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Jejum de Ester

Quando jejua-se
Em 11 de Adar, este ano (2011) quinta-feira, 17 de março.
Início do jejum: 5h (S.Paulo)
Término: 18:44h (S. Paulo)

Duração
O jejum começa antes do amanhecer e termina após o anoitecer.

Significado
Mordechai, conselheiro do rei da Pérsia, Achashverosh, vestido de andrajos e cinzas, conclamou os judeus para retornar à Torá.

Sua prima, a rainha Ester, jejuou em penitência por três dias e pediu ao povo judeu que fizesse o mesmo. Só então encaminhou-se até o rei para acusar
Haman de querer matar seu povo.

Os judeus obtiveram permissão para se defender e, em 13 de Adar, lutaram contra o inimigo, destruindo-o. Para relembrar este dia de prece e jejum que
precedeu a vitória, nossos Sábios instituíram o Jejum de Ester.

Costumes
Antes da prece de Minchá é costume doar três moedas de meia unidade monetária para tsedacá, em lembrança do meio-shekel que cada um deveria doar
para o Templo Sagrado. Para quem esquecer ou não estiver presente na sinagoga, poderá realizar este costume na manhã de Purim, antes da leitura da
Meguilá ou durante o dia.

Purim

Quando comemora-se
Em 14 de Adar. Este ano Adar II (2011), sábado à noite, 19 de março e domingo 20 de março, durante o dia.

Significado
Origina-se da palavra "Pur", sorteio. Referente a data em que Haman sorteou e marcou para o aniquilamento de todo o povo judeu. Na verdade, transformou-
se na data de sorte do povo judeu, quando então foi salvo e saiu-se vitorioso. Esta data marcou para sempre o dia em que comemora-se com grande alegria a
festa de Purim.

Preceitos
Leitura da Meguilá
Deve-se ouvir duas vezes a leitura da Meguilá de Ester: uma na noite de Purim ( sábado à noite, 19 de março) e a outra pela manhã ( domingo 20 de março,
durante o dia).

Mishlôach Manot
Envia-se alimentos a pelo menos um amigo no decorrer do dia de Purim que devem ser de duas espécies (fruta, massa e/ou bebida), prontos para consumo e
entregues através de um mensageiro.

Matanot Laevyonim
Doa-se uma certa quantia em dinheiro para pelo menos dois carentes no decorrer do dia de Purim. Caso não se encontre ninguém nestas condições, a doação
deve ser colocada em uma caixinha de tsedacá.

Refeição Festiva
Uma refeição festiva é realizada ainda durante o dia de Purim e deve conter pão, vinho e carne.

Costumes
Reco-reco
Toda vez que o nome de Haman (acompanhado de um adjetivo) for mencionado durante a leitura da Meguilá, faz-se barulho com o reco-reco ou outros
instrumentos sonoros.

Fantasia
Purim é uma festa feliz e fantasiar-se é uma maneira alegre e divertida de aumentar ainda mais a alegria do milagre ocorrido. Existem dois tipos de milagre:
aquele que é óbvio e aquele que está oculto pela Natureza. Purim pertence a segunda categoria. Nos fantasiamos para reafirmar que a Natureza nada mais é
além de uma "fantasia" da mão Divina. Proibições
É proibido jejuar em Purim. Reserva-se o dia, ou grande parte dele, para realizar todas as mitsvot referentes à festa. Qualquer trabalho desnecessário deve ser
evitado ao máximo.     

OUÇA A LEITURA DA MEGUILÁ


Para reviver os milagrosos eventos de Purim, ouvimos a leitura da
Meguilá (Rolo de Ester), este ano (2011) sábado à noite, 19 de março, e uma vez mais no domingo, 20 de março, no decorrer do dia. As duas leituras são
obrigatórias.
Quando o nome de Haman for mencionado faz-se barulho com o reco-reco.
A leitura é ouvida atentamente para que nenhuma palavra seja perdida.

PRESENTEIE OS NECESSITADOS
Interesse e dedicação para com os necessitados é uma responsabilidade durante o ano todo. Particularmente em Purim, a mitsvá mais importante é lembrar
dos menos afortunados. Dê um donativo a pelo menos duas pessoas carentes no decorrer do dia. A melhor maneira de cumprir esta mitsvá é através da
doação direta. Se por acaso não encontrar nenhuma pessoa nessas condições deposite algum dinheiro nas caixinhas de tsedacá.

ENVIE ALIMENTOS COMO PRESENTE


Em Purim enfatizamos o mérito da união e amizade judaicas, enviando aos amigos dádivas sob forma de alimentos. Mande no decorrer de domingo, 20 de
março, a pelo menos um amigo, no mínimo duas espécies comestíveis casher (no mínimo, 30g para sólidos e 86ml para líquidos) prontas para comer (por
exemplo: doces, frutas, bebidas, etc.).

PARTICIPE DE UMA REFEIÇÃO FESTIVA


Como em todas as festas, uma refeição especial é feita para celebrar Purim (incluindo carne e vinho), quando familiares e amigos se reúnem para comemorar
a data. Esta refeição acontece no domingo.Meguiláh de Esther
Meguilah de Esther

Capítulo I

O palácio real em Shushan fervilhava de atividade, o ar repleto de alvoroço. O rei Achashverosh havia acabado de ordenar um banquete inigualável em beleza
e preço. Centenas de criados esfalfavam-se de lá para cá, ansiosos para obedecer as ordens do rei.

Lá fora, os jardins encantadores floresciam em mil perfumes, enquanto eram preparados para receber os numerosos hóspedes que viriam de todo o reino.
Pashda, um artesão habilidoso, cuidadosamente pendurava tecidos finos e coloridos. Lentamente, prendia as delicadas fazendas brancas, azuis e verdes às
majestosas colunas de mármore, usando cordões de linho e lã púrpura.

Chamando da escada, Pashda tentava atrair a atenção do ajudante, Razmir. Porém, em vez de assisti-lo, Razmir observava os outros serventes que
colocavam divãs de ouro e prata em fileiras ao longo do piso de mármore colorido.

"Psiu, Razmir! Passe-me outro pedaço de cordão, está bem?"

"Perdoe-me, Pashda" – disse Razmir, em tom de desculpa. "É que tantas coisas estão acontecendo aqui. Distraí-me, observando todo este movimento."

Pashda meneou a cabeça. "Não havia tal rebuliço por aqui desde a coroação do rei Achashverosh" – disse ele.

Razmir bem se lembrava daquela ocasião. O rei havia sido coroado numa cerimônia esplêndida, que ostentava beleza e fausto. O rei parecia quase
desesperado para ser aceito como imperador da Pérsia e Medéa, governante de 127 países ao redor do mundo. Razmir refletia…

"Você sabia?" – zombou Pashda, enquanto prendia outro tecido. Abaixando a voz, sussurrou: "O rei Achashverosh é na verdade um plebeu. Não há nenhum
sangue azul correndo em suas veias. Lutou para conquistar o trono e controlar os tesouros reais. Apenas casou-se com Vashti, descendente de reis, para
fortalecer seu direito ao trono persa."

"Mas Vashti é da Babilônia" – disse Razmir. "Como veio para a Pérsia?"

"As origens de Vashti e aqueles imensos tesouros estão relacionados. Na verdade, toda essa agitação de hoje no palácio é parte da mesma história" –
explicou Pashda com ar superior.
O pobre Razmir era apenas um servente, e os segredos do palácio real estavam além de seu conhecimento. Sua curiosidade fora aguçada, e implorou ao bem
informado Pashda que lhe contasse mais detalhes.

"É uma longa história e temos muito trabalho a fazer" – replicou Pashda com um sorriso dissimulado. "Mas se você conseguir-me uma amostra dos quitutes
sendo preparados na cozinha, contarei mais na hora do almoço."

Razmir assentiu obedientemente, ansioso por ouvir o restante da história. Neste ínterim, outros preparativos estavam sendo providenciados. Mesas com
esculturas e decorações luxuosas estavam sendo postas com utensílios de bom gosto. Acima do clangor vindo das baixelas repletas, Razmir podia escutar as
conversas dos garçons.

"Olhe para todas essas taças de ouro! Não conseguiremos terminar de arrumar todas antes do Juízo Final! É necessário colocar tantas?"

"Bem, você sabe que o rei Achashverosh ordenou que um copo não seja usado duas vezes, então devemos preparar um suprimento bem grande."

"Que desperdício! Adivinhe só quem vai lavar toda a louça…"

"Na verdade, ouvi dizer que o rei permitirá que cada convidado guarde o copo em que beber; e a cada vez que for servido, receberá um novo!"

"É verdade? Bem, tanto melhor para nós. É uma pena que não lhes dê os pratos também! Veja, haverá milhares de pratos e travessas aqui, e temos que
colocar jogos individuais! Se pudéssemos empilhar tudo, como sempre fazemos, seria bem mais fácil."

"O rei Achashverosh deseja que todos os hóspedes sintam-se tão confortáveis quanto possível. Com jogos individuais, cada pessoa pode comer a seu bel-
prazer – sem precisar empurrar, abrir caminho ou engalfinhar-se pelo próximo prato."

"Olhe, onde estão aqueles copos enormes que são sempre colocados em banquetes reais? Sabe, aqueles que são enchidos de vinho e que cada convidado é
forçado a esvaziar."

"Você não soube? O rei ordenou que este costume não seja mantido nesse festim. Nesse banquete, cada convidado pode beber muito ou pouco, como
desejar."

"Que alívio! Odeio ver aquelas pobres pessoas inocentes passando mal por causa de nossa ‘generosa’ rotina de bebida."

Houve uma pausa na conversa enquanto os garçons se esgueiravam pelas fileiras de mesas, destramente balançando pilhas de travessas em enormes
bandejas.

De repente, o ruído de engradados chocalhando causou um rebuliço no pátio. Todos se voltaram para ver o que estava sendo trazido com tanto cuidado. Os
engradados foram abertos com extremo cuidado pelo próprio chefe dos garçons.

"Ah!!"

"Oh!!"

"Puxa"

"Olhe para esses belos utensílios!"

"Até mesmo as mais finas travessas reais empalidecem em comparação."

"De onde vêm?"

Olhos zombeteiros voltaram-se na direção do ignorante que perguntara. O pobre Razmir achou-se rodeado por rostos sarcásticos.

"Idiota! Não sabe que estas peças vêm do Templo dos judeus em Jerusalém?"

O rosto de Razmir ficou escarlate de vergonha. "Como puderam estes objetos maravilhosos sequer chegarem aqui?" – pensou. Não ousando exibir mais de
sua ignorância, decidiu perguntar a Pashda, e correu de volta para suas tarefas.

Após o que pareciam horas, um supervisor oficial anunciou o tão esperado descanso para almoço. Razmir manteve a promessa a Pashda e, enquanto os dois
relaxavam, mastigando ruidosamente os quitutes roubados, Pashda continuou sua história.

"Quando o poderoso rei da Babilônia, Nevuchadnêtsar (Nabucodonosor), conquistou Jerusalém, destruiu o Templo e saqueou os tesouros. Os vasos sagrados
e utensílios de ouro foram trazidos para a Babilônia e guardados nos cofres reais.

"Agora que o povo judeu fora exilado, seu Templo destruído e sua terra esvaziada, eles não mais representam imediata ameaça ao rei da Babilônia. Havia,
porém, algo que pairava como uma nuvem escura sobre a cabeça de Nevuchadnêtsar. Embora desejasse considerar o povo de Israel condenado para
sempre, as palavras do profeta Yirmiyáhu (Jeremias) ecoavam em seus ouvidos: "Pois assim diz D’us: ‘Após se completarem setenta anos, considerarei e
manterei Minha boa promessa de trazê-los de volta a este lugar.’
"Nenhum rei babilônico poderia estar a salvo até que setenta anos se passassem com a promessa permanecendo não cumprida. Assim que este prazo se
esgotasse, poder-se-ia assumir que D’us se esquecera do povo judeu e não iria vingar a destruição do Templo."

Razmir ouviu com muita atenção, embora não pudesse evitar pensar o que tudo isso tinha a ver com a festa. Pashda continuou; "Nevuchadnêtsar morreu e os
tesouros de Jerusalém foram guardados pelos reis da Babilônia que o sucederam. Passaram-se os anos e Belshatsar assumiu o trono da Babilônia. No
terceiro ano de seu governo, seus conselheiros calcularam que os setenta anos de exílio haviam terminado. Pelos seus cálculos, não havia sinal algum do
retorno dos judeus à sua Terra natal.

"Belshatsar ficou radiante e promoveu um grande banquete. Ordenou que os utensílios do Templo fossem usados para a festa como sinal de sua completa
vitória sobre os judeus e seu D’us.
"De repente, em meio à ruidosa farra e bebedeira extravagante, algo apareceu escrito na parede do salão. As palavras eram aramaicas, escritas em letras
hebraicas: ihxrpu ke, tbn tbn (menê menê tekel ufarsin), i.e., medido, medido, pesado e dividido.

"Belshatsar entrou em pânico. Queria desesperadamente entender as palavras, mas não conseguia lê-las. Finalmente mandou chamar Daniel, um sábio judeu
e ministro da corte, que disse ao rei o significado das palavras. O reino de Belshatsar estava condenado e seria conquistado por seus piores inimigos, os
persas. Estava sendo punido por fazer uso pessoal dos recipientes do Templo Sagrado.

"Quando Belshatsar ouviu a interpretação de Daniel, ficou muito assustado. E se Côresh (Ciro) e Daryávesh (Dario), os reis da Pérsia, mandassem assassinos
para matá-lo durante o sono? Por esse motivo emitiu um decreto, ordenando que qualquer um que tentasse entrar no palácio seria morto – mesmo se
afirmasse ser o rei em pessoa!

"Naqueles dias, não havia banheiros no palácio. Até mesmo o rei usava as instalações externas. Aquela noite, o rei levantou-se. Os guardas não o viram sair;
assim, quando tentou reentrar no palácio, impediram-no. Arrogantemente anunciou ser o rei; porém, estava escuro, e o escravo não prestou atenção a seus
protestos. Sem hesitação, prontamente decapitou Belshatsar. Ninguém culpou o escravo pelo que havia feito; apenas tinha seguido as ordens do rei.

"Esperando ser recompensado, o escravo dirigiu-se a Dario e Ciro, informando-os que Belshatsar tinha morrido. Os persas irromperam no palácio real e
ordenaram que cada membro da família de Belshatsar fosse morto.

"A jovem filha de Belshatsar, Vashti, estivera profundamente adormecida até ser acordada pelo tumulto. Vendo pessoas matando-se umas às outras e não
sabendo o que fazer, correu ao quarto de Belshatsar, atirando-se aos pés de Dario, pensando que fosse seu pai. Quando Dario viu a jovem frenética a seus
pés, apiedou-se dela e poupou sua vida. Ela foi levada à Pérsia como cativa, mas tratada com respeito por causa de sua ascendência real.

"Bem, quando Dario descobriu que Belshatsar havia sido morto como resultado de suas próprias ordens, percebeu que a morte fora claramente um ato de
D’us. Entendeu que Belshatsar fora morto por causa de seu desrespeito ao Templo e pelo uso de seus utensílios. Dario prometeu, então, que assim que se
sentasse no trono da Babilônia ordenaria que o Templo fosse reconstruído e os vasos sagrados devolvidos.

"Ocupado com a administração de um novo reino, porém, Dario esqueceu sua promessa até ser dela lembrado por Zerubavel, um líder judeu. Dario nomeou
seu genro, Ciro, rei da Babilônia e Medéa ainda durante sua vida, instruindo-o a providenciar para que o Templo fosse reconstruído imedia-tamente.

"Ciro cumpriu as ordens do sogro. Os judeus começaram a erigir as fundações do Templo, e o próprio Ciro pagava o salário dos operários. Porém, dois anos e
meio depois, Ciro morreu.
"Achashverosh, um plebeu, embora poderoso, lutou e subornou para abrir seu caminho ao trono. Porque queria fortalecer sua posição, desposou Vashti, que
era de família real, e reforçou as leis com mão de ferro. Em todos os 127 países, seus súditos tinham que curvar-se à sua força e autoridade."

Pashda fez uma pausa e relanceou os olhos pelo enorme relógio de sol no centro do jardim. A folga para almoço estava quase terminando, e precisavam voltar
ao trabalho. Limpou as migalhas das roupas e levantou-se.

"Oh, por favor! Termine a história. Ainda não sei qual é o motivo dessa festa!" – gritou Razmir.

"Descubra por si mesmo!" – replicou Pashda com afetação. Razmir olhou-o, perplexo.

"É tão óbvio!" – explicou Pashda num tom simpático a seu ajudante agastado. "Lembra-se da promessa dos setenta anos? O rei Achashverosh está muito
preocupado pela fraqueza de sua posição. Acredita que Belshatsar tenha errado no cálculo dos setenta anos, e por isso tenha encontrado um fim tão infeliz.
No entanto, de acordo com seus próprios cálculos, os setenta anos terminaram. Como os judeus não foram redimidos, a ameaça ao reino da Babilônia, que
agora é o império persa de Achashverosh, foi finalmente afastada.

"O governo de Achashverosh está seguro agora. A festa é para celebrar esta vitória. Porém, como é plebeu, quer convencer o povo que é verdadeiramente
digno de seu trono. Precisa impressio-nar a todos com sua grande riqueza. Esta é a razão por trás deste banquete magnífico. Usar estes utensílios do Templo
demonstrará que está livre da ameaça da maldição dos setenta anos."
Razmir assentiu. Tudo fazia sentido agora. Os dois se levantaram para continuar o trabalho.
Entretanto, ainda havia algumas dúvidas na mente de Razmir. Será que os judeus haviam terminado de construir seu Templo? Se haviam, por que os
utensílios nunca foram devolvidos? Os setenta anos realmente haviam passado?

Quando perguntou ao amigo, Pashda deu de ombros. "Na verdade, não sei o que aconteceu. Tudo que posso dizer é que os utensílios aqui estão, e ainda há
muitos judeus vivendo espalhados pelo reino. Talvez após a morte de Ciro, não tenham tido dinheiro suficiente para continuar a reconstrução do Templo e o
trabalho tenha parado."

Pashda não sabia o último capítulo dessa história. A reconstrução do Templo havia, de fato, parado, mas não por falta de fundos. Quando Achashverosh
assumira o trono, foi abordado por uma comissão de três homens; Sanbalat, Tobia e Shimshi, o escriba, um dos filhos de Haman. Presentea-ram-no com uma
requisição assinada, a respeito do Templo judeu.

"Se os judeus forem autorizados a reconstruir as muralhas de Jerusalém" – dizia a carta – "uma grande rebelião acontecerá. Sua Majestade sabe como as
muralhas eram inquebráveis.
Nevuchadnêtsar somente conseguiu conquistar a cidade após um grande cerco; quando a tomou, mandou destruir as muralhas e exilou os habitantes.
Somente então, ele e seu exército puderam sentir-se a salvo.

"Majestade, não deve permitir que os judeus reconstruam a cidade. Se o fizerem, irão rebelar-se e recusar-se a pagar taxas e tributos. Somos seus súditos
leais e estamos preocupados com o bem do reino. Não queremos que o rei sofra qualquer perda. Por isso, aconselhamos que a permissão para a
reconstrução do Templo, anteriormente assegurada por Ciro, seja revogada."

A carta havia sido enviada a mando de ninguém mais que Haman, o Agaguita, conselheiro do rei, que se apresentou pessoalmente perante Achashverosh e
explicou como a construção do Templo causaria grande dano ao monarca.

O argumento de Haman estava de acordo com sua cruel linhagem. Agag, ancestral de Haman, foi o último rei de Amalek, a nação que atacara o povo judeu
durante sua viagem através do deserto. Ao longo da história, eles haviam sempre sido o inimigo mor de Israel. Leal às tradições de sua tribo, Haman tentou
fazer de tudo a seu alcance para convencer Achashverosh a não autorizar que os judeus reconstruíssem o Templo.

Haman não era o único a pressionar o rei. A Rainha Vashti ia pelo mesmo caminho. Fervendo de ódio, exclamou: "Este Templo foi destruído por meus pais,
Nevuchadnêtsar e Belshatsar. Não descansaram até que o viram em ruínas. E você vai permitir aos judeus que o reconstruam!"
Achashverosh não gostava muito dos judeus. As palavras de sua mulher e a carta de Haman convenceram-no. Ordenou que o trabalho no Templo parasse.

Não é de se admirar que os judeus não estivessem contentes com o reinado de Achashverosh. Foram eles que haviam apelidado o rei de "Achashverosh".
Seu verdadeiro nome era Artaxerxes, o título dado a muitos governantes persas, assim como o nome ‘Faraó’ era dado aos reis do Egito. Achashverosh é um
trocadilho com as palavras "chash" e "rosh", significando "dor de cabeça" (em hebraico). Seu reinado cruel e mudanças de humor causaram dor de cabeça e
sofrimento a muitos judeus.

Achashverosh agora oferecia uma festa imensa para celebrar seu recém-adquirido poder do trono. Haman convencera-o a fazer da festa algo inesquecível.

"Embora o tempo para a redenção de Israel tenha passado" – Haman disse maliciosamente ao rei – "na verdade não há nenhuma garantia que a promessa de
seu D’us esteja definitivamente quebrada. Não é seu D’us que está impedindo a redenção, mas os próprios judeus."
Achashverosh fitou Haman, intrigado. O que queria dizer?
"Veja, Majestade, a história dos judeus não tem segredos. Todos sabem que enquanto eles obedecerem aos mandamentos de D’us, viverão bem. Entretanto,
quando não obedecem Suas leis, são subjugados por outras nações e governantes" – explicou Haman.

O rei estava começando a entender. Se os judeus se arrependessem, seriam redimidos. Entretanto, se pudessem ser levados a pecar novamente, nunca
ficariam livres do exílio.
"Ah, compreendo" – disse o rei, entusiasticamente. "Pretendo forçá-los a participar da minha festa, a beber meus vinhos e comer de minha comida."

Haman esfregou as mãos, contente. Era uma ocasião perfeita para fazer uma armadilha para os judeus e condená-los para sempre ao exílio.

Assim, Achashverosh planejou a festa. Desejava aproveitar esta oportunidade para exibir sua grande riqueza e impressionar os súditos com seu poder.
Convidou governadores de todo seu império para que viessem com suas esposas, filhos e criadagem. Também convidou todos os oficiais de seus vastos
exércitos. Precisava deles para conquistar e controlar as províncias; por isso, queria assegurar-se de seu apoio e lealdade.

Como o império era muito extenso, a festa duraria por 180 dias, de forma a permitir que mesmo os convidados vindos de terras distantes pudessem participar.
A festa começou no mês de Nissan (abril) quando os dias se tornam mais longos. Haveria suficiente luz do dia, durante o qual as pessoas poderiam admirar a
riqueza do rei. Os longos dias de verão seriam repletos de festividades e celebração. A cada dia da festa, Achashverosh apareceria ostentando as vestimentas
do Cohen Gadol (Sumo Sacerdote), mantidas nos cofres reais com os sagrados utensílios do Templo.

Os tesouros em exibição eram trocados a cada dia da festa, e nada seria exposto mais que uma única vez. O cardápio para cada dia do banquete também
seria variado; o mesmo prato nunca seria servido duas vezes. Continuar dessa maneira durante 180 dias exigia recursos infindáveis, os quais Achashverosh
estava ansioso para mostrar que possuía.

As pessoas vinham de longe e de perto. Multidões de hóspedes misturavam-se nos domínios luxuosos do palácio, bajulando o rei com os elogios mais
extravagantes. Achashverosh estava encantado ao ver que todos pareciam tão assombrosamente impressionados.

Todos, quer dizer, todos exceto os judeus. Quando a notícia do convite feito pelo rei chegou ao povo, os líderes judeus convocaram uma reunião urgente para
discutir o assunto.

"Como ousaremos recusar o convite?"

"Se o fizermos, seremos considerados rebeldes e poremos nossa vida em perigo."

"Seria possível irmos, e mesmo assim evitar a comida não-casher?"

Ansiosos e angustiados, os líderes judeus olharam para Mordechai, seu Rabi mais proeminente, em busca de orientação. "Nenhum judeu deve participar!" –
proclamou ele, vigorosamente.

Os líderes judeus rapidamente decidiram deixar a cidade de Shushan pelo período de 180 dias de duração da festa.

Quando o rei percebeu sua ausência, ficou furioso e jurou fazê-los participar da sua celebração. Sentiu também que ainda havia algo necessário a se fazer
para unir o povo que governava. O banquete de 180 dias seria suficiente para o povo de todo seu império. Entretanto, algo de especial tinha de ser feito para
assegurar a lealdade dos súditos locais. Com esses dois propósitos em mente, Achashverosh planejou uma festa especial com duração de sete dias que se
seguiria ao banquete prévio, apenas para os cidadãos de sua capital, Shushan.

"Os judeus não conseguirão se safar desta vez" – disse Achashverosh, cerrando os dentes ao decidir forçá-los a comparecer a esta segunda série de festejos.
Usando a ameaça de penalidades, forçou os judeus a retornarem a Shushan e assistirem a este segundo banquete de sete dias, começando em 3 de Tishrei e
terminando em Yom Kipur.

Embora Mordechai houvesse ordenado que os judeus não deviam comer na festa, acharam difícil de recusar. Como pode uma pessoa sentar-se à mesa de um
rei e não comer?

Tornou-se claro que o plano de Haman estava funcionando e que os judeus haviam de fato se esquecido da promessa de D’us 

Capítulo II

A rainha Vashti olhou para os folguedos e franziu a testa. Ela não gostava de ser superada."Deverei eu, a filha de um rei, ser ofuscada por um plebeu? Como
ousa ele competir com a verdadeira realeza? Farei uma festa especial para as mulheres, que será em cada detalhe tão extravagante como a do rei."

Vashti chamou as criadas e instruiu-as a se prepararem para seu banquete. Intencionalmente, procurou moças judias e fê-las trabalhar no Shabat. Ela sempre
gostara de forçar os judeus a profanar seu sagrado dia de descanso.

A festa de Vashti foi preparada, e o palácio, transformado numa imensa e resplandecente exibição de extravagância. O sétimo dia do banquete de Shushan
era também Shabat. O rei não havia comido ou bebido muito até este último dia porque estava se concentrando em exibir seu poderio. Como bom anfitrião,
apenas beliscava, passando a maior parte do tempo com os convidados. No sétimo dia, porém, após ter providenciado todas as necessidades de seus
hóspedes e haver ostentado toda sua riqueza, juntou-se aos folgazões.

Todos os cortesãos estavam se gabando sobre a beleza de suas mulheres. Uma discussão amigável irrompeu, sobre se as mulheres persas ou se as
medeanas eram as mais belas.

A essa altura, Achashverosh, que estava bastante bêbado, interrompeu a conversa com um rugido. "Minha mulher não é persa nem medeana; é da Babilônia,
mas nenhuma é tão bela quanto ela. Se não me acreditam, vou mostrá-la a vocês."

"Certamente" – zombaram os cortesãos – "vista a mais feia das mulheres como uma rainha e parecerá linda. Isso não prova nada."

"Isso é o que vocês pensam" – retorquiu o rei. "Mostrarei a vocês que ela é linda mesmo sem roupa." Com isso, voltou-se aos ministros e disse: "Tragam-me a
rainha Vashti – vestindo nada além da coroa real."
Numerosas pessoas perceberam que o rei estava embriagado, mas tiveram medo de desobedecê-lo. Ele mandou empregados comuns para chamar Vashti,
em vez de oficiais importantes. Parecia quase que a intenção era prendê-la como um criminoso qualquer. Porém, apesar do insulto implícito, ninguém ousou
desafiar as ordens do rei.

