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IL. Direitos de Autor e Informatica 1. Introdugao © art. 42° da Constituico da Republica Portuguesa prevé a liberdade de criacao intelectual, artistica e cientifica dos individuos, estipulando que tal prerrogativa inclui o direito a invengao, produsio e divulgago da obra cientifica, literdria ou artistica, bem como a proteccio legal dos direitos de autor. Tal direito € depois desenvolvido pelo Cédigo de Direitos de Autor e Direitos Conexos, e, no que especificamente diz respeito a0 mundo da informatica, pelo Decreto-lei 252/94 de 20 de Outubro. 2. Conceitos Para que nao surjam dividas quanto as expressdes utilizadas, destacaremos os seguintes conceitos: Autor: 0 criador intelectual da obra Obra: é 0 produto da criacdo intelectual do autor. Com estas nogdes ndo se deverso confundir as formas de divulgagdo da obra. O autor pode publicar a sua obra por diversos meios, tendo todos eles igual proteccio legal. Poder exprimir a sua obra através de um livro, de uma fotografia, de um filme, de um CD, etc. Claro esta que se 0 autor decidir publicar na internet, existirdo dificuldades acrescidas em controlar o seu direito. Nao se trata de no existir esse direito, mas da enorme dificuldade de perseguicéo judicial e protec¢do prética da sua obra. Alids, a este respeito proliferam, modernamente, muitos mitos sobre a disponibilidade de obras na internet. Vejamos alguns desses mitos e realidades: a) Se no tem uma nota de copyright, é de utilizagao livre. b) Nao faco qualquer uso comercial da obra. )_Encontrei na internet como sendo de dominio publico. d) Quem nao regista a obra, passa a ser livre a sua utilizagao. a e} Ao utilizar no meu site estou a fazer publicidade gratis. Estas afirmagdes sao exactamente o contrario do que se passa com a tutela legal do direito de autor. Antes de aprofundarmos o significado de direito de autor, deveremos recordar a disting3o entre direitos absolutes e direitos relativos, Aos direitos relativos (ex.: os resultantes dos contratos) podemos apontar quatro caracteristicas. A) Tém eficdcia relativa, isto &, produzem efeitos apenas perante os sujeitos da respectiva relacdo juridica. Cir. art? 406° do Cédigo Civil. 8) Para cumprirem o seu fim natural, a fungo para que foram concebidos, pressupéem a colaboracdo de terceiro. Se A deve 500 euros a B, este direito de B sobre A foi criado para que ‘A the pague os 500 euros. Esse seré o seu fim natural, digamos assim. Claro que, se A ndo pagar, ha sempre remédios para isso: B pode recorrer a0 tribunal, e este, depois de verificado © fundamento do pedido, iré aprender os bens de A, vendé-los e, com 0 produto da venda, pagar a8, ) Extinguem-se com o nio exercicio, através de figuras como a prescrigio, a caducidade, etc. D) Nestes direitos funciona o principio da liberdade contratual ou da autonomia da vontade (Codigo Civil, art® 4052): podemos - dentro de certos limites, é claro, mas limites muito amplos - criar os direitos relativos que bem desejarmos, Os direitos absolutos, por sua vez, tém também caracteristicas préprias, diametralmente opostas as dos direitos relativos A) Tém eficacia absoluta, isto é, perante toda a gente. Diz-se eficécia "erga omnes", expresso latina que significa precisamente "perante toda a gente”. Claro que nao é perante todos os habitantes do Planeta, pela simples razdo de que, em principio, cada sistema juridico nacional 86 produz efeitos no respectivo territorio. B) Nao pressupéem a colaboragio de terceiro. Para o meu direito de propriedade sobre um qualquer objecto produzir plenamente os seus efeitos, a Unica “colaboragao" de que preciso das outras pessoas é que no interfiram com o meu direito, C) Nao se extinguem com no exercicio, Eventualmente, com o tempo, poderd surgir um direito incompativel, que o faca extinguir. Porém, se isso ndo acontecer, ndo é pelo facto de um proprietério deixar de praticar os actos préprios de proprietério, nem que seja por muitas, décadas, que perde o seu direito. 35 D) Aqui funciona o princfpio da tipicidade (cfr. Cédigo Civil, art? 13062): s6 valem como direitos absolutos os que a lei expressamente regule como tal, e s6 valem como direitos absolutos se obedecerem integralmente ao respectivo tipo legal. Caso se introduzam alteragées a esse tipo legal, essas alteragGes terdo mera eficdcia de direitos relativos. . Finalidades e Componentes do Direito de Autor ‘So sobretudo duas as finalidades da previsdo juridica deste direito: 12) Fazer com que o autor seja reconhecido como tal 28) Compensar o autor pelo esforco dispendido na criagio da obra ‘O que nos leva a distinguir as duas fundamentals componentes do Direito de Autor: A componente material ou patrimonial, que significa que o autor detém um direito de exclusive sobre a exploragdo econémica da obra, 0 qual pode ser cedido definitiva ou temporariamente, de forma total ou parcial; ‘A componente moral ou intelectual com o significado de que 0 autor pode reivindicar a paternidade da obra e assegurar a sua genuinidade e integridade. Este direito é indisponivel: no se pode vender, alugar, etc., nem se pode desistir dele. Diz-se entdo que é inalienével, irrenunciével e imprescritivel: o seu titular no a pode transmitir a outrem, nao pode renunciar ala nem a perderé com o decurso do tempo. Como veremos a seguir, os dois componentes podem nao pertencer 4 mesma pessoa, e por isso € que 0 Decreto-Lei 252/94 fala, por vezes, em "criador intelectual”, 4. Protecsao Juridica dos programas de computador 4.1. Introdugao 0 Decreto-Lei 252/94 de 20 de Outubro é o diploma que procede a tutela juridica dos direitos de autor que incidem sobre programas de computador. N3o podemos pois avangar sem aqui deixar uma aproximagio ao conceito de programa de ‘computador. Para a ASSOFT, programa de computador é 0 conjunto de instrugdes ou macro-instrugdes para ser usado, directa ou indirectamente, num computador de forma a gerar um certo resultado. 