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Avaliar a incidência destas crises nos séculos XVII e XVIII
No século XVII, em virtude do arrefecimento climático, as colheitas apodreciam, pelo que o
preço dos cereais se elevava e, em consequência, os mais pobres eram atingidos (por vezes
morriam) pela fome.
Por seu turno, a fome tornava os corpos menos resistentes às epidemias: a doença,
transportada por bandos de esfomeados, acabava por atingir ricos e pobres. Foi o caso da peste
bubónica, que voltou a atingir violentamente a Europa entre 1590 e 1670. A falta de condições de
higiene e de assistência médica, em especial nas cidades, agravavam o panorama das crises
populacionais.
Somava-se a estes dois factores a guerra, responsável por um número elevado de perdas
humanas, quer pelo confronto entre tropas inimigas, quer pelos efeitos da passagem de exércitos
pelas aldeias (devastação dos campos, desorganização económica, fuga das populações). A Guerra
dos 30 anos (1618-1648), em especial, contribuiu para os picos de sobremortalidade do século XVII
que afectaram, em particular, a Alemanha.
No século XVIII, as crises demográficas esmoreceram, em virtude da transição para um novo
modelo demográfico.
Explicar a alteração demográfica verificada na segunda metade do século XVIII
A partir do século XVIII (1730-1740), na Europa e a nível mundial, verificou-se um crescimento
demográfico até então nunca registado e que não mais voltaria a conhecer retrocesso: tratava-se da
transição para um regime demográfico moderno.
Esta alteração explica-se, em primeiro lugar, pela redução da TM, em especial da TMI. A
criança torna-se a preocupação central da família: nasce com o auxilio de um obstetra – médico com
formação adequada – o qual substitui a parteira suja e ignorante – passa a ser criada pela mãe (e já
não por amas, no campo, a troco de dinheiro) e deixa de ser enfaixada. Os cuidados com a criança
são, simultaneamente, uma causa e um reflexo da redução da TMI.
Relativamente à redução geral da TM da Europa Ocidental, foram avançadas várias propostas
de explicação:
- os avanços na produtividade agrícola (que explicariam o recuo da fome, contribuindo
para uma maior resistência à doença);
- os progressos na higiene (pelo uso do sabão, nomeadamente);
- as conquistas na medicina (graças, por exemplo, à vacina contra a varíola,
descoberta por Jenner, à prática da quarentena para os enfermos de doenças contagiosas e ao
desenvolvimento, já referido, da obstetrícia);
- o desenvolvimento dos meios de transporte (facilitando o acesso aos bens essenciais
de consumo);
- a ocorrência de menos guerras;
- o clima mais favorável (resultando em boas colheitas);
- o recuo da Peste (desde 1720).
Enfim, todo um conjunto de factores (dos quais é difícil destrinçar o mais importante) concorrera
para o surgimento de um novo modelo demográfico. O recuo da mortalidade, juntamente com a
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manutenção de uma TN elevada, provocou o rejuvenescimento da população e o aumento da
esperança média de vida. No século XVIII, Thomas Malthus reflectia, na sua obra Ensaio Sobre o
Principio da População, as preocupações com este crescimento populacional, ao preconizar a
limitação dos nascimentos como único meio de evitar as catástrofes alimentares que adviriam da
desproporção entre o crescimento da população e o dos alimentos.
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- dedicava-se à carreira das armas (era a velha nobreza, chamada de nobreza de
sangue ou de espada) ou a cargos públicos merecedores de um titulo de nobreza (era a
burguesia enobrecida, chamada nobreza administrativa ou de toga);
- ocupava os cargos mais elevados da administração e do exército;
- gozava de um regime jurídico próprio (por exemplo, o nobre não podia ser açoitado
nem enforcado);
- não pagava impostos ao rei (excepto em caso de guerra);
- detinha grandes propriedades;
- fornecia os elementos que integravam o alto clero.
3. Povo ou Terceiro Estado:
- era a ordem mais heterogénea, abarcando a elite burguesa (homens de letras,
mercadores, boticários, joalheiros), os ofícios manuais (lavradores, artesãos, trabalhadores
assalariados) e, por ultimo, os mendigos e vagabundos;
- dedicava-se, na sua maioria (80%), à agricultura, como camponeses;
- pagava impostos.
Reconhecer, nos comportamentos, os valores da sociedade de ordens
Na sociedade hierarquizada de Antigo Regime, todos os comportamentos estavam rigidamente
estipulados para cada uma das ordens sociais. Assim, o estatuto jurídico, o vestuário, a alimentação,
as profissões, as amizades, os gastos, os divertimentos, as formas de tratamento deviam reflectir a
pertença a cada uma das ordens: por exemplo, apenas o nobre usava a espada e apenas o membro
do clero usava a tonsura (corte de cabelo que deixa uma coroa rapada no alto da cabeça).
Esta preocupação em tornar visível a diferenciação social exprimia os principais valores
defendidos na sociedade de ordens: a defesa dos privilégios pelas ordens sociais mais elevadas, a
primazia do nascimento como critério de distinção e a fraquíssima mobilidade social.
Identificar as vias de mobilidade social
Ao longo do Antigo Regime a mobilidade social era muito reduzida. Porém, lentamente, o Terceiro
Estado conseguiu ascender socialmente. As vias de mobilidade ascendente da burguesia eram, de
uma forma geral:
- o estudo;
- o casamento com filhas da velha nobreza;
- os lucros do grande comércio (o dinheiro);
- a dedicação aos cargos do Estado.
Esta última via deu origem à chamada nobreza de toga, através da concessão de títulos
nobiliárquicos. Já na época, alguns autores demonstravam saber que a esperança na mobilidade
social era o garante da ordem social e da resignação dos grupos considerados inferiores.
Referir as características do poder absoluto
O Antigo Regime caracterizou-se, a nível político, pelo sistema de monarquia absoluta, que
atingiu o expoente máximo nos séculos XVII e XVIII. Segundo Bossuet (clérigo e teórico do
absolutismo), o poder do rei tinha quatro características:
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1. Era sagrado (monarquia de direito divino, segundo a qual o rei apenas tinha de prestar
contas dos seus actos a Deus).
2. Era paternal (o rei devia satisfazer as necessidades do seu povo como se fosse um
pai).
3. Era absoluto (livre de prestação de contas), mas deveria assegurar a ordem e garantir
os privilégios da Igreja e da Nobreza. O rei concentrava em si os três poderes do
Estado – legislativo, executivo e judicial – por isso Luís XIV, o Rei-Sol, terá afirmado “O
Estado sou eu”.
4. Era sujeito à razão (à sabedoria do rei).
Os monarcas absolutos não reuniam os orgãos de representação da sociedade (na França, os
Estados Gerais; em Portugal, as Cortes) apesar de não abolirem essas instituições para não
afrontarem directamente as ordens sociais privilegiadas.
Sublinhar o papel desempenhado pela corte no regime absolutista
Na monarquia absoluta, o rei utilizava a vida em corte para mais facilmente controlar a Nobreza e
o Clero. O grupo que rodeava o rei (sociedade da corte) estava constantemente sujeito à vigilância
deste. Em França, o centro da vida de corte desenrolava-se no Palácio de Versalhes, onde
habitavam o rei e a alta nobreza. O Palácio era, simultaneamente, lugar de governação, de
ostentação do poder e de controlo das ordens privilegiadas.
Esclarecer o significado da expressão “encenação do poder”
Todos os actos quotidianos do rei eram ritualizados, “encenados” de modo a endeusar a sua
pessoa e a submeter as ordens sociais, Cada gesto tinha um significado social ou político, pelo que,
através da etiqueta, o rei controlava a sociedade. Um sorriso, um olhar reprovador assumiam um
significado político, funcionando como recompensa ou punição de determinada pessoa. Nobert Elias
descreveu magnificamente o cerimonial do acordar do rei Luís XIV, conhecido por “entradas”, através
do qual o Rei-Sol submetia a corte a uma hierarquia rigorosa.
Evidenciar a preponderância da nobreza fundiária em Portugal
A restauração da independência nacional, em 1640, por iniciativa da nobreza (liderada pelo
duque de Bragança, que daria inicio à quarta e última dinastia de Portugal) concedeu a esta ordem,
grandes proprietários de terras um papel social importante, reforçado pelos cargos na governação, na
administração ultramarina e no comércio. Deste modo, as principais características da sociedade de
ordens em Portugal são, por um lado, a preponderância política da nobreza de sangue e, por outro
lado, o afastamento da burguesia das esferas do poder. A debilidade da burguesia portuguesa deveu-
se, em grande parte, à centralização das actividades mercantis nas mãos da Coroa e da Nobreza e à
perseguição de judeus e cristãos-novos (judeus forçados a converter-se ao cristianismo) pela
Inquisição.
Caracterizar o “cavaleiro-mercador”
Em Portugal, a nobreza mercantilizada (dedicada ao comércio) dá origem à figura do “cavaleiro-
mercador”, o qual investe os lucros do comércio, não em actividades produtivas, mas em terras e
bens de luxo. Deste fenómeno decorrem duas consequências: a primeira, uma difícil afirmação da
burguesia portuguesa (a qual, só muito mais tarde, na segunda metade do século XVIII, graças à
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acção do Marquês de Pombal, ganhará preponderância); a segunda, o atraso económico de Portugal
em relação a vários países da Europa.
Relacionar a eficiência do aparelho burocrático com a efectiva centralização do poder
Nos séculos XVII e XVIII, os reis portugueses procederam a uma centralização do poder que se
caracterizou pelas seguintes etapas:
1. Século XVII – após o domínio filipino, D. João IV, o primeiro rei da dinastia de Bragança, viu-se
na necessidade de reestruturar os órgãos da administração central e de enfrentar a situação
de guerra. Assim, não sendo um rei de tipo absolutista, criou órgãos (como as secretarias e os
conselhos) em quem delegava poderes.
Assim, ao longo do século XVII as resoluções tomadas em Cortes tinham cada vez menos
importância para o destino do Reino e a sua convocação foi-se tornando cada vez mais rara,
ate se extinguirem praticamente, a partir de 1697 (data da ultima reunião dos três Estados, se
não se contar com a aclamação de D. Miguel nas Cortes de 1828).
2. Século XVIII – a figura mais marcante do absolutismo português, o rei D. João V, teve um
papel muito interventivo na governação, remodelando as secretarias criadas por D. João IV e
rodeando-se de colaboradores de confiança.
Porém, a reforma da burocracia do Estado não se traduziu por uma maior eficiência para os
súbditos: por um lado, faltava estabelecer uma ligação entre a administração central e a
administração local; por outro lado, a dependência, para todas as decisões, da aprovação do
rei, tomava qualquer pedido num processo muito lento. Na prática, a burocracia central
afastava o povo do seu rei.
Caracterizar o absolutismo joanino
O fenómeno a que se chamou a “encenação do poder” estava, também, presente na monarquia
absoluta portuguesa, em particular no reinado de D. João V. Tal como o Rei-Sol (Luís XIV de
França), D. João V realçava a figura régia através da magnificência (luxo) permitida pelo ouro e
diamantes do Brasil, da autoridade e da etiqueta, de que se salientam os seguintes aspectos:
- subordinação das ordens sociais (manifestada, por exemplo, na recusa de reunir
Cortes);
- apoio às artes e às letras (criando, por exemplo, a Biblioteca da Universidade de
Coimbra e a Real Academia de História);
- envio de embaixadas ao estrangeiro (destacando-se, pela sumptuosidade, a de 1709,
ao Papa);
- distribuição de moedas de ouro pela população (que lhe valeu o cognome de o
Magnânimo, ou seja, generoso).
- politica de grandes construções (em especial a do palácio-convento de Mafra, obra
que se tornou no símbolo do seu reinado e cuja construção envolveu 45 000 trabalhadores, além
dos recrutamentos forçados por todo país. O escritor José Saramago, na sua obra Memorial do
Convento, recriou a pompa da colocação da primeira pedra do Convento de Mafra em 1717: no
centro do acontecimento estava o rei, rodeado pela nobreza e pelo clero. Excluída do grande
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evento, fora da igreja e de joelhos, na lama, estava o povo, a massa de homens à custa de quem
foi erguido o dispendioso monumento).
Mostrar a fusão do poder político com o poder económico nas Províncias Unidas
Foi o dinheiro que abriu à burguesia das Províncias Unidas as portas da ascensão social.
Com o tempo, a ascensão da burguesia de negócios foi consolidada pela educação, pelo casamento
e pela dedicação aos cargos do Estado: graças à descentralização administrativa, eram os chefes
das famílias burguesas quem dominava os conselhos das cidades e das províncias formando uma
elite governante.
Foram-se quebrando, desta forma, os princípios da sociedade de ordens baseados nos
privilégios do nascimento.
Deve-se salientar, em particular, o caso de ascensão social da família de Witt, a qual,
aplicando os lucros do negócio da madeira na Companhia das Índias Orientais, conseguiu preparar
os seus filhos para o exercício de cargos na administração da Republica e, na terceira geração,
conseguiu que Jan de Witt personificasse o domínio claro da burguesia ao assumir o cargo de
Grande Pensionário (uma espécie de Primeiro-Ministro).
Contextualizar a teoria do mare liberum
O Tratado de Tordesilhas, de 1494, havia ratificado o monopólio de Espanha e Portugal sobre
os mares e as terras, restando a opção de corso (pirataria autorizada pela autoridade de um país)
aos outros estados.
No entanto, no século XVII, a doutrina de Mare Clausum (mar fechado) foi vivamente
contestada, após a captura da nau Santa Catarina (embarcação portuguesa) por um almirante das
Companhia das Índias Orientais holandesa, em 1602. Hugo Grotius, na sua obra Mare Liberum, de
1608, argumentava que não se podia impedir as nações de comerciarem entre si e que o mar não
podia ser pertença de ninguém. A polémica manteve-se acesa durante cerca de um século, com
Serafim de Freitas a representar os interesses portugueses, para os quais reivindicava o “direito
histórico” (direito aos territórios descobertos ou conquistados).
A defesa de mare liberum (mar livre), por Hugo Grotius, era, também, uma forma de legitimar
as pretensões holandesas ao comércio internacional, uma vez que no século XVII foi, para esta
nação, uma época de grande prosperidade.
Expor os acontecimentos mais relevantes da história política inglesa, no século XVII
A luta histórica entre o povo – representado pelo Parlamento – e os soberanos ingleses
remonta à Idade Média (com a Magna Carta, primeiro documento que protegia os Ingleses das
arbitrariedades do poder real), porém, é no século XVII que vinga o parlamentarismo, por meio de
duas revoluções importantes:
1. Instauração da República Inglesa – Apesar de ter assinado a Petição dos Direitos, em
1628, que o forçava a respeitar a vontade popular (ao determinar que o rei ou os seus
herdeiros não podiam decretar impostos sem o seu consentimento nem atentar contra os
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seus súbditos sem julgamento), o soberano Carlos I pagou com a vida as suas tentações
absolutistas (1649). Foi, então, abolida a monarquia e instaurada uma República, chefiada
por Cromwell. Este acabaria por impor um regime repressivo (sob o título de Lord
Protector), restaurando-se a monarquia, após a sua morte (1658), na pessoa de Carlos II
(marido da princesa portuguesa Catarina de Bragança, filha de D. João IV de Portugal).
