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MEIO AMBIENTE E TURISMO RURAL

GT 4
CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL E A PROMOÇÃO DO ECOTURISMO
NO PARQUE ESTADUAL TURÍSTICO DO ALTO RIBEIRA (PETAR)
KLEIN, Flávio Bordino1 e PAULINO, Sônia Regina2

Resumo
o presente trabalho tem como objetivo analisar as condições existentes em unidades de conservação para a implantação da
certificação ambiental em empreendimentos que localizam-se no Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (PETAR). Foram
considerados os aspectos socioambientais do turismo praticado no PETAR analisados à luz dos princípios e dos requisitos para
Certificação em Turismo Sustentável, pela ABNT NBR 15.401:2006. O perfil da demanda revela que os turistas possuem altos
níveis de escolaridade e renda e buscam serviços de acomodação com melhor infraestrutura, o que pode levar a que empreendi-
mentos certificados tenham maior aceitação da parte dos turistas. Os resultados indicam que empreendimentos que buscarem a
Certificação em Turismo Sustentável podem reduzir os impactos socioambientais negativos de modo a contribuir para a expansão
e consolidação do ecoturismo no PETAR.
Palavras-chave: Certificação Ambiental; Ecoturismo; Unidades de Conservação.

Introdução
Esse trabalho tem como objetivo analisar as possibilidades para a implantação da certificação ambiental no
Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (PETAR), com base na ABNT NBR 15.401: 2006, em empreendimentos
que prestam serviços de hospedagem aos turistas que visitam esta unidade de conservação.
Com seus 35.712 ha, o PETAR faz parte da área contínua de Mata Atlântica mais preservada do Brasil. Ele foi
criado pelo decreto lei nº 32.283 de 19/05/58, incluído como área de preservação do ecossistema Mata Atlântica e
Caverna. Abrange os municípios de Apiaí (8.360 ha) e Iporanga (27.352 ha), ambos localizados na região do Vale do
Ribeira, em SP (CASTRO, 2004; FOGAÇA, 2006). É classificado como uma Unidade de Conservação de Proteção
Integral e seu uso, de acordo com a Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho de 2000, está restrito a atividades que não
envolvam consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais. Assim, de acordo com o caput do art. 11 da
supracitada lei, uma das atividades permitidas para unidades de conservação como o PETAR é o ecoturismo. De
fato, a atividade turística nesta região vem sendo associada à geração de renda e de empregos para a população lo-
cal, em especial no Bairro da Serra em Iporanga (BONDUKI, 2002; FOGAÇA, 2006). Porém, concomitante, existem
evidências de aspectos que podem ocasionar impactos socioambientais negativos do turismo praticado dentro do
Parque como a visitação turística acima da capacidade de carga, destruição física dos espeleotemas e no entorno:
construção de hotéis e pousadas sem adequação paisagística, despejo de esgotos em rios e córregos sem tratamento
e disposição imprópria dos resíduos sólidos gerados pelos turistas (FOGAÇA, 2006; GIATTI, 2004, LOBO, 2008).
Como forma de estimular o ecoturismo no PETAR, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo contraiu
um financiamento com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para a realização do “Projeto de Desenvol-
vimento do Ecoturismo na Região da Mata Atlântica”. O Projeto abrange seis parques estaduais, dentre eles o PETAR.
Os investimentos nos parques incluirão não apenas equipamentos para a prática de atividades como trilhas, mirantes,
centros de interpretação ambiental, etc., mas também a melhoria e/ou ampliação de meios de hospedagem (exceto em
Ilhabela e PETAR)3 e serviços de alimentação, venda de artesanatos e outros serviços turísticos que poderão ser geridos,
no sistema de concessão, pelo setor privado (SÃO PAULO, 2008, grifo nosso). As atividades inseridas no referido Projeto
baseiam-se em três componentes: estruturação dos parques para a visitação pública, organização e consolidação do
produto turístico e fortalecimento da gestão pública. No caso do PETAR, a primeira componente será nos núcleos Cabo-
clos, Ouro Grosso e Santana, a partir de obras para a reforma e ampliação dos referidos núcleos, além da reorganização
administrativa para maior eficiência, controle e incremento da satisfação dos visitantes. Incluirá também investimentos
em monitoramento e infraestrutura para a visitação dos atrativos (grutas e cavernas), nos seus acessos (trilhas) e a elabo-
ração do plano de manejo. A segunda e terceira componente ocorrerá após a realização da primeira, visando ampliar
a divulgação do marketing turístico e a gestão pública do Parque. O tempo para a execução deste projeto é de quatro
anos e espera-se, após o seu término, um aumento de 50% no número de turistas (SÃO PAULO, 2008).

