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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras

2º Juízo

Conclusão a 07.11.2008

***
Processo comum colectivo nº 49/00.3JABRG

RELATÓRIO
Acordam os juízes que compõem este tribunal colectivo do 2º Juízo do Tribunal
Judicial da Comarca de Felgueiras:
Em processo comum e perante tribunal colectivo, o MP acusou e a juiz de
instrução criminal pronunciou:

1. MARIA DE FÁTIMA DA CUNHA FELGUEIRAS ALMEIDA


DE SOUSA OLIVEIRA, divorciada, actualmente presidente da Câmara
Municipal de Felgueiras, natural do Rio de Janeiro, Brasil, filha de Bernardino
Alves de Almeida e de Joaquina Alves da Cunha Felgueiras Almeida, nascida no
dia 21.04.1954, residente na Rua Manuel Faria de Sousa, 1º Esq., Margaride,
Felgueiras, titular do B.I. nº 5558059, emitido em 04.04.2000, pelo arquivo de
identificação do Porto;
2. JÚLIO MANUEL CASTRO LOPES FARIA, casado, ex–
presidente da Câmara Municipal de Felgueiras e da Assembleia Municipal de
Felgueiras, actualmente aposentado, natural da freguesia de Margaride, concelho
de Felgueiras, nascido no dia 24.04.1942, filho de Augusto Leite da Costa Faria
e de Maria Helena Saraiva Remísio de Castro Pereira Lopes, residente na Av.
Agostinho Ribeiro, Edifício Europa, Habitação nº 35, Margaride, Felgueiras,
titular do B.I. nº 708772, emitido em 31.03.2004, pelo arquivo de identificação
do Porto;
3. VÍTOR MANUEL DA SILVA BORGES, casado, engenheiro, ex-
presidente do Conselho de Administração da empresa “RESIN – Resíduos
Industriais, S.A.”, actualmente desempregado, natural da freguesia de Paranhos,
concelho do Porto, nascido no dia 19.02.1946, filho de Joaquim Ernesto da Silva
Borges e de Laura Albertina da Silva Borges, residente na Av. da Boavista,
4321, Porto, titular do B.I. nº 1922020, emitido em 11.01.2000, pelo arquivo de
identificação do Porto;
4. CARLOS ANTÓNIO MIRANDA MARINHO, casado, ex-director
financeiro da empresa “RESIN – Resíduos Industriais, S.A.”, actualmente
director financeiro da empresa “Cespa – Portugal, SA”, natural da freguesia de
Várzea da Ovelha e Aliviada, concelho de Marco de Canavezes, nascido no dia
13.06.1965, filho de Bento Marinho Coelho e de Maria Nazaré de Miranda
Monteiro, residente na Rua Eng.º José Torres C. Pacheco, nº 164, Madalena,
Paredes, titular do B.I. nº 6989972, emitido em 27.04.2005, pelo arquivo de
identificação do Porto;
5. JOSÉ ANTÓNIO BARBIERI CARDOSO, casado, engenheiro civil,
director de departamento da Câmara Municipal de Felgueiras, natural da
freguesia do Bonfim, concelho do Porto, nascido no dia 24.07.1954, filho de
António Horácio Cardoso e de Maria Elvira da Costa Barbieri de Figueiredo
Cardoso, residente na Rua de Gondarém, nº 545, 1º, Porto, titular do B.I. nº
2995828, emitido em 08.01.2007, pelo arquivo de identificação do Porto;

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6. GABRIEL ÂNGELO DOS SANTOS FERREIRA DE ALMEIDA,


divorciado, engenheiro mecânico, professor universitário, ex-quadro superior da
empresa “RESIN – Resíduos Industriais, S.A.”, natural da freguesia de Santo
Ildefonso, concelho do Porto, nascido no dia 28.01.1948, filho de Agostinho
Ferreira de Almeida e de Maria Amélia Amarante dos Santos Ferreira de
Almeida, residente na Travessa Heróis da Pátria, nº 55, 4º-A, Rio Tinto, titular
do B.I. nº 854995, emitido em 28.04.2006, pelo arquivo de identificação do
Porto;
7. ANTÓNIO PEREIRA MESQUITA DE CARVALHO, casado,
professor do ensino básico aposentado, ex-vereador da Câmara Municipal de
Felgueiras, natural da freguesia de Vila Marim, concelho de Mesão Frio, nascido
no dia 15.06.1949, filho de Afonso de Carvalho e de Maria Pereira de Mesquita,
residente no Lugar de Ladário, nº 25, Vila Cova da Lixa, Felgueiras, titular do
B.I. nº 1977728, emitido em 29.11.2002, pelo arquivo de identificação do Porto;
8. ANTÓNIO JOSÉ LEITE BRAGANÇA DA CUNHA, casado,
professor do ensino básico, natural da freguesia de Pombeiro de Ribavizela,
concelho de Felgueiras, nascido no dia 05.08.1959, filho de Afonso da Cunha e
de Maria Aurora da Silva Leite Bragança, residente na Rua D. Maria II, nº 159,
Margaride, Felgueiras, titular do B.I. nº 3862492, emitido em 06.06.2002, pelo
arquivo de identificação do Porto;
9. ANASTÁCIO AUGUSTO PINTO DE MACEDO, casado,
industrial, sócio-gerente da empresa “Macedo & Sousa, Lda.”, natural da
freguesia de Revinhade, concelho de Felgueiras, nascido no dia 24.05.1945,
filho de Armando de Macedo e de Olívia Pinto, residente no Lugar do Carvalhal,
Sousa, Felgueiras, titular do B.I. nº 3344415, emitido em 02.06.19997, pelo
arquivo de identificação do Porto;
10. GUILHERME DA SILVA ALMEIDA, casado, industrial,
administrador da empresa “Ricap – Guilherme da Silva Almeida & Filhos,
S.A.”, natural da freguesia de Penacova, concelho de Felgueiras, nascido no dia
28.09.1956, filho de João de Almeida e de Alzira da Silva, residente no Solar
dos Penedos, Penacova, Felgueiras, titular do B.I. nº 6869560, emitido em
19.04.2001, pelo arquivo de identificação do Porto;
11. JOAQUIM TEIXEIRA PINTO, viúvo, desempregado, ex-
administrador da empresa “Pinfel Calçados, S.A.”, natural da freguesia de
Lagares, concelho de Felgueiras, nascido no dia 18.01.1948, filho de António
Pinto e de Leonídia Teixeira Pinto, residente no Lugar de Devesinha, Lagares,
Felgueiras, titular do B.I. nº 3407529, emitido em 27.09.2005, pelo arquivo de
identificação de Lisboa;
12. JOSÉ MANUEL PIMENTA DA SILVA, casado, industrial, sócio-
gerente da empresa “José Manuel Pimenta da Silva & Cª Lda.”, natural da
freguesia de Unhão, concelho de Felgueiras, nascido no dia 01.07.1961, filho de
António Silva e de Maria Amélia Pimenta, residente na Rua João Xavier de
Carvalho, Bloco 7, Oliveira do Castelo, Guimarães, titular do B.I. nº 5831204,
emitido em 22/07/1977;
13. CARLOS SAMPAIO TEIXEIRA, casado, industrial, sócio-gerente
da empresa “Carlos Sampaio Teixeira e Irmão, Ldª” (“Fábrica de Calçado
Jonil”), natural da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras, nascido no dia
16.06.1953, filho de José Teixeira e de Luzia de Sampaio, residente no Lugar da
Cachada, nº 307, Margaride, Felgueiras, titular do B.I. nº 3918141, emitido em
08.03.2004, pelo arquivo de identificação do Porto;

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14. MARIA AUGUSTA FARIA FERREIRA NEVES, casada, docente


universitária, ex-administradora da empresa “Calzeus Calçados, S.A.”, natural
da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras, nascida no dia 25.04.1949,
filha de António Ferreira de Melo e de Maria de Lurdes Faria, residente na Rua
Eça de Queirós, nº 321, 1º esquerdo, Rio Tinto, titular do B.I. nº 1781860,
emitido em 18.02.2005, pelo arquivo de identificação do Porto;
15. HORÁCIO RUI LOURENÇO DA COSTA, casado, gestor de
seguros, natural da freguesia de Margaride (Santa Eulália), concelho de
Felgueiras, nascido no dia 27.07.1964, filho de José Maria Costa e de Beatriz
Cândida Lourenço, residente no lugar da Boavista, nº 816, Silvares, S. Martinho,
4820-703, Fafe, titular do B.I. nº 7005515, emitido em 07.11.2001, pelo arquivo
de identificação de Lisboa; e
16. JOAQUIM MAGALHÃES DE FREITAS, casado, empresário,
natural da freguesia de Torrados, concelho de Felgueiras, nascido no dia
02.11.1955, filho de Joaquim de Freitas e de Maria de Lurdes Alves Magalhães,
residente no Lugar de Bouça, Torrados, Felgueiras, titular do B.I. nº 3327612,
emitido em 25.03.1998, pelo arquivo de identificação do Porto;

Imputando:
à arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida de Sousa Oliveira
- com as condutas descritas no capítulo 1º, a prática de 5 (cinco) crimes de
participação económica em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de
16/07;
- com as condutas descritas no capítulo 2º, a prática de 6 (seis) crimes de
corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo art. 16º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas nos capítulos 5º, 6º e 11º, a prática de 4 (quatro)
crimes de abuso de poderes, p. e p. pelo art. 26º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas nos capítulos 4º e 5º, a prática de 3 (três) crimes de
prevaricação, p. e p. pelo art. 11º, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas nos capítulos 7º e 8º, a prática de 2 (dois) crimes de
peculato, p. e p. pelo art. 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07;
- com as condutas descritas no capítulo 9º, a prática de 1 (um) crime de peculato,
sob a forma continuada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 30º, nº 2, do
Código Penal e 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07; e
- com as condutas descritas no capítulo 10º, a prática de 2 (dois) crimes de
peculato de uso, sob a forma continuada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.
30º, nº 2, do Código Penal e. 21º, nºs 1 e 2 da Lei nº 34/87, de 16/07;

ao arguido Júlio Manuel Castro Lopes Faria, com as condutas descritas no


capítulo 1º, a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em negócio, p. e p.
pelo art. 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07 e art. 28º do Código Penal;

ao arguido Vítor Manuel da Silva Borges, com as condutas descritas no


capítulo 1º, a prática de 5 (cinco) crimes de participação económica em negócio, p. e p.
pelo art. 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07, e art. 28º do Código Penal;

ao arguido Carlos António Miranda Marinho, com as condutas descritas no


capítulo 1º, a prática de 5 (cinco) crimes de participação económica em negócio, p. e p.
pelo art. 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16/07, e art. 28º do Código Penal;

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ao arguido José António Barbieri Cardoso, com as condutas descritas no


capítulo 1º, a prática de 3 (três) crimes de participação económica em negócio, sob a
forma de cumplicidade, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 23º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16/07, e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal;

ao arguido Gabriel Ângelo dos Santos Ferreira de Almeida, com a conduta


descrita no capítulo 1º, a prática de 1 (um) crime de participação económica em
negócio, sob a forma de cumplicidade, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de
16/07, e arts. 27º e 28º do Código Penal;

ao arguido António Pereira Mesquita de Carvalho, com as condutas descritas


no capítulo 6º, a prática de 1 (um) crime de abuso de poderes, p. e p. pelo art. 26º, nºs 1
e 2, da Lei nº 34/87, de 16/07;

ao arguido António José Leite Bragança da Cunha, com a conduta descrita


no capítulo 2º, a prática de 1 (um) crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p.
pelo art. 16º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 16/07 e 28º do Código Penal;

aos arguidos Anastácio Augusto Pinto de Macedo; Guilherme da Silva


Almeida; José Manuel Pimenta da Silva; Joaquim Teixeira Pinto; Carlos Sampaio
Teixeira e Maria Augusta Faria Ferreira Neves, com as condutas descritas no
capítulo 2º, relativamente a cada um deles, a prática de 1 (um) crime de corrupção
activa, p. e p. pelo art. 374º, nº 1 do Código Penal;

ao arguido Horácio Rui Lourenço da Costa, com as condutas descritas nos


capítulos 1º e 2º, sob a forma de cumplicidade:
- a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em negócio, sob a
forma de cumplicidade, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 23º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16/07, e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal; e
- a prática de 2 (dois) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelos
arts. 16º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 16/07 e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal.

e ao arguido Joaquim Magalhães de Freitas, com as condutas descritas nos


capítulos 1º e 2º, sob a forma de cumplicidade:
- a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em negócio, sob a
forma de cumplicidade, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 23º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16/07, e arts. 27º e 28º, ambos do Código Penal; e
- a prática de um 1 (um) crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo
art. 16º, nº 1 da Lei n.º 34/87, de 16/07 e arts. 28º e 27º do Código Penal.

tudo nos termos dos factos constantes do despacho de pronuncia de fls 10286 e
ss., cujo teor aqui se dá por reproduzido.
O MP, em representação do Mnicípio de Felgueiras, deduziu pedido de
indemnização cível a fls. 6214 e ss., pedindo a condenação:
- dos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras a pagar solidariamente a
quantia global de 157.069.761$00 (ou 785.349,50 euros), como reparação pelos
prejuízos sofridos com as condutas descritas nos itens 1º a 7º do PIC em causa,

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acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos
pagamentos em causa, custas e demais despesas legais;
- da arguida Fátima Felgueiras no pagamento à CMF da quantia de 680.380$00
(ou 3.393,72 euros), como reparação pelos prejuízos sofridos com as condutas descritas
nos itens 8º, 9º, 10º e 11º do PIC, acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados
desde a data de cada um dos pagamentos em causa, custas e demais despesas legais;
- do arguido Barbieiri Cardoso no pagamento solidário com a arguida Fátima
Felgueiras à CMF da quantia de 118.750$00 (ou 592,32 euros), como reparação pelos
prejuízos sofridos com as condutas descritas nos itens nºs 10 e 15º do PIC, acrescida dos
juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos pagamentos em causa,
custas e demais despesas legais.
A arguida Fátima Felgueiras apresentou contestação escrita, junta a fls 8935 e
ss. (arrolando igualmente testemunhas), reiterada a fls 11081 e ss., onde, em síntese,
nega a prática dos crimes que lhe são imputados.
No que respeita ao PIC deduzido, concluiu que, não tendo praticado qualquer
crime, não se constituiu na obrigação de indemnizar (cfr. a posição expressa no corpo da
primeira contestação apresentada e a posição expressa na contestação autónoma
deduzida relativamente ao PIC, junta a fls 11566).
O arguido Júlio Faria apresentou contestação escrita a fls 8759 e ss.,
reproduzida a fls 10923 e 11294 (arrolando igualmente testemunhas), suscitando a
questão prévia da concretização da acusação no que a si diz respeito; no mais, em
síntese, negou a prática dos crimes que lhe são imputados e invocou factos do seu
percurso de vida pessoal, donde resulta que é pessoa socialmente bem integrada.
No que respeita ao PIC deduzido, o arguido Júlio Faria suscitou a questão do
MP não poder, em representação da CMF, deduzir o PIC em causa, entendendo assim
que o município felgueirense não se acha devidamente representado em juízo; quanto ao
mais, impugna a matéria constante do PIC.
Os arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho deduziram contestação escrita a
fls. 9051 e ss., reiterada a fls 10921 (onde também arrolaram testemunhas), chamando
de novo à colacção o facto de não serem titulares de cargos políticos (pelo que não lhes
pode ser feita a imputação dos crimes referidos na pronúncia) e negando em todo o caso
a prática dos crimes que lhes são imputados (impugnando factos e contextualizando de
forma diversa outros). Invocam ainda as respectivas condições sócio-económicas, donde
resulta que são pessoas socialmente bem integradas.
O arguido Barbieri Cardoso, por sua vez, apresentou contestação escrita a fls
8832 e ss., reiterada a fls 11067 e ss. (onde também arrolou testemunhas), tendo negado
a prática dos crimes que lhe são imputados, invocando além do mais desconhecer
qualquer esquema que visasse a obtenção de fundos destinados a financiar as
actividades partidárias do PS local e a custear despesas pessoais de outros arguidos.
Quanto ao PIC contra si deduzido, contestou-o a fls 8830 e ss. (que reiterou a fls
11386), pugnando pela sua absolvição.
Por seu turno, o arguido Gabriel Almeida apresentou também contestação a fls
8908 e ss., reiterada com ligeiras diferenças a fls 11389 e ss., onde arrolou testemunhas
e invocou desde logo a ofensa do caso julgado, pois é-lhe imputada uma conduta na
pronúncia quando da respectiva fundamentação resulta que pelo mesmo seria não
pronunciado; quanto ao mais, negou a prática de qualquer crime, tanto mais que só
entrou ao serviço da “Resin” em 01.09.97, sendo por isso alheio a qualquer plano
criminoso que porventura anteriormente tivesse sido acordado entre outros arguidos e a

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que, em todo o caso, não aderiu. Invoca ainda a sua boa conduta anterior e posterior aos
factos.
O arguido António Pereira Mesquita Carvalho deduziu também contestação
escrita, junta a fls 8918 e ss. e com ligeiras diferenças reiterada a fls 11401 e ss., onde
nega a prática do crime que lhe é imputado e invoca a sua boa conduta anterior e
posterior aos factos.
O arguido António José Leite Bragança da Cunha deduziu contestação
escrita a fls 8881 e ss., onde desde logo invoca a inconstitucionalidade do artº 16º, nº 1,
da Lei nº 34/87, de 17.07, por violação dos princípios da exigibilidade ou necessidade,
da proporcionalidade e da adequação, em face da circunstância de no respectivo tipo-
legal se cumular a pena de prisão com pena de multa, sendo certo que, sendo tal norma
inconstitucional (não podendo assim ser aplicada pelo Tribunal), não poderá igualmente
ser aplicada a Lei nº 108/2001, que alterou a Lei nº 34/87, sob pena de violação dos
princípios da não rectroactividade e da legalidade. Além disso, não tendo sido titular de
qualquer cargo político, não lhe pode ser imputado o crime referido na pronúncia no que
a si concerne; quanto ao mais, impugna os factos que lhe são imputados e invocou a sua
integridade e honestidade.
O arguido Guilherme da Silva Almeida, por seu turno, apresentou contestação
escrita a fls. 8866 e ss., reiterada a fls 10933 (tendo arrolado testemunhas), onde, em
síntese, nega a prática dos factos que lhe são imputados; mais invoca factos acerca da
sua vida pessoal, donde emerge que é pessoa socialmente integrada.
O arguido Joaquim Teixeira Pinto também apresentou contestação, junta a fls
8980 e ss. (onde arrolou testemunhas), na qual, em síntese, nega a prática do crime que
lhe é imputado na pronúncia.
O arguido José Manuel Pimenta da Silva deduziu contestação escrita e arrolou
testemunhas a fls 8723 e ss., reiterada a fls 11012 e ss., onde, em síntese, nega a prática
do crime que lhe é imputado e alega factos da sua vida pessoal donde emerge que é
pessoa socialmente bem inserida.
O arguido Carlos Sampaio Teixeira apresentou contestação e rol de
testemunhas a fls 8720 e ss., reiterada a fls 11009 e ss., onde , em síntese, nega a prática
do crime que lhe é imputado e alega factos da sua vida pessoal donde emerge que é
pessoa socialmente bem inserida.
A arguida Maria Augusta deduziu contestação escrita e arrolou testemunhas a
fls 8787 e ss., reproduzida a fls 10924 e ss., onde nega a prática do crime que lhe é
imputado, sendo certo que, na sua óptica, a factualidade descrita na pronúncia se
consubstanciaria, quando muito, na prática de um crime de extorsão pelos arguidos
Fátima Felgueiras e António Bragança da Cunha.
O arguido Horácio Costa deduziu também contestação e arrolou testemunhas a
fls 9031 e ss., reiterada a fls 11533 e ss., onde, em síntese, nega a prática dos factos e
dos crimes que lhe são imputados, alegando, além do mais, que sempre actuou de
acordo com as ordens da arguida Fátima Felgueiras (de quem era assessor), sendo certo
que foi na convicção de que nenhuma ilegalidade havia sido praticada que recebeu da
“Resin” os donativos referidos na pronúncia. Referiu ainda que, em caso de
condenação, a pena a impôr-lhe deverá ser especialmente atenuada.
Realizou-se a audiência de julgamento, com a observância dos formalismos
legais, como da respectiva acta consta.
Na audiência de julgamento foi declarada a prescrição do procedimento
criminal movido contra a arguida Fátima Felgueiras no que respeita ao crime de abuso
de poder de que também veio pronunciada, emergende dos factos constantes do

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capítulo 5º da pronúncia (cfr. despacho de fls 13927, proferido na 94ª sessão de


julgamento).
O julgamento prosseguiu porém para apuramento da demais matéria.
*
O arguido Gabriel Almeida, na sua contestação, suscita a questão da ofensa de
caso julgado.
Cumpre apreciar e decidir:
Conforme adverte Lopes do Rego (citado no Cód Proc. Penal Anotado de Simas
Santos e Leal Henriques, 1º vol., pág.375) a eliminação no Cód. Proc. Penal vigente das
matérias sobre caso julgado estabelecidas no C.P.P.1929 pode originar dificuldades e
levar a situações injustas e inconvenientes.
Com efeito, pese embora o caso julgado não deixe de estar previsto em várias
disposições do actual CPP (v.g. artºs 84º, 396º, nº4, 399º, 400º, 411º, 427º e 467º, nº1),
as mesmas são manifestamente insuficientes para abarcar todo o regime deste instituto.
Dessas dificuldades dá-se conta a jurisprudência, designadamente do STJ,
hesitante entre a solução que, no atinente ao caso julgado, preconiza que se deve
recorrer à regulamentação do Cód. Proc. Civil (v.g. acórdão de 05.07.94) e a posição
que entende dever-se considerar ainda em vigor “as disposições regulamentares do
tema que constavam do C.P.P.1929, na medida em que traduzem os princípios gerais
de direito penal vigentes entre nós”, (como se considera no acórdão de 31.10.91, in
BMJ 410º, pág. 437; e ainda na fundamentação do Assento de 27.01.93; DR-I Série A.,
de 10 de Março – hoje acórdão uniformizador de jurisprudência -, e do Assento nº
3/2000, de 15.12.99, in DR-I Série A, de 11.02.2000, págs. 518 e 519).
Ora, seja qual for o caminho a seguir, no caso presente, é manifesto que assiste
razão ao arguido Gabriel Almeida.
De facto, a questão prévia suscitada prende-se com o facto de no despacho de
pronúncia o arguido Gabriel Almeida ter sido despronunciado pela prática de 2 (dois)
crimes de corrupção activa p. e p. pelo art. 374º do C.P. ou pelo art. 18º, nº 1 da Lei nº
34/87, de 16/07, na redacção dada pela Lei nº 108/2001, de 28/11, e de 1 (um) crime de
participação económica em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1 do referido diploma, e
ambos na forma de cumplicidade, referentes ao capítulo 1º, na medida em que:
- entre os crimes de corrupção activa e os crimes de participação económica em
negócio apenas existe uma relação de concurso aparente;
- não se recolheram indícios suficientes para que o arguido Gabriel fosse
pronunciado por um dos crimes de participação económica em negócio, sob a forma de
cumplicidade, de que também vinha a acusado, conduta essa reportada a uma suposta
entrega de 20.000 cts em Dezembro de 1998 da “Resin” ao FCF, entrega essa efectivada
– segundo a acusação - através desse arguido, juntamente com o arguido Carlos
Marinho, ao arguido Horácio Costa, o qual encaminhou tal verba para o FCF.
Ora, como é bom de ver, tendo sido despronunciado pela prática daquela
conduta (além do mais por não se terem recolhido indícios suficientes de que ele tenha
acompanhado o arguido Carlos aquando da entrega dessa verba), não pode depois o
despacho de pronúncia voltá-la a incluir no corpo dos factos imputados aos arguidos,
sob pena da decisão ser entre si contraditória, ainda que apenas venha a imputar a
prática do crime em causa ao arguido Carlos Marinho.
Tendo presente o objecto do processo, tal como delimitado pela acusação e
depois comprimido pela pronúncia, é forçoso concluir que, em face da respectiva
fundamentação, a menção da pessoa do arguido Gabriel a fls 10348, correspondente à
página 138 daquele despacho – no segmento “Em 30/12/98, o arguido Horácio Costa
foi então contactado, nas instalações da CMF, pelos arguidos Gabriel Ferreira de

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Almeida e por Carlos Marinho (quadros superiores da “RESIN”)” -, se deveu a mero


lapso ao decalcar-se a segunda da primeira pronúncia proferida nos autos, numa
operação informática de copy e paste.
Consequentemente, na procedência da excepção em causa, dá-se como não
escrita a menção ao arguido Gabriel Almeida no segmento em causa do despacho
da pronúncia, acima transcrito.
*
O arguido Júlio Faria, na sua contestação ao PIC, suscitou a questão da
irregularidade da representação do Município de Felgueiras pelo MP.
Cumpre apreciar e decidir:
O MP deduziu o PIC de fls 6214 e ss., em representação do Município de
Felgueiras, ao abrigo do disposto nos artgs 3º, nº 1, al. a), e 5º, nº 1, al. b), da Lei nº
60/98, de 27.08.
O arguido Júlio Faria entende que o MP apenas tem uma intervenção meramente
acessória na instância cível, tanto mais que a CMF não solicitou que o MP a
representasse para esse efeito.
Sucede que a fls 6052 a CMF, representada pelo seu vice-presidente, manifestou
a intenção de deduzir PIC (caso viessem a ser provados prejuízos), solicitando para o
efeito a intervenção do MP (portanto, em representação do respectivo município).
Cai assim pela base a argumentação que a propósito foi aduzida pelo arguido
Júlio Faria, pelo que se julga improcedente a excepção dilatória em causa.
*
No mais, mantêm-se os pressupostos de validade e de regularidade da instância
verificados no momento da prolação do despacho que designou dia para audiência de
julgamento, inexistindo, por conseguinte, circunstâncias com a virtualidade de obstarem
ao conhecimento do mérito da causa.

***

FUNDAMENTAÇÃO

I – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 1
a) – FACTOS PROVADOS:
1. Factos provados relacionados com o 1º Capítulo da pronúncia
1.1. A propósito da Introdução.
A “RESIN – Resíduos Industriais, Ldª, com sede em Matosinhos, é uma
sociedade que inicialmente tinha por objecto a recolha, transporte, deposição e
tratamento de todos os tipos de resíduos industriais, bem como a exportação de resíduos
industriais tóxico-perigosos, representação, importação e comercialização de
equipamentos e ainda estudos e projectos técnicos de despoluição, sendo certo que mais
tarde o respectivo objecto social foi alterado/alargado, mantendo-se porém sempre
vocacionada para a área do tratamento dos lixos.
Por escritura realizada em 26.05.92, a “Resin – Resíduos Industriais, Ldª”
procedeu a uma cessão de quotas passando a sociedade “Societé Industielle de
Transports Automobilles – Sita” a ter uma quota equivalente a 14.300.000$00, num
capital global de 52.000.000$00.

1
A propósito da motivação de facto, o Tribunal não tomará posição acerca de comentários, conclusões e
matéria de direito contida na pronúncia, no PIC e nas contestações.

8
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

E em 05.04.94 a “Resin – Resíduos Industriais, Ldª” foi transformada em


sociedade por acções, nominativas e ao portador, passando a ter a designação “Resin -
Resíduos Industriais, SA”.
Em meados de 1995 a “Empresa de Construções e Obras Públicas Arnaldo de
Oliveira, SA” (“ECOP”) adquiriu 116.108 acções da “Resin - Resíduos Industriais,
SA”, passando assim a ser accionista da mesma.
Essa empresa dedicava-se, desde 1989 e de uma forma inovadora no nosso país,
à resolução dos problemas relacionados com os resíduos em diversas autarquias, sendo
uma das poucas empresas que, à data, em Portugal, tinha capacidade para tratar
convenientemente quer dos resíduos sólidos urbanos quer dos resíduos industriais.
De facto, conforme já referido, a partir de Maio de 1992 a “Societé Industielle
de Transports Automobilles – Sita” passou a ser sócia da “Resin – Resíduos Industriais,
Ldª”, pelo que a partir desse momento esta última começou a apresentar o seu know how
às autarquias portuguesas no que se refere à recolha de resíduos sólidos urbanos, ao
tratamento do lixo e à construção e manutenção de aterros sanitários.
À data, em Portugal, o assunto era ainda pouco explorado e poucas empresas se
dedicavam a tal mercado.
Em 1993, a “Resin”, juntamente com a sua sócia francesa, resolveram levar a
cabo uma campanha de sensibilização junto de autarcas e técnicos para o que já se fazia
neste âmbito na Europa, com vista a definitivamente terminar em Portugal com as
lixeiras a céu aberto e com os perigos para a saúde pública a estas inerentes.
Assim, foi efectuada uma acção comercial pela “Resin” em diversas câmaras
municipais do Vale do Sousa, do Planalto Beirão e do Grande Porto.
Foram estudadas as lixeiras e apresentadas propostas para as transformar, tendo
as diversas autarquias analisado as propostas apresentadas com a garantia do sucesso.
Nessa altura, a situação da lixeira de Sendim caracterizava-se pela deposição
descontrolada dos resíduos e pela sua autocombustão, com a inerente proliferação de
cheiros, fumos e insectos, com riscos ambientais e para a saúde pública.
Ora, a contratação de facto da “Resin” pela CMF para operar na lixeira de
Sendim (primeiro para a reabilitar sumariamente e depois para a explorar), sendo uma
das poucas empresas em Portugal que na altura (em 1993) tinha capacidade para tratar
dos resíduos sólidos urbanos e industriais, deveu-se ao facto da edilidade ter-se visto
confrontada de forma eminente com a circunstância de não ter local onde depositar tais
resíduos, na medida em que o dono do respectivo terreno, a testemunha Menezes Basto,
cessado o respectivo contrato de locação desse imóvel com a CMF, não pretendia
permitir a continuação dessa deposição nos moldes descontrolados que até então se
verificavam, em face, designadamente, dos cheiros e dos fumos provocados pela
combustão dos resíduos no local, com prejuízo para o meio ambiente e para a saúde
pública das populações que então viviam nas imediações dessa lixeira, o que aliás era
alvo de contestação popular.
Foi pois por isso que em Agosto de 1993 o arguido Júlio Faria, então presidente
da CMF (e que havia tomado conhecimento da “Resin” numa das acções de marketing
acima referidas), contactou telefonicamente com urgência o arguido Vítor Borges (que
então gozava férias no Algarve), no sentido deste se deslocar de imediato a Felgueiras –
o que fez - e de apresentar uma solução satisfatória para o tratamento dos resíduos na
lixeira de Sendim, reabilitando-a, de modo a convencer o dono do respectivo terreno a
permitir a continuação da deposição (controlada) dos resíduos sólidos urbanos e
industriais do concelho felgueirense.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Verificava-se aliás, ao tempo, grande oposição da população de Sendim à


continuação da deposição descontrolada dos resíduos naquele local, chegando ao ponto
de ocorrer manifestações, pelas razões já referidas.
A “Resin” apresentou então uma proposta (à CMF e à testemunha Menezes
Basto) de resolução dos problemas que diariamente surgiam na lixeira de Sendim,
convencendo-os dos seus bons serviços nessa área.
Foi na sequência desse contacto e dessa proposta que a “Resin” passou então a
operar na lixeira de Sendim a partir de Dezembro de 1993, primeiro numa missão de
reabilitação sumária, que durou 6 meses, e depois de exploração até ao respectivo
encerramento.
Tendo executado, ainda que recorrendo a outras empresas, os serviços
necessários à reabilitação da lixeira de Sendim e tendo procedido posteriormente à
respectiva exploração, colocou-se desde logo o problema do pagamento desses serviços,
já que inexistia qualquer suporte contratual que o permitisse e a CMF, por razões de
ordem legal e administrativa, à data, não podia contratar directamente com a “Resin”, de
modo que os responsáveis camarários viram-se na necessidade de encontrar expedientes
aparentemente legais que permitissem à edilidade proceder aos respectivos pagamentos.
Assim, para que fosse possível à CMF proceder de facto ao pagamento dos
serviços prestados pela “Resin” na lixeira de Sendim, os arguidos Júlio Faria, Fátima
Felgueiras e Vítor Borges precisavam de superar uma dificuldade adicional que
consistia em a “RESIN” não possuir alvará de construção civil e obras públicas que lhe
permitisse executar empreitadas de tratamento de resíduos sólidos urbanos, bem como o
facto da CMF, até Dezembro de 1994, não ser a proprietária dos terrenos onde se
situava a lixeira de Sendim.
Ora, para ultrapassar essa questão da falta do alvará legalmente exigido e do
facto da edilidade não ser a proprietária do terreno onde os lixos eram depositados, foi
então necessário utilizar suportes formalmente legais que permitissem à CMF justificar
o pagamento de tais empreitadas à “RESIN”, seja aparecendo como oponente aos
concursos públicos consorciada com outras empresas, seja apresentando declaração de
que os trabalhos seriam realizados por uma outra empresa a ela associada, seja
aparecendo uma empresa àquela ligada como oponente (simulada) aos referidos
concursos.
Para esse efeito, o arguido Vítor Borges, da “RESIN”, lançou mão das relações
privilegiadas que tinha com as empresas “Norlabor – Sociedade de Prestação de
Serviços, Lda.”; “Craveira – Sociedade de Construção e Obras Públicas e
Empreendimentos, Lda.”; “Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, S. A.” e
“ECOP – Empresa de Construções e Obras Públicas Arnaldo Oliveira, S. A.”,
nomeadamente celebrando com tais empresas contratos de consórcio que lhe permitiram
concorrer aos referidos concursos públicos limitados.
Assim, a empresa “Norlabor – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda.”,
a) em Abril de 1995, celebrou, com a “RESIN”, um contrato de
Consórcio tendo como objecto a manutenção e exploração (até ao seu
encerramento definitivo), do Aterro de Sendim – Felgueiras;
b) dois dos seus sócios, José António de Barros de Sousa e Carlos
Ferreira de Sousa, eram, simultaneamente, sócios da empresa
“Craveira – Sociedade de Construções e Obras Públicas e
Empreendimentos, Lda.” e da empresa “TRANSLOUSADA –
Sociedade de Aluguer de Equipamentos, S. A.”;

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

c) venceu os concursos (para adjudicação das empreitadas de


construção) de cinco dos nove Ecopontos, promovidos e adjudicados
pela AMVS;
d) prestou serviços para a “RESIN”, em regime de subempreitada, no
encerramento das lixeiras dos municípios integrados na AMVS
(trabalhos inseridos nas empreitadas de construção dos Aterros
Intermunicipais e RIB).
A empresa “Craveira – Sociedade de Construção e Obras Públicas e
Empreendimentos, Lda.”, que tinha sócios comuns à “Norlabor – Soc. de Prestação de
Serviços, Lda.” e à “Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, S. A.”, veio a
ser oponente em diversos concursos lançados em execução do plano delineado, para
completar o número mínimo de concorrentes necessário para a validade formal do
concreto procedimento imposto por lei de acordo com o valor da obra, embora nenhuma
empreitada lhe tenha sido adjudicada.
A empresa “Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, S. A.”:
a) prestou durante vários anos, serviços para a “RESIN”,
nomeadamente, fornecendo material para esta operar nas
lixeiras/aterros (designadamente, na lixeira de Sendim);
b) prestou vários serviços para a “RESIN”, em regime de
subempreitada, no encerramento das lixeiras dos municípios
integrados na AMVS (trabalhos inseridos nas empreitadas de
construção dos aterros intermunicipais e RIB);
c) prestou serviços, de forma directa, para a CMF, serviços estes
relacionados com a manutenção e reparação de máquinas e viaturas;
d) tinha sócios comuns à “Norlabor” e à “Craveira”.
A empresa “ECOP – Empresa de Construções e Obras Públicas Arnaldo
Oliveira, S. A.”;
a) adquiriu durante o ano de 1995, 20% das acções da sociedade
“RESIN”, situação que se manteve até ao ano de 1999;
b) concorreu e venceu, associada à “RESIN”, os três concursos lançados
pela AMVS para a construção dos Aterros Intermunicipais e
Resíduos Industriais Banais (RIB).
A “Translousada” tinha, de forma directa ou indirecta, interesse em manter um
bom relacionamento com a autarquia de Felgueiras, quer nos pagamentos efectuados
pela CMF à “RESIN”, quer relativamente à movimentação dada a tais quantias, na
medida em que a sua colaboração seria essencial para que também visse os seus
serviços prestados para a “Resin” posteriormente pagos por esta, uma vez que esta
pagaria àquela na medida em que recebesse da CMF, pese embora, não obstante esse
acordo, tenha sucedido ter recebido pagamentos da “Resin” antes desta ter recebido da
CMF.
Ora a arguida Fátima Felgueiras e o arguido Júlio Faria necessitavam de obter
verbas monetárias que lhes permitissem financiar as suas actividades partidárias, com
valor superior ao que poderiam obter pelos usuais métodos de angariação de fundos
para esse objectivo (isto é, recorrendo designadamente ao tecido empresarial
felgueirense no sentido de obter donativos, cada um dos quais não ultrapassando
usualmente as centenas de contos), e ainda custear despesas pessoais, designadamente
da arguida Fátima Felgueiras.
Assim, pelo menos em Abril de 1995, e aproveitando o facto de terem um bom
relacionamento pessoal e de negócios com o arguido Vítor Manuel da Silva Borges,
administrador da empresa “RESIN – Resíduos Industriais, S. A.”, e que vinha prestando

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

serviços para a CMF na lixeira de Sendim, Felgueiras, desde Dezembro de 1993 (antes
disso inexistiu qualquer relacionamento entre essa empresa e a CMF), ambos os
arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria combinaram e acordaram com aquele
um esquema que lhes permitisse obter as pretendidas verbas para financiamento das
respectivas actividades partidárias, entre as quais a campanha eleitoral referente às
eleições autárquicas de 1997, sob a aparência de resolução da questão do tratamento dos
resíduos sólidos urbanos com que a autarquia se deparava, aproveitando o lançamento
do concurso limitado denominado de “Manutenção do Aterro Sanitário – Execução de
Plataformas”.
Tal esquema consistia assim em, sob impulso ou influência dos arguidos Maria
de Fátima Felgueiras e Júlio Faria na tomada de decisão nos órgãos autárquicos em que
participavam, favorecer a “RESIN” num futuro concurso público de adjudicação de uma
empreitada relacionada com o tratamento e recolha de resíduos sólidos urbanos – pois
era ela quem de facto operava na lixeira de Sendim -, concurso esse a abrir pela Câmara
Municipal de Felgueiras, e ainda celebrando, para o efeito, um contrato simulado com a
empresa “Norlabor” (que seria, como combinado, a vencedora desse concurso limitado,
mas que nada viria a fazer na lixeira, nem tal era suposto), de modo a que os
pagamentos efectuados pela edilidade no âmbito dessa empreitada tivessem como
destinatária final a “Resin”- como forma de pagamento da exploração da lixeira de
Sendim no período imediatamente subsequente ao da reabilitação - e ainda de modo a
que parte desses pagamentos revertessem para os ditos arguidos Fátima Felgueiras e
Júlio Faria, por forma a, desse modo, financiarem as respectivas actividades partidárias,
designadamente a campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997 e ainda
para custear, designadamente, algumas despesas de índole pessoal daquela.
Com efeito, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria, enquanto
presidentes da autarquia felgueirense, influenciavam os órgãos decisórios da Câmara e
da Assembleia Municipal, perspectivando que as respectivas propostas viriam a ser
aprovadas desde que surgissem com a aparência de acto com objecto e forma legal,
assim instrumentalizando os elementos que integravam tais órgãos, levando-os, de boa-
fé, a votar favoravelmente.
É nesse contexto que a arguida Fátima Felgueiras nunca tomou qualquer espécie
de decisão individual em matéria de tratamento dos lixos municipais, quer antes quer
depois de assumir funções como presidente da CMF, estando todo o relacionamento
desenvolvido com o proprietário dos terrenos da lixeira e com a “Resin” coberto por
deliberações colectivas unânimes da CMF (com excepção da deliberação de 05.05.90,
que foi tomada por maioria, com a abstenção da arguida Fátima e de outro vereador),
por contratos (alguns dos quais simulados) celebrados em execução dessas deliberações,
por pareceres técnicos dos serviços técnicos competentes e da assessoria jurídica da
CMF e por vistos do Tribunal de Contas que precederam sempre os pagamentos devidos
por força dos contratos celebrados (alguns dos dos quais simulados).
Por sua vez, o arguido Vítor Borges comprometeu-se a entregar aos arguidos
Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria, como contrapartida por tal adjudicação e
contrato (que viria a ser celebrado entre a CMF e a “Norlabor”), uma parte das verbas
que fossem pagas de facto à “Resin” pela CMF, através das pessoas que por estes
fossem indicadas, estabelecendo dentro da sua empresa, com a colaboração do arguido
Carlos Marinho, procedimentos contabilísticos que ocultassem essas entregas, com
recurso, se necessário, à obtenção de facturas falsas (designadamente, facturas emitidas
à “Translousada” pela “Resin”, sem que na realidade estivesse subjacente a prestação de
qualquer serviço desta àquela, por forma a que contabilisticamente estivesse justificada
a transferência de verbas entre essas empresas).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Para que este esquema funcionasse com benefício para todos os interessados
seria celebrado, conforme já referido, um contrato simulado com a empresa “Norlabor”,
que formalmente seria a vencedora do concurso limitado mencionado, mas que nada
viria a fazer na lixeira de Sendim, nem era suposto fazer, pois os respectivos trabalhos, à
data da celebração do respectivo contrato de empreitada, já haviam sido concluídos pela
“Resin”.
Neste contexto, já em data indeterminada de meados de 1995, a arguida Maria
de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida de Sousa Oliveira, então vereadora na Câmara
Municipal de Felgueiras e braço direito do arguido Júlio Manuel Castro Lopes Faria,
então presidente daquela autarquia, tomou conhecimento que este último tinha a
intenção de se candidatar nas listas do Partido Socialista a um lugar de deputado na
Assembleia da República, nas eleições legislativas de 1995 (antes de meados desse ano
o arguido Júlio Faria não perspectivava sequer ser candidato pelas listas do PS a um
lugar de deputado à Assembleia da República).
Face a tal intenção, e sabendo que poderia ser a sucessora do arguido Júlio Faria
na autarquia de Felgueiras, a arguida Maria de Fátima Felgueiras resolveu começar,
desde logo, a preparar a campanha, que pretendiam grandiosa, para a sua candidatura à
presidência da Câmara Municipal de Felgueiras nas eleições autárquicas que se iriam
realizar no ano de 1997, o que tornou mais premente a necessidade de angariação de
fundos.
Depois da arguida Maria de Fátima Felgueiras ter acordado com os restantes
arguidos todos os pormenores e aspectos referentes ao esquema de movimentação de
verbas que lhe iria permitir obter quantias para financiar a sua campanha eleitoral e
despesas conexas, aquela necessitava de arranjar duas pessoas da sua inteira confiança e
que estivessem disponíveis para abrir uma conta bancária, onde pudesse depositar as
quantias monetárias provenientes da “RESIN”, bem como os vários donativos que
entretanto iria angariar junto dos industriais e munícipes do concelho de Felgueiras.
Assim, e com tal objectivo, em meados do mês de Março de 1997, os arguidos
Júlio Faria e Maria de Fátima Felgueiras deram ordens aos arguidos Horácio Costa (que
na altura exercia de facto o cargo de assessor da presidente da CMF) e Joaquim de
Freitas para que abrissem na agência bancária de Felgueiras do Banco Espírito Santo
uma conta titulada apenas por ambos (Horácio Costa e Joaquim de Freitas), destinada à
movimentação das quantias angariadas e/ou utilizadas para o pagamento de várias
despesas da sua campanha eleitoral, competindo a orientação e direcção efectiva de tal
conta bancária aos arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria.
Evitar-se-ia, através de tal esquema, que fosse possível imputar à arguida Maria
de Fátima Felgueiras qualquer ligação oficial com as contas bancárias do Partido
Socialista de Felgueiras, o que lhe permitiria, simultaneamente, não só escapar ao
controle daquele partido sobre tais verbas, mas também efectuar várias despesas, tanto
de cariz pessoal como de cariz promocional da sua campanha eleitoral, sem ter de
prestar quaisquer contas.
O dito arguido Horácio Costa, aliás, havia iniciado as suas funções na CMF
como assessor pessoal da presidente da edilidade a 01.10.96, funções essas que viriam a
cessar a 31.12.98, passando a 01.01.99 a exercer as funções de vereador em regime de
permanência, as quais viriam a terminar a 01.03.2000, por despacho da arguida Fátima
Felgueiras (antes de ingressar na CMF como assessor nunca tinha exercido funções de
índole semelhante, estando mesmo completamente desintegrado da vida política e
autárquica local).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esse arguido agiu sempre sob as ordens e instruções da arguida Fátima


Felgueiras e do arguido Júlio Faria, existindo, pelo menos até princípios de 2000, uma
relação de grande confiança entre os arguidos Hoácio Costa, Fátima Felgueiras e Júlio
Faria.

1. 2. - A propósito do contrato de transacção celebrado entre a CMF e o


engenheiro Joaquim Menezes de Basto.
Os arguidos Júlio Faria, Maria de Fátima Felgueiras e Vítor Manuel da Silva
Borges, agindo em conjugação de esforços e de intenções, de modo a resolver o
problema da deposição descontrolada dos resíduos na lixeira de Sendim e de encontrar
um expediente que legalmente permitisse à edilidade pagar a missão de reabilitação
sumária da lixeira, aproveitaram as relações já existentes entre a CMF e o Eng. Joaquim
Menezes Basto, desde meados do ano de 1990, advindas de vários contratos de locação
referentes ao prédio rústico, a este pertencente, denominado “Tapada Grande da
Devesinha”, sito no Lugar de Francoim, Sendim, Felgueiras, com a área aproximada de
3.000 m2, onde eram depositados os resíduos sólidos urbanos do concelho de Felgueiras
e no qual a empresa “RESIN”, designadamente através da “Translousada”, desde
Dezembro de 1993, passou a efectuar trabalhos para a CMF e que se prolongaram até ao
encerramento dessa lixeira.
Estes contratos entre a CMF e o Eng. Joaquim Menezes Basto vigoravam desde
01.6.1986, tendo sido renegociadas novas condições que produziram efeitos nos
períodos compreendidos entre 01.11.1990 e 31.01.1991, 01.02.1992 e 31.07.1992 e
1.02.1993 e 31.08.1993.
As cláusulas contratuais vigentes no ano de 1993, decorrentes das condições
introduzidas desde 1990, estipulavam:
• o pagamento, pela CMF, de uma renda de Esc. 150.000$00/mês;
• a devolução do terreno ao seu proprietário, devidamente limpo e
após cobertura com terra dos resíduos depositados, no final do
período estabelecido, e
• para o caso de incumprimento da anterior, a cláusula penal
compulsória de Esc. 60.000$00 por cada dia de mora na entrega
do imóvel
Pretendendo realizar um contrato de empreitada com a “RESIN” que, como
acima exposto, não possuía o necessário alvará, os ditos arguidos resolveram aproveitar
uma reclamação do Eng. Joaquim Menezes Basto (quanto à forma como os resíduos
continuavam a ser descontroladamente depositados no seu imóvel) para o interpor como
contratante da mesma pelo que, enquanto a CMF negociava a aquisição do terreno em
causa, decidiram propor ao executivo municipal a celebração, com este, de um outro
contrato que lhes permitisse alcançar tal desiderato.
Para o efeito, no dia 01.10.1993, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, na
qualidade de vereadora da CMF, apresentou ao executivo camarário (que a aprovou na
sessão realizada em 04.10.1993), uma proposta, elaborada por si ou pelos serviços sob
sua directa orientação, invocando a existência de “... diversos estragos e deteriorações
causados pela deficiente acomodação dos lixos e respectivas infiltrações.”, bem como
o facto de não ter sido possível encontrar outro terreno para aquela finalidade,
pretextando ainda “... evitar o recurso a Juízo a fim de ser determinado o direito de
cada parte e a respectiva indemnização ...” de celebração de um contrato de transacção
com o Eng. Joaquim Menezes Basto, “visando o pagamento de Esc. 32.410.480$00
(trinta e dois milhões, quatrocentos e dez mil e quatrocentos e oitenta escudos) ... a
título de indemnização por todos os danos emergentes dos contratos de locação...”, que

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

englobava uma compensação no montante de Esc. 6.500.000$00, já assumida pela


CMF, e uma indemnização por mora relativa ao último contrato de locação (01.02.1993
e 31.08.1993), no valor de 7.200.000$00. Este valor seria liquidado em sete prestações
mensais – as primeiras seis no montante de Esc. 5.235.080$00 e a última de Esc.
1.000.000$00 -, ficando os pagamentos condicionados à obtenção do visto do Tribunal
de Contas (TC).
Este contrato foi outorgado no dia 25.11.1993, nos exactos termos da proposta
supra referida, nele se estipulando:
• a obrigação, para a CMF, de recuperação, aterro e nivelamento do
terreno objecto do contrato, no prazo de seis meses, por
intermédio de um terceiro escolhido pelos contraentes (CMF e
Joaquim Menezes Basto);
• a obrigação, para o vendedor, de proceder a “...uma missão de
reabilitação sumária e de exploração provisória do aterro, com
execução regular e faseada, nos termos das condições técnicas
constantes de documento anexo”; e
• o direito de a CMF suspender o pagamento das prestações,
relativas à indemnização indicada, caso os trabalhos não
estivessem a ser executados de acordo com as condições técnicas
constantes de um anexo ao contrato.
Na execução do que tinha sido previamente acordado entre os arguidos Maria de
Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Vítor Borges, o “terceiro escolhido” para reabilitar e
explorar o aterro foi a “RESIN”.
Uma vez que a reabilitação do terreno constituía obrigação do vendedor,
ultrapassava-se por esta via o impedimento legal da “RESIN” não ser possuidora de
alvará para executar tal empreitada e do terreno à data não pertencer à autarquia, pois
era contratada por um particular – o Eng. Menezes Basto.
Entretanto, a CMF negociara com o Eng. Joaquim Menezes Basto a aquisição do
terreno em causa e, com base em proposta igualmente apresentada pela arguida Maria
de Fátima Felgueiras fundada nos mesmos argumentos que suportaram a proposta de
contrato de transacção, decidiu, na mesma sessão de 04.10.1993, celebrar com aquele
um contrato-promessa de compra e venda tendo por objecto o terreno onde vinham
sendo depositados os lixos recolhidos na área abrangida pelo concelho de Felgueiras.
A outorga deste contrato realizou-se em 22.11.1993 sendo aquele município
representado pelo seu presidente, o arguido Júlio Faria.
O preço acordado foi de Esc. 25.754.820$00 (vinte e cinco milhões, setecentos e
cinquenta e quatro mil e oitocentos e vinte escudos), embora ficando a constar apenas a
quantia de Esc. 24.754.820$00 (vinte e quatro milhões, setecentos e cinquenta e quatro
mil e oitocentos e vinte escudos) que seria paga em diversas prestações mensais - uma
prestação inicial de Esc. 2.750.540$00 e oito prestações sucessivas de Esc.
2.750.535$00, condicionado à obtenção de visto do Tribunal de Contas, mas evitando a
sua apreciação pela Assembleia Municipal.
Nesse contrato estipulava-se que:
• a escritura definitiva seria celebrada na primeira quinzena de
Abril de 1994;
• a transmissão da posse ocorreria por mero efeito do contrato
promessa;
• a CMF obrigava-se a construir um aterro sanitário no final do
período de exploração provisória da lixeira,

15
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

• podendo adquirir, se necessário, mais terreno ao Eng. Joaquim


Menezes Basto,
• ou este exigir uma indemnização à CMF em caso de
incumprimento da construção e/ou reparação do aterro.
A diferença – Esc. 1.000.000$00 – veio a ser paga por retenção de valores
referentes ao contrato de transacção.
Em 29.03.1994, a CMF procedeu ao pagamento da quantia de Esc.
5.235.080$00 (cinco milhões, duzentos e trinta e cinco mil e oitenta escudos),
correspondente à primeira prestação dos valores referidos no contrato de transacção
celebrado com o Eng. Joaquim Menezes Basto.
Em 07.04.1994, a “RESIN” assumiu as despesas decorrentes da sujeição a visto
do TC do contrato de transacção celebrado entre a CMF e o Eng. Joaquim Menezes
Basto, no valor de Esc. 32.411$00 (trinta e dois mil e quatrocentos e onze escudos).
A escritura definitiva do contrato prometido, isto é, a escritura de compra e
venda do terreno propriedade do Eng. Joaquim Menezes Basto apenas foi celebrada no
dia 27.12.1994, nos exactos termos do referido contrato promessa, tendo a CMF sido
representada pelo Presidente Júlio Faria.
Pela missão de reabilitação da lixeira de Sendim (que durou entre Dezembro de
1993 e Maio de 1994) levada a cabo pela “Resin”, esta viria a facturar e a receber da
testemunha Menezes Basto as quantias referidas infra.
Ora, findo o período de reabilitação sumária da lixeira de Sendim levada a cabo
pela “Resin”, mostrava-se necessário manter a intervenção no local, com vista a impedir
que o depósito diário de lixos voltasse a transformar o terreno já sumariamente
reabilitado numa nova lixeira a céu aberto.
Assim, findo o dito período de reabilitação da lixeira de Sendim, em Maio de
1994, a “Resin” propôs-se a continuar o trabalho mediante o pagamento mensal da
quantia de 2.800.000$00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, o que fez
ininterruptamente até Abril de 1997.
Como, em face do contrato-promessa de compra e venda já referido, se previa
que findo o período da reabilitação da lixeira de Sendim a CMF já tivesse adquirido o
terreno acima identificado, a “Resin” facturou à CMF os serviços prestados na lixeira de
Sendim entre Junho de 1994 e Janeiro de 1995.
Porém, uma vez que a escritura pública de compra e venda de tal terreno não se
realizou na data constante do respectivo contrato-promessa (o que só viria a suceder em
27 de Dezembro de 1994, mas cujos efeitos financeiros só se produziriam em Janeiro de
1995 por força do visto do Tribunal de Contas), a CMF devolveu essas facturas à
“Resin” por falta de suporte legal para o respectivo pagamento, pelo que esta empresa
decidiu facturar esses serviços à testemunha Menezes Basto.
Entretanto, em Junho de 1995, a arguida Maria de Fátima Felgueiras assumiu a
presidência da Câmara Municipal de Felgueiras, em substituição do arguido Júlio Faria,
que entretanto suspendera o seu mandato e posteriormente viria a desempenhar funções
de deputado na Assembleia da República.
Já nessa condição, em 08.02.1996, a arguida Maria de Fátima Felgueiras fez
elaborar e submeteu à aprovação do executivo camarário, uma proposta de aditamento
ao contrato de transacção celebrado com o Eng. Joaquim Menezes Basto, alegando para
o efeito as seguintes razões:
a) a existência de um contrato promessa de compra e venda de uma parcela de
terreno destinado à deposição de lixos, celebrado entre a CMF e o Eng. Joaquim
Menezes Basto, em Novembro de 1993;

16
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

b) o facto de a celebração do contrato definitivo só ter ocorrido em 27.12.1994,


quando deveria ter sido celebrado em Abril de 1994, conforme constava do texto do
contrato;
c) que, até essa data, o proprietário do terreno tinha assegurado a reabilitação
sumária e a exploração provisória do aterro; e
d) que este tinha reclamado, junto da CMF, o pagamento desses serviços, no
montante de Esc. 26.462.000$00 (vinte e seis milhões e quatrocentos e sessenta e dois
mil escudos);
propondo assim aquela arguida à Câmara Municipal de Felgueiras o pagamento
de uma indemnização naquele montante pela continuidade dos trabalhos de reabilitação
e exploração do aterro, a ser processado de forma faseada (sete prestações mensais de
Esc. 3.248.000$00 e uma prestação de Esc. 3.726.000$00), dependente de visto do TC.
Depois de aprovado em reunião do executivo, através da influência exercida pela
arguida Maria de Fátima Felgueiras para o efeito, a CMF e o Eng. Joaquim Menezes
Basto celebraram o referido aditamento ao contrato de transacção, que mais não visou
que o pagamento à “Resin” dos trabalhos por esta levados a cabo na lixeira controlada
de Sendim entre Junho de 1994 e Janeiro de 1995.
Deste modo, e nos termos constantes dos contratos de compra e venda,
transacção e respectivo aditamento, o Eng. Joaquim Menezes Basto teria a receber da
CMF a quantia de Esc. 83.618.300$00 (oitenta e três milhões, seiscentos e dezoito mil e
trezentos escudos).
No entanto, a CMF apenas pagou ao Eng. Joaquim Menezes Basto as seguintes:
a) o valor total do contrato de compra e venda (Esc. 24. 754. 820$00);
b) Esc. 37.645.560$00 (trinta e sete milhões, seiscentos e quarenta e cinco mil e
quinhentos e sessenta escudos) relativo ao contrato de transacção;
No que concerne ao aditamento ao contrato de transacção, a CMF não chegou a
pagar a importância correspondente a tal contrato, tendo-se considerado o seu valor em
dívida, acabando o mesmo por transitar, sucessivamente, de um ano para o outro, nos
orçamentos apresentados pela edilidade (situação que se mantém até hoje).
As verbas recebidas pelo Eng. Joaquim Menezes Basto no âmbito do contrato de
transacção e seu aditamento foram depois transferidas por este para a “RESIN”, de
acordo com o que tinha combinado com os arguidos supra referidos.
Assim, endossou à “RESIN” os seguintes cheques:
- n.º 5207652505, emitido pela CMF no dia 30/03/1994, sacado sobre a conta n.º
00002179630, da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
5.235.080$00;
- n.º 8284328904, emitido pela CMF no dia 22.06.1995, sacado sobre a conta n.º
00002179630 da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
17.000.000$00;
- n.º 9811598309, emitido pela CMF no dia 25.06.1995, sacado sobre a conta n.º
00002179630 da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
6.000.000$00.
O quarto cheque recebido pelo Eng. Joaquim Menezes de Basto da CMF, com o
n.º 8284328997, sacado sobre a conta n.º 00002179630 da Caixa Geral de Depósitos,
agência de Felgueiras, no montante de Esc. 11.000.000$00 (onze milhões de escudos),

17
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

não foi endossado à “RESIN”, devido ao facto de apenas uma parte do seu montante (no
caso Esc. 5.000.000$00), se destinar àquela empresa.
Na verdade, o remanescente de tal cheque, no valor de Esc. 6.000.000$00,
pertencia ao próprio Eng. Joaquim Menezes Basto e dizia respeito ao valor da compra e
venda do terreno, nele se incluindo a diferença de mil contos atrás mencionada. Visando
resolver tal diferença de verbas, o mesmo não endossou o cheque à “RESIN”, tendo
antes emitido um cheque próprio com o n.º 22543202, sacado sobre a conta n.º 211776,
da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, agência de Felgueiras, no valor de Esc.
5.000.000$00, entregando-o de seguida àquela empresa.
Para pagamento dos restantes Esc. 4.410.480$00, a CMF emitiu e entregou ao
Eng. Joaquim Menezes Basto o cheque n.º 2668265232, datado de 25.06.1995, sacado
sobre a conta n.º 00002179630, da Caixa Geral de Depósitos, agência de Felgueiras, que
este depositou na conta n.º 132040013061807, da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo,
agência de Felgueiras, no dia 26.06.1998.
Desta quantia entregou Esc. 3.410.480$00 à “RESIN”, em numerário e
faseadamente, obtendo recibo global.
Correspondem, assim, os valores facturados pela “RESIN” ao Eng. Joaquim
Menezes de Basto aos pagamentos efectuados pela CMF a este último, tanto no âmbito
do contrato de transacção, como no âmbito do seu aditamento.
Entretanto, a “RESIN”, como não recebeu do Eng. Joaquim Menezes Basto a
totalidade da quantia referente ao aditamento ao contrato de transacção, porque a
mesma lhe não foi paga pela CMF, em 27 de Novembro de 1998, decidiu constituir uma
provisão para créditos de cobrança duvidosa, no montante de Esc. 24.187.400$00 (vinte
e quatro milhões, cento e oitenta e sete mil e quatrocentos escudos), no pressuposto de
que esse valor, lançado a débito na conta do cliente Joaquim Menezes Basto, seria de
cobrança difícil ou impossível - saldo reportado a 30.06.96 e a 31.08.97.

1. 3. - A propósito do concurso e adjudicação da empreitada de "Manutenção


do Aterro Sanitário - Execução de Plataformas”.
A “Resin”, não obstante por diversas vezes ter comunicado à CMF que poderia
parar o trabalho que desenvolvia na lixeira de Sendim caso não obtivesse o respectivo
pagamento, foi adiando tal tomada de posição, pois sempre acreditou na boa-fé e na
vontade de cumprir dos representantes desta.
Com a celebração do contrato de compra e venda do terreno por parte da CMF à
testemunha Menezes Basto, em 27.12.94, passou então a ser necessária a realização de
concursos (ou a desencadear procedimentos administrativos com vista ao ajuste directo)
para a adjudicação dos trabalhos de empreitada na lixeira, por forma a pagar à “Resin”
os trabalhos que esta levava a cabo no local.
Assim, pelo menos em Abril de 1995, na execução do plano acordado e acima
referenciado, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Vítor Borges
resolveram, em conjugação de esforços e de intenções, simular a realização de um
concurso público que permitisse à Câmara Municipal de Felgueiras pagar a prestação
dos serviços efectuados pela “RESIN” àquela autarquia na lixeira de Sendim entre
Fevereiro de 1995 e Julho do mesmo ano, comprometendo-se, por sua vez, o arguido
Vítor Borges, administrador desta última empresa, com a colaboração do arguido Carlos
Marinho e da então futura colaboração Gabriel Ângelo Santos Ferreira de Almeida (que
só em 01.09.97 foi admitido ao serviço da “Resin”) a devolver à arguida Maria de
Fátima Felgueiras parte das verbas envolvidas na referida adjudicação da dita
empreitada.

18
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por outro lado, os arguidos Júlio Faria e Maria de Fátima Felgueiras, para
simular o referido concurso, contaram com a colaboração activa e empenhada do
arguido Barbieri Cardoso, nomeadamente quanto à celebração do referido contrato
simulado, colaboração essa que lhes permitiu alcançar os seus objectivos, sendo certo
porém que o arguido Barbieri Cardoso ignorava que, dessa forma, os arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria receberiam vantagens patrimoniais.
Assim, e visando definir quais os parâmetros que iriam estar na base da
celebração desse contrato simulado, no dia 11 de Abril de 1995, realizou-se, nas
instalações da autarquia, uma reunião, em que estiveram presentes os arguidos Júlio
Manuel Castro Lopes Faria (presidente da Câmara), Vítor Manuel da Silva Borges
(administrador da “RESIN”), José António Barbieri Cardoso (na época, técnico superior
daquela Câmara Municipal) e a testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues
de Carvalho (responsável pela Divisão Financeira da autarquia), sendo certo que no
apontamento efectuado por esta relativamente a essa reunião o arguido Júlio Faria
despachou no sentido de ser dada cópia desse documento ao director do Departamento
Técnico (arguido Barbieri) e ao chefe da Divisão de Apoio Técnico-administrativo
(Engº Ferreira Leite), determinando-lhe que tivesse em conta o que naquela decisão
havia sido decidido.
Nesta reunião foi então decidida a abertura de mais um concurso para
adjudicação de uma Empreitada, designada por "Manutenção do Aterro Sanitário -
Execução de Plataformas”, a ser executada na área onde funcionava a lixeira municipal,
sita em Sendim - Felgueiras, sob a forma de concurso limitado sem apresentação de
candidaturas.
Para a boa execução do esquema acordado entre todos os referidos arguidos, era
necessário que a “RESIN” se apresentasse como oponente ao referido concurso.
No entanto, como aquela empresa não reunia as condições legais para o fazer
isoladamente, uma vez que não era titular de alvará que lhe permitisse executar obras
públicas, não sendo, de resto, esse o seu objecto social, e visando ultrapassar tal
obstáculo, a “RESIN” celebrou, em 19 de Abril de 1995 (oito dias depois da reunião)
com a “Norlabor – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda.” (uma sociedade de obras
públicas), um contrato de consórcio.
Conforme consta do seu texto, este contrato, assinado pelo arguido Vítor Borges
(em representação da “RESIN”) e por José António Barros de Sousa e Carlos Ferreira
de Sousa (sócios da “Norlabor”), tinha por objecto, precisamente, o Aterro de Sendim –
Felgueiras e visava alegadamente a sua manutenção e exploração até ao encerramento
definitivo, sendo estabelecidas as competências e obrigações de cada uma das
outorgantes.
Em 24 de Novembro de 1995, o arguido Vítor Borges (“RESIN”) envia um
telefax à CMF, dirigido ao arguido Barbieri Cardoso, a coberto do qual envia uma
relação das empresas a quem deveria ser endereçado o convite para o concurso de
empreitada de "Manutenção do Aterro Sanitário - Execução de Plataformas".
As empresas indicadas foram, para além da própria “RESIN – Resíduos
Industriais, SA”; a “Norlabor – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda.” (“Norlabor”);
a “Craveira – Soc. de Const. e Obras Públicas e Empreendimentos, Lda.”; a
“Translousada – Soc. de Aluguer de Equipamentos, SA” e a “ECOP – Empresa de
Construções e Obras Públicas Arnaldo de Oliveira, SA”.
Três dias depois, em 27 de Novembro de 1995, a presidente da autarquia, Maria
de Fátima Felgueiras (que, entretanto, tinha substituído o arguido Júlio Castro Faria
nessas funções), proferiu despacho através do qual determinou a abertura do referido
concurso.

19
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esta empreitada (única) consistia, fundamentalmente, na execução de trabalhos


de movimentação de terras para a definição de plataformas, num prazo de trinta dias,
com um preço base de Esc. 17.500.000$00 (dezassete milhões e quinhentos mil
escudos), devendo a apresentação de propostas ser feita até ao dia 18.12.1995.
No seguimento desse despacho, a CMF endereçou às empresas referidas, um
“convite” para apresentação de propostas.
Em resposta ao “convite” da CMF e observando as condições da empreitada, as
sociedades referidas apresentaram as seguintes propostas:
a) a “RESIN” apresentou a sua proposta em 13.12.1995, no valor de Esc.
19.875.100$00 (dezanove milhões, oitocentos e setenta e cinco mil e cem escudos)
acrescido do respectivo IVA, e, uma vez que não era possuidora do alvará necessário
para poder concorrer à referida empreitada, declarou que para execução da empreitada
iria recorrer aos serviços da sociedade “João Tello & C. Lda.”, tendo esta empresa
apresentado declaração nesse sentido;
b) a “Craveira” apresentou a sua proposta, em 15.12.1995, no valor de Esc.
24.861.605$00 (vinte e quatro milhões, oitocentos e sessenta e um mil e seiscentos e
cinco escudos) acrescido do respectivo IVA;
c) a “Norlabor” apresentou a sua proposta, em 15.12.1995, no valor de Esc.
18.619.680$00 (dezoito milhões, seiscentos e dezanove mil e seiscentos e oitenta
escudos) acrescido do respectivo IVA;
d) a “Translousada” apresentou a sua proposta, em 15.12.1995, no valor de Esc.
21.109.400$00 (vinte e um milhões, cento e nove mil e quatrocentos escudos) acrescido
do respectivo IVA, tendo declarado que, para execução da empreitada, iria recorrer aos
serviços da sociedade “Cunha Soares & Filhos, Lda.”, tendo esta empresa apresentado
declaração nesse sentido;
e) a “ECOP” apresentou a sua proposta, em 18.12.1995, no valor de Esc.
22.757.700$00 (vinte e dois milhões, setecentos e cinquenta e sete mil e setecentos
escudos) acrescido do respectivo IVA.
Em 19.12.1995 realizou-se a sessão pública de abertura das propostas
apresentadas para a empreitada de "Manutenção de Aterro Sanitário - Execução de
Plataformas", tendo as mesmas sido apreciadas pela comissão de análise, constituída
pela presidente da autarquia, Maria de Fátima Felgueiras, pelos vereadores José Maria
Guimarães Sampaio e António Pereira Mesquita de Carvalho, estando ainda presentes
Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal (Directora do Departamento Administrativo)
e o arguido José António Barbieri Cardoso.
No dia seguinte, as propostas foram apreciadas pelo Departamento Técnico
(tendo o arguido Barbieri tido intervenção na respectiva análise enquanto director desse
departamento, tendo assinado o expediente normal por força da delegação de
competências da presidente da edilidade), que se pronunciou favoravelmente pela
proposta apresentada pela “Norlabor”, em virtude de ser a de menor valor.
O contrato de adjudicação da empreitada de “Manutenção do Aterro Sanitário –
Execução de Plataformas” à “Norlabor”, pelo valor da proposta apresentada, foi
outorgado, em 24.01.1996, pela arguida Maria de Fátima Felgueiras (em representação
da CMF) e por Adriano Rafael de Sousa Ferreira e ainda por José António Barros de
Sousa (sócios da Norlabor).
Em 26 de Fevereiro seguinte, a “Norlabor” emite, uma factura (n.º 427), no
valor global contratualizado (Esc. 19.550.664$00 – dezanove milhões, quinhentos e
cinquenta mil e seiscentos e sessenta e quatro escudos).

20
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Entretanto, pelo facto da CMF não ter procedido ao pagamento da quantia em


dívida, a “Norlabor” insiste (através de um ofício, datado de 08 de Maio), solicitando à
arguida Maria de Fátima Felgueiras a liquidação daquela importância.
Em 13.06.1996, a arguida Maria de Fátima Felgueiras emite um despacho
autorizando o pagamento da quantia de Esc. 5.000.000$00 (cinco milhões de escudos)
relativa a parte do valor da empreitada adjudicada à “Norlabor”, o qual foi processado
em 17.06.1996, emitindo esta recibo em 24.06.1996.
Em 08.05.1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras autoriza o pagamento de
mais Esc. 7.000.000$00 (sete milhões de escudos) relativos à empreitada, tendo os
serviços administrativos emitido a ordem de pagamento e respectivo cheque, no valor
de Esc. 6.633.334$00 (seis milhões, seiscentos e trinta e três mil e trezentos e trinta e
quatro escudos), à ordem da “Norlabor” que emitiu recibo em 13.05.1998 e procedeu ao
depósito em 15.05.1998 no BTA de Paredes.
Finalmente, em 06.10.1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras autoriza o
pagamento dos restantes Esc. 7.550.664$00 (sete milhões, quinhentos e cinquenta mil e
seiscentos e sessenta e quatro escudos), relativos aos trabalhos de execução da
empreitada, tendo os serviços administrativos emitido a ordem de pagamento e
respectivo cheque, no valor de Esc. 7.155.153$00 (sete milhões, cento e cinquenta e
cinco mil e cento e cinquenta e três escudos), à ordem da “Norlabor”, a qual emitiu
recibo em 21.10.1998 e procedeu ao depósito nesse mesmo dia no Banco Português do
Atlântico (BPA) de Penafiel.
Depois de ter recebido aquelas quantias da CMF, no âmbito do referido contrato
de empreitada, a “Norlabor” entregou-as na sua totalidade à “Translousada” que, por
sua vez, as entregou à “RESIN”, através do seguinte esquema de movimentação de
verbas:
a) o primeiro pagamento, no valor de Esc. 4.738.095$00 (quatro milhões,
setecentos e trinta e oito mil e noventa e cinco escudos):
⇒ a “Norlabor” recebeu o cheque em 24 de Junho de 1996, endossou-o à
“Translousada” na mesma data e esta, por sua vez, endossou-o à “RESIN” no dia
seguinte, tendo esta procedido de imediato ao seu depósito bancário;
b) o segundo pagamento, no montante de Esc. 6.633.334$00 (seis milhões,
seiscentos e trinta e três mil e trezentos e trinta e quatro escudos):
⇒ a “Norlabor” recebeu o cheque em 13 de Maio de 1998, depositou-o em
conta bancária em 15 de Maio, tendo sido emitido um cheque, de igual valor, à
“Translousada” (este cheque foi sacado de uma conta particular conjunta dos sócios da
“Norlabor”). A “Translousada” procedeu ao seu endosso à “RESIN” que o depositou no
dia 15 de Maio de 1998;
c) o terceiro pagamento, no valor de Esc. 7.155.153$00 (sete milhões, cento e
cinquenta e cinco mil e cento e cinquenta e três escudos):
⇒ a “Norlabor” recebeu o cheque em 21 de Outubro de 1998 e procedeu ao seu
depósito bancário, tendo, na mesma data, emitido um cheque, de igual valor, à
“Translousada”. Esta procedeu ao seu endosso à “RESIN” que o depositou no dia 22 de
Outubro de 1998.

1. 4. – A propósito do procedimento tendente ao ajuste directo e adjudicação


da empreitada de "Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”.
No início de 1996, e em sequência do acordo celebrado entre os arguidos Maria
de Fátima Felgueiras e Vítor Borges, com vista a pagar à “Resin” 12 meses de trabalhos
levados a cabo na lixeira de Sendim por esta empresa, foi decidido entre aqueles

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

arguidos simular um procedimento com vista ao ajuste directo da empreitada de


“Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”, a atribuir à dita “RESIN”
(proposta no valor de Esc. 33.600.000$00 - trinta e três milhões e seiscentos mil
escudos, a que correspondia 12 meses de trabalhos a 2.800 cts mensais + IVA), tendo
em conta a análise das propostas efectuada pelo Departamento Técnico.
De facto, desde Junho de 1994 que a “Resin” procedia a trabalhos de
manutenção na lixeira de Sendim, e o procedimento referido foi a forma encontrada
para que a CMF pudesse pagar 12 meses de trabalhos àquela empresa, sendo certo que
em algumas situações ela subcontratou e alugou equipamento às suas consorciadas, com
quem manteve relações comerciais não só na lixeira de Sendim, como na lixeira da
Lustosa, como ainda na lixeira de Penafiel e em outras lixeiras situadas em outras
autarquias para as quais trabalhou.
Assim, o processo de adjudicação, por ajuste directo, da empreitada de
“Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”, da responsabilidade da CMF, foi
iniciado em 01 de Abril de 1996, com o envio de “convites” a três sociedades para que
estas apresentassem as suas propostas.
Das condições gerais e especiais, constantes dos convites endereçados, são de
salientar as seguintes:
a) as propostas terem de ser apresentadas até 15 de Abril de 1996;
b) o prazo de execução da obra ser de um ano; e
c) o preço base de Esc. 30.000.000$00 (trinta milhões de escudos).
As sociedades convidadas foram a “RESIN – Resíduos Industriais, SA”; a
“Craveira – Sociedade de Construções e Obras Públicas e Empreendimentos, Lda.” e a
“Translousada – Sociedade de Aluguer de Equipamentos, SA”.
Em resposta ao convite da CMF e observando as condições da empreitada, as
sociedades referidas apresentaram as seguintes propostas:
a) - a “Craveira” apresentou a sua proposta, em 04.04.1996, no valor de Esc.
40.800.000$00 (quarenta milhões e oitocentos mil escudos) acrescido do respectivo
IVA;
b) – a “Translousada” apresentou a sua proposta, em 04.04.1996, no valor de
Esc. 39.600.000$00 (trinta e nove milhões e seiscentos mil escudos) acrescido do
respectivo IVA, tendo declarado que, para execução da empreitada, iria recorrer aos
serviços da sociedade “Cunha Soares & Filhos, Lda.” tendo esta empresa apresentado
declaração nesse sentido;
c) – a “RESIN” apresentou a sua proposta, em 12.04.1996, no valor de Esc.
33.600.000$00 (trinta e três milhões e seiscentos mil escudos) acrescido do respectivo
IVA, tendo declarado que, para execução da empreitada, irá recorrer aos serviços da
sociedade “João Tello & C. Lda.” tendo esta empresa apresentado declaração nesse
sentido.
No dia 12.04.1996, no mesmo dia em que enviou a sua proposta à CMF, a
“RESIN” enviou um fax a Carlos Silva, administrador da “Translousada” (outra das
empresas concorrentes à empreitada), solicitando o fornecimento de um camião e uma
retroescavadora para trabalhos no aterro de Felgueiras, para um período de cinco dias,
com início em 14 de Abril de 1996.
No entanto, conforme se referiu, o prazo concedido pela CMF para as três
sociedades convidadas apresentarem as suas propostas para execução da empreitada de
"Exploração e Manutenção do Aterro de Felgueiras”, só terminava no dia 15 de Abril.
Emitido um parecer favorável pelo Departamento Técnico da autarquia
(subscrito pelo arguido Barbieri Cardoso), a Presidente Maria de Fátima Felgueiras
decidiu adjudicar a empreitada à “RESIN”, em 16 de Abril de 1996, por ter sido esta

22
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

que apresentou a proposta de menor valor e porque era a que dava maiores garantias de
boa execução e qualidade técnica dos trabalhos (conforme aliás previamente combinado
com o arguido Vítor Borges).
Em 17.04.1996, a arguida Maria de Fátima Felgueiras emitiu um despacho
justificando a decisão de adjudicar “por ajuste directo” as obras de manutenção e
exploração provisória da lixeira de Felgueiras, alegando a sua urgência e interesse
público.
O contrato de adjudicação da empreitada “Exploração e Manutenção do Aterro
de Felgueiras” foi celebrado em 24.04.1996, nos termos da proposta apresentada, tendo
sido assinado pela arguida Maria de Fátima Felgueiras e pelo arguido Vítor Borges,
respectivamente em representação da CMF e da “RESIN”, prevendo o mesmo que as
obras começassem imediatamente a seguir à celebração do contrato e assinatura do auto
de consignação, ficando os pagamentos dependentes do visto do Tribunal de Contas.
A 07.05.96 iniciou-se a deposição dos resíduos sólidos industriais equiparados a
domésticos e em 24 de Junho do mesmo ano a CMF iniciou a cobrança de uma taxa às
indústrias pela deposição dos seus resíduos sólidos na lixeira de Sendim, emitindo para
o efeito a respectiva facturação, o que só se tornou possível na medida em que os
trabalhos referentes à empreitada em causa iam sendo realizados pela “Resin”, ainda
que recorrendo aos serviços de outras empresas, designadamente da “Translousada”.
Sucede porém que o Tribunal de Contas, entretanto, recusou o visto, devido ao
facto da “RESIN” não ter alvará que lhe permitisse executar tal obra, decisão que foi
comunicada à autarquia em 23.08.1996.
Face a tal decisão do Tribunal de Contas, realizou-se uma reunião de
emergência, na CMF, no dia 04.09.1996, na qual participaram apenas representantes da
“RESIN” e da CMF (Vítor Borges, Pedro Ribeiro, Barbieri Cardoso e Fernanda Castro
Leal).
Nessa reunião foram aventadas diversas hipóteses para resolução do problema
suscitado pela recusa de visto do TC e que poderiam passar por:
a) um “contrato de transacção”, para pagamento dos trabalhos efectivamente
levados a cabo pela “Resin” até à comunicação da suspensão dos trabalhos;
b) um “pedido de reapreciação” ao TC; ou
c) um “ajuste directo à “João Tello”, no período compreendido entre a suspensão
dos trabalhos e a decisão de reapreciação.
Tendo sido decidido, no final da mesma, “adjudicar” os trabalhos à “João Tello”
e celebrar um contrato de transacção com a “Resin” de modo a pagar-lhe os trabahos
que entretanto executara ao abrigo do ajuste directo relativo à empreitada em causa.
A primeira hipótese mencionada no documento de fls 255 do apenso 98
(adicional ao contrato de recolha) nada tinha a ver com o ajuste directo em causa mas
com unicamente com outras necessidades que se prendiam com a prestação de serviços
de recolha do lixo e que viriam a ser satisfeitas mediante a celebração, a 29.10.96, de
um aditamento ao contrato de prestação de serviços de recolha de resíduos sólidos
urbanos do concelho de Felgueiras.
Assim, por despacho de 10.09.1996, a Presidente Maria de Fátima Felgueiras
decide adjudicar, por ajuste directo, os restantes trabalhos à “João Tello”, justificando
tal decisão com a análise da proposta (apresentada por aquela sociedade) efectuada pelo
Departamento Técnico.
Por outro lado, visando resolver a questão do pagamento dos trabalhos
efectuados pela “RESIN”, a CMF celebrou com esta empresa, em 20.09.1996, um
contrato de transacção, ficando assim resolvido o problema suscitado com a recusa de

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

visto por parte do TC, ressarcindo-se a “RESIN” pelos trabalhos efectuados entre
25.04.96 e 05.09.96.
Tal contrato de transacção foi outorgado pelos arguidos Vítor Borges e Fátima
Felgueiras, sendo ali referido que os trabalhos adjudicados tinham sido iniciados em 25
de Abril e suspensos em 5 de Setembro de 1996, calculando-se o valor dos já realizados
em Esc. 12.133.334$00 (doze milhões, cento e trinta e três mil e trezentos e trinta e
quatro escudos) + IVA.
Esta verba foi facturada pela “RESIN” em 30 de Setembro de 1996 e paga pela
CMF em 16 de Janeiro de 1997.
O contrato de adjudicação da empreitada “Exploração e Manutenção do Aterro
de Felgueiras” foi celebrado entre a CMF e a “João Tello” em 18.10.1996, sendo o
mesmo outorgado por Maria de Fátima Felgueiras (representando a autarquia) e José
Manuel de Pinho Reis de Almeida e José Miguel Santos Vieira Neves (em
representação da “João Tello”).
Em tal contrato é ainda referido que a “João Tello” se obriga a executar a
empreitada pelo valor de Esc. 16.800.000$00 (dezasseis milhões e oitocentos mil
escudos) + IVA, de harmonia com a proposta apresentada e com a análise da mesma
feita pelo Departamento Técnico e que antecederam o despacho de Fátima Felgueiras,
datado de 10 de Setembro, que determinou a adjudicação.
Desde 31 de Dezembro de 1996 e até 03 de Abril de 1997, a “João Tello” emitiu
cinco facturas à CMF, todas relativas à empreitada em questão e no montante global de
Esc.17.640.000$00.
Com data de 11 de Junho de 1997 e na carta da “João Tello” que remete a última
factura (número 49, de 30.04.97), a arguida Maria de Fátima Felgueiras redige um
despacho, dirigido à responsável pela Divisão Financeira (testemunha Terezinha
Carvalho), alertando-a para o terminus do contrato e avisando-a que, a partir daí, devido
à selagem da lixeira de Felgueiras, deveria imputar a facturação ao Aterro da Lustosa.
Em 30 de Junho de 1997, a arguida Maria de Fátima Felgueiras comunica à
AMVS (Associação dos Municípios do Vale do Sousa), que tinham sido dadas
instruções à “RESIN” para que, a partir de Abril de 1997, a facturação relativa à
manutenção da lixeira de Felgueiras passasse a ser apresentada àquela Associação.
Entretanto, a CMF emite para a “João Tello”, em 11 de Dezembro de 1997, uma
ordem de pagamento, no valor de Esc. 9.472.400$00 (nove milhões, quatrocentos e
setenta e dois mil e quatrocentos escudos), tendo aquela emitido o respectivo recibo no
dia seguinte.
A segunda ordem de pagamento da CMF, libertando o restante valor da
empreitada, foi emitida em 6 de Fevereiro de 1998, sendo o correspondente cheque
emitido em 9 do mesmo mês à “João Tello”, no montante de Esc. 7.253.077$00 (sete
milhões, duzentos e cinquenta e três mil e setenta e sete escudos).
Depois de a “João Tello” ter recebido aquelas quantias da CMF, a mesma
entregou-as à “RESIN”, através do seguinte esquema de movimentação de verbas:
a) o primeiro pagamento, no valor de Esc. 9.472.400$00 (nove milhões,
quatrocentos e setenta e dois mil e quatrocentos escudos):
⇒ a “João Tello” recebeu o cheque, em 12 de Dezembro de 1997 e endossou-o à
“RESIN”, no dia 15 de Dezembro de 1997, tendo esta procedido de imediato ao seu
depósito bancário;
b) o segundo pagamento, no montante de Esc. 7.253.077$00 (sete milhões,
duzentos e cinquenta e três mil e setenta e sete escudos):

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

⇒ a “João Tello” recebeu o cheque, em 09 de Fevereiro de 1998, tendo este sido


endossado à “RESIN”, que por sua vez o depositou, no dia 12 do mesmo mês na sua
conta bancária.
A “RESIN” recebeu as sobreditas quantias monetárias na medida em que
executou, directamente ou por intermédio de outrem, os trabalhos adjudicados.

1. 5. – A propósito dos alegados proventos e benefícios obtidos da Associação


de Municípios do Vale do Sousa.
Em 31.01.97 o GAT do Vale do Sousa emitiu a proposta para a abertura de um
concurso de “Concepção, Construção e Gestão de um Sistema de Tratamento de
Resíduos Sólidos Industriais e Equiparados a Urbanos no Concelho de Felgueiras”
Em 07.02.1997 o concelho de administração da AMVS reuniu e, quanto ao
ponto dois da ordem de trabalhos (“Resíduos Sólidos Urbanos – Projectos”) deliberou
abrir um concurso público internacional para a adjudicação da empreitada de
“Concepção, Construção e Gestão de um Sistema de Tratamento de Resíduos Solidos
Industriais e Equiparados a Urbanos do Sector do Calçado do Município de Felgueiras”.
Tal decisão da AMVS inseriu-se no âmbito de um programa do Fundo de
Coesão que visava a construção de três aterros sanitários (Aterro Intermunicipal de
Lustosa, Lousada; Aterro Intermunicipal de Canelas – Penafiel e Aterro RIB –
Felgueiras) e de treze Ecocentros (três no Concelho de Felgueiras e dois na área de cada
um dos restantes municípios daquela associação)
Em 08.04.1997 a AMVS publicou o anúncio e respectivo caderno de encargos
do concurso.
Em ordem a concorrer a esse concurso internacional, o consórcio
“Resin”/”Sita”/”Ecop” preparou em conjunto a respectiva proposta a apresentar, o que
implicou a realização de várias reuniões e estudos até à concretização da sobredita
proposta.
Em 14.07.97 foi manuscrito, em papel timbrado da “Ecop”, um apanhado dos
valores a corrigir na proposta em estudo, constando do mesmo que deve “acrescer à
proposta Esc. 140.000.000$00”, distribuído pelos vários itens.
Em 15.07.97 as várias concorrentes, entre as quais o consórcio liderado pela
“Resin”, apresentaram as suas propostas.
Ora, na proposta apresentada pelo consórcio “RESIN”/”SITA”/”ECOP”, em
consonância com o referido manuscrito em papel timbrado da “Ecop”, foi incluído esse
montante de 140.000.000$00, que foi camuflado e distribuído pelos vários itens do
orçamento efectuado, repartindo-se o mesmo pelas diversas rubricas, de acordo com a
margem de manobra que cada uma delas permitia, ressarcindo assim a “RESIN” dos
montantes em dívida pela CMF, conforme o pretendido pelos seus responsáveis, sendo
certo que tal distribuição foi efectuada de forma proporcional, permitindo a inclusão de
outras verbas:
- uma báscula (equipamento que a “Resin” já possuía) o valor total de Esc.
7.800.000$00;
- na instalação de Pré-Tratmento Tipo “Ctipa PT 1500”, a quantia de Esc.
6.000.000$00;

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2º Juízo

- na instalação de Pré-tratamento Tipo “Ctipa ATF 1500/S, a quantia de Esc. 6.


000.000$00;
- na citada Báscula a quantia de Esc. 7. 800.000$00;
- no Fornecimento e instalação de um contentor equipado com laboratório de
análises de RIB, a quantia de Esc. 6. 000.000$00;
- no Fornecimento de queimadores atmosféricos individuais tipo “Torchére
900”, a quantia de Esc. 1. 000.000$00;
- na unidade de triagem e prensagem de RIB, incluindo equipamento de
transporte e deposição de fardos, o valor de Esc. 40. 000.000$00;
- na concepção, projecto e estudo de impacte ambiental, o valor de Esc. 15.
080.000$00;
- na montagem, desmontagem e manutenção do estaleiro, o valor de Esc.
12.600.000$00;
- na estrutura metálica aplicada no revestimento lateral de paredes de fachada, o
valor de Esc. 5.520.000$00;
- no restante valor do Capítulo 2, o valor de Esc. 7. 689.917$00; e
- no restante valor do Capítulo 3, o valor de Esc. 32.310.083$00.
À inclusão dessas verbas na proposta apresentada a tal concurso internacional
pelo consórcio liderado pela “Resin” foram completamente alheios os arguidos Fátima
Felgueiras, Júlio Faria e Barbieri Cardoso.
Em 18.07.97 foi realizado o acto público de apresentação das propostas a esse
concurso, tendo sido deliberada a admissão de todas as propostas apresentadas,
dirigindo-as à respectiva comissão de análise.
Após a análise por essa comissão, constituída por Joaquim Moreira (do GAT de
Penafiel, que presidia a essa comissão), pelo arguido José António Barbieri Cardoso (da
CMF) e por Isabel Maria Soares Brandão Vasconcelos (da, então, DRARN), a 24.09.97,
a mesma, no respectivo relatório de análise, propôs que a empreitada deveria ser
adjudicada ao consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” por apresentar a proposta que dava mais
garantias.
Em 24.10.97 o concelho de administração da AMVS reuniu e deliberou por
unanimidade, ao apreciar o relatório da comissão técnica, adjudicar a empreitada para a
construção e gestão durante 5 anos do aterro RIB de Felgueiras ao consórcio
“Sita”/”Resin”/”Ecop”, pelo preço de 981.467.560$00.
Em 23.01.98 foi outorgado o respectivo contrato de empreitada entre a AMVS e
o consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop”.
Em 08.05.98 foi elaborado pela AMVS, a dona da obra, o auto de consignação
de trabalhos.
Em meados do mês de Dezembro de 2000, por solicitação da arguida Maria de
Fátima Felgueiras e de acordo com os interesses que manifestou, a AMVS (em
14.12.2000), concordou em assinar, com a CMF, um protocolo, nos termos do qual foi
formalizada a transferência de poderes, competências, deveres e obrigações relativas ao
aterro RIB, daquela Associação de Municípios para a autarquia de Felgueiras.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por sua vez, e quanto os concursos de adjudicação dos ecocentros previstos para
Felgueiras, as propostas apresentadas foram analisadas por uma comissão de avaliação
constituída por Joaquim Moreira (do GAT de Penafiel e que presidia a tal comissão),
pelo arguido José António Barbieri Cardoso e por Fernanda Paula Mariano (estes dois
eram os representantes da CMF na AMVS).
Essa foi a única comissão de avaliação de propostas em que a CMF esteve em
maioria, sendo tal comissão análoga às que foram formadas para idênticos concursos
nos restantes municípios do Vale do Sousa.
Por outro lado, em meados do ano de 1997, a CMF tinha uma dívida para com a
“RESIN” de Esc. 101.214.905$00 (além dos encargos e juros de mora), precisamente na
altura em que foi celebrado o contrato de empreitada relativo ao Aterro RIB de
Felgueiras, relativa a diversos trabalhos, parte deles não documentados e efectuados
sem suporte legal por tal empresa para aquela autarquia.
Com o recebimento do adiantamento referente a tal empreitada, a “Resin” teve
disponibilidade financeira para conceder um donativo de 20.000.000$00 ao Futebol
Clube de Felgueiras, montante que serviu para esse clube liquidasse parte de um débito
que tinha para com a CCAM, mais concretamente parte de uma prestação vencida em
30.09.98, conforme à frente melhor se descreverá.

1.6. - A propósito dos recebimentos.


Durante a execução destes contratos, o arguido Vítor Borges, cumprindo o que
tinha combinado previamente com os arguidos Júlio Faria e Maria de Fátima Felgueiras,
efectuou a estes, por diversas vezes, entregas de dinheiro através dos também arguidos
Horácio Costa e Joaquim de Freitas, dois dos quais provenientes das quantias recebidas
da CMF (no âmbito do simulado contrato celebrado entre a edilidade e a “Norlabor”).
Os pagamentos das quantias supra referidas, por parte do arguido Vítor Borges,
da “RESIN”, à arguida Maria de Fátima Felgueiras e ao arguido Júlio Faria, obedeciam
sempre a um esquema interno instituído naquela empresa por aquele arguido.
Isto é, após serem levantadas, em numerário, as quantias monetárias que iriam
ser entregues à arguida Maria de Fátima Felgueiras, o arguido Vítor Borges entregava-
as a esta arguida, ou aos seus representantes, os arguidos Horácio Costa e Joaquim de
Freitas, pessoalmente ou por intermédio dos também arguidos Carlos Marinho e Gabriel
Ângelo.
Assim:
1 - No dia 05.06.1997, o arguido Horácio Costa recebeu, na CMF, um
telefonema do arguido Vítor Borges, administrador da “RESIN” na sequência do qual
elaborou um “relatório de actividade” para a arguida Maria de Fátima Felgueiras - (cfr.
fls. 136 e 199 – 1º Volume dos autos), dando conta do seguinte: “Ex.ma. Sr.ª.
Presidente, Aproveito para informar que recebi agora um telefonema do Sr. Eng.º.
Vítor Borges que na impossibilidade de falar com V. Exª., pede que lhe transmita que
conforme o combinado com a Senhora, os primeiros 5.000 contos estarão disponíveis
no dia 10 de Julho próximo. Mais informo que na sequência das reuniões havidas com
o Sr. Júlio Faria e a Senhora, o Sr. Freitas irá abrir conta no BES, comigo, conforme
as indicações de V. Exª.”.
Face a tal informação, a arguida Maria de Fátima Felgueiras escreveu, na mesma
folha, o seguinte despacho: “TC. Óptimo. 97.06.10”, querendo significar que "Tomou
Conhecimento" da informação.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No dia 10.07.1997, por ordem expressa da arguida Maria de Fátima Felgueiras,


o arguido Horácio Costa deslocou-se a Matosinhos, aos escritórios da “RESIN”, onde o
arguido Vítor Borges lhe entregou pessoalmente a sobredita quantia de Esc.
5.000.000$00 em notas do Banco de Portugal.
Após ter trazido tal quantia monetária para Felgueiras, o arguido Horácio Costa
contactou a arguida Maria de Fátima Felgueiras, que lhe ordenou que efectuasse, com a
mesma e mais Esc. 1.000.000$00 que uns dias antes lhe tinha entregue em mão, a
abertura de uma conta bancária na agência do Banco Espírito Santo de Felgueiras, aliás,
conforme as ordens expressas que nesse sentido lhe tinha dado em meados do mês de
Março de 1997.
Assim, no dia 11.07.1997, os arguidos Horácio Costa e Joaquim de Freitas
efectuaram a abertura da conta bancária n.º 238/27674/000.9 da agência de Felgueiras
do Banco Espírito Santo e procederam ao depósito da referida quantia de Esc. 6.
000.000$00, em numerário.
2 - No dia 16.06.1998, o arguido Carlos Marinho, director financeiro da
“RESIN”, entregou ao arguido Horácio Costa, no edifício da CMF e na presença do
também arguido Joaquim de Freitas, a quantia de Esc. 5.250.000$00, em numerário,
acondicionada no interior de uma pasta com timbre da “RESIN”.
No interior dessa pasta, e para além da referida quantia em numerário,
encontravam-se igualmente os documentos constantes de fls. 158 a 161 do 1º Volume
dos autos, nomeadamente fotocópias:
• da Guia de Receita n.º 9016, de 98.05.12 (emitida pela CMF em
nome da firma Norlabor), e de um cheque no valor de Esc.
6.633.334$00, emitido pela CMF à ordem da mesma empresa -;
• de um manuscrito com a alusão ao valor inicial de Esc.
7.000.000$00 e final de Esc. 5.250.000$00, contendo ainda este
documento uma frase manuscrita do seguinte teor: “5.250.000$00
entregue em 16.06.98 ao Sr. Dr. Horácio”, cuja autoria não foi
possível apurar;
• da factura n.º 9701208, datada de 21/11/1997, no valor de Esc.
11.032.770$00, emitida pela “RESIN” à AMVS (Associação de
Municípios do Vale do Sousa), e que respeita a “Trabalhos de
Operação na Lixeira de Felgueiras”;
• da factura n.º 9701207, datada de 21/11/97, no valor de Esc.
2.943.570$00, emitida pela “RESIN” à AMVS, e que igualmente
respeita a “Trabalhos de Operação na Lixeira de Felgueiras”.
A quantia recebida por Horácio Costa das mãos do arguido Carlos Marinho foi
posteriormente utilizada pela arguida Maria de Fátima Felgueiras para o pagamento
parcial à firma “Machado & Costas, S.A.” do preço da viatura de marca “Audi”, modelo
“A4”, matrícula 96-29-LN, como melhor se descreverá mais à frente.
3 - Em dia indeterminado de Outubro ou Novembro de 1998, o arguido Gabriel
Ferreira de Almeida, quadro superior da “RESIN” (o qual foi admitido ao serviço dessa
empresa a 01.09.97 como direcor-geral de exploração, passando a ser o responsável
pelos trabalhos realizados nas lixeiras – nomeadamente nos trabalhos levados a cabo na
lixeira de Sendim - e posteriormente nos aterros, mantendo-se ao serviço dessa empresa
até 2000), sabendo que se tratava de um “retorno” de um dos pagamentos efectuados
pela CMF no âmbito do contrato celebrado entre essa edilidade e a “Norlabor”, segundo
plano engendrado pelos arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e Júlio Faria,

28
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

entregou pessoalmente ao arguido Horácio Costa, no gabinete por este utilizado no


edifício da CMF, a quantia de Esc. 5.381.653$00, em numerário, acondicionada no
interior de uma pasta idêntica à utilizada na entrega anterior, mas sem timbre da firma.
Juntamente com a quantia em numerário, foram entregues a Horácio Costa os
seguintes documentos:
• o cartão comercial constante de fls. 164, do 1º Volume dos autos,
da firma “RESIN” e com o nome de Gabriel Ferreira de Almeida,
com a frase manuscritas pelo mesmo “com os melhores
cumprimentos. Agradecendo desde já o que poder fazer”,
assinando o mesmo com a sua rubrica;
• uma fotocópia da Guia de Receita n.º 17715, de 98.10.07, emitida
pela CMF em nome da firma Norlabor, e de um cheque no valor
de Esc. 7.155.153$00, emitido pela CMF à ordem da mesma
firma;
• um manuscrito com a referência “valor pago” e o valor inicial
“Esc. 7.155.153$00” e valor final “Esc. 5.381.653$00” e a
indicação “retorno”.
Parte desta quantia entregue pela “RESIN” foi posteriormente utilizada, no
seguimento de ordens da arguida Maria de Fátima Felgueiras, na aquisição de 1.550
bilhetes de um sorteio promovido pelo FCF para o Natal de 1998 (no valor total de Esc.
1.550.000$00) e no depósito efectuado, em 23.11.1998, no valor de Esc. 1.850.000$00,
em numerário, na conta bancária do BES, titulada pelo arguido Júlio Manuel Castro
Lopes Faria, sendo o valor restante utilizado no pagamento de múltiplas despesas da
campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima Felgueiras, conforme mais
pormenorizadamente se referirá adiante.
De facto, o arguido Júlio Faria tinha sido co-avalista de uma livrança no valor de
cerca de 113.000.000$00, a qual titulava uma dívida do FCF perante a CCAMF.
O valor titulado por essa letra viria a ser pago através de um financiamento
concedido pelo BES ao FCF, garantido também por livrança, de que também o arguido
Júlio Faria deu o respectivo aval.
Como forma de auxiliar a concretização desse pagamento, o FCF decidiu fazer
um sorteio em Dezembro de 1998, tendo sido atribuídos aos vários elementos dos seus
corpos gerentes (entre os aquais o arguido Júlio Faria) cadernetas de bilhetes, que
procurariam vender, mas cujo pagamento desde logo efectuaram ao clube, cabendo-lhes
o respectivo reembolso na medida em que esses bilhetes fossem por si vendidos.
Foi na sequência disso que o arguido Júlio Faria foi reembolsado da quantia de
1.850.000$00 (já que tinha ficado com 1.850 bilhetes, a 1.000$00 cada um).
Para além disso, conforme referido, foram ainda adquiridos 1.550 bilhetes
referentes a esse sorteio, pagos também com os fundos provenientes daquela entrega em
numerário pela “Resin”, segundo instruções recebidas pelos arguidos Horácio e
Joaquim Freitas da arguida Fátima Felgueiras.
4 – No dia 30.12.1998, o arguido Carlos Marinho, entregou ao arguido Horácio
Costa, no edifício da CMF, a quantia de Esc. 20.000.000$00, constituída por um cheque
de Esc. 12.500.000$00, emitido pela “RESIN”, mais Esc. 7.500.000$00, em numerário.
Este montante veio a ser utilizado pelo Futebol Clube de Felgueiras para pagar
uma dívida no mesmo montante à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Felgueiras,
como melhor à frente se descreve.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Estas quantias perfazem o valor global de Esc. 35.631.653$00 (€ 177.729,94).


Os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e Júlio Faria, aceitaram e utilizaram
aquelas quantias monetárias, sendo certo que o fizeram no que concerne às referidas nos
pontos 2 e 3 do ponto 1.6 da pronúncia com intuito de obterem um beneficio
patrimonial que sabiam ser ilegítimo, por constituir indevida contrapartida patrimonial
da prática de actos que violavam os seus deveres como membros de órgão
representativo de autarquia local, no âmbito de um contrato formalmente celebrado
entre a autarquia e a “Norlabor”, acima referenciado, beneficiando assim terceiros.
Por sua vez, o arguido Vítor Borges quis pagar aquelas quantias, sendo as
referidas nos pontos 2 e 3 do ponto 1.6 da pronúncia como contrapartida da indevida,
por violadora das normas legais aplicáveis, adjudicação de empreitadas à empresa que
representava, logrando assim obter os inerentes proventos.
Por outro lado, os arguidos Carlos Marinho, Gabriel Ângelo dos Santos Ferreira
de Almeida, Barbieri Cardoso, Horácio Costa e Joaquim de Freitas, actuaram com o
intuito de ajudar activamente os arguidos Júlio Faria, Maria de Fátima Felgueiras e
Vítor Borges, na execução dos factos supra referidos (isto é, o arguido Barbieri na
colaboração que prestou na simulação de um concurso limitado e na celebração de dois
contratos simulados, um com a “Norlabor” e outro com a “João Tello”, ignorando
contudo que viriam a existir “retornos” de verbas liquidadas pela CMF no âmbito
daquele contrato; o arguido Carlos Marinho na forja do suporte documental e nos
procedimentos contabilísticos destinados a dissimular aquelas entregas em numerário,
tendo procedido a duas dessas entregas, sabendo que pelo menos uma delas constituía
um “retorno” no âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor”; o arguido
Gabriel Almeida, já depois das simulações formalmente consumadas, procedeu a uma
entrega em numerário que sabia ser um “retorno” no âmbito do contrato celebrado entre
a CMF e a “Norlabor”; e os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas colaboraram na
apropriação das verbas em causa através da abertura e movimentação de uma conta
bancária e “caixa” através das quais essas mesmas verbas transitaram para serem
posteriormente utilizadas pelos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras), com estes
assim colaborando.
Todos os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que
as suas condutas eram proibidas e punidas por lei

2. Factos provados relacionados com o 2º capítulo da pronúncia:


2.1. - A propósito de outros donativos que aprovisionaram a conta do BES e a
“conta paralela”.
2.1.1. - A propósito da introdução.
Para além das verbas provenientes da empresa “RESIN”, anteriormente
referidas, a conta bancária do BES e a “caixa paralela”, tendo esta última sido criada
simultaneamente com aquela conta para servir como fundo de maneio para pagamento
de diversas despesas da campanha eleitoral de menor valor, foram providas com vários
donativos entregues pelos industriais e particulares da área do concelho de Felgueiras.
Para o efeito, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, no uso dos seus poderes de
direcção sobre a referida conta bancária e “caixa paralela”, entregava ao arguido
Joaquim de Freitas, uma relação (designada habitualmente por “listinhas”), onde
indicava um conjunto de pessoas a contactar (habitualmente empresários da zona de

30
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Felgueiras), bem como indicava, a seguir aos nomes, qual o valor do donativo que devia
ser solicitado.
Esporadicamente, era a própria arguida Maria de Fátima Felgueiras quem
contactava directamente os industriais e comerciantes, solicitando donativos para a sua
campanha eleitoral, sendo a sua posterior recolha habitualmente efectuada pelos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
Outras vezes, a arguida Maria de Fátima Felgueiras indicava esses nomes
verbalmente, sendo os contactos com as pessoas indicadas efectuados pelos arguidos
Joaquim Freitas e Horácio Costa, que por vezes foram acompanhados por outros
indivíduos.
Noutras situações, os contactados deslocavam-se directamente à CMF, onde
entregavam em mão os donativos, em cheque ou em dinheiro, por vezes ao pessoal
ligado ao Gabinete de Apoio Pessoal à Presidente (GAPP), que os recebiam e faziam
chegar aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
Alguns dos nomes supra referidos eram assinalados com uma marca,
normalmente uma cruz, por motivo que não se apurou.
A arguida Fátima Felgueiras, no âmbito dos processos de licenciamento,
proferiu os seus despachos com base e de acordo com os pareceres dos serviços
camarários e dos técnicos e assessores competentes, deferindo ou indeferindo de acordo
com tais pareceres.
Assim:
2.1.2. - A propósito dos donativos concedidos pelo arguido Anastácio
Augusto Pinto Macedo
No dia 25.09.1997, o arguido Anastácio Augusto Pinto Macedo entregou aos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas o cheque n.º 6256892519, no montante de
Esc. 250.000$00, sacado sobre a conta bancária n.º 0012174005, da agência de
Felgueiras, do Banco Espírito Santo, o qual foi entregue para apoiar financeiramente a
campanha eleitoral do PS referente às eleições autárquicas de 1997.
Uns dias depois de ter obtido a licença de construção no âmbito do processo nº
68/83 (respeitante a um processo de legalização/licenciamento de um pavilhão
industrial), com o mesmo desiderato, o arguido Anastácio Augusto Macedo, no dia
15.10.1997, emitiu o cheque n.º 3856892748, no valor de Esc. 250.000$00, sacado
sobre a conta n.º 00121740005, da agência de Felgueiras, do Banco Espírito Santo,
cheque esse que foi entregue ao arguido Horácio Costa pela arguida Fátima Felgueiras.

2.1.3. - A propósito do donativo concedido pelo arguido Carlos Sampaio


Teixeira
Em 1997, a firma “Carlos Sampaio Teixeira & Irmão, Ldª” (de que o arguido
Carlos Sampaio Teixeira é sócio-gerente) iniciou um processo para a construção de um
novo pavilhão industrial sito em Estrada - Margaride, tendo contratado a firma
“Ambienta” para a elaboração do respectivo projecto, que apresentado para
licenciamento à CMF, em 31.10.1997, foi registado com o n.º 902/97.
Entretanto, o arguido Carlos Sampaio Teixeira foi contactado, por diversas
vezes, pelos arguidos Joaquim de Freitas e Horácio Costa, para que entregasse um

31
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

donativo, o que não sucedeu na medida em que estes nunca o conseguiram contactar
pessoalmente.
Em face disso, os arguidos Joaquim de Freitas e Horácio Costa deram
conhecimento de tal situação à arguida Maria de Fátima Felgueiras, que lhes disse que
iria tratar pessoalmente desse assunto.
Assim, no dia 18 de Novembro de 1997, o arguido Carlos Sampaio Teixeira
entregou a pessoa cuja identidade não foi possível apurar, a título de donativo para a
campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima Felgueiras, o cheque n.º 7586645154,
sacado sobre a conta n.º 00195185050, do Banco Comercial Português, agência de
Felgueiras, no valor de Esc. 500.000$00, datado de 18.11.1997, cheque esse que
entretanto chegou à posse da arguida Fátima Felgueiras, a qual por sua vez o entregou
ao arguido Horácio para que procedesse ao respectivo depósito na conta do BES
referida nos autos, o que este fez a 12.12.97.
Já depois de ter efectuado tal entrega, foram emitidos pareceres técnicos
desfavoráveis pelos técnicos responsáveis pelo SNB e pelo PDM local, face ao que, em
08.04.1998, o arguido Carlos S. Teixeira (ou melhor, a firma acima referida) solicitou à
CMF o arquivamento daquele processo de licenciamento (o que foi deferido em
09.04.1998) e, nessa mesma data, apresentou um novo processo para licenciamento de
construção de um pavilhão industrial, sito no mesmo local e freguesia do anterior, ao
qual foi atribuído o n.º 255/98.
Este projecto era acompanhado por fotografias que demonstravam que tal obra
já estava a ser executada (obras de limpeza e de terraplanagem do local).
No entanto, e apesar de resultar de tal processo que a obra estava já a ser
executada, a arguida Maria de Fátima Felgueiras não mandou instaurar o competente
processo de contra-ordenação.
Na sequência deste último projecto, a CMF emitiu no dia 02.08.2000, após
requerimento do interessado nesse sentido e em face de pareceres favoráveis, o alvará
de licença de utilização com o n.º 457/2000, obtendo assim o arguido Carlos Sampaio
Teixeira o licenciamento pretendido.
O arguido Carlos Sampaio Teixeira concedeu o referido donativo nos mesmos
termos em que o fez para apoiar financeiramente a campanha eleitoral de outras forças
políticas às mesmas eleições autárquicas de 1997.
O arguido Carlos Sampaio Teixeira costuma aliás apoiar outras instituições,
culturais, sociais e desportivas quando lhe solicitam esse apoio financeiro, sem que daí
espere retirar quaisquer benefícios ou vantagens.
O donativo referido nos autos não foi concedido com o intuito de obter qualquer
licenciamento ou de evitar qualquer embargo, sendo certo que os serviços de
fiscalização da CMF nunca se dirigiram ao arguido Carlos ou ao local da obra no
sentido de o pressionar no que quer que fosse.