Ninguém, exceto a própria rainha. Quando ouviu o pedido ultrajante do rei, ficou estupefata. "Que tipo de palhaçada era esta? E se ele a exibisse defronte aos
cortesãos e todos zombassem dela? Jamais seria capaz de mostrar seu rosto novamente!

"O rei gosta apenas de minha beleza, não de mim" – pensou Vashti. "Por que devo degradar-me por ele? Quem pensa que é? Sou muito superior a ele, sendo
de linhagem real. Como ousa me ridicularizar assim?"

Desgostosa, Vashti enviou sua recusa nos termos mais enfáticos através dos criados. "Vão e digam ao palerma de seu amo que na casa de meu pai,
Belshatsar, ele não seria suficientemente bom nem para limpar os estábulos! Seus tolos débeis-mentais! Não percebem que sou a rainha Vashti, filha dos reis
da Babilônia? Se tivessem conhecido meu pai, perceberiam que Achashverosh é um joão-ninguém. Meu pai poderia beber dez vezes mais que este amo de
vocês, mas jamais teria dado uma ordem tão ultrajante!"

Ao ouvir esta resposta, Achashverosh mandou um ministro do mais alto escalão com mensagem igualmente forte para Vashti: "Olhe bem o que está fazendo!
Obedeça minhas ordens e apresente-se perante meus convidados ou ficará amargamente arrependida!"

A mensagem foi transmitida, mas a rainha a ignorou. "Volte para seu rei bêbado" – replicou – "e diga-lhe que suas idéias são absurdas. Sou a filha do grande
rei Belshatsar, neta do famoso Nevuchadnêtsar, conquistador do mundo. Não serei humilhada dessa forma!
"Aquele tolo não percebe que está apenas prejudicando a si mesmo? Vai transformar-nos em motivo de pilhéria em Shushan. Nem mesmo um idiota forçaria
sua mulher a desnudar-se em público."

A rainha Vashti estava na verdade mais preocupada com seu orgulho que com seu recato. Mesmo assim, sentiu uma real ameaça no aviso do rei.

"Se o rei insiste em que eu apareça perante as pessoas, quero cobrir meu corpo ao menos com um véu" – mandou dizer pelos cortesãos.

O rei não concordou.

"Irei sem o véu, mas não me envergonhe fazendo-me usar a coroa."

Novamente o soberano recusou. Ele não queria que seus convidados pensassem que substituíra a rainha por uma escrava.

Finalmente, Vashti rendeu-se. Embora o rei estivesse se comportando de forma irracional, relutantemente concordou em aparecer sem roupa. Preparando-se
para comparecer ao banquete real, deu uma rápida olhada no espelho.

O que viu quase fê-la desmaiar. Uma horrível erupção havia brotado em todo seu corpo. O que poderia fazer? Não seria possível aparecer como o rei havia
ordenado. Procurando desesperadamente por uma desculpa, finalmente escreveu uma mensagem e a mandou ao rei.

A nota dizia: "Não posso acreditar que você tenha mesmo dado essa ordem. Estou certa que o mensageiro deve ter interpretado mal suas palavras. Como não
ouvi a ordem de seus lábios, não irei."

Lendo o recado, o rei explodiu em fúria. Ela estava zombando dele na presença dos cortesãos. Se sua própria mulher se recusava a obedecer às suas ordens,
como poderia governar um reino?

Achashverosh tentou reprimir a ira, mas essa irrompeu fora de controle, como uma onda de fogo. Assim mesmo, fez um esforço enorme para acalmar-se,
porque na verdade não queria que nada de drástico acontecesse a Vashti. Afinal, era sua esposa e rainha.

O rei estava terrivelmente aborrecido. Como pudera fazer algo tão tolo? Por causa de sua embria-guez, sua amada rainha Vashti estava agora em grande
perigo.

Achashverosh fora subitamente mergulhado num dilema que ele mesmo criara. Não podia simplesmente ignorar o episódio por completo e continuar sua
diversão. Mesmo assim, não desejava ir em frente com sua ameaça. Precisava discutir o assunto com seus conselheiros e esperava que inventassem algum
plano inteligente para salvar tanto seu orgulho como sua rainha.

O rei Achashverosh pediu conselho a sete príncipes da Pérsia e Medéa que lhe eram mais chegados. Estes homens representavam as várias partes do reino.
Carshená, encarregado dos estábulos reais e do gado, viera da África. Shêter, da Índia, tomava conta das adegas reais. Admatá, da Europa Ocidental, dirigia
toda a criadagem. Tarshish, do Egito, cuidava dos membros da família real. Mêres, Marsená e Memuchan eram de Jerusalém. Por serem conhecidos como
conselheiros profissionais, foram colocados para chefiar os outros.
O rei pediu aos sete ministros para aconselhá-lo sobre um castigo para uma rainha que desobedeça ao rei.
Não queria de forma alguma que sugerissem uma sentença de morte. Apesar disso, Vashti havia sido extremamente desrespeitosa, por isso não poderia
perdoá-la ele mesmo, abertamente. Fazê-lo implicaria confessar que era um rei incapaz de defender sua própria honra. Mas se seus melhores conselheiros
sugerissem que a perdoasse, Achashverosh salvaria seu orgulho aceitando o perdão, desde que sugerido por eles.

O rei escolheu as palavras cuidadosamente, insinuando aos conselheiros que gostaria de um julgamento favorável à rainha.

"O que deve ser feito com a rainha Vashti, que desobedeceu às ordens do rei, trazidas a ela por meus mensageiros?" – perguntou o soberano.

Achashverosh estava na verdade dizendo: "Julguem-na como uma rainha, não como uma plebéia. Lembrem-se de que fiz um exigência imprópria e não dei a
ordem pessoalmente, mas mandei-a por mensageiros.
Além disso, todos sabem que eu tinha bebido. Deve receber algum castigo, mas não a morte. Tenham consideração, pois a vida de minha rainha está em suas
mãos." Achashverosh olhou esperançosamente para os ministros. Eles se mexiam constrangidamente em seus lugares. Embora o rei estivesse obviamente
pedindo suas opiniões, não estavam bem certos sobre como reagir.

"Devemos condená-la e colocar o orgulho do rei num pedestal, como ele sempre quis?" – refletiam. "Ou deveremos sugerir o perdão e o esquecimento, ao
mesmo tempo em que possivelmente provocaremos a ira do rei?"

Os ministros não haviam entendido as insinuações do rei, e temiam dar voz às suas opiniões.

Todos menos um. Era Memuchan, também conhecido como Haman. Provavelmente entendia as intenções do rei, mas tinha seus próprios interesses em
mente. Guardava um ressentimento pessoal contra Vashti, que fizera de tudo para humilhá-lo. Quando Vashti convidara todas as senhoras de Shushan para
sua festa, havia negligenciado a esposa de Haman.

"Que oportunidade perfeita para vingar-me dela" – pensou Haman com satisfação. "Com Vashti fora do caminho, minha linda filha tornar-se-á a candidata mais
provável a rainha."

Havia ainda algo mais incomodando Haman, e causando-lhe grande ansiedade e ódio com relação a Vashti. Os astrólogos reais haviam lhe dito que a esposa
do rei o mataria no futuro. Achando que suas predições referiam-se a Vashti, Haman estava muito ansioso para se ver livre dela.

Dessa maneira, foi Memuchan, aliás Haman, que descaradamente, destacou-se da fileira de ministros silentes, expondo sua opinião em primeiro lugar.

"Devo aconselhar o rei a não julgar Vashti apenas em relação a si mesmo" – começou. "Ela ofendeu não apenas ao rei, mas a cada homem em todo o reino.
Não há maneira de escapar à responsabilidade.
"Sabem como as histórias são deturpadas conforme são passadas adiante. O povo não conhecerá todos os detalhes. As mulheres ouvirão que a rainha foi
perdoada após desrespeitar o rei, e tentarão imitá-la. O status dos homens no reino será rebaixado, e ficarão furiosos. Se o rei não punir Vashti por
desrespeito, o que poderão os plebeus fazer com suas próprias esposas?"

Memuchan fez uma pausa e olhou à sua volta. Os ministros pareciam aliviados, gratos a ele por haver falado. Até mesmo o rei estava escutando. Na verdade,
não parecia estar gostando, mas estava atento. Memuchan continuou cautelosamente.

"Pode ser possível justificar as ações de Vashti" – disse ele – "mas deve ser condenada à morte devido à maneira pela qual humilhou o rei. Se for poupada, o
mundo não saberá de suas desculpas e justificativas. O povo saberá apenas que Vashti mostrou extremo desrespeito pelo rei e foi perdoada."

Em seguida, Memuchan apelou para a vaidade do rei. "Vashti é uma mulher teimosa, cheia de orgulho, e jamais reconhecerá que Sua Majestade é seu amo.
Se não foi capaz de mudá-la após todo esse tempo, nunca o fará, não importa quanto possa puni-la.

"Se deixá-la viver, Majestade, nunca será respeitado no reino. Acabou de dispender todo este dinheiro num banquete para ganhar o respeito universal; um ato
de Vashti poderá desfazer isso tudo."

O humor do rei havia claramente mudado. Memuchan tivera sucesso em reacender sua fúria.

Memuchan notou com grande prazer que o rei inclinava a cabeça em concordância. Percebeu, porém, que deveria agir rápido no caso do instável rei
Achashverosh mudar de idéia novamente. "Majestade" – continuou – "como Vashti cometeu tamanha ofensa ao rei e ao império, deve agir antes que a notícia
se espalhe. Deve assinar imediatamente uma ordem sentenciando Vashti à morte.

"Deve também proclamar que uma esposa precisa obedecer o marido, não importa o que lhe ordene. Esta proclamação deve ser inscrita nas leis da Pérsia e
da Medéa. Se marido e mulher são de nacionalidades diferentes, todos da casa devem falar o idioma do marido. Uma esposa não deveria de forma alguma
contrariar os desejos do marido.

"Tudo isso deve ser expresso nos termos mais enfáticos possíveis num decreto real, e enviado a todos os cantos do reino. Porém, a lei será inútil se Vashti
não for morta. Deixe que sua punição sirva de exemplo a todas as mulheres do reino."

O rei concordou furiosamente. Todos os ministros soltaram um suspiro de alívio, e parecia que o assunto estava concluído.

Entretanto, Haman tinha ainda uma preocupação. "Suponha" – pensou medrosamente – "que Vashti vai até o rei e o convence a perdoá-la." Isso não poderia
acontecer, pois ele, Haman, teria conseguido uma inimiga poderosa para toda a vida. Vashti certamente procuraria vingança sobre ele por havê-la denunciado.

O tortuoso Haman achou uma jeito de evitar esse perigo também. "É também importante, Majestade" – disse firmemente – "decretar que ninguém possa vir à
presença do rei sem sua permissão. Caso contrário, Vashti pode aproximar-se do rei e implorar por sua vida. Se tiver clemência, Sua Majestade destruirá o
reino inteiro."

Haman persuadiu o rei a jurar pelas leis da Pérsia e Medéa que Vashti nunca mais seria admitida em sua presença. Mesmo um rei não ousaria violar tal
juramento e, dessa forma, Haman assegurou-se que a sentença de morte seria levada a termo.

"Também aconselho o rei a expedir uma explicação oficial sobre a execução de Vashti, declarando: ‘Esta mulher era uma rainha e uma filha da realeza, mas
está sendo publicamente executada por desobedecer ao rei. Que esta seja uma lição para todos.’

"Não se preocupe, Majestade, não apenas seu reino será beneficiado, mas sua pessoa também, quando se casar novamente. Se o rei mandou matar sua
primeira mulher por desobediência, a segunda esposa será muito cuidadosa para não faltar-lhe ao respeito de maneira alguma.

"Se tudo isso for feito, todas as mulheres do reino respeitarão seus maridos, tanto os poderosos como os humildes. Mesmo o homem mais simples será como
um rei em sua própria casa. E até a senhora mais poderosa dará ouvidos ao marido."

Murmúrios de concordância e aprovação encheram a sala da corte, para grande prazer de Memuchan.

"Bravo!"

"Brilhante discurso!"

"Magnificamente exposto!"

Mais que qualquer outra coisa, os ministros ficaram satisfeitos pelo fato de que Memuchan tomaria a culpa se mais tarde a condenação da rainha provocasse a
ira do rei.

Logo em seguida, Vashti foi executada. Pergaminhos foram enviados a todos os países do reino, selados com o anel de sinete do rei. Cada pergaminho fora
escrito no idioma e alfabeto do país ao qual se destinava. Cada qual continha uma proclamação real de que todo homem deveria ser senhor de sua casa, e
que a esposa deveria falar o idioma do marido, em sinal de respeito a ele.

De acordo com a lei ora expedida, se uma mulher não se comportasse respeitosamente para com o marido, este seria forçado a denunciá-la, e a sentença
seria a morte. "Que decreto ridículo" – zombou o povo quando soube. "Mesmo que minha mulher me desobedeça, jamais a denunciaria" – protestou alguém na
multidão.

"O rei está contratando detetives particulares?" – alguém mais escarneceu.

As pessoas deram de ombros e foram cuidar de suas vidas. Ao contrário do plano de Haman, o decreto não foi obedecido, e isso diminuiu a importância de
uma proclamação real aos olhos do povo. Isso provou ser muito benéfico para os judeus.  

Capítulo III

Pouco tempo depois, a ira do rei esfriou. Contemplando o retrato de Vashti nos aposentos reais, começou a se perguntar o que teria acontecido a ela. Estava
tão bêbado durante o banquete que nem ao menos se lembrava do que havia feito.

"Tragam-me Vashti" – disse o rei.

Trêmulos, os criados pessoais gaguejaram: "Não podemos. Está morta. Sua Majestade mandou executá-la."
"Executada? Por que motivo? O que poderia ter feito que merecesse a execução?"

"Sua Majestade ordenou-lhe que viesse, e ela recusou. Foi pelo conselho de seus ministros que a condenou à morte. Foi sua própria ordem."

O rei estava muito confuso. "Lembro-me disso vagamente. Mas apenas disse que não deveria mais apresentar-se na minha frente. Não poderia ter ordenado
que fosse morta."

"Perdoe-nos, Majestade, mas nós mesmos ouvimos isso. Sua Majestade ordenou sua morte claramente."
Devagar, os fatos do banquete voltaram à mente do rei e ele se encheu de arrependimento. Sua mulher havia se comportado com modéstia ao recusar seu
pedido irracional e pagara com a vida. Achashverosh foi assolado pelo remorso.

Convocando os sete conselheiros, disse o rei: "Não estou zangado com Vashti, mas com vocês. Se a condenei à morte enquanto estava bêbado, por que
foram tão rápidos para cumprir a sentença? Não poderiam ter esperado até que estivesse sóbrio?"

Foram expedidas ordens sumárias de que os conselheiros fossem mandados para longe do reino. O único poupado foi Memuchan, aliás Haman. Punição
imediata seria muito suave. O rei pensou sobre um plano de vingança a longo prazo. Primeiro, promovê-lo-ia ao alto comando. Então, quando se sentisse
seguro, seria forçado a encarar a força total da fúria do rei.

Livrar-se dos conselheiros mais chegados, entretanto, não trouxe consolo ao rei. Estava muito infeliz e deprimido. Com preocupação, seus servos o viam
mergulhar mais e mais na tristeza.

"E se o rei morrer?" – pensaram. "Seu sucessor muito provavelmente nos substituirá e, então, o que faremos?" A criadagem discutiu o assunto por um tempo e
então foram ao rei com uma idéia brilhante.
"Majestade, podemos humildemente sugerir que se case novamente? Garantimos que sua futura noiva será a mais bela jovem de todo o reino!"

O rei levantou o olhar, interessado. Os servos continuaram: "Por decreto real, proclame um concurso nacional de beleza a ser promovido aqui em Shushan.
Planejamos tudo cuidadosamente. É óbvio que nem toda moça bonita do reino poderá vir até Shushan. Por isso, oficiais serão enviados a cada uma das 127
províncias para escolher a mais bela jovem de cada localidade. Serão julgadas pela aparência e personalidade. A donzela mais bonita de cada estado será
trazida a Shushan, e o rei poderá escolher a de sua preferência.

"As moças serão colocadas sob os cuidados de Hagai, o chefe do harém real, e ele se encarregará de todos os assuntos de cosméticos. A jovem que mais
agradar ao rei tornar-se-á rainha no lugar de Vashti."

O plano agradou ao rei. Sem dúvida, o conselho dos criados chegara numa hora propícia. Após o terrível parecer dado pelos conselheiros chefes,
Achashverosh se tornara completamente enojado com os anciãos do palácio. "Quanto mais envelhecem, mais debilóides se tornam. Faço melhor aceitando o
conselho destes jovens" – pensou. "São espertos e criativos e parecem dedicados aos meus interesses – não como aqueles sete velhos abutres que mal
podiam esperar para matar Vashti."

E assim, o rei colocou o plano dos criados em ação. A princípio, enviou agentes de um extremo a outro do reino, disfarçando sua verdadeira missão.
Aparentemente, estavam apenas cuidando dos negócios costumeiros do reino. O objetivo principal, entretanto, era ficar de olhos bem abertos para qualquer
jovem de excepcional beleza, registrando o nome e endereço de cada uma. Como ninguém estava informado sobre o verdadeiro objetivo da missão, nenhuma
moça escaparia à busca.
Em seguida, o rei enviou um segundo grupo de oficiais para julgar as jovens, e mandar as candidatas mais condizentes a Shushan. De posse da lista fornecida
pelos primeiros emissários, não deixariam nenhuma garota escapar da rede.

Haman, claro, sabia o que estava acontecendo, e lavrou um tento ao empurrar sua filha para a frente do oficial do rei. "É exatamente o que eu estava
esperando" – pensou, jubiloso, esfregando as mãos. "Minha adorável filha certamente tem o porte de uma rainha, e quero me assegurar que seja escolhida."
Quase podia ver a coroa real colocada sobre a cabeça da moça. Enquanto lá estava fazendo castelos no ar, mal percebeu a súbita agitação ao redor de sua
filha. Com um susto, Haman foi trazido de volta à realidade bem a tempo de presenciar, horrorizado, a filha dominada por um violento ataque de vômito.
Subitamente ficara doente e sujava-se em público.
Desnecessário dizer, o mensageiro real rejeitou-a imediatamente.  

Capítulo IV

Rumores da competição que se aproximava espalharam-se como fogo. Muitas pessoas acharam engraçado. Algumas sorriam com desdém, mas a maior parte
antecipava ansiosamente o que parecia ser diversão garantida. Apesar da jocosidade que ia pelos ares, havia pelo menos uma pessoa que estava temerosa e
preocupada pelo desenrolar dos acontecimentos. Era Mordechai, o Judeu, filho de Ya’ir, filho de Shim’i, por sua vez filho de Kish, da tribo de Binyamin. Ele
estivera entre os judeus cativos de Jerusalém, exilados para a Babilônia com o rei Yechonyá por Nevuchadnêtsar. Quando a cidade foi tomada pelos persas, o
Sinédrio (San’hedrin), que incluía Mordechai, o renomado sábio, e outros líderes da comunidade judaica, mudara-se para Shushan, a nova capital do império.

Mordechai era reconhecido como um devoto cumpridor de Torá, muito franco e sincero. Havia sido o único a santificar publicamente o nome de D’us quando o
rei Achashverosh convidara os judeus para a festa. Os outros sábios recusaram-se a participar e se esconderam, mas Mordechai desobedeceu abertamente a
ordem do rei, recusando-se a comer ou beber no banquete real. Demonstrara ter orgulho de seu judaísmo e deu um exemplo para seu povo.

Agora, estava inquieto pelos boatos na cidade, e com razão. Tinha uma prima jovem e bonita, a quem havia criado desde tenra infância, após a morte dos
pais. Era Hadassa, uma jovem delicada e adorável, conhecida pelo recato e caráter excepcional.

Quando nasceu, todos comentaram: "Que lindo bebê! Sua pele de um oliva profundo é como a cor da murta, de tão fina e delicada." Sua mãe entreouvira os
elogios e decidira. "Então, este será seu nome, Hadassa, a palavra hebraica para murta." Orou para que a filha tivesse uma personalidade tão agradável como
a suave fragrância da murta.

Hadassa fez realmente jus a seu nome. Muitas árvores perdem as folhas durante o inverno. A murta, entretanto, é sempre verde, mantendo as folhas durante o
ano todo. Como a murta, Hadassa era o tipo de menina que permaneceria virtuosa e merecedora de louvor onde quer que se encontrasse.

Por isso, Mordechai estava inquieto com os rumores vindos do palácio. Conhecedor da beleza ímpar e caráter excepcional de Hadassa, temia que fosse uma
candidata perfeita à coroa real. Porém, se fosse desígnio de D’us, como ousaria interferir?

Mesmo assim, Mordechai decidiu que seria de bom alvitre esconder temporariamente a identidade judaica de sua prima. Hadassa é obviamente um nome
judeu, por isso Mordechai decidiu mudá-lo.

"Precisamos esconder seu verdadeiro nome" – disse gentilmente à jovem prima. "De agora em diante será chamada de Ester, que significa ‘oculta’." Hadassa,
agora Ester, assentiu com a cabeça. Confiava sem restrições em seu santo primo e aceitou a decisão de boa vontade.

Como se provou mais tarde, os temores de Mordechai eram justificados. Quando espalhou-se a notícia que o rei estava procurando uma nova rainha, os
persas atiravam as filhas para os administradores do rei. Mordechai fez exatamente o oposto. Escondeu Ester da melhor maneira que pôde.

Ester sempre fora recatada, raramente aparecendo em público. Mesmo assim, muitas das mulheres persas haviam-na avistado, e sua beleza era famosa. Os
oficiais do rei logo ouviram que havia uma jovem de extraordinária beleza em Shushan, embora não soubessem sua nacionalidade. Procuraram em vão pela
"jovem misteriosa" entre as numerosas moças que se apresentaram.

"Por que procurarmos através deste vasto reino?" – perguntaram-se frustrados. "Pelo que temos ouvido, há uma jovem em Shushan mais bela que qualquer
uma dessas donzelas."

Quando não puderam encontrar Ester, falaram ao rei sobre ela. Achashverosh imediatamente fez dois decretos. Qualquer moça que se escondesse dos
agentes seria condenada à morte, e qualquer jovem que agrade ao rei tornar-se-á rainha do Império Persa.

Choviam garotas em Shushan, vindas de todas as partes do reino. Ester, claro, mantinha-se escondida, esperando não ser descoberta. Se tivesse de ser
encontrada, ao menos todos saberiam que havia sido levada contra sua vontade.

Mordechai tornou-se muito ansioso por causa da lei impondo a pena de morte para quem se escondesse dos agentes do rei. Percebeu que não poderia
esconder Ester para sempre. No fundo, Mordechai tinha um pressentimento que algo de grandioso aconteceria se Ester desposasse o rei. Além disso, se D’us
assim o havia decretado, nada podia ser feito para evitá-lo. Por isso, Mordechai instruiu Ester a deixar seu esconderijo. Deveria misturar-se com as outras
jovens e, assim, ninguém saberia sua nacionalidade. Com uma prece no coração, Mordechai mandou-a sair, decidindo deixar tudo nas mãos de D’us.

Assim que os agentes avistaram Ester, perceberam que era a jovem pela qual haviam procurado. Imediatamente, foi trazida ao palácio. Os emissários estavam
tão confiantes que Ester seria a escolhida, que não planejaram separá-la como estavam fazendo com as outras garotas.

Quando foi apresentada a Hagai, encarregado do harém, ele gostou muito. Enquanto todas as outras jovens pareciam-se entre si, a beleza e personalidade de
Ester destacavam-se de longe.

"Parece uma candidata promissora" – devaneou Hagai. "Embora seja uma grande honra ser alojada em qualquer parte do palácio, pretendo acomodá-la no
próprio harém. Lá, o contraste entre sua beleza e a das outras moças saltará aos olhos, e o rei certamente será informado a respeito."

Ester foi levada ao harém e muito bem tratada. Hagai mimou-a com cosméticos e presentes, favorecendo-a acima de todas. Ao contrário das outras jovens que
estavam sempre pedindo produtos de beleza e quinquilharias, Ester estava muito mais preocupada com seu judaísmo que com sua beleza.

"Como conseguirei manter-me casher aqui?" – pensou ansiosamente.

Percebendo a atenção especial que recebia de Hagai, decidiu aproveitá-la. "Não parece ser um mau sujeito. Vou dizer-lhe que sou vegetariana e que como
somente comida natural, crua. Espero que não crie caso por isso."

Felizmente para Ester, Hagai concordou em aceder a cada desejo seu sem muitas perguntas. Outro favor que Hagai concedeu a Ester foi que ela escolhesse
pessoalmente sete garotas do palácio real, que fossem convenientes para servi-la. Ela selecionou moças virtuosas e de bom caráter.

Secretamente, Ester ficou muito agradecida por sua boa sorte. "Que maneira perfeita de manter o Shabat despercebido. Farei com que cada moça me sirva
apenas um dia por semana. Não me verão nos outros dias, e ninguém saberá que não trabalho no Shabat."

Com efeito, a "criada do Shabat" nunca se deu conta que suas obrigações eram diferentes do resto das moças. Presumiu que sua ama evitava trabalhar
durante toda a semana. "Como é mimada esta senhora!" – pensou a serva. "Age como se já fosse rainha, jamais fazendo qualquer tipo de trabalho."

Embora Ester estivesse com outras jovens que percebiam seus modos diferentes e que ela não se alimentava das mesmas comidas, não sabiam o suficiente
sobre judaísmo para entender as razões de seus atos.
Cochichavam entre si invejosamente: "Age como se fosse nobre. Seus modos e comportamento são provavelmente parte de seu jogo, tentando de toda forma
parecer especial e superior, esperando ser escolhida como rainha."
Começaram a se perguntar. "De onde veio ela? Não contou a ninguém sobre seus pais ou em que país nasceu."
O que aquelas garotas infantis e atarantadas não sabiam era que Mordechai havia instruído Ester para esconder o fato de que era judia. Sentindo que havia
uma razão importante para que Ester fosse trazida ao palácio de Achashverosh, percebeu que, se o rei viesse a saber que Ester era judia, jamais a faria sua
rainha.

Mordechai também não queria que ninguém soubesse que Ester era aparentada com ele. "Se as pessoas descobrirem que somos primos" – disse a Ester –
"serão cautelosos com o que dizem em sua presença. Talvez sua posição no palácio seja útil a nosso povo, permitindo que obtenhamos informação internas
de forma relativamente fácil; assim saberemos o que nossos inimigos tramam contra nós."

Mordechai sabia que havia sobrecarregado Ester com uma tarefa muito difícil. Por isso, mantinha vigilância cerrada sobre o que estava acontecendo no
palácio. É claro que não fazia perguntas sobre Ester abertamente. Apenas passeava todos os dias perto do pátio do harém, mantendo olhos e ouvidos bem
abertos.

O harém real era uma colméia em atividade. As jovens recebiam um tratamento de beleza que durava um ano, com óleos delicados, perfumes raros e os mais
finos cosméticos. Cada garota exigia atenção constante das atendentes, solicitando uma lista infindável de produtos de beleza para melhorar a aparência,
esperando ser escolhida como rainha.