1
Graduando do curso de Bacharelado em Gestão Ambiental da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP. flabklein@hotmail.com
2
Docente do curso de Bacharelado em Gestão Ambiental da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP. sonia.paulino@usp.br
3
A Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo não explicita o porquê desta exceção.

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Existem, portanto, oportunidades para consolidação do ecoturismo em regiões com potencial, como é o caso
do PETAR, para diversos serviços turísticos, os quais podem ser geridos no sistema de concessão. Embora, para o
PETAR, os investimentos não incluirão a expansão dos meios de hospedagem, a tendência ao aumento da demanda
turística evidencia um potencial para a consolidação dos empreendimentos já existentes. Por outro lado, como já
mencionado, o turismo no PETAR vem aumentando os impactos socioambientais adversos, o que evidencia uma
necessidade de que a consolidação dos meios de hospedagem deva ocorrer a partir de instrumentos de gestão am-
biental que conciliem o ecoturismo com a função desta UC.
Muitas empresas estão demonstrando maior interesse em melhorar seu desempenho ambiental e, em muitos
casos, obterem certificação pela norma ISO 14001 (MOURA, 2004). Apesar deste modelo de certificação ser o mais
difundido mundialmente, a série de normas ISO 14000 baseia-se na certificação de procedimento e gerenciamento,
não estabelece padrões de desempenho, não considera os aspectos sociais e também não avalia os resultados mas
sim os procedimentos adotados pelo empreendimento para implantar o Sistema de Gestão Ambiental - ISO 14001
(PINTO; PRADA, 2008).
Devido a necessidade em criar-se um modelo de certificação propício à realidade do turismo ecológico no
Brasil, o Instituto de Hospitalidade, em parceria com o Conselho Brasileiro para o Turismo Sustentável (CBTS)
publicaram, em 2004, a Norma Nacional para Meios de Hospedagem – Requisitos para a Sustentabilidade: NIH-
54:2004. Tal Norma foi desenvolvida no âmbito do Programa de Certificação em Turismo Sustentável (PCTS). A
referida Norma objetiva a sustentabilidade de micro e pequenos meios de hospedagem, através de requisitos e
critérios mínimos, de forma a agregar valores ao produto, melhoria do atendimento, da qualidade de vida da co-
munidade receptora, concomitante à conservação ambiental (INSTITUTO DE HOSPITALIDADE, 2004). A referida
norma serviu de base para a criação, dois anos depois, da ABNT NBR 15.401:2006 (Meios de Hospedagem – Siste-
ma de Gestão de Sustentabilidade – Requisitos), que incorpora a norma desenvolvida no Programa de Certificação
em Turismo Sustentável – PCTS. Esta Norma é a referência do presente trabalho para analisar oportunidades para a
promoção do ecoturismo no PETAR.
A partir do exposto, o presente trabalho apresenta a seguir a estrutura, a qual baseou-se primeiramente,
no levantamento dos aspectos socioambientais inerentes ao turismo no PETAR para, posteriormente, relacioná-
los com a ABNT NBR 15.401:2006. Nos resultados, os aspectos negativos do turismo foram discutidos e ana-
lisados para, posteriormente, serem relacionados com os requisitos de gestão da sustentabilidade inseridos na
supracitada Norma.

Metodologia
Para o desenvolvimento do trabalho foram identificados, com base em pesquisa bibliográfica e documental, as-
pectos socioambientais do ecoturismo no PETAR que podem estar relacionados à ocorrência de impactos adversos4.
A unidade de análise foi o Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira e em relação ao entorno do parque, a unidade
foi o Bairro da Serra, localizado em Iporanga.
Para a análise da contribuição potencial da certificação ambiental para a promoção do ecoturismo no PETAR,
os aspectos ambientais compilados foram organizados e discutidos segundo os princípios e requisitos da ABNT NBR
15.401:2006 apresentados no quadro 1.

4
Aspectos ambientais são todos os elementos das atividades de uma organização (processos), seus produtos ou serviços que podem interagir com o meio ambiente como, por exemplo, consumo
de água ou emissão de efluente. Já impactos ambientais seriam quaisquer mudanças no meio ambiente que ocorrem como resultado das atividades de uma organização (MOURA, 2004).