2. Revolução Gloriosa – Ainda no século XVII, em 1688, a Revolução Gloriosa do rei
Guilherme de Orange consagra a vitória do regime parlamentar contra o poder autoritário
de Jaime II. O novo soberano comprometeu-se a respeitar solenemente as liberdades do
povo consignadas na Declaração dos Direitos (Bill of Rights) de 1689. Este é um texto
fundamental da monarquia inglesa, pois, ao contrário do que acontecia nos países de
regime absolutista, estabelecia limites ao poder real, protegendo os direitos dos súbditos,
o que fazia com que o filósofo francês Montesquieu declarasse que este país era “o mais
livre do Mundo”.
Evidenciar o carácter liberal do regime parlamentar
Nos países onde o poder absoluto dos monarcas foi limitado pela vontade dos cidadãos, como
as Províncias Unidas e a Inglaterra, o regime parlamentar assume-se como defensor das liberdades
politicas, económicas e religiosas. O cidadão, protegido das arbitrariedades do governo, substitui o
súbdito, e os poderes legislativo, executivo e judicial são divididos por vários órgãos de poder.
Aplicar a filosofia política de Locke ao parlamentarismo inglês
O filósofo John Locke foi responsável pela justificação teórica do parlamentarismo, ao defender
que todos os homens se encontram naturalmente num “estado de perfeita liberdade” e num “estado
de igualdade” ao qual renunciam, apenas, em favor da colectividade, quando se fazem representar
pelos seus governantes: “só então, nasce uma sociedade política ou civil”.
O “poder supremo do Estado” era, segundo Locke, o poder legislativo, exercido pelo Parlamento.
No entanto, Locke frisava que, se o poder legislativo fosse exercido de maneira absoluta ou
prejudicando o bem comum, então os governados retomariam o direito à sua liberdade original,
podendo depor os seus governantes.
A teoria de Locke enquadra-se, por um lado, na justificação dos acontecimentos políticos de
Seiscentos (em especial a Revolução Gloriosa de 1688) e, por outro lado, no contexto social de
ascensão da burguesia, a qual apoiava o regime parlamentar, defensor da propriedade privada, da
ordem e da segurança.
Contrapor o modelo sociopolítico absolutista ao modelo parlamentar
Modelo Absolutista:
→ o rei detém o poder absoluto, concentrando em si os poderes legislativo, executivo e
judicial;
→ o rei raramente convoca Cortes (em França, Estados Gerais);
→ o rei detém um poder sagrado, paternal, absoluto e submetido apenas à Razão;
→ o rei usa a vida de corte como palco de uma encenação do poder de forma a controlar
as ordens privilegiadas;
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→ os cargos de chefia são entregues à nobreza e ao clero, mesmo se a burguesia detém
poder económico.
Modelo Parlamentar:
→ o poder encontra-se repartido entre o rei e o Parlamento;
→ o Parlamento ocupa o lugar central na estrutura governativa;
→ a burguesia ocupa cargos importantes na administração do Estado;
→ os critérios sociais baseados no nascimento esbatem-se ou anulam-se.
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Enquadrar na teoria mercantilista:
- o conjunto de medidas encetado por Cromwell
- a política económica de Colbert
O mercantilismo francês foi implementado por Colbert (ministro do rei Luís XIV no século XVII). A
sua politica económica, muito dirigista, concedeu o principal relevo ao desenvolvimento das
manufacturas como meio de substituir as importações de produtos estrangeiros (da Holanda, da
Alemanha, da Itália, etc.) por produtos franceses. O Colbertismo salientou-se, ainda, pelo
desenvolvimento da frota mercante e da marinha de guerra e pela criação de companhias
monopolistas (associações económicas que tinham o direito exclusivo de comerciar numa dada
zona).
Oliver Cromwell (chefe do governo republicano inglês entre 1649 e 1658) encarnou uma faceta do
mercantilismo mais flexível, porém, igualmente empenhada na supremacia da economia nacional. As
suas medidas económicas centraram-se na valorização da marinha e do sector comercial, através da
publicação dos Actos de Navegação.
Distinguir entre o mercantilismo inglês, centrado no comércio, e o mercantilismo francês,
centrado nas manufacturas
O mercantilismo francês caracterizou-se, no sector manufactureiro, pelas seguintes medidas:
- criação de novas industrias (às quais o Estado concedia privilégios, tais como benefícios
fiscais e subsídios);
- importação de técnicas (por exemplo, mandar curtir à maneira inglesa as peles de boi da
França);
- criação das manufacturas reais (protegidas pela realeza, fabricavam, sobretudo, produtos de
luxo para a corte como, por exemplo, as famosas tapeçarias da família dos Gobelins);
- controlo da actividade industrial por inspectores do Estado (que avaliavam, nomeadamente,
a qualidade e os preços do trabalho realizado).
Em Inglaterra, o mercantilismo, de feição comercial, distinguiu-se pelas seguintes medidas:
- publicação (entre 1651 e 1663) dos Actos de Navegação: de acordo com estas leis, apenas
podiam entrar em Inglaterra as mercadorias que fossem transportadas em barcos ingleses ou do país
de origem; só a marinha britânica podia transportar as mercadorias coloniais e a tripulação dos
navios devia ser constituída, maioritariamente, por ingleses.
- política de expansão comercial (dirigida, em especial, às Antilhas e à América do Norte);
- criação de grandes companhias de comércio, entre as quais a Companhia das Índias
Orientais inglesa (a mais rica e poderosa das companhias monopolistas), que detinha o exclusivo de
comércio com o Oriente e amplos poderes a nível da administração, defesa e justiça.
Relacionar o proteccionismo económico com o agudizar das tensões internacionais
Uma vez que todos os países seguidores do mercantilismo adoptaram medidas de carácter
proteccionista (proibição da entrada de produtos estrangeiros através das leis pragmáticas, imposição
de elevadas taxas alfandegárias à entrada de produtos do exterior, etc.) registou-se, naturalmente,
uma contracção do comércio entre os países europeus.
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Como alternativa, esses países comerciavam com as suas próprias colónias, num regime
(também proteccionista) de exclusivo colonial: cada um dos países de origem (metrópole) controlava
a produção e os preços dos produtos coloniais, de maneira a garantir a obtenção de matérias-primas
e de mercados de escoamento das manufacturas sem a interferência dos países rivais.
Consequentemente, a criação de um império colonial e comercial passou a figurar como
prioridade dos estados europeus. A prática do capitalismo comercial (procura de lucros no grande
comércio) levou a agudizar das tensões internacionais. Assim se explicam os vários episódios de
rivalidade e mesmo de guerra entre Holandeses e Ingleses, entre Holandeses e Franceses e entre
Franceses e Ingleses nos séculos XVII e XVIII. Ponto alto deste clima de tensão, o desfecho da
Guerra dos Sete Anos (1756-1763) consagrou a supremacia da Inglaterra no comércio mundial.
Identificar as áreas coloniais disputadas pelos estados atlânticos
No século XVIII, os estados atlânticos abarcavam regiões muito ricas, por exemplo:
- império espanhol abarcava os territórios da América espanhola e Filipinas;
- a Holanda, a província mais rica das Províncias Unidas, estendeu o seu poderio até à Ásia
(arquipélago indonésio e Ceilão), África (o Cabo) e continente americano (Guianas holandesas);
- a Inglaterra, graças à vitória na Guerra dos Sete Anos (Tratado de Paris), ocupou as
possessões francesas nas Índias, territórios na América (nomeadamente o Canadá) e feitorias em
África (Senegal);
- o império francês ocupava territórios em África, no Oceano Índico (Madagáscar) e na Índia;
- o império português retirava proventos do Brasil, das suas colónias em África (sobretudo
Angola, Moçambique) e na Índia (Goa, Damão, Diu).
A hegemonia económica britânica
No século XVIII, na região de Norfolk (Inglaterra), iniciou-se a chamada “revolução agrícola”, ou
seja, um conjunto de alterações, rápidas no tempo e marcantes na forma de cultivar os campos.
Graças ao apoio do Parlamento, os grandes proprietários de terras (landlords) puderam introduzir na
agricultura uma série de inovações importantes:
- sistema de rotação quadrienal de culturas (afolhamento quadrienal): o cultivo, de maneira
rotativa, das quatro parcelas (ou folhas) de um campo, ao longo de quatro anos, permitia resolver, por
fim, o secular problema do esgotamento dos solos e, assim, prescindir do pousio (terra deixada em
descanso);
- articulação entre a agricultura e a criação de gado: o cultivo de plantas forrageiras (que
alimentavam os animais, por exemplo, o trevo) possibilitava, por um lado, assegurar o necessário
estrume e, por outro lado, incentivar o melhoramento das raças animais;
- vedação dos campos comunitários (enclosures): os campos cercados substituíram o anterior
sistema de uso comunitário das terras (open field), desencadeando a aplicação sistemática, pelos
landlords, das inovações agrícolas (selecção das sementes, melhoramento dos utensílios,
apuramento das raças animais);
- inovações técnicas: a introdução de máquinas nos campos, por exemplo a primeira
semeadora mecânica (1703), a charrua triangular (1731) e a primeira máquina debulhadora (cerca de
1780) retirava um maior rendimento da terra.
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As inovações agrícolas resultaram num aumento da produtividade, o qual, por sua vez, estimulou
o crescimento demográfico e canalizou a mão-de-obra excedentária para as cidades.
Explicar o conceito “mercado nacional”
A Inglaterra foi o país que mais cedo se transformou num espaço económico unificado, onde o
consumo interno podia expandir-se. Para a criação desde mercado nacional, contribuíram os
seguintes factores:
- o crescimento demográfico (da população) e urbano (das cidades, em especial, Londres)
tornaram-se motores do desenvolvimento económico, ao proporcionarem um maior consumo interno;
- o desenvolvimento dos transportes e vias de comunicação (construção de um sistema de
canais, ampliação da rede de estradas) permitia resolver os problemas de abastecimento;
- a inexistência de alfândegas internas retirava os entraves ao comércio;
- a união da Inglaterra com a Escócia (1707) e com a Irlanda (1808) criava um contexto
politico propício à circulação de produtos.
Avaliar o impacto do alargamento dos mercados na economia inglesa
Ao nível do mercado externo, os ingleses conseguiram abrir brechas no rigoroso proteccionismo
dos estados europeus e, ainda, comerciar com os continentes americano e asiático:
- o comércio triangular partia dos portos ingleses: comprava-se, em África, os escravos negros
por baixo preço, os quais eram transportados para as plantações e minas na América, onde eram
vendidos a um preço elevado (tráfico negreiro). Da América os ingleses traziam os metais preciosos e
os produtos tropicais (por exemplo, o algodão, o tabaco e o açúcar);
- no Oriente, a vitória inglesa na Guerra dos Sete Anos (1756-1763) expulsou os franceses da
Índia, assegurando à Companhia Inglesa das Índias Orientais o comércio dos produtos indianos (por
exemplo, as especiarias, as porcelanas, os panos de algodão, o chá e os produtos agrícolas), quer
para exportação para a Europa, quer para troca local, proibindo os produtores locais de venderem a
outros estrangeiros que não os ingleses. Da Índia, os ingleses partiam para a China (porto de
Cantão) de onde traziam, nos seus barcos (China ships) o famoso chá. O alargamento dos mercados
constituiu, assim, um dos factores da preponderância inglesa sobre o Mundo.
Sublinhar os progressos no sistema financeiro
O sistema financeiro favoreceu o sucesso inglês através das seguintes instituições:
- Bolsa de Londres (Royal Exchange) - a compra de acções do Estado ou de companhias
industriais permitiu reunir capitais em grande escala e fornecer elevados lucros aos particulares e ao
Estado (desenvolvimento do capitalismo);
- Banco de Inglaterra – realizava as operações de apoio ao comércio (por exemplo,
depósitos e transferências), emitia o papel-moeda (notas) e financiava a actividade comercial e
industrial.
Contextualizar o arranque industrial
Na segunda metade do século XVIII, na Inglaterra, deu-se a Revolução Industrial, que pode ser
definida como uma alteração tecnológica na produção acompanhada de rupturas em vários aspectos
da vida humana (demográficos, económicos, sociais, mentais).
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Preparada pela Revolução Agrícola, a ruptura tecnológica incidiu, em primeiro lugar, nos sectores
do algodão (fornecendo vestuário a uma população em crescimento) e da metalurgia (fornecendo
máquinas e elementos para a construção civil).
Os inventos no sector algodoeiro alternaram entre a tecelagem (1733 – lançadeira volante, de
Kay), a fiação (1768 – Spinning Jenny de Hargreaves) e, novamente, a tecelagem (1787- tear
mecânico de Cartwright) pois, sempre que a tecelagem se desenvolvia, precisava de mais fio para a
produção, e sempre que havia abundância de fio, eram necessários teares mais rápidos para o
aproveitar. Desta forma, quando um dos ramos do sector têxtil se desenvolvia, o outro era obrigado a
acompanhá-lo.
Na metalurgia, o grande salto tecnológico consistiu em libertar a indústria do problema da
escassez do combustível graças a Abraham Darby, que usou (em 1709) o carvão de coque (mineral)
em vez do tradicional carvão de maneira (vegetal) para alimentar as fundições. A revolução
metalúrgica também é devedora de John Smeaton, que melhorou o abastecimento de ar quente aos
altos-fornos (1761) e de Henry Cort, que converteu a gusa (ferro de primeira fundição, não purificado)
em ferro ou aço, através do processo da pudlagem (1783).
Porém, o invento que simboliza a primeira revolução industrial é, acima de qualquer outro, a
máquina a vapor (criada por Newcomen em 1708 e aperfeiçoada por James Watt em 1767), pois,
pela primeira vez na história da humanidade, criava-se uma fonte de energia artificial, eficaz e
adaptável a muitos usos (maquinismos e meios de transportes).
Sintetizar as condições da hegemonia britânica
Graças a um conjunto de transformações que tomaram, genericamente, o nome de Revolução
Industrial, a Inglaterra pôde exercer a sua preponderância (hegemonia) sobre o mundo praticamente
até ao final da Primeira Guerra Mundial (altura em que os EUA tomaram a dianteira). A supremacia
inglesa deveu-se a várias condições favoráveis:
1. No âmbito técnico e económico:
- o sistema de rotação de culturas;
- a articulação entre a agricultura e a criação de gado;
- as vedações (enclosures);
- as novas máquinas agrícolas;
- as inovações técnicas no sector algodoeiro e metalúrgico;
- a substituição da manufactura pela maquinofactura nos diferentes sectores da
economia.
2. No âmbito social e demográfico:
- o espírito empreendedor dos landlords;
- a afirmação da burguesia industrial;
- o crescimento demográfico;
- a migração para os centros urbanos.
3. No âmbito político-militar:
- o apoio do sistema Parlamentar às enclosures;
- a promulgação dos Actos de Navegação;
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- a criação das Companhias de Comércio;
- as guerras contra a França e a Holanda de que a Inglaterra saiu vitoriosa.
4. No âmbito ideológico:
- o fisiocratismo (nova doutrina económica que considerava a agricultura a base
económica da nação).
