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Potência Harmônica

A conceituação de potência ativa e reativa é bastante conhecida para circuitos


elétricos com alimentação senoidal e cargas lineares. Porém, nos casos de cargas não-
lineares e alimentação não senoidal o conceito ainda não está muito difundido. O
crescimento do uso de circuitos chaveados de eletrônica de potência, os quais se
caracterizam como cargas ( não-lineares ) geradoras de harmônicos, tem tornado mais
complexa a compensação de reativos nos sistemas de potência, visto que a potência
harmônica presente no sistema vem se tornando significativa.

1 Potência no Sistema Elétrico Alimentando Cargas Lineares

Cargas lineares são consideradas aqui, de forma simplificada, como sendo aquelas
que não produzem distorção na forma de onda de corrente a partir da aplicação de uma
onda senoidal de tensão, ou seja, a onda de corrente também é senoidal, de mesma
frequência da onda de tensão e podendo ser defasada ou não da onda de tensão. Resistores,
capacitores e indutores de núcleo a ar são considerados como cargas lineares.
Considerando a aplicação de uma onda senoidal de tensão a uma carga linear
obtém-se uma corrente também senoidal dada pela expressão 2.

v = V sinωtmax
(1)

i = I sin(ωt + θ )
max
(2)

A potência instantânea é dada por :

p = V . I sinωt. sin(ωt + θ )
max max
(3)

p = V . I cosθ .(1 − cos 2ωt ) + V . I sinθ . sin2ωt


ef ef ef ef
(4)

A expressão 4 decompõe a potência instantânea em uma parcela com valor médio


diferente de zero e outra com valor médio igual a zero. Tradicionalmente conceitua-se “ P “
como potência média ativa ou valor médio da potência instantânea e “ Q “ como potência
reativa.
P = V . I cosθ
ef ef
Q = V . I sinθ
ef ef

2 Método de Fourier de Análise de Forma de Onda

Matematicamente, uma forma de onda periódica qualquer, com uma frequência


definida, pode ser decomposta numa somatória de infinitos termos senoidais, cujas
frequências são múltiplas da frequência fundamental mais um termo igual ao valor médio
apresentado pela forma de onda original. Esta somatória é conhecida como série de Fourier.
Os termos de frequência múltipla da frequência fundamental são denominados de
harmônicos.

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A série de Fourier pode ser escrita na forma trigonométrica como segue
1
f ( t ) = a + a cos ωt + a cos 2ωt + a cos 3ωt +...
0 1 2 3
2
+ b sen ωt + b sen 2ωt + b sen ωt +...
1 2 3
(5)
onde,
2 2πnt
a = ∫ f ( t ) cos
T

n
∂.t
T 0 T
2 2πnt
b = ∫ f ( t ) sen
T

n
∂.t
T 0 T
3 Potência no Sistema Elétrico Alimentando Cargas Não-Lineares

As cargas não-lineares consideradas aqui produzem distorção da forma de onda de


corrente a partir da aplicação de uma onda senoidal de tensão. A expressão da corrente
decomposta pela série de Fourier é dada pela expressão 6.

i = I sin(ωt + θ ) + I
1 max 1 2 max
sin(2ωt + θ ) +... 2
(6)

A potência instantânea é dada por :

p = V . I sinωt. sin(ωt + θ ) + V . I
max 1 max 1 max 2 max
sinωt. sin(2ωt + θ ) +... ( 7 )
2

p = P.(1 − cos 2ωt ) + Q. sin2ωt + 2 V . I sinωt. sin(2ωt + θ ) +... ( 8 )


ef 2 ef 2

A terceira parcela da expressão 8, a qual é dada pelo somatório dos produtos da


tensão de alimentação por cada harmônico de corrente, é a representação da potência
harmônica instantânea. Desta forma torna-se necessário falar em tetraedro de potência,
onde a potência aparente total é uma composição das potências ativa, reativa e harmônica.

figura 1. Tetraedro de potência

2
S= P +Q +H 2 2 2
(9)

O fator de potência convencional é agora chamado de fator de potência fundamental


ou fator de deslocamento, o qual é dado por :
P P
cosθ = = ( 10 )
P +Q
1 2 2
S 1

O verdadeiro fator de potência é dado pelas expressões abaixo

P I
cos φ = = .cosθ 1 ef
1
( 11 )
S I ef

1
cos φ = cosθ ( 12 )
1 + TDH 2 1

onde TDH é a taxa de distorção harmônica.


