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Elizabeth Artmann 1
Creuza da Silva Azevedo 1
Marilene de Castilho Sá 1
1 Departamento de Abstract This paper presents the preliminary results from a study on the limits and possibili-
Administração e
ties of the strategic planning approach for local health organizations. A comparative analysis is
Planejamento em Saúde,
Escola Nacional de Saúde developed between two experiences concerning the application of the strategic situational plan-
Pública, Fundação ning method (PES method) in the management of a health center and hospital. Questions in-
Oswaldo Cruz.
clude the following: difficulties with the use of the category actor in local health organizations;
Rua Leopoldo Bulhões 1480,
Rio de Janeiro, RJ possibility of drafting a collective project based on the multiple rationalities existing in such or-
21041-210, Brasil. ganizations; possibility of improving communications processes with the use of the PES method;
difficulties related to organizational culture; and low levels of responsibility, as well as difficul-
ties pertaining to the method’s complexity and the possibility of simplifying it, maintaining
strategic situational analysis and improving organizations’ managerial capacity.
Key words Health Planning; Strategic Planning; Public Health
Resumo Este artigo apresenta os resultados preliminares de uma pesquisa sobre os limites e
possibilidades de aplicação do enfoque de planejamento estratégico em organizações de saúde
de nível local. Desenvolve-se uma análise comparada de duas experiências de adoção do método
de Planejamento Estratégico-Situacional (PES) para a gestão de um Centro de Saúde e de uma
unidade hospitalar. Entre as questões discutidas destacam-se: a de dificuldade de aplicação da
categoria ator no nível local de saúde; a possibilidade de construção de um projeto coletivo a
partir da multiplicidade de racionalidades presentes em organizações de saúde; a possibilidade
de se ampliarem os processos comunicativos a partir da adoção do PES; as dificuldades relativas
à cultura organizacional e aos baixos níveis de responsabilidade, além daquelas inerentes à
complexidade do método, e à possibilidade de simplificá-lo, garantindo-se a análise estratégica-
situacional e a ampliação da capacidade gerencial das organizações.
Palavras-chave Planejamento em Saúde; Planejamento Estratégico; Saúde Pública
venientes e suas formas de articulação. Por ou- mentas metodológicas específicas, que podem,
tro lado, os dois outros tipos de problemas só no entanto, ser retomadas nos demais.
podem ser tratados a partir de modelos proba- • A Teoria das Macroorganizações, onde Ma-
bilísticos e de intervenções criativas, já que fa- tus (1994a) aplica a Teoria da Produção Social à
zem parte de situações de incerteza quantitati- análise das organizações, permitindo-nos ava-
va e/ou qualitativa, nas quais não se podem liá-las, seja através de seus fluxos de produção,
enumerar todas as variáveis envolvidas e seus suas acumulações ou das regras que as regem
respectivos pesos na geração do problema. (regras de direcionalidade, departamentaliza-
Para enfrentar tal complexidade, o Método ção, governabilidade e responsabilidade). Des-
se apóia em um enfoque teórico bastante con- ta forma, oferece maneiras de se pensar a re-
sistente, do qual podem ser destacados os se- forma organizacional.
guintes elementos: Aliado a este enfoque, utilizamos, para nos
• O conceito de situação e de explicação si- aproximarmos da especificidade e complexi-
tuacional, onde a situação é um recorte proble- dade das organizações de saúde, de outro refe-
mático da realidade feito por um ator em fun- rencial teórico, conformado especialmente pe-
ção de seu projeto de ação e é constituída pelo lo trabalho de Mintzberg (1989), cuja produção
ator-eixo da explicação situacional, por outros inclui a compreensão do mundo organizacio-
atores, pelas suas ações, e pelas estruturas eco- nal e a definição de uma tipologia das organi-
nômica, política, ideológica, social etc. zações.
• A Teoria da Produção Social, que explica a As organizações de saúde, particularmente
realidade para além dos fatos mais aparentes, os hospitais, são identificados em sua tipologia
através de três níveis: o nível dos fatos propria- como organizações profissionais, caracterizan-
mente ditos ou fenoprodução (fatos de qual- do-se por sua grande dependência dos profis-
quer natureza), o nível das acumulações ou fe- sionais responsáveis pela execução das ativi-
noestruturas (capacidades de produção) e o ní- dades finalísticas da organização. Estas ativi-
vel das regras ou leis básicas que regulam uma dades, devido a sua complexidade, são execu-
formação social. Os diferentes processos e fe- tadas e controladas diretamente por esses pro-
nômenos da realidade articulam-se dinamica- fissionais, especialistas com alto nível de quali-
mente, tanto no interior de cada um desses ní- ficação, que requerem autonomia para o de-
veis, como entre eles, havendo uma maior de- senvolvimento de seu trabalho.
terminação do último nível – as regras – sobre Como o processo de trabalho é muito com-
os demais. A aplicação concreta desta teoria se plexo e especializado, os resultados do traba-
dá no momento de explicação de um problema lho profissional não podem ser mensurados fa-
quando, através da montagem do Fluxograma cilmente. As decisões, em grande parte, depen-
Situacional, localizam-se as causas nesses três dem de julgamento profissional. O poder em
níveis, estabelecendo-se uma rede de relações organizações deste tipo advém essencialmente
causais, o que contribui para uma visão mais dos experts, sendo conseqüência da perícia e
ampla do problema explicado e, conseqüente- não da hierarquia. Neste contexto, o papel dos
mente, para uma atuação mais efetiva. gerentes/planejadores é mais limitado para
• A Teoria da Ação, que distingue uma forma coordenar ou normalizar o trabalho profissio-
de ação não interativa, instrumental ou com- nal. Além disso, destaca-se o desafio de inte-
portamental – própria do planejamento nor- gração da dupla estrutura, profissional e admi-
mativo – e aplicável a problemas bem-estrutu- nistrativa, bem como entre os diversos espe-
rados, e uma forma de ação interativa, referida cialistas, principalmente no sentido do com-
ao espaço social e político, que fundamenta a promisso com os objetivos organizacionais.
