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AOS VIVOS

Alessandro de Paula
Vamos abrir cada garrafa e deixar cheios cada copo deste lugar at esvazi-los e, sim, todos vontade para mais e mais e mais e Porque hoje vamos festejar, celebrar a vida dos que j partiram, dos que prosseguem, ouvindo esta cano tanto quanto ns. Festejamos o fim de tudo: Os mil poemas que no escrevemos, escondidos sob incontveis pilhas de papis. Demonstrativos bancrios, planilhas de gastos, provas de livros sobre como emagrecer base de uma dieta de lentilhas e faturas vencidas da TV a cabo. Estao Brs, plataforma 3, acesso linha 3 do Metr (uma fratura no verso) Queremos esta festa, realizada para satisfazer aos amigos que no vieram e brindar ao Rubo, ao Caio, porque, raios, eles aqui esto, em cada um de ns, contrariando a lgica das tardes rpidas de um cotidiano sem graa. Eles esto aqui, sorriem e bebem conosco. Nada de lamentar o tempo no vivido, no dividido. Ns sorrimos e conversamos e estivemos em tantas festas como agora estamos: bbados e loucos amparvamos, celebrando a morte de Deus, a morte de Nietzsche. Pouco importa agora a vitria do Santos ou a vergonha que veste amarelo. Pouco importa que amanh venderemos nossos neurnios em atividades pouco excitantes. Menos ainda faro diferena os amantes da tcnica, os que agem conforme os manuais. Ou o vaso grego. Ou chins. No importa tambm de onde venha o tal vaso. Estamos amando cada vez mais o verso livre e On the Road. A prosa potica, o poema prosaico. A rosa do povo.

O verso de Bandeira, que no esteja mais farto. Onde quer que esteja, que esteja conosco. Vamos bradar o brado do grande campeo: Rock n roll, mothafuckeeeer!! Ao longe, os bardos que cantam vida vm chegando. A despeito da teoria burocrtica da administrao, da falta de tempo, dos trens lotados, da falta de amor, dos beijos roubados, da falta de vida. H muitos l fora que esto menos vivos que Caio e Rubens. Azar. O azar do mundo de-menos-riso, menorvores, menofrutas, menoflores. Menos pausas agora. Vamos plantar novamente, neste vaso nada grego, nada chins. Vamos gerar novos frutos e sorrisos. E festejar. Porque no estamos mortos. Nem os nossos podem estar mortos em ns.

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