Após muitos meses no harém, as moças finalmente foram escaladas para serem apresentadas ao rei. Cada uma seria oficialmente requisitada a passar uma
noite nos aposentos do rei. Qualquer coisa que desejasse do harém lhe seria concedida.

Pela manhã, retornaria a um segundo harém, ficando aos cuidados de Shaashgaz, um ministro real.

"Registre o nome da moça no caderno" – Shaashgaz ordenava a seus assistentes.

A primeira garota a ser levada de volta ao segundo harém olhou sobre os ombros do atendente que anotava seu nome. Foi tomada de surpresa.

"Mas este não é meu nome!" – protestou furiosamente.

Shaashgaz explicou: "Muitas jovens vêm de outros países, e nomes estrangeiros não podem ser usados no palácio. Então cada uma recebe um nome especial
para o palácio, pelo qual possa ser chamada, se o rei resolver vê-la novamente."

Não revelou, porém, a verdadeira razão para dotar as moças de nomes diferentes neste harém. Isso impediria que a jovem oferecesse suborno para conseguir
voltar ao rei uma segunda vez, na esperança de passar por alguém que ainda não houvesse sido chamada. Esses cuidadosos arranjos tinham de ser feitos,
pois as candidatas dispunham-se a qualquer estratagema para conseguir o trono de Vashti.

Todas, exceto Ester. Ela estava tudo menos ansiosa para tornar-se rainha. Quando chegou sua vez, recusou os lindos vestidos de festa que lhe ofereceram,
bem como os cosméticos e perfumes caros que recebeu.
Hagai ficou horrorizado ao ver sua atitude. "Se Ester apresentar-se ao rei sem jóias, ficará furioso e eu serei responsabilizado" – pensou.

Implorou a Ester para usar qualquer coisa que desejasse, assim Achashverosh não ficaria furioso. Mesmo assim, nada solicitou, pegando apenas o que Hagai
insistiu para que aceitasse.

Apesar disso, Ester era atraente para quem quer que a visse. Sua personalidade excepcional se destacava, não importando o que vestisse. Como ninguém
conhecia sua nacionalidade, as pessoas sentiam-se orgulhosas em reivindicá-la como sendo sua compatriota. Todos a elogiavam e admiravam.

O próprio rei sentiu-se atraído por Ester assim que foi trazida ao palácio, mas não se apressou. Muito tempo passaria antes que esquecesse a lição de Vashti.
Antes de tomar uma decisão a respeito de Ester, observou-a por muitos meses para ver se escondia quaisquer características indesejáveis.

Entretanto, Ester despertou a afeição e favores do rei mais que qualquer das outras jovens. Ele percebera que sua beleza era mais que aparência. Ficou
especialmente impressionado com o fato de que ela nada havia pedido para realçar sua beleza. Sentiu também que Ester era possuidora de uma
personalidade altruísta e generosa.
Finalmente, o rei colocou a coroa da rainha sobre a cabeça de Ester. Foi instalada no palácio de Vashti e assentou-se no trono real. Embora sua origem fosse
desconhecida, recebeu as mesmas honras que Vashti, filha da linhagem real da Babilônia.
O rei Achashverosh celebrou a coroação de Ester, oferecendo uma grande festa em sua honra. "Esta é a ‘Festa de Ester’ " – declarava feliz. Ele lembrou-se do
que havia acontecido durante o último banquete que havia oferecido e estava determinado a não deixar que este fosse arruinado. "Na verdade" – pensou o rei
com um meio-sorriso – "se não fosse por aquela primeira festa, jamais estaria celebrando esta."
Pensou sobre o desenrolar dos acontecimentos que haviam culminado com a coroação de Ester. "Meus súditos têm sido leais e tolerantes com minhas
despesas" – pensou. "As províncias gastaram muito para mandar as jovens para o concurso. Muitas pessoas ajudaram na minha busca por uma rainha. Devo
mostrar-lhes minha gratidão."

O rei anunciou uma isenção de impostos e distribuiu presentes de valor. Achashverosh desejava também convidar os habitantes da cidade de Shushan para
uma festa, como havia feito anteriormente. Ester aconselhou-o contra essa idéia. "Há muita gente pobre em Shushan" – disse ela. "Comparecer a um banquete
real é uma despesa enorme. Somente com roupas gastarão uma fortuna. A melhor idéia é decretar um feriado e deixar o povo comemorar em casa. Envie
presentes às pessoas, assim poderão organizar suas próprias festas."

Impressionado pela sabedoria de Ester, o rei concordou. O banquete real ficou conhecido como "A Festa de Ester", expressando seu carinho pelo povo.

O rei, entretanto, tinha outra razão para promover esta festa. Achashverosh estava ansioso para descobrir a origem de Ester. Ao proclamá-la como a "Festa de
Ester", insistiu com ela para que enviasse convites a quem quisesse.

"Certamente convidará seus parentes para que vejam sua recém-adquirida posição" – pensou o rei. "Muito provavelmente convidará seus conterrâneos e lhes
dará reconhecimento especial."

Dessa maneira, o rei esperava descobrir a origem de Ester, mas calculara mal. Ester tratou todos os convidados da mesma forma e não mostrou favoritismo a
nenhum grupo.Quando pressionada pelo rei a revelar de onde viera, declarou calmamente: "Sou órfã. Meu pai morreu antes que eu nascesse, e minha mãe
faleceu quando eu era bebê." Mas Achashverosh não ficou satisfeito com essa resposta. Incapaz de descobrir a identidade de Ester por meios escusos, tentou
uma abordagem direta. "Quero que você me diga sua nacionalidade" – disse ele.

Ester solicitou ao rei permissão para falar francamente e respondeu. "Por favor, não se zangue pelas minhas palavras, mas Sua Majestade me surpreende.
Está sendo teimoso, da mesma forma que fez quando matou Vashti. Agora está me pressionando. E se por acaso digo a coisa errada? Irá matar-me, também?
A primeira vez que perguntou sobre meus pais, eu disse a verdade. Sou órfã e nunca os conheci. Tenho boas razões para não lhe dizer o pouco que sei sobre
meu nascimento. Quando chegar a hora, saberá. Por enquanto, saiba que sou de sangue real. Escolheu-me como sua mulher e rainha sem conhecer minhas
origens. Se está satisfeito comigo, porque desperdiçar o tempo com curiosidade vã? Se quiser matar-me, nada há que possa fazer. Mas um verdadeiro rei
governa com paciência e sabedoria, percebendo que toda a verdade será revelada a seu tempo.

"Sei que seus conselheiros estão muito curiosos a meu respeito e o estão pressionando para esmiuçar meu passado. Lembre-se quanto sofrimento lhe
causaram ao sugerir que mandasse executar Vashti. Se der ouvidos a eles agora, arrepender-se-á, como já o fez antes."

Suas palavras causaram uma profunda impressão no rei, que disse: "Compreendo o que disse sobre meus assessores. Mas um rei não pode governar
sozinho. Se despedir os conselheiros, a quem deverei admitir?"
Ester sabia que estava correndo um risco, e agiu cuidadosamente. "Ouvi falar de alguns homens sábios" – replicou – "de uma nação conhecida como Israel.
São considerados instruídos e confiáveis. Como é de seu conhecimento, tanto Nevuchadnêtsar como Belshatsar, os grandes monarcas da Babilônia, tinham
um conselheiro judeu cujo nome era Daniel. Seu próprio predecessor, Ciro, empregava um judeu, Zerubavel, como conselheiro mor. Talvez, se tivesse
pessoas assim, o governo funcionasse melhor."

O rei contemplou esta nova rainha pensativamente. Sempre havia tentado ser como os outros reis famosos e governantes poderosos "Se aqueles grandes reis
tiveram conselheiros judeus, devo imitá-los. Acha que ainda existem sábios judeus por aí?"

Ester tentou falar tão casualmente quanto possível. "Na verdade" – respondeu – "ouvi falar de um descendente de Shaul, o rei judeu, que vive aqui em
Shushan. Chama-se Mordechai, e sua mente é considerada das mais brilhantes do reino."

Achashverosh sabia sobre Mordechai, e decidiu agir conforme a recomendação da rainha. Chamando Mordechai, nomeou-o conselheiro real e juiz no Portão
do Rei. Foi designado para o Portão, de forma a ficar disponível para aconselhar o público.

O rei, entretanto, queria se beneficiar da sabedoria desse homem famoso para seus próprios assuntos também. Certo dia, chamou Mordechai e lhe disse:
"Vejo como é respeitado por sua inteligência e judicio-sos conselhos. Talvez possa ajudar-me num assunto pessoal. Escolhi recentemente uma donzela
excepcio-nal para ser minha rainha, e cheguei a conhecê-la como uma pessoa ímpar. Porém, não tenho informação nenhuma a respeito de suas origens. Eu
simplesmente preciso saber sua nacionalidade."

Mordechai sabia que sua posição era delicada. Precisava fingir que não tinha nenhum interesse espe-cial no assunto. Queria também provar seu
pressentimento de que a presença de Ester no palácio era parte de uma importante missão recebida de D’us. Talvez o desprazer do rei fosse um sinal de que
a estada de Ester no palácio não tivesse que acontecer. Sua própria nomeação levantava suspeitas que ele queria apagar. Então pensou num plano simples
mas engenhoso.

"Majestade," – disse – "convoque um novo grupo de jovens a Shushan, como se quisesse escolher outra esposa. Deixe a rainha pensar que está infeliz com
ela, por causa dos segredos que esconde. Ficará nervosa e logo desatará a língua."

Este conselho agradou muito ao rei, sendo também aplaudido pelos príncipes e nobres. Estavam invejosos de Ester por causa de sua proximidade com o rei.
Por que havia sido escolhida, e não uma de suas filhas? Haman estava particularmente aborrecido. Havia planejado tão cuidadosamente livrar-se de Vashti e
substituí-la por sua própria filha, mas Ester havia interferido.

As palavras de Mordechai também dissiparam as suspeitas sobre seu possível relacionamento com Ester. Se Ester fosse judia, concluíram, Mordechai jamais
teria aconselhado o rei a trazer possíveis rivais ao palácio. Uma boa garota persa poderia facilmente tomar o lugar de Ester, e Mordechai seria também
prontamente substituído.

No desenrolar dos acontecimentos, o plano de Mordechai funcionou. Tivesse o rei escolhido outra esposa, ele e Ester teriam tido um aviso de que a posição de
Ester no palácio não era desígnio de D’us. Mas na verdade, o rei não se cansara de Ester, e não a rejeitou por recusar-se a contar seu segredo.

Era óbvio agora que Ester fora designada por D’us para desempenhar um importante papel. A curiosidade do rei aquietou-se e os nobres ficaram satisfeitos,
enquanto Ester e Mordechai secretamente anteciparam o futuro.

Capítulo V

Embora a vida no palácio parecesse agora ter voltado ao normal, sob essa calmaria problemas já fermentavam. Dois dos guardas do rei, Bigtan e Têresh,
tornaram-se hostis a Achashverosh, e planejaram assassiná-lo.

"Olhe o que o rei Achashverosh nos fez" – Bigtan sibilou ao colega. "Desde que este sujeito, Mordechai, foi indicado para conselheiro real, temos sido
rebaixados. Sabe o que este judeu Mordechai tem feito? Julga os casos de acordo com a lei judaica, sempre que é consultado por judeus. Que desgraça!
Como se nossas leis não fossem boas o suficiente."

"Pois é" – disse Têresh, rilhando os dentes – "Mordechai apoderou-se de nossos empregos e agora é o encarregado da guarda pessoal do rei. Fomos
estacionados aqui para supervisionar os aposentos do rei. Que trabalho miserável, ficar em pé o dia todo. Haman tem sido fiel a nós e tentou argumentar em
nossa defesa, mas em vão."

"Nossa má sorte é por culpa da rainha" – continuou Têresh. Foi ela quem aconselhou o rei a nomear Mordechai."

Bigtan olhou intencionalmente para o amigo.

"Sabe, esse trio petulante está me dando nos nervos. Digo a você, devemos agir rápido e dar um fim neles."
Bigtan e Têresh tinham uma queixa adicional contra o rei. Eram parentes de Vashti e haviam emigrado da Babilônia para Shushan quando fora aprisionada.

"Creio que chegou a hora de vingar a morte de Vashti" – sussurrou Têresh. Os dois traidores tinham tudo planejado. Iriam assassinar o rei, declarando que o
haviam feito por ordens de Mordechai. Como este fosse seu superior, não tiveram outra escolha a não ser obedecer. Mordechai então teria um fim bem triste.

Bigtan e Têresh tinham esperança de conseguir outra vantagem ao matar Achashverosh. Acabara de irromper uma guerra entre Pérsia e Grécia. O campo de
batalha era distante, mas Bigtan e Têresh tinham certeza de que, caso pudessem entregar a cabeça de Achashverosh aos gregos, seriam recompensados
com fama e posições de destaque.

Enquanto discutiam os detalhes de sua trama, Bigtan e Têresh mal perceberam que Mordechai estava ouvindo a conversa. Quando notaram sua presença,
Bigtan rapidamente fez sinal a Têresh para calar-se, mas este desprezou seu aviso.

"Ele não pode entender uma palavra do que falamos" – riu. "Acha mesmo que Mordechai pode falar tarso, nossa língua nativa?"

Os dois continuaram a tramar, descuidadamente supondo que Mordechai não tinha a mínima idéia do que falavam. Estavam errados. Como um dos requisitos
para servir ao San’hedrin, Mordechai precisava saber os setenta idiomas do mundo civilizado. Era tão bem versado neles que o povo o chamava de "Balshan",
i.e., o "Poliglota".

Mordechai não perdeu tempo. "A Torá nos ordena que sejamos patrióticos e que rezemos pelo bem do governo" – pensou. "Embora eu saiba que o rei não é lá
grande amigo dos judeus, é minha obrigação informá-lo desse conluio."

"Além disso" – concluiu Mordechai – "se o rei for assassinado tão pouco tempo após a coroação de Ester e de minha nomeação para o palácio, poderemos
ambos ser suspeitos de traição."

Mordechai passou a informação a Ester, querendo que ela ganhasse o crédito por salvar a vida do rei. Ester, entretanto, reportou tudo ao rei em nome de
Mordechai.

Após completa investigação, Bigtan e Têresh foram acusados de um complô para envenenar o rei. Haman, seu bom amigo, tentou em vão salvá-los. Apesar
de seus esforços, foram condenados à morte.
Ao assistir os dois pendendo no cadafalso, Haman crispou as mãos com ódio. Culpou Mordechai pela execução de seus amigos e jurou vingança.

Ester não obedecera as instruções de Mordechai para reivindicar o crédito pela descoberta da conspiração. Como não queria que ele soubesse que o tinha
desobedecido, conseguiu que o nobre ato de Mordechai não fosse recompensado de imediato.

Ester chamou os escribas reais e ordenou-lhes que registrassem o incidente nos arquivos do palácio. Deveriam anotar que Mordechai merecia uma grande
recompensa por salvar a vida do rei.

Acontece que os escribas eram ninguém menos que os filhos de Haman, e fizeram o possível para distorcer a descrição do evento. Mas a verdade pode ser
esticada apenas até um certo limite. Por fim, os arquivos do rei declaravam que Mordechai havia salvado a vida do rei e que não recebera uma recompensa.

Na verdade, os eventos todos eram dirigidos por D’us. O rei não daria a recompensa a Mordechai naquele dia, mas quando chegou a hora, este incidente seria
bem útil.

Capítulo VI

Após esses acontecimentos, o rei Achashverosh promoveu Haman. Para o observador, esta decisão poderia parecer estranha. Mordechai, que havia salvado a
vida do rei, não fora recompensado, e Haman, que havia defendido os conspiradores, foi elevado a uma posição mais alta. Porém, Achashverosh era muito
instável e agia por capricho. De início, havia ficado furioso com Haman por tê-lo aconselhado a matar Vashti. Entretanto, agora que desposara Ester,
Achashverosh estava contente por estar livre de Vashti, sentindo-se em débito com Haman por haver este indiretamente lhe trazido Ester. Por isso, o rei
recompensou-o generosamente, garantindo-lhe a mais alta posição do reino.

Até então, embora Haman fosse um dos sete conselheiros mor, havia sido o membro de menos prestígio no conselho. Agora era o mais importante. Como
prova de sua posição, seu assento estava acima dos outros. Mesmo quando não estava presente às reuniões, a posição de sua cadeira servia como
lembrança de seu posto elevado.
Vendo que o rei havia promovido Haman, o povo sentia-se obrigado a mostrar-lhe respeito. Muitos, entretanto, sabiam de suas origens e de sua profissão no
passado, e esse respeito não vinha de forma natural.

"Você sabia que Haman era atendente nos banhos e barbeiro antes de se tornar político?" – diziam as pessoas que o haviam conhecido. Havia mesmo
aqueles que declaravam ter tido o cabelo cortado por ele.
Para preservar a dignidade da posição de Haman, o rei ordenou que o povo se prostrasse diante dele, concedendo-lhe honras devidas a um Primeiro Ministro.
Até mesmo os homens que tinham assento no Portão do Rei, o local de assembléia de todos os mais altos oficiais do reino, foram solicitados a ajoelhar-se
perante Haman.

Haman vangloriava-se dessa nova promoção. Tirando vantagem desse poder, pendurou a figura de seu ídolo favorito ao redor do pescoço sempre que
desfilava pela cidade. Ao se inclinarem perante ele, estavam também curvando-se ao ídolo.

Haman estava agindo de forma contrária à lei. O Império Persa garantia liberdade de religião, e nenhuma pessoa podia ser forçada a prostrar-se para ídolos
contra a vontade.

Não era a lei persa, entretanto, que influenciava a forte resistência demonstrada por Mordechai no Portão do Rei. Ele se recusava a ajoelhar-se perante
Haman e a prostrar-se para seu ídolo. Nem ao menos faria uma breve inclinação formal. Como Haman deixara óbvio que qualquer sinal de respeito a ele
também incluía seu ídolo, Mordechai não tinha permissão, pela lei da Torá, para fazê-lo, mesmo que sua vida estivesse em risco.
Mordechai não fingia ignorar Haman. Olhando-o diretamente nos olhos, corajosamente recusava-se a arredar pé, criando ali um Kidush Hashem (santificação
do nome de D’us), dando um exemplo para todos os judeus.
Os outros oficiais no Portão do Rei ficaram perturbados pelas ações de Mordechai. "Por que desobedece as ordens do rei?" – perguntaram preocupados.
"Achashverosh pode pensar que o encorajamos a demonstrar nosso desprazer com suas ordens. Seremos todos acusados e punidos por esta teimosia."

"Prostro-me apenas perante o único D’us" – declarou Mordechai, explicando sua identidade judaica.

Após tentar convencer Mordechai a não brincar com fogo, os servos do rei denunciaram-no a Haman. Queriam testar Mordechai. Estaria realmente disposto a
colocar a vida em risco, somente para não inclinar-se perante Haman? Ficaria firme em suas crenças, a despeito do que pudesse acontecer?

Haman não podia acreditar nos relatos sobre Mordechai. "Que coragem!" – resmungou. "Como ousa desafiar as ordens do rei!" Deliberadamente, passou pelo
local onde Mordechai estava lotado para ver a verdade com seus próprios olhos.

"A paz esteja consigo" – falou Haman, fingindo ser educado.

"Para o perverso, não há paz" – respondeu Mordechai.

Fervendo de fúria, Haman rilhou os dentes. Contratara agentes para seguir Mordechai e reportar suas ações. Disseram-lhe: "Mordechai é uma pessoa
amigável, com um cumprimento gentil para todos que encontra. Saúda até mesmo o mais humilde plebeu." Quando Haman percebeu que Mordechai recusava-
se a prestar homenagem somente para ele, sua fúria extrapolou. Estava determinado a vingar-se.

A princípio, Haman tramou matar somente Mordechai. "A alta posição de Mordechai está engasgada na minha garganta. Enquanto estiver no palácio, os
judeus sentir-se-ão seguros e seguirão seu exemplo. Pretendo mostrar-lhe logo quem manda em Shushan."

Porém, ao passo que sua fúria se acumulava, Haman decidiu que estava abaixo de sua dignidade matar apenas Mordechai. "Esse povo respeita seus líderes.
Se não for Mordechai, será algum outro! Vou dar um fim em todos os sábios. Então, ficarão como carneiros sem pastor. Negligenciarão sua religião e tornar-
se-ão assimilados."

"Não" – pensou Haman, reconsiderando – "não é suficiente. Terão ainda sua Torá que ordena explicitamente denunciar os descendentes de Amalek e varrer
sua memória! Nós, os agaguitas, descendemos de Amalek! Por essa razão, os judeus são nossos inimigos mortais e seu interminável ódio por nós é uma
ameaça contínua. A única solução é exterminá-los todos: homens, mulheres e crianças. E isso é exatamente o que pretendo fazer!"

Tendo tomado uma decisão, Haman seguiu, formulando seu plano maléfico. Ele era mau, mas não tolo. Estava informado sobre os muitos eventos miraculosos
da História Judaica e sabia que os judeus tinham um D’us poderoso a seu lado. "Mas pretendo suplantá-lo" – declarou Haman arrogantemente.

Embora seu D’us seja poderoso, às vezes as coisas não vão tão bem para os judeus" – pensou Haman. "Determinarei o tempo astrologicamente mais propício
para levar adiante meu plano."

Haman usava um artefato mágico conhecido como "pur". Primeiro, queria estar certo de que seu plano para destruir os judeus era factível. O primeiro "pur" era
lançado, usando cubos semelhantes a dados. Mas, ao contrário de dados normais, os números eram arranjados de tal forma que os valores numéricos em
lados opostos nos cubos somavam sete. Um cubo tinha lados opostos com os números 1 e 6, o segundo com 2 e 5, e o ter-ceiro com 3 e 4.

Como o "pur" determinaria o destino do povo judeu, Haman usou letras hebraicas1 para adicionar os valores numéricos dos números. Os cubos eram agora
1=t (alef), 6=u (vav), 2=c (bet), 5=v (hê), 3=d (guímel), 4=s (dalet).

Haman usava três dados para cada lance. Na primeira jogada, os cubos mostraram 1-3-3. Haman ficou deliciado, pois percebera que os dados haviam
soletrado ddt (alef, guímel, guímel) formando a palavra Agag em hebraico – o nome de seu ancestral. Ansioso, virou o dado ao contrário para conferir que
letras estavam na base. Oposto ao t (alef), estava um u (vav), e oposto a cada d (guímel) estava um s (dalet). As três letras na base formaram a palavra sus
(David).

"Que boa sorte!" – exclamou Haman extasiado. "Estas letras soletram o nome David. É sinal certo de que meu povo, o povo de Agag, terminará no topo e os
judeus, o povo de David, ficarão por baixo."

Agora Haman estava ansioso por determinar a melhor ocasião para exterminar os judeus. "Este ano, qualquer data será ótima" – decidiu. "Na verdade, tudo
está indo perfeitamente bem. Eu não teria sonhado com um plano desses antes. O rei jamais teria concordado. Exterminar uma nação inteira enfraqueceria
seu reino, e os aliados dos judeus nas outras províncias poderiam vir em sua defesa. Mas agora, o governo do rei está firmemente estabelecido. Tem uma
nova rainha. Minha posição foi elevada e o palco está montado."

Mesmo assim, Haman queria conferir novamente para assegurar-se que sua boa sorte estava realmente lhe sorrindo. Lançando outro "pur" para determinar a
data exata de levar seu plano adiante, novamente colocou ao sabor do acaso a verificação sobre se estava no caminho certo.

Cortou vários pergaminhos nos quais escreveu os nomes dos doze meses lunares (conforme o calendário judaico). Outro jogo de pergaminhos era numerado
de 1 a 354, um para cada dia do ano lunar.

Haman planejou duas jogadas separadas, uma para determinar o mês e outra, o dia. Se coincidissem, saberia que a sorte estava a seu lado. Caso contrário,
perceberia que as coisas poderiam não dar certo. Por exemplo, se a jogada dos meses mostrasse Nissan2, e a jogada dos dias mostrasse 100, ficaria claro
que o esquema não estava predestinado pelo sobrenatural, pois o 100º dia do ano cai em Tamuz3, não em Nissan.
Haman escolheu seu filho Shimshi para fazer o sorteio. Tão ávido como seu pai, Shimshi tirou um número do primeiro conjunto. Podia-se ler: "Adar"4. Haman
fez um sinal para que o filho tirasse um da segunda pilha. Lenta e deliberadamente, pegou um pergaminho e o desdobrou com cuidado. Seus olhos brilharam
quando o número apareceu. Era 337, dezessete dias antes do fim do ano.

"Fantástico!" – gritou Haman, saltando de alegria. "É dia 13 de Adar. Funcionou! Vencemos! Os judeus já podem se considerar mortos!"

Shimshi e Haman festejaram o sucesso da loteria. Estavam certos de que Adar seria o mês perfeito. Centenas de anos antes, Moshê havia falecido no sétimo
dia de Adar. Obviamente, era uma época inoportuna para os judeus.

Haman também ficou contente que a data lhe desse tempo suficiente para realizar seus planos – quase um ano inteiro. Mensageiros seriam enviados a todas
as partes do império com tempo suficiente para todos os arranjos. "Deixe os judeus passarem um ano todo sabendo que estão condenados. Talvez, devido ao
medo ou ao desespero, abandonem a religião. Se eu puder forçar os judeus a se assimilarem, será quase tão bom quanto matá-los" – pensou Haman.

Capítulo VII
Agora a parte mais difícil" – disse Haman. "Tenho que persuadir o rei a concordar com meu plano. Certamente, ele odeia os judeus tanto quanto eu, mas
provavelmente recusará por causa do possível dano que o extermínio possa causar ao reino."

Haman sabia que tinha que agir cautelosamente. O rei poderia ter muitas razões para recusar-se a eliminar os judeus. Desempenhavam papel importante na
economia do império. Poderiam ter muitos aliados. Também havia a possibilidade de que reagissem, causando tremenda consternação e danos ao reino.

"Além disso" – pensou Haman – "o rei talvez concorde com o plano, mas e a rainha? Ela parece aprovar os judeus. Foi ela que convenceu o rei a nomear
Mordechai. Talvez ela se coloque em meu caminho."

"Já sei" – decidiu finalmente. "Não me aproximarei do rei como inimigo declarado dos judeus. Nem ao menos mencionarei o nome "judeu". Apenas descreverei
um povo rebelde que está contra o bem do reino e precisa ser exterminado. O rei certamente concordará que tal grupo deve ser destruído.

"Quando os escribas compuserem o decreto de extermínio, posso facilmente adicionar que os judeus são o grupo visado. Uma vez que o decreto seja selado
pelo rei, não pode ser alterado. Ninguém poderá salvá-los."
Antes de se aproximar do rei, Haman ensaiou seu discurso com cuidado. Queria desesperadamente o consentimento do rei; por isso, escolheu bem as
palavras, tentando não deixar passar nada que pudesse fazer o soberano discordar.

Armado com argumentos e acusações, apresentou seu caso ao rei. "Majestade," – começou – "há um povo que está disperso e espalhado por todas as
nações do seu império. Eles se consideram um povo distinto, e acham que somos impuros. Não comem nossa comida e não bebem nosso vinho. Na verdade,
se cair uma mosca num copo de vinho, eles a removem e bebem o resto. Mas se Sua Majestade tocar nesse vinho, o derramarão e teimosamente recusar-se-
ão a tomá-lo. Até mesmo esfregarão o copo antes de usá-lo novamente."