necessidade do cálculo interativo ou raciocínio A partir da compreensão de Mintzberg, evi-
estratégico – aplicável a problemas quase-es- dencia-se a particularidade da distribuição de
truturados. poder nas organizações de saúde, onde os pro-
• O conceito de momento, formulado para su- fissionais jogam importante papel em sua di-
perar a idéia de ‘etapas’ rígidas, implicando uma nâmica. Como conseqüência, torna-se claro
visão dinâmica do processo de planejamento, que as estratégias gerenciais devem incluir
que se caracteriza pela permanente interação processos participativos, de negociação e co-
de suas fases ou momentos e pela constante re- municação intensa com os diversos grupos in-
tomada dos mesmos. O Método PES prevê qua- ternos (Azevedo, 1995).
tro momentos para o processamento técnico- A estas discussões, somam-se nossas preo-
político dos problemas: os momentos explicati- cupações com a complexidade dos problemas
vo, normativo, estratégico e tático-operacional. de saúde (Sá, 1993; Sá & Artmann, 1994). Aqui
Cada um desses momentos possui suas ferra- destacam-se duas ordens de questões. Por um
algumas discussões sobre o processo decisório, diu que em ambas as experiências estes, além
o sistema de direção e as dificuldades para de- da condução metodológica, tivessem impor-
finição de responsabilidades. Ao mesmo tem- tante papel nas discussões de condução políti-
po, definiu-se a participação de dois membros ca e de conteúdo técnico. Deve ser também va-
da equipe de direção em um curso de gestão lorizado o papel do assessor como mediador
hospitalar oferecido pela Ensp e que adota a das relações entre os membros dos grupos,
metodologia do PES. Junto com a direção foi destacando-se a necessidade de desenvolver
amadurecido como e quando introduzir a me- sua capacidade de leitura e intervenção nos
todologia do PES. processos comunicativos/intersubjetivos que
É importante destacar que as duas expe- se estabelecem. Com relação a este último as-
riências tiveram como objetivo explícito elabo- pecto, é importante salientar que, com o pas-
rar um plano de ação estratégica, de forma par- sar do tempo e a crescente proximidade com a
ticipativa, e que pudesse contribuir para a vida e o cotidiano das instituições, temos vi-
construção da identidade do grupo de direção venciado uma relativa diminuição do olhar ex-
em torno dos problemas estratégicos das res- terno do assessor e um aumento correspon-
pectivas instituições (Tabela 1). dente de sua vivência como membro da orga-
Inicialmente, pode-se observar que as duas nização. Isto, de certo modo, pode ser vantajo-
primeiras variáveis – participantes e adesão – so, do ponto de vista de sua legitimidade, mas
buscam traduzir a estratégia adotada e as difi- pode, por outro lado, comprometer sua capaci-
culdades para a construção de um processo dade de mediação.
mais coletivo de enfrentamento de problemas. A quinta variável, que trata das estratégias
O cumprimento das tarefas pelos participan- adotadas para possibilitar a apropriação pela
tes e seu nível de autonomia – enquanto ex- equipe do enfoque metodológico do PES, per-
pressões ainda que parciais da capacidade or- mite, em uma análise comparativa, destacar a
ganizativa, de formulação de propostas, de ade- insuficiência da estratégia de se utilizar apenas
são ao processo e responsabilidade com seu do processo de assessoria como forma de ca-
andamento – podem ser tomados como indi- pacitação da equipe. A partir das diferenças de
cadores, entre outros, da construção de um treinamento/formação tanto gerencial como
ator. Esta é uma das principais questões teóri- no método PES entre as equipes das duas insti-
cas da pesquisa, qual seja, a da possibilidade tuições, conclui-se pela necessidade de inser-
de construção de atores que expressem proje- ção de alguns elementos-chave em programas
tos coletivos, tendo em vista a multiplicidade específicos de capacitação para efetivo aumen-
de racionalidades em jogo na vida institucio- to da capacidade de governo da equipe envol-
nal, os diferentes projetos e a peculiar distri- vida com o processo. A capacidade de governo,
buição de poder presente em organizações de conceito trabalhado por Matus (1993), consti-
saúde. tui-se num dos vértices de seu Triângulo de
Outro aspecto que merece destaque diz res- Governo (os outros dois são projeto de gover-
peito ao papel do diretor no processo. Cabe no e governabilidade sobre o sistema) e se ex-
lembrar que as organizações de saúde, en- pressa, em nível organizacional, no conjunto
quanto organizações profissionais, caracteri- de recursos cognitivos, tecnológicos, nas expe-
zam-se por uma situação de poder fortemente riências das equipes e dos dirigentes, nos sis-
compartido, adquirindo importância a partici- temas e métodos disponíveis etc. Os três vérti-
pação do conjunto de seus profissionais na de- ces se condicionam mutuamente. Assim, por
terminação de seus rumos. Desta forma, a di- exemplo, quanto maior a capacidade de gover-
reção, neste tipo de organização, possui menor no maior a governabilidade sobre o sistema e
governabilidade. Observa-se, no entanto, que maior a possibilidade de implementação do
variações com relação ao estilo de direção e ti- projeto de governo. Nessa perspectiva, desta-
po de envolvimento do diretor com o processo ca-se em particular a importância de sensibili-
condicionam diferenças quanto ao andamento zar e capacitar os profissionais ligados à assis-
do mesmo (adesão de outros profissionais, tência, especialmente aqueles que exercem fun-
cumprimento das tarefas, qualidade dos resul- ções gerenciais, considerando-se que nos ser-
tados, por exemplo), destacando-se, portanto, viços de saúde depende-se, em grande medida,
o papel estratégico deste ator para viabilizar o desses profissionais para obtenção de bons re-
processo. sultados.
