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RAFAELA MARCON
Tubarão
2008
RAFAELA MARCON
Tubarão
2008
RAFAELA MARCON
_________________________________________________________
Profª. e orientadora Denise Silva de Amorim Faria, Msc.
Universidade do Sul de Santa Catarina
_________________________________________________________
Prof. Lírio Hoffmann Junior, Esp.
Universidade do Sul de Santa Catarina
_________________________________________________________
Prof. Edir Josias Silveira Beck
Universidade do Sul de Santa Catarina
Dedico este trabalho aos meus pais, Elizabeth
e Alberto (in memorian), e à minha irmã
Daniela, pelo incentivo durante todo o curso,
compreensão, carinho, e esforço prestados em
todos os momentos, sem os quais eu jamais
teria chegado até aqui.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus, por ter me dado vida, saúde e muita força para
enfrentar todos os obstáculos que surgiram durante a minha caminhada
Agradeço toda a minha família, em especial minha mãe Elizabeth Dalponte
Marcon, exemplo de pessoa, a quem muito devo, tendo em vista seu sacrifício e afeto, os
quais eu jamais conseguirei retribuir da mesma forma. Ela que sempre me incentivou a não
desistir diante dos obstáculos que surgiam ao longo desta caminhada.
Meu pai Alberto Felipe Marcon (in memoriam), que mesmo não estando mais
presente, sempre me incentivou a estudar, e com certeza estaria muito orgulhoso neste
momento.
Minha irmã Daniela Marcon, que também muito me ajudou e colaborou para que
eu conseguisse chegar até aqui.
Agradeço de forma especial a professora e orientadora Denise Silva de Amorim
Faria, por ter aceitado o meu convite e me ajudado nesta tarefa. Também pela sua atenção,
dedicação, conhecimento e tempo despendidos para prestar os ensinamentos necessários na
concretização deste trabalho.
À minha tia, Itinha, que bastante colaborou na concretização deste sonho.
Agradeço, também, todos os meus colegas, que durante a caminhada, sempre me
ajudaram nos momentos em que eu encontrava alguma dificuldade. Aqueles que se tornaram
grandes amigos e confidentes, os quais deixarão muitas saudades.
Enfim, a todos que de um modo ou de outro, participaram desta caminhada
contribuindo de forma significante na realização deste sonho.
Obrigada a todos vocês!
“A coragem é a primeira qualidade humana, pois garante todas as outras.”
(Aristóteles)
RESUMO
Este trabalho foi elaborado com o objetivo de verificar se um sujeito que pratica homicídio no
trânsito sob influência de álcool deve ser punido na forma culposa, na espécie de culpa
consciente, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro ou na forma dolosa, na
modalidade de dolo eventual e julgado pelo Tribunal do Júri. Para realização deste trabalho
utilizou-se a pesquisa bibliográfica, com o estudo e análise de legislação, doutrinas e artigos
sobre o tema, bem como pesquisa documental, onde foram analisados acórdãos colhidos do
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina e do Superior Tribunal de Justiça. Com este
estudo observou-se que o problema do álcool e direção é bastante complexo e há muito se
discute esta questão, uma vez que cresce diariamente o número de veículos em circulação.
Também se verificou que existem entendimentos nos dois sentidos, tanto no Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, como no Superior Tribunal de Justiça e que atualmente há uma
tendência em se punir esses motoristas na forma dolosa. Observou-se, também, que não é
necessariamente a maneira de punir o condutor do veículo que vai reduzir esse número que a
cada dia cresce mais. Assim, concluiu-se que a questão dos homicídios praticados por
motorista sob influência de álcool é um problema social. Os Tribunais estão se mostrando
favoráveis em pronunciar o motorista para que o mesmo seja julgado pelo Tribunal do Júri,
como uma maneira de intimidar outros motoristas no intuito de que não desenvolvam esta
conduta, mas por outro lado, também se mostram favoráveis à punição na forma culposa, uma
vez que não é a punição mais severa que intimidaria estes motoristas. Medidas preventivas e
uma educação para o trânsito também poderiam auxiliar na redução desse número de
motoristas que praticam homicídios quando embriagados.
This work was developed with the goal of verifying if a person that practice murder in the
traffic under influence of alcohol should be punished as culpable, in the kind of conscious
guilt, according to the Brazilian Traffic Code, or deceit, in the form of eventual deceit and
judged by the Court of Justice. To develop this work, it was used literature research, with the
study and analysis of the legislation, doctrines and articles about the subject, as well as a
documentary research where were analyzed judgments collected to the Court of Justice of the
Santa Catarina and the High Court of Justice. With this study, it was observed that the
problem related to alcohol and driving is quite complex and the issue has been studied for a
long time, since the number of vehicles on the streets has grown every day. It was also
verified that there are understandings in both ways, as in the Court of Justice of the Santa
Catarina as in the High Court of Justice, and currently, there is a tendency in punishing those
drivers as malicious. It was also observed that it is not the way of punishing the driver that
will reduce that number which grows every day. So, it is concluded that the issue about the
homicides practiced by drunk drivers is a social problem. The Courts have been favorable
when they take the driver to the Court of Jury, as a way to intimidate the other drivers; on the
other hand, Courts have been favorable to the culpable prosecution, since it is not the most
severe punishment to intimidate those drivers. Preventive ways and a good education related
to transit could also reduce the number of drunk drivers who practice homicides.
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 10
2 DIREITO PENAL E PENA.......................................................................................... 12
2.1 CONCEITO DE DIREITO PENAL ............................................................................. 12
2.2 FUNÇÕES DO DIREITO PENAL .............................................................................. 14
2.2.1 Funções legítimas ou declaradas ............................................................................. 16
2.2.2 Funções ilegítimas ou não declaradas..................................................................... 18
2.3 CONCEITO DE PENA ................................................................................................. 20
2.4 FUNÇÕES DA PENA................................................................................................... 22
2.4.1 Teorias absolutas ...................................................................................................... 22
2.4.2 Teorias relativas........................................................................................................ 23
2.4.2.1 Prevenção geral ....................................................................................................... 24
2.4.2.2 Prevenção especial................................................................................................... 26
2.4.3 Teorias mistas ........................................................................................................... 27
3 HOMICÍDIO................................................................................................................... 29
3.1 CONCEITO .................................................................................................................. 29
3.2 OBJETIVIDADE JURÍDICA ...................................................................................... 30
3.3 SUJEITOS ..................................................................................................................... 31
3.3.1 Sujeito ativo............................................................................................................... 31
3.3.2 Sujeito passivo........................................................................................................... 32
3.4 ELEMENTO SUBJETIVO ........................................................................................... 33
3.4.1 Culpa.......................................................................................................................... 34
3.4.1.1 Culpa consciente...................................................................................................... 38
3.4.1.2 Culpa inconsciente................................................................................................... 40
3.4.2 Dolo ............................................................................................................................ 41
3.4.2.1 Dolo direto............................................................................................................... 42
3.4.2.2 Dolo indireto............................................................................................................ 43
3.4.2.2.1 Dolo alternativo.................................................................................................... 44
3.4.2.2.2 Dolo eventual........................................................................................................ 45
4 HOMICÍDIO PRATICADO SOB INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL NA DIREÇÃO DE
VEÍCULO AUTOMOTOR: DOLO EVENTUAL OU CULPA CONSCIENTE..... 48
4.1 O TRÂNSITO BRASILEIRO ...................................................................................... 48
4.2 ASPECTOS DO CRIME DE HOMICÍDIO PREVISTO NO ARTIGO 302 DO
CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO ......................................................................... 50
4.3 A INFLUÊNCIA DO ÁLCOOL E OS CRIMES DE TRÂNSITO - ALTERAÇÕES
DA LEI 11.705 DE 19 DE JUNHO DE 2008 .................................................................. 54
4.4 A CELEUMA ACERCA DA NATUREZA JURÍDICA DOS CRIMES DE
HOMICÍDIOS PRATICADOS NO TRÂNSITO POR MOTORISTA EMBRIAGADO .. 57
4.4.1 Homicídio culposo (culpa consciente) ..................................................................... 57
4.4.2 Homicídio doloso (dolo eventual) ............................................................................ 59
4.5 POSIÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
EM RELAÇÃO AOS CASOS DE HOMICÍDIO PRATICADO NO TRÂNSITO POR
MOTORISTA EMBRIAGADO.......................................................................................... 60
4.6 POSIÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM RELAÇÃO AOS CASOS
DE HOMICÍDIO PRATICADO NO TRÂNSITO POR MOTORISTA EMBRIAGADO.63
4.7 MEDIDAS PREVENTIVAS PARA A REDUÇÃO DOS CASOS DE HOMICÍDIO NO
TRÂNSITO ......................................................................................................................... 66
5 CONCLUSÃO................................................................................................................. 70
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 73
ANEXOS ........................................................................................................................... 78
ANEXO A – Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina que trata
sobre dolo eventual ............................................................................................................ 79
ANEXO B – Acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça que trata sobre
culpa consciente ................................................................................................................. 83
10
1 INTRODUÇÃO
1
GOMES, Luiz Flávio; MOLINA, Antônio García-Pablos de; BIANCHINI, Alice. Direito penal: introdução e
princípios fundamentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, v. 1, p. 25.
2
NORONHA, E. Magalhães. Introdução e parte geral. In: ______ Direito penal. 34. ed. atual. São Paulo:
Saraiva, 1999, v. 1, p. 4.
3
BITENCOURT, Cezar Roberto. Parte geral. In: ______ Tratado de direito penal. 11 ed. atual. São Paulo:
Saraiva, 2007, v. 1, p. 2.
13
4
BITENCOURT, 2007, p. 1-2.
5
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.
2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 86.
6
Ibid., p. 85.
7
GOMES; MOLINA; BIANCHINI, 2007, p. 28.