2.1.4. - A propósito dos donativos concedidos pelo arguido Guilherme da


Silva Almeida:
O arguido Guilherme da Silva Almeida, gerente do estabelecimento individual
de responsabilidade limitada denominado “Guilherme da Silva Almeida & Filhos,
EIRL” (hoje S.A.), com instalações no Lugar da Boavista – Penacova – Felgueiras, que

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

haviam sido legalizadas em 1992, por decisão da CMF no processo de obra particular nº
323/83, requereu, em 1993, nova ampliação, deferida genericamente mas sem que fosse
emitido alvará de licença de utilização.
E em 30 de Julho de 1997, requereu o licenciamento da construção de um
edifício industrial no Lugar de Bouça Grande – Penacova – Felgueiras, a que foi
atribuído, na CMF, o n.º 630/97.
No dia 31.07.97, pelas 9h. e 08m., a funcionária do EIRL “Guilherme da Silva
Almeida & Filhos, EIRL”- Sandra Maria Coutinho Pereira – contactou com os serviços
da CMF para marcar uma audiência com a presidente da autarquia, a arguida Fátima
Felgueiras.
Tal chamada foi atendida por uma funcionária da CMF, de nome Rosinda, tendo
sido agendada a audiência com a arguida Fátima Felgueiras para o dia 02.09.97.
Nesta reunião, o arguido Guilherme Almeida, enquanto dono da obra, e a
testemunha Manuel Maria Machado, enquanto autor do projecto e responsável técnico
pela execução da obra, fizeram à arguida Fátima Felgueiras a apresentação do projecto e
da obra que se pretendia realizar e que haviam feito entrar na CMF no dia 30.07.97.
No decurso dessa mesma audiência, após a apresentação do projecto e da obra, o
arguido Guilherme perguntou à arguida Fátima Felgueiras se seria possível iniciar
imediatamente os serviços de terraplanagem e remoção de terras do terreno onde iria ser
construído o edifício, terraplanagens que durariam cerca de 3 a 4 meses, por se tratar de
um terreno rochoso, e que seria também o tempo necessário para a CMF apreciasse e
aprovasse o projecto.
Na sequência desse pedido, pela arguida Fátima Felgueiras foi comunicado ao
arguido que tal só era possível após a aprovação do projecto de arquitectura e com a
obtenção de uma licença para caboucos.
No dia 29.09.97, numa primeira apreciação técnica, o Arquitecto Rui José Silva
Pinto Almeida, técnico da CMF, proferiu o seguinte despacho sobre o pedido de
licenciamento da obra objecto do processo nº 630/97:
“A pretensão deverá ser indeferida tal como é apresentada uma vez que tem
uma área de implantação superior ao imposto pelo regulamento do PDM bem como a
Certidão de Localização aprovada pela CCRN, indeferindo com base nas als. a), b) e d)
do nº 1 do artº 33 do DL. 445/91.”
Este parecer foi notificado ao arguido Guilherme Almeida através do ofício nº
5094, datado de 06.10.97, emanado da CMF, e que ele recebeu a 08.10.97.
Consequentemente, por não respeitar o PDM (que só permitia uma implantação
máxima de 1.000 metros quadrados no tipo de aglomerado em que se inseria) e por estar
em desconformidade com o processo de pedido de emissão de certidão de localização
entregue na CCRN, emitida com base na área de implantação indicada (1.000 m2), o
projecto foi, inicialmente, indeferido.
No dia 07.10.97, o arguido Guilherme da Silva Almeida foi visitado nas suas
instalações fabris pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, que se intitularam
como pertencendo à comissão de angariação de fundos para a campanha do PS da
concelhia de Felgueiras, os quais ali se deslocaram no sentido de obter daquele um
donativo para ajudar a custear as despesas com a campanha eleitoral do PS para as
eleições autárquicas que viriam a ter lugar a 14.12.97.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assim, o arguido Guilherme Almeida, na qualidade de titular do EIRL


denominado “Guilherme da Silva Almeida EIRL”, emitiu e entregou aos arguidos
Horácio Costa e Joaquim de Freitas o cheque n.º 3527347293, sacado sobre a conta n.º
0145/08/001464.1, do Banco Pinto & Sotto Maior – BPSM, dependência das Caldas de
Vizela, à ordem do arguido Joaquim de Freitas, datado de 10.10.97 e no montante de
250.000$00.
Entretanto, através de aditamento ao projecto inicial, o arguido Guilherme
requereu então a redução da área de implantação ao limite legal (1.000 m2), dando
assim cumprimento às exigências contidas no PDM, conforme consta do primeiro
despacho de indeferimento.
No dia 14.11.97, depois de satisfeitas as exigências legais (exigências contidas
nos pareceres dos técnicos camarários relativos à aprovação do projecto apresentado
pelo arguido Guilherme), este foi notificado pela CMF de que o projecto havia sido
aprovado.
Nesse mesmo dia (14.11.97), deram entrada na CMF os projectos das
especialidades
Sucede que, em data indeterminada de Novembro de 1997 (mas seguramente
antes do dia 27 desse mês), o arguido Guilherme da Silva Almeida iniciou as
terraplanagens no terreno acima referido.
Mais tarde a obra foi fiscalizada pelos serviços de fiscalização da autarquia que,
face à inexistência de licença de construção, elaboraram o correspondente auto de
notícia, datado de 27.11.1997, o que originou um processo de contra-ordenação, vindo a
obra a ser embargada no dia 09.01.98.
Perante aquele auto de notícia, o arguido Guilherme conctactou a testemunha
Manuel Machado, responsável técnico pela execução da obra, a quem deu
conhecimento desse auto.
No dia 09.01.98, o arguido Guilherme foi então notificado pelos mesmos fiscais
da CMF do embargo total da obra de terraplanagem, tendo-lhe sido comunicado que
deveria parar imediatamente a execução da obra.
Em face disso, o arguido Guilherme ordenou aos operários e demais
responsáveis pela obra de terraplanagem que parassem os trabalhos.
E, a mando do arguido Guilherme Almeida, foram efectuados vários
telefonemas para o gabinete da testemunha Manuel Machado e que se prendiam com a
resolução do problema e com a possibilidade das obras prosseguirem.
Em data indeterminada de meados de Janeiro de 1998, enquanto se encontrava
na “MOCAP” (na “Exponor”), o arguido Guilherme foi contactado pelo seu
funcionário, a testemunha Paulo Martins, o qual lhe comunicou que havia recebido na
empresa um telefonema da CMF vinda do arguido Horácio Costa a pedir para lhe falar.
Como o arguido Guilherme não se encontrava na empresa, o arguido Horácio
Costa solicitou o seu número de telemóvel, o qual lhe foi fornecido, pelo que,
contactando-o de seguida, comunicou-lhe que, segundo indicação por si obtida da
arguida Fátima Felgueiras, o dito Guilherme Almeida poderia continuar com as
terraplanagens.
Em face desta comunicação, o arguido Guilherme Almeida retomou os trabalhos
de terraplanagem.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Todavia, no dia 19.01.1998, os serviços da Câmara Municipal de Felgueiras


elaboram um novo auto de notícia comunicando o não acatamento da ordem de
embargo, auto esse que a arguida Fátima Felgueiras não mandou remeter ao MP para
procedimento criminal pela eventual prática de um crime de desobediência,
diligenciando antes pela obtenção de esclarecimentos junto do Departamento Técnico.
Entretanto, em face dos pareceres favoráveis, a arguida Fátima Felgueiras
deferiu o licenciamento requerido, por despacho proferido em 26.01.1998, em
consequência do que veio a ser emitida a licença de construção nº 101/98.
Em 06.02.1998, o arguido Guilherme da Silva Almeida entregou um segundo
donativo para a campanha eleitoral daquela arguida, no valor de Esc. 150.000$00 (cento
e cinquenta mil escudos), tendo para o efeito emitido o cheque n.º 2283963692, datado
de 06.02.1998, sacado sobre a conta n.º 00000145816, da Caixa de Crédito Agrícola
Mútuo de Felgueiras.
A 14.08.97, o arguido Guilherme Almeida havia dado entrada na CMF de um
projecto de arquitectura relativo à construção de um armazém, ao qual veio a ser
atribuído o nº 662/97.
Em 20.10.97, o arguido Guilherme Almeida recebeu o ofício 5125, datado de
07.10.97, dando conhecimento do parecer técnico dos serviços da CMF, que se
pronunciaram no sentido do seu indeferimento por este, à semelhança do projecto
relactivo ao edifício industrial, prever uma área de implantação superior à permitida
pelo PDM e aprovada pela CCRN.
Como não foi dada qualquer resposta a tal ofício, o arguido Guilherme recebeu a
03.04.98 o ofício nº 1674, datado de 31.03.98, indeferindo o pedido de licenciamento de
construção de tal armazém.
Ora, esse projecto viria a ser reformulado, pelo que, em 19.02.1998, o arguido
Guilherme Silva Almeida apresentou um outro pedido de licenciamento (ao qual foi
atribuído o n.º 116/98) referente à construção de um armazém, contíguo ao edifício
industrial já existente, situado em Bouça Grande – Penacova – Felgueiras (a que
respeita o processo de licenciamento n.º 630/97).
Devido ao facto de tal obra, mais uma vez, ter sido iniciada sem licença, a
mesma foi embargada, após instauração de um processo de contra-ordenação baseado
em auto de notícia datado de 25.05.1998.
Em 17.06.98, o arguido Guilherme recebeu o ofício 3087, datado de 15.06.98,
novamente com um parecer técnico no sentido do seu indeferimento, uma vez que o
deferimento do projecto estava pendente de uma operação de loteamento ou de destaque
da parcela de terreno onde se pretendia efectuar a implantação da obra.
O técnico responsável pelo projecto de arquitectura, contratado pelo arguido
Guilherme, insistiu então na construção do armazém sem qualquer operação de
destaque, tendo sido recebido pelo arguido Guilherme em 26.10.98 o ofício 5592,
datado de 19.10.98, reafirmando a posição da CMF de que o projecto só seria aprovado
após a operação de destaque.
Assim, inicialmente, este pedido de licenciamento foi indeferido, dado que o que
se pretendia era a construção de um armazém na mesma parcela de terreno em que já
existia a fábrica, implicando uma operação prévia de destaque ou de loteamento (o
imóvel foi considerado uma segunda construção).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em face destes sucessivos despachos, o técnico responsável pelo projecto


contratado pelo arguido Guilherme avançou para a operação de destaque e, em
15.01.99, recebeu o arguido Guilherme o ofício 259, emanado da CMF e datado de
12.01.99, notificando-o da decisão de indeferimento do pedido de destaque tal qual ele
fora apresentado pelo ali requerente.
A operação de destaque viria entretanto a ser aprovada.
Em 11.02.1999, os serviços de fiscalização elaboraram novo auto de notícia,
dando conta do não acatamento da ordem de embargo (de que o arguido Gulherme não
foi notificado).
Em face disso, em 15.02.1999 a arguida Fátima Felgueiras mandou embargar de
novo a obra e, em 17.02.1999, a mesma arguida Maria de Fátima Felgueiras, ordenou a
remessa do auto de notícia ao Ministério Público, para efeitos de procedimento criminal
pela prática do crime de desobediência (facto de que o arguido Guilherme, pelo menos à
data, não teve conhecimento).
No entanto, a 06.04.99, a arguida Maria de Fátima Felgueiras proferiu novo
despacho, em sentido contrário, determinando a suspensão do envio do auto de notícia
ao Ministério Público por 60 dias, com base numa informação do Departamento
Técnico da autarquia datado de 29.03.99 e que consta do processo de licenciamento a fls
133, sendo certo que, em face da aprovação do projecto de arquitectura, esse auto não
viria a ser enviado ao MP.
No dia 05.05.99, o arguido Guilherme recebeu o ofício 2489, notificando-o da
aprovação do projecto de arquitectura, em face de parecer favorável.
No dia 15.07.99, o arguido Guilherme recebeu o ofício 2111, notificando-o para
proceder ao levantamento da licença de construção.
Em 07.10.99 foi emitido o alvará de licença de construção nº 698/99.
Em 16.03.2000 o arguido Guilherme foi notificado do ofício 684, no qual a
CMF informava que não se encontravam aprovadas as obras de infraestruturas.
Em 09.06.2000 foi então emitido o alvará de licença de utilização nº 339A/2000.

2.1.5. - A propósito dos donativos concedidos pelos arguidos Joaquim


Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva
Os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Pimenta da Silva eram sócios na
empresa do ramo imobiliário denominada “Conterfel”, conjuntamente com o Eng.º.
Manuel Maria Machado, conhecendo-se há vários anos.
Por outro lado, e simultaneamente, o arguido Joaquim Teixeira Pinto era
também administrador da empresa “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”, enquanto o
arguido José Manuel Pimenta da Silva era sócio-gerente da empresa denominada
“Solpré – José Manuel Pimenta da Silva & Cª., Lda.”.
Todavia, sucede que ambos os arguidos, necessitavam de construir, para cada
uma daquelas empresas, novas unidades industriais (visto que as anteriores deixaram de
ser suficientes e adequadas à actividade industrial que prosseguiam).
Tendo encontrado um terreno adequado às suas necessidades, situado no lugar
de Cabeça de Porca, Sendim, Felgueiras (situado uma parte, segundo o PDM, em zona
industrial e outra em zona de floresta dominante e área percorrida por incêncios), as

36
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

duas empresas associaram-se no sentido de o adquirir, perspectivando dividí-lo


posteriormente em duas partes, na qual cada uma das ditas empresas construiria as
respectivas instalações fabris.
Entretanto, entre ambos os mencionados arguidos, foi acordado que seria a firma
“José Manuel Pimenta da Silva & Cª., Lda.” a adquirir o dito terreno, o que se
concretizou por escritura pública realizada ainda no ano de 1997, registando-se assim o
imóvel unicamente em nome da firma “José Manuel Pimenta da Silva e Cª Ldª”, mais
tendo sido acordado que mais tarde a firma “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”
adquiriria a parcela onde lhe caberia construir as suas instalações (o que só viria a
suceder após o loteamento do terreno, por escritura publica celebrada em 18.02.2002, no
Cartório Notarial de Fafe).
Contudo, como ao referido terreno correspondia apenas um único artigo
matricial - situação que inviabilizava a construção das duas referidas unidades
industriais -, aqueles arguidos perspectivavam dividí-lo através de uma operação de
destaque de uma parcela, o que porém não viriam a conseguir levar a cabo na medida
em que os serviços competentes da CMF entendiam que a operação em causa apenas
poderia ser concretizada através do loteamento do terreno, o que não agradou nada
àqueles arguidos, visto que se tratava de uma operação mais demorada e mais cara.
A fim de ultrapassar tal problema legal e uma vez que não conseguiam proceder
ao destaque da parcela, os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da
Silva pediram então uma audiência à arguida Maria de Fátima Felgueiras, em data
indeterminada do ano de 1997, mas situada no primeiro semestre, audiência essa que
lhes foi concedida.
Através de tal contacto pessoal com a Presidente Maria de Fátima Felgueiras,
acompanhada do Arquitecto Rui Almeida e estando ainda na altura presente o
Engenheiro Manuel Maria Machado, que acompanhava os arguidos Joaquim Teixeira
Pinto e José Manuel Pimenta da Silva (por ser o técnico contratado por estes), e depois
dos ditos arguidos terem exposto a situação do referido lote de terreno, bem como as
suas intenções de no mesmo instalarem dois pavilhões industriais, um para cada uma
das suas empresas (“Solpré” e “Pinfel”), àquela arguida foi solicitada a autorização para
o início das obras de terraplanagem, mesmo sem a emissão da respectiva licença de
construção.
Por outro lado, visando resolver o problema da implantação em tal terreno dos
dois citados edifícios industriais, a arguida Maria de Fátima Felgueiras comunicou
àqueles arguidos que a solução seria efectuar-se o loteamento do terreno.
Entretanto, os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva
iniciaram os trabalhos de terraplanagem, em data não concretamente apurada, mas
situada durante o primeiro semestre do ano de 1997.
No seguimento da referida audiência, em 30.07.1997, a sociedade “José Manuel
Pimenta da Silva & C. Lda.” requereu, à CMF, autorização para proceder à construção
de duas unidades industriais num terreno sito em Cabeça de Porca – Sendim –
Felgueiras, tendo tais pedidos dado origem aos processos de obras particulares com os
n.º 413/99 e 414/99, solicitando, além disso, a constituição de dois lotes independentes,
pedido que deu origem ao processo de loteamento n.º 10/97, o qual viria inicialmente a
ser rejeitado por falta de apresentação de documentos necessários à análise do pedido de
loteamento em causa.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na altura de qualquer eleição, as comissões de angariação de fundos de qualquer


partido político percorrem a região de Felgueiras em busca de donativos, com particular
insistência junto dos industriais.
Assim, em 29.10.1997, os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
deslocaram-se ao gabinete da testemunha Manuel Machado, o qual lhes entregou:
- o cheque n.º 8369035058, no montante de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil
escudos), sacado sobre a conta n.º 0003265130, da agência de Felgueiras, da Caixa
Geral de Depósitos, emitido pelo arguido Joaquim Teixeira Pinto (“Pinfel”), a título de
donativo para a campanha eleitoral do PS; e
- o cheque n.º 8350026306, no valor de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil
escudos), sacado sobre a conta bancária n.º 0000074888, da agência de Felgueiras, da
Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, emitido pelo arguido José Manuel Pimenta da Silva
(da empresa Solpré), também a título de donativo para a campanha eleitoral daquele
partido às eleições autárquicas de Dezembro de 1997.
O arguido Pimenta da Silva efectuou também donativos a outras forças políticas,
concorrentes às eleições autárquicas de 1997.
Já em 12.12.1997, a dita testemunha Manuel Machado entregou aos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas o cheque n.º 8417836902, no valor de 670.000$00
(seiscentos e setenta mil escudos), sacado sobre a conta n.º 40012619996, da agência de
Felgueiras, da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, emitido pelo arguido José Manuel
Pimenta da Silva a título de donativo, mas para finalidade que não se apurou.
De permeio, em 26 de Novembro de 1997, a sociedade “José Manuel Pimenta da
Silva & C. Lda.” reformulou o projecto de loteamento.
Tal pretensão veio a ser indeferida, em inícios de 1998, com base em pareceres
técnicos que indicavam que o projecto violava o PDM em vigor, uma vez que a
implantação dos edifícios iria ocupar solo classificado como “floresta dominante”,
sendo uma área habitualmente percorrida por incêndios.
Em 19.02.1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras mandou notificar a
requerente do teor de tal despacho de indeferimento (posterior, portanto, à entrega dos
referidos donativos).
Entretanto, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, no dia 06.03.1998, remeteu
novamente o processo ao Director do Projecto do PDM para reapreciação.
Em 03.06.1998, o arguido José Manuel Pimenta da Silva juntou novas plantas,
informando a autarquia de que a estrutura dos edifícios já estava construída e
solicitando ao Gabinete do PDM que lhe indique a forma de ultrapassar a situação.
Depois de ter sido solicitado à Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro
e Minho (DRAEDM) que se pronunciasse sobre o processo, esta exigiu um estudo
paisagístico que, uma vez apresentado, foi considerado “globalmente equilibrado”.
Com base neste parecer, os técnicos da autarquia não levantaram qualquer
objecção, motivo pelo qual o projecto de arquitectura referente a tal loteamento acabou
por ser deferido pela arguida Maria de Fátima Felgueiras, em 25.01.1999, vindo a ser
deferida a respectiva licença a 03.01.2000, cujo alvará foi emitido já em 30.11.2001.
No âmbito do processo de obra particular nº 413/99, a Fiscalização elaborou a
27.05.98 uma participação dando conta da construção de dois pavilhões sem a
necessária licença de construção, razão pela qual a obra viria a ser embargada; mas,

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

como foi desrespeitado tal embargo, o arguido Pimenta da Silva foi julgado por crime
de desobediência no âmbito do processo nº 115/2000, do 1º Jz do TJ da Comarca de
Felgueiras.
A par disso, foi levantado um processo de contra-ordenação, tendo a sociedade
“José Manuel Pimenta da Silva & Cª Ldª”, em nome de quem o projecto e o
licenciamento da obra se encontrava, pago a coima que lhe foi aplicada, no montante de
750.000$00, mais custas no montante de 1.795$00, por decisão proferida pela CMF a
17.04.2000.
Pagou também a sociedade em causa, para que o processo fosse legalizado, a
importância de 22.159.150$00, como compensação pela área de terreno (8.475 m2) que
teria de ceder ao domínio público, sendo certo porém que de metade desse valor viria a
ser reembolsada pela sociedade “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”.
Foi ainda liquidada a quantia de 4.691.234$00 pela emissão do respectivo alvará
de loteamento.
Com a sua decisão de deferir o referido loteamento, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras autorizou a desafectação de um terreno classificado como “floresta
dominante”, requerido pelo arguido José Manuel Pimenta da Silva em representação da
sociedade “José Manuel Pimenta da Silva & Cª Ldª”, que só podia ser legalmente
efectuada por decisão judicial ou através da revisão do PDM, aprovando
consequentemente a legalização das duas supra referidas construções efectuadas pelas
firmas representadas pelos arguidos José Manuel Pimenta e Joaquim Pinto.
Por outro lado, através de tal decisão, os arguidos José Manuel Pimenta da Silva
e Joaquim Teixeira Pinto lograram alcançar os seus objectivos, ou seja, construir no
local referido.
Os arguidos Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva agiram de
forma livre, voluntária e consciente querendo através das suas condutas obter o
licenciamento das obras supra referidas, como efectivamente obtiveram.
Por sua vez, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, agiu de forma livre,
voluntária e consciente, deferindo o licenciamento do loteamento e das construções
referidas, estribada contudo em pareceres favoráveis.

2.1.6. - A propósito dos donativos concedidos pela arguida Maria Augusta


Faria Ferreira Neves
A arguida Maria Augusta foi militante do Partido Socialista desde 22.07.96 até
15.05.2002, tendo assumido a vice-presidência da Assembleia Municipal de Felgueiras
entre Janeiro de 1998 (na sequência da sua eleição pela lista do PS nas eleições
autárquicas ocorridas em 14.12.97) até meados de 2000, no âmbito da qual foi
convidada várias vezes pela arguida Fátima Felgueiras – em substituição do presidente
da Assembleia Municipal de Felgueiras, o Dr. Barros Moura, que residia e trabalhava
em Lisboa – para estar presente nas mais variadas recepções que a CMF efectuava às
entidades oficiais.
Foi convidada em 1997 para fazer parte da comissão de apoio à candidatura da
arguida Fátima Felgueiras, que era constituída por diversas personalidades locais, tendo
sido a dita Maria Neves incumbida de, pontualmente, organizar actos políticos dirigidos
à área feminina do eleitorado, sendo certo que, nesse âmbito, procedeu à entrega de

39
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

donativos, através da emissão de cheques, uns em nome da “Calzeus” e outro em nome


pessoal.
Consequentemente, era pessoa que mantinha com a arguida Fátima Felgueiras
uma relação de alguma proximidade.
A “Calzeus” é uma sociedade parcialmente pertencente à família da arguida
Maria Augusta Neves, onde trabalhavam quer o marido quer o seu filho, fundada há
mais de 10 anos, tendo grangeado elevado prestígio no mercado de calçado, quer a nível
nacional quer a nível internacional, designadamente através da marca “Swear”.
Nessa empresa a arguida Maria Neves, apesar de ter figurado como
administradora, nunca exerceu funções executivas, nunca tendo assim recebido qualquer
remumeração respeitante ao cargo de administradora, sendo certo que centra a sua
actividade nas funções docência universitária (há mais de 19 anos), na investigação e na
autoria de manuais escolares.
Assim, com o objectivo de apoiar a candidatura da arguida Maria de Fátima
Felgueiras à presidência da CMF, foi entregue por pessoa não concretamente
identificada ao arguido Horácio Costa, em 07.11.1997, um donativo no valor de Esc.
200.000$00 (duzentos mil escudos), através do cheque n.º 6921427631, sacado sobre a
conta bancária n.º 00015300007, da agência do Banco Espírito Santo de Barrosas,
subscrito, na qualidade de administradores da firma “Calzeus”, por José Manuel
Monteiro Neves e José Manuel Ferreira Neves, respectivamente marido e filho da
arguida Maria Augusta.
Cerca de um mês depois, em 12.12.1997, ainda com o mesmo propósito, a
arguida Maria Augusta Ferreira Neves procedeu à entrega de novo donativo, no valor de
Esc. 70.000$00 (setenta mil escudos), através do cheque n.º 0932743089, sacado sobre
a conta n.º 00427209100, da agência Central do Porto da Caixa Geral de Depósitos.
Em 05.01.1998, deu entrada, na CMF, um requerimento, em nome de José
Manuel Monteiro Neves, solicitando licença para proceder à construção de um edifício
destinado a armazém, com uma área de construção de 1.000 m2 (processo de construção
nº 6/98, apreendido nos autos), implantado num terreno com uma área de 11.900 m2
sito em Campos – Lagares – Felgueiras, pertencente à empresa “Calzeus Calçados,
S.A.”, tendo os projectos apresentados à CMF sido elaborados pela firma “Ambienta”.
A 26.02.98 foi aprovado o respectivo projecto de arquitectura, tendo-se
concedido 180 para que o requerente apresentasse os projectos de especialidade, os
quais viriam a ser apresentados a 22.07.98.
Entretanto, no dia 13.05.1998, a arguida Maria Augusta Ferreira Neves entregou
um terceiro donativo, no valor de esc.100.000$00 (cem mil escudos), através do cheque
n.º 9031000271, sacado sobre a conta bancária n.º 36258301001, da empresa “Calzeus
Calçado, Lda.”, da agência de Felgueiras do Banco Totta & Açores, apesar das eleições
terem ocorrido em Dezembro de 1997, donativo esse entregue para ajudar no custeo de
despesas relacionadas com a revista “Rubeas”.
Em 02.09.1998, os funcionários do serviço de fiscalização da CMF verificaram
que a obra já se tinha iniciado sem que tivesse sido emitida a respectiva licença de
construção e que a mesma tinha uma área total de construção bastante superior aquela
que constava do projecto apresentado na CMF.
Dando conta de tal situação, foi elaborado um auto de notícia que veio a dar
origem ao processo de contra-ordenação nº 466/98, aberto no dia seguinte, sendo certo

40
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

que o requerente da licença não se encontrava presente no acto da fiscalização, tendo


sido notificado do processo de contra-ordenação com o respectivo auto de notícia no dia
22.10.98.
Entretanto, no dia 03.09.98 a arguida Maria de Fátima Felgueiras tinha
despachado favoravelmente a emissão da licença de construção nº 660/98, emitida a
09.09.98, estribada em pareceres técnicos favoráveis constantes do processo de
licenciamento referido.
Ainda no âmbito do supra aludido processo de contra-ordenação, o ali arguido
José Manuel Monteiro Neves apresentou a sua defesa em 24.03.99, solicitando o
arquivamento dos autos, tendo aí sido aposta, desde logo, uma nota manuscrita pela
arguida Fátima Felgueiras, dirigida à testemunha Helena Félix, em 25.03.99 e que se
passa a reproduzir: “se, como afirma, o processo estiver legalizado à data da conclusão
do de contra-ordenação, admito que se arquive com admoestação.”
Entretanto, a arguida Maria Augusta Neves, a fim de ajudar a pagar o
remanescente do preço de aquisição da sede local do PS ainda em dívida, entregou ao
arguido António Bragança, em Abril de 1999, o cheque com o n.º 3769765719, no valor
de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos), sacado sobre a conta n.º 21656575/001
do BTA, balcão de Felgueiras, titulada por José Manuel Monteiro Neves (mas emitido
por Maria Augusta Ferreira Neves, em 16.04.1999).
Tal cheque foi depois entregue, para posterior depósito bancário, por António
Bragança a José Júlio Silva Pereira, funcionário do GAPP, co-titular com aquele de uma
conta bancária “oficial” do Partido Socialista de Felgueiras com o n.º 309-046952-400
da Caixa Geral de Depósitos de Felgueiras.
O arguido António Bragança exerceu as funções de adjunto do GAPP desde
13.10.99 até 10.02.2000, altura em que foi exonerado.
Em 26.11.99, ainda no âmbito do supra aludido processo de contra-ordenação, o
ali arguido José Manuel Monteiro Neves, instado a tanto pela CMF, veio informar que o
processo de construção estava devidamente legalizado, tendo requerido, uma vez mais,
o arquivamento dos autos.
Tal requerimento foi despachado a 27.11.99 pela arguida Fátima Felgueiras, a
qual, direccionando-o uma vez mais à testemunha Helena Félix, apôs “A confirmar-se,
arquive.”
No seguimento de tal despacho, a testemunha Helena Félix, em nota manuscrita
no próprio requerimento do dito José Neves, solicitou a 02.12.99 informação no sentido
de saber se a construção do pavilhão industrial estava ou não legalizada.
E, no seguimento desse pedido de informação, a 10.12.99, é aposta, igualmente
sobre o referido documento, a informação solicitada, subscrita por um técnico da CMF e
por ele rubricada (a qual é ilegível), na qual refere expressamente que “a obra está
legalizada” .
Em face dessa informação e do despacho da arguida Fátima de 27.11.99, acima
transcrito, o processo foi arquivado, tendo sido o mencionado José Neves notificado
desse arquivamento em 16.12.99.
E em 15.12.99 foi emitido o alvará nº 940/99, licenciando alterações à
construção inicial, alterações estas destinadas a um armazém.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Mais tarde, os serviços da CMF constataram que o edifício não era um armazém
mas uma unidade industrial, motivo pelo qual a arguida Maria de Fátima Felgueiras
proferiu, em 23.11.2000, um despacho concedendo 60 dias para que o proprietário
regularizasse a situação.
No entanto, pelo menos até Janeiro de 2002, tal regularização não tinha sido
requerida, vindo a licença de utilização a ser concedida a 28.02.2002.
A arguida Maria Augusta Ferreira Neves agiu de forma livre, voluntária e
consciente querendo contribuir e entregar os donativos supra referidos à arguida Maria
de Fátima Felgueiras.
A arguida Fátima Felgueiras agiu de forma livre e voluntária, despachando o
sobredito processo de licenciamento e deferindo a emissão das respectivas licenças
estribada, para o efeito, em pareceres técnicos que apontavam nesse sentido.

3. Factos provados relacionados com o 3º capítulo da pronúncia


3.1. – A propósito dos pagamentos de bens e serviços efectuados através da
conta do B.E.S.
A conta bancária n.º 238/27674/000.9, da agência bancária de Felgueiras do
Banco Espírito Santo, entre 11.07.1997 e 07.09.1999, data do seu encerramento, foi
utilizada para depósito de quantias monetárias obtidas pela forma supra descrita e para
realização de inúmeros pagamentos relacionados com os vários serviços e bens
contratados para as acções de campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima
Felgueiras, bem como despesas de cariz pessoal da mesma.
De entre os múltiplos pagamentos efectuados através de tal conta bancária,
destacam-se os seguintes:
a) – Acções da campanha eleitoral:
Durante o período em que tal conta esteve activa, através dela foram efectuados
múltiplos pagamentos de custos de campanha eleitoral (designadamente com
espectáculos musicais, bandeiras, cartazes, “pins”, renda da sede, etc.) que atingiram o
valor global de Esc. 52.577.832$00.
b) - Aquisição do Veículo “Audi A4”, de matrícula 96-29-LN, por Fátima
Felgueiras:
Em meados do ano de 1998, a arguida Maria de Fátima Felgueiras manifestou
ao arguido Joaquim de Freitas a intenção de trocar a sua viatura de marca “Citroen”, por
um veículo de marca “Audi A4”, recorrendo para o efeito às sobreditas quantias obtidas
através da “RESIN e depositadas na conta do BES e numa “conta paralela”, de que
aquele e o arguido Horácio Costa eram co-titulares, vindo a utilizar efectivamente parte
da quantia de Esc. 5.250.000$00 entregue em 16.06.1998 pelo arguido Carlos Marinho
em numerário, já em seu poder, proveniente de fundos angariados.
Os arguidos Joaquim de Freitas e Horácio Costa, seguindo instruções da Maria
de Fátima Felgueiras, contactaram a empresa “Machado & Costas, Lda.”, de Guimarães,
e acertaram a compra do referido veículo pelo preço de Esc. 5.700.000$00, a pronto
pagamento.
Posteriormente, e com intuito de impedir, para sua salvaguarda, que fosse
possível associar a compra de tal automóvel à conta existente no BES de Felgueiras,
ainda segundo instruções da arguida Fátima Felgueiras, os arguidos Horácio Costa e

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2º Juízo

Joaquim de Freitas decidiram depositar, no dia 28.07.1998, do montante que lhes tinha
sido entregue pelo arguido Carlos Marinho da “RESIN”, a quantia de Esc.
4.700.000$00, em dinheiro, na conta pessoal do primeiro, com o n.º 133180013, do
Banco Melo, agência de Fafe, embora não lograssem completar tal dissimulação.
No dia seguinte, 29.07.1998, os arguidos Horácio Costa, Joaquim de Freitas e
Maria de Fátima Felgueiras, dirigiram-se ao “stand” da empresa “Machado & Costas,
Lda.”, sito em Guimarães onde, após terem tratado de toda a documentação referente à
compra, o primeiro entregou na contabilidade daquela empresa, para pagamento do
automóvel, os seguintes cheques, que tinha previamente emitido:
- o cheque n.º 1659468550, com a data de 29.07.1998, sacado sobre a sua conta
n.º 00133180013, do Banco Melo, agência de Fafe, no valor de 4. 700. 000$00 - (cfr.
fls. 77 do 1º Volume); e
- o cheque n.º 1659468550, com data de 29.07.1998, no valor de Esc.
1.000.000$00, emitido sobre a conta n.º 0027674009 do BES, titulada pelos arguidos
Horácio Costa e Joaquim de Freitas - (cfr. fls. 77 do 1º Volume);
c) – Pagamento de uma dívida do FCF:

No ano de 1998, a “RESIN” recebeu um adiantamento, no valor de Esc.


389.970.768$00, autorizado pela “AMVS”, sobre as verbas provenientes da construção
do aterro RIB de Felgueiras, supra referido.
Após a “RESIN” ter recebido tal adiantamento, uma parte daquele montante foi
utilizado para pagar uma dívida que o FCF tinha para com a Caixa de Crédito Agrícola
Mutuo de Felgueiras (CCAMF), proveniente de um acordo particular assinado entre a
CCAMF e o FCF (acordo de transacção), em 15.09.1998, acordo esse que visou
regularizar as dívidas deste clube para com aquela instituição bancária, relativas a várias
acções comuns e acções executivas em curso, consolidando o crédito da primeira na
quantia global de Esc. 325.000.000$00.
Desse montante, a quantia de Esc. 50.000.000$00 deveria ser paga até ao dia
30.09.1998.
Todavia, sucede que, até essa data o FCF apenas conseguiu pagar Esc.
30.000.000$00, permanecendo em dívida a quantia de Esc. 20.000.000$00.
Porque entretanto a CCAMF estava a exigir o pagamento da quantia ainda em
dívida, o arguido Júlio Faria recorreu à arguida Maria de Fátima Felgueiras, procurando
que esta tentasse encontrar uma solução que permitisse ao FCF pagar à CCAM de
Felgueiras tal montante.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras, acedendo a tal pedido, deu instruções ao
arguido Horácio Costa no sentido de acompanhar o arguido Júlio Faria à sede da
“Resin”, em Matosinhos, com o intuito de contactar o arguido Vítor Borges e de lhe
solicitar um donativo de Esc. 20.000.000$00 para o FCF, tendo-se então comprometido
o arguido Vítor Borges a apoiar o clube em face das disponibilidades financeiras da
“Resin” logo que o consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” recebesse o adiantamento de
verbas da AMVS, no âmbito do contrato de empreitada para a construção do Aterro de
Resíduos Industriais Banais (RIB) de Felgueiras, pois só nessa altura teria
disponibilidade financeira para apoiar aquele clube com um dito donativo.
No seguimento de tal acordo, no dia 27.10.1998, alguém da “Resin” (cuja
identidade não se apurou) contactou, via fax, a Associação de Municípios do Vale do
Sousa (AMVS), solicitando que fosse transcrito para impresso da Associação o texto
enviado em anexo e que autorizava a concessão de um adiantamento sobre o "Contrato

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

de Empreitada de Concepção, Construção e Gestão de um Sistema de Tratamento de


Resíduos Industriais Equiparados a Urbanos do Sector do Calçado no Município de
Felgueiras – RIB de Felgueiras", no montante de Esc. 389.970.768$00 (trezentos e
oitenta e nove milhões, novecentos e setenta mil e setecentos e sessenta e oito escudos)
para que esse montante fosse descontado junto de uma instituição de crédito,
comprometendo-se a AMVS a proceder à sua liquidação.
O Conselho de Administração (CA) da AMVS deliberou favoravelmente a
proposta da “RESIN” autorizando-a a proceder ao desconto de uma factura junto de
uma instituição de crédito, desde que à AMVS não fossem imputados juros de mora
pela sua não liquidação nos prazos previstos, e, em 06.11.1998, comunica tal decisão à
referida empresa.
Após ter tido conhecimento de tal adiantamento à “RESIN”, o arguido Júlio
Faria, visando resolver a dívida do FCF, nesse mesmo dia envia a Horácio Costa um
manuscrito, onde renova o pedido de resolução da situação.
Após o envio de tal missiva e depois do arguido Júlio Faria de ter sido
informado de que poderia comunicar à CCAM de Felgueiras que o problema seria
resolvido a muito breve trecho (pois a “Resin” acedera em entregar o solicitado
donativo de 20.000 cts), no dia 04.12.1998, esse arguido e Álvaro Costa, em
representação do FCF, enviam uma carta à CCAM de Felgueiras referindo que a dívida
de Esc. 20.000.000$00 seria saldada até ao final do ano.
Em 30.12.1998, o arguido Horácio Costa foi então contactado, nas instalações
da CMF, pelo arguido Carlos Marinho (quadro superior da “RESIN”), tendo ele feito
entrega de Esc. 20.000.000$00 (vinte milhões de escudos), sendo Esc. 12.500.000$00
através da emissão do cheque n.º 9112924417, sacado sobre a conta do BPN n.º
122970155, titulada pela “RESIN”, e o restante em numerário.
Como habitualmente, o arguido Horácio Costa comunicou tal recebimento à
arguida Maria de Fátima Felgueiras, que de imediato contactou os responsáveis pelo
FCF.
Decorrido pouco tempo, mas nesse mesmo dia, Horácio Costa foi abordado pelo
Dr. Barata Feio e pelo Sr. Figueiredo, funcionários do FCF, aos quais entregou a supra
referida quantia monetária, na forma em que a recebera da “RESIN” e estes deslocaram-
se ao Banco Totta & Açores (BTA) agência de Felgueiras onde depositaram aqueles
valores na conta n.º 21287235/001, titulada pelo FCF.
Esta quantia, que permitiu ao FCF solver a totalidade da prestação vencida em
30.09.98, no âmbito do supra descrito acordo de transacção (para garantia do capital em
dívida foram emitidas seis livranças em branco de acordo com a respectiva cláusula 4ª,
tendo os Srs. Álvaro Costa e Fernando Lima prestado o respectivo aval da forma ali
convencionada, sendo certo porém que nenhuma dessas livranças foi avalisada pelo
arguido Júlio Faria, nem era suposto sê-lo em face de tal acordo); tal quantia apenas foi
entregue pela “RESIN” porque tal lhe foi pedido pelo arguido Júlio Faria (com o aval da
arguida Fátima Felgueiras, a qual dera instruções ao arguido Horácio no sentido de
acompanhar à sede da “Resin” o arguido Júlio) e porque tinha obtido (a mais) a quantia
de Esc. 140.000.000$00, dissimulada na proposta que o consórcio liderado pela “Resin”
apresentou ao concurso internacional relativa à concepção/construção/exploração, com
apoios comunitários, do Aterro de Resíduos Industriais Banais (RIB) de Felgueiras.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Fátima Felgueiras sempre recebeu com regozijo a colaboração das


mais diversas pessoas e entidades com as associações de natureza desportiva, social,
cultural ou outras existentes no concelho de Felgueiras.
Considerando mesmo vital para a prossecução dos objectivos dessas associações
o mecenato e os contributos, incluindo de natureza financeira, prestados por tais pessoas
e entidades.
O FCF não constituía, neste aspecto, excepção, pelo relevante contributo que
sempre deu ao desenvolvimento do desporto concelhio e ao prestígio do município.

3.2. – A propósito da “conta paralela” ou “caixa paralela”


Para além da referida conta bancária aberta no BES, existiram ainda diversos
donativos e pagamentos efectuados com as quantias recolhidas que não chegaram a ser
depositados ou movimentados em tal conta bancária, acabando os mesmos por
constituir uma espécie de “conta paralela” ou “caixa paralela”.
Estes montantes “guardados em caixa” serviram, entre outras coisas, para pagar
diversos serviços relativos à campanha eleitoral da arguida Maria de Fátima Felgueiras
às eleições autárquicas de 1997, bem como para o pagamento de despesas de cariz
particular de tal arguida, tais como gasolina, despesas com géneros alimentícios, para
pagar 1.550 bilhetes de um sorteio realizado pelo FCF, para depositar Esc.
1.850.000$00 na conta particular do arguido Júlio Faria, etc...
Os depósitos documentados em tal “conta paralela” ascenderam ao valor global
de Esc. 11.131.653$00, enquanto os pagamentos efectuados atingiram o valor global de
Esc. 14.920.998$00, sendo a diferença coberta por transferência da referida conta aberta
no BES.

4. Factos provados relacionados com o 4º capítulo da pronúncia


4.1. - A propósito da introdução
A arguida Maria de Fátima Felgueiras, no exercício das suas funções de
presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, analisou e deferiu inúmeros pedidos de
licenciamento de obras particulares e outras, sempre estribada em pareceres técnicos.
Assim:
4. 2. – A propósito do processo de obra particular n.º 130/88, relativo à
construção da unidade industrial da sociedade “Teixeira Pinto & C. Lda.”
(posteriormente, “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”)
A sociedade denominada “Teixeira Pinto & C. Lda.” (posteriormente
denominada, “Pinfel – Indústria de Calçado, SA”), no dia 06.04.1988, apresentou, nos
serviços de obras da CMF, um pedido de licenciamento de construção de uma unidade
industrial, sita no Lugar de Pinheiro, Lagares, Felgueiras, o qual foi registado como
processo de obra n.º 130/88, pedido esse que foi deferido, emitindo-se
consequentemente o respectivo alvará de construção.
Todavia, sucede que, no dia 11.06.1997, foi emitido, em tal processo, um
parecer técnico alertando para o facto daquela obra estar a ser ampliada sem o
respectivo licenciamento e em desconformidade com o PDM e RGEU em vigor.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Face a tal denúncia, mas apenas em 27.10.1997, são instaurados dois processos
de contra-ordenação pelas ampliações efectuadas sem licença de construção e pelo facto
do imóvel estar a ser utilizado sem a respectiva licença de utilização (processos de
contra-ordenação nºs 583/97 e 584/97).
Em Novembro de 1997 foi concedido um prazo de 180 dias para que a
requerente regularizasse a situação, o que não foi feito.
Entretanto, os mencionados processos de contra-ordenação foram encerrados,
respectivamente, no dia 25.01.1998 (através de um despacho de arquivamento –
processo nº 583/97) e no 05.11.1999 (através da aplicação de uma coima – processo
584/97).
No dia 16.02.2000 a requerente fez juntar um requerimento no sentido de
legalizar as alterações entretanto introduzidas ao projecto inicial, tendo-lhe sido porém
concedidos 30 dias para instruir o processo com os documentos em falta.
Alguns meses depois, mais precisamente, no dia 06.07.2000, a presidente da
CMF, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, sem que tal tivesse sido requerido mas na
sequência de uma audiência concedida à requerente a 05.07.2000, decide solicitar a
reapreciação do referido pedido de licenciamento por parte dos serviços técnicos da
autarquia.
Depois de dois pareceres elaborados por um técnico da CMF (datados de 4 e 19
de Julho de 2000, respectivamente) terem referido, expressamente, que se mantinha a
violação do PDM, a arguida Maria de Fátima Felgueiras decidiu indeferir o
licenciamento/legalização das obras, através de despacho proferido no dia 18.09.2000.
Em 11.12.2000, no mesmo processo de legalização de obra, foram proferidos
novos pareceres técnicos, que mantiveram a indicação de que não estavam a ser
respeitados os afastamentos aos limites da propriedade.
Dada a junção de declaração de não oposição por parte do proprietário do
terreno confinante relativamente ao não respeito da construção pelo afastamento ao
limite da propriedade, por despacho de 21.12.2000, o projecto de arquitectura acabaria
por ser aprovado, ficando o processo a aguardar a apresentação dos projectos de
especialidade.
Entretanto, a 18.01.2001, foi feito um novo requerimento de legalização da obra,
na sequência da qual, a 14.02.2001, foi concedido um prazo de 30 dias para que a
requerente levasse a cabo obras de demolição, sendo concedida licença para o efeito.
Uns dias depois, no dia 21.02.2001, foram liquidadas as respectivas taxas,
embora agravadas (porquanto, pelo menos uma parte das obras decorreu antes do
respectivo licenciamento).
Em 23.02.2001, o processo de obra foi averbado em nome da “Pinfel – Indústria
de Calçado, SA”, tendo o alvará de construção sido emitido em 23.04.2001, com o n.º
304/2001.
Finalmente, depois de a arguida Maria de Fátima Felgueiras ter proferido, em
08.06.2001, um despacho deferindo a licença de utilização, esta veio a ser emitida, no
dia 15 do mesmo mês.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, querendo decidir no sentido da emissão do alvará de construção e da
respectiva licença de utilização da obra supra referida, usando os poderes das funções de

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

autarca que exercia, estribada nos pareceres técnicos proferidos em tal processo de
licenciamento.

4. 3. – A propósito do processo de obra particular n.º 5/I/93 relativo à


construção da unidade industrial da sociedade “Marina Calçados, SA”
O processo de obra particular n.º 5/I/93, relativo à construção da unidade
industrial da sociedade “Marina Calçados, SA”, sita na Quinta da Estrada – Margaride –
Felgueiras, deu entrada na CMF, no dia 15.06.1993, tendo o projecto sido elaborado
pela firma “Ambienta”.
O respectivo projecto de arquitectura foi aprovado por despacho proferido a
02.02.94 pelo arguido Júlio Faria, então presidente da CMF, na sequência de pareceres
técnicos favoráveis, o último dos quais proferido no dia anterior.
Em face disso, não obstante a área de construção requerida ser de 3.996 m2,
violando assim o regulamento do PDM de Felgueiras (que entretanto entrara em vigor a
28.01.94), já que para o local a área máxima de ocupação do solo prevista era de 1.000
m2 (área classificada como sendo de aglomerado de 2º nível), a 19.08.94 a arguida
Fátima Felgueiras despachou favoravelmente o projecto apresentado, sendo emitido o
respectivo alvará de construção, em 07.11.1994, ao qual foi atribuído o n.º 903/94.
No dia 16.10.1997, António Pereira de Castro (irmão e sócio do requerente de
tal projecto - Carlos Pereira de Castro), entregou um donativo para a campanha eleitoral
da arguida Maria de Fátima Felgueiras às eleições autárquicas do mesmo ano, no valor
de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos).
Após a entrega de tal donativo, no dia 27.03.1998, foi emitido, pela CMF, o
Alvará de Utilização nº 187 para aquela unidade industrial.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente tendo deferido, no pleno exercício das suas funções membro eleito de órgão
autárquico, a emissão do alvará de construção e a respectiva licença de utilização da
obra supra referida, estribada em todo o caso em pareceres técnicos favoráveis.

5. Factos provados relacionados com o 5º capítulo da pronúncia


5.1. - A propósito da introdução
Manuel Renato Guerra Fonseca e Silva (adiante designado apenas por Renato
Guerra - pai) foi sócio-gerente da empresa Proeme – Promoção e Mercados, Ldª, que
tinha por objecto a prestação de serviços na área do estudo de mercados e promoção de
produtos, consultadoria de imagem e publicidade e se encontra actualmente desactivada
e sem qualquer tipo de actividade, detendo o mesmo uma quota de 80% do capital
social, enquanto o seu filho Renato Manuel Ferreira Guerra da Fonseca e Silva (adiante
designado como Renato Guerra - filho) detinha os restantes 20%.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras, através da adjudicação e celebração de
um contrato atinente às comemorações dos “20 anos do Poder Local”, pretendia
divulgar o trabalho que tinha desenvolvido na autarquia de Felgueiras, durante os dois
últimos anos do mandato por si exercido, em substituição do arguido Júlio Faria.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

5. 2. - A propósito da adjudicação dos contratos de “prestação de serviços


de assessoria de comunicação e imagem” e de “concepção, produção e
fornecimento de exposição no âmbito das comemorações dos 20 Anos do Poder
Local”, celebrados entre a “Proeme” e a CMF (na parte que ainda interessa)
Na execução do referido projecto estratégico, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras, em Fevereiro de 1997, usando para o efeito os poderes que detinha na CMF,
procedeu à abertura de um concurso limitado sem apresentação de candidaturas, que
teve como objecto a prestação de serviços de assessoria de comunicação e imagem
(nomeadamente, assessorar e coordenar as relações públicas da autarquia, conforme o
ponto 5.1 do caderno de encargos) e ainda a concepção, produção e fornecimento de
exposição no âmbito das comemorações dos “20 Anos do Poder Local” (de acordo com
o ponto 5.2 do caderno de encargos).
Para concorreram a tais concursos limitados, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras, através da CMF, convidou três empresas para apresentarem propostas.
Todavia, apenas duas das empresas convidadas, as sociedades “Isto É –
Comunicação Visual, Lda.”, com uma proposta global de Esc. 28.269.000$00 (vinte e
oito milhões e duzentos e sessenta e nove mil escudos) e a “Proeme”, com uma proposta
global de Esc. 34.900.000$00 (trinta e quatro milhões e novecentos mil escudos), foram
oponentes ao concurso.
Apreciadas as propostas por uma comissão de análise, esta, no seu relatório
final, considerou-as similares, remetendo a decisão final para a pessoa que detinha a
competência para a adjudicação, ou seja, para a presidente da CMF.
No entanto, no parecer emitido, aquela Comissão alertou para o facto de: “face
ao tipo de concurso aberto – Concurso limitado sem apresentação de candidaturas, o
valor da adjudicação não poderá ultrapassar o limite de 7.500.00$00, pelo que esta se
deve resumir aos serviços prestados no ponto 5.1”, acrescentando ainda que,
relativamente à adjudicação das restantes tarefas englobadas no ponto 5.2., a mesma
deve ser “precedida dos formalismos administrativos adequados a cada uma delas. Isto
não obstará a que o contrato a celebrar para os serviços do ponto 5.1. não possa impor
ao adjudicatário responsabilidades pela exequibilidade, em termos de custos, das
referidas tarefas do ponto 5.2., em conformidade com a respectiva proposta agora
apresentada”.
Apesar de a sociedade “Isto É, Lda.” ter apresentado uma proposta
substancialmente inferior (menos Esc. 6.631.000$00 – seis milhões e seiscentos e trinta
e um mil escudos), a arguida Maria de Fátima Felgueiras decidiu, em 10.03.1997,
adjudicar à “Proeme”, os serviços referidos no ponto 5. 1, alegando para o efeito que era
a: “... firma melhor pontuada, com base na informação técnica”, facto que se colhia do
parecer da comissão de avaliação, com ela celebrando assim a CMF, no dia 01.04.1997,
um “Contrato de Prestação de Serviços de Assessoria de Comunicação e Imagem e
Coordenação das Relações Públicas da CMF”, no valor global de Esc. 7.546.500$00
(sete milhões, quinhentos e quarenta e seis mil e quinhentos escudos), ou seja Esc.
6.450.000$00 + IVA, para vigorar entre o mês de Agosto e o mês de Dezembro de
1997.
Porém, o mesmo acabou por ser suspenso pela autarquia, em Setembro do
mesmo ano, com efeitos a partir de Agosto de 1997, através de um despacho proferido
pela arguida Maria de Fátima Felgueiras, por considerar que a “Proeme” não estava a
executar o contrato conforme o previsto contratualmente.

48
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e


consciente, adjudicando o referido contrato de prestação de serviços à “Proeme” na
medida em que a respectiva proposta foi a melhor pontuada pela comissão de análise
constituída para apreciar as propostas apresentadas no âmbito do concurso limitado
acima referido.

6. Factos provados relacionados com o 6º capítulo da pronúncia


6.1. – A propósito da introdução
A “ADEC – Associação para o Desenvolvimento, Educação e Cultura de
Felgueiras”, surgiu, formalmente, no dia 22 de Fevereiro de 1994, por iniciativa de um
conjunto de pessoas, de entre as quais sobressaem José Augusto de Sousa Oliveira,
Horácio António Magalhães Lopes dos Reis, Maria de Fátima Felgueiras, António
Pereira Mesquita de Carvalho, Júlio Faria e Manuel Maria Lopes Machado, tendo a
escritura de constituição da associação sido outorgada pelos dois primeiros.
De acordo com os estatutos aprovados em Assembleia-geral, a “ADEC” visava,
no essencial, prosseguir os seguintes objectivos e interesses:
- promover e desenvolver o ensino, a educação e a formação
profissional, nas suas diversas vertentes, no seio da comunidade;
- promover iniciativas de protecção do ambiente e do património
paisagístico e histórico-cultural da região;
- promover acções de divulgação, informação e defesa dos direitos do
consumidor;
- promover actividades desportivas, recreativas e de lazer e turismo;
bem como
- prestar outros serviços úteis à comunidade.
Na prossecução desses objectivos, a “ADEC” decidiu concretizar dois projectos
- a criação do Jornal “O Sovela” (publicação periódica semanal de âmbito regional) e o
clube de natação “A Foca”, aos quais acabou por cingir a sua actividade.

6. 2. - A propósito do jornal semanário “O Sovela”


No período compreendido entre 16 de Março de 1994 e 6 de Setembro de 1998,
a arguida Maria de Fátima Felgueiras desempenhou as funções de Presidente da
Direcção da “ADEC”, sendo, para além disso, vereadora (até meados de 1995) e
presidente da CMF (a partir dessa altura).
Por sua vez, o arguido António Pereira Mesquita de Carvalho foi secretário da
direcção daquela associação.
Em Setembro de 1998, o arguido António Pereira, foi eleito presidente da
Direcção, em substituição da arguida Maria de Fátima Felgueiras.
Entre 17.04.1997 e 20.05.1998, o arguido António Pereira foi ainda Director do
jornal “O Sovela”, cargo que já antes tinha desempenhado.
Simultaneamente, o arguido António Pereira, desde 05.01.1998, foi vereador da
CMF (com os pelouros da Acção Social, Cultura, Juventude e Desporto), tendo sido
entretanto o seu presidente na sequência da fuga da arguida Fátima do país.

49
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Todas estas pessoas (bem como a quase totalidade dos restantes associados)
estavam intimamente ligadas ao PS de Felgueiras, sendo certo que desde a criação de tal
jornal regional era o arguido António Pereira e a arguida Maria de Fátima Felgueiras
quem decidiam todos os assuntos respeitantes àquele Semanário, inclusive as matérias
jornalísticas que deviam ou não ser publicadas e de que forma.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras considerava que o “Semanário de
Felgueiras” estava ligado directamente com a oposição ao seu executivo camarário – no
caso o PSD -, manifestando grande animosidade para com tal periódico, pelo facto de o
mesmo estar relacionado com a publicação de notícias que considerava suas detractoras,
bem como da edilidade que dirigia e ainda pelo facto de o mesmo ser dirigido por um
seu opositor político.
No período compreendido entre meados do ano de 1998 e Fevereiro de 2003, a
CMF contratualizou e pagou a publicidade (incluindo a referente aos eventos,
canalizada pela testemunha António Pimentel) no:
• “Semanário de Felgueiras”, no montante global de € 9.652,32;
• “Jornal da Lixa”, publicidade no valor global de € 8.176,48;
• Jornal “O Sovela” no valor global de € 52.070,53,
No período compreendido entre 15.10.95 e Janeiro de 2002, o arguido António
Carvalho exerceu somente as funções de vereador dos pelouros das áreas de educação,
cultura, desporto, turismo, juventude e acção social.
A partir de Janeiro de 2002 o pelouro do desporto foi entregue ao vereador Vítor
Costa, que também passou a ter a seu cargo os pelouros do trânsito e contra-ordenações,
o qual, a partir de Janeiro de 2003, passou também a ter a seu cargo os pelouros do
turismo e da juventude.
Com a fuga do país da arguida Fátima Felgueiras em Janeiro de 2003, o arguido
António Carvalho, então na qualidade de vice-presidente da CMF, passou a assumir as
funções de presidente da autarquia em exercício.
Em relação às publicações respeitantes a áreas de pelouros que o arguido
António Carvalho não tinha a seu cargo, as ordens eram precedidas frequentemente de
despachos escritos da arguida Fátima Felgueiras.
A arguida Fátima não permitia que qualquer dos vereadores ou funcionários
contrariassem as suas instruções de serviço (escritas ou verbais), bem como os
respectivos despachos (a menos que desse indicações verbais de sentido contrário).
A partir do início do mês de Julho de 2002, o arguido António Carvalho
começou a solicitar por escrito, para despacho do mesmo, a publicação em órgãos de
comunicação social locais de eventos promovidos pelos pelouros de que era
responsável.
No que respeita às publicações sobre os avisos de assuntos do Departamento do
Planeamento da CMF, a publicação foi efectuada no jornal “O Sovela” por exclusão dos
demais jornais locais, sendo certo que o “Semanário de Felgueiras”, nesse caso, para
além de não ter respondido a nenhum dos requisitos exigidos, também não apresentou
proposta de preço para o serviço solicitado.
No que respeita à publicitação da “MOCAP”, a publicidade, segundo despacho
da arguida Fátima, deveria inserir-se em meia página a cores no Jornal “O Sovela”.
Porém, a publicidade em causa foi inserida em mais de meia página, sendo
assim o seu preço inferior ao preço praticado pelo “Semanário de Felgueiras” (e caso a
publicidade fosse efectivada no “Jornal da Lixa” o seu preço seria superior).
Sobre a publicidade a inserir sobre o “Dia Mundial do Consumidor” (em
contracapa), recaiu um despacho da arguida Fátima Felgueiras de 13.03.2002, sendo

50
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

certo que o jornal “O Sovela” foi o único a apresentar uma proposta de preços para
aquele evento (onde o dito evento acabou por ser publicitado).
Quanto à publicação sobre a “Uniformização Documental”, por despacho de
22.03.2002 da arguida Fátima, esta mandou efectuar a respectiva publicitação no
“Sovela” e no “Jornal da Lixa” (nada referindo porém acerca da dimensão e coloração
do anúncio), tendo sido efectuada em contracapa a respectiva publicitação no “Sovela”
e numa página a cores no “Jornal da Lixa”, sendo certo que o preço praticado pelo
“Semanário de Felgueiras” em contracapa era inferior em 99,04 euros relativamente ao
preço praticado pelo “Sovela”.
No que respeita à publicitação dos condicionamentos de trânsito por causa dos
rallies, em 1998, o arguido Bragança da Cunha (então adjunto do GAPP) mencionou
como títulos para a publicitação respectiva os principais jornais locais (“Sovela”,
“Semanário de Felgueiras”, “Jornal da Lixa” e “Notícias de Felgueiras”), sendo certo
que por despacho da arguida Fátima Felgueiras, datado de 11.11.98, esta determinou
que a referida publicidade fosse efectuada apenas nos jornais “O Sovela” e “Jornal da
Lixa” (publicitação efectivada em menos de ¼ de página e em mais de ½ de página, a
preto e branco), sendo certo que no formato em menos de ¼ de página o “Semanário de
Felgueiras” fazia o preço mais elevado e no formato de mais de ½ de página o “Sovela”
praticava o preço mais caro (ambos a preto e branco).
Face a informações escritas proferidas pela testemunha Pimentel, dirigidas ao
arguido António Carvalho, no sentido da publicitação ser efectuada nos principais
órgãos de comunicação social ou em alguns deles, o dito arguido António Carvalho
proferiu despachos autorizadores entre 01 de Julho e 22 de Outubro de 2002, todos eles
relativos à publicitação de eventos a realizar no âmbito do pelouro que tinha a seu
cargo.
Ora, na sequência dessas informações e despachos, respeitantes à publicitação de
eventos realizados no âmbito daqueles que foram promovidos pelo pelouro de que o
dito arguido António tinha a seu cargo, registam-se os seguintes:
- Publicidade acerca do “Encontro de Teatro”, última peça (sobre o qual recaiu
um despacho do arguido António Carvalho, de 01.07.2002 do seguinte teor: “G.
Imprensa: Autorizado, nos moldes das iniciativas anteriores);
- Comemoração da elevação de Felgueiras a cidade (sobre o qual recaiu um
despacho do arguido António Carvalho, de 01.07.2002 do seguinte teor: “G. Imprensa:
Autorizado, nos moldes das iniciaitivas anteriores);
- Festival de Folclore “Cidade de Felgueiras” (sobre o qual recaiu um despacho
do arguido António Carvalho, de 22.07.2002 do seguinte teor: “Autorizado. Proceda-se
como habitualmente, com parcimónia);
- “Feira das Tradições” (sobre o qual recaiu um despacho do arguido António
Carvalho, de 02.09.2002 do seguinte teor: “Autorizado. Proceda-se em conformidade);
- Inscrições Teatro (sobre o qual recaiu um despacho do arguido António
Carvalho, de 017.09.2002 do seguinte teor: “Deve ser feita uma nota p/ os jornais
locais...e utilizar o spot rádio Felgueiras”);
- “Desfolhada Tradicional 2002”;
- “Jornadas Leonardo Coimbra”.
Com a excepção das “Comemorações da elevação de Felgueiras a cidade”, cujo
evento também foi publicitado no “Semanário de Felgueiras”, todos os demais eventos
apenas o foram no jornal “O Sovela”.
A manutenção do jornal “O Sovela” dependia da autonomia financeira do
mesmo.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Caso esse jornal deixasse de ser publicado, a testemunha Pimentel deixaria de


ser o respectivo director, cargo esse de que se orgulhava e que lhe dava alguma
notoriedade na cidade e no concelho de Felgueiras.

7. Factos provados relacionados com o 7º capítulo da pronúncia


No mês de Junho de 1992, a CMF adquiriu à empresa “Auto Sueco”, de Braga,
o veículo de matrícula 58-26-AO, marca “Volvo 460 Turbo”, pelo preço de Esc.
5.507.200$00.
No âmbito de tal contrato, foi ainda instalado, em tal veículo automóvel, um
telefone móvel, com sistema de mãos livres, de marca “AEG”, modelo “Telecar CD
452”, com a referência “AEG AT – 52-SE 53.1795.214.00”, com o n.º 79521412555,
bem como o auscultador de marca/modelo “AEG BHA-A52-2”, com o n.º de série 53.
17.31.040.00 731040, passando tal equipamento a ser propriedade da CMF, uma vez
que foi adquirido com capitais públicos, pelo preço de Esc. 420.000$00.
A instalação daquele telefone, no referido veículo de marca “Volvo”, matrícula
58-26-AO, foi efectuada pela empresa “Sósequeiras – Comércio e Indústria de
Combustíveis e Veículos, Lda.”, com sede na Avenida da Liberdade, em Braga, pelo
preço de Esc. 364. 697$00.
Entretanto, no dia 19.03.1996, o referido veículo de marca “Volvo”, de
matrícula 58-46-AO, teve um acidente em Lisboa, tendo tal viatura ficado em estado
irrecuperável, motivo pelo qual foi abatida ao efectivo da CMF.
Na sequência de tal acidente, em meados do ano de 1996, a arguida Maria de
Fátima Felgueiras ordenou que o referido telefone fosse instalado na sua viatura
particular, de marca “Citroen”, matrícula SE-48-94, o que foi feito na empresa “Electro
- Auto da Gandra”, pelo preço de Esc. 24.541$00, valor debitado à CMF, sendo certo
que na contabilidade da autarquia tal ficou a constar como serviço executado no veículo
da CMF, de marca “Peugeot”, com a matrícula NO-55-23.
A arguida Fátima Felgueiras deu essa ordem na medida em que a CMF, ao
tempo, só dispunha de uma viatura para o serviço da presidência e da vereação e ela
usava a sua viautura pessoal da marca “Citroën”, modelo “BX”, em deslocações ao
serviço da CMF, sendo necessário o uso desse telemóvel para poder desempenhar as
funções de que estava investida.
Entretanto, em meados do ano de 1998, em data não concretamente apurada, a
arguida Maria de Fátima Felgueiras vendeu a sua viatura usada, de marca “Citroen”,
modelo “BX”, de matrícula SE-48-94, a Fernando Pereira Sampaio, pelo preço de Esc.
400.000$00, dele não se retirando (pelo menos) os encaixes referentes ao telemóvel
“AEG” acima referido.

8. Factos provados relacionados com o 8º capítulo da pronúncia


Em Agosto de 1997, a arguida Maria de Fátima Felgueiras teve de se deslocar a
Cabo Verde, para assinar um acordo de geminação entre a cidade de Felgueiras e a
cidade de São Vicente, daquele país, tendo resolvido integrar os seus dois filhos na
respectiva comitiva, que assim se compôs pelas referidas três pessoas.
Para o efeito, reservou na agência de viagens “Navitur”, através dos serviços da
CMF, 3 passagens aéreas para as Ilhas do Sal e S. Vicente, em Cabo Verde, e
alojamento para 3 pessoas naquelas ilhas.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Essa deslocação inseriu-se num conjunto de iniciativas de geminação de cidades


que fazem parte de uma política de seguida pelas autarquias e são consideradas um
factor de importância relevante na valorização dos municípios aderentes.
No caso em apreço, a assinatura do referido protocolo de geminação envolveu,
como normalmente sucede, a deslocação duma representação mais ou menos alargada,
normalmente composta por famílias de acolhimento, grupos culturais e desportivos,
entre outros.
Esse tipo de representação contém sempre uma componente familiar,
considerada essencial pelas entidades envolvidas no processo de geminação, sendo
habitual que os presidentes que participam na representação protocolar se façam
acompanhar dos reespectivos cônjuges e por vezes dos seus filhos.
À data a arguida Fátima vivia separada de facto do seu então marido (de quem
se viria a divorciar), tendo assim resolvido integrar na dita comitiva os seus dois filhos.
Entretanto, viria a ser emitida a factura nº 34960 da “Navitur Turismo”, datada
de 15.10.97, emitida em nome da CMF, no valor total de Esc. 562.303$00 (que
corresponde ao valor de 3 passagens aéreas), e onde é unicamente referido o nome de
“Fátima Felgueiras”, bem como da “passagem aérea Porto/Lisboa/Sal/S.
Vicente/Sal/Lisboa incluindo alojamento em Sal e S. Vicente + transferes”.
Porém, na verdade, a importância debitada naquela factura corresponde às
seguintes despesas:
• o montante de Esc. 435.603$00 (corresponde ao valor de cada
passagem aérea Porto-Lisboa-Sal-Lisboa-Porto, ou seja,
corresponde a Esc. 145.201$00 x 3 pessoas) ,
• o valor de Esc. 117.300$00 (corresponde ao valor de cada
passagem aérea Sal-S.Vicente-Sal, ou seja, corresponde a Esc.
39.100$00 x 3 pessoas) e
• Esc. 9.400$00 (que corresponde ao valor dos transferes entre as
ilhas do Sal/São Vicente e vice-versa)
Conforme o previsto, Maria de Fátima Felgueiras, Sandra Felgueiras e João
Felgueiras, respectivamente mãe e filhos, efectuaram as ditas viagens a Cabo Verde,
saindo do Porto no dia 10.08.1997 e regressando no dia 18.08.1997.
A arguida e os fillhos permaneceram na cidade de S. Vicente no período
compreendido entre os dias 14 e 17 de Agosto, tendo durante os dias 10 a 14 de Agosto,
permanecido na cidade do Sal.

9. Factos provados relacionados com o 9º capítulo da pronúncia


Durante o período compreendido entre 1997 e 2000, a Câmara Municipal de
Felgueiras pagou várias despesas de viagens aéreas efectuadas pela arguida Maria de
Fátima Felgueiras e suportou ajudas de custo e despesas de alojamento.
Entre as várias viagens, cujos custos foram suportados pela CMF, contam-se as
seguintes:
1. Durante os dias 18 a 22 de Agosto de 1999, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras viajou para a Irlanda do Norte, no âmbito de uma visita de estudo realizada
pela “VALSOUSA - Associação de Municípios do Vale do Sousa”, àquele país, sendo
as despesas de alojamento referentes a tal viagem pagas por aquela associação de
municípios.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Porém, e apesar de saber que as despesas de alojamento e ajudas de custo


referentes a tal viagem seriam suportadas por aquela associação de municípios, a
arguida Maria de Fátima Felgueiras havia solicitado e recebido dos serviços da CMF
(assinando a respectiva ordem) o pagamento antecipado de ajudas de custo completas
(incluindo o alojamento), antes portanto da realização dessa viagem, no montante de
Esc. 118.750$00, locupletando-se assim no montante de 35.620$00, correspondente a
cerca de 30% das ajudas de custo adiantadas pela CMF (referentes a alojamento).
Ora, no âmbito de tal viagem à Irlanda do Norte, a “Valsousa-AMVS”, em 29 de
Setembro de 1999, portando depois de realizada a dita viagem, pagou à arguida Maria
de Fátima Felgueiras, na sua qualidade de membro do conselho de administração e
representante da AMVS, ajudas de custo (cerca de 70% do valor das ajudas completas),
no valor de Esc. 83.130$00, deduzidas assim do valor correspondente ao alojamento
(30%).
Ainda em 29 de Setembro de 1999, por sua iniciativa, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras devolveu à CMF a quantia que recebera da AMVS nesse mesmo dia, no
montante de Esc. 83.130$00.
Porém, não devolveu à CMF a quantia de 35.620$00, correspondente a cerca de
30% das ajudas de custo que indevidamente lhe tinham sido adiantadas pela CMF,
locupando-se assim nesse montante, no que agiu de forma livre, voluntária e consciente,
com a intenção de fazer sua a sobredita quantia, apesar de bem saber que tal conduta era
proibida e punida por lei.

2. Visando celebrar um protocolo de geminação entre as cidades de Felgueiras e


Pont-Saint-Maxence, em França, a arguida Maria de Fátima Felgueiras, acompanhada
de mais 6 pessoas da CMF, nomeadamente António Carvalho, Anabela Gonçalves,
Silvina Moura, Maria Conceição Rocha, Rogério Azevedo e Agostinho Barbosa,
efectuaram uma viagem Porto/Paris/Porto, com saída no dia 16.05.1997 e regresso em
19.05.1997, viagem essa paga pela CMF.
Para além de tais pessoas, a arguida Maria de Fátima Felgueiras decidiu levar
consigo o seu filho, João Felgueiras, integrado na dita comitiva, tendo as despesas sido
suportadas pela CMF.
Os actos protoculares de geminação de cidades implicam convites para a
integração de familiares dos presidentes de autarquias, sendo pois prática habitual a
inclusão nas comitivas dos filhos dos responsáveis autarquicos.
Foi assim nesse contexto que o filho da arguida Fátima, João Felgueiras, viajou
a França integrado na respectiva comitiva.
As passagens aéreas para tal viagem foram requisitadas pela CMF à Agência de
Viagens “Santa Quitéria”, através da requisição constante de fls. 437 do Apenso 7,
tendo esta agência de viagens, após ter prestado tal serviço, emitido a factura nº 1302,
no valor de Esc. 394.296$00.
Através da ordem de pagamento nº 2288 a CMF efectuou o pagamento dessa e
de várias outras viagens, em 17.07.1997, através de um cheque emitido sobre uma conta
do BTA.

3. No dia 15.09.1997, Sandra Felgueiras, filha da arguida Maria de Fátima


Felgueiras, efectuou uma viagem de avião Porto/Lisboa, tendo para o efeito aquela

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

utilizado o bilhete de avião, com o nº 6852100056107, emitido pela “Portugália


Airlines”, no valor de Esc. 18.791$00.
Por outro lado, na mesma data e no mesmo voo, mas com regresso no mesmo
dia ao Porto, viajou a arguida Maria de Fátima Felgueiras, utilizando o bilhete da
“Portugália” nº 6852100056106, constante por fotocópia a fls. 1651 do 8º volume dos
autos, no valor de Esc. 37.582$00.
Estes dois bilhetes de avião, no valor total de Esc. 56.373$00, foram pagos,
naquela data, pela arguida Maria de Fátima Felgueiras com recurso ao cartão de crédito
com o nº 4940012004694899.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras solicitou aos serviços da CMF o
reembolso de toda esta quantia, tendo tal despesa lhe sido efectivamente paga, através
da ordem de pagamento nº 3825, datada de 17.10.1997.
Nos documentos que entregou à CMF para justificar o pagamento daquela
despesa, a arguida Maria de Fátima Felgueiras apenas juntou o bilhete de avião que lhe
dizia directamente respeito, não tendo por lapso entregue qualquer documento
comprovativo da aquisição de uma outra passagem aérea (pelo preço de 18.791$00)
referente a um voo de Lisboa para o Porto, realizado no mesmo dia 15.09.97, numa
outra companhia aérea, voo esse em que de facto viajou, não tendo assim feito uso
integral do bilhete da “Portugália” com o nº 6852100056106 (que só usou para a viagem
Porto/Lisboa).

10. Factos provados relacionados com o 10º capítulo da pronúncia


10.1. - A propósito da Introdução
Enquanto presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, a arguida Maria de
Fátima Felgueiras tinha direito à utilização do veículo marca BMW, matrícula 87-74-
MR, propriedade da CMF.
Tal utilização, nos termos da lei, era restrita a deslocações no exercício das suas
funções oficiais.
No entanto, pelo menos numa situação, que infra se descreverá, a arguida
utilizou essa viatura no interesse particular de terceiros.
Para além da utilização de tal viatura oficial, a arguida Maria de Fátima
Felgueiras também ordenou e permitiu que fossem utilizados os meios existentes no seu
Gabinete de Apoio Pessoal (GAPP), sito nas instalações da CMF, para fins diferentes
daqueles a que estavam adstritos, nomeadamente para executarem ofícios, missivas e
outros documentos para diversos organismos estranhos à autarquia, entre os quais se
contavam o FCF, o Partido Socialista de Felgueiras, a “ADEC”, o Jornal “O Sovela”,
entre outros.

10.2. - A propósito da utilização, por Fátima Felgueiras, para fins


particulares, da viatura adstrita à presidência da CMF
Com a autorização da arguida Maria de Fátima Felgueiras, aproveitando o facto
do motorista da CMF, Manuel Ferreira Pinto, conduzindo a viatura da CMF, de marca
BMW, matrícula 87-74-MR, ter de se deslocar a Lisboa para a trazer de volta no
Domingo seguinte (aonde ela se deslocara no dia 04.05.99 em razões de serviço da

55
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

CMF, só regressando no Domingo seguinte porquanto iria participar durante esse fim-
de-semana no Conggresso Nacional do PS), o dito motorista da CMF transportou no
interior da mencionada viatura, no dia 05.02.99, os vereadores Edgar Silva e António
Pereira e a solicitadora Conceição Rocha (militante do PS-Felgueiras), a fim dos
mesmos também participarem no Congresso Nacional do Partido Socialista que
decorreu em Lisboa, nos dias 06 e 07 de Fevereiro de 1999.
Já na cidade de Lisboa, com a conivência e autorização da arguida Fátima, o
mesmo motorista da CMF, naqueles dias 6 e 7 de Fevereiro de 1999, fazendo uso da
dita viatura da marca “BMW”, transportou as referidas pessoas do hotel para o local do
congresso e vice-versa.
O referido motorista, ficou alojado na “Pensão Residencial Avenida Alameda”,
em Lisboa, tendo o mesmo dado entrada, naquela unidade hoteleira, pela 01,00 hora do
dia 06.02.1999, e saído pelas 10,00 horas, do dia 07.02.1999, tendo pago por tal estadia
a quantia de Esc. 13.000$00, que o próprio efectuou em numerário.
As despesas de alojamento, parqueamento, portagens e combustível efectuadas
com tal viagem foram inicialmente pagas pelo motorista Manuel Ferreira Pinto.
Porém, mais tarde, tais despesas relativas ao alojamento e ao parqueamento
daquela viagem, no valor global de Esc. 26.691$00, foram pagas ao referido motorista
por Horácio Costa, através do dinheiro proveniente da “caixa paralela”.
Por outro lado, as despesas de portagens e combustíveis de tal deslocação, foram
pagas pela CMF, mediante a utilização, no primeiro caso da “via verde” e no segundo
caso através de um “fundo permanente” que o motorista Manuel Pinto possuía para o
efeito, sendo o mesmo constituído por uma quantia em numerário disponibilizada
mensalmente pela tesouraria da CMF, por indicação da arguida Maria de Fátima
Felgueiras.
Além disso, e em data que se desconhece, por ordens da arguida Maria de
Fátima Felgueiras enquanto presidente da Autarquia, o motorista da CMF, Manuel
Pinto, transportou, no veículo de marca “BMW”, propriedade da CMF, aquela arguida
da cidade de Felgueiras até à cidade de Lisboa, para participar no casamento de um dos
filhos do Dr. Pais Martins, que se realizou naquela cidade.
Fê-lo na medida em que a arguida Fátima havia recebido o respectivo convite na
qualidade de presidente da CMF, tendo sido nessa qualidade que se deslocou àquele
evento social.
Apesar de bem saber que tal lhe era interdito e que a sua conduta era proibida e
punida pela lei, a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, querendo utilizar para o uso particular de terceiros, uma das quais estranha a
tal autarquia, na situação acima descrita, o veículo de marca “BMW”, propriedade da
CMF, o qual se destinava prioritariamente ao uso do presidente da câmara para as
funções que lhe estavam adstritas.

10.3. - A propósito da utilização do GAPP (Gabinete de Apoio Pessoal à


Presidente) e respectivos funcionários pela arguida Maria de Fátima Felgueiras, para
fins particulares
Na CMF existia um gabinete denominado ”GAPP” - (Gabinete de Apoio Pessoal
à Presidente) – cuja composição foi definida pela arguida Fátima Felgueiras na
sequência das eleições autárquicas ocorridas em Dezembro de 1997 -, que funcionava
na dependência directa e sob as ordens expressas da arguida Fátima Felgueiras, visando

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2º Juízo

tal gabinete organizar e apoiar as actividades institucionais desenvolvidas pela


presidente da autarquia, no âmbito das funções e competências inerentes a tal cargo.
Todavia, sucede que os funcionários, o material e o equipamento informático
existente em tal gabinete, para além de servirem para o exercício de actividade de apoio
à presidente da Autarquia, também serviram para tratar de inúmeros assuntos de
competência única, directa e exclusiva do Futebol Clube de Felgueiras, do Partido
Socialista de Felgueiras, do Jornal “O Sovela” e ainda da “ADEC” - (Associação para o
Desenvolvimento e Cultura de Felgueiras).
Na verdade, de entre as várias actividades desenvolvidas por tal Gabinete de
Apoio Pessoal à Presidente, este gabinete executou, por ordens expressas da arguida
Maria de Fátima Felgueiras ou com o seu consentimento, durante o ano de 1998, as
seguintes tarefas:
1 - tratou de todos os assuntos administrativos e institucionais do
Partido Socialista de Felgueiras, designadamente a recepção,
tratamento, resposta e envio da mais variada correspondência;
2. – tratou do arquivo das listas de candidatos do Partido Socialista às
Assembleias de Freguesia e Municipal, bem como à Câmara
Municipal;
3. – tratou de manter actualizado o arquivo de relações dos militantes e
candidatos do Partido Socialista de Felgueiras, bem como arquivar os
manifestos eleitorais das listas candidatas pelo PS de Felgueiras; e
4. – tratou da elaboração dos comunicados de carácter político
elaborados pela presidente da CMF, que era à data simultaneamente
presidente da Comissão Política Concelhia do PS - Felgueiras.
Por outro lado, o GAPP também serviu para tratar de diversos assuntos
relacionados com a ADEC (Associação Para o Desenvolvimento e Cultura de
Felgueiras), bem como com o Jornal “O Sovela”, nomeadamente para contactar os
funcionários daquele jornal, que ali se dirigiam para receber os seus salários, para além
de ser o local onde os fornecedores de tal periódico se dirigiam para receber os seus
créditos, que eram pagos pela referida conta do Banco Espírito Santo ou pela “caixa
paralela”.
Para além disso, a arguida Maria de Fátima Felgueiras ordenou, por diversas
vezes, que o GAPP elaborasse e tratasse de vários assuntos relacionados com a gestão
corrente do Futebol Clube de Felgueiras, nomeadamente elaborando mapas relativos à
recolha de fundos, cartas dirigidas a vários industriais do concelho de Felgueiras
solicitando donativos para tal clube, bem como para a convocação de assembleias
gerais.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente querendo utilizar de forma continuada e sistemática os serviços dos
funcionários e os bens da autarquia que lhe eram acessíveis em razão das suas funções
de autarca para executar tarefas para terceiros estranhos à autarquia, como
efectivamente utilizou, apesar de bem saber que tal utilização era contrária aos deveres e
obrigações do cargo que exercia.

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2º Juízo

11. Factos provados relacionados com o 11º capítulo da pronúncia - o


loteamento do Bustelo
Em 1989, José Augusto Sousa Oliveira, marido da arguida Fátima Felgueiras,
celebrou um contrato-promessa de compra e venda com Armindo Leite da Silva e
esposa relativo à metade indivisa de um terreno situado em Bustelo, Pombeiro,
Felgueiras, sendo certo que a outra metade tinha já sido prometida comprar por
Fortunato Alves de Sousa ao mesmo Armindo Leite da Silva.
No dia 05.06.1990, o dito Fortunato de Sousa requereu à CMF o licenciamento
da operação de loteamento do citado terreno, tendo tal pedido dado origem ao processo
de loteamento n.º 173/90.
Em 07.02.1991, foi celebrada escritura de compra e venda relativa à aquisição
da totalidade de tal terreno, figurando na mesma como único comprador o mencionado
Fortunato Sousa e como vendedores o Armindo Leite da Silva e esposa.
Na mesma altura, o José Augusto Sousa Oliveira celebrou um contrato –
promessa com o Fortunato Alves de Sousa e espsosa, figurando o primeiro como
promitente comprador e os segundos como prometentes vendedores, tendo por objecto a
aquisição de metade do referido terreno, combinando entre si que as despesas já
efectuadas e as a efectuar no futuro, no citado loteamento, seriam divididas na
proporção de 50% para cada um.
As obras de terraplanagem e de infra-estruturas de água e saneamento iniciaram-
se antes de estar aprovado o referido loteamento, tendo a CMF, em 20.10.1992,
instaurado um processo de contra-ordenação ao Fortunato Alves de Sousa, por falta de
licenciamento de tais obras.
No entanto, e apesar de ter conhecimento de que tinha interesses no referido
terreno (desde pelo menos 1989), a arguida Maria de Fátima Felgueiras, quer como
vereadora substituta do presidente da Câmara de Felgueiras, quer como presidente da
autarquia de Felgueiras, com o intuito de obter vantagem patrimonial com a venda de
lotes e com a construção num deles de uma habitação para nela habitar, participou em
inúmeros actos administrativos relacionados com o referido processo de loteamento nº
173/90, nos quais estava directamente interessada, violando o dever de isenção,
imparcialidade e lealdade, designadamente por omitir a verificação de circunstâncias
impeditivas da sua participação em tais decisões, nomeadamente os seguintes.
Enquanto vereadora, participou;
- na deliberação camarária que aprovou o citado loteamento, realizada no dia
09.08.1991; e
- na deliberação camarária que aprovou o averbamento de tal processo de
loteamento em nome da empresa “F. de Sousa & Filho, Lda.”, realizada no dia
24.06.1993.
E enquanto presidente da Câmara Municipal de Felgueiras (período de
31.10.1995 até ao presente), decidiu:
- em 16.11.1995, ao abrigo da delegação de competências de 16.10.1995, deferir
as obras de urbanização;
- em 05.03.1996, exarou despacho de deferimento no requerimento em que a
empresa “F. de Sousa & Filho, Lda.”, de que o Fortunato de Sousa era sócio, solicita
que, como garantia, sejam aceites lotes de terreno;

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2º Juízo

- em 24.04.1996, emitiu despacho no sentido de o requerente (a empresa “F. de


Sousa & Filho, Lda.”), indicar o número de lotes que ficam a constituir garantias das
obras de urbanização, devendo a área total das mesmas não ultrapassar 12. 400 m2;
- em 17.06.1996, exarou despacho no parecer técnico em como não deverão ser
aceites como garantia de execução das obras de urbanização, os lotes nº 30 e nº 31, nos
quais estava pessoalmente interessada;
- em 15.07.1996, deferiu o pedido de emissão de alvará de loteamento e
respectivas obras de urbanização e mandou proceder à sua emissão;
- em 08.03.1997, despachou no sentido da testemunha Helena Félix verificar se
haveria fundamento para outra solução jurídica que não a imposição de uma coima de
1.000.000$00 (tanto mais que à data o loteamento já estava legalizado), designadamente
a admoestação;
- em 07.05.1997, deferiu a prorrogação de prazo para execução de obras de
urbanização apresentado pelo requerente “F. Sousa & Filho, Lda.”;
- em 17.60.1999, exarou despacho para o Director do Departamento Técnico se
pronunciar sobre o requerimento em que o requerente solicita a recepção provisórias das
obras;
- em 12.11.1999, homologou o auto de recepção provisória de obras de
urbanização.
A arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma livre, voluntária e
consciente, violando os deveres que lhe estavam legalmente confiados no exercício do
cargo de vereadora e presidente da Câmara Municipal, nomeadamente os referentes à
garantia de imparcialidade da administração, com o desiderato já referido, sabendo que
tal conduta era proibida e punida por lei.

12. Factos provados relacionados com o percurso de vida dos arguidos, sua
inserção social e antecedentes criminais

Arguida Fátima Felgueiras


A arguida Fátima Felgueiras é a mais velha de duas irmãs, descendente de um
casal de condição sócio-económica e cultural média.
Nasceu no Rio de Janeiro (Brasil), onde o progenitor esteve emigrado. Este
exercia a sua actividade profissional no ramo da restauração e a progenitora era regente
escolar, leccionando no ensino básico.
Com cerca de 4 anos de idade regressa a Portugal com a mãe e a irmã,
permanecendo o pai no Brasil, processando-se a sua socialização num contexto familiar
tradicional e socialmente integrado, marcado pela ausência da figura paterna, o qual só
regressou definitivamente a Portugal quando a arguida tinha 12 anos de idade.
Em Portugal, por força da ausência do progenitor, o agregado familiar
privilegiou o relacionamento com a família alargada do lado materno, dos quais
receberam apoio afectivo e material para suprir as necessidades que pudessem surgir,
evidenciando assinaláveis níveis de solidariedade e coesão intra-familiar.
A arguida viveu parte substancial da sua vida na cidade de Felgueiras, primeiro
integrando o agregado familiar de origem e, posteriormente, com o seu próprio
agregado familiar.

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2º Juízo

O ambiente e a dinâmica familiar no qual a arguida processou o seu


desenvolvimento decorreu num ambiente relacional harmonioso, coeso e solidário, de
acordo com os padrões educativos considerados convencionais.
O seu percurso escolar iniciou-se em Felgueiras, onde concluiu o 9º ano de
escolaridade, tendo feito o 11º ano no Liceu de Guimarães e concluído em Coimbra o
curso de Filologia Germânica em 1977.
Aos 20 anos de idade, ainda antes de concluir a licenciatura, contraíu
matrimónio com a testemunha Sousa Oliveira, resultando desta união o nascimento de
dois filhos (Sandra e João Felgueiras). Este vínculo matrimonial cessou em 1999, após
cerca de 5 anos de separação de facto.
Iniciou a sua actividade profissional como professora, desenvolvendo-a na
cidade de Felgueiras, com excepção do período de um ano, em que realizou estágio
profissional em Coimbra.
Em Felgueiras, fez parte de várias associações culturais, sociais, humanitárias e
religiosas, participando activamente na vida da comunidade.
Em 1979, com 26 anos de idade, foi eleita deputada à Assembleia Municipal de
Felgueiras, onde permaneceu como independente até 1989, ano em que foi eleita
vereadora da CMF, ocupando o pelouro da cultura e acção social.
Em 1995 foi nomeada presidente da CMF, em substituição do então presidente
(arguido Júlio Faria), em virtude deste ter sido eleito deputado à Assembleia da
República. Em 1997 foi eleita presidente da CMF pela primeira vez e reeleita em 2001.
Em 2003, no decurso do presente processo, foge para o Brasil (de modo a evitar ser
presa preventivamente), donde regressou em finais de 2005, candidatando-se de novo à
presidência da CMF, conseguindo ser de novo eleita.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia, a arguida era vereadora
da CMF e depois a respectiva presidente.
Encontrava-se então separada de facto, habitando na companhia dos filhos num
apartamento com boas condições de habitabilidade, apresentando uma razoável situação
económica. As suas rotinas eram condicionadas pela natureza das funções públicas que
desempenhava.
A arguida está aposentada desde 2004, auferindo uma pensão de reforma no vlor
líquido de cerca de 2.000,00 euros por mês. Desempenha actualmente as funções de
presidente da CMF, auferindo 1/3 do vencimento, isto é, cerca de 1.400,00 euros
mensais.
Em virtude dos dois anos em residiu no Brasil com o filho mais novo, a sua
situação económica agravou-se em virtude das despesas que tem de suportar.
Actualmente partilha com o ex-marido um apartamento deste, a pretexto da
gestão e contenção de despesas, não só as decorrentes da sua vida familiar como
também as decorrentes deste processo.
Dedica quase todo o seu tempo à gestão autárquica e os poucos tempos livres de
que dispõe são dedicados ao convívio com familiares e amigos.
Possui competências cognitivas, interpessoais e sociais que lhe permitem
estabelecer relações de urbanidade e convivialidade, gozando localmente de uma
imagem positiva.
Sente-se injustiçada e revoltada em virtude de ter sido visada no âmbito deste
processo judicial.
A actual situação provoca-lhe um esforço acrescido na gestão da autarquia, dado
que a sua comparência nas sessões de julgamento retiram-lhe disponibilidade para o
exercício das tarefas relacionadas com as suas funções.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A imagem social da arguida Fátima Felgueiras no meio local não foi afectada
com o presente processo judicial.
O filho mais novo da arguida encontra-se perturbado emocionalmente com toda
esta situação, recusando-se mesmo a voltar a viver em Portugal.
No âmbito do processo comum singular nº 101/02.0TAFAF, do 3º Jz do T.J. da
Comarca de Fafe, por sentença proferida a 22.03.2006, transitada em julgado, foi a
arguida Fátima Felgueiras condenada na pena de 200 dias de multa à taxa diária de
50,00 euros, no montante global de 10.000,00 euros, pela prática de um crime de
difamação perpetrado a 30.09.2001, p. e p. pelos artgs 180, nº 1, 183º, nº 2, e 184º,
todos do CP, com referência ao artº30º, nº 2, da Lei nº 2/99, de 13.01; Tal pena,
entretanto, veio a ser declarada extinta pelo seu pagamento.

Arguido Júlio Faria


O arguido Júlio Faria nasceu em 24.04.42, na freguesia de Margaride –
Felgueiras, é o mais velho de quatro irmãos (dois do sexo masculino e dois do sexo
feminino), descendente de um casal de condição sócio-económica acima da média. O
pai era funcionário judicial, com habilitações académicas universitárias, e a mãe era
doméstica. O seu processo de socialização decorreu num contexto familiar tradicional,
socialmente integrado e sem dificuldades económicas. Viveu parte substancial da sua
vida em Felgueiras, primeiro no agregado familiar de origem e, posteriormente, com o
seu agregado familiar constituído.
O arguido desenvolveu-se em ambiente familiar harmonioso, pautado por
padrões educativos convencionais, veiculando os valores dominantes no seu meio sócio-
cultural.
O percurso escolar iniciou-se em Felgueiras, onde concluiu o 9º ano de
escolaridade (no Externato Infante D. Henrique). O 10º e o 11º anos foram feitos no
Porto, no colégio João de Deus, evidenciando um trajecto escolar com algum sucesso.
Ingressou entretanto na universidade, no curso de Engenharia Química. Viria contudo a
abandonar este curso devido, por um lado, à morte do progenitor e, por outro lado, ao
facto do curso escolhido não corresponder às suas espectativas, regressando assim para
junto da mãe em Felgueiras.
Abandonados os estudos, permanece durante cerca de um ano em Felgueiras,
antes de ingressar no serviço militar obrigatório, que cumpriu durante 4 anos, dois dos
quais em Moçambique.
Recebeu dois louvores durante o serviço militar (um do comandante do batalhão
em Mueda, em 1968, e outro do comandante militar da região de Porto Amélia, em
1969).
Terminado o serviço militar, começa a sua vida profissional, no Banco de
Portugal, tendo sido colocado em Lisboa, em Agosto de 1970.
Neste ano, contrai matrimónio com a sua esposa, também natural de Felgueiras.
Do casamento nasceram quatro filhos, dois rapazes e duas raparigas, sendo as relações
familiares harmoniosas.
Em 1971 vem trabalhar para a agência do Porto do Banco de Portugal, cidade
onde passa a residir. Em 1978 vem para a agência de Guimarães do mesmo Banco, onde
permaneceu até Março de 1983, fixando definitivamente residência em Felgueiras.
Nesse ano obteve uma promoção por mérito no Banco de Portugal. Este regresso à terra
de origem permitiu-lhe o reforço de redes sociais e, simultaneamente, proporcionou-lhe
as condições necessárias para o início da actividade política local.
Entre 1974 e 1978, desempenhou actividade no Sindicato dos Bancários do
Norte, tendo feito parte da Comissão de Trabalhadores do Banco de Portugal. Após ter

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2º Juízo

fixado definitivamente residência em Felgueiras, foi eleito vereador na CMF em 1983,


ficando com o pelouro da cultura. Em 1985 foi eleito presidente da CMF, cargo que
ocupou até 1995, quando foi eleito deputado à Assembleia da República, onde
permaneceu até ao final da legislatura, em 1999 (tendo sido em 1996 coordenador
adjunto do grupo parlamentar do PS na Assembleia República, da Comissão
Parlamentar de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e
Ambiente; em 1997 foi membro da Comissão parlamentar de Saúde na Assembleia da
República; em 1995 foi o coordenador regional dos deputados do PS, na Assembleia da
República, pelo círculo do Porto; foi ainda coordenador do grupo parlamentar do PS na
Assembleia da República, da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às Denúncias
de Corrupção na JAE, em 1998).
Entre 1989 e 1993 foi o presidente da AMVS.
Como militante do PS, liderou desde finais de 1978 até 1993, a Comissão
Política concelhia de Felgueiras daquele partido, sendo certo que ao assumir essa
liderança, na CMF o PS tinha eleito 3 elementos, o PSD 2 elementos e o CDS 3
elementos; nas juntas de freguesia o PS elegeu 15 presidentes, o PSD 11 pressidentes e
um presidente independente; em 1993, na CMF o PS elegeu 4 elementos e 24
presidentes de juntas de freguesia.
Cumpriu 5 mandatos como membro da Comissão Nacional do PS e 3 mandatos
como membro da Comissão Política Nacional do mesmo partido.
Enquanto presidente da edilidade, durante os seus mandatos, foram iniciadas,
concluídas ou executadas, entre outras, as seguintes obras, iniciativas e eventos:
Biblioteca Municipal; Piscina Municipal; Centro Coordenador de Transportes; actual
Estádio Dr. Machado Matos; Escola Preparatória da Lixa; Escola Secundária de
Felgueiras; Escola C+S de Idães; Pavilhão de Idães; Piscina da Lixa; ETAR de
Felgueiras; ETAR da Lixa; largamento da EN 101, entre os Carvalhinhos e Várzea para
duas faixas de rodagem em cada sentido; Praça Vasco da Gama; Rua Manuel Faria e
Sousa; abastecimento de água em Barrosas; Lixeira Municipal Controlada (Sendim);
Instituto Superior de Ciências Educativas; Felmostra – Mostra das Potencialidades do
Concelho de Felgueiras; Valsousa – Associação de Municípios do Vale do Sousa;
recuperação do Cortejo das Flores, integrado nas festas de S. Pedro.
Entre 1996 e 2001 fez parte dos órgãos sociais do FCF. Em 2001 foi eleito
presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras, cargo a que renunciou em 2003, na
sequência do presente processo. De 1999 a 2005 foi administrador do Hospital da
Misericórdia de Felgueiras.
Foi ainda membro do Conselho Geral da Associação dos Municípios
Portugueses (tendo obtido dessa associação um voto de apreço e reconhecimento em
1995), do Conselho Geral de Estudos e Formação Autárquica, do Conselho Superior de
Estatística – Norte, audor da Defesa Nacional (em 1989, por designação da CCRN e
Governo Civil, do PSD).
Em 1999 frequentou o Seminário Avançado de Gestão e Investimento em
Serviços de Saúde na Escola Superior de Direcção e Negócios.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia, o arguido era presidente
da CMF (até 1995) e depois deputado à Assembleia da República, fazendo também
parte dos órgãos sociais do FCF.
Mantinha a residência oficial em Felgueiras, alternando a sua vida entre as idas
ao parlamento, em Lisboa, e a actividade política e outras em Felgueiras. Habitava num
apartamento com boas condições de habitabilidade, na companhia da esposa, dos filhos
e da sua mãe, evidenciando uma situação económica razoável.

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2º Juízo

Desde que deixou o cargo de administrador do Hospital da Misericórdia de


Felgueiras não mais desempenhou qualquer actividade profissional.
Actualmente, continua a residir com a esposa e os dois filhos mais novos, numa
casa com boas condições de habitabilidade. Vive da sua reforma do Banco de Portugal
(1.200,00 euros), que aufere desde 1988, e da de eleito local (2.000,00 euros), que
aufere desde 1999.
Tem uma situação económica algo difícil em virtude de dívidas avultadas que
teve de assumir por ter avalizado operações financeiras realizadas por dirigentes do FCF
e que ainda se encontra a pagar.
Reparte os seus tempos livres no convívio com os familiares, leitura,
aprendizagem de novas tecnologias da informação e actividade física de manutenção.
O impacto da situação jurídico-penal deste processo é marcado por um maior
isolamento social e de uma maior reserva nas relações interpessoais, decorrestes do
desconforto e tensão que este processo provoca.
Do ponto de vista social a sua imagem não foi afectada, pois continua a
beneficiar de uma percepção comunitária bastante favorável.
Economicamente, pelas despesas que acarreta a sua defesa, este processo está a
contribuir para tornar mais delicada a situação económica do arguido.
O arguido Júlio Faria não tem antecedentes criminais.

Arguido Vítor Borges


O arguido Vítor Borges é oriundo de uma estrutura familiar de condição sócio-
económica favorecida. Teve uma infância e adolescência percepcionada pelo mesmo
como gratificantes, ligada ao Instituto Profissional do Terço, uma instituição fundada no
Porto pelos seus familiares maternos, especialmente vocacionada para o apoio/protecção
de menores em risco. Os pais exerciam cargos de direcção, sendo certo que a mãe
também ali leccionava, promovendo o contacto diário dos filhos com os menores
internados, uma vez que frequentaram a escola e viviam na casa da família localizada na
sede da instituição.
O processo de formação escolar caracterizou-se pela adaptação e bom
aproveitamento, ingressando no curso de Engenharia Electrotécnica, no Instituto
Superior de Engenharia do Porto, que frequentou até ao último ano, sem no entanto
concluir a licenciatura, uma vez que interrompeu a vida académica para cumprir o
serviço militar obrigatório, na Guiné, onde permaneceu de 1972 a 1974.
Quando regressou ao Porto, conseguiu colocação profissional como gestor de
produção, responsável pela segurança, controle de qualidade e ambiente na empresa
“Texas Instruments”, uma multinacional americana, onde permaneceu até 1989, ano em
que fundou a “Resin”.
O arguido investiu na expansão desta empresa, pioneira no sector da recolha e
tratamento de resíduos, que acabou por se converter numa sociedade anónima com
implantação a nível nacional. Neste processo relevou características de empreendorismo
e de liderança.
Em 1975 casou com Maria João Borges, nascendo desta união dois filhos,
actualmente com 30 e 27 anos de idade. O casal investiu no processo
educativo/académico dos descendentes (ambos licenciados), procurando satisfazer as
necessidades dos seus elementos e transmitir regras e limites orientadores.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia, o arguido exercia as
funções de presidente do Conselho de Administração da “Resin”, suspendendo o
mandato quando foi constituído arguido no presente processo judicial. Passou a exercer
funções de administrador até proceder, em Junho de 2006, à venda das acções que

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2º Juízo

detinha na sociedade, pondo fim ao seu vínculo contratual por mútuo acordo.
Actualmente presta apoio e aconselhamento ao seu filho que exerce a actividade na
“Resin”, não apresentando um projecto profissional definido.
A situação patrimonial da família é favorável, contando com participações
activas do arguido, que aufere um subsídio de desemprego, uma renda proveniente de
um espaço comercial e das aplicações financeiras que realizou com a venda das acções e
com o recebimento da indemnização pela caducidade do contrato.
O núcleo familiar é constituído pelo arguido Vítor e pela esposa
(profissionalmente inactiva), os quais privilegiam o contacto com outros elementos da
família alargada no seu quotidiano (filhos, noras, irmãos e pais), a par das relações de
amizade que mantêm, cultivando o convívio social.
Reside em moradia localizada na Avenida da Boavista, nas proximidades do
parque da cidade do Porto, inserida em contexto sócio-residencial conotado com um
padrão sócio-económico elevado, mantendo com a vizinhança relações cordiais.
O arguido vivencia com tranquilidade o desenrolar deste processo, o qual não
interferiu na qualidade das relações familiares e de amizade.
Porém, foi ao nível profissional que este contacto com o sistema penal mais
impacto provocou, pela incompatibilidade que se veio a gerar entre as exigências
inerentes ao exercício das suas funções e a disponibilidade que o presente processo lhe
tem exigido.
O arguido Vítor Borges não tem antecedentes criminais.

Arguido Carlos Marinho


O arguido Carlos Marinho é natural de Marco de Canaveses, sendo o terceiro de
quatro irmãos, por ordem de nascimento, de uma família de modestos recursos
económicos.
A sua família era estruturada do ponto de vista funcional e proporcionou-lhe um
desenvolvimento dentro de padrões normativos. Os pais são por si percepcionados
como elementos de identificação positivos, embora se sinta mais próximo afectivamente
da figura paterna.
Iniciou a escolaridade em idade própria, tendo sido a mesma pautada pelo
sucesso, concluindo a licenciatura em Contabilidade e Administração.
Antes de concluir a licenciatura iniciou-se profissionalmente numa empresa do
ramo automóvel, sendo o responsável pelos serviços administrativos, onde laborou
cerca de 10 meses. A entrada no mercado de trabalho foi precipitada pelo falecimento
do pai, iniciando logo após a conclusão do curso superior a actividade numa empresa
multinacional de auditoria, onde se manteve durante seis anos, saindo em 1993 por ter
encontrado uma alternativa profissional mais rentável e gratificante.
Sequencialmente, ingressa na “Resin” como contabilista, empresa onde ainda se
mantém.
Contraiu matrimónio em 1994, tendo nascido na constância do mesmo um filho
que conta actualmente com 11 anos de idade.
No período a que se reportam os factos de que e pronúnciado o arguido residia
no agregado dos sogros com a cônjuge e descendente, trabalhando na “Resin” como
contabilista primeiro e depois como director financeiro.
No ano de 2000, altura em que o presente processo se tornou do conhecimento
público através dos meios de comunicação social, o arguido, juntamente com o seu
agregado familiar constituído, tinha-se autonomizado em termos habitacionais para casa
própria, cuja hipoteca bancária ainda se mantém. Trata-se de um imóvel tipo moradia,
de rés-do-chão, com boas condições de habitabilidade.

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2º Juízo

A mudança para habitação própria surgiu da necessidade de autonomização do


seu agregado, apesar de em termos sócio-familiares não ter surgido qualquer alteração
na medida em que se mantém na mesma cidade onde residem os sogros.
Laboralmente desempenhava as funções de director financeiro da “Resin”,
categoria à qual havia sido promovido, cargo que ainda hoje mantém. Paralelamente
trabalhava na empresa “Contagem, Gabinete de Contabilidade, Ldª”, em Paredes,
actividade que mantém desde 1995, a qual é exercida aos Sábados e esporadicamente
nos períodos nocturnos, como forma de aumentar o pecúlio económico auferido.
Exerce essas funções com elevado grau de responsabilidade.
Ao nível económico o agregado familiar do arguido, os rendimentos auferidos
pelo casal ronda os 6.000,00 euros mensais, pagando uma prestação mensal de 440,00
euros mensais a título de amortização de empréstimo bancário contraído para a
aquisição de habitação própria.
O arguido Carlos Marinho experiencia de forma gratificante a vida familiar,
participando ambos os elementos do casal nas decisões que dizem respeito à vida
comum. Aproveita os tempos livres para o convívio com a família constituída e com a
família de origem, deslocando-se semanalmente a casa da mãe, no Marco de Canaveses,
com o intuito de manter contactos com aquela, irmãos e outros familiares.
Mantém pouco convívio com os vizinhos – pois a maior parte do tempo passa-o
em matosinhos, no seu local de trabalho -, mas as relações que com eles estabeleceu são
cordiais.
É visto no meio como um indivíduo educado, não sendo porém do conhecimento
dos vizinhos o facto dele estar envolvido neste processo, na qualidade de arguido.
Ao nível do impacto deste processo, inicialmente e durante alguns meses –
movido por sentimentos de vergonha -, o arguido isolou-se socialmente, sobretudo
devido à exposição mediática que o mesmo teve e tem tido.
O mesmo sucedeu com a sua esposa, mas com o tempo ambos aprenderam a
minimizar os efeitos deste novo contexto de vida.
Ao nível do cargo e funções laborais exercidas este processo não teve qualquer
implicação. No entanto, no ano de 2004/2005, com a entrada de um novo accionista na
empresa, sentiu um clima de desconfiança relativamente à sua pessoa por haver
conhecimento que ele era um dos arguidos deste processo, situação que lhe provocava
constrangimento. Este clima, porém, foi sendo ultrapassado com o decorrer do tempo,
uma vez que foram reforçadas as funções do cargo que ocupa, as quais se traduzem na
representação da empresa em diversos actos, nomeadamente junto de instituições
bancárias e outras.
A sua entidade laboral deposita nele total confiança, pois são-lhe reconhecidas
boas capacidades profissionais.
O arguido Carlos Marinho não tem antecedentes criminais.

Arguido Barbieri Cardoso


O desenvolvimento psicossocial e afectivo do arguido Barbieri Cardoso
estruturou-se no núcleo familiar constituído pelos pais e por duas irmãs, pautando-se a
dinâmica inter-familiar por elevados níveis de afectividade e coesão, com uma
vinculação extensiva a outras figuras da família alargada, nomeadamente aos avós
maternos.
Beneficiavam de uma situação sócio-económica equilibrada, fruto de uma gestão
criteriosa dos recursos provenientes da actividade profissional do pai nos “TLP”,
cabendo à mãe um papel mais activo no exercício da parentalidade.

65
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O percurso escolar caracterizou-se pela adaptação e facilidade de apreensão dos


conteúdos lectivos durante a frequência do ensino básico, preparatório e secundário, nos
diversos estabelecimentos de ensino público que frequentou até ingressar na
Universidade do Porto, onde concluiu, em 1977, a licenciatura em Engenharia Civil.
Assim que obteve a licenciatura ingressou no Gabinete de Apoio Técnico na
Câmara Municipal de Peniche, para exercer a actividade de engenheiro, actividade que
suspendeu para cumprimento do serviço militar obrigatório, em Tancos e em Espinho.
Por concurso público, ingressou na CMF como chefe de serviços na carreira
técnica. Ocupou vários lugares de direcção, em regime de comissão de serviço,
efectuando um percurso evolutivo até se posicionar na categoria de assessor principal,
onde ainda se mantém.
Desde 1991 que colabora, em regime de avença, com a “Ader-Sousa”,
desempenhando as funções de coordenador neste projecto que visa o acesso a
programas de desenvolvimento local dos municípios do vale do Sousa.
Contraíu matrimónio em 1981, nascendo desta união duas filhas, actualmente
com 22 e 18 anos de idade. O ambiente familiar é funcional, com um espírito enraizado
de apoio e entreajuda, criando condições para o desenvolvimento integral das filhas,
investindo na sua formação pessoal e escolar.
Os níveis de inserção familiares e profissionais que detinha no período que se
reporta à data dos factos mantêm-se inalterados, na medida em que o arguido Barbieri
mantém-se integrado no núcleo familiar constituído pela mulher (professora do ensino
secundário) e filhas (estudantes, respectivamente, do ensino superior e secundário).
Estabelecendo ligações de proximidade com outros membros da esfera familiar (pais e
irmãs).
Exerce as funções de director de planeamento na CMF, actividade de
compatibiliza com o cargo de coordenador da associação “Ader-Sousa” e com a
participação na sociedade “Ambiédica”, cujo objecto social se encontra ligado ao ramo
imobiliário.
Ao nível das suas características pessoais destaca-se o empreendorismo e
motivação para a participação em actividades promotoras do desenvolvimnto
comunitário, o que lhe permite satisfazer necessidades de reconhecimento sócio-
profissional e económico.
A situação financeira do casal é equilibrada, pese embora assistam a uma
diminuição do poder económico em virtude das despesas decorrentes do patrocínio no
âmbito deste processo judicial.
Ao nível dos seus tempos livres, o arguido Barbieri Cardoso disfruta de recursos
de lazer (espaços verdes e passeios à beira-mar) do contexto envolvente à sua habitação,
um apartamento localizado numa das zonas nobres da cidade do Porto (Foz).
Mantém relações cordatas com a vizinhança, procurando porém manter a reserva
da vida privada.
A sua situação jurídico-penal é vivida por si e pelos seus familiares de forma
apreensiva, vivendo com penosidade a sua exposição às instâncias formais de controle e
à consequente censura social.
A complexidade e mediatização deste processo, para além do já referido
acrécimo de despesas, tem tido custos pessoais e familiares, bem como profissionais,
designadamente traduzidos no evitamento de convívio social e na diminuição da sua
responsabilidade para assumir novos compromissos.
O arguido Barbieri Cardoso não tem antecedentes criminais.

Arguido Gabriel Almeida

66
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Gabriel é o mais novo de três irmãos, oriundo de uma família estável,
de nível sócio-cultural médio-alto, estabelecida na cidade do Porto, cuja dinâmica é
coesa, pautada por padrões sócio-educativos convencionais e de investimento na
qualificação académico-profissional dos seus membros.
Concluiu aos 23 anos a licenciatura em Engenharia Mecânica na Faculdade de
Engenharia do Porto. No termo do curso realizou um estágio de alguns meses na
Bélgica, após o que ingressou no mercado de trabalho como engenheiro mecânico, na
indústria nacional. Desempenhou a sua actividade profissional em diversas empresas,
numa trajectória de ascensão profissional e de reconhecimento de competência técnica,
que lhe possibilitou aliás cargos de direcção/administração que lhe foram consignados
desde os 31 anos de idade.
Contraíu matrimónio aos 24 anos de idade e construiu com a sua esposa, uma
professora do ensino secundário, um projecto de família que se prolongou por 23 anos e
que se cindiu por divórcio em 1997, no contexto da qual consolidou condições de bem-
estar e segurança material elevadas. Tem dois filhos, ambos já autonomizados, com
famílias constituídas e descendentes próprios.
Cumulativamente com a carreira no ramo industrial desenvolveu uma actividade
docente, primeiro no ensino secundário e depois, desde 1973, no então Instituto
Industrial do Porto, hoje Instituto Superior de Engenharia do Porto. Leccionou nos
cursos nocturnos, o que lhe proporcionou complementos de rendimento e actualização
mas que lhe condicionou, pelo intenso nível de investimento laboral, a qualidade da
participação na vida em família.
Dotado de uma postura enérgica e pragmática, actuou de forma a corresponder
responsavelmente aos compromissos assumidos nos múltiplos papéis e actividades
desenvolvidas.
No período de 1997 a 2002/2003 cessou, em situação de licença sem
vencimento, as funções docentes, centrando a sua actividade na indústria. Em 1997
efectuou formação técnica e gestão na “Suez-Lyonesse” e, por referenciação de uma
empresa na área do ambiente daquela holding, integrou, em Setembro de 1997, a firma
“Resin”, também daquele ramo, com funções de director-geral, designadamente para as
áreas técnicas e profissionais.
Rescindiu o seu contrato de trabalho que o ligava à “Resin” em Maio de 2000 e
então empenha-se em outros projectos ligados ao ambiente, tendo ainda trabalhado na
sociedade de empreitadas “Adriano”.
Em meados de 2002 retomou a docência, estando desde há 4 anos na situação de
exclusividade no ISEP, integrado no Departamento de Engenharia Mecânica, onde
lecciona as cadeiras de “Órgãos de Mecânica”, “Introdução à Engenharia I”, “Mecânica
dos Materiais” e “Projecto”.
Restringiu a sua actividade profissional ao ensino em razão da sua situação
processual, o que o inibe de aceitar funções com relevância de direcção por as
considerar incompatíveis com os requisitos de credibilidade inerentes ao exercício
daqueles cargos.
Divorciado desde 1997, vive sozinho, em andar próprio, localizado na zona da
periferia urbana da cidade do Porto, não estabelecendo relações de vizinhança para além
das formalmente exigidas.
Mantém um relacionamento próximo frequente com os filhos e respectiva
família constituída e ainda com a ex-mulher. Neste contexto, é preservado o sentido de
unidade familiar, procurando o arguido Gabriel cultivar uma relação de proximidade e
cooperação com os descendentes e, por decorrência, a retribuição afectiva que lhe é
concedida.

67
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Para além destas valências de organização de vida, desenvolve outras


sociabilidades que passam pelo convívio em círculos de amizades e viagens,
caminhadas e dança, as que se configuram comuns e adaptativas para a sua condição.
Vivência com incomodidade o presente processo, nomeadamente ao nível da sua
actividade profissional, tendo porem conseguido mobilizar recursos pessoais e de apoio
da rede de relações familiares e sociais que lhe vêm possibilitando uma adaptação
eficiente a esta nova situação.
O arguido Gabriel Almeida não tem antecedentes criminais.

Arguido António Pereira Mesquita de Carvalho


O arguido António Carvalho é o mais velho de dois irmãos, descendente de um
casal de modesta condição sócio-económica e cultural. O pai era ferroviário, com o 3º
ano de escolaridade, e a mãe era doméstica, sem qualquer instrução académica. O
processo de socialização decorreu inserido num contexto familiar tradicional,
socialmente integrado e com algumas dificuldades económicas, em que apenas uma
gestão muito rigorosa dos rendimentos permitia satisfazer as necessidades básicas
fundamentais.
O âmbiente e a dinâmica familiar no qual se processou a fase inicial do seu
desenvolvimento foi caracterizado por um estilo relacional harmonioso e coeso e por
padrões educativos tradicionais no seu meio cultural, conduzindo, desta forma, a uma
socialização bem sucedida.
O percurso escolar iniciou-se na localidade de naturalidade, onde concluiu o 4º
ano de escolaridade. Aos 12 anos de idade ingressou no seminário de uma congregação
religiosa, onde permaneceu até cerca dos 28 anos de idade. Concluiu o 3º ano de
Teologia e o bacharelato em Filosofia. Enquanto seminarista, leccionou no Seminário
da Régua (1 ano) e Viana do Castelo (1 ano). O seu trajecto escolar evidencia
regularidade e sucesso.
Em 1977, após sair do seminário, contraíu matrimónio com a sua actual esposa,
também professora, tendo fixado definitivamente residência na Lixa (concelho de
Felgueiras). Teve dois filhos fruto desse casamento, um rapaz e uma rapariga,
experenciando um bom ambiente familiar.
Continuou a sua actividade docente em 1996, quase sempre na Lixa, onde foi
presidente do Conselho Directivo da Escola Preparatória, durante 17 anos.
Em 1994 foi convidado para assessor na CMF, tendo sido vereador da cultura de
1995 a 2003. De 2003 a 2005 exerceu o cargo de presidente da CMF, em substituição
da presidente eleita (arguida Fátima Felgueiras), já que esta ausentou-se para o Brasil. A
sua trajectória profissional, quer na escola, quer na actividade camarária, apresenta
hábitos estruturados de trabalho, evidenciando ainda capacidade de realização, tendo
desempenhado cargos directivos de relevo.
Participou na vida associativa da comunidade, tendo feito parte dos órgãos
sociais de várias associações com diferentes fins (B.V. da Lixa, Banda de Música da
Lixa, Misericórdia de Felgueiras e Confraria de Stª Quitéria).
À data dos factos que lhe são imputados, ele era verador da CMF com o pelouro
da cultura. Habitava, e continua a habitar, uma casa, tipo vivenda, adquirida com
recurso a empréstimo bancário há cerca de 16 anos, com boas condições de
habitabilidade, na companhia da esposa, da sogra e dos dois filhos. Apresentava um
estilo de vida pró-social, com participação activa na vida da comunidade, e rotinas
diárias condicionadas pela natureza das actividades que desempenhava, que lhe
absorviam todo o tempo disponível. Revelava, e revela, comportamentos sociais
ajustados e respeitadores dos padrões socialmente dominantes.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No período posterior aos factos que lhe são atribuídos, substituiu a a presidente
da CMF durante dois anos. Em 2005 aposentou-se, tendo deixado de exercer qualquer
actividade profissional e política.
Actualmente continua a residir na mesma casa, na companhia da esposa,
também reformada, e da sogra (que se encontra acamada).
O agregado tem uma boa situação económica, sendo certo que o arguido e a
esposa recebem, cada um deles, 2.000,00 euros de pensão de reforma por mês.
Ocupa os seus tempos livres no convívio e apoio familiar, bem como na
participação activa nalgumas associações da comunidade.
É pois um indivíduo detentor de competências cognitivas, interpessoais e
sociais, que lhe permitem uma ajustada inserção comunitária.
A sua actual situação jurídico-penal está a causar algum impacto ao nível
pessoal, decorrente do desconforto e tensão que o presente processo lhe acarreta.
Procura manter a família à margem de toda esta envolvência, à custa de uma excessiva
internalização de sentimentos, que estão a reflectir-se nalgumas queixas sintomáticas.
Socialmente a sua imagem não foi afectada, continuando a benificiar de uma
imagem social bastante favorável.
O arguido António Pereira Mesquita de Carvalho não tem antecedentes
criminais.