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Quadro 1 - Princípios e requisitos5 ambientais, socioculturais e econômicos estabelecidos pela ABNT NBR 15.401:2006

Princípios: Requisitos relacionados aos aspectos ambientais:


• Respeitar a legislação vigente; • Preparação e atendimento a emergências ambientais;
• Garantir os direitos das populações • Áreas naturais, flora e fauna;
locais; • Arquitetura e impactos da construção no local;
• Conservar o ambiente natural e sua • Paisagismo;
biodiversidade; • Emissões, efluentes e resíduos sólidos;
• Considerar o patrimônio cultural e os • Eficiência energética;
valores locais; • Conservação e gestão do uso de água;
• Estimular o desenvolvimento social e • Seleção e uso de insumos
econômico dos destinos turísticos;
Requisitos relacionados aos aspectos socioculturais:
• Garantir a qualidade dos produtos,
processos e atitudes; • Comunidades locais;
• Estabelecer o planejamento e a gestão • Trabalho e renda;
responsáveis. • Condições de trabalho;
• Aspectos culturais;
• Saúde e educação;
• Populações tradicionais
Requisitos relacionados aos aspectos econômicos:
• Viabilidade econômica do empreendimento;
• Qualidade e satisfação dos clientes;
• Saúde e segurança dos clientes e no trabalho
Fonte: ABNT NBR 15.401:2006.

Em 2009, o hotel Canto das Águas, localizado na cidade de Lençóis, na Chapada Diamantina, é o primeiro
hotel a receber a certificação de conformidade com a ABNT NBR 15.401 (INSTITUTO ECOBRASIL, 2009).
De uma forma geral, os padrões de certificação socioambiental são apresentados na forma de princípios e cri-
térios. Os princípios expressam ideias, definem a estrutura básica dos padrões. Os critérios tratam de elementos que
podem ser medidos e/ou avaliados a partir de indicadores (PINTO; PRADA, 2008). No caso da ABNT NBR 15.401,
um dos critérios/requisitos estabelecidos ao empreendimento como, por exemplo, em relação à população local,
seria em comprometer-se com o aproveitamento da comunidade local (item 6.2 da Norma). Assim, um indicador
para este requisito seria o percentual da mão-de-obra local em relação ao total do empreendimento.
A partir dos procedimentos metodológicos apresentados, buscou-se apontar os aspectos ambientais do ecotu-
rismo no PETAR para, posteriormente, relacioná-los com os princípios e requisitos inerentes à Norma.

Resultados e discussão
Esse item baseia-se em identificar e compilar, com base em pesquisa bibliográfica e documental, os aspectos
socioambientais associados aos impactos adversos das atividades turísticas no PETAR.

Compilação de aspectos socioambientais do ecoturismo no PETAR


No PETAR, o ecoturismo nas últimas décadas tornou-se a principal fonte de renda e empregos, principalmente
para a população residente no Bairro da Serra, localizado em Iporanga (BONDUKI, 2002; GIATTI, 2004; FOGAÇA,
2006). Em 1998, mais de 83% do fluxo de visitantes do PETAR concentraram-se no Núcleo Santana, onde se localiza
o Bairro da Serra. Em 2003 o PETAR recebeu mais de 48 mil visitantes (GIATTI, 2004).
No que concerne o atrativo turístico, a beleza cênica e a floresta preservada tornaram o Parque um dos locais
turísticos mais visitados no Estado de São Paulo, incluindo o turismo de aventura e o espeleológico (CASTRO, 2004).
No entanto, a questão da infraestrutura do setor hoteleiro não acompanhou o crescimento da demanda turística no
PETAR. Segundo Giatti (2004), no Bairro da Serra há uma carência de saneamento básico na região e, devido ao
aumento do ecoturismo, a qualidade das águas na região vem sendo comprometida devido ao despejo de esgoto
sem tratamento nos rios e córregos no referido bairro, além da produção de resíduos sólidos pelos turistas que são
dispostos em lixões a céu aberto (BONDUKI, 2002; GIATTI, 2004). Em relação aos aspectos paisagísticos, Fogaça
5
Salienta-se que para cada requisito listado no quadro 1, existem diversos subitens a ser considerados. Por exemplo, o requisito “qualidade e satisfação do cliente” possui 13 subitens exigidos
pela Norma.