Objetivando exemplificar a aplicação do novo conceito de fator de potência,
considera-se agora o efeito de uma retificação de meia onda para alimentação de uma carga
puramente resistiva ( figura 2 ).

figura 2. Retificação de meia onda com carga resistiva

3
figura 3. Corrente e tensão na fonte de retificador de meia onda

A análise de Fourier da corrente na fonte de alimentação do retificador de meia


onda com carga resistiva é realizada com o auxílio de um programa computacional de
desenvolvimento de pesquisa em sua versão educacional conhecido como PSPICE.

DC COMPONENT = -3.130590E+01

HARMONIC FREQUENCY FOURIER NORMALIZED PHASE NORMALIZED


NO (HZ) COMPONENT COMPONENT (DEG) PHASE (DEG)

1 6.000E+01 4.922E+01 1.000E+00 1.728E+02 0.000E+00


2 1.200E+02 2.098E+01 4.262E-01 7.560E+01 -9.720E+01
3 1.800E+02 7.282E-02 1.479E-03 -2.198E+01 -1.948E+02
4 2.400E+02 4.194E+00 8.520E-02 6.120E+01 -1.116E+02
5 3.000E+02 4.254E-02 8.642E-04 -3.663E+01 -2.094E+02
6 3.600E+02 1.796E+00 3.649E-02 4.680E+01 -1.260E+02
7 4.200E+02 2.986E-02 6.066E-04 -5.128E+01 -2.241E+02
8 4.800E+02 9.974E-01 2.026E-02 3.240E+01 -1.404E+02
9 5.400E+02 2.292E-02 4.656E-04 -6.593E+01 -2.387E+02
10 6.000E+02 6.344E-01 1.289E-02 1.800E+01 -1.548E+02

TOTAL HARMONIC DISTORTION = 4.368733E+01 PERCENT

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figura 4. Componentes harmônicos do seno retificado

O verdadeiro fator de potência apresentado pela carga para a fonte é dado por

I 1ef
cos φ = . cos θ 1 = 0.792
I 02 + I 12ef + I 22ef + ...I Nef
2

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Medição e Tarifação em Sistemas Elétricos Distorcidos
Workshop
CESP - CPFL - ELETROPAULO - IEE

A energia elétrica é produzida sob forma senoidal, na frequência de 60 Hz e uma


grande parte das cargas conectadas à rede solicitam correntes senoidais. Estas são as
chamadas cargas lineares. Entretanto, muitas das atuais cargas instaladas no sistema
elétrico apresentam características de não linearidades. Estas, conhecidas como cargas não
lineares, são aquelas que operam com correntes não senoidais, ou simplesmente correntes
distorcidas.
Uma onda que se apresente de forma não senoidal pode ser decomposta em uma
somatória de ondas senoidais, onde a primeira se apresenta com a mesma frequência da
onda original, e é conhecida por fundamental e as outras têm frequências múltiplas à da
fundamental, sendo chamadas de componentes harmônicos. O segundo harmônico de uma
onda de 60 Hz tem frequência de 120 Hz, o terceiro tem frequência de 180 Hz e assim por
diante.
Para uma boa parte das cargas não lineares os harmônicos gerados são
preponderantemente de ordem ímpar, ou seja : terceiro, quinto, sétimo etc.., podendo ser
desprezado os de ordem par, em face de suas pequenas intensidades. Estes componentes de
ordem ímpar são essencialmente harmônicos de corrente, ou seja as cargas não lineares se
apresentam basicamente como fontes de correntes distorcidas.
O grave disso é que essas correntes harmônicas podem se propagar em direção a
outros consumidores, gerando inúmeros problemas para quem, muitas vezes, apresenta um
sistema eletricamente bem comportado.
Os componentes harmônicos, em geral, têm sua amplitude diminuida na mesma
razão que sua frequência aumenta. A ferramenta matemática para análise desse fenômeno é
a Série Trigonométrica de Fourier.
Em face dessa tendência dos harmônicos diminuirem com o aumento de sua ordem,
basta, em muitos casos, limitar a análise aos primeiros 50 componentes.
Existem muitos tipos de fenômenos ou de arranjos que podem levar um dispositivo
ou um equipamento a se comportar como uma carga não linear. Entre eles podem ser
mencionados a saturação do núcleo magnético de transformadores, conexão de neutro de
transformador, fornos elétricos a arco, lâmpadas fluorescentes, computadores, fontes
chaveadas, compensadores estáticos, controladores de velocidade de motores, conversores
DC, inversores, televisores, fornos microondas, fotocopiadoras, reatores etc.
Uma rede poluída com harmônicos pode produzir vários efeitos sobre equipamentos
conectados a mesma, tais como :
• Maior solicitação do isolamento
• Ressonância
• Aumento das perdas e aquecimento
• Magnetização assimétrica de transformadores
• Interferência em sistemas de medição e de proteção
• Oscilação e até mesmo redução de conjugado em motores ( harmônicas 2, 5, 8
etc. produzem conjugado opositor ao movimento do motor )

