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Recife
2009
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Maria Janaina Silva de Luna – Graduada em Letras pela Universidade Federal de Pernambuco.
Professora de Inglês e Português da Escola Americana do Recife. Professora de Português do Ensino
Médio da escola Professor Jordão Emerenciano. Especialista em Psicopedagogia Escolar pela
Faculdade Joaquim Nabuco.
RESUMO
Este texto aborda utilização das histórias infantis, que vão além do entretenimento ou
letramento. O estudo focaliza a utilização das histórias e seu valor terapêutico, quando usado
como instrumento de auxilio à identificação e exposição verbal do que há por trás da dificuldade
de aprender que algumas crianças possuem no ambiente escolar. A pesquisa discute como os
transtornos emocionais podem prejudicar o desenvolvimento acadêmico das crianças se não
forem identificados previamente. Este trabalho apresenta a compreensão empática (Carl
Rogers) como um elo significativo entre o professor e o aluno, a estruturação das histórias
infantis e práticas pedagógicas complementando o trabalho terapêutico.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................07
4.1 Os Personagens........................................................................................13
5. HISTÓRIA........................................................................................................14
5.1 Temática....................................................................................................17
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................23
9. REFERÊNCIAS...............................................................................................25
10. GLOSSÁRIO....................................................................................................26
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1. INTRODUÇÃO
A aprendizagem é a construção do conhecimento, um processo natural e espontâneo que se
por alguma razão não acontece, uma lei da natureza está sendo contrariada.
Os transtornos emocionais que, por sua vez geram graves dificuldades de aprendizagem, são
geralmente detectáveis na escola. Assim, é fácil deduzir a grande responsabilidade do professor
frente aos agentes que tanto podem contribuir para a gravidade da situação como para a solução dos
infinitos problemas, dificuldades e limitações, a que a criança está exposta principalmente quando
ingressa na escola. Frente a esta situação, não cabe ao professor a função de terapeuta, mas de
interventor e mediador. Uma das várias ferramentas que o professor dipõe seria as histórias infantis
utilizadas em sala de aula terapeuticamente com o objetivo de criar uma relação de ajuda, de
compreensão, apoio entre o aluno e o conflito que o aflige. Os vínculos que surgem desta relação têm
um poder curativo, pois é mais fácil superar as dores através de uma relação autêntica de respeito
mútuo do que sozinho.
Segundo Bettelheim (1980, p.23) “as histórias infantis, tratando de problemas universais,
falam ao ego e encorajam seu desenvolvimento, enquanto que ao mesmo tempo aliviam tensões pré-
conscientes e inconscientes”. Cada ser humano vive uma história de interações, encontros e
acontecimentos em que as doenças, mesmo surgindo mais no corpo ou na "mente", resultam dos
desequilíbrios existenciais e de soluções inadequadas de vida.
O objetivo deste trabalho é apresentar uma proposta de utilização das histórias infantis que vá
além do entretenimento ou letramento. Essa proposta se baseia na utilização das histórias e seu valor
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terapêutico quando usado como instrumento de auxílio à identificação e exposição verbal do que há
por trás da dificuldade de aprender que algumas crianças apresentam no ambiente escolar.
Um aluno só poderá ser diagnosticado com dificuldades de aprendizado quando der um sinal,
um aviso que algo precisa ser redimensionado. Segundo Fernández (1991) a dificuldade de aprender
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Para que não haja mal entendido sobre o objetivo do presente artigo, é preciso conhecer
algumas diferenças entre o ato terapêutico e a terapia. Mas antes desta exposição, a psicóloga
Priscila Vieira, por meio de uma analogia entre os conceitos, nos faz perceber claramente a
diferença entre eles. “Quando alguém se machuca, uma ferida aparece. O ato terapêutico vai
“curar” essa ferida superficialmente. O “mercúrio” utilizado aliviará a dor da pessoa naquele
momento. Ela verbalizará a dor que está sentindo, mas a pessoa que a assiste se limitará amenizar
sua dor neste momento. Já a terapia irá mais fundo. Precisaremos abrir o ferimento, checar o que
há por dentro, fazer uma limpeza externa e interna. Um processo doloroso de descobrimento da
causa da dor. Só então faremos um diagnóstico e planejaremos um tratamento adequado para que
aquela dor nunca mais incomode.”
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Ato Terapêutico
Pode ser conduzido por qualquer profissional que busque o bem estar daquele que se
encontra em conflito;
O trabalho em equipe é permitido; o mediador pode trocar ideias sobre o envolvido com
outros colegas; a informação não é sigilosa.