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(2006) afirma que as casas que eram usadas como pousadas, feitas de pau-a-pique, foram transformadas em casas
de alvenaria, gerando grande impacto ambiental em relação ao aspecto paisagístico.
Em relação aos aspectos socioeconômicos negativos, a maior parte das pousadas e camping não possuem firma
aberta, o que impede maior arrecadação tributária em nível municipal (FOGAÇA, 2006). Outra questão pertinente
refere-se à falta de investimento na qualificação profissional da mão-de-obra local, o que limita as possibilidades
de ascensão profissional no setor turístico local. O setor hoteleiro local também não valoriza os gêneros alimentícios
produzidos pelas comunidades locais, tampouco, produtos como artesanato (BONDUKI, 2002; FOGAÇA, 2006).
Uma outra questão relevante é a influência da cultura dos turistas em relação a cultura local. Os turistas, muitas
vezes, praticam comportamentos atípicos da comunidade como nadar sem roupas no rio, consumo exagerado de
álcool e drogas (BONDUKI, 2002). Os turistas que visitam o Vale do Ribeira possuem tendência a realizarem rela-
ções sexuais sem preservativo e cometerem assédio e abuso sexual com as nativas, potencializados pelo uso abusivo
de álcool, maconha, cocaína e outras drogas sintéticas como LSD e ecstasy, além de drogas injetáveis, aumentando
a vulnerabilidade à transmissão do HIV entre os turistas e população local e entre os próprios turistas (SANTOS;
PAIVA, 2007). Isso também pode influenciar negativamente a cultura local.
O interior do PETAR também vem sofrendo com aspectos e impactos da atividade turística, em especial, na
caverna de Santana, a mais visitada do PETAR: visitação acima da capacidade de carga, uso de madeira para o aces-
so ao interior da Caverna (a madeira pode causar desequilíbrio no ecossistema pela proliferação de fungos), uso de
iluminação artificial à base de carbureto, o qual produz acetileno, um combustível que causa diversos impactos ao
ecossistema interno das cavernas, poeira, fuligem e matéria orgânica transportada pelo corpo dos turistas, alterações
comportamentais na fauna, surgimento de plantas e fungos, e alteração no microclima (LOBO, 2008), além da de-
predação física dos espeleotemas, danificadas por vandalismo (GIATTI, 2004).
Em virtude dos crescentes impactos ambientais e pela ausência de um plano de manejo6, criou-se um plano de
emergência como medida temporária para manter a atividade turística no PETAR: atualmente apenas as 12 cavernas mais
visitadas estão abertas à visitação porém, com algumas regras como, por exemplo, cada gruta recebe um número máximo de
visitantes por dia. A Fundação Florestal, órgão ligado à Secretaria Estadual do Meio Ambiente e responsável pela administra-
ção do parque, comprometeu-se a entregar, entre abril e maio de 2010, um plano de manejo para a área (MOREIRA, 2009).
Sobre o perfil da demanda turística do PETAR, segundo Rossi (1996 apud BONDUKI, 2002), 86% dos visitantes do
Núcleo Santana possuem até 35 anos e cerca de 48,36% do total estariam cursando o nível superior ou possuíam nível
superior completo. Em relação a renda, mais de 47% possuem renda pessoal de até 4 salários mínimos, 20,65% de 5 a 8
salários, 15,76% entre 9 e 15 salários, 9,78% entre 16 e 30 salários e 2,72% mais de 30 salários mínimos. Quanto a proce-
dência, 90% dos visitantes são das cidades do Estado de São Paulo sendo, apenas da Capital e para a cidade de Campinas,
40% e 10%, respectivamente (ROSSI, 1996 apud BONDUKI, 2002). A procedência dos turistas é de suma importância:
como Iporanga dista 360 km da capital paulista (GIATTI, 2004), o tempo de permanência dos turistas no PETAR é em
torno de três dias (FOGAÇA, 2006). Tais dados evidenciam uma demanda com alto poder aquisitivo o que, somado ao
tempo de permanência, permitem agregar maior valor à economia local, sobretudo no setor hoteleiro.
Outra questão pertinente acerca do perfil da demanda é de que há uma tendência de um novo perfil de tu-
rista que visita o PETAR: visitantes avulsos, às vezes famílias que chegam sozinhos, de carro de passeio e sem guias
próprios (BONDUKI, 2002). Além disso, gastam mais em suas viagens, além de exigirem maior qualidade e conforto
pelos serviços. Esta mudança de perfil já é percebida por todos os empreendedores pois as pousadas que operam
com as maiores taxas de hospedagem são as que possuem melhores padrões de conforto aos hóspedes cujos pro-
prietários, em sua maioria, não são nativos do bairro (FOGAÇA, 2006, grifo nosso). Esta questão sobre a maior parte
dos empreendedores não serem nativos do bairro é relevante, uma vez que podem limitar as oportunidades de em-
prego e renda à população local, devendo haver formas de garantir que as comunidades tradicionais e locais sejam
também contempladas com os benefícios advindos do ecoturismo.

