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Didática Geral: para quê?

Caro aluno, provavelmente você já deve ter ouvido em seu dia a


dia alguém pronunciar a palavra didática. Isso pode ter acontecido
num ambiente escolar qualquer e com certeza se referiam à forma
como algum profissional fazia para transmitir uma informação aos
seus alunos, talvez a você mesmo. Sim, é comum ouvirmos ou falar-
mos que alguém tem ou não tem didática para ensinar, já que este
vocábulo entrou para o cotidiano das pessoas principalmente como
sinônimo de boa explicação ou de transmissão de informações com
clareza. Assim, muitas vezes nos referimos aos professores de acor-
do com sua didática, isto é, a lucidez que alcançaram ao longo de
sua trajetória profissional para transmitir conteúdos curriculares.
Mas, cabe perguntar: o significado dessa palavra está restrito a essa
aplicação? Ou a didática vai além disso? O que ela significa para a
realidade de um educador ou de um futuro educador?
Vamos buscar respostas para esses questionamentos e, ao final, você
deverá ser capaz de:
- compreender e diferenciar o significado dos conceitos de educação,
instrução, ensino e didática;
- identificar a Didática como área da Ciência Educacional e, con-
sequentemente, como instrumento para a ação docente, compreen-
dendo seu objeto de estudo e os temas aos quais se dedica;
- compreender o conceito de processo didático.
Vamos trabalhar! O exercício do magistério requer preparo e for-
mação sólida e aqui você vai obter subsídios importantes para isso.

1.1 – Três conceitos fundamentais: educação,


instrução e ensino

A humanidade, desde suas formas mais incipientes de organização so-


cial, dependeu da criação e aperfeiçoamento de um corpo de conhe-
cimentos essenciais à sobrevivência. Num primeiro momento, conhe-
cimentos ligados à subsistência alcançada com o domínio de plantas
e espécies animais; posteriormente, a conquista de territórios perten-
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centes a tribos rivais e a organização dos primeiros aparatos milita-


res e administrativos, até chegar à especialização do trabalho e recente
exploração de recursos naturais, bem como o acúmulo de riquezas nas
sociedades industriais.

Quanto ao corpo de conhecimentos acima mencionado, dois exemplos


podem ser citados para que possamos entender melhor. Primeiramente,
se quisermos resgatar um período mais remoto, podemos apontar o fim
do período Paleolítico, há cerca de 10 mil anos, quando pela primeira vez
o homem dominou a técnica de reprodução do fogo, conhecimento que
permitiu um grande avanço nas formas de vida e de organização da socie-
dade. Do primeiro ato de observação do fogo aos primeiros rudimentos
técnicos para sua reprodução em cavernas para espantar o frio, foi preciso
que o conhecimento fosse socializado, ou seja, compartilhado em grupo.

Ao mesmo tempo, quando olhamos épocas mais recentes vemos a constru-


ção do conhecimento científico e sua transmissão e aplicação, o que implica
geração de inúmeros benefícios que vão desde as viagens espaciais à produ-
ção de medicamentos e recursos médicos que prolongam a nossa existência,
o que também envolve a socialização do conhecimento construído.

Mas o homem não é o mesmo ontem e hoje, ele transforma a si


mesmo e ao mundo, ele cria novas situações, a natureza o coloca
sempre diante de novas circunstâncias,sendo assim ele sempre es-
tará diante da necessidade de construir novos conhecimentos. É
preciso, então, lembrarmos que o homem não é único, igual em to-
das as épocas, mas a condição humana é a mesma e se caracteriza
pela busca incessante da sobrevivência. Ora, se admitirmos que há
uma condição humana, que semelhança existiria entre o homem do
Paleolítico e o homem das Sociedades Industriais? O trabalho.

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Tanto o homem do Paleolítico quanto o homem das Sociedades Indus-


triais trabalham para produzir e reproduzir a sua existência, distinguin-
do-se dos outros animais por exercer sobre o mundo natural e social uma
ação que transforma a realidade a partir de um planejamento consciente,
o que ocorre sempre tendo em vista suas necessidades (Libâneo, 1994).
Devemos destacar, porém, que tal ação não acontece isoladamente, isto
é, existe uma convivência, um relacionamento para que a transforma-
ção possa acontecer e para que as necessidades sejam supridas.