Considerando agora o papel do assessor, A conjuntura institucional é uma variável
vale destacar que a diferença nas formas de in- que expressa características particulares das
serção nas duas instituições – no hospital, co- instituições, que podem condicionar o anda-
mo membro da equipe de direção – não impe- mento dos processos. No início do processo no
Tabela 1
Variáveis Centro de Saúde-Escola Germano Sinval Faria/Ensp Hospital Raphael de Paula e Souza
1) “Atores”/Participantes
Total de participantes • 56 pessoas na 1ª oficina (identificação e seleção de problemas) • 40 pessoas em média (9 por grupo de trabalho
ao longo do momento explicativo e normativo)
• 19 pessoas em média ao longo do processo • Reuniões com equipe de direção – 10 participantes
de explicação situacional dos problemas
• Cerca de 12 participantes a partir do momento normativo • Na realização das operações/ações, atividades
envolvendo equipes dos serviços, portanto novos
participantes (cerca de 30 pessoas)
2) Adesão/Participação
Assiduidade e • Flutuações no número de participantes ao longo do processo, • Boa assiduidade no geral, com flutuações nos
cumprimento das tarefas com freqüência em geral regular às reuniões (cerca de 60%) diferentes grupos (média de 70% de freqüência)
• Tarefas cumpridas, embora com atrasos, até o desenho • Cumprimento de 100% das tarefas até o momento
das operações. Dificuldade no cumprimento de tarefas normativo. Dificuldade na implementação
relativas à execução das operações de operações
Motivação para • Média a alta em todos os participantes no início • Alta motivação domina em três dos quatro grupos
discussão do processo. Diminuição da motivação de alguns deles ao de trabalho. Oscilações da motivação ao longo do
longo do processo processo.
Autonomia • Grupos ainda muito dependentes da orientação • Boa autonomia dos coordenadores de grupo e de
(e presença) das assessoras uma parcela dos participantes, variando o grau
Obs. Nenhum participante conhecia a metodologia de autonomia geral dos diferentes grupos
Obs. Participação de alunos do curso de gestão
hospitalar e residentes (r2 – estágio em gestão
hospitalar)
3) Papel do diretor
Formação para gerência • Conhecimento de algumas experiências de planejamento • Boa capacidade de análise estratégica; formação
estratégico e pouco conhecimento sobre a metodologia em gestão hospitalar; conhecimento da
do PES no início do processo. Especializando-se em Curso metodologia do PES através do acompanhamento
para Gerentes Locais de Saúde de algumas experiências e cursos
Tabela 1 (continuação)
Variáveis Centro de Saúde-Escola Germano Sinval Faria/Ensp Hospital Raphael de Paula e Souza
4) Papel do assessor
Tipo de inserção • Assessoria à direção do CSE, sem inserção direta • Inserção como membro da equipe de direção
(ator no processo)
Envolvimento • Em tempo parcial, condução geral do processo • Cotidiano, condução geral do processo, definição
de planejamento, definição de estratégias para de estratégias de desenvolvimento do processo
o desenvolvimento do processo, coordenação das oficinas, com a Direção, pré-processamento dos problemas,
monitoria e supervisão dos grupos de trabalho revisão dos produtos com os coordenadores
de grupo
Formas de capacitação • Preparação de um grupo coordenador do processo: • Equipe de coordenação: curso na Ensp (Gestão
quatro seminários teóricos e de discussão metodológica Hospitalar) e participação de residentes em Gestão
(até Momento Explicativo) Hospitalar; debates com assessor sobre
o desenvolvimento do trabalho
• Posteriormente a discussão teórico-metodológica passa • Participantes: discussão teórico-metodológica
a integrar as oficinas de processamento dos problemas, no início do processo
com todos os participantes. Introdução de alguns conceitos • debates nos grupos de trabalho sobre
simultaneamente à sua aplicação seu desenvolvimento
Intrumentos • Roteiros de trabalho e utilização de caso ilustrativo • Roteiros de trabalho com caracterização
de uma SMS (M. Explicativo e Normativo) e explicação dos momentos, objetivos
e técnicas até desenho de operações
6) Conjuntura institucional
Momento da gestão • Início do processo a seis meses do término do mandato, • Início do processo no início da gestão.