O rei Achashverosh ficou profundamente ofendido. Haman astuciosamente conseguira preparar o espírito do rei para lançar suas próximas reclamações sobre
os judeus.

"Este povo tem suas próprias festas e costumes bizarros. São preguiçosos e nunca trabalham por completo. Enquanto nosso povo trabalha duramente, estão
sempre celebrando um dia de Shabat ou algum outro tipo de dia festivo, no qual não podem fazer nenhum trabalho. Porém, quando acontece um feriado
nosso, o ignoram por completo. É óbvio que não querem nada conosco."

O rei inclinou-se para a frente. "Onde Haman está tentando chegar?" – pensou. "Tal povo definitivamente não parece ser de grande vantagem para meu reino;
porém, meu império é feito de muitos povos e nações."

Como se lendo os pensamentos do rei, Haman continuou: "Não há nenhum outro grupo como esse. Existem muitas outras nacionalidades no reino, mas todos
confraternizam uns com os outros e até mesmo casam-se entre si. Este grupo em particular continuamente se recusa a se assimilar. Até mesmo mutilam os
filhos, marcando os corpos com a circuncisão para ter certeza de que não farão casamentos mistos. Normalmente, os refugiados tentam se encaixar em seu
novo país e ser amigáveis para com os outros. Não esse povo. Faz tudo ao seu alcance para permanecer diferente. Tentam persuadir as pessoas de que
nossos deuses não são bons e que apenas seu D’us deve ser venerado. Estão minando a religião nacional."

O desprazer de Achashverosh com o povo descrito por Haman estava aumentando. Como podia manter um grupo tão perigoso em seu império?

Haman continuou: "Não têm respeito nenhum pelas leis do rei. Todas as outras nações no império incorporaram estas leis em suas constituições. Este grupo
não adicionou sequer um decreto do monarca à sua lei."

Nesse ponto, a ira do rei havia sido suficientemente provocada. Assim, Haman espertamente desvelou seu plano. "De nada vale ao rei manter esse povo. A
menos que deseje que permaneçam um eterno espinho, Majestade, não tem outra escolha senão matá-los."

O rei assentiu, finalmente compreendendo a intenção do primeiro ministro. Embora estivesse em concordância com o plano, sabia que levá-lo a termo não
seria tarefa fácil.

"Acha realmente que esse povo horrível, embora mereça ser eliminado, simplesmente caminhará como ovelhas para o matadouro?" – perguntou o rei. "Não
quero desencadear uma revolução em meu império."

"Muito improvável, Majestade" – Haman assegurou-lhe. "Veja, estas pessoas estão espalhadas por todo o império. Existem uns poucos numa cidade, uns
poucos mais em outra. Não precisa se preocupar de que revidem: estão espalhados demais para que possam desfechar um ataque unificado. Até que
consigam se juntar para elaborar um plano de defesa, serão apenas uma triste memória.

"Além disso" – continuou Haman – "estão constantemente discutindo e brigando entre si. Nunca concordam sobre coisa alguma, e certamente não para
começar uma rebelião. Mesmo seus sábios discordam uns dos outros. Pode-se achar costumes diferentes entre eles. Tenho eu próprio observado isso.
Algumas dessas pessoas se apercebem de minha presença e prestam-me os devidos respeitos, mas uns poucos teimosamente se recusam a fazê-lo. Mesmo
em tempos de perigo, nunca se unem."

O rei ainda não estava convencido. "Com certeza os amigos, vizinhos e concidadãos virão para ajudá-los. Terei uma rebelião se espalhando como fogo
através de meu reino."

"De forma alguma" – replicou Haman com um esgar. Mantêm-se tão acima de todos que nenhuma outra nacionalidade os ajudará. Ninguém tem uma boa
palavra sobre eles. Ninguém pode tolerá-los. Se Sua Majestade eliminar este grupo, nenhuma nação se levantará para defendê-los. Pelo contrário, todos
tecerão elogios e proclamarão um feriado."

"Não vejo como o extermínio de grande porcentagem de cidadãos possa ser útil ao império" – protestou o rei, fracamente.

Haman estava ficando impaciente com a resistência do rei. "Majestade, se está verdadeiramente interessado no bem-estar do reino, deve fazer com que este
povo indigno seja destruído imediatamente. Não são essenciais ao império. São totalmente improdutivos. São tão estranhos à nossa cultura, que em nada
contribuem. Além disso, estão escassamente distribuídos pelo reino; assim, se forem eliminados, dificilmente alguém sentirá falta" – disse.

O rei ainda não estava bem convicto. O lado moral de sua natureza pedia uma consideração mais humana.
"Os adultos parecem maus, mas talvez as crianças devessem ser salvas?" – sugeriu, hesitantemente.
Está claro que Haman tinha uma resposta pronta. Não desistiria de uma chance de se vingar do povo que recebera ordem de destruir sua nação, os agaguitas.

"Não, não, Majestade!" – declarou. "Quando esse povo ataca seus inimigos, mata homens, mulheres e crianças da mesma forma. Dê a eles uma dose de seu
próprio remédio, exterminando-os completamente!"

O rei recostou-se no trono e deu um suspiro satisfeito. O plano de Haman o agradara. Já tinha secretamente adivinhado quem era "esse povo". Percebeu que
Haman se referia aos judeus, e sentia mais ira em relação a eles que seu próprio primeiro ministro.No entanto, o rei hesitava. Durante toda a conversa, Haman
não havia tocado no ponto que era na verdade o cerne da questão. "Os judeus podem ser uma nação inferior, mas todos sabem que têm um D’us poderoso.
Sei muito bem o que aconteceu com todos os reis que tentaram prejudicar os judeus."

Lembrou-se com um tremor da descrição dos últimos infelizes dias de Nevuchadnêtsar. Belshatsar também tivera um triste fim. "O D’us dos judeus pode ser
muito perigoso" – pensou sinistramente.

Achashverosh meditou: "Sei como defender-me e isentar-me de qualquer responsabilidade por este plano. Haman nunca mencionou a palavra ‘judeu’. Vou
levar este plano adiante, alegando que nunca soube quem eram os rebeldes. Estava apenas cumprindo meu dever, protegendo o império de elementos
perigosos."

Haman permitiu que o rei pensasse sem interrompê-lo. "Afinal, o rei precisa de tempo para amadurecer a idéia" – pensou. Quando percebeu a mudança no
humor do rei, agiu rápido e apresentou o argumento final.
"Majestade, não pense que esta será uma tarefa difícil e que terá de enfrentar grandes batalhas contra esse povo. Uma assinatura sua e serão eliminados.
Têm suficientes inimigos que estarão dispostos a fazer o trabalho.

"Contribuirei pessoalmente com 10.000 lingotes de prata a serem depositados no tesouro real. Os fundos cobrirão quaisquer despesas necessárias para
eliminar esse povo. Sobrará dinheiro suficiente, também, Majestade, que pode ser usado para repor os impostos que seriam coletados desses cidadãos
indignos. Pense a respeito – todo aquele dinheiro dos impostos sem que tenha o trabalho de coletá-lo."
O rei estava convencido. "Nada tenho a perder e tudo a ganhar" – disse de si para si. "Na verdade, não me envolverei diretamente na matança. Deixe que
Haman faça o trabalho sujo. Sempre poderei alegar ignorância. Dar-lhe-ei carta branca, e a responsabilidade será toda sua."

O rei Achashverosh deu a Haman seu anel de sinete, garantindo-lhe completa autoridade para fazer o que desejasse, sem precisar de mais nenhuma
permissão do rei.

Achashverosh então reconsiderou a oferta de dinheiro. Voltou-se a Haman dizendo: "Se o que disse a respeito daquele povo for verdade, então merecem ser
mortos sem piedade. Por que, então, me oferece dinheiro? Outros poderiam dizer que está tentando me subornar para matá-los. Não aceito subornos. Fique
com o dinheiro e faça com aquele povo como bem lhe aprouver."

Na verdade, Achashverosh sentia que deveria estar pagando Haman pelo serviço que estava na iminência de fazer para o reino. Afinal, Achashverosh queria
os judeus assassinados tanto quanto Haman o desejava; talvez mais até. O rei estava satisfeito com o desenrolar dos acontecimentos. Não havia declarado
guerra aberta contra os judeus. Poderia alegar ignorância, e Haman faria o trabalho desagradável por ele.

Haman não perdeu tempo. "Com um rei como Achashverosh, nunca se sabe" – pensou. "Pode mudar de idéia amanhã." Começou imediatamente a compor os
termos do decreto a ser emitido.

"A melhor coisa será matar todos os judeus num único dia. Assim, não se prepararão para revidar nem tentarão fugir" – pensou Haman. "As pessoas terão
permissão de assumir a propriedade dos judeus após matá-los. Ninguém será tentado a salvar a vida de um judeu com essas condições. Porém, se o povo
souber disso, iniciará os assassinatos em massa antes do dia aprazado, e meu plano poderá ruir."

Concentrando-se, Haman finalmente achou a solução perfeita. A única parte do decreto a ser tornada pública seria que todos deveriam se preparar para o dia
13 de Adar. Centros seriam estabelecidos para que todos os homens fisicamente aptos se apresentassem naquele dia. Seriam informados que algo importante
estava para acontecer, porém mais não seria revelado até a data apropria-da.

Cartas mais específicas seriam mandadas para as lideranças, os oficiais do rei, os nobres e governadores. Seriam notificados do plano de ação e advertidos a
fazerem preparativos secretos. Haman convocou os secretários reais e ditou o conteúdo do decreto público e das cartas particulares. Foram emitidos em nome
do rei Achashverosh e selados com seu anel de sinete. Em seguida, estafetas foram enviados para entregar as cartas. Fizeram a jornada de dez dias em
apenas um.

Sendo informados da pressa dos mensageiros e vendo que seu plano começava a tomar forma, Achashverosh e Haman sentaram-se para celebrar, brindando
ao sucesso da empreitada.

O povo de Shushan, entretanto, estava confuso. O rei despachara seus mensageiros por todo o reino, embora houvesse tempo suficiente. Era um sinal certo
de que o rei estava ansioso sobre alguma coisa. Caso contrário, por que a pressa? Ainda faltavam onze meses até o dia 13 de Adar. A confusão aumentou ao
se espalharem os rumores, e as pessoas sentiam-se inseguras sobre o futuro.

Capítulo VIII

No entanto, uma pessoa ficou conhecendo os fatos. Logo após o decreto ter sido emitido, Mordechai descobriu os detalhes da trama. Percebeu que o rei havia
ordenado a destruição dos judeus sem, ao menos, investigar as acusações. Os fatos haviam acontecido tão depressa, que parecia não haver tempo para
desfazê-los.

Angustiado, Mordechai rasgou suas roupas, como os enlutados fazem pelos mortos. "Se nada for feito" – lamentou – "logo muitos judeus perecerão." Vestiu-se
de aniagem, sinal de tristeza e arrependimento, e colocou cinzas sobre a cabeça. "Não removerei este saco de aniagem até que meu povo esteja seguro" –
prometeu.

Mordechai caminhou pelas ruas da cidade, chorando alto e amargamente. "Tudo aconteceu porque me recusei a inclinar-me perante Haman" – pensou
consigo. "Na verdade, fiz a coisa certa, mas sou responsável pelo terrível decreto."

Mordechai sabia que a situação era séria, mas também sabia o que deveria ser feito. Erguendo a voz, proclamou: "A tragédia se abateu sobre nós! Haman e o
rei decidiram nos matar a todos!"

Alguns passantes judeus ouviram seus brados e olharam para Mordechai com horror. A notícia correu célere, e logo uma enorme multidão se juntou.
Mordechai levantou-se e dirigiu-se à turba: "Queridos irmãos judeus, sabem o que está acontecendo? Fomos proclamados um povo condenado. Nossos dias
estão contados. Fomos sentenciados à morte."

Pessoas entreolhavam-se em choque. A ameaça de morte descera subitamente, sem nenhum aviso.
Mordechai continuou a bradar: "Devemos nos arrepender! Fomos advertidos. Bem sabíamos que participar do banquete real era um pecado. Agora, devemos
pedir perdão a D’us."

Como era costume em tempos difíceis naqueles dias, uma arca contendo um Rolo da Torá era trazida à praça principal. Mordechai tirou o Rolo e leu alguns
trechos, conclamando o povo a pedir o perdão de D’us, e implorar a Ele que os salvasse.

Dirigiu-se novamente ao povo: "Meus irmãos! Todos os portões dos Céus estão fechados aos malfeitores, exceto o portão das lágrimas. Peguem o exemplo de
Ninvê (Nínive). D’us decretou que a cidade fosse destruída. Quando o profeta Yoná (Jonas) disso informou o rei, esse desceu do trono, removeu a coroa,
cobrindo-se de estopa e cinzas. Percorreu pessoalmente a cidade, ordenando um período de jejum e penitência. D’us teve misericórdia e anulou o decreto.
Devemos fazer o mesmo, jejuar e nos arrepender. D’us verá nossa sinceridade e aceitará nossas preces."

Ao ouvir estas palavras, as pessoas começaram a chorar amargamente. Agora que os judeus de Shushan sabiam do terrível fado que se abateria sobre eles e,
tendo sido instruídos a se arrepender, Mordechai decidiu que deveria tentar a apresentação de um pedido oficial para cancelar o decreto. Esperava conseguir
uma audiência com Achashverosh e persuadi-lo a reverter as ordens.

Abrindo caminho até o palácio, Mordechai encontrou um grupo de meninos voltando da escola. Parou uma das crianças: "Que versículo você aprendeu hoje?"
– perguntou.

O menino ergueu os olhos para o sábio com respeito e admiração. Respondeu corajosamente: "Estudamos o versículo que diz: ‘Não temas o terror súbito, nem
a destruição dos perversos se vier.’ "

A face atormentada de Mordechai iluminou-se. Abordou uma segunda criança e fez a mesma pergunta. O menino respondeu: " ‘Façais um plano – mas será
malogrado. Digai tudo que quiserdes – não se materializará, pois D’us está conosco!’ "

Encorajado pela fé sincera da criança, pediu a uma terceira para repetir o versículo que acabara de estudar. O menino citou as palavras reconfortantes do
profeta Yesha’yáhu (Isaías). " ‘Até tua velhice, Eu estou contigo; até tua senilidade, Eu te sustentarei; Eu te fiz, Eu te conduzirei; Eu te sustentarei e te
libertarei!’ "
Ao ouvir estas palavras de esperança, o espírito de Mordechai se elevou. "Não importa o que Haman tenha tramado, D’us ajudará Seu povo" – pensou
confiante.

Como se pela mão do destino, aconteceu que Haman estava passando. Percebeu a calma disposição de Mordechai e não pôde suprimir a curiosidade.

"Vi você falando com aqueles meninos" – disse, suspeitosamente. "O que disseram que o deixou tão feliz?"

"Nada de importante para você" – replicou Mordechai – "mas me disseram que nada temos a temer dos planos que engendrou."

Haman ficou furioso. "Cuidarei primeiro destes malandros. Depois deles, será sua vez" – resmungou com um sorriso cruel.

Mordechai chegou ao Portão do Rei. Quis entrar e aproximar-se do rei, mas não lhe foi permitida a entrada. O costume local proibia a qualquer pessoa entrar
no Portão do Rei vestindo estopa. Como aniagem era um sinal de luto, era considerado de mau agouro no palácio, como se o usuário estivesse antecipando a
morte do rei.

Mordechai não desanimou. Sentou-se perto do portão lastimando-se, de aniagem e tudo, na esperança de atrair atenção oficial. Alguém se encarregaria de
reportar ao rei essa cena indigna. Achashverosh certamente mandaria chamá-lo, exigindo uma explicação de seu comportamento.
Nesse meio tempo, a notícia se espalhou como fogo. Apesar do plano de Haman de manter tudo em segredo, o decreto foi amplamente divulgado em todo o
império. Os judeus entraram em pânico; o anti-semitismo estava se intensificando.

"Esperem só" – seus vizinhos não-judeus ameaçavam. "Logo mataremos vocês e tomaremos posse de todo seu dinheiro."

Nas províncias mais distantes, os judeus estavam desesperados. Temiam que seus cobiçosos vizinhos não esperassem até 13 de Adar. Parecia haver pouca
chance de preparar algum tipo de defesa. Levantavam os olhos aos Céus, decretando dias de jejum e luto, vestindo aniagem e cinzas.

Lá na capital, em Shushan, entretanto, os judeus sabiam que a ordem provavelmente seria mantida. Ao menos teriam tempo até que o decreto fosse efetivado.
Esperavam que Mordechai fosse admitido à presença do rei. Talvez tivesse êxito, conseguindo a anulação da lei.

Para seu desgosto, a presença de Mordechai no Portão do Rei permanecia ignorada pelos oficiais do palácio e pelo próprio rei. Apenas uma pessoa parecia
transtornada pelo protesto de Mordechai.

Quando a Rainha Ester foi informada do comportamento de Mordechai, ficou horrorizada. A princípio, não pôde acreditar no que ouvia; porém, quando suas
criadas pessoais contaram-lhe a mesma história, percebeu que deveria ser verdade.

Ester recompôs-se rapidamente e mandou roupas para Mordechai. Queria que viesse ao palácio e discutisse o assunto com ela. "Diga-lhe que não é
apropriado para uma rainha ir até a rua" – disse à criada.

Na verdade, Ester teria ficado feliz em sair e encontrar Mordechai, seu santo primo a quem tanto respeitava. Entretanto, pensou que pudesse ser perigoso ser
vista com ele nessa ocasião.

Mordechai não quis aceitar as vestimentas. Não tiraria sua roupa de aniagem até que seu povo estivesse a salvo. Ester logo entendeu que Mordechai estava
extremamente perturbado. Pensou num plano que lhe permitisse comunicar-se com Mordechai sem levantar suspeitas. Escolheu Hatach como mensageiro.
Era um velho cortesão judeu. Havia servido como conselheiro para Belshatsar, Dario e Ciro. O rei Achashverosh o havia rebaixado e colocado à disposição de
Ester.

Se os cortesãos do rei vissem as criadas de Ester indo e vindo entre ela e Mordechai, poderiam suspeitar de um complô contra o rei. Entretanto, como Hatach
ainda servia oficialmente como um dos conselheiros do rei, sua presença não levantaria tantas suspeitas.

"Descubra qual é o problema" – ela instruiu Hatach. "Por que Mordechai está de luto em público?"

Hatach não foi diretamente a Mordechai. Passeou pela rua principal como se tivesse algo a fazer, para dar a impressão que encontrara Mordechai ao acaso.
Embora muitos judeus caminhassem por ali em estado de choque, Hatach não os questionou. Queria dar a Ester informação precisa, vinda diretamente de
Mordechai. Este notou Hatach e contou-lhe tudo. Também revelou seu plano para tentar o cancelamento do decreto.

"Como é possível?" – exclamou Hatach. "Um decreto emitido pelo rei não pode ser revogado."

"Este é um caso excepcional" – disse Mordechai. Fomos falsamente acusados, e o rei selou o decreto sem saber de todas as conseqüências."

Hatach assentiu lentamente. "Se ao menos alguém pudesse ir ao rei e explicar o caso. Mas quem ousaria?"
Mordechai tinha a resposta. "Chegou a hora de Ester revelar sua identidade. Vá e explique a situa-ção para ela. Diga-lhe que dou permissão para contar seu
segredo. Ela deve entender que também está incluída no decreto, já que é judia. Dê-lhe instruções para abordar o rei e implorar misericórdia, suplicando-lhe
por nosso povo. Ela deve fazê-lo em segredo, pois Haman tem agentes em todo o palácio."

Hatach correu de volta e relatou a Ester as palavras de Mordechai. Ela podia sentir a urgência na mensagem. Teria gostado de seguir as instruções
imediatamente, mas fazê-lo não seria assim tão simples. Pediu a Hatach que explicasse sua delicada posição a Mordechai. "Não posso tentar uma reunião
com o rei por causa da lei que Haman fez incluir na constituição persa: ninguém pode convocar uma audiência com o rei. Qualquer um que entre nos
aposentos reais sem um chamado será sentenciado à morte imediatamente."

"Não podia fingir desconhecer esta lei?" – sugeriu Hatach.

"Não" – respondeu Ester. "Todos os servos do rei conhecem esta regra, que tem sido largamente divulgada no império.

"Além disso" – continuou" – mesmo se eu tivesse de arriscar minha vida e, por milagre, o rei me recebesse estendendo seu cetro real, não há garantia de que
serei capaz de anular o decreto. Se eu falhar, é mais provável que seja destituída ou mesmo morta, perdendo qualquer chance de falar em nome de nosso
povo quando uma ocasião mais favorável se apresentar.

"Embora nosso povo esteja ameaçado" – ela continuou – "ainda há muito tempo. Eu não hesitaria em enfrentar o perigo se a ameaça fosse imediata. Estou
certa de que o rei logo me chamará. Já faz trinta dias que não me chama, e deverá fazê-lo a qualquer hora. Então, poderei falar com ele."

Embora falasse esperançosamente sobre uma possível audiência com o rei, Ester estava realmente preocupada. "Talvez o rei esteja entediado comigo, e seja
esse o motivo pelo qual não tenho sido chamada por um mês."

A mensagem de Ester a Mordechai não parecia muito encorajadora. Para aumentar a dificuldade da situação, Haman infelizmente percebera as frequentes
idas e vindas de Hatach a Mordechai, ficando desconfiado.

"Aposto que estão conspirando para cancelar o decreto" – pensou. "Bem, darei um basta nisso tudo agora mesmo." Sem mais hesitação, Haman mandou
executar Hatach.

Apesar de muito abalada com a tragédia, Ester estava determinada a ajudar. Achou outras pessoas para confiar suas mensagens a Mordechai.

Embora os argumentos de Ester pudessem parecer convincentes a outras pessoas, Mordechai não fora persuadido. Sabia que qualquer demora poderia ser
prejudicial ao povo judeu, e sua resposta ao arrazoado de Ester foi bem clara.

"Não espere o rei mandar chamá-la! Muitos judeus estão caindo no desespero. Podem abandonar a religião e tentar se assimilar entre outras nações, na
esperança de escapar à morte certa. Além disso, se demorar, pode ser que o rei não tenha tempo de mandar mensagens às províncias mais longínquas a
tempo de salvar os judeus locais da destruição. Além do mais, quem sabe o que pode acontecer? Da mesma forma que se tornou rainha inesperadamente,
pode ser destituída sem aviso. Certamente sua presença no palácio foi planejada por D’us."

"D’us nunca abandonou seu povo" – continuou Mordechai. "Não nos abandonará agora e tem muitas maneiras de nos resgatar. Entretanto, pense em seu
próprio futuro. Não acredite estar segura no palácio ou que escapará ao destino de todos os outros judeus."

Ester ficou agastada pela resposta severa de Mordechai. Respondeu rapidamente: "Por favor, não pense que estou hesitante por medo de perigo pessoal. Se
houvesse uma chance de salvar meu povo, alegremente me ofereceria. Apenas planejei esperar a ocasião mais propícia para explicar ao rei como tem sido
enganado por Haman. Percebo por sua insistência que a hora chegou. Vou agora mesmo."

Como Mordechai, Ester sabia que o terrível perigo pairando sobre o povo judeu era o resultado dos pecados do povo. Se os judeus se arrependessem, D’us
certamente mostraria mercê; e ela poderia então persuadir o rei Achashverosh a anular o decreto.

Disse a Mordechai: "Vá, reuna todos os judeus. Haman mentiu sobre nós ao dizer que não somos unidos. Que os judeus se juntem e demonstrem sua união e
amor mútuo. Mostremos que os primeiros argumentos de Haman não passavam de mentiras.

"O rei então começará a duvidar do restante das palavras de Haman. Além do mais, se Haman vir que os judeus são unidos, pode ser que entre em pânico e
revogue o decreto. Perceberá a força da união e saberá que não seremos derrotados facilmente.
"Proclame três dias de jejum e rezem por mim! Orem para que Achashverosh não me mate por violar a lei, entrando em seus aposentos sem um chamado.

"Minhas criadas e eu jejuaremos também, e rezarei para que D’us perdoe meu povo por participar do banquete de Achashverosh. Se eu rezar pelos outros,
minhas preces serão ouvidas."

Mordechai ficou aliviado ao receber a corajosa mensagem de Ester, mas um tanto apreensivo por seu pedido. O decreto fora expedido no dia 13 de Nissan. Se
Mordechai agisse sem perda de tempo, os três dias de jejum coincidiriam com Pêssach. Mandou a Ester uma mensagem urgente.

"Como podemos pedir às pessoas para jejuar em Yom Tov (dia festivo)?"

A resposta de Ester não se fez esperar. "Você é o líder de Israel e está autorizado a promulgar o jejum. Se os judeus deixarem de existir, quem irá então
guardar Pêssach? Se Israel for destruído, o que será da Torá e seus mandamentos? Não hesite, por favor! Eu também agirei imediatamente de acordo com
suas instruções. Farei o que puder. Se eu morrer, morrerei tentando ajudar nosso povo."

Mordechai estava grato a Ester pela devoção a seu povo e por ter concordado em arriscar a vida. Convocou os judeus e declarou um jejum. Milhares de
cohanim (sacerdotes) se reuniram, tocando shofar e segurando Rolos de Torá. O povo juntou-se a eles em ardente prece. Seu lamento era tão intenso que
parecia atingir o mais alto dos Céus.

Capítulo IX

Como parte das preparações espirituais necessárias para a audiência de Ester com o rei, Mordechai enviou cartas, comunicando aos judeus nas províncias
mais distantes para jejuar por três dias. Por três dias repletos de preces, a Rainha Ester vestiu-se de aniagem e cinzas, no lugar de suas lindas túnicas. Então,
ao terceiro dia, vestiu seus aparatos reais. Pôs uma túnica adornada com jóias e um traje entrelaçado com a mais fina seda, enfeitada com raras pedras
africanas. Calçou seus pés em sandálias de ouro e colocou a magnífica coroa sobre a cabeça.

Chamou então três de suas criadas. "Gostaria que me acompanhassem à Sala do Trono"– disse casualmente, tentando esconder a ansiedade.

"Mas, Majestade, como podemos nos aproximar do rei sem que nos chame? Além disso, jejuamos por três dias e não estamos tão atraentes como de
costume. É assim que se ganha o favor do rei?" – a serva deixou escapar. Teria continuado, mas foi silenciada pelo olhar sério e determinado da rainha.

Confiantemente, duas criadas se postaram cada uma a seu lado, e a terceira atrás, segurando a cauda do vestido para que não arrastasse no chão.

Ester esperava que a presença das criadas a protegesse em sua ousada tentativa de entrar sem convite nos aposentos do rei. A lei mandava que os guardas
matassem qualquer um que entrasse sem permissão. Porém, se viesse com todos os aparatos de seu cargo, certamente hesitariam. Talvez considerassem a
rainha igual ao rei, e a isentassem do decreto. No mínimo, ganharia tempo.

Lentamente, as mulheres caminharam em direção à Sala do Trono. As criadas recobraram a calma ao sentir a autoconfiança da rainha. Embora estivesse
arriscando a vida, a face de Ester brilhava com uma luz interior que escondia seus temores. Parecia tranqüila e despreocupada. Precisava-se passar através
de sete portas para entrar na Sala do Trono. Ester caminhava com tal autoridade e confiança que os guardas não a pararam. Antes que alguém percebesse o
que tinha acontecido, ela estava de pé à porta da Sala do Trono. Os guardas dos aposentos íntimos rodearam-na ameaçadoramente, incertos sobre que
atitude tomar.