Podemos, nesse ponto, indicar uma outra característica da já mencionada


condição humana a qual aproxima o homem paleolítico do homem atual.
Para que ele exerça sua ação transformadora sobre a realidade é impres-
cindível que se construa um corpo de conhecimentos para a criação de
novas atividades e para o aperfeiçoamento daquilo que já é conhecido.

Denominamos esse corpo de conhecimentos como patrimônio


cultural, o qual será transmitido em diferentes situações e de dife-
rentes formas para as novas gerações ou para aqueles que, mesmo
mais velhos, não possuem determinado conhecimento. Embora
permaneça aqui algo em comum entre o homem pré-histórico e o
homem contemporâneo, por outro lado aparece uma novidade: as
situações em que o conhecimento, ou seja, o patrimônio cultural
é evocado e a forma como ele será transmitido vão ser diferentes.
O homem muda ao longo do tempo e o trabalho terá finalidades
variáveis de acordo com tais mudanças. Desse modo, podemos
considerar: o homem é um ser histórico que, por meio do traba-
lho, transforma a si e a realidade que o circunda durante toda sua
existência conforme as necessidades de cada momento.

Encontramos na literatura filosófica e pedagógica inúmeras defi-


nições para o termo educação. Todavia, em nossos estudos ado-
taremos objetivamente a seguinte definição: processo em que o
conhecimento de diferentes tipos é transmitido para que o patri-
mônio cultural não seja perdido e as sociedades possam manter
viva a sua memória e sobreviver transformando a si mesmas e ao
mundo que as rodeia. Sendo assim, ela é universal, pois todas as
sociedades têm educação; Ela é social, pois a educação só existe
coletivamente, na convivência entre os seres humanos. Vejamos,
agora, algumas características desse processo.

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A educação é um processo, pois não se reduz a uma única ação isolada,


ou seja, é o conjunto de várias ações em que um indivíduo ou grupo
altera a maneira como o outro enxerga o mundo e mesmo os valores
cultivados, isto é, o que tem maior ou menor importância.

Voltando ao exemplo do Paleolítico no que diz respeito à produção e


controle do fogo, conseguimos visualizar esse processo, quando alguém
deliberadamente demonstrou, em primeiro lugar, que o fogo produzia o
efeito de tornar o ambiente mais agradável em épocas frias, convencen-
do o outro de que aquele efeito era necessário e desejável para tornar as
condições mais agradáveis. A partir daí seria necessário mostrar que o
atrito da pedra ou da madeira poderia gerar o efeito desejado. Em meio
a todas essas etapas devem ter surgido dúvidas, alguma coisa pode não
ter ficado clara, quando houve a primeira tentativa de reprodução pode
ter havido alguma falha, enfim, a coisa não se deu de forma natural, não
houve uma assimilação automática, mas uma interação e, possivelmen-
te, uma troca de conhecimentos que estavam referenciados nos aspectos
da vida social dos indivíduos envolvidos.

Concluímos, então, que a educação está em constante movimento e


transformação, não está acabada, não existe uma receita única para edu-
car e os sujeitos participantes de um processo educativo estarão sempre
numa relação dialógica. Mesmo que um deles tente calar o outro, o
resultado do processo não dependerá apenas de um indivíduo.

Já vimos, então, que a educação como processo é universal e en-


volve toda a sociedade. Podemos agora começar a visualizar de
que maneira isso acontece. O que representa a educação que re-
cebemos dos nossos pais no interior da família? E na escola, por
meio de um curso presencial ou a distância?

Ao processo educativo dado no interior da família atribuímos o


conceito de educação informal e àquele realizado na escola, edu-
cação formal. Para melhor esclarecer, vejamos a seguinte concei-
tuação definida por Libâneo (1994, p. 18):

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“Podemos falar de educação não-formal quando se trata de atividade


educativa estruturada fora do sistema escolar convencional [caso da fa-
mília e dos meios de comunicação] e de educação formal a que se realiza
nas escolas ou outras agências de instrução e educação (igrejas, sindi-
catos, partidos, empresas) implicando ações de ensino com objetivos
pedagógicos explícitos, sistematização e procedimentos didáticos”.