5. No âmbito comercial e financeiro:
- o comércio triangular a partir dos portos de Inglaterra;
- o Tratado de Eden (realizado entre a França e a Inglaterra, em 1786, com clara
vantagem da Inglaterra devido à exportação de lanifícios e ferragens em condições
vantajosas);
- a acção da Companhia Inglesa das Índias Orientais;
- o comércio com a China;
- a Bolsa de Londres;
- o Banco de Inglaterra.
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3. Protecção da produção nacional através das pragmáticas (leis que proibiam o uso de
produtos de luxo estrangeiros);
4. Desvalorização monetária (para tornar os produtos nacionais mais baratos em relação aos
estrangeiros);
5. Criação de companhias monopolistas (por exemplo, a Companhia do Maranhão, para o
comércio brasileiro).
Explicar o retrocesso da política industrializadora portuguesa
A decadência do esforço industrializante deveu-se, acima de tudo, à descoberta de minas de ouro
(1690) e de diamantes (1729) no Brasil. A entrada de toneladas de metal precioso em Portugal, ao
longo do século XVIII, levou a que, no reinado de D. João V, se cunhasse moeda em abundância,
respirando-se um clima de prosperidade sem o esforço do investimento manufactureiro. As leis
pragmáticas já não eram respeitadas e o país voltou-se para o comércio como actividade prioritária.
A procura do ouro do Brasil era feita (já desde o século XVI) pelas bandeiras, expedições
armadas que, empunhando um estandarte – a bandeira – partiam, geralmente da pobre vila de São
Paulo, e se aventuravam no interior brasileiro para capturar índios e descobrir jazidas. O movimento
dos bandeirantes, apesar do seu carácter desumano, que lhe valeu forte oposição dos jesuítas
(devido ao apresamento e escravização dos índios), teve o mérito de proporcionar o alargamento e
desbravamento do território brasileiro, cujas fronteiras foram então definidas segundo limites mais
amplos do que aqueles inicialmente previstos no Tratado de Tordesilhas na época de D. João II.
Avaliar a dependência da economia portuguesa face à Inglaterra
Segundo o tratado de Methuen (1703), a Inglaterra comprava os vinhos portugueses com
vantagem competitiva em relação aos vinhos franceses, enquanto Portugal comprava os lanifícios
ingleses sem restrições.
Este tratado gerou uma situação de dependência de Portugal em relação a Inglaterra pois, não só
contribuía para o abandono das manufacturas de panos em Portugal, como conduzia ao escoamento
do ouro brasileiro para pagar as importações inglesas. Além disso, no terceiro quartel do século XVIII,
94% do vinho português exportado tinha como destino a Inglaterra, reforçando a dependência face a
este país.
Paradoxalmente, como dizia no início do século XIX o economista José Acúrsio das Neves,
“Portugal, nadando em ouro, viu-se pobre”.
Contextualizar a política económica pombalina
Face à nova crise de meados do século XVIII, o rei D. José I tentou uma estratégia de mudança
em relação à política de seu pai (D. João V). O ministro Sebastião José de Carvalho e Melo (Marquês
de Pombal) delineou a recuperação económica com base nos pressupostos mercantilistas. As
principais medidas económicas (do tipo mercantilista) que tomou foram:
- a concessão de privilégios (subsídios, isenção de impostos) às indústrias existentes;
- a criação de manufacturas da Covilhã e de Portalegre para desenvolver a indústria de
lanifícios;
- a introdução dos têxteis de algodão;
- o desenvolvimento da indústria de vidro da Marinha Grande;
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- o fomento de vários sectores da indústria (nomeadamente, a fundição do ferro, a cerâmica, a
saboaria, a construção naval);
- a contratação de empresários estrangeiros com o objectivo de diminuir as importações;
- a reorganização da Real Fábrica da Seda (criada no reinado de D. João V e reestruturada
com operários e mestres de várias artes de origem francesa).
Além da actividade industrial, também o comércio foi reorganizado no intuito de reduzir o défice e
de colocar as trocas na mão da burguesia portuguesa. O Marquês de Pombal conseguiu atingir estes
objectivos graças às seguintes medidas:
- criação de companhias monopolistas que aliavam os capitais privados aos do Estado (por
exemplo, a Companhia da Ásia, para o comércio com o Oriente; a Companhia do Grão-Pará e
Maranhão, para o comércio com o Brasil; a Companhia Geral das Reais Pescas do Reino do Algarve;
a Companhia para a Agricultura das Vinhas do Alto Douro, criada para a reorganização e controlo do
comércio dos vinhos do Douro, então dependente dos ingleses);
- atribuição do estatuto nobre aos grandes burgueses accionistas das companhias
monopolistas;
- instituição da Aula do Comércio, escola comercial para os filhos dos burgueses;
- criação da Junta do Comércio, órgão que controlava a actividade comercial do reino.
Em consequência desta política económica, o final do século XVIII foi, para Portugal, um período
de prosperidade, com uma balança comercial positiva e a resolução do problema do défice comercial
com a Inglaterra.
MÓDULO 5
O Liberalismo – ideologia e revolução, modelos e práticas nos séculos XVIII e XIX
A Revolução Americana, uma revolução fundadora
22
Em 1783, colonos e ingleses assinaram o Tratado de Versalhes, no qual a Inglaterra reconhecia a
independência das 13 colónias. Nesse momento os Franceses puderam, também, sentir o sabor da
vitória, recuperando alguns dos territórios perdidos em 1763.
Relacionar os princípios contidos na Declaração de Independência de 1776 e na Constituição
de 1787 com a aplicação dos ideais iluministas
A Declaração de Independência de 1776 justifica a ruptura relativamente à Inglaterra com base
nos pressupostos iluministas:
- defende o direito à igualdade e à independência como “Lei da Natureza”;
- proclama, como direitos “inalienáveis” (isto é, que não se podem retirar nem transmitir a
outrem) e concedidos por Deus, “a Vida, a Liberdade e a procura da Felicidade”;
- institui a soberania popular com base em “governos, cujo justo poder emana do
consentimento dos governados”;
- prevê o direito de os povos deporem um governo que não os represente e de “instituir um
novo governo”;
- rejeita o “despotismo absoluto”.
Em 1787, a Constituição definiu o modelo político do novo estado independente: foi instituída
a República dos Estados Unidos da América, um conjunto de Estados federados com alguma
autonomia mas obedientes a um Estado Central forte.
Neste diploma foram aplicados, na prática, pela primeira vez, as ideais iluministas:
- a divisão tripartida dos poderes, pensada pelo filósofo iluminista Montesquieu, foi aplicada da
seguinte forma: o poder legislativo foi entregue ao Congresso, composto pela Câmara dos
Representantes e pelo Senado (que reúnem no edifício do Capitólio, em Washington); o poder
executivo coube ao Presidente dos EUA (residente da Casa Branca, em Washington, desde 1800) e
o poder judicial passou a pertencer a um Tribunal Supremo e a tribunais inferiores;
- foram consignadas as liberdades e garantias dos cidadãos;
- foi consagrada a soberania nacional, nomeadamente pela possibilidade de exercer o direito
de voto.
Em resumo, a Revolução Americana deu início a uma vaga de revoluções liberais que
ocorreram entre os séculos XVIII e XIX e que puseram fim ao sistema de Antigo Regime baseado no
absolutismo e na sociedade de ordens. Estes movimentos instituíram a soberania popular, a
separação de poderes, a livre iniciativa económica, a tolerância religiosa e a descolonização.
23
- a alta burguesia era superior às ordens tradicionalmente privilegiadas (clero e nobreza) em
riqueza e instrução, contudo, não tinha acesso aos altos cargos da administração pública, do exército
e da hierarquia religiosa, para os quais se exigia prova de nobreza;
- os camponeses, apesar de constituírem a maioria da população (cerca de 80%) continuavam
na miséria, pois não eram detentores das terras que trabalhavam e ainda tinham de pagar impostos;
- os trabalhadores das cidades recebiam baixos salários;
- a nobreza mantinha um estilo de vida ocioso e frívolo; porém, detinha a maior parte da
propriedade fundiária, os postos mais importantes e estava isenta do pagamento de impostos;
- o clero possuía terras, recebia rendas e a dízima (1/10 de toda a produção agrícola), no
entanto, tal como a nobreza, não pagava impostos.
Esta situação de profunda injustiça social foi, então, uma das causas das Revolução Francesa.
Analisar a crise económico-financeira
Nas vésperas da Revolução, a França era afectada por uma crise económica motivada pelos
seguintes factores:
- o aumento do preço do pão, em virtude de maus anos agrícolas;
- a quebra de produção têxtil, não só devido ao aumento do preço do pão (que limitava a
capacidade de aquisição de outros produtos pelas famílias), mas também por causa do Tratado de
Eden, de 1786 (que previa a livre-troca do vinho francês pelos têxteis ingleses);
- as despesas do Estado com o exército, as obras públicas, a dívida pública e o luxo da corte,
que originavam um défice constante, já que o clero e a nobreza não contribuíam para as receitas do
Estado (pois não pagavam impostos).
Podemos considerar a crise económico-financeira como o segundo factor que conduziu à
Revolução.
Explicar o fracasso das tentativas políticas de reforma
Perante a crise económico-financeira, o poder político tinha de agir. O rei Luís XVI, monarca
absoluto, rodeou-se de ministros para o auxiliarem: Turgot, Necker, Calonne e Brienne propuseram,
sucessivamente, reformas no intuito de solucionar a crise. Porém, a conclusão a que chegavam era
sempre a mesma: a única maneira de obter mais receitas para o Estado passaria por fazer com que
as ordens privilegiadas também pagassem impostos. Ora, o clero e a nobreza, opuseram-se
terminantemente às tentativas de redução dos seus privilégios.
A própria rainha Marie Antoinette, chamada pelo povo de “Madame Défice” devido às suas
despesas com a corte, contribuiu para que os ministros fossem despedidos.
Foi num clima de agitação popular e de oposição política das ordens privilegiadas que Luís XVI
resolveu convocar os Estados Gerais (reunião dos representantes das diversas ordens sociais),
enquanto se elaboravam os Cadernos de Queixas (registo dos anseios da sociedade francesa).
24
Da Nação soberana ao triunfo da Revolução burguesa
25
- a proclamação do fim da sociedade de ordens (“Os homens nascem e são livre e iguais em
direitos”);
- a salvaguarda dos direitos naturais do homem (“A liberdade, a propriedade, a segurança e a
resistência à opressão”);
- a defesa da soberania popular contra o absolutismo (“O princípio de toda a soberania reside
essencialmente na Nação”);
- a protecção dos cidadãos pela lei (“Tudo aquilo que não é proibido pela lei não pode ser
impedido […]. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei”);
- a tolerância religiosa (“Ninguém pode ser inquietado pelas suas opiniões, incluindo opiniões
religiosas”);
- a liberdade de expressão (“Todo o cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir
livremente”);
- a defesa da burguesia e do direito à propriedade privada (“A propriedade é um direito
inviolável e sagrado”).
Pela alteração profunda que este documento provocou nas estruturas sociais e políticas de Antigo
Regime, podemos relacioná-lo com o início de um novo período histórico: a Época Contemporânea.
Caracterizar a monarquia constitucional
Em Setembro de 1791 foi aprovada a Constituição. O rei tinha de obedecer a este documento
fundamental, pelo que designamos a nova etapa (1791-92) por monarquia constitucional. Esta
caracterizou-se por:
- separação de poderes: o poder legislativo era entregue à Assembleia Nacional Legislativa
(composta por 745 deputados), o poder executivo pertencia ao rei (que podia vetar as leis durante
dois anos: veto suspensivo) e o poder judicial cabia a juízes eleitos e a um Tribunal Superior;
- instituição da soberania nacional (é a Nação quem escolhe os governantes, através do voto
– sistema representativo);
- consagração dos Direitos do Homem e do Cidadão;
- manutenção da distinção pela riqueza (o processo de eleição de deputados da Assembleia
Legislativa era indirecto e realizado através do sufrágio censitário: apenas os homens mais ricos, que
pagavam um imposto – ou censo – igual ou superior a três dias de trabalho, podiam votar; eram estes
cidadãos activos quem podia escolher os verdadeiros eleitores, os quais, por sua vez, eram aqueles
que tinham riqueza suficiente para pagar um imposto igual ou superior a dez dias de trabalho).
Descrever a passagem da monarquia à república
A República foi proclamada em Setembro de 1792. Dois factores, em especial, precipitaram o fim
do regime monárquico na França:
- a tentativa de fuga do rei, em 1791, com o objectivo de ser acolhido no estrangeiro por um
país de regime absoluto, e o seu regresso humilhante a Paris, apenas serviram para acelerar a
instituição da República, forma de governo que, até, então, não fora defendida;
- a guerra da França, em Abril de 1792, contra os estados absolutistas que queriam restituir o
poder a Luís XVI (Áustria, Prússia) agravou os problemas económicos e contribuiu para o radicalismo
político: os federados (milícias defensoras da Revolução) acorreram a Paris, assaltaram as Tulherias
26
e o rei foi suspenso pela Assembleia Legislativa em Agosto de 1792, terminando, assim, a monarquia
constitucional.
O fim da monarquia viria a consumar-se em 1793 quando, após um julgamento de 26 horas, Luís
XVI foi condenado à morte na guilhotina (pena aplicada, também, à rainha Marie Antoinette, no
mesmo ano).
Relacionar a obra da Convenção com a força do movimento “sans-culotte” e o triunfo dos
ideais jacobinos
A etapa da Convenção republicana (1792-1795) foi marcada pela divisão entre duas facções
políticas: por um lado os Girondinos, por outros os Montanheses (estes últimos liberados por Marat,
Danton e Robespierre). Apesar de todos terem ligações ao Clube dos Jacobinos (clube de burgueses
revolucionários), os Montanheses eram mais radicais. Eram apoiados pelos chamados sans-
coulettes. Estes eram membros das classes populares, artesãos, lojistas e operários que não tinham
rendimentos suficientes para se tornarem cidadãos activos (pois vigorava o sufrágio censitário) mas
exprimiam as suas revindicações em clubes, debates e através de petições (propostas aos poderes
públicos). Tratavam a todos por tu e vestiam-se de maneira característica.
Foi devido à pressão dos sans-coulettes que os Girondinos (e os burgueses, seus apoiantes)
foram afastados do poder em 1793 e o rei foi condenado à morte, sentença que Robespierre
considerava “uma medida de salvação pública”. Os Montanheses estavam, então, livres para
instaurar medidas que agradavam aos sans-coulettes, tais como:
- a Lei do Máximo (que fixava preços e salários);
- a abolição total do feudalismo;
- a instrução gratuita e obrigatória;
- a partilha, pelos mendigos, de bens retirados aos “suspeitos” de oposição à Revolução;
- as leis de assistência social (por exemplo, abonos de família);
- a abolição da escravatura nas colónias (1794).
Explicar o Terror
O Terror designa a fase mais radical e violenta da Revolução Francesa, ocorrida em 1793-1794.
A Convenção, que desempenhava o poder legislativo, criou um governo centralizado e ditatorial:
o poder executivo pertencia a dois Comités – o Comité de Segurança Geral e o Comité de Salvação
Pública, cujos membros dependiam da aprovação mensal da Convenção para se manterem em
funções.