O rei estava sentado em seu trono, envergando as vestes reais e portando o cetro de ouro nas mãos. Levantando os olhos, viu Ester de pé à sua frente,
olhando-o.

"Como ousa entrar em meus domínios, violando a lei?" – pensou furiosamente. "Está assinando sua própria sentença de morte.

"Que perda terrível! Que ironia! Tantas vezes chamei Vashti, mas ela se recusou a apresentar-se para mim, e foi executada" – lembrou estremecendo. "Agora
Ester está violando a lei, entrando sem ser convidada; será detida e condenada à morte." Incapaz de encarar diretamente a execução da rainha, virou-se para
outro lado.

Ester havia levantado os olhos e encarado o rei. Vendo fúria em seu olhar, ficou imóvel, silenciosamente implorando pela ajuda de D’us. O cetro! Se ao menos
o rei o levantasse e apontasse para ela!

Apesar das ordens claras de dar morte imediata a qualquer um que entrasse sem permissão, ninguém ousava tocar na rainha. Ela se postava bem em frente
ao rei e Achashverosh testemunhara a violação da lei tão claramente como todos os demais presentes. Não seria apropriado executá-la sem instruções. Todos
permaneceram em silêncio, esperando pela reação do rei.

Os cortesãos assistiam ao drama que lá se desenrolava. O rei desviara o olhar e não estava estendendo o cetro para ela. Os guardas tomaram isso como um
sinal para avançar e prendê-la.

Mas D’us, o Rei dos reis, estava protegendo Ester. De repente, Achashverosh voltou-se para ela, quase como se alguém o tivesse esbofeteado na face. A
aparência calma e composta de Ester teve um efeito calmante nos nervos do rei, que começou a relaxar. Sorrindo, estendeu o cetro de ouro para Ester.

"Qual é o problema, Rainha Ester? O que deseja?" – perguntou o rei, sua curiosidade aguçada. "Obviamente, não teria arriscado a vida à toa. Deve ter um
pedido importante. Por favor, diga-me o que há. De boa vontade dar-lhe-ei o que deseja, mesmo se for a metade do reino!"

O rei escolhera as palavras cuidadosamente. Daria somente "metade do reino". Havia algo que não concederia a ninguém. Metade do reino seria até os limites
de Jerusalém. Jamais permitiria a reconstrução do Templo dos judeus.

Ouvindo estas palavras, Ester estremeceu. Ainda não havia entendido completamente que sua vida fora poupada, e agora tinha de encarar um desafio
adicional. O que se escondia atrás das palavras do rei? Suspeitaria que ela era judia? E Haman, estaria ele ciente de sua identidade? Agora é a hora de
acalmar as suspeitas que possam ter.

Ester percebeu quão perto chegara de ser morta. Apenas no último minuto, o rei estendera o cetro. Agora não era a hora certa de falar ao rei sobre seu povo.

"Convidarei o rei para uma festa e ficará de bom humor" – pensou Ester. "Amanhã, talvez poderá ter esquecido que entrei na Sala do Trono sem convite. Além
disso, se eu falar agora, Haman pode aproximar-se depois e fazê-lo mudar de idéia. Seria melhor abordar o rei durante o banquete. Talvez o ambiente o faça
lembrar da maneira que Haman o persuadiu a matar Vashti. Convidarei Haman, também, para deixá-lo desprevenido. Não quero que desconfie que tenho algo
contra ele. Pensará que sou sua aliada, e não suspeitará que tenho a intenção de estragar-lhe os planos. Se eu lhe der atenção especial, talvez consiga
despertar suspeitas no rei sobre ele."

Ester sabia o quanto Haman a odiava. Fizera com que Vashti fosse executada para que sua própria filha se tornasse rainha, mas ficara extremamente
frustrado desde que Ester fora a escolhida. Agora havia publicamente ignorado sua autoridade, violando a lei por ele instituída, e, o que era pior, saindo
impune disso tudo. Obviamente, estaria furioso e ofendido. "Devo fazer todo o possível para agradá-lo" – decidiu Ester.

Todos os presentes na Sala do Trono fitavam a rainha perdoada, esperando que manifestasse seu desejo.

"Posso esperar que o rei compareça ao banquete que preparei para ele? – disse finalmente. "Como tenho sido ingrata com Haman, sem cujos conselhos sobre
Vashti eu jamais teria me tornado rainha, poderá ele vir também?"

O rei Achashverosh foi rápido na aceitação do convite. Uma festa? A qualquer hora! "Façam com que Haman se apresse e venha conforme Ester deseja" –
ordenou. Secretamente, o rei não gostara nada que Ester convidasse Haman para jantar com eles. Ordenou que Haman se apressasse para mostrar que era
subordinado à rainha.

Haman prontamente aceitou o convite. Não o fez porque queria obedecer Ester, mas porque assim poderia comer, beber e jactar-se com os oficiais do rei,
dizendo ser o único convidado a uma festa particular com o casal real.

Durante o banquete, Ester não participou da refeição que havia preparado, pois ainda estava jejuan-do. O rei e Haman comeram juntos enquanto Ester atuava
como anfitriã. Embora o rei insistisse para que se juntasse a eles, declinou, fingindo estar com problemas no estômago. Após comer e beber até ficar satisfeito,
o rei voltou-se para Ester. "Tudo que desejar" – disse – "darei a você. Antes, você quis que Haman e eu viéssemos à sua festa; eu o tenho aqui, agora. O que
você quer? Não pôs sua vida em perigo apenas para ter um banquete. Para correr tal risco, deve haver um assunto de vida ou morte a preocupando, ou um
problema envolvendo enormes somas de dinheiro. Haman é o tesoureiro real. Se precisa de dinheiro, ele o dará a você imediatamente. Pegue quanto precisar
– até o valor de metade do reino."

"Não quero metade do reino. Não preciso de nenhum dinheiro" – declarou Ester. Ela não queria que Achashverosh pensasse que desejava alguma coisa de
Haman. Esta não era a razão de tê-lo convidado para a festa. O que Ester queria podia apenas ser concedido pelo próprio rei.

"Se isso agrada ao rei, e se ele quer satisfazer-me um desejo, tenho apenas um agora. Quero que o rei e Haman venham à festa que prepararei para amanhã.
Então, revelarei a verdadeira razão da minha ida à Sala do Trono."

Achashverosh franziu o cenho, mas pareceu ficar satisfeito quando Ester acrescentou em seguida: "Amanhã, também revelarei detalhes sobre minha família e
meu local de nascimento."

A festa terminou e Haman saiu. Feliz e contente, suspirou de alívio ao voltar para o Portão do Rei.

"Ótimo!" – pensou ele. "Estava realmente com medo de que meus planos dessem em nada. Parecia um pouco suspeito. O decreto acabara de ser emitido e,
de repente, a rainha Ester organiza festas e me convida. Pensei realmente que iria me denunciar ao rei, dizendo que meu plano ‘solução final’ para os judeus
lhe é desfavorável."

Porém, nada deste tipo havia ocorrido, e Haman estava de bom humor. "Não apenas a rainha nada disse de desagradável sobre mim, como ainda convidou-
me para outra festa. Não há necessidade de me preocupar de que algo de mal aconteça no banquete de amanhã.

"A rainha não estava se sentindo bem e não pôde comer hoje. Quer fazer outro festim amanhã porque então poderá comer e beber também" – concluiu
Haman.

Imerso nesses pensamentos agradáveis, Haman passou pelo Portão do Rei. Lá estava Mordechai de novo. Como sempre, não se levantou ao ver Haman
passar, nem fez qualquer gesto de respeito. Foi como se Mordechai não o tivesse avistado.

Haman sentiu um duro golpe em seu orgulho. Vindo diretamente da festa onde a própria rainha o havia homenageado, era-lhe particularmente odioso. Apenas
um olhar para Mordechai e sentiu-se ferver de raiva.
"O que Mordechai está fazendo?" – pensou furiosamente. "Posso entender sua recusa em inclinar-se porque é um judeu. Mas porque nem ao menos mostra
um sinal de respeito? Nem ao menos pode se mover? Isso nada tem a ver com sua religião. Apenas é teimoso e tem orgulho como todos os outros judeus.
Senta-se à cabeceira do conselho e vira a cabeça das crianças judias. Quem pensa que é, afinal?

"Todo o povo judeu está para ser morto porque Mordechai se recusa a se curvar a mim. Mesmo assim ousa não se inclinar ou mostrar o mínimo respeito.
Talvez esteja planejando usar suas ligações com a rainha Ester para anular o decreto. Talvez seja por isso que Mordechai age tão presunçosamente!"

Haman estava confuso. "A rainha nada tem contra mim. Pelo contrário! Tem me convidado para festas mais íntimas com o rei. Mas, e se algo acontece e o
decreto contra os judeus for anulado? Mordechai também viverá. NÃO! Algo precisa ser feito com ele imediatamente!"

Antes, Haman havia sentido que matar apenas Mordechai estava abaixo de sua dignidade, mas agora Mordechai precisava de tratamento especial.

"Darei um fim nele antes mesmo que chegue a hora do decreto. Não quero que tenha qualquer chance de sobreviver."

Pensou em matar Mordechai imediatamente. Uma palavra a seus guardas, e seria feito. Porém, controlou-se, decidindo ir para casa e discutir o assunto com
sua mulher e amigos. Portanto, Haman apressou-se para casa.

Reunidos à volta da mesa estavam Zêresh, sua esposa, e seus amigos mais chegados. Todos os olhos seguiam Haman, passeando incessantemente pela
sala.

"Apenas olhem para mim, o Primeiro Ministro" – vociferou. "Sou tão rico. Tenho tanto poder. Tenho muitos filhos em altas posições no governo. Alguns deles
são escribas do rei, que controlam o governo de todas as formas, exceto no nome. Mesmo assim, tudo parece sem valor, a cada vez que vejo aquele
Mordechai. Está me deixando louco."

"Que é isso, Haman" – disseram seus assessores, racionalmente. "Por que preocupar-se com Mordechai? Sua morte está decretada, junto com o resto dos
judeus. Tenha um pouquinho de paciência e logo desaparecerá para sempre."

"Vocês não parecem entender minha situação" – disse Haman com arrogância. Mas como poderiam? Suas posições não foram elevadas, como a minha,
acima de todos os nobres e assessores do rei! Não foram pessoalmente convidados às festas da rainha. Não podem sentir a excitação do poder supremo.
Então, como podem entender que uma pessoa importante como eu não tolere ser constantemente ofendido?"

Todos se calaram. Haviam sido insultados e não queriam ser repreendidos novamente. "Sei como se sente" – disse Zêresh. "Tem toda razão em odiar
Mordechai. Apresse sua morte a todo custo e relaxe."
Os assessores de Haman concordaram: "Por que não? Mate-o!"

"Livre-se dele!"

"Acabe com ele, e compareça à festa da rainha para celebrar sua vitória!"

Zêresh continuou: "Deixe seus homens construirem uma plataforma de cinqüenta cúbitos5 de altura. Fale ao rei cedo pela manhã, enquanto Mordechai ainda
recita suas preces. Diga ao rei que Mordechai é um rebelde, um traidor, que merece ser enforcado por renegar o poder dos deuses persas e rezar a seu
próprio D’us.
"Construa a plataforma nos nossos terrenos particulares, assim ninguém poderá impedir que o enforque de imediato. Não lhe dê sequer uma chance de
terminar suas preces judaicas.

"E não vá ao rei especialmente para requisitar a execução de Mordechai. Aja como se tivesse outros importantes assuntos de estado para discutir, e então
mencione o enforcamento de Mordechai de modo casual. Será fácil chegar ao rei bem cedo, quando a rainha Ester não estiver por perto. O rei gosta de você,
e agora também sabe que a rainha o favorece. Um pedido pequeno como livrar-se de Mordechai será facilmente concedido."

A idéia não apenas agradou a Haman, como também o obcecou. Não conseguiu comer nem dormir até que tivesse ordenado aos construtores que
começassem o trabalho. Até os filhos de Haman participaram, pregando pregos e cantando. Zêresh e algumas amigas tocaram música, emprestando à
construção dessa esquisita plataforma um ar estranhamente festivo.

Quando ficou pronta, Haman subiu ao topo, experimentando o laço do carrasco em si mesmo para certificar-se de que estava na altura apropriada.

A mente de Haman começou a girar com grandes planos que iam muito além de livrar-se do inimigo judeu. Assim que Mordechai estivesse morto, também
assassinaria Achashverosh e Ester. Ainda tinha vínculos estreitos com o rei da Grécia, por causa de suas conexões com Bigtan e Têresh. Se matasse
Achashverosh, o governante grego o proclamaria rei, dando-lhe poder supremo e vingando a morte de seus bons amigos, Bigtan e Têresh.

Haman sentia-se em segurança. Ninguém no palácio sabia da trama. Mal sabia ele que Charvoná, um dos assessores do rei, o estava investigando e já estava
em seu rastro maléfico.

Após erigir o cadafalso, Haman foi até Mordechai para vê-lo pela última vez. Achou-o, ainda vestindo roupas de luto, ensinando a uma enorme multidão de
crianças.

Haman rangeu os dentes. "Mostrarei a eles" – resmungou.

"Guardas!" – gritou. "Peguem todas essas crianças, acorrentem-nas, e joguem-nas na prisão. Ha! Ha! Seus infelizes! Logo farão companhia a seu professor no
outro mundo! Lá, poderão estudar o quanto quiserem!"
As crianças se amontoaram nas escuras masmorras, preparando-se para a morte. Suas preces sinceras abalaram os alicerces dos Céus.

Haman não percebeu que esta ação selara seu destino. Foram as preces das crianças corajosas, e seu apego ao estudo de Torá apesar do perigo ameaçador,
que anularam o decreto celestial contra os judeus.

Capítulo X

Aquela noite era a primeira noite de Pêssach, uma época de grandes maravilhas e milagres. Os judeus sentavam-se às mesas do sêder, celebrando a festa e
louvando a D’us pelo milagre do Êxodo do Egito. Imploraram a D’us que os salvasse do terrível decreto de Haman. Sentiam que havia chegado a hora de D’us
intervir a seu favor.

Ao mesmo tempo em que muitos judeus faziam vigília, rezando por uma nova redenção, o malvado Haman contava as horas até o amanhecer, ansioso para
falar ao rei sobre Mordechai. Apenas o rei Achashverosh estava calmamente descansando, exausto e embriagado como resultado do festim.

Porém D’us perturbou o sono de Achashverosh. Num sonho que parecia real, viu Haman andando em sua direção, removendo a coroa e vestes reais e
empunhando uma espada como se para matá-lo. Acordando, banhado em suor, gritou: "Uma conspiração! Traidor! Assassino!"

Achashverosh esfregou os olhos e olhou ao redor. Tudo estava silente; o palácio calmo e sossegado. "Por todos os deuses! Que susto. Foi um sonho e tanto!"
Mudando de lado, o rei se aninhou sob as colchas de cetim e voltou a dormir.

Porém, tão logo fechou os olhos, achou-se bem acordado, como se alguém o estivesse sacudindo para a frente e para trás, suspendendo-o e deixando-o cair
novamente. Ouviu uma voz que lhe dizia: "Ingrato! Ingrato! Vá e pague suas dívidas!" O rei ficou muito confuso.

A princípio, achou que houvesse sido drogado. Levantou-se e chamou os cozinheiros, padeiros e garçons de vinhos para interrogá-los. Tivera alguém a
chance de drogá-lo ou envenenar a comida?

"Majestade" – replicaram – "Haman comeu a mesma comida que Sua Realeza" O rei estremeceu à mera menção do nome Haman, lembrando-se de seu
primeiro sonho. "Confira tudo" – trovejou. Uma rápida investigação mostrou que ele não tivera nenhum desconforto.

"Ahá!" – pensou o rei. "Haman não foi afetado pela comida. Espere um pouco. E Ester? Também faz parte da conspiração? Parece tão perfeito. De repente,
Ester planeja uma festa à qual nada come. Haman é o único convidado. Isso tudo parece tão suspeito."
Para dizer o mínimo, o rei estava muito perturbado.

Subitamente, teve outro pensamento preocupante. "Ester arriscou a vida a fim de convidar-me para a festa, e então adiou a revelação de seu verdadeiro
pedido até o próximo dia. O que está tramando? O que está por trás disso tudo?

"Minha cabeça está rodando. Voltarei a dormir e amanhã providenciarei uma investigação completa. Quero ir ao fundo disso tudo. Preciso apenas de algumas
poucas horas de descanso; assim poderei pensar com clareza pela manhã."

Cansado e aborrecido, o rei cambaleou até a cama. Entretanto, não conseguia adormecer. Finalmente decidiu usar um plano simples, praticado em muitas
noites insones nos palácios reais. Quando um rei não conseguia dormir, fazia com que os escribas lessem os registros do palácio para ele. Estas anotações
são bastante entediantes e, geralmente, o rei pegava no sono sem demora.

Efetivamente a voz relaxante do escriba logo o pôs num estado de sonolência. Estava quase adormecendo quando o escriba chegou ao registro de Bigtan e
Têresh. Subitamente, o rei despertou totalmente. Lembrava-se bem do episódio. A Rainha Ester o havia informado do complô e, literalmente, salvara-lhe a
vida. Sim, havia mencionado o nome de Mordechai, mas a parte que ele tomara no evento não estava clara. Quando o registro foi feito, Ester especificamente
ordenara ao escriba para inserir o nome de Mordechai e para dar-lhe crédito por ter salvado o rei.

Tanto o rei como Mordechai nada sabiam sobre isso. O rei ficou surpreso ao ouvir o nome de Mordechai tão diretamente ligado ao caso. Achashverosh sentiu-
se alivia-do! "Pelo menos agora sei que Ester é leal" – pensou. "Do contrário, jamais teria se incomodado de informar-me sobre a conspiração."

Dirigindo-se aos criados, o rei perguntou: "Como homenageamos Mordechai por ter salvado minha vida? Não consigo lembrar de tê-lo recompensado."

"Bem" – sugeriu um dos criados. "Ele foi nomeado juiz no Portão do Rei."

"Sim" – replicou o rei – "mas isso não foi recompensa. Foi feito simplesmente por recomendação de Ester. E não me arrependo nem um pouco. Seus bons
conselhos têm se provado muito úteis. Além disso, isso não aconteceu antes que descobrisse o complô?"

Os criados viram uma oportunidade para se manifestarem, não porque gostassem de Mordechai, mas porque detestavam Haman por este dar-lhes ordens.

"Muito justo, Majestade!" – disseram entusiasticamente. "Na verdade, nada foi feito por Mordechai. Que ironia! Mordechai salvou a vida do rei e nada recebeu.
Haman, que causou a morte de Vashti, foi promovido à posição mais alta da corte, e exige honra e reconhecimento por parte de todos."

De repente, o rei lembrou-se do estranho sonho no qual era sacudido e chamado de "ingrato!" Contou-o para os criados.

"Isso faz sentido, Majestade" – disseram judiciosamente. "Sua Realeza não recompensou Mordechai, e é bem possível que Haman esteja tramando assassinar
o rei. Lembra-se do quanto tentou conseguir um perdão para Bigtan e Têresh? É óbvio que não lhe tem amizade. Mordechai, por outro lado, nem queria que
Sua Majestade soubesse que foi ele quem lhe salvou a vida. É claro que não o fez para receber recompensa, mas tão somente por lealdade ao rei."

Achashverosh ficou pensativo. Sua mente estava clareando e, finalmente, conseguia tomar decisões acertadas. "Assim que o dia amanheça, recompensarei
Mordechai."

Sentindo-se mais calmo, o rei despediu os criados e finalmente caiu no sono. Ao adormecer, o sonho se repetiu. Nele estava Haman, uma espada
desembainhada, pronto a matar o rei e a rainha.

Naquele exato momento, Haman bateu à porta do pátio externo. Era antes da alvorada. Não podia esperar mais. Desprezando com impaciência os conselhos
da esposa para que fosse pela manhã, chegou ao raiar do dia.
O rei acordou com um susto. "Quem está no meu pátio? Quem bateu tão ousadamente no portão, acordando-me assim que caí no sono?" – trovejou ele.

Os criados responderam prontamente: "É Haman, Majestade. Bateu à porta e está de pé ali fora. Não sabemos porque está aqui!"

"Vejamos" – pensou – "se Haman se considera merecedor de tais honrarias e até onde vão suas exigências."

Haman foi apanhado de surpresa. Seus pensamentos voaram. "Quem será a pessoa que o rei deseja homenagear?" – pensou. "Claro, sou eu! Não pode estar
falando de qualquer outra pessoa. Senão, por que está falando sobre homenagem e não recompensa? Se o rei quisesse recompensar outro cortesão no reino,
simplesmente daria uma boa soma de dinheiro ou uma posição de prestígio. Obviamente, o rei quer recompensar alguém que é extremamente rico, e não
precisa de mais dinheiro ou poder. Quem mais seria, senão eu?"

Mesmo assim, Haman ainda estava preocupado de que o rei na verdade tivesse outra pessoa em mente. Foi, portanto, muito cauteloso com a resposta. A
homenagem envolveria realeza, algo que Haman certamente apreciaria, se fosse ele o homenageado. Mas se acaso o rei estivesse falando de outra pessoa, a
recompensa seria apenas temporária, sem nada de permanente.

Haman respondeu: "Que os criados e oficiais peguem os reais mantos púrpura, envergados pelo rei no primeiro dia de reinado. A pessoa a quem deseja
prestar honras deve receber as magníficas vestes de estado. Deve aparatar-se como o rei, quando senta-se em seu trono. "

Com essas palavras, Haman dardejou um olhar faminto à coroa do rei. Era o que realmente desejava, o próprio símbolo da realeza. Mas ousaria mencioná-la?
Talvez, o rei perceberia a insinuação?
"Que os criados tragam também o cavalo no qual o rei montou quando a coroa foi colocada em sua cabeça, e que o cavalo seja ajaezado da mesma forma que
no dia da coroação."

A palavra "coroa" imediatamente desencadeou uma reação no rei. "Agora percebo o que Haman deseja. Acho que meu sonho foi verdadeiro" – resmungou
para si mesmo, a face púrpura de ódio.

Haman foi rápido em perceber a raiva exibida no rosto do rei, e logo recuou. "Que dêem o cavalo e as vestes a um dos oficiais da mais alta posição." Não
houve mais menção da coroa.

"Que os oficiais vistam o homenageado" – continuou Haman. "Que cada um o adorne com uma peça diferente, e que esta pessoa monte o cavalo real ao longo
da principal avenida da cidade. Os altos oficiais deveriam juntar-se ao desfile como uma guarda de honra: um segurando a cauda do manto, outro guiando o
cavalo, e um terceiro liderando o séquito."

Haman fez uma pausa para recobrar a respiração. Na sua fantasia, estava em cima do cavalo, acenando para o povo que o inundava de honrarias. Porém,
refreou-se: "Cuidado, tenha cuidado agora! É necessário evitar as suspeitas do rei. Não pode desconfiar de minhas intenções de agarrar o trono" – pensou.

Rapidamente, disse: "Ponha batedores abrindo caminho para a pessoa a ser homenageada, proclamando: ‘Assim deve ser feito para o homem a quem o rei
deseja honrar.’ É verdade, Majestade, que Sua Realeza estará dando grande honra a esta pessoa, mas a honra do rei será ainda maior. Se tamanha pompa
pode ser concedida pela mera vontade do rei, imagine quanta glória o monarca atrairá sobre si!"

O rei Achashverosh observou cuidadosamente o primeiro ministro. Podia ler nas entrelinhas e estava um tanto divertido pelo que Haman revelava sobre si
mesmo em resposta à sua pergunta.

"Oh, claro, Haman" – sorriu o rei. "Esta certamente é uma maneira soberba de honrar um leal cidadão de Shushan. Agora, vá em frente, requisite as vestes e o
cavalo. Corra e providencie a homenagem que descreveu a Mordechai."

Os olhos de Haman esbugalharam-se de horror. Ouvira corretamente? Mas o rei estava assentindo, despedindo-o com um aceno de mão.

"Isso mesmo. Mordechai, o homem que desvelou a conspiração de Bigtan e Têresh, salvando minha vida. Vá! Faça o que sugeriu."

A cabeça de Haman girava. Não podia acreditar no que ouvia. Não podia pensar. Qualquer coisa, qualquer coisa, para ganhar tempo."

"Majestade, não tenho a menor idéia de quem seja este Mordechai" – gaguejou.
"Estou falando de Mordechai, o Judeu."

"Mas há muitos judeus chamados Mordechai.’

"Sabe muito bem a que Mordechai me refiro. É um de meus oficiais que trabalham no Portão do Rei."
"Mas certamente Sua Majestade não se refere àquele Mordechai."

"É precisamente aquele Mordechai. Merece ser homenageado. Vá em frente. Busque você mesmo as vestes, pois são muito valiosas. Você mesmo deve fazer
a proclamação que sugeriu." O rei estava finalmente apreciando esta conversa.

Haman estava fora de si, de ódio. Porém, recobrou-se e tentou cavar uma saída para a situação humilhante. "Majestade" – disse – "se deseja honrar uma
pessoa, pode conceder-lhe tudo isso e ainda mais. Mas jamais pensei que desejasse fazer uma homenagem ao judeu Mordechai. Pensei que nos
entendêssemos a respeito desses judeus. Não me dando conta de que Sua Realeza queria pagar uma dívida de honra, simplesmente assumi que queria
homenagear especialmente um de seus súditos.

Honra e dívida são muito diferentes. Não há limite para as honrarias que Sua Majestade pode conceder. Mas se trata-se apenas do pagamento de uma dívida,
não deveria dar mais que a quantia devida. Caso contrário, pode abrir um perigoso precedente.

"Como pode deixar que um plebeu como Mordechai monte o cavalo que Sua Majestade cavalgou na coroação, e use suas vestes de estado? Envergonharia
sua posição. Se deseja recompensar Mordechai, dê-lhe uma cidade ou um negócio rentável. Ele é pobre, e algo dessa monta o fará mais feliz que qualquer
outra coisa!"

Havia impaciência na voz do rei. "A idéia veio de seus próprios lábios, Haman. Quero que faça exatamente o que sugeriu. Ficou desapontado? Tanto pior! É
uma vergonha para você? Talvez, mas não razão para delongas. Apresse-se. E não leve Mordechai apenas por ruas secundárias e vielas. Faça como falou:
leve-o ao longo da avenida principal."

"Majestade, por favor!" – implorou Haman. "Não me humilhe dessa forma diante de todo o povo. O homem que o rei deseja homenagear é meu arquiinimigo
Como posso honrá-lo? Construí um cadafalso especialmente para ele no meu terreno, e vim aqui esta manhã pedir permissão para enforcá-lo. Veja, estou
admitindo. Agora está me pedindo para glorificá-lo."

"Chega de conversa" – disse o rei. "Sem mais demora, vá até o almoxarifado real e apanhe um dos valiosos mantos púrpuras que tenho, bordado a ouro e
cravejado de jóias. Pegue aquela linda espada que veio da Etiópia. Providencie a capa que me foi presenteada por meus súditos coloniais na África. Traga o
cavalo que montei no dia de minha coroação, chamado Shifragaz. Junte tudo e faça a Mordechai do modo que descreveu."

Um enorme desespero tomou conta de Haman, que começou a tremer.

"Mas, Majestade, não sei em qual portão ele está. Sua Realeza disse o Portão do Rei, mas o rei tem muitos portões."

"Vamos, vamos, Haman, não seja tolo" – disse o rei, zombeteiro.

