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AS BALADAS LITERÁRIAS DE KÁTIA BORGES

Por Thiago Lins

Se a nossa lírica é composta por uma diversidade singular de formas (filosófica,


cotidiana, concreta, intertextual, narrativa e meditativa), a poetisa baiana Kátia Borges
certamente abraçaria a forma rock n´roll de fazer poesia. Uma balada para Janis (P55
edições, 2009), segundo livro da poetisa, é um beat acelerado de versos contagiantes.

Numa bela referência à cantora Janis Joplin, Kátia Borges escreve como se tocasse riffs
inspirados de guitarra ou como um DJ anônimo que pichasse frases com chantily nas
paredes, em noites insones iluminada pela abençoada poesia. Os quatro breves atos que
compõem o livro (Port Arthur, Texas; Hal Ashbury, San Francisco; Pearl; Landmark
Hotel) reencenam os passos de Joplin e outros desbravadores que botaram o pé na
estrada, sem medo de abraçar o porvir. As baladas de Kátia Borges são carregadas de
poemas que traduzem um espírito irrequieto diante de ruas antigas e caminhos mal-
traçados. Sem lenço ou documento resta-nos:

Sair ao sol,
encarar o dia,
sem medos das sombras
que insistem.

É a poesia eleita como abrigo que Kátia Borges nos brinda nas páginas de Uma balada
para Janis. Junto com Todos os Santos, Kátia imprime em cada verbo, em cada verso
que escapa uma comunhão singular de ritmos e tons que descortina para o leitor um mar
sem limite de emoções. O poema bem cuidado, a “guloseima sagrada” que mostra para
nós que:

Não existem mais mistérios


O meu aparelho é stereo e vai do jazz ao
[rock n´roll

[e ouço poesia, todo dia, no volume máximo]

O poema em “alto volume” que pega o leitor pelo “ouvido”, sem receios de criar esses
sentimentos sentimentais a partir do ridículo reforçam a inequívoca atmosfera musical
do livro. Kátia Borges elenca pequenos flagrantes de vida, numa atmosfera zen em que
há um poema aqui nesta desmedida. E sutilmente, mas com graça e espírito rebelde, nos
diz que cada construção cotidiana é outra espécie de metáfora, metaverso, visibilidade,
invisibilidade. Permite-nos vislumbrar outras sensibilidades, a aliança com o sentimento
mediado pelo labor poético. Uma torrente nova de alumbramentos que não subtrai o
fardo que carregamos; todavia, sustenta preces e livros que me livrem do desassossego,
desta palavra que eu não digo, e para sempre pesa no verso.

Nas páginas de Uma balada para Janis, Kátia Borges toca junto às nossas emoções; um
relicário delicado que nos lembra que a poesia ainda permanece e fica, transformando
quem a lê, mesmo que dentro da noite refrigerada.

Thiago Lins da Silva é mestrando em Literatura e Diversidade Cultural – UEFS.

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