O Comité de Segurança Geral prendia os suspeitos de contra-revolução e entregava-os a um
Tribunal Revolucionário. Na verdade, a Lei dos Suspeitos, de 1793, traduziu-se pela legalização da
violência: todos podiam ser suspeitos, quer “pelas suas conversas ou escritos”, quer por não
possuírem “o certificado de civismo”, por serem “familiares de nobres” ou porque haviam emigrado.
Após um julgamento sumário (breve e sem hipótese de defesa, uma vez que nem sequer eram
inquiridas testemunhas) as vítimas do Terror eram encarceradas e, na maior parte das vezes,
executadas pela guilhotina (inventada em 1789).
Uma outra faceta do Terror consistiu na política de descristianização (movimento anti-religioso). O
governo revolucionário instituiu um Estado laico (não religioso). As marcas do cristianismo foram
27
apagadas: o poeta Fabre Églantine criou um novo calendário, que situava o ano I na data da
proclamação da República pela Convenção (1792) e criava novos nomes para os meses do ano; a
hierarquia religiosa era ridicularizada, os padres refractários eram perseguidos, o culto dos santos foi
substituído pelo culto aos mártires da revolução (por exemplo, a Marat, herói dos sans-coulettes,
assassinado no banho por uma jovem girondina), o casamento religioso passou a acto civil, o divórcio
foi autorizado (através da Lei do Casamento e do Divórcio).
Para compensar a aniquilação do cristianismo, Robespierre criou um culto ao Ser Supremo,
porém, um boa parte da população francesa, fiel à religião católica, afastou-se da revolução. Os
confrontos fizeram-se sentir, em 1793, na região da Vendeia, onde monárquicos e católicos tentaram
a contra-revolução (sem sucesso).
Justificar o fim da república jacobina
A república jacobina teve o seu fim em Julho de 1794 quando Robespierre, responsável por
inúmeras condenações à morte foi, ele mesmo, guilhotinado em resultado de uma conspiração da
Convenção. O extremismo desta etapa foi responsável pelo seu fracasso.
Avaliar a acção do Directório
A etapa do Directório (1795-1799) já foi descrita como a “anti-convenção”, no sentido em que o
novo regime se opôs à ditadura de Robespierre e procurou restabelecer a concórdia social. Assim, de
acordo com a nova Constituição de 1795:
- o poder executivo era entregue a cinco directores (o Directório);
- o poder legislativo pertencia a duas assembleias interdependentes – o Conselho dos
Anciãos (que propunha as leis) e o Conselho dos Quinhentos (que votava as leis);
- o sufrágio censitário indirecto era restabelecido.
Em termos sociais, o fim do Terror jacobino e de todas as suas instituições exprimiu-se através de
um ambiente de festas e de luxo (apesar dos problemas económicos decorrentes da guerra contra a
Europa), bem como da adopção de uma moda extravagante.
Explicar a ascensão de Napoleão Bonaparte
O golpe do 18 do Brumário do Ano VIII (09.11.1799), por Napoleão Bonaparte, acabou com o
Directório, dando início à etapa do Consulado (1799-1804). Uma nova Constituição (de 1799)
entregou o poder a Napoleão, que exercia o cargo de primeiro-cônsul.
A obra do Consulado assentou nas seguintes medidas:
- centralização administrativa e judicial (os juízes e os funcionários locais eram nomeados pelo
governo; o Código Civil de 1804 unificava a França em termos legais);
- recuperação financeira (criação do Banco de França, em 1800, e emissão de uma nova
moeda - o franco germinal);
- reconciliação nacional (fim das perseguições políticas; Concordata com a Santa Sé, em
1801).
No entanto, Napoleão não abandonou o cargo de primeiro-cônsul ao fim de dez anos, como
estava previsto; conseguiu que a Constituição de 1802 o tornasse cônsul vitalício e, em 1804, foi
proclamado Imperador, autocoroando-se na Igreja de Norte-Dame, em Paris. Iniciava-se, então, a
etapa do Império Napoleónico (1804-1815).
28
Figura de contornos míticos na história mundial, Napoleão teve um percurso político pautado por
vitórias militares (destacando-se as campanhas da Itália, em 1796/97 e do Egipto, em 1798), e
derrotas sucessivas (1812-1815), acabando por se retirar da cena política e exilar-se de França.
Sublinhar a consolidação da revolução burguesa
A Revolução Francesa começou por ser uma revolta do Terceiro Estado que, nas palavras do
contemporâneo Abade Sieyès, queria ser “tudo”. A Bastilha, símbolo da prepotência do regime
absolutista, foi tomada pelo povo e por burgueses, as estruturas do Antigo Regime foram
desmanteladas, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão exprimia o ideal político burguês.
Durante a época da Convenção, o poder passou, efectivamente, para as mãos do povo: os sans-
coulettes conseguiram que o sufrágio directo fosse instaurado e a política de condenação de todos os
suspeitos, encarnada por Robespierre, representou a vingança extremada do povo contra os séculos
de repressão das ordens privilegiadas.
Assim, para defender a revolução, a Convenção impôs o despotismo, o Terror.
Seguiu-se-lhe o Directório que, preocupado em impedir uma nova tirania, instituiu a renovação
periódica dos cargos e a distribuição dos poderes. Nesse processo, restituiu a chefia da nação aos
burgueses.
Finalmente, Napoleão Bonaparte, para além de ser considerado um militar brilhante, destacou-se
como legislador activo, consolidando os direitos da burguesia, nomeadamente através:
- do Código Civil de 1804, que assegurava a protecção à propriedade privada;
- da criação dos liceus, em 1802, que permitia preparar os filhos dos burgueses para os
cargos do Estado.
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revolução jacobina; porém, os efeitos foram oposto, pois as nações oprimidas e fragmentadas viriam
a desencadear, ao longo do século XIX, uma série de revoluções liberais.
30
Explicar a invasão de Portugal pelas tropas napoleónicas
Em 1806, Napoleão Bonaparte decretou o Bloqueio Continental, que proibia as nações europeias
de comerciar com a Inglaterra. Portugal, aliado histórico da Inglaterra, desrespeitou o Bloqueio e, em
consequência, sofreu três invasões francesas:
1ª liderada pelo general Junot em 1807-1808 (chega até Lisboa);
2ª comandada pelo marechal Soult em 1809 (chega até o Porto, cujo bispo recusa a rendição;
a tomada violenta da cidade redunda na fuga da população pela ponte das Barcas, que desabou.
Soult retira-se após o envio de reforços de Inglaterra);
3ª chefiada pelo marechal Massena em 1810-1811 (graças às linhas de Torres Vedras,
fortificações construídas por iniciativa de Wellington, a passagem do exército de Massena é
interceptada, retirando-se em 1811).
Relacionar a conjuntura política, económica e social resultante das Invasões Francesas com a
Revolução Liberal de 1820
As invasões francesas podem ser consideradas como uma causa indirecta da Revolução Liberal
portuguesa de 1820, na medida em que criaram uma conjuntura propícia à mudança, a vários níveis:
1. Conjuntura politica:
a) a família real, juntamente com todos os que representavam a monarquia e os
súbditos que quisessem acompanhar a viagem em navios privados (cerca de
15000 pessoas, no total), embarcou para o Brasil (1807). A ideia não era nova,
pois já em épocas anteriores (por exemplo, aquando da invasão espanhola, em
1580) se havia pensado nessa possibilidade. Porém, a mudança da Corte para
o Brasil, apesar de justificada, então, pela necessidade de preservar a
independência de Portugal e de evitar a dissolução da dinastia de Bragança, foi
entendida, pelos súbditos comuns, como uma verdadeira fuga, contribuindo,
assim, para o descrédito da monarquia absoluta.
b) Na ausência de D. João VI (que apenas regressaria em 1821), Portugal ficou
sob o domínio do marechal inglês William Beresford, tornado presidente da
Junta Governativa. Beresford organizou a defesa contra os Franceses,
controlou a economia e exerceu a repressão contra o Liberalismo nascente.
Conquistou o ódio dos militares, que perdiam os postos de comando para os
Ingleses, e da generalidade dos Portugueses que o viam como prepotente
(tendo-se salientado o episodio da execução do general Gomes Freire de
Andrade por envolvimento na conspiração liberal de 1817). A Revolução de
1820 viria a ser desencadeada aproveitando a ausência de Beresford, que se
havia deslocado ao Brasil no intuito de solicitar ao rei poderes acrescidos.
c) A permanência dos Franceses no território português (apesar de serem os
invasores malquistos), bem como o exemplo da revolução liberal espanhola de
1820, contribuíram para disseminar as ideias as ideias liberais entre os
Portugueses.
2. Conjuntura económica:
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a) As invasões francesas, para além de responsáveis pela destruição material à
passagem dos soldados, provocaram a desorganização em todos os sectores
económicos e o défice financeiro.
b) A situação do Brasil como sede do reino (em consequência das invasões
francesas) valeu-lhe a atenção do regente que, durante a sua estadia, tomou
medidas favoráveis à economia brasileira, porem, muito contestadas pela
burguesia da metrópole, destacando-se:
-em 1808, a abertura dos portos do Brasil, obrigando a burguesia portuguesa a
competir com os estrangeiros pelo mercado brasileiro;
-em 1810, o tratado de comércio com a Inglaterra, que favorecia a entrada de
manufacturas inglesas no Brasil.
3. Conjuntura Social:
a) A burguesia, sendo o grupo mais afectado pela crise no comércio e na indústria
decorrente das invasões francesas, era também o mais descontente, logo, mais
inclinado à preparação da revolta. A tomada de consciência política traduziu-se
na constituição do Sinédrio (associação secreta fundada por Manuel Fernandes
Tomás, ligada à Maçonaria) que planificou a rebelião.
32
não eliminou) as rendas e pensões que os camponeses tinham de pagar aos senhores das
terras.
Reconhecer no processo de independência do Brasil uma das razões do fracasso do Vintismo
O Vintismo fracassou por vários motivos:
1. Pela oposição constante das ordens privilegiadas, que não queriam perder os seus
direitos.
2. Pelo descontentamento das classes populares, as quais pretendiam uma reforma
socioeconómica mais profunda, que anulasse as estruturas de Antigo Regime; ao invés, a
actuação vintista defendeu os interesses da burguesia rural em detrimento do pequeno
campesinato, pois os deputados das Cortes eram, também, proprietários de terras. A Lei
dos Forais, nomeadamente, não surtiu o efeito desejado porque não se aplicava a todas
as terras e porque convertia as rendas (habitualmente pagas em géneros) em prestações
pagas em dinheiro, sem um critério de conversão uniforme.
3. Pela actuação antibrasileira das Cortes; apesar de o Brasil ter o estatuto de reino desde
1815, toda a actuação das Cortes se orientou no sentido de lhe retirar autonomia e de
refrear o progresso económico:
- o regresso de D. João VI a Portugal em 1821, onde veio assinar a constituição de 1822,
interrompeu a obra de desenvolvimento que este monarca havia iniciado no Brasil (por
exemplo, permitindo a criação de indústrias, ordenando a criação de um banco, de uma
biblioteca, de um teatro, de uma imprensa local). Ficou no Brasil, como regente, o seu filho
Pedro.
- as Cortes, compostas por deputados que dependiam do comércio colonial, aprovaram
várias leis que tornavam o Brasil directamente dependente de Lisboa (por exemplo, os
poderes judicial e militar eram submetidos directamente a Lisboa) e que retiravam a
liberdade de comércio à colónia (nomeadamente, só os navios portugueses podiam fazer
o comércio do porto em porto em todas as possessões do Império).
- o príncipe regente D. Pedro foi chamado a Portugal com o argumento (pouco
convincente) de ser educado na Europa.
Esta tentativa, por parte das Cortes, de retirar direitos que os colonos sentiam como adquiridos
resultou, em 1822, na independência do Brasil proclamada pelo próprio D. Pedro, coroado Imperador
do Brasil (foi D. Pedro I do Brasil, entre 1822 e 1831, e D. Pedro IV de Portugal, durante uma semana
apenas, em 1826 antes de abdicar do trono português em favor da sua filha).
A perda da colónia americana foi um dos factores de fracasso do Vintismo, pois retirou
importantes fontes de rendimento a Portugal, o que provocou o descontentamento social. A
independência do Brasil só viria a ser reconhecida pela metrópole portuguesa em 1825.
Comparar a Carta Constitucional de 1826 com a Constituição de 1822
A Constituição de 1822 é um diploma arrojado para o seu tempo. Eis as suas principais
deliberações:
1. Os direitos dos cidadãos foram assegurados (art.º. 1 – “A Constituição política da Nação
Portuguesa tem por objectivo manter a liberdade, segurança e propriedade de todos os
33
Portugueses”). Porém, a ausência de representação das classes populares nas Cortes (os
deputados eram, maioritariamente, magistrados, proprietários e comerciantes) repercutiu-
se na afirmação do sufrágio não-universal (Título III, Capítulo I, item 33 – “Na eleição dos
deputados têm voto os portugueses que estiverem no exercício dos direitos de cidadão
[…]. Da presente disposição se exceptuam […]).
2. O poder real foi limitado: o rei, a quem cabia o poder executivo, tinha direito de veto
suspensivo sobre as Cortes, isto é, podia remeter uma lei já aprovada às Cortes
Legislativas, mas teria de acatar o resultado dessa segunda votação. Assim, o absolutismo
foi abolido, pois a soberania residia nas Cortes e não no rei (Título II, item 36 – “A
soberania reside essencialmente em a Nação”).
3. A sociedade de ordens foi abolida, pois não se reconheciam quaisquer privilégios à
nobreza e ao clero (Título I – item 9 – “A Lei é igual para todos”). Esta determinação
motivou, aliás, a oposição cerrada das ordens privilegiadas ao radicalismo vintista.
4. A responsabilidade de elaboração das leis foi entregue a uma Câmara única (Cortes
Legislativas), o que retirava às ordens superiores a possibilidade de terem um órgão de
representação próprio (Título III, Capítulo V, item 105 – “A iniciativa directa das leis
somente compete aos representantes da Nação juntos em Cortes.”).
5. A religião católica era aceite como religião oficial dos Portugueses.
A Carta Constitucional de 1826, ao contrário da Constituição de 1822, é um documento tipo
moderado. A Carta foi outorgada por D. Pedro, após a morte do pai, D. João VI, em 1826 (“Faço
saber a todos os meus súbditos portugueses que sou servido decretar, dar e mandar jurar
imediatamente pelas três Ordens do Estado a Carta Constitucional […]. “ Procurava conciliar o Antigo
Regime e o liberalismo, através das seguintes medidas:
1. O poder real foi ampliado: graças ao poder moderador de que passa a usufruir (Título V,
art.º 71 – 2º poder moderador é a chave de toda a organização política e compete
privativamente ao rei […]”), o monarca podia nomear os Pares, convocar as Cortes e
dissolver a Câmara dos Deputados, nomear e demitir o governo, vetar a título definitivo as
resoluções das Cortes (Título III, art.º 59 – “O rei dará, ou negará, a sanção em cada
decreto […]”) e suspender os magistrados.
2. Os privilégios da nobreza foram recuperados (Título VIII, art.º 45, item 31 – “Garante a
nobreza hereditária e suas regalias.”).