Arguido António Bragança da Cunha


O arguido Bragança da Cunha teve um processo de desenvolvimento integrado
em grupo familiar residente em Felgueiras, cuja dinâmica e funcionalidade eram
equilibradas.
O percurso escolar do arguido iniciou-se em idade normal e com um
desempenho linerar e adequado, finalizado com o antigo 5º ano do liceu em Felgueiras,
transitando posteriormente para Guimarães, onde concluiu o magistério primário aos 18
anos de idade.
Inicia então a sua trajectória profissional na Biblioteca Municipal de Felgueiras,
tendo ali permanecido durante cerca de dois anos. Seguiu-se uma experiência docente
no ensino primário durante aproximadamente dois anos, interrompida com o exercício
de funções autárquicas na vereação do município de Felgueiras, como responsável pelo
pelouro da cultura e educação no mandato 1983 a 1985.
Paralelamente ao exercício da vereação, o arguido Bragança assume a
coordenação da Direcção de Educação de Adultos de Felgueiras, aproximadamente
entre os anos de 1982 a 1985.
Findo o mandato na vereação, o arguido inicia funções como adjunto do
presidente (cargo mais tarde designado como chefe de gabinete) do município de
Felgueiras, um cargo de nomeação onde se manteve entre os anos de 1986 e 2000, tendo
assim prestado serviço a três presidentes da autarquia (Machado Matos, Júlio Faria e
Fátima Felgueiras).
Enquanto exercia funções na autarquia, em 1997, o arguido concluiu o curso de
estudos superiores especializados em administração escolar no ISCE, instituto superior
sediado em Odivelas, com um pólo em Felgueiras. Fez ainda parte do secretariado da
concelhia do PS, actividade que exerceu em acumulação com as restantes funções,
sensivelmente entre 1980 e 2000.
Casou aos 25 anos de idade, facto que conduziu à autonomização residencial
face ao agregado de origem, mantendo uma relação conjugal estável, tendo tido o casal
uma filha fruto desse casamento.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A actual situação sócio-familiar não apresenta alterações significativas


relativamente àquela que exstia aquando dos factos sobre os quais está pronunciado,
constituindo o agregado com a cônjuge e uma filha maior, estudante do ensino superior.
Este núcleo familiar reside em habitação própria, tendo uma situação económica
estável.
Com o abandono das funções que exercia na CMF, o que ocorreu após os factos
que originaram os presentes autos, o arguido regressou ao Agrupamento Vertical de
Escolas de Lagares, em Felgueiras, onde desempenhou inicialmente a função de vice-
presidente do conselho executivo e actualmente assume a função de presidente para o
mandato 2006/2009. Apesar de manter a filiação partidária, interrompeu as suas funções
no secretariado do PS.
Neste contexto, o quotidiano do arguido está muito centrado nas funções que
desempeha no Agrupamento Vertical de Escolas de Lagares, assim como nas relações
de sociabilidade com familiares e amigos.
É pessoa que tem capacidade de liderança, é detentor de competências pessoais,
sociais e académicas adequadas a um percurso social e profissionalmente activo e
integrador, beneficiando de uma rede social de apoio e integração na comunidade local.
O principal impacto deste processo judicial manifestou-se na interrupção da sua
vida partidária activa, bem como o a transição de uma experiência profissional de
décadas na autarquia para assumir funções na gestão do Agrupamento Vertical de
Escolas de Lagares, actividade que para si é gratificante.
Experienciou também constrangimentos na sua vida profissional, em face deste
processo.
Não tem antecedentes criminais.

Arguido Anastácio Macedo


No âmbito do processo comum singular nº 804/04.2TAFLG, do 1º Jz do T.J. da
Comarca de Felgueiras, por sentença proferida a 16.11.2005, transitada em julgado, foi
o arguido Anastácio Macedo condenado na pena de 130 dias de multa à taxa diária de
5,00 euros, pela prática a 15.06.2004 de um crime de emissão de cheque sem provisão,
p. e p. pelo artº 11º, nº 1, do DL nº 454/91, de 28.12; tal pena, entretanto, viria a ser
declarada extinta pelo seu pagamento.

Arguido Guilherme Almeida


O arguido Guilherme iniciou o processo de socialização em agregado familiar
com um modelo parental ajustado, verificando-se a existência de normas estruturadoras
e controlo parental. Os progenitores proporcionaram aos 11 descendentes uma estrutura
funcional de referência e integração. O arguido, sendo um dos elementos mais novos do
agregado, beneficiou de uma situação económica equilibrada, uma vez que os irmãos
mais velhos cedo começaram a trabalhar e a contribuir para a economia doméstica.
Teve um percurso escolar normal, tendo concluído a escolaridade obrigatória
(equivalente ao actual 1º ciclo do ensino básico). Deixou de estudar porquanto
considerava apelativo o mundo do trabalho, um pouco influenciado pelas experiências
dos irmãos mais velhos.
Iniciou o percurso laboral na área do fabrico de calçado na empresa onde o pai e
os irmãos já trabalhavam. Nos primeiros anos o pai geria o seu vencimento, a partir dos
20 anos de idade passou a comparticipar nas despesas do agregado, gerindo ele o
produto do seu trabalho, sentindo esta mudança como prova da confiança dos pais e
uma maior responsabilização e autonomia face ao agregado.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Aos 20 anos de idade constituiu, juntamente com familiares, uma sociedade


comercial para o fabrico de calçado, cedendo a sua quota 4 anos depois.
Aos 26 anos de idade iniciou a construção de um pavilhão onde veio a instalar a
sua fábrica de calçado. No exercício da actividade empresarial assumiu-se inicialmente
como empresário em nome individual, constituindo posteriormente uma sociedade
unipessoal e em 1997 constituiu uma sociedade anónima.
Casado há 23 anos, tem 4 filhos (com 22, 18, 15 e 13 anos de idade,
respectivamente). A dinâmica familiar deste casal apresentou-se sempre estável, com
um padrão de relacionamento coeso e harmonioso.
À data dos factos que lhe são imputados na pronúncia o arguido residia com a
esposa e os 4 filhos em casa própria, numa pequena freguesia do concelho de
Felgueiras, situação que se mantém no presente. A dinâmica familiar é estruturada e
funcional, com um estilo de comunicação gratificante.
Profissionalmente o arguido Guilherme exerce actividade como administrador
da “Ricap, SA”, uma empresa ligada ao fabrico do calçado. É empresário da indústria
do calçado há mais de 20 anos.
Além da sua actividade profissional, exerce também o cargo de presidente da
Junta de Freguesia de Penacova, tendo sido eleito nas últimas eleições autárquicas.
Encara o exercício autárquico como um dever de cidadania mas também como um
desafio para a sua capacidade de administração.
É um indivíduo que revela sentido de autonomia, realização e motivação para a
prossecução de objectivos definidos e concretos. Tem sentido humanitário e altruísta,
tendo colaborado com várias obras paroquiais e da junta de freguesia, tanto no período
anterior como posterior ao exercício do seu cargo autárquico.
O presente processo judicial está a ser vivido por si com algum desconforto,
encarando-o porém com serenidade.
Até ao momento, pelo menos, em termos sociais, estes processo não tem
afectado a sua imagem, sendo pessoa respeitada e considerada no meio.
Não tem antecedentes criminais.

Arguido Joaquim Teixeira Pinto


O processo de socialização do arguido Joaquim Pinto decorreu em contexto
familiar estável e economicamente equilibrado, sendo satisfatórias as relações intra-
familiares, com uma actuação positiva dos seus progenitores no processo educativo dos
10 descendentes.
O arguido completou o 10º ano de escolaridade, iniciando o seu percurso
profissional com 11 anos de idade numa barbearia até ao 18 anos, idade com que
emigrou para França para evitar o cumprimento do serviço militar obrigatório.
Viveu durante 9 anos naquele país, onde casou aos 24 anos de idade e de cuja
relação nasceram dois filhos, actualmente com 35 e 28 anos de idade, respectivamente.
Durante esse período de tempo desempenhou diferentes actividades profissionais,
sobretudo na área da construção civil e vendas.
Após o 25 de Abril regressou a Portugal, tendo durante um ano exercido a
actividade de agente de calçado.
Em 1976 estabeleceu-se por conta própria no ramo do fabrico do calçado.
Á data dos factos que lhe são imputados, o arguido Pinto integrava o seu
agregado familiar, constituído pela cônjuge e pelos dois filhos do casal. Actualmente,
face ao falecimento da cônjuge e à autonomização dos dois filhos, vive sozinho,
mantendo uma relação de grande proximidade com estes.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido desenvolveu as funções de administrador da “Pinfel”, sociedade


anónima ligada ao fabrico de calçado. Esta empresa entrou em processo de falência há
cerca de 2 anos.
O arguido pondera agora a possibilidade de investir no mercado africano,
procurando oportunidades de trabalho neste continente.
Apesar de privilegiar o trabalho e a família como as vertentes enformadoras do
seu quotidiano, está também envolvido em actividades pró-sociais, nomeadamente em
iniciativas dos Rotários de Felgueiras.
Aparenta uma consciência crítica e crenças adequadas quanto a comportamentos
normativos, evidenciando competências pessoais e sociais significativas.
O presente processo, apesar de mediatizado, não interferiu com o normal
desenrolar da vida do arguido Pinto, aguardando serenamente o seu desfecho.
Não tem antecedentes criminais.

Arguido José Manuel Pimenta da Silva


O arguido José Silva é oriundo de um agregado familiar numeroso, sendo um
dos sete descendentes de um casal de agricultores de médios recursos. A dinâmica
familiar foi pautada pela funcionalidade, com bons níveis de coesão e solidariedade
entre os seus elementos.
Frequentou o sistema de ensino entre os 6 e os 12 anos de idade, até à conclusão
do 6º ano de escolaridade. Teve um percurso escolar positivo, sem incidentes e com
bom aproveitamento. Contudo, abandonou o percurso escolar, por opção, privilegiando
o exercício da actividade profissional.
Inicia a sua trajectória profissional como empregado de balcão no sector da
restauração, onde esteve até aos 16 anos de idade. Depois de uma curta experiência
como empregado de escritório, ingressou na indústria do calçado como operário. Em
1978 estabeleceu-se por conta própria, criando uma empresa em sociedade com outra
pessoa, que se dedicava ao fabrico de solas. Em 1984malargou a actividade,
constituindo uma outra empresa do mesmo sector.
Em 1986, na sequência da morte súbita da primeira esposa, o arguido vendeu as
empresas e desligou-se de todos os negócios em que estava envolvido, por acusar
problemas depressivos graves.
Um ano depois, porém, retomou a actividade profissional, constituindo a
sociedade “Solpré – José Manuel Pimenta da Silva, Ldª”, empresa que mantém. Alargou
também o seu ramo de investimentos, nomeadamente para o sector imobiliário, sendo
sócio de duas imobiliárias.
Contraíu segundo matrimónio em 1991, nascendo desta relação dois filhos,
actualmente com 12 e 15 anos de idade. A dinâmica familiar é compensadora e
afectivamente equilibrada.
À data dos factos que desencadearam os presentes autos, tal como no presente, o
arguido integrava o agregado constituído pela esposa e pelos dois filhos menores.
Residem em Guimarães numa moradia propriedade de uma das empresas imobiliárias
de que é sócio, dispondo de muito boas condições de habitabilidade e está inserida em
meio urbano.
Profissionalmente exerce as funções de gerente da “Solpré”, com sede em
Cabeça de Porca, Sendim (Felgueiras). Usufrui de uma situação económica estável e
confortável proveniente do rendimento da sua actividade profissional e da esposa.
Em termos de lazer e ocupação de tempos livres, destaca-se a convivência com a
família e amigos.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tem cuidados específicos com a saúde, uma vez que apresenta alguns problemas
depressivos e perturbações do sono desde jovem, fazendo acompanhamento clínico da
especialidade e tomando medicação para o efeito.
O arguido beneficia de adequada inserção comunitária, especialmente em
Felgueiras, onde passa parte substancial do seu quotidiano. Junto da comunidade onde
cresceu, em Varziela - Felgueiras, detém uma imagem positiva, sendo descrito como
pessoa empreendedora e solidária, participando e contribuindo para instituições
culturais e de solidariedade social, atenta a sua situação sócio-ecnómica confortável. Foi
membro do “Rotary Clube de Felgueiras”.
O presente processo teve um impacto negativo na sua vida, visto que a sua
credibilidade social e empresarial podem sair prejudicadas, sobretudo pelo facto do
processo ser alvo de forte mediatização, além de que, numa fase incial, este contacto
com o sistema judicial acabou por acentuar as suas complicações de saúde, situação
entretanto estabilizada.
Não tem antecedentes criminais.

Arguido Carlos Sampaio Teixeira


O arguido Carlos Sampaio teve um processo de desenvolvimento integrado num
agregado numeroso, ligado a uma actividade empresarial de pequena dimensão no
sector do calçado, actividade na qual se mantêm envolvidos alguns dos irmãos do
arguido.
O percurso escolar inicia-se em idade normal, com abandono aos 13 anos de
idade com a conclusão do 7º ano de escolaridade pelas dificuldades económicas do
agregado e motivação para o desempenho de uma actividade profissional.
Inicia uma trajectória laboral precoce como aprendiz de escriturário, área de
actividade onde se manteve até aproximadamente os 17 anos de idade, momento em que
emigra para França, país onde residia um irmão. Após uma experiência profissional
assalariada numa fábrica de pneus, aos 21 anos de idade regressa a Portugal para o
cumprimento do serviço militar obrigatório.
A trajectória profissional que se seguiu ao regresso a Portugal do arguido
Teixeira manteve-o ligado a uma actividade empresarial estável e continuada fundada
em décadas de laboração no sector do calçado, sector de actividade que assume uma
configuração e transmissão intergeracional na sua família.
Casou aos 26 anos de idade, relação que e estável e donde resultou o nascimento
de dois filhos (um actualmente ainda menor).
No plano cívico e associativo, teve uma curta participação na direcção do FCF,
clube entretanto extinto.
A actual situação sócio-familiar do arguido tendo por referência a data dos
factos que lhe são imputados não apresneta alterações significativas. Vive com a
cônjuge e os dois filhos em moradia própria em Felgueiras. Este agregado tem uma
situação económica estável fundada em décadas de actividade empresarial no sector do
calçado.
O quotidiano do arguido está muito centrado na gestão empresarial da fábrica
“Jonil”, uma organização com aproximadamente 40 trabalhadores e com uma laboração
estável. O arguido trabalha no sector do calçado por conta prórpria há mais de 20 anos,
inicialmente de parceria com um irmão e actualmente em sociedade com o filho mais
velho (de 26 anos de idade) e com a esposa.
Ao longo do seu percurso profissional, o arguido Teixeira não se envolveu na
aquisição de formação certificada na área da gestão, estando a sua competência e

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

sucesso laboral firmados na experiência de vida e no trabalho continuado por conta


própria neste sector, onde sente grande à vontade.
Comunitariamente, o arguido é um indivíduo plenamente integrado na cidade e
no concelho de Felgueiras, cuja imagem social está associada a uma actividade
empresarial estável e socialmente responsável. O seu quotidiano está muito centrado na
vida empresarial e nas relações de sociabilidade com familiares e grupo de pares ligados
à gestão no sector do calçado, factor que impede uma participação mais activa na vida
associativa e cívica do concelho.
Os presentes autos não tiveram qulquer impacto significativo no seu quotidiano.
É pessoa empreendedora, cuja experiência de vida, reforçada pelo carácter
intergeracional de um sector de actividade conhecido do grupo familiar, o dotou de
consolidadas competências sociais e pessoais na área da gestão de empresas no ramo do
calçado.
Não tem antecedentes criminais.

Arguida Maria Augusta


O processo de socialização da arguida Maria Augusta decorreu no seio de um
agregado familiar de bons recursos sócio-económicos, sendo a mais velha de dois
descendentes. A dinâmica familiar foi pautada pela funcionalidade, com bons níveis de
coesão e solidariedade entre os seus elementos.
Frequentou o sistema de ensino de modo continuado até à conclusão em 1973 da
licenciatura em Ciências Matemáticas, pela Universidade do Porto. Paralelamente ao
exercício da actividade profissional como docente do ensino superior, concluiu o
mestrado em 1988 na área da metedologia do ensino da matemática e, em 2000,
concluiu o doutoramento na área didáctica da matemática.
Iniciou a actividade profissional após a conclusão da licenciatura como
professora do ensino secundário, mantendo-se neste ramo de ensino até 1985. Nesta
altura ingressa na docência do ensino superior, tendo passado por vários
estabelecimentos de ensino, nomeadamente pela Universidade do Minho, Universidade
Portucalense e Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto. Nesta
última instituição desempenhou funções de coordenação e chefia.
Paralelamente à sua actividade docente, a arguida manteve uma colaboração
directa com a “Porto Editora”, exercendo as funções de revisora científica para a área da
matemática.
A arguida iniciou a sua participação política activa durante a década de 90. Em
1997 foi eleita deputada à Assembleia Municipal de Felgueiras, cargo que manteve até
2004.
Contraíu matrimónio com 24 anos de idade, tendo nascido desta relação um
filho, actualmente maior de idade e autónomo. Desde essa altura passou a residir em Rio
Tinto – Gondomar, embora mantivesse residência no seio meio social de origem, em
Lagares – Felgueiras.
Neste plano existe uma dinâmica familiar compensadora sob o ponto de vista
afectivo.
Á data dos factos que desencadearam os presentes autos, a arguida exercia
funções de professora coordenadora do ISCAP. Residia com o marido, em casa própria,
com boas condições de habitabilidade, e evidenciava uma boa situação económica,
situação que ainda se mantém.
Em 2002 foi convidada para presidir ao Conselho Executivo da Escola Superior
de Gestão e Tecnologia de Felgueiras, cargo que manteve até Maio de 2004, altura em

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

que apresentou a demissão desse cargo, devido a ter sido constituída arguida no âmbito
dos presentes autos.
É nesta altura que optou por suspender toda a sua actividade académica, por não
se sentir em condições de exercer a actividade laboral enquanto o presente processo não
estiver resolvido. Solicitou licença sem vencimento pelo período de 3 anos, culminando
com o pedido de exoneração dos quadros do ISCAP.
Actualmente, mantém como única ocupação profissional a colaboração com a
“Porto Editora” como revisora científica de manuais escolares de matemática. Reparte o
seu quotidiano entre aquela actividade e a convivência com a família, dispensando
grande parte do seu tempo disponível nos cuidados prestados aos netos menores.
Até Maio de 2004 a arguida Augusta exercia uma actividade política em
Felgueiras, onde possuía residência. Paralelamente detinha outra residência em Rio
Tinto – Gondmar, onde se fixou a título definitivo recentemente.
Tomou conhecimento pela comunicação social de que iria ser constituída
arguida, notícia que foi acolhida por si e pela sua família com surpresa.
O seu envolvimento neste processo causou-lhe sentimentos de vergonha e
constrangimento nas suas relações profissionais e sociais, sobretudo devido à forte
mediatização de que este processo foi alvo.
Desde então sentiu a sua imagem social e profissional descredibilizada, tendo
suspendido os cargos que ocupava quer nos estabelecimentos de ensino superior quer na
assembleia municipal.
Passou a padecer de problemas de saúde, designadamente sintomas depressivos
e descontrolo da tensão arterial, situação que tem vindo a estabilizar-se com a
intervenção clínica. O impacto negativo inicial parece entretanto ter sido ultrapassado,
exprimindo agora a arguida maior tranquilidade e verbalizando o desejo da sua rápida
resolução.
Ela é detentora de uma imagem social conceitualizada, assente numa trajectória
académica e profissional consolidada quer como docente quer como investigadora no
ensino superior.
Não tem antecedentes criminais.

Arguido Horácio Costa


O arguido Horácio Costa é casado, vive com a esposa e dois filhos menores em
casa própria, suportando mensalmente a respectiva prestação em virtude de amortização
de empréstimo bancário que contraiu.
Encontra-se presentemente a montar um escritório que desenvolverá a sua
actividade na área financeira e seguros.
Não tem antecedentes criminais.

Arguido Joaquim Freitas


O arguido Joaquim Freitas é casado e empresário do ramo do calçado.
Não tem antecedentes criminais.

b) – FACTOS NÃO PROVADOS:


Com interesse, não se provou qualquer facto que esteja em contradição com os
que acima se deram como provados nem a demais matéria alegada na pronúncia, no PIC
e nas contestações, designadamente a que infra se referirá.

- A propósito do 1º capítulo da pronúncia

75
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se provou que a “Resin”, no âmbito da divulgação da sua actividade junto


das autarquias, tenha levado autarcas a França, em visita a aterros sanitários.
Não se provou que as relações estabelecidas entre a CMF e a “Resin” se tenham
precipitado na sequência de um grave acidente com um camião na lixeira de Sendim,
que se incêndiou por efeito de auto-combustão provocada, e com a tomada de posição
da população da freguesia de Sendim (provou-se porém que essas relações iniciaram-
se/precipitaram-se na sequência do facto da CMF ter estado na iminência de não ter
local para a deposição dos resíduos, face à relutância da testemunha Menezes Basto em
permitir a continuação da deposição descontrolada desses resíduos no seu terreno).
Não se provou que a população saíu à rua e que impediu a partir desse momento
o depósito de lixo na lixeira (provou-se, em todo o caso, a existência de oposição
popular à deposição descontrolada dos resíduos no local).
Não se provou que a testemunha Menezes Basto tenha exigido qualquer
indemnização à CMF (provou-se, em todo o caso, que reclamou junto da edilidade pelo
facto da deposição dos resíduos ser efectuada de forma descontrolada, ao ponto de
pretender impedir a continuação dessa deposição, pelo menos nesses moldes, tanto mais
que à data já tinha expirado o período de vigência do último contrato de locação
celebrado com a CMF relativamente a esse terreno, o que só não veio a suceder devido
à intervenção da “Resin” no local com a reabilitação sumária da lixeira durante um
período de 6 meses).
Não se provou que a “Resin”, por si ou recorrendo a outras empresas (quer
subcontratando trabalhos quer recorrendo ao aluguer de máquinas com condutor), não
tenha executado os trabalhos que facturou à testemunha Menezes Basto, à CMF e à
AMVS a propósito dos serviços prestados na lixeira de Sendim até ao seu
encerramento.
Não se provou que, no âmbito das empreitadas levadas a cabo para reabilitar e
explorar a lixeira de Sendim, os preços praticados pela “Resin” não fossem ajustados
aos trabalhos que executou no terreno, pelo que, outrossim, não se provou que tenha
existido qualquer sobreavaliação de tais trabalhos ou que tenham sido pagos trabalhos
não executados de modo a permitir “retornos”.
Não se provou que o preço da venda da “Tapada Grande da Devesinha” se tenha
cifrado em 24.754.820$00 (provou-se que o preço se cifrou em 25.754.820$00).
Não se provou que antes de meados de 1995 a arguida Fátima Felgueiras tenha
sabido que o arguido Júlio Faria iria integrar as listas do PS nas eleições legislativas de
1995 em lugar elegível e que, desse modo, antes dessa altura perspectivasse suceder-lhe
à frente dos destinos da CMF e ser candidata pelo PS à presidência da edilidade nas
eleições autárquicas que se viriam a realizar em Dezembro de 1997.
Não se provou que antes de Abril de 1995 os arguidos Júlio Faria, Fátima
Felgueiras e Vítor Borges tenham engendrado um plano que permitisse, por um lado, à
CMF pagar os serviços que de facto a “Resin” prestava na lixeira de Sendim e, por
outro, financiar as actividades do PS local, designadamente a campanha para as eleições
autárquicas que iriam ter lugar em Dezembro de 1997, através de “retornos” de
pagamentos efectuados pela CMF (provou-se que antes dessa altura havia apenas um
“esquema” que consistia no lançar mão de expedientes administrativos que permitissem
à CMF pagar os trabalhos que a “Resin” levava a cabo na lixeira de Sendim e sem que
desse “esquema” estivessem pressupostos “retornos” de verbas; provou-se, em todo o
caso, que em Abril de 1995 foi urdido um plano donde emerge a correlação entre o
expediente administrativo então formalmente adoptado e que permitia à CMF proceder
a pagamentos à “Resin” e os “retornos” que permitiam designadamente financiar as

76
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

actividades do PS de Felgueiras, pese embora só reportado a uma das empreitadas


celebradas a propósito da lixeira de Sendim, formalmente entre a CMF e a “Norlabor”).
Não se provou que o arguido Carlos Marinho tenha sido um dos “cérebros” de
tal plano (provou-se apenas que ele colaborou com os arguidos Vítor Borges, Júlio Faria
e Fátima Felgueiras, na medida em que criou o suporte documental que
contabilisticamente “justificou” as transferências para a sua entidade patronal - a
“Resin” - de todos os pagamentos que a CMF efectuou a propósito dos trabalhos
executados na lixeira de Sendim e que permitiram os “retornos” no âmbito dos
pagamentos efectuados pela CMF no que se refere ao contrato de empreitada referido
no ponto 1.3 da pronúncia, tendo-se aliás provado que procedeu a duas entregas em
numerário, sendo certo que uma delas constituiu um “retorno” e outra traduziu-se num
donativo de 20.000 cts ao FCF, dos quais 7.500 cts foi entregue em numerário e o
restante em cheque).
Não se provou que o arguido Barbieri Cardoso, ao colaborar com os arguidos
Vítor Borges, Júlio Faria e Fátima Felgueiras nas simulações de concurso, ajuste directo
e contratos de empreitada soubesse que daí iriam decorrer “retornos”, designadamente
no que se refere ao concurso limitado e contrato de empreitada mencionados no ponto
1.3 da pronúncia.
Não se provou que o arguido Gabriel, directa ou indirectamente, tenha
colaborado com os arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e Júlio Faria antes de
01.09.97, data do seu ingresso ao serviço da “Resin” (sendo certo que a única
colaboração demonstrada se prendeu apenas com a entrega de um dos “retornos”).
Não se provou que os arguidos Júlio Faria e Barbieri Cardoso não tenham estado
presentes na reunião ocorrida na CMF a 04.09.96, mencionada no ponto 1.4 da
pronúncia.
Não se provou que o “adicional ao contrato de recolha” tenha constituído
qualquer hipótese de resolução da situação originada pela recusa do visto pelo TC no
que se refere à adjudicação dos trabalhos pela CMF à “Resin”, referida no ponto 1.4 da
pronúncia.
Não se provou que tenha existido qualquer “retorno” no âmbito dos contratos
referidos nos pontos 1.2. 1.4 e 1.5 da pronúncia (provaram-se apenas dois “retornos” no
âmbito dos pagamentos efectuados pela CMF à “Norlabor”, com referência portanto ao
contrato mencionado no ponto 1.3 da pronúncia).
Consequentemente, não se provou que a primeira entrega de 5.000 cts em
numerário pela “Resin” aos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras tenha constituído
um qualquer “retorno” (tratou-se de um donativo mas não se demonstrou que estivesse
relacionado com qualquer “retorno” de verbas pagas pela CMF).
Consequentemente, não se provou ainda que o donativo de 20.000 cts ao FCF
tenha constituído qualquer “retorno” no âmbito de qualquer um dos pagamentos
efectuados ou autorizados pela AMVS (demonstrou-se porém que a “Resin” teve
disponibilidade financeira para apoiar o FCF em virtude de ter recebido um valor
referente ao adiantamento no âmbito da empreitada mencionada no ponto 1.5 da
pronúncia, de que parte reteve para si e não entregou à “Ecop”).
Não se provou que o concurso internacional mencionado no ponto 1.5 da
pronúncia tenha sido lançado no âmbito de qualquer quadro de apoio comunitário
(beneficiou antes de fundos de coesão).
Não se provou que os arguidos Júlio Faria, Fátima Felgueiras e Barbieri Cardoso
tenham exercido qualquer influência junto da AMVS para que o consórcio liderado pela
“Resin” vencesse o concurso internacional mencionado no ponto 1.5 da pronúncia ou

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

para que a “Norlabor” vencesse o outro concurso mencionado em tal ponto da mesma
peça processual.
Não se provou que na análise das propostas aos concursos mencionados no
ponto 1.5 da pronúncia (para a construção do aterro RIB de Felgueiras e para a
construção de ecocentros e não ecopontos conforme referido na pronúncia) algum dos
elementos das respectivas comissões de análise tenha favorecido qualquer um dos
concorrentes ou sequer que sobre tais elementos tenham sido exercidas quaisquer
influências nesse sentido.
Não se provou que os arguidos Júlio Faria, Fátima Felgueiras e Barbieri Cardoso
soubessem que a “Resin” inflaccionou em 140.000 cts o valor da proposta apresentada
pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” (conforme dado como provado), de modo a,
dessa forma, ressarcir-se dos montantes então em dívida pela CMF e que ultrapassavam
os 100.000 cts (mesmo sem considerar os juros de mora e os encargos emergentes dessa
situação de mora por banda da CMF).
Não se provou que esses 140.000 cts, dissimulados na proposta apresentada pelo
consórcio liderado pela “Resin”, digam na realidade respeito à exploração do aterro RIB
de Felgueiras e que tal tenha sido assim dissimulado para beneficiar do co-
financiamento por fundos de coesão comunitários em 85% (fundos esses que não
financiavam a exploração mas apenas a construção do aterro).
Não se provou que a “Resin” nunca tenha entregue qualquer quantia em
numerário (provaram-se quatro entregas em numerário: um donativo que serviu para
abrir a conta do BES, dois “retornos” e parte de um donativo em numerário concedido
ao FCF, conforme acima dado como provado).
Não se provou que as quantias monetárias não tenham sido entregues pelas
pessoas mencionadas na pronúncia, no contexto dado como provado (porém, quanto ao
facto alegado na pronúncia de que o arguido Gabriel Almeida acompanhou o arguido
Carlos Marinho aquando da entrega ao arguido Horácio Costa, na CMF, do donativo de
20.000 cts destinado ao FCF, cfr. o que a propósito acima foi decidido pelo Tribunal a
título de questão prévia).
Não se provou que os arguidos Horácio e Joaquim Freitas não tivessem
consciência que duas das entregas em numerário referidas não se reportassem a
“retornos” de verbas pagas pela CMF no âmbito do contrato de empreitada celebrado
com a “Norlabor” (não se demonstrou pois que, quanto a elas, tivessem partido do
pressuposto de que se trataram de simples donativos).
Não se demonstrou – para além do provado -, quais as funções efectivamente
exercidas pelo arguido Gabriel na “Resin” (designadamente as que alegou nos artgs 20 e
21 da sua contestação).
Não se provou que o arguido Gabriel não tivesse consciência de que a quantia
por si entregue em numerário – proveniente da “Resin” – não constituísse um “retorno”
de um dos pagamentos efectuados pela CMF com referência ao contrato de empreitada
que a edilidade celebrou com a “Norlabor” e mencionado no ponto 1.3 da pronúncia,
não se demonstrando ainda que não tivesse tomado consciência de que o mesmo era
simulado.
Quanto às circunstâncias dessa entrega, não se demonstrou o que a propósito foi
alegado nos artgs 39º a 47º da contestação apresentada pelo dito Garbriel Almeida.
Não se provou que tenha sido o arguido Gabriel a assinar o fax de fls 223 do
apenso 20.
Não se provou que a “Resin” não tenha recebido qualquer verba em numerário
da testemunha Menezes Basto.

78
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se provou que os arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras controlassem


absolutamente os órgãos decisórios da CMF e da Assembleia Municipal de Felgueiras
(pese embora se tenha demonstrado que, naturalmente, exerceriam influência sobre
esses órgãos, em face das relevantes funções autárquicas e partidárias que então
exerciam, tendo o PS a maioria quer no executivo camarário quer na assembleia
municipal).
Não se provou que as empresas “Translousada”, “Craveira”, “Norlabor”, “Ecop”
e “João Tello” tenham acedido em colaborar (aparecendo como oponentes em
concursos ou procedimentos administrativos simulados, com vista à adjudicação de
trabalhos de empreitada referentes à lixeira de Sendim) na perspectiva de serem
beneficiadas ou compensadas em futuras adjudicações de empreitadas que a CMF ou a
AMVS iriam promover (demonstrou-se porém que a “Translousada” tinha interesse em
prestar a sua colaboração no “esquema” montado de modo a que a “Resin” recebesse de
facto as contrapartidas monetárias pelo trabalho que levava a cabo na lixeira de Sendim
na medida em que dessa forma também ela receberia da “Resin” o pagamento pelos
serviços que lhe iam sendo subcontratados, já que existia um acordo entre essas
empresas no sentido de que a “Translousada” receberia o respectivo pagamento na
medida em que a CMF pagasse à “Resin”; em todo o caso, não obstante esse acordo, a
“Resin” chegou a liquidar pagamentos à “Translousada” independentemente de ter
recebido da CMF).
Não se provou que a aposição do despacho “TC. Óptimo. 97.06.10” no
documento de fls 199 e ss. do 1º volume tenha sido aposto pela arguida Fátima
Felgueiras antes da aposição em tal documento pelo arguido Horácio Costa da
informação manuscrita ali constante (consequentemente, não se demonstrou que tal
despacho se refira ao conteúdo do relatório em causa).
Não se demonstrou aliás que qualquer um dos documentos entregues pelo
arguido Horácio Costa tenham sido adulterados (o Tribunal convenceu-se da respectiva
veracidade).
Não se provou que pelas missivas de fls 9145 e 9146 o FCF tenha solicitado
qualquer apoio à “Resin” (tratam-se antes de missivas de agradecimento, sendo certo
que o “apoio” que importa aos autos foi solicitado pessoalmente pelo arguido Júlio
Faria, acompanhado do arguido Horácio Costa, algures em Setembro de 1998; os
agradecimentos a que se reportam as missivas em causa referem-se assim, quando
muito, ao outro contrato de publicidade referido nos autos para a mesma época
desportiva e não àquele cuja cópia consta designadamente de fls 9147).
Com as ressalvas já assinaladas na matéria de facto dada como provada, não se
demonstrou a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras na sua contestação nos
artgs 1º a 4º, 6º, 8º, 10º, 11º, 12º, 13º, 17º (parte final), 18º, 19º, 20º, 23º, 24º, 26º, 28º,
30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º e 36º.
Com as ressalvas já assinaladas, não se demonstrou a matéria alegada pelo
arguido Horácio Costa nos artgs 9º, 10º (primeira parte), 11º (primeira parte), 13º, 14º,
15º e 16º da sua contestação.

- A propósito do 2º capítulo da pronúncia


Introdução
Não se provou que a aposição de marcas ou cruzes à frente de nomes constantes
em listas de pessoas a contactar no sentido de lhes solicitar um donativo para a
campanha eleitoral de 1997 correspondia à existência de processos de licenciamento de
construções, pavilhões ou armazéns na CMF, correspondendo ainda tal sinal à
existência de irregularidades e/ou ilegalidades nas obras e construções que os indivíduos

79
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

a contactar tinham em curso ou já concluídas, como forma de os pressionar a contribuir


com o donativo pretendido, não se provando ainda que muitos deles ao darem o seu
contributo para a campanha eleitoral sabiam que evitariam que as suas instalações
fabris, ou obras ilegais, fossem mais tarde fiscalizadas pelos serviços camarários
competentes.
Não se identificou quem do GAPP chegou a recepcionar donativos e a
estabelecer prévios contactos telefónicos com as pessoas a quem lhes eram solicitados
donativos, avisando-as da visita dos arguidos Horácio e Joaquim com essa finalidade.
Não se provou a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras nos artgs 37º e
38º da sua contestação.
Não se demonstrou que ela nunca tenha agido com a intenção de beneficiar
algum munícipe no âmbito de processos de licenciamento e que sempre agiu convencida
da legalidade e justiça das decisões que nesse âmbito proferiu (pese embora também
não se tenha demonstrado o contrário, isto é, que alguma vez tenha agido com esse
intuito).

Anastácio Augusto Pinto Macedo


Não se provou que, em meados do mês de Agosto de 1997, o arguido Anastácio
Augusto Pinto Macedo foi contactado pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim de
Freitas, nas escadas exteriores do edifício da Câmara Municipal de Felgueiras, para que
contribuísse com um donativo de Esc. 1.000.000$00, para a campanha eleitoral da
arguida Maria de Fátima Felgueiras, às eleições autárquicas de Dezembro de 1997, que
se avizinhavam.
Não se provou que, face a tal pedido, o arguido Anastácio Augusto Pinto
Macedo concordou em entregar apenas a quantia de Esc. 500.000$00, em duas tranches,
e desde que os arguidos Horácio Costa e Joaquim de Freitas se comprometessem a
solucionar, junto da arguida Maria de Fátima Felgueiras, um problema relacionado com
a legalização de um pavilhão industrial.
Não se provou que, no mesmo instante, o arguido Horácio Costa disse ao
arguido Anastácio Augusto Pinto Macedo que ia ver o que estava a passar com tal
assunto e que iria procurar “desencravá-lo”, sendo certo que depois lhe diria alguma
coisa.
Não se provou que, entretanto, uns dias depois de ter recebido o primeiro
cheque, e como se tratava de um apoiante da campanha eleitoral de Maria de Fátima
Felgueiras, o arguido Horácio Costa tenha solicitado àquela que defirisse a emissão da
requerida licença de utilização, ao que a mesma acedeu, mas apenas mediante o
compromisso do arguido/requerente, Anastácio Augusto Pinto de Macedo, contribuir
com o segundo donativo, no valor de 250.000$00, para a sua campanha eleitoral,
conforme o combinado.
Não se provou que, após ter efectuado a entrega do primeiro cheque e ainda
antes de efectuar a entrega do segundo, o arguido Horácio Costa tenha entregue ao
arguido Anastácio Macedo, pessoalmente e em mão, a referida licença de utilização,
devidamente emitida pela CMF, que tinha previamente obtido junto de Fátima
Felgueiras, sendo certo que para a sua emissão nunca foi efectuada qualquer vistoria ou
fiscalização pelos serviços competentes da CMF.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se provou que o segundo cheque emitido pelo arguido Anastácio tenha sido
entregue à arguida Fátima Felgueiras pelo arguido Joaquim Freitas (mas provou-se que
foi ela quem o entregou ao arguido Horácio).
Não se provou que o arguido Anastácio Augusto Macedo tenha agido de forma
livre, voluntária e consciente querendo entregar várias quantias monetárias à arguida
Maria de Fátima Felgueiras, através de interpostas pessoas da sua confiança, para ajudar
a financiar a campanha eleitoral desta, recebendo em troca da entrega de tais apoios
financeiros a emissão e aprovação da licença de utilização e de ocupação de um
pavilhão industrial de sua propriedade, apesar de o mesmo bem saber que tal conduta
era proibida e punida por lei.
Não se provou ainda que, por sua vez, a arguida Maria de Fátima Felgueiras
agiu de forma livre, voluntária e consciente, aceitando, e utilizando, aquelas quantias
monetárias, com intuito de obter beneficio patrimonial que sabia ser ilegítimo, por
constituir indevida contrapartida da prática de actos administrativos que violavam as
normas legais aplicáveis e os seus deveres como membro de órgão representativo de
autarquia local, sabendo igualmente que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Por outro lado, não se demonstrou também que o arguido Horácio Costa tenha
agido de forma livre, voluntária e consciente querendo participar e colaborar na prática
de tal crime, nomeadamente colaborando na angariação de fundos monetários para a
campanha eleitoral da arguida Fátima Felgueiras, e nesse âmbito solicitando-lhe que
emitisse a aludida licença de utilização recebendo em troca um donativo monetário por
parte do beneficiado, o que conseguiu e obteve, sendo certo que o mesmo bem sabia que
tal conduta era proibida e punida por lei.

Carlos Sampaio Teixeira


Não se provou que o arguido Carlos Sampaio Teixeira tenha iniciado os
trabalhos de movimentação de terras antes de Dezembro de 1997.
Não se provou que o arguido Carlos se tenha recusado perante os arguidos
Horácio e Joaquim a conceder qualquer donativo para a campanha eleitoral do PS
relativo às eleições autárquicas ocorridas em Dezembro de 1997 (provou-se antes que o
dito Carlos nunca recebeu os arguidos Horácio e Joaquim, apesar destes várias vezes
terem procurado contactá-lo).
Não se provou que tenha sido a arguida Fátima a dar instruções aos funcionários
dos serviços de fiscalização da CMF no sentido de se deslocarem ao local, de modo a
pressionar o arguido Carlos Sampaio Teixeira a contribuir com um donativo.
Não se provou que o arguido Carlos tenha concedido o donativo referido nos
autos em face de tal visita da Fiscalização e em ordem a evitar o embargo da obra.
Não se provou que a arguida não tenha mandado instaurar um processo de
contra-ordenação contra o arguido Carlos Sampaio Teixeira com o intuito de o
beneficiar.
Não se provou que a licença de construção nº 457/2000, de 02.08.2000 tenha
sido concedida como contrapartida do donativo que o arguido Carlos Sampaio Teixeira
concedera em Novembro de 1997.
Não se provou pois que a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma
livre, voluntária e consciente, aceitando, e utilizando, aquelas quantias monetárias, com
intuito de obter beneficio patrimonial que sabia ser ilegítimo, por constituir indevida
contrapartida da prática de actos administrativos que violavam as normas legais
aplicáveis e os seus deveres como membro de órgão representativo de autarquia local e

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

da omissão de instauração de procedimento contra-ordenacional, sabendo igualmente


que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Por sua vez, também não se provou que o arguido Carlos Sampaio Teixeira agiu
de forma livre, voluntária e consciente querendo entregar uma quantia monetária à
arguida Maria de Fátima Felgueiras, através de interpostas pessoas da sua confiança,
para ajudar a financiar a campanha eleitoral desta, recebendo em troca da entrega de tal
quantia monetária a emissão e aprovação da licença de utilização de um pavilhão
industrial de sua propriedade, apesar de o mesmo bem saber que tal conduta era
proibida e punida por lei.
Não se provou também a matéria alegada nos artgs 31º, 32º e 33º da contestação
apresentada pelo arguido Carlos Sampaio Teixeira.

Guilherme da Silva Almeida


Não se provou que, após ter sido notificado da decisão de indeferimento no
âmbito do processo de licenciamento nº 630/97, o arguido Guilherme da Silva Almeida,
acompanhado do engenheiro Manuel Maria Machado (responsável pelo projecto), se
tenha deslocado à CMF, tendo contactado com a Presidente Maria de Fátima Felgueiras
(provou-se que essa audiência teve lugar antes de qualquer parecer ou decisão no
âmbito de tal processo de licenciamento).
Não se provou que no decurso de tal reunião, realizada em Setembro de 1997, o
arguido Guilherme da Silva Almeida tenha obtido da arguida Maria de Fátima
Felgueiras, verbalmente, autorização para começar as obras, ainda que sem o despacho
favorável e consequente emissão e levantamento da licença de construção, mediante o
compromisso de entregar um donativo para a campanha eleitoral daquela arguida.
Não se provou que, na sequência do embargo das obras de terraplanagem, o
arguido Guilherme Almeida se tenha deslocado à CMF e, na impossibilidade de falar
com Fátima Felgueiras, tenha colocado o problema a Horácio Costa, pedindo-lhe que
intercedesse junto daquela arguida no sentido de resolver o referido embargo.
Não se provou que no dia 16.01.98, o arguido Horácio Costa tenha informado
verbalmente o arguido Guilherme de Almeida que a arguida Maria de Fátima Felgueiras
tinha dado autorização verbal para o recomeço das obras e que iria resolver o problema
do embargo e do licenciamento da referida obra, desde que o mesmo entregasse mais
um donativo para a sua campanha eleitoral, o que aquele arguido aceitou fazer logo que
tivesse a licença na sua posse e o embargo resolvido (provou-se que foi o arguido
Horácio quem transmitiu via telefone a dita autorização, mas não se provou que a
mesma estivesse dependente de qualquer donativo).
Não se provou que, na sequência do alegado desrespeito do embargo da obra de
terraplanagem a arguida Maria de Fátima Felgueiras, num primeiro momento, tenha
decidido mandar comunicar esse facto ao Ministério Público mas que posteriormente,
devido ao acordo celebrado com o arguido Guilherme de Almeida, tenha revogado tal
decisão (demonstrou-se que a arguida Fátima nunca ordenou a remessa do auto ao MP,
pois o que existe no processo de licenciamento é uma simples “choca” nesse sentido,
sem que a arguida Fátima a tenha assinado, tendo antes manuscrito um despacho no
sentido de obter esclarecimentos).
Não se provou que do processo de licenciamento nº 116/98 não conste a
informação do Departamento Técnico de 29.03.99 (provou-se que consta de fls 133 de
tal processo).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se provou que o arguido Guilherme da Silva Almeida tenha entregue os


quantitativos monetários referidos nos autos à arguida Maria de Fátima Felgueiras,
através dos arguidos Horácio Costa e Joaquim de Freitas, com intuito de obter em troca
decisão favorável sobre licenças de construção e de utilização das obras em que era
interessado.
Não se demonstrou que, por sua vez, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras,
Horácio Costa e Joaquim de Freitas agiram em conjugação de esforços e de intenções,
visando através das suas condutas obterem (do modo descrito na pronúncia)
quantitativos monetários para a campanha eleitoral daquela arguida, sendo certo que
aquela para alcançar tal objectivo usou para o efeito os poderes de natureza pública do
cargo que exercia, apesar de bem saber que não podia receber qualquer gratificação ou
quantia monetária pelo exercício de tais funções ou por causa delas.
Não se demonstrou que todos estes arguidos bem sabiam que as suas condutas
eram proibidas e punidas por lei.
Com as ressalvas acima referidas (a propósito da factualidade provada), não se
demonstrou, designadamente, a matéria constante dos artgs 7º (pois provou-se que a
arguida Fátima impôs duas condições para que os trabalhos de terraplanagem pudessem
arrancar); 15º (pois não se demonstrou que só a 14.11.97 é que esses trabalhos se
iniciaram); 19º (provou-se que as obras arrancaram em data indeterminada de
Novembro de 1997); 22º; 25º, 2ª parte (pois demonstrou-se que essa visita apenas foi
efectuada pelos arguidos Horácio e Joaquim); 26º, 2ª parte; 27º (no sentido de que não
se sabe se o pedido foi então ali efectuado pelos visitantes ou se esse pedido já
anteriormente havia sido feito, designadamente pela arguida Fátima); 28º, 2ª parte; 30º;
31º, 1ª parte; 36º, 41º (não se apurou, em concreto, qual o teor das comunicações
estabelecidas entre o arguido Guilherme e o gabinete “M2”, embora se tivesse
demonstrado que se prendiam com a resolução do problema lavantado pelo auto de
notícia); 46º; 47º (ignora-se qual foi em concreto o teor das comunicações estabelecidas
entre o arguido Guilherme e o gabinete “M2”, embora se tivesse demonstrado que se
prendiam com a resolução do problema lavantado pelo embargo da obra); 50º, parte
final (não se demonstrou que as obras só tivessem sido retomadas a 19.09.98); e 56º, 2ª
parte, todos da contestação apresentada pelo arguido Guilherme da Silva Almeida.

Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva


Não se provou que o terreno referido nos autos tenha estado registado em nome
do arguido José Pimenta da Silva (provou-se que esse terreno esteve registado em nome
da firma “José Manuel Pimenta da Silva & Cª Ldª”).
Não se provou a existência de qualquer correlação entre a entrega dos donativos
por banda destes arguidos e o andamento e deferimento das suas pretensões no âmbito
dos processos de licenciamento referidos nos autos (assim como não se demonstrou o
inverso).
Não se demonstrou em que data do primeiro semestre de 1997 teve lugar a
reunião entre os arguidos Fátima, Pinto e Silva.
Não se provou que nessa reunião a arguida tenha dado autorização verbal para
que as obras de terraplanagem se inciassem.
Não se provou que na mesma reunião a arguida Fátima tivesse transmitido aos
arguidos Pinto e Silva que a divisão do terreno em duas parcelas poderia ser feita
através de um destaque.
Não se provou que os arguidos Pimenta da Silva e Teixeira Pinto tenham
entregue directamente os respectivos donativos aos arguidos Horácio e Joaquim e que o

83
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

fizeram em datas distintas (provou-se que os primeiros dois donativos foram entregues
na mesma ocasião através da testemunha Manuel Machado e que todos os donativos
foram entregues através desta mesma testemunha).
Não se provou qual a finalidade da concessão do donativo de 670 cts e que este
tenha sido entregue directamente pelo arguido Silva os arguidos Horácio e Freitas.
Não se demonstrou que os arguidos Fátima, Silva e Pinto tivessem consciência
de que a aprovação da operação de loteamento fosse um acto administrativo ilegal.
Não se demonstrou a matéria alegada pelo arguido Pimenta da Silva nos artgs 7º
a 13º e 25º a 29º na sua contestação escrita.
Não se demonstrou a matéria constante dos artgs 2º a 5º, 7º a 16º, 19º, 28º, 29º,
35º, 36º, 37º, 46º, 47º, 56º, 63º 64º, 65º, 68º, 69º, 70º, 74º, 77º e 89º da contestação
apresentada pelo arguido Joaquim Teixeira Pinto.

Maria Augusta Faria Ferreira Neves


Não se provou que antes de iniciar a construção do edifício industrial, a arguida
Maria Augusta Neves tenha colhido previamente junto dos serviços técnicos da CMF, e
pessoalmente junto da arguida Maria de Fátima Felgueiras, a informação que tal
construção era possível e legal.
Não se provou que se tenham deslocado ao local da obra vários Técnicos da
Autarquia e a própria arguida Maria de Fátima Felgueiras, a fim de se inteirar sobre a
mesma.
Não se identificou que entregou ao arguido Horácio o cheque de fls 519.
Não se demonstrou que o cheque de fls 541 tenha sido entregue para apoiar a
candidatura da arguida Fátima à presidência da CMF (provou-se que foi entregue para
apoiar o projecto relativo à revista “Rubeas”).
Não se provou que, face da instauração do processo de contra-ordenação nº
466/98, a arguida Maria Augusta Faria Ferreira Neves tenha tentado, de imediato, falar
com a arguida Maria de Fátima Felgueiras, não o tendo conseguido.
Não se demonstrou que, devido à dificuldade em conseguir falar com a
Presidente da CMF, a arguida Maria Augusta Faria Ferreira Neves tenha resolvido
abordar informalmente o arguido António Bragança da Cunha, pedindo-lhe que
comunicasse à arguida Maria de Fátima Felgueiras a instauração do referido processo e
se podia fazer alguma coisa para o resolver.
Não se apurou que, depois de o arguido António Bragança da Cunha ter
comunicado aquele pedido à arguida Maria de Fátima Felgueiras, esta lhe tenha dado
instruções no sentido de deixar o referido processo de contra-ordenação no seu gabinete
e de informar a arguida Maria Augusta que o problema seria resolvido e que entregasse
a quantia de Esc. 500.000$00 ao partido, instruções que aquele cumpriu.
Não se provou que no dia 0909.1998 a arguida Maria de Fátima Felgueiras tenha
despachado favoravelmente a emissão da licença de construção nº 660/98 (provou-se
que esse despacho foi proferido a 03.09.98).
Não se provou que, como o processo de contra-ordenação não tinha sido, de
imediato, arquivado, a arguida Maria Augusta Neves tenha questionado, novamente, o
arguido António Bragança sobre tal situação, ou seja, sobre o facto de o processo de
contra-ordenação não ter sido arquivado, bem como sobre o facto de estar a ser exigido
pela CMF o pagamento da respectiva coima.

84
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se demonstrou que, mais uma vez, este facto tenha sido comunicado pelo
arguido António Bragança à arguida Maria de Fátima Felgueiras, e que esta, para
arquivar o processo, tenha exigido que a arguida Maria Augusta Neves pagasse a
quantia combinada, ou seja, a quantia de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos).
Não se provou que tenha sido no seguimento daquela exigência que a arguida
Maria Augusta Neves tenha entregue ao arguido António Bragança, em Abril de 1999, o
cheque com o n.º 3769765719, no valor de Esc. 500.000$00 (quinhentos mil escudos),
sacado sobre a conta n.º 21656575/001 do BTA, balcão de Felgueiras, titulada por José
Manuel Monteiro Neves (mas emitido por Maria Augusta Ferreira Neves, em
16/04/1999).
Não se provou que, posteriormente, emergente de uma qualquer combinação
entre ambas arguidas, tenha sido arquivado o processo de contra-ordenação referido e
que tenha sido emitido o alvará nº 940/99, licenciando alterações à construção inicial,
alterações estas destinadas a um armazém.
Não se provou que a arguida Maria Augusta Ferreira Neves agindo de forma
livre, voluntária e consciente tenha querido contribuir e entregar os donativos supra
referidos à arguida Maria de Fátima Felgueiras a fim de obter em troca o respectivo
licenciamento da obra supra referida, assim como não se demonstrou que ela tenha
visado com tais condutas evitar que lhe fosse aplicada uma coima de valor elevado
pelos serviços camarários, sendo certo que a mesma bem sabia que tal conduta era
proibida e punida por lei.
Não se provou também que os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e António
Bragança da Cunha agiram de forma livre, voluntária e consciente, em conjugação de
esforços e de intenções, querendo receber as quantias supra aludidaspara licenciarem
contra as normas legais vigentes as obras requeridas pela arguida Maria Augusta junto
da CMF, bem como para evitarem que a mesma pagasse uma elevada quantia monetária
àquela autarquia, a título de coima, usando para o efeito os poderes legais dos cargos de
autarcas que desempenhavam, apesar de bem saberem que ao fazê-lo violavam os
deveres a que estavam a obrigados por força de tais cargos e que as suas condutas eram
proibidas e punidas por lei.
Não se demonstrou ainda qualquer outro facto alegado nas contestações, em
contradição ou para além dos que acima se deram como provados, designadamente:
- A matéria constante dos artgs 12º, 14º, 24º, 50º e 60º (2ª parte) da contestação
apresentada pela arguida Maria Augusta Neves;
- A matéria constante dos artgs 64º, 67º e 70º da contestação apresentada pelo
arguido Bragança.

- A propósito do 3º capítulo da pronúncia


Não se provou a matéria que a propósito foi alegada pela arguida Fátima
Felgueiras nos artgs 48º a 53º, 55º e 57º da sua contestação.
Não se provou a versão dos factos apresentada na contestação dos arguidos Júlio
Faria (artº 62º), Vítor Borges e Carlos Marinho (artgs 107º a 109º e 111º), no que
respeita à concessão pela “Resin” do donativo de 20.000 cts, na parte em que entra em
contradição com a matéria que acima se deu como provada.
Não se demonstrou que tenha sido a arguida Fátima a contactar directamente
com a “Resin” no sentido desta empresa apoiar financeiramente o FCF, designadamente
com recurso às verbas que aquela empresa iria receber da AMVS.
Não se provou que a “Resin” desde logo se tenha comprometido a contribuir
com 20.000 cts para o FCF (provou-se que foi esse o donativo solicitado e que a

85
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

“Resin” se comprometeu a contribuir de acordo com as suas disponibilidades


financeiras e em face de verbas que teria a receber da AMVS).
Não se provou que tenha sido o arguido Gabriel Almeida a assinar e a enviar
para a AMVS, no dia 27.10.98, o fax referido na pronúncia e constante de fls 223 do
apenso 20 (ignora o Tribunal quem o fez).
Não se demonstrou quem informou o arguido Júlio Faria de que poderia remeter
uma missiva à CCAM, referindo que a dívida de 20.000 cts seria saldada até ao final do
ano de 1998.
Não se provou que o arguido Gabriel Almeida tenha acompanhado o arguido
Carlos Marinho aquando da entrega dos 20.000 cts.
Não se provou que a entrega dessa quantia permitiu saldar uma dívida avalisada
pelo arguido Júlio Faria (provou-se aliás que o arguido Júlio não tinha prestado
qualquer aval no âmbito do acordo de transacção que o FCF celebrou com a CCAM).
A propósito da aquisição dos bilhetes referentes ao sorteio promovido pelo FCF,
não se provou a versão dos factos alegados pelo arguido Júlio Faria na medida em que
esteja em contradição com a matéria de facto que a esse propósito se deu como provada
(a versão desses factos que deu na audiência de julgamento não foi aliás coincidente
com a posição expressa no artº 61º da sua contestação escrita).

- A propósito do 4º capítulo da pronúncia

Introdução
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras, ao proferir os seus
despachos nos processos de licenciamento, tenha deferido as pretensões formuladas
pelos requerentes em tais processos com a consciência de que ao fazê-lo estaria a violar
qualquer norma legal, designadamente o RGEU e o PDM.
Não se demonstrou ainda que tenha decidido em sentido contrário aos pareceres
proferidos pelos técnicos em tais processos de licenciamento.

Processo de obra particular nº 130/88


Não se provou que a arguida Fátima Felgueiras tenha proferido qualquer
despacho contra qualquer parecer proferido no âmbito do processo em causa.
Não se provou que a arguida Fátima Felgueiras tenha agido com a consciência
de que, ao deferir o licenciamento da obra em causa bem como ao deferir a respectiva
licença de utilização, estivesse a violar qualquer norma legal, designadamente do RGEU
e do PDM.
Não se demonstrou ainda que tivesse agido com a intenção de ilicitamente
beneficiar a requerente nas decisões que tomou naquele processo de licenciamento.

Processo de obra particular nº 5/I/93


Não se provou que, no momento da aprovação do projecto de arquitectura,
tivesse existido a consciência por parte do presidente da edilidade de que o projecto
violava o PDM.
Não se provou que a arguida Fátima, em face dos despachos que proferiu,
tivesse tido a consiência de ter cometido alguma ilegalidade (designadamente por
violação do PDM).
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras tivesse querido beneficiar a
requerente do processo de licenciamento em causa.
Não se provou a existência de alguma relação entre o donativo concedido e o
deferimento da licença de utilização.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- A propósito do 5º capítulo da pronúncia


Não se provou que a “Proeme”, antes da abertura do concurso limitado referido
nos autos, tenha fornecido bens e serviços à CMF, mantendo assim com esta um
relacionamento priviligiado.
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras, aproveitando esse
relacionamento, em finais do ano de 1996, tenha tido qualquer reunião com a
testemunha Renato Guerra, onde ficou acordada a elaboração de “um projecto global”,
nos moldes indicados na pronúncia.
Não se demonstrou que da informação técnica proferida pela comissão de
análise das propostas apresentadas pelas firmas “Proeme” e “Isto É” não resulte que a
proposta apresentada por aquela não seja a melhor pontuada.
Não se provou que a arguida Fátima Felgueira tenha agido com a intenção de
beneficiar a firma “Proeme” quando determinou a adjudicação à firma melhor pontuada.

- A propósito do 6º capítulo da pronúncia


Não se provou que tenha sido a testemunha Pimentel a tratar de toda a
publicidade mandada publicar pela CMF (demonstrou-se que ele, enquanto membro do
Gabinete de Imprensa da CMF, só tratava da publicidade dos eventos e não da
publicidade institucional).
Não se dmeonstrou que, em meados do ano de 1997, os arguidos Maria de
Fátima Felgueiras e António Pereira, resolveram beneficiar o Jornal “O Sovela”,
encaminhando para tal semanário a maioria das verbas que a CMF gastava em
publicidade, em detrimento e prejuízo dos restantes periódicos do concelho de
Felgueiras, no caso “O Semanário de Felgueiras” e o “Jornal da Lixa” (porém, também
não se demonstrou o contrário).
Não se demonstrou, consequentemente, que tal decisão tinha ainda como
objectivo o financiamento indirecto do jornal “O Sovela”, no sentido de o viabilizar,
atentas as dificuldades financeiras com que se debatia tal órgão de imprensa regional,
bem como o de fazer frente ao “Semanário de Felgueiras”.
Não se demonstrou que, devido às posições políticas assumidas no referido
“Semanário de Felgueiras”, a arguida Maria de Fátima Felgueiras entendia que aquele
periódico não devia, nem podia, beneficiar das verbas que a CMF gastava
periodicamente em publicidade nos jornais existentes no concelho de Felgueiras, pelo
que, e no seguimento de tal entendimento, ordenou verbalmente ao arguido António
Pereira que encaminhasse a grande maioria da publicidade da Câmara para o jornal “O
Sovela” e que tal publicidade fosse contratada com o “Semanário de Felgueiras” apenas
em casos muito excepcionais (em todo o caso, também não se demonstrou o contrário).
Não se provou que, por sua vez, o arguido António Pereira, depois de ter
recebido tal ordem e de ter concordado com ela, pô-la em execução, instruindo em
conformidade o Gabinete de Imprensa da autarquia, dirigido por António Pimentel (em
todo o caso, também não se demonstrou o inverso).
Não se provou que, em face da desporporção de verbas pagas aos vários jornais
locais por causa da publicação de publicidade da CMF, desproporção essa favorável ao
“Sovela”, os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e António Pereira, através das
condutas descritas, tenham conseguido canalizar a maioria dos montantes que a
autarquia que dirigiam gastava em publicidade para o semanário “O Sovela”,
beneficiando assim este periódico em detrimento dos outros dois existentes naquele
concelho.

87
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não de demonstrou que os arguidos Maria de Fátima Felgueiras e António


Pereira agiram de forma livre, voluntária e consciente querendo canalizar a maioria dos
montantes que a autarquia que dirigiam gastava em publicidade para o semanário “O
Sovela”, com o intuito de beneficiar este periódico em detrimento dos demais existentes
naquele concelho, usando e abusando para efeito dos poderes que como autarcas
detinham e exerciam, apesar de bem saberem que estavam a violar o princípio da
imparcialidade e isenção a que se encontravam obrigados legalmente, para além de
saberem que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Não se demonstrou, em todo o caso, a matéria de facto alegada pelo arguido
António Pereira Mesquita de Carvalho na sua contestação nos artigos 10º, 11º (parte
final), 15º, 19º, 46º, 47º (na parte em que se refere que a testemunha Pimentel
desobedeceu a instruções), 48º, 49º (no sentido de que a desconformidade entre as
instruções escritas e a publicação dos eventos em causa pela testemunha Pimentel se
tenha devido à razão alegada), 53º, 54º e 55º.
Não se provou ainda a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras na sua
contestação nos artgs 72º e 73º.

- A propósito do 7º capítulo da pronúncia


Não se provou que, aquando da venda da viatura “Citroën BX” referida nos
autos e da respectiva entrega à testemunha Fernando Sampaio, não se tenha retirado o
corpo do telemóvel “AEG” referenciado nos autos (em todo o caso, também não se
demonstrou o contrário).
Não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras tenha agido com qualquer
intenção apropriativa relativamente a tal equipamento.

- A propósito do 8º capítulo da pronúncia


Não se provou que a arguida Fátima Felgueiras tenha resolvido aproveitar a
deslocação em causa para gozar umas férias com os seus dois filhos, a expensas do
erário público, no caso da CMF.
Não se provou que, para conseguir que os serviços da autarquia de Felgueiras
pagassem as referidas passagens aéreas e despesas correlacionadas, não só a si, mas
também aos seus filhos, a arguida Maria de Fátima Felgueiras necessitasse que na
factura emitida ficasse apenas a constar a emissão de uma única passagem aérea, em seu
nome.
Não se demonstrou que, para tanto, a arguida Fátima tenha solicitado à
“Navitur” que na factura a emitir apenas fosse referida uma passagem aérea e não três.
Não se demonstrou que estivesse previsto, no programa inicial, que a arguida
Maria de Fátima Felgueiras iria permanecer na cidade de São Vicente durante os dias 10
a 18 de Agosto de 1997.
Não se provou que a arguida Maria de Fátima Felgueiras se tenha locupletado à
custa do erário público da quantia de Esc. 374.802$00 (Esc. 290.402$00 + Esc.
78.200$00 de passagens aéreas + Esc. 6.200$00 de transferes), referente às passagens
aéreas e transferes pagas pela CMF, para que os seus filhos a acompanhassem até Cabo
Verde.
Não se demonstrou ainda que a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de
forma livre, voluntária e consciente querendo apropriar-se para si e em benefício de
terceiros de dinheiro pertencente ao erário público, no caso à CMF, como efectivamente
se apropriou, usando e abusando para o efeito os poderes e as facilidades que o cargo

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

político que exercia lhe atribuíam, apesar de bem saber que tal conduta era proibida e
punida por lei.
Não se demonstrou por fim a matéria constante dos artgs 86º e 87º da
contestação apresentada pela arguida Fátima Felgueiras.

- A propósito do 9º capítulo da pronúncia


No que respeita à parte introdutória
Não se demonstrou que, para além e sem prejuízo da factualidade dada como
provada a propósito dos pontos 1 a 3 deste capítulo, a CMF, durante o período
compreendido entre os anos de 1997 e 2000, tenha suportado o pagamento de várias
despesas de viagens aéreas de familiares da arguida Fátima Felgueiras.
Não se demonstrou, para além e sem prejuízo da factualidade dada como
provada a propósito dos pontos 1 a 3 deste capítulo, que, sempre que algum dos filhos
da arguida Fátima necessitasse de viajar de avião, ela adquiria os respectivos bilhetes,
em seu nome, cedendo-os de seguida àqueles, apresentando posteriormente nos serviços
da autarquia o respectivo comprovativo, como se tais viagens tivessem sido efectuadas
por ela própria em serviço da autarquia, visando assim a mesma, através de tal esquema,
ser reembolsada do preço desembolsado com tais viagens de avião.

No que respeita ao ponto 1.


Não se provou que o pagamento efectuado pela AMVS à arguida Fátima, a título
de ajudas de custo, tenha sido anterior ao pagamento antecipado dessas mesmas ajudas
de custo por banda da CMF.
Não se provou que a arguida Fátima tenha sido alertada pelos serviços da CMF
para o facto de ter recebido ajudas de custo em duplicado.
Não se demonstrou que ela se tenha locuptado indevidamente de quantia
superior a 35.620$00, cerca de 30% do valor que antecipadamente recebera da CMF a
título de ajudas de custo.

No que respeita ao ponto 2.


Não se provou que, face à matéria de facto que a propósito se deu como
provada, a arguida Maria de Fátima Felgueiras se tenha locupletado à custa do erário
público do preço referente à viagem efectuada pelo seu filho João Felgueiras a França,
apesar de bem saber que tal conduta era proibida e punida por lei.

No que respeita ao ponto 3.


Não se provou que, tendo em conta que a arguida Fátima Felgueiras apenas
apresentou o bilhete de avião que lhe dizia respeito, tenha a nesma recebido
indevidamente o valor de Esc. 18.791$00, assim se locupletando nesse montante,
correspondente à viagem de avião utilizada pela sua filha, Sandra Felgueiras.
Não se provou ainda que a arguida Maria de Fátima Felgueiras agiu de forma
livre, voluntária e consciente querendo-se locupletar à custa do erário público, de forma
sistemática e continuada, de várias quantias a título de viagens de avião efectuadas pelos
seus filhos, como efectivamente se locupletou, tendo para o efeito a mesma apresentado
nos serviços da CMF os respectivos comprovativos como se tivesse sido a própria a
efectuar tais viagens, quando bem sabia que os mesmos não correspondiam à verdade e
que por tal motivo não tinha direito a receber os montantes gastos com tais viagens,
uma vez que as mesmas não foram prestadas no âmbito do serviço público, para além de
mais saber que tais condutas eram punidas e proibidas por lei.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se provou ainda a matéria alegada pela arguida Fátima no artº 95º da sua
contestação 2 .

- A propósito do 10º capítulo da pronúncia


No que respeita à introdução
Não se demonstrou que, para além da matéria dada como provada a propósito da
deslocação a Lisboa ao Congresso Nacional do PS, por diversas vezes, a arguida Maria
de Fátima Felgueiras tenha utilizado a viatura “BMW” referida nos autos, conduzida
pelo seu motorista, em deslocações que nada tinham a ver com o serviço do município,
nomeadamente de e para reuniões em Lisboa do Secretariado Nacional, da Comissão
Política e da Comissão Permanente do Partido Socialista.
Para além da matéria dada como provada a propósito da deslocação a Lisboa ao
Congresso Nacional do PS, não se demonstrou que tenha ocorrido qualquer outra
situação de uso da mencionada viatura para fins particulares da arguida Fátima ou de
terceiros.
No que respeita ao uso da viatura “BMW” referida nos autos
Não se provou que a viatura em causa fosse usada exclusivamente pela arguida
Fátima Felgueiras em deslocações de serviço.
Não se provou que a arguida tenha viajado nessa viatura para Lisboa, a fim de
participar no Congresso Nacional do PS.
Não se provou que o convite para o casamento de um dos filhos do Dr. Pais
Martins tivesse sido endereçado à arguida Fátima a título particular e que, assim, a
respectiva deslocação a esse evento social tivesse sido efectuada por ela a título
particular.
Não se demonstrou que ela tenha usado a viatura em causa para fins particulares
em qualquer outra situação (não se demonstrou pois, para além da situação referida, a
matéria genérica constante do intróito com que a pronúncia abre o seu ponto 10.1).
Em todo o caso, também não se provou a matéria alegada nos artgs 97º e 99º
(segunda parte) da contestação apresentada pela arguida Fátima Felgueiras.

No que respeita à utilização do GAPP


Não se provou que tenha sido a arguida Fátima a criar o GAPP.
Não se apurou, em concreto, qual o valor do papel e dos meios informáticos
utilizados nas tarefas referenciadas na matéria de facto dada como provada.
Não se provou a matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras no artº 100º da
sua contestação.

- A propósito do 11º capítulo da pronúncia


Não se provou que em que altura de 1989 a arguida Fátima teve conhecimento
do negócio celebrado entre as testemunhas Sousa Oliveira e Fortunato Sousa (provou-
se, em todo o caso, que ela teve esse conhecimento em 1989).
Não se provou que em 23.02.1997, a arguida Fátima tenha fixado a coima de
Esc. 1.000.000$00, a Fortunato Alves de Sousa, como representante legal da empresa

2
Note-se que o Tribunal se convenceu que à arguida Fátima lhe foram pagas as passagens aéreas que
adquiriu (referente a três viagens, uma Porto/Lisboa e duas Lisboa/Porto), sendo certo que apenas não foi
entregue na CMF, certamente por lapso, o comprovativo da aquisição da segunda passagem aérea
Lisboa/Porto. Em face deste nosso convencimento, naturalmente que não se demonstrou que a CMF, com
ou sem lapso, tenha liquidado a passagem aéra referente à viagem Porto/Lisboa de Sandra Felgueiras mas
antes a segunda viagem Lisboa/Porto adquirida pela arguida Fátima.

90
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

“F. Sousa & Filho, Lda.”, na sequência da instauração do Processo de Contra-


ordenação, por terem sido executadas obras do loteamento e de urbanização sem o
correspondente alvará de licenciamento;
Não se provou que em 08.03.1997 ela despachou no sentido de ser alterada
aquela coima, no valor de Esc. 1.000.000$00, para admoestação, sem que existisse
qualquer justificação para o efeito;

- A propósito do PIC deduzido


Não se provou qualquer outro facto para além dos que se deram como provados
a propósito da matéria constante da pronúncia, designadamente, que o município de
Felgueiras tenha ficado lesado nas quantias referidas nos artgs 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º
(provou-se que a arguida Fátima locuptou-se indevidamente na quantia de 35.625$00),
11º, 13º e 14º, do PIC deduzido 3 .

- A popósito das condições sócio-económicas dos arguidos e respectivos


percursos de vida
Não se demonstrou qualquer outra matéria para além da que se deu como
provada (a qual aliás, na essência, traduz, ainda que por outras palavras, a quase
totalidade do que a propósito foi alegado por alguns arguidos nas respectivas
contestações).

c) - A CONVICÇÃO DO TRIBUNAL:
O tribunal alcançou a sua convição ponderando de forma conjugada os
depoimentos dos arguidos que quiseram depôr, os testemunhos produzidos e os
documentos analizados na audiência de julgamento da forma que a seguir se explicitará.
Por outro lado, dado o elevado número de intervenientes (acidentais e não
acidentais) que prestaram declarações e a evidente complexidade dos autos, optou-se
por reproduzir por súmula 4 as respectivas declarações (possibilitando assim que melhor
se possa escrutinar a forma como o Tribunal as filtrou) e, quando se justifique, procurar-
se-á relacionar os respectivos depoimentos com os documentos pertinentes constantes
dos autos.
Assim:

- A convicção do Tribunal a propósito do 1º capítulo da pronúncia

Introdução

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu ter sido eleita pelo PS nas eleições locais de Dezembro de 1989, numa
altura em que não era militante do partido, assumindo a função de vereadora na CMF
entre Janeiro de 1990 e Outubro de 1995, com o pelouro da educação, cultura, acção
3
A factualidade alegada nos args 10º e 15º do PIC não foi objecto de apreciação na medida em que o
arguido Barbieri não foi pronúnciado pela prática do alegado crime de peculato que lhe está na base
(emerge aliás dos autos que ele devolveu a totalidade da quantia que recebera da CMF a título de
antecipação de ajudas de custo, no montante de 118.750$00).
4
Tratando-se de uma reprodução por súmula, não se trata, como é bom de ver, de uma reprodução ipsis
verbis de tudo quanto foi dito, pelo que o resumo dos depoimentos prestados pressupôs por parte do
Tribunal uma actividade interpretativa de todas as declarações prestadas.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

social, desporto e habitação. Nessa altura era presidente da autarquia o arguido Júlio
Faria, até ter sido eleito deputado na Assembleia da República nas eleições legislativas
ocorridas em 1995.
Salientou que apenas em Julho de 1995 teve conhecimento de que o arguido
Júlio Faria tinha a intenção de se candidatar a um lugar de deputado na Assembleia da
República, integrando a lista do PS, sendo certo que as listas dos candidatos não são
divulgadas antecipadamente e, devido a movimentações internas no partido, são
formuladas e reformuladas até à última hora antes de serem apresentadas, de sorte que
ignorava se ele iria ocupar na lista um lugar elegível. Em todo o caso, não era
expectável que Felgueiras tivesse um candidato elegível nas listas do PS, elaboradas
pela Federação Distrital do Porto do partido
Nega que perspectivasse suceder ao arguido Júlio Faria à frente dos destinos da
CMF (não obstante na altura ser vice-presidente da CMF), dando conta da grande
oposição interna a esse facto, no seio do PS de Felgueiras, oposição essa que se
verificou quer quando integrou as listas do PS de Felgueiras em lugar elegível nas
eleições autárquicas de Dezembro de 1989, quer quando assumiu o comando dos
destinos da autarquia a partir de Outubro de 1995 (parece que terá sido apartir de
Agosto de 1995, visto que o arguido Júlio Faria suspendeu o seu mandato nessa altura)
e ainda quando se apresentou como canditada a presidente da CMF nas listas do PS nas
eleições autárquicas de 14 de Dezembro de 1997.
Nega terminantemente ter engendrado qualquer esquema de angariação de
fundos com vista às eleições autárquicas de 1997, descrevendo a forma como são
organizadas as campanhas eleitorais, com a nomeação de comissões encarregues de
levar a cabo as diferentes actividades necessárias ao decurso da campanha eleitoral,
entre as quais a recolha de fundos, dando conta que, como cabeça de lista do PS local,
apenas lhe cabia dirigir a campanha eleitoral em termos de orientação política,
alheando-se de todo em todo da recolha de fundos, que cabia aos arguidos Horácio
Costa e Joaquim Freitas, razão aliás pela qual foi aberta em nome deles a conta do BES
referida nos autos e sobre a qual não tinha qualquer poder de disposição, ignorando de
todo em todo os respectivos movimentos, bem como quem oferecia os donativos e em
que montante.
De resto, salientou ser normal em todas as eleições locais e em todos os partidos
a abertura de uma conta paralela, isto é, uma conta “não oficial” do partido (ignorando
em todo o caso se tal foi feito nas eleições autáquicas de 1993).
Nega terminantemente alguma vez ter reúnido com os arguidos Júlio Faria,
Vítor Borges e Carlos Marinho, estes na altura pertencentes aos quadros da “Resin”,
com os objectivos descritos na pronuncia e que alguma vez os valores das empreitadas
adjudicadas tenham sido sobreavaliados com o desiderato ali referido.
De resto, referiu ter conhecido o arguido Vítor Borges em Outubro de 1995 e o
arguido Carlos Marinho apenas no ano passado no T.J. de Guimarães, aquando da
realização do debate instrutório a que se reportam estes autos.
Nega terminantemente alguma vez ter controlado ou instrumentalizado os
órgãos decisórios da CMF (aliás compostos também por elementos da oposição,
designadamente no executivo, onde três veradores foram eleitos por listas de outros
partidos que não do PS) ou a AMVS.
Referiu que a “Resin”, à data, era das únicas empresas a operar em Portugal que
tinha os conhecimentos necessários para o tratamento dos lixos domésticos e industriais,
sendo certo que essa empresa – conforme é aliás habitual – se consorciou com outras
empresas a fim de concorrer aos concursos abertos e relativos à construção de aterros e

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

tratamento dos lixos, assim ultrapassando o facto de não ter alvará de construção civil e
obras públicas.
Revelou desconhecer os fluxos financeiros existentes entre as empresas ali
referidas, admitindo como verídica essa matéria, justificando a transferência de verbas
para a “Resin” pelo facto de sempre ter sido ela quem tratou os lixos no concelho, na
lixeira de Sendim, ainda que sem qualquer contratualização em alguns períodos, e das
relações de consórcio estabelecidas entre umas e outras.
Nega a existência de concursos simulados (mas não deu uma explicação
satisfatória para o facto da “Resin” ter enviado uma lista das empresas a contactar a fim
de serem oponentes, conforme referido na pronúncia).

- Arguido Júlio Faria


Referiu que suspendeu o seu mandato como presidente da autarquia
Felgueirense a 03.08.95, data que coincidiu com a última reunião camarária a que
presidiu.
Na sequência da sua eleição como deputado na Assembleia da República, nas
eleições legislativas ocorridas em Outubro de 1995, renunciou ao mandato de presidente
da CMF.
Esclarece que em finais de Junho ou princípios de Julho de 1995 a Federação
Distrital do PS havia elaborado a lista de candidatos e o depoente foi colocado em 14º
lugar dessa lista, portanto em lugar elegível.
Acrescentou que foi contactado nessa altura para integrar a dita lista,
manifestando disponibilidade para tal pelo facto de já ser presidente da CMF há cerca
de 10 anos (foi presidente da CMF entre 1986 e 1995; antes disso foi vereador).
Foi só nessa altura que comunicou esse facto à arguida Fátima Felgueiras, sendo
certo que entendia que ela tinha condições para se candidatar à presidência da CMF nas
eleições de Dezembro de 1997.
A propósito da campanha eleitoral para as eleições autárquicas de 14.12.97,
referiu que a Comissão Política do PS de Felgueiras convocou os militantes e
simpatizantes para se organizar a respectiva campanha, com a organização dos
diferentes “pelouros”, entre os quais o das finanças, responsável pela recolha de fundos
(a primeira reunião ocorreu a 09.07.97, conforme “acta” junta aos autos no decurso da
audiência de julgamento).
Esse “pelouro das finanças” foi integrado pelos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas, bem como pelo Sr. Dinis. Mais tarde outras pessoas diligenciaram
também pela recolha de fundos para a campanha eleitoral.
A angariação de fundos decorreu conforme era habitual, isto é:
- Procedia-se à obtenção de fundos junto das pessoas que pudessem apoiar
financeiramente a campanha eleitoral do PS;
- Procedeu-se à abertura de uma conta bancária com vista ao depósito dos
donativos recolhidos (normalmente titulada por elementos do “pelouro das finanças”),
sendo certo que na conta oficial do partido praticamente apenas se depositavam as
quotas dos militantes e as verbas destinadas à gestão corrente do PS. Justificou assim a
não utilização dessa conta oficial do partido para o depósito dos donativos para a
campanha eleitoral, até porque nesta participavam elementos que não eram militantes do
PS.
Referiu que não lhe foi dado conhecimento da abertura da conta do BES, titulada
pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, sendo certo que nunca teve
conhecimento das respectivas movimentações nem poder de facto para dispor do
dinheiro depositado em tal conta, tanto mais que em 1997 estava já afastado da

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2º Juízo

intervenção política em Felgueiras (não obstante, era membro da Comissão Política do


PS de Felgueiras desde 1978).
Aliás, referiu que, enquanto candidato à presidência da CMF em anteriores
eleições, nunca se ocupou da angariação de fundos, sendo certo que acerca disso
nenhuma informação era prestada à direcção de campanha, mais ocupada em iniciativas
de cariz político.
Na campanha de 1993 referiu que o Dr. Sousa Oliveira (ex-marido da arguida
Fátima Felgueiras) era candidato à Assembleia Municipal, não se recordando se
integrou ou não o “pelouro das finanças”.
Na campanha eleitoral de 1997 também a questão da angariação de fundos não
foi abordada ao nível da direcção de campanha, sendo certo que só viu o Horácio Costa
na 1ª reunião da Comissão Política (antes já o conhecia, por ser assessor da CMF – com
funções que em concreto desconhece –, mas não tinha com ele grande relacionamento).
De resto, o depoente integrava a “comissão coordenadora”, que se ocupava
apenas da coordenação das acções de campanha (e onde se abordava a estratégia a
seguir), e fê-lo dada a sua experiência eleitoral e porque era membro da Comissão
Política do PS de Felgueiras desde 1978.
Referiu não se recordar porque razão foram escolhidos os arguidos Horácio
Costa e Joaquim Freitas para integrar o “pelouro das Finanças” (embora parta do
pressuposto de que não mereciam quaisquer reservas da presidente da Comissão Política
do PS de Felgueiras, a arguida Fátima Felgueiras), não confirmando que alguma vez os
mesmos se tivessem reunido em sua casa para debaterem a composição desse pelouro (o
Joaquim Freitas, em todo o caso, esteve várias vezes em sua casa e o Horácio Costa –
que se lembre - esteve uma vez em sua casa, acompanhado do arguido Bragança, por
motivo de assuntos particulares e que nada tiveram a ver com a campanha eleitoral).
Seja como for, reconheceu que o manuscrito de fls 156 do 1º volume é da sua
lavra (alusivo ao “pelouro das finanças”), expressando não se recordar onde o elaborou
nem onde o entregou aos arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa, sendo certo que tal
documento terá sido elaborado aquando das primeiras reuniões da Comissão Política.
Salientou o facto de suspeitar que tal documento não está completo, sendo certo
que é uma mera súmula de uma das reuniões quanto às necessidades a que o dito
“pelouro das finanças” deveria dar resposta.
A expressão “se assim for entendido dar conhecimento à candidata” mais não
significa do que, se assim for entendido, deveria dar-se conhecimento à arguida Fátima
Felgueiras das contribuições mais significativas.
Salientou nunca ter dado ordens aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
para o pagamento de algumas contas, já que não eram seus subordinados, pois quando
muito chamava a atenção para o seu pagamento, de que o manuscrito de fls 171, do 1º
volume, é, na sua óptica, exemplo (não se recorda a quem deixou esse “post-it”, mas
terá sido a um dos elementos do “pelouro das finanças”).
Expressou desconhecer as relações estabelecidas entre a “Resin” e outras
empresas, designadamente as referidas na pronúncia.
Na altura da campanha eleitoral referida já conhecia o arguido Vítor Borges
(mas não conhecia o arguido Carlos Marinho), pois conheceu-o no 1º semestre de 1993
aquando de uma apresentação efectuada pela “Resin” enquanto empresa especializada
no tratamento do lixo, num encontro com autarcas da AMVS num hotel em Lousada.
A “Resin” era então a única empresa com conhecimento e capacidade para tratar
do lixo.

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2º Juízo

Explicou que na altura a recolha do lixo era um problema grave em Felgueiras,


sem qualquer tratamento, visto que era depositado sem mais na lixeira de Sendim, onde
ocorriam frequentes incêncios por força da combustão desses lixos assim depositados.
Recorda-se que em 1982 – era o depoente vereador – os lixos eram depositados
em Pombeiro, o que motivou fortes protestos da população, razão pela qual os lixos
passaram a ser depositados por favor em Sendim, entre 1982 e 1986, em terrenos
pertencentes ao Eng. Menezes Basto.
Salientou que em virtude da forte pressão do dono do terreno onde estava
implantada a lixeira no sentido da CMF pôr termo à deposição do lixo naquele local
(ameaçando mesmo impedir a deposição do lixo naquele local) e dado o facto de
inexistir local alternativo (em 1992 havia-se vedado e efectuado algumas obras num
terreno em Barrosas, mas a deposição do lixo nesse local não foi avante em face dos
protestos populares), em finais de Agosto de 1993 contactou a “Resin”, na pessoa do
arguido Vítor Borges, tendo então decorrido conversações entre este, o depoente e o
Eng. Menezes Basto, de que resultou a concessão por este de uma moratória na
deposição do lixo no seu terreno em Sendim.

- Arguido Vítor Borges


Esclareceu que a “Resin” constituiu-se em Fevereiro de 1989, tendo obtido um
acordo com uma empresa francesa com “know how” na área da recolha, transporte e
tratamento do lixo, pagando-lhe por isso uma verba.
Tal empresa (France Déchets) acabou por deter 45% do capital social da
“Resin”, na altura uma sociedade por quotas.
Referiu que o primeiro contacto que a “Resin” teve com o Vale do Sousa
ocorreu em inícios de 1993 numa reunião com a AMVS destinada a apresentar aquela
empresa, na altura pioneira na prestação de serviços na recolha, transporte e tratamento
de lixos.
Os presentes ficaram agradados com tal apresentação, tendo sido nessa mesma
reunião que conheceu o arguido Júlio Faria (só em 1995 viria a conhecer a arguida
Fátima Felgueiras).
Nessa reunião deu conta aos autarcas da possibilidade de candidatura a fundos
comunitários para financiar projectos na sua área de intervenção, tendo então ficado a
aguardar contactos.
Sucede que em Julho ou Agosto de 1993, estando o arguido de férias no Algarve
(acha que é mais provável ter sido em Agosto pois é nesse mês que normalmente passa
férias), recebeu um telefonema de Felgueiras, tendo-lhe sido dado conta que o
presidente da autarquia tinha urgência em falar consigo.
A situação assumia foros de urgência, pois o arguido Júlio Faria encontrava-se
em pânico ante a eminência do fecho da lixeira de Sendim e a falta de alternativas para
a deposição dos lixos (segundo lhe transmitiu, o proprietário do terreno – a testemunha
Menezes Basto – iria impedir a deposição do lixo no seu terreno em Sendim a partir da
Segunda-feira próxima).
Acedeu então em deslocar-se do Algarve a Felgueiras para falar com a
testemunha Menezes Basto.
Explicou que na altura a “Resin” tinha necessidade de construir em Portugal,
ainda que a custos de produção, um protótipo do tipo de obra que poderia realizar de
modo a poder mostrar o trabalho desenvolvido a potenciais clientes.
Uma vez chegado a Felgueiras, reuniu-se de imediato com o arguido Júlio Faria,
o qual o colocou em pormenor a par da situação (basicamente nos termos descritos por

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2º Juízo

este arguido), informando-o que a testemunha Menezes Basto não queria receber sequer
o dito Júlio Faria.
Foi então a Sendim falar com o dito Eng. Menezes Basto e apresentou-se,
dizendo-lhe que vinha da parte do arguido Júlio Faria. Em face dessa apresentação foi
muito mal recebido, mas conseguiu encetar com ele uma conversa que durou cerca de 2
horas e garantiu-lhe que resolvia o problema da lixeira de Sendim do seguinte modo:
- Em 6 meses faria uma reabilitação visual do local, por forma a fazer cessar os
cheiros e insectos no local provocados pela lixeira;
- Taparia os lixos depositados (de modo a evitar a respectiva combustão).
Por imposição da testemunha Menezes Basto teve de convencer também a
respectiva esposa, o que aliás conseguiu.
Ficou então acordado que a “Resin” poderia avançar com a reabilitação do local.
Teve então com o Eng. Menezes Basto várias outras reuniões, sendo certo que
ele só aceitava o depoente como interlocutor.
Avisou porém o depoente que nada lhe iria pagar pois entendia que era a CMF
que deveria pagar a reabilitação.
Numa reunião em que estiveram presentes o depoente, o arguido Júlio Faria e a
testemunha Menezes Basto, foi apresentado o estudo da reabilitação da lixeira de
Sendim e o respectivo custo (cerca 34.0000 cts.), segundo orçamento fornecido pela
“France Déchets” em Setembro de 1993.
Sucede que devido ao facto de não ser da propriedade da CMF o terreno onde tal
lixeira estava implantada existiam constrangimentos administrativos que impediam a
edilidade de directamente pagar à “Resin” os serviços a prestar.
Uma das hipóteses colocadas seria o pagamento de uma renda superior pela
CMF ao Eng. Menezes Basto, parte da qual reverteria para a “Resin”.
Porém, convenceu a testemunha Menezes Basto a vender o terreno à CMF pois
alertou-o de que, por força de legislação comunitária que iria ser aprovada, os
proprietários dos terrenos onde estivessem implantadas lixeiras iriam ser
responsabilizados pela alteração da qualidade ambiental, o que certamente lhe traria
custos avultados.
Por essa razão ele desistiu de renegociar os termos do contrato de arrendamento
com a CMF e decidiu-se a vender o terreno referido.
Antes da decisão de avançar com os trabalhos quis mostrar ao Eng. Menezes
Basto um aterro sanitário em França, aproveitando o facto dele ir de férias com a família
para França. Consequentemente, tal aterro sanitário foi-lhe mostrado por um
responsável da “France Déchets” e ele ficou fascinado com o que viu.
Entretanto, a recuperação interna da lixeira ficaria a aguardar a concessão de
fundos comunitários, sendo certo que se passaram meses em negociações entre o Eng.
Menezes e a CMF.
Entre fins de 1993 e princípios de 1994 (algures entre Novembro de 1993 e
Janeiro de 1994) iniciaram-se os trabalhos na lixeira de Sendim (vindo de França uma
máquina de compactação a 10.12.93 – que no mercado custava cerca de 35.000 cts -,
com os respectivos técnicos - cfr. documento junto na audiência de julgamento).
Confrontado com o documento em causa, adiantou que os trabalhos nunca se iniciariam
antes da data da vinda da referida máquina de compactação de França para Portugal
(razão pela qual os trabalhos ter-se-iam iniciado em Dezembro de 1993 e durante um
período de 6 meses, isto é, até Maio de 1994).
Assegurou que a “Resin” não retirou qualquer lucro da operação de reabilitação
em causa, visto que pagou 24.500 cts aos franceses e colocou no local dois seguranças,
um porteiro e um encarregado, além de que teve de pagar o transporte de terra.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente assegurou não ter tido qualquer participação na realização do


contrato de transacção e respectivo aditamento.
O Eng. Menezes Basto apenas lhe disse que o pagamento dos 34.000 cts estaria
assegurado e que, na sequência da conversa que teve com ele, iria vender o terreno à
CMF “por vinte e tal mil contos”.
Os pagamentos efectuados pelo Eng. Menezes de Basto foram efectuados em
prestações (não pôs em causa que os pagamentos tenham sido efectuados conforme
descrito na pronúncia), negando terminantemente a existência de qualquer retorno ou
sequer qualquer pagamento da “Resin” em numerário nos termos descritos no
mencionado despacho.
Admite que possa ter pressionado a CMF a pagar ao dito Eng. Menezes Basto
para assim obter também o respectivo pagamento, mas assegurou não se recordar desse
facto.
Tem a ideia de que os pagamentos só aconteceram depois de terminada a
reabilitação visual da lixeira.
O arguido Carlos Marinho, por seu turno, segundo se lembra, foi contratado para
trabalhar na “Resin” em 1990 ou 1991 (cfr. em todo o caso o respectivo contrato de
trabalho, junto com a sua contestação). Posteriormente o arguido Vítor Borges corrigiu
as suas declarações, afirmando então que o arguido Carlos Marinho foi admitido ao
serviço da “Resin” apenas em 1993, com responsabilidade na área da contabilidade da
empresa e passando a ser o respectivo director financeiro quando a “ECOP” vendeu as
suas acções da “Resin” (onde chegou a deter 20% do capital).
A propósito da “Translousada” e da “Norlabor” (que têm sócios comuns) referiu
que a “Resin” procurou empresas locais para lhe prestarem serviços de subempreitada
nos aterros pois os custos seriam menores. A “Resin” não procedia a trabalhos de
empreitada (limitava-se praticamente a empregar o seu “know how” e a dirigir os
trabalhos), subempreitando a empresas locais a execução das empreitadas, por
representar menores custos, e não por não dispor de alvará para o efeito (pois poderia
usar o alvará da sua accionista).
Confirmou a celebração do contrato de consórcio com a “Translousada” (cfr.
doc. de fls 145 do apenso 97) pelas seguintes razões:
1ª - Havia a necessidade de ter um consorciado com alvará (não faria sentido
utilizar o alvará da sua accionista “Sita” dada a dimensão pouco relevante da obra para
esta empresa; se usasse esse alvará teria desnecessariamente custos acrescidos pois teria
de lhes pagar);
2ª - Era um “cartão de visita” para a “Translousada” (com reflexos favoráveis
para a imagem desta empresa junto de potenciais clientes).
Por outro lado, a única irregularidade que se verificou nos trabalhos executados
para a AMVS foi o facto de inexistir base administrativa legal para que a autarquia
pudesse pagar à “Resin”.
De facto, quando a “Resin” terminou o trabalho de reabilitação da lixeira de
Sendim, andaram um a dois anos sem que fosse concretizado o pagamento da
exploração dessa lixeira por não haver suporte legal.
Recorda-se de ter pressionado a CMF a pagar os trabalhos referentes à
exploração do aterro e de facturar directamente à CMF. Porém, no final do ano, foi
chamado à CMF e explicaram-lhe que rejeitavam essas facturas pois não havia base
legal para as pagar. Foi por isso que fizeram o concurso a que se reporta o ponto 1.3. da
pronúncia.
Fez-se pois o concurso referido no ponto 1.3. da pronúncia, sendo certo que o
arguido Barbieri remeteu-lhe um fax a pedir que informasse de empresas que poderiam

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

ser convidadas a apresentar propostas por estarem habilitadas a executar os trabalhos


pretendidos, o que fez (o original de tal documento de resto encontra-se no dossier
respeitante ao processo administrativo desse concurso limitado, conforme se verificou
na audiência de julgamento).
Ora, o legal representante da “Translousada” disse-lhe para indicar as firmas
“Craveira” e “João Tello”, o que fez no referido fax.
De resto, com o arguido Barbieri Cardoso apenas teve contactos de índole
técnica e que se prendiam com o andamento dos trabalhos.
Explicou ainda que pelo facto da “Translousada” e da “Norlabor” ter sócios
comuns, confunde as duas firmas, sendo certo que esta última quase sempre trabalhou
na realbilitação da lixeira e trabalhou sempre na respectiva exploração. Recebeu aliás
dela reclamações pelos atrasos no pagamento dos serviços que prestou para a “Resin”,
atrasos esses que chegaram ao montante de 30.000 cts, o que tinha grande relevância
para ela dada a sua pequena dimensão.

- Arguido Carlos Marinho


Salientou que só começou a trabalhar na “Resin” a 15.09.93, data em que
assinou o respectivo contrato de trabalho (conforme documento constante de fls 7031
do volume 27-A). Ocupou-se então da área contabilistica e fiscal da empresa. A parte
financeira da empresa era então assumida pelo Sr. Florentino Borges, entretanto
falecido.
Cabia-lhe assim tratar contabilisticamente os documentos (como por ex.
facturas, recibos, notas de débito, notas de crédito), elaborar balancetes mensais, fazer
análises à rentabilidade da empresa, processar os salários (tarefa que mais tarde foi
atribuída a uma pessoa contratada para o efeito).
Salientou que não participava em actos de gestão da empresa.
Apenas tomou conhecimento da existência das empresas “ECOP” e “SITA”
porquanto entraram para o capital social da “Resin”, altura em que a “Resin” passou a
ter um novo director financeiro (Luciano Barreira, provindo dos quadros da “ECOP”).
Travou conhecimento com as empresas “Translousada” e “Norlabor” devido às
relações comerciais que estabeleceram com a “Resin”.
De facto, a “Translousada”, que fazia terraplanagens, trabalhou para a “Resin”
na lixeira de Sendim desde o início dos trabalhos de reabilitação (Dezembro de 1993)
até pelo menos ao início da exploração do aterro. Tal empresa também alugou
equipamento à “Resin”, equipamento esse que operava em Sendim.
A “Norlabor” encetou relações comerciais com a “Resin” depois de 1993, visto
que efectuou serviço idêntico na lixeira da Lustosa, tendo igualmente alugado
equipamento à “Resin” nos trabalhos executados na Lustosa.
A “Craveira” nada lhe diz.
Da “Translousada” conhecia o Sr. Carlos Silva e o Dr. Carlos Sousa.
Na altura não lhe foi dado a conhecer a celebração do contrato de consórcio
entre a “Resin” e a “Norlabor” referido nos autos, desconhecendo igualmente em que
circunstâncias foi celebrado tal contrato. Aliás, só dele teve conhecimento já no decurso
do presente processo.
À epoca não sabia que o Dr. Carlos Sousa era sócio comum da “Translousada” e
da “Norlabor”.
Nega a existência do esquema referido na pronúncia no que a si concerne.

- Arguido Barbieri Cardoso

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2º Juízo

Começou por referir que foi admitido ao serviço da CMF em Setembro de 1980
como chefe dos Serviços Técnicos de Obras.
Em 22.05.85 foi nomeado director do Departamento Técnico.
Como director do Departamento Técnico cabia-lhe dirigir a actividade do
respectivo departamento, respondendo directamente perante o executivo municipal.
Explicou que os chefes de divisão têm uma função mais operativa e que respondem
perante o respectivo chefe de departamento.
Participa em reuniões de coordenação (onde participa a presidente da edilidade,
os vereadores, os directores de departamento e eventualmente os chefes de divisão). Por
norma as decisões de lançamento dos concursos de obras são tomadas nas reuniões de
coordenação.
Salientou os deveres de lealdade, sigilo e obediência a que está sugeito enquanto
funcionário camarário perante o respectivo executivo.
Em traços gerais, explicou a estrutura organizativa da CMF (cfr. a fls 28 a 37 do
apenso 137 a estrutura organizativa da CMF).
Em 19.05.2000 foi nomeado director do Departamento de Planeamento (cfr. fls
67 e ss. do apenso 137).
Além disso era coordenador técnico da ADERSOUSA, daí ter travado
conhecimento com os presidentes de câmara do Vale do Sousa (aliás, antes de tomar
certas decisões a AMVS ouvia-o).
Para além dessas funções, é sócio da “Ambiedica, Ldª” (uma empresa que
desenvolve a sua actividade na área imobiliária) e “Ambienta, Ldª” (sociedade que
elabora projectos de construção civil), assegurando que nunca teve funções executivas
nesta última, sendo certo que há já cerca de 3 anos que nela não exerce qualquer função,
tendo inclusive decidido deixá-la, o que ainda não se concretizou.
Explicou que o Eng. Adelino Leite era o responsável pela área de infra-
estruturas de ambiente (águas, saneamento e recolha de resíduos), sendo certo que como
era engenheiro electrotécnico e de máquinas não tinha qualificação técnica para apreciar
as propostas apresentadas em concursos de obras de construção civil.
Em face das funções que exercia era ele quem sempre teve mais intervenção nas
relações com a “Resin” e que justificou a emissão das respectivas facturas.
Quanto à problemática da recolha dos resíduos sólidos urbanos no concelho
felgueirense, descreveu a lixeira de Sendim como um “inferno”, em que os resíduos
entravam em auto-combustão e exalavam um cheiro nauseabundo, tendo-se chegado a
esse ponto dado o contínuo e crescente aumento da recolha de resíduos, em face do
crescimento enconómico e da alteração dos hábitos de consumo, que determinou aliás
também a alteração da natureza dos lixos produzidos (em 1981 recolhiam-se
semanalmente 27 toneladas; em 1985 65,5 toneladas semanais; em 1989 105 toneladas
por semana; em 1991 150 toneladas semanais; e em 1992 43,5 toneladas por dia, dos
quais 54% eram resíduos sólidos urbanos e 46% resíduos industriais banais – tratam-se
de valores estatísticos em função de amostragens efectuadas, visto que não havia na
altura báscula para pesar os camiões. Só a partir de Abril de 1996 é que esse
equipamento se encontrava a operar na lixeira).
Explicou que integrou a Comissão de Análise quer no que se refere ao concurso
a que se reporta o ponto 1.3 da pronúncia quer no ajuste directo a que se reporta o ponto
1.4 da mesma peça processual em face das funções que exercia na CMF, sendo certo
que a análise das propostas foi relativamente simples e teve a ver essencialmente com os
preços apresentados.
Por outro lado, nos concursos da AMVS era hábito nomear-se para a Comissão
de Análise um técnico do município onde a obra iria ser implantada, já que a dita

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2º Juízo

associação não dispunha de técnicos próprios para o efeito. Foi pois nesse contexto que
também integrou a Comissão de Análise nos concursos a que se reporta o ponto 1.5,
sendo certo que o depoente era já um elemento conhecido devido às funções que
também desempenhava na ADERSOUSA.
Nega terminantemente que alguma vez tenha sido influenciado directa ou
indirectamente nas apreciações que fez das diversas propostas apresentadas.
A propósito do tratamento dos resíduos (produção do lixo – recolha –
eliminação/reciclagem), referiu que teve várias reuniões com a Direcção Regional e
com o Ministério do Ambiente desde 1995.
Nas lixeiras o tratamento dos resíduos reconduz-se ao fim ao cabo à
compactagem do lixo e à sua movimentação de modo a criar plataformas, bem como à
cobertura com terra por forma a melhor permitir a decomposição dos resíduos
orgânicos.
Tratam-se pois de vasadouros controlados.
É este tipo de trabalhos que estavam em causa no concurso a que se reporta o
ponto 1.3 da pronúncia e no ajuste directo a que se alude no ponto 1.4 da mesma peça
processual.
Havia a expectativa de prolongar o tempo de vida útil da lixeira e obviar ao
perigo de desmonoramento com a criação de plataformas, sendo certo que 1 tonelada de
lixo representa 2 m3 de lixo doméstico e 3 m3 de resíduos industriais banais.
Em 02.07.99 na lixeira de Sendim deixou de haver depósito de lixo doméstico e
só em meados de 2001 é que também se deixou de depositar os resíduos industriais
banais, altura em que começaram a ser depositados no aterro RIB quando este ficou
totalmente concluído.
Explicou que a propósito da concepção/construção (selagem da lixeira e
construção do aterro)/exploração a “Resin” apresentou a melhor solução técnica, pois
previa o enfardamento dos resíduos e assim uma melhor compactagem, além de uma
mesa de triagem dos resíduos, assim dininuindo o espaço utilizado e,
consequentemente, prolongando o tempo de vida útil do aterro.
Assim, no concurso internacional a que se faz alusão no ponto 1.5, confirmou
que abertura de propostas teve lugar a 18.07.97, a 28.11.97 efectuou-se a adjudicação, a
23.01.98 celebrou-se o contrato de empreitada e a 08.05.98 efectuou-se a consignação,
tendo sido concluída a obra em Dezembro de 2000 e iniciada a sua utilização em Julho
de 2001 (a deposição dos resíduos industriais banais na lixeira fazia também parte do
concurso enquanto ela não fosse selada).
A escolha da localização do aterro prendeu-se com questões técnicas, pois era
adequado do ponto de vista geotécnico, além de que no local já existia a lixeira de
Sendim e que era necessário selar, possibilitando o respectivo controle da qualidade
ambiental com menores custos.
Recorda-se que a escolha daquela localização para o aterro provocou protestos
(segundo a arguida Fátima Felgueiras não era expectável que essa localização criasse
resistência pois já ali existia a lixeira; porém, esses protestos ocorreram e foram
fomentados pela oposição ao executivo camarário, tendo sido criada uma associação
que intrepôs 3 providências cautelares para impedir a construção do aterro naquele
local).
- Arguido Horácio Costa
Segundo referiu, iniciou funções na CMF em Outubro de 1996.
Explicou que tinha sido aluno da arguida Fátima Felgueiras quando esta
leccionava na Escola Secundária de Felgueiras.

100
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Chegou a ganhar um prémio por ser o melhor aluno, que recebeu na CMF, sendo
certo que a arguida Fátima Felgueiras estava presente.
Foi também aluno do ex-marido da arguida Fátima Felgueiras.
Certo dia deslocou-se à CMF a propósito de um investimento de uma empresa
do seu sogro no concelho (na altura o depoente dava aulas e trabalhava a tempo parcial
para o sogro) e por acaso encontrou-se com a arguida Fátima Felgueiras, a qual, tendo-o
reconhecido, entabularam conversa, na sequência da qual ela perguntou-lhe se não
queria exercer funções na CMF.
Ela queixava-se que estava sozinha (dos 3 vereadores do PS só um exercia
funções efectivas) e que “precisava de sangue novo”.
Propôs-lhe então a celebração de um contrato de prestação de serviços,
exercendo assim funções de assessor.
O seu cunhado Bragança da Cunha (também arguido neste julgamento) fez a
ponte entre os dois. Salientou porém que não foi por intermédio dele que ingressou na
CMF, tanto mais que a arguida Fátima Felgueiras não nutria apreço pelo seu cunhado,
razão pela qual não lhe iria fazer favores.
Assim, a 01.10.96 iniciou funções como assessor da Presidente da CMF (até
Dezembro de 1998), por 290 cts mensais, tendo como tarefa tratar dos assuntos
relacionados com o Centro Coordenador de Transportes (mais tarde redenominado de
Centro de Camionagem) e tinha de estar disponível para o que fosse necessário para
auxiliar a arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que só dela recebia ordens, razão pela
qual aliás ela lhe delegou competências.
Tinha a obrigação de apresentar um relatório mensal da execução das tarefas de
que era incumbido.
Consequentemente, na prática, exercia funções mais vastas que aquelas que
constavam do objecto do contrato que celebrou com a CMF.
Assim, para além do Centro Coordenador de Transportes, teve intervenção no
conjunto habitacional da Longra (no arrendamento de apartamentos e na venda de lojas
e garagens); na venda de lotes de um terreno na Lixa para construção em altura (onde se
procedeu à limpeza do espaço e à formalização do loteamento); à venda de lotes
camarários dispersos por todo o concelho; teve intervenção na reabilitação do
Cineteatro Fonseca Moreira e da “Casa do Curral” (edifício adquirido pela CMP após
muitas negociações com o respectivo proprietário e onde viria a ser instalado um pólo
do Instituto Superior Politécnico do Porto); na zona das “Portas da Cidade” encetou
diligências junto dos proprietários de terrenos nessa zona com vista à respectiva
aquisição por banda da CMF; teve intervenção nas negociações que conduziram à
demolição de um edifício numa das entradas da cidade de Felgueiras e, de uma forma
geral, teve intervenção ao nível do património imobiliário da CMF, o que o obrigava a
ter um contacto estreito com os serviços camarários, pois era necessária a execução de
obras de vária ordem nesses espaços e antes de mais tinha necessidade de identificar os
espaços junto dos serviços camarários e saber o que neles era possível construir (assim
se inteirando do património imobiliário do Município Felgueirense e do seu respectivo
valor patrimonial).
Ainda título de exemplo da estreita colaboração que mantinha com os serviços
camarários, referiu que na preparação do orçamento camarário para 1997 a testemunha
Terezinha pôs-lhe num dos gabinetes uma série de documentos de modo a que o
depoente colocasse as questões que entendesse acerca dos custos e dos investimentos na
área do património imobiliário da CMF, entre os quais o Centro Coordenador de
Transportes.