"Eu suplico, Majestade. Este homem é meu inimigo figadal. Se fizesse isso, estaria indo contra todos os ensinamentos de minha família" – implorou Haman.
"Farei qualquer coisa" – disse, desesperadamente. "Até darei a Mordechai dez mil lingotes de prata. Apenas poupe-me esta vergonha. Por ter salvado a vida
do rei, não o matarei quando os outros judeus forem mortos. Pagarei a ele os dez mil lingotes de prata que planejava dar para ter os judeus exterminados."

"Tudo bem, Haman" – disse o rei. "Dê a ele o dinheiro. Afinal, ele merece. Mas não ficará isento de preparar para ele toda a honra que descreveu. Você agora
está recebendo ordens de providenciar até o último detalhe."

"Por favor, Majestade, mate-me!" – gritou ele. "Qualquer coisa! Mas não me obrigue a fazer isso. Seria melhor morrer que passar por tal vergonha."

"Não seja dramático. Faça o que estou mandando. Se quiser, posso mandar matá-lo também. Mas por enquanto, não perca tempo. Veja, Haman, como você
me é importante. Tudo que me diz, eu faço" – disse o rei, sarcástico.

Vendo que não tinha escolha, Haman arrastou-se até os depósitos reais, vencido e desesperado. Estava em estado de choque e mal podia andar. Apanhando
as roupas da coroação e colocando-as sobre os ombros, foi até os estábulos reais e arreou o cavalo especial que pertencia ao rei. De má vontade, dirigiu-se
ao Portão do Rei.

Era de manhã cedo e Mordechai, adornado com seu talit (xale de orações), estava recitando as preces matinais. Estava cercado pelos alunos fiéis que não
deixavam sua presença e ficaram com ele, jejuando, rezando, e estudando Torá. No momento em que terminava suas preces, avistou Haman aproximando-se.
Imaginando que vinha para matá-lo, Mordechai voltou-se aos discípulos e implorou a eles: "Corram para salvar a vida."

"Não, querido Rabi" – gritaram – "não fugiremos. Ficaremos consigo na vida e na morte."

Mordechai e os alunos continuaram a estudar e rezar mesmo à aproximação do perverso Haman. Estavam revisando as leis do ômer, o sacrifício trazido ao
Templo no primeiro dia de Pêssach.

Haman abordou um dos alunos mais distantes do mestre. "O que Mordechai está discutindo?" – perguntou.
Abalado pela pergunta inesperada, o aluno trêmulo respondeu: "As leis do ômer, uma oferenda que D’us nos mandou trazer a nosso Templo em Jerusalém."
"O que era essa oferta? Ouro? Prata?"

"Não, era uma oferenda de cevada."

"Cevada? E por isso D’us os protege? Um punhado de sua cevada suplantou as dez mil barras de prata que ofereci ao rei."

Mordechai entreouviu as palavras de Haman. "O que Haman quer dizer com isso, que a cevada suplantou a prata?" – pensou. Obviamente, veio aqui para
zombar de nós. Todos sabemos que assinou nossa sentença de morte."

Haman mal podia abrir a boca. "Santo Mordechai, aproxime-se. Seu D’us sempre faz milagres para você. Planejei o mal, mas a sorte virou-se contra mim.
Levante-se e deixe-me vesti-lo com estas roupas reais. Suba no cavalo que pertence ao rei. O rei me ordenou fazê-lo, e não ouso desobedecer."

Mordechai não podia acreditar em seus ouvidos. Seria verdade? A salvação estava chegando e D’us não abandonara seu povo? Mordechai não prezava
honrarias, mas se essa fosse uma maneira de agradar ao rei e salvar os judeus, concordaria.

"Haman, não percebe que estou vestido de aniagem e cinzas? Antes de envergar as túnicas reais, preciso de um banho e um corte de cabelo. Necessito de
ajuda, porém, pois estou muito fraco por ter jejuado durante três dias."

A notícia se espalhou como fogo. A rainha Ester ouvira que Mordechai ia desfilar pela cidade e que seria homenageado por salvar a vida do rei. Expediu
ordens de que todo o comércio fosse fechado; assim, todos poderiam testemunhar o evento, na esperança que isso a ajudasse no momento de persuadir o rei
a cancelar o decreto.

Quando Haman tentou achar uma casa de banhos, nenhuma estava aberta. Temeroso de que o rei o acusasse de perder tempo, correu para aquecer água e
preparou um banho para Mordechai com suas próprias mãos. Tentou então achar um barbeiro para cortar os cabelos de Mordechai, mas todos haviam
fechado os negócios, esperando pelo grande desfile.

Haman quis chamar um de seus escravos para cortar o cabelo de Mordechai, mas este não o permitiu. Um dos escravos poderia feri-lo e dizer que fora por
acidente. Haman não ousaria machucar Mordechai porque sabia que o rei estava de olho em tudo que fazia.

Não tendo outra escolha, Haman foi para casa e pegou sua tesoura de barbeiro e outros instrumentos. Ao cortar o cabelo de Mordechai, suspirava
profundamente. "Por que está resmungando?" – perguntou Mordechai.

"Imagine só" – grunhiu Haman – "um homem importante como eu, elevado pelo rei acima de todos os governadores; logo eu, que mando no reino todo, estou
agora reduzido a barbeiro."

"Fala como se nunca tivesse feito isso antes" – replicou Mordechai. "Todos sabem que você e seu pai eram barbeiros e atendentes na casa de banho na
cidade de Circésio antes de vir para Shushan. É por isso que tem todo o equipamento do ofício."

Haman mordeu os lábios. O corte de cabelo estava terminado. Haman vestiu Mordechai com as túnicas reais. "Venha, monte o cavalo" – disse.

"Não posso" – disse Mordechai. "Estou muito fraco pelo longo jejum."

Haman estava desesperado. Mas tinha que seguir as ordens do rei. "Está bem" – suspirou. "Vou curvar-me e você pode subir às minhas costas."

Mordechai montou o cavalo, os lábios nunca deixando de recitar louvores a D’us pela inesperada mudança nos acontecimentos. Tanto judeus como não-
judeus seguiram o cavalo, juntando-se a Haman que entoava: "Assim deve ser feito para o homem a quem o rei deseja honrar."

O cortejo logo passou em frente à casa de Haman. No andar superior, a filha de Haman estava olhando pela janela. Viu um homem totalmente alquebrado,
conduzindo um cavalo. Um segundo homem, montado, tinha a face radiante. "Claro" – pensou ela. "Papai foi ao palácio esta manhã para conseguir o
enforcamento de Mordechai. O cavaleiro deve ser meu pai e Mordechai deve estar guiando o cavalo."

"Que oportunidade perfeita para envergonhar Mordechai" – disse ela. Cuidadosamente, esperou até que o homem que levava o cavalo pelas rédeas estivesse
bem embaixo da janela. Com uma maldição, verteu seu vaso de noite bem em cima de sua cabeça.

O imundo conteúdo da vasilha caiu na cabeça de Haman. Este olhou para ver quem fizera algo tão terrível contra ele. Neste instante, a filha reconheceu o pai.
Em choque, se jogou da janela alta, mergulhando para a morte.

Capítulo XI

Quando terminou o desfile, Mordechai voltou ao San’hedrin, que estava reunido no Portão do Rei, e removeu os trajes reais. Vestindo aniagem e cinzas,
continuou com o jejum e as preces. Também pediu a todos os outros judeus que fossem às sinago-gas para rezar.

Na verdade, Mordechai estava um tanto temeroso sobre a honra que havia recebido. Disse ao povo agrupado: "Tinha esperança de conseguir uma audiência
com o rei para suplicar-lhe que revogasse o decreto. Mas não fui levado ao palácio, e o rei já me pagou por salvar-lhe a vida. Nossa única salvação agora é
rezar a D’us."

Enquanto isso, Haman, deprimido pela perda da filha favorita e profundamente envergonhado pelo vexame público, tentava ir para casa o mais rápido possível.
Ninguém parecia reconhecê-lo, e a multidão que assistira ao desfile colidia com ele por onde quer que tentasse passar.

Haman tinha vergonha de contar seus problemas aos amigos. Trocou confidências com a mulher, mas as péssimas notícias haviam se espalhado
rapidamente. A família e os amigos tentaram confortá-los, mas estavam tão abalados que não conseguiam pensar direito. Além disso, seu conselho original
não havia produzido frutos, e estavam assustados.

Finalmente, alguns poucos homens mais sábios reuniram coragem para falar; porém, antes que pudessem revelar seu plano, os guardas do rei chegaram para
apressar Haman para a segunda festa. Vendo a confusão estampada nas faces da mulher e dos amigos, o próprio Haman tentou confortá-los. Disse: "Não se
preocupem pelo que aconteceu hoje. Ainda pretendo enforcar Mordechai. Escapou de mim por esta vez, mas não o fará novamente. O que houve foi apenas
questão de azar, e minha sorte não pode ser ruim para sempre. As estrelas agora estão sorrindo para os judeus, mas da próxima vez sorrirão para mim."
Levantou a cabeça arrogantemente.

Sua mulher e amigos, entretanto, não se convenceram. Com pesar nas vozes, replicaram: "O que diz pode ser verdadeiro sobre todas as outras nações, mas
não dos judeus. Seu destino não é determinado pelas estrelas. Em sua Torá, são comparados tanto ao pó como às estrelas. Algumas vezes, são baixos como
o pó; subitamente, podem ser elevados tão alto como as estrelas. Se Mordechai é um verdadeiro descendente desses judeus da Torá, uma vez que você
começou a sua queda diante dele, com certeza morrerá."

Empurrado pelos guardas do rei, Haman não teve chance de responder. "Corra! Corra!" – diziam os guardas. Obviamente, os dias de respeito a Haman eram
parte do passado. Agora, todos no palácio sentiam que ele era um homem marcado. Os soldados empurravam-no para a frente, dizendo com rudeza: "Que
falta de educação deixar o rei e a rainha esperando. Tudo está pronto, e você fica sentado em casa batendo papo com os amigos!"

Apesar desses comentários, Haman continuava pensando. Tinha muitos planos. Talvez pudesse fugir. Afinal, tinha filhos que eram governadores em
províncias distantes. Podia juntar-se a eles e começar uma rebelião.

Sem que Haman soubesse, Ester previra seus planos. Percebendo que lidava com uma pessoa escorregadia, ordenou aos oficiais que trouxessem Haman
sem demora. Não lhe daria chance de tramar com seus conselheiros, nem de escapar da capital e juntar-se aos filhos. Ordenou também que os filhos de
Haman fossem imediatamente convocados à capital, antes que pudessem descobrir o que acontecera com o pai, e que não tivessem tempo para começar
uma rebelião contra o rei.

O rei e Haman juntaram-se a Ester no segundo banquete preparado por ela. Tendo completado o jejum, agora podia jantar com eles. Mesmo assim, não bebeu
vinho, pois queria as idéias claras quando fosse implorar por seu povo.
Haman estava deprimido, e o rei ainda descontente pela noite insone, e ambos beberam para afogar as mágoas. Ester fingiu juntar-se a eles. Achou a leve
embriaguez do rei encorajadora, esperando que sua mente ficasse ainda mais anuviada quando se tratasse de Haman.

Certamente, o vinho melhorara o espírito do rei, que repetiu a pergunta feita quando da festa ante-rior. "O que deseja, rainha Ester? Seja o que for, será
concedido. Qual é sua vontade? Até o valor de metade do reino será feito."

Vendo Achashverosh num humor receptivo, Ester decidiu que era chegada a hora de agir. Com uma prece ardente no coração, respirou fundo. Os olhos
inundados de lágrimas, disse numa voz trêmula: "Se tenho agradado a Sua Majestade e se deseja conceder-me um pedido, imploro que poupe minha vida e a
de meu povo!" Tomado de surpresa, o rei Achashverosh olhou-a, estupefato.
"Sou de sangue real" – continuou Ester – "descendente do famoso rei Shaul da tribo de Binyamin. Os judeus são meu povo. Nosso arquiinimigo negociou-nos
como objetos de sua posse para exterminar, matar e destruir!

"O inimigo deseja matar-me junto com todo meu povo. Secretamente, trama também destronar o próprio rei. Enquanto eu estiver aqui, está temeroso de agir
porque cuido do bem-estar do rei.

"Se meu povo e eu tivéssemos sido vendidos como escravos, teria me calado. Jamais teria invadido seus aposentos íntimos sem ser chamada. No fim, Sua
Majestade teria percebido a perda que uma ação tão cruel traria a seu reino e teria libertado os judeus por si mesmo.
"Mas o decreto é para que sejamos todos exterminados" – gritou Ester, a voz trêmula. "Imploro em nome do meu povo. Poupe-nos, e eu também serei salva."

Aparvalhado, o rei tentou ordenar os pensamentos, enquanto seu desconforto e sua ira cres-ciam. Embora Achashverosh odiasse os judeus, na verdade não
dissera a Haman que os exterminasse. Temia a D’us e Seu castigo. O rei sabia que Haman expedira um decreto, mas Haman disfarçara tão bem o assunto
que o rei não estava bem certo do conteúdo. Embora Haman tivesse sugerido o extermínio, o esboço final tinha a aparência de ameaça apenas, sem planos
concretos para a execução.

O rei estava confuso. Havia mesmo assinado um decreto para aniquilar os judeus? Instruíra seus oficiais a fazê-lo? Quem ousaria matar um povo inteiro sem
informar claramente ao rei sobre os planos? Seria possível que tivesse se esquecido? Estaria Ester acusando-o de ser o inimigo, ou referia-se a Haman?

"Quem é esse inimigo?" – gritou. "Quem ousaria fazer tal coisa?"

Era agora ou nunca! Ester declarou com destemor: "Um homem odioso. Um inimigo. O malvado Haman! Ele é inimigo do rei tanto quanto meu!

"Acalentou pensamentos de livrar-se de Sua Majestade, rei Achashverosh, enquanto estivesse dormindo. Quando o plano foi frustrado, tentou persuadi-lo a
consentir que vestisse seus trajes reais e montasse o cavalo que pertence ao rei, ousando mesmo sugerir que lhe desse a coroa. Vestido dessa maneira,
poderia facilmente atrair as massas e começar uma rebelião.

"No desenrolar dos fatos, meu justo primo Mordechai recebeu a honra oferecida por Sua Majestade. O rei deve saber que ele lhe é leal. Pois veja, até mesmo
salvou sua vida uma vez. Haman o odeia porque sabe que Mordechai está sempre vigilante para descobrir conspirações contra o rei.

"Todas suas acusações contra os judeus são falsas! Quer exterminar um povo inteiro por causa de seu ódio a mim e a Mordechai. Haman sempre foi odioso e
homicida. Não tramou a execução de Vashti, e até mesmo conspirou contra sua vida com Bigtan e Têresh? Lembre-se,Haman tentou salvá-los quando o
conluio foi descoberto. Quando fui à Sala do Trono sem convite, ele mal podia esperar para matar-me. Estou surpresa de que Sua Majestade não tenha
percebido que pessoa desprezível ele é."

Haman esquivou-se do rei e da rainha. Todas suas mentiras haviam sido reveladas, e o casal real estava unido contra ele. Aterrorizado, percebeu que
ninguém o defenderia.

O rei Achashverosh estava fora de si de raiva. Haman o havia tomado por tolo. "Eu o elevei à mais alta posição do império, e ousa tramar contra mim bem
debaixo de meu nariz!" – pensou o rei raivosamente.

O fato de que Achashverosh estivesse ligeiramente bêbado aumentava sua fúria. Lembrava-se do sonho no qual Haman o havia atacado e tirado sua coroa.
Claramente, via que Haman era seu inimigo! Apesar disso, teve controle suficiente para agir com calma. Foi até o terraço no jardim contíguo ao palácio. Talvez
o ar fresco lhe desanuviasse a cabeça e lhe permitisse pensar mais claramente.

Nesse ínterim, Haman, muito abalado, sabia que não poderia justificar-se para o rei a quem enganara. Achashverosh jamais daria ouvidos a suas desculpas.
Entretanto, com Ester poderia, ao menos, ter a esperança de pleitear ignorância. "Não havia ela escondido a própria origem?" – pensou Haman
freneticamente. "Como poderia eu ter sabido que os judeus eram seu povo? Se eu tivesse essa informação, jamais teria pensado em prejudicá-los."

Com Achashverosh fora no jardim, Haman voltou-se para Ester e implorou por sua vida. O ar do jardim não havia aquietado a fúria do rei, e este voltou para
beber novamente e acalmar os nervos.
Naqueles tempos antigos, as pessoas costumavam reclinar-se em divãs à hora das refeições. Quando o rei entrou na sala de jantar, foi tomado de surpresa
pela cena diante de seus olhos. Lá, esparramado sobre o divã da rainha, estava Haman. Havia se jogado aos pés de Ester, suplicando-lhe perdão. Ao ouvir o
rei entrar, Haman assustou-se e tentou ficar de pé rapidamente. Ao fazê-lo, tropeçou e caiu ao comprido sobre o divã, bem na hora em que o rei abria a porta.
"Que é isso?" – trovejou o rei. "Ousa atacar a rainha na minha própria presença, no meu próprio palácio?"

O rei não podia crer no que via. A memória de sua primeira mulher, Vashti, despertou suas emoções. "Haman estava invejoso de sua posição e a fez ser
morta. Agora está atacando Ester para matá-la" – pensou.

Haman foi apanhado de surpresa. Sua vergonha foi tão grande que não conseguia encarar o rei. Tomado de pavor, emudeceu. Ninguém se movia no salão de
jantar. Ester prendia a respiração, esperando que o rei decidisse o destino de Haman. Este estava imóvel no lugar, como um criminoso condenado.

Exatamente neste instante, Charvoná agiu. Era um dos sete ministros do rei. Cada um trabalhava num dia diferente, e hoje era o turno de Charvoná. Este
havia seguido os eventos deste drama na corte desde o início. Era um dos que tinham sugerido a busca por uma nova rainha. Havia também liderado as
tropas enviadas para trazerem Haman a esse segundo banquete. Após ouvir os próprios conselheiros de Haman dizendo-lhe que certamente seria vencido por
Mordechai, Charvoná sentiu que era chegada a hora da queda de Haman.

Falou claramente: "Majestade, tudo que a rainha lhe contou é verdade; mas se isso não for suficiente, olhe para o cadafalso que Haman preparou para
Mordechai. Mesmo que odeie Mordechai, por que não pode esperar? Deu ordens de que todos os judeus sejam mortos em breve. O patíbulo tem cinqüenta
cúbitos de altura. Pode-se enforcar dez homens ali! Obviamente, não foi projetado apenas para Mordechai, mas para o rei e todos seus aliados.

"Majestade, Mordechai é seu súdito mais leal. Haman fez um cadafalso tão alto que todos na cidade poderiam ver Mordechai pendendo da forca. E veja onde o
erigiu. Não na prisão, onde a maioria das execuções acontece, mas em seu próprio terreno. Quer mostrar ao mundo que sua palavra é lei, que não precisa da
permissão de ninguém. Pretendia observar o corpo de Mordechai pendendo da forca bem daqui, da festa" – concluiu Charvoná.

O rei já ouvira o suficiente. "Que o cadafalso de Haman seja usado. Pendure-o lá!" – trovejou ele.
Enquanto o rei chamava os guardas, Charvoná completou baixinho: "Majestade, sugiro anunciar que está enforcando Haman por tramar a morte de Mordechai.
Não torne público o fato de que seu conselheiro mais chegado queria assassinar o rei. Isso poderia causar um escândalo por todo o império."

Os guardas agarraram Haman, colocando-lhe um capuz sobre a cabeça, enquanto o arrastavam para fora. Esta foi sua última audiência com o rei.

Quando Haman foi levado da sala, o rei chamou Mordechai e disse: "Pegue seu inimigo Haman e enforque-o no patíbulo que preparou para você. Faça com
ele o que lhe aprouver!"

Sob guarda cerrada, Haman foi conduzido dos terrenos do palácio, o tempo todo implorando a Mordechai: "Por favor, não me enforque como um animal
abatido! Fui o homem mais poderoso do reino. Todos estremeciam às minhas palavras. Agora sou eu que tremo perante você. Permita-me conservar minha
dignidade. Se deve me matar, faça-o pela espada. Deixe-me morrer como nobre. Não me enforque como um criminoso comum."

Haman tinha um motivo inconfesso para implorar pela espada. Em seu ódio aos judeus, pensou: "Se eu puder realizar o extermínio dos judeus, minha morte
não terá sido em vão. Se for enforcado como um malfeitor qualquer, o povo poderá presumir que meu decreto foi cancelado. Se morrer como um nobre, as
pessoas pensarão que o decreto ainda tem validade. Posso mesmo ser considerado um mártir sagrado."

Mordechai, entretanto, entendeu o perverso plano de Haman. Ignorando suas súplicas, ordenou que fosse enforcado. Não agia por ódio pessoal, mas o fazia
apenas para proteger os judeus do cruel decreto de Haman.

O enforcamento de Haman foi proclamado como uma punição por conspirar para a morte de Mordechai. Haman foi enforcado vestindo os trajes de estado,
para que todos pudessem reconhecê-lo.

Capítulo XII

Quando a execução foi reportada ao rei, sua ira finalmente arrefeceu. A calma desceu
sobre o palácio em Shushan.

Achashverosh voltou-se para a Rainha Ester e disse: "Fiquei furioso hoje, mas minha fúria não se dirigia a você. Como prova do respeito que lhe tenho,
ofereço-lhe o controle das propriedades de Haman, bem como poder total sobre sua esposa e filhos."

Ester sentiu-se aliviada pela oferta do rei. Não tinha interesse nas riquezas que recebera. Tinha em mente algo muito mais importante. Embora Haman
estivesse morto, o decreto havia sido divulgado. Ali mesmo em Shushan, muitos não-judeus já estavam afiando as espadas.

"Certamente, todos serão informados do gesto do rei" – pensou Ester, esperançosamente. "Concedendo-me o controle de sua família e de seus bens, o rei
indica que todas as propriedades e poderes de Haman estão em minhas mãos. Agora que o povo sabe que sou judia, certamente ninguém ousará fazer mal a
nenhum judeu."

Ester contou ao rei que Mordechai, seu primo, a tinha criado e cuidado desde a mais tenra infância. O rei ficou impressionado e convocou Mordechai para uma
audiência especial.

Ester foi cuidadosa em não pedir qualquer privilégio especial para Mordechai. Se o fizesse, o rei poderia suspeitar que havia forjado tudo para este fim.

Ester percebeu que ainda jogava uma partida perigosa, e que teria que ser muito cuidadosa ao lidar com o rei. O decreto ainda não fora cancelado e sua
missão ainda não terminara.

O rei Achashverosh havia chamado Mordechai ao palácio para algo mais que uma conversa amena. Estava preocupado que Mordechai pudesse ser
assassinado como vingança pela execução de Haman.

"Sugiro que permaneça no palácio até que as forças de Haman sejam derrotadas" – instou o rei.
Mordechai agora tinha livre acesso ao rei, pela própria vontade do monarca. A lei, ordenando que ninguém poderia ir até o rei sem convite, foi revogada.
Haman sugerira a lei originalmente para impedir que Vashti implorasse por sua vida. Continuou a insistir em sua validade por suspeitar que Ester se
aproximasse do rei para suplicar clemência para os judeus. Agora que Haman estava morto, a lei foi cancelada e Mordechai podia falar ao rei sempre que
desejasse.
O rei, por sua vez, teve amplas oportunidades de reconhecer a inteligência e as qualidades pessoais de Mordechai. "Agora que meu antigo Primeiro Ministro
está morto, posso ver que Mordechai preenche o cargo perfeitamente" – pensou o rei. "Além disso, merece uma recompensa por educar uma criança e fazê-la
digna de ser rainha."

Ester também quis dar a Mordechai um penhor de sua gratidão. Transferiu-lhe todos os direitos sobre a família de Haman e nomeou-o curador de suas
propriedades. Ester instruiu-o também a distribuir a fortuna de Haman aos judeus, como pagamento pelos danos que sofreram por causa dos decretos de
Haman.

Embora o rei fosse receptivo a seu desejo e tivesse agido generosamente em relação a Mordechai, Ester percebeu que não seria prudente fazer mais pedidos
de imediato. Temia que o rei não consentisse. "Já me deu o controle sobre a família e os bens de Haman. Talvez aproveite isso como desculpa para não me
conceder mais favores" – preocupava-se. "E se o decreto de Haman não puder ser cancelado?"

Decidiu esperar por mais dois meses antes de abordar o rei para novos pedidos. Enquanto isso, instruiu os judeus a jejuar, a arrepender-se e a implorar a D’us
por misericórdia. Pediu que rezassem para que o rei desse ouvidos a ela e revogasse as cartas que ordenavam a morte dos judeus.

Ester passou muitos longos dias e noites insones, rezando e suplicando a D’us que salvasse Seu povo. Finalmente, procurou o rei. Sabendo que não seria fácil
convencê-lo, jogou-se a seus pés, soluçando e implorando.

"Por favor, Majestade" – chorou amargamente, o corpo sacudido por soluços – "meu povo está atemorizado. Todos os dias nossos inimigos nos provocam,
dizendo: ‘Amanhã, vou matá-lo e apossar-me de suas propriedades.’ Haman está morto, mas seus planos perversos estão bem vivos. Seu decreto contra os
judeus ainda é vigente. Imploro, Majestade, cancele o decreto!"

O rei estava num dilema. Era impossível revogar o decreto! Seria contra todos os precedentes! A lei persa dizia que tudo que fosse escrito em nome do rei e
selado com o anel de sinete não poderia voltar atrás. Mesmo assim, não suportava ver sua amada rainha chorando tão desesperadamente.

Lentamente, acenou com o cetro dourado para Ester, um sinal de que deveria erguer-se e falar-lhe sem temor. Encorajada pelo gesto do rei, levantou-se para
apresentar seu pedido. Proferiu uma prece ardente a D’us antes de continuar sua súplica em favor do futuro de seu povo.

"Majestade, peço que atenda meu pedido apenas se for correto e apropriado para si. Se encontrei mercê em seus olhos, imploro seu consentimento. Entendo
que a suspensão do decreto deva ser feita de acordo com a lei persa. Por isso, ordene o recolhimento das cartas contendo o perverso plano de Haman."

O rei hesitava. "Posso fazer um anúncio oficial para este fim" – concordou.

"Um anúncio não será suficiente. Pode ser esquecido; e quando chegar a hora marcada por Haman, o povo o ignorará" – argumentou Ester.

"Revogar um decreto assinado e selado é muito difícil" – protestou o rei.

"Eu sei, mas há uma brecha. O verdadeiro mandado real estabelece apenas que o povo deve se preparar para o dia designado. As cartas, dizendo que aquele
seria o dia do extermínio dos judeus, foram expedidas apenas para os governadores. Estas cartas não contêm o selo real. Por isso, legalmente pode alegar
que as cartas aos governadores não eram documentos reais, mas apenas a palavra de Haman."

O rei refletiu um pouco, mas ainda não estava totalmente convencido. "Ainda faltam muitos meses para o dia 13 de Adar" – disse ele.

Ester desmanchou-se em lágrimas. "Como posso suportar uma ameaça dessas proporções pairando sobre meu povo?" – soluçou. "A essa altura, muitos
inimigos dos judeus já sabem do decreto, e estão matando judeus em algumas das províncias mais distantes."

"Estou numa posição muito difícil" – explicou o rei. "É óbvio que desejo salvar o povo de minha rainha. Porém, se eu tentar cancelar as cartas, explicando em
detalhes a situação, causarei grande prejuízo ao império. Serei acusado de favoritismo. Meus súditos podem até se rebelar."