14
Pode-se definir o Direito penal, do ponto de vista dinâmico e social, como um dos
instrumentos do controle social formal por meio do qual o Estado, mediante um
determinado sistema normativo (leia-se: mediante normas penais), castiga com
sanções de particular gravidade (penas e outras conseqüências afins) as condutas
desviadas (crimes e contravenções) mais nocivas para a convivência, visando a
assegurar, dessa maneira, a necessária disciplina social bem como a convivência
harmônica dos membros do grupo.
Sob o enfoque estático e formal pode-se afirmar que o Direito penal é um conjunto
de normas (normas jurídico-públicas) que definem certas condutas como infração,
associando-lhes penas ou medidas de segurança assim como outras conseqüências
jurídicas (indenização civil, por exemplo). 8 (grifos do autor)
Deste modo, observa-se que o direito penal apresenta diversos conceitos, mas de
um modo geral todos possuem a mesma essência, qual seja, o poder punitivo do Estado em
impor regras e aplicar sanções aos membros de determinada sociedade.
8
GOMES; MOLINA; BIANCHINI, 2007, p. 24.
9
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 77-78.
10
BITENCOURT, 2007, p. 7.
15
Queiroz assinala que “o direito penal não é senão um dos muitos instrumentos de
política social de que se vale o Estado para a realização dos fins que lhe são
constitucionalmente assinalados.” 11
Se uma concepção predominantemente liberal concede ao Direito Penal uma
função protetora de bens e interesses, uma concepção social, em sentido amplo, pode, por sua
vez, adotar uma concepção predominantemente imperialista e, portanto, reguladora de
vontades e atitudes internas, como ocorreu, por exemplo, com o nacional-socialismo alemão.
A primeira concepção destaca a importância do bem jurídico; a segunda apóia-se na infração
do dever, na desobediência, na rebeldia da vontade individual contra a vontade coletiva.
Agora, se um Estado Social pretende ser também um Estado de Direito terá de outorgar
proteção penal à ordem de valores constitucionalmente assegurados, rechaçando os
postulados funcionalistas protetores de um determinado status quo. 12 (grifos do autor)
Corroborando com a idéia de que o direito penal busca proteger os bens jurídicos
dos indivíduos e proporcionar uma convivência harmoniosa entre os mesmos, Queiroz
assevera que:
[...] sob o manto de um Estado a que se defere funções relativas, exclusivamente,
não pode ser fim da pena o retribuir por retribuir, nem o pretender fazer justiça sobre
a terra, mas simplesmente possibilitar, em termos mui relativos e limitados, isto é,
subsidiariamente, e dentro duma política social de largo alcance (intervenção de
caráter etiológico), a convivência social, condicionando o exercício da liberdade,
coibindo o arbítrio e, por conseqüência, a violência mesma. Ao declarar, pois, o
Estado determinados comportamentos como delituosos, pretende-se prevenir, mais
energicamente, sua reiteração, protegendo determinados bens jurídicos; busca-se
controlá-lo, enfim, quando semelhante fim não se possa lograr por outros meios
menos onerosos à liberdade, e para cuja finalidade possa o direito penal concorrer
utilmente.13 (grifos do autor)
Cumpre destacar, ainda, que o direito penal possui funções e missões, sendo umas
distintas das outras, conforme extrai-se da lição de Gomes, Molina e Bianchini, que abaixo
elencam quais seriam as missões do direito penal:
As missões do Direito Penal, isto é, suas finalidades, suas metas, são as
conseqüências queridas e buscadas oficialmente pelo sistema (proteção de bens
jurídicos, diminuição da violência estatal, diminuição da violência individual etc.).
Funções são as conseqüências (efetivas) não desejadas (oficialmente,
ostensivamente), mas reais do sistema. [...]14
Destarte, percebe-se que a função primordial do direito penal é a proteção dos
bens jurídicos essenciais para se viver da forma mais harmoniosa possível na sociedade, e este
11
QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do direito penal: legitimação versus deslegitimação do sistema penal.
Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 122.
12
COBO DEL ROSAL, Manuel; ANTON VIVES, R.S. apud BITENCOURT, 2007, p. 7.
13
QUEIROZ, op. cit., p. 127.
14
GOMES; MOLINA; BIANCHINI, 2007, p. 222.
16
direito entra em cena quando os outros ramos do direito não se mostram razoáveis na solução
dos conflitos sociais.
Além desta função precípua, Gomes faz uma distinção bipartida das funções reais
do direito penal em funções legítimas ou declaradas e ilegítimas ou não declaradas15, objeto
de estudo dos próximos tópicos.
15
GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. O direito penal na era da globalização. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, p. 92 - 98.
16
Ibid., p. 92.
17
BITENCOURT, 2007, p. 7-8.
17
18
GOMES; BIANCHINI, 2002, p. 93.
19
Ibid., p. 94.
20
Ibid., p. 95.
21
ROXIN, Claus. Problemas fundamentais de direito penal. Tradução Ana Paula dos Santos Luís
Natscheradetz. 3. ed. Lisboa: Vega, 1998, p. 76.
22
GOMES; BIANCHINI, op. cit., p. 97.
18
os indivíduos, como a violência arbitrária do Estado, buscando sempre uma harmonia entre os
seres humanos.
23
O artigo 216-A do Código Penal assim dispõe: Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter
vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou
ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos.
Cf. BRASIL. Decreto-lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848compilado.htm >. Acesso em: 20 out. 2008.
24
GOMES; BIANCHINI, 2002, p. 100-101.
25
Ibid., p. 100.
26
Ibid., p. 102.
19
27
GOMES; BIANCHINI, 2002, p. 102-103.
28
QUEIROZ, 2001, p. 54.
29
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 108.
30
A lei 9.426/96 aumentou a pena de alguns crimes, tais como furto de veículos, receptação e receptação
qualificada, dentre outros crimes, Cf. BRASIL. Lei nº 9.426, de 24 de dezembro de 1996. Altera dispositivos
do Decreto-lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal - Parte Especial. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9426.htm. Acesso em: 25 out. 2008.
31
QUEIROZ, op. cit., p. 55.
20
32
GOMES; BIANCHINI, 2002, p. 103-104.
33
QUEIROZ, 2001, p. 56.
34
ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusão de segurança jurídica: do controle da violência à violência do
controle penal. Porto Alegre: Livr. do Advogado, 1997, p. 293.
21
35
FERREIRA, Gilberto. Aplicação da pena. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 3.
36
GRECO, Rogério. Parte Geral. In ______ Curso de direito penal. 5. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro:
Impetus, 2005, v. 1, p. 543-544.
37
Ibid., p. 544.
38
FERREIRA, op. cit., p. 5.
39
GRECO, op. cit., p. 542.
22
infração penal. Nesse sentido Bitencourt acrescenta que “é quase unânime, no mundo da
ciência do Direito Penal, a afirmação de que a pena justifica-se por sua necessidade.” 40
Para Zaffaroni e Pierangeli “a pena não pode perseguir outro objetivo que não seja
o que persegue a lei penal e o direito penal em geral: a segurança jurídica. A pena deve aspirar
a prover segurança jurídica, pois seu objetivo deve ser a prevenção de futuras condutas
delitivas.” 41
Assim, percebe-se que a pena é a conseqüência imposta ao indivíduo, após um
devido processo penal, quando este praticar uma infração penal e violar as normas jurídicas.
Três são as teorias mais importantes que explicam quais são as funções da pena.
São elas: teorias absolutas, que vêem na pena a retribuição por um mal cometido; teorias
relativas, que atribuem à pena um caráter preventivo, seja em caráter geral ou especial e as
teorias mistas, que unem a idéia de retribuição e prevenção.
As teorias absolutas são aquelas que entendem que a pena tem caráter retributivo.
Os defensores das teorias absolutas são Imannuel, Kant e Hegel e, segundo esses pensadores,
o mais importante é esclarecer qual a essência de punir ou qual a natureza. Para eles, só é
legítima a pena que seja justa, ainda que esta pena não seja útil. Tanto em Kant como em
Hegel, a justificação da pena é uma justificação idealista, quer dizer, que o direito que aí se
trata não corresponde com o direito como ele é, histórica e praticamente, mas como deve ou
deveria ser, idealmente falando. 42.
A pena é vista, sob o enfoque das teorias absolutistas, como uma forma de
retribuir um mal cometido. Pune-se o cometimento de um mal com a imposição de outro.
Neste sentido Queiroz dispõe que:
40
BITENCOURT, 2007, p. 80.
41
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 103-104.
42
QUEIROZ, 2001, p. 18-19.
23
43
QUEIROZ, 2001, p. 18.
44
BITENCOURT, 2007, p. 83.
45
QUEIROZ, op. cit., p. 20.
46
ROXIN, 1998, p. 16.
24
A prevenção geral busca prevenir que novos delitos sejam cometidos. Neste
sentido Feuerbach apud Bitencourt defende que:
47
QUEIROZ, 2001, p. 35-36.
48
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 120.
49
FERREIRA, 1995, p. 26
50
Ibid., 26-27
51
SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JÚNIOR, Alceu. Teoria da pena: finalidades, direito positivo,
jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 131.
25
52
BITENCOURT, 2007, p. 89-90.
53
Ibid., p. 90.
54
QUEIROZ, 2001, p. 36.
55
SHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002, p. 132.
56
GRECO, 2005, p. 548.
57
SHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, loc. cit.
26
58
QUEIROZ, 2001, p. 40.
59
SHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002, p. 132.
60
QUEIROZ, op. cit., p. 56.
61
ROXIN, 1998, p. 20.
62
SHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, op. cit., p. 133-134.
27
63
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 108.
64
QUEIROZ, 2001, p. 57.
65
BITENCOURT, 2007, p. 94.
66
BRASIL, 1940, loc. cit.