3. As Cortes Legislativas passaram a ser compostas por duas Câmaras: a Câmara dos
Deputados, eleita por sufrágio indirecto e censitário, e a Câmara dos Pares, reservada a
elementos das ordens superiores nomeados a título vitalício e hereditário (Título III, art.º
14 – “As Cortes compõem-se de duas Câmaras […]”.
4. A liberdade religiosa não era admitida.
5. Os direitos do indivíduo só aparecem no fim do documento (Título VIII, art.º 45.º - “[…] a
liberdade, a segurança individual e a propriedade […]” e o sufrágio era censitário e
indirecto.
A Carta Constitucional teve três períodos diferentes de vigência:
34
1º - entre 1826 e 1828.
2º - entre 1834 e 1836.
3º - entre 1842 e 1910 (embora sujeita a alterações desde 1851).
Relacionar a guerra civil de 1832-34 com a resistência ao Liberalismo
O Liberalismo português sofreu várias ameaças:
- as primeiras reacções absolutistas lideradas pelo infante D. Miguel foram apoiadas pela sua
mãe, a rainha D. Carlota Joaquina, pela nobreza e pelo clero. Beneficiando de uma conjuntura
externa favorável ao retorno das monarquias absolutas, D. Miguel pôs em prática dois movimentos
militares: a Vilafrancada, em 1823 e a Abrilada, em 1824. Apesar de fracassados (D. Miguel é exilado
em Viena de Áustria) puseram termo ao projecto progressista do Vintismo. D. João VI remodelou o
governo, que passou a integrar liberais moderados, e muitos dos liberais (ou “malhados”, como lhes
chamavam os partidários de D. Miguel) fugiram do país;
- em 1828, Portugal tornou-se, de novo, um país absolutista. Perante o problema da sucessão
ao trono após a morte de D. João VI, D. Pedro, então imperador do Brasil, confirmou a regência de
Portugal pela sua irmã, a infanta D. Isabel Maria e abdicou dos seus direitos à Coroa em favor da
filha D. Maria da Glória (rainha D. Maria II). Porém, como a sua filha tinha apenas sete anos, ficaria
como regente D. Miguel, o qual casaria com a sobrinha e juraria a Carta Constitucional. O casamento
não se chegaria a realizar pois D. Miguel, após ter regressado do exílio, convocou Cortes onde se fez
aclamar rei absoluto. Assim, entre 1828 e 1834, Portugal viveu sob o regime absolutista, o que
conduziu à fuga de um grande número de liberais;
- entre 1832 e 1834 desenrolou-se a guerra civil entre os liberais (chefiados por D. Pedro
desde 1831) e os absolutistas (liderados por D. Miguel). A implantação definitiva do Liberalismo
revelou-se muito difícil, pois D. Pedro apenas dispunha de um pequeno exercito (de cerca de 7500
homens). Foi a partir da ilha Terceira dos Açores (que já se havia insurgido militarmente contra o
absolutismo em 1828 e em 1829) que D. Pedro organizou a resistência. Em 1832 desembarcou em
Pampelido (Mindelo), dirigindo-se para a cidade do Porto, onde foi cercado, durante dois anos, pelas
forças absolutistas (Cerco do Porto). A vitória liberal só aconteceu em 1834, e foi selada pela
convenção de Évora-Monte. D. Pedro morreu, pouco tempo depois, de tuberculose, enquanto o seu
irmão D. Miguel foi exilado para o resto da sua vida. D. Maria II, rainha desde os sete anos de idade,
só então, com quinze anos, pôde sentar-se no trono português.
37
A nível político, o Liberalismo defende a representatividade popular, contra o regime absolutista; a
nível económico, é a favor da liberdade de iniciativa privada, contra o intervencionismo do Estado; a
nível social, coloca a burguesia no topo da escala social, contra os privilégios da nobreza e do clero.
A implantação do Liberalismo correspondeu à queda do Antigo Regime e influenciou, de forma
marcante, grande parte dos regimes actuais.
Mostrar que o Liberalismo defende os direitos individuais
O Liberalismo defende os direitos individuais porque considera que esses direitos são naturais,
isto é, derivam da própria condição do ser humano e, como tal, nascem com o indivíduo.
São eles:
1. O direito à liberdade (que dá o nome ao Liberalismo): é o direito mais abrangente, pois
engloba todos os outros direitos – podemos referir, nomeadamente, a liberdade de seguir
apenas a lei, rejeitando qualquer autoridade arbitrária, a liberdade de expressão, a
liberdade de exercer uma profissão, de possuir bens, de reunião, a liberdade religiosa, a
liberdade de participar na vida política.
2. O direito à igualdade: todos os cidadãos passavam a ser considerados iguais perante a lei;
porém, nas formas de liberalismo moderado eram aceites e, até fomentadas as distinções
sociais, nomeadamente com base na riqueza. A questão dos direitos à liberdade e à
igualdade levantou, em vários países, a polémica sobre a permanência da escravatura,
considerada contraditória com os direitos naturais; nos EUA, nomeadamente, a
escravatura esteve na base da guerra civil entre o Norte liberal e o Sul esclavagista, entre
1861 e 1865.
3. O direito à segurança e à propriedade: a importância concedida à posse de bens explica-
se pela preponderância da burguesia (grupo social que baseou a sua ascensão social nos
lucros do comércio e na aquisição de propriedades). Defendia-se, abertamente, que as
assembleias representativas deveriam ser compostas por proprietários, os únicos que
seriam capazes de representar os interesses dos seus eleitores (também eles,
proprietários) e de manter a ordem e a segurança necessárias à preservação dos bens.
A defesa do direito à propriedade explica porque é que, na maioria dos países que
adoptaram o Liberalismo, só podia escolher os seus representantes quem atingisse um
determinado patamar de rendimentos – sufrágio censitário – apesar de este tipo de
sufrágio introduzir um factor evidente de desigualdade entre os cidadãos. Os mais ricos
eram também, na opinião dos liberais, os mais instruídos e, portanto, os mais capazes de
votar.
4. O direito de intervir na governação: o súbdito do Antigo Regime é substituído pelo cidadão
do Liberalismo, indivíduo que é convidado a participar na vida politica de múltiplas
maneiras – como eleitos e detentor de cargos (se tivesse os meios económicos de se
tornar cidadão activo), mas também participando nos diversos clubes (por exemplo, no
Clube dos Jacobinos, em França), assistindo às assembleias legislativas, onde intervinha
na discussão, escrevendo para jornais ou apresentando petições (reivindicações escritas).
Basta lembrar a importância dos sans-coulettes na etapa da Convenção da Revolução
38
Francesa para nos apercebermos de como os cidadãos ditos “passivos” podiam influenciar
de forma determinante o rumo da governação.
Pela sua importância, estes direitos apareceram consignados nos diplomas fundamentais do
Liberalismo:
- a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América (1776) apresenta como
justificação para romper os laços políticos com a Inglaterra os “Direitos inalienáveis, entre os
quais a Vida, a Liberdade e a procura da Felicidade”;
- a Constituição dos Estados Unidos da América (1787) tem como objectivo assegurar “os
benefícios da liberdade”;
- a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789) refere, no seu artigo 1.º,
que “Os homens nascem e são livres e iguais em direitos” e, no artigo 2.º que os direitos naturais
do homem “são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão”;
- a Carta Constitucional de 1814 esclarece, no Artigo 1.º, que “Os Franceses são iguais
perante a lei [..]”, embora apresente, seguidamente, todas as nuances a esse direito
características de um liberalismo moderado (bicameralismo, sufrágio censitário, autoridade real
reforçada, liberdade de expressão e de religião relativizadas);
- a primeira Constituição Portuguesa (1822) explicita, logo no seu artigo 1.º, que “tem por
objectivo manter a liberdade, a segurança e a propriedade de todos os Portugueses”;
- a Carta Constitucional portuguesa (1826), partidária de um liberalismo mais moderado,
remete a enunciação dos direitos para o fim do diploma constitucional, referindo, no artigo 45.º
que “A inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos portugueses, que tem por base a
liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida pela constituição do Reino”.
Sublinhar os fundamentos do liberalismo político, a saber: constitucionalismo; separação de
poderes; soberania da Nação, representada em assembleias
Em todos os países onde o Liberalismo se afirmou, foi necessário criar os mecanismos legais
para impedir o retorno ao Absolutismo. Deste modo, os princípios liberais eram salvaguardados pelas
seguintes medidas:
- elaboração de um documento onde eram explicitados os direitos e os deveres dos cidadãos
e o funcionamento do Estado: esse documento podia ser chamado Constituição, quando era
elaborado e votado pelos representantes do povo (deputados) ou Carta Constitucional, quando era
outorgado por um monarca, nos regimes liberais mais conservadores;
- separação dos poderes legislativo, executivo e judicial, entregues a diferentes
representantes de forma a que um déspota não pudesse concentrar em si todos os poderes.
Habitualmente, o poder executivo pertencia ao rei (pois o Liberalismo não significou o fim das
monarquias) e aos ministros do Governo, enquanto o poder legislativo pertencia a assembleias
eleitas pelos cidadãos e o poder judicial cabia a juízes eleitos;
- direito dos cidadãos da Nação a fazerem-se representar em assembleias (soberania
nacional). As assembleias, que elaboravam as leis, podiam assumir a forma de uma Câmara única
que representava os cidadãos (nos regimes liberais mais progressistas) ou de um sistema bicameral
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(no Liberalismo moderado ou conservador) em que ainda se permitia que os representantes das
ordens sociais superiores – clero, nobreza – se reunissem à parte, depois de nomeados pelo rei.
A soberania nacional não deve de ser confundida com a soberania popular, característica dos
regimes democráticos pois, devido às restrições impostas ao direito de voto com base na fortuna
(sufrágio censitário), a população não era representada na sua globalidade.
Um dos aspectos mais polémicos da implantação do Liberalismo foi a questão religiosa. A defesa
dos direitos individuais dos cidadãos previa o direito à liberdade religiosa; porém, na maior parte dos
países que adoptaram o Liberalismo, as estruturas da Igreja católica foram declaradamente atacadas
por serem consideradas coniventes com o regime absolutista deposto. Em França, por exemplo,
subordinou-se o clero ao Estado através da Constituição Civil do Clero, procedeu-se a uma
campanha de descristianização e à promulgação da Lei do Casamento e do Divórcio que substituía o
sacramento do matrimónio por um contrato civil, passível de dissolução. A laicização do Estado
(emancipação do Estado da influência religiosa) passou, também, pelas seguintes medidas:
- instituição do registo civil para os nascimentos, casamentos e óbitos, substituindo os registos
paroquiais;
- criação de escolas e hospitais públicos;
- expropriação e nacionalização dos bens das ordens religiosas, muitas das vezes extintas.
Devido à secularização (sujeição às leis civis) das instituições, o clero viu perder, num curto
espaço de tempo, os privilégios de que havia beneficiado desde a Idade Média; o anticlericalismo
chocou uma parte da sociedade civil, a qual chegou mesmo, por vezes, a identificar-se, de novo, com
o Absolutismo – foi o que aconteceu em França, na revolta da Vendeia, ou em Portugal, na adesão
popular a D. Miguel.
Caracterizar o liberalismo económico
Ao contrário daquilo que defendia o mercantilismo, o liberalismo económico opunha-se à
intervenção do Estado na economia. De acordo com o valor iluminista do individualismo, devia dar-se
total liberdade à iniciativa privada, pois a procura individual do lucro resultaria, naturalmente, na
riqueza e progresso de toda a sociedade. Destacaram-se vários pensadores na formulação dos
princípios do liberalismo económico:
- Adam Smith defende a inteira liberdade de iniciativa dos indivíduos para produzir e
comerciar; o Estado não precisa de se imiscuir na economia pois esta rege-se por leis próprias, em
particular a lei da oferta e da procura e a livre concorrência;
- Quesnay advoga o fisiocratismo, doutrina económica segundo a qual a base da riqueza de
cada país está na agricultura, pelo que se deve incentivar todos os cidadãos a serem agricultores e a
comercializarem, em regime de livre concorrência, os seus produtos agrícolas; o fisiocratismo serviu
de base ideológica à revolução agrícola inglesa do século XVIII;
- Gournay exprimiu o ideal de livre concorrência na famosa expressão “laissez faire, laissez
passer” (“deixai produzir, deixai comercializar”).
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Identificar as características do Romantismo
No final do século XVIII e durante o século XIX, percorreu a Europa uma corrente estética com
origem na Alemanha: o Romantismo. As principais características deste movimento cultural devem
ser enquadradas no seu contexto histórico:
- culto do eu: num tempo marcado por revoluções constantes, quer a nível político (revoluções
liberais), quer a nível económico (revolução industrial), torna-se compreensível que uma das
características mais importantes do Romantismo seja a recusa do racionalismo e da harmonia: o
indivíduo centra-se nas suas sensações subjectivas, deixa que os sentimentos o dominem e procura
paisagens dramáticas em consonância com o seu estado de espírito instável. O herói romântico
experimenta, assim, uma insatisfação inexplicável – o “mal do século”;
- exaltação da liberdade – o Romantismo exprimiu, na arte, o desejo de liberdade social e
política enquanto, na prática, se envolvia nas lutas políticas e sociais da sua época. Várias figuras do
Romantismo, nacionais e estrangeiras, combateram, na arte e na vida, pela liberdade dos povos. O
Romantismo tornou-se, assim, sustentáculo do Liberalismo, o que levava Victor Hugo a afirmar: “O
Romantismo […] é afinal de contas […] o Liberalismo em literatura”.
Relacionar o nacionalismo romântico com o interesse pela Idade Média
A preocupação romântica em defender as minorias étnicas da sujeição aos estados autoritários
(defesa do princípio das nacionalidades) e o apoio dos românticos aos movimentos de unificação
nacional (quer a Itália, quer a Alemanha apenas se tornaram estados unificados no século XIX)
alicerçaram-se no interesse pela Idade Média: nesse período histórico os românticos encontraram a
origem das nações da Europa Ocidental. O Romantismo recuperou, da Idade Média, as tradições, a
arte gótica, a literatura, em suma, tudo o que pudesse legitimar o seu desejo de liberdade através da
busca das “origens”.
Além do mais, os românticos identificavam a Idade Média com a sua própria sensibilidade,
encarando-a como um período apaixonante e de profundo dramatismo.
Distinguir os princípios estéticos do Romantismo nas artes plásticas, na literatura e na música
Desde o final do século XVIII, a literatura registou uma assinalável democratização graças ao
avanço da técnica industrial, que tornou a impressão dos livros e jornais mais barata. As obras
literárias românticas difundiram-se, assim, a um corpo de leitores mais alargado, que acompanhava
com entusiasmo o novo estilo, baseado nos seguintes pressupostos:
- reacção ao classicismo;
- valorização do sujeito e das suas intuições;
- busca do pitoresco e do exótico;
- produção de romances com base em factos históricos, sobretudo medievais (por exemplo,
os romances de Walter Scott e de Victor Hugo);
- poesia emotiva (por exemplo, com Goethe e o movimento Sturm und Drang – “Tempestade e
Paixão”);
- culto das emoções externas;
- culto das literaturas nacionais;
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Nas artes plásticas, o Romantismo operou, também, uma revolução assinalável em relação aos
paradigmas do racionalismo neoclássico:
- captação de atmosferas através da cor e da luminosidade (por exemplo, na pintura de
William Turner);
- valorização da expressividade e do movimento (por exemplo, nas telas de Delacroix);
- inspiração na Natureza;
- nostalgia de um mundo desaparecido (Oriente, Idade Média).