101
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No início exerceu as suas funções num gabinete minúsculo situado no edifício


da CMF, que partilhava com mais pessoas, como por exemplo o presidente da
Assembleia Municipal de Felgueiras (que na altura era o ex-marido da arguida Fátima
Felgueiras) e, durante algum tempo, com a D. Cândida (funcionária camarária), numa
altura em que a testemunha Leonor era recepcionista da parte política da CMF.
Era também um gabinete de apoio à presidente da edilidade, razão pela qual
chegou a ausentar-se do local para que ela pudesse efectuar telefonemas.
Era suposto ter ocupado um gabinete no Centro Coordenador de Transportes, na
altura ainda em construção (durante cerca de 1 ano). Acabou por nunca ocupar esse
gabinete, tanto mais que os acessos e arranjos exteriores ainda não estavam concluídos
(devido ao ano chuvoso em 1997 registaram-se atrasos na conclusão dessas obras), o
que o impedia aliás de levar lá potenciais interessados na aquisição das lojas do Centro
de Camionagem e de cuja venda o depoente estava incumbido. As obras aliás só se
concluíram já em 1998, quando era suposto estarem concluídas em 1997. Nunca chegou
a realizar-se uma cerimónia de inauguração desse edifício, mas existiu um auto de
recepção da obra. De resto, os elementos da fiscalização camarária, quando visitavam o
edifício, devido ao estado dos acessos, chamavam o encarregado da obra e eram
transportados na pá de um empilhador até ao interior do edifício (até finais de 1997).
Inexistia ainda água e luz até finais de 1997 (e até inícios desse ano inexistia mesmo a
caixilharia das portas e janelas).
Era pois no dito gabinete, situado no edifício da CMF, que desde finais de 1996
recebia os munícipes em audiência (por ex. os interessados na aquisição das ditas lojas,
munícipes com queixas dos vizinhos, pedidos de emprego, assuntos relacionados com o
PS, assuntos relacionados com a campanha eleitoral, assuntos relacionados com obras
particulares, assuntos relacionados com publicidade na via pública, entre outros), em
representação da arguida Fátima Felgueiras quando ela estava ausente, em face da
delegação de competências no depoente, transmitindo-lhe depois os assuntos em causa.
Foi de resto a arguida Fátima quem ordenou ao arguido Bragança que
providenciasse pela instalação do depoente nesse gabinete, tendo-lhe arranjado
provisoriamente uma secretária de recurso até que fosse adquirida uma outra e uma
cadeira para aquele espaço e dado instruções à empregada de limpeza (D. Adelaide)
para limpar o local. O GAPP forneceu-lhe então algum material de escritório e com a
autorização da testemunha Fernanda Leal, no Departamento Administrativo, fez
dossiers e foram-lhe fornecidos lápis, borrachas e papel.
Era frequente deslocar-se ao gabinete da arguida Fátima Felgueiras para tratar
dos mais variados assuntos. Esta aliás não confiava em mais alguém para fazer
audiências na sua ausência e deu-lhe carta branca no exercício das suas funções,
permitindo que o depoente se socorresse do auxílio dos serviços camarários.
A testemunha David Mota apenas foi admitido na CMF em meados de 1998
para exercer funções na Central de Camionagem, numa altura em que o depoente ainda
partilhava o gabinete com o Vereador Lickfold.
Sinal de que o seu local de trabalho se situava na CMF – onde cumpria um
horário, sem prejuízo do exercício das suas funções o obrigar a deslocações frequentes –
é o facto de almoçar muitas vezes do bar situado no edifício da CMF.
Exerceu pois funções como assessor da presidente da autarquia até Dezembro de
1998, tendo passado a exercer as funções de vereador - em face da renúncia do
Vereador Lickfold - desde 01.01.99 até Fevereiro de 2000 (o depoente integrou a lista
do PS, em 5º lugar, nas eleições autárquicas de Dezembro de 1997, razão pela qual
substituiu o dito vereador – cfr. documento de fls 5802 dos autos). Nessa altura passou a
exercer as funções de vereador em regime de permanência, sem qualquer pelouro,

102
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

exercendo ainda as mesmas funções que antes. Em Março de 2000 a arguida Fátima
Felgueiras retirou-lhe o estatuto de verador em regime de permanência, tendo sido nessa
qualidade que foi vereador até ao final de 2001.
Para ilustrar o grau de confiança que a arguida Fátima Felgueiras depositou em
si, juntou aos autos um cartão manuscrito por ela quando o convidou para integrar a
lista do PS nas eleições autárquicas (e cuja lista foi apresentada a 17.12.97). Uma vez
que integrou o 5º lugar dessa lista não tinha qualquer expectativa em ser eleito, a fazer
fé nas sondagens efectuadas.
Quando iniciou funções na CMF não era filiado em partido algum e não tinha
qualquer experiência política, estando completamento alheado do ambiente político no
concelho de Felgueiras, tanto mais que residia em Fafe.
Porém, já conhecia a D. Cândida e o arguido Júlio Faria dos seus tempos de
escola, além de ser cunhado do arguido Bragança.
Quanto ao seu papel nas eleições autárquicas de 1997, referiu o seguinte:
O desempenho das suas funções agradou à arguida Fátima Felgueiras, nunca
tendo recebido qualquer reparo a esse propósito.
Tomou contacto com os elementos do PS local quando exercia funções na CMF,
ou porque iam solicitar alguma coisa à arguida Fátima Felgueiras ou porque ali se
dirigiam para pagar as suas quotas.
O PS era composto por elementos com muito pouco espírito crítico e que
gravitavam à volta do poder.
O secretário-coordenador do PS local (o arguido Bragança, seu cunhado), na
prática, nada fazia.
O arguido Joaquim Freitas fazia parte da Comissão Política do PS local e era
amigo da arguida Fátima Felgueiras.
A arguida Fátima Felgueiras era assim a única com capacidade para se
candidatar à presidência da câmara nas eleições autáquicas de Dezembro de 1997.
Assim, ela auto-propôs a sua candidatura e escolheu as pessoas que iriam
trabalhar consigo.
O depoente só soube que ia integrar a lista do PS em 5º lugar, como
independente, minutos antes da mesma ser apresentada no T.J. da Comarca de
Felgueiras, o que aliás motivou desagrado entre alguns elementos do partido.
Como não foi eleito continuou como assessor na CMF.
O seu contrato foi então alterado e passou a auferir uma remuneração
equivalente à de vereador, por proposta da arguida Fátima Felgueiras, já que ela
considerava-o o 5º vereador, apesar de não ter sido eleito (cfr. contrato de prestação de
serviços de fls 5797 do 23º volume).
Para além de aumentada a sua remuneração (para 580 cts mensais) alargaram-se
o âmbito das suas funções.
Tinha de cumprir um horário (das 9.30 horas às 20 horas) e recebia instruções da
Presidente Fátima Felgueiras, encontrando-se sempre ao seu dispôr. Aliás, não se
ausentava do edifício da CMF sem a autorização dela.
De resto, a arguida Fátima Felgueiras sempre reconheceu publicamente ao
depoente as suas funções como assessor dela, dando como exemplo a entrevista que ela
deu ao “Comércio do Porto”, publicada na edição de 23.06.2000 (cfr. documento de fls
5796 do 23º volume).
Na campanha eleitoral a sua participação foi sempre efectuada a mando da
arguida Fátima Felgueiras.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ela era uma pessoa muito ocupada, pois para além de presidente da CMF, era
presidente da Comissão Política do PS local, dirigente nacional do PS, dirigente do
FCF, exercia funções na “Cercifel” e na “Cruz Vermelha”, entre outras funções.
Apercebeu-se que a arguida Fátima Felgueiras não nutria grande apreço pelo
secretário-coordenador do PS local, o arguido Bragança da Cunha, não obstante este ser
“um pau mandado” dela e uma “extensão” do arguido Júlio Faria na CMF.
Assim, foi o depoente quem a representou em várias reuniões do partido, onde
transmitia aposição dela, reportando-lhe mais tarde o que se passara.
Muitas vezes deixou o seu trabalho para dar execução a ordens proferidas pela
arguida Fátima Felgueiras em tarefas ligadas à campanha eleitoral.
Nesse contexto, por exemplo, diligenciou pela instalação da sede de campanha
numa loja fechada e arrendada ao “Minipreço” e cujo proprietário era o Sr. Lickefold,
tendo sido através dele que encetou contactos com um elemento do “Minipreço” em
ordem a alcançar aquele desiderato.
Teve um papel preponderante na organização de iniciativas de campanha.
Esteve também no “Pelouro das Finanças” da campanha eleitoral.
O arguido Joaquim Freitas foi-lhe apresentado pela arguida Fátima Felgueiras
quando foi trabalhar para a CMF.
Em Março de 1997 a arguida Fátima Felgueiras mandou-o ir a casa do arguido
Júlio Faria (que conhecia de vista e que representava uma espécie de “pai político” do
PS local, pois foi presidente da CMF, era deputado e oriundo de uma família
conceituada em Felgueiras) e encontrou o arguido Joaquim Freitas à porta do edifício.
Entraram os dois no apartamento do arguido Júlio Faria, o qual lhes revelou os
motivos da reunião. Disse ao depoente que devia fidelidade à arguida Fátima Felgueiras
e ao Joaquim Freitas referiu o facto dele fazer parte da Comissão Política do PS local e
de ser amigo pessoal da arguida Fátima Felgueiras.
Transmitiu-lhes que era necessário criar um “Pelouro das Finanças” para a
campanha eleitoral que se avizinhava e que a arguida Fátima Felgueiras pretendia que
eles integrassem esse pelouro.
Deu-lhes então conta de que era necessário abrir uma conta bancária e entregou-
lhes um manuscrito (que não adulterou), documento esse que fez juntar aos autos.
Aceitou a tarefa de que foi incumbido e o arguido Júlio Faria transmitiu-lhes que
a direcção de campanha iria instruí-los acerca da forma como a dita conta iria ser gerida
e que a Fátima Felgueiras iria falar com eles a esse propósito.
Sabe agora que a conta do BES foi aberta por força de uma desavença entre o
então marido da arguida Fátima Felgueiras e o arguido Júlio Faria (caso não tivesse
existido essa zanga, tal como em 1993, seria o Dr. Sousa Oliveira com o arguido
Joaquim Freitas quem seriam os titulares da conta respectiva).
Na primeira oportunidade transmitiu à arguida Fátima Felgueiras o que se tinha
passado na reunião em causa.
Cerca de uma semana depois ela chamou-o ao seu gabinete (estava presente o
arguido Joaquim Freitas) e deu-lhes instruções para abrir uma conta bancária, pois era
necessário dar cumprimento a várias situações urgentes em termos financeiros.
Uma dessas situações prendia-se com o Jornal “O Sovela”, que praticamente
estava falido, jornal esse que era um veículo para fazer passar a mensagem política da
arguida Fátima Felgueiras.
O director desse jornal era o Sr. Barros (de quem a arguida Fátima não gostava).
O depoente constatou a realidade do jornal, designadamente a falta generalizada
de pagamento aos credores e o contabilista desesperava pois não lhe era entregue a
documentação necessária para fazer a contabilidade.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente fez um levantamento dos credores e das dívidas existentes e agiu no


sentido de reabilitar o jornal, sempre sob as ordens da arguida Fátima Felgueiras.
Antes de abrir a conta no BES procurou informar-se da razão de ser da abertura
dessa conta.
Recorda-se que quando foi trabalhar para a CMF foi ao escritório do ex-marido
da arguida Fátima Felgueiras (Dr. Sousa Oliveira), o que fez aliás várias vezes a mando
deste e com autorização da arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que existia alguma
incompatibilidade entre ele e o arguido Júlio Faria. O ex-marido da arguida Fátima quis
fazer de si “um pombo correio”.
Numa dessas ocasiões fez-lhe o ponto da situação da pré-campanha e deu-lhe
conta que tinha instruções para abrir uma conta com o arguido Joaquim Freitas. Ele
comentou então que sempre assim foi (em 1993 já tinha sido aberta uma conta para o
mesmo fim, titulada pelo próprio e pelo arguido Joaquim Freitas, sendo certo que já em
1989 tinha também sido aberta uma conta titulada por outras duas pessoas).
Perguntou-lhe então se o PS não tinha uma conta oficial, ao que lhe respondeu
que não porquanto se o dinheiro caísse no partido “ninguém pagava a ninguém, pois
toda a gente rouba”.
Ficou pois com a convicção de que a abertura da conta era uma prática normal e
para obviar a problemas no seio do partido, tendo-lhe garantido o Dr. Sousa Oliveira a
legalidade de tal procedimento, o que deixou tranquilo o depoente.
De resto, o Dr. Sousa Oliveira procurou sempre manter-se informado acerca da
gestão financeira de tal conta.
O “Pelouro das Finanças” tinha também uma vertente de dinheiro em caixa,
além da conta.
Inicialmente ficou estabelecido que a conta do BES apenas se destinaria a
financiar as acções de campanha, mas com o decorrer do tempo apercebeu-se que
gradualmente tal conta foi estando ao serviço de outras coisas (como por ex. para o
pagamento des despesas do PS local, pagamento de despesas relacionadas com a
campanha referente à regionalização, para a campanha das legislativas e para o
Parlamento Europeu, além de algumas situações ligadas ao FCF).
Se desse facto tivesse antecipado conhecimento teria pedido a demissão.
Nessa altura existia uma relação de recíproca confiança entre o depoente e a
arguida Fátima Felgueiras. Esta referiu-lhe que existiam outras contas como aquela e
que os respectivos titulares nunca a questionaram acerca dos propósitos da sua abertura.
O depoente e o arguido Joaquim Freitas limitavam-se a recolher dinheiro e a
depositá-lo na dita conta, tudo segundo orientações que lhes eram dadas quer pelo Dr.
Sousa Oliveira quer pela arguida Fátima Felgueiras (aliás, aquele chegou a indicar-lhe
os montantes que certas pessoas deveriam dar e a arguida Fátima Felgueiras chegou a
entregar-lhes dinheiro e cheques de donativos, como por ex. de um empresário têxtil
chamado Dinis, da esposa de um empresário de terraplanagens e do dono da empresa
“Jonil”. Vários elementos da CMF fizeram o mesmo como por ex. o seu cunhado
Bragança, o Sr. Júlio Pereira, a D. Leonor, além do Dr. António Pereira – que instalou
salamandras nas escolas primárias do concelho - e do Sr. David, lider da Juventude
Socialista do PS local).
Quanto às listas de pessoas a contactar em ordem a recolherem donativos, nunca
as mesmas lhe foram entregues, sendo certo porém que as viu nas mãos do arguido
Joaquim Freitas.
Era este aliás quem estabelecia o percurso a fazer de acordo com as instruções
da arguida Fátima Felgueiras.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por outro lado, algumas outras pessoas também participavam na recolha de


fundos, como por exemplo o Sr. Fernando Pereira Sampaio (que os acompanhou em
algumas deslocações a clientes e amigos dele).
A contabilidade dos donativos era feita no GAPP, designadamente pelo arguido
Bragança da Cunha.
O Sr. Júlio Pereira juntava vários cheques e procedia ao seu depósito (não sabe
em que conta).
Haviam vários peditórios para os mais variados fins.
Assim, em 1997, a própria arguida Fátima Felgueiras várias vezes acompanhou
o Sr. Fernando Lima (então presidente do FCF) na recolha de donativos, ao que pensa,
para o FCF.
Quanto aos movimentos na conta do BES explicou que recebia os respectivos
extractos e apunha-lhes anotações.
Os arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Bragança da Cunha e o Sr. Júlio
Pereira tinham conhecimento dos ditos movimentos (o Sr. Júlio Pereira e os arguidos
Júlio Faria e Bragança da Cunha eram os titulares da conta oficial do PS de Felgueiras).
Aliás, extraía fotocopias dos extractos bancários da mencionada conta do BES e
fornecia-as aos arguidos Fatima Felgueiras e Júlio Faria.
Alguns dos cheques emitidos dessa conta destinaram-se a pagar despesas do PS
local.
A arguida Fátima Felgueiras tinha perfeito conhecimento dos depósitos
efectuados e das facturas a que era necessário dar pagamento.
Esta aliás metia o “nariz em tudo”, tendo o depoente junto quatro documentos
para ilustrar esta afirmação (documentos que se reportam a mensagens políticas e a
actividades de campanha, em que ela deu directrizes para as acções de campanha).
Ninguém questionava as suas directrizes e o mesmo se passou no que respeita ao
“Pelouro das Finanças”.
Quanto à forma como se processava a troca de correspondência entre o arguido
Júlio Faria e a CMF, na altura em que aquele era deputado na Assembleia da República,
explicou que o arguido Bragança da Cunha organizava uma pasta com documentos
destinados ao arguido Júlio Faria (como por ex.fotocópias do extracto da conta do BES
e recortes de jornal) e que era entregue pelo motorista da CMF (Sr. Pinto) em casa dele.
Na volta o dito motorista trazia documentos destinados a elementos que prestavam o seu
serviço na CMF, entre os quais o depoente, pois foi assim que recebeu do arguido Júlio
Faria o manuscrito a que já se fez alusão (constante de fls 156 e 157 do 1º volume).
No que respeita ao clube de natação “Foca” o depoente não teve qualquer
intervenção pois esse assunto estava entregue a outro assessor.
A arguida Fátima Felgueiras pretendia uma campanha eleitoral que ofuscasse a
Federação Distrital do Porto do PS, de quem aliás recusou contributos, e centrada na sua
pessoa (para ilustrar esta facto exibiu uma medalha que era oferecida).
Constava-se na CMF que o arguido Júlio Faria tinha preparado a sua
substituição com antecedência, sendo certo que ele nunca se desligou dos assuntos
camarários mesmo depois de ter sido eleito deputado.
Aliás, os elementos do Gabinete de Apoio tinham sido escolhidos pelo arguido
Júlio Faria e a arguida Fátima Felgueiras manteve a sua composição por imposição dele.
De resto, a D. Cândida foi substituída pela arguida Fátima Felgueiras e assistiu a
alguns telefonemas que esta fez ao arguido Júlio Faria a dar-lhe conta da sua mágoa por
esse facto.
Quanto substituiu na vereação o Sr. Lickefold, deu conta à arguida Fátima
Felgueiras de que pretendia deixar de tratar de determinados assuntos como por

106
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

exemplo efectuar os pagamentos através da conta do BES e de manter esta conta aberta,
posição que a desagradou Quis-lhe então entregar os dossiers relacionados com o
“Pelouro das Finanças” mas ela retorquiu-lhe “que estavam muito bem” com o
depoente.
Instruiu-o no sentido de levar consigo e analisar o dossier do Dr. Sousa Oliveira.
Acerca disso falou com o Joaquim Freitas, o qual se demarcou do assunto, tendo então o
depoente não acatado aquela instrução.
Divergiu com a arguida Fátima Felgueiras no que respeita à compra do estádio
Dr. Machado Matos e faltou à reunião onde tal assunto foi discutido (em meados de
1999).
A partir de então o seu relacionamento com ela nunca mais foi o mesmo, pois
ela não admitia ser contrariada.
No final de 1999 tomou conhecimento da denúncia anónima que originou estes
autos, denúncia essa que causou um “turbilhão” na CMF, sendo certo que a arguida
Fátima Felgueiras queria saber quem tinham sido os seus autores.
Tendo ela tomado conhecimento que algumas pessoas de Felgueiras se reuniram
com o Narciso Miranda a propósito dos acontecimentos que vieram a público e
desagradada com tal facto, acusou o arguido Bragança da Cunha de ter sido o autor da
denúncia anónima e correu-o da CMF, retirando-lhe o computador.
Desde então a arguida Fátima Felgueiras entendeu que o depoente não tinha
condições para continuar a exercer as funções de verador em regime de permanência,
tendo passado a exercer as funções de vereador sem esse regime até Dezembro de 2001
(cfr. o despacho datado de 01.03.2000, proferido pela arguida Fátima Felgueiras,
constante de fls 5807 do 23º volume).
Esclareceu, quanto aos pagamentos efectuados, que na CMF tirava fotocópias
dos cheques que ia emitindo com o arguido Joaquim Freitas e apunha notas e
informações quando inexistiam documentos de suporte, por forma a assim prestar
contas.
Confrontado com o documento de fls 120 do apenso 1, referiu tratar-se de um
cheque no valor de 600.000$00, datado de 02.12.97, emitido a favor do arguido Júlio
Faria e sacado sobre a sobredita conta do BES, sendo certo que o cheque em causa foi
assinado pelo depoente e pelo arguido Joaquim Freitas (era necessária a assinatura dos
dois). Tal cheque foi emitido por ordem da arguida Fátima Felgueiras e sem lhes dar a
indicação do fim a que se destinava.
Tal cheque foi de facto entregue ao arguido Júlio Faria (não se recorda de que
forma), que o endossou ao filho (António Pedro Lopes Faria), razão pela qual não
chegou a ser depositado na conta pessoal daquele.
Confrontado com o documento de fls 165 do 1º volume (igual ao documento de
fls 197 do apenso 1) referiu tratar-se de mais um cheque sacado sobre a conta do BES a
favor do arguido Júlio Faria, no montante de 170.000$00 e datado de 28.01.99, como
sempre assinado pelo depoente e pelo arguido Joaquim Freitas. Pese embora não se
recorde porque motivo tal cheque foi emitido, acha pouco provável que se tenha
destinado a reembolsar o arguido Júlio Faria de despesas que ele suportou a propósito
da campanha eleitoral das eleições autárquicas de Dezembro de 1997, em face da data
do cheque (é certo que após as eleições foram pagas despesas relacionadas com a
campanha, mas depreende-se do depoimento em causa que tal não terá sido o caso dada
a distância temporal entre a emissão desse cheque e a data das eleições referidas).
Salientou que, pese embora nem todos os cheques tenham sido mandados emitir pela
arguida Fátima Felgueiras, foi ela quem ordenou a respectiva emissão relativamente a
todos os cheques destinados ao arguido Júlio Faria.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontado com outro documento de fls 165, do 1º volume (depósito do cheque


referido), referiu não conhecer a letra, razão pela qual ignora quem procedeu ao
respectivo depósito. Não reconhece inclusive a rúbrica que consta do canto inferior
esquerdo.
Confrontado com o documento de fls 199 do apenso 1 referiu tratar-se de um
cheque sacado sobre a conta do BES, assinado pelo depoente e pelo arguido Joaquim
Freitas, a favor do arguido Júlio Faria, datado de 15.02.99, titulando a quantia de
57.090$00. Explicou que tal cheque foi emitido para reembolsar o arguido Júlio Faria
do facto de ter pago o almoço dos elementos de Felgueiras que se deslocaram ao
Congresso Nacional do PS, realizado em Lisboa (o depoente esteve presente a convite
da arguida Fátima Felgueiras).
Confrontado com o respectivo talão de depósito (cfr. fls 166 do 1º volume),
referiu que esse depósito foi efectuado pelo Sr. David Mota Queirós, pessoa que chegou
a trabalhar na dependência do depoente e chegou a ser líder da Juventude Socialista do
PS de Flegueiras.
Confrontado com o talão de depósito de fls 195 do apenso 1 na conta do BES,
no montante de 250.000$00 e datado de 23.12.98, depósito esse efectuado pelo dito
David Queirós, referiu tratar-se de um donativo, ao que pensa.
Confrontado com o talão de depósito de fls 200 do apenso 1 na conta do BES,
no montante de 250.000$00, datado de 24.02.99, referiu ter sido efectuado tal depósito
pelo Sr. Armindo Álvaro Pimenta Brochado (também ele fazia depósitos na conta do
BES), o qual pertencia também à Juventude Socialista do PS local.
O Vereador António Pereira procurou-o e entregou-lhe um cheque do Eng.
Agostinho Correia Lemos dizendo-lhe que se tratava de um donativo concedido pela
empresa “Mecanor”. Recebeu o cheque e depositou-o na conta do BES (cfr. doc. de fls
509 do 4º volume). Mais tarde veio a saber que a “Mecanor” montava o aquecimento
nas escolas primárias do concelho.
O Eng. Macedo procurou-o e disse-lhe que trazia um donativo (referiu-lhe que
tinha procurado entregar à própria arguida Fátima o dito cheque mas ela mandou-o ir ter
com o depoente). O dito engenheiro pediu-lhe para não apresentar a pagamento esse
cheque durante uns dias pois a conta ainda não estava aprovisionada para o efeito (cfr.
documento de fls 496, do 1º volume). Mais tarde veio a saber que o dito senhor era
sócio de uma empresa que estava a construir para a CMF escolas pré-primárias.
O Sr. Meireles procurou-o e disse-lhe que queria fazer um donativo, tendo-lhe
entregue um cheque de 50.000$00 (cfr. fls 492 do 4º volume). Mais tarde veio a saber
que ele fazia biscates de construção civil para a CMF.
A propósito dos documentos de fls 182 e 186 do 1º volume, referiu que alguém
encomendou a realização de propaganda eleitoral pelo telefone, a qual foi efectuada.
Foi-lhe então dirigida pelo Dr. Manuel Seabra (na altura a exercer funções na
CM de Matosinhos) uma factura no montante de 256.345$40. Como não estava por
dentro da situação aguardou por instruções. Após insistência pelo respectivo pagamento
pelo dito Manuel Seabra, a arguida Fátima Felgueiras a 01.04.98 despachou no sentido
de ser paga tal factura. Emitiu então a 09.04.98 um cheque ao portador (traçado), no
montante de 256.345$00 (constante de fls 186 do 1º volume).
Confrontado com cartão de fls 2183, referiu reportar-se a uma firma cujo
respectivo sócio-gerente é o Sr. Jorge Fonseca, cartão esse que veio acompanhado de
um donativo de 500.000$00. Foi a arguida Fátima Felgueiras quem lhe entregou tal
quantitativo em numerário com o cartão dentro de um envelope, transmitindo-lhe que se
tratava de um donativo para a campanha eleitoral.

108
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontado com o documento de fls 7087 do volume 27-A (cheque de


1.500.000$00, datado de 20.10.97) referiu pertencer ao Sr. Joaquim Ribeiro, empresário
muito conhecido em Felgueiras e morador em Caldas de Vizela, entretanto falecido,
cheque esse que lhe foi entregue pelo arguido Bragaça da Cunha para o depositar na
conta do BES, o que fez.
Confrontado com o cheque de fls 7085, no montante de 200.000$00 e datado de
12.12.97, referiu que lhe foi entregue pela arguida Fátima Felgueiras e que o mesmo se
reporta a um donativo, sendo certo que tal cheque foi sacado sobre uma conta conjunta
do Sr. José Andrade David Pereira (dono de máquinas de terraplanagem) e de Deolinda
Lima (que pensa ser a esposa).
Confrontado com o cheque de fls 7098 do volume 27-A (emitido por Manuel
Joaquim Oliveira Magalhães), no montante de 100.000$00, esclarece que foi o Sr.
Fernando Pereira Sampaio quem o depositou (acompanhava-o quando isso sucedeu).
Confrontado com o “post-it” de fls 171 do 1º volume, referiu ser da autoria do
arguido Júlio Faria, reportando-se a uma ordem que deu ao “Pelouro das Finanças”. O
“David” ali mencionado não é senão o Sr. David Mota Queirós, líder da Juventude
Socialista local. O “Nequinhas”, por seu turno, é um senhor já reformado e pai do Sr.
Júlio Pereira. O Dr. Orlando Sousa à data era membro da assembleia municipal e
militante do PS e actualmente é presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Confrontado com o teor do cheque de fls 172 do 1º volume, referiu tratar-se de
um cheque de 800.000$00 que se destinou a pagar bandeiras e pendões.
Aliás, recorda-se que o Sr. Sousa Oliveira o chamou ao seu escritório para lhe
dar orientações e disse-lhe que o Dr. Orlando Sousa era um indivíduo a “temer” porque
nas eleições de 1993 foi necessário proceder ao pagamento de despesas de campanha a
uma empresa de Braga com quem ele tinha relações e ele tinha por hábito inflaccionar o
valor das facturas a pagar.
Por via da dita empresa de Braga, foi o Dr. Orlando Sousa quem forneceu as
bandeiras e os pendões referidos, sendo certo que está convencido que não foi a arguida
Fátima Felgueiras quem encomendou esses artefactos pois nunca antes lho tinha
referido. O arguido Joaquim Freitas disse-lhe também que de nada sabia acerca dessa
encomenda.
Ora, o Dr. Orlando Sousa exigiu ao depoente o pagamento dos ditos 800.000$00
pela encomenda dessas bandeiras e pendões, por contacto telefónico que efectuou para a
CMF.
A demora no pagamento foi tanta que o arguido Júlio Faria lhe entregou o “post-
it” de fls 171 do 1º volume, na sequência da qual emitiu o cheque de fls 172 do 1º
volume.
Confrontado com o cheque de fls 213 do apenso 4, datado de 30.11.98 e no
montante de 35.000$00, referiu ter-se tratado do pagamento de um serviço prestado pelo
Sr. Carlos Ribeiro (publicidade numa carrinha na campanha do referendo pela
regionalização).
Ainda do mesmo apenso 4, os documentos de fls 212 (cheque datado de
23.11.98), 205 (cheque de 200 cts, datado de 08.09.98 e emitido a favor de Renato
Guerra) e 206 (comprovativo da remessa do meio de pagamento pelo correio) dizem
respeito a um pagamento efectuado à “Proeme” a propósito da campanha referente ao
referendo para a regionalização (fornecimento de placares). Chamou à colacção o
documento de fls 208 do mesmo apenso 4 para demonstrar que os funcionários da CMF,
em horário de expediente, tratavam de assuntos relacionados apenas com o PS.
O documento de fls 224-A do apenso 4 reporta-se a um recibo da “Portugal
Telecom” dirigida ao arguido Bragança da Cunha e respeitante ao uso do telefone

109
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

instalado na sede de campanha durante o mês de Janeiro de 1998. Não obstante, o


respectivo recibo foi dirigido à CMF e foi mesmo despachado pela arguida Fátima
Felgueiras, que a 28.02.98 nele apôs uma rúbrica. Foi o arguido Bragança da Cunha
quem lhe entregou esse documento.
O documento de fls 224-B do apenso 4 reporta-se a uma despesa com um
almoço com o Eng. António Guterres que ocorreu no Porto ainda a propósito da
campanha relativa ao referendo para a regionalização.
Confrontado com o cheque de fls 224 do apenso 4, no valor de 280.000$00,
referiu que foi emitido e entregue ao Sr. David a propósito de uma iniciativa levada a
cabo pela Juventude Socialista do PS local no Parque de Campismo em Vila Fria e
destinado a pagar ao “Quinteto Zézé Fernandes”.
Confrontado com o cheque de fls 218 do apenso 4 esclareceu que se tratou de
um pagamento ao Sr. Querós, pois foi ele quem efectuou a sonorização da carrinha que
fez a publicidade relativa à campanha para as eleições europeias de 1999.
Esses pagamentos eram quase sempre efectuados nas instalações da CMF, pois
era ali que as pessoas iam ter consigo. Chegou a colocar o problema à arguida Fátima
Felgueiras, mas ela ordenava o respectivo pagamento a si ou ao secretário-coordenador
do PS (o arguido Bragança da Cunha).
Os documentos normalmente eram rubricados pelo depoente e pelo arguido
Joaquim Freitas.
Chegaram a gratificar (com fundos da conta do BES) pessoas que com o seu
trabalho participaram na campanha eleitoral, como por exemplo 100.000$00 ao Sr.
David Mota (cfr. cheque de fls 178 do apenso 1, emitido a 14.05.98, e cheque de fls 161
do apenso 1, no montante de 50.000$00).
Explicou que a sede de campanha ainda se manteve durante algum tempo após
as eleições e foi o dito David quem teve um papel importante no seu desmantelamento,
daí as gratificações a que aludiu. Aliás, foi o depoente quem sugeriu a gratificação
referida, mas a decisão final coube à arguida Fátima Felgueiras.
Porém, o cheque de fls 184 do apenso 1, no valor de 200.000$00, datado de
02.09.98, emitido a favor do Sr. David Mota, não constituiu uma gratificação.
A propósito do documento de fls 127 do apenso 4º referiu que o mesmo reporta-
se ao pagamento da quantia de 57.740$00 referente ao custo das bebidas consumidas no
“Ciclos Bar”, as quais foram oferecidas aos jovens presentes, depois de com eles a
arguida Fátima Felgueiras se ter reunido na sede de campanha para lhes dar a conhecer
os seus projectos para o concelho (encontro que ocorreu a 04.12.97). O documento em
causa não é mais que um cartão do bar com o consumo efectuado. Em tal documento
não foi aposta a rúbrica do depoente nem do arguido Joaquim Freitas.
A propósito dos documentos de fls 179 e 180 do apenso 4º referiu que anotou
que se tratava do pagamento de lanternas emprestadas pelos Bombeiros Voluntários e
que foram furtadas durante o concerto dos “Santos & Pecadores” no Mercado
Municipal, pelo que tiveram de as substituir, o que importou a quantia de 102.389$00.
Os Bombeiros pagaram o remanescente da factura, pois aproveitaram para também
fazer uma encomenda.
A propósito do documento de fls 2895 e ss. (ou 4511 e ss.), explicou que se trata
da contestação apresentada na acção de prestação de contas movida contra si e contra o
arguido Joaquim Freitas pelo PS a 28.10.2001, segundo lhe disseram por influência da
arguida Fátima Felgueiras.
O documento de fls 187 do apenso 4º reporta-se ao pagamento da quantia de
6.700$00 referente a um ramo de flores entregue à arguida Fátima Felgueiras.

110
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O documento de fls 173 do 1º volume refere-se a um orçamento de instalação do


ar condicionado do espaço que servia de sede do PS (apesar de formalmente não
pertencer ao partido), dirigido ao arguido Bragança da Cunha, sendo certo que após a
sua instalação foi ele quem lhe entregou a factura, tendo conseguido então um desconto
de 3%, daí que só tenha pago a quantia de 776.0000$00, conforme anotação efectuada
vermelho no documento referido. Esclareceu que foi decidido pela arguida Fátima
Felgueiras instalar o ar condicionado naquele espaço na medida em que ela queixava-se
do execessivo calor existente no local aquando de uma reunião que ali teve lugar em
Julho ou Agosto de 1997. A ordem de aquisição foi transmitida por ela ao arguido
Bragança da Cunha.
O documento de fls 174 do 1º volume, datado de 16.10.97, reporta-se à
reparação de um painel colocado no edifício que funcionava como sede do PS, tendo
sido paga a quantia de 331.500$00 (cfr. cheque de fls 175, datado de 16.10.97) por essa
reparação e o montante de 50.000$00 pelo respectivo transporte (cfr. documento de fls
176 do 1º volume).
Quanto aos documentos de fls 196 e 197 do 1º volume explicou-os da seguinte
forma:
No âmbito de uma viagem a Lisboa pela arguida Fátima Felgueiras, a qual ali se
deslocou na viatura da CMF, conduzida pelo respectivo motorista (Sr. Pinto), de modo a
participar no Congresso Nacional do PS, foram efectuadas despesas com a dormida do
motorista, combustíveis e estacionamentos. Tais documentos foram-lhe entregues pelo
Sr. Pinto por ordem da arguida Fátima Felgueiras por forma a que o depoente pagasse
tais despesas com os fundos recolhidos na conta do BES, o que fez.
Quanto ao cheque de fls 187 do volume 1º, datado de 23.11.98, no montante de
150.000$00, emitido ao portador, referiu que o mesmo foi depositado na conta oficial
do partido para fazer face às dificuldades de pagamento das contas de água e luz
consumidos no espaço que funcionava como sede do partido.
O documento de fls 28 do apenso 4º diz respeito ao contrato subscrito pelo
arguido Bragança da Cunha para a actuação do Armando Gama e da Valentina Torres,
que o depoente se limitou a pagar.
O documento de fls 93 do mesmo apenso 4º, reporta-se a uma factura datada de
14.11.97 emitida pelo “Supermercado S. Jorge” (pertencente ao Sr. Inácio Ferreira
Faria, presidente da junta de freguesia da Várzea), relativo ao fornecimento de carne,
alho e sal, produtos esses pagos pelo depoente com fundos da conta do BES.
O cheque de fls 96 do apenso 94 (no montante de 90.000$00) reporta-se ao
pagamento do aluguer de mesas usadas num evento de campanha organizado pelo Sr.
Carlos Severino, presidente da junta de freguesia de Lagares, evento esse que teve lugar
em Santa Luzia.
O documento de fls 102 a 104 do apenso 4º reporta-se ao contrato subscrito para
a actuação do grupo “Santos & Pecadores”, tendo emitido os respectivos cheques de
pagamento a 07.11.97 e a 11.12.97 (cfr. fls 103 e 104 do mesmo apenso).
Os documentos de fls 117 a 125 do mesmo apenso reportam-se a almoços e
jantares no “Lucybar” de funcionários camarários pagos com fundos da conta do BES.
Os documentos de fls 139 a 150 do apenso 4º reportam-se a facturas de refeições
consumidas no “Café Snack-bar Bem-Estar” por funcionários camarários que, após o
expediente, iam fazer serviços para a campanha eleitoral do PS (eram-lhes pagas as
refeições e gratificações). Tais depesas foram pagas com fundos da conta do BES.
No que se refere ao documento de fls 195 do 1º volume explicou que a arguida
Fátima Felgueiras encomendou um fogo de artifício para fechar a sua campanha
eleitoral, tendo sido paga a quantia de 850.000$00.

111
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O documento de fls 190 do 1º volume reporta-se a um serviço de transporte de


elementos do PS ao Porto, a fim de participarem num almoço com o Eng. António
Guterres que teve lugar a 06.11.98, numa acção que se inseria na campanha do
referendo da regionalização. Tal serviço foi efectuado pela “Auto-Viação de Landim” e,
não obstante ter sido encomendado pela Federação Distrital do Porto do PS acabou por
ser pago com fundos da referida conta do BES.
O documento de fls 188 reporta-se a um aviso/recibo de seguro no montante de
14.890$00, seguro esse que foi efectuado para acautelar qualquer ocorrência na
utilização pelo PS do espaço do Cineteatro Fonseca Moreira em 06.11.98 e 07.11.98,
ainda a propósito de um evento que se inseria na campanha do referendo pela
regionalização. A ordem para efectuar o seguro chegou-lhe através do Gabinete de
Apoio à Presidente.
Deu conta dos rumores que referiam a hipótese da arguida Fátima Felgueiras
poder vir a ocupar um cargo ministerial e que o arguido Júlio Faria não tinha assegurada
a sua continuidade como deputado na Assembleia da República.
Referiu que a arguida Fátima Felgueiras preocupava-se com o futuro político
dele, tendo existido rumures de que ele poderia vir a ser nomeado Governador Civil do
Porto, de vir ocupar um cargo importante a nível regional caso a regionalização
avançasse, de ser nomeado para a Comissão de Coordenação da Região Norte ou de ser
nomeado para um cargo de relevo na AMVS, hipóteses que não se concretizaram. Ele
acabou então por ocupar o cargo de gestor do Hospital Agostinho Ribeiro.
Em meados de 1999 a arguida Fátima Felgueiras, na qualidade de presidente da
Comissão Política do PS de Felgueiras, propôs-se apresentar na Federação Distrital do
Porto do PS novos elementos a fim de se tornarem filiados no partido, entre os quais o
depoente. Recorda-se que assinou a proposta mas nunca chegou a receber o cartão de
militante, razão pela qual não se considera militante do PS.
Ainda a propósito da campanha eleitoral das autárquicas de 1997, debruçando-se
sobre as actas datadas de 09.06.97 entregues na audiência de julgamento pelo arguido
Júlio Faria e constantes de fls 12211 a 12215, referiu que nunca teve conhecimento da
existência de actas, pese embora seja referido a fls 1212 que o depoente iria assegurar a
feitura da acta e assinalar as presenças.
Explicou que nesse período existiam muitas reuniões da chamada “task force”,
constituído pelo núcleo duro. Não reconhece assim naqueles documentos o espelho da
realidade.
De resto, o Sr. Dinis nunca fez parte do “Pelouro das Finanças” ao contrário do
que consta em tal documento (aliás, com ele só falou uma única vez).
A propósito de um documento junto na 29º sessão de julgamento, referiu tratar-
se de um rascunho de uma reunião da autoria do arguido Bragança da Cunha e na alusão
à “contabilidade” aparece alusão à arguida Fátima Felgueiras com as iniciais “FF”. As
inicias “AJB” significam António José Bragança (secretário-coordenador), as iniciais
“HC” reportam-se à pessoa do depoente (assessor da presidente da CMF) e as iniciais
“JJP” reportam-se a José Júlio Pereira (membro da Comissão Política e do Secretariado
do PS local).
Assegurou nunca ter tido qualquer responsabilidade na contabilidade do PS
local, sendo certo que o seu nome é ali referido por ser co-titular da conta do BES, a
qual se tornou na conta não oficial do partido.
Teve participação nessa reunião porque a arguida Fátima Felgueiras solicitou a
sua comparência.

112
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que o Sr. Júlio Pereira, Secretário da arguida Fátima Felgueiras, em


horário de expediente tratava de assuntos relacionados com o PS, dando como exemplo
os documentos de fls 10 a 17 do apenso 4º.

- Arguido Joaquim Freitas


Foi militante do PS desde 1993 até à altura em que o Eng. António Guterres foi
o Secretário-geral do partido.
Foi membro da Comissão Política do PS de Felgueiras no tempo em que a
arguida Fátima Felgueiras foi presidente da CMF (antes do presente mandato). Foi ela
quem o convidou em 1996 para fazer parte de tal Comissão. Pensa que ali permaneceu
até 1999.
Conheceu a arguida Fátima Felgueiras em 1992 ou 1993 por intermédio do Dr.
Sousa Oliveira. Eram amigos de família, pois as respectivas famílias conviviam com
regularidade em casa uma da outra, relacionamento esse que se manteve até ao ano
2000 (até à altura da denúncia anónima que deu origem a estes autos).
A arguida Fátima Felgueiras assumiu o segundo lugar das listas do PS já antes
de 1993 quando o nº 2 até então, o Professor Campos, foi “corrido” e foi para o PSD,
sendo certo que já então qualquer elemento crítico era corrido. Corrigiu depois o seu
depoimento, precisando que o Prof. Campos foi eleito vereador da CMF cumprindo
mandato entre 1993 e 1997, tendo sido corrido quase no final desse mandato, não
aparecendo nas listas de 1997, razão pela qual não foi reeleito.
Em 1993 fez parte com o Dr. Sousa Oliveira de uma comissão angariadora de
fundos para a campanha eleitoral das eleições autárquicas ocorridas nesse ano, sendo o
arguido Júlio Faria o cabeça de lista pelo PS. Foi convidado pelo arguido Júlio e pelo
Dr. Sousa Oliveira para assumir essas funções. Recorda-se que nessa altura lhe diziam
que a arguia Fátima Felgueiras, dentro de 2 ou 3 anos, viria a ser presidente da
edilidade, o que pressupunha que o arguido Júlio Faria fosse eleito deputado na
Assembleia da República, o que se veio a concretizar de facto em 1995 visto que ela
era a Vice-presidente da autarquia. Tal informação foi-lhe dada pela própria arguida
Fátima Felgueiras e mais tarde ouviu também tal comentário da boca do Dr. Sousa
Oliveira quando se dirigiu ao Sr. José Anselmo Peixoto Pereira no sentido de obter um
donativo (o depoente estava presente).
Na política prepara-se o caminho com tempo.
Assim, em 1995 era já previsível que o arguido Júlio Faria ocupasse um lugar
elegível para a Assembleia da República nas listas do PS.
Recorda-se aliás que já em 1994 houve um jantar na sua casa do Mindelo onde
se discutiu a sua sucessão e onde a mesma foi “cozinhada”.
De resto, o pré-lançamento da arguida Fátima como sucessora do arguido Júlio
Faria ocorreu num churrasco que teve lugar na quinta do pai do depoente. Nessa altura
recorda-se que o arguido Júlio Faria estava doente, tendo sido substituído pela arguida
Fátima à frente dos destinos da CMF, enquanto vice-presidente da edilidade (facto que
só ocorreu uma vez). Tal churrasco ocorreu por alturas do Verão, não sabendo precisar
nem o mês nem o ano (em todo o caso teve lugar em data posterior a 1994).
Quanto à angariação de fundos para a campanha eleitoral referiu o seguinte:
O presidente da CMF era sempre o presidente da comissão política do PS local e
era ele quem designava as pessoas da sua confiança para fazerem parte das diferentes
comissões, designadamente a de angariação de fundos para a campanha eleitoral.
A existência de contas paralelas vinham já pelo menos desde as eleições
autárquicas de 1993 (nesse ano o depoente integrou com o Dr. Sousa Oliveira a
comissão de angariação de fundos) onde era suposto proceder-se ao depósito dos

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

donativos. Estranhou por isso que donativos tivessem sido depositados na conta pessoal
do Dr. Sousa Oliveira.
Em 1997, data que não consegue recordar mas antes da pré-campanha (que se
iniciou em Abril/Maio desse ano), a arguida Fátima Felgueiras pediu-lhe para ir a casa
do arguido Júlio Faria, o que fez (já ali se tinha deslocado várias vezes). Uma vez ali
chegado, ao que pensa, encontrou o arguido Horácio Costa à entrada do prédio onde se
situa o apartamento do arguido Júlio Faria. Subiram então juntos ao dito apartamento,
onde foram recebidos pelo arguido Júlio Faria, o qual sabia ao que iam – pois foi logo
direito ao assunto que ali os levou - e, no decurso da reunião, escreveu o manuscrito que
consta de fls 156 e 157 dos autos. Explicou-lhes que já tinha falado com a arguida
Fátima acerca desse assunto e que o depoente e o arguido Horácio haviam sido
escolhidos para integrar o “Pelouro das Finanças”. Foi o arguido Horácio Costa quem
guardou o manuscrito referido na CMF, sendo certo que tratava de matéria sigilosa.
A arguida Fátima levou esse assunto à Comissão Política onde foram aditados
mais nomes a fim de integrar o “Pelouro das Finanças”, como por exemplo o Sr.
Sampaio da Lixa e o Sr. Dinis (chefe das Finanças de Felgueiras, o qual porém nunca os
acompanhou na angariação de donativos nem nunca entregou donativos).
Sendo matéria sigilosa, que em princípio não deveria extravasar o conhecimento
dos quatro (depoente, Horácio Costa, Júlio Faria e Fátima Felgueiras), estranhou que a
arguida Fátima tivesse levado esse assunto à Comissão Política.
Assim, os donativos institucionais ficariam a cargo dos arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria, ao passo que o depoente e o arguido Horácio tratariam de
recolher donativos no meio empresarial.
Abriram então a conta no BES com 5.000.000$00 entregues pela “Resin”
(segundo lhe disse o arguido Horácio Costa tratou-se de um donativo) e 1.000.000$00
entregues pela arguida Fátima ao arguido Horácio Costa. O arguido Horácio transmitia-
lhe os donativos que recebia e vice-versa, não pondo em causa a veracidade do que ele
lhe transmitia a esse propósito.
A razão de ser da abertura dessa conta era a de fugir ao controle do PS. De resto,
as contas da campanha de 1997 nunca foram prestadas à Comissão Política, como já
assim tinha sucedido em 1993 (o Dr. Sousa Oliveira referiu-lhe que era necessário
prestar contas aos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras e, segundo ele, tê-las-á
entretanto prestado num dia em que o depoente não se encontrava presente. Seja como
for, essas contas não foram prestadas ao partido).
Como sempre havia grande desconfiança sobre aqueles que angariavam fundos,
o depoente e o arguido Horácio decidiram anotar tudo (o arguido Horácio Costa anotava
tudo e dava conhecimento ao depoente), até por exemplo da compra de selos (cfr.
manuscrito de fls 226 do apenso 4).
A primeira vez que se falou na abertura da mencionada conta foi em casa do
arguido Júlio Faria, na reunião a que já se referiu. Deu conhecimento à arguida Fátima
do que ali se passou, no gabinete desta na CMF, tendo-lhe ela então dado instruções
para abrir a dita conta. Entre a data daquela reunião e a data da abertura da conta
decorreu algum tempo na medida em que não existia dinheiro para proceder à sua
abertura.
Recorda-se que as eleições desse ano foram preparadas com muita antecedência
na medida em que era a primeira vez que a arguida Fátima concorria como cabeça de
lista do PS à CMF.
Nessa altura não tinha grande confiança com o arguido Horácio, o qual lhe foi
apresentado pela arguida Fátima Felgueiras no gabinete desta. Ele era visto como braço
direito dela e da sua confiança. Sinal disso é o facto dela o ter apresentado, pois não era

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

habitual ela fazê-lo relativamente aos funcionários camarários. De resto, quer o


depoente quer o arguido Horácio Costa foram escolhidos para o “Pelouro das Finanças”
por serem pessoas de confiança e por não questionarem. A arguida Fátima apresentou-o
como colaborador e só à testemunha Leonor é que ouviu tratar o arguido Horácio como
assessor.
A recolha dos fundos que foram depositados na conta referida destinou-se não
só à dita campanha eleitoral como também a outras campanhas e causas (como por
exemplo o “Sovela”).
Como a comissão política não tinha “massa crítica” – era composta sobretudo
por presidentes de juntas de freguesia, designados por “Yes men” - a arguida Fátima
tudo decidia. De resto, as decisões normalmente já estavam tomadas (no GAPP entre os
arguidos Fátima e Bragança e ainda o Sr. José Júlio Pereira) quando expostas na
comissão política.
Já o Secretariado (composto sobretudo por funcionários camarários, como por
ex. o arguido Bragança, o Sr. José Júlio Pereira e o Sr. Silva) tinha alguma massa
crítica.
Fora das reuniões as pessoas criticavam a arguida Fátima, mas nas reuniões nada
diziam.
Deu como exemplo o facto de ter votado desfavoravelmente a gestão por parte
da CMF de um pavilhão gimnodesportivo, tendo sido por isso um pouco afastado.
Na sequência do Dr. Sousa Oliveira ter votado negativamente a concessão de um
apoio na ordem dos 300.000 cts ao FCF pela CMF a arguida Fátima incumbiu o
depoente de propor um voto de desconfiança na Comissão Política, o que fez, tendo
sido tal voto aprovado por unanimidade (depois do Sr. Silva ter votado contra e de ter
declarado que se “enganara”, alterando o seu sentido de voto).
Confrontado com o documento de fls 199 do 1º volume, reconheceu nele, na
parte manuscrita, a letra do arguido Horácio Costa. Referiu que não conhecia o arguido
Vítor Borges.
Sempre apenas recebeu ordens da arguida Fátima Felgueiras no que à campanha
eleitoral de 1997 diz respeito, sendo certo que a recolha de fundos correu à margem do
partido.
O arguido Bragança, por seu turno, estava marginalizado nas actividades de
campanha e procedia tarde e a más horas aos contactos de que era incumbido fazer.
Segundo lhe foi confidenciado por ele as relações entre ambos não eram boas porque ele
aspirava a ser vereador (o que nunca conseguiu).
Quando o arguido Horácio Costa entrou para a CMF o fosso entre os arguidos
Fátima e Bragança aumentou porque aquele “fez-lhe sombra” (o arguido Horácio por
vezes queixava-se à arguida Fátima do cunhado). De resto, o relacionamento entre o
arguido Horácio Costa e o arguido Bragança não era bom, apesar de serem cunhados
(daí que não seja verosímil que o arguido Horácio tenha entrado para a CMF por cunha
do arguido Bragança).
Todos os dias o depoente passava pela CMF para falar com o arguido Horácio a
fim de tratarem de assuntos relacionados com a angariação de fundos para a campanha
eleitoral.
O Horácio Costa tinha ali um gabinete, o qual era o seu local de trabalho.
O depoente e o arguido Horácio não movimentavam a conta a seu bel-prazer.
Era arguida Fátima quem dava as ordens para se proceder aos pagamentos, sendo certo
que lhe era dado conhecimento dos contributos (quem e com quanto contribuíam).
Iam bater à porta de empresários que constavam de uma lista que lhes era
fornecida (não se recorda se essa lista lhes era fornecida pela arguida Fátima ou pelo

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

GAPP, designadamente pelo arguido Bragança) e essas pessoas eram avisadas pelo
GAPP da visita do depoente e do arguido Horácio.
Depreende agora que quer a arguida Fátima quer o arguido Júlio não quiseram
ser titulares da dita conta para evitar qualquer responsabilidade criminal que pudesse ter
lugar.
Telefonou para a PJ quando suspeitou de que poderia haver um “saco azul”, o
que sucedeu quando teve um almoço de trabalho com a testemunha Manuel Faria (com
quem tem relações comerciais) e este lhe fez alusão a esse “saco” quer para a campanha
eleitoral quer para o futebol. Falou acerca desse assunto com o arguido Horácio e
decidiram verificar da veracidade dessa suspeita.
O depoente nunca tomou qualquer iniciativa de fazer pagamentos. Houveram
aliás pagamentos com os quais não concordou.
A gestão da conta do BES era feita pela arguida Fátima Felgueiras e o arguido
Júlio por vezes solicitava a realização de alguns pagamentos (cfr. por ex. doc. de fls 171
do 1º volume).
A arguida Fátima chegou-lhe a entregar vários donativos que angariou (exemplo
disso foi um cheque emitido a seu favor e que estava acondicionado num envelope
endereçado “à atenção da Srª presidente”).
Não tem porém a certeza se os contactos pessoais que ela fez se reportavam à
obtenção de donativos para a camanha ou à obtenção de donativos para o FCF ou
mesmo para o jornal “O Sovela” (acompanhada pelo Sr. Fernando Lima).
Recorda-se que a arguida Fátima disse-lhe que o Eng. Manuel Maria Machado
(que é o técnico que apresenta mais projectos na CMF) tinha a obrigação de entregar um
donativo de três ou quatro mil contos (em 1997 ele entregou dois cheques de donativos
do Sr. Pimenta da “Solpré” e do Sr. Pinto da “Pinfel” – cfr. ponto 2.4. da pronúncia).
Fez a recolha de donativos não só com o arguido Horácio mas também com o
arguido Bragança e o Sr. Sampaio da Lixa. Foi também uma vez com a arguida Maria
Augusta a Lagares tentar obter um donativo do Sr. Júlio Teixeira, conhecido dela.
Foi-lhes entretanto movida uma acção judicial de prestação de contas pelo PS,
sendo certo que, em todo caso, antes disso, quiseram prestá-las à arguida Fátima, a qual
lhes disse para o fazerem ao Dr. Sousa Oliveira, o que não fizeram (tal passou-se antes
do arguido Horácio ser vereador).
Confrontado com a acta da Comissão Política a propósito da organização da
campanha eleitoral de 1997 (junta no decurso da audiência de julgamento e datada de
09.06.97) e onde consta que fazia parte da Direcção de Campanha, referiu que na
prática nada se passava conforme ali estava estabelecido pois era a arguida Fátima quem
mandava de facto e se reunia apenas com 3 ou 4 pessoas (a “task force”: Professor
Edgar, o arguido Horácio Costa, o depoente, o arguido Bragança e o arguido Júlio
Faria), inexistindo qualquer acta.
Era o “núcleo duro” que executava ou mandava executar o que a arguida Fátima
determinava. A arguida Fátima era minuciosa ao ponto de por exemplo determinar a que
hora deveriam os carros com propaganda sonora circular nas ruas.

- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal


É funcionária da CMF desde 1989, tendo chefiado o Departamento
Administrativo desde 1991, passando a directora do Departamento de Administração
Geral desde 2000 (redenominação do Departamento Administrativo).
Recorda-se que no Verão de 1995 o presidente da autarquia – o arguido Júlio
Faria - interrompeu o seu mandato para ir para a Assembleia da República como
deputado.

116
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Depois disso ele deslocou-se uma vez ou outra durante algum tempo para
assegurar a transição dos processos para a arguida Fátima Felgueiras, a qual lhe sucedeu
na presidência da CMF.
Às reuniões de câmara o arguido Júlio Faria deixou de ir desde que tomou posse
como deputado na Assembleia da República.
A depoente nunca participou ou assistiu a qualquer sessão da Assembleia
Municipal.
Ignora qual a influência política que o arguido Júlio Faria poderia eventualmente
exercer no seio do PS local depois de ter deixado a presidência da CMF.
Sobre os funcionários camarários deixou de exercer qualquer influência.
Acerca do arguido Horácio Costa referiu ter a ideia de que ele dispunha de um
gabinete no edifício da CMF desde que foi admitido como assessor.
Confirma os contactos que ele teve com o Departamento Administrativo no que
tange ao património imobiliário da CMF, não só com a depoente – designadamente
porque desempenha além do mais as funções de notária privativa da CMF - como
também com a funcionária Fernanda Sousa.
Era habitual o Departamento Administrativo fornecer o papel e outro material de
escritório.
Manifestou a ideia de que o arguido Horácio ia à CMF todos os dias.
Não tem ideia da testemunha Cândida ter ocupado o gabinete a que se referiu o
arguido Horácio, mas não pôs em causa a veracidade desse facto.
Recorda-se de ver o arguido Horácio no bar da CMF mas não se recorda se o via
lá todos os dias.

- Testemunha Cândida da Ascenção Ribeiro da Costa


É funcionária da CMF há cerca de 19 anos. Quando foi admitida foi exercer
funções no Gabinete de Imprensa e depois foi para o Gabinete de Apoio ao Presidente
(na altura o arguido Júlio Faria, durante dois mandatos), onde dava apoio
administrativo.
Em 1996/97 foi transferida para a Secção de Expediente Geral (Departamento
Técnico) e em 2001 foi para o Gabinete de Atendimento (altura em que esse gabinete
abriu).
Conheceu o arguido Horácio Costa nos tempos de escola.
Ele prestava funções de gestor do Centro Coordenador de Transportes, ao que
pensa em 1996, como avençado. Nessa altura a depoente estava no GAPP e passou para
a recepção.
O arguido Horácio Costa tinha um gabinete no edifício do Centro Coordenador
de Transportes, onde também trabalhava a testemunha David Mota Queirós.
Por vezes, como vagou um gabinete usado pelo Vereador José da Silva Campos,
o arguido Horácio usava-o para fazer alguns atendimentos e para ultimar assuntos
relacionados com a venda das lojas do Centro Coordenador dos Transportes.
Em meados de um ano que não pode precisar (talvez 1997), no Verão (já era
presidente da CMF a arguida Fátima Felgueiras), a depoente foi de férias e quando
regressou ocupou esse gabinete no edifício da CMF durante cerca de dois meses, antes
de ser transferida para a Secção de Expediente Geral – Obras Particulares (transferência
que lhe foi comunicada pelo arguido Barbieri Cardoso).
Enquanto a depoente ali esteve (entre Setembro e Outubro de 1997) o Dr. Sousa
Oliveira não usou o dito gabinete.
Ao contrário do que referiu o arguido Horácio Costa não ficou desagradada com
essa transferência e não contactou o arguido Júlio Faria para se lamentar desse facto.

117
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não pôs em causa o carácter diversificado das funções do arguido Horácio e


referiu não saber se a testemunha David Mota Queirós partilhava com ele um gabinete
no Centro Coordenador de Transportes.
*
Foi efectuada uma acareação entre o arguido Horácio Costa e a testemunha
Cândida de Ascenção Ribeiro da Costa, da qual resultou que cada um manteve a
respectiva versão dos factos, designadamente no que respeita ao facto do arguido
Horácio ter ocupado ou não um gabinete no edifício da CMF (o arguido Horácio
chamou à atenção para o facto de que o edifício do Centro Coordenador de Transportes
à data estava em acabamentos pelo que não poderia ocupar qualquer gabinete nesse
edifício, como emerge dos relatórios mensais que na altura remetia à arguida Fátima
Felgueiras, designadamente o que diz respeito a Janeiro de 1997. Já a testemunha David
Queirós, segundo o arguido Horácio, entrou para a CMF em finais de 1998).
A testemunha Cândida, apesar de manter o seu depoimento, admitiu que o
arguido Horácio Costa pudesse ir todos os dias ao dito gabinete na CMF mas não estava
lá todo o dia. Depois de 1997 admitiu não saber se ele ocupou ou não esse gabinete pois
saíu de lá.
O arguido Horácio Costa acrescentou ainda que a testemunha em causa ficou
aborrecida com a transferência e que isso sucedeu porque ela era próxima do vereador
José Campos, eleito pelo PSD. Foi por isso que o arguido Bragança diligenciou pela
substituição dela pela testemunha Leonor Couto. Reafirmou que assistiu a telefonemas
dela para o arguido Júlio Faria , onde se lamentava desse facto.
O Dr. Sousa Oliveira, segundo a testemunha Cândida, ocupou um gabinete ao
lado do Departamento Administrativo e não o gabinete em causa, quando foi presidente
da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Acrescentou que depois das eleições de 1997 o arguido Horácio Costa exercia
funções por ali mas não sabe que gabinete ocupava, sabendo que o ocupou enquanto
vereador a tempo inteiro.
O arguido Horácio Costa retorquiu que o Dr. Sousa Oliveira de facto ocupou um
gabinete ao lado do Departamento Administrativo para impedir que fosse ocupado por
vereadores eleitos pelo PSD, altura em que o gabinete em causa lhe foi definitivamente
atribuído.
*
- Testemunha Edgar Pinto da Silva
Referiu ser militante do PS desde 1996. Foi vereador na CMF de 1997 a 2001
(na sequência das eleições autárquicas de Dezembro de 1997), onde tinha o pelouro da
educação, do ambiente (não se recorda em que altura do seu mandato), dos cemitérios,
das contra-ordenações (mais tarde) e da “Casa do Risco”.
A propósito da campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997
referiu que participou em reuniões preparatórias para que as várias equipas fossem no
dia seguinte às juntas de freguesia realizar acções de campanha.
Nessas reuniões participavam, designadamente, os candidatos à vereação e à
Assembleia Municipal e a arguida Fátima Felgueiras, além de outros militantes e
simpatizantes do PS.
Assim, participou em reuniões onde estiveram presentes, designadamente, os
arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Horácio Costa, Joaquim Freitas, António
Pereira, António Bragança da Cunha e Maria Augusta Neves, além das testemunhas
Júlio Pereira e Orlando Sousa, entre outros militantes e simpatizantes.
Tais reuniões não eram restritas.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No final de cada dia realizava-se um encontro na sede de campanha a fim de se


fazer um balanço das acções levadas a cabo nesse dia.
Na altura o depoente era inexperiente nas questões políticas.
Não tem a certeza se fazia parte ou não da direcção de campanha
Pese embora nas reuniões se falasse da compra do material necessário para a
campanha não se debatiam questões de ordem financeira, pelo menos que se lembre.
Nunca assistiu a qualquer reunião onde o pelouro das finanças estivesse em
discussão. Nessa altura, aliás, não sabia quem integrava esse pelouro, o que só veio a
saber depois da toda a celeuma que deu origem a estes autos.
Ignora pois de que forma as despesas de campanha eram pagas bem como a
quem eram entregues os documentos para o pagamento dessas despesas.
Nunca viu qualquer manuscrito alusivo ao pelouro das finanças.
Para além dessas reuniões mais alargadas existiam reuniões mais restritas do
“núcleo duro”, não se recordando se nelas participava ou não.
Conhece o arguido Horácio Costa desde a altura da campanha eleitoral referida.
Ele participou nela desde Maio/Junho de 1997, participando inclusive nas reuniões
referidas. Nelas não se recorda de alguma vez ter sido levantada alguma questão
relacionada com o pagamento de despesas de campanha.
Ele, de resto, organizava as pessoas para irem às juntas de freguesia em acções
de campanha e era o responsável pelos carros de som. Era enfim o responsável pela
organização da campanha.
Sabe que ele antes de ser vereador foi assessor da arguida Fátima Felgueiras
(ignora desde quando, mas talvez desde 1996), ou pelo menos assim sempre foi
considerado.
No âmbito das suas funções, o arguido Horácio Costa atendia munícipes na falta
da arguida Fátima Felgueiras e tinha a seu cargo o Centro Coordenador de Transportes.
Tem a ideia de que ele era também assessor político da arguida Fátima Felgueiras.
Salientou porém o depoente que ia só de vez em quando à CMF.
Ainda a propósito da campanha eleitoral referiu que as pessoas eram
distribuídas por várias tarefas. Lembra-se por exemplo de ter substituído o arguido
Horácio Costa em certa ocasião no que se refere ao percurso efectuado por um carro
equipado com aparelho de som e que divulgava propaganda política. O depoente, de
resto, para além de organizar os percursos dessas viaturas, ia às juntas de freguesia e
organizava sessões de esclarecimento.
Foi confrontado então com as declarações que prestou perante a JIC a fls 7772,
último parágrafo e primeiras duas linhas de fls 7773 e linhas 15 a 27 de fls 644.
Em face desse confronto admitiu que foi na fase final da campanha eleitoral que
soube quem eram os responsáveis pelo pelouro das finanças (não obstante, perante a JIC
havia afirmado que só tinha tomado conhecimento desse facto já no decurso deste
processo). Não soube porém explicar a sua razão de ciência.
A propósito da forma como as pessoas eram escolhidas para integrar os
diferentes pelouros referiu que a escolha era decidida em conjunto, mas que a arguida
Fátima Felgueiras tinha sempre a última palavra. Foi pois a arguida Fátima quem em
última análise escolheu os membros da comissão de campanha.
Tem a ideia de que a campanha eleitoral terá custado cerca de
50/60.000.000$00.
Todos dependiam do que a arguida Fátima Felgueiras decidia e o arguido
Horácio não seria excepção.
Ela tem uma personalidade forte e tudo o que ordenasse tinha de ser feito. Julga
por isso que o arguido Horácio Costa não tinha autonomia.

119
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na altura não chegou a saber da existência da conta do BES referida nos autos.
Soube dela mais tarde numa reunião de câmara quando o Vereador Manuel Faria lhe
perguntou se conhecia a dita conta e lhe respondeu negativamente.
Pensa que a arguida Fátima Felgueiras teria de ter conhecimento da mesma pois
era ela quem mandava e, conhecendo-a como conhece, o arguido Horácio Costa não a
iria abrir sem prévio conhecimento dela.
O arguido Horácio Costa era pessoa organizada e fiel à arguida Fátima.
Quando o depoente assumiu as funções de vereador, em Janeiro ou Fevereiro de
1998, o arguido Horácio Costa ocupava um gabinete na CMF. Tem a certeza desse facto
enquanto foi Vereador da CMF.
Antes disso tem a ideia que ele partilharia esse gabinete com o Vereador
Lickfold, mas não tem a certeza desse facto, pois só esporadicamente ia à CMF (tem a
ideia de ter falado com a arguida Fátima no GAPP quando foi convidado para integrar a
lista do PS às eleições autárquicas de 1997 e o arguido Horácio encontrava-se ali).
Nunca presenciou qualquer conversa entre os arguidos Fátima e Horácio a
propósito das contas da campanha.
Porém, recorda-se de certa vez, no final de uma reunião no gabinete da arguida
Fátima, do arguido Horácio lhe ter querido mostrar as contas (que interpretou ser da
campanha eleitoral), ao que ela lhe respondeu que as contas estavam bem entregues a
ele (foi na altura em que o arguido Horácio passou de assessor a vereador). O arguido
António Pereira Mesquita de Carvalho estava também presente.
As relações entre os arguidos Horácio Costa e Fátima Felgueiras começaram a
detriorar-se quando o arguido Horácio se manifestou contra a proposta da arguida
Fátima no sentido de que a CMF adquirisse o Estádio Dr. Machado Matos. A esse
propósito ocorreu um jantar na “Pensão Albano” com todos os vereadores (incluindo da
oposição) e a presidente da edilidade, sendo certo que no trajecto para aquele
estabelecimento a arguida Fátima, junto ao edifício da CGD, estando presentes o
depoente e os arguidos Horácio e António Pereira, reagiu mal ao facto de todos
manifestarem oposição a essa proposta, dizendo que quem decidia era ela, avisando os
eventuais dissidentes de que lhes retiraria os pelouros caso fossem vereadores.
Naturalmente que essa advertência foi tida como uma ameaça. Ora só o arguido Horácio
Costa, no dito jantar, abertamente contrariou a posição da arguida Fátima Felgueiras,
justificando essa oposição com o facto de estar “cansado” de receber dinheiro no seu
gabinete para liquidar dívidas do FCF e do arguido Júlio Faria.
No âmbito das suas funções de vereador não tinha autonomia, pois nada se fazia
na CMF sem a autorização e o conhecimento da arguida Fátima Felgueiras.
Normalmente as decisões eram tomadas em reuniões de vereação, mas a última
palavra cabia sempre à arguida Fátima Felgueiras.
Não se recorda de ter desabafado com o arguido Horácio Costa de que “nem
sequer podia pregar um prego numa escola” (apesar de ter o pelouro da educação), mas
admite que possa ter efectuado com ele esse desabafo.
Quanto à autonomia dos demais vereadores julga que ela era partilhada com a
arguida Fátima Felgueiras. Ela tinha sempre a última palavra e intrometia-se no trabalho
dos vereadores. Revelava-se pouco flexível e impunha a sua vontade.
De resto, ela sabe impor-se e as pessoas iam um pouco a “reboque” das ideias
dela. Ela manifestava conhecimento em todas as áreas e enquanto presidente da CMF
tinha de se ingerir nos assuntos dos vereadores. Avocava a si as competências dos
vereadores, de modo que era ela quem praticamente tudo fazia, às vezes sem o
conhecimento do vereador responsável pelo pelouro ao abrigo do qual certa acção era
desenvolvida.

120
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ainda quanto ao modo de agir da arguida Fátima Felgueiras confirmou as


declarações que prestou a fls 7776, 1º e 2º parágrafo.
Não obstante ter tido o pelouro do ambiente quase nenhuma acção desenvolveu
nessa área.
Admite que o problema dos lixos tivessem a ver com o pelouro do ambiente e
que na altura era, ao que pensa, a “Resin” que recolhia e tratava o lixo, operando no
aterro de Sendim.
À pergunta efectuada no sentido de saber se o depoente participou em alguma
reunião entre a CMF e responsáveis da “Resin” respondeu ter participado numa reunião
na lixeira por causa dos lixiviados. Tem a ideia de que os elementos da “Resin” se
deslocavam à CMF para solicitar a efectivação dos pagamentos de facturas apresentadas
por prestadores de serviços nesse domínio.
Era a arguida Fátima Felgueiras quem tratava directamente com a “Resin”, à sua
revelia (não obstante ter o pelouro do ambiente). Ela achava que o depoente não tinha
capacidade para estar com esse pelouro, ignorando, em face disso, por que motivo lho
terá sido atribuído.
Aliás, incomodava-o o facto de por vezes saber que ela estava reunida na CMF
com empresas ligadas ao ambiente sem que ao depoente fosse dado conhecimento
sequer.

- Testemunha Maria Leonor Alves da Costa


Entrou em 1985 para a CMF como auxiliar de serviços gerais.
Em 1997 (ao que pensa), foi substituir a testemunha Cândida no GAPP no
respectivo período de férias (pensa que na 2ª quinzena de Agosto), o que normalmente
também sucedia quando ela faltava muito esporadicamente (era o arguido Bragança
quem a chamava para a substituir). Hoje exerce funções no GAPP.
Referiu que o arguido Horácio Costa não ocupava qualquer gabinete na área
política do edifício da CMF. Tal só veio a suceder quando o Vereador Lickfold
renunciou ao cargo e o arguido Horácio passou a exercer a função de vereador (em todo
o caso, o arguido Horácio, quando se deslocava à CMF, chegou também a utilizar esse
espaço quando o Vereador Lickfold ainda não tinha renunciado e não se encontrava na
CMF, já que este apenas ali se deslocava ou de manhã ou de tarde, ocupando o arguido
Horácio a secretária mais pequena).
Quando a testemunha Cândida regressou de férias no Verão de 1997 ocupou um
gabinete na área política do edifício da CMF.
O arguido Horácio Costa era o responsável pelo Centro Coordenador de
Transportes, sendo certo que sabe que ele dispunha de um gabinete nesse edifício
(nunca o viu porém a ocupá-lo). A sua razão de ciência deve-se ao facto de ter atendido
na CMF potenciais interessados na aquisição de lojas do Centro Coordenador de
Transportes e remetia-os para o arguido Horácio Costa naquele centro.
Além disso, quando o arguido Horácio ia à CMF pedia à Cândida para utilizar o
gabinete que estava atribuído a esta, pois entendia que tinha mais dignidade que o
gabinete de que dispunha no Centro Coordenador de Transportes para receber os
potenciais interessados na aquisição das lojas daquele centro (situação que se verificou
no período compreendido entre o momento em que a Cândida regressou de férias e o
momento em que foi transferida para o Departamento Técnico). Recorda-se aliás que o
arguido Horácio Costa certa vez lhe disse que o seu gabinete no Centro Coordenador de
Transportes era impessoal.
A testemunha David Mota, ao que presume, chegou a partilhar com o arguido
Horácio um gabinete no Centro Coordenador de Transportes. A sua razão de ciência

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

deve-se ao facto de os ver regressar (presumivelmente) daquele centro. Em todo o caso,


à pergunta feita no sentido de se saber se o dito gabinete no Centro Coordenador de
Transportes era ocupado pelo arguido Horácio Costa ou pela testemunha David Mota,
respondeu apenas não saber quem o ocupou em primeiro lugar.
Não conhecia ao arguido Horácio qualquer outra função, sendo certo que nunca
ouviu dizer que ele fosse assessor da arguida Fátima Felgueiras.
A esse propósito foi confrontada com as declarações prestadas perante a JIC a
fls 7812, linhas 14ª a 20ª, tendo referido a esse propósito que só por lapso proferiu tais
declarações, pois estava nervosa e com muita pressão (a posição agora assumida pela
testemunha e a explicação que deu para a discrepância assinalada pareceu-nos
manifestamente inverosímil).
Por outro lado, a propósito das audiências concedidas pela arguida Fátima
Felgueiras, a testemunha Cândida ia buscar os processos de licenciamento e elaborava
uma ficha com as questões que os munícipes iriam colocar nas audiências com a
presidente. Tal sucedeu até à transferência da Cândida para o Departamento Técnico,
por alturas do Natal de 1997.
Esclareceu que o arguido Horácio Costa recebia munícipes uma vez ou outra
quando a arguida Fátima Felgueiras estava ausente. Presume que o fazia por indicação
da arguida Fátima. Ignora quais os assuntos tratados em tais audiências.
Nessas ocasiões o arguido Horácio recebia os munícipes no gabinete que
ocupava na ausência do Vereador Lickefold.
Não sabe precisar se tal já sucedia antes de 1998 (acabou por referir que antes
das eleições autárquicas de 1997 isso não sucedia).
Admite que para se ser assessor da presidente teria de existir confiança política.
Ignora porém de que forma o arguido Horácio Costa foi recrutado.
Ignora qual era o horário de trabalho desse arguido e não se recorda se ele ia à
CMF todos os dias. Porém, se ele se deslocasse todos os dias à CMF naturalmente
cruzar-se-ia consigo todos os dias, o que não sucedia.
Confrontadas com as declarações prestadas perante a JIC a fls 7813, linhas 17ª a
22ª, confirmou-as.
Precisou, a propósito, que o gabinete referido não era do arguido Horácio (tal
afirmação não se coaduna com a afirmação contrária feita perante a JIC) e que já não se
recorda se ele o partilhava com o Verador Lickefold ou com a testemunha Cândida. Isto
é, quando ele tinha necessidade de ali receber munícipes, ele pedia autorização ou ao
Verador Lickefold ou à testemunha Cândida para usar tal espaço (tal depende do
momento temporal em que tal sucedeu).
Ignora se o arguido Horácio guardava o seu arquivo pessoal nesse gabinete.
*
Efectuada uma acareação entre o arguido Horácio Costa e as testemunhas
Fernanda Leal, Terezinha do Nascimento e Cândida Costa, no essencial
reafirmaram a posição já antes expressa acerca do facto do arguido Horácio Costa
ocupar ou não um gabinete no edifício da CMF (como sintoma ao fim ao cabo da
relação de confiança mútua então vivida entre ele e a arguida Fátima).
A esse propósito, com relevo, a testemunha Terezinha do Nascimento
acrescentou que era muitas vezes confrontada com orçamentos de obras apresentados
pelo arguido Horácio Costa (relacionados com património imobiliário da CMF) e por
vezes contactava-o telefonicamente numa extensão interna do edifício onde está
instalada a CMF.
O arguido Horácio Costa referiu que o vereador Lickefold tinha outros interesses
para além da CMF (era por ex. comandante dos Bombeiros Voluntários de Felgueiras),

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

daí que só exercesse funções a meio tempo, sendo certo que ainda assim procurava
empurrar para o depoente os assuntos que a ele competiam porque não estrava disposto
a receber ordens da arguida Fátima Felgueiras.
Tanto quanto lhe permite a memória, ele não terá exercido efectivas funções de
vereador mais do que 6 meses, após o que passava pela CMF sem qualquer assiduídade,
acabando por renunciar ao cargo de vereador ao fim de cerca de 1 ano após ter tomado
posse.
Quando isso sucedeu foi incumbido de tarefas que anteriormente estavam sob a
responsabilidade do Sr. Lickefold.
Esclareceu que quando ocupou esse gabinete o mesmo tinha 1 mesa redonda, 2
sofás, 2 armários, 1 mesa de telefone, sendo certo que o arguido Bragança e a
testemunha Júlio Pereira confidenciaram-lhe que a outra mesa que ali existia tinha ido
para casa da arguida Fátima para ela nela despachar os processos, tendo o GAPP ali
colocado uma mesa nova e 2 cadeiras. A testemunha Cândida, segundo o arguido
Horácio, ocupou a mesa que já lá existia durante o tempo em que ambos ocuparam esse
espaço (a testemunha Cândida referiu que nesse gabinete nunca existiram armários em
madeira enquanto o ocupou e que quando o arguido Horácio lhe pedia para usar esse
espaço usava a secretária mais pequena, sinal de que o gabinete fora-lhe atribuído e que
ele só o usava porque o permitia, posição que o arguido Horácio rejeitou).
Segundo o arguido Horácio, quando a testemunha Cândida de lá saiu, salvo erro,
o arguido Bragança mandou adquirir dois armários e duas cadeiras a condizer com o
mobiliário que tinha ali instalado quando depoente foi ocupar esse espaço por indicação
da arguida Fátima Felgueiras. O depoente procurava acondicionar os seus dossiers o
melhor que pôde nos armários antes existentes e que já estavam atolhados, sendo certo
que entretanto acomodou devidamente os seus dossiers nos novos armários (os quais
dispunham de chave).
A testemunha Cândida entretanto reconheceu que partiu do pressuposto que o
arguido Horácio tinha um gabinete no Centro Coordenador de Transportes (sem
verdadeira razão de ciência, porque nunca o viu a ocupar esse gabinete) e explica o
facto dele por vezes usar o gabinete na CMF referido porque, segundo o que agora
ouviu a esse arguido, o Centro Coordenador de Transportes não estaria concluído.
*
- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro
Disse ser presidente da junta de freguesia de Refontoura desde 14.12.97 até ao
presente (eleito pelo PSD) e, como tal, deputado na Assembleia Municipal de
Felgueiras.
De 24.04.99 até Fevereiro de 2001 foi o presidente da Comissão Política do PSD
local. Integrou a Comissão Política do PSD local de Março de 1996 até há cerca de 3-4
meses, considerando a data da tomada do seu testemunho.
Segundo conversas que ouviu (não soube precisar de quem as ouviu), o arguido
Horácio Costa era assessor da presidente da edilidade. Tal facto aliás era do domínio
público.
Uma das suas funções (do arguido Horácio) era a de receber presidentes de junta
(algumas vezes recebeu o depoente) e transmitia depois à arguida Fátima as
preocupações que nessas reuniões lhe eram transmitidas. Tratavam-se de assuntos de
resolução simples e notou que ele tinha autonomia para os receber. Tem aliás a ideia
que ele o fazia na qualidade de assessor da arguida Fátima Felgueiras.
Assim, por exemplo, uma das situações que tratou com ele numa dessas reuniões
prendia-se com o reforço das comparticipações da CMF às juntas de freguesia.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Horácio Costa estava de resto numa situação de algum privilégio em


relação a qualquer outro funcionário da CMF.
Porém, a partir de meados de 1999 deixou de poder reunir-se com o arguido
Horácio Costa.
Hoje aliás é a própria Fátima Felgueiras quem recebe os presidentes de junta.

- Testemunha José Orlando Dias da Rocha e Sousa


Foi candidato à Assembleia Municipal de Felgueias nas eleições autárquicas de
1993, 1997, 2001 e 2005 (hoje é o presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras).
Nas eleições de 1997 integrou como independente as listas do PS e fez parte da
Direcção de Campanha do PS (de que também fazia parte o arguido Júlio Faria, os
candidatos à Assembleia Municipal e à CMF e os candidados a presidentes de junta).
Alguns membros tinham tarefas especificas, como por exemplo o arguido Júlio
Faria (coordenação), a arguida Fátima Felgueiras (estratégia política) e os arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas (aspecto financeiro da campanha).
Foram os responsáveis máximos do ponto de vista político quem escolheram as
pessoas, designadamente a arguida Fátima Felgueiras, o Sr. Lickfold, o Prof. Edgar, o
Sr. Álvaro Costa, os arguidos Horácio Costa e António Pereira e o Dr. Barros Moura
(este último candidato à Presidência da Assembleia Municipal de Felgueiras). O
depoente, por sua vez, não fazia parte desse grupo.
Os arguidos Horácio Costa e Joquim Freitas eram os responsáveis pela
angariação de fundos para a campanha e pelo pagamento das inerentes despesas.
Como não estava bem por dentro desses assuntos (tanto mais que era
independente) ignora se o aspecto financeiro da campanha eleitoral era processado de
forma independente em relação ao PS.
Em todo o caso, deduz que se movimentaram consideráveis somas de dinheiro
em face da logística financeira existente.
As pessoas davam as suas contribuições em dinheiro ou em cheque e os arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas usavam esse dinheiro para pagar as despesas de
campanha.
Pensa que eles abriram inclusive uma conta bancária, tendo essa ideia na medida
em que a certa altura foi-lhe solicitado que arranjasse rapidamente uns pendões e
bandeiras porque tinha contactos em empresas de publicidade e que poderiam fornecer
esse tipo de material. Ora, o depoente adiantou a quantia necessária para a aquisição
desse material (pois as empresas exigem o pagamento no acto do levantamento do
material em tempo de campanha eleitoral), da qual foi reembolsado através de um
cheque endossado pelo arguido Júlio Faria (que lhe havia prometido o reembolso),
cheque esse que foi entregue pelo arguido Horácio Costa. Não se recorda quem lhe fez a
solicitação, mas lembra-se que lhe foi feita numa reunião da Direcção de Campanha,
quando esta já estava na recta final.
Confrontado com o “post it” de fls 171 (manuscrito pelo arguido Júlio Faria) e
com cópia do cheque de fls 172, no valor de 800 cts e datado de 09.12.97, sacado sobre
a conta do BES titulada pelos arguidos Horácio e Joaquim Freitas, confirmou que o
cheque em causa foi aquele que lhe foi entregue pelo arguido Horácio Costa de modo a
reembolsá-lo da quantia que desembolsara com a aquisição das bandeiras e dos
pendões. Quanto ao “post it” não reconhece a respectiva letra, ignorando quem seja o
“Nequinhas”, sendo certo que a alusão a um tal de “David” se pode reportar a um dos
candidatos à Assembleia Municipal.
Em face do recebimento desse cheque, sacado sobre aquela conta do BES, deduz
que a mesma se reportasse à campanha eleitoral, sendo certo que ouviu dizer que outros

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pagamentos foram efectuados através de tal conta, deduzindo ainda que tal facto era do
conhecimento de outras pessoas ligadas ao PS.
Referiu que é normal que numa campanha surjam necessidades de última hora,
as quais são sentidas em função das ideias que se vão concretizando, incumbindo-se
dessa tarefa normalmente a pessoa que esteja em melhores condições de fazer as
encomendas de material que se revelem necessárias, cabendo depois aos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas proceder ao respectivo pagamento.
Todos os que estavam presentes nessas reuniões sabiam que era assim. Em todo
o caso, os elementos do “núcleo duro” eram mais assíduos (candidatos à CMF, os
primeiros 10 da lista de candidatos à Assembleia Municipal e cinco ou seis candidatos a
presidente das juntas de freguesia mais importantes).
Por que a estrutura montada era composta de voluntários, era normal que se
registassem ausências às reuniões.
Deduz que a arguida Fátima soubesse que os arguidos Horácio e Joaquim Freitas
estavam encarregues de proceder aos pagamentos na medida em que ela era a figura
máxima.
Fez a distinção entre a Direcção de Campanha (que era um grupo mais restrito) e
a Comissão de Apoio à candidatura da arguida Fátima Felgueiras (que era um grupo
bem mais alargado e composto por pessoas da sociedade civil que apoiavam a
candidatura da arguida Fátima e cuja identificação era normalmente divulgada em papel
de formato A4).
O “núcleo duro” é que determinava quais as acções de campanha que deveriam
ser levadas a cabo, bem como a aquisição dos produtos a fim de serem usados em tais
acções.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas tinham autonomia para angariar fundos,
presumindo que tivessem tal autonomia no que se refere aos pagamentos, tanto mais
que faziam parte do “núcleo duro”.
Ignora se mais alguém angariou fundos para além dos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas.
Nas reuniões em que esteve presente não se recorda de alguma vez se ter
debativo questões que se prendessem com o aspecto financeiro da campanha.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se as acções de campanha eram
decididas em função das disponibilidades financeiras referiu que as campanhas
normalmente são geridas de forma irracional, daí os déficites.
Não se recorda de alguma vez os arguidos Horácio Costa e Joquim Freitas terem
alertado para a existência de dificuldades financeiras em face da disponiblidade
necessária para custear certas acções de campanha. Aliás, tais questões eram
secundarizadas. A preocupação centrava-se mais na estratégia política e nas acções de
campanha a levar a cabo.
*
A propósito das declarações prestadas pela testemunha José Orlando Dias da
Rocha e Sousa, o arguido Horácio Costa começou por salientar que desde a abertura do
inquérito que deram origem a estes autos a estratégia da arguida Fátima Felgueiras e das
pessoas que a rodeiam orientou-se no sentido de imputar apenas ao depoente e ao
arguido Joaquim Freitas a responsabilidade pela abertura da conta do BES e pela
angariação de fundos.
Acrescentou que a testemunha Orlando Sousa só foi para o PS depois de corrido
do PSD, segundo ouviu dizer, por se ter aproveitado economicamente nesse partido.
No PS ele não teve qualquer papel de destaque e teve pouco poder de
intervenção.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Movimentou-se nos meandros do FCF.


Fez fornecimentos para a campanha eleitoral respeitante às eleições autárquicas
de 1993.
Chegou a jurar vingança ao depoente.
Todas as manhãs de Domingo, na “Rádio Felgueiras”, ele tinha intervenções que
demonstravam grande animosidade para com a pessoa do depoente.
Não o considera por isso uma testemunha fiável.
Além disso, mantém com a arguida Fátima Felgueiras uma relação de grande
amizade.
Ademais, partir do momento em que tomou posições consentâneas com a
posição da arguida Fátima e de ataque ao depoente conseguiu ascender à presidência da
Assembleia Municipal de Felgueiras.
A propósito da encomenda dos pendões e das bandeiras, assegurou não ter
presenciado a solicitação nesse sentido à testemunha referida, sendo certo que ele
solicitou-lhes (ao depoente e ao arguido Joaquim Freitas) o pagamento da quantia
referente ao preço dos mesmos, pedido a que só acederam quando receberam o “post-it”
de fls 171.
O cheque foi entregue ao “Nequinhas”, que por sua vez o terá entregue à
testemunha Orlando Sousa.
*
- Testemunha Horácio António Magalhães Lopes dos Reis
É vereador da CMF, tendo sido já membro da Assembleia Municiapal, eleito
pela lista do PS nas eleições autárquicas de 1993. Para além disso é administrador de
várias empresas, entre as quais a “Marfel”.
Referiu que fez parte do conselho editorial da revista “Rubias” e que não fez
parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas de 1997 (pelo PS).
Nas reuniões não era assíduo.
*
A propósito destas declarações, referiu o arguido Júlio Faria que a testemunha
em causa, conforme resulta dos documentos que entregou no decurso da audiência de
julgamento alusivas às actas das reuniões onde se definiram os pelouros, fez parte da
direcção de campanha, da comissão coordenadora e do pelouro da comunicação (que
tinha a seu cargo a revista “Rubias”).
Acrescentou que normalmente nas actas constava a indicação das pessoas
presentes nas reuniões, admitindo que a testemunha Horácio Reis não fosse assíduo.
*
A testemunha Horácio Reis reiterou que não fazia parte da direcção de
campanha, sendo certo que o lugar que ocupava na lista do PS para a Assembleia
Municipal não era determinante (ocupava um lugar abaixo do 10º).
O depoente não tratou do que quer que seja que não fosse da revista “Rubias” e
da comunicação social no período de campanha eleitoral.
Por norma, a direcção dos partidos têm regras estatutárias acerca da escolha dos
candidatos.
Confrontado com as actas de fls 12206 e ss., onde o seu nome é referido como
fazendo parte da direcção de campanha, referiu ter sido a primeira vez que viu esse
documento, admitindo apenas que quem elaborou esse documento estivesse a contar
consigo para a direcção de campanha, da qual efectivamente nunca fez parte.
Seja como for, não assinou qualquer um desses documentos nem teve qualquer
intervenção na respectiva elaboração.
De resto, não fazia parte sequer do chamado “núcleo duro”.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nas eleições de 1993 e 1997 não era obrigatória a elaboração de actas das
reuniões.
Nas eleições de 2005 a elaboração dessas actas já era obrigatória (nestas eleições
já fez parte da direcção de campanha).
*
A propósito destas declarações a arguida Fátima Felgueiras referiu que a
testemunha Horácio Reis não fez parte da direcção financeira da campanha nas eleições
de 1997, sendo certo que participou no grupo de trabalho da comunicação social (que
tinha a seu cargo a revista “Rubeas”).
A testemunha em causa, para além disso, fez parte da direcção de campanha e
esteve presente em reuniões onde se definiu a orientação política a seguir nas sessões de
esclarecimento.
Era o secretário-coordenador quem tinha de organizar esses eventos, entendendo
que a divergência de depoimentos é mais de natureza semântica no que diz respeito ao
facto da testemunha em causa ter ou não integrado a direcção de campanha.
Ademais, todas as pessoas que integravam a lista do PS faziam parte da direcção
de campanha (facto que, em todo o caso, não coincide com o teor das actas juntas pelo
arguido Júlio Faria).
Como a depoente raramente ia às reuniões do “núcleo duro” (só ia às reuniões
em que estava em causa a orientação política), não pode precisar se ele fazia ou não
parte desse núcleo.
A testemunha esteve também presente em reuniões de plenário e de orientação
política.
*
Ainda a propósito desta temática, o arguido Horácio Costa salientou que não
reconhece nos documentos de fls 12206 e ss. a natureza de actas das reuniões. Foi o
arguido Bragança quem entregou esses documentos ao arguido Júlio Faria, sendo certo
que o depoente nunca fez quaisquer actas (segundo esses documentos caberia ao
depoente redigí-las, o que nunca sucedeu).
Na ocasião em que estas questões vieram a público o arguido Bragança
organizou uma reunião em sua casa com a testemunha Júlio Pereira, onde fizeram a
composição de documentos e actas (os documentos que foram juntos pelo arguido Júlio
Faria), pelo que não lhes atribui qualquer credibilidade.
Refutou as declarações acima exaradas e pertencentes à arguida Fátima, pois a
direcção de campanha não tinha a abrangência que ela pretendeu transmitir.
Ela era a presidente da Comissão Política do PS local e não existiam quaisquer
actas das reuniões desse órgão.
Nas reuniões eram feitas listas de presenças mas não actas.
Os nomes colocados nos documentos juntos pelo arguido Júlio Faria foram ali
colocados sem o conhecimento dos próprios.
A testemunha Horácio Reis não fez parte da direcção de campanha, sendo certo
que ele não aparecia às reuniões, pois tinha pouca disponibilidade, mesmo para
colaborar com a revista “Rubeas”.
O Jornalista João Ivo era pago pelo grupo que organizava a revista e não através
da conta do BES.
*
- Testemunha Gonçalo Alberto Alves da Costa Magalhães
Referiu ser assistente administrativo especialista na CMF, ao serviço da qual foi
admitido há 21 anos. Além disso, entre 92/93 e 2000/2001, prestou apoio à Comissão
Especializada de Fogos Florestais, a qual era presidida pelo presidente da CMF, e

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

integrava-na um elemento da GNR, elementos das duas coorporações de bombeiros do


concelho (BV de Felgueiras e BV da Lixa), por elementos da “Associação Florestal do
Vale do Sousa” e por um representante da zona agrícola do Vale do Sousa.
Tal comissão tinha uma conta bancária e era o presidente da CMF ou os dois
comandantes de cada uma das coorporações de bombeiros, na ausência daquele, que a
poderiam movimentar (testemunha Luís Queirós, enquanto comandante dos BV da
Lixa, e o Sr. Lickfold, enquanto comandante dos B.V. de Felgueiras).
Os assuntos eram discutidos e decididos nas reuniões dessa comissão.
Era a presidente da edilidade quem geria o dia-a-dia da comissão, mas as
decisões mais importantes eram tomadas nas reuniões, na qual todos os elementos
poderiam participar.
Do depoimento desta testemunha não resultou que a arguida Fátima impusesse a
sua vontade nas decisões tomadas no seio da comissão.

- Testemunha Luís Magalhães Pinto de Queirós


Referiu que é professor aposentado, tendo sido comandante dos B.V. da Lixa
durante 34 anos (até 2001).
Enquanto comandante dos BV da Lixa integrou a “Comissão Especial de Fogos
Florestais” desde a sua criação até 2001.
Integravam essa comissão, para além da presidente da CMF, os dois
comandantes dos B.V. do concelho e um representante dos Serviços Florestais.
Reuniam muitas vezes, sobretudo antes da época dos fogos florestais.
Tal comissão tinha uma conta bancária e o depoente tinha poderes para a
movimentar. Admite que a possa ter movimentado, mas não se recorda se de facto tal
sucedeu.
As decisões eram discutidas e deliberadas em conjunto, sendo certo que
ninguém impunha o que quer que seja.

- Testemunha David Mota Antunes Queirós


Referiu ser funcionário da CMF desde Março/Abril de 1998, exercendo
actualmente as funções de técnico informático.
Esclareceu que trabalhou no Centro de Camionagem entre 1998 e 2001/2002.
Foi militante do PS desde 1994 até 2004 ou 2005.
Foi líder da Juventude Socialista de Felgueiras entre 1998 e 2004. Por inerência,
nesse período foi membro da Comissão Política do PS local.
Na Central de Camionagem coordenava os serviços e organizava o serviço de
condomínio e os transportes que ali operavam.
O seu chefe directo era o arguido Horácio Costa.
Normalmente, quase todos os dias, falava com ele, tanto na CMF como no
Centro de Camionagem.
Segundo presume, o local de trabalho do arguido Horácio Costa era na CMF,
pois dirigia-se lá para falar com ele, sendo certo que ele ocupava um gabinete que era
do Vereador José Carlos Lickfold. Normalmente informava a D. Leonor, a qual estava à
entrada, e que, por sua vez, comunicava ao arguido Horácio Costa a sua presença, tanto
telefonicamente como batendo à porta daquele gabinete. Se ele estava ocupado
esperava, mas normalmente entrava logo. Foi sempre nesse espaço que se encontrava
com ele quando ali se dirigia para lhe falar.
O arguido Horácio Costa dizia-lhe que era assessor da CMF e encarregue do
edifício do Centro de Camionagem. À partida ele era assessor da arguida Fátima
Felgueiras.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Apercebeu-se que ele negociava algum do património imobiliário da CMF,


incluindo as lojas da Central de Camionagem (o depoente dava-lhe apoio
administrativo, daí que tenha conhecimento desse facto).
Ignora se tinha outras funções.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se ele recebia pessoas, referiu que
por vezes ligava para a CMF para saber se este ali se encontrava e ele informava-o para
não aparecer a determinada hora pois estaria ocupado a receber pessoas.
Essas audiências deveriam ser determinadas pela arguida Fátima mas não tem
conhecimento directo desse facto.
Pensa que o arguido Horácio tanto recebia pessoas quando ela estava presente
como quando não se encontrava presente, mas não tem certeza desse facto na medida
em que habitualmente o depoente encontrava-se no Centro de Camionagem.
Presume, em todo o caso, que ele fazia audiências em substituição da arguida
Fátima Felgueiras.
Pelo que o arguido Horácio lhe dizia, ele também recebia presidentes de junta.
À partida o arguido Hrácio teria de merecer alguma confiança por parte da
arguida Fátima, tanto mais que ele fez parte das listas do PS nas eleições autárquicas de
1997, tendo inclusive chegado a desempenhar funções de vereação. Porém, qual o grau
de confiança existente não o pode referir por ignorar.
Quanto à participação do depoente na campanha eleitoral das eleições
autárquicas de 1997, referiu que, enquanto membro da Juventude Socialista, participou
em acções de campanha.
Como tinha à data algum tempo disponível, estava pela sede com colegas da
Juventude Socialista.
Integrou uma comissão que se ocupava da logística e organização da campanha
eleitoral.
A Comissão Política do PS local era presidida pela arguida Fátima.
Havia uma direcção de campanha, composta por exemplo por elementos da
Comissão Política com disponibilidade (por ex., o líder de então da Juventude
Socialista, António Faria; os arguidos Bragança, Joaquim Freitas, Fátima Felgueiras,
Júlio Faria e Horácio Costa e as testemunhas Edgar Silva e Júlio Pereira).
No âmbito da direcção de campanha organizaram-se grupos de trabalho (ex.,
constituíram-se as comissões de estratégia política (composto pelos arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria e o falecido Barros Moura), de logística (composto pelo arguido
Horácio Costa, pela testemunha Edgar Silva e por membros da Juventude Socialista,
entre os quais o depoente) e de angariação de fundos (composto pelos arguidos Horácio
e Joaquim Freitas, e ainda por alguns industriais que não conhecia).
Esclareceu que não fazia parte da direcção de campanha mas chegou a participar
em algumas das suas reuniões.
Tem a ideia de ter estado presente na reunião onde se constituíram os grupos de
trabalho que referiu, reunião essa que foi uma espécie de plenário (reunião mais
alargada, até para ver da disponibilidade de cada um).
Nos plenários a arguida Fátima normalmente estava presente, pelo que é
provável que ela estivesse presente na reunião referida.
A comissão de angariação de fundos é sempre importante, pois da sua acção
vem a possibilidade de financiar uma campanha eleitoral.
O depoente nunca angariou fundos, mas estes eram recolhidos junto de
militantes, simpatizantes do PS e empresários com disponibilidade financeira para o
efeito.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não sabe de que forma essas contribuições eram dadas, mas presume que os
doadores fossem contactados pela comissão de angariação de fundos.
Na comissão de logística, quando se propunha alguma iniciativa havia a
preocupação de perguntar ao arguido Horácio Costa ou ao arguido Joaquim Freitas se
existiam ou não fundos para o efeito.
Essas iniciativas eram propostas em reuniões da direcção de campanha ou
apenas no seio da comissão de logística, a qual gozava de alguma liberdade de acção.
As despesas reportavam-se normalmente a comícios, contratação de artistas e
material de campanha.
Dependendo da iniciativa que se pretendesse levar a cabo, a questão da sua
realização poderia ser discutida no seio da direcção de campanha (normalmente no que
se refere às iniciativas como maior impacto), questionando-se então na reunião se
existia ou não fundos para as realizar.
Os comícios são as iniciativas mais importantes numa campanha. O candidato à
presidência da Câmara Municipal era o principal orador, pelo que sabia o que se iria
passar nesse evento e teria de dar o seu acordo à forma como ele se iria desenrolar.
Se a arguida Fátima concordasse com a estratégia delineada, seguia-se esse
caminho, se não concordasse ela daria a sua opinião e procurava-se chegar a acordo
com a decisão da direcção de campanha.
Existiam pessoas que estavam em desacordo com a posição da arguida Fátima
Felgueiras e expressavam esse desacordo. Várias vezes o depoente manifestou a sua
discordância com ela nas reuniões da comissão política.
A arguida Fátima por norma revelava muito conhecimento acerca de todos os
assuntos e era por isso que por vezes as pessoas não se sentiam à-vontade para dar a sua
opinião, pois receavam não ter um conhecimento tão aprofundado do assunto em causa.
A este propósito a testemunha foi confrontada com as declarações que prestou
perante o JIC a fls 7839, linhas 7 a 13, do 29º volume.
Referiu então que é possível que algumas pessoas, nas costas da arguida Fátima,
criticassem as suas posições e o não fizessem na sua presença. Tal comportamento é
normal, talvez porque essas pessoas estariam mais à-vontade para o fazer perante duas
ou três pessoas e não numa reunião.
Quando perante a JIC referiu que as pessoas tinham receio de a contrariar quis
na verdade dizer que tinham esse receio porque não dispunham da mesma informação
que ela para argumentar de igual modo com a mesma.
Ignora se a comissão de angariação de fundos dispunha ou não de alguma conta
bancária.
Explicou que várias vezes o arguido Horácio lhe pediu para efectuar depósitos
numa conta bancária do BES, não lhe dando qualquer justificação para o efeito.
Foi confrontado com o talão de depósito de fls 7101 do 27º volume, no valor de
250.000$00 (depósito de um cheque do BPA), a 23.12.98, confirmando que a assinatura
constante do talão é sua, assegurando que não lhe foi dada qualquer explicação para
esse depósito.
Foi confrontado com o talão de depósito de fls 7102, do 27º volume, de um
cheque do BPA no valor de 250.000$00, depósito esse efectuado a 24.02.99, referindo
que esse depósito foi efectuado pelo Armindo Brochado (funcionário da CMF – auxiliar
administrativo que prestava apoio ao GAPP).
Foi confrontado ainda com o talão de depósito de fls 7103, fo 27º volume, sem
qualquer assinatura, ignorando que procedeu a esse depósito de 2.000.000$00 em
numerário no dia 15.12.97.
Esclareceu que não relacionou a conta do BES com actividades partidárias.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Só se recorda de efectuar depósitos nessa conta após as eleições de 1997.


A sede do PS passou a dispor de um computador em 2000 ou 2001. Antes disso
o depoente usava o seu computador pessoal de casa para elaborar documentos para o
PS, quanto aos outros elementos, não sabe onde compunham os textos usados pelo
partido.
Esclareceu que entretanto pediu a demissão da Juventude Socialista e que foi
expulso do partido na sequência de um procedimento disciplinar.
Não tem a certeza se o arguido Horácio fazia parte da Comissão Política do PS
local (se não fosse militante não poderia fazer parte dessa comissão), mas tem a certeza
que fazia parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas de 1997.
Não se recorda se devido a assuntos relacionados com essa campanha eleitoral
se dirigiu ao GAPP na CMF, sendo certo que não tinha confiança com as pessoas que
trabalhavam nesse gabinete de apoio.
O arguido Horácio Costa pediu-lhe para pagar a renda da sede do PS em Paredes
(na altura da campanha eleitoral de 1997), o que fez através de um cheque que se
encontrava num envelope. Não reparou na importância.
Sabia que a responsabilidade pelas despesas de campanha era dos arguidos
Horácio e Joaquim Freitas. Não sabe de que forma essas despesas eram pagas.
Julga que eles tinham autonomia para efectuar os pagamentos, pois tinham a
responsabilidade pela parte financeira da campanha.
Recorda-se, por exemplo, que a Juventude Socialista organizou um
acampamento nacional em Felgueiras (em 1998 ou 1999) e o PS pagou a despesa
inerente (pagamento a um grupo musical que fez a animação do evento) através de um
cheque que lhe foi entregue pelo arguido Horácio Costa. Explicou que como a
Juventude Socialista não tinha autonomia financeira, tiveram de pedir o dinheiro aos
elementos do PS. No caso em apreço, solicitou ao arguido Horácio o apoio financeiro
necessário. Reparou que o cheque que ele entregou reportava-se a uma conta titulada
por ele, não sabendo se se tratou ou não de um contributo pessoal da sua parte, sendo
certo que na altura ignorava que ele era titular de uma conta que servia para pagar
despesas referentes a iniciativas do PS, facto que só mais tarde veio a saber através dos
jornais.
À data os responsáveis financeiros do PS local eram o arguido Bragança e a
testemunha Júlio Pereira (eles eram titulares da conta oficial do PS). Não recorreu a eles
porque se sentia mais à-vontade com o arguido Horácio (acabou por referir não se
recordar se na altura rcorreu também aos ditos Bragança e Pereira).
Não se recorda de ter feito o pagamento de pequenas despesas de campanha,
como por exemplo despesas de correio, mas admite que tal facto corresponda à verdade.
Admite que o arguido Bragança e a testemunha Júlio Pereira lhe possam ter
pedido para levar cartas ao correio e que pagou os respectivos selos e outras pequenas
despesas do PS, sendo certo que tais despesas eram normalmente pagas em numerário.
Admite que possa ter recebido dinheiro em numerário do arguido Horácio para
esse fim.
Não se recorda de ter entregue à testemunha Orlando Sousa um cheque de
800.000$00, mas pensa que não.
Para além dos elementos que compunham a comissão de angariação de fundos
esporadicamente alguns industriais auxiliaram os arguidos Horácio e Joaquim Freitas na
recolha de fundos.
Nunca se apercebeu de terem sido entregues donativos no GAPP.
Em finais de 1998 ou já em 1999 foi com o arguido Horácio Costa a algumas
fábricas recolher donativos para financiar actividades do PS.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Após o período eleitoral o arguido Horácio Costa colaborou com o arguido


Bragança e com a testemunha Júlio Pereira na contabilidade do PS.
Relativamente à campanha eleitoral de 1997 fez algumas tarefas por
incumbência do arguido Horácio, o qual lhe deu uma gratificação em numerário.
A única vez que recebeu um cheque da conta do BES foi para pagar a animação
musical no acampamento organizado pela JS, conforme já referiu.
Confrontado com o cheque de fls 178 do apenso 1 (ou fls 382 do 1º volume,
com uma anotação do arguido Horácio), no valor de 100.000$00 e datado de 14.05.98,
sacado sobre a dita conta do BES, reconheceu tê-lo levantado. A esse propósito, admitiu
que tenha auxiliado nalguma tarefa para o “Sovela”, mas não se recorda em concreto
por que motivo tal cheque foi por si levantado.
Confrontado com o cheque de fls 184 do apenso 1, no valor de 200.000$00, de
02.09.98, sacado sobre a conta do BES, emitido à sua ordem, reconheceu também ter
levantado a quantia monetária respectiva, referiu não se recordar a que propósito é que o
fez.
Confrontado com o cheque de fls 161 do apenso 1, no valor de 50.000$00, de
22.01.98, sacado sobre a conta do BES, reconheceu que a respectiva quantia foi por si
levantada. Também no que a este cheque se refere, assegurou não se recordar por que
motivo o levantou.
Em todo o caso, referiu que o arguido Horácio Costa chegou-lhe a emitir
cheques de modo a levantar a respectiva quantia, que depois lhe entregava em mão.
Afirmou então que os cheques em causa não se reportaram a qualquer
pagamento à sua pessoa.
Confrontado com o talão de depósito de fls 73, do 1º volume (depósito de
170.000$00 a favor do arguido Júlio Faria, a 28.01.99), referiu não reconhecer a
assinatura de quem fez o depósito.
Confrontado com o talão de depósito de fls 74, do 1º volume, datado de
15.02.99, no valor de 57.090$00, reconheceu que apôs a sua rúbrica nesse documento,
mas não se recorda por que motivo efectuou esse depósito.
Esclareceu que sabia que a conta do BES era titulada pelo arguido Horácio, mas
não sabia para o que servia.
Não se recorda se recebeu do arguido Horácio algum dinheiro para pagar as
despesas do “ralypaper” (iniciativa da campanha eleitoral de 1997, onde foram
distribuídos troféus, artefactos que terão sido encomendados e pagos por alguém, que
neste momento não sabe precisar).
*
Em face das declarações da testemunha David Queirós o arguido Horácio Costa
assegurou que aquele tomou conhecimento da conta do BES porque foi portador de
dezenas de cheques para pagamento a credores no âmbito da campanha eleitoral e de
despesas do “Sovela” e do PS.
Ele aliás chegou a deslocar-se à fábrica do arguido Joaquim Freitas com cheques
da conta do BES para colher deste a respectiva assinatura.
Nunca a testemunha David lhe entregou um tostão sequer dos cheques que
levantou dessa conta.
No que se refere ao cheque de fls 178 do apenso 1, assegurou que serviu para
pagar a embalagem e a ensacagem do “Sovela”, conforme anotação que apôs na
fotocópia desse cheque, conforme documento de fls 382 do 1º volume.
Acrescentou a esse propósito que a testemunha em causa arranjou elementos da
Juventude Socialista para fazerem esse serviço, tendo-lhes pago as horas de trabalho
despendidas através da entrega desse cheque ao David Mota.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A referida testemunha sabia que o depoente não era militante do PS e que era
convidado por elementos do PS local nas iniciativas partidárias.
Quando conheceu a referida testemunha ele era colaborador de António Faria, à
data líder da JS, e como este não tinha grande disponibidade, era substituído pelo David
nas reuniões da Comissão Política do PS local.
Mais tarde ele assumiu a liderança da JS.
Foi ele quem organizou o “ralypaper” e comprou os troféus, ao que pensa, em
Barrosas.
Ele também organizou em Stª Quitéria jogos de “paintball” com elementos da
JS.
Sob as ordens do arguido Júlio Faria ele organizou na Escola Preparatória
Manuel Faria e Sousa um evento com jovens (jantar cozinhado nesse estabelecimento
de ensino, com animação), sendo certo que se tratava de um evento da JS.
Ele efectuou vários pagamentos em cheques e em numerário, como por
exemplo:
- Numa loja dos 300, adquiriu baldes do lixo, esfregonas, produtos de limpeza e
cestos para colocar guarda-chuvas;
- Pagou a grupos folclóricos;
Ele abria e fechava a sede de campanha da arguida Fátima Felgueiras;
Era ele quem conferia a entrega dos brindes e conferia com o depoente e o
arguido Joaquim Freitas o respectivo pagamento.
Era a testemunha em causa quem comprava os jornais diários e os colocava na
sede de campanha e para fazer face a essa despesa o depoente retirava o dinheiro (em
numerário) da gaveta no seu gabinete, conforme aliás a testemunha David várias vezes
observou.
Sempre soube que o depoente obedecia a ordens.
Solicitou-lhe o pagamento de eventos organizados por ele, como foi o caso do
acampamento referido, sendo certo que ele foi ter com o depoente porquanto, segundo
lhe disse, tinha instruções da Comissão Política para que esse pagamento fosse
efectuado.
Ele chegou a esperar várias vezes que o depoente tirasse fotocópias dos cheques
que ia emitindo, antes de lhos entregar para efectivar o depósito.
É falso que vários empresários – com a excepção das pessoas que referiu –
tenham auxiliado o depoente na recolha de fundos.
Na Comissão Política do PS discutiu-se a colocação de uma aparelhagem de
som num carro de modo a fazer propaganda política no âmbito da campanha de 1997,
sendo certo que foi a testemunha David quem tratou do assunto, falando com o Sr.
Queirós, tendo posteriormente entregue ao depoente o documento respectivo, com base
no qual foi efectivado o pagamento dessa despesa.
A arguida Fátima queria que mais carros do género circulassem, pelo que alguns
empresários disponibilizaram viaturas das suas empresas para esse efeito, sendo certo
que o David chegou a conduzir várias dessas viaturas, tendo sido advertido pelo
depoente e pelo Joaquim Freitas que o combustível deveria ser pago com dinheiro da
gaveta ou então, se adiantasse o dinheiro, seria posteriormente reembolsado, sendo-lhe
vedado pagar o combustível solicitando recibos em nome das firmas que
disponibilizaram as viaturas.
Nesse período ele chegou a distribuir o “Sovela” numa carrinha do arguido
Joaquim Freitas.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha David participava nas reuniões, mas não participou nas reuniões
mais importantes, onde era definida a estratégia e onde eram tomadas as decisões mais
importantes.
Ele aliás muitas vezes teve de esperar pelo fim dessas reuniões do “núcleo duro”
para poder fechar a sede de campanha.
Confirmou que o encarregou de pagar uma renda da sede de campanha em
Paredes no “Minipreço” (senhoria daquele espaço).
Conforme já referiu antes, ele foi compensado monetariamente pelo auxílio que
prestou.
Em 1997 a testemunha David não tinha qualquer relacionamento com o arguido
Bragança e não era este quem lhe dava instruções para ir ter com o depoente a fim de
serem efectivados os pagamentos dos eventos organizados pela JS.
Na Comissão Política mandava a arguida Fátima Felgueiras, pelo que quando a
testemunha lhe solicitava algum pagamento o depoente só o poderia fazer com
autorização daquela.
*
Em face destas declarações do arguido Horácio Costa, a testemunha David
Queirós referiu que os jornais eram recebidos na sede de campanha e o depoente ou os
jovens faziam a respectiva distribuição nos pontos de interesse.
Poucas vezes conduziu carrinhas com equipamento de som próprio para a
divulgação pelas ruas da propaganda política (conduziu uma “Renault Express” da
firma do arguido Joaquim Freitas e uma carrinha “Toyota” de outra empresa). Admitiu
que o pagamento do combustível era feito conforme referido pelo arguido Horácio.
É verdade que chegou a esperar que o arguido Horácio tirasse fotocópias dos
cheques emitidos, antes de lhe serem entregues.
Manteve contudo que chegou a levantar quantias da conta do BES as quais
posteriormente entregou ao arguido Horácio.
A iniciativa levada a cabo numa escola preparatória (evento referido pelo
arguido Horácio) partiu de uma proposta da JS e poderá ter sido sugerida pelo arguido
Júlio Faria. Essa proposta foi apresentada à direcção de campanha, onde foi aprovada tal
iniciativa. Negou, em todo o caso, que o arguido Júlio Faria tivesse encaminhado o
depoente ao arguido Horácio Costa de modo a que a despesa fosse paga.
Foi o arguido Horácio quem lhe deu o dinheiro (em numerário) para que o
depoente pudesse ir à dita loja dos 300 adquirir os produtos referidos por aquele
arguido.
Não se recorda de alguma vez ter pago qualquer quantia a ranchos folclóricos.
Os brindes que entravam na sede de campanha eram de facto conferidos por si e
distribuía-os conforme instruções que recebia do arguido Horácio Costa, não passando
pelo depoente o pagamento desses brindes.
Quanto ao “rallypaper”, tratou-se de uma iniciativa aprovada pela direcção de
campanha sob proposta da JS, sendo certo que se recorda agora que os troféus foram
adquiridos pelo líder do núcleo de Barrosas da JS.
Acrescentou que o PS dispunha de uma aparalhagem de som que estava
avariada. Após a campanha eleitoral decidiu-se mandar repará-la, pelo que, segundo
instruções ou do Júlio Pereira ou do arguido Bragança, foi pedido um orçamento.
Entretanto deram-lhe a indicação para adquirir uma aparelhagem nova e que
fosse ter com o arguido Horácio para que a mesma fosse paga.
Em 1998 assumiu a liderança da JS. Antes disso era o braço direito do líder da
JS, contactando por isso com o arguido Bragança.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Sabia que o arguido Joaquim Freitas tinha uma fábrica em Torrados, tendo-se
deslocado algumas vezes à mesma para ir buscar a carrinha “Renault Express” a fim de
ser usada a propósito de várias campanhas eleitorais, não se recordando de ali se ter
deslocado por qualquer outro motivo.
Não se recorda de ter ido à empresa do arguido Joaquim Freitas para colher a
sua assinatura, mas admitiu que tal possa ter sucedido. Seja como for, se tal sucedeu, os
cheques iam acondicionados num envelope, o qual deveria entregar ao dito Joaquim
Freitas, envelope esse que umas vezes ele devolvia e outras vezes não. Tem pois a ideia
de ter levado envelopes à fábrica do arguido Joaquim Freitas (mas acabou por referir
que o memso não lhe era devolvido). Não se recorda que tipo de envelopes eram esses,
que por vezes levou à fábrica do arguido Joaquim Freitas. Situa esse faco por alturas da
campanha eleitoral de 1997 ou em momento posterior.
Sabe que os cheques da conta do BES eram assinados por duas pessoas, mas à
data não reparou nesse facto quando lhe foram entregues cheques dessa conta pelo
arguido Horácio.
O arguido Horácio Costa solicitou-lhe várias vezes que procedesse ao
levantamento de cheques de outras pessoas, presumindo que se tratavam de donativos,
tendo-lhe posteriormente entregue a correspondente quantia monetária.
É possível que tivesse auxiliado na ensacagem e embalagem do “Sovela”, mas
por esse trabalho nenhuma compensação monetária recebeu.
Porém, conforme se pode verificar a fls 357, consta um pagamento de
100.000$00 com a indicação de que foi efectuado ao depoente.
Assegurou porém que tal facto não corresponde à verdade.
Admite contudo que os jovens (entre dois a quatro) que auxiliaram nessa
operação de ensacagem e embalagem de duas ou três edições do “Sovela” tenham sido
gratificados e que eventualmente tivesse recebido esse dinheiro para lhes dar. A
testemunha porém acabou por afastar esta hipótese (que aliás foi por ele levantada).
Confrontado com o documento de fls 383, dirigido ao arguido Horácio e
respeitante ao preço da ensacagem (orçamento) por semana (7.000$00 por semana, num
total de 14.000$00 por duas semanas), com a anotação (aposta pelo arguido Horácio) de
pagamento e com a indicação do respectivo cheque, com o qual foi também confrontado
(cuja cópia consta de fls 382, no valor de 100 cts e onde consta uma anotação de que foi
para pagar duas semanas de ensacagem do “Sovela” e para pagar contas residuais da
campanha), confirmou ter sido por si levantado (tal cheque não é traçado, pelo que pode
ser levantado).
Confrontado com o cheque de fls 384, constatou-se que se trata de um cheque
traçado, no valor de 103.683$00, de 04.05.98 (dstinado ao pagamento de uma empresa
de embalagens).
Confrontado com o cheque de fls 385 a 387 constatou-se que se tratam
igualmente de cheques traçados e, como tal, foram depositados.
Perguntado acerca de um tal João Ivo, referiu tratar-se de um colaborador do
“Sovela”, não sabendo de que forma era pago.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa esclareceu que, ainda a
propósito do cheque de fls 382, no valor de 100 cts e datado de 14.05.98, o mesmo foi
emitido a favor da testemunha David de modo a que ele levantasse o dinheiro e
procedesse ao pagamento aos jovens que o auxiliaram a ensacar e embalar o “Sovela”, o
que saiu mais barato para o dito jornal. Crê que ele também ficou com algum desse
dinheiro.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Anotou também na cópia desse cheque que o mesmo também se destinou a


pagar algumas contas residuais. Tal cheque não foi traçado para que o David pudesse
levantar a respectiva quantia e assim pudesse proceder aos pagamentos.
Por vezes os credores pediam para que os cheques não fossem traçados na
medida em que, necessitando do dinheiro, não os queriam depositar.
O documento de fls 383 (de 29.05.98) reporta-se a um orçamento de uma
empresa e prendia-se com o facto de se ter optado por enviar o jornal para ensacar numa
empresa durante duas semanas, pelo preço de 14 cts, já que a experiência com os jovens
correu mal.
O cheque de fls 384 (traçado, datado de 04.06.98, no valor de 103.683$00) foi
emitido para pagar a outra empresa pela embalagem do “Sovela”, já que a outra
empresa tinha falido entretanto.
O João Ivo era funcionário do “Sovela” e recebia um salário, o qual era pago
através da conta do BES, segundo instruções que recebeu, daí que a esse propósito
tenha emitido cheques traçados.
Confrontado com o teor do cheque de fls 161 do apenso 1, no valor de
50.000$00 e datado de 22.01.98, o qual não se mostra traçado, explicou que o emitiu a
favor do David para o remunerar na medida em que ele ficou durante algum tempo com
a responsabilidade de desmantelar a sede de campanha.
Já no documento de fls 258 do apenso 4 consta o nome de vários jovens que
deram o seu contributo para a campanha eleitoral e que por isso receberam uma
gratificação, entre os quais a testemunha David Queirós. À frente de cada um dos nomes
consta a gratificação concedida (o David recebeu 100 cts).
Já o cheque de fls 184 do apenso 1, datado de 02.09.98 e no valor de
200.000$00, foi entregue à testemunha David a fim de o entregar ao Dr. Sousa Oliveira
e correspondia a 50% do valor do preço de venda da viatura “Citroën BX” referida nos
autos, cheque esse que foi emitido em face das ordens recebidas da arguida Fátima
Felgueiras.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se acondicionava os cheques num
envelope que entregava à testemunha a fim de os ir levar ao arguido Joaquim Freitas
esclareceu que no seu gabinete, na presença da testemunha David, tirava o livro de
cheques da gaveta e colocava-o num envelope, pedindo então para ele os levar ao
arguido Joaquim Freitas a fim de os assinar. Informava-o de quantos cheques levava e
que eram para o arguido Joaquim Freitas os assinar. Depois de assinados por este, a
testemunha David devolvia-os ao depoente. Consequentemente, o David bem sabia que
levava aqueles cheques a fim de serem assinados pelo arguido Joaquim Freitas, sendo
certo que o depoente nada tinha a esconder da dita testemunha, segundo assegurou.
No que se refere à aquisição da aparelhagem ao Sr. Queirós, referida pela
testemunha David, chamou à colação o documento de fls 217 e 218 do apenso 4, o qual
se trata da factura respectiva.
Ainda sobre o acampamento organizado pela JS no Parque de Campismo de
Vila Fria, esclareceu que se tratava de um parque camarário e que estava sob a alçada
do arguido António Pereira Mesquita de Carvalho. Recorda-se que certa ocasião a
arguida Fátima deu instruções ao arguido António Pereira para “pôr aquilo em
funcionamento” de modo a que o espaço fosse rentabilizado e foi então que ele sugeriu
que a JS poderia promover ali alguma iniciativa, a qual viria a ter lugar conforme já
referido, tendo sido o depoente quem liquidou os custos.
Ainda a propósito das carrinhas usadas na campanha e disponibilizadas por
empresários felguerenses, referiu que o Sr. Pinto (empresário que tem a sua empresa
sediada em Revinhade) foi um dos empresários que disponiblizou uma carrinha (a

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

testemunha David apenas confirmou ter-se deslocado a uma empresa em Revinhade


para ir buscar uma carrinha, mas não se lembra do nome do respectivo empresário).
Ainda a propósito da compra dos troféus para o “rallypaper”, acrescentou que
foi a testemunha David Queirós quem lhe entregou o documento de fls 598 do3º volume
(daí que, ao que se depreende, tenha presumido que tenha sido ele), precisando agora
que ignora quem adquiriu esses troféus.
A testemunha David fez muitos depósitos na conta do BES (por ex., um depósito
de 250 cts, conforme documento de fls 195 do apenso 1, a seu mando, não se
recordando por que motivo esse depósito foi efectuado, mas deveria respeitar a um
donativo).
O depoente instruia a testemunha em causa para depositar os cheques na “conta
da campanha”, pois era sempre assim que se referia a essa conta.
Recorda-se que a certa altura o arguido Bragança chamou à CMF uma senhora
que fornecia e instalava cortinados, tendo-a levado à sede de campanha e combinado
com ela os cortinados e os varões a colocar nesse espaço, os quais foram efectivamente
colocados.
Chegado o momento de proceder ao pagamento, ela foi informada de que era da
conta da campanha que obteria o pagamento e que se deveria dirigir ao depoente no
sentido de obter o respectivo pagamento pois era o responsável por essa conta.
Era assim com todos os credores, razão pela qual era procurado por eles no
sentido de lhes pagar.
*
A testemunha David Queirós, por turno, ainda a propósito do documento de fls
184 do apenso 1, reafirmou não se recordar porque razão procedeu ao levantamento
desse cheque.
Acrescentou, em todo o caso, que “usaram da sua inocência” para ir levantar
dinheiro.
Nunca entregou qualquer quantia ao Dr. Sousa Oliveira.
Não sabe se os jovens que ensacaram o “Sovela” foram ou não remunerados
(pensa em todo o caso que não).
Foi-lhe dito que o “Sovela” estava com dificuldades financeiras, daí que o
auxílio prestado fosse gratuito.
Mantém que nunca teve conhecimento que a conta do BES era a conta da
campanha das eleições ocorridas em 1997. Sabia que o arguido Horácio era titular dessa
conta, sendo certo que ele não se referia a ela como sendo a conta da campanha.
Não se recorda do arguido Horácio lhe ter dito para levar cheques ao arguido
Joaquim Freitas a fim deste os assinar.
Não se recorda se levava e trazia de volta alguns dos documentos que
transportava acondicionados em envelope (antes havia referido que só os levava e que
não os trazia de volta, possibilidade que agora admite).
Explicou que se tratava de assuntos a que não deu importância, pelo que não os
memorizou.
Acrescentou que quando o arguido Joaquim Freitas não se encontrava na sua
empresa, deixava o envelope com alguém da recepção da fábrica. O arguido Horácio
queria porém que o depoente os entregasse pessoalmente ao arguido Joaquim Freitas.
À pergunta efectuada no sentido de saber se o depoente aguardava que o arguido
Joaquim Freitas lhe devolvesse o envelope, referiu que podia ficar um pouco à conversa
com ele, mas não se recorda de ter aguardado que ele lhe devolvesse algo, hipótese que
porém agora não descarta.