16 Jé em 1977 a OMPI (Organizagio Mundial de Propriedade Industrial) preocupou-se em adiantar uma nocdo de programa de computador, a qual, como seria préprio na altura, tentava esclarecer numa nica forma o que vinha a ser isso. Assim, para a OMPI o programa de computador era um conjunto de instrugdes capaz, quando incorporado num veiculo legivel pela maquina, de fazer com que uma maquina, que disponha de capacidade para processar informages, indicar, desempenhar ou executar uma particular funco, tarefa ou resultado. Outra questo introdutéria a ter em atencdo refere-se a actividade do programador, que se poderia apresentar pela seguinte sequéncia: 7 >» TCE) Linguagem (Algoritmo) de alto nivel Desta actividade nasce num primeiro momento 0 cédigo-fonte e, depois, 0 cédigo-objecto. Sobre estes incidiréo os direito de autor. 4.2, Ambito da lei © DL. 252/94 surgiu pela transposi¢ao para o ordenamento juridico nacional da Directiva n.? 91/250/CEE. Uma directiva é uma norma de Direito Comunitério (direito da Unio Europeia), ¢ consiste, sumariamente, na ordem dada aos Estados-Membros para introduzirem certas alteragdes nos seus sistemas juridicos nacionais, com vista a uniformizagao das regras em toda a comunidade. Principio da Novidade ‘So protegidos apenas os programas de computador com cardcter criativo. O que é “cardcter criativo"? Nao & com o sentido da linguagem comum. Quer, sim, dizer algo diferente do que j existe (pode até ser de fraca qualidade!). Para efeitos da proteccdo a titulo de direito de autor, 86 se exige que seja diferente de todos os programas que jé existem. Esta disposi¢ao, que estabelece o chamado "principio da novidade", levanta alguns problemas. Em primeiro lugar, poder-se-ia argumentar que um programa, pelo facto de ser uma mera aplicagdo das leis da matematica, nunca se poderia considerar inovador. Porém, as patentes dizem respeito a meras aplicagdes de leis da fisica, da mecénica, etc., no foi por isso que deixou de se conceder tal direito de exclusivo. Outro problema é 0 da programacéo por objectos. Seré que uma mera combinacao de elementos que ja existem pode ser considerada inovadora? Entendemos que sim, desde que no seja uma mera "colagem" aleatéria dos tais objectos "pré-fabricados", Temos ainda o caso das linguagens de programac3o, nomeadamente se é possivel registar um direito de autor sobre 0 programa, se ele foi feito com uma linguagem de programaco sobre a qual incida também um direito de autor. E quem diz linguagem de programacio diz, também, sistema operativo. Somos de opinigo que pode. Uma linguagem de programa¢ao foi feita para isso mesmo: para permitir a criagdo de programas. Um sistema operativo foi feito para permitir que se usem programas, sejam processadores de texto, folhas de céleulo ou jogos. af que, nestes casos, no haverd que pedir autorizagao 20 titular do direito de autor sobre a linguagem de programagao ou sobre o sistema operativo, a néo ser, € claro, que tenhamos assinado um contrato nesse sentido. Porém, ai estamos obrigados a tal ndo por causa da natureza do direito de autor, mas por mero resultado do contrato. € ai, como veremos mais adiante, as consequéncias da violagdo desse dever seréo bem menos graves do que se estivéssemos a violar 0 proprio direito de autor. Por outro lado, pode haver casos duvidosos. Até que ponto é que uma nova versio de um programa, um mero upgrade, pode ser considerado inovador? Tudo dependerd da anélise do ‘caso em concreto. Em alguns casos, até mesmo uma mera modificag3o do interface grafico pode fazer surgir uma nova obra, passivel de novo direito de autor, se, por exemplo, 0 interface grafico for, na perspectiva do utilizador, o elemento mais importante. Principio da Equiparaco da Protecco Legal Para efeitos de protecc3o do direito de autor, o material de concepcio preliminar é equiparado ao programa de computador. Pode-se considerar que cabe no conceito de material de concep¢do preliminar, por exemplo, 0 algoritmo. Porém, como veremos, nao se trata do algoritmo em abstracto, como figura légica, mas aquele algoritmo em concreto. Alguns elementos deste material de concepeao preliminar poderdo, eles mesmos, ser objecto de um direito de autor préprio. Pense-se, por exemplo, nos esbocos feitos por artistas, para certos jogos. Podem perfeit mente ser considerados obras artisticas e, por isso, podem estar abrangidos por um direito de autor auténomo. Aliés, nesses casos, os autores do programa provavelmente deverdo tomar as devidas precaugées, para que o autor dos desenhos (ou ‘outro material) ndo venha mais tarde reclamar pelo seu uso indevido, Basicamente, devera ser uma dectaragio de autorizagéo de uso no software, ou algo do género. 4.3. Objecto da lei A\lei pretende dar proteccio a todas as formas de expresstio do programa, 38

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