e forma de acesso com perspectivas de reeleição. Processo eleitoral Diretor indicado internamente, nomeado pelo MS,
ao cargo com 3 candidatos. Reeleição da Chefia por grande sem mandato definido
margem de votos. Mandato de dois anos (este foi
o horizonte de tempo definido para o plano)
Receptividade da • Inicialmente, grande receptividade à proposta; funcionários • Grande receptividade à proposta, com algumas
instituição à proposta e chefias com muitas expectativas. Atualmente a receptividade dificuldades em um dos grupos (até o desenho
continua boa dentro de um grupo mais restrito de participantes de operações). Dificuldade para difundir e ampliar
(reconhecimento da importância do processo para maior o alcance do trabalho para além dos níveis gerenciais
organicidade do grupo). No entanto, há dificuldades de
envolvimento de outros profissionais
Centro de Saúde, houve certa dificuldade de todo para o nível local, ao mesmo tempo con-
adesão de profissionais que se colocavam em siderando as especificidades deste nível e pro-
oposição à direção. Ao longo do processo, hou- curando tornar o método mais acessível sem,
ve gradativamente um aumento da adesão, contudo, empobrecê-lo.
ainda que no período eleitoral as relações te- Foram utilizadas várias técnicas que não
nham ficado mais tensas e os grupos de traba- pertencem ao PES, para facilitar a participa-
lho mais esvaziados. Hoje observa-se um mo- ção nos grupos de trabalho e a busca do con-
vimento de reaglutinação em torno do plano. senso na seleção dos problemas. Dentre estas,
Já no Hospital, o fato de o processo de planeja- destacamos o Diagrama de Afinidades – uma
mento ter começado no início da gestão do ferramenta da abordagem da Qualidade To-
atual diretor, parece ter contribuído para uma tal – por sua utilidade no agrupamento de pro-
maior adesão e agilidade. blemas.
As opções metodológicas buscaram res- Das adaptações feitas no interior do méto-
ponder às necessidades de adaptação do mé- do, vale a pena destacar a introdução do exer-
Tabela 1 (continuação)
Variáveis Centro de Saúde-Escola Germano Sinval Faria/Ensp Hospital Raphael de Paula e Souza
Momento normativo • Mesa redonda, com convidados representativos de grupos • Discussão com um representante do MS sobre
de variáveis mais importantes, para a construção dos cenários variáveis relevantes para a construção dos cenários.
• Apresentação da proposta de Reforma
Administrativa do Governo Federal
Momento estratégico • Implementação de algumas ações menos sensíveis aos cenários • Idem
• Construção dos cenários (otimista, central e pessimista) com
um grupo menor, de maior adesão ao processo
• Dificuldade para iniciar análise estratégica das operações • Pouco sistemática. Discussão em dois momentos:
propostas. Análise estratégica sistemática apenas de uma no nível da equipe de direção e no nível
operação desenhada pelo ator “Presidência da Fiocruz”, dos gerentes (seminário)
de alto impacto sobre a missão do CSE
8) Organização/Dinâmica do processo
cício de construção de uma ‘imagem de futuro’ tos da explicação situacional dos problemas.
que serviria de parâmetro para a seleção de Do mesmo modo, apenas parte das operações
problemas enquanto obstáculos ao alcance foram incluídas.
do futuro desejado. Contudo, observamos nas O segundo refere-se a resultados mais ge-
duas instituições que os problemas identifica- rais e finalísticos, que remetem à possibilida-
dos são, principalmente, o resultado da aplica- de de ampliação da capacidade gerencial das
ção do brainstorm (tempestade de idéias), não instituições a partir do processo de planeja-
se relacionando diretamente a obstáculos para mento estratégico. Estamos utilizando o termo
o alcance da imagem de futuro. Posteriormen- ‘capacidade gerencial’ com um significado
te avaliamos que esta dissociação pode ter sido mais amplo, equivalente ao conceito de capa-
decorrente de contradições entre as duas téc- cidade de governo trabalhado por Matus
nicas, já que a primeira pressupõe um exercí- (1993) (Tabela 2).
cio mais racional de identificação de proble- Com relação aos resultados do processa-
mas, enquanto a outra estimula a livre asso- mento técnico-político dos problemas, várias
ciação. questões devem ser observadas.
Outra adaptação importante foi feita no Em primeiro lugar merecem atenção os ti-
Protocolo de Seleção de Problemas sugerido pos de problemas selecionados. Nas duas ex-
por Matus, introduzindo-se o critério de im- periências, observamos que a quase totalidade
pacto na qualidade da assistência à saúde e dos problemas diz respeito a aspectos internos
não utilizando outros critérios que avaliamos à instituição, ou melhor, ao que Matus deno-
como mais adequados para a perspectiva do mina “problemas intermediários”. O único pro-
nível central de governo (maturação; inovação blema que não se encaixa totalmente nesta ca-
ou continuidade; impacto regional e balanço tegoria foi aumento da demanda reprimida, se-
político). lecionado pelo Centro de Saúde, e que pode ser
Por fim, uma última observação refere-se à situado na fronteira entre um ‘problema final’,
noção de momento trabalhada por Matus, que ou seja, ligado à missão da instituição e um
destaca a não-linearidade, ou seja, a interpe- problema intermediário. É importante desta-
netração dos mesmos. Este fenômeno se verifi- car que no Hospital foram levantados alguns
cou nas duas experiências, conforme pode ser problemas finais, agrupados nos enunciados
visto no quadro apresentado. No Hospital, esta produção e qualidade assistencial deficiente e
foi uma estratégia especialmente adotada no inserção deficiente do HRPS no SUS e na co-
processo, o que permitiu maior aproximação munidade. Embora não priorizados naquele
entre o tempo metodológico e o tempo institu- momento, a identificação destes problemas in-
cional. Por exemplo, ao mesmo tempo em que dica a sensibilidade dos profissionais para as
se desenvolvia o desenho do plano (momento questões finais da organização.
normativo), algumas operações menos sensí- Contudo, consideramos que, do ponto de
veis aos cenários já iam sendo implementadas vista da capacidade gerencial, a dificuldade em
(momento tático-operacional) e outras passa- identificar e/ou priorizar problemas finais re-
vam pela análise de viabilidade (momento es- vela uma limitação, na medida em que pode
tratégico). Isto possibilitou aumentar a veloci- significar restrições na compreensão da missão
dade de respostas, bem como a coesão em tor- e, conseqüentemente, prejuízos para a qualida-
no do plano, uma vez que permitiu a visualiza- de das propostas de intervenção, inclusive para
ção do ‘fazer’. aquelas relativas aos problemas intermediários.