Na música, o Romantismo é emoção pura, caracterizando-se por:
- apuramento da melodia;
- desenvolvimento da sinfonia (destacando-se as sinfonias de Beethoven);
- virtuosismo instrumental (como o demonstram as obras para violino de Paganini ou para
piano, de Chopin);
- inspiração na poesia (por exemplo, em Schubert);
- revivalismo do folclore musical (nomeadamente, com Grieg e Sibelius);
- afirmação da ópera (graças aos exemplos incontornáveis de Puccini, Verdi e Wagner).
Exemplificar manifestações literárias e artísticas do Romantismo em Portugal
Embora com atraso cronológico (segundo quartel do século XIX), o Romantismo português
acompanha de perto as características gerais do movimento romântico europeu: a par da idealização
das personagens, as obras românticas integram, geralmente, a ideia de um destino fatal (a morte é,
muitas vezes, a solução para o conflito), a salvação pela religião, a valorização do pitoresco e das
raízes medievais. Tal como acontece no resto da Europa, o escritor romântico compromete-se com a
ideologia política do Liberalismo.
São exemplos marcantes do movimento literário romântico em Portugal:
Almeida Garrett:
- é, geralmente, considerado o introdutor do Romantismo em Portugal (com os poemas
Camões e D. Branca);
- renovou o teatro português, como testemunha a obra dramática Frei Luís de Sousa;
- aplicou-se na pesquisa das raízes populares da literatura nacional (de que resultaram o
Cancioneiro e o Romanceiro);
- inspirou-se na História, que fez reviver nos seus escritos (por exemplo, nas Viagens na
Minha Terra e n’ O Arco de Sant’Ana);
- abraçou a ideologia liberal, o que lhe valeu o exílio na Inglaterra e na França.
Alexandre Herculano:
- marcou a historiografia nacional com a sua Historia de Portugal;
- inspirou-se na Idade Média para os seus romances históricos (por exemplo, em Eurico, o
Presbítero);
- tal como Almeida Garrett, esteve exilado em França e desembarcou juntamente com D.
Pedro IV e os liberais na praia de Pampelido.
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Camilo Castelo Branco:
- o Romantismo literário encontrou-se com o dramatismo na vida real (Camilo experimentou o
encarceramento, no Porto, devido à sua relação adúltera com Ana Plácido);
- conduziu ao clímax o espírito romântico na sua obra Amor de Perdição.
O Romantismo, movimento que exacerbava o fervor dramático, continuou a cultivar-se a par de
uma nova corrente que a ele se opunha: o Realismo, movimento que desponta, em Portugal, no
último quartel do século XIX.
Na arquitectura, o Romantismo evidenciou-se na mistura de vários estilos como o manuelino, o
gótico e os elementos exóticos árabes e indianos; este eclectismo teve um resultado feliz na
construção do Palácio da Pena, em Sintra, ou da Estação do Rossio, em Lisboa.
Na escultura destacaram-se de um panorama algo pobre Soares dos Reis (é famosa a sua obra
O Desterrado) e o seu discípulo António Teixeira Lopes.
Na pintura, devem salientar-se as obras de Domingos António Sequeira, Tomás da Anunciação,
Francisco Pereira Meneses e Francisco Metrass.
MÓDULO 6
A Civilização industrial – economia e sociedade; nacionalismos e choques
imperialistas
As transformações económicas na Europa e no Mundo
43
(petróleo e electricidade), novos sectores de ponta (siderurgia, química) e novos inventos (por
exemplo, o motor de explosão e a lâmpada).
Num sentido mais amplo, a segunda revolução industrial ultrapassa os aspectos técnico e
produtivo para abranger a expansão do capitalismo industrial com consequências ao nível de toda a
vida em sociedade.
Referir os principais progressos técnicos
Relembremos: o século XVIII (primeira revolução industrial) foi marcado pela revolução industrial
do ferro, graças aos seguintes progressos:
1. A utilização do carvão de coque (obtido a partir de carvão mineral) como combustível.
2. O aperfeiçoamento dos foles.
3. A técnica da pudelagem (que permitia transformar o ferro de primeira fundição, não
purificado, em ferro ou em aço).
Já a segunda metade do século XIX (segunda revolução industrial) é o período de afirmação do
aço:
1. Em 1856, Bessemer inventou um conversor que transformava o ferro em aço segundo
um processo muito mais rápido que o da pudelagem.
2. Em 1867, o processo Siemens-Martin recuperava ferragens, permitindo produzir
grandes quantidades de aço.
3. Em 1878, o método de Thomas e Gilchrist permitia eliminar o fósforo, aproveitando
maiores quantidades de minério.
A partir de 1880, o aço, mais moldável e resistente, substitui o ferro na construção de máquinas
para a indústria, de meios e vias de transporte e na construção civil, conferindo à siderurgia o papel
de sector de ponta da segunda revolução industrial.
Outro sector que registou um grande avanço foi o da indústria química:
1. Os corantes artificiais foram utilizados na indústria têxtil graças aos trabalhos de Perkin,
em 1856.
2. Criaram-se novos medicamentos, por exemplo, a aspirina, criada pela empresa Bayer,
em 1899.
3. Os insecticidas e os fertilizantes foram produtos de sucesso deste ramo da indústria.
4. O processo de vulcanização da borracha (Goodyear, 1884) deu origem à indústria de
pneus para automóveis e bicicletas.
Enquanto a primeira revolução industrial é indissociável da energia a vapor, alimentada pela
hulha (carvão mineral), a segunda revolução industrial introduziu novas fontes de energia que
produziram uma ruptura tecnológica: o petróleo e a electricidade.
A indústria petroquímica (relativa aos derivados do petróleo) beneficiou dos seguintes progressos
técnicos:
1. 1859: exploração do primeiro poço de petróleo (Pensilvânia, EUA).
2. 1886: invenção do motor de explosão (por Daimler) que funcionava a petróleo;
3. 1897: invenção do motor movido a óleo pesado (gás oil).
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Na mesma época, a energia eléctrica foi aplicada a uma serie de progressos técnicos que
deslumbraram os seus contemporâneos:
1. A lâmpada eléctrica (grande invento de Edison) substituiu a iluminação a gás nas ruas e
casas, com franca vantagem: ao contrário do sistema anterior, a lâmpada não libertava
calor, não sofria explosões nem intermitências e o consumo era de fácil contagem;
2. A electricidade, aplicada aos mais diversos maquinismos, revolucionou a vida do cidadão
comum. Surgiram, nomeadamente:
- o comboio eléctrico (criado por Siemens em 1879, embora continuassem plenamente
activos os comboios a vapor);
- o telefone (invenção de Bell, em 1876);
- o cinema (com origem no cinematógrafo de Lumière, em 1895);
- a radiofonia (fruto da aplicação da teoria das ondas hertzianas, em 1887);
- os metropolitanos e os carros eléctricos.
Nos transportes, registaram-se os seguintes progressos:
1. A aplicação da energia a vapor ao comboio (por Stephenson que, em 1830, inaugurou a
linha Liverpool - Manchester) e ao navio (a partir de 1860) ditou uma nova era nos
transportes, facilitando a circulação das matérias-primas, dos produtos industriais e das
pessoas.
2. A utilização do motor de explosão nos automóveis e aviões alterou, para sempre, as
noções de distância.
3. A bicicleta tornou-se, não só, um meio de transporte bem acolhido por todas as classes
sociais, mas também uma modalidade desportiva de grande êxito.
Justificar a concentração monopolista
A partir de cerca de 1870, a pequena oficina cede lugar à empresa concentrada, ou seja, a
produção é realizada em grandes fábricas (concentração geográfica) que reúnem avultados capitais
por acções (concentração financeira), onde trabalham numerosos operários (concentração da mão-
de-obra) os quais vigiam numerosas máquinas (concentração técnica). Este gigantismo explica-se,
por um lado, pela própria natureza de alguns sectores económicos (como, por exemplo, o da
siderurgia) que exigiam máquinas volumosas e um grande número de operários e, por outro lado, por
imperativos económicos que tornavam mais rentável a grande fábrica, abolindo, assim, a
concorrência das pequenas empresas através da criação de monopólios de produção (por exemplo, a
empresa alemã Krupp detinha um verdadeiro monopólio da produção de aço).
Em suma, a tentativa de criação de monopólios justifica-se pelo sistema económico do
capitalismo industrial que caracterizou a segunda metade do século XIX.
Distinguir concentrações verticais e horizontais
Concentrações verticais – consistem no controlo, por uma empresa, das várias etapas de
fabrico de um produto industrial (por exemplo, da exploração da borracha à sua transformação em
pneus de automóvel e, por último, à comercialização do produto acabado). Controlando todo o
processo de produção, a empresa consegue diminuir o grau de imprevisibilidade do negócio e obter
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as melhores condições financeiras em cada uma das fases de produção. Assim se formaram alguns
dos monopólios do século XIX.
Concentrações horizontais – consistem no agrupamento de empresas de um mesmo ramo (por
exemplo, têxtil) que combinam, entre si, as condições de produção que consideram melhores, de
maneira a vencer a concorrência (quer interna, por parte de empresas que não integram essa
concentração, quer externa, de outros países produtores).
Também os bancos se envolveram no processo de concentração: os bancos mais pequenos
foram sendo absorvidos pelos mais poderosos (por exemplo, os bancos da família Rockefeller) os
quais se expandiram em número de sucursais e em volume de operações financeiras.
Os bancos alimentaram a expansão industrial, oferecendo os seus serviços às operações
comerciais e o crédito à indústria e, por sua vez, lucraram com o desenvolvimento industrial, muitas
das vezes investindo directamente em companhias industriais (eram, por isso, chamados “bancos de
negócios”).
Explicar os métodos de racionalização do trabalho
O engenheiro Frederick Taylor expôs o método de transformar a produção num processo racional,
isto é, pensado de maneira a tornar-se o mais rentável possível. A racionalização, descrita na sua
obra Princípios de Direcção Cientifica da Empresa, foi chamada de taylorismo e assentava nos
seguintes procedimentos:
1. Dividir a produção de um objecto numa série de “movimentos essenciais que cada um
dos operários tem de executar”.
2. Pré-definir o tempo mínimo necessário para a realização de cada um desses gestos
simples.
3. Produção de objectos todos iguais – estandardização.
Henry Ford aplicou o taylorismo à produção de automóveis, introduzindo a linha de montagem
nas suas fábricas para (nas palavras do próprio Ford) “levar o trabalho ao operário, em vez de levar o
operário ao trabalho”. Desta maneira poupavam-se todos os gestos inúteis ou lentos, o que resultou
num extraordinário aumento da produtividade. Ainda de acordo com as ideias de Taylor, Ford
aumentou os salários dos seus operários, conseguindo com essa medida motivá-los para o trabalho e
até vender-lhes automóveis. A racionalização aplicada às fábricas tomou o nome de fordismo.
Embora eficaz do ponto de vista do patrão, o fordismo foi considerado desumano para os
operários: o capitalismo industrial transformou o antigo artesão, orgulhoso do seu trabalho criativo,
que desenvolvia do início ao fim, num proletário, elemento substituível de uma cadeia de montagem
que, de seu, apenas tinha um salário e a sua prole. Estava, assim, consumada a divisão entre o
capital (patrão) e o trabalho (operário).
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A Geografia da Industrialização
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Ao contrário do proteccionismo, o livre-cambismo opunha-se à intervenção do Estado na
economia; reunia defensores desde o século XVIII, em especial Adam Smith, economista escocês
que advogava a total liberdade da iniciativa privada (liberalismo económico), uma vez que a
economia se auto-regularia pela lei da oferta e da procura e pela livre concorrência.
As ideias de Adam Smith foram desenvolvidas, ainda no século XVIII, por Thomas Malthus, David
Ricardo e Jean Baptiste Saly e foram aplicadas no século XIX, um pouco por toda a Europa industrial
que se revia no exemplo da Inglaterra e do seu primeiro-ministro Robert Peel. Este aboliu as
chamadas Corn Laws, leis que protegiam a produção de pão nacional através de taxas aplicadas
sobre a importação de trigo.
Caracterizar as crises do capitalismo
Apesar de ser um sistema económico favorável ao capitalismo industrial, o livre-cambismo
padecia de um problema intrínseco: de tempos a tempos (em intervalos de tempo de 6 a 10 anos), o
sistema de livre concorrência (livre procura de lucro) originava crises económicas para se auto-
regular. Estes ciclos de curta duração, estudados por Clément Juglar (e por isso denominados,
correntemente, por ciclos de Juglar) caracterizam-se por três etapas:
1. Uma fase de crescimento económico, durante a qual a produção aumenta e as actividades
financeiras (banca, bolsa) se expandem, de modo a corresponder à procura dos
consumidores.
2. Uma etapa de crise, isto é, de rápida diminuição da produção e descida dos preços, numa
tentativa de escoar o excesso de produção acumulada (crise de superprodução). A
tendência de baixa da economia conduz rapidamente a falência de empresas e de bancos
e à quebra de investimento na bolsa (crash); a população desempregada não tem meios
para consumir em abundância, o que retira o estímulo à produção. Em virtude do livre-
cambismo, a crise expande-se, a breve trecho, pelo mundo industrializado e respectivas
áreas coloniais, originando uma contracção do comércio internacional.
3. Uma etapa de recuperação, em que a oferta e a procura se reajustam e as actividades
económicas são relançadas (até que uma nova crise venha abalar a economia).
Estas crises – que se distinguem das crises do Antigo Regime por serem crises de superprodução
industrial e não crises de escassez devido a maus anos agrícolas – eram inerentes ao próprio
sistema capitalista, em que o Estado não intervinha na economia; porém, os elevados custos, não só
económicos mas também (e sobretudo) sociais, levaram os governos a admitir, no final do século
XIX, medidas de retorno ao proteccionismo.
No século XX, devido à Grande Depressão dos anos 30, despoletada pela crise de 1929 nos
EUA, tornou-se evidente que o liberalismo económico puro tinha de ser refreado pela intervenção do
Estado.
Explicar os fundamentos da divisão internacional do trabalho
Entende-se por divisão internacional do trabalho a parte de produção e de comercialização que
cabe a cada país: na linha da frente, e com o maior número de investimentos no Mundo e a
respectiva compensação em lucros, encontravam-se a Inglaterra, a França, a Alemanha e os EUA.
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Este protagonismo fundamenta-se na rápida industrialização que estes quatro países tiveram, a qual
lhes permitiu explorarem economicamente os países mais atrasados e as colónias.
O capitalismo industrial contribuiu para criar um mundo económico desigual, no qual um punhado
de países detém o controlo das correntes de comércio internacional.
50
permitia o surgimento do sentimento de paternidade, que começou a difundir-se a limitação voluntária
dos nascimentos.