137
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Reconheceu que fez vários depósitos na conta do BES conforme já referido e, se


bem se recorda, efectuou também um depósito na conta pessoal do arguido Júlio Faria.
No que respeita à quantia de 50 cts que o arguido Horácio referiu terem sido
recebidos pelo depoente (cfr. documento de fls 161 do apenso 1 – cheque de 50 cts,
datado de 22.01.98), explicou que a quantia monetária em causa não era para si, porque
só recebeu uma gratificação de 100 cts do arguido Horácio no final da campanha
eleitoral, quantia que presume ter sido proveniente dos donativos efectuados para a
campanha. Ignora quem tomou a decisão de o gratificar. O arguido Horácio referiu-lhe
que ia ou que já tinha gratificado outras pessoas.
É possível que quando fez depósitos na conta do BES soubesse que se tratavam
de donativos, pois sabia que o arguido Horácio era responsável pela angariação de
fundos, mas a conta do BES poderia ser uma conta pessoal dele que fosse usada para
aquele fim (tinha a noção que ela era usada para o depósito de donativos e para o
pagamento de despesas de campanha).
No que se refere ao talão de depósito de fls 141 do apenso 1 (no valor de 2.000
cts, efectivado a 15.12.97) referiu não reconhecer a letra.
Os responsáveis pela parte financeira da campanha eram os arguidos Horácio e
Joaquim Freitas e, que saiba, eles não prestavam contas a quem quer que seja, mas se as
prestassem não tinha de ter conhecimento desse facto.
Noutras campanhas (que não a de 1997) levantou cheques de donativos e
entregou a respectiva quantia ao arguido Horácio, conforme instruções que recebia dele.
*
O arguido Horácio Costa chamou então à colação o teor do documento de fls
357 (relação dos pagamentos de despesas do “Sovela”, a qual foi feita ao longo do
tempo, à medida em que os pagamentos eram processados), na qual foram incluídos os
100 cts entregues ao David para pagar a ensacagem do jornal.
Quanto o depoente se demitiu da ADEC entregou cópia da relação dos
pagamentos com os respectivos comprovativos ao arguido António Pereira Mesquita
Carvalho, o qual, por sua vez, a entregou à testemunha Horácio Reis numa reunião da
ADEC ocorrida em Setembro ou Outubro de 1999.
A dita cópia foi enviada com a missiva cuja cópia se acha a fls 422, dirigida ao
arguido António Pereira Mesquita Carvalho.
*
- Testemunha Adelino José Magalhães Leite
Referiu ser funcionário da CMF desde 1991, sendo desde 2002 (mais ou menos)
o chefe da Divisão de Apoio Operativo (com responsabilidades pelas viaturas da CMF).
Explicou que desde 1991 até cerca de 2002 foi o chefe da Divisão dos Serviços
Urbanos (incluía o serviço de recolha do lixo e o seu vasadouro).
Tem formação em engenharia electrotécnica.
A Divisão dos Serviços Urbanos estava integrada no Departamento Técnico, o
qual na altura era chefiado pelo arguido Barbieri Cardoso.
Quando iniciou funções na CMF a recolha do lixo era feita por viaturas da
autarquia adaptadas para o efeito, lixo esse que era vasado directamente na lixeira
municipal (em Sendim).
Sempre conheceu o terreno onde estava implantada a lixeira como a lixeira
municipal.
Tratava-se de um foco de poluição, sendo certo que quando se procedia à
queima dos resíduos na estrada nacional apenas se circulava com os faróis acesos.
Recebia muitas queixas da população em face dessa circunstância.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em 1993 ou 1994 foi-lhe comunicado que tal lixeira iria ser controlada (foi ou o
arguido Barbieri ou o arguido Júlio Faria que lho terão comunicado).
A recolha do lixo iria ser feita pela “Resin”, com viaturas novas para esse fim,
com um aumento significativo dos contentores e dos circuitos de recolha (que se
alargou praticamente a todo o concelho).
Essa recolha do lixo pela “Resin” começou em 1994 ou 1995.
Aquando da definição dos circuitos de recolha e frequência de recolha travou
conhecimento com o arguido Vítor Borges e com a Engª Claudia Ribeiro (em reuniões
que tiveram lugar nos Serviços Operativos).
O depoente não teve qualquer intervenção nos concursos efectuados nem
controlou a execução das obras na lixeira.
De facto, sobre essa matéria nada sabe, nem tinha de saber, na medida em que o
lançamento dos concursos e os projectos de obras não faziam parte das suas atribuições,
já que eram matéria do planeamento, assunto directamente tratado pelo director do
Departamento Técnico (o arguido Barbieri Cardoso).
Era porém a sua Divisão que controlava a recolha do lixo pela “Resin” (quando
deixou ela própria de proceder a essa recolha).
Nessa medida, passava regularmente pelos locais de recolha do lixo e verificava
se havia sido recolhido ou não. Passou também o depoente a controlar a qualidade da
recolha do lixo.
Quanto ao seu vasamento, uma ou duas vezes por mês dirigia-se à lixeira para
verificar se existiam condições para a deposição do lixo.
Presenciou várias máquinas a trabalhar no local, não se preocupando em saber
quem em concreto operava no local, não se recordando de ver nessas máquinas qualquer
alusão à firma a que pertenciam.
Ao fim de algum tempo de intervenção (que não precisou) foi colocado um
controle de entrada, facto de que se recorda porquanto teve de se identificar para entrar
na lixeira, sendo certo que o funcionário que ali estava disse-lhe que trabalhava para a
“Resin”.
Constatou a execução de plataformas e a deposição do lixo na mesma, sendo
certo que era o Departamento Técnico da CMF que controlava a boa execução dos
trabalhos (designadamente o Eng. José António Ferreira e o Eng. Almeida, não sabendo
se a Engª Neri exerceu também fiscalização dessa obra).
Desconhece se algumas reuniões tiveram lugar na CMF com elementos da
“Resin” (salvo naquelas em que participou a propósito da frequência e da definição dos
circuitos de recolha do lixo).
Diariamente contactava com um encarregado da “Resin” (como por ex. o Sr.
Cunha, encarregado da “Resin” no que se refere à recolha do lixo, o qual prestava o seu
serviço nos Serviços Operativos da CMF, onde o depoente também prestava o seu
serviço, sendo certo que os encarregados não eram sempre os mesmos; recorda-se ainda
do Sr. Faria, outro dos encarregados da “Resin” que por ali passaram).
Não tem memória de na lixeira ter visto qualquer logotipo alusivo à “Resin”.
Assegurou que a sua Divisão não executou qualquer obra na lixeira.
Segundo foi informado, quem executava as obras nesse local era a “Resin”.
Não lhe competia visar as facturas referentes aos trabalhos ali efectuados, tanto
mais que nem sequer sabia quais eram os valores da adjudicação.
Na lixeira o depoente nunca levantou qualquer objecção quanto à qualidade dos
serviços ali prestados (controlava apenas a deposição do lixo, nada sabendo acerca da
execução dos demais trabalhos na lixeira, até porque desconhecia o respectivo projecto).
Com a intervenção da “Resin” o lixo deixou de ser queimado.

139
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nunca ouviu falar das firmas “Norlabor” e “João Tello”, sendo certo que sabe
que a “Translousada” repara equipamento pesado, pois executou já serviços para a CMF
nessa área (ao que pensa, em 1998 ou 1999 reparou uma máquina retroescavadora e
uma máquina autoniveladora da CMF). Ignora se essa empresa aluga esse tipo de
equipamentos.
Nunca ouviu qualquer menção que relacionasse essas empresas com a lixeira de
Sendim.
Na lixeira, para além do porteiro, não se recorda de ali ver alguém a trabalhar
que fosse funcionário da “Resin”.
Na portaria existia uma balança ligada a um computador para pesar o lixo que
era admitido. Ignora se essa informação era comunicada à CMF a fim de que fosse
cobrada uma taxa a quem ali recorria para depositar resíduos.
*
Referiu o arguido Barbieri Cardoso que a testemunha Adelino Leite nunca
abriu qualquer concurso, mesmo em obras que diziam respeito a áreas da sua
responsabilidade (como por exemplo o saneamento).
A testemunha em causa não visou as facturas da “Resin” respeitantes aos
trabalhos na lixeira, pois apenas competia-lhe visar as facturas apresentadas pela
“Resin” no que se refere à recolha do lixo.
Crê que os carros de recolha do lixo tinham o logotipo da “Resin”, assim como
os contentores de recolha. Na lixeira existia também o logotipo da “Resin” conforme
aliás ilustrado em fotografias juntas aos autos.
*
A testemunha Adelino Leite confirmou que apenas visava as facturas referentes
à recolha do lixo e que o logotipo da “Resin” encontrava-se nos carros de recolha do
lixo e em quase todos os contentores.
Explicou que também fazia projectos para clientes, pois foi sócio de duas
empresas que se dedicavam ao ramo imobiliário e a projectos de electricidade e
telefones (firmas “Imoreactiva” e “Reactiva”).

- Testemunha Cláudio Pedro Ribeiro Barreto Marques


Explicou que era o sócio-gerente da firma Barreto Marques, Unipessoal, Ldª”, a
qual tinha como objecto o marketing e a comunicação, dedicando-se à elaboração de
trabalhos de design gráfico (designadamente no âmbito de campanhas políticas).
Fizeram trabalhos e forneceram material para a campanha política do PS de
Felgueiras nas eleições autárquicas de 2001 (conceberam logotipos, outdoors e cartazes
e forneceram material de campanha).
Para o efeito contactaram a arguida Fátima Felgueiras na CMF (o depoente e o
seu pai), oferecendo os seus préstimos, tendo-lhe exibido um portfólio demonstrativo do
seu trabalho executado noutras campanhas eleitorais. Recorda-se que foram recebidos
num gabinete no 1º piso, mas que não era o gabinete da presidente. Estava presente o
Sr. Júlio e talvez o Dr. Victor. Ficaram de desenvolver uma linha gráfica e se a mesma
agradasse seriam contratados, o que veio a suceder.
O progenitor do depoente era o elemento que tinha know how na área das artes
gráficas, sendo ele quem ia às reuniões.
Nesse âmbito, recorda-se dos Srs. Júlio e Victor e da arguida Fátima Felgueiras.
Inicialmente desenvolveram uma linha gráfica e posteriormente foram
fornecendo material, como por ex. pins, bonés t-shirts e canetas, o que ascendeu a cerca
de 5.200.000$00.
A encomenda foi feita pelos referidos Fátima Felgueiras, Sr. Júlio e Dr. Victor.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente participou em reuniões onde se tomaram decisões acerca do logotipo


da campanha, designadamente no que respeita à sua côr.
Falou com a arguida Fátima (certa ocasião em que a encontrou) para lhe pedir a
opinião acerca da imagem que da sua pessoa deveria ser colocada por ex. em t-shirts.
Não foi convocada qualquer reunião para esse efeito, apenas a encontrou por acaso e
aproveitou a oportunidade para a abordar acerca do assunto referido. Aliás, o depoente
não foi convocado para qualquer reunião com a arguida Fátima.
Por vezes as decisões eram tomadas na sede do PS local, em reuniões onde
estava muita gente (não sabe os respectivos nomes).
O pagamento dos seus serviços e do material fornecido foi efectuado através de
duas letras aceites pelo Sr. Sidónio Ribeiro, entretanto reformadas, pelo que tiveram
dificuldade em receber o pagamento respectivo. Antes disso perguntaram a elementos
da campanha de que forma iriam receber, tendo sido remetidos para aquele Sr. Sidónio,
o qual foi entretanto contactado, não sem antes terem pedido o dinheiro ao Sr. Júlio.
Seja como for, não solicitou o pagamento à arguida Fátima (não sabe se o seu
pai o fez), nem com ela teve qualquer encontro a esse propósito.
Em todo o caso, o seu pai disse-lhe que falou com ela a respeito da reforma das
letras e que ela o tranquilizou dizendo que esse assunto já estaria resolvido.
É normal os candidatos não se envolverem nas questões financeiras da
campanha eleitoral, em face da experiência profissional que tem. Acreditou por isso que
ela partisse do pressuposto de que esse assunto já estivesse resolvido.

- Armindo Álvaro Pimenta Brochado


É funcionário camarário desde Maio de 1998, exercendo funções no GAPP
desde Agosto desse ano até às últimas eleições (em 2005).
O depoente era militante do PS, pertencendo à data à Juventude Socialista e,
como tal, participou na campanha eleitoral referente às eleições autárquicas ocorridas
em 1997.
Foi candidato à Assembleia de Freguesia da freguesia onde vivia.
Ignora se depois de terminada a campanha eleitoral foram efectuados
pagamentos referentes a despesas relacionadas com ela.
Nunca foi da sua responsabilidade o pagamento de despesas de campanha, nem
sabia sequer quem tratava desses assuntos.
Não se recorda de ter levantado ou depositado cheques relacionados com essa
matéria.
Não se recorda de ir aos CTT enviar correspondência relacionada com acções de
campanha.
Confrontado com o documento de fls 200, do apenso 1 (igual ao documento de
fls 7101), respeitante a uma cópia de um talão de depósito na conta do BES de 250 cts,
a 24.02.99 pelas 10h56m, confirmou ter sido esse talão preenchido pelo depoente.
Porém, afirmou não saber que conta é aquela a que diz respeito o depósito, presumindo
que se trata de uma conta pessoal do arguido Horácio Costa. Deve tê-lo feito a pedido
desse arguido.
Era normal à data (em 1999) o depoente ir à rua fazer todo o tipo de serviços
relacionados com o GAPP.
Em todo o caso, o arguido Horácio nada tinha a ver com o GAPP.
Porém, não lhe ia negar a realização desse pedido de depósito.
Os credores dirigiam-se às pessoas que faziam parte do “grupo financeiro” a
propósito de despesas de campanha (de 1997), mas à data não sabia quem o compunha

141
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

(só mais tarde é que ficou a saber que os arguidos Horácio e Joaquim Freitas faziam
parte desse grupo, quando toda esta questão veio a público).
Confrontado com o talão de depósito na conta do BES, no valor de 250 cts,
constante de fls 7102 e 7103, reconheceu ter preenchido esse talão (igual ao de fls 200
do apenso 1), referiu que era o arguido Horácio quem lhe dava os elementos para
proceder ao respectivo preenchimento. Por vezes o talão de depósito já estava
preenchido. Reafirmou que presumia que essa conta era uma conta pessoal do arguido
Horácio Costa, pelo que partia do pressuposto que lhe fazia um favor, sendo certo que
entendia que na CMF ele era seu superior por à data partilhar um gabinete com um
vereador (Lickefold).
É certo que nenhum verador da CMF lhe pediu para efectuar depósitos, mas tê-
los-ia efectuado se lho pedissem.
Confrontado com o documento de fls 208 do apenso 4 (talão dos CTT
respeitante ao envio de correspondência a 28.10.98, no montante de 92.650$00, em que
o PS é a entidade devedora), referiu que presume tratar-se de despesas de envio de
correspondência. Nessa cópia existe um manuscrito a vermelho com os dizeres “Pago.
Regiões”. Assegurou não conhecer a letra (que é do arguido Horácio, segundo o
próprio).
Houve de facto uma campanha que se prendeu com o referendo da
regionalização, mas já não se recorda em que ano.
O depoente tinha assento na Comissão Política do PS local enquanto membro da
JS.
Conhece a testemunha David Queirós, o qual era líder da JS.
Explicou que quando depôs motraram-lhe documentos alusivos a depósitos na
conta do BES e nas conversas que teve então com a dita testemunha não os
relacionaram com depósitos referentes a actividades partidárias, nem tinham de os
relacionar.
O arguido Horácio entitulava-se assessor da presidente da autarquia e
frequentava com regularidade as instalações da CMF.
Ele exercia funções no Centro de Camionagem.
Tem a ideia que quando o arguido Horácio foi para a CMF partilhou o gabinete
com o Vereador Lickefold, ficando com ele quando este deixou de desempenhar essas
funções (este, até renunciar, exercia funções a meio tempo, mas via-o pela CMF com
regularidade).
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que conheceu a
testemunha Armindo Brochado durante a campanha eleitoral de 1997, o qual era uma
“extensão” da testemunha David Mota, da JS.
Quando foi necessário obter o apoio da JS, foi a testemunha David Mota quem
trouxe os elementos.
A testemunha Armindo teve grande conhecimento acerca da logística e acerca
das acções de campanha.
Na verdade, ele organizou reuniões, foi muitas vezes à CMF e ao gabinete do
depoente a esse propósito, conduziu viaturas e fez parte de um staff que organizou
concertos, entre outras actividades em que participou nessa campanha.
Ele esteve presente em todas as acções organizadas pela JS, designadamente no
acampamento em Vila Fria.
Ele teve assim conhecimento de situações relacionadas com o financiamento da
campanha.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Devido à sua acção na campanha foi um dos elementos agraciado com uma
compensação monetária (em Dezembro de 1997 pagou-lhe uma quantia em dinheiro –
cujo montante não se recorda -, ao que julga na CMF).
Não compreende como pode ter referido ao tribunal entender que o depoente era
o seu superior hierárquico, já que a testemunha Júlio Pereira e o arguido Bragança é que
eram os seus superiores hierárquicos desde a altura em que ele integrou o GAPP.
Sabe assim que o depoente não tinha autoridade para lhe dar qualquer ordem.
A testemunha Davi Mota é que colaborava com o depoente na CMF.
Nunca o depoente mandou à testemunha Armindo efectuar qualquer depósito na
conta do BES.
Ele aliás tirava cópia dos cheques no GAPP e transportava-os por ordem dos
seus superiores e nunca por ordem do depoente.
Foi devido à sua acção na campanha de 1997 que ele foi para o GAPP por
merecer a respectiva confiança política.
Sobre o Centro de Camionagem a testemunha em causa nada sabe.
Foi a testemunha Armindo quem o auxiliou a levar as caixas com as suas coisas
para a sua viatura (por indicação da testemunha Júlio Pereira), quando ali se deslocou
para as recolher, conforme episódio que já relatou.
*.
Em face destas declarações a testemunha Armindo Brochado referiu que tirava
cópia dos cheques que depositava e entregava ao arguido Horácio essas mesmas cópias.
É verdade que foi gratificado pela sua acção na campanha eleitoral de 1997,
tendo sido a testemunha David Queirós quem lhe entregou o dinheiro num envelope
fechado, na sede de campanha. Segundo presume, esse dinheiro proveio do arguido
Horácio (talvez o David lho tenha dito, mas não se recorda). À data não sabia que ele
era o responsável pelos pagamentos, sendo certo que só mais tarde veio a saber que era
ele e o arguido Joaquim os responsáveis pelos pagamentos.
Confirmou que transportou os caixotes para o carro do arguido Horácio, tendo-
os recolhido no salão nobre da CMF. O arguido Horácio escolheu o que quis levar e o
depoente auxiliou-o (não se recorda quantos caixotes transportou).

- Testemunha Vítor Manuel Fernandes Oliveira de Sousa


É jornalista de profissão, tendo colaborado a tempo inteiro para o “Público” de
Novembro de 1992 até Março de 1997. Por convite telefónico da arguida Fátima
Felgueiras, ingressou no Gabinete de Imprensa da CMF a 01.04.97, onde permaneceu
até ao final de 2005.
Quando iniciou funções na CMF conheceu o arguido Horácio Costa, o qual já
era assessor da arguida Fátima Felgueiras. Ele foi-lhe apresentado nessa qualidade ou
pela própria arguida Fátima ou por algum elemento do GAPP. Não sabe em concreto
quais eram as suas funções na CMF.
Como tinha de ir muitas vezes à zona da presidência da CMF, cruzava-se muitas
vezes com o arguido Horácio Costa, o qual dispunha nessa zona de um gabinete (à
direita). Sempre o viu na zona do GAPP a prestar as suas funções.
O depoente fez parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas de 1997,
tendo integrado o pelouro da comunicação.
O arguido Horácio, por seu turno, estava na área financeira da campanha.
Foi nesse período que mais de perto conviveu com ele, pois ambos faziam parte
da direcção de campanha.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Recorda-se que nas primeiras reuniões ficaram definidos os pelouros. Aliás, a


respectiva composição foi publicada na comunicação social, tendo como fonte a
direcção de campanha.
A composição dos pelouros foi feita em função da disponibilidade das pessoas e
das áreas a que estavam ligadas, sendo certo que alguns lugares já vinham definidos.
O arguido Joaquim Freitas fazia também parte do pelouro das finanças.
Não se recorda como é que esse pelouro foi constituído, mas o certo é que o
depoente, os arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, António Pereira, Horácio Costa e
Joaquim Freitas e ainda outros elementos estavam presentes na reunião onde tal ficou
definido.
A arguida Fátima Felgueiras acompanhava de perto a actividade do pelouro da
comunicação, presumindo que assim fosse em relação aos demais pelouros.
Aliás, estava-lhe no ADN controlar tudo de perto.
Desconhece porém se ela interferia nas questões financeiras da campanha.
Recorda-se que nas reuniões as coisas já vinham definidas e eram postas à
consideração.
As reuniões depois passaram a ser sectoriais, isto é, cada pelouro reunia os seus
elementos.
No caso do depoente, articulava-se com a arguida Fátima Felgueiras (havia
outros elementos no pelouro da comunicação mas que eram meramente decorativos).
Fazia-o no seu local de trabalho.
Quanto ao modo como decorriam as outras reuniões sectoriais nada sabe.
O depoente não se preocupava com os custos das publicações de campanha pois
tal constituia preocupação do pelouro das finanças.
O depoente limitava-se a concluir o seu trabalho e a entregá-lo na reunião,
perdendo-lhe depois o rasto. Constatava depois o produto final, uma vez publicado.
Todos sabiam quem compunha o pelouro das finanças, segundo presume.
Ignora se esse pelouro pagou despesas depois de finda essa campanha.
Não sabe igualmente se foram pagas por esse pelouro despesas que nada tinham
a ver com a campanha (desiganadamente despesas do “Sovela”).
Depois das eleições o arguido Horácio Costa chegou a ser vereador (ele era o 5º
da lista e foi substituir o vereador Lickefold, o qual se demitiu dessa função).

- Testemunha José Júlio da Silva Pereira


É funcionário administrativo da CMF há 25 anos, tendo exercido funções no
GAPP durante 22 ou 23 anos, até 2005.
É militante do PS há 10/15 anos.
Fez parte de várias comissões políticas do PS local, tendo colaborado nas várias
campanhas eleitorais desde há cerca de 15 anos (designadamente na preparação de
eventos, como comícios).
A primeira campanha eleitoral autárquica em que colaborou remonta à segunda
metade da década de oitenta.
As despesas partidárias disparavam aquando das eleições.
O PS tinha uma conta própria e na altura da campanha eleitoral havia um grupo
que tratava das contas da campanha, contas essas que nada tinham a ver com a conta
oficial do partido. Julga que esse grupo abria uma conta bancária, mas não tem a certeza
desse facto.
No tempo em que o arguido Júlio Faria se candidatou à CMF criava-se uma
direcção de campanha composta por membros da comissão política e algumas pessoas
convidadas para o efeito.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Criavam-se então os vários grupos para o desempenho de tarefas variadas, entre


as quais o grupo das finanças da campanha.
Não se recorda quem nessa altura compunha o grupo das finanças,
designadamente nas eleições de 1993.
À pergunta efectuada no sentido de saber se a testemunha Sousa Oliveira (ex-
marido da arguida Fátima Felgueiras) fez parte do grupo das finanças na campanha
eleitoral referente às eleições de 1993, referiu não se recordar, acrescentando que ele foi
candidato à Assembleia Municipal de Felgueiras nessas eleições.
O tipo de procedimento que referiu quanto à organização da campanha sempre
se manteve assim.
Não sabe em concreto quais os valores despendidos nas campanhas, mas tudo
indica que eram despendidas verbas significativas nas acções de campanha que eram
desenvolvidas.
Os fundos provinham de donativos de pessoas amigas do PS, designadamente
industriais, comerciantes e cidadãos comuns.
Não sabe de que forma esses donativos eram concedidos, isto é, se em
numerário se através de cheque. Admite que os donativos fossem concedidos de ambas
as formas, mas salientou que nunca fez parte do pelouro das finanças.
À pergunta efectuada no sentido de se saber por que razão tais fundos não
entravam na conta oficial do partido, referiu que sempre foi assim, sendo certo que a
conta oficial do PS destinava-se a penas a pagar as despesas correntes do partido (os
titulares dessa conta eram os arguidos Júlio Faria e Bragança e o depoente). Não deu
qualquer explicação para esse facto, limitando-se a referir ignorar a razão subjacente a
tal realidade.
A campanha era sempre gerida à parte em termos financeiros.
Foi então a testemunha confrontada com as declarações que prestou perante o
JIC, exaradas a fls 3276, linhas 33 a 36 (14º volume), referindo então que presumia ser
conforme então declarou.
Explicou que nas campanhas em que o arguido Júlio Faria foi o cabeça de lista
ignora se era aberta alguma conta bancária.
Relativamente às campanhas em que foi cabeça de lista a arguida Fátima
Felgueiras, soube posteriormente da abertura de uma conta. Concretamente, no que se
refere às eleições de 1997, soube posteriormente (em 1999 ou 2000) da abertura da
conta do BES. À data ignorava se tinha ou não sido aberta alguma conta, mas presumia
que sim em face dos montantes movimentados serem avultados. Todos aliás presumiam
que tinha sido aberta uma conta.
Nessa campanha eleitoral o grupo das finanças era composto pelos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas e, ao que julga, pela testemunha Dinis. Foi numa
reunião da direcção de campanha (formada por 20 a 30 elementos, como por exemplo
os arguidos Júlio Faria, Fátima Felgueiras e Maria Augusta, o depoente, a testemunha
Horácio Reis e Fernando Martins Coelho) que essas pessoas foram indicadas para esse
grupo.
Porém, a propósito do seu nome não constar como pertencendo à direcção de
campanha nos documentos juntos pelo arguido Faria na audiência de julgamento (cfr.
fls 12211), explicou que a direcção de campanha é diferente da comissão coordenadora,
da qual não fazia parte. Os elementos da comissão coordenadora faziam parte da
direcção de campanha, mas era um grupo mais restrito.
Era sobretudo a comissão de eventos que dependia mais da angariação de
fundos, visto que sem dinheiro nada se fazia (daí a importância da comissão de gestão

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

financeira da campanha). Era o grupo financeiro que procedia ao pagamento das


despesas.
A opinião da arguida Fátima era sempre uma referência.
Ignora se antes das reuniões as decisões já vinham “cozinhadas”.
Na direcção de campanha não se abordavam questões relacionadas com
pagamentos.
Na campanha eleitoral de 1997 o depoente fazia parte da comissão de eventos.
Estava por isso mais afecto à logística da campanha. Não fazia encomendas.
Nas eleições autárquicas de 2005 o candidato à CMF e um outro candidato
(ambos do PS) é que abriram uma conta para as despesas de campanha (ao que parece é
agora obrigatório por lei), sendo certo que o depoente fez parte da direcção de
campanha.
Acha que os candidatos por norma não se sentem confortáveis com a questão da
recolha de fundos para que de alguma forma não se sintam reféns.
Antes dos elementos do pelouro das finanças irem recolher os fundos sucedia
que elementos da direcção de campanha poderiam contactar potenciais doadores.
Não se recorda porém de terem telefonado do GAPP para potenciais doadores
para a campanha, designadamente industriais.
Ao depoente não foram entregues donativos, nem os donativos foram entregues
no GAPP, que tenha conhecimento.
Cofrontado com cópia do cheque de fls 501 do 3º volume (o segundo), no valor
de 250.000$00 e datado de 10.10.97), emitido a favor do arguido Joaquim Freitas,
referiu ignorar por que motivo se acha emitido a favor deste arguido.
Foi confrontado com o cheque de fls 526, do 3º volume (cópia de cheque
emitido por Albino Moreira Fernandes, no valor de 300.000$00), emitido a favor do
arguido Horácio Costa. Assegurou não conhecer o dito Albino, conhecendo antes a
firma “Machado Fernandes e Nogueiras, Ldª”, por ter construído uns prédios em frente
à Biblioteca Municipal. Essa empresa tem um funcionário que foi seu colega de escola
(Júlio). Ignora onde é a sede dessa empresa, mas deduz que seja em Fafe em face do
teor do cheque em causa. Não se recorda de ter falado com o Júlio no sentido de
sensibilizar a respectiva entidade patronal a conceder um donativo, sendo certo que ao
depoente ninguém entregou na CMF qualquer donativo.
Confrontado com o cheque de fls 7089, datado de 04.11.97 e no valor de
500.000$00, sacada sobre uma conta titulada por Paula Maria Leite Melo, mas assinado
por Rolando Melo (ex-vereador da CMF e dono da empresa de calçado “RCM” e que
tem uma filha de nome Paula), assegurou ignorar de que forma esse cheque foi parar ao
pelouro das finanças.
Constatou-se que o único cheque emitido a favor do PS (referente a donativo)
consta de fls 518 do 3º volume (cheque de Eugénio Faria Leite, no valor de 500.000$00
e datado de 09.12.97). Assegurou não se recordar desse cheque, sendo certo que a
maioria dos donativos concedidos ao PS não eram daquela monta e surgiram
fundamentalmente por alturas da aquisição da sede do PS local, em 1994 ou 1995.
Nas eleições legislativas, eram as estruturas distritais do partido que escolhiam
os candidatos à Assembleia da República. No caso, seria a Distrital do Porto do PS
quem escolhia os candidatos à Assembleia da República e os indicava à estrutura
nacional do partido, que, depois de tomar a decisão quanto à composição das listas,
incluía os candidatos indicados nas listas.
A campanha para as eleições autárquicas é mais personalizada, havendo um
confronto mais directo entre os candidatos.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quando o arguido Horácio Costa ingressou como assessor na CMF o depoente


já exercia funções no GAPP. Ele era assessor da presidente da autarquia e administrava
o Centro Coordenador de Transportes e o património municipal.
Ele partilhava o primeiro gabinete à direita, ao lado do GAPP. Partilhou esse
gabinete com o verador Lickefold e chegou a partilhá-lo com a testemunha Cândida
num curto período de tempo, ao que pensa antes das eleições de 1997. Ele ia quase
diariamente a esse gabinete. Entretanto passou a exercer as funções de vereador.
Não tem conhecimento que ele tenha feito audiências a presidentes de junta, pois
o depoente só marcava audiências dos presidentes de junta com a arguida Fátima
Felgueiras.
Seja como for ele atendia pessoas no seu gabinete, mas o depoente não fazia a
marcação de audiências com os munícipes. Assim, não sabe se ele chegou ou não a
atender presidentes de junta.
Pensa que o arguido Horácio não teria autonomia na sua acção, já que deveria
estudar os assuntos que lhe competia acompanhar para depois os submeter à apreciação
da arguida Fátima Felgueiras. Ele cumpria as ordens dela.
Quando o arguido Horácio Costa deixou de se vereador permanente o mobiliário
do seu gabinete foi removido para o salão nobre da CMF, visto que a zona dos gabinetes
entrou em obras.
Esse mobiliário permaneceu no salão nobre até ao momento em que ele ali se
deslocou para recolher os seus pertences, na sequência do facto de ter sido convocado
para o efeito por meio de ofício e de ter acertado telefonicamente com ele o dia e a hora
em que isso sucederia.
Foram então ambos ao salão nobre e foi ele quem abriu o armário (já que era ele
quem tinha a respectiva chave). Ele retirou então os objectos do armário e o depoente,
juntamente com a testemunha Armindo Brochado, auxiliaram-no a transportar tais
objectos para a sua viatura.
Em sede de reinquirição referiu que em 1997 pertencia à comissão política do
PS local e era secretário da arguida Fátima (prestava serviço no GAPP). Nessa altura o
arguido Júlio Faria não pertencia à dita comissão política. Faziam parte desse órgão a
arguida Fátima Felgueiras, a testemunha Sousa Oliveira, a testemunha Fernando Pereira
Sampaio, o arguido Bragança, Augusto Faria, Conceição Rocha, António Faria, o
depoente, etc.
A comissão política reunia de três em três meses, sendo certo que em alturas de
campanha eleitoral é a direcção de campanha que assume a liderança da campanha.
Na comissão política e na direcção de campanha, que tenha conhecimento, o
arguido Júlio Faria não tinha qualquer poder de facto ou de direito.
A direcção de campanha não escolhia candidatos. Era a comissão política que
escolhia o candidato à presidência da CMF e à presidência da Assembleia Municipal de
Felgueiras. Os presidentes de junta normalmente eram recandidatados.
A comissão coordenadora era composta por um grupo de pessoas mais restrito.
Eram constituídos pelouros (finanças, logística, eventos, produção de textos ou
notícias).
Reafirmou que só soube da conta do BES após as eleições de 1997 (não se
recorda de quem ouviu essa informação), sendo certo que o PS tinha uma conta que
servia para pagar as despesas correntes e não as despesas de campanha.
Na altura da campanha eleitoral sabia que alguém geria financeiramente a
campanha, mas não sabia quem.
Ainda em sede de reinquirição afirmou que das reuniões da direcção de
campanha eram feitas actas pelo arguido Bragança, as quais eram distribuídas na

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

reunião seguinte. Não sabe porém se eram feitas actas de todas as reuniões. Tais
documentos não estão na posse do PS.
Em sede de reinquirição referiu que o processo de escolha dos candidatos a
deputado na Assembleia da República passa pela Federação Distrital do PS (cujo líder
era a testemunha Narciso Miranda), e concerteza que se começou a falar da
possibilidade do arguido Júlio Faria integrar a lista do PS à Assembleia da República
uns meses antes das eleições legislativas (essas eleições ocorreram em Outubro e a
escolha dos candidatos ter-se-á processado antes do Verão).
Em todo o caso, salientou que ignora os pormenores da escolha do arguido Júlio
Faria.
Em Felgueiras ele foi o primeiro ex-presidente de Câmara a ir para a Assembleia
da República.
Não sabe se o arguido Júlio Faria suportou despesas do PS.
O arguido Júlio Faria, quando era deputado, usava um gabinete para
atendimento na Biblioteca Municipal (à Segunda-feira, dia em que se encontrava em
Felgueiras).
O Sr. Pinto levava ao arguido Júlio Faria recortes de jornais e alguma
correspondência dirigida a ele (que retirava de uma prateleira que se encontrava em
cima de uma mesa no GAPP e destinada à colocação de documentos destinados ao
arguido Júlio Faria. Ignora se o arguido Horácio alguma vez ali colocou algo destinado
ao arguido Júlio). Não sabe se o Sr. Pinto levava esses documentos a casa dele ou ao
gabinete que ocupava para atendimento. Ignora ainda se o Sr. Pinto levava-lhe esses
documentos semanalmente ou de quinze em quinze dias.
*
A propósito das declarações da testemunha José Júlio, referiu o arguido Horácio
Costa que a constituição do grupo das finanças ocorreu antes de constituída a direcção
de campanha, pelo que não foi no âmbito da mesma que tal pelouro foi criado.
De facto, a pré-campanha começou em Maio/Junho de 1997 e na altura não
havia sido ainda constituída a direcção de campanha.
Nessa altura a arguida Fátima Felgueiras deu instruções rigorosas acerca do
lançamento da sua candidatura.
O primeiro evento sucedeu em Julho de 1997 (refeição no Mercado Municipal),
tendo sido realizadas despesas, designadamente de correio (respeitante aos convites) no
montante de 114.289$00 (cfr. extrato da conta do BES, designadamente fls 10 do
apenso 1).
Essas despesas chegaram às mãos da testemunha José Júlio, o qual se dirigiu ao
depoente para as pagar, o que foi feito.
Nessa altura o pelouro das finanças já estava constituído conforme já relatou,
logo, esse pelouro não foi criado no âmbito da direcção de campanha.
De resto, a conta do BES foi aberta em Julho de 1997 e os primeiros donativos
foram doados em Julho desse ano.
Quando muito a direcção de campanha, depois de constituída, ratificou a
composição do pelouro das finanças tal como havia sido criado.
Os fornecedores da campanha iam ter consigo ou com o arguido Joaquim Freitas
porque alguém os remetia nesse sentido. Alguns desses credores já tinham prestado os
seus serviços ao PS no âmbito de outras campanhas (como por exemplo a “Tipografia
de Guimarães”; “Xavier Calçada”; José Carlos Ribeiro, que prestou um serviço de
propaganda numa viatura por 1.500 cts para a campanha de 1997; “Foto Macedo”, o que
importou numa despesa de mais de 1.000 cts no âmbito da campanha de 1997).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Existiram também contas do PS que lhe chegaram via arguido Bragança, como
era o caso dos artistas contratados (como por exemplo a Cândida Branca Flôr e os
“Excesso”).
Alguns presidentes de junta também fizeram fornecimentos para a campanha.
A testemunha Júlio Pereira ia ter consigo com carácter regular e permanente a
propósito de débitos do PS porque tinha instruções nesse sentido.
Foi ele aliás quem lhe apresentou o Sr. Germano, da “Tipografia de Guimarães”,
na CMF, porque existia um débito que era necessário liquidar.
De facto, com carácter regular pagou débitos do PS, de que são exemplos os
documentos de fls 174, 176, 177, 182 e 186.
Apesar da testemunha José Júlio ter referido que não era hábito prestar-se contas
ao partido a propósito da campanha, o certo é que foi movida ao depoente e ao arguido
Joaquim Freitas uma acção de prestação de contas.
Em Fevereiro de 2000 foi a um plenário de militantes do PS na sede local do PS
e foi confrontado com perguntas sobre as contas da campanha. Respondeu durante 3
minutos mas teve de sair porque foi vaiado.
Já depois do depoente ter saído da CMF, a testemunha Júlio Pereira e o arguido
António, segundo lhe disse o arguido Joaquim Freitas, foram à empresa de calçado
“Combate”, situada em Torrados, pertença do pai do arguido Joaquim Freitas e dos
filhos, e assediaram o arguido Joaquim Freitas no sentido convencer o depoente a
fornecer-lhe elementos documentais relativos ao PS, prometendo que nada lhe
aconteceria, que a testemunha Sousa Oliveira (ex-marido da arguida Fátima) trataria de
tudo e que todos os problemas recairiam sobre a pessoa do depoente. Este discurso
partiu mais do arguido António Pereira Mesquita de Carvalho, segundo lhe foi referido
pelo arguido Joaquim Freitas.
No que respeita ao cheque de fls 526 do 3º volume, emitido pelo Sr. Albino,
referiu que este senhor residia no centro da cidade de Felgueiras e a testemunha José
Júlio disse ao depoente para ir ao escritório de uma firma em Fafe para levantar um
donativo junto de um Sr. Júlio, o que fez, tendo-lhe sido entregue um envelope dirigido
à testemunha José Júlio, a quem o entregou. Mais tarde a testemunha José Júlio
devolveu-lhe um cheque passado em seu nome para o depositar (cuja cópia consta de fls
526 do 3º volume), já que se tratava de um donativo para a campanha.
No que respeita ao cheque cuja cópia se acha a fls 518 do 3º volume, emitido
pelo Sr. Eugénio a favor do PS, assegurou que o mesmo foi entregue no GAPP e que foi
a testemunha José Júlio que o deu ao depoente já endossado, tendo-o então depositado
na conta do BES.
No que se refere ao cheque do Sr. Rolando (constante de fls 7089), assegurou
que quem lho entregou foi o arguido Bragança, o qual mantinha com ele um bom
relacionamento. O Sr. Rolando Melo tinha sido vereador, não o conhecendo
pessoalmente.
O Sr. Agostinho Costa dirigia-se ao GAPP para tratar de assuntos do FCF e a
certa altura o arguido Joaquim Freitas encontrou-o lá e solicitou-lhe um donativo para a
campanha, sendo certo que a testemunha José Júlio estava presente.
A testemunha bem sabe que a arguida Fátima se deslocava com o Sr. “Lima da
Jóia” (Fernando Lima) a empresas no sentido de solicitar donativos e a respectiva
contabilidade era feita no GAPP pela testemunha José Júlio.
Além disso, quem levava os credores ao seu gabinete na CMF para serem
atendidos pelo depoente era a testemunha José Júlio da Silva Pereira (foi o caso da
pessoa que se deslocou à CMF para receber o crédito emergente da prestação dos
“Bombos de Airães”).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

*
Em face das declarações proferidas pelo arguido Horácio Costa, a testemunha
José Júlio da Silva Pereira referiu que não sabe quando teve lugar a reunião da
direcção de campanha onde ficaram definidos os vários pelouros, entre os quais o
pelouro das finanças.
Referiu porém não se recordar da pessoa que nessa reunião transmitiu a
composição dos vários pelouros.
Foi confrontado com o manuscrito de fls 156 (da autoria do arguido Júlio Faria),
tendo-lhe reconhecido a letra. O arguido Júlio Faria fazia parte da direcção de campanha
e está em crer que ele esteve presente nas reuniões da direcção de campanha.
Se esse documento tivesse sido escrito após a reunião da direcção de campanha
que definiu a composição dos pelouros deveria constar o nome da testemunha Dinis
(chefe da Repartição de Finanças da Lixa, à data, tendo vindo mais tarde para a
Repartição de Finanças de Felgueiras, pessoa que não era assídua nas reuniões) como
fazendo parte do pelouro das finanças, o que não sucede (o que inculca a ideia que esse
documento terá sido redigido antes, além de que o texto está dirigido para o futuro).
Além disso, esse documento trata de matéria reservada e as reuniões da direcção de
campanha eram mais alargadas. Ignora porém se esse documento está ou não completo.
Da análise do documento parece resultar que já existiria a comissão coordenadora,
composta por um grupo de pessoas mais restrito.
No que se reporta à refeição no Mercado Municipal, recorda-se apenas de uma
em que participou o António Guterres. Não se lembra de qualquer refeição nesse local
na campanha de 1997.
Admite que tenha solicitado ao arguido Horácio a liquidação das despesas de
correio, no valor de 114.287$00, por ele referidas (a 31.07.97 – cfr. fls 10, do apenso 1
e relação de cheques de fls 53 do apenso 1). Deve tê-lo feito porque alguém lhe deve ter
dado essa indicação, talvez o arguido Bragança, que era o secretário coordenador do PS
local (não obstante à ainda não estar constituído o pelouro das finanças?).
Ainda a propósito de despesas do PS pagas pelo arguido Horácio, foi
confrontado com os documentos de fls 2 a 8 do apenso 4.
Não se recorda se recebia a verba necessária em cheque ou em numerário para
pagar essas despesas.
Não se recorda em que data ocorreu a conferência de imprensa de lançamento da
candidatura da arguida Fátima Felgueiras às eleições de 1997 (cfr. fls 14 do apenso 4,
cópia de recibo dos CTT, onde tem manuscrita uma anotação alusiva a conferência de
imprensa realizada a 30.06.97).
Conhece o Sr. Germano da “Tipografia de Guimarães” por ser fornecedor da
CMF. Não se recorda de o ter apresentado ao arguido Horácio Costa mas admite essa
possibilidade a propósito de um crédito que essa tipografia detinha por força de
trabalhos efectuados para a campanha eleitoral de 1997.
Confirmou que foi a comissão de finanças que pagou a sessão fotográfica aos
candidados do PS às eleições autárquicas de 1997, trabalho executado pela “Foto
Macedo”.
Pensa que de facto quer os “Excesso” quer a Cândida Branca Flôr actuaram em
eventos da campanha de 1997. Era a comissão coordenadora quem tratava da
contratação e de fazer as encomendas para a campanha.
Esteve presente na reunião na sede do PS ocorrida em Fevereiro de 2000, a que
o arguido Horácio fez alusão. Recorda-se dele ter falado alguns minutos e de ter saído
na sequência de algumas movimentações de desagrado (ele não teve condições para

150
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

poder continuar a falar). Não se recorda qual o assunto acerca do qual ele estava a falar
quando saíu.
O depoente fazia parte do secretariado do PS de Felgueiras, pelo que sabe que a
acção de prestação de contas foi proposta contra os arguidos Horácio e Joaquim Freitas.
Pese embora não consiga situar no tempo, confirma que se deslocou à firma
“Combate”. Fez um telefonema ao arguido Joaquim Freitas a pedido da arguida Fátima
Felgueiras e ele disse-lhe que só falava com o depoente e com o arguido António
Pereira. Dirigiram-se então à dita firma e ele mostrou-lhes uma convocatória da PJ,
mostrando-se muito preocupado. Não sabe o que é que a arguida Fátima queria dele,
mas ele não queria falar com ela. Quando se encontraram com ele não receberam
indicações da arguida Fátima acerca do assunto que deveriam tratar, mas foi ela quem
lhes disse para irem ter com ele (?!). Não presenciou qualquer aliciamento.
Ainda no que respeita ao cheque de fls 526, do 3º volume, emitido pelo Sr.
Albino, referiu não se recordar de ter solicitado ao Júlio que intercedesse no sentido da
sua entidade patronal conceder um donativo, sendo certo que não mandou o arguido
Horácio a Fafe para o receber, negando ter-lhe entregue o cheque em causa.
Quanto ao episódio relatado pelo arguido Horácio a propósito do Sr. Agostinho
Costa, referiu que ele de vez em quando ia ao GAPP, levando no início de cada ano
calendários para colocar nas secretárias. Ele era um negociante de peles, fez parte da
direcção do FCF e de uma comissão organizadora de uma tourada destinada a recolher
fundos para o FCF (o depoente fez também parte dessa comissão).
Não se recorda porém de ter ouvido o arguido Joaquim Freitas solicitar-lhe
qualquer donativo no GAPP.
Não sabe se a arguida Fátima recolheu fundos com o Sr. Fernando Lima. Só
sabe que ela participou em dois jantares de angariação de fundos para o FCF e numa
campanha de angariação de fundos para esse clube.
A este propósito, em sede de reinquirição, referiu que era prática habitual o FCF
organizar sorteios, sendo certo que os membros da respectiva direcção é que se
encarregavam de distribuir os bilhetes, podendo nessa conformidade recorrer aos
presidentes de junta e aos industriais.
*
O arguido Horácio Costa esclareceu então que a refeição no Mercado
Municipal se tratou de um almoço e o conjunto dos recibos dos CTT que totalizam
114.289$00 corresponde à divulgação desse evento.
As conferências de imprensa visavam tornar grande um evento que serviria de
apresentação de uma candidatura. A conta bancária do BES tinha sido aberta
recentemente e ainda não dispunham de cheques, daí que só mais tarde essas despesas
tenham sido pagas.
O documento de fls 602 reporta-se a uma despesa paga ao restaurante “Brasão”,
estabelecimento que prestou o serviço no almoço no Mercado Municipal (despesa que
foi paga em numerário na medida em que ainda não dispunham de cheques).
*
O arguido Júlio Faria, por seu turno, referiu que foi por alturas de Maio de
1997 que a comissão política do PS de Felgueiras iniciou o processo das eleições de
1997. Como o depoente à data não fazia parte desse órgão, não sabe exactamente o que
foi entendido fazer a esse propósito.
No início de Junho criou-se a direcção de campanha e a comissão coordenadora
(quanto à composição da direcção de campanha remeteu para os documentos por si
juntos a fls 12206 a 12208; quanto à composição da comissão coordenadora remeteu
para os documentos por si juntos a fls 12209 a 12221).

151
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Mais tarde quer a direcção de campanha quer a coordenadora incluíram outros


elementos que inicialmente delas não faziam parte.
A 09.06.97 ocorreu a primeira reunião da direcção de campanha, sendo certo
que deve ter sido a comissão coordenadora que reflectiu acerca do início da campanha,
pois, segundo assegurou, existia lista de presenças.
Explicou que a comissão coordenadora era o órgão executivo da direcção de
campanha.
O período de campanha eleitoral é de 10 dias, conforme legalmente
estabelecido.
Ainda a propósito do seu manuscrito de fls 156, interroga-se se esse documento
está completo na medida em que não contém a sua rúbrica e a data. Tem para si que
esse documento deverá ter sido elaborado após a primeira ou as primeiras reuniões da
direcção de campanha.
Juntou entretanto aos autos um documento alusivo a uma reunião da comissão
coordenadora a 20.06.97. Segundo o depoente, o facto de nesse documento se fazer
referência à firma “Xavier Calçada” demonstra que o seu manuscrito é posterior a
20.06.97. De facto, o depoente não conhecia essa firma, daí que a referência à mesma
no seu manuscrito só pode significar que esse documento foi por si elaborado depois
dessa reunião ocorrida a 20.06.97.
*
O arguido Horácio Costa, entretanto, reafirmou o que já havia dito quanto às
audiências que fazia, isto é, que fazia audiências a presidentes de junta, que inicialmente
eram dirigidas à arguida Fátima Felgueiras. Essas audências eram marcadas no GAPP
para que a arguida Fátima as fizesse, mas ela mandava o depoente fazê-las (deu três
exemplos a esse propósito). Aliás, a arguida Fátima Felgueiras instruiu o GAPP para
direccionar para o depoente essas audiências, quando não tinha disponibilidade.
Posteriormente o depoente informava-a por escrito do conteúdo da audiência e ela
proferia o inerente despacho, que muitas vezes era dirigido ao GAPP.
Fez também muitas audiências a munícipes.
Havia uma funcionária no hall de entrada da zona política da CMF (onde se
encontravam os gabinetes da presidente e da vereação) – a testemunha Leonor – e se se
tratasse de assuntos do PS ela encaminhava as pessoas para o GAPP, o qual depois
encaminhava para o depoente se se tratasse por exemplo de algum credor do PS, sendo
certo que nunca lhe foi pedido para ir para a sede do PS tratar dos pagamentos. Esses
pagamentos eram feitos pelo depoente na CMF.
Segundo notícia do “Sovela” (edição de 24.10.97, uma sexta-feira), foi na
segunda-feira, dia 20.10.97(último dia para apresentar no tribunal as listas), que foram
divulgadas as listas na sede do PS local. Foi esse o acto público de apresentação das
candidaturas às eleições.
Quanto à firma “Xavier Calçada”, tratou-se de uma empresa que prestou os seus
serviços ao PS a propósito de propaganda móvel (o Sr. Xavier Calçada foi-lhe
apresentado pelo arguido Bragança e era um prestador de serviços habitual do PS),
tendo ocorrido o primeiro pagamento (de 750.000$00) no dia 13.10.97 (cfr. documento
de fls 65 do apenso 4), o segundo pagamento (de 750.000$00) no dia 10.11.97 (cfr.
documento de fls 66 do apenso 4) e o terceiro pagamento (de 1.500.000$00) a 11.12.97
(cfr. documento de fls 67 do apenso 4).
*
- Testemunha Fernando Pereira Sampaio
Foi militante do PS de 1992 até por alturas de 2000.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Fazia parte do movimento que preconizava a elevação da Lixa a concelho por


alturas de 1999. Antes dessa data não era conotado como sendo apoiante dessa causa.
No que toca à campanha eleitoral de 1997 não se recorda se pertencia à direcção
de campanha, mas tem a ideia que sim, até porque montou na Lixa uma sede de
campanha (chegou a pertencer à comissão política num determinado período e ao
secretariado noutro, não concretizando porém entre que datas pertenceu a esses órgãos
do PS de Felgueiras).
A sua acção nessa campanha centrou-se sobretudo à zona da Lixa.
A sede da campanha do PS na Lixa foi montada num espaço pertencente a um
familiar do arguido António Pereira e funcionou durante três semanas.
Fez parte do grupo de recolha de fundos com os arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas e com a testemunha Dinis (não se lembra se nessa altura já tinha sido
ou não montada a sede na Lixa, sendo certo que quando contactou com o arguido
Horácio alguns empresários antes das eleições essa sede na Lixa ainda não havia sido
montada, o que só viria a suceder, talvez, um mês e meio depois).
Recolheu fundos com os ditos arguidos.
Tem a ideia que esse grupo foi constituído na reunião onde foi constituída a
direcção de campanha, facto do qual não tem a certeza. Seja como for, foram nomeados
numa reunião ocorrida na sede do PS local, ao que pensa depois das férias, sendo certo
que a arguida Fátima Felgueiras estava presente, tendo sido ela quem indicou os nomes
para a composição desse grupo (normalmente era ela quem indicava os nomes). Teve a
percepção de que o arguido Horácio Costa estava mais ligado à arguida Fátima
Felgueiras.
Não teve então a percepção de que os arguidos Horácio e Joaquim já estivessem
intrusados, sendo certo que iriam ocorrer mais reuniões para se definir os termos da
recolha de fundos, às quais o depoente não compareceu, tendo achado estranho não ter
sido convocado.
Depois de ter sido nomeado para a comissão de angariação de fundos chegou a
dizer à testemunha Dinis que só foram nomeados “para fazer monte”, visto que não
eram convidados para nada. As funções do pelouro das finanças centravam-se nos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
Não se recorda em que data ocorreu essa primeira reunião em que esteve
presente (onde nem sequer se determinou a abertura de uma conta bancária para a
gestão dos fundos da campanha, da qual só veio a ter conhecimento quando veio a
público o presente caso).
A propósito do destino das verbas recolhidas foi confrontado com as declarações
prestadas perante o JIC e constantes de fls 7672, 2º parágrafo, tendo esclarecido que na
altura presumia que os donativos seriam depositados na conta do PS na medida em que
era o partido que geria esses fundos. À data desconhecia a existência da conta do BES.
Pensava aliás que a conta oficial do PS era a conta da campanha.
Os pagamentos eram feitos pelo arguido Horácio Costa, sendo certo que ignora
quem assinava os cheques dessa conta, pois não viu nenhum.
Quase sempre se fazia aquilo que a arguida Fátima determinava. Aliás, durante o
tempo em que participou na campanha não tem conhecimento de se ter feito algo
contrariando o que ela determinava. “Era ela quem dava as ordens e ponto final”. Quase
ninguém se atrevia a alterar aquilo que ela determinava.
Nessa altura o relacionamento que mantinha com a arguida Fátima era normal na
medida em que ainda não pertencia ao movimento que preconizava a elevação da Lixa a
concelho, movimento que ela não gostava.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Porém, confrontado com as suas declarações de fls 7671, linhas 7 a 9, prestadas


perante o JIC (donde emerge que nessa altura já pertencia a esse movimento e que a
arguida Fátima indicou o seu nome para o grupo de angariação de fundos na medida em
que conhecia muitos empresários) admitiu estar equivocado quando à data em que
ingressou nesse movimento de elevação a concelho da Lixa, sendo certo que em 2004
(quando prestou declarações perante o JIC) recordava-se melhor dos factos.
Tem aliás uma cópia da escritura de constituição desse movimento, pelo que na
altura deve ter consultado esse documento para prestar a informação relativa à data em
que ingressou em tal movimento.
São pois mais fidedignas as ditas declarações prestadas perante o JIC.
Dadas as relações de animosidade existentes entre si e a arguida Fátima (pelo
motivo apontado), deduz que foi nomeado para o grupo de angariação de fundos na
medida em que tinha três ou quatro amigos que poderiam dar contribuições monetárias
para a campanha.
Ignora se algum dos elementos da comissão de angariação de fundos fez parte de
idêntica comissão em campanhas anteriores.
Em 1993 o depoente foi candidato à junta de freguesia de Vila Cova, ignorando
quem ficou encarregue de angariar fundos.
Confrontado com manuscrito de fls 156 (da autoria do arguido Júlio Faria),
assegurou nunca o ter visto.
Não sabe qual era o papel do arguido Júlio Faria nessa campanha eleitoral, mas
pensa que ele era pessoa influente no concelho.
Recorda-se que com o arguido Horácio foi a três ou quatro sítios no sentido de
obter donativos para a campanha (ao que pensa antes das eleições, pese embora os
donativos possam ter sido concedidos depois, sendo o depoente quem normalmente
comunicava o motivo da visita):
- Ao Sr. Manuel Benjamim Fernandes Rodrigues (tem a ideia que o arguido
Joaquim Freitas também os acompanhou, mas não tem a certeza se ele entrou nas
instalações fabris), em Revinhade, ao que pensa já depois das eleições. O dito
Benjamim era cliente do depoente (o depoente faz projectos de obras – firma “Projecto
Lixa”) e foram lá por o conhecer. O depoente e o arguido Horácio falaram com ele e
solicitaram-lhe então um donativo e tem a ideia que ele ficou de entregar mais tarde um
cheque através de um seu empregado na CMF, não sabe a quem. Ele referiu que poderia
contribuir com 500.000$00 (cfr. o cheque de fls 535, no montante de 1.000.000$00 e
datado de 26.02.98);
- Ao Sr. Armando Jorge de Almeida Moreira, que conhecia por ser seu cliente.
Ele só conheceu o arguido Horácio nesse encontro. Não se recorda qual o montante que
ele deu (cfr. o cheque de fls 7096, de 200 cts e datado de 23.09.97, igual ao documento
de fls 493), sendo certo que ele ficou de mandar entregar mais tarde o donativo. Por
norma, nessas circunstâncias, os donativos eram entregues na CMF ao arguido Horácio
Costa no seu gabinete (gabinete esse no qual já tinha entrado várias vezes, quer antes
quer depois das eleições. Nessa zona do 1º andar do edifício da CMF existia uma
funcionária na recepção – a testemunha Leonor –, a quem perguntava se o arguido
Horácio estava, sendo certo que pelo menos numa das vezes ele não se encontrava
presente. Sempre conheceu aquele local como sendo o gabinete do arguido Horácio,
sendo certo que nunca lhe transmitiram que ele teria um gabinete noutro lado). Admite
que quando o arguido Horácio não se encontrava na CMF os cheques poderiam ser
entregues no GAPP, mas não tem conhecimento concreto desse facto. O depoente até
poderia entregar os seus donativos aos arguidos Bragança, Júlio Faria e Fátima
Felgueiras e não necessariamente ao arguido Horácio Costa. Seja como for, quando

154
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

visitavam os empresários não ficava definido a quem o cheque do donativo respectivo


deveria ser entregue, apenas que seria entregue na CMF se o donativo não fosse logo
concedido aquando da visita;
- Ao Sr. José Luís Alves Magalhães da Cunha, de Lagares, aonde se deslocou
com o arguido Horácio Costa antes das eleições. Esse senhor também era seu cliente,
sendo certo que ele transmitiu-lhes que mandaria entregar o donativo respectivo na
CMF. Ignora qual o montante que ele concedeu (cfr. o cheque de fls 530, no montante
de 500.000$00 e datado de 28.01.98);
- Ao Sr. Manuel Joaquim Oliveira Magalhães (que vende na Lixa materiais de
construção), o qual é também seu cliente. Também ele assentiu em dar um donativo que
posteriormente entregaria na CMF (cfr. o cheque de fls 7098, de 100.000$00 e datado
de 08.10.97, igual ao documento de fls 498).
Não fez mais contactos no sentido de angariar donativos para a campanha
eleitoral de 1997.
Depois das eleições, numa das suas idas à CMF, o arguido Horácio Costa pediu-
lhe para dar uma ajuda no sentido de contribuir para a liquidação das dívidas da
campanha (estava presente o arguido Joaquim Freitas), tendo-lhe dito na altura o
arguido Horácio que a arguida Fátima tinha fornecido uma lista relativa a pessoas que
teriam de contribuir, sendo uma delas o depoente, o qual bem podia dar um contributo.
O depoente mostrou-se então renitente em dar uma contribuição na medida em
que tinha custeado as despesas relativas à montagem da sede de campanha na Lixa
(tendo desembolsado mais de 1.000.000$00) e o PS ainda não o tinha reembolsado.
Apesar disso, acedeu em contribuir com 500.000$00 (não se recorda se deu essa quantia
nessa data ou posteriormente – cfr. o cheque de fls 531, nesse valor e datado de
06.02.98, cheque que confirmou ter sido por si emitido – mas não foi o depoente quem
lhe colocou o montante -, tendo-o entregue ao arguido Horácio no seu gabinete na
CMF).
Confrontado com o documento de fls 310 do apenso 4, alusivas às despesas de
montagem da sede da Lixa, num total de 549.000$00 (segundo anotação do arguido
Horácio Costa, datada de 15.12.97, foi oferta da testemunha Fernando Pereira Sampaio),
esclareceu a testemunha que foi o depoente quem entregou esse documento ao arguido
Horácio Costa ainda antes das eleições (esse documento foi por si elaborado e
assinado), sendo certo que essas despesas foram consideradas por si como sendo uma
oferta.
Esclareceu ainda que foi induzido em erro pelo facto das despesas com a
montagem da sede e do donativo que entregou ter ultrapassado a quania de
1.000.000$00.
Corrigiu pois as suas declarações no sentido de que o custo da montagem da
sede na Lixa foi de 549 cts.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
nunca esteve em nunhuma reunião do PS, da comissão política do PS ou do
secretariado.
Ele de facto acompanhou o depoente na visita aos empresários acima referidos,
mas não o fez por convite do depoente, já que apenas seguia as instruções da arguida
Fátima Felgueiras.
Deslocaram-se nessas visitas usando a viatura da testemunha.
Muitos dos cheques referentes a donativos só chegaram depois das eleições. Se o
PS não tivesse ganho as eleições está convencido que muitas pessoas que prometeram
donativos os não iriam conceder.

155
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Era o arguido Joaquim Freitas quem tinha as “listinhas” e disse à testemunha


Sampaio que teria de dar 1.000 cts por indicação da arguida Fátima Felgueiras (segundo
lhe transmitiu o Joaquim Freitas). Assim, ele teria de complementar o que já tinha
contribuído com mais cerca de 500 cts (despesas da sde na Lixa no valor de 549 cts +
500 cts).
Quanto à data da inauguração da sede de campanha na cidade da Lixa, segundo
noticiado no jornal “Sovela” de 31.10.97, terá ocorrido a um Domingo, dia 26.10.97.
A testemunha Dinis nunca lhe entregou qualquer donativo.
*
A testemunha Fernando Pereira Sampaio, por sua vez, acrescentou que ia
frequentemente à CMF (até porque fazia projectos de obras que apresentava na CMF) e
foi nessas ocasiões que combinou com o arguido Horácio as deslocações àqueles
empresários.
O Horácio Costa dizia-lhe que tinha recebido instruções da arguida Fátima no
sentido de visitar com o depoente esses empresários, razão pela qual combinaram a
deslocação em causa.
Na reunião em que foi indicado para fazer parte da comissão da angariação de
fundos tem a ideia que o arguido Horácio não estava presente, pois era uma reunião do
partido e o arguido Horácio não era militante. Quer a testemunha Dinis quer o arguido
Joaquim estavam presentes pois ambos faziam parte da comissão política.
Porém, confrontado com as suas declarações prestadas a fls 7670, penúltimo
parágrafo, e 7673, 1º a 3º parágrafo, prestados perante o JIC, referiu agora ter quase a
certeza que o arguido Horácio esteve afinal presente na reunião dado assunto em causa
reportar-se à campanha, nomeadamente à recolha de fundos.
Os elementos que integraram essa comissão de angariação de fundos aceitaram
de imediato e verbalmente a incumbência.
Desconhece a existência de um secretariado da direcção de campanha.
Existia o secretariado local do PS, que era o órgão que determinava as iniciativas
a tomar fora do âmbito das eleições, órgão esse composto por 10 elementos, um dos
quais da JS.
A comissão política do PS local, por seu turno, era composta por vinte e tal
elementos.
Nessa altura fazia parte quer da comissão política quer do secretariado.
Confrontado com os documentos juntos pelo arguido Júlio Faria a fls 12206 a
1208, referiu que a alusão a secretariado deve referir-se ao secretariado do PS, sendo
certo que as pessoas que constam dessa lista são as mesmas que faziam parte do
secretariado do PS (mas no documento refere-se ao secretariado da direcção de
campanha).
Referiu ter a ideia que existiu uma reunião do secretariado do PS e logo a seguir
uma outra para nomear os elementos da comissão de angariação de fundos, não sabendo
se o arguido Horácio estava presente desde o início ou se só foi admitido quando se
tratou do problema da recolha de fundos. Sabe que entre a primeira e a segunda reunião
saíram pessoas, que já não estavam assim presentes na segunda reunião (ocorrida de
imediato no mesmo local), tendo ficado apenas 4 ou 5 pessoas (o depoente, o Joaquim
Freitas, a testemunha Dinis; não tem a certeza se o arguidos Horácio Costa e a arguida
Fátima estariam presentes). Porém, a testemunha nas declarações prestadas perante o
JIC, a fls 7670, penúltimo parágrafo, referiu que tinha sido a arguida Fátima quem fez a
respectiva nomeação, como aliás o referiu antes na audiência de julgamento. Manifesta
agora dúvidas quanto a esse facto.
Nunca assinou qualquer lista de presenças nas reuniões do secretariado.

156
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quanto à inauguração da sede de campanha na Lixa, admite que a notícia do


“Sovela” seja verídica quanto à data, já que esse jornal fez a cobertura do
acontecimento.
Assim, corrige as suas declarações pois, em face desse dado de que já não se
recordava, conclui que a preparação da instalação da sede na Lixa ocorreu em
Setembro/Outubro de 1997.
*
A arguida Fátima Felgueiras, por seu turno, referiu que a Comissão Política era
um órgão de reflexão política do PS e o Secretariado do PS o órgão executivo do
partido, cujo responsável era o secretário-coordenador (arguido Bragança).
Foi na comissão política que se decidiu acerca da composição da direcção de
campanha e admite que possam ter sido recebidas sugestões do secretariado.
Nunca foi a qualquer reunião do secretariado do PS local.
Como a depoente fazia parte da Comissão Política Nacional do PS e do
Secretariado Nacional do mesmo partido, tinha conhecimentos em termos de análise
política que os outros elementos das estruturas locais do partido não tinham.
Por via de regra não existia um secretariado da direcção de campanha, tarefa que
normalmente era assumida pelo secretariado do PS local como órgão executivo da
estrutura local do partido.
Reafirmou que só cuidava da estratégia política a seguir na campanha eleitoral.
Nunca soube quem eram os clientes da testemunha Sampaio, daí que não
entenda como poderia ter indicado ao arguido Horácio que deveria visitá-los com a
testemunha em causa.
Nunca teve qualquer relação de animosidade com a dita testemunha, pese
embora não tivesse com ele qualquer relação de amizade.
Nunca achou “graça” existir uma sede de campanha na Lixa, mas foi a
testemunha Sampaio quem fez questão disso, à semalhança do que sucedia com outros
partidos.
*
O arguido Horácio Costa referiu ainda que esteve presente em muitas reuniões
do PS a mando da Fátima Felgueiras e que era por esse motivo que ninguém
questionava a sua presença, apesar de não ser militante do PS.
Esteve em reuniões da direcção de campanha e da comissão coordenadora.
Não tem dúvidas porém em que nunca esteve em qualquer reunião em que fosse
equacionada a sua participação no pelouro das finanças (ver, em todo o caso, o auto de
exame de dois discos rígidos do computador usado pelo arguido Bragança, constante de
fls 1108 e a perícia que entretanto foi determinada pelo tribunal já no decurso da
audiência de julgamento).
*
- Testemunha Herique Manuel da Silva Correia
Referiu ser inspector-chefe da PJ (tendo coordenado a investigação nos
presentes autos).
Tomou conhecimento do caso dos autos através da denúncia anónima constante
de fls 2 a 12 do 1º volume, tendo entretanto surgido outras denúncias anónimas que
foram juntas aos autos.
Mais tarde, pelos jornais, tomou conhecimento que o arguido Horácio Costa
tinha sido afastado da CMF, bem como o arguido Bragança e que havia um litígio
crescente entre os arguidos Horácio Costa, Joaquim Freitas e Bragança relativamente à
arguida Fátima Felgueiras.
Assim, em 2000, deslocaram-se a Felgueiras para tentar obter informações.

157
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

À data o arguido Horácio Costa era vereador e o arguido Bragança era chefe do
GAPP e o secretário-coordenador do PS de Felgueiras.
A cota de fls 28 a 30 reporta-se a informações que recolheram no terreno.
Foram entretanto contactados pelos ditos Horácio Costa e Joaquim Freitas, os
quais quiseram denunciar certos factos, já numa fase posterior ao primeiro contacto com
a PJ (cfr. fls 62 dos autos – informação de serviço acerca da entrega de documentos
pelos ditos arguidos, juntos a fls 87 e 88, os quais dizem respeito a dois manuscritos.
O requerimento de fls 63, de 28.03.2000, desses arguidos, foi acompanhado dos
documentos juntos a fls 64 a 84.
O documento de fls 64 versa sobre a criação do pelouro das finanças no âmbito
da campanha eleitoral de 1997; o documento de fls 66 reporta-se a uma guia de
pagamento da CMF e cópia de um cheque da CMF emitido a favor da “Norlabor”; o
documento de fls 67 trata-se de um manuscrito com contas; os documentos de fls 68 e
69 reportam-se a duas cópias de facturas emitidas pela “Resin” à “AMVS”; o
documento de fls 70 diz respeito a uma guia de pagamento da CMF relativamente à
“Norlabor”, com cópia de um cheque emitido pela CMF a favor dessa firma; o
documento de fls 71 é mais um manuscrito com contas; o documento de fls 72 trata-se
de uma fotocópia de um cheque da conta do BES emitido a favor do arguido Júlio Faria;
os documentos de fls 73 e 74 reportam-se a talões de depósito a favor do arguido Júlio
Faria; o documento de fls 75 é uma cópia de um cheque emitido a favor do arguido
Júlio Faria; o documento de fls 76 reporta-se a um talão de depósito em numerário de
1.850 cts na conta do arguido Júlio Faria; os documentos de fls 77 reportam-se a cópias
de dois cheques da conta do BES; o documento de fls 78 reporta-se a um extrato de
conta; o documento de fls 79 reporta-se a um talão de depósito de 4.750 cts na conta do
arguido Horácio no “Banco Mello”; o documento de fls 81 a 83 reporta-se a cópia de
documentos alusivos ao seguro do “Audi A4” referido nos autos, na companhia de
seguros “AXA”; e o documento de fls 84 é um bilhete de um sorteio promovido pelo
FCF.
Pediram informações bancárias alusivas à conta do BES (cfr. ofício de fls 71),
tendo obtido dos respectivos titulares a respectiva declaração de autorização (cfr. fls 39
e 48).
Criaram então o apenso nº 1 (cfr. cota de fls 89) com os documentos entregues
pelo BES.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


É inspector da PJ, tendo auxiliado a testemunha Henrique Correia nas
investigações.
A PJ tomou conhecimento incial de alguns factos denunciados através da
denúncia anónima constante de fls 3 a 12, remetida para a Procuradoria Geral da
República.
Contactaram inicialmente os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas (não se
recorda se por iniciativa deles ou da PJ), tendo tomado conhecimento da existência
desses indivíduos através da comunicação social.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se os arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas contactaram as estruturas nacionais do PS por causa de alguns dos
factos em causa nos autos, referiu não saber se os documentos (faxes) constam dos
autos (cfr. fls 1184 e 1185 – missivas remetidas a José Sócartes e a Jorge Coelho; cfr.
ainda os talões de correio de fls 1186 e 1187).
Ao longo da investigação foram surgindo outras denúncias anónimas.

158
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi sobretudo o arguido Horácio quem entregou documentos à PJ (cfr. por ex. o
requerimento de fls 63 de junção de documentos dos arguidos Horácio e Joaquim
Freitas.
Esses arguidos eram os titulares da conta do BES, os quais autorizaram o
levantamento do sigilo bancário respectivo (cfr. fls 39 e 48).

- Testemunha Sandra Cláudia de Jesus Ribeiro


É engenheira civil e trabalhou para a “Resin” entre 1995 e 2007. Inicialmente
era engenheira civil no Departamento de Estudos e Projectos (fazia a preparação das
propostas a apresentar nos concursos públicos ou a clientes particulares. Em ordem a tal
fazia o levantamento do terreno e fazia estudos económicos) e mais tarde, entre 1995 e
2001, tornou-se responsável pelas explorações (recolha do lixo, aterros e selagem de
lixeiras), no âmbito do qual fazia a gestão do equipamento e do pessoal e fazia estudos
económicos.
Em Felgueiras acompanhou a exploração da lixeira de Sendim entre o final de
1996 e o princípio de 1997 (durante cerca de um ano deslocava-se ao local uma ou duas
vezes por semana). Ia ao local ver o desenvolvimento dos trabalhos ou a reuniões na
CMF com o arguido Barbieri Cardoso para dar nota dos trabalhos executados. Nessa
altura acompanhou também a recolha de resíduos urbanos em Felgueiras.
Depois da selagem da lixeira de Sendim, a partir de Maio de 1997 deixou de a
acompanhar (passou a ser acompanhada pelo engenheiro Barriga e depois pelo
engenheiro Faria).
Quando iniciou o acompanhamento dessa lixeira ela já era controlada e já tinha
sido efectuada a primeira reabilitação (reabilitação que continuou enquento lá esteve).
A recepção dos resíduos era controlada (os resíduos eram pesados com recurso a
uma báscula) e a lixeira era vigiada 24 horas por dia.
As máquinas faziam a movimentação e a compactação do lixo, o qual era
depositado em alvéolos.
Por norma as lixeiras são exploradas por fases. Define-se um alvéolo que vai ser
coberto com resíduos. Torna-se necessária a construção de plataformas para dar
estabilidade à lixeira e plataformas de acesso para descarga dos resíduos pelos camiões.
As plataformas vão mudando de local e crescendo à medida que a lixeira vai
sendo explorada e à medida que vão sendo depositados os lixos.
A lixeira de Sendim tinha declives mais acentuados do que a lixeira de Lustosa
e, por isso, era mais difícil de explorar.
Em Felgueiras sempre foram recebidos muitos resíduos provenientes da
indústria do calçado, resíduos que são volumosos, difíceis de compactar e mais
inflamáveis, aumentando assim o risco de incêncio.
Tinha assim de haver uma inspecção visual quando esses resíduos eram
depositados e a cobertura tinha de ser feita de imediato para minimizar o risco de
combustão.
À entrada da lixeira havia uma recepção instalada num contentor pré-fabricado,
uma báscula e um guarda.
Quando chegava um camião com resíduos fazia-se a respectiva pesagem
(controlava-se assim o tipo de resíduos e a sua quantidade), após o que a viatura era
encaminhada para a zona de descarga, onde nela existia sempre uma máquina com o
respectivo operador, o qual procedia à aludida inspecção visual, à compactação dos
resíduos e à sua cobertura com materiais inertes.
Os vigilantes eram funcionários da “Resin”.

159
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Os operadores de máquinas eram funcionários da empresa à qual a “Resin”


procedia ao respectivo aluguer.
As máquinas usadas na lixeira consistiam numa pá carregadora, num
compactador e às vezes uma máquina com pás giratórias.
A “Resin” coordenava os trabalhos levados a cabo pelos operadores de
máquinas, existindo um encarregado, funcionário da “Resin”, que coordenava os
trabalhos.
A “Resin” fazia ainda a planificação da exploração.
Era ela que tinha o “know how” necessário para a execução desses trabalhos,
sendo certo que a CMF acompanhava a exploração.
O talão da báscula tinha três vias: uma delas era entregue a quem procedia ao
depósito, outra era entregue mensalmente à CMF e outra ficava para a “Resin”.
Crê que a CMF cobrava uma taxa aos industriais pela deposição do lixo.
A “Resin” tinha um contrato com um valor fixo mensal pela exploração da
lixeira, independentemente da quantidade de lixo depositado. Não sabe qual o
respectivo preço (acha possível que seja de 2.800 cts por mês, quando confrontada com
esse valor).
Nunca teve acesso a qualquer contrato celebrado entre a CMF e outra entidade
que tivesse por objecto a dita lixeira.
O nome Menezes Basto não lhe é estranho e relaciona-o com o proprietário dos
terrenos onde foi instalada a lixeira de Sendim. Nunca viu qualquer contrato celebrado
entre ele e a CMF.
A “Norlabor” era uma empresa que fazia terraplanagens e movimentações de
terras, procedendo também ao aluguer de equipamento. Nunca teve qualquer
conhecimento de algum contrato celebrado entre esta empresa e a CMF.
A “João Tello” era uma empresa do mesmo género e, ao que pensa, também
alugava equipamento. Nunca viu qualquer contrato celebrado entre esta empresa e a
CMF.
A depoente não tinha acesso ao que se pagava ou deixava de pagar a propósito
das obras em que a “Resin” estava envolvida.
Na lixeira sabia o que devia ser facturado (as facturas não lhe passavam pelas
mãos mas dava indicações à contabilidade acerca do que deveria ser facturado).
Em face disso, não sabia o que de facto era pago, ignorando se a CMF devia
dinheiro à “Resin”.
Durante o tempo em que a depoente acompanhou a exploração da lixeira de
Sendim a “Resin” sempre se manteve no local a trabalhar e depois disso continuou a
operar nessa lixeira.
A depoente reportava ao director geral da “Resin” (ao arguido Gabriel Almeida).
Tem a ideia que ele terá sido contratado pela “Resin” em 1996/97 para exercer essas
funções (acompanhava a gestão da empresa ao nível operacional, acompanhava os
contratos que a empresa tinha celebrado tanto a nível da gestão diária –
equipamentos/pessoal – como ao nível da gestão económica dos projectos. Não crê que
ordenasse pagamentos).
Normalmente ele econtrava-se na sede da “Resin”, mas fazia frequentes
deslocações às obras.
Crê que ele tinha poder para fechar negócios.
A decisão de concorrer a algum concurso era conjunta, entre os arguidos Vítor
Borges e Gabriel Almeida.

160
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não sabe se ele procedia à cobrança de créditos, mas crê que ele diligenciava
junto das entidades devedoras pela obtenção dos pagamentos a que a “Resin” tinha
direito.
O arguido Carlos Marinho era o responsável pela gestão financeira da empresa.
Em 1997 ele era apenas o responsável pela contabilidade (o director financeiro era a
testemunha Luciano Barreira). Não crê que tivesse autonomia para decidir fazer
pagamentos.
O arguido Vítor Borges, por seu turno, era o administrador da “Resin”
(presidente do conselho de administração).
Quando a depoente foi admitida ao serviço da “Resin” era o arguido Vítor
Borges quem era o responsável pelos negócios da empresa em Felgueiras, mas quando
foi admitido o arguido Gabriel Almeida houve uma transferência de responsabilidade
daquele para este no que concerne ao acompanhamento dos negócios em Felgueiras.
Os trabalhos que foram pagos à “Resin” foram efectivamente realizados, pelo
menos no tempo em que acompanhou a exploração da lixeira de Sendim.
Em face do tipo de trabalho em causa (contínuo) é normal que o auto de
recepção da obra fosse assinado sem a ida ao local. Tratava-se de um trabalho que
nunca estava concluído enquanto existisse deposição de lixo na lixeira. Só quando se dá
a selagem da lixeira é que a obra está concluída, o que só ocorreu em 1998, ao que crê.
Nessa altura já estava afastada do acompanhamento dessa lixeira.
Os concursos públicos tinham um caderno de encargos onde se definia o que se
pretendia e às vezes a forma de execução.
Quando se trata da execução de uma obra não há qualquer obstáculo a que se
façam autos de medição e de recepção.
A selagem consiste na modelação para dar estabilidade à massa de resíduos. É
assim criada uma rede de drenagem de lixiviados e do gás, procede-se à
impermeabilização com tela e procede-se à cobertura com terras para que possa ser
vegetalizada. Não acompanhou esse processo em Felgueiras mas crê que procedeu-se
desse modo na selagem da lixeira de Sendim.
Durante o tempo em que acompanhou a exploração da lixeira de Sendim
contactou várias vezes com o arguido Barbieri Cardoso. Era com ele que reunia para lhe
dar conta da evolução dos trabalhos. Era a ele que entregava os talões da báscula.
Sempre o viu como uma pessoa bastante profissional e rigorosa na defesa dos interesses
da CMF.
A esse propósito não teve contacto com mais algum técnico da CMF, sendo
certo que contactou com o engenheiro Leite (funcionário camarário) a propósito da
recolha de resíduos em Felgueiras.
A “Resin” não necessitava necessariamente de alvará, tudo dependia da
intervenção que tivesse nas obras. No caso da lixeira de Sendim a “Resin” prestava os
serviços já referidos, mas subempreitava o serviço de movimentação de terras a
empresas que dispunham do necessário alvará.
O último concurso na zona do Vale do Sousa em que a “Resin” participou terá
sido em 1998 (parece que foi em Outubro de 1997, cujo dono da obra era a AMVS) e
não tem a certeza se o arguido Gabriel participou na negociação respectiva.

- Testemunha Carlos Miguel da Venda de Paços Faria


É engenheiro do ambiente, foi funcionário da “Resin” desde Julho de 1998 até à
fusão daquela com outra empresa, em 2006. Antes de ter sido admitido ao serviço da
“Resin” não a conhecia.

161
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que foi contratado para acompanhar o encerramento das lixeiras do


Vale do Sousa e o arranque da construção dos aterros de Lousada, Penafiel e Felgueiras.
Numa primeira fase acompanhou a construção dos aterros e o encerramento das
lixeiras que tinham atingido o volume disponível para a deposição de resíduos.
A lixeira de Sendim era para ser encerrada em 1998, mas como se registou um
atraso na construção do aterro da Lustosa (Lousada), manteve-se a exploração dessa
lixeira por mais tempo que o previsto.
De facto, com a construção do aterro da Lustosa estava prevista a deposição dos
resíduos domésticos no mesmo provenientes do concelho de Felgueiras. Como a
construção desse aterro se atrasou, continuou-se a proceder à deposição desse tipo de
resíduos na lixeira de Sendim. Para Felgueiras estava apenas prevista a deposição dos
resíduos do calçado.
Porém, só em Julho de 1999 é que os resíduos sólidos urbanos de Felgueiras
começaram a ser depositados no aterro da Lustosa e até lá continuaram a ser
depositados na lixeira de Sendim.
E só em Julho de 2001 é que se iniciou a exploração do aterro RIB de Felgueiras
e até lá os resíduos eram depositados na lixeira de Sendim.
Consequentemente, a exploração da lixeira prolongou-se por cerca de mais dois
anos.
Recorda-se que pelo menos duas ou três vezes alguém que não concordava com
a localização da lixeira naquele sítio ateou fogo aos resíduos.
Era necesário construir caminhos de acesso e plataformas para que os camiões
que carregavam os resíduos conseguissem chegar ao local de deposição.
À medida que a deposição de resíduos ia ocorrendo criavam-se taludes.
Sob a última camada de resíduos depositados era colocada cerca de meio metro
de terra, após o que se colocava uma tela de impermeabilização com mais meio metro
de terra e criava-se uma rede de drenagem de águas.
Em termos técnicos o depoente era o responsável, mas reportava à testemunha
Pinto Barriga e mais tarde a outra pessoa (Octávio Englekn) – responsáveis pelo
departamento técnico da “Resin” para o Vale do Sousa -, a quem enviava a lista do que
era depositado na lixeira. Mandava também para a CMF uma outra via desse documento
para que ela pudesse cobrar uma taxa pela deposição do lixo.
Explicou que a “Resin” tinha quatro funcionários na lixeira, onde se fazia o
registo do que era depositado através de uma báscula, sendo emitidos três talões (um era
entregue a quem depositava o lixo, outro era entregue à CMF e outro ficava para a
“Resin”).
Havia uma lista de empresas proibidas de depositar os resíduos na lixeira
porquanto não pagavam essa deposição, pelo que deduzia que a CMF facturava a
deposição do lixo.
O director geral da “Resin” era o arguido Gabriel Almeida e só mais tarde é que
contactou com esse arguido quando ele visitava as obras na zona do Vale do Sousa, o
que nem sequer sucedia uma vez por semana.
Só na fase final da exploração da lixeira é que a “Resin” ali colocou um
encarregado. Antes disso existia também um encarregado, funcionário da “Resin”, mas
estava mais afecto à recolha de resíduos sólidos urbanos em Felgueiras.
Quer a “Translousada” quer a “Ecorumo” eram empresas subcontratadas pela
“Resin”.
Por vezes a “Resin” alugava (com manobrador/condutor) máquinas (por vezes
uma máquina com pás giratórias para escavar terra e a tempo inteiro encontrava-se no
local uma máquina com pá de rastos) e camiões.

162
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente não tinha grande conhecimento da parte financeira da “Resin”. O


arguido Carlos Marinho era o responsável da “Resin” pela parte financeira da empresa.
Sabe que havia um valor fixo mensal que era cobrado pela “Resin” pela
exploração da lixeira, sendo certo que com o aterro passou a ser cobrado um valor por
tonelada.
A certa açtura passou a haver indeferenciação na facuração, que era emitida ou à
AMVS ou à CMF, o que aliás motivou a devolução de facturas.
Por um lado, a “Resin” tinha um contrato com a AMVS para encerrar a lixeira e
explorar o aterro, mas por outro, era a CMF que depositava os resíduos na lixeira.
No que se refere ao aterro, para além do tipo de resíduos, haviam várias
especificidades que atrasaram a sua construção.
Numa primeira fase estava prevista a construção do aterro encostado à zona da
lixeira, mas por questões de estabilidade partiu-se para outra solução (construiu-se um
caminho de permeio).
Com a construção verificaram a existência de nascentes de água, alterações nas
características dos taludes e indiferenciação no tratamento dos lixiviados (aliás, lançou-
se um concurso para redimensionar o tratamento dos lixiviados, visto que o que estava
projectado revelou-se insuficiente).
Tudo isso atrasou a conclusão da construção do aterro.
As reuniões havidas por causa do aterro eram feitas com a AMVS e nelas
participavam elementos da CMF, como o arguido Barbieiri, a engenheira Neri e outro.
Aliás, o depoente contactava mais com o arguido Barbieiri Cardoso.

- Testemunha José Henrique Machado Pinto Barriga


Trabalhou para a “Resin” desde Outubro de 1997 até à sua fusão com outra
empresa em 2005 ou 2006. Era engenheiro do ambiente para a área do Vale do Sousa.
Foi admitido pelo arguido Gabriel Almeida.
No Vale do Sousa iriam iniciar-se um conjunto de obras com alguma
complexidade quer ao nível da selagem de lixeiras quer ao nível da construção de
aterros.
Em 1997 a lixeira de Sendim já estava controlada, não sendo já uma lixeira
“selvagem”.
Tinha equipas nas várias lixeiras (do Vale do Sousa) para proceder à
compactação e cobertura dos resíduos (lixeiras de Sendim, Seroa e Lustosa).
O depoente, por seu turno, dava o respectivo acompanhamento técnico.
Em todas essas lixeiras existiam máquinas para fazer a compactagem e a
cobertura dos resíduos.
Construíam-se com inertes plataformas para acesso dos camiões para descarga.
Em Felgueiras a lixeira era vigiada 24 horas por dia por três funcionários.
Faziam-se levantamentos topográficos para verificar a capacidade de
compactação dos resíduos. Quanto mais compactados menor quantidade de lixiviados
existiriam e maior capacidade teria a lixeira de receber resíduos.
Acompanhou a fase de exploração da lixeira de Sendim até final de 1999, sendo
certo que depois dessa data quem passou a estar à frente do controle dessa lixeira era a
testemunha Carlos Miguel da Venda de Paços Faria.
Explicou que a quantidade de resíduos depositados, o tipo de resíduos em causa
e a maior ou menor pluviosidade registada pode condicionar a rapidez e a necessidade
de construção de plataformas.
A “Resin” não interrompeu a exploração da lixeira, pois se isso sucedesse
perder-se-iam anos de trabalho com a deposição “selvagem” dos lixos.

163
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na lixeira de Sendim, quando necessário, um encarragado da recolha de


resíduos, dava o seu apoio.
Existia a operar uma máquina para a compactagem dos resíduos e a “Resin”
alugava camiões para o transporte da terra com que os resíduos eram cobertos (o
aluguer era feito à “Translousada” e mais tarde à “Ecorumo”. O seu intorlocutor era a
testemunha Carlos Silva, tanto no que se referia a uma como a outra empresa).
Não conhece nem a “Norlabor” nem a “João Tello”.
Haviam reuniões técnicas na CMF, sendo sobretudo o arguido Barbieri o seu
intorlocutor.
Havia uma fiscalização periódica pela autoridade que tutelava e quem respondia
pelo que se passava na lixeira era a “Resin”.
A “Translousada” limitava-se a cumprir as directivas que lhe eram dadas pela
“Resin”.
Só desde o momento em que cessasse a deposição do lixo na lixeira é que seria
lógica a existência de um auto de recepção.
A exploração pressupõe o controle e a queima do bio-gás.
Construíram assim um sistema de captação de lixiviados que foi complexo.
A máquina que procedia à cobertura dos resíduos custava 8/9 cts à hora.
A “Resin” debitava por mês 2.800 cts.
Ouviu dizer que tinha dificuldade em receber os pagamentos, mas não se tratava
de uma questão sobre a qual se debruçasse. Tem a ideia de que terminou um contrato e
que não havia outro contrato (no âmbito do qual pudessem ser feitos os pagamentos
devidos).
A construção do aterro de Felgueiras atrasou-se muito.
A exploração de um aterro impõe um leque grande de trabalhos preparatórios
complexos (é mais fácil construir uma casa).
O resíduo industrial do calçado ocupa muito espaço e pesa pouco, tornando-o
difícil de compactar. Como também eram depositados no local os resíduos sólidos
urbanos, os resultados da compactagem eram mais difíceis.
O aterro de Felgueiras foi construído pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop”.
Havia a dificuldade de compactagem dos resíduos industriais do calçado, com
metais pesados cujos tratamentos físico-químicos eram mais exigentes.
A construção ficou a cargo da “Ecop”, o projecto sobretudo a cargo da “Sita” e a
exploração pela “Resin”.
O início da exploração do aterro de Felgueiras deu-se em finais de 2000.
O depoente só acompanhou algumas reuniões preparatórias com a ETEC
(empresa contratada pela AMVS para fiscalizar a obra) para a construção do aterro.
Com efeito, o depoente acompanhou mais a construção dos aterros de Lustosa e
de Penafiel, de sorte que, no que ao aterro de Felgueiras concerne, só conhece o
projecto, não tendo acompanhado a sua construção.
Foi substituído pelo engenheiro Octávio Engelkn.
Em todo o caso, o projecto previa a construção de uma rede de drenagem
friática, o alisamento do terreno, a deposição de uma camada de um metro de argila, a
colocação de uma tela e de uma camada de impermeabilização, uma rede de drenagem
do aterro e uma rede de drenagem dos lixiviados.
Havia uma reunião mensal e reuniões secundárias de fiscalização pela ETEC.
Inicialmente o depoente reportava ao engenheiro Paulo Ribeiro.
O arguido Vítor Borges era o presidente do conselho de administração da
“Resin”. Vinha raramente ao terreno, normalmente em ocasiões solenes.
O arguido Carlos Marinho era o contabilista da empresa.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha Luciano Barreira era o director financeiro (o qual esteve pouco


tempo no exercício dessas funções). Depois, para essas funções (provindo da “Ecop”),
veio o Dr. António Massa, o qual esteve no exercício dessas funções durante cerca de
um ano, até ao momento em que a “Ecop” deixou de participar no capital social da
“Resin”.
Pensa que o contrato de manutenção da lixeira de Sendim foi celebrado com a
CMF e que a facturação era-lhe emitida; porém, não tem a certeza desse facto (acabou
por referir não saber a quem a “Resin” facturava).

- Testemunha António Fernando da Silva Ramos


É encarregado de resíduos sólidos urbanos. Trabalhou para a “Resin” entre
Novembro de 1993 até à data em que se fundiu com outra empresa, dando origem à
“Cespa Portugal”, ao serviço da qual actualmente a testemunha trabalha.
Quando iniciou funções na “Resin”, durante dois ou três meses, foi motorista,
passando depois a encarregado na lixeira de Felgueiras (desde Janeiro de 1994 até à
construção do aterro RIB de Felgueiras).
Quando começou a trabalhar na lixeira de Sendim o lixo ardia muito e havia lixo
por todo o lado.
Trabalhou com dois funcionários (o Sr. Pereira e o Sr. Sousa), sendo certo que
na altura estava a operar na lixeira um “buldozer” de uma empresa francesa com o
objectivo de limpar o local (que operou nessa lixeira durante 6 meses).
O depoente conduzia uma máquina com uma pá de rastos, que entretanto
desmontou, e para o local foi trabalhar uma outra máquina com pá de rastos da marca
“Catterpilar”.
Foi o Sr. Oliveira Pereira (de nacionalidade portuguesa mas há muitos anos a
trabalhar em França) quem lhe deu formação para operar com a dita máquina.
Foi ele quem lhe deu formação na limpeza dos alvéolos, deposição do lixo e sua
cobertura.
Recorreu várias vezes aos Bombeiros de Felgueiras no sentido de lhe fornecer
água para os radiadores das máquinas.
Os primeiros engenheiros a dar-lhe indicações foram as testemunhas Pinto
Barriga, Claudia Ribeiro e Miguel Faria.
O depoente também trabalhou em Lousada e em Penafiel.
De facto, ainda em 1994 foi fazer o mesmo tipo de trabalho na lixeira da
Lustosa, dividindo-se então entre esta e a lixeira de Sendim.
Na lixeira de Sendim existia um contentor à entrada, onde guardava algumas
peças e combustível.
Em frente a esse contentor construiu logo no início um pequeno jardim e com
brita fez no chão o logotipo da “Resin”.
Entretanto, cerca de um ano depois de ter ido trabalhar para essa lixeira, foi
colocada uma báscula para pesar o lixo.
Construíam plataformas nos locais de descarga, em zonas criadas para o efeito.
Essas plataformas eram construídas quando se mudava de local de descarga.
Até ao encerramento da lixeira a “Resin” sempre ali se manteve a operar e a
construir plataformas.
A “Translousada”, a “Ecorumo” e a “Norlabor” alugavam máquinas com
manobrador à “Resin”. Era a testemunha Carlos Silva quem contactava consigo.
Quando havia problemas com a máquina (manobrada pela testemunha Mário
Barbosa) contactava a “Translousada” no sentido de se diligenciar pela respectiva

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2º Juízo

reparação. A testemunha Mário Barbosa dizia-lhe que a “Translousada”, a “Ecorumo” e


a “Norlabor” pertenciam ao mesmo grupo.
Acabou por dizer não saber se a “Norlabor” alguma vez operou no local.
Afirmou que no local, na lixeira, só existiu uma báscula.

- Testemunha Albino Fonseca Loureiro


Referiu ter sido membro da Assembleia da Freguesia de Sendim, secretário da
junta de frequesia de Sendim até 1993 e presidente dessa junta de freguesia desde 1993
até 2005, tendo integrado ainda a Assembleia Municipal de Felgueiras.
Há cerca de 20 anos que desempenha cargos autárquicos.
Até Janeiro de 1994 ao lixo depositado na lixeira de Sendim era ateado fogo
diariamente e durante a noite o fumo corria pelo vale até ao centro da freguesia. Em dias
mais quentes não se podia dormir com a janela aberta ou deixar roupa a secar no
exterior. Em dias de nevoeiro, com o fumo à mistura, não se via nada. Havia
proliferação de insectos na zona e as águas foram contaminadas a médio/longo prazo.
Uma das condições que colocou para ser candidato à presidência da junta de
freguesia de Sendim (em 1993) era a de que a situação da lixeira mudasse, o que lhe foi
garantido numa sessão pública se o PS vencesse as eleições autárquicas (tratou-se de
uma sessão ocorrida na sede de Felgueiras do PS. O arguido Júlio Faria por norma
estava presente nessas sessões, mas na sessão em causa não se recorda se ele esteve
presente ou não).
De facto, a população estava contra a existência da lixeira naquelas condições.
Recorda-se que, ainda era secretário da junta de freguesia de Sendim, a lixeira
esteve para sair daquele local para ser instalada noutro sítio (da mesma freguesia), o que
originou protestos. O presidente da CMF iria então a uma sessão da Assembleia de
Freguesia de Sendim, convocada extraordinariamente por causa desse assunto, onde iria
dar explicações. Porém, como na noite anterior registaram-se distúrbios na zona onde
iria ser implantada a nova lixeira, o presidente da edilidade transmitiu que apenas iria a
essa sessão extraordinária da assembleia de freguesia se lhe fossem garantidas as
condições de segurança necessárias. Como essas condições de segurança não lhe foram
garantidas ele não compareceu, sendo certo que nessa assembleia existiu forte oposição
à mudança da lixeira para outro local da freguesia de Sendim.
Desde Janeiro de 1994 o lixo passou a ser diariamente aterrado normalmente.
Faziam-se sucalcos, o espaço da lixeira foi vedado e vigiado.
Passou a ser uma lixeira controlada, sendo evidente a alteração da situação.
Até à abertura do aterro a lixeira incendiou-se três vezes. O pó proveniente da
lixa das máquinas de cardar calçado é altamente inflamável.
Recorda-se que na lixeira chegou a falar algumas vezes com a testemunha
António Fernando da Silva Ramos (funcionário da “Resin”). Foi aliás muitas vezes ver
os trabalhos na lixeira, tirando inclusive fotografias para demonstrar que a situação na
lixeira estava melhor. O mau cheiro no local não desapareceu totalmente, mas na
povoação esse cheiro deixou de se fazer sentir, assim como os fumos.
Até ao encerramento da lixeira ela esteve sempre controlada, pois sempre ali
trabalhavam pessoas nos mesmos moldes.

- Testemunha Américo da Silva Teixeira


Foi tesoureiro da junta de de freguesia de Sendim entre 1986 e 1989 e presidente
dessa junta entre 1990 e 1993, eleito pelas listas do CDS.
Enquanto era presidente dessa junta de freguesia a lixeira referida nos autos era
um problema porque ardia e cheirava mal. Quando entrava em combustão ninguém

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

podia parar no local. O depoente aliás, nessas ocasiões, tinha de fechar as janelas de sua
casa. A população estava farta dessa situação e incomodava-o por esse facto.
A testemunha Menezes Basto era o proprietário do terreno onde estava
implantada essa lixeira. Havia um contrato que terminou e, segundo ouviu dizer, a
lixeira era para ser instalada em Barrosas. Porém, dado que a população de Barrosas
opôs-se a isso, surgiram rumores de que afinal a lixeira iria mudar-se para outro local de
Sendim (lugar de Casal).
Entretanto, conseguiu-se que a testemunha Menezes Basto prorrogasse por mais
6 meses a deposição do lixo no mesmo local. Foi o depoente quem fez esse pedido à
testemunha Menezes Basto e à esposa deste, tendo acedido, sendo certo que a CMF
comprometeu-se a retirar dali a lixeira findo esse período.
Entretanto, terminou o mandato do depoente.
Constatou que posteriormente a situação da lixeira melhorou. Referiu que é
proprietário de uns terrenos a cerca de 1.000 mts mais abaixo e as águas das minas eram
coloridas por força da poluição, águas essas que entretanto melhoraram muito.
Tendo desaparecido os cheiros e os fumos a população de Sendim acomodou-se
à existência da lixeira, reclamando apenas mais obras para a freguesia como
compensação pela existência dessa lixeira.
*
A propósito da possibilidade da lixeira de Sendim se deslocar para Barrosas,
referiu o arguido Júlio Faria que nessa freguesia do concelho de Felgueiras nunca
existiu lixeira, pese embora estivesse tudo preparado para ali instalar uma lixeira, o que
não sucedeu devido à forte oposição da população, que impediu a concretização desse
projecto.
*
- Testemunha António José Ferreira Pereira
Foi funcionário da “Resin” entre 08.01.94 até 30.06.2006, tendo trabalhado na
portaria da lixeira de Sendim.
Quando iniciou funções na “Resin” foi logo trabalhar para a dita lixeira.
No Início apontava os carros que entravam com o lixo (matrícula e o nome da
firma).
Quando ali foi instalada uma báscula procedia-se à respectiva pesagem e
anotava-se também as viaturas. Nessa altura foram trabalhar para a lixeira mais pessoas.
À data o seu chefe era a testemunha Fernando Ramos (encarregado).
O depoente esteve sempre no mesmo lugar.
Existia uma máquina que aterrava o lixo que era descarregado num local
próprio.
Andava lá o Sr. Pereira, que veio de França.
De vez em quando iam ao local engenheiros da “Resin”. O responsável era o
engenheiro Miguel Faria quando começou a funcionar o aterro. No tempo da lixeira a
engenheira Cláudia também ia ao local.
Não sabe ao certo em que data a lixeira foi selada. Nessa altura foi trabalhar para
a portaria do aterro RIB de Felgueiras, que tem a mesma localização que a lixeira e cuja
portaria é comum.
Em todo o tempo que ali prestou serviço a “Resin” sempre se manteve a operar
no local.

- Testemunha José de Sousa


Foi admitido ao serviço da “Resin” a 08.01.94, tendo trabalhado para essa
empresa até há cerca de 5 anos atrás (saiu a 13.03).

167
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi trabalhar para a lixeira de Sendim como cantoneiro. Cerca de 1 ano e meio
depois foi trabalhar para a Lustosa, onde permaneceu durante dois ou três anos. Nessa
altura exerceu funções para “Translousada” e para a “Norlabor”, mas era ainda
funcionário da “Resin”. Fazia também a vigilância nocturna na lixeira de Sendim.
Recorda-se de ver na lixeira de Sendim carrocarias de viaturas incendiadas.
O Sr. Pereira começou a trabalhar na lixeira de Sendim com o depoente. Logo
depois veio o Sr. Fernando Ramos e depois o Sr. Pereira (que veio de França), o qual
lhes deu formação para trabalhar com as máquinas.
Na lixeira chegou a trabalhar um manobrador de máquinas, pensa que da
“Norlabor” (chamava-se Mário).
A “Norlabor” e a “Translousada” tinham sócios comuns.

- Testemunha Joaquim Fernando Moreira


É engenheiro civil, encontrando-se reformado da função pública.
Explicou que foi director do GAP do Vale do Sousa desde 1986 até há cerca de
um ano. Antes disso, desde 1976, foi ali funcionário.
O Vale do Sousa tinha um conjunto de lixeiras onde os lixos eram depositados
de forma descontrolada.
Os autarcas de então perceberam que a lixeira de Sendim, como estava, não
podia continuar devido aos incêndios e outros problemas que causavam ao nível
ambiental. Os resíduos industriais do calçado eram ali depositados.
Antes da AMVS decidir lançar os concursos referidos no ponto 1.5 da
pronúncia, segundo a ideia que tem por volta de 1993/94, a lixeira de Felgueiras
começou a ser controlada.
Quando se pensou na construção de um aterro em Felgueiras visitou a dita
lixeira (já depois de 1994). Nessa altura no local já se encontrava uma empresa a fazer a
manutenção da lixeira. Era a “Resin” que se encontrava no local (viu lá um técnico e um
funcionário da “Resin”. As máquinas que viu a trabalhar não pertenciam de certeza à
“Resin” porque ela não possuía esse tipo de equipamento. Não sabe a quem pertenciam
essas máquinas). Já conhecia a “Resin” porque assistiu à sua apresentação numa reunião
com os autarcas do Vale do Sousa, ocorrida em Lousada (esteve presente como
convidado).
Os fumos deixaram de existir à medida em que os incêndios iam diminuindo.
Diminuiu também o mau cheiro.
Na altura o Vale do Sousa produzia cerca de 200 toneladas de lixo por ano e a
AMVS começou por pensar em construir um aterro para servir os seus seis concelhos
(Penafiel, Lousada, Felgueiras, Paredes, Paços de Ferreira e Castelo de Paiva).
Decidiu-se porém proceder à construção dos aterros de Lustosa (Lousada) e
Penafiel, segundo estudos de localização que então foram efectuados e que apontaram
para a Lustosa, no que se refere a Lousada, sendo certo que a localização do aterro de
Penafiel era pacífica.
Assim, em 1994 foi lançado o concurso para a construção do aterro da Lustosa.
A seguir lançou-se o concurso para a construção do aterro de Penafiel e por último o
concurso para a construção do aterro de Felgueiras, o qual essencialmente se destinaria
a receber os resíduos provenientes da industria do calçado.
Os resíduos sólidos urbanos do concelho de Felgueiras, por sua vez, passariam a
ser depositados no aterro da Lustosa logo que estivesse construído (o qual receberia
também os resíduos sólidos urbanos dos concelhos de Paços de Ferreira e de Lousada).

168
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Enquanto não era concluída a construção do aterro da Lustosa, os resíduos


sólidos urbanos provenientes do concelho de Felgueiras continuariam a ser depositados
na lixeira de Sendim.
Sucede que, para além do período previsto no concurso, a lixeira de Sendim
continuou a receber os lixos urbanos.
A C.M. de Lousada pretendia que os concelhos de Paços de Ferreira e Felgueiras
pagassem uma verba mensal à junta de freguesia da Lustosa para que os resíduos
sólidos urbanos pudessem ser depositados no aterro da Lustosa. Houveram divergências
acerca deste ponto, de modo que o presidente da C.M. de Lousada não permitiu que na
Lustosa fossem recebidos aquele tipo de resíduos provenientes de Felgueiras, impasse
que durou cerca de 8 ou 9 meses, período de tempo em que os resíduos sólidos urbanos
continuaram a ser depositados na lixeira de Sendim.
Chegou-se entretanto à conclusão que a verba prevista para a selagem da lixeira
de Sendim seria muito superior porque o volume de lixo ali depositado foi muito
superior ao previsto no contrato, pelo que se teve de ajustar o preço.

- Testemunha José da Silva Campos


Foi vereador a tempo não permanente na CMF entre 1983 e 1985 e a tempo
permanente entre 1986 e 25.10.93, voltando a ser verador a tempo não permanente entre
1994 e 1997. Só em Junho de 1996 voltou a execer a as funções de vereador a tempo
não permanente.
Nos primeiros 11 anos concorreu integrado nas listas do PS como independente.
Nos quatro anos seguintes concorreu integrado nas listas do PSD como independente e
no último mandato voltou a concorrer integrado nas listas do PS como independente.
Nunca tendo sido filiado, no âmbito das campanhas apenas tinha intervenção
política, desconhecendo como era organizada.
Sabia que existiam donativos e que muitos felgueirenses apoiavam todos os
partidos com donativos, tanto quanto ouviu dizer.
Ignora a quem o dinheiro era entregue, mas certamente que seria entregue a uma
equipa encarregue de recolher o dinheiro.

- Testemunha António Ribeiro Dinis


É militante do PS desde Março de 1995.
Integrou a comissão política concelhia do PS de Felgueiras em 1996/97. À data
a presidente da comissão política era a arguida Fátima Felgueiras (não sabe desde
quando).
Em finais de Maio ou princípios de Junho de 1997 a comissão política deliberou
por unanimidade apoiar a candidatura da arguida Fátima Felgueiras à presidência da
CMF. Ela era a candidata natural para esse cargo.
Mandataram então o secretariado para eleger a direcção de campanha e para
dinamizar o grupo de apoio.
O arguido Bragança era o responsável pelo secretariado.
Haviam reuniões do secretariado, mas o depoente não participava nelas.
Esteve presente numa reunião onde foi constituída a direcção de campanha e
criados os pelouros. Estavam presentes muitas pessoas, inclusive os arguidos Horácio
Costa, Joaquim Freitas, Júlio Faria e Fátima Felgueiras (a qual chegou mais tarde).
Essa reunião terá-se-á realizado talvez em Junho de 1997, logo a seguir à
deliberação da comissão política a que já fez referência, pois entretanto vinha o período
das férias.