Com relação à natureza dos problemas se-
lecionados nas duas instituições, observamos
Resultados várias semelhanças, embora a forma de recor-
te, ou seja, sua abrangência ou maneira de de-
Os quadros a seguir sintetizam os resultados finição tenham sido diferentes. Tomemos co-
obtidos com o processo de planejamento es- mo exemplo o primeiro problema, que em am-
tratégico nas duas instituições. O primeiro tra- bas as instituições refere-se à gerência, mas,
ta particularmente dos resultados do processa- enquanto o Centro de Saúde definiu-o como
mento técnico-político dos problemas selecio- um problema amplo de planejamento e gestão,
nados e também expressa, através da qualida- o recorte dado pelo Hospital envolve questões
de deste processamento, a capacidade geren- referentes à missão, já que seu enunciado rela-
cial das instituições. Em função dos limites de ciona a gerência aos objetivos e resultados. Por
espaço para a publicação, o quadro só contém outro lado, o Centro de Saúde trata a questão
os vetores de descrição dos problemas e os nós da missão como um problema à parte, embora
críticos, tendo-se excluído os demais elemen- na explicação de ambos os problemas – gerên-
Tabela 2
Quadro comparativo dos principais resultados do processamento técnico-político dos problemas (de maio de 1995 até agosto de 1996).
Problema 1: deficiência dos mecanismos de gerência, Problema 1: gerência sem definição de objetivos
planejamento, controle e avaliação e não voltada para resultados
Desequilíbrio entre as atividades planejadas e emergenciais; Lentidão na tomada de decisões; dia-a-dia repleto de urgências;
ausência de acompanhamento e avaliação das atividades; produção, custos e faturamento hospitalares desconhecidos; vigilância e
desorganização do trabalho na área administrativa; desinformação limpeza inadequadas; alto percentual de suspensão de cirurgias; baixa
dos funcionários quanto às decisões tomadas; representatividade taxa de ocupação nas clínicas cirúrgicas; tmp elevado; pacientes com
qualitativamente deficiente do CD/CSE; absentísmo e escaras nas enfermarias; alta taxa de mortalidade neonatal; inadequação
impontualidade; descumprimento das atividades e decisões sem da formação de residentes; desconhecimento das expectativas e opiniões
justificativas aceitáveis; saída não planejada de pessoal para da clientela
participação em cursos, treinamento etc.; processos de trabalho
lentos e ineficazes; espaços coletivos esvaziados; falta de material
de consumo
Nc1: inexistência de um projeto específico para o CSE que articule Nc1: missão do hospital não compartilhada internamente.
ensino, pesquisa e assistência
Nc2: falta de um sistema de planejamento Nc2: planejamento precário nos diversos setores e serviços
Nc3: despreparo dos profissionais para a gerência Nc3: inexistência de sistema de monitoramento e prestação de contas
Nc4: sistemas de informação inadequado Nc4: inexistência de incentivo por desempenho
Nc5: falta de mecanismos eficientes de comunicação
Nc6: falta de um sistema de acompanhamento, avaliação, supervisão
e cobrança do trabalho
Operações: Operações:
Op1: definir um projeto específico para o CSE contemplando as Op1: definir e divulgar a missão do HRPS internamente (ação1.6: definir
atividades de assistência, ensino e pesquisa (ação 1.1: realizar um objetivos e metas para os diversos serviços de acordo com a missão
seminário para definição do projeto) (esta operação é comum aos traçada para o hospital)
problemas 1 e 2)
Op7: criar um sistema de planejamento Op2: montar sistema de informações gerenciais: desenvolver subsistemas
de avaliação da produção e qualidade dos serviços.
Op8: definir um programa de capacitação de gerentes nas diversas Op3: montar sistema de informações gerenciais: desenvolver subsistema
áreas do CSE de avaliação de custos e faturamento
Op11: criar uma coordenação técnica (...) para a avaliação contínua Op5: implantar programa de capacitação gerencial (ação5.1: realizar
do CSE seminário de desenvolvimento gerencial com chefes de serviço)
cia e missão – apareça a forte inter-relação en- recortado – abrangendo planejamento, contro-
tre eles através de ‘nós explicativos’ (causas) le e avaliação – é resultado de uma orientação
comuns. da assessoria no processo de agrupamento dos
A descrição do problema de gerência/obje- problemas. Ainda que todos os problemas rela-
tivos – VDP – realizada pela equipe do hospital tivos à avaliação ou controle tenham sido le-
valorizou em especial resultados finais da pró- vantados pelos próprios participantes, não ha-
pria assistência, talvez para compensar a não- via por parte do grupo, no início, uma visão in-
seleção do problema sobre deficiência na qua- tegrada da relação entre eles.
