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A antropologia dos Sonaipsede como ilustração para a reflexão de um

Edespiano
Por Victor Waller Sadalla

Os Sonaipsede, pequena tribo da "rica" etnia Oiluteg Sagrav, que se estende da Evon Ohluj ao alto do
monte Avepati a planície baixa do Agixib, caracteriza-se por uma série de peculiaridades, tais quais
rituais, crenças, práticas mágicas e estrutura moral idiossincráticas.

Conforme reza uma das lendas passadas de geração para geração, a fundação da tribo, exemplar
Teocracia de Legagis, na inóspita região da Ahcor ocorreu pelo místico (cujo papel e figura são
análogos ao Faraó egípcio) Yra Odlawso, que por uma iluminação divina soprada ao seu ouvido pelo
deus Otierid, em um tempo antropológico-sociológico relativamente recente.

Estamentalmente, mesmo não sendo uma sociedade estratificadora, economicamente falando, há três
castas, muito próximas as da sociedade Hindu, a dos Sonula, ou os sem luz, que "financiam", os
Serosseforp, ou os que possuem a luz, similares aos sacerdotes, e os Sodagerpme, ou os com quem não
se deve conversar, parecidos com os "intocáveis" indianos.

Ainda que não haja nada formalmente escrito sobre a mitologia, esta não se finda no breve conto do
gênese. Passadas de boca em boca entre os Sonula no Roderroc (cômodo comum para interação breve)
por meio de rodas de contos ou então em um grande mural, denominado Koobecaf, de rascunhos quase
rupestres, a mitologia se incrusta na imaginação severamente limitada e no senso comum destes
humanos. Dentre estes mitos, marcados, entre outros, pelo maniqueísmo vulgar e por uma moralidade
pautado em um conceito moderno –e aqui portanto notamos que é uma comunidade aparentemente
desenvolvida–: o "eu", destacam-se dois elementos que incorporam o mal: Irtimid e Acerac, ambos da
classe dos Serosseforp.

Sem nos distanciarmos dos símbolos desta cultura, encontramo-nos com o corpo e seus significados.
Assim como na cultura Sonacirema, espetacularmente explanada pelo professor Horace Miner na
década de 70 – em "O Ritual do Corpo dos Sonacirema" In: A.K. Rooney e P.L. de Vore (orgs) You
And The Others, Cambridge University Press – possuem os Sonaipsede, com incrível semelhança,
todos os mesmos processos ritualísticos ao nascer do Sol e em seu crepúsculo; o corpo –
principalmente a idéia de sua doença e impotência– é para os Sonaipsede gerador de um horror quase
que patológico, e ao mesmo tempo de fascinação; e, logo, basilar para as relações da tribo.

As vestimentas surgem, nesta sociedade estamental, como forma de desigualizar o corpo quando
comparado com outra casta e aproximar os de mesmo patamar. Ambas as três classes possuem
características próprias. Todavia, neste estudo endereçado à consciência dos alunos da Edesp, preferi
focar no conjunto médio, tanto por sua complexidade, quanto por os outros dois serem encontrados em
outras tribos do gênero.

A sexualidade, por sua vez, ainda em um corte sobre os Sonula, também se encontra neste padrão de
poder e censura; considerada algo tão amedrontador e proibido que apenas duas vezes ao ano, uma ao
primeiro equinócio do calendário ocidental e outra um mês e meio após o solstício de inverno, é
permitida uma interação mais próxima entre ambos os sexos, em um ritual semelhante ao bacanal,
regado a destilados de trigo e cevada e cantigas entonadas por um mestre de cerimônia; envolve não
apenas a específica comunidade, mas também a toda a etnia Oiluteg Sagrav. Fora esses eventos, o
acasalamento dificilmente ocorre entre membros iguais –aparentemente um Tabu–, os quais buscam
seus parceiros no além-Agixib.

Por fim, falamos do poder entre os Sonula. Estes marcam seus panos com animais, como o albatroz, o
alce, o jacaré, o cavalo e a águia (todos não oriundos da fauna local), em tentativa de criar uma escala
de poder. A crença fundamental subjacente a todos os signos compartilhados entre "os sem luz" parece
ser a de que um pode ser superior ao outro pelo poder e/ou pela luz. Isto se deve a dois fatores: serem
os "financiadores", o que impede que qualquer um o seja, tanto pelos custos quanto pela seleção para
se tornar um Sonula, e o ambiente fomentado por uma eterna disputa para ser "o escolhido",
considerado pelos que tem luz como "o melhor", "o superior".

Caros leitores, findo aqui meu breve relato sobre essa tribo.

Entretanto, inquieto-me com interrogações que despontam ao comparar nossas práticas sociais com a
dos Sonaipsede. Edespianos possuímos as mesmas práticas, mas não entendemos a verdade
simplesmente pelo nosso preconceito e por despreparo mental em analisar os símbolos sob outros
pontos de vista que não o do nosso exaustivamente grande ego.

"Olhando de longe e de cima de nossos altos postos de segurança na civilização


desenvolvida, é fácil perceber toda a crueza e irrelevância da magia. Mas sem seu poder de
orientação, o homem primitivo não poderia ter dominado, como o fêz, suas dificuldades
práticas, nem poderia ter avançado aos estágios mais altos da civilização".
Malinowski

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