O rei tinha em mãos um complicado problema legal. As cartas não podiam ser simplesmente anuladas, e as necessárias etapas legais para mudar seu impacto
seriam complicadas. Seria necessário convocar a mente mais arguta do império para resolver o assunto, e isso significava Mordechai. Este foi chamado, e o
rei consultou-o.

Mordechai respondeu: "Conforme a lei, se um ministro real expede um edito e então é legalmente executado, este edito está automaticamente invalidado. Por
isso, o principal é informar ao povo em todas as províncias que Haman foi executado. Isso impedirá que aqueles que odeiam os judeus levantem a mão contra
eles."

Mordechai e o rei consideraram outras possibilidades. Poderiam dizer ao povo que o rei ordenara a Haman que fizesse uma proclamação, dando aos judeus
permissão para matar os inimigos em 13 de Adar. Haman teria mudado o fraseado da proclamação, dizendo que os judeus deveriam ser mortos por seus
inimigos – em persa as palavras são muito parecidas – e o rei havia assinado sem ler cuidadosamente. Quando o monarca descobrira a troca de palavras,
mandara enforcar Haman.

Um plano alternativo seria dizer toda a verdade. Haman mentira sobre os judeus e convencera o rei de que eram seus inimigos. Confiando em Haman, o rei
havia assinado o decreto.

Finalmente, decidiram que seria melhor não anular as cartas mandadas por Haman. Em vez disso, um novo mandado seria expedido, dando aos judeus
autoridade para se reunirem, defenderem-se, e matar quem quer que os atacasse. Os governadores também receberiam instruções para apoiar os judeus.
Dessa maneira, os judeus seriam salvos sem o cancelamento formal do primeiro decreto.

No mínimo, um segundo decreto confundiria os inimigos dos judeus. Afinal, uma ordem fora expedida dizendo que os judeus seriam mortos, e agora outra
seria emitida, dando aos judeus permissão para se defenderem. Como a intenção do rei não ficaria clara, muitos pensariam que a atitude mais segura seria
não fazer nada.

O rei Achashverosh instruiu Mordechai a redigir uma proclamação que ele, o rei, assinaria e selaria. Foram feitas versões em todos os idiomas falados no
império.

As cartas explicavam que o rei daria permissão para que os judeus em todas as cidades se organizassem para se defender de seus inimigos. Mordechai
insinuava ao povo judeu que deveriam esforçar-se para viver em paz, e que se reunissem apenas para guerrear em autodefesa. O principal seria a união. Os
judeus deveriam se reunir e tirar a limpo suas diferenças. Quando todos os judeus estivessem juntos, D’us os ajudaria a superar qualquer obstáculo ou inimigo.
Embora o rei desse aos judeus permissão para se apossarem das propriedades dos inimigos, Mordechai proibiu-os claramente de fazê-lo.

As cartas especificavam que os judeus se preparassem para a autodefesa no dia 13 de Adar. Embora os judeus pudessem ter atacado seus inimigos mais
cedo, pois sabiam quem eram os adversários, deveriam esperar até o último instante para dar-lhes uma chance de se arrependerem. Haman havia escolhido
13 de Adar porque, astrologicamente, este parecera ser o pior dia possível para os judeus. Em vez de fazê-lo o dia da derrota dos judeus, Mordechai queria
que fosse o dia de sua maior vitória.

Mordechai mandou o novo decreto pelos mesmos mensageiros que haviam entregue o de Haman, porque não queria que os governadores questionassem a
veracidade da nova proclamação. Os mesmos mensageiros poderiam explicar que o decreto anterior fora invalidado, e os governadores perceberiam que as
novas cartas eram genuínas. Muitos desses estafetas haviam acabado de voltar de longas viagens a distantes províncias, quando receberam ordens de iniciar
viagem novamente.

"Os judeus têm vivido em pânico; e quanto mais cedo a mensagem chegar, melhor" – declarou Mordechai.

"Mas os mensageiros e os cavalos estão exaustos" – reclamou o zelador do estábulo.


"Então providencie camelos dos estábulos reais" – disse Mordechai. "Camelos podem viajar grandes distâncias sem parar para comer, beber ou descansar."

Os estafetas puseram-se a caminho a toda velocidade, a fim de levar a palavra do rei às províncias e dar aos judeus ampla margem de tempo para se
defenderem.

Mensageiros especiais também foram enviados a todos os governadores. Se acaso alguém atacasse com armas os judeus, os governadores tinham ordem
real de vir em seu auxílio.

Capítulo XIII

Cópias das ordens do rei foram afixadas em todos os lugares públicos de cada cidade.
A lei também foi proclamada e largamente difundida na capital, Shushan. Ao mesmo tempo, acontecia a posse de Mordechai como o novo Primeiro Ministro.
Era o assunto mais comentado na cidade.

"Você viu o novo Primeiro Ministro?"

"É aquele digno cavalheiro vestido com uma fina capa de linho, Mordechai, o Judeu?

"Sim, e você viu a túnica azul e branca debaixo da púrpura e ouro? Impressionante!"

Toda a cidade de Shushan borbulhava de entusiasmo, mas os judeus estavam completamente atônitos.

"Graças a D’us!"

"Que milagre! Agora que Mordechai foi homenageado e promovido, nossos inimigos não ousarão nos atacar!"

"Tenho certeza de que Mordechai está aceitando a homenagem exatamente por causa disso."
"O que quer dizer?"

"Acha realmente que um sábio reverenciado como Mordechai está interessado em toda essa honra e riqueza? É claro que não se importa com essas coisas,
mas nossa situação desesperada exige que as aceite; assim, nossos inimigos terão medo de atacar."

"E olhe – aquela túnica azul e branca é, na verdade, um talit feito de lã branca com o cordão azul de tsitsit."

O que mais impressionava os judeus era a visão do justo sábio, usando tefilin sobre a coroa de ouro que faiscava sobre sua cabeça.

Em todos os países e cidades atingidos pela palavra e pela lei do monarca, os judeus se rejubilavam e celebravam. Durante o período de perseguição, muitos
judeus haviam se escondido. Agora, finalmente, po-diam emergir sem temor. Antes, vestiam aniagem e cinzas; agora, caminhavam triunfalmente. Enquanto o
decreto tinha validade, tinha sido um insulto ser chamado de judeu; agora era uma honra.

Porém, o mais importante era que os judeus se rejubilassem em seu renovado compromisso com Torá e mitsvot. Ser judeu fora tão perigoso, que muitos
judeus ignorantes tinham pensado em abandonar a Torá. Agora retornavam à vida religiosa ainda mais forte que antes. Aqueles que haviam tido medo de
circuncidar os filhos imediatamente cumpriram essa mitsvá. Como as pessoas tinham visto Mordechai usando tefilin sobre a coroa, renovaram a prática dessa
mitsvá sem medo.

A milagrosa cadeia de eventos teve forte impacto também sobre a população em geral. A aristocracia se aliava tão fortemente aos judeus que era quase como
se tivesse se convertido. Muitos inimigos dos judeus também se disfarçavam de judeus, temendo pela vida.

Quando o dia 13 de Adar finalmente chegou, todos viram como a mão de D’us dirigira o curso da História. O próprio dia escolhido por Haman para a destruição
dos judeus provara ser a hora de seu maior triunfo. As intenções de Haman haviam se frustrado com a ajuda de D’us.

Ninguém viera em ajuda dos inimigos dos judeus por medo das conseqüências. Trabalhadores e empresários também apoiavam os judeus. Os nobres e os
governadores alinharam-se com os judeus, por medo de Mordechai, cuja reputação estava crescendo em todo o império.

Entretanto, os judeus não se sentiam completamente fora de perigo. Os seguidores de Haman ainda tinham posições importantes. Nas províncias mais
distantes, o perigo era maior. Os judeus viviam em cidades abertas, sem muralhas, onde os inimigos podiam atacar tanto de fora como de dentro, e podiam
facilmente superá-los em número.

Nessas províncias, os comparsas de Haman não temiam Mordechai tanto quanto os de Shushan. Às vezes, os judeus dessas cidades não tinham apoio total
dos ministros e dos exércitos do rei.
Setenta e cinco mil inimigos dos judeus estavam preparados para cumprir ao pé da letra o decreto de Haman. Sendo na maioria descendentes de Amalek,
estavam determinados a matar qualquer um que suspeitassem ser judeu. Buscavam vingança pela morte de Haman, bem como a satisfação de assassinar
judeus.

Os judeus reuniram-se para lutar, orando a D’us por ajuda contra os inimigos. Mordechai declarou um jejum nacional, mandando a seguinte mensagem a todos
os judeus: "Devemos jejuar e rezar no dia anterior à batalha, como foi feito por Moshê e Yehoshua. Isto nos trará a ajuda de D’us. No futuro, este jejum seria
comemorado como Taanit Ester, na véspera de Purim.
Os judeus se uniram como se fossem um só. De bom grado, cada judeu ofereceria sua vida para defender o próximo. Antes de enfrentar os inimigos, oraram e
se arrependeram por todas as faltas passadas. Prepararam os exércitos e lutaram em autodefesa no dia 13 de Adar, eliminando os inimigos.

Em Shushan, a situação era mais complicada. Por um lado, a influência de Mordechai e Ester estava mais forte. Por outro, o centro das atividades antijudaicas
era baseado nesta cidade. Liderados pelos dez filhos de Haman, determinados a vingar a morte do pai, havia muitos que não hesitavam em atacar os judeus.
Para se defenderem, os judeus mataram quinhentos de seus atacantes; porém, cuidadosamente abstiveram-se de tomar posse das propriedades dos
vencidos.

"Acho que entendo por que Mordechai nos instruiu a não tomar os despojos de guerra" – disse um guerreiro judeu a outro.

"Obviamente" – disse o amigo – "quer provar que não lutamos por causa dos saques."

"Isso também" – concordou o primeiro – "mas eu estava só pensando. Estamos nos defendendo dos seguidores de Haman, descendentes dos amalequitas.
Quando o rei Shaul guerreou contra Amalek, cometeu um pecado ao guardar os despojos. Agora, estamos expiando aquela transgressão, não tocando nesses
saques."

Naquela tarde, Mordechai anunciou um cessar fogo, parando todas as operações de guerra. A ameaça imediata fora contida. "Embora tenhamos recebido
permissão para matar nossos inimigos por todo o dia, quero mostrar que o povo judeu não tem sede de sangue" – explicou.
Para que todos soubessem que a autoridade real fora concedida aos judeus, o rei ordenou que um relatório dos fatos lhe fosse entregue em mãos. A lista dos
mortos e suas propriedades foi apresentada ao soberano, incluindo uma contabilidade acurada, tornando claro que nada do butim estava faltando.

Com o relatório em mãos, o rei Achashverosh procurou a rainha Ester. "O que deseja agora? Será concedido. O que mais quer? Será feito."

Ester viu que a ocasião era favorável para fazer mais pedidos. O rei finalmente percebera que os seguidores de Haman eram um elemento perigoso e
indesejável no império. "Majestade" – disse ela – "se for do agrado do rei e se quiser que o império prospere, permita que os judeus de Shushan lutem amanhã
contra os seguidores de Haman, como fizeram hoje. Restam muitos partidários de Haman em Shushan, que cometerão atos de terrorismo para vingar sua
morte. Permita também que os dez filhos de Haman sejam enforcados no cadafalso."

O rei percebeu que Mordechai havia parado a luta ao meio-dia, e concordou com o pedido de Ester. O enforcamento dos filhos de Haman deixou seus
seguidores muito deprimidos, e os judeus conseguiram sobrepujar os inimigos também no dia 14 de Adar. Executaram trezentos oponentes que ainda ousaram
atacar. Novamente, ninguém tocou nos despojos de guerra.

Dessa maneira, os eventos daqueles dias tornaram-se História. Nas províncias, os judeus ainda tiveram medo na manhã de 14 de Adar. Apesar da miraculosa
derrota de seus inimigos, os judeus temeram um contra ataque. Entretanto, o dia se escoou pacifica e calmamente, então puderam depor as armas e
descansar. Como foi no dia 14 de Adar que a extensão do milagre se tornou conhecida, os judeus declararam este dia uma data festiva. Festejando e se
rejubilando, os judeus habitantes das províncias longínquas celebraram o grande milagre.

Em Shushan, os judeus lutaram tanto no dia 13 como no 14 de Adar, e não depuseram as armas até o dia 15.

Por esse motivo, foi no dia 15 que celebraram. O dia festivo não foi estabelecido para celebrar a derrota do inimigo, mas como reconhecimento da milagrosa
libertação. Não comemoraram a vingança, mas a própria sobrevivência contra todas as adversidades. A celebração principal, portanto, não foi feita no dia da
vitória, mas no dia em que puderam descansar da guerra.
Mais tarde, os sábios da Grande Assembléia discutiram como fixar a data precisa na qual estabelecer a celebração oficial de Purim.

"Parece lógico legislar que em Shushan os judeus deveriam celebrar no dia 15, ao passo que todas as outras cidades o façam no dia 14" – sugeriu um sábio.

Isso criaria uma diferença no cumprimento entre nosso povo" – argumentou um segundo.

"Mas há uma grande diferença" – insistiu o primeiro. "Estes dois dias na verdade comemoram duas vitórias diferentes. A celebração no dia 14 é pelo triunfo
dos judeus nas províncias, enquanto no dia 15 comemora-se a vitória em Shushan."

"Um momento" – disse um terceiro. "Não podemos esperar que os judeus vivam em Shushan para sempre. E se o milagre especial de Shushan for
esquecido?"

Os homens na Grande Assembléia consideraram o assunto. Finalmente, um se pronunciou: "Podemos destacar um aspecto de Shushan e usá-lo como
símbolo para identificar outras cidades que queremos equiparar a Shushan. Nestas cidades, as celebrações serão no dia 15 de Adar, como em Shushan. Isso
vai assegurar a preservação do dia festivo distinto.

"A cidade de Shushan é cercada por muralhas de proteção. Podemos proclamar que todas as cidades que, como a capital, tenham muralhas, devem celebrar
no dia 15."

Os sábios concordaram, mas um ancião levantou um ponto importante: "Nossa Terra natal, Israel, agora jaz em ruínas. Jerusalém, nossa cidade sagrada, não
mais possui muralhas. É correto estabelecer uma lei pela qual o status de Jerusalém será menor que o de outras cidades com muralhas em todo o mundo? A
festa então terá que ser celebrada no dia 14 em Jerusalém, como se fosse uma cidadezinha não cercada?"

Os sábios tinham uma resposta: "Em vez de atribuir o status especial de Shushan a cidades com muralhas nos dias de Achashverosh, podemos fazer uma
emenda no decreto, aplicando-o a cidades muradas desde os dias da conquista de Israel por Yehoshua. Automaticamente, isso dará especial categoria a
Jerusalém e a outras cidades da Terra Santa."

"Escolhendo os dias de Yehoshua como ponto de partida terá significado especial" – comentou um sábio. "Ele foi o primeiro judeu a batalhar contra Amalek."

"Criar um dia festivo a 15 de Adar é também muito significativo" – disse outro. "É um dia apropriado do mês, e combinará com outras datas importantes no
nosso calendário, como Pêssach, a 15 de Nissan; Sucot, a 15 de Tishrei; Tu Bishvat, a 15 de Shevat e Tu Beav, a 15 de Av. Todos esses dias festivos, que
coincidem com o plenilúnio, comemoram importantes datas judaicas. Como Israel é comparada à Lua, faz sentido celebrarmos quando a lua está cheia."

Todos os sábios concordaram; assim, isso foi transformado em lei: cidades com muralhas protetoras ao tempo de Yehoshua deveriam celebrar no dia 15;
todas as outras cidades no dia 14.

Mordechai registrou a história do milagre e ordenou que fosse recontada todos os anos. Mandou pergaminhos a todos os judeus do império, bem como
àqueles que viviam além das fronteiras. Todos estariam obrigados a festejar a data, até mesmo os muitos judeus que haviam fugido para países fora do
Império Persa, e haviam estado relativamente a salvo do decreto de Haman.

Alguns desses judeus questionaram a nova legislação. "Não é proibido adicionar festas àquelas já mencionadas na Torá?"

"Além disso, o mar não se abriu! Não houve milagres claros como no Êxodo do Egito" – adicionou outro.

"Mordechai não deu a este dia festivo o status dos dias santos proclamados pela Torá. Fazê-lo significaria proibir o trabalho. É permitido trabalhar neste dia
festivo" – responderam outros.
"Então como vamos celebrar?"

As pessoas revisaram cuidadosamente as instruções de Mordechai. "Primeiro, devemos ler os rolos e recontar a história. E precisamos mandar pacotes de
comida a nossos amigos."

"Isso se parece com um costume local" – comentou um dos judeus nativos. Quando os soldados voltam da guerra, mandam presentes aos amigos e parentes
em comemoração à sua sobrevivência na batalha."

"O que mais Mordechai nos mandou fazer?"

"Bem, ordenou que todos celebrassem. Como o perigo foi igual para todos, ricos e pobres, o pobre também deve rejubilar-se."

"Como isso pode ser feito?"


"Mordechai disse-nos para fazer caridade e para assegurarmo-nos de que todos os judeus estejam felizes nesse dia. A outra mitsvá deste dia é fazer uma
refeição festiva, comer e beber alegremente e dar graças a D’us pelos grandes milagres."

"Parece que o episódio inteiro se desenrolou durante banquetes" – alguém comentou.


"Sim!" – concordou outro.

"Primeiro, Achashverosh organiza uma festa para a aristocracia. Em seguida, outra para o público."

"Não esqueça a festa de Vashti" – intercalou um terceiro.

"E quando Ester foi escolhida como rainha, o rei deu uma festa em sua homenagem."

"Haman selou o decreto contra os judeus bebendo numa festa com Achashverosh."

"Que irônico! Sua própria queda aconteceu no segundo banquete de Ester. E agora teremos outro festim. Bem, é melhor correr para casa e dizer às nossas
esposas que comecem a cozinhar."

Todos os judeus de todo o império aceitaram prontamente os decretos de Mordechai e da Grande Assembléia de sábios. Muitos tinham mesmo começado a
guardar o dia festivo por conta própria, e queriam mantê-lo todos os anos. Agora que tinha sido oficialmente transformado em lei, ficaram contentes e
aceitaram isso como uma obrigação.

O dia festivo seria chamado Purim, plural da palavra "pur" – os lances decisivos que haviam sido jogados como tentativa de condenar o povo judeu. Haman
tinha acreditado numa escolha ao acaso, pensando que o "pur" controlaria os acontecimentos, mas o milagre de Purim revelara que D’us controlava o
desenrolar da História da Humanidade.

Os judeus aceitaram manter o dia festivo através das gerações em cada família, em cada país e em cada cidade. Os dias de Purim nunca caducariam entre os
judeus, e sua memória jamais se extinguirá.

Mesmo depois que Mordechai e Ester viram a aceitação do dia festivo pelos judeus, escreveram uma versão oficial do pergaminho anterior. Estavam
preocupados de que, em futuros tempos de perseguição, os judeus pudessem considerar Purim inapropriado, e que não ousassem celebrar a vitória sobre os
inimigos, por medo de que fazê-lo despertasse ainda mais ódio e perigo. O fato de que o motivo para Purim seria bem conhecido, e que foi até mesmo escrito
nos registros oficiais dos persas e medeanos, reasseguraria aos judeus e daria às futuras gerações coragem para manter o dia festivo.

A rainha Ester escreveu aos sábios, solicitando que a recém-instituída leitura da Meguilá fosse feita de um rolo de pergaminho, escrito na mesma maneira que
um Rolo de Torá. Ela explicou que escrever a história de como os judeus derrotaram os seguidores de Haman era parte da mitsvá na Torá para lembrar os
cruéis atos de Amalek.

Os sábios concordaram com seu pedido e proclamaram que a Meguilá havia sido escrita com Rúach Hacôdesh (inspiração Divina). Como Ester havia
arriscado a vida por seu povo, seria conhecida como Meguilat Ester (Rolo de Ester).

As grandiosas lições de Purim são reconfirmadas através da História. Mordechai instruiu os judeus a não abandonar o estudo de Torá. Negligenciar a Torá
havia levado à perseguição persa, e o mérito das crianças que estudavam Torá havia salvado os judeus.

Quando Ester disse a Mordechai para "ir e reunir todos os judeus", havia enfatizado a necessidade de união. Este espírito de união provocou o milagre; e neste
espírito de união, os judeus aceitaram o dia festivo que permite hoje esta celebração.

Até o rei Achashverosh estava feliz. Como resultado de sua ajuda aos judeus, recobrara muitas das terras que havia perdido. Renovara seu domínio sobre
muitos outros países e ilhas, restabelecendo sua administração e aumentando sua renda através de novos impostos.

O rei Achashverosh havia escritos nos registros reais os eventos de seu poderoso governo. Descreveu em detalhes a história da promoção de Mordechai e
sua competência em dirigir o império. O mundo todo ficou sabendo que Achashverosh havia chegado à sua grandeza graças à ajuda de Mordechai e por
causa do bem que havia feito ao povo judeu.

Mesmo com sua alta posição de ser o segundo do reinado, Mordechai não perdeu sua preocupação com o povo. Ao contrário, usava seu escritório público
para ajudar os judeus sempre que possível. Não esperava que o procurassem com problemas, mas buscava ativamente maneiras de ajudá-los.

Mordechai era conhecido por sua bondade a todos, judeus e não-judeus igualmente. Como resultado, os habitantes de cada país falavam bem do povo judeu e
procuravam sua ajuda.
Com tudo isso, Mordechai permaneceu "Mordechai o Judeu", o homem que preservou seu judaísmo sem concessões, ensinando a verdade e a paz a todos.
Meguiláh de Esther Resumido

Capítulo I

(1) E sucedeu nos dias de Achashverosh - o Achashverosh que reinou desde a Índia até a Etiópia, sobre cento e vinte e sete províncias.

(2) Naqueles dias, assentando-se o rei Achashverosh no trono real, em Shushan, a capital.

(3) No terceiro ano de seu reinado, ofereceu um banquete a todos seus oficiais e servos; o exército da Pérsia e da Média, os governadores e oficiais das
províncias estavam presentes.

(4) Quando exibiu a opulência de seu reino glorioso e o esplendor de sua grandiosa majestade, durante muitos dias - cento e oitenta dias.

(5) E passados esses dias, ofereceu o rei a todo povo que se achava em Shushan, a capital, dos maiores aos menores, um banquete de sete dias, no pátio do
jardim do palácio real.

(6) Havia cortinas de fina lã branca e azul-celeste, enlaçadas com cordões de fino linho e de púrpura sobre trilhos de prata e pilares de mármore; os divãs eram
de ouro e de prata sobre um pavimento de pórfiro verde e branco, de madrepérola e ônix.

(7) As bebidas foram servidas em utensílios de ouro - cada utensílio diferente do outro - com vinho real em abundância, segundo a generosidade do rei.

(8) E a bebida foi conforme a lei: sem coerção; pois assim o rei ordenara a todos os oficiais de sua casa, que fizessem segundo a vontade de cada um.

(9) Também a rainha Vashti ofereceu um banquete às mulheres no palácio do rei Achashverosh.

(10) Ao sétimo dia [Shabat], estando o coração do rei já alegre pelo vinho, ordenou a Mehuman, Biztá, Charvoná, Bigtá e Avagtá, Zetar e Charcás - os sete
camareiros que atendiam o rei Achashverosh.

(11) Que trouxessem a rainha Vashti à presença do rei, com a coroa real, para exibir aos povos e aos oficiais sua beleza; pois ela era muito formosa.

(12) Porém, recusou-se a rainha Vashti a vir segundo a ordem real por intermédio dos camareiros; por isso, se enfureceu muito o rei e se inflamou de ira.

(13) Consultou, então, o rei os peritos, conhecedores dos tempos - pois assim era o procedimento do rei [dirigir-se] a todos os conhecedores da Lei e do
Direito.

(14) Os mais chegados a ele eram: Carshená, Shetar, Admatá, Tarshish, Mêres, Marsená [e] Memuchan, os sete oficiais da Pérsia e da Média que tinham
acesso ao rei e ocupavam os primeiros assentos do reino.

(15) Sobre o que se devia fazer, legalmente, à rainha Vashti por não obedecer a licitação do rei Achashverosh transmitida pelos camareiros.

(16) Então declarou Memuchan perante o rei e os oficiais: "Não é só contra o rei que procedeu mal a rainha Vashti, mas também contra todos os oficiais e
contra todos os povos de todas as províncias do rei Achashverosh.

(17) Pois o ato da rainha chegará à atenção de todas as mulheres, de modo a seus maridos ficarem desprezíveis a seus olhos, quando disserem: "O rei
Achashverosh mandou vir a rainha Vashti a sua presença, porém ela não foi!."

(18) Neste dia, as princesas da Pérsia e da Média, ao ouvirem sobre o ato da rainha, citarão [o fato] a todos os oficiais do rei; e haverá muito desprezo e
indignação.

(19) Se bem parecer ao rei, que se promulgue um édito real de sua parte, e que se inscreva nas leis da Pérsia e da Média, irrevogavelmente, que Vashti não
torne mais à presença do rei Achashverosh, e que o rei confira seu estado real a outra [mulher], melhor do que ela.

(20) E quando for ouvido o édito que o rei proclamar em todo seu reino - vasto que é - todas as esposas hão de honrar seus maridos, dos mais importantes aos
menos importantes."

(21) A proposta agradou ao rei e aos oficiais, e o rei fez conforme a palavra de Memuchan.

(22) Enviou cartas a todas as províncias do rei, a cada província segundo sua escrita, e a cada povo segundo seu idioma, com o propósito de que cada homem
fosse senhor em sua casa e falasse o idioma de seu próprio povo.

Capítulo II

(1) Após esses fatos, já aplacada a ira do rei Achashverosh, lembrou-se de Vashti e do que ela fizera e do que fora decretado contra ela.

(2) Então disseram os moços do rei, seus servidores: "Procurem-se moças para o rei, donzelas jovens e de boa aparência.

(3) E que o rei nomeie comissários em todas as províncias de seu reino para que reúnam todas as donzelas jovens e de boa aparência em Shushan, a capital,
no harém, sob os cuidados de Heguê, camareiro do rei, guarda das mulheres; e dêem-se-lhes seus cosméticos.
(4) Então, a moça que cair no agrado do rei, reinará em lugar de Vashti." O conselho agradou ao rei, que assim fez.

(5) Havia um homem judeu em Shushan, a capital, cujo nome era Mordechai, filho de Yair, filho de Shim'i, filho de Kish, da tribo de Binyamin.

(6) Que fora desterrado de Jerusalém no degredo junto com os que haviam sido exilados com Yechonyá, rei de Yehudá, exilado por Nevuchadnetsar, rei da
Babilônia.

(7) Criara ele a Hadassá, i.e., Ester, filha de seu tio, pois não tinha pai e mãe. E a moça era de porte formoso e de boa aparência; e quando morreram o pai e a
mãe, Mordechai a adotara como filha.

(8) E sucedeu que, ao se divulgar a solicitação real e seu decreto, e ao se reunir um grande número de moças em Shushan, a capital, sob os cuidados de
Hegai, foi levada Ester ao palácio aos cuidados de Hegai, guarda das mulheres.

(9) A moça caiu em seu agrado e obteve seu favor; ele se apressou em preparar seus cosméticos e seus alimentos especiais, e mais sete aias a ela
designadas pelo palácio; e a transferiu com suas aias para os melhores aposentos do harém.