lidade. Já no Centro de Saúde, chama a atenção, No que diz respeito ao problema relativo à
na descrição do problema de gerência, a preo- missão, destaca-se em sua descrição a dificul-
cupação com a representatividade do Conselho dade que o Centro de Saúde vivencia em desen-
Departamental e com o esvaziamento de ou- volver as áreas de ensino e pesquisa e realizar
tros espaços coletivos, indicando uma com- sua articulação com a assistência. Esta questão
preensão estratégica sobre a gerência por uma é muito importante na medida em que expres-
parte do grupo encarregado do processamento sa os desafios que se apresentam em função de
do problema. Por outro lado, é importante des- sua inserção num centro de excelência em
tacar que a amplitude com que o problema foi ciência e tecnologia como a Fiocruz. Cabe tam-
Tabela 2 (continuação)
Nós Críticos:
Operações:
Problema 3: política de recursos humanos inadequada Problema 2: precariedade da política de recursos humanos no HRPS
Nc1: falta de critérios definidos para seleção, recrutamento e Nc1: ausência de mecanismos de coordenação entre rh e os setores
liberação dos servidores externa e internamente
Nc2: inexistência de política de educação continuada Nc2: indefinição das funções e atribuições da divisão de rh
Nc3: sistema de avaliação de desempenho inexistente Nc3: falta de um sistema de incentivo por produção
Nc4: falta de profissionais com preparo em rh
Nc5: não reposição de pessoal
Nc6: processo de trabalho desgastante e desumanizado
Operações: Operações:
(não foram desenhadas operações para este problema) Op1: definir as funções e atribuições e elaborar plano de trabalho
para o drh
Tabela 2 (continuação)
Problema 4: processo de trabalho inadequado e desorganizado Problema 3: inadequada organização do processo de trabalho
inter e intra-setorial
Não-cumprimento de algumas rotinas (como preenchimento de Lentidão nos processos administrativos; descontrole de recursos materiais
exames e prontuários, normas de programas, marcação de consultas e financeiros; serviços desorganizados (arquivo, almoxarifado, lavanderia
e agendamento, prazos para solicitação de serviços administrativos); etc.); conflito entre os serviços
processos indefinidos e inadequados (inexistência de padronização
de conduta na assistência, interrupção constante das atividades etc.)
Nc1: falta de mecanismos de controle e avaliação das rotinas Nc1: mecanismos de coordenação inter e intra-setorial insuficientes
e processos de trabalho
Nc2: desinformação e despreparo no desempenho do trabalho Nc2: indefinição de responsabilidades
Nc3: rotinas e normas de serviços desatualizadas e/ou inexistentes Nc3: normas e rotinas inadequadas intra e interserviços
Operações: Operações:
Optou-se por conhecer melhor o problema através de um Op1: redefinição de mecanismos de coordenação e comunicação
levantamento dos processos de trabalho
Op2: definição de atribuições e responsabilidades dos níveis gerenciais
(a1: realização do seminário gerencial)
Op3: revisão dos processos de trabalho, buscando revisão com
perspectiva de descentralização e não-fragmentação de
responsabilidades
Nós críticos:
Operações:
Tabela 2 (continuação)
Vetor de Definição:
Nós Críticos:
Operações:
PES para intervir na organização propriamente postas em vários problemas. Tal fato pode ser
dita de processos de trabalho. Isto levou à bus- explicado, por um lado, pela existência de nós
ca de outras estratégias para a continuidade do críticos comuns a vários problemas, como, por
processamento. No hospital, partindo-se de exemplo, ‘falta de um sistema de incentivo por
uma discussão teórica sobre metodologias de produção’, comum aos problemas de Recursos
intervenção nos processos de trabalho, optou- Humanos e Gerência sem Definição de Objeti-
se por analisar e reorganizar, como experiência vos, do Hospital, e ‘inexistência de um projeto
piloto, o processo relacionado a contratos de específico para o Centro de Saúde que articule
serviços, por envolver diversos setores e repre- ensino, pesquisa e assistência’, do problema de
sentar um desafio para aumentar a responsa- Gerência, que, por sua vez, superpõe-se a dois
bilidade e integração institucional. No Centro nós críticos do problema de missão. Por outro
de Saúde, ao contrário, a estratégia utilizada lado, este impacto pode ser explicado também
inicialmente foi a realização de um levanta- pela estreita inter-relação entre os diversos
mento, setor por setor, de todos os fluxos e pro- problemas selecionados.
cessos de trabalho, de modo a obter melhor co- Passaremos agora a considerar os resulta-
nhecimento dos problemas existentes previa- dos a partir da possibilidade de impacto na ca-
mente à intervenção. Em ambos os casos, no pacidade gerencial das instituições (Tabela 3).
entanto, essas estratégias foram posteriormen- O primeiro comentário a ser destacado re-
te complementadas, associando-se análises fere-se aos tempos gastos nesses processos de
segmentadas de processos de trabalho a recor- planejamento estratégico, já que a velocidade é
tes mais integradores/intersetoriais, onde tais um fator importante a ser considerado na ca-
processos aparecem mais nitidamente relacio- pacidade de resposta aos problemas das orga-
nados aos produtos/objetivos das instituições. nizações. Nos dois casos estudados, o que se
É importante ressaltar que, tanto no Hospital, observa, de um modo geral, é que o tempo dis-
como no Centro de Saúde, a intervenção sobre pendido na elaboração e execução do plano
este problema passou a ser realizada em con- tem sido maior que o inicialmente esperado.