Certificação em Turismo Sustentável como instrumento de promoção do ecoturismo no PETAR


Os aspectos associados a impactos socioambientais adversos em decorrência do turismo no PETAR relacio-
nam-se com os requisitos da ABNT NBR 15.401:2006. No item anterior, os aspectos mais relevantes que foram
evidenciados seriam:

6
O art. 2º, inciso 17 da Lei nº 9.985/2000 define o plano de manejo como um documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se
estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade.

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• Geração de resíduos sólidos e disposição inadequada em lixões a céu aberto
• Geração de esgoto doméstico
• Despejo de esgotos sem tratamento em rios
• Construção de pousadas sem adequação quanto a paisagem
• Visitação em cavernas acima da capacidade de carga
• Infraestrutura inadequada à visitação em cavernas
• Poeira, fuligem, depredação física, alteração no microclima e na fauna e proliferação de fungos, entre outros
no interior das cavernas mais visitadas

A seguir, esses aspectos são tratados procurando relacioná-los aos requerimentos para o cumprimento dos
requisitos da norma de certificação.
O item 5.5 da Norma trata sobre emissões, efluentes e resíduos sólidos. Para os resíduos, o item 5.5.1(p. 12)
afirma que “O empreendimento deve planejar e implementar medidas para reduzir, reutilizar ou reciclar os resíduos
sólidos. O planejamento deve incluir o estabelecimento de metas de redução, reutilização e reciclagem, de acordo
com as condições locais”.
Em relação aos efluentes líquidos, o que, neste caso, inclui o esgoto doméstico, é tratado no item 5.5.2 (p. 12)
“O empreendimento deve planejar e implementar medidas para minimizar os impactos provocados pelos efluentes
líquidos ao meio ambiente e à saúde pública”. Tais medidas, segundo a Norma, devem incluir o tratamento das
águas residuais a partir da conexão com o sistema público ou a partir de instalações próprias.
O aspecto paisagístico também é contemplado na Norma. O item 5.4.1 (p. 11) afirma que “O planejamento e
a operação do paisagismo do empreendimento devem ser efetuados minimizando os impactos ambientais”. Ainda
no referido item, alguns cuidados devem ser tomados: o paisagismo deve refletir o ambiente natural do entorno,
não deve haver propagação de espécies exóticas pelo entorno e que seja utilizado o máximo de espécies nativas.
Os três últimos aspectos listados acima ocorrem dentro do Parque, especialmente no interior das cavernas. O
item 5.2 (p. 10) da Norma trata sobre áreas naturais, flora e fauna. No supracitado item, o empreendimento deve
ter um comprometimento com a conservação das áreas naturais próprias e inclusive de terceiros. A alínea b do item
5.2.2 afirma que o empreendimento “quando não possuir uma área natural própria, apoiar a proteção e manejo
de áreas naturais de terceiros na região”. Sobre as áreas naturais protegidas, o mesmo item afirma “Convém que o
empreendimento participe nas ações da gestão das áreas naturais protegidas”.
Os aspectos socioeconômicos negativos em decorrência do turismo no PETAR seriam:

• Baixa capacitação da população local para atividades ligadas ao ecoturismo


• Limitação na ascensão profissional de empregos ligados ao turismo
• Falta de valorização para produção de alimentos e artesanato produzidos pela população local
• Vulnerabilidade da população local em contrair doenças como HIV devido ao assédio e abuso sexual dos turistas
• Consumo de álcool e outras drogas pelos turistas, além de outros costumes que podem influenciar a cultura local
• Tendência ao aumento de empreendedores não nativos
• Oferta de serviços de acomodação que podem não atender plenamente as expectativas dos turistas