28
Nas palavras de Ferreira as teorias mistas atuam “como meio termo entre as
teorias absolutas e relativas, que, conciliando, atribuem duplo fundamento à pena. Para elas,
portanto, a pena tem duas razões: a retribuição, manifestada através do castigo; e a prevenção,
como instrumento de defesa da sociedade.” 67
Estas teorias não visam especificamente retribuir ou prevenir, mas sim retribuir e
prevenir ao mesmo tempo. Corroborando com esta teoria Jescheck apud Queiroz justifica que:
As teorias unitárias intentam, assim, [...] mediar entre as teorias absolutas e
relativas, não, naturalmente, somando sem mais suas contraditórias idéias básicas,
mas mediante a reflexão prática de que a pena, na realidade de sua aplicação, pode
desenvolver a totalidade de suas funções frente à pessoa afetada e seu mundo
circundante, de maneira que o que importa é conseguir uma relação equilibrada
entre todos os fins da pena (método dialético), servindo assim de ponte entre umas e
outras.68
As teorias mistas ou unificadoras tentam agrupar em um conceito único os fins da
pena. Tais teorias partem da crítica às soluções monistas, ou seja, às teses sustentadas pelas
teorias absolutas ou relativas da pena. Aceitam a retribuição e o princípio da culpabilidade
como critérios limitadores da intervenção da pena como sanção jurídico-penal. Assim, a pena
não pode, pois, ir além da responsabilidade decorrente do fato praticado.69
Porém, quer seja para fins de retribuição ou de prevenção “em realidade, a pena,
hoje, só se justifica, se tiver por objetivo evitar o cometimento de novos crimes.
ressocializando o criminoso. O punir por punir em obediência cega a um dogmatismo ético
não tem mais sentido.” 70
Portanto, observa-se que as teorias mistas, como o próprio nome pressupõe, unem
a idéia de retribuição, defendida pelas teorias absolutas e a idéia de prevenção, fundamento
das teorias relativas, idéia esta adotada pelo Código Penal brasileiro.
67
FERREIRA, 1995, p. 29.
68
QUEIROZ, 2001, p. 66.
69
BITENCOURT, 2007, p. 95-96.
70
FERREIRA, op. cit., p. 30.
29
3 HOMICÍDIO
3.1 CONCEITO
1
BRASIL. Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em 14 out. 2008.
2
JESUS, Damásio E. de. Parte especial: dos crimes contra a pessoa, dos crimes contra o patrimônio. In: ______
Direito penal. 28. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2, p. 17.
3
PRADO, Luiz Regis. Parte especial, arts. 121 a 183. In: ______ Curso de direito penal brasileiro. 2. ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, v. 2, p. 43.
30
4
HUNGRIA, Nélson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal: Decreto-Lei n. 2.848, de 7
de dezembro de 1940. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, v. 5, p. 25.
5
CAPEZ, Fernando. Parte especial. In: ______ Curso de direito penal. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2003, v.2, p. 3
6
NORONHA, E. Magalhães. Dos crimes contra a pessoa, dos crimes contra o patrimônio. In: ______ Direito
penal. 34. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1999, v. 2, p. 16.
7
FUKASSAWA, Fernando Y. Crimes de trânsito: de acordo com a Lei nº 9.503, de 23-9-1997, Código de
Trânsito Brasileiro. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p. 116.
31
Toda vez que ocorre um crime de homicídio, uma pessoa perde a vida. Portanto,
necessariamente o objeto jurídico neste caso é a vida de um ser humano, bem jurídico este
tutelado pela Constituição da República Federativa do Brasil como um dos mais importantes.
Neste sentido, Prado esclarece:
O bem jurídico tutelado é a vida humana independente. A proteção de tão relevante
bem jurídico é imperativo de ordem constitucional. Com efeito, o bem jurídico vida
humana é assegurado pela Constituição Federal, que expressamente estabelece:
“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à segurança e à propriedade” (art. 5°, caput, CF).8 (grifos do autor)
Prado também afirma que “a garantia da vida humana não admite restrição ou
distinção de qualquer espécie. Ou seja, protege-se a vida humana de quem quer que seja,
independentemente da raça, sexo, idade ou condição social. [...] configura o delito de
homicídio a morte dada a qualquer pessoa [...].” 9
Logo, o bem jurídico tutelado no delito de homicídio é a vida humana, sendo
irrelevante para tanto, o meio empregado para se obter o resultado e as condições em que o
crime ocorreu, que podem constituir circunstâncias qualificadoras.
3.3 SUJEITOS
O sujeito ativo de um crime é aquele que pratica a conduta descrita na lei, ou seja,
o fato típico. Apenas o homem, quer seja sozinho ou associado a outros (co-autoria ou
8
PRADO, 2002, p. 43-44.
9
Ibid., p. 44.
32
10
MIRABETE, Júlio Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Parte Geral, arts. 1º a 120 do CP, conforme Lei n. 7.209,
de 11-07-84. In: ______ Manual de direito penal. 24. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2007, v. 1, p. 110.
11
CAPEZ, 2003, p. 10.
12
NORONHA, E. Magalhães. Introdução e parte geral. In: ______ Direito penal. 34. ed. atual. São Paulo:
Saraiva, 1999, v. 1, p. 113.
13
PRADO, 2002, p. 45.
14
JESUS, 2007, p. 20.
33
pessoa), o Estado (ex: crimes contra a Administração Pública); [...] e, inclusive, pode ser a
pessoa jurídica (ex: crimes contra o patrimônio).” 15 (grifos do autor)
Mirabete e Fabbrini complementam justificando que o “sujeito passivo do crime é
o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado pela conduta criminosa. Nada impede que, dois
ou mais sujeitos passivos existam: desde que tenham sido lesados ou ameaçados em seus bens
jurídicos referidos no tipo, são vítimas do crime.” 16
No caso do delito de homicídio Hungria e Fragoso preconizam que “o sujeito
passivo do homicídio é o “ser vivo, nascido da mulher”. A destruição do embrião ou feto
humano no útero materno não é homicídio, contemplando-a a lei penal sob o nomem juris de
abôrto [sic], menos severamente punido.” 17 (grifos do autor)
O sujeito passivo, assim como o sujeito ativo, pode ser qualquer pessoa que tenha
nascido com vida. Não há exigência de nenhum requisito especial para legitimação do sujeito
passivo, conforme se extrai da lição de Prado:
Basta, para a caracterização do delito em tela que o sujeito passivo esteja vivo. Não
importa seu grau de vitalidade ou a existência ou não de capacidade de
sobrevivência. A presença de condições orgânicas precárias que impeçam a
continuidade da vida não afasta a configuração do delito.18
Complementando o entendimento de que não importa o grau de vitalidade do
indivíduo, e que qualquer ser humano pode ser sujeito passivo no homicídio, Capez
preleciona:
[...] não é importante perquirir o grau de vitalidade da vítima, ou seja, se ela tem
poucos minutos de vida, ou então, se apresenta um quadro clínico vegetativo por
não mais haver solução médica para o seu caso. Enquanto houver vida, ainda que
sem qualidade, o homem será sujeito passivo do delito de homicídio. 19
Logo, o sujeito passivo no delito de homicídio pode ser qualquer pessoa que esteja
vivo, não interessando quais as condições físicas ou o grau de vitalidade no momento em que
o crime se consuma.
15
BITENCOURT, Cezar Roberto. Parte geral. In: ______ Tratado de direito penal. 11 ed. atual. São Paulo:
Saraiva, 2007, v. 1, p. 231.
16
MIRABETE; FABBRINI, 2007, p. 114.
17
HUNGRIA; FRAGOSO, 1981, p. 36.
18
PRADO, 2002, p. 46.
19
CAPEZ, 2003, p. 11.
34
que nas palavras de Wessels apud Bitencourt “são dados ou circunstâncias que pertencem ao
20
campo psíquico-espiritual e ao mundo de representação do autor.” No caso do delito de
homicídio não é diferente, pois sempre haverá um elemento subjetivo quando este ocorrer.
No caso de homicídio, os elementos subjetivos necessários para a caracterização
do delito são a culpa ou o dolo. Sem a existência de um deles não há crime.
Este tópico abordará os elementos subjetivos culpa, na forma consciente e
inconsciente e o dolo, direto ou indireto, este subdividido em eventual e alternativo, conforme
a seguir se demonstrará.
3.4.1 Culpa
O direito penal se interessa apenas pela conduta humana quando esta agir culposa
ou dolosamente. A ausência de culpa ou dolo pressupõe ausência de fato típico e,
conseqüentemente, inexistência de infração penal.
No caso do delito de homicídio a regra é que este seja doloso, entretanto, o artigo
18, parágrafo único do Código Penal dispõe que “salvo os casos expressos em lei, ninguém
pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.” 21
Destarte, a possibilidade do delito de homicídio ser culposo, está expressa nos
artigos 121, § 3° do Código Penal que dispõe: “Art. 121 – Matar alguém: Pena - reclusão, de
seis a vinte anos. [...] § 3°: Se o homicídio é culposo: Pena - detenção, de um a três anos” 22 e
no artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro, in verbis: “Art. 302. Praticar homicídio
culposo na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão
ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.” 23, ou
seja, estes são casos que a lei autoriza a punição do sujeito ativo na modalidade culposa.
No momento, interessa apenas discorrer sobre a culpa e suas espécies, culpa
consciente e inconsciente, sendo que o elemento subjetivo dolo será apresentado no tópico
subseqüente.
Primeiramente, vale ressaltar os ensinamentos de Noronha quando dispõe acerca
da diferenciação da culpa em lato sensu e stricto sensu. Segundo o autor “o vocábulo culpa,
20
BITENCOURT, 2007, p. 263.
21
BRASIL, 1940, loc. cit.
22
Ibid.
23
Id. Lei n° 9.503 de 23 de setembro de 1997. Código de Trânsito Brasileiro. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9503.htm> Acesso em: 26 out. 2008
35
24
NORONHA, 1999, p. 140.
25
BITENCOURT, 2007, p. 278.
26
HUNGRIA; FRAGOSO, 1981, p. 47.