Justificar a expansão urbana
O crescimento das cidades oitocentistas explica-se pela atracção que estas exercem sobre uma
população em franco crescimento. Entre os principais factores de expansão urbana, contam-se:
- o êxodo rural: as alterações na produção agrícola, ao dispensarem parte da mão-de-obra,
levam a que o habitante da província procure a cidade (sobretudo a partir de 1850, a população
urbana da Grã-Bretanha, da França e da Alemanha regista um crescimento substancial, enquanto a
população rural desses países estagna ou decresce);
- a emigração: a população europeia foi responsável por diversas vagas de partida para as
colónias dos continentes africano, americano e oceânico, destacando-se, em especial, o crescimento
urbano nos EUA (em consonância com a sua supremacia económica, Nova Iorque tornou-se a
segunda cidade mundial, em 1900);
- o crescimento dos sectores secundário e terciário: a indústria, o comércio, as profissões
liberais concentram-se nas cidades e requerem cada vez mais efectivos; é o caso, por exemplo, da
cidade de Essen, onde estava sediada a fábrica Krupp e que passou de 2000 habitantes, em 1800,
para 443 mil habitantes em 1900. Simultaneamente, a população activa dedicada ao sector primário
(agricultura, pesca, silvicultura) diminui acentuadamente (por exemplo, na Alemanha passou de
42,5% em 1882 para 28,6% em 1907).
Caracterizar o novo urbanismo oitocentista
O crescimento muito rápido de algumas cidades (por exemplo, Londres, Paris, Nova Iorque)
originou novos problemas que se tornaram um desafio para as chefias municipais e para arquitectos,
urbanistas e filantropos.
O novo urbanismo tinha, essencialmente, duas preocupações:
- criar espaços para a burguesia, “entregando” a cidade àqueles que a tinham criado;
- proporcionar condições de vida mais dignas para os proletários, em geral provincianos
desenraizados, cujos filhos trabalhavam arduamente para aumentar o rendimento doméstico:
1. No âmbito da afirmação burguesa, destacam-se as grandes intervenções urbanas nas
principais cidades europeias: as antigas muralhas são destruídas, rasgam-se avenidas, criam-se
infraestruturas (abastecimento de água e iluminação, rede de esgotos), projectam-se espaços para o
lazer (óperas, teatros, jardins…), criam-se redes de transportes públicos (eléctricos,
metropolitanos….).
Neste processo, a cidade expande-se em extensão (ou em altura, como nos EUA, com os primeiros
arranha-céus), relegando as “classes perigosas” para a periferia. Os “grands travaux” (grandes obras
públicas), encomendados ao barão Haussmann por Napoleão III em meados de Oitocentos,
alteraram profundamente a fisionomia de Paris e serviram de exemplo a outras cidades em
renovação nos séculos XIX e XX. A “Paris de Haussmann” celebra as conquistas da burguesia.
2. No século XIX, vários urbanistas, preocupados com os problemas sociais que atribuíam à
deficiente habitação operária (alcoolismo, criminalidade, promiscuidade, epidemias, prostituição,
mendicidade), procuraram soluções ideais para integrar harmoniosamente o operário no espaço
51
industrial. Ficaram conhecidos por urbanistas utópicos: Charles Fourier lançou a ideia de um
falanstério – edifício para a habitação e o trabalho dos operários – e Godin criou o familistério ou
palácio social, onde as famílias operárias dispunham de alojamento cómodo.
Distinguir a origem e o destino das migrações internas
O fenómeno urbano esta intimamente ligado ao das correntes migratórias: no século XIX, a
principal origem das migrações internas (dentro do mesmo país) era o campo - fosse porque uma
agricultura mecanizada dispensava mão-de-obra para as fábricas, fosse porque uma agricultura de
subsistência fornecia insuficientes rendimentos – e o principal destino era a cidade. A partir de 1850,
o êxodo rural foi responsável pelo acentuado crescimento da população urbana da Europa (sobretudo
da Grã-Bretanha e Alemanha). Para as raparigas do campo, o destino profissional era, na maioria
das vezes, o serviço doméstico.
Porém, um outro tipo de migrações internas era frequente: as deslocações sazonais (realizadas
apenas em certas alturas do ano) para locais onde era necessário, pontualmente, um acréscimo de
mão-de-obra.
Explicar o fenómeno emigratório
A partir de 1840, os Europeus espalharam-se pelo Mundo em sucessivas vagas de emigração. Na
origem deste fluxo emigratório terão estado os seguintes factores:
1. A pressão populacional: os governos e sindicatos apoiavam políticas migratórias no intuito
de contornar os problemas decorrentes da explosão populacional europeia (necessidade de
mais empregos, contestação social).
2. Os problemas do mundo rural: enquanto nos países desenvolvidos as transformações na
agricultura libertavam mão-de-obra, nas regiões menos industrializadas persistiam as fomes
provocadas por maus anos agrícolas (foi o caso da vaga de emigrantes irlandeses, durante
a “potatoe famine” – fome de batatas - da década de 1840).
3. Os problemas ligados à industrialização: uma industrialização muita rápida (por exemplo,
na Grã-Bretanha) produzia desemprego tecnológico (os homens eram substituídos por
máquinas), e uma industrialização lenta (caso de Portugal), não oferecia empregos
suficientes para a população em crescimento. Ambas as situações podiam, portanto, levar
à emigração para países com carência de mão-de-obra.
4. A revolução dos transportes, que embarateceu o preço das passagens, nomeadamente de
barco a vapor.
5. A idealização dos países de destino (nomeadamente os EUA, que receberam metade da
imigração europeia, e o Brasil, principal destino da emigração portuguesa no século XIX),
os quais eram vistos como terra das oportunidades, da promoção social e da tolerância
moral. Os EUA receberam perto de 34 milhões de pessoas entre 1821 e 1920, sendo a
forte imigração apontada como um dos factores que explicam a sua pujança económica.
6. A fuga a perseguições politicas e religiosas (por exemplo, aquando da instauração da 2ª
república, em 1848, em França).
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Unidade e diversidade da sociedade oitocentista
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a) Pequenos empresários da indústria – embora vulneráveis às crises e aos consequentes
fenómenos de concentração empresarial, foram-se expandindo em número ao longo do
século XIX.
b) Empregados comerciais – a expansão da revolução industrial criou novos empregos para
fazer chegar o produto ao consumidor do mercado interno (por exemplo, os empregados de
grandes armazéns ou os transportadores)
c) Profissionais liberais – eram todos aqueles que, em vez de terem um patrão, trabalhavam por
conta própria. Estavam ligados à ideia de promoção social: tornar-se médico, advogado,
empregado de escritório (colarinho branco) ou professor primário era uma maneira segura de
perspectivar um futuro desafogado, longe da dureza do trabalho manual da imprevisibilidade
do mundo dos pequenos negócios. O seu estatuto valorizou-se na medida em que serviam as
necessidades (de cuidados médicos, de conhecimentos jurídicos, de instrução) da sociedade
industrial.
As classes médias eram acérrimas defensoras dos valores da burguesia, no intuito de
permanecerem (e, se possível, promoverem-se) dentro dessa classe social. Tornaram-se, assim, as
classes mais conservadoras.
Caracterizar a condição operária
A aplicação do liberalismo económico nos países industrializados, ao estabelecer a não-
intervenção do Estado, deixou os operários à mercê das regras do mercado. O proletário é aquele
que não tem qualquer poder sobre a produção, pois as minas, os caminhos-de-ferro, as fábricas
pertencem à classe burguesa que detém o capital. Ele apenas tem os seus filhos e um salário pelo
seu trabalho, o qual aumenta ou diminui conforme a prosperidade da empresa, sem que um salário
mínimo esteja assegurado.
Neste contexto, os operários da segunda revolução industrial enfrentavam graves problemas
dentro e fora do seu local de trabalho:
- ausência de rede de solidariedade (em grande parte oriundos do campesinato, os operários
tinha de sobreviver na cidade sem o apoio da família alargada);
- elevado risco de acidentes de trabalho e de doenças profissionais (que, a ocorrerem, podiam
levar ao despedimento do operário, o qual se via, subitamente, incapacitado e sem salário);
- ausência de medidas de apoio social (não existia o direito a férias ou a descanso semanal, o
horário de trabalho rondava as 16 horas por dia, não se contemplava o direito a subsídios por
desemprego, velhice ou doença);
- proibição e repressão de todo o tipo de reivindicação social (pois as leis e as instituições de
autoridade defendiam a classe dominante);
- contratação de mão-de-obra infantil, por ser mais barata (cerca de um terço do salário de um
adulto), menos reivindicativa e mais ágil (por exemplo, nos espaços exíguos das minas); daqui
resultava uma elevada taxa de mortalidade infantil entre os filhos da população operária;
- espaços de trabalho pouco saudáveis (ruído, calor ou frio extremos, iluminação deficiente,
ausência de cantinas e de vestuário apropriado);
- espaços de habitação sobrelotados e insalubres;
54
- pobreza extrema e todos os valores a esta associados (desnutrição, doenças, crimes,
prostituição, consumo elevado de bebidas alcoólicas, mendicidade.).
Mostrar como se caracterizou o movimento operário
As primeiras reacções dos operários contra a sua condição miserável foram espontâneas, pouco
organizadas e dirigidas, sobretudo, contra as máquinas que lhes roubavam o trabalho
(nomeadamente o movimento de Ned Ludd, na Inglaterra – luddismo – era mecanoclasta, isto é,
destruía as máquinas de produção).
Com o passar do tempo, o movimento operário (acções de luta dos proletários por melhores
condições de vida e por uma maior intervenção política) organizou-se para se tornar mais eficaz,
revestindo, no essencial, duas formas:
1. O associativismo – na falta das redes de solidariedade tradicionais (família, paróquia) as
associações de socorros mútuos apoiavam os operários em caso de vicissitude (doenças,
desemprego, acidentes) mediante o pagamento de uma quota.
2. O sindicalismo – no início actuando clandestinamente, os sindicatos utilizavam como
principais meios de pressão sobre o patronato as manifestações (por exemplo, a de 1 de
Maio de 1886, em Chicago, pela jornada de 8 horas, actualmente comemorada como Dia do
Trabalhador) e as greves. Estas constituíam uma forte arma de reivindicação, pois
prejudicavam a produção e, consequentemente, os lucros da indústria e do comércio, além
de evidenciarem a importância fundamental da classe trabalhadora (Proudhon dizia que, se o
proletariado desaparecesse, a produção “pararia para sempre e era uma vez os
proprietários”). Graças às greves, o enorme desfasamento entre o salário real dos operários e
o custo de vida foi-se esbatendo pelo que, no final do século XIX, a classe trabalhadora havia
conquistado um maior poder de compra.
Foi na Grã-Bretanha que o movimento operário se revelou mais precoce, com a autorização dos
sindicatos (trade unions) e das greves em 1824-25.
Os progressos da legislação social (por exemplo, a regulamentação do horário de trabalho, o
repouso semanal, a criação de pensões para as situações de acidente, doença, velhice) tornaram-se
mais notórios, na Europa industrializada, no terceiro quartel do século XIX, por efeito da pressão dos
sindicatos, entretanto legalizados, e pela difusão das ideias socialistas.
Relacionar a condição operária com as doutrinas socialistas
As condições de miséria em que viviam os proletários despertaram a vontade de intervenção social
de pensadores da época. No século XIX, a doutrina socialista emergente criticava a desumanidade
do sistema capitalista e propunha uma sociedade mais igualitária. Porém, podemos distinguir duas
abordagens diferentes do socialismo:
1. Socialismo utópico – propunha alternativas ao capitalismo no intuito de criar uma sociedade
mais justa. A principal referência é Pierre-Joseph Proudhon, o qual defendia que os operários
trabalhassem “uns para os outros” em vez de trabalharem para um patrão. Entregando a
propriedade privada a produtores associados e abolindo o Estado pôr-se-ia fim à “exploração
do homem pelo homem”.
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2. Marxismo (socialismo científico) – o filósofo alemão Karl Marx analisou historicamente os
modos de produção, tendo concluído que a luta de classes é um fio condutor que atravessa
todas as épocas. Baseado neste pressuposto, expôs um plano de acção para atingir uma
sociedade sem classes e sem Estado – o comunismo.
Expor os princípios do marxismo
Karl Marx e Friedrich Engels expuseram, no Manifesto do Partido Comunista (1848), uma proposta
de explicação do processo histórico que tomou o nome de marxismo ou materialismo histórico:
- a luta de classes entre “opressores e oprimidos” é um traço fundamental de toda a História;
- a sociedade burguesa, dividida entre a burguesia e o proletário, será destruída quando este,
“organizado em classe dominante” instaurar a ditadura do proletariado;
- depois de conquistar o poder político, o proletariado retirará o capital à burguesia e o
capitalismo será destruído pois estarão “todos os instrumento de produção nas mãos do Estado” -
assim se construirá o comunismo;
- os operários devem unir-se internacionalmente para fazer a revolução comunista, por isso o
Manifesto institui o lema “Proletários de todos os países, uni-vos”.
Indicar os seus efeitos no movimento operário
Marx e Engels viveram uma parte da sua vida na Inglaterra no século XIX, tendo contactado com a
miséria da condição operária. A teorização marxista revestiu um carácter prático que faltava ao
socialismo proudhoniano e teve um impacto visível na sociedade do seu tempo:
- de acordo com a ideia do internacionalismo operário, Karl Marx redigiu os estatutos da I
Internacional (Associação Internacional de Trabalhadores), criada em Londres (1864);
- Marx deu o seu apoio à Comuna de Paris, de 1871 (o primeiro governo operário da História);
- Engels foi um dos fundadores da II Internacional, criada em Paris (1889);
- a realização das Internacionais Operárias promoveu a fundação de partidos socialistas na
Europa.
Apesar de ter chocado ideologicamente com outras propostas de remodelação da sociedade
(nomeadamente, o proudhonismo, o anarquismo e o revisionismo), as quais viriam a contribuir para o
fim das duas Internacionais, a doutrina marxista prevaleceu viva e serviria de base teórica à
revolução de 1917, na Rússia.
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Descrever sucintamente o processo de unificação nacional levado a cabo por italianos e
alemães na 2ª metade do século XIX
Unificação italiana (1861) – meados do século XIX, a Itália era um conjunto de sete Estados.
Embora as correntes nacionalistas se viessem a expandir desde o século XVIII, a ideia de um Estado
único enfrentava a oposição dos Austríacos, que dominavam os Estados do Norte e Centro, e a
desconfiança do Papa, detentor de vastos Estados da Igreja.
A unificação partiu da iniciativa do Reino do Piemonte-Sardenha, porque era o Estado onde o
Liberalismo se encontrava em expansão, quer a nível económico (era o mais industrializado do
território italiano), quer a nível político (vigorava a monarquia constitucional do rei Vítor Manuel II,
favorável às ideias liberais).
As figuras-chave da unificação foram o primeiro-ministro Cavour, que defendeu a integração de
Roma na Itália unificada (mas salvaguardando a independência do Papa) e Garibaldi, conquistador
do Reino das Duas Sicílias. Graças ao apoio da França de Napoleão III, os Austríacos foram
vencidos em batalha e Vítor Manuel II tornou-se rei de Itália.
Unificação alemã (1871) – em 1850, o território alemão era composto por 39 Estados
autónomos, embora ligados pela Confederação Germânica, criada pelo Congresso de Viana (1815).
A unificação foi impulsionada pela Prússia (o Estado mais industrializado) que já havia derrubado
as barreiras alfandegárias entre alguns dos Estados em 1828 (aliança que tomou o nome de
Zollverein).