169
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tem a ideia que a testemunha Fernando Sampaio também estava presente nessa
reunião.
O depoente integrou de forma voluntária o pelouro das finanças, tendo-se
mesmo oferecido para integrar esse pelouro, de que também faziam parte os arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas.
À pergunta efectuada no sentido de se saber porque razão o arguido Horácio
Costa, não sendo militante do PS, integrou esse pelouro, respondeu que ele é familiar do
arguido Bragança (cunhado) e cabia ao secretário-coordenador desenvolver a
composição dos pelouros, pelo que, segundo presume, terá sido essa a razão pela qual
ele integrou o pelouro das finanças, além de que ele também exercia funções na CMF
(acha que ele era assessor da arguida Fátima, mas não tem a certeza. Expressou a
certeza de que ele era assessor – conforme era do domínio público -, mas em rigor não
sabe se o era da arguida Fátima). Esse facto pode também ter contribuído para que ele
integrasse esse pelouro.
Mais tarde surgiram outras pessoas a colaborar com o pelouro das finanças, mas
quando esse pelouro foi constituído só tinha três elementos (os arguidos Horácio Costa
e Joaquim Freitas e o depoente).
De resto, a testemunha Fernando Sampaio chegou a colaborar com os arguidos
Horácio e Joaquim Freitas na angariação de donativos, sem que no entanto fizesse parte
do pelouro das finanças.
Tem a ideia que o arguido Joaquim Freitas, por seu turno, tinha já experiência na
recolha de fundos em campanhas anteriores.
Os três reuniram-se e elaboraram uma lista de pessoas e empresas a contactar no
sentido de obter donativos (o critério de constituição dessa lista tinha a ver com a
disponibilidade financeira das pessoas a contactar, normalmente elementos pertencentes
ao tecido empresarial). Seguramente que deu sugestões de nomes.
Entretanto, não sabe porque razão o deixaram à margem do processo de recolha
de fundos, não tendo assim efectuado qualquer contacto no sentido de recolher fundos
para a campanha.
Não questionou os arguidos Horácio e Joaquim Freitas acerca das razões pelas
quais foi posto de lado, mas tem a ideia que comentou esse facto com a testemunha
Fernando Sampaio.
Ouviu dizer que o arguido Horácio fazia os contactos telefónicos.
Nessa altura o depoente trabalhava na repartição de finanças de Lousada (tendo
depois ido para a repartição de finanças de Baião e, em Setembro de 1997, para a
repartição de finanças de São João da Madeira). Assim, só à sexta-feira é que o
depoente poderia ir às reuniões, ainda que chegasse atrasado.
Por conseguinte, não obstante as suas limitações de tempo por força da sua
actividade profissional, participava nas reuniões da direcção de campanha e estava
presente em acções de campanha.
Nas reuniões da direcção de campanha eles apresentavam com satisfação o
resultado da sua acção em termos genéricos (tinham uma ideia de quanto seria
necessário para custear a campanha e eles apenas iam revelando em termos globais
como ia decorrendo a angariação de fundos. Diziam que esta estava a correr bem, mas
não davam pormenores).
Seja como for, o depoente não sabia nem lhe era transmitido qual o nível de
realização da angariação de fundos.
Estavam mais preocupados com as acções de campanha e não tanto com a parte
financeira.

170
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Fátima Felgueiras nunca se preocupava muito com as questões


financeiras, preocupando-se mais com a estratégia política.
Em 2001 o depoente também participou na campanha para as eleições
autárquicas e a postura era a mesma.
Referiu porém não saber se fora do âmbito das reuniões da direcção de
campanha o arguido Horácio Costa informava a arguida Fátima Felgueiras dos assuntos
relacionados com o pelouro das finanças.
O arguido Júlio Faria integrava a comissão coordenadora da direcção de
campanha. Esse grupo centralizava as questões em termos de estratégia política.
Faziam-se actas das reuniões, sendo certo porém que nunca as viu, tendo a ideia
de que haveria alguém mandatado para as fazer.
À época as pessoas mais importantes do PS de Felgueiras eram os arguidos Júlio
Faria e Fátima Felgueiras.
Nessas eleições o número dois da lista foi o Sr. José Carlos Lickefold e o
número três a testemunha Edgar Pinto da Silva.
Confrontado com o manuscrito de fls 156, reconheceu a letra do arguido Júlio
Faria, acrescentando porém que desconhece o documento em causa.
*
Em face do depoimento da testemunha António Ribeiro Dinis, o arguido
Horácio Costa referiu que não conhecia a dita testemunha, só a tendo visto na
apresentação da candidatura da esposa dele na Lixa, a qual encabeçava a lista de
candidatos a uma das juntas de freguesia dessa zona, sendo certo que só falou com ele
na inauguração da sede de campanha na Lixa. Até esse dia não o conhecia.
Só ouvia falar dele de vez em quando, sendo certo que nunca esteve com ele em
qualquer reunião seja de que ambito for.
Nas reuniões ele não tinha participação. Ele trabalhava na repartição de finanças
e não se lembra dele ter estado presente em qualquer reunião.
Ele participou na elaboração da candidatura da esposa, segundo teve
conhecimento por terceiros.
Não sabe se ele participava nas reuniões da comissão política, reuniões onde o
depoente não participava.
Se ele tivesse de facto feito parte do pelouro das finanças tê-lo-ia referido ao
tribunal.
Assegurou que ele não fez parte desse pelouro.
O depoente não tinha poder para incluir ou excluir (marginalizar) quer quer que
seja.
Não compreende que, se ele tivesse feito parte desse pelouro e tivesse sido
marginalizado, não tenha colocado o problema, quando é certo que a testemunha em
causa foi um dos mandatários que em nome do PS local lhe instauraram a acção de
prestação de contas já referida.
*
A testemunha Dinis, por seu turno, reafirmou o que disse, acrescentando que o
José Manuel Pinto Ribeiro (um industrial da Lixa) lhe disse que o arguido Horácio
Costa lhe havia telefonado por causa de um donativo.
Não se recorda de mais alguém lhe ter dito que o arguido Horácio fez um
contacto telefónico nesse sentido.

- Testemunha Augusto Coelho de Faria


Desde 1978 que é o presidente da junta de freguesia de Idães e até às últimas
eleições autárquicas fez parte da comissão política do PS local. Foi sempre eleito

171
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

integrado nas listas do PS, com excepção das últimas eleições autárquicas, uma vez que
foi eleito integrado nas listas do PSD. Foi militante do PS desde 1989 até 2005.
Fez parte do secretariado e da comissão eleitoral na campanha eleitoral referente
às eleições autárquicas que tiveram lugar em 1997.
Aliás, sempre fez parte das comissões eleitorais.
Uma vez que fazia parte do secretariado integrou a direcção de campanha.
Em 1997 a comissão política do PS foi eleita em Janeiro, tendo reunido em
princípio de Junho desse ano, onde foi mandatado o secretário-coordenador (o arguido
Bragança) para criar a direcção de campanha.
Foi assim o secretariado e alguns elementos da comissão política (por ex. o
depoente) quem fizeram os convites às pessoas para integrar a direcção de campanha.
Pensa que os respectivos elementos não foram escolhidos pela arguida Fátima
Felgueiras, visto que as pessoas convidadas foram à primeira reunião da direcção de
campanha acompanhadas das pessoas que as convidaram, sendo certo que a arguida
Fátima não esteve presente nessa primeira reunião.
A direcção de campanha foi assim composta por elementos do secretariado, por
alguns membros da comissão política e outras pessoas amigas do PS mas não militantes.
O arguido Júlio Faria fazia também parte dessa direcção de campanha (mas a arguida
Fátima Felgueiras não fazia parte da mesma. Em todas as campanhas eleitorais
autárquicas em que participou o candidato à presidência da CMF nunca fez parte da
direcção de campanha).
A direcção de campanha reuniu pela primeira vez a 09.06.97, data que
confirmou com documentos que possui e que verificou quando soube que iria depor
neste julgamento como testemunha.
Os jornais locais reportaram-se à criação e composição da direcção de
campanha, designadamente o jornal “O Sovela”, edição de 12.09.97, o qual cobriu uma
conferência de imprensa onde foi apresentada a direcção de campanha, tendo sido
publicado nesse jornal os nomes de quem integrava essa estrutura da campanha
eleitoral.
A arguida Fátima era à data a presidente da comissão política.
Foi então confrontado com os documentos de fls 12206 e ss., juntas pelo arguido
Júlio Faria, referindo que também tem cópia desses documentos, tratando-se de actas
que eram feitas em cada uma das reuniões que tinham lugar.
Era o arguido Bragança quem fazia as actas das reuniões, as quais não eram
assinadas. Na reunião seguinte eram distribuídas cópias da acta referente à reunião
anterior. Foi assim nessa altura que entrou na posse dos documentos que já referiu.
Assim, no documento de fls 12211 (igual ao documento a que acima fez
referência a propósito da data da primeira reunião da direcção de campanha) consta que
a primeira reunião ocorreu a 09.06.97, conforme tinha afirmado.
Chamou à atenção para o facto de que nas actas não constam o nome de todos os
elementos que integravam a direcção de campanha, já que existiam elementos que por
inerência faziam parte dela, além de que o rol das pessoas que dela faziam parte ia-se
alargando até ao dia das eleições.
Assim, é natural que o “Sovela” apenas tenha divulgado os nomes das primeiras
pessoas que fizeram parte da direcção de campanha, na sua edição de 12.09.97.
Já a reunião ocorrida no Centro Tecnológico do Calçado a 16.06.97 serviu para
traçar com a direcção de campanha a organização da campanha eleitoral, tendo sido
decidido fazer um apelo público à arguida Fátima Felgueiras para se candidatar, apelo
esse que teve lugar a 05.07.97 num almoço no Mercado Municipal (cfr. a edição do
“Sovela” de 11.07.97, onde noticia esse evento, ocorrido no dia 05.07.97. A fls 3 desse

172
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

jornal aparece uma fotografia da mesa, onde está a D. Glória Freitas, militante do CDS).
A organização desse evento e realização desse apelo público era uma forma de
mobilizar as pessoas em torno da campanha pois já se sabia que a arguida Fátima seria a
candidata do PS.
Como a arguida Fátima Felgueiras “estava no coração das pessoas”, foi muito
fácil a mobilização das pessoas para a campanha.
O convite endereçado à arguida Fátima para se candidatar era lógico, em face da
obra que ela levou a cabo no concelho nos dois anos anteriores. Assim, pelo menos em
Margaride, já se sabia que ela seria candidata antes de se fazer o apelo à sua
candidatura.
No mínimo ela teria já essa expectativa, mas só aquando da primeira reunião a
que aludiu é que essa expectativa se concretizou.
Em Setembro desse ano ocorreu a apresentação da candidatura dela, conforme
noticiado pelo jornal “O Sovela”.
Na primeira reunião da direcção de campanha (a 09.06.97) criaram-se os
pelouros (dos eventos, da comunicação, das finanças, da estratégia política, entre
outros).
Os arguidos Júlio Faria e António Pereira integraram o pelouro da estratégia
política.
O depoente, nessa reunião, estava ao lado da testemunha António Dinis, o qual
se ofereceu logo para integrar o pelouro das finanças, tendo integrado ainda esse
pelouro os arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa.
Nessa primeira reunião é possível que tenham estado presentes as testemunhas
Edgar Pinto da Silva e Orlando Sousa.
Admite também que as testemunhas Vítor Sousa (que fez parte do pelouro da
comunicação) e Fernando Sampaio (que participou em muitas reuniões) tenham estado
presentes na dita reunião onde se criaram os pelouros, mas não se recorda.
A arguida Fátima Felgueiras nada teve a ver com o pelouro das finanças, até
porque ela não esteve presente nessa reunião.
A imagem do presidente da câmara era para ser resguardada, daí que não
acredite que ela tenha tido qualquer intervenção nesse domínio.
A propósito da realização de eventos mais caros, questionavam os elementos do
pelouro das finanças no sentido de saber se existiam os fundos ncessários. Sucedeu
assim por exemplo a propósito da actuação dos “Santos & Pecadores”.
Recorda-se de ter questionado os elementos do pelouro das finanças acerca
desse assunto, sendo certo que a arguida Fátima Felgueiras não estava presente. Não era
aliás a arguida Fátima quem programava os eventos mas a direcção de campanha.
Nunca a viu a pedir donativos para a campanha.
Explicou que é muito amigo dela e se isso sucedesse saberia.
Aos arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa nunca os viu tristes e
preocupados. Diziam que toda a gente dava dinheiro porque “adoravam a Fatinha”.
As contas da campanha eleitoral sempre foram separadas das contas do PS. A
conta oficial do partido era apenas usada para o pagamento das despesas correntes do
PS.
As contas da campanha eram separadas (como sucedia com todos os partidos) na
medida em que nela participavam pessoas que não eram militantes.
Assim, as finanças da campanha nada tinham a ver com as finanças do PS, pois
as campanhas tratam-se de eventos supra partidários.
O arguido Joaquim Freitas era um elemento da comissão política do PS.

173
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Horácio Costa trabalhava na CMF (não sabe o que fazia mas
trabalhava no andar de cima do edifício da CMF, perto do GAPP) e era cunhado do
arguido Bragança (secretário-coordenador).
O arguido Horácio Costa dizia que era assessor da arguida Fátima Felgueiras,
mas nunca foi recebido por ele, apesar de quase todos os dias ir à CMF.
O arguido Joaquim Freitas já tinha feito parte do pelouro das finanças em
anteriores campanhas eleitorais referentes a eleições autárquicas.
O pelouro das finanças é tão importante como os outros.
Para si a escolha dos candidatos era mais importante.
O arguido Horácio Costa integrou o pelouro das finanças se calhar por ser
cunhado do secretário-coordenador do PS.
No âmbito das reuniões em que a arguida Fátima esteve presente (ela esteve
presente em muitas) ela dava sugestões como qualquer outra pessoa.
Nunca viu ordens escritas da arguida Fátima dirigidas aos pelouros.
O número dois da lista do PS a essas eleições era o Sr. Lickefold e quando ele
saíu da vereação foi o arguido António Pereira que passou a ocupar a vice-presidência
da CMF, ao que presume (na medida em que ele era o braço direito da arguida Fátima).
A testemunha Edgar Pinto da Silva, por seu turno, passou a número três (a testemunha
referiu que não tem a certeza deste facto).
A testemunha Edgar Pinto da Silva não fazia parte do secretariado, pelo que
acha estranho que ele tivesse afirmado que foi a arguida Fátima Felgueiras quem
escolheu os elementos da direcção de campanha.
Havia um grupo de pessoas de que fazia parte o arguido António Pereira e meia
dúzia de presidentes de junta, incluíndo o depoente, que “davam o litro” pela
candidatura da arguida Fátima Felgueiras.
Nunca ouviu a expressão “task force” ou “núcleo duro” como reportado a esse
grupo de pessoas ou a outro.
A testemunha Orlando Sousa foi candidato à Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Não sabe se ele fez parte da Direcção de Campanha, mas é natural que
entretanto viesse a fazer parte dela (essa testemunha referiu a existência de um “núcleo
duro”, facto que a testemunha Augusto Faria referiu desconhecer).
A testemunha Vítor Sousa é jornalista e integrava o pelouro da comunicação.
Pensa que ele era militante do PS. Admite que ele possa ter estado na primeira reunião
da direcção de campanha. Confrontado com o facto dessa testemunha ter referido que a
arguida Fátima esteve nessa reunião, respondeu que ele se deve ter equivocado.
Confrontado com o facto da testemunha Fernando Sampaio também ter dito que
a arguida Fátima esteve presente nessa reunião, na sede do PS, respondeu que ele se
deve ter equivocado.
Tal testemunha referiu ainda que a arguida Fátima indicou nomes para a
direcção de campanha, facto que a testemunha Augusto Faria refutou, assegurando que
as pessoas ofereciam-se para integrar os diferentes pelouros em face das suas aptidões.
O depoente nunca ouviu dizer que essa testemunha tenha feito parte do pelouro
das finanças, admitindo porém que possa ter colaborado com esse pelouro.
O depoente teve mais contacto com o arguido Horácio Costa quando ele foi
vereador (pensa que a partir de Janeiro de 1999), pese embora cerca de 99% das vezes
que ia à CMF, enquanto presidente de junta, falava com a arguida Fátima Felgueiras.
Não sabe qual era o relaciomento existente entre os arguidos Fátima Felgueiras e
Horácio Costa.

174
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Joaquim Freitas era empresário e dava-se bem com o arguido


Horácio.
A testemunha Dinis, apesar de fazer parte do pelouro das finanças, pouca ou
nenhuma actividade desenvolveu nesse âmbito, ignorando porque motivo tal sucedeu.
Ele referiu-lhe que apenas o chamaram uma vez no âmbito desse pelouro, ignorando em
que altura isso terá sucedido.
Não sabe se os arguidos Horácio e Joaquim Freitas conversavam com a arguida
Fátima acerca desse pelouro, mas pensa que não.
O arguido Júlio Faria coordenava as reuniões da direcção de campanha.
Foi então a testemunha confrontada com o manuscrito de fls 156, tendo referido
não reconhecer a letra.
Apenas admite que esse documento tenha sido elaborado após a primeira
reunião da direcção de campanha, onde se criaram os pelouros.
Não sabe se antes das reuniões ocorreram contactos pessoais entre os arguidos
Júlio Faria, Horácio Costa e Joaquim Freitas a propósito do pelouro das finanças.
Não sabe como é que esse pelouro movimentava a conta aberta, mas
normalmente eram os responsáveis desse pelouro quem recebiam os donativos e
pagavam as despesas.
Não faz ideia quanto é que se gastou na campanha, mas terá sido “muito
dinheiro”.
Não sabe quanto é que as pessoas em concreto contribuíram, mas tal assunto era
tratado nas reuniões.
Sempre soube que iria ser aberta uma conta para a campanha eleitoral, pois o
arguido Joaquim Freitas transmitiu-lhe que iriam abrir uma conta para proceder ao
depósito dos donativos e para proceder aos pagamentos. Soube depois pela
comunicação social que foram os dois a abrir essa conta. Aquando dessa conversa não
se recorda quem estaria presente, admitindo até que pudesse estar apenas com o arguido
Joaquim Freitas.
Ignora se os outros elementos da direcção de campanha sabiam ou não da
existência dessa conta à data.
Não sabe se a arguida Fátima se preocupava ou não com a situação financeira do
“Sovela”.
Ao que pensa, qualquer compra tinha de passar pelo secretário-coordenador.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa referiu que nunca esteve
em qualquer reunião em que tenha sido constituído o pelouro das finanças.
Se o PS entendia que pelo facto da sua candidata, estando envolvida nas
questões financeiras da campanha, ficaria com a sua imagem delapidada, o depoente
não sentiu a sua imagem delapidada pelo facto de pertencer ao pelouro das finanças.
O depoente, em muitas ocasiões, ia às reuniões em representação da arguida
Fátima Felgueiras, levando as suas instruções, daí que de facto ela muitas vezes não
tenha estado presente.
Ia a essas reuniões em representação dela porque ela assim lho ordenava.
A testemunha Augusto Faria deu indicações relativamente a pessoas que
poderiam contribuir para a campanha e sempre com referência à arguida Fátima na
medida em que ela gozava de grande popularidade.
Os valores recebidos eram comunicados aos arguidos Fátima Felgueiras e Júlio
Faria. Entregava-lhes cópias dos extractos bancários. Tratava-se de assunto que não era
divulgado.

175
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Os presidentes de junta eram uma espécie de parentes pobres e iam à CMF


mendigar junto da arguida Fátima Felgueiras as suas reivindicações.
As reuniões da “task force” eram constituídas por pessoas muito ligadas à
arguida Fátima Felgueiras (pelo depoente, Joaquim Freitas, Bragança, Júlio Faria, Maria
Augusta, Edgar Pinto da Silva, Júlio Pereira e Francisco Almeida).
Os presidentes de junta tinham também que tratar das respectivas candidaturas.
O depoente chegou a receber a testemunha Augusto Faria (ele enquanto
presidente de junta) a propósito de um diferendo que ele teve em 1998 com
determinadas pessoas do lugar do Tarrio. Antes tinha recebido a pessoa que encabeçava
esse movimento e mais tarde a testemunha para explicar a sua posição.
Recebeu-o no seu gabinete na CMF a propósito de eventos realizados em Idães,
como por exemplo em Julho de 1997.
Em boa verdade não era o secretariado que organizava as coisas, pese embora
colhesse os louros em relação ao que era feito.
As listas foram feitas pouco antes de terem sido apresentadas no tribunal.
O símbolo da campanha foi escolhido pela arguida Fátima, bem como o slogan.
A escolha da sede de campanha foi escolhida pela arguida Fátima e não pelo
secretariado.
A escolha de alguns fornecedores não foi feita pelo secretariado nem pelo PS.
A propósito de uma entrevista concedida pela testemunha Manuel Faria (líder da
oposição) à RTP a arguida Fátima reuniu a “task force” para rebater em termos políticos
o que nessa entrevista foi dito. A testemunha Augusto Faria não fazia parte da “task
force”. Sabe porém que ele era muito ouvido pela arguida Fátima a propósito de
assuntos relacionados com as juntas de freguesia, pois ele tinha um certo peso político.
Muitas vezes, depois das reuniões ocorridas na sede de campanha, ficavam os
elementos da “task force” e tratavam de assuntos que não tinham sido tratados nas
reuniões mais alargadas.
*
A testemunha Augusto Faria referiu, por seu turno, que pensa não ter tido
qualquer reunião com o arguido Horácio a propósito de um problema de águas em
Tarrio (não se tratava de um problema relacionado com um caminho).
Reafirmou que o secretário-coordenador teve um papel fundamental na
coordenação da campanha eleitoral. Ele era o braço direito do arguido Júlio Faria na
comissão coordenadora.
O depoente esteve presente na reunião em que o arguido Horácio Costa – que
também estava presente – foi indicado para 5º lugar da lista do PS. O depoente colocou
reticências à inclusão do nome do arguido Horácio Costa naquela posição da lista por
ser novo. Não sabe quem o indicou, pois ele já constava do documento que circulava
entre os presentes. Disseram-lhe que era uma lista para ganhar e acatou-a.
O depoente como membro do Secretariado e da Comissão Política não se podia
fazer substituir, pelo que não faz sentido que a arguida Fátima se fizesse representar
pelo arguido Horácio nas reuniões.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que não incluiu o
arguido António Pereira Mesquita de Carvalho como fazendo parte da “task force” na
medida em que ele nunca ficava nas reuniões da noite por razões pessoais.
Em todo o caso, ele era uma pessoa da confiança da arguida Fátima Felgueiras.
Já tinha referido que a inclusão do nome do depoente no 5º lugar da lista não foi
bem acatado.

176
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

As folhas de presença nas reuniões do secretariado e da comissão política eram


apenas assinadas por quem estava presente. O seu nome aparecia depois de uma linha
divisória, que o separa dos demais.
Reafirmou que participou nessas reuniões da comissão política em representação
da arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que, não sendo militante nem eleito para esse
órgão, não era suposto nelas tomar parte.
*
A testemunha Augusto Faria, por seu turno, referiu não se recordar de ver o
arguido Horácio em alguma reunião da comissão política.
Admitiu porém que ele possa ter estado presente em alguma reunião da
comissão política, mas não tinha o direito de voto.
Muitas vezes o arguido António Pereira esteve consigo à noite depois das
reuniões da comissão política.
*
A arguida Fátima Felgueiras referiu, por seu turno, que na reunião em que
foram aprovadas as listas foi a depoente que fez as listas para a CMF.
Foi o falecido Barros Moura quem fez as listas para a Assembleia Municipal.
Eram os cabeças-de-lista quem propunham as listas.
Foi a depoente quem indicou para 5º lugar o nome do arguido Horácio Costa
pelos motivos que já teve oportunidade de explicar (apenas para acalmar o arguido
Bragança, ainda com a promessa de mantê-lo no GAPP, já que tinha negado integrá-lo
sequer na lista, quando ele queria ser o número dois), sendo certo que o 5º da lista nunca
era eleito (desde 1989 que integrava as listas do PS e o 5º elemento nunca tinha sido
eleito). Nas eleições de 1997, porém, estiveram perto de eleger o 5º elemento da lista,
sendo certo que foi considerado que nessas eleições o PS obteve a maior vitória no
concelho (e a segunda maior vitória no destrito do Porto nessas mesmas eleições).
A propósito do cartão de fls 12644 (cartão de agradecimento junto pelo arguido
Horácio Costa na 28ª sessão) referiu que fez questão de manuscrever os cartões de
agradecimento dirigidos a várias pessoas pelo contributo que deram para a campanha
(trabalhando na mesma).
Tal nada teve a ver com o agradecimento a algum elemento da sua lista.
Aliás, o cartão de fls 12644 foi “roubado” por alguém, sendo certo que esse
documento não foi dirigido ao arguido Horácio Costa. Escreveu cartões iguais depois
das eleições. A referência nesse cartão ao dia 17 às 21.30 horas deverá reportar-se à
comemoração da vitória, mas não tem a certeza (as eleições ocorreram a 14.12.97).
Eram sobretudo a figuras de instituições de Felgueiras e que estiveram com a
sua candidatura (pensa que não eram sequer militantes do PS) que dirigiu tais cartões.
Uma das pessoas a quem deu um dos cartões de agradecimento foi ao Sr.
Clemente Freitas (pai do arguido Joaquim Freitas) e pode ter sido por via dele que o
cartão de fls 12644 chegou às mãos do arguido Horácio Costa.
O secretariado é um órgão executivo.
A comissão política é um órgão colegial de reflexão política.
Nas reuniões da comissão política podem estar como convidados eleitos pelo PS
não militantes, sem direito a voto ou de intervenção.
O arguido Horácio assistiu a uma ou duas reuniões da comissão política como
convidado, quando já era vereador. Ele queria intervir mas não podia fazê-lo. Enquanto
ele não foi vereador ele nunca foi a qualquer reunião da comissão política, ainda que
como convidado, pois não o poderia lá estar.

177
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na comissão política não há representações em caso de ausência, pelo que nunca


se poderia fazer representar por alguém nas suas ausências. É pois falso o que a
propósito referiu o arguido Horácio.
*
O arguido Horácio Costa, por sua vez, ainda em relação ao cartão de fls 12644,
assegurou que o mesmo lhe foi dirigido e recebeu-o no dia em que a lista iria dar
entrada no tribunal.
É pois falsa a versão apresentada pela arguida Fátima Felgueiras a esse
propósito.

- Testemunha Maria da Glória Pinto Leite Freitas


Foi deputada na Assembleia Municipal de Felgueiras (eleita como independente
na lista do PSD) durante um mandato, antes da arguida Fátima Felgueiras ter sido eleita
presidente da CMF (terá sido pois eleita nas eleições de 1993).
Fez igualmente parte da direcção da “Cercifel”.
Participou na campanha eleitoral da arguida Fátima Felgueiras referente às
autárquicas de 1997, a qual já conhecia por motivos profissionais, tendo estabelecido
com ela uma relação de amizade. Considerava-a a melhor candidata à presidência da
CMF.
A depoente fez parte do grupo de eventos (foi a D. Madalena quem a convidou).
Integrou esse grupo depois de estar formado, sendo certo que se tratava de um grupo
que se ia alargando.
A arguida Maria Augusta também fazia parte desse grupo.
Participou em muitas reuniões, quer relativas apenas ao grupo de que fazia parte
quer em reuniões mais alargadas à noite.
Sempre que o grupo dos eventos queria realizar alguma iniciativa contactava o
grupo de angariação de fundos na pessoa dos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
(o arguido Horácio era o “homem da nota”).
Deu como exemplo o facto de terem recebido cinco deputadas europeias, tendo
organizado um lanche num hotel e oferecido um ramo de flores a cada uma. Foi o
arguido Horácio Costa quem pagou a despesa e recorda-se que ele achou caro.
Às vezes a arguida Fátima, nas reuniões mais alargadas, dirigia-se ao arguido
Hoarácio e perguntava-lhe se havia dinheiro (“Ó Horácio, há dinheiro? Pode ser?”).
Nunca notou que os arguidos Fátima Felgueiras e Horácio Costa andassem
aborrecidos.
Acerca dos eventos conversavam com a arguida Fátima, mas ela não “metia o
bedelho” nesses assuntos.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas angariavam fundos, tendo o marido da
depoente (comerciante de peles) comentado consigo que os viu em fábricas, presumindo
que a pedir donativos.
Sabe que o arguido Horácio Costa trabalhava na CMF, mas não sabe que
funções exercia.
O arguido Joaquim Freitas, por seu turno, era empresário (trabalhava na fábrica
do pai).
*
O arguido Horácio Costa referiu que na campanha de 1997 houveram um
conjunto de pessoas que por indicação da arguida Fátima Felgueiras foram convidadas
para aderirem à causa da sua candidatura. Ela deu-lhe uma lista de nomes de “notáveis”,
segundo a expressão dela, com bom nome na terra e normalmente desprendidas do PS.

178
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Precisou que a arguida Fátima fornecia os nomes ao arguido Bragança, os quais,


no seu computador, os incluía na lista de pessoas que integravam a comissão de apoio.
Entretanto as listas foram organizadas em face da actividade das pessoas a
convidar. Entre elas estava a testemunha Maria da Glória Freitas.
Essas pessoas iam sendo chamadas quando haviam eventos.
Confirma que a testemunha Maria da Glória participou no pelouro dos eventos.
Porém, quem normalmente executava as tarefas eram as pessoas ligadas ao PS e
que trabalhavam na CMF.
A testemunha Maria da Glória não foi designada na reunião onde se
constituíram os pelouros.
No que se refere ao lanche ocorrido num hotel (“organização de mulheres para
mulheres”), foi dos poucos homens que esteve presente.
Conforme disse a testemunha Maria da Glória, o depoente era conhecido como o
“homem da nota”.
A factura das flores chegou-lhe às mãos, através da testemunha Júlio Pereira.
Não sabia de onde vinha essa factura.
Acerca da constituição do pelouro das finanças e da abertura da conta do BES a
testemunha Maria da Glória nada sabe na medida em que era matéria reservada.
Naturalmente que a arguida Fátima lhe perguntava se havia dinheiro à frente de
outras pessoas, informando-a. À frente de outras pessoas ela não lhe iria perguntar de
forma pormenorizada acerca das verbas existentes, pois era assunto tratado em privado,
dado ser matéria reservada.
Na altura havia o nervosismo inerente ao facto da eleição não ser certa, daí que a
contenção na informação era importante, de modo a não passar para a oposição.
A arguida Fátima, aliás, não queria que as contas da campanha passassem por
certos elementos do PS e não queria prestar contas à estrutura distrital do PS.
As coisas eram organizadas antes de serem discutidas nas reuniões, pois se a
organização das coisas se fizesse nas reuniões nada se organizaria. Era o “staff” da
arguida Fátima quem de facto organizava os eventos.
*
- Testemunha Carlos Zeferino Ribeiro da Costa
É presidente da junta de freguesia de Lagares desde 1976, tendo sempre
concorrido às eleições autárquicas integrado nas listas do PS.
Desde 1992 que é militante do PS.
Foi membro da comissão política de 1997 até 2005.
Em 1997 a arguida Fátima Felgueiras era a presidente da comissão política do
PS de Felgueiras.
Em termos políticos era ela quem mandava. Em termos de execução era o
secretariado que executava as determinações políticas. O secretário-coordenador era o
arguido Bragança, cunhado do arguido Horácio Costa.
Nos princípios de Junho de 1997 a comissão política do PS reuniu (a arguida
Fátima estava presente) e mandatou o secretariado para constituir uma direcção de
campanha, contactando assim as pessoas para o efeito.
Nos finais de Junho desse ano, no Centro Tecnológico do Calçado, fez-se uma
reunião mais alargada e decidiu-se que nos princípios de Julho de 1997 iria realizar-se
um almoço-convívio para apelar à arguida Fátima Felgueiras que se candidatasse à
presidência da CMF, o que sucedeu no primeiro Sábado de Julho no Mercado
Municipal.
Ela era a candidata natural do PS.

179
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Os pelouros apenas foram criados numa reunião ocorrida depois das férias na
sede do PS, reunião essa na qual não esteve presente. Soube disso por ouvir dizer a
alguns dos seus colegas.
O depoente não fez parte da direcção da campanha, mas assistiu a algumas
reuniões. Nas reuniões a que assistiu a arguida Fátima Felgueiras era presença habitual.
Ela era a principal interessada que a campanha corresse bem.
Toda a gente sabia que a angariação de fundos ficou a cargo dos arguidos
Horácio Costa e Joaquim Freitas. Eles pediram a colaboração a alguns presidentes de
junta no sentido de lhes indicar pessoas a contactar a fim de lhes solicitar um donativo.
Não acompanhou os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas à fábrica da
testemunha Júlio Sampaio Teixeira (fábrica “Lagarto”), em Lagares, no sentido de
recolher um donativo.
Eles vangloriavam-se que angariavam muito dinheiro. Não lhe parece que eles
andassem a cumprir ordens de quem quer que seja.
Nunca viu qualquer escrito, designadamente do arguido Júlio Faria, relativo ao
pelouro das finanças.
Se não houvesse dinheiro pouco se poderia fazer.
Cada um oferecia-se para os pelouros para os quais tinham mais vocação.
Era o arguido Júlio Faria – enquanto coordenador da campanha – que
perguntava às pessoas acerca do pelouro que estariam dispostas a integrar, segundo lhe
disseram, e então as pessoas ofereciam-se para integrar os pelouros de acordo com a
respectiva vocação.
Segundo lhe disseram, a testemunha Dinis foi o terceiro a oferecer-se para
integrar o pelouro das finanças.
Não sabe se a arguida Fátima estava presente nessa reunião.
Essa reunião era importante na medida em que se escolhessem as pessoas
erradas para os diferentes pelouros podia-se deitar tudo a perder, pelo que considera
natural que a arguida Fátima estivesse presente nessa reunião.
Antes dessa campanha não estava “muito metido” no PS, pelo que não sabe de
que modo eram organizadas as campanhas anteriores.
As contas da campanha eram separadas das contas do partido até porque nas
campanhas eleitorais autárquicas intervinham pessoas que não eram militantes do PS.
Tal era assim um procedimento habitual.
O depoente era fornecedor de peixe e fornecia as sardinhas para os eventos.
Num dos eventos quis oferecer as sardinhas mas o arguido Horácio Costa fazia
questão de as pagar, dizendo-lhe que não havia a necessidade de as oferecer na medida
em que havia muito dinheiro (tratava-se de um valor a rondar os 50.000$00); o depoente
porém não aceitou o pagamento.
A Comissão de Eventos era constituída pelo Jacinto Ferreira, pela arguida Maria
Augusta e pelo António Faria. Nenhum dos seus elementos trabalhava na CMF. Nunca
lhe constou que a testemunha Maria da Glória fizesse parte dessa comissão, mas via-a
por lá. Acabou por referir que ela foi convidada para integrar essa comissão por ser
dinâmica. Constava-se que ela era simpatizante de um partido de direita (acha que do
CDS).
O depoente quis fazer um evento de apresentação dos candidatos em Lagares e
falou acerca disso com a Comissão de Eventos e com o arguido Horácio no sentido de
saber se havia dinheiro para custear as despesas.
O depoente apresentou queixa-crime contra o arguido Horácio Costa na medida
em que ele, na Assembleia Municipal de Felgueiras, disse que os presidentes de junta
beneficiaram de dinheiro do “saco azul”.

180
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quando o depoente tinha assuntos relacionados com a freguesia de Lagares,


tratava-os com a arguida Fátima no gabinete desta.
Recorda-se que certa altura apareceu na CMF o arguido Horácio Costa e nessa
altura não sabia quem ele era. Encontrava-o de vez em quando nos corredores da CMF,
na zona política. Diziam que ele se gabava de ser assessor, segundo lhe disseram alguns
dos seus colegas presidentes de junta de freguesia. Não perguntou à arguida Fátima
quem era ele.

- Testemunha Artur Manuel da Silva Carvalho Borges


É militante do PS. Foi presidente da Câmara Municipal de Baião entre 1983 até
1993. Por ser presidente da CMB, foi presidente da comissão política do PS de Baião.
Em finais de 1995 era o Vice-governador Civil do Porto (o Dr. Joaquim Couto
era o Governador Civil do Porto).
Presidiu à comissão de fogos florestais do Governo Civil.
Em 2002/2003 foi chefe de gabinete da arguida Fátima Felgueiras (GAPP).
Em 1997, por norma, os candidatos à presidência das câmaras municipais não
integravam a respectiva direcção de campanha, a qual era integrada por pessoas que se
disponibilizavam para acompanhar determinada candidatura.
Era comum, segundo a experiência que tem, que os cidadãos se organizassem
em torno de determinada personalidade, que encabeçava o projecto.
À época as direcções de campanha dirigiam o convite à candidata de forma mais
reservada, cujo anúncio era depois tornado público.
O candidato não se metia na organização dos pelouros, só se ocupando da parte
política e da estratégia política. Não lhe causa assim estranheza que a cabeça de lista
não esteja presente na reunião onde se organizaram os pelouros.
Não é usual em qualquer partido que o candidato se envolva na parte financeira
da campanha. Esse distanciamento, porém, não vai ao ponto de se desinteressar de saber
se há ou não dinheiro para custear as despesas de campanha.
O candidato tem uma intervenção muito centrada nos comícios e ao nível da
transmissão do projecto político. Essa é a prioridade da sua intervenção.
É preocupação da direcção de campanha organizar-se de modo a reunir os
fundos necessários para custear as despesas.
Não concorda com a ideia de que as pessoas que angariam fundos para a
campanha tenham de ser de grande confiança do candidato.
Ao tempo, as contas da campanha não entravam nas contas dos partidos porque
as pessoas que faziam parte da máquina da campanha não eram todas militantes.
As eleições autárquicas são muito personalizadas, independentemente dos
partidos.
A comissão política é normalmente um órgão deliberativo e o secretariado um
órgão executivo.

- Testemunha Francisco Soares Mesquita Machado


É presidente da Câmara Municipal de Braga desde as primeiras eleições
autárquicas. É militante do PS.
Antes da nova legislação, o PS tinha uma comissão política (que designa os
candidatos, os quais são ratificados pela comissão política nacional do PS) e um
secretariado (órgão executivo).
O secretariado organiza a campanha (normalmente é o secretário-coordenador
que assume papel de relevo na coordenação do secretariado, o qual pode agregar outros

181
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

elementos que possam auxiliar nas tarefas da campanha eleitoral, ainda que não sejam
militantes).
As tarefas são assim distribuídas, sendo certo que é habitual a existência de um
grupo ou de uma só pessoa encarregue da angariação de fundos.
Normalmente tenta-se resguardar o cabeça de lista da angariação de fundos na
medida em que ele é o responsável pela estratégia política, tarefa que por si só já é
pesada.
Convém que a angariação de fundos seja feita com alguma independência.
Não conhece caso algum (que pode existir) em que o cabeça de lista se envolva
na angariação de fundos.
Os angariadores de fundos têm em primeiro lugar que ser pessoas de confiança
do secretário-coordenador.
Acha pouco provável que tenham de ser pessoas de confiança da candidata, a
qual é só a responsável número um pela coordenação política da campanha e não da
logística. Em todo o caso tem de haver confiança mútua.
Se no final não existisse dinheiro suficiente para pagar todas as despesas de
campanha a responsabilidade pelo respectivo pagamento seria do partido a nível local e,
em última análise, a responsabilidade pelo pagamento seria do PS nacional.
Era habitual a abertura de uma conta para a campanha.
Em Braga, no final, reuniam-se e se houvesse um saldo positivo, a verba
respectiva convertia-se em receita do PS.
As contas da campanha tinham autonomia em relação às contas do partido, até
porque na campanha referente às eleições autárquicas intervinham pessoas que não
eram militantes e as contribuições até eram concedidas por pessoas que não se
identificavam sequer com o partido.
Normalmente as pessoas que davam donativos não queriam que o respectivo
nome fosse revelado. Com a nova lei de financiamento dos partidos é obrigatória a
identificação das pessoas que contribuem para as campanhas, situação que cria
dificuldades na angariação de fundos.
Não tem conhecimento que em Felgueiras as coisas se passassem de modo
diferente em relação a Braga.
Conhece a arguida Fátima Felgueiras há muitos anos (desde o tempo em que ela
era veradora na CMF) e já pertenceram ambos ao Secretáriado Nacional no PS.
Das diversas conversas que manteve com ela nunca notou nada que o levasse a
pensar o contrário (em todo o caso as conversas que tinham não versavam sobre esse
tema).
A arguida Fátima é pessoa afável, dinâmica e corajosa para enfrentar a situação
de que está a ser alvo.
Nunca notou nela um acto menos sério.
Ela faz as coisas com convicção e tem uma postura que caracteriza pelo “antes
quebrar que torcer”.
Ela foi considerada uma autarca modelo.
O presidente da comissão política faz apenas a orientação política do PS a nível
local. O secretariado é que tem o poder executivo.
A angariação de fundos numa campanha visa assegurar o pagamento das
despesas de pré-camapanha e da campanha propriamente dita. Na altura da pré-
campanha já está formada a comissão eleitoral.
Os valores envolvidos numa campanha dependem da câmara em concreto e do
valor da oposição. O esforço financeiro não é igual em todo o país.

182
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

À pergunta efectuda no sentido de saber se em Felgueiras é razoável um gasto na


ordem dos 50.000 cts, limitou-se a responder que sempre se despendem quantias
avultadas.
É evidente que o secretário-coordenador tem de ter confiança nas pessoas que
escolheu para angariar os fundos, as quais têm de ser sérias.
A conta bancária do PS não se pode misturar com a conta bancária da campanha,
desconhecendo qualquer situação em que isso não seja assim.
É normal existir dinheiro em caixa para pagar pequenas despesas.
A conta bancária da campanha por vezes não está em nome do partido mas das
pessoas responsáveis pela angariação de fundos.
Reconheceu que, em concreto, não sabe o que se passou em Felgueiras.
Normalmente as contas bancárias abertas para a campanha não deverão ser
usadas para outros fins (devem ser apenas usadas para financiar a campanha).
Ao depoente, em Braga, nunca lhe foram prestadas contas acerca da campanha
eleitoral, pois não se envolvia nesses assuntos nem queria saber quem tinha concedido
os donativos.

- Testemunha Raúl Fernando Sousela da Costa Brito


É militante do PS desde 1975, tendo sido dirigente distrital e nacional desse
partido (pertenceu ao secretariado nacional da comissão política nacional do PS). Foi
deputado na Assembleia da República durante 13 anos, até 1995, dando apoio à região
do Vale do Sousa. Foi igualmente deputado no Conselho da Europa e vice-governador
civil do Porto. Foi ainda vereador na CMF.
Teve intervenção na campanha eleitoral de 1997 em Felgueiras.
A nível local existia um Secretariado da Comissão Política do PS de Felgueiras
que via quais eram os nomes para determinada candidatura e que cerca de oito a seis
meses antes das eleições apresentava a sua proposta à comissão política.
É o Secretariado que detém o poder executivo no partido.
O secretário-coordenador é o principal decisor na estrutura local do PS, pois
preside a um órgão executivo do partido.
As grandes deliberações são tomadas na comissão política, normalmente sob
proposta do secretariado.
Naturalmente que o candidato pode fazer as suas exigências e colocar as suas
condições, designadamente no que respeita à composição das listas.
No que a este aspecto concerne, não sabe se a Comissão Política do PS de
Felgueiras deu ou não à arguida Fátima carta branca para constituir a respectiva lista,
circunstância que não descarta e que admite ser uma possibilidade.
Todos tentam angariar o maior número de apoiantes, assim alargando a base de
apoio.
Em 2001 o depoente foi candidato (derrotado) à presidência da Câmara
Municipal de Paços de Ferreira e foi o secretariado do PS local que lhe apresentou os
nomes das pessoas que integrariam os diversos grupos. O candidato também pode
sugerir nomes. Parte-se do pressuposto que as pessoas escolhidas são sérias.
Os candidatos não se envolvem na recolha de fundos de modo a que não se
sintam depois condicionados no caso de serem eleitos.
A regra é assim a distanciação entre a questão dos fundos para a campanha e o
candidato. Este, em todo o caso, pode participar em almoços de angariação de fundos.
O candidato tem assim uma intervenção mais política e normalmente não tem
um conhecimento profundo da situação financeira da campanha.

183
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Naturalmente que quando o candidato deseja fazer um comicio tem de saber se


existem os fundos necessários, sendo então informado pela estrutura.
Convém que um dos elementos do grupo de angariação de fundos faça parte da
comissão política local do PS.
Sucede frequentemente que os fundos existentes sejam insuficientes para custear
a campanha e o partido não se responsabiliza pelo pagamento das dívidas, razão pela
qual muitas vezes os credores dirigiam-se aos candidatos no sentido de lhes pagar os
respectivos créditos, chegando eles então a pagar do seu bolso algumas despesas de
campanha.
Até por esse motivo as contas da campanha são autónomas em relação às contas
do partido, sendo certo que desconhece qualquer situação em que assim não fosse, numa
altura em que não havia financiamento público dos partidos políticos.
Por outro lado, essa autonomia deve-se ainda ao facto da campanha para as
eleições autárquicas envolver pessoas que não são militantes.
Assim, ninguém prestava contas ao partido no que respeita às contas da
campanha (enquanto dirigente da Federação Distrital do PS nunca verificou que alguém
tenha prestado contas das campanhas eleitorais autárquicas).
Os assessores normalmente estão numa situação de fragilidade e procuram
agradar na medida em que o respectivo lugar pode estar em causa.
Se estivesse no lugar do arguido Horácio Costa teria recusado angariar fundos.
Trata-se de uma situação que lhe parece anómala na medida em que pode levar a que
alguns doadores possam ter expectativas de alguma contrapartida, pois há o risco de se
associar o assessor ao candidato no que se refere à angariação de fundos.
À data a arguida Fátima Felgueiras era a presidente da comissão política local do
PS.
Normalmente as campanhas movimentam verbas consideráveis.
Na campanha de 2001 para a campanha eleitoral relativa às eleições autárquicas
para a Câmara Municipal de Paços de Ferreira, foram despendidos cerca de
8.000.000$00.
Em Felgueiras não sabe que verba foi despendida, pois tal depende das
iniciativas que aqui foram tomadas.
Existem pessoas que dão dinheiro para a campanha e não querem que se saiba,
sendo certo que as contribuições tanto podem ser dadas em numerário como através de
cheque.
Normalmente a comissão de candidatura abre uma conta bancária.
No seu caso (campanha eleitoral de 2001 relativa à C.M. de Paços de Ferreira)
isso sucedeu e se não havia dinheiro para determinada iniciativa o depoente decidia se
pagava ou não o que faltava do seu bolso em ordem a que essa iniciativa se realizasse
(ou não).
No seu caso, os titulares da conta respectiva pertenciam ao grupo de angariação
de fundos, facto que o depoente sabia. Seja como for, o depoente não participou na
recolha de fundos. Não obstante, admitiu ter recebido dois donativos de dois amigos.
Acabou por referir que, no que toca aos outros concelhos, não sabe como é que
essa questão foi organizada.
Assim, não obstante os princípios que proclamou professar, considerou um
donativo de 500 cts normal e que os aceitaria se lhos fossem oferecidos pessoalmente,
concluindo que não é fácil conciliar o princípio da necessidade (que o obrigaria a aceitar
pessoalmente donativos) com o princípio da independência em relação à questão dos
fundos.

184
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Armando António Martins Vara


Em 1997 fazia parte do secretariado nacional do PS.
Foi coordenador do PS no que se refere às eleições autárquicas de 2001.
O PS caracteriza-se por ser uma “organização desorganizada”.
Havia grande autonomia das suas estruturas locais.
Era a comissão política concelhia que ratificava a lista dos candidatos e tomava
as decisões. O secretariado é que organizava o processo eleitoral do partido.
O depoente conhece melhor a realidade de Bragança.
As tarefas eram distribuídas pelas pessoas, incluindo a angariação de meios
financeiros para a campanha.
Por norma os cabeças de lista não se ocupavam da angariação de fundos, no
sentido de resguardar o candidato de um hipotético conflito de interesses uma vez eleito.
Se o depoente fosse candidato procuraria que alguém muito perto de si não
estivesse envolvido no grupo responsável pela recolha de fundos para a campanha
eleitoral.
Por via de regra era o secretariado que designava as pessoas.
As contas da campanha não se confundiam com as contas do partido a nível
local.
Os estatutos do PS regulam as substituições, não achando por isso possível que o
presidente da comissão política concelhia possa ser substituído na sua ausência por um
representante que tenha enviado para o efeito. Quem o deveria substituir seria o
primeiro suplente.
Segundo tem ideia, não recebeu dos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
qualquer carta, mas admite que possa estar equivocado visto que recebia muitas
missivas.
A questão de se saber se o PS apoiaria ou não a recandidatura da arguida Fátima
Felgueiras em 2001 foi discutida na comissão de coordenação do PS para as eleições
autárquicas de 2001. O PS manteve o apoio à arguida Fátima, não obstante as notícias
que vinham a público, já que a forma como ela vinha exercendo o cargo de presidente
da CMF mereceu-lhe mais confiança do que as acusações que vinham a público e que
considerava serem fruto de uma disputa do poder a nível local.
Se tivesse tido qualquer dúvida acerca da honestidade dela e do seu carácter não
a teria apoiado no sentido de que fosse a candidata do PS à CMF nas eleições
autárquicas de 2001.
Ela sempre foi uma excelente presidente de câmara.
Quem é militante de uma causa não anda por interesse pessoal. A arguida
Fátima Felgueiras é militante nas causas que defende.

- Testemunha Mário Hermenegildo Moreira de Almeida


É presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde desde 1981, tendo sido
presidente da Associação Nacional de Municípios durante 11 anos.
Há muitos anos que é o presidente da comissão política do PS de Vila do Conde.
Quem efectivamente conduz os destinos do PS a nível local é secretariado. O
depoente, quando se quer inteirar dos pormenores de algum assunto relacionado com o
partido consulta, por exemplo, o secretário-coordenador.
No dia-a-dia o depoente não manda no PS de Vila do Conde, pese embora seja a
figura máxima do partido em Vila do Conde. Confia nas pessoas que fazem parte do
secretariado local.
Em 1997, em Vila do Conde, no que se refere à campanha eleitoral, referiu o
seguinte:

185
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Normalmente há recandidaturas. Recolhe-se os nomes que irão integrar a lista e


é aí que o candidato tem a intervenção principal.
O depoente nunca se ocupa dos aspectos organizativos da campanha, conforme
aliás é a norma.
No período de campanha eleitoral o candidato tem um trabalho enorme e tem de
se concentrar nas questões políticas.
O secretariado é que organizava a campanha, podendo criar grupos, onde se
inclui a angariação de fundos (que organiza, por ex., jantares de angariação de fundos,
recolhe donativos e organiza leilões de obras de arte).
Em Vila do Conde as receitas angariadas para a campanha entravam na conta
oficial do PS local.
O depoente nunca se envolveu na recolha de fundos e se alguém lhe oferecesse
algum donativo remetia a pessoa para os responsáveis pela angariação de fundos,
recusando-se a receber esse donativo.
Não sabe como é que as coisas se passaram em Felgueiras.

- Testemunha José Narciso de Rodrigues de Miranda


Foi presidente da Câmara Municipal de Matosinhos durante 26 anos, funções
que interrompeu por pouco tempo quando integrou o Governo.
Integrou todos os órgãos do PS, quer a nível local, regional e nacional, excepto o
de secretário-geral.
Em 1997 era o presidente da Federação Distrital do Porto do PS e membro de
órgãos nacionais do mesmo partido.
No exercício das suas funções no PS acompanhou as eleições autárquicas nesse
ano.
Existia uma orientação verbal segundo a qual os candidatos não deveriam
participar na recolha de fundos.
Aliás, o depoente, em todas as vezes que concorreu à presidência da C.M. de
Matosinhos, nunca recebeu pessoalmente qualquer donativo e se lho quisessem oferecer
pessoalmente diria que não tratava desse assunto.
Quanto à composição das listas, dava-se grande autonomia às estruturas
concelhias do partido, listas essas que normalmente eram aprovadas pelo PS.
Nas concelhias onde apenas existe uma secção as questões operacionais são
tratadas pelo secretariado.
Havia a orientação de se organizar grupos de trabalho nas campanhas. Havia
também o grupo de recolha de fundos, cujos membros eram os responsáveis pela
recolha dos fundos.
O depoente nunca conheceu nem se preocupou em conhecer os mecanismos de
recolha de fundos. Durante a campanha a pressão é maior e o candidato não tem sequer
tempo para se ocupar dessas questões.
Esteve em Felgueiras a propósito da campanha eleitoral relativa às eleições
autárquicas de 1997.
À data o secretário-coordenador era o arguido Bragança.
Recorda-se que em 1997 o processo eleitoral no interior do partido foi pacífico.
Na disputa interna no seio da Federação Distrital do Porto do PS a arguida
Fátima apoiou sempre um candidato diferente do depoente, com excepção da última
candidatura do depoente (em que ela o apoiou).
Ela integrou a estrutura nacional do PS, mas tal não sucedeu por sugestão do
depoente.

186
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A primeira vez que sentiu que qualquer coisa de anormal se passava em


Felgueiras foi quando certa ocasião uma das suas secretárias o chamou à atenção para o
facto de ter recebido cartas anónimas relacionadas com Felgueiras, mas o depoente não
lhes deu importância (nem sequer as viu) e mandou avisar a arguida Fátima Felgueiras.
Em Outubro/Novembro de 1999 o depoente foi para o Governo e no seu
ministério comentou-se que tinham recebido cartas anónimas (o Jorge Coelho era o
ministro).
Numa viagem de avião em que também viajava a arguida Fátima, abordou-a
acerca desse assunto e disse-lhe para ver o que se passava.
Foi-lhe pedida insistentemente a realização de uma reunião com pessoas do PS
de Felgueiras, entre as quais o arguido Bragança, mas recusou várias vezes. Entretanto,
acabou por aceder tomar um café com ele, mas como se atrasou combinaram jantar em
Matosinhos. Nessa reunião conheceu os irmãos Costa (o arguido Horácio Costa e o
irmão), estando ainda presentes os arguidos Joaquim Freitas e Bragança.
Eles pediram-lhe a sua ajuda para resolver o problema de Felgueiras, uma vez
que eles tinham um projecto de poder, projecto esse encabeçado pelo arguido Horácio
Costa.
Porém, tal projecto era absurdo, razão pela qual nunca poderia dar o seu aval a
essas intenções.
Esse projecto consistia em afastar a arguida Fátima da presidência da CMF.
Acusavam-na de autoritarismo.
Disse-lhes que se a arguida Fátima saísse da presidência da CMF teria de ser o
número dois a assumir a presidência. Consequentemente, o projecto deles era inviável.
Abordaram o assunto das cartas anónimas, mas recusou-se a falar com eles
acerca do respectivo conteúdo.
Nessa reunião falou sobretudo com o arguido Bragança.
Entretanto, em Setembro de 2000, o depoente saíu do Governo e alguns meses
depois teve lugar uma reunião na sede distrital do PS com elementos do PS de
Felgueiras (consegue apenas identificar o arguido Horácio, não se recordando quem
eram os demais elementos) na qual lhe quiseram entregar um dossier acerca das contas
do PS de Felgueiras, as quais apresentavam saldo (era o arguido Horácio quem tinha na
sua posse esse dossier, o qual se mostrava cansado e abatido).
Pediu para que lhe explicassem quem é que em Felgueiras lhe deu credenciais
para ter uma conta bancária do PS. Disseram-lhe então que a conta estava em nome dos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, recusando-se por isso a receber o dito
dossier (por não se tratar de uma conta do PS).
Sugeriu que apresentassem esse dossier ao responsável do PS pelas contas
nacionais do partido.
Lidou com a arguida Fátima Felgueiras sobretudo nos congressos do PS e nas
estruturas nacionais do partido.
Recorda-se que perante um conflito institucional que se prendia com a instalação
de um instituto politécnico pelo Governo na região do Vale do Sousa (tem a ideia que
ponderava-se a sua instalação ou em Felgueiras ou em Lousada ou em Felgueiras ou em
Paços de Ferreira, já não se recorda bem), tendo-se marcado uma reunião entre a
Secretaria de Estado do Ensino Superior e os dois presidentes de câmara onde esse
instituto se poderia vir a instalar (ambos eleitos pelas listas do PS) e, em face do que a
arguida Fátima expôs de forma agerrida, aquele instituto viria a ser instalado em
Felgueiras.
Em 2001 o depoente chegou a ser o responsável do PS, durante 5 meses, pela
coordenação das autárquicas (sucedeu-lhe a testemunha Armando Vara) e questionava-

187
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

se se o PS deveria ou não apoiar a recandidatura da arguida Fátima. Todos consideraram


que ela se deveria recandidatar numa reunião ocorrida numa altura em que já era a
testemunha Armando Vara o responsável do PS pela coordenação da campanha eleitoral
referente às eleições autárquicas de 2001.
*
Em face do depoimento da testemunha Narciso Miranda o arguido Horácio
Costa negou terminantemente que existisse alguma tentativa de “assassinato político”
da arguida Fátima Felgueiras.
Na sequência da denúncia anónima houve uma reunião em casa da arguida
Fátima Felgueiras.
O Dr. Barros Moura conversava muito com o arguido Bragança, inclusive acerca
da denúncia anónima, e a arguida Fátima “andava de cabeça perdida”.
Ele (Barros Moura) sugeriu ao arguido Bragança a marcação de uma reunião
com a testemunha Narciso Miranda, o que foi feito para o dia 05.02.2000 (inicialmente
havia referido 05.02.2001, dizendo ter-se tratado de lapso).
Essa reunião tinha como objectivo expôr a situação política que se vivia em
Felgueiras para que a testemunha Narciso Miranda chamasse a “capítulo” a arguida
Fátima (em face da reacção dela na sequência de denúncia anónima).
Foi estabelecido que a essa reunião iria o Dr. Barros Moura, os arguidos
Bragança e Joaquim Freitas, o depoente, a testemunha Edgar Costa (o qual se recusou a
ir).
Porém, à última hora o Dr. Barros Moura informou que não poderia ir a essa
reunião e, em sua representação, foi o irmão do depoente (Orlando Costa), o qual era
membro da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Na dita reunião a testemunha Narciso Miranda lançou o repto de um projecto de
poder a encabeçar pelo arguido Bragança, tendo comparado a arguida Fátima a um
eucalipto que em volta tudo seca. Mais disse ao arguido Bragança que ele teria de tomar
conta do partido em Felgueiras e que teria de “mobilizar as suas tropas” caso tivesse
fundamento a denúncia anónima e que o partido teria de prosseguir ainda que com um
“cadáver político”.
Foi por isso que o arguido Bragança fez os seus contactos nos dois dias
seguintes, findos os quais foi corrido da CMF.
Na dita reunião a testemunha Narciso Miranda contou que também tinha sido
alvo de uma denúncia anónima e geriu a questão sem dar nas vistas, isto é, sem fazer
“ondas” na comunicação social.
Ele viu a documentação que levavam.
A testemunha Narciso encarregou então a testemunha Guilherme Pinto de se
econtrar com o depoente para melhor esclarecer a situação, razão pela qual entretanto se
encontraram na Foz (o depoente, o arguido Joaquim Freitas e a testemunha Guilherme
Pinto).
Entretanto, a propósito de documentos que entretanto fez juntar ao processo a fls
14718 e ss., o arguido Horácio Costa chamou à colacção vários artigos de jornal que
considerou relevantes (e demonstradores do apoio que a testemunha Narciso Miranda
prestou à arguida Fátima Felgueiras), designadamente as cópias desses artigos
constantes de fls 14719 a 14724, 14726 a 14729, 14732 a 14737.
*
Dada a contradição existente entre os depoimentos do arguido Horácio Costa e
Narciso Miranda, procedeu-se à respectiva acareação, onde ambos mantiveram
posição anteriormente assumida quanto ao propósito do encontro que tiveram.

188
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assim, o arguido Horácio Costa disse que a reunião com a testemunha Narciso
Miranda ocorreu em 05.02.2000 (e não 2001 conforme por lapso havia referido).
A testemunha Narciso Miranda apoiou as quatro pessoas que com ele se
reuniram na Federação Distrital do Porto.
Não foi o depoente quem a marcou com a testemunha Narciso. O depoente foi
convidado pelo arguido Bragança para ir com eles, sendo certo que ele iria transmitir à
testemunha Narciso quais eram as necessidades do partido em face da gestão autárquica
que então se vivia e do que era imputado à arguida Fátima Felgueiras.
O Dr. Barros Moura, enquanto presidente do órgão fiscalizador da acção da
CMF (era presidente da assembleia municipal), sentiu a necessidade da realização da
aludida reunião com a testemunha Narciso Miranda.
O Dr. Barros Moura, aliás, estava também a ser alvo de ataques, pois a jornalista
Inês Serra Lopes, do “Independente”, remeteu ao arguido Barbieri um documento
alusivo à gestão dos dinheiros públicos pela Associação Industrial de Felgueiras (criada
pelo Dr. Barros Moura e outras pessoas), a fim de dele obter um comentário
(28.01.2000) – cfr. e-mail de fls 14718.
Haviam pois razões partidárias e pessoais do Dr. Barros Moura para que ele
quisesse a realização da reunião com a testemunha Narciso Miranda.
A 14.02.2000 o PSD de Felgueiras promoveu uma conferência de imprensa onde
tornou pública a denúncia anónima e acrescentou uma série de assuntos em relação a
essa denúncia.
O ambiente era tenso e de preocupação para quem estava ligado ao PS de
Felgueiras, daí a necessidade da reunião com a testemunha Narciso Miranda.
O depoente foi incluído nesse grupo de pessoas, mas nunca foi incluído em
qualquer projecto de poder. O depoente foi convidado para ir à dita reunião para dar
conta do que se passou com a conta do BES.
Refuta pois a ideia da existência de um projecto de poder que visasse o derrube
da arguida Fátima Felgueiras nos moldes em que a testemunha Narciso Miranda o
apresentou ao Tribunal.
As expressões “assassinato político” e “assalto de poder” foram usadas pela
arguida Fátima Felgueiras para desvalorizar a investigação e as declarações do
depoente. Quando ela foi constituída arguida ela passou a dizer que as pessoas eram
ressabiadas políticos e que as oposições se aproveitavam disso na tentativa de a
destituir.
A testemunha Narciso prometeu-lhes que iria tomar decisões e resolver o
problema, mas apercebeu-se que ele acabava por actuar de forma diferente. Ele acedia
com quem falava, isto é, se falasse com a arguida Fátima solidarizava-se com ela e ao
mesmo tempo manifestava apoiar o grupo que o visitou .
No “Sovela” aliás vem publicada uma notícia que dá conta que a testemunha
Narciso Miranda se solidarizou com a arguida Fáima Felgueiras (notícia publicada na
edição de Abril de 2000).
O depoente considerou tal facto uma traição, nomeadamente em face do que a
testemunha Narciso se comprometeu perante o grupo com quem reuniu e mesmo para
com o PS de Felgueiras.
Ele apelava para a unidade do partido e para a vitória das próximas eleições
autárquicas, que viriam a ocorrer em 2001.
Salientou que nas declarações que o depoente fez à comunicação social manteve
sempre a versão dos factos quer no que toca à reunião com a testemunha Narciso
Miranda quer quanto ao encontro à beira-mar com a testemunha Guilherme Pinto.

189
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha Narciso Miranda chegou a fazer alguns telefonemas ao depoente


dizendo-lhe para não falar à comunicação social e assegurava-lhe que tudo se iria
resolver.
O depoente deixou-se “enrolar” por ele até certa altura porque era “caloiro” na
política. Apercebeu-se que ele jogava com um “pau de dois bicos”.
Numa entrevista que a testemunha Narciso Miranda deu a 13.01.2003 negou ter
conhecimento do “saco azul” quando é certo que a reunião já referida ocorreu em
05.02.2000 (cfr. documento de fls 14737).
Na edição do “Público” de 10.10.2001 vem noticiado que a testemunha Narciso
Miranda apoiava a recandidatura da arguida Fátima Felgueiras à CMF (cfr. documento
de fls 14729).
Reafirmou que foi a testemunha Narciso quem, na dita reunião ocorrida a
05.02.2000, lançou ao arguido Bragança o repto para um projecto de poder, para ele
reunir as suas tropas, que a arguida Fátima era um “eucalipto que secava tudo em volta”
e que se houver um “cadáver politico” a arguida Fátima seria esse cadáver.
Por seu turno, a testemunha Narciso Miranda assegurou que só acedeu reunir
após muitas insistências, pois entendia serem irrelavantes as reuniões solicitadas.
A sua então secretária foi permanentemente contactada para que o depoente
acedesse em reunir com eles (ela trabalhou consigo até Outubro de 1999, tendo então
ido para a Assembleia da República exercer as funções de deputada e o depoente
ingressou no Governo).
Só depois do caso vir a público e porque tinha mais tempo é que acedeu
encontrar-se com eles, encontro que não ocorreu à hora marcada pois o depoente
atrasou-se.
Explicou que o jantar aconteceu acidentalmente, pois a reunião era para se
realizar na mesa de um café às 18 horas, mas por deferência para quem tinha esperado
por si muito tempo, acabou por reunir com eles ao jantar.
Não perguntou a quem quer que seja se tinham comprado um triciclo e não se
lembra de ter apelidado a arguida Fátima de “eucalipto”, mas trata-se de uma expressão
usada com frequência na política e aplicada a pessoas firmes e que são lideres (secando
tudo à volta), pelo que entende ser um elogio.
À data não conhecia a arguida Fátima Felgueiras suficientemente bem para usar
aquela expressão relativamente à pessoa dela.
Em todo o caso, admite que possa ter usado essa expressão na dita reunião.
Nega porém que tenha dito que o poder poderia “cair na rua”.
O jantar foi muito cordial, sendo certo que só conhecia os arguidos Bragança e
Joaquim Freitas.
Reafirma que ainda hoje não conhece a conta do “saco azul” e não seria na dita
reunião que iria tomar conhecimento dessa conta. De facto, nessa reunião não lhe foram
apresentados papéis.
Mais tarde houve uma reunião na sede do PS Porto e quiseram-lhe entregar
documentos relativos ao “saco azul”, mas recusou recebê-los, tendo sugerido que os
mesmos fossem entregues ao presidente da Comissão de Jurisdição (testemunha
Guilherme Pinto), visto que é essa comissão que aplica sanções aos militantes.
O PS tem regras e é a Comissão de Jurisdição que constitui uma espécie de
tribunal do partido. Essa comissão só se pronuncia se houver uma queixa. O normal
seria que se os estatutos tivessem sido violados que se tivesse apresentado uma queixa.
Não sabia que o dito jantar se realizou por iniciativa do Dr. Barros Moura, o
qual era seu amigo e com quem teve várias conversas informais. Ele tinha sido deputado

190
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

e era eurodeputado. Era pessoa muito respeitada. Se soubesse que ele iria à reunião teria
mais cuidado na sua marcação.
Quanto às considerações feitas pelos jornalistas não as comenta, designadamente
que apoiou a arguida Fátima Felgueiras.
Salientou que a arguida Fátima Felgueiras apoiou o Francisco Assis contra a sua
recandidatura à Federação Distrital do Porto do PS, logo não tinha razões para a apoiar.
Que se lembre, nunca falou com o Dr. Sousa Oliveira.
Não tem a certeza em que data ocorreu o dito jantar, mas tem quase a certeza
que teve lugar ainda em 1999 (nessa altura o problema ainda não era público, pois se
fosse já público não acederia em reunir com eles, segundo disse em contradição com o
facto de ter declarado anteriormente que acedeu em reunir após o “problema” se tornar
público e por ter mais tempo disponível).
Tem a certeza que esse jantar ocorreu depois da reunião na sede do Porto do PS
(antes a testemunha tinha transmitido a ideia de uma sequência inversa das reuniões).
Esta reunião na sede do partido no Porto teve lugar pouco depois de ter tomado
posse como Secretário de Estado (Outubro de 1999), talvez 15 ou 30 dias depois.Tem
quase a certeza que foi ainda em 1999.
Ao contrário do que disse o arguido Horácio Costa o dinheiro do “saco azul”
não financiou a Federação Distrital do Porto do PS.
Na altura não existiam regras quanto ao financiamento dos partidos.
Na altura o depoente não tinha razões para se opor à recandidatura da arguida
Fátima Felgueiras.
Não é de estranhar que se prepare as eleições autárquicas com 15 meses de
antecedência. Neste momento já se preparam as próximas eleições autárquicas.
As estruturas dos partidos é que fazem movimentações em reuniões para
preparar estratégias para as candidaturas às eleições autárquicas. É ainda muito cedo
para definir as listas, sendo assuntos que são muito tratados nos corredores.
Deve-se delinear a estratégia e só depois é que deve-se colocar a questão dos
nomes. Reconheceu em todo o caso que na prática não é bem assim.
Não sabe quem é que insistentemente solicitava as reuniões com o depoente, só
a sua ex-secretária é que poderá esclarecer esse facto. Sabe apenas que eram opositores
internos à arguida Fátima Felgueiras.
Explicou que quando há um conflito entre dois militantes do PS não é o líder
distrital que o pode derimir, mas a Comissão de Jurisdição.
Recorda-se que no dito jantar ligou para a sua então secretária (chamava-se
Paula Cristina Guimarães Duarte e não Ana Paula, conforme referiu o arguido Horácio
Costa, sendo certo que nunca teve qualquer secretária ou assessora com o nome “Ana”).
Não tem ideia nenhuma de lhe ter telefonado por causa de algum assunto tratado
nessa reunião.
Na reunião ocorrida na sede do Porto do PS o conflito era já público (o que mais
uma vez revela contradição no depoimento da testemunha quanto à sequência das
reuniões: primeiro referiu que ocorreu o jantar e depois a reunião na sede distrital do
PS; depois afirmou o contrário e agora reafirma a primeira versão). Estavam presentes o
Guilherme Pinto e o Renato Sampaio.
Da dita reunião deduziu que houve uma tentativa de tomada de poder em
Felgueiras.
O arguido Horácio Costa, por sua vez, replicou, reiterando que o jantar ocorreu
a 05.02.2000. Foi aliás o arguido Joaquim Freitas quem pagou o dito jantar com o seu
cartão de crédito.

191
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Dr. Barros Moura responsabilizou a testemunha Narciso Miranda pela má


gestão da “questão de Felgueiras”.
Na reunião ocorrida na sede distrital do Porto do PS (ocorrida a 19.02.2000) o
depoente foi convocado, mas ausentou-se porque recebeu chamadas anónimas,
ameaçando de morte os seus filhos. A testemunha Narciso Miranda disse-lhe que isso
não se fazia e que era muito feio. Não assistiu por isso a essa reunião.
O depoente e o arguido Joaquim Freitas foram alvo de um inquérito disciplinar
pela Federação Distrital do PS e foram ambos suspensos por 60 dias em face das
denuncias difamantes que fizeram em relação à arguida Fátima Felgueiras.
Em 09.02.2000 ocorreu uma reunião em Lisboa em que participaram o Dr.
Barros Moura, a arguida Fátima e a testemunha Narciso Miranda.
No dia 10.02.2000 o arguido Bragança foi posto fora da CMF.
O depoente explicou que tinha a ideia que a secretária da testemunha Narciso se
chamava Ana Paula, mas admite que se possa ter equivocado. Ele ligou-lhe para pedir
que o “material” de Felgueiras fosse colocado na sua secretária na Segunda-feira
seguinte.
É evidente que nesse jantar ele não tomou conhecimento do extracto da conta,
mas tomou conhecimento da situação, como por exemplo a compra do “Audi A4”
referido nos autos.
A testemunha Narciso Miranda referiu então que não foi a Federação Distrital
que aplicou qualquer sanção, mas a Comissão de Jurisdição.
Quem escolhe os candidatos são as comissões políticas concelhias, mas podem
ser avocadas as candidaturas (é necessário para o efeito uma maioria de 2/3). O líder do
partido, com a sua autoridade, pode propor a avocação ao abrigo dos estatutos e quando
ele faz essa proposta é porque já sabe que detém a maioria de 2/3 necessária à respectiva
aprovação.
Em média fazem-se três a quatro avocações por ano no seu partido a nível
nacional.
A reunião na Federação Distrital correu muito bem. Quando deu a palavra para
que o assunto fosse exposto é que lhe quiseram entregar as contas, mas não as aceitou.
No final o arguido Horácio Costa disse que estava a ser ameaçado e disse-lhe que não
era ali que poderia resolver esse assunto.
Acrescentou que no jantar já referido, quando lhe foi apresentado um projecto
alternativo de poder para Felgueiras, perguntou quem era o número dois. Como o
número dois não se encontrava entre o grupo, não seria apossível essa pretensão, pois
em caso de impedimento do presidente da autarquia ele é substituído pelo número dois
(vice-presidente).
O depoente pertencia à Comissão Permanente do PS, na altura presidida pelo
Jorge Coelho, a qual se reunia semanalmente.
Assegurou que em Lisboa não teve qualquer reunião com o Dr. Barros Moura,
pois não tratava desses assuntos.
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa explicitou que se
encontrou na Mealhada com o Dr. Barros Moura no dia 07.02.2000 e deu-lhe conta do
que se passou na reunião (jantar) ocorrida no dia 05.02.2000.
Na reunião de 19.02.2000 (na Federação Distrital do Porto) saíu no início da
mesma, conforme já explicou.
No dia 12.10.2001 o “Comércio do Porto” publicou um artigo de opinião da
testemunha Pedro Baptista, onde defendia que o PS não deveria apoiar a recandidatura
da arguida Fátima Felgueiras (cfr. documento de fls 14730 e 14731).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha Raúl Brito, por seu turno, numa notícia de jornal, queixou-se da
falta de apoio da Federação Distrital do Porto do PS na sua candidatura à Câmara
Municipal de Paços de Ferreira (cfr. documento de fls 14725).
*
A propósito do e-mail de fls 14718, referido pelo arguido Horácio Costa (e por
ele junto aos autos para demonstrar que o Dr. Barros Moura também tinha interesse na
reunião que teve lugar com a testemunha Narciso Miranda), explicou o arguido
Barbieri Cardoso que, à data, a CMF apenas tinha três endereços electrónicos, um dos
quais caía no computador do depoente, outro no computador da Informática (de que era
responsável) e outro no computador da arguida Fátima (mas que esta não usava).
Ficaram espantados como é que o “Independente” tinha tido acesso ao endereço
electrónico em causa, pois era utilizado como um endereço quase privado.
Estranharam que esse e-mail tenha sido enviado a uma Sexta-feira (dia de folga
desse jornal, que na altura saía precisamente à Sexta-feira) e às 23.18 horas.
Em face disso, ficaram na dúvida se esse e-mail tinha sido ou não enviado pelo
“Independente”, já que poderia ter sido remetido por qualquer um.
Consequentemente, procuraram saber se o “Independente” tinha na verdade
enviado esse correio electrónico (não se recorda se falou com a Inês Serra Lopes ou
com a sua secretária), tendo-lhe sido dito de forma inequívoca que não tinha sido esse
jornal a remeter esse e-mail.
Procuraram então saber a origem do mesmo junto da “AEIOU”, a qual alegou
sigilo para negar prestar essa informação e que só a prestariam em sede de investigação
(criminal).
Não tem qualquer ideia de ter fornecido uma cópia desse documento ao arguido
Horácio Costa.
Apesar de não negar esse facto, acha-o estranho, pois o arguido Horácio não
tinha nada a ver com o assunto nem dele nada percebia.
Certo é que a resposta dada (de cariz técnico) não foi posta à consideração dele
(remeteu-a para o “Independente”).
Tem a ideia que a arguida Fátima não queria que se desse qualquer resposta.
*
Ainda a propósito desse assunto, a arguida Fátima Felgueiras referiu que a
estratégia de se remeter e-mails do género foi um método usado para provocar
incidentes, de modo a que a comunicação social fizesse um julgamento em praça
pública.
Antes desse e-mail (de 28.01.2000) a depoente já tinha recebido várias cartas
anónimas.
A primeira carta anónima que recebeu prendia-se com a aquisição do Estádio
Dr. Machado Matos pela CMF, cuja decisão já tinha sido tomada pela CMF mas que
faltava a ratificação pela assembleia municipal, pelo que deve ter recebido essa carta
anónima por alturas de Junho/Julho de 1999.
O Dr. Barros Moura recebeu carta anónima de idêntico teor, pelo que telefonou
logo à depoente a contar-lhe o sucedido.
Procurou-se saber junto dos CTT quem e donde essas cartas tinham sido
enviadas e apuraram apenas que foram remetidas através dos CTT de Vizela.
Ainda acerca do mesmo assunto recebeu uma segunda carta anónima (seguida
de uma carta acerca do mesmo assunto remetida a todos os presidentes de junta de
freguesia, exortando-os a votar contra a aprovação da aquisição do estádio, método que
muito os indignou), onde se fazia menção de que não tinha dado a devida atenção à
primeira carta e que o escândalo iria rebentar.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Dr. Barros Moura só conversava consigo acerca destes assuntos e com o


arguido Júlio Faria (foi a depoente quem o convidou para se candidatar à presidência da
Assembleia Municipal de Felgueiras, o que ele aceitou na medida em que eram
conhecidos de longa data, visto que a depoente andou no externato propriedade da mãe
dele e o irmão dele – Pedro – foi seu professor de matemática).
Os três interrogaram-se acerca da identidade dos autores dessas cartas e
naturalmente que apontaram suspeitos em função dos interesses em jogo. Identificaram
essas pessoas e os jornalistas de que eles se serviam.
Entenderam porém que nada haveria a fazer que não fosse esperar.
Acha estranho que o e-mail de fls 14718 esteja nas mãos do arguido Horácio
Costa, pois não havia razão alguma para que o arguido Barbieri lhe tivesse entregue
uma cópia desse documento. Este aliás enviou uma cópia desse documento para o Dr.
Barros Moura (na Assembleia da República).
A depoente, aludindo indirectamente ao arguido Horácio Costa e a propósito dos
artigos de jornal que fez juntar aos autos, referiu que não andava a colecionar artigos de
jornal.
*
O arguido Horácio Costa, em face destas declarações da arguida Fátima
Felgueiras, reafirmou tudo o que disse no que respeita ao e-mail em causa,
designadamente a forma como lhe veio parar às mãos (tem aliás na sua posse a
respectiva resposta, que se recusou a assinar na medida em que o assunto não lhe dizia
respeito).
Em Julho de 1999 o “Independente” já havia publicado um artigo alusivo aos
negócios existentes entre a CMF e o FCF.
O negócio do estádio foi feito muito antes de Julho de 1999, sendo certo que
nessa altura já a Assembleia Municipal de Felgueiras tinha aprovado o negócio, daí que
não faça sentido que a arguida Fátima tenha recebido cartas anónimas com o teor que
ela referiu após essa aprovação.
Por outro lado, a respeito do facto da arguida Fátima ter referido que não
coleccionava artigos de jornal, salientou que ela juntou dezenas de artigos de jornal no
Tribunal Administrativo (acção de perda de mandato).
Ademais, na primeira entrevista que ela deu aos jornais, não fez referência a
qualquer maquinação para dar uma certa aparência aos factos, descartando antes
qualquer responsabilidade em alguma irregularidade ou ilegalidade cometida, sacudindo
essa responsabilidade para os técnicos da CMF.
Não compreende porque motivo o arguido Júlio Faria haveria de ser consultado
a propósito das aludidas cartas anónimas na medida em que o nome dele só veio à baila
na primeira denúncia anónima.
De resto, à data, o depoente não tinha acesso sequer (e assim conhecimento) a
toda a matéria que consta nessa denúncia.
Por fim, referiu que o Dr. Barros Moura veio do PCP, onde é costume respeitar-
se a máquina partidária.
Ele, respeitando a máquina partidária, tinha longas conversas ao telefone com o
arguido Bragança acerca de assuntos relacionados com a CMF e a assembleia
municipal.
É portanto falso que sobre as questões referidas pela arguida Fátima ele apenas
falasse com ela e com o arguido Júlio Faria.
*
- Testemunha Paulo Ramalheira Teixeira

194
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É presidente da Câmara Municipal de Castelo de Paiva desde 07.01.98 (eleito


pelas listas do PSD).
Referiu que se candidatou à presidência da C.M. de Castelo de Paiva em 1993 e
que perdeu essas eleições, tendo porém vencido as eleições em 1997, sendo reeleito em
2001 e 2005.
Os partidos apresentam os candidatos às Câmaras mas não os apoiam, tendo por
isso de existir uma estrutura autónoma de apoio.
Há assim uma equipa que trabalha todo o processo eleitoral.
Antes de 2001 não existia qualquer regulamentação legal quanto ao
financiamento. Havia sempre um grupo de pessoas credíveis (socialmente credíveis e
sem problemas financeiros) que angariavam fundos para a campanha.
O depoente não se envolvia na questão da angariação de fundos, daí que não
saiba como é que essa comissão procedia.
O candidato tem muitas tarefas, o que não lhe permite disponibilizar tempo para
assuntos como a questão do financiamento.
Além disso, se o candidato se envolvesse nessa questão ficaria comprometido
para com os doadores.
Referiu o depoente que foi condenado em 1996 no pagamento de uma multa de
mil e tal contos e que recusou os apoios financeiros que então lhe foram oferecidos para
liquidar tal multa, justamente para não se comprometer.
Pensa que todos os candidatos se procuram colocar de fora da angariação de
fundos. Essa será a regra, pese embora admita que possam haver excepções.
O depoente trabalhou num grande grupo económico que costumava dar
donativos para vários partidos.
O PSD só lhe ofereceu a foto e mais nada. A partir do momento do anúncio da
candidatura as contas de campanha não entram nas contas do partido. Tal era a regra no
PSD.
Ao que lhe disse o candidato pelas listas do PS à C.M. de Castelo de Paiva,
também era assim no PS, mas não sabe em que moldes.
Acabou por referir que não sabia ao pormenor quem fazia os fornecimentos e
quem os ia pagar no âmbito da campanha eleitoral. Só no final da campanha é que se
fazia um balanço e chegou a ter de passar um cheque pessoal para cobrir o passivo
(pagou 2/3 do custo da campanha).
Referiu ainda que foram encarregadas duas ou três pessoas que garantiram ao
mandatário da sua candidatura que iriam fazer os possíveis para angariarem fundos,
sendo certo que o depoente apenas conhecia a pessoa que ia liderar essa angariação de
fundos por fazer parte da estrutura da sua candidatura, sendo certo que esteve presente
na reunião onde se criou a estrutura de campanha.
Em rigor não sabe se os outros candidatos sabem ou não quem é o responsável
pela angariação de fundos.
O candidato à Câmara é o líder em termos de imagem.
Não se recorda de alguém alguma vez lhe ter oferecido um donativo para a
campanha. Se tal sucedesse remeteria a pessoa para o responsável pela angariação de
fundos.
Revelou que na campanha eleitoral de 1993 foram despendidos 550.000$00, na
campanha eleitoral de 1997 foram despendidos 3.000.000$00 e na campanha de 2001
foram despendidos 10.000.000$00.
Quando um candidato já é presidente de Câmara, quando se recandidata
normalmente é o último a ser apresentado porque se parte do pressuposto de que se vai
recandidatar (uma vez que a estrutura já está montada).

195
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É normal que quem se candidata pela primeira vez tenha de se apresentar mais
cedo.
O depoente já foi convidado pelo presidente do PSD para se recandidatar em
2009 às eleições autárquicas.
Os presidentes do PS e do PSD já anunciaram publicamente que estavam
disponíveis para apoiar a recandidatura de presidentes de Câmara.
Referiu, por fim, no que concerne aterros, que a ministra do ambiente de então,
Elisa Ferreira, na inauguração do Aterro de Rio Mau, elogiou a AMVS pelo facto de
não ter existido derrapagens em relação ao orçamentado.

- Testemunha José Alves de Sousa Oliveira


É advogado de profissão e foi casado com a arguida Fátima Felgueiras até
meados de 1999, tendo a respectiva acção de divórcio por mútuo consentimento sido
proposta em meados de 1998 (a separação de facto deu-se porém em meados de 1997,
quando o depoente saiu da casa-de-morada de família).
Nas eleições de 1993 o depoente foi candidato à presidência da Assembleia
Municipal de Felgueiras, tendo sido o depoente quem fez a respectiva lista (pelo PS)
para esse órgão, tendo incluído nela o arguido Joaquim Freitas.
Quem tinha a responsabilidade pela composição da lista para a CMF era o
candidato à presidência.
Em 1995 a IGAT fez uma inspecção ao município felgueirense e nessa altura o
depoente era o presidente da assembleia municipal.
Até 1995 o arguido Joaquim Freitas andava muito consigo e era visita de sua
casa. Ele era capaz de “rastejar” para agradar.
Na segunda parte do seu mandato como presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras o depoente despachava o respectivo expediente no seu gabinete porquanto o
gabinete da CMF que usava para esse efeito foi necessário para nele instalar um serviço
camarário (pensa que foi para instalar o serviço que tratava das contra-ordenações).
A testemunha Sousa Oliveira fez questão de ser ouvido à matéria relativa ao
funcionamento das campanhas eleitorais (apesar de inicialmente nenhuma questão lhe
ter sido colocada acerca desse assunto), o que se concretizou aquando da sua
reinquirição.
Referiu então que desde 1979 que tem conhecimento da dinâmica das
campanhas eleitorais.
O Dr. Machado Matos era advogado e o depoente trabalhou no escritório dele.
Até 1993 nunca foi candidato, mas apoiava sempre as campanhas do PS.
Em 1993 o depoente foi efeito presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Na campanha eleitoral desse ano o depoente ficou encarregue da angariação de
fundos.
Em 1993 existiam um grupo de pessoas donde emergiram os vários grupos.
Foi assim constituído por exemplo um grupo de reflexão.
Os vários grupos tinham autonomia entre si.
Para evitar que as pessoas soubesse da matéria relativa aos dinheiros e porque o
Sr. Silvério (que fazia parte do grupo que recolhia os fundos) era pessoa muito ocupada,
os donativos foram depositados nas contas pessoais do depoente, na CGD, no BES e na
CCAM.
O depoente não abriu assim nenhuma conta para esse efeito.
Não informou o arguido Júlio Faria (candidato nessas eleições à presidência da
CMF) das contribuições que eram dadas para a campanha.

196
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A si nunca lhe pediram para fazer algum favor como contrapartida em relação a
algum donativo que era concedido, pois todos sabiam que não valeria a pena fazer esse
pedido ao depoente.
Nesse aspecto a arguida Fátima Felgueiras era igual ao depoente, isto é, não era
permeável a pedidos.
Por via de regra o candidato à presidência da CMF não era informado das
contribuições que eram feitas.
As contas da campanha, por seu turno, nada tinham a ver com as contas do
partido.
Em 1997 o arguido Horácio Costa procurou-o uma vez no seu escritório e pediu-
lhe para ver se lhe arranjava uma lista das pessoas que na campanha anterior
concederam donativos e para o informar dos montantes com que contribuíram, pedido
que recusou na medida em que se tratava de matéria reservada.
Lateralmente, referiu que vive na mesma casa que a sua ex-mulher, mas
salientou que fazem vidas completamente separadas (essa alusão foi feita a despropósito
e relaciona-se com o facto do arguido Horácio ter referenciado o facto da testemunha
em causa viver com a arguida Fátima, numa anterior sessão de julgamento em que a
testemunha Oliveira já não estava presente, apesar deste ter assegurado – sem qualquer
credibilidade - não saber o que se passava na sala de audiências).
*
Em face do depoimento da testemunha Sousa Oliveira o arguido Joaquim
Freitas referiu que em 1993 foi o depoente que andou a pedir donativos com essa
testemunha, só não o tendo acompanhado nas visitas a empresas que prestavam serviços
para a CMF.
*
- Testemunha Mário Eurico Pontes Martins
Referiu ser técnico oficial de contas e compadre da arguida Fátima Felgueiras
desde 1992 (ela é madrinha de baptismo do seu filho).
Filiou-se no PS em Fevereiro de 1975. Deixou de ser filiado nesse partido em
2007.
Em 1983 radicou-se em Felgueiras.
Fez parte das comissões políticas e do secetariado.
Desde 1992 até ao presente que é membro da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Em 1997, a nível local, o Secretariado é que detinha o poder executivo e quem
estava à frente dessa estrutura local do PS era o secretário-coordenador. Era ele quem
dirigia a parte executiva do poder no seio do partido a nível local, assegurando tudo
quanto dizia respeito à vida quotidiana do PS em Felgueiras.
A Comissão Política, por seu turno, era o órgão do partido que a nível local
traçava as orientações gerais, reunindo de vez em quando.
Em 1997 a Comissão Política reuniu-se em Junho.
Não fez parte da Direcção de Campanha em 1997, mas era o animador do
partido.
Não havia evento algum que não fosse apresentado por si (“esteve em todas”). O
depoente considera-se um homem da comunicação social, tendo um programa na rádio
local há mais de 20 anos.
Para ilustrar a sua dedicação referiu ter subido aos postes para colocar cartazes.
Nessas eleições o depoente concorreu em número quatro da lista do PS à junta
de freguesia de Margaride.

197
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não existe a tradição da candidata à presidência da CMF fazer parte da direcção


de campanha.
O principal responsável (como coordenador) da direcção de campanha em 1997
foi o arguido Júlio Faria.
Os pelouros foram criados da forma habitual (criaram-se os pelouros dos
eventos, das finanças e da logística).
As pessoas ofereciam-se para integrar os diferentes pelouros, sendo certo que o
depoente ofereceu-se para integrar o pelouro dos eventos (liderado pela arguida Maria
Augusta).
A testemunha Vítor Sousa pertencia à direcção de campanha e parece que estava
ligado a actividades jornalísticas. Ele era avençado na CMF e integrava ali o Gabinete
da Comunicação.
O pelouro das finanças, por seu turno, foi integrado pelos arguidos Horácio
Costa e Joaquim Freitas e pela testemunha Dinis.
O arguido Horácio Costa não era filiado no partido, tendo na altura perguntado
quem ele era, pois não o conhecia. Veio então a saber que ele era cunhado do arguido
Bragança e irmão de Orlando Costa, o qual, à data, era membro da Assembleia
Municipal de Felgueiras (e irmão de uma funcionária da CMF). Disseram-lhe que o
arguido Horácio Costa trabalhava para os lados do Centro Coordenador de Transportes.
O depoente vai poucas vezes à CMF, sendo certo que nunca viu o arguido
Horácio na área política, nem sequer quando ele foi vereador, pois eram as secretárias
que o atendiam (nunca o viu no GAPP). Nunca o depoente conheceu os gabinetes dos
assessores e dos vereadores da CMF.
Ignora quem o convidou para trabalhar na CMF, nem sabe quais as funções que
ele ali exercia.
Mesmo antes de entrar na política a arguida Fátima Felgueiras era a grande
referência cultural do concelho.
Só a ouvia tratar por “tu” o arguido Pereira (nunca a ouviu tratar por “tu” o
arguido Horácio Costa. Segundo imagina, pois nunca a viu dirigir-se a ele, deveria tratá-
lo normalmente, isto é, por “você”).
Nunca a viu envolvida na angariação de fundos. Os candidatos não têm
interferência seja em que pelouro for. A candidata tem de se preocupar com a
mensagem política e de contactar com as pessoas.
Quem reunia com os pelouros era a direcção de campanha. A arguida Fátima
estava presente nas reuniões gerais (com todos os pelouros), não tendo conhecimento
dela se reunir com este ou aquele pelouro.
Existia também um pelouro da comunicação, mas era o secretariado que tratava
dessa área.
Nunca viu os arguidos Horácio e Joaquim Freitas prestarem contas à arguida
Fátima Felgueiras.
Era a candidata à presidência da CMF quem escolhia a sua equipa, assim como
competia ao candidato à presidência da assembleia municipal escolher os elementos
para a respectiva lista, pois a comissão política dava liberdade para tal, pese embora
tivesse de ratificar as listas.
As relações entre os arguidos Bragança e Fátima Felgueiras nunca foram boas.
Foi o depoente quem sugeriu à arguida Fátima que deveria candidatar-se à CMF.
Em 1997 aliás o PSD andava atrás dela para ser a sua candidata.
O arguido Horácio Costa apareceu em quinto lugar da lista para a CMF e não
percebeu esse facto. Interpelaram a arguida Fátima acerca desse assunto e ela disse-lhe
que tinham existido pressões nesse sentido por parte do arguido Bragança, o qual queria

198
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

ser o número dois da lista (cfr. o depoimento da testemunha Augusto Coelho Faria,
presidente da junta de freguesia de Idães). Em 1989 ele tinha sido candidato a
presidente da junta de freguesia de Margaride e havia perdido. Foi ele quem angariou
muitos militantes para o PS.
Havia a tradição do PS eleger quatro elementos (pelo que o quinto elemento em
princípio não seria eleito).
O depoente não esteve presente na reunião onde foram apresentadas as listas de
candidatos.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas não andavam contrariados na recolha de
fundos. As pessoas contrariadas no PS afastavam-se. Ninguém no PS anda às ordens na
medida em que só existem voluntários.
A arguida Fátima, por seu turno, nunca se deixava mandar por quem quer que
seja e nunca dizia “nim”.
Normalmente é o presidente da comissão política que é o candidato à
presidência da CMF, mas nem sempre foi assim (o Dr. Machado Matos era
independente e o arguido Júlio Faria também no primeiro mandato).
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
Mário Martins nunca esteve presente em qualquer reunião em que o depoente esteve
presente.
Constava-se que ele era funcionário de uma empresa de uma cunhada que “dava
rédea curta” aos funcionários e era por isso que ele tinha pouca disponibilidade.
Numa primeira fase era o arguido António Pereira quem animava os eventos e
só mais tarde é que a testemunha Mário Martins passou a animar os eventos.
Ele tinha tão pouca disponibilidade que mesmo nos eventos ele chegava em
cima da hora (a ponto de se colocar o problema de não saberem se ele iria aparecer ou
não), sendo certo que o arguido Bragança entregava-lhe então o guião uns minutos antes
de se iniciar o evento (guião esse que estava na posse do arguido Bragança na CMF).
Aliás, só porque a testemunha em causa não tinha disponibilidade é que foi outra
pessoa quem fez a gravação de uma mensagem da arguida Fátima para ser divulgada
nos carros de som.
Em 1997 ele nunca colocou qualquer panfleto e cartazes, ao contrário do que
disse. O depoente pagou 1.000 cts pela realização desse serviço.
Não compreende como é que a arguida iria ceder a pressões do arguido
Bragança. Ironizou que ele tinha tanto poder no PS local que nem sequer conseguiu
fazer-se incluir na lista para a CMF.
O depoente andava bem disposto porque à data não tinha motivos para pensar
que iria ter problemas.
Pelo menos uma vez a testemunha em causa foi ao seu gabinete na CMF
acompanhado do arguido Joaquim Freitas. Este disse-lhe que ele vinha da parte da
arguida Fátima Felgueiras e explicou-lhe que estava em causa o pagamento das horas
que ele perdia pela animação que fazia, sendo certo que ele tinha tomado conhecimento
de que se tinha gratificado outros colaboradores (pelo que também queria uma
gratificação). Colocou o problema à arguida Fátima, mas a pretensão dele não foi
satisfeita, pois ela disse que as pessoas deveriam andar no PS sem qualquer interesse, o
que deixou muito agastada a testemunha Martins.
Há figuras que só se acercaram da arguida Fátima quando se sabia que ela seria
a vencedora, entre os quais a testemunha em causa.
*

199
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha Mário Eurico Pontes Martins mostrou-se então estarrecido com


as declarações proferidas pelo arguido Horácio Costa, negando que alguma vez tenha
estado com o arguido Joaquim Freitas na CMF.
Apodou de atroz mentira o facto do arguido Horácio ter referido ao tribunal que
o depoente pretendia ser gratificado pela sua acção desenvolvida na campanha eleitoral
de 1997, tendo salientado o seu espírito altruísta, pois nunca levou dinheiro a ninguém,
sempre tendo feito tudo de borla.
Em 1997 de facto “não trepou aos postes” para colocar cartazes, mas fê-lo em
campanhas anteriores.
É falso que o arguido Bragança lhe tenha entregue qualquer guião referente a
qualquer evento que tenha apresentado.
Reafirmou que esteve “em todas”. Fez por exemplo a apresentação da
candidatura da arguida Fátima e era a sua voz que se ouvia difundida pelos carros de
som.

- Testemunha Manuel Tomás Cortez Rdrigues Queiró


Foi secretário-geral do CDS.
Referiu que o arguido Júlio Faria é casado com uma prima da progenitora do
depoente.
O arguido Júlio Faria exerceu as funções de presidente da CMF, presidente da
Assembleia Municipal de Felgueiras e deputado na Assembleia da República (eleito
pelo círculo eleitoral do Porto).
As associações municipais têm muito pouco poder e a fiscalização que exercem
é necessariamente política, já que a Câmara é que detém o real poder.
A associação de municípios normalmente tem poderes delegados dos municípios
associados e as decisões que toma não podem ultrapassar os municípios.
O depoente já fez a constituição da lista de candidatos para a Assembleia da
República com o Professor Freitas do Amaral (na altura presidente do CDS).
Há lugares elegíveis e outros que apenas são incluídos para fazer número. A
disputa dos lugares elegíveis é muito grande e só as cúpulas partidárias é que decidem.
Isto é, ninguém, de per si, decide ser candidato numa posição da lista elegível, pois tal
depende de decisão das direcções nacionais dos partidos.
A composição das listas depende da negociação entre as direcções distritais e a
direcção nacional dos partidos. Há mais abertura nos partidos maiores.
A palavra final é assim sempre do órgão nacional, em particular do líder do
partido.
A esse nível as concelhias não têm qualquer poder.
Em face do que já referiu no que se refere à composição das listas, entende que
em 1993 seria difícil (senão impossível) que o arguido Júlio Faria já perspectivasse a
sua inclusão nas listas do PS para a Assembleia da República, na sequência das eleições
legislativas ocorridas em 1995, e muito menos que perspectivasse a sua inclusão nessa
lista num lugar elegível.
Só no último momento é que se decide a composição das listas.
As eleições locais, por seu turno, são descentralizadas e muito personalizadas
nos candidatos e, assim, muito dependentes da lógica local, factores que se reflectem no
respectivo financiamento.
Há uma contabilidade nacional do partido, o qual fornece material de apoio a
nível nacional, mas também há material específico de cada concelho.
A contabilidade local tem mais relevância nas eleições autárquicas (facto que é
mais evidente nos pequenos partidos).

200
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente já foi o candidato do CDS à CMF em 2001 (numa altura em que o


arguido Júlio concorreu à presidência da Assembleia Municipal de Felgueiras) e 90% do
financiamento da campanha eleitoral reportou-se a financiamento local (na sua
campanha foram despendidos mais de 10.000 cts, tendo prestado contas ao CDS).
Isto também é válido no que se refere aos outros partidos.
Grande parte do seu tempo foi despendido na angariação de fundos para a
campanha eleitoral, tendo visitado para o efeito as indústrias locais, visitando as pessoas
do costume e outras pessoas que lhe foram indicadas, tendo para o efeito elaborado uma
lista alagrada. Se o depoente não se deslocasse pessoalmente no sentido de pedir
donativos seria difícil obtê-los. Às vezes referiam-lhe que já tinham concedido
donativos a outros partidos (PSD e PS).
Revelou que programou despesas sem ter as receitas asseguradas, tendo assim
ficado com um déficit.
Explicou que quem parte à conquista de uma posição perdida não pode prometer
nada.
Ignora como é que se procede no PS e no PSD, mas segundo lhe parecia os
efeitos práticos eram os mesmos.
Nas eleições autárquicas existem 308 lógicas diferentes, tantas quantos os
municípios existentes no nosso país.
A angariação de fundos pelo depoente não era propriamente um acto de
campanha. Se fosse eleito presidente da autarquia e se recandidatasse não consegue
especular se o seu procedimento seria o mesmo quando ao método de angariação de
fundos.
O arguido Júlio Faria foi presidente da autarquia felgueirense numa altura de
grande explosão urbanística no concelho, pelo que ele ficou ligado a muitas obras.
O depoente foi campeão nacional de natação. Recorda-se assim da construção da
Piscina Municipal de Felgueiras.
Foi porta-voz do CDS na Assembleia da República para a área do ambiente e
não lhe passou despercebida a construção das ETAR em Felgueiras.

- Testemunha Pedro Luís da Rocha Baptista


É membro da concelhia política do PS do Porto.
Entre 1993 e 1997 foi deputado municipal na Assembleia Municipal do Porto.
Foi deputado do PS na Assembleia da República entre 1995 e 1999. Foi adjunto
da direcção parlamentar entre 1999 e 2001.
Uma Câmara é basicamente um órgão executivo.
A assembleia municipal tem um papel essencialmente fiscalizador.
As associações de municípios, por seu turno, existem para defender interesses
supra-municipais, dada a falta de regiões administrativas.
Nunca há uma grande antecedência no que respeita às decisões relativas à
composição das listas de candidatos. A tendência é para deixar para a última hora a
tomada das decisões dolorosas, ao ponto de muitas vezes tais decisões serem tomadas
no último dia disponível para a apresentação das listas.
As pessoas podem fazer os seus cálculos na sua intimidade para alcançar
determinados objectivos, mas a política é muito volúvel.
A decisão pertence à comissão política distrital e ao secretário-geral do PS (o
qual tem direito a indicar 30% da lista).
Não sabe quando é que o arguido Júlio Faria foi convidado para integrar a lista
dos candidatos do PS à Assembleia da República no que se refere às eleições
legislativas de 1995.

201
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente foi convidado duas ou três semanas antes da respectiva apresentação


para integrar essa lista (tendo ficado posicionado num lugar entre o 20º e o 30º dessa
lista, sendo certo que o arguido Júlio Faria ocupava um lugar um pouco melhor
posicionado em relação ao lugar ocupado pelo depoente).
Tem a certeza que com mês e meio/dois meses antes da respectiva apresentação
ninguém esboçou a composição dessa lista
É costume a eleição de um deputado pelo Vale do Tâmega.
Não sabe se alguma vez havia sido eleito um deputado de Felgueiras.
O presidente da Federação Distrital faz um esboço da lista e faz contactos tendo
em conta o critério de qualidade dos candidatos e a representatividade, na medida em
que há a tradição de sub-regiões terem deputados eleitos.
Nas eleições legislativas tudo se passa ao mais elevado nível do partido.
É fornecido o material de campanha e é o partido (quer a estrutura nacional quer
a estrutura distrital) que assume a responsabilidade pelo pagamento das despesas de
campanha.
O candidato é quase anónimo.
Nas eleições autárquicas tudo se passa de modo diferente.
Nas eleições de 1997 o depoente foi o candidato do PS à Câmara Municipal de
Gondomar, tendo apenas sido eleito vereador.
Assim, em Gondomar, nessa altura, foi criada uma comissão de fundos, tendo
afastado a pessoa que nas anteriores eleições havia angariado os fundos para a
campanha eleitoral, o qual, por esse facto, apelidou de Nazi o depoente. Afastou-o
mesmo antes de existir uma direcção de campanha e fê-lo porque queria que fosse um
grupo a angariar os fundos e porque o indivíduo em causa não lhe merecia confiança no
que respeita à sua seriedade em face das informações que dele obteve.
O depoente nunca mexeu num tostão. Certa vez alguém lhe disse que queria
contribuir e remeteu-o para o grupo que recolhia os fundos, de modo a que mais tarde
não se sentisse condicionado se fosse eleito.
Essa comissão de recolhe de fundos era autónoma em relação ao PS.
Não sabe se essa comissão abriu alguma conta bancária, mas presume que sim
na medida em que receberam donativos em cheque e passaram recibo.
Recolhia-se fundos a nível local.
Existiam verbas a nível nacional para auxiliar o esforço das campanhas a nível
local.
Uma das condições que colocou para ser candidato à presidência da CMG foi a
de lhe terem garantido na Federação Distrital do PS que havia dinheiro para o apoiar.
Tem porém a certeza que a comissão de angariação de fundos não angariou o
montante necessário para fazer face às despesas de campanha (as quais rondaram os
10.000 cts, facto que só soube à posteriori e de modo vago; houveram porém despesas
que a Federação Distrital do PS pagou directamente a empresas de publicidade e cujo
montante desconhece).
Esse grupo de angariação de fundos prestou contas ao seu número dois, o qual
por sua vez prestou contas à Federação Distrital do PS.
Por via de regra a contabilidade da campanha autárquica é autónoma da
contabilidade do partido.
Quanto mais distante do dinheiro melhor para o candidato pela razão que
apontou.
Não conhece qualquer sede concelhia que esteja registada em nome do PS
nacional (a sede do Porto do PS está em nome do partido). Referiu não saber por que
razão isso sucede.

202
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente ainda era deputado quando foi convidado pela arguida Fátima
Felgueiras no âmbito de questões que se prendiam com a natação, pois ela tinha um
projecto de criação em Felgueiras de um pólo de natação (o que implicava a construção
de uma piscina olímpica) e o depoente disponibilizou-se para tentar sensibilizar o
Governo de então para apoiar esse projecto.
Veio várias vezes a Felgueiras assistir a simpósios e nessas alturas encontrava-se
com ela.
A nível partidário nunca teve com ela qualquer relação.
Quem manda nos partidos a nível concelhio é a Comissão Política respectiva e o
presidente dessa comissão é pessoa influente.
Existe também um secretariado da comissão política.
O exercício do poder a nível local depende muito das personalidades que
compõem os órgãos locais do PS.
As comissões políticas é que criam as comissões de campanha.
As decisões mais importantes têm de passar pela comissão política local.
O Secretariado, por seu turno, é o órgão executor.
*
A arguida Fátima Felgueiras, em face destas declarações, referiu que
Felgueiras tem uma única secção do PS, tem um secretariado e uma comissão política.
A Comissão Política é o órgão superior em termos de estratégia política, mas
quem manda é o secretário-coordenador e não o presidente da comissão política local,
no que se refere ao dia-a-dia do partido. É ele quem faz a filiação dos miliantes por
exemplo, sendo certo que a comissão política reúne poucas vezes.
*
A testemunha Pedro Luís da Rocha Baptista referiu então que o poder
executivo é do secretariado.
A Comissão Política é o órgão deliberativo e reúne no mínimo de três em três
meses. É fundamentalmente um órgão de debate político.
O Secretariado é que decide as questões do dia-a-dia do partido e reúne todas as
semanas.
O secretário-coordenador tem um papel preponderante do ponto de vista
executivo.
*
O arguido Horácio Costa, por seu turno, a propósito do financiamento do
partido, chamou à colação o artigo de opinião da testemunha Pedro Baptista, publicado
na edição de 12.10.2001 do “Comércio do Porto” (cfr. documento de fls 14730 e
14731), onde então expressava uma opinião diversa da que transmitiu ao Tribunal.
*
- Testemunha Luís da Costa Lima
Sempre residiu em Felgueiras e exerceu alguns cargos políticos.
Foi membro da Assembleia Municipal de Felgueiras de 1996 até 2005.
É vereador da CMF (eleito nas listas do PSD) desde 2005.
Foi vogal do Conselho Fiscal da CCAM entre 1998 e 2000 (ao que pensa).
Foi presidente do Conselho Fiscal do FCF durante duas épocas desportivas (tem
a ideia que por volta dos anos 2000 e 2001).
Referiu que a oposição estaria atenta a eventuais ilegalidades cometidas pelo
Executivo camarário e não se recorda de nada desse género que envolva a lixeira de
Sendim.
Não tem a certeza se a questão da lixeira foi ou não discutida na Assembleia
Municipal de Felgueiras.

203
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quando a lixeira era um problema era natural que a oposição chamasse esse
assunto à colacção, mas não se recorda desse problema ter sido abordado por causa de
eventuais ilegalidades.
As populações da freguesia de Sendim reclamaram por causa da existência da
lixeira e dos problemas que causava, sendo certo que a respectiva junta de freguesia tem
recebido compensações por ter a lixeira instalada naquele local (tem uma bonificação).
A oposição (PSD, CDS e CDU) censurava a CMF por não tomar medidas no
que se refere aos problemas criados pela lixeira, na altura em que se tratava de uma
lixeira a céu aberto, onde eram indiscriminadamente depositados os resíduos urbanos e
industriais (sobretudo provenientes da indústria do calçado), resíduos esses que
frequentemente entravam em combustão, provocando fumos espessos e cheiros, o que
era prejudicial para a saúde, sobretudo para quem estava mais próximo desse local.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se em 1996, quando a testemunha
entrou para a Assembleia Municipal de Felgueiras, esse assunto ainda era discutido, e se
nessa altura a lixeira já estava controlada, apenas respondeu que tal era provável,
acabando por referir não se recordar em que época os problemas relacionados com esse
assunto foram levantados na assembleia municipal, admitindo que essas questões
tivessem sido levantadas antes de nela ingressar.
*
Em face destas declarações, o arguido Júlio Faria referiu que a testemunha Luís
Lima foi de facto membro da Assembleia Municipal de Felgueiras e que a questão da
lixeira foi anterior ao ingresso da testemunha em causa nesse órgão autárquico, pois
remonta a 1993.
Especulou que a testemunha tenha conhecimento dessa questão enquanto
dirigente político do PSD local.
*
A testemunha Luís Lima, por seu turno, referiu que foi presidente da concelhia
local do PSD em 2000, sendo certo que antes de 2000 não exercia qualquer cargo no
PSD local. Porém, era militante desse partido.
Assim, admite que tenha ouvido as discussões em torno da lixeira na Assembleia
Municipal de Felgueiras antes de nela ter ingressado, já que as sessões são públicas e o
depoente assistiu a algumas sessões, além de que essas questões eram dicutidas em
reuniões do seu partido (existiam reuniões mais restritas e outras mais alargadas).

- Testemunha José Joaquim Almeida Lopes


Referiu ser juiz conselheiro (do STA) jubilado e parente em 6º grau da arguida
Fátima Felgueiras (o pai dela era primo da sua mãe).
A arguida Fátima nasceu no Brasil e veio viver para Portugal aos 4 anos de
idade.
Assim, desde criança que convive com ela, sendo muito amigos.
Conheceu a testemunha Sousa Oliveira em Coimbra, na faculdade. Foi a arguida
Fátima quem o apresentou (na altura namoravam). Desde então sempre foram muito
amigos.
Ambos depositavam em si muita confiança.
A sua prima Fátima disse-lhe que desconfiava que tinha sido o arguido Horácio
Costa quem tinha enviado a carta anónima que despoletou este processo (ele tinha sido
assessor dela e depois verador na CMF).
A arguida Fátima Felgueiras viu-se aflita com o que dela se dizia na
comunicação social.

204
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Telefonou assim muitas vezes ao depoente para lhe pedir esclarecimentos acerca
de dúvidas que ela lhe expressava. Nessa altura foi uma espécie de conselheiro jurídico
dela.
Aconselhou-a a não falar com a comunicação social (“cala, reza e sofre”), mas
ela não conseguia manter-se calada e procurava defender-se.
Em Agosto de 2000, no Mindelo, cerca das 22 horas, foi ter à casa de férias do
arguido Joaquim Freitas para lhe falar acerca desse assunto.
Deu um passeio com ele e conversaram durante cerca de uma hora/hora e meia
(entre as 22 e as 23/23.30horas).
O depoente, quando leu a primeira carta anónima, desconfiou logo que por
detrás de tudo isto estivessem razões do foro sentimental.
Assim, perguntou ao arguido Joaquim Freitas a razão de tudo isto, porque é que
era amigo da arguida Fátima e porque motivo agora se voltava contra ela e ele abriu-se
todo com o depoente, tendo-lhe contado tudo.
Disse-lhe que estava profundamente apaixonado pela arguida Fátima Felgueiras
há já muito tempo e que tentou ter com ela um relacionamento amoroso, que ela sempre
recusou.
Sintomático disso foram os episódios que ele lhe contou:
- Certo dia, ele procurou a arguida Fátima em casa desta, às 3 horas da manhã,
num fim-de-semana, numa altura em que ela estava sozinha (nessa altura já a
testemunha Sousa Oliveira tinha saído de casa e a arguida Fátima andava com o filho
João para todo o lado, com excepção do fim-de-semana, que o João passava com o pai).
A arguida Fátima atendeu-o e ele perguntou-lhe se ela estava sozinha ao que ela,
mentindo-lhe, disse que estava com o João, tendo-se então ido embora o arguido
Joaquim.
- Certo dia os autarcas foram para o Algarve e hospedaram-se no mesmo hotel.
O arguido Joaquim Freitas estava presente e a arguida Fátima fazia-se acompanhar pelo
João.
O arguido Joaquim pensava que o João estava alojado noutro quarto (porém
estava alojado no mesmo quarto que a mãe), pelo que ele bateu-lhe à porta, mas como
ela estava com o filho ele desistiu dos seus intentos naquele dia.
- Certo dia, encontrando-se a sua prima Fátima em Lisboa, o arguido Joaquim
Freitas deslocou-se à capital e andou atrás dela por todo o lado. Ela regressou com o
arguido Júlio Faria na viatura deste e na A1 o arguido Joaquim, ao volante da sua
viatura, pôs-se ao lado da viatura em que eles seguiam durante alguns quilómetros.
- Certo dia, em Lisboa, estavam os arguidos Joaquim Freitas, Júlio Faria, Fátima
Felgueiras e os seus dois filhos (e ainda outras pessoas) num estabelecimento de
restauração quando os ditos Júlio Faria e Fátima Felgueiras ausentaram-se, o que o
deixou furioso com os ciúmes.
- Certo dia o arguido Joaquim Freitas combinou jantar com a arguida Fátima no
“Hipanema Park Hotel”, no Porto. A ideia dele era “dormir” com ela no Hotel depois do
jantar. Porém, ela não compareceu. Passado uma hora ele telefonou-lhe e ela disse-lhe
ele “andava muito enganado”.
Na conversa que teve com o arguido Joaquim Freitas o depoente notou-lhe os
ciúmes doentios e ele julgava que por ser filho de um rico industrial de Felgueiras tinha
direito a ter a primeira dama.
Ele revelou-lhe que não tinha contado a verdade à PJ acerca do “saco azul”.
Disse-lhe que a arguida Fátima apenas sabia que eram eles (Joaquim e Horácio)
quem angariavam os fundos para a campanha eleitoral e que os depositavam, mas que
não sabia quanto tinham, sendo certo que ela não se interessava por dinheiro.