27
CAPEZ, 2003, p. 62-63.
28
MIRABETE; FABBRINI, 2007, p. 136.
29
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.
2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 506.
36
meios não corresponder àquela que deveria em realidade ser imprimida para evitar as lesões
aos bens jurídicos.” 30
Deste modo, entende-se que para a configuração do delito na modalidade culposa,
alguns elementos são necessários. Greco assim destaca:
[...] para a caracterização do delito culposo é necessário a conjugação de vários
elementos, a saber:
a) conduta humana voluntária, comissiva ou omissiva;
b) inobservância de um dever objetivo de cuidado (negligência, imprudência ou
imperícia);
c) o resultado lesivo não querido, tampouco assumido pelo agente;
d) nexo de causalidade entre a conduta do agente que deixa de observar o seu dever
de cuidado e o resultado lesivo dele advindo;
e) previsibilidade;
f) tipicidade. 31
Com relação à conduta humana voluntária comissiva ou omissiva, basta que o
agente pratique uma ação (comissão) ou deixe de praticar (omissão), e dessa ação resulte
ofensa a um bem jurídico.
No tocante ao dever objetivo de cuidado, Bitencourt assevera que tal elemento
consiste “em reconhecer o perigo para o bem jurídico tutelado e preocupar-se com as
possíveis conseqüências que uma conduta descuidada pode produzir-lhe, deixando de praticá-
la, ou, então, executá-la, somente depois de adotar as necessárias [...] precauções para evitá-
lo.” 32
O resultado final deve ser diverso daquele pretendido pelo agente e,
principalmente deve ser conseqüência da inobservância do cuidado devido. Em outras
palavras, é indispensável que a inobservância do cuidado devido seja a causa do resultado
tipificado como crime culposo.33
Também fazendo parte da definição da culpa, encontramos a previsibilidade, que
segundo Noronha consiste:
Na possibilidade de se prever um fato. Diz-se haver previsibilidade quando o
indivíduo, nas circunstâncias em que se encontrava, podia ter-se representado como
possível a conseqüência de sua ação. Distingue-se da previsão, porque esta a
contém. O previsto é sempre previsível. A previsão é o desenvolvimento natural da
previsibilidade. 34
30
GRECO, Rogério. Parte Geral. In: ______ Curso de direito penal. 5. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro:
Impetus, 2005, v. 1, p. 198.
31
Ibid., p. 197.
32
BITENCOURT, 2007, p. 281.
33
Ibid., p. 282-283.
34
NORONHA, 1999, 141.
37
O elemento subjetivo culpa, está previsto no artigo 18, inciso II, do Código Penal,
in verbis: “Art. 18 - Diz-se o crime: [...] II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado
por imprudência, negligência ou imperícia.” 35
Conforme se extrai da leitura do artigo 18 do Código Penal brasileiro, existem três
modalidades de culpa: imprudência, negligência e imperícia.
A primeira delas, a imprudência é apresentada por Bruno apud Greco como a
modalidade de culpa que “consiste na prática de um ato perigoso sem os cuidados que o caso
36
requer.” Logo, o agente age de forma perigosa, abrindo mão do zelo que deveria ter em
determinada situação.
A imprudência é caracterizada pela prática de uma conduta de maneira arriscada,
perigosa e tem caráter comissivo. É uma imprevisão ativa, que se caracteriza pela
precipitação, insensatez ou imoderação do agente.37
Outra modalidade de culpa, também insculpida no artigo 18 do Código Penal, é a
negligência. A respeito desta modalidade, Noronha preconiza que:
[...] é inação, inércia e passividade. Decorre de inatividade material (corpórea) ou
subjetiva (psíquica). Reduz-se a um comportamento negativo. Negligente é quem,
podendo e devendo agir de determinado modo, por indolência ou preguiça mental,
não age ou se comporta de modo diverso.38
Corroborando com o entendimento de que a negligência consiste em indiferença
quando da prática de certa conduta, Bitencourt assevera que “negligência é a displicência no
agir, falta de precaução, a indiferença do agente, que, podendo adotar as cautelas necessárias,
não o faz. É a imprevisão passiva, o desleixo, a inação (culpa in ommitendo). É não fazer o
que deveria ter feito. 39
Por último, como terceira modalidade da culpa, denota-se a imperícia,
caracterizada pela “falta de capacidade, despreparo ou insuficiência de conhecimentos
técnicos para o exercício de arte, profissão ou ofício.” 40
Também contemplando a idéia, Greco dispõe que “fala-se em imperícia quando
ocorre uma inaptidão, momentânea ou não, do agente para o exercício de arte, profissão ou
ofício. Diz-se que a imperícia está ligada, basicamente, à atividade profissional do agente.” 41
(grifo do autor)
35
BRASIL. 1940, loc. cit.
36
GRECO, 2007, p. 205.
37
BITENCOURT, 2007, p. 285.
38
NORONHA, 1999, p. 144.
39
BITENCOURT, loc. cit.
40
Ibid., p. 286.
41
GRECO, loc. cit.
38
42
BITENCOURT, 2007, p. 287.
43
NORONHA, 1999, p. 143.
44
HUNGRIA; FRAGOSO, 1981, p. 47.
39
45
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 517.
46
BITENCOURT, 2007, p. 288.
47
JESUS, 2007, p. 81.
48
Ibid., p. 82.
49
GRECO, 2007, p. 207.
50
SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JÚNIOR, Alceu. Teoria da pena: finalidades, direito positivo,
jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 397-398.
40
51
NORONHA, 1999, p. 143.
52
MIRABETE; FABBRINI, 2007, p. 141.
53
BITENCOURT, 2007, p. 287.
54
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 517.
41
3.4.2 Dolo
Após discorrer sobre a culpa e suas espécies, este tópico tratará do dolo, que
também é um dos elementos subjetivos do crime de homicídio. Como já mencionado, a
conduta que interessa para o direito penal é a culposa ou dolosa. Sem a presença de um destes
elementos não há infração penal.
O dolo está previsto no artigo 18, inciso I, do Código Penal que reza: “Art. 18 -
Diz-se o crime: I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.
[...]” 56
O dolo pode ser conceituado como a vontade de concretizar os elementos
objetivos do tipo, ou seja, é a consciência e a vontade da realização de uma conduta descrita
como tipo.57
A consciência do que está sendo feito e a vontade na obtenção do resultado,
também são preconizadas por Wezel apud Greco:
Toda ação consciente é conduzida pela decisão da ação, quer dizer, pela consciência
do que se quer – momento intelectual – e pela decisão a respeito de querer realizá-lo
– momento volitivo. Ambos os momentos, conjuntamente, como fatores
configuradores de uma ação típica real, formam o dolo (= dolo do tipo). 58
O dolo é o elemento nuclear e primordial do tipo subjetivo, e muitas vezes é o
único componente do tipo. Pode ser definido como querer o resultado típico, a vontade
realizadora do tipo objetivo. No caso do homicídio, é querer matar um homem, que pressupõe
que saiba que a conduta do objeto é um homem. Logo, é a vontade realizadora do tipo
objetivo, guiada pelo conhecimento dos elementos deste no caso concreto. 59
Essa vontade na realização do tipo objetivo que caracteriza o dolo é também
observada por Noronha:
55
JESUS, 2007, p. 81.
56
BRASIL, 1940, loc. cit.
57
BITENCOURT, 2007, p. 266.
58
GRECO, 2007, p. 183.
59
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 481.
42
[...] para agir com dolo, não basta que o evento tenha sido previsto pelo indivíduo, é
mister seja querido. Esse resultado é a meta, o fim que o sujeito ativo busca com sua
atividade consciente e dirigida. Costuma dizer-se, por isso, abreviando o conceito,
que o dolo é a vontade de executar um fato que a lei tem como crime. 60
Existem algumas teorias que explicam a definição do dolo. Neste momento,
apresentam-se três teorias: teoria da vontade, teoria da representação e teoria do
consentimento.
A teoria da vontade é defendida por Carrara apud Bitencourt o qual justifica que o
dolo “consiste na intenção mais ou menos perfeita de fazer um ato que se conhece contrário à
lei” 61, em outras palavras, o dolo seria a vontade dirigida à obtenção do resultado.
A teoria da representação, defendida por Liszt e Frank, entende que para
existência do dolo, basta a representação subjetiva ou a previsão do resultado como certo ou
provável. Esta teoria acabou caindo em descrença e seus defensores aderiram à teoria da
vontade. 62
E por último, a teoria do consentimento, que une a idéia de representação e
vontade. Tavares apud Greco afirma que:
A teoria do consentimento ou da assunção é a teoria dominante e tem por base uma
vinculação emocional do agente para com o resultado. Vale dizer, exige não apenas
o conhecimento ou a previsão de que a conduta e o resultado típicos podem realizar-
se, como também que o agente se ponha de acordo com isso ou na forma de
conformar-se ou de aceitar ou de assumir o risco de sua produção. 63
A teoria da vontade foi adotada pelo Código Penal quando dispõe na primeira
parte do artigo 18, inciso I, que “o agente quis o resultado” e a teoria do consentimento na
parte final, quando preconiza “[...] ou assumiu o risco de produzir o resultado”. 64
Assim, percebe-se que o dolo é a consciência e a vontade de realizar certa conduta
que acaba produzindo o resultado morte. O dolo, assim como a culpa, apresenta duas
espécies, o dolo direto e o dolo indireto, conforme se discorrerá na seqüência.
O dolo direto é uma das espécies de dolo, encontrado tanto na doutrina como no
Código Penal, conforme se extrai da leitura do artigo 18, inciso I, anteriormente citado.
60
NORONHA, 1999, p. 136.
61
BITENCOURT, 2007, p. 267.
62
Ibid., p. 268.
63
GRECO, 2007, p. 186.
64
BITENCOURT, op. cit., p. 268.