O item 6 da Norma trata dos requisitos socioculturais para o turismo sustentável. Sobre a inclusão da popula-
ção local, o item 6.2.1 (p. 16) afirma que: “pelo menos 50% da força de trabalho envolvida com as operações do
empreendimento devem ser provenientes das comunidades locais”. Sobre a capacitação, o mesmo item frisa que “O
empreendimento deve promover ações de capacitação profissional, de modo que pessoas das comunidades locais ou
regionais possam obter trabalho diretamente no empreendimento ou pela ativação de cadeias produtivas regionais.
O incentivo à venda de artesanatos e de produtos típicos também são requisitos ao empreendimento conforme
o item 6.2.2: “O empreendimento deve incentivar a venda de artesanatos e produtos típicos (inclusive culinários) da
região, fornecidos por pessoas das comunidades locais, no empreendimento ou nas próprias comunidades locais [...]”.
O item 6.4 da Norma trata dos aspectos culturais. O item 6.4.5 (p. 17) é de suma importância, pois trata-se do
respeito à cultura local: “O empreendimento deve fornecer aos clientes orientações e informações para incentivar
o conhecimento e para promover atitudes e comportamento de respeito à cultura local”. Devido a vulnerabilidade
da população local em adquirir doenças sexualmente transmissíveis como o HIV, o empreendimento também deve
participar de programas de saúde das comunidades locais como iniciativas de educação para a saúde, conforme o
item 6.5.1 da Norma.

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O item 7 da Norma refere-se aos requisitos econômicos para o turismo sustentável. Dentre eles, convém desta-
carmos o item 7.2 “Qualidade e satisfação dos clientes”. Como já abordado, os principais tipos de turismo praticado no
PETAR seriam o de aventura e o espeleológico e tais tipos devem ser identificados e oferecidos aos clientes conforme
o item 7.2.1 (p. 18) “O empreendimento deve estabelecer e manter procedimento para identificar as expectativas
dos clientes em relação aos produtos e serviços oferecidos”. Além disso, a satisfação dos clientes também é relevante
para os turistas do PETAR devido a maiores exigências quanto a qualidade nos serviços de acomodação. Sobre isso,
o item 7.2.4 (p. 19) afirma que “O empreendimento deve manter um sistema de informação sobre a satisfação dos
clientes [...]. As informações sobre a satisfação dos clientes devem ser utilizadas na revisão crítica do sistema de gestão
da sustentabilidade”.
É importante também que o empreendimento disponibilize aos clientes diversas informações acerca do local e
do entorno, conforme o item 7.2.7 da Norma. Dentre estas informações, podemos destacar: o incentivo ao consu-
mo de produtos regionais, as atividades socioculturais na região, como se conduzir nas comunidades locais e sobre
suas responsabilidades nos locais que visitar, e informações sobre como se comportar no meio rural. Tais requisitos
relacionam-se com a valorização da produção local, o respeito quanto a cultura local e a não degradação do am-
biente físico como a destruição de espeleotemas por vandalismo no interior das cavernas.
Verifica-se que a Certificação em Turismo Sustentável é focada nos meios de hospedagem, estabelecendo cri-
térios mínimos específicos de desempenho em relação à sustentabilidade que permitem considerar adequadamente
aspectos relacionados aos principais impactos sociambientais negativos da atividades turística no PETAR.

Considerações finais
Os objetivos da ABNT NBR 15.401 levam em conta os requisitos legais e os impactos ambientais, sócio-
culturais e econômicos significativos relacionados aos meios de hospedagem. Nota-se, portanto, que a Certificação
em Turismo Sustentável, a partir da referida norma, é propícia para implantação em empreendimentos no PETAR.
O trabalho apresentado demonstrou a importância do turismo no PETAR, especialmente pela geração de em-
pregos e renda à população local sendo, portanto, uma alternativa viável e necessária para o uso restrito desta UC.
Porém, evidenciou-se que existem diversos aspectos associados a impactos socioambientais adversos no interior
e no entorno do PETAR decorrentes do turismo no local. Tais aspectos envolvem os turistas, a população local, os
gestores do PETAR e os meios de hospedagem, o que demonstra a necessidade do uso de instrumentos de gestão
ambiental que possam tornar o turismo local em “turismo sustentável”. Nesse sentido, a Certificação em Turismo
Sustentável, pela ABNT NBR 15.401, é adequada para aplicação em empreendimentos localizados no entorno do
Parque. Seus princípios e requisitos, se implementados, poderiam auxiliar na gestão turística do PETAR, inclusive
no auxílio à aplicação e monitoramento do plano de manejo que atualmente espera-se para a região. Além disso,
tal Norma levaria os empreendimentos a reduzir os impactos socioambientais negativos que ocorrem, bem como a
ampliar os benefícios à população local, a partir da inclusão da mão-de-obra local, bem como pela divulgação da
cultura e produtos como artesanato produzidos localmente.

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ANAIS DO VII CONGRESSO INTERNACIONAL SOBRE TURISMO RURAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - CITURDES 289

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