205
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Disse-lhe que queriam tirá-la da presidência da CMF.


Disse então ao arguido Joaquim Freitas que os factos de que a arguida Fátima
era acusada constituíam crime e que podiam dar cadeia por muitos anos e que dessa
forma eles também se incriminavam.
Desafiou-o então a colocar por escrito o que lhe dissera, a fim de ser revelado à
comunicação social, o que ele assentiu mas apenas na presença da arguida Fátima
Felgueiras.
Sugeriu então um encontro entre ambos.
Sugeriu-lhe igualmente que ele se fizesse acompanhar de um advogado, ao que
ele lhe retorquiu dizendo que confiava no depoente e na arguida Fátima.
Ele aliás referiu-lhe que havia consultado o Dr. Proença de Carvalho e que tinha
gasto muito dinheiro.
O depoente na altura não tinha telemóvel (só em 2000 é que adquiriu um) e por
esse motivo pediu para usar o telemóvel do arguido Joaquim a fim de telefonar à
arguida Fátima de modo a combinarem o encontro, o que ele acedeu.
Ele sugeriu um jantar com os três no “Hipanema Park Hotel”, no Porto, e que
pagava a despesa.
O depoente falou então com a “Fatinha”, tendo-lhe contado o sucedido e
sugeriu-lhe que combinassem então um jantar. Ela respondeu-lhe que “não queria nada
com ele”. O depoente, porém, aconselhou-a a ceder, ao que ela lhe respondeu que iria
pensar no assunto. Disse-lhe então que o arguido Joaquim lhe iria telefonar no dia
seguinte, altura em ela lhe daria a sua resposta.
Combinou com o arguido Joaquim Freitas que este passaria por sua casa, indo
assim juntos ao dito jantar (pelas 20 horas), sendo certo que a arguida Fátima iria
directamente para o hotel.
Porém, no dia seguinte, o depoente aguardou em vão em sua casa que o arguido
Joaquim Freitas comparecesse, o que não sucedeu. Jantou por isso em casa. Cerca das
22 horas o depoente passou por casa do arguido Joaquim Freitas e questionou-o por que
motivo não tinha aparecido, ao que ele lhe respondeu que a arguida Fátima lhe havia
dito para assumir as suas responsabilidades e que ela assumiria as suas, não querendo
nada consigo, tendo-lhe desligado o telefone, o que deixou triste o dito Joaquim Freitas.
Disse ao Joaquim Freitas que se calhar ela tinha feito bem em recusar o convite,
pois colocou a hipótese do arguido Joaquim Freitas levar consigo elementos da PJ para
os apanhar. Ele disse-lhe que se davam bem (ele e o arguido Horácio) com os
inspectores da PJ e que até já tinham almoçado e jantado com eles. Referiu-lhe ainda
que tinham o “estatuto de arrependidos”, ao que o depoente o avisou para não estarem
seguros de que não iriam ser responsabilizados criminalmente.
Ele disse-lhe ainda que a PJ andava “a reboque” do arguido Horácio Costa.
O arguido Joaquim pediu-lhe ainda para telefonar à arguida Fátima no sentido
de a convencer a encontrar-se com ele, mas como ela nunca quis nada com ele tudo
ficou sem efeito.
Mais tarde o arguido Joaquim contou à PJ a conversa que tiveram e eles
distorceram tudo. Desde então o depoente foi também visado no inquérito.
Na sequência do facto do Dr. Artur Marques, em entrevista ao “24 Horas”, em
2004, ter dito que o depoente seria testemunha, foi profundamente incomodado, tendo
então sido transcritas escutas telefónicas que lhe fizeram em 2000/2001 e cuja
destruição havia sido determinada pelo JIC, falsificando autos de transcrição (ao que
presume foram arrancadas folhas validadas pelo JIC e colocaram no seu lugar outras
folhas), o que aliás é demonstrado pela qualidade com que o depoente é identificado
nesses autos de transcrição (o depoente à data não tinha essa qualidade).

206
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi remetida uma certidão pelo MP à Procuradoria-geral da República para


procedimento criminal contra o depoente, mas que foi arquivado liminarmente por não
haver qualquer matéria que justificasse a abertura de um inquérito.
As ditas escutas foram divulgadas nos jornais, o que lhe acarretou sérios
problemas.
Já na instrução a JIC mandou extrair certidão dessas escutas a fim de serem
remetidas ao CSM para eventual procedimento disciplinar, o qual acabou por ser
arquivado na medida em que é claramente inconstitucional a utilização de escutas
telefónicas em sede de procedimentos disciplinares.
O seu sistema nervoso “rebentou” e a sua carreira terminou, razão pela qual se
jubilou.
Os elementos que recolheu a propósito deste processo foram recolhidos quer no
processo crime de que foi alvo quer no procedimento disciplinar referido.
O depoente prestou depoimento na acção de perda de mandato instaurado contra
a arguida Fátima Felgueiras.
O arguido Joaquim Freitas andava por todo o lado, na sua viatura, com a arguida
Fátima na campanha eleitoral de 1997 e à data eles eram muito amigos.
De uma paixão que ele sentia por ela passou a nutrir-lhe ódio.
Em relação ao arguido Horácio Costa sempre desconfiou que também poderiam
estar na base da respectiva actuação razões de ordem sentimental, mas o arguido
Joaquim Freitas contou-lhe que ele se desentendeu com a arguida Fátima num
restaurante a propósito de uma deliberação da CMF que iria ser tomada no sentido de
apoiar o FCF com um subsídio, o que ele discordava; como ele disse que iria votar
contra ela dirigiu-lhe palavras desagradáveis, pelo que ele se terá sentido humilhado,
passando a detestá-la.
Notava-se que o arguido Joaquim tinha medo do arguido Horácio.
Recorda-se do arguido Joaquim lhe ter mostrado uma tablete de calmantes que
trazia no bolso, dizendo que os andava a tomar.
A arguida Fátima contou-lhe que tinha sido professora de Inglês do arguido
Horácio Costa e que o tinha trazido para assessor dela na CMF e que ele nutria uma
paixão por ela.
Disseram-lhe aliás que o arguido Horácio Costa se tinha gabado de ter ido para a
cama com a arguida Fátima Felgueiras, facto que lhe pareceu descredível.
A sua prima disse-lhe que ele era um assesssor dedicado e que mais tarde ele
assumiu a função de vereador.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa referiu que não foi o
depoente quem elaborou a carta anónima referida.
Nos seus depoimentos à PJ nunca mentiu, nem nunca sentiu motivos de
arrependimento.
Sempre teve muito respeito pela arguida Fátima Felgueiras enquanto mulher,
desde a altura em que de facto foi aluno dela.
Nutriu por ela simpatia, negando terminantemente ter alguma vez sentido
qualquer espécie de paixão por ela.
Já na sessão de julgamento em que viria a ser inquirida a testemunha Guilherme
Pinto, relembrou ainda o arguido Horácio Costa que a testemunha Almeida Costa
declarou ao tribunal que o depoente teria agido por vingança.
A esse propósito, esclareceu que moveu um processo-crime contra a arguida
Fátima por difamação, sendo certo que numa carta enviada a António Pereira – chefe de
finanças de Amarante, transcreveu as declarações prestadas pelo dito juiz conselheiro

207
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

nesse processo-crime, em que referia que esse senhor lhe tinha contado que ouvira o
depoente a gabar-se de ter ido para a cama com a arguida Fátima Felgueiras. Remeteu-
lhe assim a dita carta para que o dito António Pereira se explicasse, isto é, se confirmava
ou não ter relatado algum episódio do género ao dito Almeida Lopes (cfr. documento de
fls 14740 e o respectivo aviso de recepção, constante de fls 14741).
Porém, não recebeu qualquer resposta, nem por ele foi recebido na Repartição de
Finanças de Amarante, apesar de ali se ter deslocado com o intuito de dele obter
esclarecimentos.
Para ilustrar o facto de nunca ter agido movido por sentimentos de vingança,
referiu que no Verão de 2005 foi contactado pelo arguido Jaoquim Freitas, o qual lhe
pediu para falar com uma pessoa muito próxima da arguida Fátima, a sua filha Sandra
Felgueiras. O depoente acedeu, tendo-se encontrado com ela num hotel em Guimarães.
Ela explicou-lhe então que a sua mãe queria regressar a Portugal do Brasil e
candidatar-se à presidência da CMF e que ela tinha garantias de que poderia regressar
para responder neste processo e que, nesse contexto, era importante que o depoente se
mantivesse em silêncio, de modo a não prejudicar a candidatura dela.
Transmitiu então à Sandra Felgueiras que nada de pessoal lhe movia contra a
arguida Fátima Felgueiras, que não frequentava Felgueiras e que não tinha qualquer
ambição política, pelo que seria na Justiça que o problema se resolveria, razão pela qual
não manteria com a arguida Fátima qualquer conflito nesse período de tempo, desde que
não fosse provocado.
Esta postura do depoente levou a que outras pessoas procurassem confrontar-se
com o depoente e com o arguido Joaquim Freitas, pois não queriam que a arguida
Fátima ganhasse as eleições autárquicas de 2005.
Foram assim atacados de todos os lados, acusando-os de irem mentir à Justiça e
de ascender com a arguida Fátima ao poder.
O facto de ter prometido à Sandra Felgueiras que se manteria em silêncio no
período eleitoral demonstra que não agiu com qualquer intuito vingativo.
A Sandra Felgueiras confidenciou-lhe que uma jornalista e namorada do José
Sócrates e que este já tinham diligenciado para que não houvesse qualquer problema
com o regresso da arguida Fátima Felgueiras.
*
O arguido Joaquim Freitas, por seu turno, reafirmou o teor da conversa que
teve com a testemunha Almeida Lopes conforme já tinha relatado ao tribunal.
Assegurou que nunca esteve apaixonado pela arguida Fátima Felgueiras e que
“tem vergonha de ser português” em face do que ouviu da boca da testemunha em
causa.
*
Já a arguida Fátima Felgueiras referiu ter ouvido pela primeira vez da
testemunha Almeida Lopes que o arguido Joaquim Freitas nutria por si uma paixão, mas
não duvida que ele lhe tenha contado falsamente esse facto.
Acrescentou que pouco tempo depois de ter visto os arguidos Horácio e Joaquim
na televisão numa entrevista que concederam, o Sr. Clemente Freitas (pai do arguido
Joaquim), que sempre havia apoiado a depoente, pediu-lhe uma entrevista na CMF,
tendo acedido, apesar de ter hesitado em concedê-la. Recebeu-o e ele cambaleava e
chorava, pedindo-lhe desculpa pelo comportamento do filho, mas que eram uma chatice
as questões de amor. Foi a primeira vez que lhe passou pela cabeça que o arguido
Joaquim Freitas, com a sua disponibilidade e simpatias, pudesse nutrir por si uma
paixão, o que a deixou perplexa. Ele tinha aliás reacções infantis (ele era “uma criança
num corpo de homem”).

208
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido António Pereira contou-lhe que o arguido Joaquim Freitas lhe


confidenciara que se tinha metido com um familiar e não tem dúvidas que é mentira o
que contara àquele arguido.

- Testemunha Guilherme Manuel Lopes Pinto


Referiu que se recorda de ter estado com o arguido Horácio Costa em duas
ocasiões, uma delas a pedido da testemunha Narciso Miranda, à data presidente da
Federação Distrital do Porto do PS.
A primeira vez que se encontrou com ele foi numa reunião que teve lugar entre a
dita testemunha Narciso Miranda e o arguido Horácio Costa (que se fazia acompanhar
de duas ou três pessoas, cuja identidade já não se recorda, mas pensa que um deles era
membro da comissão política de Felgueiras do PS). Encontrava-se ainda presente, para
além do depoente, um outro elemento da Federação Distrital do Porto do PS. Essa
reunião teve lugar no último trimestre de 1999.
Nessa primeira reunião pretendia-se discutir a situação política criada em
Felgueiras. A ideia era afastar a arguida Fátima Felgueiras da presidência da CMF. A
testemunha Narciso Miranda opunha-se a essa hipótese por entender que não existiam
razões políticas que o justificassem. Mais no final da reunião os elementos de
Felgueiras tentaram entregar à testemunha Narciso um dossier mas este recusou-se a
recebê-lo na medida em que a Federação Distrital não era um órgão jurisdicional e a
reunião em causa era apenas de cariz político.
Explicou que não havia qualquer forma legal do PS afastar a arguida Fátima da
presidência da CMF e foi isso mesmo que tentaram explicar aos elementos de
Felgueiras presentes nessa primeira reunião. Havia também o problema de se saber
como é que a CMF iria ser governada se a arguida Fátima Felgueiras fosse afastada,
pois nesse caso gerar-se-ia grande instabilidade política, sendo certo que nenhum dos
elementos de Felgueiras presentes poderia ascender à presidência da CMF.
Na segunda reunião o depoente reuniu-se com os arguidos Horácio e Joaquim
Freitas, num Sábado, em 2000, no Porto, na Foz (essa reunião antecedeu a cimeira da
presidência portuguesa da União Europeia, cimeira essa que teve lugar em Aveiro em
Janeiro de 2001). Acedeu em reunir com eles na medida em que ameaçavam perturbar
as cerimónias relativas à dita cimeira com uma manifestação.
O depoente reuniu com eles na qualidade de presidente da Comissão de
Jurisdição para analisar os aspectos jurídicos relacionados com um processo disciplinar
que eles queriam que fosse instaurado contra a arguida Fátima Felgueiras (queriam a
sua expulsão do partido).
Explicou que essa reunião teve lugar na Foz na medida em que era um lugar
facilmente identificado por todos.
Viu os documentos que eles traziam, mas não viu grande coisa.
Ficou revoltado quando leu duas notícias de jornal em que se dizia que a reunião
teve lugar junto ao mar para que os documentos a ele fossem lançados pelo depoente (os
arguidos Horácio e Joaquim Freitas manifestaram esse receio ao jornal).
Eles não quiseram deixar-lhe ficar cópia dos documentos que traziam (apenas os
exibiram). Disseram-lhe que esses documentos já tinham sido entregues à PJ. Assim,
por falta de provas, o procedimento disciplinar contra a arguida Fátima não prosseguiu.
Foi entretanto movido um procedimento disciplinar contra os arguidos Horácio e
Joaquim Freitas por difamação da arguida Fátima.
Eles, de facto, recorreram a um órgão jurisdicional do partido e depois não
colaboraram, daí que se partisse do pressuposto de que se tratava de uma difamação.

209
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente ficou convencido que se tratava de uma tentativa de assalto ao


poder.
Tem a ideia que a medida disciplinar aplicada foi uma repreensão.
Só em data posterior à aplicação dessa sanção é que tomaram conhecimento que
a PJ estava a investigar os factos em causa.
Explicou que nessas duas reuniões os arguidos Horácio e Joaquim Freitas
tiveram uma presença importante, sendo certo que as pressões provinham sobretudo do
arguido Horácio Costa, o qual aliás se mostrava determinado.
Admite que possa ter reunido com eles uma terceira vez, mas não se recorda
desse facto.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
Guilherme Pinto nunca esteve consigo em qualquer reunião e muito menos em 1999.
Só esteve consigo na Foz, à beira-mar, em Junho de 2000. Ele tinha acabado de
chegar do estrangeiro, onde foi assistir a uma partida de futebol, ou da seleccção ou do
F.C. do Porto.
Recorda-se aliás que o foram levar a casa, para os lados do Hospital Pedro
Hispano.
Na altura ele disse-lhe que a arguida Fátima se tinha portado mal porquanto não
compareceu na reunião com o Narciso Miranda e que ela era autoritária.
Reafirmou que em 05.02.2000 teve lugar o jantar nos “Lusíadas”, em
Matosinhos, tendo sido essa a primeira vez que o depoente esteve com a testemunha
Narciso Miranda.
Se tivesse estado com ele em data anterior, as cartas que remeteu ao PS tê-lo-
iam referido (cfr. ponto 4 de fls 5821 – carta de 18.09.2000).
No fax remetido a Jorge Coelho em Maio de 2000 refere-se o mesmo assunto.
Chamou ainda à colação o artigo publicado na “Visão” de 18.10.2001 (cfr.
documento de fls 14732), onde se faz alusão precisamente a essa reunião do dia
05.02.2000 (já na altura a posição do depoente era sempre a mesma).
A cimeira referida pela testemunha Guilherme Pinto ocorreu em Santa Maria da
Feira e não em Aveiro, a qual teve lugar em Junho ou princípios de Julho de 2000, o
que preocupou a testemunha Narciso Miranda porquanto o depoente disse à
comunicação social que iria entregar (na dita cimeira) ao Primeiro Ministro de então
(António Guterres) um dossier sobre esse assunto.
Foi por isso que a testemunha Narciso mandou a testemunha Guilherme
encontrar-se com o depoente e o arguido Joaquim Freitas.
De facto, o depoente tinha um dossier para entregar ao António Guterres na
cimeira referida.
No “Público” de 30.06.2000 noticia-se esse episódio e o encontro com o
depoente em Junho de 2000.
A testemunha Guilherme Pinto, sobre esse assunto, prestou declarações ao
“Comércio do Porto”, edição de 09.10.2001.
Antes desse encontro na Foz o depoente tinha estado reunido com o Renato
Sampaio, onde lhe foi oferecido “tudo e mais alguma coisa” para se calar.
Nega que quisesse “assaltar” o poder, até porque era apenas um vereador há
cerca de 1 ano e era o quinto da lista. Aliás, com que apoios políticos é que poderia
“tomar o poder”?
O depoente prestou declarações no processo disciplinar de que foi alvo, mas não
violou o segredo de justiça em relação ao que tinha contado à PJ e aos documentos que
lhe tinha entregue.

210
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nunca falou em afastar a arguida Fátima. Ela estava legitimada para estar na
presidência da CMF.
Questiona por que motivo o PS lhe moveu um processo disciplinar por
difamação da arguida Fátima quando esta não fez qualquer queixa-crime contra o
depoente por esse motivo.
Na sequência desse processo disciplinar o depoente foi suspenso por 60 dias
(apesar de não ser militante do PS).
Explicou que desconfiava da testemunha Guilherme Pinto como desconfiava de
toda a gente.
*
A testemunha Guilherme Pinto, por seu turno, reafirmou o que disse.
Admite que um colega seu da comissão de jurisdição inquiriu o arguido Horácio
Costa no âmbito do processo disciplinar que lhe foi movido.
Tem a certeza que uma das reuniões referidas ocorreu antes da cimeira, que
admite ter-se realizado em Stª Maria da Feira, e que a segunda reunião teve lugar já
depois da presidência portuguesa.
Pretendia-se evitar que esta situação prejudicasse a presidência portuguesa da
União Europeia.

- Testemunha Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho


Esta testemunha prestou declarações por escrito, visto ser membro do Conselho
de Estado, as quais se encontram juntas aos autos a fls 13600 a 13602 (cfr. as questões
que lhe foram efectuadas por escrito e constantes de fls 13065 a 13067).
Referiu que em 16.05.2000 e 19.09.2000 era membro do Secretariado Nacional
do PS.
Nessas datas a arguida Fátima Felgueiras era também membro desse órgão
nacional do PS.
O depoente foi o coordenador político das eleições para as autarquias locais nas
eleições de 2005.
Na medida em que nunca esteve ligado à área financeira do PS referiu ignorar de
que modo se processava nas concelhias o financiamento das campanhas eleitorais para
as eleições autárquicas de 1997, sendo certo que na altura era Ministro da
Administração Interna e não tinha qualquer função executiva no seio do partido.
Assegurou nunca ter recebido o fax de 16.05.2000, constante de fls 1186 e 5819.
Da mesma forma, assegurou não ter recebido a carta cuja cópia se acha junta a
fls 1189 dos autos (de 19.09.2000).
Além disso, não teve sequer conhecimento do teor dessas missivas.
Não tomou igualmente conhecimento do teor das missivas de fls 5821 e 5827,
pois as mesmas nunca lhe foram apresentadas.
Presume que tomou conhecimento da investigação a que respeita estes autos
pela comunicação social, em data que não pode precisar, limitando-se a aguardar a
conclusão das investigações em curso.
Esteve presente na cerimónia de recandidatura da arguida Fátima Felgueiras às
eleições autárquicas de 2001, em nome do Secretariado Nacional do PS, sendo certo que
à data inexistia contra ela qualquer acusação proferida pelo MP (ainda decorria a
investigação).

- Testemunha Renato Luís de Araújo Forte Sampaio

211
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esta testemunha depôs por escrito, visto ser deputada na Assembleia da


República (cfr. as questões que lhe foram colocadas por escrito a fls 12944 a 12947 e as
respectivas respostas a fls 13627 a 13631).
Referiu que em Abril de 2000 fazia parte do Secretariado da Federação Distrital
do PS do Porto.
À data a testemunha Narciso Miranda era o presidente da Federação Distrital do
PS do Porto e o falecido Dr. Barros Moura o presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
Por sua vez, a arguida Fátima Felgueiras, segundo se recorda, era membro da
Direcção Nacional do PS.
A responsabilidade financeira das concelhias do PS cabia normalmente ao
respectivo presidente e ao secretariado, sendo certo no entanto que cada concelhia
decidia sobre a respectiva estrutura.
O financiamento das concelhias do PS deveria processar-se com o apoios da
Direcção Nacional do partido e de donativos.
Confirma que esteve presente na reunião/almoço no restaurante “Scala” (referida
na questão nº 6), na praça Velásquez, no Porto, acompanhado do Dr. Barros Moura e
cujo objectivo era o de falar acerca das divergências no seio do PS de Felgueiras.
Foi o Dr. Barros Moura quem solicitou e agendou essa reunião, sendo certo que
o depoente esteve presente sem que para o efeito tivesse sido mandatado por quem quer
que seja ou em representação de quem quer que seja.
Nessa reunião estiveram ainda presentes os arguidos Horácio Costa (à data
vereador na CMF) e Joaquim Freitas (à data membro da Assembleia Municipal de
Felgueiras).
Nessa reunião foi abordado o tema da investigação então em curso na PJ sobre
um alegado “saco azul” na CMF (irregularidades no financiamento do PS de Felgueiras
e irregularidades na gestão levada a cabo pela arguida Fátima Felgueiras na autarquia),
sendo certo que não se recorda de ter sido referenciado o nome de qualquer empresa,
designadamente a “Resin”.
Segundo os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas as denúncias poderiam
beliscar o PS, sendo certo que nunca se pediu silêncio a qualquer um dos presentes, mas
apenas ponderação nas afirmações de prova.
Na opinião dos presentes essas denúncias apenas prejudicavam a arguida Fátima
Felgueiras (afirmação que parece ser contraditória com facto de ter referido que,
segundo os arguidos Horácio e Joaquim, o PS poderia sair beliscado com o caso).
Não confirmou que se tenha feito algum comentário acerca da testemunha Sousa
Oliveira.
A presença do arguido Horácio serviu, conforme se apercebeu, para que ele
relatasse as irregularidades existentes na CMF.
Não confirmou que este arguido apenas tenha comparecido no final da reunião.
Nessa reunião não foi apresentada qualquer proposta ao arguido Horácio Costa,
tanto mais que o depoente não estava mandatado por quem quer que seja para que a
pudesse apresentar..
Admite que possa ter transmitido o resultado dessa reunião/almoço à testemunha
Narciso Miranda, mas não “tem bem presente” esse facto.
À data ignora se a testemunha Narciso Miranda demonstrou solidariedade para
com a arguida Fátima Felgueiras, facto que sucedeu mais tarde na convicção de que não
existiam graves irregularidades.
Ignora se contra os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas foi instaurado
algum procedimento disciplinar por parte da Federação Distrital do PS do Porto.

212
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Colocada a questão de se saber se não deveria ter sido instaurado um


procedimento disciplinar pelo PS à arguida Fátima, expressou apenas a opinião de que
ninguém deveria ser condenado sem culpa provada.

- Testemunha Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte


Esta testemunha prestou declarações por escrito, visto ser deputada na
Assembleia da República, as quais se encontram juntas aos autos a fls 14780 e 14781
(cfr. ainda as perguntas que lhe foram efectuadas por escrito a fls 14754 e 14755).
Confirmou que, entre 1989 e 1995, exerceu as funções de secretária e/ou
assessora da testemunha Narciso Miranda, então presidente da C.M. de Matosinhos.
Em 1995 foi eleita deputada à Assembleia da República, mas continou a
colaborar graciosamente com a C.M. de Matosinhos até 1999 como assessora do
presidente da edilidade.
Referiu que, no exercício dessas funções, desde o início do Verão de 1999 foi
contactada telefonicamente e de forma insistente por elementos que diziam ser do PS de
Felgueiras no sentido de ser agendado um encontro com a testemunha Narciso Miranda,
então presidente da C.M. de Matosinhos e da Federação Distrital do Porto do PS. O
objectivo desse encontro, segundo lhe disseram esses elementos, prender-se-ia com o
PS de Felgueiras e com a autarquia liderada pela arguida Fátima Felgueiras.
Não se recorda da identidade desses elementos que a contactaram
telefonicamente.
No seguimento dessa solicitação foi entretanto agendada uma reunião com a
testemunha Narciso Miranda, a qual ocorreu talvez em Novembro ou Dezembro de
1999.
Situou os factos no tempo com recurso ao facto da testemunha Narciso Miranda
ter sido nomeado Secretário de Estado em Outubro de 1999, sendo certo que a dita
reunião foi agendada posteriormente a pedido do mesmo (nessa reunião a testemunha
Narciso Miranda esteve presente, não sabendo dizer se ele esteve em outras reuniões
com os ditos elementos de Felgueiras).

Análise crítica
Antes de mais, à guisa de introdução, é de salientar que, a propósito das várias
matérias, a credibilidade e verosimelhança dos factos não se mede pela soma aritmética
dos depoimentos num ou noutro sentido, sendo certo que notamos por parte de alguns
uma tentativa de “branqueamento” de determinadas realidades (o sacudir sistemático de
“água do capote”, a tese da cabala – de assassinato político e da forja de documentos -,
o depoimento esguio particularmente politizado, afirmações de fé sem real sustentação,
sofreguidão na defesa das posições mais convenientes a alguns arguidos por manifesta
inexistência de distânciamento emocional e depoimentos de descredibilidade
confrangedora emergentes do facto dos depoentes respectivos ainda serem funcionários
da CMF) e noutros afirmações que se fundam em documentos e razão de ciência que
dão consistência às suas afirmações e ainda em relatos repletos de pormenores que, no
contexto em que se inseriram, conferiram as mais das vezes credibilidade ao respectivo
depoimento.
Esta tendência de comportamento impressionou o Tribunal, criando-lhe uma
certa predisposição na análise da credibilidade dos váriados depoimentos.
Porém, tal não significa necessariamente que uns depuseram sempre com
respeito pela verdade dos factos e que os outros o não fizeram de todo em todo, pois
essa posição maniqueísta, especialmente em relação a acontecimentos complexos,
costuma não corresponder à realidade das coisas e da vida.

213
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Acerca da possibilidade do Tribunal poder e dever valorar as declarações


prestadas pelo arguido Horácio Costa, tendo presente o seu comportamento processual
na audiência de julgamento e o disposto na actual versão do artº 345º, nº 4, do CPP (que
dá expresso acolhimento a alguma jurisprudência e a alguma doutrina proferida já no
âmbito da anterior versão do CPP, pelo que, nessa medida, não é dispiciendo
considerar-se tal norma interpretativa), já tivemos a oportunidade de tomar posição
acerca dessa matéria em despacho proferido na 75ª sessão da audiência de julgamento
(fls 13609 dos autos principais), do qual aliás foi interposto recurso.
Inversamente, pelas razões então expressas, não se poderá valorar o depoimento
do arguido Joaquim Freitas na parte em que prejudica a posição dos demais arguidos.
Isto posto:
Quanto ao objecto social da “Resin” e à sua transformação de sociedade por
quotas em sociedade anónima e respectivas participações sociais, teve-se em
consideração a certidão comercial junta a fls 9093 e ss. e a cópia certificada de fls 9125
a 9142 dos autos.
O arguido Vítor Borges, por seu turno, teve a oportunidade de se referir ao
desenvolvimento da actividade de tal empresa em Portugal, de forma que aliás nos
mereceu credibilidade.
No despacho de pronúncia não se determina com exactidão a data em que a
arguida Fátima Felgueiras teve conhecimento da intenção do arguido Júlio Faria em se
candidatar nas listas do PS a um lugar de deputado na Assembleia da República, a
propósito das eleições legislativas que teriam lugar em Outubro de 1995 (depreende-se
contudo que, segundo a pronúncia, esse conhecimento terá tido lugar em 1993, facto
que de todo não se demonstrou).
Foi, no entanto, possível apurar que esse conhecimento teve lugar pelo menos
em meados do ano de 1995.
De facto, a arguida Fátima Felgueiras assegurou que só em Julho de 1995 teve
conhecimento dessa intenção do arguido Júlio Faria.
Essa versão dos factos coaduna-se com a posição que a propósito foi assumida
pelo arguido Júlio Faria, pois referiu que foi convidado para o efeito na altura em que as
respectivas listas foram elaboradas pela Federação Distrital do Porto do PS, algures em
finais de Junho ou princípios de Julho de 1995, tendo sido pois nessa altura que deu
conta desse facto à arguida Fátima Felgueiras, na altura vereadora e vice-presidente da
CMF.
Com verdadeiro conhecimento de causa acerca desse facto ninguém mais foi
ouvido.
Em todo o caso, várias testemunhas, conhecedoras das actividades partidárias,
por desempenharem ou terem desempenhado cargos políticos e funções partidárias,
deram conta que a composição das listas não é feita com muita antecedência e está
sujeita a alterações, às vezes de última hora, em face das variadas movimentações
internas no seio dos partidos (diriamos que quase como “sete cães a um osso”).
Tais depoimentos dão verosimelhança à posição expressa a esse propósito pelos
arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras (cfr. ainda, em especial, os depoimentos das
testemunhas Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró, Narciso Miranda e Pedro Luís da
Rocha Baptista).
É de salientar que, a este propósito, não pode ser valorado o depoimento do
arguido Joaquim Freitas, pois de alguma forma prejudica a posição assumida pelos
arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras e em face do facto de se ter recusado a
responder a quaisquer perguntas que os mandatários dos assistentes ou os defensores
dos demais arguidos lhe quisessem porventura colocar (cfr. artº 345º, nº 4, do CPP, na

214
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

sua actual versão, emergente da Lei nº 48/2007, de 29.08, a qual deu expresso
acolhimento a idêntica posição assumida por alguma doutrina e por alguma
jurisprudência, designadamente do Tribunal Constitucional, acerca dessa matéria à luz
da anterior versão do CPP).
Sem qualquer credibilidade, porém, foi a posição expressa pela arguida Fátima
Felgueiras de que não perspectivava suceder ao arguido Júlio Faria à frente dos destinos
da CMF (em face da oposição interna que se registava no seio do PS local), já que ela
era a “candidata natural”, segundo aliás referido por algumas testemunhas e pelo
arguido Horácio Costa, em face do facto de ter assumido a presidência da CMF em
1995 após a ida do arguido Júlio Faria para a Assembleia da República e do trabalho
desenvolvido por ela nos dois anos seguintes, sendo certo que, como nos pareceu
provado à saciedade, o PS de Felgueiras era constituído por elementos desprovidos de
“massa crítica” (e que gravitavam em torno dela), conforme referiu o arguido Horácio
Costa a dada altura, além de que a arguida Fátima Felgueiras era pessoa centralizadora e
de personalidade forte – “o tal eucalipto que tudo seca em volta”, na expressão da
testemunha Narciso Miranda -, facto que foi assim demonstrado apesar de algumas
testemunhas procurarem “virar o bico ao prego” face a anteriores declarações prestadas
perante a JIC, com as quais foram aliás confrontadas, daí que possam ser valoradas.
De resto, sinal de que ela procurou logo em abrir caminho à sua candidatura foi
o facto se ter preocupado com a “imagem” da CMF (ou antes, com a sua própria
imagem), contratanto os serviços de uma empresa para o efeito (a “Proeme”). A
divulgação das actividades camarárias misturou-se assim com a propaganda política (de
que o “Sovela” dava eco, conforme é perceptível pela sua leitura).
Não é pois por acaso que foi grangeando grande apoio popular, de sorte que não
se vislumbra no panorama local qualquer outra pessoa que, à data, se perfilasse como “o
candidato natural” pelo PS às eleições autárquicas de 1997.
Os “apelos” à sua candidatura, já em meados de 1997, mais não são do que
meras encenações políticas, pois à data já se sabia há muito que ela se iria candidatar
pelo PS à presidência da CMF nas eleições autárquicas que haveriam de ter lugar em
Dezembro desse ano. De facto, “ela era a noiva que antes de o ser já sabia que iria sê-
lo”.
Por outro lado, ficou demonstrado que a “Resin” iniciou os trabalhos na lixeira
de Sendim em Dezembro de 1993, no circunstancialismo relatado pelos arguidos Júlio
Faria e Vítor Borges (cfr. também o depoimento da testemunha Menezes Basto). Esse
facto é mais ou menos corroborado pelos vários ex-funcionários dessa empresa que
foram ouvidos, alguns dos quais iniciaram funções em Janeiro de 1994 (cfr. em
particular os depoimentos das testemunhas António Fernando da Silva Ramos, António
José Ferreira Pereira e José de Sousa; cfr. também o depoimento de alguns elementos
que pertenceram à junta de Freguesia de Sendim e ainda o documento junto já no
decurso do julgamento e alusivo à máquina de compactação que foi operar para o local
e que proveio de França em Dezembro de 1993 com o respectivo manobrador, o qual
terá dado formação técnica aos funcionários da “Resin” que ali prestavam serviço no
sentido de poderem manobrar aquele tipo de maquinaria).
Nesse sentido apontam também as facturas emitidas pela “Resin” à testemunha
Menezes Basto e à CMF até Janeiro de 1995 (as quais viriam a ser devolvidas pela
CMF por falta de suporte legal que permitisse o respectivo pagamento), bem como as
facturas emitidas pela “France Dechets” à “Resin” – cfr. as facturas juntas aos autos a
fls 52 e ss. do apenso 98, bem como as facturas juntas aos autos pelo arguido Vítor
Borges a fls 12663 e ss. e as que o arguido Carlos Marinho juntou a fls 12320 e ss.

215
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assim, as relações entre a CMF e a “Resin” iniciaram-se de facto nessa altura


(apesar de formalmente continuarem a ser inexistentes).
Note-se que ninguém nos relatou o episódio do incêndio do camião do lixo,
descrito na contestação dos arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho, mas ficou patente
da prova produzida – já referida – que à data (1993) existia grande descontentamento
popular pela forma como eram descontroladamente depositados os resíduos na lixeira
de Sendim, situação que mudou com a intervenção no local por banda da “Resin”, a
qual se havia dado a conhecer aos autarcas do Vale do Sousa nesse ano de 1993, razão
pela qual o arguido Júlio Faria contactou telefonicamente o arguido Vítor Borges no
Verão desse ano, no circunstancialismo que então ambos descreveram assertivamente
ao Tribunal (porquanto não emergiu das declarações prestadas pelos arguidos nem pela
prova testemunhal produzida, não se provou que a “Resin” tenha levado autarcas a
França em visita a aterros sanitários; fê-lo, em todo o caso, pelo menos em relação à
testemunha Menezes Basto, aproveitando o facto dele ter ido a esse país passar férias, o
que foi decisivo para o convencer de que a lixeira de Sendim poderia ser reabilitada
com sucesso, o que de facto veio a suceder).
Poder-se-ia pensar que, em face do facto do Tribunal se ter convencido que só
em meados de 1995 é que a arguida Fátima perspectivou a sua possível candidatura à
presidência da CMF nas eleições de 1997, que só então o esquema relatado na
pronúncia foi engendrado (destinado a financiar as actividades partidárias do PS local),
realidade a que oportunamente iremos retornar no sentido de explicitar de que forma o
Tribunal se convenceu desse facto.
Note-se, porém, que o esquema engendrado para que, de facto, a “Resin”
recebesse da CMF os pagamentos como contraprestação do trabalho de reabilitação e
exploração que levava a cabo, já vinha desde finais de 1993, daí a celebração do
contrato de transacção com a testemunha Menezes e respectivo aditamento.
Note-se ainda que a reunião onde ficou decidida a realização do concurso
limitado simulado mencionado no ponto 1.3 da pronúncia ocorreu em Abril de 1995,
pelo que, conforme melhor se explicitará, tendo-se convencido o Tribunal da existência
de dois “retornos” no âmbito desse contrato, naturalmente que o esquema engendrado e
que, aproveitando-se do lançamento desse concurso, visou a obtenção pelos arguidos
Fátima e Júlio de verbas destinadas a financiar as respectivas actividades partidárias e,
como se verá, custear despesas pessoais desta última, terá sido urdido nessa altura pelos
arguidos Júlio, Fátima e Vítor.
Assim, naturalmente que estarão excluídas do mesmo as situações anteriores
(portanto, pelo menos, o contrato de transacção celebrado com o Eng. Meneses Basto e
respectivo aditamento), sendo certo que os “recebimentos” ou “retornos” só tiveram
lugar a partir de 1997 e, ainda assim, reportados apenas ao contrato celebrado entre a
CMF e a “Norlabor”, conforme à frente melhor se verá.
Além disso, não se convenceu o Tribunal de que o contrato de transacção tenha
sido sobreavaliado (de modo a permitir “retornos”) pois, com assertividade, foi referido
pelo arguido Vítor Borges que o preço praticado fundou-se num orçamento apresentado
pela “France Dechéts”, a qual recebeu cerca 24.000 cts pela operação de reabilitação da
lixeira – cfr. documentos de fls 12263 e ss. -, não tendo pois a “Resin” retirado qualquer
lucro, em face dos demais custos que teve que suportar, designadamente com pessoal,
sendo certo que esta estava interessada em mostrar obra feita – ainda que a custo de
produção - para angariar potenciais clientes.
Após a missão de reabilitação referida a “Resin” porpôs-se a continuar a operar
no local mediante o pagamento mensal de 2.800 cts + IVA (cfr. ainda os depoimentos

216
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

dos arguidos Carlos Marinho e Barbieri Cardoso, bem como o depoimento de algumas
testemunhas, entre as quais Pinto Barriga).
A simulação (relativa, por interposta pessoa – cfr. artº 241º, nº 1, do Código
Civil) 5 do contrato de transacção celebrado entre a CMF e o Eng. Meneses visou antes
permitir que a “Resin” recebesse o que tinha direito pelo facto de ter ido operar na
lixeira de Sendim, ante a eminência da referida testemunha Menezes Basto impedir a
continuação da deposição dos lixos no local e do facto dessa deposição ser efectuada de
forma descontrolada, com prejuízo para as populações e para o meio ambiente,
conforme resultou do depoimento dos arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Vítor
Borges e Barbieri Cardoso, e ainda do depoimento de muitas testemunhas que relataram
o estado da lixeira antes e depois da reabilitação levada a cabo pela “Resin”.
Note-se aliás que essa matéria não foi levada à apreciação da Assembleia
Municipal de Felgueiras, apesar da sua relevância, porque não era conveniente,
conforme referiu aliás o arguido Júlio Faria, dando a explicação de que tal não se
compadecia com a necessidade de uma resolução rápida do problema (para além disso,
à data vivia-se já em clima de campanha eleitoral – referente às eleições autárquicas de
1993 – e a questão dos resíduos era arma de arremesso político por parte da oposição;
refira-se porém que a questão da celeridade na resolução do problema não seria posta
em causa pela apreciação dessa questão por parte da Assembleia Municipal de
Felgueiras, segundo nos convencemos, pois poderia ser convocada uma sessão
extraordinária desse órgão autárquico e, segundo foi dito, num mês teria já deliberado; o
combate político terá sido assim a verdadeira razão subjacente ao facto de se não
pretender submeter aquela matéria à apreciação da Assembleia Municipal de
Flegueiras).
Ora, o facto do arguido Júlio Faria se ter preocupado em afastar esse assunto da
apreciação da Assembleia Municipal de Felgueiras não significa necessariamente que
ele não “controlava” esse órgão autárquico. Naturalmente que teria um peso decisivo na
maioria que sustentava o executivo liderado por si, controlo esse que seria menor se
fosse necessária uma maioria qualificada. A verdadeira razão que esteve na base da
decisão de simular o preço da compra e venda do terreno onde se situava a lixeira de
Sendim e de assim evitar a apreciação da questão em causa pela Assembleia Municipal
de Felgueiras foi assim a de evitar que a oposição explorasse politicamente esse tema.
Adiantamos já que, não obstante o arguido Júlio Faria estar afastado dos
destinos da CMF desde Agosto de 1995 (altura em que suspendeu o seu mandato,
renunciando ao cargo já em Outubro de 1995, na sequência das eleições legislativas
realizadas nesse mês, em face das quais conseguiu ser eleito deputado à Assembleia da
República), mantinha contudo uma actividade partidária local (a testemunha Manuel
Ferreira Pinto levava-lhe documentos – cfr. as declarações do arguido Horácio Costa, do

5
A CMF queria verdadeiramente contratar com a “Resin” e não com a testemunha Menezes Basto,
conforme ficou demonstrado à saciedade (cfr. por exemplo os depoimentos dos arguidos Júlio Faria e
Vitor Borges e ainda das testemunhas Menezes Basto e Fernanda Leal), só não o tendo feito em face de
constrangimentos administrativos que a impediam de celebrar com essa empresa qualquer contrato,
designadamente o facto de não ser a proprietária do terreno onde os lixos eram depositados. O Eng.
Menezes Basto é, assim, na verdade, um “testa de ferro” nesse negócio, transmitindo para a “Resin” os
respectivos efeitos económicos (os pagamentos tinham como destinatário final a “Resin”, conforme aliás
não foi posto em causa – cfr., designadamnente, o relatório que seguiu o rasto do dinheiro, o depoimento
de quem o elaborou e os documentos pertinentes referenciados aquando da reprodução por súmula dos
depoimentos das testemunhas que a propósito deposeram). A simulação existe porquanto todos os
intervenientes agiram conluiados, as declarações negociais divergem da real vontade das partes e elas
agiram naturalmente com intenção de enganar terceiros (desde logo o Tribunal de Contas), sendo certo
que, como é sabido, não é requisito da simulação o propósito de prejudicar terceiros.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

próprio arguido Júlio Faria e das testemunhas Ferreira Pinto, que a propósito procurou
“tapar o sol com a peneira”, e José Júlio da Silva Pereira, donde resulta que a
testemunha Pinto recolhia no GAPP, em local especialmente destinado para o efeito, a
documentação que era preparada para o arguido Júlio Faria), além de que desempenhou
um papel relevante na preparação e na campanha eleitoral de 1997, tendo aliás sido
beneficiado com pagamentos provenientes da conta do BES, designadamente a título do
reembolso de despesas que efectuou a propósito de actividades partidárias que por si
foram custeadas, com o pagamento de bilhetes que lhe haviam sido atribuídos e
referentes a um sorteio promovido pelo FCF e de um donativo de 20.000 cts concedido
pela “Resin” a esse clube por intermédio desse arguido – matérias a que oportunamente
iremos dar particular atenção -, tudo conforme referiu o arguido Horácio Costa
sustentado por documentos juntos aos autos (de que o manuscrito de fls 156 é um
exemplo), o que inculca a ideia de que também participou nesse “esquema” destinado a
angariar fundos que doutra forma não teriam conseguido os arguidos Fátima e Júlio –
note-se que esse esquema foi engendrado numa altura em que ele ainda era presidente
da CMF -, tanto mais que, a avaliar pelos gastos efectuados na campanha eleitoral de
1997 (cerca de 50.000 cts), esta campanha foi de facto “grandiosa” (note-se que o valor
em causa é extremanente avultado em relação ao que foi expresso por várias
testemunhas que também se candidataram a eleições autárquicas e que revelaram qual o
valor que foi despendido nas respectivas campanhas), além de que aquele donativo da
“Resin” e outras contribuições por ela efectuadas (designadamente os “retornos”)
concerteza não seriam concedidas se ela não tivesse sido beneficiada nas adjudicações
que de facto lhe foram efectuadas pela CMF, camuflada pela interposição de “testas de
ferro” nos negócios em causa (o benefício traduziu-se designadamente na adjudicação
de facto de trabalhos sem qualquer procedimento administrativo legalmente conduzido
de forma a que esses trabalhos lhe pudessem ser real e legalmente adjudicados. Não se
põe em causa contudo que os trabalhos tenham sido de facto realizados, os quais aliás
constatámos no local – cfr. o auto de inspecção ao local, ilustrado de resto com
fotografias).
Resta saber se esse benefício da “Resin” terá alguma relevância penal,
indemonstrada que está a ocorrência de qualquer prejuízo patrimonial para a CMF,
matéria de direito que a seu tempo iremos dar atenção.
Ademais, não terá sido por acaso que o vereador que tinha o pelouro do
ambiente fosse posto sistematicamente de lado nos assuntos que se prendiam com a
“Resin” e a lixeira, já no mandato emergente das eleições de 1997, a ponto de se sentir
incomodado com esse facto (cfr., a propósito, o depoimento da testemunha Edgar Pinto
da Silva).
Ainda segundo essa testemunha, a arguida Fátima intrometia-se nos assuntos
que deveriam ser tratados pelos vereadores, ultrapassando-os, chegando ao ponto de
tratar pessoalmente de tudo, sinal claro de que de facto é pessoa centralizadora. Se
assim é na sua acção à frente dos destinos da CMF assim seria também ao nível da
acção partidária (a menos que tenha dupla personalidade, o que por certo não sucede),
pelo que nos pareceu manifestamente abusiva a pretensão de que se procurar transferir
para o secretário-coordenador a responsabilidade pela tomada de algumas decisões.
“Estava-lhe no ADN” (da arguida Fátima) controlar tudo de perto, segundo a
testemunha Vítor Sousa.
Por outro lado, em face da prova produzida, é bem evidente que o arguido
Horácio Costa era de facto assessor da arguida Fátima Felgueiras (independentemente
dos termos do contrato de assessoria e respectivo aditamento – cfr. documentos de fls
5797 a 5801), tanto mais que era nessa qualidade que se apresentava e era conhecido

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pela generalidade das pessoas (conforme referido por várias testemunhas), sendo pois
uma pessoa da sua inteira confiança. Assim se explica que ele tenha sido “pau para toda
a colher”, quer no que respeita a assuntos de índole partidária (não obstante ser um
recém chegado às lides do PS de Felgueiras e de não ser militante desse partido) quer no
que respeita a assuntos de natureza pessoal, como foi por exemplo o episódio da
aquisição do “Audi A4” e da venda do “BX” referido nos autos.
Esse arguido, entretanto, a 01.01.99, viria a assumir o cargo de vereador em
regime de permanência, na sequência da renúncia ao mandato pelo Verador Lickfold,
mantendo-se nessa condição até Março de 2000 (cfr. documentos de fls 5804 e ss. do
23º volume dos autos).
Pareceu ao Tribunal que as testemunhas que procuraram contrariar a ideia de
que o arguido Horácio Costa era pessoa então muito próxima da arguida Fátima
procuraram deliberadamente ocultar a verdade dos factos (designadamente, em face da
evidência do arguido Horácio Costa surgir ligado aos mais variados assuntos, alguns
deles sensíveis, tendo sido aliás pela mão dela que ele ingressou na CMF como
assessor).
Sinal disso foi a circunstância de se ter procurado contrariar o facto do arguido
Horácio ter ocupado um gabinete na CMF enquanto assessor (facto afirmado a pés
juntos por ele e, com credibilidade, confirmado designadamente pelas testemunhas
Fernanda Leal e Terezinha do Nascimento, ambas funcionárias da CMF, facto esse
corroborado pela circunstância do Centro Coordenador de Transportes não estar
concluído de forma a que ele pudesse ocupar nas suas instalações um gabinete – cfr. os
relatórios mensais juntos pelo arguido Horácio Costa já no decurso do julgamento, os
quais se reportavam, designadamente, ao estado das obras naquele edifício, constantes
de fls 12669 a 12697; cfr. ainda o documento remetido pela CMF de fls 13446 a
13449).
Note-se que o Tribunal convenceu-se que o arguido Horácio Costa recebia
presidentes de junta na ausência ou nos impedimentos da arguida Fátima Felgueiras,
conforme referiram aquele arguido e, por exemplo, a testemunha Joaquim José Teixeira
Ribeiro (presidente da junta de freguesia da Refontoura); ao invés, pareceu-nos que as
testemunhas que faziam as marcações das audiências não depuseram de forma
totalmente isenta acerca dessa matéria, talvez devido ao constrangimento de serem
funcionários camarários e de não se sentirem à vontade para pôr em causa quem de
momento comanda os destinos da autarquia, segundo aquela que foi a percepção do
Tribunal.
Não foi pois por acaso que o arguido Horácio Costa foi escolhido pelos arguidos
Fátima Felgueiras e Júlio Faria para integrar o “pelouro das finanças”, sendo assim um
dos con-titulares da conta do BES referida nos autos (aberta em 11.07.97 – cfr.
informação de fls 13923, a ficha de assinaturas de fls 13924 e o extracto bancário
constante do apenso 1), juntamente com o arguido Joaquim Freitas (este amigo pessoal
da arguida Fátima, membro da comissão política do PS local, conhecedor do meio
empresarial e já com experiência na recolha de fundos, pois fez parte do “pelouro das
finanças”, juntamente com a testemunha Sousa Oliveira, na campanha eleitoral referente
às eleições autárquicas de 1993).
Em todo o caso, porquanto só a ela se referiu o arguido Horácio Costa, não se
demonstrou a matéria alegada por ele no artº 15º, primeira parte e parte final, da sua
contestação.
Procurou-se ainda fazer passar a ideia de que era perfeitamente natural a
existência de uma conta autónoma para a campanha eleitoral, dado que as campanhas

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

para as eleições autárquicas envolvem pessoas que não são militantes e a conta oficial
do partido destinar-se-ia apenas a fazer face às despesas correntes.
O argumento parece-nos pobre, além de que, pelo menos em Vila do Conde,
inexistia qualquer conta autónoma para esse efeito (cfr. o depoimento da testemunha
Mário Hermenegildo Moreira de Almeida).
O certo é que os candidatos a eleições autárquicas ouvidos (vencedores ou
vencidos) apenas relataram a sua experiência pessoal relativamente a outros concelhos,
revelando assim de facto nada saberem em relação a Felgueiras, sendo certo que as
concelhias do PS gozavam de grande liberdade na forma como se organizavam para a
campanha eleitoral.
Seja como for, ficou demonstrado que era constume a existência de uma conta
autónoma, pelo menos desde as eleições autárquicas de 1989, mas no caso em apreço
essa mesma conta não se destinou apenas a financiar a campanha eleitoral, como
também outras causas do PS local, entre as quais o “Sovela”, bem como a aquisição da
viatura “Audi A4” referida nos autos. Ultrapassou pois em muito o âmbito do
financiamento das mencionadas eleições autárquicas.
Em face disso, sendo a arguida Fátima pessoa centralizadora, merece mais
crédito o depoimento do arguido Horácio Costa quando referiu que quem de facto
controlava a conta do BES era ela e o arguido Júlio, pois ia-lhes dando conta do que
recebiam e pelo menos alguns pagamentos só foram efectuados com o aval dela ou por
indicação do arguido Júlio Faria (cfr. o “post-it” já referenciado).
De resto, dando crédito ao depoimento do arguido Horácio, convencemo-nos
que ele actuou sempre sob as ordens e orientações, sobretudo, da arguida Fátima
Felgueiras (essa sustentação é verosímel em face da personalidade centralizadora da
arguida Fátima, que nada deixava ao acaso; o arguido Horácio recebia também
instruções do arguido Júlio, daí o teor de alguns manuscritos por ele redigidos e
destinados ao dito Horácio Costa).
Tal não significa necessariamente que a arguida Fátima tivesse conhecimento
pormenorizado, digamos em tempo real, de todos os movimentos da conta do BES (daí
que, nesse contexto, não seja estranho que a dado passo ela se tenha disponibilizado
para pagar uma despesa de campanha caso não existissem fundos na conta do BES,
conforme nota escrita dirigida ao arguido Horácio no documento de fls 185 do 1º
volume, quando na verdade à data esses fundos existiam em face do que se vislumbra
do respectivo extracto bancário constante do apenso 1).
Reafirma-se que a conta do BES não foi só a conta da campanha eleitoral de
1997, pois destinou-se a outros fins, desde o pagamento das mais variadas despesas e
actividades do PS, até ao pagamento de despesas da ADEC (“Sovela”) e mesmo de
despesas pessoais da arguida Fátima (como por exemplo a aquisição do “Audi A4”), daí
que não pareça verosímel que (em particular) a arguida Fátima se tenha desligado da
gestão dessa conta, tal era a sua importância.
Ademais, mesmo do manuscrito de fls 156 (da autoria do arguido Júlio Faria) se
extrai que essa posição de absoluta independência do candidado em relação ao aspecto
financeiro da campanha poderia não corresponder à realidade, pois ali se admite que se
poderia dar conhecimento à candidata (se assim fosse entendido) da questão da
angariação de fundos (distanciamento esse que de facto inexistiu pelas razões já por nós
mencionadas sinteticamente).
Não era pois muito relevante o distanciamento da arguida Fátima em relação à
questão da angariação de fundos, posição de princípio adiantada por várias testemunhas
(pese embora o “princípio da necessidade”, segundo a testemunha Raúl Brito, o pudesse
levar a fazer concessões em prejuízo do “princípio da independência” do candidato em

220
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

relação a essas matérias), mas sem real conhecimento de causa em relação ao que de
facto se passou em Felgueiras.
Note-se aliás que em Felgueiras existiam peditórios a “torto e a direito” e a
arguida Fátima tomou parte activa em alguns desses peditórios, como por exemplo para
financiar o FCF e a ADEC, conforme emerge de alguns documentos acima
referenciados aquando da reprodução por súmula das declarações prestadas por alguns
arguidos e testemunhas.
É de salientar que da versão dos factos plasmada na contestação à acção de
prestação de contas quanto às incidências da abertura da conta do BES resulta que os
arguidos Horácio e Joaquim Freitas sabiam desde a primeira hora que essa conta
bancária não se destinaria apenas ao depósito dos fundos necessários para a campanha
eleitoral de 1997, mas também para outras causas do PS, pelo que nessa parte as
afirmações efectuadas, designadamente pelo arguido Horácio Costa (de que estava
convencido que essa conta serviria apenas para proceder ao depósito dos donativos para
essa campanha eleitoral), não nos mereceram credibilidade.
Não obstante o arguido Horácio agir sob as ordens da arguida Fátima, o certo é
que, designadamente em função do grau de confiança mútuo patenteado, não podia
deixar de saber que algumas das entregas em numerário por banda da “Resin”
constituíam “retornos”, matéria a que mais à frente iremos dar atenção mais detalhada.
Tivemos ainda um relato por parte da testemunha Jorge Fernando Moreira da
Fonseca (“Anglomex”), o qual referiu que entregou o respectivo donativo para a
campanha eleitoral de 1997 à arguida Fátima Felgueiras, juntamente com o cartão de fls
2183 (o próprio arguido Horácio referiu ter recebido alguns cheques por intermédio da
arguida Fátima).
Ademais, por alturas da recepção do cheque de fls 499 do 3º volume, a arguida
Fátima estava presente, segundo a testemunha Joaquim Fernando Melo (que já não se
recorda se ela chegou a assistir à entrega do dito cheque ao arguido Joaquim Freitas ou
se surgiu no local 2 ou 3 minutos depois, o que em todo o caso não parece ter sido
coincidência, segundo deduzimos).
Não era pois pessoa muito preocupada em manter as devidas distâncias em
relação à angariação de fundos (naturalmente que os incautos cidadãos, quando
confrontados com pedidos de donativos por parte da “Srª Presidente” da autarquia, não
fariam grande distinção se se tratavam de donativos para uma campanha eleitoral, se
para o FCF ou se para a “ADEC” ou ainda para outro fim, conforme aliás parece
resultar do depoimento de algumas testemunhas que concederam donativos mas que não
sabem já exactamente para que finalidade; houve até uma testemunha que afirmou ter
concedido um donativo que tinha dois destinos: parte para a campanha eleitoral e parte
para o FCF, tal era a confusão).
Tudo isso torna verosímel a posição expressa pelo arguido Horácio Costa a
propósito do facto de ter referido que dava conhecimento das movimentações da conta
do BES aos arguidos Fátima e Júlio Faria e que, assim, eles não se mantinham distantes
no que se refere aos donativos que iam sendo concedidos.
Não é de estranhar que a generalidade das testemunhas ouvidas e que estiveram
envolvidas na campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997
desconhecessem na verdade se o arguido Horácio reportava ou não à arguida Fátima,
pois era matéria sensível e reservada (cfr. o manuscrito do arguido Júlio Faria de fls
156).
Não têm pois verdadeiro conhecimento de causa acerca dessa matéria,
limitando-se a expressar opiniões e convicções alicerçadas em pobres ou inexistentes

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

fundações. Algumas dessas profissões de fé, aliás, mais não representaram que
comoventes manifestações de apreço pela figura da “Srª Presidente”.
De resto, ficamos com a ideia que tudo era na verdade decidido por meia dúzia
de elementos (o “núcleo duro” ou “task forçe”, de que os arguidos Horácio e Joaquim
Freitas faziam parte, o que atesta bem o grau de confiança que neles era depositado) e
que nas reuniões mais alargadas alguns aspectos seriam apenas “apurados”. É aliás
sabido que em reuniões alargadas nada de concreto se tende a decidir se os assuntos a
tratar não vierem já alinhavados.
O arguido Horácio explicou em que circunstâncias foi convidado para integrar o
pelouro das finanças e quais as circunstâncias que rodearam a abertura da conta do BES.
Fê-lo relatando o encontro que ocorreu em casa do arguido Júlio Faria em Março
de 1997, com abundância de pormenores, o que tornou tal depoimento credível, tanto
mais que foi assertivo.
Foi nesse encontro, ocorrido em Março de 1997, que o arguido Júlio Faria
entregou aos arguidos Horácio e Joaquim Freitas o manuscrito de fls 156, facto por este
negado.
Aliás, o arguido Júlio Faria, apesar de reconhecer a autoria de tal documento,
suspeita (especula) que o mesmo não estará completo, dando a ideia de que esse
documento foi assim adulterado. Fê-lo porém sem qualquer assertividade.
Da análise desse documento retira-se, designadamente, que se reporta ao futuro
(o que inculca a ideia de que se trata de um documento anterior a qualquer reunião
realizada no seio do PS com vista à organização dos diferentes pelouros, tanto mais que
nesse documento não é referenciado que a testemunha Dinis faça parte do pelouro das
finanças, como de facto fez, pois ofereceu-se para isso numa reunião ocorrida em
meados de 1997, sendo certo que nesse pelouro, não obstante, não teve qualquer acção -
cfr. o depoimento da testemunha António Ribeiro Dinis). Além disso, convém não
esquecer que, segundo foi afirmado, alguns lugares já estavam preenchidos antes da
reunião onde se definiram os vários pelouros (cfr. por exemplo o depoimento da
testemunha Vítor Manuel Fernandes Oliveira de Sousa), em que os participantes se
ofereceram para os diversos grupos, pese embora a última palavra cabesse sempre à
arguida Fátima Felgueiras, conforme nos pareceu mais credível em face da
personalidade centralizadora dela, que nada quis deixar ao acaso (cfr., designadamente,
o depoimento testemunha Edgar Pinto da Silva; a arguida Fátima apenas reconheceu ter
composto a lista concorrente à CMF pelo PS nessas eleições).
A alusão à firma “Xavier Calçada” no documento de fls 156 prova, segundo o
arguido Júlio, que esse documento é posterior a uma reunião onde se abordou a
contratação dessa empresa, a qual até então desconhecia. Consequentemente, conclui
que esse manuscrito só foi elaborado por si após essa reunião. Questiona-se porém a
necessidade da simples existência desse manuscrito, o qual inculca fortemente a ideia de
que nem tudo era tratado nas reuniões, designadamente as matérias sensíveis.
Seja como for, o Tribunal convenceu-se da versão que a propósito foi
apresentada pelo arguido Horácio Costa pelos motivos sinteticamente referenciados
(chama-se aqui à colacção, além do mais, a diferença de postura corporal aquando da
tomada de declarações – o arguido Horácio olhava-nos directamente, o arguido Júlio
baixava os olhos; o arguido Horácio mostrou-se quase sempre muito assertivo naquilo
que dizia e o arguido Júlio utilizava frequentemente a expressão “estou em crer”).
Ademais, não vemos discrepâncias relevantes entre o que foi afirmado pelo
arguido Horácio Costa a propósito da abertura da conta do BES – com a ressalva de que
não nos mereceu credibilidade a sua afirmação de que pensava que essa conta apenas se
destinaria ao depósito dos donativos necessários para o financiamento da campanha

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

eleitoral de 1997 - e o que havia sustentado a esse propósito na acção ordinária nº


705/2001 do 1º Jz deste Tribunal (cfr. certidão de fls 13944 e ss., em particular os artgs
65º e ss. da contestação apresentada nessa acção de prestação de contas).
Foi ainda referido pelo arguido Júlio Faria (e por algumas testemunhas, como
por exemplo Augusto Coelho de Faria) a existência de umas “actas” referentes às
reuniões onde se tratou da organização da campanha, quer no que respeita aos vários
pelouros quer no que respeita às acções de campanha propriamente ditas (não referem
esses documentos quem os elaborou nem estão assinados, sendo certo que o arguido
Horácio Costa referiu que esses documentos foram compostos pelo arguido Bragança e
pela testemunha José Júlio da Silva Pereira já depois deste caso vir a público) – cfr. os
documentos de fls 12206 e ss., 14311 e ss., 14445 e ss. e o exame aos discos rígidos de
fls 14327 e ss.
Em face desse exame parece não existir dúvidas de que foi o arguido Bragança
quem os elaborou (não se sabe porém em que momento, parecendo-nos estranho que
essas “actas” não estejam assinadas; ignoramos assim se são documentos fidedignos ou
não).
Seja como for, a simples existência de um manuscrito do arguido Júlio Faria
alusivo ao “pelouro das finanças”, entregue numa reunião ocorrida em Março de 1997
em sua casa pela calada da noite, inculca a ideia de que de facto tudo era decidido por
meia dúzia de pessoas e que muitos dos que deram o seu contributo para a campanha
eleitoral com o seu esforço e empenho mais não foram do que marionetas manipuladas
pelas mãos hábeis que seguravam nos cordelinhos.
Além disso, pareceu-nos caricato o facto de algumas testemunhas terem referido
desconhecer que o arguido Horácio fazia parte do “pelouro das finanças”, quando outras
houve, com menores ou nenhumas responsabilidades nas lides partidárias, que
declararam saber que aquele arguido era o “homem da nota”; não obstante,
curiosamente, era sempre a ele que recorriam quando se tratava do financiamento de
alguma actividade do PS ou da JS, integrada ou não no âmbito da dita campanha
eleitoral, sinal inequívoco de que, pelo menos depois das eleições de 1997, bem sabiam
que o arguido Horácio era um dos titulares de uma conta que se destinava a financiar as
actividades do PS de Felgueiras.
A matéria em causa parece que “queimou” quem acerca dela foi questionado,
alegando desconhecimentos inversosímeis acerca de realidades de que não poderiam
deixar de conhecer (com maior ou menor pormenor). Esta postura, encardida em
determinadas testemunhas, tornou-as as mais das vezes descredíveis.
No que se refere às relações estabelecidas entre a “Resin” e as empresas
“Norlabor”, “Craveira” e “Translousada”, teve-se em conta o depoimento do arguido
Vítor Borges, o qual explicou que procurava manter relações comerciais com as
empresas locais, designadamente porque isso permitia reduzir os custos, que seriam
maiores se contratasse empresas não locais a fim de executarem os trabalhos em regime
de subempreitada.
Tal arguido explicou a razão por que foi celebrado o contrato de consórcio a que
se reporta o documento de fls 145 do apenso 97. A explicação dada não nos merece
qualquer reserva.
Emerge do depoimento desse arguido e do arguido Carlos Marinho que as
relações estabeleceram-se primordialmente com a “Translousada” e com a “Norlabor”
(aquela operou na lixeira de Sendim e esta na Lustosa, alugando equipamento com
condutor) e que foi através destas empresas que a “Resin” tomou conhecimento da
“Craveira” (com sócios comuns às já referidas empresas) e “João Tello” (que na
realidade nada fezeram na lixeira de Sendim).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por outro lado, a “ECOP” chegou a entrar no capital social da “Resin”, tendo
aliás estabelecido relações de consórcio com esta, factos que não foram postos em
causa.
A este propósito foi igualmente relevante o depoimento das testemunhas que
tinham responsabilidades nas empresas referidas.
Acresce, por fim, que não se demonstrou que a arguida Fátima e o arguido Júlio
tenham exercido qualquer influência junto da AMVS para que o consórcio liderado pela
“Resin” tenha vencido o concurso a que se reporta o ponto 1.5 da pronúncia.
Acerca destas matérias mais à frente delas trataremos com mais pormenor.

O contrato de transacção celebrado entre a CMF e o Eng. Joaquim Menezes


de Basto

Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Deu conta do problema premente que era a recolha do lixo no concelho, visto
que era depositado na lixeira de Sendim sem qualquer tratamento, com os inerentes
problemas para a saúde pública e para o ambiente, designadamente, em face da
combustão dos lixos e fumos por ele originados, da contaminação dos lençóis friáticos e
da propagação de insectos e outros animais, bem como o cheiro nauseabundo que se
sentia no local.
Os terrenos onde eram depositados os lixos pertenciam a particulares
(designadamente ao Eng. Menezes Basto), tendo sido então celebrada entre a CMF e o
proprietário um contrato de arrendamento abarcando uma área de cerca de 3.000 m2.
Antes disso já os lixos ali eram depositados, ignorando que tipo de acordo vigorava
entre a CMF e o respectivo proprietário.
Em todo o caso, não pôs em causa o teor da pronúncia no que se refere aos
sucessivos contratos de arrendamento ali descritos.
Referiu que em 05.11.90 participou numa reunião do executivo (então na
qualidade de veradora) onde o verador que tinha o pelouro do ambiente (verador
Campos) informou que o Eng. Menezes Basto – que à data recebia 25.000$00 de renda
por mês – queria por termo à deposição de lixo no seu terreno, permitindo porém a
deposição por mais um ano, impondo a vedação do terreno e o pagamento de uma renda
mensal de 200.000$00. Nessa reunião, com a abstenção da depoente, foi aprovada uma
contraproposta que consistia no pagamento de 60.000$00 mensais de renda e a
deposição de lixo por mais 14 meses, sendo certo que por cada dia de atraso na
devolução de tal terreno a CMF pagaria 30.000$00 a título de cláusula penal,
contraproposta essa que terá sido aceite pelo Eng. Menezes Basto (cfr. os contratos de
arrendamento juntos a fls 7, 11 e 12 do apenso 98).
Ora, o contrato de arrendamento celebrado nas condições descritas terminou em
Janeiro de 1992 sem que a CMF tivesse uma alternativa quanto ao local de deposição do
lixo, sendo certo que diariamente eram recolhidas cerca de 60 toneladas por dia, dos
quais cerca de metade eram lixos domésticos e outra metade residos industriais, em
especial provenientes da indústria do calçado.
Simultaneamente, o Eng. Menezes Basto exigia a devolução do terreno e o
pagamento da indemnização fixada a título de clausula penal por cada dia de atraso.
É nesse contexto que o presidente da elididade de então (o arguido Júlio Faria), a
04.02.92, informa os serviços desse facto, tendo entretanto convencido o respectivo
proprietário a prorrogar o contrato de arrendamento por mais 6 meses e que terminaria
em Julho de 1992, tendo porém o Eng. Menezes Basto exigido uma renda mensal de

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

150.000$00 e uma cláusula penal de 60.000$00 por cada dia de atraso na devolução do
terreno, o que foi aceite pelo executivo camarário na medida em que não existia uma
solução alternativa.
Sucede porém que, no final de Julho de 1992, a CMF não tinha ainda soluções
alternativas, visto que outras localizações para a deposição dos lixos eram alvo de
contestação popular.
Em face dessa realidade, a CMF convenceu o Eng. Menezes Basto a prorrogar
por mais 7 meses e pela última vez o contrato de arrendamento (até Agosto de 1993),
numa altura em que ali eram depositadas cerca de 70 toneladas de lixo por dia.
Ora, no final de Agosto de 1993, o Eng. Menezes Basto mostrava-se irredutível
em negar a continuação da deposição do lixo no seu terreno (dado o problema de saúde
pública e de degradação ambiental gerada pela deposição do lixo a céu aberto sem
qualquer tratamento, além de que ele vivia nas imediações da lixeira), sendo certo que a
deposição dos lixos tinha já ultrapassado a área que tinha sido arrendada à CMF.
Foi assim nesse contexto que o arguido Júlio Faria contactou com o arguido
Vítor Borges, enquanto presidente do Conselho de Administração da “Resin” – uma das
poucas empresas na altura com “know how” para tratar os lixos e que a depoente
conheceu através do presidente da AMVS -, no sentido de convencer o Eng. Menezes
Basto a permitir a continuação da deposição dos lixos (mas em moldes
substancialmente diferentes quanto à forma de deposição, de modo a eliminar os riscos
para a saúde pública e para o ambiente).
Foi pois o arguido Vítor Borges quem convenceu o Eng. Menezes Basto de que
era possível tratar os lixos, tendo este inclusive visitado em França, por ocasião das suas
férias, um aterro sanitário.
Entretanto, uma vez que o arguido Júlio Faria esteve doente durante cerca de 2
meses, a depoente substituiu-o nesse período de tempo à frente dos destinos da
edilidade, tendo sido por isso ela a apresentar ao executivo camarário a proposta de
celebração do contrato de transacção com o Eng. Menezes Basto, nos modes constantes
da pronúncia, em Outubro de 1993, e pelas razões explicitadas em tal proposta, que
reafirmou.
Confirmou assim os termos do contrato de transacção celebrado com o Eng.
Menezes Basto nos moldes constantes nos autos.
Justificou o facto de caber ao Eng. Menezes Basto a obrigação de reabilitação da
lixeira (não obstante ter sido a CMF, com a deposição dos lixos, quem degradou o
terreno) pelo facto de ser o titular do respectivo direito de propriedade (justificação que
não colhe inteiramente em face das declarações prestadas pelos arguidos Júlio Faria e
Vítor Borges).
Justificou a escolha da “Resin” para a reabilitação da lixeira de Sendim pelo
facto de ser das poucas empresas em Portugal com “Know how” para o efeito e dos
preços praticados serem mais baixos, sendo certo que a “Resin” dispunha do alvará de
empresas com quem se consorciava para realizar as obras necessárias para o efeito.
Referiu que o custo da reabilitação foi 32.410.480$00, precisamente o montante
constante do contrato de transacção, pelo que tal verba terá sido utilizada pelo Eng.
Menezes Basto para pagar os trabalhos de reabilitação da lixeira levados a cabo pela
“Resin”, o que desmente os termos constantes de tal contrato quanto à finalidade de tal
verba, tratando-se a celebração de tal contrato um estratagema que visava afinal permitir
o pagamento de tais trabalhos levados a cabo pela “Resin” (cfr. as declarações dos
arguidos Júlio Faria e Vítor Borges). Isto é, ao contrário do que expressamente
reconheceu e do que consta do documento respectivo, a celebração do contrato de
transacção visava o pagamento dos trabalhos de reabilitação da lixeira de Sendim

225
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

levados a cabo pela “Resin” (o que aliás se depreende também das suas declarações
acerca da real razão para a celebração do aditamento a tal contrato).
Referiu ignorar quem pagou as despesas relativas ao visto do TC, mas admitiu
que a “Resin” pagou algumas despesas (cfr. fls 226 do ap. 97 e 53 L do ap. 98).
Confirmou os termos do contrato-promessa de compra e venda do terreno onde
eram depositados os lixos, bem como os termos da escritura pública de compra e venda,
nos termos constantes da pronúncia.
Salientou a urgência na aquisição de tal terreno, já que os lixos continuavam a
ser depositados diariamente (mesmo para além do período do contrato de
arrendamento), razão pela qual era inconveniente submeter tal assunto à Assembleia
Municipal de Felgueiras (que normalmente reunia cinco vezes por ano, sem prejuízo da
realização de assembleias extraordinárias), o que em todo o caso seria necessário caso o
preço de aquisição ultrapassasse os 25.000 cts. Daí que, segundo se depreende do seu
depoimento, o preço se tenha cifrado em 24.754.820$00 (existe porém um diferencial
de 1.000.000$00, também recebidos pelo Eng. Menezes Basto, o que indicia que o
preço realmente acordado foi afinal de 25.754.820$00).
Ora, segundo referiu, o prazo de 6 meses previsto no contrato de transacção
terminou por alturas de Abril de 1994, altura em que a CMF deveria celebrar com o
Eng. Menezes Basto a escritura de compra e venda de tal terreno (cfr. os termos do
contrato-promessa), o que não foi possível pois este não tinha registado em seu nome o
direito de propriedade respectivo, além de que nessa altura a CMF não dispunha de
dinheiro para o pagamento do respectivo preço.
Consequentemente, só em Dezembro de 1994 se realizou a dita escritura de
compra e venda.
Não obstante, a “Resin” não deixou de trabalhar na lixeira entre Abril de 1994 e
Dezembro do mesmo ano, razão pela qual teriam de ser pagos os serviços prestados, não
obstante inexistir qualquer contratualização, dada a premencia do problema da recolha e
tratamento dos lixos e inexistência de outras alternativas.
A “Resin”, por seu turno, tinha interesse em manter-se no local já que pretendia
conquistar mercado no norte do país, sendo certo que operava também em Paços de
Ferreira e em Lousada sem qualquer contratualização. Porém, ameaçava demandar a
CMF e proceder à interrupção dos trabalhos de manutenção da lixeira caso não fosse
pago o valor correspondente a esses trabalhos (mais adiante, porém, referiu que a
“Resin” exigia o pagamento desses serviços ao Eng. Menezes Basto, razão pela qual
este fazia chegar à “Resin” o dinheiro que recebia da CMF e que não respeitavam à
aquisição do terreno, depreendendo-se do seu depoimento que a “Resin” recebia o
dinheiro do Eng. Menezes Basto na medida em que este recebesse da CMF o respectivo
pagamento).
Foi nesse contexto, em Fevereiro de 1996, já depois de ter assumido a
presidência da CMF (já que o arguido Júlio Faria foi eleito deputado na Assembleia da
República em Outubro de 1995), que submeteu à aprovação do executivo uma proposta
de aditamento ao contrato de transacção referido pelas razões mencionadas na mesma.
Ora, nesses termos veio a ser celebrado com o Eng. Menezes Basto o aditamento
referido ao contrato de transacção, que realmente mais não visava que o pagamento à
“Resin” dos trabalhos de manutenção da lixeira que entretanto vinha fazendo, segundo
se depreende do depoimento da arguida Fátima Felgueiras, e cujo pagamento não estaria
coberto pelo contrato de transacção inicialmente celebrado.
Confirmou os pagamentos efectuados no âmbito do contrato de transacção e
respectivo aditamento, nos moldes constantes da pronúncia (cfr. os documentos a
propósito mencionados na pronúncia, quer do processo principal quer do ap. 98).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Arguido Júlio Faria


Referiu que em Agosto de 1993 o Eng. Menezes Basto queria por fim à
deposição do lixo no seu terreno em Sendim, o que já ocorria desde 1982, sendo certo
que em 1986 fizeram um acordo sucessivamente renovado em condições mais gravosas
para a CMF. De resto, já em 1992 havia sido, sem sucesso, tentada a transferência da
deposição do lixo para Barrosas.
Confirmou os termos do acordo celebrado entre a CMF e o Eng. Menezes Basto
conforme consta da pronúncia.
Já na altura as Câmaras Municipais de Felgueiras, Paços de Ferreira e Lousada
buscavam uma solução intermunicipal para o problema da recolha e tratamento do lixo,
perspectivando-se a construção de um aterro sanitário intermunicipal e com recurso a
fundos comunitários.
Sucede que, inexistindo na altura qualquer solução intermunicipal para o
problema da recolha e tratamento do lixo, findo o período de vigência do contrato
celebrado com o Eng. Menezes Basto, uma vez que inexistia terreno alternativo para a
deposição do lixo do concelho, a CMF não entregou o imóvel conforme estipulado
(sendo certo que já na altura, com a deposição do lixo, se ocupava terreno não incluído
no contrato de arrendamento celebrado com o Eng. Menezes Basto, visto que a área de
deposição do lixo era já de cerca de 3.000 m2).
Por força desse facto houve uma reunião entre o arguido Vítor Borges (que o
depoente havia contactado) e o Eng. Menezes Basto, onde se procurou sossegar as
preocupações deste relativamente à forma como no futuro ali se iria continuar a
proceder ao deposito dos lixos (foi pois necessário convencê-lo de que a deposição dos
lixos no local iria processar-se em moldes radicalmente diferentes, de modo a evitar a
combustão, os fumos e os maus cheiros, tendo inclusivamente o Eng. Menezes Basto
visitado em França um aterro sanitário a convite do arguido Vítor Borges).
Criaram-se assim condições para a celebração do contrato de transacção referido
nos autos (cfr. fls 52 do apenso 98), cuja proposta foi preparada pelos Serviços
Administrativos e Jurídicos da CMF.
Mais referiu que foi o depoente quem escolheu a “Resin” para operar no local
(pois era a única, segundo sabia, que tinha o “know how” necessário), o que foi
aprovado pelo executivo camarário com a concordância do Eng. Menezes Basto.
A respectiva proposta foi assim apresentada pela arguida Fátima Felgueiras ao
executivo camarário (não o foi pelo depoente, enquanto Presidente da edilidade, na
medida em que entre Setembro e Novembro de 1993 foi substituído por ela por motivo
de doença – cfr. fls 63 do apenso 98).
O valor encontrado teve por base o preço praticado pela “Resin” relativamente
aos serviços que se propunha fazer no local (depósito dos lixos de forma ordenada e
controlada, cobertura com terra vegetal de modo a evitar a combustão, vedação do
terreno, colocação de um vigilante e utilização da maquinaria necessária à execução dos
trabalhos).
Na mesma altura propôs-se também a aquisição do terreno referido.
Os 32.410.480$00 referidos no contrato de transacção destinavam-se na verdade
a pagar os serviços a prestar pela “Resin” e não, no todo ou em parte, ao pagamento
duma indemnização pelos prejuízos sofridos pelo Eng. Menezes Basto pelo
incumprimento por banda da CMF dos acordos anteriormente celebrados.
Aliás, não tem qualquer recordação de alguma vez o Eng. Menezes Basto ter
exigido à CMF qualquer indemnização (antes da intervenção da “Resin” o dito Eng.
propunha-se apenas impedir a CMF de continuar a depositar os lixos naquele local).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu que coube ao Eng. Menezes Basto a reabilitação do terreno pelas razões
já expandidas pela arguida Fátima Felgueiras.
A liquidação dos montantes ao Eng. Menezes Basto foi feita em prestações,
sendo certo que ele fazia chegar o dinheiro à “Resin”, de modo que esta pudesse
continuar com os trabalhos.
Aliás, ao que pensa, a “Resin” começou no local os trabalhos em Dezembro de
1993, tendo realizado os serviços constantes do contrato de transacção.
Mais referiu que se o contrato-promessa de compra e venda do dito terreno
ultrapassasse os 25.000 contos teria a sua aquisição de ser submetida à aprovação da
Assembleia Municipal (cfr. o respectivo contrato-promessa de compra e venda,
constante de fls 80 do apenso 98).
Aliás, não era conveniente submeter tal questão à Assembleia Municipal na
medida em que o problema dos lixos era premente (pelas razões já referidas, isto é, em
suma, pela falta de local alternativo e pelo problema ambiental e de saúde pública que
eram gerados pela forma como eram depositados os lixos na lixeira de Sendim) e dado
que já se vivia em clima pré eleitoral relativamente às eleições autárquicas de 1993 (e
essa questão poderia-se tornar numa arma de arremesso político por parte da oposição).
Afirmou que o preço de aquisição desse terreno é o que consta do contrato-
promessa e respectiva escritura pública de compra e venda, isto é, 24.754.820$00 (e não
25.754.820$00). Recorda-se porém que, de facto, a proposta incial do Engenheiro
Menezes Basto ultrapassava os 25.000 contos, de modo que o conseguiu convencer a
baixar o preço por forma a que o assunto não tivesse de ser submetido à aprovação da
Assembleia Municipal, pelas razões já referidas.
Referiu ignorar quem assumiu o pagamento das despesas com o visto do
Tribunal de Contas no que concerne ao contrato de transacção referido.
Por fim, visto que na altura já não exercia qualquer cargo autárquico, salientou
ser alheio ao aditamento ao dito contrato de transacção.

- Arguido Vítor Borges


Reafirmou o que a propósito já referiu, designadamente que o contrato de
transacção em apreço (cfr. doc. de fls 52 e ss. do apenso 98) servia para que a CMF
pagasse ao Eng. Menezes Basto a reabilitação da lixeira de Sendim e de modo a que
este pagasse à “Resin” os trabalhos que ali levava a cabo.
Confirmou que a “Resin” suportou o custo com o visto do Tribunal de Contas
(cfr. fls 226 do apenso 97 e 531 do apenso 98).
Quanto à venda do terreno pelo Eng. Menezes Basto à CMF (cfr. o respectivo
contrato-promessa de compra e venda a fls 80 e ss. do apenso 98 e o contrato definitivo
constante de fls 83 e ss. do mesmo apenso 98) reafirmou o que já havia dito, ignorando
ao certo qual foi o preço estabelecido entre as partes (na ordem dos “vinte e tal contos”,
segundo lhe disse a dita testemunha Menezes Basto).
Ainda a propósito do contrato-promessa de compra e venda do terreno onde
estava implantada a lixeira de Sendim e do respectivo contrato definitivo, recorda-se do
Eng. Menezes Basto lhe ter referido ter celebrado o mencionado contrato-promessa e
que não havia ainda sido celebrada a escritura por problemas existentes com o terreno
(que o arguido não soube explicar quais. A razão adiantada por outros arguidos foi a de
que o registo não estaria actualizado, de modo que houve a necessidade de que o Eng.
Menezes Basto o registasse primeiro em seu nome, o que terá motivado o atraso na
celebração da escritura de compra e venda do imóvel, que apenas teve lugar a 27.12.94
– cfr., em todo o caso, a respectiva certidão da Conservatória do Registo Predial
competente).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quanto ao aditamento ao dito contrato de transacção explicou a necessidade da


sua celebração na medida em que o primeiro contrato apenas cobria a reabilitação da
lixeira durante 6 meses (até Maio de 1994) ao preço de 2.800.000$00 mensais (já não se
recorda se com IVA incluído ou não; parece em todo o caso que a tal montante deveria
acrescer o IVA a 5% em face das facturas juntas aos autos). Consequentemente, haveria
que pagar o trabalho de exploração dessa lixeira pela “Resin” no período compreendido
entre Junho e Dezembro de 1994 (inicialmente havia referido entre Junho e novembro
de 1994, corrigindo depois as suas declarações do modo referido), sendo certo que
inicialmente a “Resin” havia directamente emitido as facturas respectivas à CMF (por a
considerar a responsável pela deposição do lixo no local), as quais foram recusadas por
falta de suporte administrativo para as pagar pelas razões já referidas, segundo lhe
explicou a testemunha Teresinha (ou seja, enquanto o terreno não fosse adquirido pela
CMF não era possível efectuar um ajuste directo à “Resin” desses trabalhos).
Em face de tal devolução, mantiveram as facturas em causa mas retiraram o
nome da CMF e colocou-se o nome do Eng. Menezes Basto (cfr. a propósito as
declarações prestadas pelo arguido Carlos Marinho e as facturas em causa juntas na
audiência de julgamento tal como originalmente haviam sido emitidas), tendo-lhe sido
enviadas, o que lhes permitiria ao menos recuperar o IVA pago ao Estado (chegou a
explicar ao Eng. Menezes Basto a razão de tal procedimento, sendo certo que já sabia
que ele as não iria liquidar, conforme aliás lho referiu).
A forma de se ultrapassar a situação (de modo a permitir que a testemunha
Menezes Basto liquidasse tais facturas) foi assim a celebração do dito aditamento ao
contrato de transacção (cfr. a proposta apresentada a 08.02.96 pela arguida Fátima
Felgueiras, constante de fls 55 e ss. do apenso 98).
Sucede que esse aditamento apenas cobria 7 meses de trabalhos (entre Junho e
Dezembro de 1994), faltando ainda liquidar trabalhos executados ao longo de mais 11
meses no local (daí a abertura do concurso a que se reporta o ponto 1.3. da pronúncia).
Questionado acerca do facto do aditamento ao contrato de transacção apenas
cobrir o pagamento de 7 meses de trabalhos respondeu que tal se terá devido ao facto de
se prever a aquisição do terreno pela CMF findo esse período (cfr. o respectivo
contrato-promessa de compra e venda, onde se estipulava que a escritura seria celebrada
na primeira quinzena de Abril de 1994; porém, esse contrato só viria a ser celebrado a
27.12.94, conforme emerge do respectivo documento constante de fls 83 e ss. do apenso
98).
Confrontado com vários documentos do apenso 97, entre os quais os de fls 213,
345 e 347 referiu que nunca viu os cheques referidos na pronúncia (pois não tratava dos
assuntos da contabilidade), ignorando mesmo quanto foi recebido pela “Resin” a
propósito do aditamento ao contrato de transacção já referido, tendo porém a ideia que
parte do crédito (contabilisticamente detido sobre o Eng. Menezes Basto em face da
alteração das facturas quanto ao seu destinatário) foi colocado numa conta de créditos
de cobrança duvidosa, remetendo para o arguido Carlos Marinho as respectivas
explicações em face das funções que este exerceu na “Resin” (a ideia foi, em todo o
caso, obter uma vantagem fiscal).
Sem ter a certeza, tem a ideia de se ter enviado muitos faxes à CMF a solicitar o
pagamento e ponderou suspender os trabalhos por falta de pagamento.
Em todo o caso, assegurou que o Eng. Menezes Basto nada pagou em numerário
à “Resin”.

- Arguido Carlos Marinho

229
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu que não teve qualquer intervenção na celebração do contrato de


transacção em apreço, celebrado entre a CMF e o eng. Menezes Basto, apenas dele
tomando conhecimento já no decurso deste processo.
De resto, não participou em qualquer reunião onde esse tema fosse abordado,
tendo apenas alertado o arguido Vítor Borges da falta de rentabilidade do preço
praticado para a reabilitação da lixeira de Sendim (2.800.000$00 + IVA por mês), pois
pagavam mensalmente à “Translousada” 1.600.000$00 + IVA, colocaram no terreno
três homens e o custo da estrutura montada rondava os 8 a 10%.
Confirmou que foi a “Resin” quem suportou o pagamento do visto do TC,
conforme confirmou nos documentos contabilísticos a que teve acesso, ignorando
porque motivo foi a “Resin” a suportar esse custo, quando tal despesa caberia ao dono
da obra.
No que concerne ao aditamento ao contrato de transacção esclareceu que após a
conclusão dos trabalhos de reabilitação da lixeira de Sendim, em Maio de 1994, a
“Resin” manteve-se a operar no local (exploração da lixeira), passando a CMF a ser
responsável pelo pagamento das respectivas facturas.
Assim, desde Junho de 1994 a Outubro de 1995 a “Resin” fez a exploração
dessa lixeira, facturando mensalmente à CMF 2.800.000$00 + IVA.
No final de 1995 o arguido Vítor Borges teve uma reunião na CMF e nessa
altura devolveram-lhe as 17 facturas em causa visto que por razões administrativas a
CMF as não podia liquidar, sendo certo que parte delas iriam ser debitadas ao Eng.
Menezes Basto.
Por esse motivo, tais facturas foram anuladas, tendo aconselhado o arguido Vítor
Borges a que se procedesse à substituição nas facturas originais da identidade do sujeito
passivo (que passou a ser o Eng. Menezes Basto até Janeiro de 1995 – altura em que
deixou de ser proprietário do terreno onde estava implantada a lixeira - e a
“Translousada” a partir de então), dessa forma se evitando uma fiscalização das
Finanças que por certo quereria averiguar a razão de tal procedimento. Para provar o
que afirmou exibiu e juntou aos autos as ditas 17 facturas emitidas à CMF e referentes
àquele período de tempo.
Assegurou que nas facturas compreendidas entre Junho de 1994 e Janeiro de
1995 foi substituída a CMF pelo Eng. Menezes Basto como sendo a entidade a quem
foram emitidas porquanto em Janeiro de 1995 o dito Eng. Manezes Basto deixou de ser
o proprietário do terreno onde se situava a lixeira, pelo que formalmente deixava de ser
responsável por qualquer pagamento (está documentado nos autos que o contrato de
compra e venda ocorreu em Dezembro de 1994).
Nas facturas compreendidas entre Fevereiro de 1995 e Outubro do mesmo ano
substituíram a CMF como sujeito passivo pela “Translousada”. A testemunha não deu
uma explicação para tal.
Referiu que a reabilitação da lixeira foi integralmente paga, tendo explicado os
documentos constantes dos autos e que documentam esses pagamentos (indicados na
pronúncia), em que essencialmente o Eng. Menezes Basto recebia da CMF e fazia
chegar esse dinheiro à “Resin”, chegando porém a emitir um cheque pessoal.
Assim, o cheque da CMF nº 5207652505, datado de 30.03.94 (constante de fls
347 do apenso 97), foi endossado pelo Eng. Menezes Basto e destinou-se ao pagamento
da factura nº 663, de Dezembro de 1993, constante de fls 218 do apenso 97 (cfr. o
depósito constante de fls 227 e o respectivo recibo de fls 225, todos do mesmo apenso
97).
Já o cheque nº 8284328904, emitido pela CMF a 22.06.95 (constante de fls 345
do apenso 97), foi também endossado à “Resin” pelo Eng. Menezes Basto e destinou-se

230
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

ao pagamento das facturas nºs 940056, de Janeiro de 1994 (constante de fls 220 do
apenso 97), 9402116, de Fevereiro de 1994 (constante de fls 221 do apenso 97), factura
nº 9400177, de Março de 1994 (constante de fls 222 do apenso 97) e parte da factura nº
9400251, de Abril de 1994 (constante de fs 223 do apenso 97). Cfr. ainda o depósito de
fls 231 (a 23.06.95) e o recibo de fls 230, de 03.06.95, todos do mesmo apenso 97.
Já o cheque pessoal do Eng. Menezes Basto nº 22543202, no montante de
5.000.000$00, destinou-se ao pagamento do remanescente (3.940.320$00) da factura nº
9400251, de Abril de 1994 (constante de fls 223 do apenso 97) e parte da factura nº
9400319, constante de fls 228 do apenso 97 (1.059.680$00). Cfr. ainda o recibo de fls
232, datado de 06.07.95 e o talão de depósito de fls 234, todos do apenso 97.
Quanto a este cheque de 5.000.000$00 emitido pelo Eng. Menezes Basto a favor
da “Resin”, constante de fls 338 do apenso 98 (o depósito consta de fls 234 do mesmo
apenso), não sabe porque razão foi emitido um cheque pessoal daquele.
Por fim, em Julho de 1996 o Eng. Menezes Basto pagou o remanescente da
factura nº 9400319 e parte da factura nº 9400480, constante de fls 203 do apenso 97,
datada de 29.07.94, através do endosso do cheque nº 9811598309, datado de 25.06.95 e
emitido a seu favor pela CMF, tendo sido emitido o correspondente recibo constante de
fls 213 do apenso 97 e datado de 26.06.96.
Tal testemunha assegurou que a “Resin” não recebeu do Eng. Menezes Basto
qualquer quantia em numerário, sendo certo que o recibo de fls 213 do apenso 97
reporta-se ao pagamento das facturas por si já indicadas, efectuado através do endosso
do cheque nº 98115983309, emitido pela CMF a 25.06.95.
Aliás, afirmou que o dito eng. nenhum outro pagamento efectuou.
A dívida (respeitante também à exploração da lixeira) transitou de ano para ano
desde 1994 na contabilidade da “Resin”, pelo que em Outubro/Novembro de 1998 foi
constituída uma provisão para clientes de cobrança duvidosa por forma a eliminar tal
dívida da contabilidade, desistindo pois a “Resin” de cobrar uma quantia que rondava os
24.000.000$00. Tal procedimento foi adoptado sem que lhe dessem qualquer explicação
por parte da administração, tendo-lhe transmitido porém que havia a expectativa de
receber esse dinheiro. Ignora se a “Resin” chegou a adoptar algum procedimento para a
receber, sendo certo que, se formalmente era o Eng. Menezes Basto o devedor, o certo é
que o real devedor era a CMF.
Só o fizeram em 1998 porque só nesse ano é que a “Resin” teve condições para
considerar essa dívida como custo.
Referiu ainda que não se recorda com que base fez a facturação da reabilitação
da lixeira, adiantando porém que o deverá ter feito segundo notas escritas do arguido
Vítor Borges.
Confirmou que veio de França uma máquina necessária para se dar início aos
trabalhos de rabilitação (cfr. doc. junto na audiência de julgamento), tendo visitado a
lixeira uma única vez (o mesmo sucedendo ao aterro).
A exploração da lixeira já foi efectuada com o recurso aos serviços da
“Translousada”, segundo as facturas por ela apresentadas.
A reabilitação importou em cerca de 31.000.000$00 (IVA incluído) e a
exploração em cerca de 26.000.000$00. Tais trabalhos foram facturados ao Eng.
Menezes Basto, tendo ficado em dívida cerca de 24.000.000$00, sendo certo que era a
CMF a real devedora. Expressou a propósito a ideia de que ficaram por pagar parte dos
trabalhos de exploração reportados a um tempo em que era a CMF a cliente de facto
mas não a proprietária do terreno onde se situava a lixeira, o que a impedia de
formalmente assumir o pagamento desses serviços prestados pela “Resin”.
Assegurou que a “Norlabor” não trabalhou na lixeira de Sendim.

231
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nega ter alguma vez tido qualquer contacto com o arguido Barbieri Cardoso,
sendo certo que não conhecia pessoalmente quer a arguida Fátima Felgueiras quer o
arguido Júlio Faria.

- Arguido Barbieri Cardoso


Referiu não ter estado na reunião em Lousada onde a “Resin” se apresentou aos
autarcas, conforme referido pelo arguido Vítor Borges.
Contudo, esteve presente numa reunião que se realizou em Paços de Ferreira a
13.05.93, presidida pelo Eng. António Taveira, então Secretário de Estado dos Recursos
Naturais, onde se discutiu a problemática da recolha e tratamento do lixo e da
dificuldade da resolução desse problema a nível meramente municipal, concluindo-se
pela necessidade de uma solução conjunta intermunicipal entre os municípios do Vale
do Sousa.
Nessa reunião participou o arguido Vítor Borges (em representação da “Resin”)
e o Sr. Xavier Bonelle (em representação da “Déchets”).
O dito Secretário de Estado admitiu então a construção de dois alvéolos na
lixeira da Lustosa (Penafiel) e o encerramento das lixeiras, entre as quais a de Sendim.
Entretanto, foi remetido um ofício do Ministério da Administração Interna ao
CEFF (o qual porém apenas deu entrada na CMF a 11.08.93), que na altura era
presidido pelo Prof. Campos, o qual despachou no sentido de lhe ser remetido tal
expediente uma vez que era também o vereador responsável pela área do ambiente.
Em face desse expediente recebido do Ministéro da Administração Interna, o
depoente deslocou-se duas vezes, no final de Agosto de 1993, à lixeira de Sendim, onde
encontraram o Eng. Menezes Basto acompanhado de um técnico da “Portucel” (empresa
que explorava a floresta no local) e que ameaçava rescindir o contrato que tinha com o
dito eng. se o problema da lixeira não se resolvesse devido aos incêndios.
Recorda-se que numa das deslocações ele estava também acompanhado do
arguido Vítor Borges.
Foi nessas circunstâncias que travou conhecimento com o Eng. Menezes Basto
(antes disso, nas reuniões de câmara, ouvia apenas falar dele e dos contratos de
arrendamento que tinha celebrado com a CMF, sendo certo que, em todo o caso, era o
Sr. José da Silva Magalhães – encarregado-geral da CMF – quem o contactava
pessoalmente).
Recorda-se que nessa altura o arguido Júlio Faria – então presidente da edilidade
- informou-o que a “Resin” havia sido contactada para apresentar uma solução para a
lixeira de Sendim. O depoente foi acompanhando a evolução da situação nas reuniões
de coordenação na CMF, pois o arguido Júlio Faria solicitava consultas ao
Departamento Técnico acerca de aspectos técnicos.
Foi consultado antes de ter sido celebrado o contrato de transacção com o Eng.
Menezes Basto, tendo sido encetadas negociações com este e com o Sr. Moura Borges
(proprietário dos terrenos vizinhos e que também haveriam de ser adquiridos pela CMF
para o mesmo fim) para adequarem os respectivos terrenos à deposição dos lixos.
A exploração provisória da lixeira de Sendim foi sendo feita a par da sua
reabilitação desde Dezembro de 1993 (antes disso não tem conhecimento nem notícia da
“Resin” operar no local).
Explicou que a CMF não celebrou na altura qualquer contrato com a “Resin”,
apesar de ser esta quem operava na lixeira de Sendim, na medida em que não era a
proprietária do terreno onde tal lixeira estava implantada e o Eng. Menezes Basto não
queria transmitir a propriedade do imóvel até se assegurar de que a realibilitação da
lixeira era concretizada, além que de que a “Resin” não possuía o alvará necessário para

232
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

levar a cabo as obras no local e por isso tal empresa apenas poderia ser considerada uma
prestadora de serviços (esclareceu que à data da sua inquirição na fase de inquérito
desde processo a única ideia que tinha para a não contratualização com a “Resin” era a
falta de alvará desta última).
O arguido Júlio Faria decidiu então celebrar o contrato de transacção com o Eng.
Menezes Basto como forma de se ultrapassar a questão, naturalmente depois de
consultar a assessoria jurídica.
Pronunciou-se o depoente acerca do documento de fls 98 e ss. do apenso 98, no
que aos aspectos técnicos concerne.
Assegurou que a missão de reabilitação foi executada no local conforme fotos
juntas aos autos a fls 11736 e ss. do 45º volume e de acordo com o que estava previsto.
Foi ao local de vez em quando acompanhar a execução dos trabalhos, razão pela
qual se lembra de ver ali uma máquina francesa e de outra maquinaria, não se
recordando se as mesmas estavam ou não identificadas com o logotipo ou outro sinal
identificativo de alguma empresa, sendo certo que nunca se interessou em saber a quem
pertenciam. Chegou a falar algumas vezes com o encarregado da “Resin” e com a Engª
Claudia Reibeiro.
Crê que lhe transmitiram que a “Translousada” também trabalhava no local.
O chefe da Divisão dos Serviços Urbanos (Eng. Adelino Leite) dava-lhe conta
também de que não tinha problemas com a deposição do lixo em face das obras que iam
sendo executadas no local.
Assegurou que era a “Resin” e a “France Déchets” quem executavam os
trabalhos referidos.
Recorda-se do arguido Júlio Faria ter estado doente e de ter sido substituído pela
vice-presidente da autarquia, a arguida Fátima Felgueiras.
Recorda-se ainda de terem sido adquiridos três terrenos contíguos, um
pertencente ao Eng. Menezes Basto, com a área de 22.160 m2 (onde ocorria a deposição
dos lixos), e dois ao Sr. Moura Borges (com as áreas de 3.135 m2 e 6.980 m2).
A proposta inicial efectuada pelo Eng. Menezes Basto quanto ao preço de venda
ultrapassava os 30.000.000$00, o que lhe pareceu excessivo, sendo certo que foi
chamado a pronunciar-se acerca do valor dos terrenos em causa.
Deu conta que ignora se o preço acordado entre as partes é ou não coincidente
com o que consta do contrato-promessa e da escritura pública de compra e venda.
Tem ideia que houve atraso na celebração desta última porquanto o Eng.
Menezes Basto “não tinha em ordem os documentos” necessários à concretização do
negócio (cfr. a este propósito a respectiva escritura, designadamente fls 84 verso do
apenso 98, donde emerge que o Eng. Menezes Basto só logrou proceder ao registo do
imóvel em seu nome no dia 11.04.94, o que terá justificado o dito atraso).
Quanto ao aditamento ao contrato de transacção celebrado com o Eng. Menezes
Basto, salientou que os trabalhos foram prosseguindo sem qualquer contratualização
formal com a “Resin”, havendo pois que encontrar soluções que não passassem pela
celebração de contratos de transacção no futuro.
Sabia que existiam facturas emitidas pela “Resin” à CMF sem suporte
administrativo que permitisse o pagamento por parte desta última.
A arguida Fátima Felgueiras foi pois confrontada com essa situação desde Junho
de 1994, isto é, existência de facturas para as quais inexistia suporte administrativo que
permitissem o respectivo pagamento.
Equacionaram-se pois quais as soluções necessárias para resolver esse problema,
que se arrastava desde Junho de 1994 e quais as soluções a adoptar para as situações
futuras.

233
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ora, em Setembro/Outubro faz-se o planeamento do orçamento camarário e até


Janeiro de 1995 a solução não passava pela abertura de um concurso limitado (visto que
o contrato de compra e venda do terreno só produziu todos os seus efeitos após o visto
do TC em 16.01.95). Assim, a solução adoptada foi a do aditamento ao contrato de
transação para o pagamento dos trabalhos até Dezembro de 1994.
Ora, quer a decisão de se proceder ao aditamento ao contrato de transacção
celebrado com Eng. Menezes Basto, quer a decisão de se proceder à abertura do
concurso a que se reporta o ponto 1.3 da pronúncia, quer a decisão de se proceder ao
ajuste directo à “Resin” (ponto 1.4 da pronúncia) foram tomadas na mesma reunião de
coordenação, de modo a solucionar o problema do pagamento dos trabalhos efectuados
até então e de modo a solucionar o problema do pagamento dos trabalhos a executar no
futuro na lixeira de Sendim.
Tais soluções foram já equacionadas na preparação do orçamento camarário para
1996 (em reuniões mais alargadas) sendo certo que, como referiu, o planeamento
orçamental para o ano seguinte efectua-se por norma em Setembro/Outubro de cada
ano.
O contrato de transacção serviu assim para pagar a missão de reabilitação da
lixeira de Sendim, a exploração provisória e o projecto respectivo, de forma assim
indemnizar o Eng. Menezes Basto em ordem à reabilitação do seu terreno e o
aditamento ao contrato de transacção destinou-se ao pagamento dos trabalhos
efectuados na lixeira de Sendim entre Junho de 1996 a Janeiro de 1995, à razão de
2.800.000$00 + IVA (em Janeiro de 1995 o IVA passou de 16 para 17%).
A cláusula inserta no contrato-promessa de compra e venda referido nos autos de
entrega do terreno prometido vender visava salvaguardar a continuidade de deposição
de lixos no local.
A propósito do manuscrito de fls 2275, do 10º volume, efectuado pela
testemunha Teresinha, esclareceu não ter estado na reunião a que ali se faz alusão e,
segundo depreende desse documento, também o arguido Júlio Faraia não terá estado
presente (caso contrário não haveria necessidade de elaborar o documento em causa).
Explicou que os concursos passavam pela Divisão de Apoio Técnico e
Administrativo (cujo chefe era o Eng. José Ferreira), daí o teor do despacho do arguido
Júlio Faria inserto no dito documento de fls 2275.
A propósito do fax de fls 2273 do 10º volume explicou que o GAT (Gabinete de
Apoio Técnico) de Penafiel orientava a pesquisa de terrenos alternativos para neles se
construir aterros sanitários.
Na audiência foi junto um documento respeitante a um fax remetido pela
“Resin” a dar conta do preço praticado para a continuação dos trabalhos (2.800.000$00
+ IVA), documento esse despachado pela arguida Fátima Felgueiras na medida em que
o arguido Júlio Faria se encontrava de férias.

- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira


Tendo sido inspector da Inspecção Geral de Finanças elaborou vários relatórios
que se encontram juntos aos autos (cfr. fls 2285 e ss., 4140 e ss., 4677 e ss. e 5964 e
ss.).
Confrontado com os documentos de fls 341 e 342 do apenso 97 (missivas
remetida pela “Resin” ao Eng. Menezes Basto no sentido dele confirmar o débito em
causa), presume que esses documentos não chegaram a ser enviados ao destinatário uma
vez que este os não preencheu na parte destinada a tal. Explicou que se tratam de
documentos elaborados pelos Revisores Oficiais de Contas para confirmação de saldos.

234
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se tratam de documentos de cobrança de dívidas. Pede-se ao destinatário (devedor)


que confirme o crédito.
Já os documentos de fls 344 e 345 do apenso 97, de igual natureza, terão sido
preenchidos pelo destinatário.

- Testemunha Joaquim de Jesus Osório de Menezes Basto


Referiu que tinha um terreno que começou a ser usado para o depósito do lixo
do concelho de Felgueiras, talvez há mais de 20 anos (o Dr. José Maria Machado Matos
ainda era o presidente da CMF, pelo que tal terá ocorrido nos anos 80).
A primeira abordagem feita ao depoente no sentido de consentir na deposição do
lixo naquele local foi feita pelo Sr. Silva, um funcionário da CMF.
Nessa altura o depoente, como contrapartida, apenas pediu à CMF que
pavimentasse o caminho de acesso à sua residência, o que foi feito. Inexistiu nessa
altura qualquer outra contrapartida.
Asseguraram-lhe que a deposição do lixo no seu terreno seria temporária.
Porém, a deposição do lixo naquele local arrastou-se no tempo, sendo certo que toda a
gente ali depositava lixo, tendo-se mesmo ultrapassado a área inicialmente acordada.
Consequentemente, a lixeira tornou-se um local insuportável, com o lixo amontoado por
todo o lado e de forma desordenada, entrando de vez em quando em combustão.
Falou então com o arguido Júlio Faria, à data presidente da CMF, no sentido
dele encontrar uma solução alternativa, o qual então lhe manifestou a dificuldade em
encontrar outra alternativa.
Durante anos pressionou-o a parar com a deposição dos lixos na sua
propriedade, tendo-se dirigido muitas vezes a CMF com esse desiderato. Não se recorda
de ter ameaçado chamar a GNR e vedar o terreno para parar com a deposição do lixo
nesse local.
Celebrou entretanto com a CMF um contrato de locação (não se recorda de todo
do ano em que tal contrato foi celebrado), enquanto a CMF procurava encontrar um
local alternativo para a deposição do lixo.
Esse contrato veio posteriormente a ser alterado.
É possível que os sucessivos contratos de locação se tenham arrastado de 1986
até 1993.
Não se recorda do montante da última renda paga pela CMF (os montantes eram
discutidos com o arguido Júlio Faria).
Acerca das cláusulas dos diferentes contratos de locação revelou a testemunha
grandes lacunas de memória, tendo sido então confrontado com a cópia dos contratos de
locação referidos, designadamente com os constantes de fls 7, 11 e 12 do apenso 98. A
propósito deste último referiu não ter ideia de ter recebido qualquer indemnização da
CMF pelo atraso na devolução do terreno locado. Confrontado com a cláusula 7ª do
último contrato de locação celebrado (que previa uma indemnização a título de cláusula
penal em caso de mora na entrega do imóvel) confirmou o pagamento de 6.500.000$00.
A CMF entretanto pretendeu adquirir o terreno e o depoente decidiu vendê-lo,
opção mais consentânea com os seus interesses dado o ponto de degradação a que
chegou o dito terreno. Não se recorda quem da CMF lhe propôs o negócio, não se
recordando ainda se nessa altura já conhecia o arguido Vítor Borges (acabou por referir
que foi este arguido quem o aconselhou a vender o terreno, visto que iria sair legislação
comunitária que o responsabilizaria pela reabilitação ambiental do terreno). Assegurou
que a sua esposa não se metia nesses assuntos (assim desmentindo a versão contada
pelo arguido Vítor Borges, o qual referiu que teve de convencer a esposa da testemunha
para que pudesse avançar com a reabilitação da lixeira).

235
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tem a ideia que os preços foram discutidos com o arguido Barbieri Cardoso,
sendo certo que o vereador José Campos estava presente.
Não se recorda de quanto era o valor da proposta inicial que apresentou à CMF.
Não tem ainda presente por quanto vendeu o terreno; seja como for, o respectivo
preço consta da escritura de compra e venda celebrada. Não tem porém a certeza se o
preço declarado na escritura de compra e venda coincide com o preço realmente
acordado entre as partes.
Admite que a venda ter-se-á concretizado em 1993 ou 1994 (cfr. o documento de
fls 83 do apenso 98, datado de 27.12.94).
A testemunha em causa foi então confrontada com as declarações que prestou
perante a PJ a fls 2062 quanto ao preço de venda e razões da divergência entre o preço
realmente acordado e o que ficou expresso na escritura.
Confirmou então o que a esse propósito declarou à PJ. Recorda-se que foi por
uma questão de ordem técnica que ficou a constar um preço inferior a 25.000.000$00,
caso contrário seria necessária a realização de um concurso público (pensa que terá sido
essa a explicação que lhe foi transmitida pelo arguido Júlio Faria).
Por outro lado, por questões de ordem política, a questão tinha de se resolver
rapidamente (aproximavam-se eleições autárquicas).
Esclareceu que tinha herdado o terreno em causa e que não o tinha registado em
seu nome, tendo apenas diligenciado nesse sentido quando decidiu vender o imóvel à
CMF.
Antes de se ter concretizado a venda tornava-se necessário reabilitar o terreno,
sendo certo que se encontrava depositado lixo por todo o lado, mesmo fora dos limites
da lixeira, quer numa área de cerca de 10.000 m2 ainda pertencente ao depoente quer
ainda numa área de terreno pertencente a um vizinho.
Sugeriu então à CMF que fosse a “Resin” a proceder à reabilitação do terreno
porque entendeu que era a empresa adequada a tal. Porém, não celebrou com ela
qualquer acordo escrito. Como a responsabilidade pelos estragos provocados era da
CMF esta pagaria a reabilitação ao depoente, o qual por sua vez pagaria à “Resin”, daí a
celebração do contrato de transacção com a CMF.
Tomou conhecimento da “Resin” por andar pela lixeira, designadamente o
arguido Vítor Borges (aliás, ninguém o apresentou, tendo travado conhecimento com
ele porque o encontrou na lixeira).
Confirmou que inicialmente se mostrou renitente na capacidade da “Resin”
reabilitar o local, mas entretanto aproveitou o facto de ter ido de férias a França para
visitar um aterro sanitário (da “France Dechéts”), por intermédio do arguido Vítor
Borges, o qual queria convencê-lo de que faria uma reabilitação profissional da lixeira.
Ficou agradado com que viu em França e então acreditou que a “Resin” poderia
reabilitar adequadamente a lixeira, criando uma infra-estrutura semelhante à que vira.
Assim, desde o Verão de 1993 que o lixo passou a ser tratado na lixeira,
compactado e acondicionado, sendo certo que o lixo era depositado diariamente. Pese
embora não se encontrasse diariamente no local, das vezes que ali se deslocou passou a
ver a deposição do lixo efectuada nos moldes referidos.
O valor do contrato de transacção celebrado com a CMF foi de 32.410.480$00,
equivalente ao valor que acordou com a “Resin” (confirmou os termos do contrato de
transacção em causa, cuja cópia se acha a fls 76 e 77 do apenso 98).
Referiu que não foi a CMF a contratar directamente a “Resin” porque tal
obrigaria a um concurso e dada a proximidade das eleições autárquicas, segundo lhe
disse o arguido Júlio Faria.