43
O dolo direto é definido por Zaffaroni e Pieangeli como “aquele em que o autor
quer diretamente a produção do resultado típico, seja como o fim diretamente proposto ou
como um dos meios para obter este fim” 65
Corroborando este conceito Hungria e Fragoso preconizam que o dolo direto
ocorre “quando o agente prevê como certo o resultado, para cujo evento precisamente
empreende o ato de vontade.” 66
O dolo direto pode ser entendido como aquele que corresponde com a vontade do
sujeito ativo quando da ocorrência do evento lesivo.
Extrai-se da lição de Greco que o dolo direto é aquele querido pelo agente:
Diz-se direto o dolo quando o agente quer, efetivamente, cometer a conduta descrita
no tipo, conforme preceitua a primeira parte do art. 18, I, do Código Penal. O
agente, nesta espécie de dolo, pratica sua conduta dirigindo-se finalisticamente à
produção do resultado por ele pretendido inicialmente. 67
Nesta espécie de dolo, o agente quer produzir diretamente o resultado lesivo. Sua
conduta é dirigida à realização de um fato típico, descrito como infração penal.
Seguindo este raciocínio, Bitencourt informa que o dolo direto compõe-se de três
aspectos, a saber: “1) a representação do resultado, dos meios necessários e das
conseqüências secundárias; 2) o querer o resultado, bem como os meios escolhidos para a sua
consecução; 3) o anuir na realização das conseqüências previstas como certas, necessárias ou
possíveis [...]” 68 (grifos do autor)
No caso do delito de homicídio, o sujeito ativo age com dolo direto quando sua
conduta é destinada a matar o sujeito passivo. Suas atitudes dirigem-se exclusivamente na
morte de um indivíduo. Ele busca o resultado morte e, para tanto, anui com este resultado.
Neste sentido, o dolo direto é visto como aquele decorrente da vontade do ser
humano em ocasionar um resultado lesivo a outro ser humano. Sua vontade é dirigida para
este fim.
O dolo apresenta como espécies o dolo direto e o dolo indireto, sendo que o direto
foi abordado no tópico anterior, e o dolo indireto será abordado neste tópico.
65
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 497.
66
HUNGRIA; FRAGOSO, 1981, p. 45-46.
67
GRECO, 2007, p. 188.
68
BITENCOURT, 2007, p. 268.
44
69
NORONHA, 1999, p. 138.
70
JESUS, 2007, p. 36.
71
HUNGRIA; FRAGOSO, 1981, p. 46-47.
72
NORONHA, loc. cit.
73
HUNGRIA; FRAGOSO, op. cit., p. 47.
45
O que distingue o dolo alternativo dos demais é o fato de que, como o próprio
nome já diz o agente alterna entre os resultados e tanto faz se, por exemplo, o disparo da arma
de fogo irá ferir ou matar a vítima.
O dolo indireto alternativo mostra-se quando o aspecto volitivo do agente
encontra-se direcionado de maneira alternativa, quer seja em relação ao resultado ou em
relação à pessoa contra a qual o crime é cometido. Se essa alternatividade disser respeito ao
resultado, fala-se em alternatividade objetiva, mas se referir-se à pessoa contra qual o agente
direciona sua conduta, a alternatividade será subjetiva.74
A figura do dolo alternativo também é preconizada por Capez como a espécie de
dolo em que “o agente não se importa em produzir este ou aquele resultado (quer ferir ou
matar)” 75, ou seja, o agente busca um resultado lesivo, mas necessariamente não se importa
qual será este resultado.
Enfim, pode-se afirmar que o dolo alternativo é aquele em que o sujeito ativo não
deseja um resultado específico. Ele age consciente de sua conduta lesiva e aceita a
possibilidade de ocorrência de qualquer resultado, seja apenas ferir ou matar.
74
ROCHA, Fernando Galvão da. apud GRECO, 2007, p. 188.
75
CAPEZ, 2003, p. 13.
76
BRASIL, 1940, loc. cit.
77
BRUNO, Aníbal. Parte geral. In: ______ Direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984, v. 2, p. 73-74.
46
78
BITENCOURT, 2007, p. 268.
79
GRECO, 2007, p. 190.
80
ZAFFARONI; PIERANGELI, 1999, p. 498.
81
SHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002, p. 395-396.
82
BITENCOURT, op. cit., p. 288.
47
evento), mas sim à conduta, prevendo que esta pode produzir aquele. Prevê que é
possível causar o resultado e, não obstante, pratica o comportamento. Entre desistir
da conduta e causar o resultado, prefere que este se produza.
A figura do dolo eventual pode ser compreendida através das fórmulas de Frank,
ilustradas por Hungria e Fragoso que preconizam:
A primeira delas assim decide: a previsão do resultado como possível somente
constitui dolo, se a previsão do mesmo resultado como certo não teria detido o
agente, isto é, não teria tido o efeito de um decisivo “motivo de contraste”. É esta a
fórmula denominada da “teoria hipotética do consentimento”, a que o próprio Frank
acrescentou esta outra (chamada “teoria positiva do consentimento”): se o agente se
diz a si próprio: seja como for, dê no que der, em qualquer caso não deixo de agir, é
responsável a título de dolo. 83 (grifos no autor)
Jescheck apud Shecaira e Júnior argumenta que “o dolo eventual se integra assim
pela vontade de realização concernente à ação típica [...], pela consideração séria do risco de
produção do resultado [...], e, em terceiro lugar, pelo conformar-se com a produção do
resultado típico como fator da culpabilidade.” 84
No dolo eventual não é vaga a vontade do agente, pois esta é dirigida a um certo
resultado. O sujeito não recua diante da prevista possibilidade de um resultado diverso,
consentindo no seu advento. 85
Deste modo, conclui-se que o dolo eventual é aquele em o sujeito ativo prevê o
resultado, mas não o deseja diretamente. Porém, prossegue na sua conduta criminosa
assumindo o risco de causar um evento lesivo, qual seja a morte de um ser humano, que lhe é
indiferente.
83
HUNGRIA; FRAGOSO, 1981, p. 51.
84
SHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002, p. 396.
85
HUNGRIA; FRAGOSO, op. cit., p. 47.
48
Este tópico ocupa-se em fazer breves anotações acerca do trânsito brasileiro, que
dia-a-dia fica mais intenso e com maiores problemas, uma vez que o número de automóveis
fabricados cresce diariamente, assim como são facilitadas as condições para a sua aquisição.
Inicialmente cumpre transcrever o conceito de trânsito, consoante se extrai do
artigo 1°, § 1º do Código de Trânsito Brasileiro:
Art. 1º O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional,
abertas à circulação, rege-se por este Código.
§ 1º Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e animais,
isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada,
49
1
BRASIL. Lei n° 9.503 de 23 de setembro de 1997. Código de Trânsito Brasileiro. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9503.htm> Acesso em: 02 nov. 2008
2
TAWIL, Marc. Trânsito assassino: as mortes aumentam: ninguém liga. São Paulo: Terceiro Nome, 2007, p.
09-10.
3
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Delitos do automóvel. 5. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 1.
4
ACIDENTES de trânsito no Brasil dão prejuízo anual de R$ 28 bilhões, mostra ANTP. A tarde on line.
Salvador, 18 set. 2007. Disponível em: <http://www.atarde.com.br/brasil/noticia.jsf?id=790375#>. Acesso em:
01 nov. 2008.
5
TAWIL, op. cit., p. 11-12.
50
Diante do grande número de acidentes com vítimas fatais que ocorrem nas
rodovias de todo o país, o legislador editou o Código de Trânsito Brasileiro, e inaugurou o rol
dos crimes em espécie com o homicídio culposo disposto no artigo 302.
6
HOLANDA, Cornélio José. O dolo eventual nos crimes de trânsito. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 326, 29
maio 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5263>. Acesso em: 02 nov. 2008.
7
NOGUEIRA, 1988, p. 7.
8
Ibid., p. 11.
51
9
FUKASSAWA, Fernando Y. Crimes de trânsito: de acordo com a Lei nº 9.503, de 23-9-1997, Código de
Trânsito Brasileiro. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 116-117.
10
Ibid., p. 117.
11
Ibid., p. 121.
12
Ibid., p. 114.
13
BRASIL, 1997, loc. cit.
14
Id. Decreto-lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 02 nov. 2008.
52
15
LEAL, João José. Homicídio culposo de trânsito: a impropriedade de duas normas incriminadoras para uma
mesma conduta típica. DireitoNet, Sorocaba, 13 mar. 2005. Disponível em:
<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/19/44/1944/#perfil_autor>. Acesso em: 03 nov. 2008.
16
FUKASSAWA, 1998. p. 115-116.
17
Ibid., p. 116.
18
NINNO, Jefferson. Crimes de trânsito (L. 9.503/97). In: FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui (Coord.) Leis
penais especiais e sua interpretação jurisprudencial. 7. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002. v. 1, p. 961-962.
53
A nova lei apresenta uma imprecisão na descrição dos tipos penais, por serem
descritas utilizando o próprio nomen juris da conduta. Em verdade, o núcleo do
crime de homicídio não é "praticar homicídio", mas "matar alguém". O ideal seria se
o novo tipo fosse descrito como "causar a morte de alguém, culposamente, na
direção de veículo automotor". [...] 19 (grifos do autor)
Outro aspecto que merece ser observado é com relação à pena prevista para o
delito culposo previsto no Código de Trânsito Brasileiro e a pena prevista para o homicídio
culposo previsto no Código Penal.
A nova lei chegou com rigor dobrando a pena mínima detentiva do homicídio
culposo, uma vez que no homicídio culposo do artigo 121, § 3°, do Código Penal ela é de 1
(um) a 3 (três) anos e no homicídio previsto no artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro
oscila entre 2 (dois) e 4 (quatro) anos, além de prever outras penas como suspensão ou
proibição para se obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor.20
A respeito dessa desproporcionalidade entre as penas previstas para o homicídio
culposo Leal observa que:
[...] o sistema opera com dois pesos e duas medidas para punir um mesmo tipo de
conduta delituosa. Para o Direito Penal vigente, se alguém causa a morte
involuntária de uma pessoa, mediante grave negligência ou imperícia ao manejar
uma arma de fogo; ao montar um cavalo, [...] o crime praticado será necessariamente
o de homicídio culposo simples.