Terapia
Ao se identificar com um personagem de ficção, o leitor entra em sintonia com valores, ideais e formas da
comunidade em que o personagem se situa. Ao mesmo tempo, o leitor responde, em contrapartida, com os seus valores e
os seus sentimentos, naquele momento, a todo conjunto de valores sociais representados pelo personagem, pela história,
pelo narrador da ficção. (Amarilha, 1997)
Ao ouvir muitas histórias, a criança, além de dar o primeiro passo rumo a sua formação
psicológica, busca respostas aos seus questionamentos, descobrindo o mundo imenso de conflitos,
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impasses, soluções que todos vivemos e atravessamos. Sua identificação com tantos personagens,
com a maneira como estes resolvem seus conflitos, ajuda a esclarecer melhor suas próprias
dificuldades ou encontrar um caminho para a solução delas.
Nas histórias há muito mais liberdade. A criança pode retirar delas o que necessita e a história
se adapta ao estado de desenvolvimento da criança. Uma boa história contém valores concretos e
abstratos. A criança pode identificar-se com personagens do conto de fadas e distinguir a imaginação
da realidade, o que parece ser especialmente importante.
4.1 Os Personagens
Os personagens nas histórias infantis são tipos lineares e com limites bem definidos dentro do
enredo. São também representantes de valores históricos e suas qualidades físicas e morais ou
defeitos são nítidos. A maioria dos contos não possui nomes de personagens, e se o possuem, são
bastante genéricos, como João e Maria, o que facilita a projeção da criança. As personagens são
claramente descritas como sendo boas ou más e o seu comportamento não se altera de forma
imprevisível.
O espaço e o tempo em que se desenvolve a história nunca são detalhados com precisão. O
“Era um vez...” mostra ao leitor que aquela narrativa maravilhosa está muito distante dele, o que, de
certa forma, acaba servindo como uma convidativa porta de entrada para a fantasia.“Imaginando, ela
pode brincar com temas próprios de sua realidade psíquica, por vezes difícil, como o amor, a morte, o
medo, a rivalidade fraterna, a separação e o abandono”. (GUTFREIND, 2004 : 25).
O tempo e o espaço nas histórias têm um valor eterno devido ao seu caráter abstrato. Outro
aspecto importante é a sua orientação para o futuro: “Enquanto que a fantasia é irreal, os bons
sentimentos que nos oferece sobre nós próprios e o nosso futuro são reais e estes bons sentimentos
efetivos são aquilo de que precisamos para nos apoiar”, diz ainda Bettelheim.
O desencadeamento dos fatos dá-se de forma direta e, no fim, o bem sempre vence o mal,
mesmo que para isso se tenha que usar do artifício da magia, muitas vezes presente como mediadora
entre uma situação de equilíbrio com uma de desequilíbrio e vice-versa. Os vilões quase sempre
morrem ou são castigados exemplarmente, muitas vezes submetidos às mesmas maldades que
cometeram. Mais forte que um castigo é a convicção de que o crime não compensa e esta é a razão
pela qual, nas histórias de fadas, a pessoa má sempre perde.
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5. HISTÓRIA
Se começarmos por uma história que a criança se mostre interessada, teremos uma boa
oportunidade de discernir os problemas mais urgentes que a própria criança põe em foco. A próxima
coisa a fazer será escolher uma história que seja útil para se trabalhar os problemas da criança. Se o
problema principal for a relação com a mãe, escolheremos uma história em que o papel da mãe e os
símbolos a ela ligados sejam essenciais. Assim, a história será um ponto de partida para mudar
gradualmente a imagem negativa da mãe ou ressaltar seus pontos positivos.
A história escolhida para ser trabalhada em sala de aula deve conter elementos de angústia,
fantasia e defesa do aluno e o que professor quer atingir naquele momento específico. “A
preocupação da história não é com o mundo exterior, mas representa os processos interiores que
ocorrem num indivíduo, por meio da linguagem de símbolos que vão personificar e ilustrar os
conflitos internos”, afirma Hisada.
Bettelheim diz que a maior contribuição das histórias é no campo das emoções, pois
desenvolvem a capacidade de fantasia infantil, fornecem escapes ao falar, dos medos, ansiedades,
ódios, sentimentos de inferioridade, aliviando as pressões exercidas por estes problemas, auxiliando
na recuperação e consolo.
A vida de um rinoceronte, também, não é sempre fácil. Eu soube de um que era muito infeliz.
Querem saber por quê?