junto com as propostas relativas ao problema Ainda que vários fatores possam ser associados
de missão/objetivos. a esta situação – a complexidade da metodolo-
Outra observação relevante diz respeito ao gia, as respectivas estratégias de apropriação
problema de inadequação dos processos de do método pela equipe de coordenação e a di-
aquisição de materiais e equipamentos e sua ficuldade de constituição de um grupo de dire-
manutenção, selecionado pelo Hospital talvez ção mais orgânico, entre outras –, é importante
devido à importância que esta questão tenha levar em conta que dificilmente uma mudança
representado para a instituição naquele mo- de cunho mais profundo, que impacte o coti-
mento. Este problema, no nosso entendimen- diano da organização, possa acontecer num
to, é um desdobramento daquele relativo à or- período curto de tempo. As resistências às mu-
ganização do processo de trabalho interno, danças, as questões relacionadas a hábitos e à
constituindo-se num segmento mais estrutu- cultura organizacional devem ser considerados
rado deste. No entanto, dependendo da forma com a devida importância. Matus, embora en-
como é recortado e explicado, podem ser res- fatize a necessidade de mudar a cultura das or-
saltados aspectos mais ou menos passíveis de ganizações, não oferece elementos teóricos su-
intervenções normatizadas. No caso do hospi- ficientes para a análise e intervenção neste âm-
tal, o que se observou é que o processamento bito, sendo importante buscar o aporte de ou-
do problema deu origem a uma explicação tros autores, como Habermas (Artmann, 1993).
abrangente, compreendendo nós críticos, em Admitindo-se, portanto, que essa mudança
sua maioria, pouco estruturados. Todavia, o tem um caráter social/cultural, não dependen-
único nó crítico que até o momento teve ope- do exclusivamente do método adotado, é im-
rações implementadas é o de deficiência no portante reconhecer que uma das condições
abastecimento de materiais de consumo, o para que ela ocorra reside na possibilidade do
mais estruturado dos quatro, embora muito es- processo de planejamento ser permeado pelos
tratégico, já que de sua solução depende a pos- problemas e prioridades da vida real e cotidia-
sibilidade de cumprimento da missão do hos- na das organizações, não sendo apenas a ex-
pital. De todo modo, a abrangência do recorte pressão de uma formalidade. Este é um desafio
e da explicação do problema deu origem a um que vem sendo enfrentado nos dois casos tra-
plano de intervenção muito amplo, dificultan- balhados. Observamos que a complexidade do
do a implementação das operações. método e as exigências que apresenta para o
Uma observação geral importante diz res- processamento dos problemas têm representa-
peito ao impacto simultâneo de algumas pro- do um certo descompasso entre o tempo ne-
Tabela 3
Quadro comparativo de resultados gerais (de maio de 1995 até agosto de 1996).
1) ‘Os tempos’ • Abril a dezembro/95 (60 turnos): reuniões teóricas, • Julho a dezembro/95 (62 turnos): oficinas de
do processo reuniões plenárias e oficinas de processamento, processamento, plenária, concluindo
até o desenho das operações o momento normativo
• Janeiro a maio/96: reuniões mais espaçadas, • Janeiro a maio/96: reuniões mais espaçadas,
implementação de algumas operações, formulação de implementação de operações, avaliação
cenários, adequação de operações, avaliações estratégicas e adequação do plano, análise estratégica informal.
informais e pontuais
• Maio a julho/96: reuniões semanais com assessoras para • Maio a julho/96: implementação de operações.
discussão dos encaminhamentos e execução de operações Ênfase no trabalho com o grupo de direção
relativas a dois problemas, desenvolvidas ao longo da semana ampliado que se formou. Realização de seminário
pelos grupos de trabalho com gerentes.
2) Impacto nas • Ampliação da comunicação entre grupos divergentes • Busca, pelo diretor, de uma agenda com menos
práticas gerenciais urgências e mais voltada para assuntos estratégicos
• Envolvimento progressivo de profissionais da assistência • Colegiado ampliado, com participação de todos os
com as questões gerenciais chefes, responsáveis por unidades de produção
• Discussão do plano de objetivos e metas (Fiocruz) à luz • Envolvimento progressivo dos gerentes da área
das operações já definidas no processo de planejamento assistencial com a questão da missão institucional
estratégico-situacional
• Ampliação da discussão sobre a missão do CSE e seus • Redirecionamento de demandas para níveis
processos de trabalho gerenciais intermediários
• Construção progressiva de um grupo de gestão para o CSE • Desenho de estratégias de descentralização
e aumento das responsabilidades das gerências
intermediárias (gestão por programas; seminário de
gerentes; pacto sobre o papel dos gerentes)
• Elaboração de projetos por serviço
3) Dificuldades • Afastamento da chefia por problemas de saúde por 1 mês, • Resistência de alguns membros importantes da
no início do processo, além de greves e outras interrupções equipe de direção (muito voltados para as
atividades operacionais)
• Pouca participação de pessoas estrategicamente • Desencontros entre tempos institucionais e tempos
importantes metodológicos (problemas de abastecimento;
crise na área de cirurgia torácica)
• Não-designação, no início, de pessoas responsáveis • Dificuldades para desenvolver o conjunto de
pelo registro dos trabalhos e tarefas/cultura de baixa operações propostas. Restrições de tempo.
responsabilidade Abandono de algumas operações
• Dificuldade de alguns profissionais p/reflexão • Projeto muito amplo
teórico-metodológica
• Dificuldade da assessoria em traduzir alguns conceitos • Dificuldades para conciliar as operações propostas
e noções do PES com o trabalho cotidiano
• Conhecimento insuficiente dos participantes sobre alguns • Não-desenvolvimento de uma trajetória estratégica
conteúdos dos problemas
• Restrições de tempo e pessoal para executar e atualizar
o conjunto de operações propostas
Examinando agora as experiências com ba- significativa do plano, que incluía operações
se em seu grau de sistematicidade com relação voltadas para o enfrentamento de outros pro-
à aplicação da metodologia, é possível obser- blemas.