[...] por mais intenso que tenha sido o grau da culpa, seja qual for a circunstância
desfavorável que torne o crime mais grave e reprovável, a pena mínima será de um
ano e a máxima de três anos de detenção.
No entanto, basta uma simples e trivial negligência ao volante de um veículo
automotor, causadora de um homicídio, para que este seja punido com uma pena
mínima de dois anos e máxima de quatro anos de detenção. Há aí, uma diferença
quantitativa significativa que estabelece uma injustificável e desnecessária
assimetria no sistema punitivo. 21 (grifos do autor)
O autor ainda assevera que esta desproporcionalidade entre as penas gera:
[...] uma impropriedade jurídico penal que fere o princípio da razoabilidade, porque
não tem lógica, nem é de bom senso partir da presunção jurídica de que todo o
homicídio culposo de trânsito é necessariamente mais grave do que qualquer outro,
que não tenha sido praticado na direção de um veículo automotor.22
Tanto no homicídio culposo previsto no Código Penal, como no homicídio
culposo previsto no Código de Trânsito Brasileiro, o elemento subjetivo que norteia a ação do
sujeito ativo, é a culpa, seja por imprudência, negligência ou imperícia, o que, a princípio fere
o princípio da proporcionalidade e o princípio da igualdade, tendo em vista que se atribui
desvalores diferentes a condutas idênticas.
19
ANDRADE, Paulo Gustavo Sampaio. Homicídio e lesão corporal: forma culposa qualificada no CTB. Jus
Navigandi, Teresina, ano 4, n. 43, jul. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1736>. Acesso em: 03 nov. 2008.
20
FUKASSAWA, 1998, p. 112-113.
21
LEAL, loc. cit.
22
Ibid.
54
Seguindo este raciocínio, Stoco apud Jobim preleciona que "nada justifica que
para a mesma figura penal a pena-base seja diversa. Tal ofende o princípio constitucional da
isonomia, e o direito subjetivo do réu a um tratamento igualitário." 23
A natureza dos crimes culposos do Código Penal e do Código de Trânsito
Brasileiro é a mesma, tendo em vista que o desvalor da ação praticada gera igual resultado
lesivo. Sabe-se que o agente não quer o resultado, nem assume o risco de produzi-lo.
Entretanto a não observação dos deveres de cuidado, quando da prática da conduta, para
evitar lesão ao bem jurídico vida, acarreta responsabilidade pelo agravo praticado. 24
Entretanto, ainda que a capitulação não esteja correta e a pena prevista esteja
desconforme com o homicídio culposo previsto no Código Penal, o certo é que, quando
ocorrer um homicídio no trânsito, este será regulado pelo Código de Trânsito Brasileiro, ante
o princípio da especificidade.
23
JOBIM, Eduardo Schmidt. A inaplicabilidade do artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro. Jus Navigandi,
Teresina, ano 6, n. 52, nov. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2444>. Acesso
em: 03 nov. 2008.
24
NINNO, 2002, p. 962.
25
LOUREIRO NETO, José da Silva. Embriaguez delituosa. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 6.
55
[...]
Art. 276. Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às
penalidades previstas no art. 165 deste Código. 26
O motorista que for parado em uma fiscalização e, após a realização do teste do
bafômetro, ficar provado que se encontra com concentração alcoólica inferior a 6 (seis)
decigramas de álcool por litro de sangue, não importando qual seja a concentração, será
penalizado com multa e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses, não se levando
em consideração qual seja a real situação do condutor.
No caso desta infração, o legislador não levou em consideração se o condutor
oferece algum perigo para o trânsito, e muito menos estabeleceu um valor de multa
diferenciado de acordo com o grau de concentração alcoólica.
Referida Lei também alterou o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, o qual
trata sobre o crime de embriaguez no volante, e que a partir de então passou a ter a seguinte
redação:
Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de
álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência
de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
26
BRASIL, 1997, loc. cit.
27
Ibid.,
28
GOMES, Luiz Flávio. Reforma do Código de Trânsito (Lei nº 11.705/2008): novo delito de embriaguez ao
volante. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1827, 2 jul. 2008. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11453>. Acesso em: 08 nov. 2008.
56
29
O inciso V do parágrafo único do art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, previa um acréscimo de 1/3 à
metade da pena para o agente que praticasse homicídio na direção de veículo automotor estivesse “sob
influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos.” Cf. BRASIL, 1997, loc. cit.
30
ALFERES, Eduardo Henrique. Novas normas de embriaguez ao volante. Âmbito jurídico, Rio Grande, ano
11, n. 55, 31 jul. 2008. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=
revista_artigos_leitura&artigo _id=3038.>. Acesso em: 08 nov. 2008
57
31
FUKASSAWA, 1998, p. 75
32
SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JÚNIOR, Alceu. Teoria da pena: finalidades, direito positivo,
jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 401-402.
58
A idéia de que estes delitos devem ser punidos a título de culpa, é defendida por
Wunderlich apud Pepeu:
[...] é totalmente equivocada e divorciada dos novos paradigmas do Direito Penal
moderno a tentativa de se levar os crimes de trânsito ao plenário do Júri e, com isso,
aplicar a reprimenda mais gravosa. Não podemos permitir que seja dada demasiada
elasticidade à ficção jurídica dolus eventualis, nem que tripudiem sobre a teoria
geral do delito, para suprir uma legislação inadequada ou para atender os ´ditos´
reclamos sociais. 33 (grifos do autor)
Biasotti apud Pepeu se posiciona afirmando que:
Em verdade, ainda que em números discretos, conhecem-se casos de motoristas que
respondem a processo perante o Júri, por haver causado a morte de pedestres. Tê-la-
iam causado por inobservância desmarcada de regras de trânsito, como: dirigir em
estado de embriaguez, trafegar em velocidade incompatível com a segurança,
desobedecer ao sinal fechado ou à parada obrigatória, disputar corrida por espírito de
emulação etc. [...] a afirmação de que o autor de morte no trânsito, naquelas
circunstâncias, deve ser julgado pelo Júri, porque praticou o delito dolosamente,
contém falsa premissa. Deveras, não foi dolo o que aí pudera ter existido, nem
sequer dolo eventual, senão culpa (ainda consciente). No dolo eventual, de feito, a
doutrina imprimiu sempre esta nota conspícua: não basta a caracterizá-lo tenha o
agente assumido o risco de produzir o resultado lesivo; necessita que nela haja
consentido. Vindo ao nosso ponto: motorista, de quem se afirmasse que obrara com
dolo eventual, cumpria a que, além de ter assumido o risco de causar a morte da
vítima, com isso mesmo houvera concordado, o que repugna ao bom senso e afronta
a lição da experiência vulgar.34
Percebe-se que aqueles que defendem a culpa consciente como elemento objetivo
norteador da conduta do agente que pratica o homicídio sob influência de álcool, assim o
fazem por entender que o fato de unir o álcool a direção não é elemento suficiente para
demonstrar que o condutor não se importou com o resultado.
De acordo com Aguiar “a crescente consideração do dolo eventual nos crimes de
trânsito demonstra simplesmente que o Judiciário, implicitamente, percebe o descompasso
entre a lei e as demandas da sociedade e utiliza um artifício para atender à opinião pública.” 35
O Poder Judiciário acaba utilizando-se do dolo eventual para levar esses
motoristas a julgamento pelo Tribunal do Júri, e também os condena a penas mais severas
para acalmar a sociedade, prevenir a impunidade ou aplicar um tratamento profilático aos
condutores em geral.
Wunderlich complementa:
Diga-se, então, que o dolo eventual nos crimes de trânsito é uma ficção jurídica
utilizada fantasiosamente para compensar uma legislação inadequada e, assim,
atender aos reclamos da mídia. Diga-se, ainda, que serve para acabar com aquilo que
a mídia (odiosa imprensa leiga) e os profetas dos "movimentos", mais das vezes
33
PEPEU, Sérgio Ricardo Freire. O dolo eventual e a culpa consciente em crimes de trânsito. Jus Navigandi,
Teresina, ano 3, n. 35, out. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1731>. Acesso
em: 08 nov. 2008.
34
Ibid.
35
AGUIAR, Alexandre Magno Fernandes Moreira. O dolo eventual nos crimes de trânsito e a navalha de
Occam. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1607, 25 nov. 2007. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10694>. Acesso em: 09 nov. 2008.
59
36
WUNDERLICH, Alexandre. O dolo eventual nos homicídios de trânsito: uma tentativa frustrada. Jus
Navigandi, Teresina, ano 4, n. 43, jul. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1732>. Acesso em: 08 nov. 2008.
37
FUKASSAWA, 1998, p. 95.
38
RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 6. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007, p. 608.
60
39
HOLANDA, loc. cit.
40
FUKASSAWA, 1998, p. 98.
41
RODRIGUES, Décio Luiz Rodrigues. Crimes do código de trânsito. São Paulo: Lemos e Cruz, 2007, p. 24
61
42
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Recurso criminal n. 2005.039710-4. Relator: Des. Amaral e
Silva. Florianópolis, SC, 31 de janeiro de 2006. Disponível em:
< http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pc. jsp?CDP=010007O9K0000 >. Acesso em: 05 nov. 2008.
62
Em outro acidente, o motorista foi denunciado como incurso nas sanções do artigo
121, § 2º, inciso III, parte final, c/c os artigos 13, caput, e 18, inc. I, 2º parte, todos do Código
43
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Recurso criminal n. 2007.063865-9. Relator: Des. Moacyr de
Moraes Lima Filho. Florianópolis, SC, 17 de junho de 2008. Disponível em:
<http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pc. jsp?CDP=01000AYXC0000>. Acesso em: 05 nov. 2008.