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Bem, o rinoceronte não se acertava com seu longo chifre sobre o nariz. Em todo lugar
atrapalhava. Ele ficava preso em árvores e, sem querer, batia em outros animais. Ou derrapava numa
brincadeira, caía num buraco e ficava preso.
O rinoceronte estava aborrecido! Às vezes desejava não ser mais um rinoceronte. Certo dia,
um macaquinho escutou isso. “Você pensa que só você tem dificuldades?” perguntou ele ao
rinoceronte, que estava coçando as costas numa árvore. “Veja meu rabo comprido! Não pense que
isso é sempre uma vantagem! Muitas vezes já deu um nó nele numa subida? Geralmente, quando eu
estava com muita pressa. São coisas que acontecem. Mas será que é preciso ficar tão descontente por
isso?!
O rinoceronte escutava em silêncio. Um pequeno besouro passou por perto e disse: “Ei,
cuidado, aí!”
Assustado, o rinoceronte deu um passo para trás. “Desculpe, eu não tinha visto você.”
“É o que geralmente acontece comigo”, resmungou o besouro. “Infelizmente sou tão pequeno.”
Então deu uma risada marota. “Em compensação posso fazer cócegas no teu pé sem você me
ver.”
“É verdade.” O macaco riu alegremente. “Todos nós podemos fazer alguma coisa que os outros
não podem. – Você é grande e forte”, disse para o rinoceronte. “E você pode correr depressa.” O
rinoceronte acenou com a cabeça que sim. “Que tolo que eu era! Estou feliz em ser um rinoceronte.”
Ele deu uma volta, bateu com seus chifres contra uma árvore e todos deram muita risada.
5.1Temática
Por meio dessa prática, o aluno terá a oportunidade de se ver e perceber os colegas em volta. O
professor poderá explorar as diferenças e semelhanças físicas que cada aluno possui.
Material: Papel “jornal”; lápis de cores, hidrocores, gizes de cera; lápis e borracha
Aplicação:
1. O educador distribuirá um pedaço do papel do tamanho do aluno.
2. O aluno terá que desenhá-lo no papel. Mas isso só será possível com a ajuda de um colega ou
até mesmo do professor.
3. O aluno deita sobre o papel e escolhe a posição do desenho: de braços abertos, fechados, um
braço levantado, etc.
4. Quando o desenho da forma do aluno estiver pronto, ele já pode desenhar os detalhes:
cabelos, olhos, boca, roupa, entre outros.
5. Terminada a pintura do desenho, o professor abre um círculo e pede para que cada um se
apresente. Neste momento o professor pode guiar os alunos a um debate sobre as diferenças e
semelhanças de cada um. Pode também falar sobre o texto do rinoceronte.
6. Após esse debate, o professor cola os desenhos pela sala.
Algumas crianças consideram a escola como um refúgio dos problemas familiares, pois, tanto o
ambiente escolar quanto os professores, continuam constantes em sua vida durante esse período de
grande reviravolta existencial. Mesmo assim, nem sempre esses alunos aceitarão conversar a respeito
das dificuldades que enfrentam em casa. Serão as alterações em seu desempenho e comportamento
que denunciarão a existência de problemas emocionais. Mas essas alterações podem ser consideradas
mais estressantes em certos momentos da vida da criança, como por exemplo, as mudanças, as
novidades, as exigências adaptativas, uma nova escola ou, simplesmente, a adaptação à adolescência.
7. CONTADORES DE HISTÓRIAS
“O contador é um artista que traz na alma a emoção que contagia a todos com suas
histórias.”
O ato de contar histórias acompanhou o homem em sua evolução através dos tempos.
“Narrar é criar histórias, construir enredos, contar o que ouviu falar. O som e o ritmo das
palavras, a proximidade do corpo, a da voz de quem conta a história, provoca um grande fascínio nas
pessoas; não importam as condições socioculturais de que fazem parte, elas têm prazer em ouvir e
também em contar histórias”, afirma Nelma Azevedo, especialista em Literatura Infato-Juvenil.
O que mais importa no ato de contar histórias é saber despertar emoções. São momentos de
divertimento, de troca de experiências, de ensinamentos morais, de mostrar normas e lições de vida
sempre de forma lúdica e prazerosa.
Os primeiros contadores de histórias no Brasil foram os índios. Para eles era de suma
importância transmitir, não só às crianças, mas aos moços, todos os conhecimentos tribais e tradições
guerreiras. Mas a função de contar histórias não se limitava apenas aos pajés e anciãos da tribo.
Havia também as mães que gostavam de lembrar as lendas, mitos e fábulas da tribo.
