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ARTIGOS EVOLUGAO DOS CONCEITOS DE FUNGAO E DE INTEGRAL | Geraldo Avila 1. Introdugéo Muita gente tem a impressio de que a Matematica € estatica; de que os conceitos, uma vez formulados, se cristalizam como coisas completes ‘e acabadas, que permanecem entao imutaveis; de que os re- sultados, uma vez obtidos, se somam uns aos outros na acumulacao de um corpo de conhecimento que nao tem outra dindmica interna que a do crescimento por adigdo de unidades novas. A realidade, entretanto, @ bem outra. Tanto ao matematico engajado numa area de pesquisas e que esta a par dos problemas e das descobertas mais recentes em seu campo de trabalho, quanto ao estudioso que analisa a evolucao historica da Matematica, a eles @ dado observar a vigorosa dindmica do progresso, os erros e acertos nos processos de descoberta, a interdependéncia dos resultados que vio surgindo, tornando impossivel mesmo divisar fronteiras defini das de separacdo entre as varias disciplinas matematicas. No mais das vezes 08 conceitos se formam e evoluem de maneira lenta e gra dual, num processo que se subordina as necessidades do corpo cient? fico em suas varias etapas de desenvolvimento. Os conceitos de fungZo e de integral exemplificam muito bem © que vimos dizendo. E um acompanhamento de seu desenvolvimento por cérca de século e meio, como nos propomos fazer aqui, expée, com muita clareza, a dindmica e a vitalidade da evolugdo da Andlise Ma temitica nesse periodo. 2. 0 Teorema Fundamental A nog&o de integral de uma funcao como Grea foi introduzida no sécuto XVII. 0 Teorema Fundamental do Calculo, que relaciona a ‘integral coma derivada, foi um resultado decisivo para que os métodos infinitesimais que entao surgiam pudessem se organizar em discipli- na autdnoma — o Calculo Diferential e integral. 4 15 Numa de suas versdes o Teorema Fundamental ,afirma que ef P(x) = J Flt)de a @ uma primitiva de f, isto €, #'(«) = f(x). Outra versio equiva lente desse teorema afirma que se ¢ @ uma primitive qualquer da fungéo fF, entio > @(b) = oa) f. se)des ou ainda, como f(x) = G' (x), > Glb) - Gla) = I a'(t)ae. a) Evidentemente, tudo isso @ valido no pressuposto de que f(z) © G'(z) sejam fungdes continuas no intervalo [a,b]. Mas, no século XVII, quando 0 CAlcuto ainda se encontrava em estagio em brion&rio, ndo havia uma preocupagao explicita com a nocdo de conti. nuidade, mesmo porque o conceito de fungdo era também muito restri to. Por funcio se entendia uma correspondéncia entre variaveis, sem pre dada por formulas ou expressdes analiticas, como yt dn - Jee 1, ys ave74 1, etc. E a nogdo de continuidade s6 comecaria a aparecer no século XVIII. 3. 0 Cdlculo no Século XVITT Leonhard Euler (1707-1783) € a grande figura da Matematica e da Fisica Tedrica em sua Epoca. £m meados do século ele publicou livros que estabeleceram padrées definitivos no Calculo e exerceram profunda influéneia por seguramente um século. No segundo volume de uma dessas obras — "Introduction in Analysin Infinitorum", de 1848~ ele distingue entre fungdes continuas e descontinuas. Por continua ele entende uma funcdo dada por uma Ginica expresso analitica, como y= sen =, yeo'+] ou y= loge. E descontinua € a fungdo dada por varias expressdes analiticas, rém cujo grafico @ uma curva Gnica, sem interrupgdes. Um exemplo a fungdo definida por a é cujo grafico esta ilustrado na Fig. 1. Fig. 1 Segundo Euler, esta fungdo tem uma des continuidade em x = 1. Como se vé, isto ndo corresponde ao que ho je entendemos por descontinuidade, Todas as idéias do Calculo, envolvendo fungdo, integral, de rivada, continuidade, séries, convergéncia, etc., foram se desenvol. vendo gradativamente, a medida que o Calculo e outras disciplinas da Analise ganhavam corpo. Bastante intenso durante todo o século XVIII, esse desenvolvimento se traduziu na descobertae sistemati zagao de novos métodos e técnicas, alargando consideravelmente as fronteiras desses varios dominios cientificos. Mas, nesse mesmo pe riodo, nada de significativo ocorreu na area de fundamentos, uma tarefa que estava reservada ao século XIX. Aquele conceito de integral do século XVII, embora ainda va go e carente de uma fundamentacao satisfatéria, serviu muito bem a todo o desenvolvimento de que falamos acima, passando por uma = pri meira reviso somente em 1821 por obra de Augustin Louis Cauchy (1789 -1857). Mas, para que possamos bem entender toda a evolucio do con ceito, devemos primeiro introduzir um dos problemas que se revelou o mais fértil em todo o desenvolvimento da Analise no século XIX e que consiste em expressar uma dada funcao em série de senos e co- -senos. 4. A Corda Vibrante 0 problema surgiu em meados do século XVIII, em conexao com 0 estudo das vibracdes transversais de uma corda flextvel e estica da, como uma corda de violino. Supondo que a corda coincida com 0 eixo dos = em sua posigdo de repouso, seja u = u(z, ¢) 0 desvio de seu ponto de abcissa * no instante ¢ (Fig. 2). Entéo a fungao u(x, t) satisfaz a equagdo diferencial parcial

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