44
Id. Tribunal de Justiça. Recurso criminal n. 2008.014724-7. Relator: Des. Sólon d’Eça Neves. Florianópolis,
SC, 10 de julho de 2008. Disponível em:
< http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pc. jsp?CDP=01000BEST0000>. Acesso em: 06 nov. 2008.
63
Penal tendo em vista que no momento do acidente que resultou na morte de duas pessoas, o
mesmo encontrava-se embriagado. Concluída a instrução processual o réu restou pronunciado
nas sanções do artigo 121, § 2º, inciso III (parte final), na forma do artigo 70 (duas vezes), c/c
os artigos 13, caput, e 18, inciso I (segunda parte), todos do Código Penal, em concurso
material (art. 69, CP) com os delitos dos artigos 305 e 306, ambos da Lei 9.503/97.
Inconformado com a decisão interpôs Recurso em Sentido Estrito, o qual foi decidido pela
Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
ACIDENTE DE TRÂNSITO - HOMICÍDIOS DOLOSOS (DUAS VEZES) -
EMBRIAGUEZ AO VOLANTE - DIREÇÃO EM ZIGUEZAGUE - INVASÃO DA
CONTRAMÃO - INDÍCIOS QUE, SOMADOS, APONTAM PARA A
CONFIGURAÇÃO DE DOLO EVENTUAL - DÚVIDA QUE DEVE SER
DIRIMIDA PELO CONSELHO POPULAR.
ACIDENTE DE TRÂNSITO - HOMICÍDIOS QUALIFICADOS PELO PERIGO
COMUM - INOCORRÊNCIA - SUPRESSÃO DA QUALIFICADORA QUE SE
MOSTRA DESTITUÍDA DE FUNDAMENTO JURÍDICO.
CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO (LEI N. 9.503/97) - AFASTAMENTO
DO LOCAL DO DELITO (ART. 305) - CONFIGURAÇÃO, EM TESE -
ANÁLISE QUE DEVE SER FEITA PELOS JURADOS - CONDUÇÃO DE
VEÍCULO SOB EFEITO DE ÁLCOOL (ART. 306) - DELITO DE MERA
CONDUTA QUE É ABSORVIDO PELO DE HOMICÍDIO DOLOSO (CP, ART.
121, CAPUT) - COMINAÇÃO AFASTADA PELA APLICAÇÃO DA
SUBSIDIARIEDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.45
Destarte, percebe-se que muitas vezes o Tribunal entende que homicídio praticado
no trânsito por motorista embriagado deve ser punido de acordo com a legislação especial, ou
seja, o Código de Trânsito Brasileiro, editado com fim de punir exclusivamente os crimes de
trânsito na modalidade culposa.
Porém, em outros casos, pune o condutor do veículo de acordo com o Código
Penal, por entender que há configuração de dolo eventual na conduta do mesmo, e assim, o
motorista que praticou o homicídio, é levado a julgamento pelo Tribunal do Júri.
45
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Recurso criminal n. 2006.002066-0. Relator: Des. Irineu João da
Silva. Florianópolis, SC, 21 de março de 2006. Disponível em:
< http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pc. jsp?CDP=010007ULW0000>. Acesso em: 06 nov. 2008.
64
imediatamente clama pela condenação daquele condutor pela modalidade de dolo eventual,
pois se entende que ele assumiu o risco de produzir o resultado lesivo.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou afirmando que nestes
casos, mesmo diante da embriaguez do condutor, há culpa consciente e não dolo eventual.
Um dos casos trata-se de um réu que fora denunciado perante a 1ª Vara Criminal
de Florianópolis como incurso nos artigos 121, caput, c/c artigo 70, ambos do Código Penal e
artigo 304 do Código de Trânsito Brasileiro, pela prática de homicídio na direção de veículo
em estado de embriaguez. O juízo de 1° grau afastou a possibilidade de dolo eventual
desclassificou as condutas imputadas para os delitos inscritos no artigo 302, parágrafo único,
inciso III, e artigo 306, ambos da Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro).
Irresignado, o órgão do Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito,
pleiteando a reforma da sentença de desclassificação, pleito este que foi acatado em 2° grau,
onde a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça Catarinense reformou a decisão para
pronunciar o réu nas sanções do artigo 121, caput, do Código Penal, determinando seu
julgamento pelo Tribunal do Júri.
O réu por sua vez, apresentou Recurso Especial, dirigido ao Superior Tribunal de
Justiça, que então decidiu pela desclassificação para a modalidade culposa:
PENAL. PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS
DECLARATÓRIOS. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. HOMICÍDIO. ACIDENTE DE
TRÂNSITO. DOLO EVENTUAL. CULPA CONSCIENTE. REVALORAÇÃO DE
PROVAS. POSSIBILIDADE. PRONÚNCIA. APLICAÇÃO DO BROCARDO IN
DUBIO PRO SOCIETATE. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS DO DOLO
EVENTUAL. DÚVIDA NÃO CARACTERIZADA. DESCLASSIFICAÇÃO DA
CONDUTA QUE SE IMPÕE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
Inexistente qualquer ambigüidade, obscuridade, contradição ou omissão no aresto
impugnado, insubsistente a alegada contrariedade ao art. 619 do CPP.
A revaloração do contexto probatório firmado pelo Tribunal a quo, diferente do
reexame de provas vedado pela Súmula 7/STJ, é permitida em sede de recurso
especial.
A pronúncia do réu, em atenção ao brocardo in dubio pro societate, exige a presença
de contexto que possa gerar dúvida a respeito da existência de dolo eventual.
Inexistente qualquer elemento mínimo a apontar para a prática de homicídio, em
acidente de trânsito, na modalidade dolo eventual, impõe-se a desclassificação da
conduta para a forma culposa.46
Noutro caso trata-se de competência originária, em que um desembargador do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul praticou homicídio na direção de veículo
automotor, em estado de embriaguez e velocidade incompatível com o local do acidente.
Denunciado pela prática do crime previsto no artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro,
decidiu a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça:
46
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n. 705416. Relator: Min. Paulo Medina. Brasília,
DF, 23 de maio de 2006. Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/SCON/jurispr.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&livre=embriaguez&&b=ACOR&p=tru
e&t=&l=10&i=21>. Acesso em: 05 nov. 2008.
65
47
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação penal n. 189. Relator: Min. Garcia Vieira, Brasília, DF, 05 de
setembro de 2001. Disponível em:
< http://www.stj.jus.br/SCON/jurispr. jsp?livre=embriaguez&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=62>. Acesso
em: 05 nov. 2008.
66
O direito penal é um instrumento que deve ser utilizado apenas quando os outros
meios de controle social fracassam, e também quando os outros ramos do direito não se
mostram razoáveis na solução do conflito.
Entretanto, muitas vezes não é o que se vê, e o direito penal acaba sendo utilizado
de maneira simbólica ou promocional, cumprindo funções ilegítimas, servindo apenas para
acalmar os ânimos da sociedade frente aos problemas sociais que poderiam ser solucionados
de outro modo, conforme demonstrado no primeiro capítulo.
Tratando-se de crimes de trânsito, a pena não possui função contra motivacional,
onde os motoristas se intimidariam diante de uma pena mais severa que foi imposta àquele
motorista que praticou homicídio no trânsito quando se encontrava embriagado, tendo em
48
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 719477. Relator: Min. Gilson Dipp, Brasília, DF,
04 de agosto de 2005. Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/SCON/jurispr.jsp?livre=tr%E2nsito+dolo+eventual&data=%40DTDE+%3E%3D+2002
0101+e+%40DTDE+%3C%3D+20081107&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=7 >. Acesso em: 06 nov. 2008.
67
vista que as pessoas não ingerem bebidas alcoólicas e saem às ruas destinadas a cometerem
homicídios.
Quando a questão envolve o trânsito brasileiro e o grande número de homicídios,
dentre os quais inúmeros deles têm como fator determinante a embriaguez do condutor do
veículo, é importante salientar algumas medidas preventivas, para evitar que esses infortúnios
aconteçam.
O homem precisa ser educado no bom sentido, ou seja, ser orientado. É preciso
educá-lo para o aprimoramento do espírito e para uma convivência social pacífica,
indispensável e necessária a todo ser humano. O homem não pode viver só e para viver em
comunidade, precisa se enquadrar e respeitar as regras sociais, indispensáveis à convivência
harmônica e construtiva. 49
Nogueira prossegue afirmando que:
O grande problema do nosso trânsito é justamente a falta de educação dos nossos
motoristas, que não estão devidamente preparados para a função. Todo mundo
reclama e proclama que a educação é considerada fator primordial para a disciplina
do trânsito, pretendendo alguns inclui-la como matéria curricular a ser ministrada
nas escolas, principalmente de primeiro grau. 50 (grifos do autor)
A colocação do autor é de todo correta, uma vez que o primeiro passo para educar
os futuros motoristas, seria colocar como disciplina da grade escolar dos alunos do ensino
fundamental, matérias relacionadas à educação no trânsito, o que já vem sendo feito em
algumas escolas, porém poucas. Esta medida deveria ser implantada em toda a rede pública e
particular.
Shimoishi apud Tawil corrobora com a idéia de que a educação no trânsito deve
iniciar desde as séries do ensino fundamental e afirma:
Há saídas para o trânsito do Brasil. A primeira delas é a implementação da educação
para o trânsito desde os primeiros anos do ensino fundamental, de maneira clara e
contínua. A segunda é preparar os instrutores dos órgãos de trânsito, porque serão
eles que formarão os futuros motoristas. Uma fiscalização eficiente também é
fundamental para um trânsito mais humano. E, por fim, um Poder Judiciário que
faça os culpados ou infratores cumprirem as penas cabíveis, sem exceção. 51
A educação já nas séries iniciais é sem dúvida uma das principais medidas
preventivas que devem ser adotadas no combate à redução na violência no trânsito. Mas
existem outras, conforme observa Nogueira:
Fiscalização ou policiamento não deixa de ser uma exigência indispensável à
segurança no trânsito que, infelizmente, também não deixa de ser deficitária, tanto
nas rodovias como nas cidades [...]. O problema da segurança no trânsito terá
melhores soluções, quando houver mais educação e melhor fiscalização. 52
49
NOGUEIRA, 1988, p. 16.