Depois vieram as negras velhas e amas de leite que com suas vozes mansas, entonações doces,
faziam os filhos dos colonizadores adormecerem com suas histórias simples, mas cheias de heróis.
E, por último, os europeus que chegaram por meio das avós coloniais que contavam histórias
de madrastas, príncipes, gigantes e outros. Os contos eram narrados nas reuniões familiares e
acompanhavam os viajantes nos caminhos e travessias.
A especialista Nelma Azevedo chama atenção para o fato de que há contadores especiais que
participaram da nossa vida e que nos transportaram à terra do faz de conta, os nossos pais, avós e por
que não nossos professores com suas histórias cheias de amor e tão importantes para o nosso
crescimento social e cognitivo?
É importante que o professor esteja atento ao processo comunicativo que há por trás da
contação de histórias. Pois é através desse processo que surge a cumplicidade entre o narrador e o
ouvinte, capaz de recuperar o oral nas linhas escritas e reconhecer o valor da oralidade no processo
interativo, aproximando assim as pessoas envolvidas (professor e alunos) e tornando seu
relacionamento mais humano.
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Celso Sisto, em seu livro Textos e pretextos sobre a arte de contar histórias, sintetiza em treze
atribuições necessárias para um bom contador de histórias. São elas: emoção, texto, adequação,
Corpo, voz, olhar, naturalidade, clima, ritmo, memória, pausa e silêncios, elemento estético e
credibilidade
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Um desenvolvimento incomum nem sempre é sinal de uma patologia, mas pode refletir
dificuldades pessoais circunstanciais. Quando a criança começa a apresentar dificuldades escolares, é
necessário pesquisar a causa real do problema. Ela precisa de compreensão, orientação e instrução
adequadas para superar dificuldades.
As histórias infantis não nos falam de uma solução feliz que se atingiu sem qualquer esforço.
As mais variadas histórias falam de um certo problema que só se resolve quando o herói ou a heroína
se submetem a provas e a sofrimentos. Isto significa que a criança não ultrapassará a sua crise até
estar pronta para evoluir por meio de um combate e até que seja capaz de reconhecer, de forma
ampla, o seu problema, e tenha assim atingido a maturidade.
O professor interventor e mediador, ao utilizar uma história infantil, deve estar atento às
necessidades das crianças que estão sob sua responsabilidade. Ele precisa permitir que cada um fale
de seus sentimentos de forma espontânea, respeitando sempre a individulidade, o desejo e o direito de
cada um de falar ou não sobre o que sente. A criança precisa se sentir realmente acolhida, aprovada e
enconrajada, para que a intervenção funcione.
REFERÊNCIAS
1. AMARILHA, Marly. Estão mortas as Fadas? Literatura infantil e prática pedagógica. 7ª edição
RJ. Vozes. 1997.
2. ASSUNÇÃO, Elisabete da. COELHO, Maria Teresa. Problemas de aprendizagem. São Paulo,
SP. Ed. Ática. 2002.
4. BETTELHEIM, Bruno. Na terra das fadas. Análise dos personagens femininos. RJ. Paz e
Terra. 1997.
5. COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas. Símbolos - Mitos – Arquétipos. 1ª edição. SP.
Paulinas. 2008.
6. FALCONE, Eliane Mary de Oliveira, GIL Débora Barbosa, FERREIRA Maria Cristina. Um
estudo comparativo da freqüência de verbalização empática entre psicoterapeutas de
diferentes abordagens teóricas.
7. FILLIOZAT, Isabelle. Entendendo o coração das crianças. Compreenda sua linguagem e seus
risos e choros. Como lidar com as emoções dos seus filhos. RJ. Campus, 2000.
8. FONSECA, Vitor. Escola. Quem és tu? Porto Alegre. Artes Médicas. 1993
9. GRIMM, Jakob. Contos de Grimm. Tradução do alemão: Tatiana Belinky. SP. Paulus. 1989.
10. HISADA, Sueli. A utilização de histórias no processo psicoterápico. 2ª edição. SP. Reiventer.
2007.
12. PILETTI, Nelson. Psicologia Educacional. 17ª edição. SP. Ática. 2008.
13. SABINI –CÓRIA, Maria Aparecida. Psicologia do desenvolvimento. 2ª edição SP. Ática. 2007.
14. SISTO, Celso. Textos e Pretextos sobre a arte de contar histórias. 2ª edição. Curitiba.
Positivo. 2005.
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15. TRADUÇÃO: Rehfeldt, H. Klaus. As mais Belas Histórias de Boa - Noite. Ed. EKO.
Blumenau, SC. 1997.
GLOSSÁRIO