Os principais obreiros da unificação foram o rei Guilherme I da Prússia e o chanceler do rei Otto
von Bismark. A unidade alemã foi conseguida pelas armas, primeiramente contra a Áustria, na
Guerra dos Ducados, para integrar os territórios do Norte e Centro, e depois contra a França de
Napoleão III, em 1870-71, para dominar os Estados do Sul.
A unificação, sob a forma de um Império com 25 Estados – o II Reich – consumou-se em 1871,
sob o reinado do kaiser Guilherme I.
A unificação de Itália e a da Alemanha exprime claramente o nacionalismo oitocentista, pois
cumpriu, simultaneamente, dois objectivos: ligar povos com uma tradição comum e satisfazer
interesses económicos.
A integração de territórios ricos em matéria-prima para a indústria (caso da Alsácia e Lorena,
anexadas pelo Império Alemão) e a conquista de colónias para escoar os produtos industriais não
foram alheios aos anseios nacionalistas do século XIX.
Distinguir as zonas de expansão europeia entre fins do século XIX / início do século XX
Grã-Bretanha – acalentava o projecto de dominar o território africano do Cairo ao Cabo; ocupava
os territórios da Índia, da Austrália, do Canadá; exercia influência sobre a China e recebera, como
concessão, Hong-Kong, em 1842.
França – ocupou territórios no Norte e Centro africanos (por exemplo, Marrocos, a Argélia, a
Tunísia), na Ásia (Indochina) e na América (Antilhas Francesas, nomeadamente).
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Império Alemão – possuía territórios em África (por exemplo, SE e SO alemão) e exercia
influência na Ásia Menor e na Península Arábica.
Rússia - o Império Russo expandiu-se por províncias como a Geórgia, e o Azerbeijão e procurou
estender a sua influência ao Extremo Oriente.
Aplicar a essa expansão os conceitos de imperialismo e colonialismo
A expansão europeia inscreve-se numa estratégia de controlo de uma vasta extensão territorial
com vista à satisfação das necessidades económicas das metrópoles e à afirmação de uma pretensa
superioridade cultural.
O caso mais evidente de imperialismo e de colonialismo ocorreu relativamente à ocupação do
continente africano. Na Conferência de Berlim (1884-85), os chefes de Estado europeus repartiram,
entre si, o território africano sem atender às fronteiras definidas pelos povos autóctones e impuseram
o seu domínio a todos os níveis (económico, cultural, político, militar). Definiram que a colonização só
poderia assentar no princípio de ocupação efectiva, isto é, já não bastava ter descoberto ou
conquistado determinado território para ter direito a possuí-lo (direito histórico), era preciso que os
países europeus mostrassem que eram capazes de “assegurar, nos territórios ocupados por eles no
continente africano, a existência de uma autoridade suficiente para fazer respeitar os direitos
adquiridos”.
Contextualizar o imperialismo
A formação de impérios pelas potências europeias explica-se, em primeiro lugar, no contexto da
expansão industrial, que necessitava de matérias-primas para a produção maquinofacturada e de
mercados para escoar os excedentes.
Em segundo lugar, o continente europeu, em fase de explosão populacional, precisava de
colónias para aliviar a pressão demográfica.
Por último, os anseios nacionalistas que acompanharam a criação das democracias europeias
tinham uma vertente imperialista. O nacionalismo carregava a ideia de conquista: pangermanismos,
pan-eslavismo eram vocábulos correntes na época, utilizados para transmitir o desejo de expansão
imperialista de um povo traduzida no prefixo pan (vocábulo de origem grega que significa tudo ou
todo).
Discriminar algumas rivalidades imperialistas
França / Império Alemão – A oposição da França à Alemanha explica-se, por um lado, pela
disputa da Alsácia e Lorena, território perdido para a Alemanha em 1871, e, por outro lado, pelo
desenvolvimento do novo império Alemão que retirou à França parte da preponderância económica
que esta detinha sobre a Europa. Em contrapartida, a França conseguiu dominar grande parte do
Norte de África.
Império Russo / Império Austro-húngaro – a rivalidade entre os dois impérios justifica-se,
nomeadamente, pela disputa da influência nos Balcãs.
Império Russo / Japão – As ambições do Império Russo no Extremo Oriente colidiam com o
imperialismo japonês, o que acabou por provocar, em 1904-1905, a guerra russo-japonesa, de que
saiu vitorioso o Japão (o regime político autocrático russo sofria o primeiro grande abalo, não por
coincidência, com a revolta de 1905, reprimida pelas tropas czaristas).
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Relacioná-las com o clima de “paz armada”
A tensão gerada pelas rivalidades económicas levou os Estados europeus a procurarem aliados:
1879 – Dupla Aliança (Alemanha e Áustria-Hungria);
1882 – Tríplice Aliança (Alemanha, Áustria-Hungria e Itália);
1907 – Tríplice Entende (França, Rússia, Grã-Bretanha).
A política de alianças era complementada por uma corrida aos armamentos.
Em 1908, a Áustria-Hungria anexou a Bósnia-Herzegovina, gerando protestos da Sérvia, a qual
pretendia desempenhar um papel influente nos Balcãs (panservismo). Em 1914, quando o herdeiro
ao trono austro-húngaro foi assassinado na Bósnia, a suspeita de que a Sérvia pudesse estar
envolvida nesse acto levou o imperador Francisco José da Áustria-Hungria a declarar guerra à
Sérvia. Era o fim da paz armada e o início da Primeira Guerra Mundial.
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Caracterizar as linhas de força do fomento económico da Regeneração
1. Revolução dos transportes – esperava-se que a política de instalação de meios de
transporte e de comunicação levasse a todo o país um progresso geral. Assim, apostou-se
na construção rodoviária e na expansão da rede ferroviária (em cerca de 50 anos, desde a
ligação de Lisboa ao Carregado, em 1856, as vias férreas cobriram o território nacional).
Construíram-se pontes (por exemplo, a ponte D. Luís no Porto) e portos (nomeadamente, o
porto de Leixões).
2. Livre-Cambismo – o fomento económico assentou na doutrina livre-cambista, expressa na
pauta alfandegária de 1852. Fontes Pereira de Melo (o qual, além de ministro das Obras
Públicas, foi, também, ministro da Fazenda) era um acérrimo defensor da redução das
tarifas aduaneiras, argumentado que:
- só a entrada de matérias-primas a baixo preço poderia favorecer a produção
portuguesa;
- a entrada de certos produtos industriais estrangeiros (que Portugal não produzia) a
preços mais baixos beneficiava o consumidor;
- a diminuição das tarifas contribuía para a redução do contrabando.
3. Exploração da agricultura orientada para a exportação – a aplicação do liberalismo
económico favoreceu a especialização em certos produtos agrícolas de boa aceitação no
estrangeiro como, por exemplo, os vinhos e a cortiça. A aplicação do capitalismo ao sector
agrícola passou por uma série de inovações, nomeadamente:
- o desbravamento de terras (arroteamentos);
- a redução do pousio;
- a abolição de pastos comuns;
- a introdução de maquinaria nos trabalhos agrícolas (sobretudo no Centro e Sul do
país, pois no Norte a terra é mais fragmentada e irregular);
- o uso de adubos químicos (produzidos nacionalmente, devido ao desenvolvimento da
indústria química).
4. Arranques industriais – apesar do atraso económico de Portugal em relação aos países
desenvolvidos da Europa, registaram-se alguns progressos a nível industrial:
- difusão da máquina a vapor;
- desenvolvimento de diversos sectores da indústria (nomeadamente cortiças,
conservas de peixe e tabacos);
- criação de unidades industriais e concentração empresarial em alguns sectores (por
exemplo, no têxtil);
- aumento da população operária, sobretudo no Norte do país (apesar de se tratar
maioritariamente de mão-de-obra não qualificada);
- criação de sociedades anónimas;
- aplicação da energia eléctrica à indústria (já no século XX).
No entanto, a economia portuguesa padecia de alguns problemas de base que impediram o
crescimento industrial:
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- a falta de certas matérias-primas no território nacional (por exemplo, o algodão);
- a carência de população activa no sector secundário (totalizava apenas cerca de 20%, em
1890);
- a falta de formação do operariado e do patronato;
- a orientação dos investimentos particulares para as actividades especulativas e para o sector
imobiliário, em detrimento das actividades produtivas;
- a dependência do capital estrangeiro.
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- concentração industrial – através da criação de grandes companhias, melhor preparadas
para enfrentar as flutuações do mercado (por exemplo, a CUF – Companhia União Fabril, de Alfredo
da Silva, produtora de adubos);
- valorização do mercado colonial, suprindo a perda de mercados europeus;
- expansão tecnológica, com a difusão dos sectores ligados à 2ª revolução industrial
(electricidade, indústria química, metalurgia pesada) e da mecanização.
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de Camões foram aproveitadas politicamente para reforçar o sentimento de desconfiança
face ao regime monárquico.
5. A revolta de “31 de Janeiro” – em 1891, em contexto de profunda crise económica e de
rescaldo do ultimato inglês, um grupo de militares de baixa patente protagonizou uma
tentativa de implantação da Republica, no Porto (na antiga Rua de Santo António, actual
Rua 31 de Janeiro). Apesar de fracassada (foi violentamente reprimida), a revolta exprimiu
os anseios de derrube da monarquia partilhados por grande parte da população.
6. A ditadura de João Franco – em 1907, o rei D. Carlos dissolveu o Parlamento, permitindo
ao ministro João Franco que governasse com plenos poderes. A ditadura apenas veio a
reforçar o descontentamento com a monarquia.
7. O regicídio – o assassinato do rei D. Carlos e do príncipe herdeiro, D. Luís Filipe, em
1908, mostrou, em evidência, o total descrédito em que havia caído a monarquia. Depois
de um golpe tão violento, tornou-se impossível ao filho mais novo do rei – D. Manuel II –
assegurar a continuidade da dinastia de Bragança no poder. Foi o último rei de Portugal.
Enunciar os princípios fundamentais do ideário republicano
As principais ideias sobre as quais assentou a actuação dos governos da Primeira República
foram:
- a laicização do Estado (total separação entre a Igreja e o Estado) - porém, as medidas anti-
clericais do ministro Afonso Costa (por exemplo, a expulsão dos jesuítas do país) fizeram com que a
primeira república perdesse uma grande parte do apoio popular;
- a abolição da sociedade de ordens (pela aniquilação definitiva dos privilégios do Clero e da
Nobreza);
- a defesa dos direitos dos trabalhadores (nomeadamente, instituindo o direito à greve e o
descanso obrigatório aos domingos para os assalariados);
- o direito à instrução (através da reforma do ensino público) – a Primeira República conseguiu
resultados assinaláveis no domínio do ensino, porém, afastou os analfabetos da intervenção política.
Descrever a Revolução de 5 de Outubro de 1910
A revolução foi preparada para ter início no dia 4 de Outubro, em Lisboa. Com efeito, desde a
madrugada, foram-se organizando os oficiais revoltosos, os quais puderam contar o auxílio da
Marinha. Seguiram-se recontros entre os republicanos e as tropas fiéis à monarquia. A República foi
proclamada às 9 horas do dia 5 de Outubro de 1910, da varanda dos Paços do Concelho.
Consumava-se o fim de um sistema político que, na prática, já ruíra.
Logo após a revolução, formou-se um Governo Provisório presidido por Teófilo Braga.
Caracterizar o regime político instaurado pela Constituição de 1911
A Assembleia Nacional Constituinte elaborou a Constituição de 1911 e elegeu o primeiro
presidente da República (Manuel de Arriaga). As linhas de fundo do regime político republicano eram:
- superioridade do poder legislativo, pois o Congresso da República, composto pela Câmara
dos Deputados e pelo Senado, era dotado de amplos poderes: controlava o Governo e podia destituir
o presidente da República. Esta característica pode, aliás, explicar a instabilidade governativa da
Primeira República;
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- o carácter simbólico da figura do presidente da República, o qual era eleito pelo Congresso e
não podia exercer o direito de veto sobre as leis emanadas do Congresso;
- o sufrágio directo e universal para os maiores de 21 anos que soubessem ler e escrever ou
fossem chefes de família.
Os caminhos da cultura
A confiança no progresso científico
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Explicar o investimento público na área do ensino
No século XIX, a questão da educação tornou-se um tema prioritário para vários governos da
Europa ocidental, pelos seguintes motivos:
- o aprofundamento dos sistemas representativos (demoliberalismo) fez com que o direito de
voto se estendesse à maioria da população, pelo que a classe política viu interesse na difusão do
ensino público como meio de esclarecer os cidadãos e de influir na sua tomada de decisões;
- o espírito positivista do século XIX, ao considerar unicamente como verdadeiro o
conhecimento obtido através da observação e da experimentação, contribuiu para a valorização de
instituições ligadas à ciência (universidades, laboratórios, museus de História natural);
- a laicização dos Estados, ao retirar da alçada da Igreja a tradicional função educadora, levou
a uma maior responsabilização dos Estados na alfabetização;
- as classes médias, ligadas à vida urbana, procuraram cursos que promovessem a sua
ascensão social, nomeadamente aqueles que os preparassem para exercer profissões liberais.
O interesse pela realidade social na literatura e nas artes – as novas correntes estéticas
na viragem do século
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simbólica das ideias, razão por que os seus autores foram denominados simbolistas. Gustave
Moreau e Puvis de Chavannes souberam criar nas suas telas um ambiente de mistério e de sonho,
enquanto Paul Gauguin procurou afastar-se da civilização industrial europeia para procurar, na arte e
na vida, um ideal de primitivismo.
Em Inglaterra, a pintura de Rossetti ou de Burne-Jones (chamada pré-Rafaelita por recusar os
cânones do Renascimento) pode ser integrada na corrente simbolista pela aproximação ao
sobrenatural e pela valorização de ambientes de evasão.
Arte Nova – assumindo-se, sobretudo, como um estilo decorativo, a Arte Nova resulta da vontade
de imprimir colorido e graciosidade a uma Europa descaracterizada pela industrialização. Os artistas
da Arte Nova elaboram jóias refinadas (Lalique), adornavam a entrada para o metropolitano
parisiense, ilustravam painéis publicitários com gravuras de mulheres idealizadas entre flores e
folhagens (Mucha). O requinte e a elegância permitem identificar, rapidamente, todas as facetas da
Arte Nova.
Enquanto corrente arquitectónica, a forma ondulada, a aplicação do ferro e a valorização da
estrutura como decoração marcaram as obras de Arte Nova, salientando-se as do arquitecto Gaudí,
em Barcelona.
Estabelecer um paralelo entre as artes plásticas e a literatura
As artes plásticas e a literatura seguiram caminhos comuns na revolução artística da segunda
metade do século XIX, em particular nas correntes realistas e simbolista.
Na literatura, as descrições minuciosas e a crítica social caracterizavam as obras literárias dos
autores realistas, como Flaubert, enquanto Émile Zola denunciava as condições de vida do
operariado.
O simbolismo literário caracterizou-se pela expressão do sobrenatural e pela valorização das
ideias subjectivas, nomeadamente na obra de Baudelaire, cujo soneto Correspondances é o ponto de
partida para o cânone formal do Simbolismo, e em Edgar Allan Poe, autor inglês cujas obras são
carregadas de mistério.
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