(10) Não contou Ester sobre seu povo nem sobre seu parentesco, pois Mordechai a instruiu que não contasse.

(11) Cada dia Mordechai passava diante do pátio do harém para saber como passava Ester e o que lhe sucedia.

(12) Ora ao chegar a vez de cada moça vir ao rei Achashverosh, depois de tratada segundo à maneira prescrita para as mulheres, por doze meses - pois este
foi o tempo prescrito para realizar seu embelezamento: seis meses com óleo de mirra e seis meses com perfumes e cosméticos femininos.

(13) Quando a moça vinha ao rei, tudo o que solicitava era-lhe dado para acompanhá-la do harém ao palácio.

(14) Ao entardecer entrava e pela manhã retornava ao segundo harém, aos cuidados de Shaashgaz, o camareiro do rei, guarda das concubinas. Não tornava
mais ao rei, salvo se o rei a desejasse de volta, e fosse chamada pelo nome.

(15) Quando chegou a vez de Ester, filha de Avicháyil - tio de Mordechai, que a adotara como filha - apresentar-se ao rei, nada pediu além do que
recomendara Hegai, camareiro do rei, guarda das mulheres. E sucedeu que Ester cativou todos que a viram.

(16) Foi levada Ester ao rei Achashverosh, a seu palácio, no décimo mês, que é o mês de Tevêt, no sétimo ano de seu reinado.

(17) Amou o rei a Ester mais do que a todas as mulheres, e ela encontrou graça e favor perante ele mais do que todas as donzelas; e pôs-lhe a coroa real na
cabeça e a fez rainha no lugar de Vashti.

(18) Ofereceu então o rei um grande banquete a todos seus oficiais e servos - foi o banquete de Ester - e proclamou anistia [fiscal] a todas as províncias e
distribuiu presentes à altura de um rei.

(19) Quando, pela segunda vez, foram reunidas donzelas e Mordechai estava assentado ao portão real.

(20) Ainda não havia Ester contado de seu parentesco nem de seu povo, conforme lhe instruira Mordechai, pois a ordem de Mordechai, Ester cumpria como
quando estava sob sua tutela.

(21) Naqueles dias, estando Mordechai assentado ao portão real, indignaram-se Bigtan e Têresh, dois camareiros do rei, da guarda da porta, e tramaram
atentar contra o rei Achashverosh.

(22) Chegou a conspiração ao conhecimento de Mordechai, que a contou à rainha Ester; e Ester informou o rei, em nome de Mordechai.

(23) Investigou-se o caso e, confirmado, foram ambos enforcados. Isso foi consignado no livro de crônicas na presença do rei.

Capítulo III

(1) Após esses fatos, promoveu o rei Achashverosh a Haman, filho de Hamdata, o agaguita, e o exaltou, pondo sua cadeira acima da de todos os oficiais que
estavam com ele.

(2) E todos os servos do rei do portão real se ajoelhavam e se prostravam perante Haman, pois assim havia ordenado a esse respeito o rei. Porém Mordechai
não se ajoelhava nem se prostrava.

(3) Então disseram os servos do rei do portão real, a Mordechai: "Por que transgrides a ordem do rei?"

(4) E sucedeu que, tendo-lhe dito isso dia após dia, e como não lhes desse ouvidos, contaram então a Haman, para ver se as palavras de Mordechai se
manteriam, pois lhes tinha declarado que era judeu.

(5) Haman, vendo que Mordechai não se ajoelhava, nem se prostrava perante ele, encheu-se de ira.

(6) Porém, menosprezou a seus olhos atentar apenas contra Mordechai, porque lhe haviam contado de que povo era Mordechai; pelo que procurou Haman
aniquilar todos os judeus que havia em todo o reino de Achashverosh, o povo de Mordechai.
(7) No primeiro mês, que é o mês de Nissan, no ano duodécimo do reinado de Achashverosh, lançou-se o pur, isto é, a sorte, na presença de Haman, de dia
em dia, de mês em mês, até o duodécimo, que é o mês de Adar.

(8) Disse, então, Haman ao rei Achashverosh: "Existe um povo, espalhado e disperso, dentre os demais povos de todas as províncias de teu reino, cujas leis
são diferentes de qualquer outro povo, e que não cumpre as leis do rei; pelo que não convém ao rei conservá-lo.

(9) Se bem parecer ao rei, decreta-se, pois, que sejam mortos, e dez mil talentos de prata pesarei em mãos dos encarregados do serviço para serem
depositados no tesouro real."

(10) Então o rei tirou seu sinete da mão e deu-o a Haman, filho de Hamdata, o agaguita, inimigo dos judeus.

(11) Disse o rei a Haman: "Esta prata te é dada, como também este povo, para fazeres dele o que mais te agradar."

(12) Foram chamados, pois, os escrivães do rei no dia treze do primeiro mês, e escreveu-se tudo quanto havia ordenado Haman aos sátrapas do rei, aos
governantes de cada província e aos oficiais de cada povo; a cada província segundo sua escrita e a cada povo segundo sua língua; escrito em nome do rei
Achashverosh e selado com o sinete real.

(13) Expediram-se cartas, por meio de homens dos correios, a todas as províncias do rei, para que aniquilassem, matassem e exterminassem todos os judeus,
jovens e velhos, crianças e mulheres, em um só dia, no dia treze do duodécimo mês, que é o mês de Adar, e que lhes saqueassem os bens.

(14) Que uma cópia do decreto fosse proclamada como lei em cada província, e [divulgada] de forma clara a todos os povos para que se preparassem para
aquele dia.

(15) Os homens do correio partiram apressadamente com a ordem real, e a lei foi proclamada em Shushan, a capital; o rei e Haman sentaram-se a beber, mas
a cidade de Shushan se achava perplexa.

Capítulo IV

(1) Quando soube Mordechai tudo o que se havia passado, rasgou suas vestes, cobrindo-se [de pano] de saco e de cinzas, e saiu pelo meio da cidade a
clamar com grande e amargo clamor.

(2) Chegou até a frente do portão real; porque ninguém podia passar pelos portões reais coberto [de pano] de saco.

(3) E em todas as províncias a que chegava a ordem do rei e a sua lei, havia grande luto entre os judeus, jejum, choro e lamentação; e em [pano de] saco e em
cinza deitavam-se muitos.

(4) Então vieram as aias de Ester e seus camareiros contar-lhe; estremeceu muito a rainha e mandou roupas com que vestir a Mordechai e tirar-lhe o [pano de]
saco; porém não as aceitou.

(5) Então convocou Ester a Hatach, um dos camareiros do rei, enviado para servi-la, e ordenou [que fosse] a Mordechai a fim de saber o que e por que era
aquilo.

(6) Saiu Hatach ao encontro de Mordechai, à praça da cidade, diante do portão real.

(7) Contou-lhe Mordechai tudo quanto se passava, bem como o montante de prata que Haman tinha prometido pagar ao tesouro real pelo extermínio dos
judeus.

(8) Também a cópia do decreto escrito que se proclamou em Shushan, da aniquilação, deu-lhe para mostrar a Ester e esclarecê-la; e ordenou que fosse ao rei
suplicar-lhe e pedir-lhe por seu povo.

(9) Retornou Hatach e contou a Ester as palavras de Mordechai.

(10) Então respondeu Ester a Hatach e mandou-o dizer a Mordechai:

(11) "Todos os servos do rei e o povo das províncias do rei sabem que qualquer homem ou mulher que for ter com o rei no pátio interior sem ser chamado, não
terá senão uma sentença, a de morte, salvo a quem o rei estender o cetro de ouro para que viva; e eu não fui chamada para ter com o rei nestes trinta dias.

(12) Comunicaram a Mordechai as palavras de Ester.

(13) Disse Mordechai que respondessem a Ester: "Não imagines que, por estares no palácio do rei, escaparás dentre todos os judeus.

(14) Pois se te calares agora, alívio e salvação erguer-se-ão para os judeus de outra parte, mas tu e a casa de teu pai havereis de perecer; e quem sabe se
para uma oportunidade como esta chegaste ao reino."

(15) Então disse Ester para responder a Mordechai:

(16) "Vai, reúne todos os judeus que se encontram em Shushan, e jejuai por mim; não comais nem bebais três dias, dia e noite. Também eu e minhas aias
assim jejuaremos. E desse modo irei ter com o rei, embora contra a lei; e se tiver de perecer, perecerei."

(17) Mordechai foi e fez tudo conforme Ester lhe havia ordenado.
Capítulo V

(1) E sucedeu que no terceiro dia, Ester vestiu seus trajes reais, indo postar-se no pátio interno do palácio real, defronte aos aposentos do rei; e o rei estava
sentado em seu trono real, no palácio real, defronte à entrada do salão.

(2) E tão logo avistou a rainha Ester parada no pátio, caiu em seu agrado. Estendeu o rei a Ester o cetro de ouro que tinha na mão; Ester aproximou-se e tocou
a ponta do cetro.

(3) Disse-lhe, então, o rei: "Que tens, rainha Ester? E qual é teu desejo? Até a metade do reino ser-te-á dado."

(4) Respondeu Ester: "Se bem parecer ao rei, venha o rei e Haman hoje ao banquete que preparei para ele."

(5) Disse, então, o rei: "Fazei apressar a Haman, para que se cumpra a palavra de Ester." Vieram o rei e Haman ao banquete preparado por Ester.

(6) Disse o rei a Ester durante o banquete do vinho: "Qual é teu pedido? E ser-te-á dado. E qual é teu desejo? Até a metade do reino será concedido."

(7) Então respondeu Ester e disse: "Meu pedido e meu desejo [são]:

(8) Se alcancei graça aos olhos do rei, e se bem parecer ao rei atender meu pedido e conceder meu desejo, venha o rei com Haman ao banquete que lhes hei
de preparar, e amanhã, farei conforme a palavra do rei."

(9) Haman saiu naquele dia, alegre e de coração exultante, Mas, assim que Haman avistou Mordechai junto do portão real, sem que se levantasse ou movesse
diante dele, encheu-se Haman de ira contra Mordechai.

(10) Haman se conteve, foi para casa e mandou vir seus queridos e sua mulher Zêresh.

(11) Contou-lhes Haman a glória de sua riqueza, o grande número de seus filhos e tudo que o rei o havia engrandecido e de como o havia exaltado acima dos
príncipes e dos servos do rei.

(12) Disse Haman: "Até mesmo a rainha Ester a ninguém fez vir com o rei ao banquete que preparara, senão a mim; e também para o dia seguinte estou
convidado por ela, juntamente com o rei.

(13) Porém tudo isto não me tem valor, enquanto vir o judeu Mordechai sentado ao portão real."

(14) Então lhe disse Zêresh, sua mulher, e todos seus queridos: "Manda preparar uma forca numa árvore de cinqüenta côvados de altura, e pela manhã dize
ao rei que nela enforque Mordechai; e vai alegre em companhia do rei ao banquete." A sugestão agradou a Haman, e ele preparou a forca na árvore.

Capítulo VI

(1) Naquela noite vagava o sono do rei; então mandou trazer o livro de registro das crônicas. Foram lidas perante o rei.

(2) Achou-se escrito que Mordechai havia denunciado a Bigtana e Têresh, os dois camareiros do rei, da guarda da porta, que haviam tramado um atentado
contra o rei Achashverosh.

(3) Disse, então, o rei: "Que honra e distinção foram prestadas a Mordechai por isso?" Disseram os lacaios do rei que o serviam: "Nada lhe foi conferido."

(4) Disse o rei: "Quem está no pátio?" Ora Haman havia entrado no pátio externo do palácio real, para dizer ao rei que enforcasse Mordechai na árvore que
mandara preparar para ele.

(5) Disseram-lhe os lacaios do rei: "Haman está no pátio." Disse o rei: "Que entre."

(6) Entrou Haman e o rei lhe disse: "Que se deve fazer ao homem a quem o rei deseja honrar?" Pensou Haman consigo mesmo: "A quem o rei há de querer
honrar mais do que a mim?"

(7) Disse Haman ao rei: "O homem a quem o rei deseja honrar.

(8) "Que se lhe tragam as vestes reais usadas pelo rei e o cavalo que serve de montaria ao rei e que lhe seja colocada a coroa real na cabeça.

(9) "E que se entreguem as vestes e o cavalo às mãos de um dos príncipes dentre os fidalgos do rei, e vistam com elas o homem a quem o rei deseja honrar; e
levem-no a cavalo pela praça da cidade, e apregoem diante dele: 'Assim se faz ao homem a quem o rei deseja honrar.'"

(10) Disse então o rei a Haman: "Apressa-te, toma as vestes e o cavalo, conforme disseste, e faze assim com Mordechai, o judeu, que está assentado ao
portão real; e não omitas coisa nenhuma de tudo o que disseste."

(11) Haman pegou as vestes e o cavalo e vestiu a Mordechai e fê-lo andar montado pela praça da cidade e apregoou diante dele: "Assim se faz ao homem a
quem o rei deseja honrar."
(12) Tornou Mordechai ao portão real; Haman, porém, precipitou-se para casa, sorumbático e de cabeça coberta [de vergonha].

(13) Contou Haman a Zêresh, sua mulher, e a todos seus amigos tudo que lhe tinha sucedido. Disseram-lhe então seus conselheiros e Zêresh, sua mulher:
"Se for de origem judaica este Mordechai diante de quem começaste a cair, nada conseguirás contra ele; e acabarás, certamente, caindo perante ele."

(14) Ainda conversavam, quando chegaram os camareiros do rei, e apressaram-se em conduzir Haman ao banquete preparado por Ester.

Capítulo VII

(1) Veio, pois, o rei com Haman festejar com a rainha Ester.

(2) Disse o rei para a Ester também no segundo dia durante o banquete do vinho: "Qual é teu pedido, rainha Ester? E ser-te-á dado. E qual é teu desejo? Até a
metade do reino será concedido."

(3) Então a rainha Ester respondeu e disse: "Se alcancei graça a teus olhos, ó rei, e se bem parecer ao rei, que me seja dada minha vida em [troca de] meu
pedido, e a de meu povo em [troca de] meu desejo.

(4) Pois fomos vendidos, eu e o meu povo, para sermos aniquilados, mortos e exterminados. Se ainda fôssemos vendidos como escravos e servas, calar-me-
ia, pois o inimigo não valoriza o prejuízo que terá o rei."

(5) Falou então o rei Achashverosh e disse à rainha Ester: "Quem é este e onde está este, cujo coração se inclinou a proceder assim?"

(6) Disse Ester: "O tal homem cruel e inimigo é este perverso Haman." Então Haman se atemorizou perante o rei e a rainha.

(7) E o rei levantou-se, furioso, do banquete do vinho, [passando] para o jardim do palácio. E Haman ficou a rogar por sua vida à rainha Ester, pois viu que todo
o mal contra ele já estava [determinado] pelo rei.

(8) E o rei tornou do jardim do palácio ao local do banquete do vinho, e eis que Haman estava caído sobre o divã em que se encontrava Ester. Exclamou o rei:
"Acaso terias querido forçar a rainha na minha presença [e] em minha própria casa?" Tão logo a frase saiu dos lábios do rei, cobriu-se [de vergonha] o rosto de
Haman.

(9) Disse, então, Charvoná, um dos camareiros do rei: "Eis que a forca na árvore, de cinqüenta côvados de altura, que preparou Haman para Mordechai, que
falara em benefício do rei, encontra-se na casa de Haman." Disse o rei: "Enforcai-o nela."

(10) Enforcaram, pois, Haman na árvore que havia preparado para Mordechai. Então a ira do rei se aplacou.

Capítulo VIII

(1) Naquele dia, deu o rei Achashverosh à rainha Ester a casa de Haman, inimigo dos judeus; e Mordechai veio perante o rei, pois Ester lhe revelara o que ele
era para ela.

(2) Tirou o rei seu sinete que havia tomado de Haman e deu-o a Mordechai. E Ester pôs Mordechai [para dirigir] a casa de Haman.

(3) Tornou Ester a falar perante o rei, lançando-se a seus pés, chorou e lhe implorou que revogasse a maldade de Haman, o agaguita, e seu plano tramado
contra os judeus.

(4) Estendeu o rei para Ester o cetro de ouro. Então, levantou-se Ester, pondo-se de pé perante o rei.

(5) Ela disse: "Se bem parecer ao rei, se alcancei graça perante ele, se a causa é justa diante do rei e se lhe sou agradável a seus olhos, escreva-se
revogando as cartas concebidas por Haman, filho de Hamdata, o agaguita, as quais escreveu para exterminar os judeus em todas as províncias do rei.

(6) Pois como poderei assistir ao mal que sobrevirá a meu povo? E como poderei assistir à destruição de minha linhagem?"

(7) Disse o rei Achashverosh à rainha Ester e a Mordechai, o judeu: "Eis que a casa de Haman dei a Ester, e a ele enforcaram por tramar contra os judeus.

(8) Escrevei, pois, a respeito dos judeus, como bem vos parecer, em nome do rei, e selai-o com o sinete real, pois os decretos escritos em nome do rei e
selados com o sinete real não podem ser revogados."

(9) Foram convocados os escrivães do rei daquele tempo, no terceiro mês, que é o mês de Sivan, aos vinte e três dias do mês, e foi escrito tudo quanto
Mordechai ordenara, sobre os judeus, aos sátrapas, aos governantes e aos príncipes das províncias que se estendem da Índia até Etiópia, cento e vinte e sete
províncias, a cada província segundo sua escrita e a cada povo segundo seu idioma, e também aos judeus segundo sua escrita e seu idioma.

(10) Escreveu-se em nome do rei Achashverosh, selou-se com o sinete real e se despacharam as cartas por meio dos homens do correio a cavalo, e
montadores de ginetes e mulas ligeiras.

(11) Nelas o rei concedia aos judeus de cada cidade se reunirem e se levantarem em defesa de sua vida, aniquilar, matar e exterminar toda e qualquer força
armada do povo e da província que viesse contra eles, crianças e mulheres, e que lhes saqueassem os bens.
(12) Num só dia em todas as províncias do rei Achashverosh, no dia treze do duodécimo mês, que é o mês de Adar.

(13) Que uma cópia do decreto fosse proclamada como lei em cada província, e [divulgada] de forma clara a todos os povos para que os judeus se
preparassem para aquele dia, vingando-se de seus inimigos.

(14) Os homens do correio montados em ginetes e mulas partiram incontinente e apressadamente pela ordem do rei. E o édito foi proclamado em Shushan, a
capital.

(15) Então Mordechai saiu da presença do rei com traje real azul-celeste e branco, uma grande coroa de ouro e um manto de fino linho e púrpura; e a cidade
de Shushan exultou e se alegrou.

(16) Para os judeus houve esplendor, alegria, regozijo e honra.

(17) E em toda a província e em toda cidade aonde chegava a palavra do rei e sua lei, havia alegria e regozijo entre os judeus, comemoração e festividade. E
muitos dos povos da Terra se converteram ao judaísmo pois tinha caído o temor dos judeus sobre eles.

Capítulo IX

(1) No duodécimo mês, que é o mês de Adar, dia treze do mês, ao chegar a palavra do rei e sua lei a serem cumpridas, no dia em que os inimigos dos judeus
contavam assenhorear-se deles, sucedeu o contrário, pois os judeus é que se assenhorearam dos que os odiavam.

(2) Reuniram-se os judeus nas suas cidades, em todas as províncias do rei Achashverosh, a fim de enfrentar aqueles que lhes procuravam fazer o mal. E
ninguém pôde resistir-lhes, pois seu temor recaiu sobre todos os povos.

(3) E todos os príncipes das províncias e os sátrapas e os governantes e os oficiais do rei exaltaram os judeus, pois recaíra o temor de Mordechai sobre eles.

(4) Pois Mordechai era grande no palácio real e sua fama corria todas as províncias, pois o homem Mordechai se ia tornando cada vez mais poderoso.

(5) Então os judeus feriram a todos seus inimigos a golpes de espada, abatendo-os e eliminando-os. E fizeram de seus inimigos o que bem quiseram.

(6) E em Shushan, a capital, os judeus abateram e eliminaram quinhentos homens.

(7) E Parshandata, e Dalfon, e Aspata.

(8) E Porata, e Adalya, e Aridata.

(9) E Parmashtá, e Arissai, e Aridai, e Vayzata

(10) Os dez filhos de Haman, filho de Hamdata, inimigos dos judeus, foram abatidos; porém sobre os despojos não estenderam a mão.

(11) Naquele dia, chegou o número de mortos em Shushan, a capital, ao conhecimento do rei.

(12) Disse o rei à rainha Ester: "Em Shushan, a capital, os judeus abateram e eliminaram quinhentos homens e os dez filhos de Haman; nas demais províncias
do rei, o que não terão feito! Qual é teu pedido? E ser-te-á dado. E qual ainda é teu desejo? E será atendido.

(13) " Disse então Ester: "Se bem parecer ao rei, conceda também amanhã aos judeus de Shushan agir conforme o édito de hoje; e aos dez filhos de Haman,
que os dependurem na forca."

(14) Ordenou então o rei que se fizesse assim. Proclamou-se a lei a Shushan e os dez filhos de Haman foram enforcados.

(15) Reuniram-se os judeus de Shushan também no dia quatorze do mês de Adar e abateram em Shushan trezentos homens; porém, sobre os despojos não
estenderam a mão.

(16) Os demais judeus que viveram nas províncias do rei também se reuniram e se levantaram em defesa de sua vida; e tiveram sossego de seus inimigos,
abatendo entre os inimigos setenta e cinco mil [homens]; porém, sobre os despojos não estenderam a mão.

(17) Isso sucedeu no dia treze do mês de Adar; e descansaram no dia quatorze do mês e fizeram dele um dia de festa e alegria.

(18) Os judeus, porém, que se achavam em Shushan, se reuniram no dia treze e catorze do mesmo e sossegaram no dia quinze do mesmo e fizeram dele um
dia de festa e alegria.

(19) Por isso, os judeus das cercanias, que habitam em cidades abertas, fazem do dia catorze do mês de Adar dia de alegria e festa, e uma festividade de
enviar porções [de comida] uns aos outros.

(20) Mordechai escreveu estes fatos e despachou cartas a todos os judeus de todas as províncias do rei Achashverosh, aos que estavam perto e aos que
estavam longe.

(21) Ordenando-lhes que comemorassem o dia quatorze do mês de Adar e o dia quinze todos os anos.
(22) Como os dias em que os judeus se tiveram sossego de seus inimigos, e o mês em que a tristeza se converteu em alegria, e o luto em festividade; que
fizessem deles dias de festa e alegria, mandando porções [de comida] uns aos outros e dádivas aos pobres.

(23) Os judeus assumiram [cumprir] o que naquele tempo tinham feito pela primeira vez, conforme Mordechai lhes prescrevera.

(24) Pois Haman, filho de Hamdata, o agaguita, inimigo de todos os judeus, tramara aniquilar os judeus e lançara o pur, isto é, a sorte, para aterrorizar e
aniquilá-los.

(25) Mas, tendo ela [Ester] ido ao rei, ordenou por cartas que o mau intento [de Haman] que tramara contra os judeus recaísse sobre sua própria cabeça, pelo
que enforcaram a ele e a seus filhos.

(26) Por isso chamaram àqueles dias de Purim, pelo nome pur. Em virtude de todas as palavras daquela carta, do que testemunharam e do que lhes havia
acontecido.

(27) Os judeus estabeleceram e tomaram sobre si e sobre seus descendentes e sobre todos os que privassem com eles [os prosélitos], que não se deixaria de
comemorar estes dois dias conforme o que se escrevera deles e segundo suas datas, todos os anos.

(28) E que estes dias seriam lembrados e comemorados geração após geração, por todas as famílias, em todas as províncias e em todas as cidades, e que
estes dias de Purim jamais caducariam entre os judeus, e que sua memória jamais se extinguiria entre seus descendentes.

(29) Então escreveu a rainha Ester, filha de Avicháyil, e Mordechai, o judeu, com toda autoridade, a fim de firmar esta carta de Purim pela segunda vez [i.e., no
ano seguinte].

(30) Expediram cartas a todos os judeus, às cento e vinte e sete províncias do reino de Achashverosh, com palavras sinceras e de paz.

(31) Para que cumprissem os dias de Purim nas datas determinadas, conforme assumiram Mordechai, o judeu, e a rainha Ester, e conforme estabeleceram
sobre si e sua descendência, sobre as prescrições do jejum e de seu lamento.

(32) E a ordem de Ester veio instituir estas normas de Purim; e se escreveu no Livro [i.e., a Meguilá de Ester entrou nas Escrituras Sagradas].

Capítulo X

(1) Depois disto, impôs o rei Achashverosh um tributo sobre a terra e sobre as ilhas do mar.

(2) Quanto aos demais feitos relativos a seu poder e seu valor e ao relato da grandeza de Mordechai a quem o rei exaltou, estão consignados no livro das
crônicas dos reis da Média e da Pérsia.

(3) Pois Mordechai, o judeu, foi o vice do rei Achashverosh, um grande homem para os judeus e estimado pela maioria de seus irmãos; procurava o bem-estar
do seu povo e se empenhava pela paz de toda sua posteridade.
Receitas de Purim

Oznê Haman
índice
        Ingredientes da massa

1 xícara de açúcar
1/3 xícara de óleo
1/3 xícara de margarina ou gordura vegetal
3 ovos
1/2 xícara de suco de laranja
10 xícaras de farinha de trigo peneirada
3 colheres (chá) de fermento em pó
1 ovo para pincelar
açúcar de confeiteiro

Ingredientes do recheio

50 g de sementes de papoula
100 g de açúcar
3 colheres (sopa) de vinho doce
1/2 colher (sopa) de gordura vegetal
1 casca de limão ralada fina
100 g de tâmaras picadas

Preparo da massa

Misture bem o açúcar, o óleo e a gordura vegetal até formar um creme. Adicione os ovos e o suco e mexa bem. Junte os ingredientes secos e enrole no
formato de bola.

Preparo do recheio

Numa panela misture a papoula, o açúcar, o vinho e a gordura. Cozinhe em fogo baixo por alguns minutos mexendo com uma colher de pau. Retire do fogo e
acrescente a casca de limão ralada.

Observação: se for necessário aumentar a quantidade do recheio, acrescente 1/2 xícara de biscoito esfarelado ou farinha de rosca.

Outras opções de recheio

Utilizando-se de recheios mais sólidos como Marrom Glacê, goiabada, etc., você consegue fechar a massa com mais facilidade e não corre o risco de abrir-se
no momento de assar.

Passo-a-passo

1. Divida a massa em quatro porções. Numa superfície enfarinhada abra cada porção com um rolo e estenda-a bem fina.
2. Com a borda de um copo, corte a massa em círculos.
3. Espalhe sobre o centro do círculo um pouco de geléia. Sobre a geléia, acrescente uma colher de recheio de sementes de papoula e sobre ele,
pequenas porções de tâmara picada.
4. Para formar o triângulo, erga os lados direito e esquerdo, deixando a base e a frente na mesa, trazendo os dois lados de encontro no centro,
sobre o recheio.
5. Levante a frente para o centro e aperte bem as três pontas.
6. Aqueça previamente o forno. Pincele a massa com um ovo batido antes de assar.
7. Coloque em forma untada e asse em forno moderado por vinte minutos. Polvilhe com açúcar de confeiteiro.

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Tempo total de cozimento: 25 minutos.

Tipo da receita: fácil.

Rendimento: 4 dúzias.

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