50
Ibid., p. 16.
51
TAWIL, 2007, p. 87.
52
NOGUEIRA, op. cit., p. 19.
68
53
NOGUEIRA, 1988, p. 21.
54
TAWIL, 2007, p. 91.
55
LEAL, João José. Alcoolismo e acidentes de trânsito. Boletim jurídico, Uberaba, ano 3, n. 116, fev. 2005.
Disponível em: < http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=536>. Acesso em: 08 nov. 2008.
56
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bafômetro. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 344, 16 jun. 2004. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5338>. Acesso em: 08 nov. 2008.
69
5 CONCLUSÃO
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navalha de Occam. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1607, 25 nov. 2007. Disponível em:
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Nome, 2007.
ANEXOS
79
ANEXO A – Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina que trata
sobre dolo eventual
RELATÓRIO
VOTO
DECISÃO
ANEXO B – Acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça que trata sobre culpa
consciente
RELATÓRIO
É o relatório.
86
EMENTA
"Ainda, o laudo pericial que refere ter o veículo da vítima invadido a via
preferencial, por onde o acusado transitava, e que o choque seria inevitável mesmo
87
Não prospera o apelo especial nesse primeiro ponto, pois a matéria supostamente
não apreciada pelo Tribunal a quo, - possível culpa da vítima no sinistro - foi analisada tanto
no Recurso em Sentido Estrito quanto nos Embargos Declaratórios.
No que tange ao dissídio jurisprudencial, tenho-o por comprovado na espécie.
O recorrente traz à colação acórdãos paradigmas que, diante de circunstâncias
similares a do aresto impugnado - colisão de veículos automotores com resultado morte, na
presença de embriaguez do condutor e excesso de velocidade - terminaram por reconhecer a
presença de homicídio culposo (fls. 1304/1314, vol. 6).
É o que atesta o precedente do Supremo Tribunal Federal:
"DOLO EVENTUAL E CULPA CONSCIENTE. 1. O DOLO EVENTUAL DO ART.
15, I, IN FINE, DO CÓDIGO PENAL, PRESSUPÕE CONSCIÊNCIA E ANUÊNCIA
DO AGENTE, AINDA QUANDO NÃO QUEIRA O RESULTADO. 2. O DOLO
EVENTUAL CONFINA-SE, MAS NÃO SE CONFUNDE COM A CULPA
CONSCIENTE, NA QUAL, PREVENDO OU DEVENDO PREVER O RESULTADO,
O AGENTE ESPERA LEVIANAMENTE QUE ELE NÃO SE REALIZE. 3. A
EMBRIAGUEZ, SEJA VOLUNTÁRIA OU CULPOSA, POR SI SÓ NÃO
CARACTERIZA O DOLO EVENTUAL" (HC 46.791/RS, Relator o Ministro Aliomar
Baleeiro, RTJ 51/668).
Assim, diante da identidade de matéria discutida neste caso e no acórdão apontado
e, demonstrada a divergência, de pleno cabimento o Recurso, com base no art. 105, inciso III,
alínea "c", da Constituição da República.
No mérito, o Recurso Especial busca a revaloração dos fatos apurados nas
instâncias inferiores, porquanto não estariam a apontar, em momento algum, a existência de
indícios mínimos de que teria o acusado agido com dolo eventual.
88
(...)
(...)
Embora dolo e culpa sejam elementos subjetivos desencadeados pela vontade, são
as circunstâncias concretas e não a expressão volitiva que determinam a
classificação no tipo doloso ou
culposo.(...)
Sendo assim, conclui-se que a decisão desclassificatória era inviável, nesta fase,
pois o acervo probatório não permite afirmar, com absoluta certeza , qual teria
sido o elemento subjetivo que determinou a conduta do réu no evento denunciado,
isto é, se agiu assumindo o resultado de sua conduta (dolo eventual), ou se postou-
se com mera culpa, devendo a matéria, por conseguinte, ser decidida pelo
Conselho de Sentença (...)" (fls. 1.212/1.219, vol. 5). GRIFEI
Por fim, a distinção entre dolo eventual e culpa consciente resume-se à aceitação
ou rejeição da possibilidade de produção do resultado. Persistindo a dúvida entre
um e outra, dever-se-á concluir pela solução menos grave: pela culpa consciente.
(BITENCOURT, Cezar Roberto; Tratado de Direito Penal, Ed. Saraiva, 2006, vol. 1,
p. 360-361) GRIFEI
Aplicando-se ao caso concreto a teoria da vontade ou do consentimento, não
resulta a possibilidade de ter agido o acusado com dolo eventual.
A existência de dolo eventual não se limita à previsão do resultado. Deve ser
somada ao elemento intelectual (conhecimento da possibilidade do resultado lesivo), o
componente volitivo (aceitar a ocorrência do resultado).
Assim, não basta que o agente tenha consciência de que sua conduta poderá gerar
um dano, deverá ele, na posse desse conhecimento, permanecer no intento de agir,
desconsiderando as implicações.
Na culpa consciente, de forma diversa, o agente pode até prever o resultado, mas
não o aceita. Acredita, sinceramente, que o evento lesivo não ocorrerá.
Dentro desse contexto, é inadmissível que GIULIANO GUGLIELMI, ao tomar a
direção de seu veículo, na hipótese de estar embriagado ou sob efeitos de medicamento,
estaria de acordo com o resultado morte de duas pessoas.
Considerar que o acusado tenha, de forma indiferente, admitido a possibilidade de
se envolver em sinistro automobilístico, provocando a morte de outrem, implicaria na absurda
conclusão de que ele teria assumido o risco de causar sua morte.
92
A dúvida deve ser sempre dirimida em favor do réu, e não como está na decisão
atacada, em que se invocou o brocardo 'in dubio pro societate ' para pronunciar o recorrente,
tendo em vista a impossibilidade de se estabelecer o elemento subjetivo do tipo.
De outra parte, o decisum desclassificatório, constitui precedente lógico e
necessário o juízo de certeza declaratório, com ampla análise das questões de fato contidas
nos elementos probatórios, âmbito no qual o magistrado deve exercer com profundidade o seu
racional convencimento motivado.
Se na pronúncia tem-se um juízo de prelibação, de admissibilidade, de suspeita,
de probabilidade, sob pena de usurpação de competência, uma vez que o processo toma curso
distinto, o juízo natural: Tribunal do Júri, para julgamento daquela mesma infração, na
desclassificação, o juízo é definitivo específico, de certeza, tornando-se imprescindível a
cognição profunda dos fatos contidos nas provas coligidas.
Admissível, pois, a análise exaustiva do elemento subjetivo do tipo no âmbito do
decisum de desclassificação, em que se emite um juízo de certeza, e não de suspeita, como na
pronúncia, em que visa salvaguardar a competência constitucional do Júri.
A doutrina corrobora o entendimento:
"(...) a expressão in dubio pro societate não exibe o menor sentido técnico. Em tema
de direito probatório, afirmar-se: 'na dúvida em favor da sociedade' consiste em
absurdo lógico-jurídico. Veja-se: em face de contingente dúvida, sem remédio, no
tocante à prova – ou melhor, imaginada incerteza – decide-se em prol da sociedade.
Dizendo de outro modo: se o acusador não conseguiu comprovar o fato, constitutivo
do direito afirmado, posto que conflitante despontou a prova; então, se soluciona a
seu favor, por absurdo. Ainda, porque não provou ele o alegado, em face do
acusado, deve decidir-se contra o último. Ao talante, por mercê judicial o vencido
vence, a pretexto de que se favorece a sociedade: in dubio contra reum”
(PITOMBO, Sérgio Marcos de Moraes. Pronúncia e in dubio pro societate - Boletim
dos Procuradores da República, n.º 45, janeiro de 2002, p. 26)."
"A dúvida razoável, que leva o caso ao júri, é aquela que permite tanto a absolvição
quanto a condenação. Assim, não é trabalho do juiz togado 'lavar as mãos' no
momento de efetuar a pronúncia, declarando, sem qualquer base efetiva em provas,
haver dúvida e esta dever ser resolvida em favor da sociedade, remetendo o
processo a julgamento pelo Tribunal Popular. Cabe-lhe, isto sim, filtrar o que pode
e o que não pode ser avaliado pelos jurados, zelando pelo respeito ao devido
processo legal e somente permitindo que siga a julgamento a questão realmente
controversa e duvidosa. Esta, afinal, é a função do judicium acusationis – fase de
instrução – pela qual passaram as partes, produzindo provas sobre o crivo do
contraditório e da ampla defesa. (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo
e Execução Penal. Ed. Revista dos Tribunais, p. 672, 2005)
94
Conclui-se, pois, ser vedada a pronúncia do réu, ausente contexto probatório que
indique a prática de crime doloso contra vida. Não há de se falar na aplicação do aforismo in
dubio pro societate .
Resulta de todo o explicitado que o Recurso Especial de GIULIANO
GUGLIELMI deve ser provido, porquanto o acórdão impugnado, ao entender pela
possibilidade de existência de dolo eventual teria, além de ensejado dissídio entre julgados,
violado dispositivos de lei federal.
Posto isso, DOU PROVIMENTO ao Recurso Especial para, reformando o
acórdão recorrido, desclassificar a infração penal de homicídio doloso para homicídio culposo
cometido na direção de veículo automotor (art. 302 da Lei 9.503/97), devendo ser os autos
remetidos ao Juízo competente.