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Vale salientar que distorções de corrente podem acarretar distorções de tensão, e
estas por sua vez podem alterar o funcionamento de vários equipamentos eletrônicos.
Harmônicos de maior ordem podem causar interferências em sistemas de
comunicação telefonia ou redes, prejudicando ainda a sua isolação e proteção.
A análise de harmônicos pode ser realizado com a Transformada de Fourier através
do uso de um Analisador de Espectros, o qual permite obter diretamente a intensidade de
cada harmônico e o respectivo ângulo de fase entre este e a fundamental. Desta forma é
possível calcular a distorção harmônica.
Especialistas do mundo inteiro têm voltado os olhos na busca de soluções para os
problemas criados pelos harmônicos. E, sem sombra de dúvidas, uma das preocupações
reside no fato de que este fenômeno pode causar erros na contabilização da energia elétrica.
Alexânder Domijam et alli, em seu trabalho entitulado “ Watthour Meter Accuracy
Under Controlled Unbalanced Harmonic Voltage and Current Condition “, constatou erros
em medidores tanto por falta quanto por excesso e ressalta ser difícil, no momento,
conhecer todas as causas de tais erros e quantificá-los com precisão. Acredita-se que os
erros estão associados ao princípio de funcionamento do medidor.
Também observa que sinais com mesmas taxas de distorção harmônicas, porém com
formas de ondas diferentes, aplicados no mesmo medidor, podem conduzir a erros
diferentes. Com isso, conclui-se que é necessário classificar as formas de onda e seu
impacto nos medidores não somente pela taxa de distorção harmônica mas também pelo
espectro harmônico associado, tanto em amplitude quanto em fase.
Existe uma preocupação comum e geral em afirmar que os atuais medidores em uso
não são, em absoluto, adequados para a nova realidade das cargas não lineares que vem se
firmando e aumentando dia-a-dia. Erros inaceitáveis têm sido constatados em diversas
situações.

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International Electrotechnical Commission
IEC Standard

Publication 555-2
First Edition 1982

Disturbances in Supply Systems


Caused by Household Appliances and Similar Electrical Equipament

Muitas aplicações domésticas e equipamentos elétricos similares , equipados ou não


com dispositivos eletônicos de controle, são passíveis de introduzir distúrbios nos sistemas
aos quais estão conectados, especialmente harmônicos.
Tais equipamentos, contudo, não devem afetar as características do sistema, a fonte
de tensão ou a performance de algum outro equipamento conectado ao sistema de
suprimento de energia elétrica, isto é, cuidados devem ser tomados para limitar os efeitos
dos distúrbios e para atender a compatibilidade eletromagnética.
Os harmônicos de corrente de entrada, medidos de acordo com as recomendações da
IEC, não deverão exceder aos limites apresentados na tabela 1. Tais valores são aplicáveis a
correntes de linha e de neutro e para todos os tipos de conexão do equipamento à rede.
Os limites definidos na tabela são aplicáveis para harmônicos em estado permanente
ou em transitórios, excetuando-se harmônicos de correntes não-repetitivos com duração
não maior que uns poucos segundos.
É importante salientar que a tabela não se aplica a receptores de televisão e
carregadores de baterias, e que para ferramentas portáteis deve ser aplicado um fator de
multiplicação de 1.5 sobre os valores da tabela.

Ordem da Corrente Harmônica


Harmônica ( n ) Máxima Permissível ( A )
Harmônicas Ímpares
3 2.30
5 1.14
7 0.77
9 0.40
11 0.33
13 0.21
15 a 39 0.15 x ( 15 / n )
Harmônicas Pares
2 1.08
4 0.43
6 0.30
8 a 40 0.23 x ( 8 / n )
tabela 1

Definições

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• Compatibilidade Magnética é a habilidade que um dispositivo tem de funcionar
satisfatoriamente no seu ambiente eletromagnético sem introduzir distúrbios
intoleráveis para o ambiente ou outros dispositivos.
• Taxa harmônica de um componente harmônico de ordem n de uma onda distorcida é a
taxa, expressa como uma percentagem, do valor eficaz desse componente harmônico em
relação ao valor eficaz da componente fundamental dessa mesma onda.

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