var dois grandes momentos diferenciados. Os fatos acima nos remetem a algumas
Um primeiro, que correspondeu ao mo- considerações. Por um lado, evidencia-se a re-
mento explicativo e parte do normativo, carac- lativa abrangência dos planos comparativa-
terizou-se por uma aplicação mais sistemática mente à capacidade de processamento das
dos instrumentos metodológicos, nas duas ins- equipes envolvidas, o que pode ser explicado
tituições, sendo que, no Centro de Saúde, o de- por fatores que vão desde a orientação meto-
senvolvimento da proposta buscou maior rigor dológica no recorte e seleção dos problemas a
conceitual e metodológico, com menos adap- questões relativas à insuficiência quantitativa e
tações que no Hospital. qualitativa de pessoal e aos ainda baixos níveis
A partir do final do momento normativo de responsabilidade – no sentido trabalhado
(análise das operações nos diferentes cená- por Matus na Teoria das Macroorganizações
rios), incluindo também o estratégico e o táti- (Matus, 1993; Rivera, 1995; Artmann, 1993). Por
co-operacional, observou-se uma segunda fase outro lado, é necessário reconhecer – como
neste processo, quando as duas experiências, inerente à introdução de processos de mudan-
coincidentemente, passaram a se caracterizar ça de forma participativa nas organizações – a
por um processo mais informal, menos siste- real sobrecarga advinda da necessidade de
mático, do ponto de vista da aplicação da me- compatibilizar a execução das atividades rela-
todologia. tivas à continuidade do funcionamento da or-
Ainda que consideremos necessária a ma- ganização com as novas demandas oriundas
nutenção de certo grau de sistematicidade e do processo de mudança.
rigor metodológico, observamos que é impor- De todo modo, embora seja necessário evi-
tante que os participantes não se deixem apri- tar um aprisionamento ao formalismo proces-
sionar ou subordinar pelos aspectos formais sual do método, deve ser considerado que um
do método. Esse aprisionamento seria inver- dos objetivos dessa metodologia é aumentar a
samente proporcional à autonomia e capaci- capacidade de governo das equipes envolvidas,
dade propositiva dos participantes e, por ou- para o que o emprego de seus instrumentos
tro lado, à flexibilidade na condução metodo- pode ser uma das condições. Nas duas expe-
lógica. riências não se conseguiu, até o momento, de-
Assim, pelas características dos dois pro- senvolver o plano de forma mais sistemática
cessos, observou-se, na primeira fase, uma após o desenho das operações. Assim, não se
maior subordinação dos profissionais do Cen- chegou a analisar, por exemplo, o impacto dos
tro de Saúde ao formalismo processual, com- cenários sobre as operações. Do mesmo modo,
parativamente aos profissionais do hospital. as análises estratégicas não sistemáticas não
Estes últimos, com maior freqüência, abriram conduziram à montagem de uma trajetória es-
mão de alguns passos metodológicos na busca tratégica mais global para a execução do plano.
de maior agilidade de respostas e aprofunda- As conseqüências podem se manifestar, entre
mento de proposições, bem como souberam se outros aspectos, na falta de ligação ou coerên-
utilizar do espaço de discussão para clara ne- cia entre as decisões do dia-a-dia e a situação-
gociação política. No caso do Centro de Saúde, objetivo pretendida.
o maior formalismo pode estar ligado à menor Nesta discussão em torno da necessidade
organicidade do grupo de coordenação, ao de maior ou menor sistematização, não se po-
pouco conhecimento técnico sobre o conteúdo de deixar de considerar também a capacidade
de alguns problemas trabalhados, à menor ex- de análise estratégica e gestão já acumulada
periência gerencial, bem como ao encaminha- pelas equipes. No caso do Hospital, a despeito
mento do processo dado pela assessoria. de existirem condições mais favoráveis a um
Já na segunda fase, observamos, nas duas processo mais sistemático, do ponto de vista
experiências, um processo de revisão informal metodológico, dadas pela inserção da assesso-
do plano, que se expressou na reformulação de ra como membro da equipe de direção, aca-
algumas operações sem a correspondente revi- bou-se optando, de certo modo, por um proces-
são dos conteúdos explicitados anteriormen- so mais informal, na medida em que a equipe
te nos diversos instrumentos metodológicos de direção formada reunia um grupo de profis-
(‘formatos’). Neste processo, ocorreu também, sionais com boa capacidade de análise estraté-
nas duas instituições, uma priorização, em ter- gica e formulação, o que, esperava-se, minimi-
mos de execução, das operações relativas à zaria as perdas possíveis relativas a processos
missão institucional e um ‘abandono’ de parte menos sistemáticos.
como fator essencial para a ampliação da co- veis diferenças quanto aos limites e possibili-
municação interna e, conseqüentemente, para dades de adoção do enfoque de planejamento
a possibilidade de construção de um projeto estratégico em organizações de saúde de dis-
coletivo e estratégico. tintos níveis de complexidade e o estudo da es-
Além das questões acima, ficam especial- pecificidade que o caráter público das organi-
mente registradas, como intenção de continui- zações possa conferir aos processos de plane-
dade de nossa investigação, o exame de possí- jamento e gestão.
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