Desse modo, verificamos que a educação, de um modo geral, pode ter


duas naturezas distintas e, é claro, formas variáveis de ocorrência em
cada uma delas. Porém, não podemos cair no engano de achar que os
dois processos ocorrem isoladamente. Veremos que, ao longo da his-
tória, eles vão interagir, interpenetrar-se e até mesmo se completar. De
uma forma mais simples, notamos que certos aspectos da educação
formal estarão presentes na educação informal, como no caso do pai
que utiliza procedimentos da educação escolar para educar os filhos,
ajudando-os nas tarefas de casa ou usando sanções conforme as notas
obtidas na escola. O inverso também é verdadeiro, quando a educação
formal se apropria de conhecimentos obtidos em processos de educação
informal, caso da difusão, por escolas e universidades, do uso de plantas
medicinais popularmente utilizadas.

Embora tenhamos aprendido que a palavra educação tenha uma abran-


gência universal, percebemos que, na atualidade, a escola adquiriu
status de principal lugar de construção e difusão de processos educa-
cionais, particularmente os da educação formal. Na modernidade, o co-
nhecimento escolar, sobretudo o científico, ocupa um lugar de destaque,
já que a vivência reflexiva e participativa dos indivíduos na sociedade
depende da escola. Se por um lado isso traz a necessidade positiva da
escola ser renovada a cada momento para que possa acompanhar criti-
camente o desenrolar da história, coloca sobre ela uma responsabilidade
que deveria ser dividida, principalmente com a família.

A nossa maior preocupação nos estudos que agora iniciamos será a de


compreender e questionar aspectos da educação formal escolar, muito
embora já saibamos que ela não ocorre isoladamente, não sendo um
processo homogêneo, pois se apropria de conhecimentos e práticas edu-
cativas formais e informais dadas em outros ambientes e sofre influên-
cias filosóficas e de princípios político-pedagógicos diversos.

A partir do conceito de educação escolar exposto, identificamos ou-


tro conceito fundamental para a compreensão do processo educati-
vo, a instrução. Com o entendimento do que é instrução, daremos
mais um passo para situar a Didática no horizonte de trabalho do
professor em formação.

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INSTRUÇÃO: compõe o processo educativo, sendo constituída


pelas ações que levam ao domínio de conhecimentos sistemati-
zados. Trata-se da transmissão de conteúdos, os quais deverão
ser assimilados por aquele que os recebe. Todavia, se o processo
resumir-se à instrução ele deixa de ser educativo, pois abre mão
da construção e reconstrução permanente de conhecimento, dei-
xando também sua face reflexiva, isto é, de pensar a sociedade e
a si mesmo de forma constante e, consequentemente, de atuar na
formação dos indivíduos (Freire, 1996).
ENSINO: é o conjunto de ações, meios e condições para realiza-
ção da instrução, é a principal forma de veiculação da educação
(Libâneo, 1994). Podemos destacar, para diferenciar instrução de
ensino, que a primeira enfatiza o conteúdo a ser ensinado e o se-
gundo, o caminho para transmitir os conteúdos. O ensino é típico
da educação escolar e a Didática encontra nele uma das suas pre-
ocupações primordiais.

1.2 – A Didática como área da Pedagogia e ins-


trumento para a ação docente

A palavra Didática pode ter sua origem etimológica ligada a duas pa-
lavras gregas Techné didaktiké que, juntas, significam arte ou técnica
de ensinar. Apesar de originalmente a palavra estar restrita ao ensino,
sobretudo em sua dimensão técnica, ao longo do tempo teve o signi-
ficado ampliado, tornando-se mais abrangente, indo além do aspecto
puramente técnico (Pimenta, 1997).

Quando falamos em Didática, referimo-nos a um campo de es-


tudos das Ciências Educacionais que deve promover uma refle-
xão sistemática a respeito do processo de ensino-aprendizagem,
problematizando os elementos que o constituem e o influenciam.
Nesse sentido, a Didática se apresenta como um campo de pes-
quisas educacionais e como um aparato técnico a que o professor,
em sua experiência cotidiana, possa recorrer para tornar o ensino
mais eficiente (Pimenta, 1997).

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