Anti-Ritos

Instalao sonora para o sino da igreja de S. Vicente

Andr G Pinto
O sino da igreja um som centrpeto; ele atrai e unifica a comunidade a um nvel social, da mesma maneira que une homem e Deus. Em tempos passados tambm teve uma fora centrfuga, quando serviu para espantar espritos malvolos. Schafer, R. Murray

Rituais sociais passados so creditados como pontos focais no desenvolvimento do que hoje chamamos msica, embora as concepes de msica e som fossem indistintas em tempos passados. Na Grcia antiga, msica e som eram parte de um todo, parte de toda uma economia sacrificatria. Segundo Attali, o desenvolvimento da msica ao longo da histria parte da criao continua de uma ideia exterior, onde rudo desordem. Esta instalao tem como ambio a secularidade, o profano, o mundano atravs da subverso clara e simblica da iconografia sagrada de uma igreja que embora ainda ostente todo o seu esplio, perdeu o poder divino da comunho. O sino: a invocao divina dos devotos; agora trazido at ao interior da nave principal, onde ressoa e ganha o primeiro plano de relevncia, transgredindo os propsitos originais de funcionamento do rudo sagrado que agora ecoa dentro da nave principal. O sino exposto enquanto mero objecto acstico de grande poder sonoro e a nave principal da igreja transformada numa sala de outros espectculos que no os eclesisticos, onde o concerto se desenvolve, concentrando-se apenas na existente hiptese de articulao entre simples mortais com o outrora sacro sino eclesistico. Desta maneira, o concerto ser gratamente imprevisvel, entregue probabilidade, mas a uma probabilidade regulada pela condio humana, onde a estrutura da pea aberta e livre, no entanto submissa ao potencial relacionamento e articulao (in)directa do pblico com o espaorelao que ser fulcral na composio da soundscape resultante. No deixa de ser um concerto de improvisao livre, embora seja em parte uma operao de acaso. Aqui a pea todo o espao interior da igreja em constante mutao performativa, tanto quanto a sua repercusso exterior na interferncia compositiva/decompositiva do comportamento quotidiano da cidade. O exsagrado agora uma poderosa interferncia profana. A desconstruo/subverso do rito eclesial a consciente e orgulhosa celebrao espiritual e material do Intil! Rudo a decapitao de Perseus por Medusa. Rudo Mythos oposto a Logos. Rudo Excreo Sacra. Rudo Humano Real. Rudo Digno Intil. Rudo Altivo Imbecil. Rudo Rebelde Libertrio.