236
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tem a ideia que a quantia acordada para a transacção foi paga na totalidade em
prestações. Perguntava na contabilidade da CMF (à testemunha Terezinha do
Nascimento Lopes Domingues Carvalho) quando é que as prestações iriam ser pagas.
Como se deslocava à CMF muitas vezes (à contabilidade para saber dos pagamentos, já
que se registava grande atraso na liquidação do acordado) não era necessário ser avisado
por terceiros (designadamente pela “Resin”) da ocorrência desses pagamentos. Seja
como for, referiu que por vezes o arguido Vítor Borges contactava-o a dar-lhe conta de
que a CMF iria proceder a um pagamento parcial.
Entende que era natural que a “Resin” procurasse junto da CMF saber quando é
que ela iria efectuar ao depoente os pagamentos pois deles dependia os pagamentos
efectuados pelo depoente àquela empresa.
Sobre o assunto dos pagamentos não se recorda de ter tido qualquer conversa
com a arguida Fátima Felgueiras.
Por outro lado, não conhece o arguido Carlos Marinho.
Como referiu, recebia o dinheiro da CMF e pagava à “Resin”, por vezes
endossando à mesma o cheque que recebera da CMF.
Chegou também a depositar o dinheiro na sua conta e a emitir a favor da “Resin”
um cheque sacado sobre a sua conta pessoal.
Não se recorda se chegou a proceder algum pagamento em numerário à “Resin”
(tem a ideia que sim, mas não tem a certeza; mais à frente acabaria por referir não ter
ideia de ter feito qualquer pagamento em numerário, posição que manteve mesmo
depois de confrontado com as declarações que prestou a fls 2803 perante a PJ na fase de
inquérito).
Normalmente aparecia alguém da “Resin” para receber o pagamento sem
necessidade de prévio contacto da sua parte (o que pressupunha que já sabiam do
pagamento efectuado pela CMF, tanto mais que apareciam logo a seguir ao
recebimento).
Não tem ideia de ter feito qualquer pagamento directamente ao arguido Vítor
Borges.
Assim, os 32.410.480$00 destinaram-se à “Resin”.
À testemunha foi perguntado se tinha retirado dos pagamentos recebidos da
CMF a quantia de 1.000.000$00 referente à diferença entre o preço real e o preço
declarado na escritura de compra e venda celebrada com a CMF (e também no contrato-
promessa de compra e venda celebrado anteriormente), ao que respondeu “que é capaz”
de ter ficado com 1.000.000$00 por esse motivo.
Confirmou ainda os termos do aditamento ao contrato de transacção, celebrado a
28.02.96, conforme documento que consta a fls 57 e 57 verso do apenso 98, no
montante de 26.462.000$00.
Explicou que a sua razão de ser se deveu ao facto dos trabalhos se terem
prolongado por muito tempo e o dinheiro não chegar para pagar esses trabalhos, sendo
certo que “do seu bolso” nada pagou à “Resin” (só lhe pagava o que recebia da CMF).
De resto, até Dezembro de 1994 o terreno ainda era seu, de modo que era suposto que o
dinheiro que deveria receber da CMF se destinasse ao pagamento da reablitação da
lixeira e num seu terreno confinante com ela, onde também abusivamente se havia
depositado lixo.
A questão preocupava-o na medida em que tinha um terreno que confinava com
a área da lixeira e onde também se depositaram lixos, daí que também tivesse tal área de
ser reabilitada.
Nunca pediu à CMF qualquer indemnização, só pedindo à arguida Fátima
Felgueiras (à data presidente da edilidade) a conclusão da reabilitação do terreno. O

237
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

dinheiro que recebesse a propósito do aditamento era para pagar a quem o depoente
entregasse a conclusão dos trabalhos de reabilitação.
Referiu que contratou homens para limpar o seu terreno adjacente à área da
lixeira.
Na área da lixeira propriamente dita só a “Resin” ali trabalhou, segundo se
apercebeu, tendo-se procedido inclusivamente à vedação da área ocupada pela lixeira.
Em todo o caso o depoente reside em Guimarães e a casa da quinta dista cerca de
1.500/2.000 metros de distância relativamente à área da lixeira, sendo certo que não
tomava normalmente o caminho que dava acesso à dita lixeira. Viu lá máquinas – entre
as quais um caterpilar amarelo a fazer trabalhos de terraplanagem - e camiões a
trabalhar (não sabe a quem pertenciam pois não tinham qualquer sinal identificativo).
Quanto à “Translousada” referiu não ter qualquer ideia de que alguma vez
alguém lhe ter dito que operou na lixeira.
À pergunta feita no sentido de se saber se o dinheiro que lhe caberia receber por
força do contrato de transacção se destinaria apenas a reabilitar a lixeira ou também o
seu terreno confinante com aquela, respondeu não saber na medida em que a lixeira na
altura não estava vedada e na sua zona de confinância os terrenos confundiam-se.
Além disso, existem pagamentos feitos ao depoente que não se destinaram à
“Resin”, relativos a trabalhos não executados por esta empresa.
Quanto aos recebimentos confirmou o que a propósito consta dos seguintes
documentos:
- Cópia do cheque de fls 347, do apenso 97, emitido pela CMF a 30.03.94, no
montante de 5.235.080$00, a favor do depoente;
- Cópia do cheque de fls 345 do apenso 97, emitido pela CMF a 22.06.95, no
montante de 17.000.000$00, a favor do depoente (cfr. ainda o recibo de fls 339 do
apenso 97, de 23.06.95, o qual se reporta a 3 facturas e parte de outra; bem como o
recibo emitido pela “Resin” a 26.06.95 a favor do depoente, no montante de
6.000.000$00, constante de fls 231 do apenso 97);
- Cópia de talão de depósito na conta do depoente, no montante de
11.000.000$00, efectivado a 30.06.95, dos quais 6.000.000$00 destinaram-se ao
depoente (ainda referente ao preço da aquisição do terreno pela CMF) e 5.000.000$00 à
“Resin” pela reabilitação da lixeira (cfr. documentos de fls 338 e 353 do apenso 97);
- Cópia do cheque de fls 349 do apenso 97, emitido pela CMF a 25.06.98, no
valor de 4.410.480$00, a favor do depoente (cfr. o depósito respectivo referenciado no
extracto da conta do depoente, conforme documento de fls 389 do apenso 97); referiu a
testemunha não se recordar qual o destino que deu a esse dinheiro, o qual se tratou do
último pagamento efectuado pela CMF. Porém, essa quantia não vem referênciada no
que manuscreveu no documento de fls 334 do apenso 97 (onde estão indicados todos os
pagamentos efectuados), sendo certo que foi depositada na conta pessoal do depoente
(cfr. o extracto da sua conta a fls 389 do apenso 97).
Em face do que manuscreveu no documento de fls 335 do apenso 97 mostrou-se
baralhado quanto ao facto de em 1998 ter pago ou não à “Resin” a quantia de
3.410.480$00, retendo 1.000.000$00 para si. Porém, os seus apontamentos poderão não
ser contemporâneos a esse pagamento. Seja como for, entende que os seus manuscritos
são mais fidedignos (de fls 334 e 335 do apenso 97).
Consequentemente, a CMF pagou-lhe o total de 37.645.560$00, dos quais
apenas 6.000.000$00 se destinaram ao depoente.
Acha que mais nada recebeu da CMF, pelo que não foi paga a totalidade da
quantia referente ao aditamento ao contrato de transacção.

238
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A “Resin” emitia ao depoente as respectivas facturas, sendo certo que ignora se


todas elas foram pagas. Em todo o caso a “Resin” não lhe reclamou pela falta de
qualquer pagamento nem o demandou judicialmente por esse facto.
Ignora ainda se as facturas que lhe foram exibidas e que constam do apenso 97
são aquelas que a “Resin” na altura emitiu, não se lembrando mesmo se as recebeu,
assim como os respectivos recibos após os pagamentos efectuados (foi confrontado com
a factura de fls 203 do apenso 97, com os recibos de fls 336 e 337 do apenso 97; neste
último documento reconheceu a sua assinatura, reconhecendo assim ter sido recebido
por si. Seja como for, quer este documento quer o de fls 336 do apenso 97 foram por si
entregues à PJ, já que o depoente entregou os documentos de fls 333 e ss do apenso 97,
pelo que deve tê-los recebido).
Ignora também se a “Resin” considerou o depoente como um cliente de
cobrança duvidosa (cfr. doc. de fls 199 do apenso 97).
Confrontado com o documento de fls 334 do apenso 97, datado de 29.09.94
(documento contabilístico da “Resin” dirigido ao depoente no sentido de confirmar o
saldo de 26.175.400$00 a favor daquela empresa com referência a 30.06.94, devendo
devolver o duplicado respectivo devidamente assinado), confirmou que recebeu tal
documento e que manuscreveu nele uma contabilidade (tratam-se dos valores recebidos
a propósito do contrato de transacção celebrado a 25.11.93 e pagamentos efectuados à
“Resin”, onde faz a indicação das facturas emitidas pela “Resin” e dos recibos por ela
emitidos, o que pressupõe o pagamento, sendo certo que dali resulta que, a propósito do
aditamento celebrado a 28.02.96, só foi paga, em 26.06.96, a quantia de 1.824.600$00).
Não pode garantir que tenha remetido à “Resin” o duplicado (que aliás foi por si
assinado), mas acha que o deve ter feito. Por outro lado, uma vez que nesse documento
fez referência a factura e a recibos, conclui que os deve ter recebido da “Resin”.
O documento de fls 343 do apenso 97 tem a mesma natureza, está datado de
30.06.95, sendo certo que o saldo indicado nesse documento é de 9.175.400$00.
Não garante que tenha assinado e devolvido o respectivo duplicado.
O documento de fls 342 do apenso 97 tem a mesma natureza, está datado de
30.06.96 e o saldo indicado é de 24.187.400$00. Tal documento não está assinado por si
(em todo o caso foi o depoente quem o entregou à PJ).
De modo idêntico o documento de fls 341 do apenso 97 não está assinado por si
(mas foi entregue à PJ pelo depoente pelo que o deve ter recebido da “Resin”). Tal
documento, de idêntica natureza aos já referidos (documento remetido para conferência
de saldo), data de 31.08.97 e refere ainda o saldo de 24.187.400$00 (montante em
dívida relativo ao aditamento ao contrato de transacção).
Se recebeu os documentos de fls 342 e 341 do apenso 97 não lhes ligou
importância (deve tê-los recebido pois entregou-os à PJ), pois na altura os pagamentos
estavam suspensos pela CMF. Não viu nesse facto qualquer motivo de preocupação
uma vez que só estava obrigado a pagar à “Resin” na medida em que recebesse da
CMF.
Confrontado com o documento de fls 199, do apenso 97 (extracto de conta da
“Resin” relativamente ao depoente, apresentando um saldo a favor daquela no montante
de 24.187.400$00 a 27.11.98 e com um manuscrito que refere “clientes de cobrança
duvidosa”), referiu não saber a que se refere.
*
O arguido Júlio Faria referiu nesta altura que o início da deposição do lixo no
terreno da testemunha Menezes Basto ocorreu numa altura em que era presidente da
CMF o Dr. Machado Matos, em 1982, sendo certo que em 1986 (tinha o depoente
acabado de assumir a presidência da CMF) celebrou-se o primeiro contrato de locação

239
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

referido nos autos, confirmando que a única contrapartida então oferecida pela CMF foi
a pavimentação do acesso à casa da referida testemunha.
Foi no Verão de 1993 que se iniciou colaboração da “Resin”, numa altura em
que a testemunha Menezes Basto pressionava no sentido de cessar a deposição do lixo
no seu terreno.
Esclareceu que o Vereador José Campos detinha o pelouro da higiene e limpeza
(daí que não seja de estranhar que estivesse presente aquando da negociação do preço de
aquisição do terreno à testemunha Menezes Basto).
Procurou-se evitar que tal aquisição fosse sujeita à aprovação da Assembleia
Municipal pois estava-se às portas das eleições autárquicas, daí que o valor da aquisição
não pudesse exceder os 25.000.000$00, sendo certo que a operação teve de ter
igualmente o visto do Tribunal de Contas.
Quanto ao facto da testemunha referida se ter dirigido várias vezes à CMF para
saber da efectivação dos pagamentos referiu que era frequente os credores da CMF
dirigirem-se às suas instalações com o propósito de saberem quando os seus créditos
iriam ser liquidados.
*
- Testemunha José António de Sousa Ferreira
É funcionário da CMF desde 1983/1984 e há cerca de uma década que é chefe
da Divisão da DATA, respondendo directamente perante o arguido Barberi Cardoso.
Referiu que a “Resin” começou a fazer o tratamento da lixeira de Sendim, sendo
certo que quem pagava os serviços por ela prestados era o proprietário do terreno onde
estava implantada a referida lixeira (a testemunha Menezes Basto). Na altura discutia-se
se a CMF poderia ou não assumir o pagamento dos serviços prestados pela “Resin” em
terrenos que não eram seus, segundo se apercebeu em conversas informais que teve no
seio da CMF.
Segundo ouviu dizer a CMF fez um protocolo com o Eng. Menezes Basto em
que durante certo período de tempo pagou o tratamento do lixo a esta testemunha, para
que esta depois pagasse à “Resin”. Precisou que presume que era à “Resin” que o Eng.
Menezes Basto pagava na medida em que era quem no local prestava os serviços de
tratamento do lixo desde 1993, ano em que a CMF deixou de ter intervenção directa na
lixeira de Sendim.

- Testemunha Manuel Ferreira de Faria


Foi vereador durante vários mandatos, eleito pelas listas do PS e PSD nos anos
80 e 90, tendo igualmente sido deputado na Assembleia Municipal de Felgueiras nos
anos 80. Fez parte de uma comissão administrativa do FCF, ao que pensa em 1994. É
membro da direcção da CCAM desde 1999. É sócio da testemunha Menezes Basto na
firma “Cifal” desde 1987 (o arguido Júlio Faria precisou que a testemunha em causa foi
eleita como idependente pelas listas do PS no mandato de 1986/89; foi vereador eleito
pelas listas do PSD nos mandatos de 1994/97 e 1998/2001. A testemunha em causa
confirmou esta precisão).
A testemunha Menezes Basto era proprietária de uns terrenos onde se fazia o
depósito dos resíduos, já no tempo em que era presidente da autarquia o Dr. Machado
Matos. Entre a CMF e a dita testemunha existia um contrato de arrendamento desses
terrenos, os quais se iam renovando, segundo lhe disse essa testemunha, a qual só
conheceu em 1987. Quando entrou para a CMF (nos anos 80) esses contratos já
existiam. Desconhece em concreto os seus termos.
Os assuntos relacionados com a deposição dos resíduos eram discutidas quer no
executivo quer na assembleia municipal.

240
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ignora se a testemunha Menezes Basto vendeu à CMF o terreno onde se


depositava o lixo.
Ele queixava-se muito do atraso no pagamento das rendas por parte da CMF.
A “Resin” recolhia e tratava os lixos no concelho de Felgueiras, quer quando
apenas existia a lixeira quer posteriormente após a construção do aterro.
Deduz que seria a CMF a pagar-lhe esses serviços, sendo certo que era cobrada
uma taxa aos munícipes (durante muitos anos não foi cobrada qualquer taxa. Cfr. a
deliberação que aprovou a cobrança dessa taxa, constante do apenso 137, a fls 55 e ss.,
datada de 08.01.96 para entrar em vigor a 01.03.96 – o depoente confirmou ter assinado
o documento em causa).
Tem a ideia da existência de facturação à CMF. Ignora se a “Resin” emitiu
facturas à testemunha Menezes Basto.
Tem a ideia de que nas contas de gerência da CMF constava um débito de cerca
de 17.000.000$00 à testemunha Menezes Basto e que era alvo de críticas por parte da
oposição.
Confrontado com o orçamento camarário de 2001, constante de fls 66 ss. do
apenso 98, referiu tratar-se do documento que referira, onde se verifica que o aludido
débito para com a testemunha Menezes Basto rondava os 26.000.000$00. Uma vez que
essa rúbrica apareceu em mais do que um orçamento camarário, foram pedidos
esclarecimentos pela oposição. Não se recorda da testemunha Terezinha (do
Departamento de Gestão Financeira da CMF) ter sido ouvida sobre esse assunto mas
admite que o possa ter sido.
Ignora se esse montante foi entretanto pago.

- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal


É funcionária da CMF desde 1989. Entrou como jurista, chefiou o Departamento
Administrativo de 1991 até à sua reestruturação em 2000, altura em que passou a
assumir o cargo de Directora do Departamento de Administração Geral (redenominação
do Departamento Administrativo).
Na reestruturação do ano transato a área financeira da CMF saíu da alçada do
Departamento de Administração Geral. Certo é que a Divisão Administrativa e
Financeira da CMF estava integrada no Departamento Administrativo e o respectivo
quadro não estava preenchido nessa altura (cfr. a fls 28 e ss. do apenso 137 cópia do
diploma que respeita à organização dos serviços camarários e que data de 1992 e a fls
67 e ss. do mesmo apenso consta o diploma respeitante à estrutura da CMF na
reestruturação de 2000).
A depoente exercia também as funções de notária privativa da CMF.
Cabia-lhe assim elaborar os diferentes contratos e as escrituras, além de
superintender os serviços de que era responsável. Também instruia e acompanhava os
processos de contra-ordenação instaurados pela CMF.
Em 1995 foi admitida outra jurista na CMF (Drª Helena Felix), a qual passou a
ocupar-se da área das contra-ordenações, sendo certo que neste momento ela é a chefe
da área de contencioso da CMF.
Em 1989 já existia o Departamento Administrativo e o Departamento Técnico.
Era o Departamento Técnico que preparava os projectos de obras, o caderno de
encargos e o programa dos concursos abertos pela CMF com vista à execução das obras
que o executivo camarário decidia levar a cabo.
Porém, por vezes esse serviço era encomendado a terceiros estranhos à CMF.
O Engº Ferreira era o responsável pela área dos concursos (DATA).

241
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A depoente estava presente nas sessões públicas de abertura das propostas


apresentadas nos concursos, bem como ou o director do Departamento Técnico (arguido
Barbieri Cardoso) ou o chefe de Divisão (Engº Ferreira, chefe da DATA), os quais
prestavam auxílio à Comissão de Análise.
Era a CMF que deliberava a composição quer da Comissão de Abertura quer a
da Comissão de Análise.
Esclareceu que pouco tempo depois de ser admitida na CMF o presidente de
então (o arguido Júlio Faria) pediu-lhe para minutar um contrato de locação de um
terreno situado em Sendim para o depósito do lixo, terreno esse pertencente à
testemunha Menezes Basto. Foi nessa altura a primeira vez que ouviu falar dele.
Recorda-se de ter feito a minuta de outros contratos de locação com o mesmo
objecto, pois tinham um prazo de vigência e renegociava-se a respectiva renda mensal
(cfr. a fls 3, 4, 11 e 12 os contratos de locação respectivos, celebrados em 1986, 1990,
1992 e 1993, respectivamente).
Tem a ideia de ter sido em 1993 que o arguido Júlio Faria determinou à
assessoria jurídica que elaborasse um contrato de transacção entre a CMF e a dita
testemunha Menezes Basto decorrente de prejuízos sofridos por este com a deposição
do lixo no seu terreno, já referido. O contrato foi preparado quer pela depoente quer
pelo Dr. José de Barros (ilustre mandatário do arguido Barbieri Cardoso nestes autos),
pois ambos constituiam a assessoria jurídica da CMF. Tal contrato mereceu o visto por
parte do TC (o qual aliás pediu o envio dos contratos de locação e a informação dos
pagamentos efectuados pela CMF).
Ignora se a testemunha Menezes Basto reclamou ou não da CMF alguma
indemnização, pois não tinha com ele um nível de contacto que lhe permitisse sabê-lo.
Em todo o caso, quando o arguido Júlio Faria determinou à depoente que minutasse o
contrato de transacção, referiu-lhe que a testemunha Menezes Basto reclamava da CMF
o pagamento de indemnizações pelo uso do seu terreno como lixeira.
Mais foi determinado na mesma altura pelo arguido Júlio Faria que se
preparasse a celebração de um contrato-promessa de compra e venda do aludido terreno
(com uma área superior à que constava do contrato de locação), em que a CMF figurava
como promitente compradora. A CMF pretendia continuar a depositar naquele local o
lixo.
Foi pois sob a orientação do arguido Júlio Faria que se elaboraram esses
contratos (a cópia da respectiva proposta de aquisição do terreno consta de fls 78 do
apenso 98 e é datada de 01.10.93, tendo sido aprovada por deliberação de 04.10.93,
onde refere que o preço da aquisição seria de 24.754.820$00).
Não obstante no contrato-promessa referido se contemplar uma clausula que
permitia intervenções no terreno pela CMF a assessoria jurídica da edilidade considerou
que a edilidade não tinha tomado posse do imóvel, pois existia um regime específico
para estas situações, conforme aliás foi explicado ao TC, daí que a CMF, de per si, não
pudesse intervir no terreno até ao momento da sua aquisição.
Tem a ideia de que o preço da compra e venda roudou 24.000 e tal contos.
Recorda-se que inicialmente o preço da compra e venda era superior em 1.000
cts, preço esse que chegou a constar na minuta inicial do contrato-promessa. Esse valor
inicial havia sido indicado pelo arguido Júlio Faria, porém a assessoria jurídica
informou-o das consequências caso o preço ultrapassasse os 25.000 cts (a celebração do
contrato teria de se sujeitar à aprovação da Assembleia Municipal). Em face dessa
informação o arguido Júlio Faria deu nota de que tinha de renegociar o preço com a
testemunha Menezes Basto, o qual teria de baixar o preço em 1.000 cts, aumentando-se
simultaneamente em 1.000 cts o valor do contrato de transacção.

242
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O contrato de compra e venda do terreno da testemunha Menezes Basto deveria


ter sido celebrado em Abril mas porque a dita testemunha não o tinha registado em seu
nome só mais tarde (em Dezembro de 1994) é que se logrou concretizar a celebração da
respectiva escritura.
Só após o visto por parte do TC (em Janeiro de 1995) é que o contrato de
compra e venda em causa pôde produzir os seus efeitos financeiros (portanto desde
Janeiro de 1995), pelo que só desde então é que a CMF poderia proceder ao pagamento
do preço e intervir no terreno enquanto proprietária.
De resto, a CMF, como o mesmo fim, adquiriu à família Moura Borges um
terreno confinante (cfr. a fls 161 e ss. do apenso 98 o contrato de transacção celebrado a
esse respeito).
Ao que pensa em 1996, foi efectuado um aditamento ao dito contrato de
transacção, tendo sido a arguida Fátima Felgueiras (já então na qualidade de presidente
da CMF) quem lhe determinou a preparação do respectivo contrato.
Ouviu dizer que tal aditamento foi celebrado após insistência da testemunha
Menezes Basto (não conseguiu porém revelar qual identidade da pessoa que lho terá
dito).
Por força do contrato de transacção a testemunha Menezes Basto obrigou-se a
contratar uma terceira entidade para reabilitar o terreno em causa.
Como os trabalhos prolongaram-se para além de Abril (altura prevista
inicialmente para a celebração da escritura pública de compra e venda do terreno) e
tinham de ser pagos celebrou-se o já referido aditamento ao contrato de transacção.
Hoje ouve dizer que era a “Resin” que no local se encarregou da sua
reabilitação, mas na altura tal não lhe foi dado a conhecer tal facto.
Em 2005 a testemunha Menezes Basto remeteu uma carta à CMF a exigir o
pagamento da verba ainda em dívida (referente ao aditamento) sob pela de recorrer aos
tribunais.
Nas reuniões de preparação do planeamento do orçamento camarário verificava
que essa dívida aparecia sucessivamente como passivo (os contratos têm de ter um
cabimento orçamental. A verba respectiva ficava cativa enquanto não fosse pago o
débito em causa. Assim, transitou de exercício para exercício como passivo).
Ignora qual o destino final do dinheiro pago à testemunha Menezes Basto. Ele
aliás contactava mais com a testemunha Terezinha.
Foi então confrontada com a informação constante de fls 7 do apenso 98,
informação esta prestada pelo Vereador José Campos a propósito da cláusula penal e
dos contratos de arrendamento celebrados com a testemunha Menezes Basto. A esse
propósito referiu ter a ideia de que foi na sequência dessa informação que viriam a
celebrar o contrato de locação (antes tinham a designação de arrendamento).
Reafirmou que foi a depoente e o Dr. José de Barros quem preparou a proposta
de fls 78 do apenso 98, a qual foi apresentada para aprovação ao Executivo a 04.10.93.
Admite que possa ter estado na reunião onde a proposta viria a ser aprovada.
Não se recorda de em alguma reunião a que tenha assistido se discutir a questão
das indemnizações a pagar à testemunha Menezes Basto.
*
A arguida Fátima Felgueiras, a propósito da testemunha Fernanda Leal, referiu
que ela foi a primeira jurista a ser admitida na CMF e que desde a sua admissão assistia
às reuniões de Câmara, isto é, sempre teve assento no local onde o Executivo abordava
todas as questões.

243
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A questão da deposição do lixo no terreno da testemunha Menezes Basto e as


exigências deste, conforme já referido, não era menor e era também debatida em
reuniões de coordenação dos serviços.
*
- Testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues Carvalho
Em Outubro de 1990 foi admitida na CMF, onde passou a trabalhar na área da
contabilidade e na dependência directa do presidente da CMF. Cabia-lhe preparar o
orçamento, prestar contas, proceder aos pagamentos, analisar as propostas de crédito e
demais funções na área da contabilidade.
A 13.04.2000 foi nomeada chefe da Divisão Financeira, passando a testemunha
Fernanda Leal a ser a sua superiora hierárquica.
O Eng. Menezes Basto falou consigo várias vezes no âmbito dos contratos de
arrendamento/locação celebrados entre a CMF e essa testemunha a propósito dos
pagamentos.
Teve acesso ao conteúdo desses contratos na medida em que era remetida uma
cópia dos mesmos para a contabilidade a fim de que pudesse tomar conhecimento dos
pagamentos que eram devidos pela autarquia.
Não se recorda porém das datas em que tais contratos foram celebrados (talvez
1990/93).
Pelo mesmo motivo teve conhecimento da celebração entre a CMF e o Eng.
Menezes Basto de um contrato de transacção (rondava os 33.000 cts) e de um contrato
de compra e venda de um terreno da sua propriedade (que rondava os vinte e quatro mil
e tal contos, não se recordando se o preço expresso no contrato era o preço realmente
acordado entre as partes).
Uma vez que os pagamentos eram efectuados com atrasos, o Eng. Menezes
Basto dirigia-se à depoente para saber dos pagamentos no que se refere a tais contratos
(não se recorda porém se ele lhe especificava a que contratos se referia).
Do que viu no contrato de transacção referido tem a ideia de que a testemunha
Menezes Basto obrigou-se a recorrer a um terceiro para proceder à reabilitação do
terreno (uma vez que o mesmo não era à data da propriedade da CMF).
No âmbito das conversas que teve com essa testemunha por causa dos
pagamentos ele referiu-lhe que a “Resin” o pressionava no sentido do pagamento. Não
se recorda dele lhe ter referido que a CMF lhe devia o pagamento de indemnizações.
De resto, também o arguido Vítor Borges a questionava acerca dos pagamentos.
Posteriormente foi celebrado entre a CMF e o Eng. Menezes Basto um
aditamento ao contrato de transacção (no montante de vinte mil e tal contos; cfr.
documento de fls 57 do apenso 98, onde se constata que o valor foi de 26.462.000$00).
Ignora se a verba prevista para o contrato de transacção se destinava ou não à
“Resin” na medida em que sobre essa matéria não conversou com a testemunha
Menezes Basto (cfr., sobre este contrato, a informação redigida pela depoente e
constante de fls 2275 e as declarações infra exaradas acerca desde documento por banda
desta testemunha).
Assegurou que em 1998 foram pagos 21.000 cts no âmbito desse contrato de
transacção.
Em 2005 a testemunha Menezes Basto reclamou o pagamento do remanescente
(através de uma missiva dirigida à CMF pelo seu advogado), o que mereceu uma
deliberação no sentido de que esse crédito ainda não poderia ser pago porque estava a
ser objecto de análise nestes autos. Consequentemente, o remanescente da quantia em
causa ainda não foi paga.
Esse passivo transitou sucessivamente de ano para ano no orçamento camarário.

244
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por vezes era questionada acerca dessa inscrição no orçamento camarário pela
arguida Fátima Felgueiras e explicava-lhe que se tratava de um débito no âmbito do
aditamento ao contrato de transacção.
Confrontada com o orçamento camarário de 2001, cuja cópia se acha a fls 66 e
67 do apenso 98, constatou que o montante em dívida cifrava-se em 26.462.000$00,
montante que se reporta ao aditamento ao contrato de transacção já referido, admitindo
porém que não se possa reportar apenas a esse aditamento visto que no que se refere ele
tem a ideia de que a dívida rondava os 21.000.000$00 (porém esse montante coincide
com a verba constante no aditamento ao contrato de transacção).
Explicou que não tinha instruções para anular a inscrição daquela verba no
passivo, daí que tenha transitado sucessivamente de exercício para exercício.
Não tem memória de alguma situação similar em termos de atraso no pagamento
pela CMF. Não põe porém de parte essa possibilidade relativamente a outros débitos
visto que a CMF procede aos pagamentos com atraso em face das dificuldades
financeiras de que padece.
Explicou ainda que não era a depoente quem determinava a afectação das
verbas disponíveis aos pagamentos devidos pela CMF. Era a presidente da edilidade
quem assinava as ordens de pagamentos, sendo certo que a depoente informava-a das
disponibilidades de tesouraria.
Quanto à reabilitação da lixeira nada sabe, apenas se tendo deslocado a esse
local uma única vez há cerca de 2 anos.

- Testemunha Luís Vieira Lemolino Velosa


Referiu ter sido o revisor oficial de contas da “Resin” durante 3 ou 4 anos, desde
a altura em que ela se transformou em sociedade anónima (pensa que desde 1996 até
1999).
Confrontado com o documento de fls 199 do apenso 97 (extracto de conta da
“Resin” para com a testemunha Menezes Basto) e com o facto de ter sido constituída
uma provisão por se ter considerado a dívida de 24.187.400$00 de cobrança duvidosa
em finais de 1998 referiu que concerteza a administração da “Resin” teve dúvidas
quanto à cobrança desse montante. Normalmente, antes disso, o devedor é interpelado
para pagar o débito, pelo que presume que a testemunha Menezes Basto tenha sido
interpelado nesse sentido, mas não o pode afirmar pois trata-se de uma decisão da
administração.
O depoente referiu que concerteza à data quis-se inteirar da razão do reforço da
provisão em causa, sendo certo porém que não contacta os clientes. Vê antes a listagem
dos clientes e vê o saldo que existe antes do final do período e faz um pedido por escrito
ao cliente para confirmar o saldo inscrito nas contas que são apresentadas pela empresa
em relação a ele. Com isso pretende tão só verificar se o saldo apresentado pela empresa
está correcto ou não independentemente de ser de cobrança duvidosa ou não.
É a administração da empresa que toma a iniciativa de colocar certos créditos
como sendo de cobrança duvidosa, sendo certo que tal não era sequer feito por sugestão
do depoente.
Contraditoriamente, porém, referiu que dava sugestões acerca da constituição de
provisões que entendia deverem ser constituídas e a administração aceitava ou não essas
sugestões. Além disso, quando lhe pediam uma opinião dava-a. Porém, a sua
preocupação era a de rever as contas de modo a verificar se elas estavam ou não bem
feitas. O revisor oficial de contas certifica perante terceiros que as contas apresentadas
têm fiabilidade. Trata-se pois de uma função fiscalizadora. Assim, se se tivesse
apercebido que as contas porventura tinham sido forjadas não as teria aceite e nessa

245
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

hipótese das duas uma: ou eram corrigidas ou o depoente emitia reservas às contas
apresentadas.
No exercício de 1998 entendeu que a “Resin” deveria ter feito provisões
superiores (que quanto maiores menores serão os resultados do exercício).
Recorda-se aliás que por esse motivo chegou a colocar reservas às contas
apresentadas pela “Resin”, como sucedeu relativamente às contas referentes ao
exercício de 1997, sugerindo o aumento da provisão constituída para créditos de
cobrança duvidosa.
Relativamente à provisão a que se reporta o documento de fls 199 do apenso 97,
referiu que foi constituída em 1998, o que significa que no ano seguinte a “Resin”
acatou a sugestão efectuada pelo depoente (situação que aliás era normal).
A provisão para cobrança duvidosa deve ser constituída obedecendo a vários
critérios, desde logo critérios económicos que resultam de uma análise da situação do
cliente, mas no caso dos autos o Código do IRC impunha limitações à consideração
desse tipo de critérios (para efeitos fiscais). Foi pois um critério de natureza fiscal que o
motivou a levantar reservas (em função da idade dos saldos, quanto mais antigos maior
a percentagem da provisão a constituir, nos termos do artº 35º do CIRC: em créditos
com mais de 24 meses deve ser constituída uma provisão de 100%; há mais de 18
meses, 75%; há mais de 12 meses, 50%; há mais de 6 meses, 25%).
Confrontado com os documentos de fls 343 (de 04.09.95, onde se refere um
saldo de 9.175.400$00) e 344 do apenso 97 (de 14.10., apresentando um saldo de
26.175.400$00) referiu tratar-se dos mencionados pedidos de confirmação de saldo,
neste caso à testemunha Menezes Basto. Foi por iniciativa do depoente que essas
missivas foram-lhe enviadas, as quais aliás mereceram resposta dessa testemunha
(nesses documentos ele apôs a sua assinatura e apôs o que bem entendeu).
Esse tipo de documentos (que não são interpelações para pagar) são também
remetidas a fornecedores, a bancos e de um modo geral a todos os terceiros que mantém
com a empresa relações comerciais e que o revisor oficial de contas selecciona.
Recorda-se aliás que chegou a remeter documentos de idêntica natureza a um escritório
de advogados de modo a confirmar o saldo e para saber dos processos pendentes.
Confrontado com os documentos de fls 341 (de 6.11.97, apresentando um saldo
de 24.187.400$00, que coincide com a verba colocada como sendo de cobrança
duvidosa) e 342 do apenso 97 (datada de 26.08.96, onde o saldo apresentado é
exactamente o mesmo: 24.187.400$00) referiu tratar-se de documentos semelhantes,
mas a testemunha Menezes Basto não confirmou o saldo em causa na medida em que
não respondeu.
Explicou que certos clientes não dão qualquer resposta a esse tipo de missivas,
os quais aliás muitas vezes nem sabem para que servem, devolvendo-as sem confirmar
ou não o saldo apresentado. Não parece ser esse o caso dos autos na medida em que o
cliente em causa respondeu às missivas de fls 343 e 344 do apenso 97, tendo colocado
anotações nesses documentos. Não sabe porém por que motivo as missivas de fls 341 e
342 do apenso 97 não contêm qualquer resposta por parte da testemunha Menezes de
Basto.

- Testemunha Paulo José Bento Ribeiro


Referiu ter sido Director Técnico da “Resin” desde Janeiro de 1995 até Março
de 1999.
Explicou que trabalhava numa empresa francesa que pertencia ao grupo
“Lyonesse”, principal accionista da “Resin”, quando foi convidado para trabalhar nesta
pelo arguido Vítor Borges.

246
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A actividade da “Resin” consistia na recolha e limpeza urbana de resíduos.


Foi admitido ao serviço da “Resin” para desenvolver estudos e projectos de
irradicação de lixeiras e construção de aterros sanitários. Dava apoio técnico nas obras
em curso e fazia os orçamentos com que a “Resin” se apresentava aos concursos
públicos.
À data em que entrou para a “Resin” a gestão financeira desta era efectuada por
um francês, proveniente da “Sita”.
A “Resin”, no desenvolvimento da sua actividade, estabeleceu consórcios com a
“Hidroprojectos”, com a “Aciconstrói” para a zona a Sul de Leiria e com a “ECOP” –
quando esta entrou no capital social da “Resin” – para a zona a Norte de Leiria.
A “ECOP” entrou no capital social da “Resin” quando o depoente já ali
trabalhava, tendo sido nessa altura nomeado um director financeiro para a “Resin”
proveniente da “Ecop”.
Tal facto não constituiu uma surpresa para si na medida em que o arguido Vítor
Borges discutiu esse assunto consigo, tendo verificado que a maioria das empresas do
mesmo ramo de actividade associavam-se a empresas de construção civil e obras
públicas. Assim, de modo a expandir os seus negócios, teria a “Resin” que associar-se a
uma empresa de construção civil com alguma dimensão, tendo assim procurado
empresas que estivessem interessadas.
Entretanto o arguido Vítor Borges transmitiu-lhe que a “Ecop” se mostrava
interessada, adquirindo, salvo erro, 25 ou 30% do capital social da “Resin” (que era a
participação que o accionista francês estava disposto a alienar).
Explicou que antes da construção do aterro RIB de Felgueiras e mesmo antes de
ser admitido na “Resin” esta já recolhia o lixo e fazia a manutenão das lixeiras do Vale
do Sousa (Sendim, Lustosa e Paços de Ferreira).
Em 1995 a Secretaria de Estado do Ambiente lançou os projectos de irradicação
das lixeiras e construção de aterros sanitários (encerraram-se nos anos seguintes mais de
300 lixeiras e construíram-se mais de 20 aterros).
A “Resin” propôs-se a encerrar lixeiras e a construir aterros sanitários (um dos
seus accionistas – a “France Dechéts” – construía aterros e a “Sita” recolhia resíduos
urbanos). Em face disso o depoente fez um estágio em França.
O depoente participou na construção de 60 aterros, quer como funcionário da
“Resin” quer como consultor de outras empresas.
À data haviam outras empresas com “know how” na área, mas estava-se nos
primórdios do encerramento das lixeiras e na construção de aterros sanitários. Até
1994/1995 a principal área de negócio do tipo de empresas como a “Resin” reportava-se
à recolha e transporte de resíduos.
Em Felgueiras a lixeira de Sendim era uma lixeira com controle e com uma
actividade de manutenção (rudimentarmente eram acamados os lixos e tapados com
terra).
Inicialmente tal lixeira recebia todo o tipo de resíduos urbanos e da indústria do
calçado, sendo certo que o depoente deslocava-se ao local quase diariamente.
Com a construção do Aterro da Lustosa (o primeiro do país) encerraram-se as
lixeiras e a lixeira de Sendim apenas passou a receber os resíduos industriais banais.
Posteriormente foi construído o aterro RIB de Felgueiras, o primeiro do país
com as características necessárias para receber esse tipo de resíduos.
Só ouviu falar da testemunha Menezes Basto numa altura em que se procurava
escolher um local para a construção do aterro RIB.
Ele tinha um terreno que confrontava com a lixeira de Sendim e que seria um
dos locais possíveis para a construção do dito aterro. Uma parte desse terreno (a

247
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

montante) poderá ter sido escolhido para a construção do aterro (juntamente com o
terreno de outro proprietário), terrenos esses que teriam de ser adquiridos pela CMF.
Ignora a quem pertencia o terreno onde se situava a lixeira de Sendim, admitindo
que seria da CMF na medida em que ali eram depositados os lixos do concelho.
Ignora se existia alguma conta-corrente entre a “Resin” e a testemunha Menezes
Basto.
Confrontado com os quadros de fls 22 e 23 do apenso 12, referiu não os
conhecer.
No que toca à dívida da CMF para com a “Resin”, sabe que chegou à centena de
milhar de contos.
O arguido Vítor Borges referiu-lhe a certa altura que os accionistas da “Resin”
também fizeram sentir a necessidade da “Resin” receber os valores em atraso da CMF,
pois a manutenção dessa situação traduziam-se em resultados negativos, existindo um
entendimento entre a administração e os accionistas de que parar os trabalhos não seria
sensato em termos comerciais pois os valores em causa não eram significativos e viam o
trabalho desenvolvido em Felgueiras como um investimento que poderia potenciar a
expansão dos negócios com os fundos comunitários que tinham sido aprovados. Não
seria pois sensato cortar relações com potenciais clientes.
Consequentemente, não se equacionava a paragem dos trabalhos e procuravam-
se encontrar soluções com a CMF e mais tarde com a AMVS no sentido de se obter o
pagamento do montante em dívida.
O arguido Vítor Borges transmitia-lhe que iria encontrar a solução junto da
CMF quanto à questão dos pagamentos, sendo certo que assistiu a uma reunião na CMF
entre os arguidos Vítor Borges e Fátima Felgueiras em que foi manifestada a
preocupação pela falta de pagamento, tendo aliás o depoente dito à arguida Fátima que
era seu entendimento que a “Resin” deveria parar os trabalhos em face da falta de
pagamento dos trabalhos efectuados, tendo então o arguido Vítor Borges assentido em
aguardar durante mais algum tempo para que entretanto se encontrassem as soluções
necessárias para que a situação fosse desbloqueada.
Transmitiu também essa preocupação ao arguido Barbieri Cardoso.
Com a admissão do arguido Gabriel Almeida na “Resin” (para exercer as
funções de Director Geral) este passou a conduzir as negociações, juntamente com o
arguido Vítor Borges, afastando-se o depoente desse assunto, daí que não tenha grande
conhecimento das soluções que entretanto foram adoptadas no sentido de ultrapassar os
constrangimentos de natureza legal que impediam a CMF de proceder ao pagamento da
quantia em dívida para com a “Resin”.
Quando o depoente saiu da “Resin” era o arguido Carlos Marinho quem assumia
as funções de contabilista da empresa e, como tal, estando dependente hierarquicamente
do Director Financeiro, não tinha poderes de direcção.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Referiu que entre si e a testemunha Carlos Alves (inspector da PJ) foi dividida a
investigação, sendo certo que a investigação de tudo o que se relacionava com os lixos
ficou a cargo deste.
O terreno onde estava implantada a lixeira de Sendim pertencia à testemunha
Menezes Basto.
Não se recorda quando é que a CMF ali começou a depositar o lixo.
Foi então confrontado com o documento de fls 3 do apenso 98 (contrato de
arrendamento celebrado a 01.07.85 entre a CMF e a testemunha Menezes Basto, para se
iniciar a 01.03.86).

248
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi ainda confrontado com os contratos de locação celebrados entre as mesmas


partes, cujas cópias constam de fls 4, 11 e 12 do apenso 98.
No que se refere ao documento de fls 63 do apenso 98, referiu tratar-se da
proposta subscrita pela arguida Fátima Felgueiras, datada de 01.10.93, no sentido de se
pagar à testemunha Menezes Basto uma indemnização por força de incumprimento dos
contratos de locação por banda da CMF, na sequência da qual foi celebrado o contrato
de transacção cuja cópia consta de fls 76 e 77 do apenso 98 (a 25.11.93), encontrando-se
cópia das respectivas ordens de pagamento a fls 22, 26, 33, 40, 45 e 50 do apenso 98.
Também a arguida Fátima Felgueiras propôs a aquisição do terreno onde estava
implantada a lixeira, conforme documento de fls 78 e 79 do apenso 98 (proposta
apresentada a 01.10.93), na sequência da qual foi celebrado entre a testemunha Menezes
Basto e a CMF o contrato-promessa cuja cópia consta de fls 80 a 82 do apenso 98,
celebrado a 22.11.93.
Esclareceu que estes documentos foram recolhidos na CMF.
Não encontraram na CMF qualquer documento alusivo à negociação de tais
contratos, designadamente correspondência com a testemunha Menezes Basto (quer no
que se refere ao contrato de transacção quer no que se refere ao contrato-promessa de
compra e venda, designadamente no que respeita ao montante da indemnização e no que
respeita ao preço da compra do terreno). A esse propósito, para além dos aludidos
contratos, na CMF a PJ apenas encontrou as propostas subscritas pela arguida Fátima
Felgueiras.
A diferença do preço declarado na escritura de compra e venda (escritura
celebrada a 27.12.94, conforme documento de fls 83 a 85 do apenso 98) e o preço
realmente acordado entre as partes para a aquisição do terreno (de 1.000.000$00) vem
mencionada no documento de fls 142 do apenso 97, apreendido na “Resin” (alusivo ao
historial do aterro de Felgueiras).
Procurou-se não ultrapassar os 25.000 cts, caso contrário seriam necessários
outros procedimentos de índole administrativa para que o contrato de compra e venda
pudesse ser celebrado.
Ainda a propósito do contrato de transacção sabe que o terceiro escolhido para
proceder à reabilitação do terreno foi a “Resin”, o que se deduz em face do facto dos
pagamentos efectuados pela CMF à testemunha Menezes irem parar à “Resin” (com
excepção do montante relativo ao pagamento do preço da venda do terreno à CMF),
além de que foi a “Resin” quem pagou o custo do visto do Tribunal de Contas,
conforme emerge do documento de fls 226 do apenso 97, no valor de 32.401$00
(documento de caixa da “Resin”), sendo certo que quem deveria ter procedido ao
pagamento seria ou a CMF ou a testemunha Menezes Basto.
A “Resin” não dispunha de alvará para levar a cabo certo tipo de obras. Uma das
formas encontradas para contornar esse problema era o de responsabilizar a testemunha
Menezes Basto pela reabilitação do terreno, conforme emerge do contrato de transacção
aludido (dessa forma seria ele e não a CMF a contratar os serviços do terceiro escolhido
para proceder à respectiva reabilitação, caso contrário o dito contrato por certo não
mereceria o visto do TC, conforme sucedeu numa outra situação aludida na pronúncia).
Nas buscas efectuadas pela PJ não encontraram qualquer escrito entre a
testemunha Menezes Basto e a “Resin”.
Ignora se o terreno em causa não estava registado em nome da testemunha
Menezes Basto e se foi por esse facto que a celebração da escritura se atrasou face ao
que estava estabelecido no respectivo contrato-promessa de compra e venda.
A arguida Fátima subscreveu ainda uma proposta de aditamento ao contrato de
transacção, conforme emerge do documento de fls 55 e 56 do apenso 98, no valor de

249
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

26.462.000$00, o qual efectivamente veio a ser celebrado entre a CMF e a dita


testemunha, conforme documento de fls 57 do apenso 98, a 28.02.96.
No orçamento da CMF para 2001 (cfr. documento de fls 66 e 67 do apenso 98)
aparece uma rubrica que refere renda de terrenos, no montante de 26.462 cts, verba
coincidente com o valor do aditamento ao contrato de transacção (o que significa que
pelo menos até 2001 esse montante não havia sido pago pela CMF).
A PJ só foi à lixeira para ver aonde ficava e não se recorda quem lá operava.
Foi a testemunha confrontada com o documento de fls 344 do apenso 97
(conferência de saldos da “Resin” para com a testemunha Menezes Basto, reportada a
30.06.94, apresentando um saldo de 26.195.400$00, documento enviado pelo ROC da
“Resin”, a testemunha Velosa). O saldo respectivo foi confirmado pela testemunha
Menezes Basto.
Referiu que esse documento é uma fotocópia, ignorando onde se encontra o
original (deverá estar na posse da testemunha Menezes Basto), sendo certo que só lhe
foi entregue uma cópia pelo ROC da “Resin” aquando da sua inquirição na fase de
inquérito destes autos.
Foi ainda confrontado com os documentos da mesma natureza (que são
originais), constante de fls 341 e 342 do apenso 97 (onde aparece em ambos o mesmo
saldo de 24.187.400$00, ainda em dívida, o que coincide com o documento de fls 199
do apenso 97), onde não consta qualquer confirmação do respectivo saldo pela
testemunha Menezes Basto, ao contrário do que havia feito no que se refere ao
documento de fls 344 do apenso 97, que também lhe foi remetido pelo ROC. Desses
documentos não emerge que tenham sido enviados à testemunha Menezes (porém, em
face do teor da cota de fls 2089 e do apenso 97, que foi aberto com os documentos
apreendidos à “Translousada” - cfr. auto de apreensão de fls 2009 e cota de abertura do
apenso 97, constante de fls 2010 -, terá sido a testemunha Menezes quem forneceu esses
documentos, pelo que os deverá ter recebido, mas aos quais não deu qualquer resposta
ao ROC da “Resin”. Referiu porém a testemunha Henrique Correia que esses
documentos foram recolhidos na “Resin”, declaração que mais tarde corrigiu).
O documento de fls 342 do apenso 97 tem uma anotação manuscrita (“RES
96/21/54) que não sabe se se trata de um registo de correio.
Referiu a testemunha que não esteve presente na busca efectuada à “Resin”.
Foi confrontado com as facturas emitidas pela “Resin” à testemunha Menezes
Basto, alusivas a trabalhos de exploração no aterro de Felgueiras, constantes de fls 203 a
209, 211 e 220 a 223, do apenso 97, facturas essas emitidas até 31.01.95 e que prefazem
o valor global de 57.422.480$00.
A factura de fls 218 do apenso 97 (de 31.12.93) é referenciada no documento de
fls 334 do mesmo apenso.
Nesse documento também é referenciada, além do mais, a factura de fls 220 do
apenso 97.
Segundo anotação aposta pela testemunha Menezes existia um saldo de
24.187.400$00.
A fls 347 do apenso 97 consta uma cópia de um cheque da CMF emitido a favor
da testemunha Menezes Basto, no valor de 5.235.080$00 e datado de 30.03.94, sendo
certo que esse cheque foi endossado à “Resin”, a qual por sua vez emitiu ao dito
Menezes Basto um recibo no mesmo valor a 30.03.94 (nas observações constantes desse
recibo faz-se alusão ao dito endosso) – cfr. fls 225 do apenso 97.
A fls 345 do apenso 97 consta cópia de um cheque de 17.000 cts emitido pela
CMF à testemunha Menezes Basto, o qual foi por este endossado à “Resin”, a qual por
sua vez emitiu àquele o respectivo recibo, no mesmo valor (cfr. documento de fls 230,

250
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

do apenso 97, onde se alude ao cheque que serviu de meio de pagamento, que é o
mesmo que foi emitido pela CMF).
A fls 213 do apenso 97 consta uma cópia de um recibo emitido pela “Resin” a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 6.000 cts.
A fls 232 do apenso 97 consta uma cópia de um recibo emitido pela “Resin” a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 5.000 cts.
A fls 349 do apenso 97 consta uma cópia de um recibo emitido pela “Resin” a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 4.410.480$00.
A fls 388 e 399 do apenso 97 consta um extracto de conta da “Resin” para com a
testemunha Menezes Basto (apreendido na “Resin”).
Em face desse extracto, houve um montante por liquidar à testemunha Menezes
Basto pela “Resin”.(24.187.400$00 – cfr. ainda o documento de fls 199 do apenso 97 e
334 do mesmo apenso).
Em face disso, contabilisticamente a “Resin”fez um reforço da conta de clientes
de cobrança duvidosa no montante de 24.187.400$00, conforme está manuscrito nesse
extracto de conta.
A PJ não encontrou qualquer elemento que lhe permitisse concluir que houve
uma tentativa de cobrança coerciva desse montante.
Sem essa tentativa não compreende por que motivo foi aquele crédito
considerado de cobrança duvidosa.
Confrontado com as facturas juntas na audiência de julgamento pelo arguido
Carlos Marinho, constantes de fls 12.322 e ss. dos autos, emitidas pela “Resin” à CMF,
verificou-se que são iguais às que foram emitidas à testemunha Menezes Basto.
A fls 132 do apenso 97 consta um fax de 03.06.96 enviado pela “Resin” à
“Translousada” (ao cuidado da testemunha Carlos Sousa), onde se dá conta que quanto
aos valores em dívida referente aos anos de 1995 e 1996 inexiste suporte legal para que
a CMF pudesse pagar as verbas em causa, tendo solicitado a respectiva resolução à
CMF.
Admite que nessa altura as empresas não tinham muito “know how” na área de
actividade da “Resin”.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Recolheram na CMF documentos relativos à lixeira de Sendim.
O proprietário dos terrenos era a testemunha Menezes Basto.
Ao que pensa, desde 1986 existiu um contrato de arrendamento e depois de
locação, o qual se foi renovando até cerca de 1993.
Nesse período de tempo existiu um período em que inexistia qualquer contrato
que permitisse à CMF utilizar tal terreno para a deposição do lixo, o que deu origem ao
pagamento de uma indemnização de 6.500 cts à dita testemunha pela CMF.
Foi então confrontado com o contrato de arrendamento, cuja cópia consta de fls
3 do apenso 98, e com os contratos de locação cujas cópias constam de fls 4 (datado de
20.11.90), 11 (que vigorou de 01.02.92 até 31.07.92) e 12 (que vigorou de Fevereiro de
93 até Agosto do mesmo ano), todos do apenso 98.
Assim, entre Agosto de 1992 e Janeiro de 1993 inexistiu qualquer contrato.
Segundo a justificação apresentada, foi por esse motivo que foi paga à testemunha
Menezes Basto a dita indemnização de 6.500.000$00 (cfr. a proposta de celebração do
contrato de transacção, apresentada pela arguida Fátima Felgueiras a 01.10.93,
conforme documento de fls 63 do apenso 98).

251
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não recolheram na CMF qualquer documento que demonstrasse que a


testemunha Menezes Basto exigisse o pagamento de qualquer indemnização, nem
recolheram qualquer documento alusivo a eventuais prejuízos por ele sofridos.
A CMF decidiu ainda comprar o terreno onde estava instalada a lixeira (mais do
que os 3.000 m2 iniciais), tendo sido a respectiva proposta apresentada pela arguida
Fátima Felgueiras a 01.10.93 (cfr. documento de fls 78 e 79 do apenso 98).
À data a arguida Fátima era vereadora e tinha alguns pelouros, entre os quais os
pelouros do desporto e cultura, não tendo a certeza se ela tinha o pelouro do ambiente (o
arguido Júlio Faria era então o presidente da autarquia).
O contrato-promessa de compra e venda do aludido terreno foi celebrado a
22.11.93, onde se refere um preço de 24.754.820$00 (cfr. documento de fls 80 a 82 do
apenso 98). Se o preço ultrapassasse os 25.000.000$00, a aquisição teria de ser
aprovada pela Assembleia Municipal.
Do documento de fls 142 do apenso 97 (historial do aterro de Felgueiras),
apreendido na “Resin”, mais concretamente do documento nº 1, alusivo ao contrato de
compra e venda do terreno, emerge que o preço acordado foi de 25.754.820$00, sendo
certo que do documento nº 2 ali aludido refere-se uma parcela de 1.000 cts pertença da
testemunha Menezes Basto (cfr. ainda o documento de fls 344 do apenso 344, referente
a conferência de saldos, designadamente as contas efectuadas nesse documento pela
testemunha Menezes Basto)
O contrato de transacção referido foi celebrado a 25.11.93, no montante global
de 32.410.480$00.
Parece-lhe estranho que tenha sido a testemunha Menezes Basto quem, por força
do dito contrato de transacção, se tenha obrigado a reabilitar o terreno, quando é certo
que três dias antes tinha celebrado um contrato-promessa de compra e venda do terreno
em que, conforme emerge dos seus termos, transmitiu para a CMF a respectiva posse
por mero efeito desse contrato.
As prestações devidas por força destes contratos foram pagos à testemunha
Menezes Basto.
Alguns dos cheques emitidos pela CMF à dita testemunha foram por este
endossados à “Resin”, a qual lhe emitia facturas em valores idênticos.
A “Resin” tinha uma conta-corrente com a testemunha Menezes Basto, mas não
existia qualquer contrato escrito entre eles, o que não lhe parece normal.
Para além disso, a “Resin” não tinha qualquer contrato com a CMF que tivesse
qualquer relação com a lixeira.
A “Resin” não dispunha de alvará para executar as obras de reabilitação da
lixeira.
A CMF, por sua vez, não poderia contratar com uma empresa que não
dispusesse do alvará necessário para proceder à execução das obras de reabilitação
necessárias na lixeira de Sendim, até porque dessa forma não lograria obter o necessário
visto do Tribunal de Contas.
Naturalmente que o problema estaria ultrapassado se fosse a testemunha
Menezes Basto a contratar os serviços da “Resin”.
A fls 347 do apenso 97 consta uma cópia de um cheque emitido pela CMF a
favor da testemunha Menezes Basto, no valor de 5.235.080$00, datado de 30.03.94.
A fls 225 do apenso 97 consta um recibo da “Resin” para a testemunha Menezes
Basto, datado de 30.03.94, no mesmo valor de 5.235.080$00 (nesse documento, nas
observações, refere o número do cheque que serviu de meio de pagamento e que
coincide com o número do cheque de fls 347 do apenso 97, emitido pela CMF).

252
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 213 do apenso 97 consta um recibo emitido pela “Resin” à testemunha


Menezes Basto no valor de 6.000.000$00, datado de 26.06.96.
Do documento de fls 353 do apenso 97, penúltima linha, extrai-se que na conta
dessa testemunha foi efectuado um depósito de 11.000.000$00 (cfr. ainda o respectivo
talão de depósito nesse montante, tendo-se tratado do depósito de um cheque, sendo
certo que nesse documento tem manuscrito os dizeres “5.000 cts - Resin”; 6.000 cts –
mim”).
A fls 232 do apenso 97 consta um recibo da “Resin”, emitido a favor da
testemunha Menezes Basto, no valor de 5.000 cts.
A fls 349 do apenso 97 consta um cheque da CMF para a testemunha Menezes
Basto, no valor de 4.410.480$00, o qual foi depositado na conta dessa testemunha (cfr.
documento de fls 389 do apenso 97, 2ª parcela).
Entretanto a arguida Fátima Felgueiras, a 08.02.96, apresentou uma proposta de
aditamento ao contrato de transacção referido, no montante de 26.462.000$00 (cfr.
documento de fls 55 do apenso 98), tendo esse aditamento sido celebrado a 28.02.96.
Nessa altura a arguida Fátima era já presidente da CMF (o arguido Júlio já tinha
ido para a Assembleia da República exercer as funções de deputado).
Nunca encontraram na CMF qualquer documento da testemunha Menezes Basto
reclamando qualquer indemnização.
Também não encontraram na CMF qualquer documento alusivo à negociação
entre esta e a referida testemunha no que se refere ao pagamento de uma indemnização.
A celebração da escritura do contrato de compra e venda estava prevista para
Abril, segundo o contrato-promessa mas só se realizou a 27.12.97.
Ignora se a totalidade do terreno estaria em nome do vendedor.
Porém, se o atraso na celebração da escritura fosse imputável ao promitente
vendedor, naturalmente que inexistiria qualquer justificação para que a CMF lhe tivesse
de pagar qualquer indemnização por esse atraso (um dos motivos apresentados para a
celebração do aditamento ao contrato de transacção foi precisamente o atraso na
celebração da escritura pública de compra e venda desse imóvel e o custo dos trabalhos
que a testemunha Menezes alegadamente suportou nesse período de tempo – cfr. doc. de
fls 55 do apenso 98).
Só durante o inquérito é que a CMF contabilizou um pagamento, segundo se
apurou numa perícia.
Pensa que se tratou de uma duplicação de um pagamento no âmbito do contrato
de transacção, não contabilizado, no montante de cinco mil e tal contos (não se
reportava pois ao aditamento).
O orçamento da CMF reflectia um valor em dívida correspondente ao valor do
aditamento (cfr. por ex. o orçamento da CMF para 2001 – fls 66 e 67 do apenso 98).
Não encontraram na CMF qualquer documento donde se extraia que a
testemunha Menezes Basto tenha reclamado esse valor, o que não é normal.
Porém, tal compreende-se na medida em que o dinheiro não lhe era destinado,
mas à “Resin”, pois ele já tinha recebido tudo a que teria direito.
A “Resin” não recebeu qualquer verba da CMF referente ao aditamento.
Os documentos apreendidos a esse propósito na CMF referem que esse montante
era devido pela testemunha Menezes Basto.
Recorda-se que o ROC da “Resin” (testemunha Velosa) remeteu à testemunha
Menezes Basto um ou dois ofícios para confirmação de saldos.
Assim, por exemplo, consta de fls 344 do apenso 97 um desses documentos,
datado de 29.09.94, reportado a um saldo em 30.06.94, que a testemunha Menezes
confirmou (no qual estão indicados os pagamentos efectuados pela CMF)

253
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O valor da transacção foi de 32.410.480$00, dos quais 1.000.000$00 diziam


respeito a parte do preço do contrato de compra e venda do terreno.
Os documentos de fls 341 (é o original e data de 26.08.96) e 342 do apenso 97 (
de 06.11.97) são de idêntica natureza e não terão sido devolvidos pela testemunha
Menezes Basto ao ROC.
Não se recorda se esses documentos foram entregues pela testemunha referida
(recorda-se que ele entregou documentos) ou se foram apreendidos na “Resin” (cfr. cota
de fls 2010, referente à abertura do apenso 97 com os documentos apreendidos à
“Translousada”, documentos esses referenciados no auto de apreensão de fls 2009,
tendo sido entretanto juntos a esse apenso outros documentos, como por exemplo os que
foram apreendidos à “Resin” e estão referenciados no auto de apreensão de fls 2017 a
2019 e cota de fls 2020; os documentos apreendidos à “Norlabor” e referidos no auto de
apreensão de fls 2024 e na cota de fls 2025; outros documentos apreendidos à
“Translousada”, conforme auto de apreensão de fls 2027 e cota de fls 2028; outros
documentos apreendidos à “Norlabor”, referenciados no auto de apreensão de fls 2038 e
na cota de fls 2039; outros documentos apreendidos à “Resin” e identificados no auto de
apreensão de fls 2079 e 2080 e referenciados na cota de fls 2081. Por outro lado, do
auto de inquirição de fls 2086 e da cota de fls 2089 resulta que os documentos em causa
– de confirmação de saldos - terão sido entregues pela testemunha Menezes Basto,
tendo sido juntos ao apenso 97 pela testemunha Carlos Alves – conforme acabou por
confirmar quando confrontado com esses elementos -, após o separador com o nome da
dita testemunha Menezes Basto).
Não encontraram qualquer documento da “Resin” donde resulte que tenha
reclamado junto da testemunha Menezes Basto o pagamento da quantia em dívida.
No que se refere à CMF não se recorda, sendo certo que a “Resin” a não
demandou.
Era frequente o pagamento com atrasos consideráveis pelas autarquias e as
empresas têm relutância em demandá-las por temerem que não lhes sejam adjudicadas
mais obras.
A quantia em dívida foi considerada de cobrança duvidosa pela “Resin”,
conforme emerge do extracto de conta-corrente com a testemunha Menezes Basto,
constante de fls 199 do apenso 97 (onde se indica que foi constituída uma provisão na
conta de clientes de cobrança duvidosa)
O devedor de facto da “Resin” era a CMF, mas não tinha qualquer suporte legal
para lhe exigir o respectivo pagamento.
Por sua vez, a testemunha Menezes Basto não tinha qualquer interesse em exigir
o pagamento da quantia em falta na medida em que não lhe era destinada e o terreno já
não era dele.
A “Resin” emtiu facturas e recibos de verbas que recebeu da testemunha
Menezes. Emitiu também facturas a essa testemunha e que não obteram pagamento.
A fls 335 do apenso 97 consta um documento com mais contas elaboradas pela
testemunha Menezes Basto.
Ele tinha mais terrenos nas imediações da lixeira de Sendim e que estariam
desvalorizados em face da existência da mencionada lixeira.
Em face das facturas e recibos emitidos pela “Resin” deduz que ela tenha
prestado serviços na lixeira, mas não pode afirmar quais e quando.
Acha difícil que a CMF tivesse meios para tratar do lixo (para o recolher e
depositar sim, mas para o tratar não).

254
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Recorda-se de ler notícias em jornais dando conta de que populares reclamavam


da existência da lixeira naquele local por força de incêndios e escorrimentos de líquidos,
mas não sabe a que tempo se reportam esses protestos.
Numa primeira busca levada a cabo às instalações da “Resin” viu um mapa que
espelhava a área de intervenção dessa empresa.
À data a “Resin” centrava a sua actividade numa área do país e existia outra
empresa que prestava serviços idênticos mas que centrava a sua acção noutra área do
país.
O arguido Barbieri facultou fotografias que retratavam a situação da lixeira antes
de intervencionada.
O aditamento ao contrato de transacção não foi pago, não tendo a “Resin”
demandado quem quer que seja por esse facto.

- Testemunha António Fernando da Silva Ramos


A testemunha Menezes Basto, a certa altura, apresentou-se ao depoente (quando
trabalhava na lixeira de Sendim ao serviço da “Resin”) e andou com ele no sentido dele
lhe indicar a localização de uma mina de água.
Tem a ideia que ele era o proprietário do terreno onde estava implantada a
lixeira, segundo deduz.
Ele não lhe demonstrou qualquer animosidade. Aliás, ele disse-lhe que ainda
bem que tinham ido para ali resolver o problema da lixeira, referindo-lhe inclusive que
em meio ano até os eucaliptos que por ali existiam ficaram mais bonitos.

- Testemunha José da Silva Campos


Foi vereador a tempo não permanente na CMF entre 1983 e 1985 e a tempo
permanente entre 1986 e 25.10.93, voltando a ser verador a tempo não permanente entre
1994 e 1997. Só em Junho de 1996 voltou a execer as funções de vereador a tempo não
permanente.
Nos primeiros 11 anos concorreu integrado nas listas do PS como independente.
Nos quatro anos seguintes concorreu integrado nas listas do PSD como independente e
no último mandato voltou a concorrer integrado nas listas do PS como independente.
O depoente teve a seu cargo muitos pelouros (higiene e limpeza, cemitérios,
mercados e feiras, etc).
Foi o vereador que foi confrontado com mais situações relacionadas com a
lixeira de Sendim.
O vereador Mendes Ribeiro, já falecido e eleito pelas listas do PSD, partilhou
consigo esse dossier.
O depoente exerceu funções nessa área, enquanto vereador, de 1986 até 1993.
A arguida Fátima Felgueiras só tinha intervenção nessa área em substituição do
arguido Júlio Faria, nas suas faltas e impedimentos, no tempo em que ela era vereadora
e este o presidente da autarquia. Nessa altura ela era a vice-presidente da autarquia.
Já no tempo em que era presidente da autarquia o Dr. Machado Matos (em 1983
era o presidente da CMF) existiu uma revolta popular em Pombeiro devido à “Lixeira
do Sapato”.
Uma das cláusulas penais insertas num contrato de locação celebrado com o
dono do terreno foi o depoente quem fez questão de a incluir (depois de ter conversado
com o dono do terreno e com o seu advogado, Dr. Paiva Martins).
Nessa altura viviam um problema muito premente com lixeiras clandestinas
dispersas pelo concelho em face do “boom” da indústria do calçado (deu como exemplo
a existência de uma lixeira em Revinhade).

255
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Procuraram vários locais para a instalação da lixeira (em Barrosas, na zona da


Lixa – em Seixedo - e por trás do monte de Stª Quitéria).
Chegou a ser ameaçado de pistola por um proprietário onde se perspectivava a
instalação da lixeira.
Em Barrosas chegaram a vedar o terreno e a drenar as águas, mas devido à
contestação popular tal projecto não foi avante.
Continuou-se assim a depositar o lixo em Sendim.
Essa lixeira não era clandestina.
Ultrapassou-se a área inicialmente acordada por via de contrato com o dono do
terreno.
O contrato inicial tinha sido celebrado no mandato anterior.
Não é verdade que o dono do terreno (testemunha Menezes Basto) nunca tenha
reclamado, pois muitas vezes foi o seu intorlocultor no que a essas reclamações
concerne e que se prendiam com a situação da lixeira (por ex., a autocombustão dos
resíduos, o que provocava incêndios, e o facto de se ter ultrapassado a área inicialmente
acordada).
Ele disse-lhe várias vezes que não queria uma lixeira nos seus terrenos e
pressionou-o nesse sentido.
Referiu-lhe ainda que pretendia ser ressarcido pelos prejuízos decorrentes das
más condições de funcionamento da lixeira e pela excessiva utilização do seu terreno
para esse fim (transmitiu-lhe essa pretensão na altura em que os contratos de locação
foram celebrados).
Numa zona próxima à lixeira (Francoim) existia uma zona industrial, em parte
instalada em terrenos que foram da testemunha Menezes Basto, o que provocava
desagrado aos industriais em face do funcionamento da lixeira naquelas condições.
O presidente da junta de freguesia de Sendim, por seu turno, dava conta do
sentimento de revolta popular.
Foi confrontado com o documento de fls 7 (de 01.10.90) e 10 (de 10.09.90), os
quais se reportam a informações suas a propósito da lixeira, enquanto vereador, tendo
relatado conversas com a testemunha Menezes Basto, onde lhe dava conta que ele não
queria a continuação da deposição do lixo no seu terreno naqueles moldes, tendo
imposto condições para a continuidade da deposição dos resíduos naquele local,
impondo designadamente uma renda superior, de 25 para 200 cts, o que era uma forma
de obrigar a CMF a sair dali.
Como não foi possível instalar em Barrosas a lixeira, negociou-se com a
testemunha Menezes Basto a prorrogação do contrato, onde figurou então da dita
cláusula penal.
A testemunha Menezes Basto mostrou-se receptiva aos apelos da CMF pois
sabia que o problema era premente, daí que, não obstante não desejar a lixeira nos seus
terrenos, continuasse a permitir a deposição do lixo nesse local, ainda que a cláusula
penal referida não tivesse sido cumprida.
De 1990 a 1993 as relações existentes entre a CMF e a testemunha Menezes
Basto degradaram-se bastante por causa da lixeira. Ele aliás queria falar pouco com o
arguido Júlio Faria, a ponto de não querer ser recebido por ele.
Em 25.10.93 o depoente entregou os pelouros, tendo-se então desligado das
negociações.
Não acompanhou assim de perto os trabalhos que entretanto foram
desenvolvidos na lixeira, não podendo precisar em concreto quem andava no terreno.
Os problemas relacionados com a lixeira prendiam-se com os incêndios, os
fumos e os cheiros.

256
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Para pelo menos controlar o início dos incêndios, foi ali colocado um
encarregado, de modo a que os resíduos depositados fossem cobertos.
A “Resin” surge como sendo uma empresa com “know how” nessa área, a qual
se apresentou em Lousada (ao que pensa num restaurante) à AMVS e em Felgueiras (na
CMF), onde deu a conhecer as suas capacidades e possíveis soluções.
Crê que foi a partir de finais de 1994 que a “Resin” teve intervenção na lixeira
de Sendim.
Tomaram-se medidas para não poluir as águas da zona da lixeira.
A “Resin”, nos primeiros tempos, teve de tratar dos lixiviados da lixeira.
Considera que o trabalho desenvolvido pela “Resin” merece ser relevado na
medida em que resolveu um problema grave no concelho de Felgueiras.
Acabaram-se entretanto as queixas relacionadas com o funcionamento da lixeira
de Sendim.
O único interesse da CMF era o de resolver o problema. Não tem a percepção de
que a “Resin” tivesse sido beneficiada.
Tem a ideia que os contratos celebrados com a “Resin” foram aprovados na
CMF e que são legais (haviam pareceres jurídicos). Acabou por referir não ter
conhecimento concreto de algum contrato celebrado entre ambas.
O interesse inerente à sua celebração não era de índole pessoal, mas apenas de
resolução do problema dos lixos.
Não conhece a “Norlabor” e que a CMF tenha celebrado com essa empresa
algum contrato por causa da lixeira.
Nunca tinha ouvido falar da “João Tello”. Não sabe se foi celebrado algum
contrato entre a CMF e essa empresa a propósito da lixeira.
Não sabe se, para além dos contratos de locação, a CMF celebrou com a
testemunha Menezes Basto algum outro contrato.

- Testemunha Fernando Valdemar Rodrigues Lima


É empresário. Foi vereador na CMF entre 1990 e 1993 (pelo PSD).
Esteve ligado ao FCF de 1994 a 1997, tendo feito parte da direcção do clube em
1996 e 1997.
Os contratos celebrados a propósito da lixeira eram discutidos em reunião de
Câmara, mas não se recorda bem. Tem a ideia de nessas reuniões se falar da “Resin”.
Foi a “Resin” que tomou conta da lixeira.
Os documentos da CMF foram submetidos à apreciação do Tribunal de Contas e
não houve problemas (por exemplo, o protocolo celebrado entre a CMF e o FCF). Não
se tratavam de contratos celebrados com a “Resin”.
Não conhece a testemunha Menezes Basto, mas esse nome não lhe é estranho.
Tem uma vaga ideia de terem existido problemas com uns arrendamentos
relacionados com a lixeira.
Não tem a certeza se a “Resin” trabalhou na lixeira no tempo em que era
vereador, mas tem a ideia que sim.
Não conhece ninguém dessa empresa.
*
A propósito destas declarações o arguido Júlio Faria referiu que o primeiro
contrato celebrado entre a CMF e a “Resin”, ou melhor, entre a CMF e a testemunha
Menezes Basto, é de Novembro de 1993, numa altura em que a testemunha Fernando
Lima ainda era vereador. Foi a propósito desse contrato que a entidade terceira
escolhida para reabilitar o terreno foi a “Resin”, facto que foi objecto de discussão na
CMF.

257
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nos finais do ano de 1993 existiram conversações com o arguido Vítor Borges
e que permitiram a celebração da transacção com a testemunha Menezes Basto.
Em todo o caso, durante o tempo em que a testemunha Fernando Lima foi
vereador, a “Resin” não teve qualquer intervenção na lixeira.
Os problemas relacionados com a lixeira eram discutidos em reuniões de
Câmara e com os autarcas, devido aos problemas provocados pelo descontrolo da
lixeira.

Análise crítica
Os contratos de arrendamento/locação celebrados com a testemunha Menezes
Basto constam dos autos e foram já acima referenciados (cfr. os documentos de fls 3, 4,
11 e 12 do apenso 98).
Acerca da inexistência de local alternativo para a deposição dos resíduos e das
circunstâncias em que a “Resin” foi operar na lixeira de Sendim (subcontratando
designadamente os serviços da “Translousada”) já o tribunal teve oportunidade de
expressar a sua convicção, fundada nos depoimentos, em particular, dos arguidos Júlio
Faria e Vítor Borges e ainda no depoimento da testemunha Menezes Basto. Em relação
a essa matéria foram também relevantes os depoimentos dos arguidos Fátima Felgueiras
e Barbieri Cardoso.
Para além disso, muitas testemunhas relataram o estado da lixeira antes e depois
da reabilitação levada a cabo pela “Resin”.
A proposta para a celebração do contrato de transacção foi apresentada ao
executivo camarário pela arguida Fátima Felgueiras (cfr. fls 63 do apenso 98) na medida
em que, à data, o arguido Júlio Faria se encontrava doente (segundo o próprio, entre
Setembro e Novembro de 1993), sendo por isso substituído por ela (a qual, recorde-se, à
data, era a vice-presidente da autarquia) – cfr. as declarações dos arguidos Júlio e
Fátima Felgueiras.
Os termos dessa proposta não correspondiam porém à realidade dos factos, pois
o propósito da celebração do contrato de transacção foi na verdade outro, conforme já
tivemos oportunidade de explicitar.
Seja como for, estava subjacente uma situação que urgia resolver, de modo a
pôr cobro ao problema de saúde pública e ambiental que então se vivia em face da
forma como os resíduos eram depositados na lixeira de Sendim e ante a eminência da
CMF não ter à disposição local alternativo para os depositar.
Em todo o caso, a testemunha Menezes Basto não exigia na verdade o
pagamento de qualquer indemnização (conforme aliás referiu), apenas não estando
disposto a permitir a continuação da deposição dos resíduos, pelo menos nos mesmos
moldes (isto é, de forma descontrolada – cfr. por exemplo as informações de 01.10.90 e
de 10.09.90, constantes de fls 7 e 10 do apenso 98, proferidas pelo então Verador José
da Silva Campos, o qual entretanto se desligou desse assunto quando cessou o seu
mandato).
Já os termos do contrato de transacção, celebrado a 25.11.93, são os que
constam do respectivo documento (cfr. fls 76 e 77. do apenso 98), sendo certo que,
segundo a testemunha Maria Fernanda Castro Leal, foi ela quem redigiu esse contrato (e
o contrato-promessa de compra e venda) sob a supervisão do arguido Júlio Faria.
Por outro lado, o facto de ter sido a “Resin” a pagar o visto do Tribunal de
Contas (cfr. fls 226 do apenso 97 e 53L do apenso 98) é indício que corrobora a ideia de
que o contrato de transacção em causa é simulado (simulação relativa, nos moldes já
acima explicitados), além de que essa empresa foi a destinatária final dos pagamentos,
razão pela qual exercia pressões sobre a CMF em ordem à obtenção do pagamento

258
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

(sabendo aliás da respectiva ocorrência sem necessidade de ser informada desse facto
pela testemunha Menezes, sinal de que existia um canal de comunicação directo entre a
CMF e a “Resin” – cfr. a propósito, por exemplo, as declarações prestadas pelas
testemunhas Menezes Basto e Terezinha Carvalho).
Acerca da necessidade da dita simulação já tivemos a oportunidade de explicitar
a sua razão de ser – a CMF não podia celebrar o contrato dissimulado com a “Resin”
(em especial, segundo explicou a testemunha Fernanda Leal, porquanto não era dona do
terreno onde estava implantada a lixeira, não obstante, nos termos do contrato-promessa
de compra e venda desse terreno constar que a respectiva posse se havia transmitido
para a CMF por mero efeito desse contrato; por outro lado, a “Resin” não dispunha de
alvará que, de per si, lhe permitisse executar os trabalhos, dificuldade que poderia ser
ultrapassada usando o alvará de outra empresa; para o arguido Barbieri esta segunda
razão era a única de que tinha conhecimento e que impedia a CMF de proceder a um
ajuste directo desses trabalhos à “Resin”. Note-se aliás que a missão de reabilitação da
lixeira, levada a cabo pela “Resin”, pressupôs, como não podia deixar de ser,
movimentações de terras, daí que os trabalhos só pudessem ser legalmente levados a
cabo por quem dispusesse de alvará para o efeito).
De resto, reafirma-se, do depoimento daqueles arguidos e daquela testemunha
resulta que de facto tal contrato visou apenas permitir que a CMF pagasse à “Resin” os
serviços que ela viria a prestar na lixeira de Sendim (entre Dezembro de 1993 e Maio de
1994, segundo o arguido Vítor Borges), sendo certo que o valor desse contrato cobria o
preço da reabilitação da lixeira de Sendim, existindo um diferencial de 1.000.000$00
que diziam ainda respeito ao preço de aquisição desse terreno pela CMF, conforme mais
à frente iremos melhor explicitar (cfr. documentos de fls 142 e ss. – “Aterro de
Felgueiras – Hitorial” 6 - e 344, ambos do apenso 97).
Na verdade, a testemunha Menezes Basto pagava à “Resin” na medida em que
recebesse da CMF (conforme o demonstram os documentos respectivos – cfr. por
exemplo, a este propósito, as declarações do arguido Carlos Marinho e os documentos
mencionados na pronúncia).
De modo a evitar os constrangimentos que não permitiam à CMF legalmente
pagar à “Resin” a reabilitação da lixeira, era imperioso que aquela adquirisse o
respectivo terreno (terá sido o arguido Vítor Borges quem terá convencido a testemunha
Menezes Basto a vender esse terreno à CMF, conforme emergiu dos respectivos
depoimentos).
Para o efeito, foi celebrado entre as partes um contrato-promessa de compra e
venda (cfr. fls 80 e ss. do apenso 98), na sequência de proposta apresentada nesse
sentido pela arguida Fátima Felgueiras a 01.10.93 e aprovada pelo executivo camarário.
Verifica-se que o preço é na verdade simulado, pois, conforme aliás emerge das
declarações do arguido Júlio Faria, era importante que o mesmo não ultrapassasse os
25.000 cts, caso contrário tal contrato teria de ser submetido à apreciação da Assembleia
Municipal de Felgueiras, o que de todo era inconveniente (pelos motivos já referidos).
Ora, o tribunal convenceu-se que, na realidade, o preço acordado foi de
25.754.820$00, conforme a custo admitiu a testemunha Menezes Basto (facto negado
sem qualquer credibilidade pelo arguido Júlio Faria, o qual apenas admitiu que a
proposta inicial da testemunha Menezes relativamente ao preço – e pelos vistos final –
ultrapassava os 25.000 cts; cfr. ainda as declarações do arguido Barbieri Cardoso a este
propósito).

6
Documento apreendido na “Resin”.

259
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha Fernanda Castro Leal referiu aliás que o preço de 25.754.820$00


chegou a constar da minuta inicial do contrato, tendo sido entretanto alterado quando a
assessoria jurídica informou o arguido Júlio Faria de que um valor superior a 25.000 cts
obrigaria à aprovação desse contrato pela Assembleia Municipal de Felgueiras, facto
que aponta no sentido de que o preço foi de facto simulado em ordem a evitar a
intervenção deste órgão autárquico.
Na verdade, do dinheiro recebido da CMF, a testemunha Menezes Basto ficou
com essa quantia, tendo feito chegar o remanescente à “Resin”, conforme consta da
pronúncia.
Tendo a testemunha Menezes recebido da CMF um pagamento parcial de
11.000 cts – cfr. o talão de depósito de fls 338 do apenso 97 7 -, desse montante apenas
pagou à “Resin” 5.000 cts, conforme explicitado na pronúncia – cfr. fls 234 e 338 do
apenso 97 -, retendo pois para si a quantia de 6.000 cts, razão pela qual não terá
endossado esse cheque de 11.000 cts emitido pela CMF (cfr. ainda a anotação da
testemunha Menezes no doc. de fls 334 do apenso 97, donde emerge que desse
montante pago pela CMF apenas 5.000 cts se destinaram à “Resin”).
O diferencial de 1.000 cts (reportados ainda ao preço da compra e venda e
retidos pela testemunha Menezes) emerge ainda do documento de fls 142 do apenso 97
(historial do aterro de Felgueiras), apreendido na “Resin”.
Negaram os arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho o recebimento de qualquer
quantia em numerário por parte da testemunha Menezes.
Porém, esta testemunha começou por admitir ter procedido a um pagamento em
numerário à “Resin”, mas sem ter a certeza desse facto, hipótese que depois afastou,
mesmo depois de confrontado com as suas declarações de fls 2803 dos autos (as
declarações então prestadas perante a PJ – com as quais foi confrontado, por ter sido
autorizado por todos os intervenientes processuais - merecem-nos maior credibilidade
pelo que a seguir se explicita).
Ora, o último pagamento que recebeu da CMF (de 4.410.480$00 – cfr. o cheque
de fls 349 do apenso 97 e talão de depósito na conta da testemunha Menezes de fls 389
do mesmo apenso) não vem referenciado no documento de fls 344 do apenso 97, tendo
essa testemunha referido ao Tribunal ignorar qual o destino que deu a esse dinheiro.
Certo é que a “Resin” emitiu um recibo de 6.000 cts a 26.06.96 (cfr. fls 213 do
apenso 97), pelo que, não tendo recebido o remanescente (3.410.480$00) por nenhuma
das vias já referidas (endosso de cheques emitidos pela CMF ou cheque pessoal da
testemunha Menezes), conclui-se que terá recebido essa verba em numerário, o que
confere credibilidade às declarações prestadas a esse propósito pela testemunha
Menezes ao JIC.
A escritura de compra e venda apenas foi celebrada a 27.12.94 (cfr. fls 83 e ss.
do apenso 98), quando, nos termos previstos pelo contrato-promessa de compra e venda,
deveria ter sido celebrada na primeira quinzena de Abril de 1994.
A razão de ser desse atraso prendeu-se com o facto do promitente-vendedor não
ter registado em seu nome esse terreno. Trata-se assim de facto imputável à testemunha
Menezes Basto e não à CMF (cfr. fls 84 verso do apenso 98), de sorte que essa
circunstância nunca poderia servir para justificar a celebração de qualquer aditamento
ao contrato de transacção.
Certo é que esse atraso na celebração do contrato definitivo terá “obrigado” à
celebração do aditamento ao contrato de transacção a 28.02.96 (cfr. fls 57 do apenso 98)
– na medida em que enquanto a CMF não fosse a proprietária do terreno mantinham-se

7
Onde a testemunha Menezes Basto manuscreveu “5.000.000$00 Resin” / “ 6.000.000$00 mim”.

260
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

as dificuldades de ordem administrativa que não lhe permitiam contratar directamente


com a “Resin” -, possibilitando assim à CMF o pagamento dos serviços prestados pela
“Resin” entre Junho e Janeiro de 1995 (cfr., designadamente, as declarações dos
arguidos Vítor Borges e Barbieri Cardoso), cuja proposta foi também apresentada pela
arguida Fátima, então já na qualidade de presidente da edilidade (cfr. fls 55 e 56 do
apenso 98).
Ademais, emerge do documento de fls 142 e ss. do apenso 97 que esse
aditamento foi a forma legalmente encontrada para que a “Resin” pudesse receber o
pagamento dos trabalhos executados na lixeira de Sendim entre Junho de 1994 e Janeiro
de 1995 (altura em que o contrato de compra e venda do terreno produziu os seus efeitos
financeiros por força do visto do TC, conforme referiu a testemunha Fernanda Castro
Leal).
Segundo a testemunha Fernanda Leal, foi a arguida Fátima Felgueiras quem lhe
determinou a preparação desse contrato.
Nas facturas emitidas pela “Resin” à CMF (as quais foram devolvidas – cfr. fls
12320 e ss.), foi alterada a identidade do destinatário nas facturas emitidas até Janeiro
de 1995 (recorde-se que só a partir desta data é que se produziram os efeitos financeiros
do contrato de compra e venda do terreno por força do respectivo visto por banda do
Tribunal de Contas a 16.01.95 - cfr. as declarações do arguido Carlos Marinho, as quais,
nessa parte, nos pareceram credíveis, tanto mais que as mesmas se fundam nos
documentos juntos já no decurso da audiência de julgamento por parte desse arguido,
documentos esses que se reportam às facturas em causa e às missivas que enviaram tais
documentos à CMF).
Por outro lado, os documentos enviados pelo ROC da “Resin” (testemunha
Velosa) à testemunha Menezes Basto terão sido de facto por ele recepcionados,
inclusive os de fls 341 e 342 do apenso 97, pois foram fornecidos por esta testemunha à
PJ (sinal de que os terá de facto recebido), conforme acabou por emergir dos
depoimentos dos agentes da PJ que conduziram a investigação.
No que toca ao aditamento nada foi pago à testemunha Menezes Basto (ou
melhor, à “Resin”), tanto mais que nos sucessivos orçamentos camarários a respectiva
verba (26.462.000$00) aparece sempre como passivo (cfr., designadamente, o
orçamento camarário de 2001, constante de fls 66 e 67 do apenso 98; cfr. ainda as
declarações prestadas a esse propósito pela testemunha Terezinha).
A propósito dos pagamentos por parte da CMF, referiu ainda a testemunha
Terezinha que eles eram determinados pela presidente da CMF (pois assinava as
respectivas ordens de pagamento), limitando-se a testemunha a informá-la das
disponibilidades de tesouraria.
De resto, conforme consta da pronúncia (e confirmado designadamente pelo
arguido Carlos Marinho), a “Resin”, a 27.11.98, decidiu constituir uma provisão para
clientes de cobrança duvidosa, no montante em dívida de 24.187.400$00 (cfr.
documentos de fls 199, 341 e 342, todos do apenso 97).
A testemunha Velosa, então ROC da “Resin”, explicou em que condições se
deve constituir uma provisão dessa natureza (outras testemunhas referiram-se também a
esse facto, designadamente por terem conhecimentos técnicos na área da contabilidade).
Esse procedimento não causa particular estranheza pelo facto do devedor de
facto ser a CMF.
Na verdade, formalmente era a testemunha Menezes o devedor, mas a real
devedora – ainda que sem qualquer contrato formalmente firmado - era a CMF, daí
talvez a incerteza na cobrança do crédito (a CMF sempre poderia ser demandada, pois
entre a CMF e a “Resin” estabeleceram-se relações comerciais de que resultou para

261
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

aquela a obrigação de pagar o preço acordado para a prestação dos serviços desta na
lixeira de Sendim, além de que, ainda que assim não fosse entendido, sobejaria sempre
o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa).
Salientamos, em todo o caso, o facto de não se ter produzido qualquer prova de
que a “Resin” não tenha efectuado os trabalhos em causa ou que o respectivo valor
tenha sido empolado, mesmo em relação aos contratos mencionados nos pontos 1.3 e
1.4. da pronúncia; aliás, provou-se justamente o contrário (cfr. as declarações prestadas
pelos arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Vítor Borges, Carlos Marinho e Barbieri
Cardoso e o depoimento das testemunhas que relataram o estado da lixeira antes e
depois da intervenção da “Resin”, com relevo para o depoimento da testemunha
Menezes Basto, o depoimento dos ex.funcionários da “Resin”, o auto de inspecção ao
local, as fotos tiradas aquando da inspecção, as fotos tiradas no momento em que a
“Resin” operava no local e os documentos de fls 12391 a 12396, 12426 a 12510, 12511
e 12512, 12513 a 12523, 12524 a 12565, 12576 a 12579, 12580 a 12584, 12585 a
12590, 12599 12613, bem como os documentos juntos no apenso 141, conjugados com
as explicações dadas pelo arguido Barbieri Cardoso, que aliás nos mereceram todo o
crédito pela forma escorreita com que depôs acerca dessa matéria).
O preço de 2.800 cts mensais + IVA mostrou-se pois ajustado em função dos
trabalhos levados a cabo e do crescente volume de deposição de resíduos registado na
lixeira de Sendim ao longo do tempo, cujo tempo de vida aliás se prolongou para além
do esperado.

O Concurso e Adjudicação da Empreitada de “Manutenção do Aterro


Sanitário – Execução de Plataformas”

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Esclareceu que quando assumiu a presidência da CMF assumiu igualmente o
pelouro do ambiente, sendo certo que a partir de Dezembro de 1995 deixou de haver
qualquer contratualização relativamente à recolha e tratamento do lixo, além de que o
espaço utilizado para a deposição do lixo revelava-se já insuficiente.
Antes disso, por proposta dos serviços, entendeu a CMF abrir um concurso para
a manutenção do aterro e execução das plataformas, sendo certo que não esteve presente
na reunião de 11.04.95, mencionada no documento de fls 2275, do 10º volume.
Confirmou ter proferido o despacho de abertura do concurso a 27.11.95
(portanto já depois de ter assumido a presidência da CMF), conforme doc. de fls 69 do
apenso 95-A e doc. de fls 897. Esclareceu em todo o caso que a informação em causa
terá sido redigida pela Drª Terezinha e que o arguido Barbieri Cardoso era ao tempo o
responsável pelo Departamento Técnico da CMF.
Seja como for, a propósito do doc. de fls 70, referiu que o manuscrito ali inserto
foi escrito depois de ter proferido o respectivo despacho, sendo certo que alguém do
Departamento Técnico (de que o arguido Barbieri Cardoso era o responsável) colocou o
nome das empresas a convidar para o concurso.
Confirmou o objecto da empreitada a realizar, segundo o caderno de encargos
elaborado pelos técnicos, conforme consta da pronúncia, bem como o respectivo valor.
Pese embora tenha referido entender ser normal o convite a algumas empresas
em ordem a apresentarem as respectivas propostas, não deu qualquer explicação
plausível para o teor do fax de fls 301 do apenso 21, que alegou desconhecer.
Quando confrontada com o documento de fls 145, do apenso 97, não lhe causou
estranheza que a “Resin” se consorciasse com outras empresas, designadamente com a

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

“Norlabor” (consórcio esse que tinha como objecto precisamente a exploração e a


manutenção do aterro de Felgueiras), já que tal tipo de acordos são frequentes nas
relações comerciais existentes entre as empresas de construção civil e obras públicas.
Não pôs em causa o teor das propostas apresentadas, conforme consta da
pronúncia (cfr. docs de fls 118 e ss. do apenso 98) e que a sessão pública de abertura
dessas propostas ocorreu nos moldes também ali descritos (cfr. doc. de fls 89 e ss. do
apenso 98), sendo certo que foi escolhida a proposta apresentada pela “Norlabor” em
face do parecer técnico elaborado pelo Departamento Técnico (cfr. docs de fls 94 e ss.
do apenso 95-A), a qual aliás era a de menor valor.
Referiu ter sido uma surpresa não ter ganho a “Resin”, pois era quem no terreno
vinha executando os serviços de recolha e tratamento do lixo.
Salientou que todos os seus despachos foram proferidos com base nas
informações dos serviços camarários.
Confirmou que o contrato foi outorgado a 24.01.96, nos moldes descritos na
pronúncia.
Não obstante, era a “Resin” quem vinha procedendo aos trabalhos em causa,
pelo que se a “Norlabor” ou qualquer outra empresa efectivamente tiveram intervenção
neste domínio fizeram-no a título de subempreitada.
Admitiu assim que pelo menos parte dos trabalhos tinham sido já iniciados antes
da adjudicação à “Norlabor”, ignorando quanto tempo demorou a execução dos
trabalhos adjudicados (mas que seguramente ultrapassou 1 mês).
Confirmou o não pagamento da primeira factura emitida pela “Norlabor” e que
esta reclamou várias vezes o respectivo pagamento.
Confirmou que era à “Norlabor” que a CMF pagava os trabalhos executados
pela “Resin”, pelo que, pese embora desconheça qual o trajecto que teve o dinheiro
recebido pela “Norlabor”, não estranhou o facto do mesmo chegar à “Resin”, já que era
quem efectivamente executava a obra.
Referiu aliás não saber se a “Norlabor” prestou algum serviço na lixeira de
Sendim, mas se o fez fê-lo por subempreitada, conforme já referido.
Esclareceu aliás que a “Resin” exigia também o pagamento dos seus serviços e
insistia com a CMF para que ultrapassasse os embaraços administrativos que impedia
tal pagamento e para decidir se queria contratualizar com ela ou não quanto ao
tratamento dos lixos, visto que desde Janeiro de 1995 trabalhava na lixeira sem qualquer
contratualização formal.
Mais esclareceu que era a Drª Teresinha quem recebia da “Resin” os insistentes
pedidos de pagamento.
Salientou que os pagamentos efectuados à “Norlabor” corresponderam aos
serviços efectivamente executados no terreno (pela “Resin”).
Não deu qualquer explicação para o facto da “Norlabor” considerar de cobrança
duvidosa o alegado crédito que formalmente detinha sobre a CMF (cfr. doc. de fls
1906), não tendo conhecimento de que essa empresa alguma vez tenha demandado a
CMF, sendo certo que, em todo o caso, não teria interesse em o fazer pois foi oponente
em vários concursos abertos nos municípios do Vale do Sousa.

- Arguido Júlio Faria


Explicou que, a propósito da prossecução e realização dos trabalhos que a
“Resin” vinha executando na Lixeira de Sendim, existia alguma indefenição quanto ao
modo como se deveria avançar, num quadro de dificuldade em escolher e libertar o
terreno necessário à construção de um aterro que servisse os concelhos de Felgueiras, de

263
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Paços de Ferreira e de Lousada, sendo certo que em 1994 já se desenhava um novo


quadro de apoio comunitário.
Devido a contestação popular não foi possível construir esse aterro
intermunicipal em Lustosa (Lousada). Consequentemente, os três concelhos teriam de
indicar terrenos alternativos para serem avaliados, o que demorou o seu tempo.
Nesse meio tempo a “Resin” continuava a prestar os seus serviços na Lixeira de
Sendim.
Ora, a “Resin” remeteu-lhe um fax em 1994 mostrando-se disponível para
proceder à análise das alternativas de localização do futuro aterro no concelho de
Felgueiras.
Criaram-se pois assim condições para o lançamento do concurso referido nos
autos.
A propósito da reunião mencionada na pronúncia como tendo ocorrido a
11.04.95, referida no manuscrito de fls 2275 do 10º volume (da autoria da Drª
Teresinha), referiu não ter estado presente, sendo certo que a informação de fls 2275 lhe
é dirigida, o que seria desnecessário se de facto tivesse participado na dita reunião.
De resto, em face do conteúdo de tal documento – mormente na parte em que o
depoente determina que se dê cópia desse documento ao arguido Barbieri – se vê que
também este provavelmente não esteve presente (caso contrário não seria necessário
entregar-lhe cópia da informação prestada pela Drª Teresinha).
Referiu ignorar se a “Resin” já tinha executado parte dos trabalhos previstos no
caderno de encargos do concurso aquando da respectiva abertura, sendo certo porém
que ela sempre se manteve a operar em Sendim, executando trabalhos que deveriam ser
pagos pela CMF e que não estavam a coberto do contrato de transacção acima referido.
Consequentemente, a abertura do concurso em apreço foi a forma encontrada
para permitir o pagamento dos trabalhos que a “Resin” vinha executando em Sendim e
de modo a concluí-los de acordo com o respectivo caderno de encargos.
Existia por outro lado a preocupação de candidatar o projecto a fundos
comunitários, de modo a afectar o mínimo possível o orçamento camarário.
Referiu desconhecer a “Norlabor”.
Depois de ter sido eleito deputado desligou-se do andamento dos assuntos
camarários, até para não ser mal interpretada a sua actuação e ser vista como uma
ingerência incómoda em assuntos que já não lhe diziam respeito. Procurava assim dar
espaço aos novos dirigentes camarários.
Quanto ao facto de ter sido a “Resin” a indicar a lista das empresas a convidar
para o concurso, referiu ser normal a remessa de uma lista de empresas a convidar,
sendo certo que à data não teve qualquer reunião com a Tutela onde lhe indicassem
nomes de empresas com capacidade para executar os trabalhos. Terá sido por isso que
se recorreu à única empresa que se sabia ter essa capacidade, no sentido dela própria
indicar outras empresas que pudessem concorrer ao dito concurso.
Referiu ainda que só manteve com o arguido Barbieri Cardoso uma relação
profissional, sendo certo que ele não era filiado no PS nem nunca o viu em qualquer
iniciativa promovida por este partido.

- Arguido Vítor Borges


Reafirmou o que já havia referido quanto à necessidade da celebração do
concurso em causa.
Recorda-se de ter tido uma reunião na CMF onde esse problema foi abordado
(cfr. doc. de fls 2275 do 10º volume – manuscrito da Drª Teresinha alusivo à dita
reunião) e onde se adiantaram várias hipóteses de resolução do problema do pagamento

264
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

dos trabalhos efectuados pela “Resin” (invocação de natureza urgente e razões de saúde
pública ou abertura de um concurso limitado para trabalhos já excutados pela “Resin”
através de subempreitada à “Translousada” e à “Norlabor”).
Não se recorda de quem esteve presente (tem ideia de terem estado presente as
testemunhas Teresinha e Fernanda Castro Leal. Não tem ideia alguma do arguido
Barbieri Cardoso ter estado presente, tanto mais que ali não se discutiram questões de
natureza técnica).
Não se recorda se a esse propósito teve ou não mais reuniões, mas admite como
provável que sim.
Confirmou a celebração do contrato de consórcio de fls fls 145 do apenso 97 e
reafirmou as razões da respectiva celebração, acrescentando ainda que a “Norlabor”
receava ficar arredada das empreitadas quando a “ECOP” entrou no capital social da
“Resin”, sendo certo que a área do ambiente era potencialmente atraente, além de que
queria fixar uma listagem de preços de aluguer dos equipamentos (o que aliás foi feito
com a “Translousada”).
O concurso em apreço precipitou a celebração desse contrato de consórcio.
Pese embora não tenha já a certeza, tem a ideia de que foi o arguido Barbieri
Cardoso quem lhe telefonou (presume esse facto por lhe ter dirigido o fax de fls 301 do
apenso 21) solicitando-lhe que indicasse as empresas que deveriam ser convidadas (as
quais deveriam ter no seu objecto social a celebração de empreitadas de obras públicas e
que tivessem capacidade para as executar), daí a remessa do fax de fls 301 do apenso 21
a 24.11.95.
Como os trabalhos já estavam feitos (incluindo a execução das plataformas,
triagem do lixo, deposição do mesmo com compactagem e deposição de terra), o
concurso apenas visou o pagamento dos mesmos à “Resin” (a data muito próxima entre
a adjudicação e a conclusão dos trabalhos indicia que eles já estariam realizados, já que
não seria possível executá-los naquele pequeno período de tempo se nada estivesse feito
à data da adjudicação).
Nessa medida, já se sabia à partida que a “Norlabor” iria ganhar o concurso (e
que a “Resin” seria o destinatário final dos pagamentos a efectuar pela CMF). Houve
assim uma consertação entre os concorrentes nas propostas apresentadas de modo a que
a “Norlabor” apresentasse a melhor proposta. Nesse sentido, aliás, deu instruções aos
técnicos da “Resin” para conversarem com as outras empresas concorrentes.
Na altura haviam débitos da “Resin” à “Norlabor”. Porém, quem de facto
trabalhou na lixeira foi a “Translousada”, conforme verificou nos documentos depois da
sessão de julgamento do dia anterior.
Reafirmou que para si a “Norlabor” e a “Translousada” eram a mesma coisa,
pois tinham sócios comuns.
Explicou o percurso sinuoso que os meios de pagamento tiveram até chegar à
“Resin” (via “Norlabor” e desta para a “Translousada” até por fim chegar à “Resin”)
pelo facto da “Norlabor” ter ganho o concurso por ter alvará para o efeito, havendo que
fazer intervir a “Translousada” no circuito do pagamento porque quem de facto
executou trabalhos na lixeira foi esta empresa (subcontratada pela “Resin”), a qual já
tinha recebido parte dos pagamentos por banda da “Resin” (a “Resin” elaborou o
projecto, supervisionou a sua execução, mantendo no terreno um engenheiro, dois
seguranças e um encarregado).
Acrescentou que as relações comerciais que a “Resin” mantinha com a
“Translousada” a propósito do trabalho por esta desenvoilvido na lixeira de Sendim não
foi formalizado por escrito.

265
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Arguido Carlos Marinho


Explicou que em finais de 1995, aquando da devolução das 17 facturas pela
CMF, foi-lhe dito pela administração da “Resin” que parte delas teriam de ser anuladas
e emitidas ao Eng. Menezes Basto e outra parte à “Translousada”, tendo-se procedido
do modo já acima referido.
Posteriormente soube pelo arguido Vítor Borges que foi a “Norlabor” que
ganhou o concurso em causa relativo à manutenção da lixeira.
Nessa altura ignorava a celebração do contrato de consórcio com a “Norlabor”,
acerca do qual aliás nunca foi ouvido, tendo-lhe sido dito posteriormente que a
celebração de tal contrato visava garantir no futuro o relacionamento comercial
existente com a “Norlabor” em face do facto da “ECOP” ter entrado no capital social da
“Resin”.
Na altura da realização do concurso em causa ignorava que tinha sido solicitada
à “Resin” a indicação de empresas que a ele pudessem concorrer.
Confirmou que a CMF pagou à “Norlabor”, esta pagou à “Translousada”, a qual
por sua vez pagou à “Resin”, a qual era a destinatária final dos pagamentos efectuados
pela CMF, sendo certo que a “Norlabor” nunca operou na lixeira de Sendim (apenas
operou na lixeira da Lustosa). De facto, apenas a “Translousada” operou na lixeira de
Sendim subcontratada pela “Resin”.
Os pagamentos ocorreram em 1996 e 1998.
A propósito do documento de fls 127 do apenso 97 (missiva da “Translousada” à
“Resin”, ao cuidado do arguido Vítor Borges, em Julho de 1996, a remeter cópia do
contrato de empreitada celebrado entre a CMF e a “Norlabor”), com o qual foi
confrontado, referiu ignorar, visto que os documentos pertinentes já haviam sido
tratados contabilisticamente pelo depoente em finais de 1995 com a emissão das
facturas à “Translousada” (o depoente tratava das facturas e contabilizava os
recebimentos recebidos pela tesouraria).
Confrontado com o teor da factura de fls 122 do apenso 95-A (factura emitida
pela “Norlabor” à CMF, a 26.02.96, no valor de 19.550.664$00) referiu que o montante
respectivo corresponde à totalidade do valor da empreitada em causa. A única
explicação que encontra para o facto de ter sido apresentada uma única factura com o
valor global da empreitada é a de que a mesma se destinava ao pagamento de trabalhos
já efectuados.
Confrontado com o teor do documento de fls 123 do apenso 95-A (recibo da
“Norlabor” à CMF, no montante de 5.000.000$00), explicou que até 1998 não chegou à
“Resin” qualquer outra quantia monetária por conta do pagamento dos serviços que
prestou na lixeira de Sendim, no que diz respeito à sua manutenção/execução de
plataformas (o primeiro pagamento parcial da CMF cifrou-se na quantia líquida de
4.738.095$00, após as legais retenções).
Ignora se a “Norlabor” pressionou a CMF a efectivar os pagamentos em falta ou
se a “Resin” exerceu também pressão junto da edilidade nesse sentido, mas admite que
tal possa ter ocorrido visto ser a destinatária final desses pagamentos (cfr. a propósito o
documento de fls 293 do apenso 97).
Explicou que o documento de fls 1906 constitui um extracto de conta-corrente
existente entre a “Norlabor” e a CMF.
Em finais de 1997 o crédito em causa (cerca de 14.000.000$00) foi considerado
de cobrança duvidosa, o que de certa forma considerou estranho em face da natureza da
entidade devedora, remetendo para os responsáveis da “Norlabor” a explicação de tal
procedimento. Não deu qualquer explicação para o facto de tal procedimento ter sido
adoptado sem dar conhecimento à “Resin” já que esta era a destinatária final dos

266
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pagamentos efectuados pela CMF, remetendo mais uma vez a explicação para os
responsáveis da “Norlabor”.
Foi então confrontado com os seguintes documentos, que não pôs em causa:
- fls 131 do apenso 95-A (ordem de pagamento da CMF no montante de
7.000.000$00, com o valor líquido – após as legais deduções – de 6.633.334$00);
- fls 133 do apenso 95-A (recibo nº 649, no montante de 7.000.000$00, emitido
pela “Norlabor” à CMF, datado de 13.05.98, reportado ao segundo pagamento parcial
da já referida factura cuja cópia se acha a fls 122 do apenso 95-A);
- fls 136 do apenso 95-A (ordem de pagamento da CMF à “Norlabor” do
montante de 7.550.664$00, o que perfaz o valor líquido de 7.155.153$00, após as legais
retenções);
- fls 138 do apenso 95-A (recibo da “Norlabor” à CMF no montante de
7.550.664$00, datado de 21.10.98, reportado ao terceiro e último pagamento parcial da
factura de fls 122 do apenso 95-A).
Por outro lado, confirmou que a “Resin” recebeu as quantias em causa do
seguinte modo:
- 4.738.095$00 a 25.06.96, através do cheque nº 1159765 da CGD, constante de
fls 1903 dos autos, para liquidação da factura nº 9500182, de 27.02.95 (cfr. fls 161 do
apenso 97) e parte da factura nº 9500280, de 31.03.95 - 1.462.095$00 (cfr. fls 162 do
apenso 97) -, tendo emitido o respectivo recibo à “Translousada” a 25.06.95 (cfr.
documento de fls 191 do apenso 97); cfr. ainda o talão de depósito na conta da “Resin”
a 25.06.96, constante de fls 192 do apenso 97;
- 6.633.334$00, através do cheque nº 40878643, de uma conta particular de
sócios da “Norlabor”, constante de fls 1910 dos autos (cfr. ainda o documento de fls 158
do apenso 95-A e o talão de depósito na conta da “Norlabor” constante de fls 1912 dos
autos), para pagamento do remanescente da factura nº 9500280, de 31.03.95, constante
de fls 162 do apenso 97 (1.813.905$00), da totalidade da factura nº 9500369, datada de
18.04.95, no montante de 3.276.000$00 (cfr. documento de fls 163 do apenso 97) e
parte da factura nº 9500451, de 31.05.95, constante de fls 164 do apenso 97
(1.543.429$00); cfr. ainda o documento comprovativo do depósito na conta da “Resin”
a fls 196 do apenso 97 e o recibo respectivo a fls 195 do apenso 97, datado de 14.05.98;
- 7.155.153$00, através de cheque endossado pela “Translousada” e emitido pela
“Norlabor”, correspondente à liquidação do remanescente da factura nº 9500451, de
31.05.95 (cfr. fls 164 do apenso 97 – 1.732.571$00), à totalidade da factura nº 9500571,
de 30.06.95, no montante de 3.276.000$00 (constante de fls 165 do apenso 97) e parte
da factura nº 9500665, de 31.07.95 (constante de fls 166 do apenso 97 - 2.146.582$00);
cfr. o recibo de fls 198 do apenso 97, datado de 22.10.98 e o documento e fls 151 do
apenso 95-A.
Quanto ao manuscrito a lápis no verso do recibo de fls 195 do apenso 97
(respeitante ao segundo recebimento), afirmou não ser da sua autoria, ignorando a que
se refere (cfr. fls 4629 dos autos).
Explicou, em todo o caso, que o IVA entre empresas era de 17% na altura e que
no que respeita a uma entidade pública era na altura de 5%. Consequentemente, as
facturas emitidas pela “Resin” à “Translousada” incluiam IVA a 17%, ao passo que a
factura emitida pela “Norlabor” à CMF incluíu IVA a 5%.
Assim, o valor do crédito da “Resin” é superior ao valor da factura emitida pela
“Norlabor” à CMF.
Tal facto explica porque razão a última factura emitida pela “Resin” à
“Translousada” (cfr. fls 166 do apenso 97) não foi integralmente paga.

267
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A esse propósito esclareceu que abordou o Sr. Carlos Silva da “Translousada”


no sentido de ser paga a diferença, mas tal situação foi-se protelando no tempo até que o
valor em dívida foi “anulado” (considerando o crédito de cobrança duvidosa,
constituindo-se por isso a provisão respectiva) como compensação pelo facto da
“Resin” não pagar atempadamente os serviços prestados pela “Translousada” na lixeira
de Sendim, sendo certo que esta empresa nunca debitou juros de mora.
Questionado da razão pela qual nas 17 facturas originalmente remetidas à CMF
para pagamento (e por esta recusadas conforme já acima referido) colocou o IVA a
17%, não obstante a CMF ser uma entidade pública, respondeu que decidiu fazer desse
modo porquanto inexistia qualquer contratualização entre essa edilidade e a “Resin”
(explicação que não se percebe, pois se não havia contratualização desde logo essas
facturas não deveriam ter sido emitidas e apresentadas a pagamento à CMF).
Nega que os valores dos trabalhos tenham sido sobrevalorizados e que alguma
quantia recebida pela “Resin” tenha sido entregue à arguida Fátima Felgueiras,
conforme consta da pronúncia.
Explicou ainda que a “Translousada” tinha de intervir no processo de forma a
que contabilisticamente os pagamentos à “Resin” estivessem justificados na medida em
que aquando da devolução das referidas 17 facturas pela CMF (em Dezembro de 1995)
parte delas foram reemitidas e enviadas à “Translousada”, sendo certo que quem acabou
por ganhar o concurso foi a “Norlabor” (porém, tendo sido devolvidas as facturas em
causa no final de 1995, numa altura em que já se sabia que a “Norlabor” já tinha ganho
ou ganharia o concurso - realizado em Dezembro de 1995 -, não se percebe, à luz
daquela explicação, porque razão as facturas reemitidas o não foram à “Norlabor” no
período compreendido entre Fevereiro de 1995 e Outubro de 1995, sendo certo aliás que
parece ter havido concertação na apresentação das propostas dos diferentes concorrentes
ao concurso em causa de modo a que ganhasse a proposta apresentada pela “Norlabor”,
concorrentes esses indicados aliás pela “Resin”, daí que seja pouco plausível que tenha
constituído uma surpresa para a “Resin” que a “Norlabor” tenha ganho o concurso,
empresa com a qual aliás tinha celebrado a 19.04.95 um contrato de consórcio tendo por
objecto precisamente a manutenção da lixeira de Sendim, dai que faça todo o sentido
que esta última tenha apresentado a proposta que viria a ser vencedora por ser pelo
menos a de menor custo para a edilidade).
Confrontado com o documento de fls 127 do apenso 97 (é a “Translousada” que
remete à “Resin” cópia do contrato de empreitada celebrado a 24.01.96 entre a CMF e a
“Norlabor”), referiu que a “Translousada” e a “Norlabor” tinham sócios comuns, daí
que não estranhe esse facto.

- Arguido Barbieri Cardoso


Em 1995 o então Secretário de Estado do Ambiente (Poças Martins)
impulsionou o desenvolvimento da resolução o problema dos resíduos no Vale do
Sousa, tendo sido celebrado a 28.09.95 um protocolo entre o Ministério do Ambiente e
os municípios do Vale do Sousa (documento junto na audiência de julgamento) com
vista à candidatura aos fundos comunitários.
Havia pois a expectativa que os custos com a recolha e tratamento dos resíduos
viessem a ser em parte suportados pelos fundos comunitários (os fundos estruturais
comparticipavam em 50%, ao passo que os fundos de coesão comparticipavam em
85%).
Ora, a partir de Maio de 1994 inexistia qualquer contratualização formal que
permitisse à “Resin” continuar a trabalhar na lixeira de Sendim, quer porque a CMF
ainda não havia adquirido o terreno onde estava implantada a lixeira (a escritura

268
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

realizou-se a 27.12.94) quer porque a “Resin” não dispunha de alvará que lhe permitisse
executar obras de empreitada. A este propósito recorda-se que o TC rejeitou um
contrato de fornecimento de semáforos por entender que se tratava de um contrato de
empreitada e o mesmo por certo entenderia quanto à actividade desenvolvida pela
“Resin” na lixeira de Sendim. Havia pois dúvidas acerca da qualificação jurídica dessa
actividade (mera prestação de serviços ou empreitada?), sendo certo que a qualificação
como empreitada permitia à CMF pagar um IVA de apenas 5%, ao passo que se se
tratasse de um fornecimento ou de uma mera prestação de serviços teria de pagar o IVA
a 17%.
O arguido Júlio Faria, não obstante (dada a falta de alternativas), concordou em
que a “Resin” continuasse a operar no local (cfr. fax de fls 2773).
A “Resin”, a propósito, remeteu o respectivo orçamento (2.800 cts /mês + IVA),
conforme documento junto na audiência de julgamento.
A Drª Terezinha prestou informação escrita ao arguido Júlio Faria do que se
passou na reunião de 11.04.95, conforme documento de fls 2275, do 10º volume.
Em meados de 1995 o problema arrastava-se e só se procurou uma solução
quando a arguida Fátima Felgueiras tomou conta desse dossier em Setembro/Outubro de
1995.
Em 17.07.95 foram abertas as propostas para o concurso de construção do aterro
da Lustosa (Penafiel), criando a expectativa de uma resolução rápida do problema da
recolha e tratamento dos resíduos.
Como a arguida Fátima Felgueiras queria “colocar a casa em ordem” decidiu-se
que o serviço de recolha de resíduos deveria gerar receitas para se financiar, com a
criação de uma taxa em inícios de 1996 para os resíduos industriais (princípio
poluidor/pagador).
Além disso, em ordem a resolver questões passadas (pagamento dos trabalhos já
executados) ela mandou abrir um concurso ao Departamento Técnico, sendo certo que é
a assessoria jurídica quem prepara e elabora os contratos, dando seguimento ao que já
havia sido anteriormente decidido pelo arguido Júlio Faria (cfr. documento de fls 2275
do 10º volume).
Explicou que a lixeira de Sendim situava-se em terrenos que segundo o PDM
faziam parte da Reserva Ecológica, como acontecia com todos os terrenos com uma
inclinação superior a 30%. No caso o terreno tinha essa inclinação devido à deposição
do lixo, pelo que não fazia sentido integrar aquela área na “Reserva Ecológica”.
Ora, os trabalhos efectuados pela “Resin” entre Junho de 1994 até Abril de 1996
foram pagos com recurso ao expediente do concurso (precisou mais tarde que esse
expediente serviu para pagar os trabalhos efectuados entre Fevereiro de 1995 até Abril
de 1996; já antes desse perído de tempo a CMF teria lançado mão do contrato de
transacção e seu aditamento, referidos no ponto 1.2 da pronuncia, para pagar trabalhos
efectuados anteriormente).
Nega qualquer sobreavaliação pois foi paga a quantia de 977$00 por tonelada de
lixo, o que é um preço muito bom.
Esclareceu que o concurso em causa reportava-se formalmente a trabalhos a
executar num período de 30 dias na medida em que grande parte desses trabalhos já
haviam sido executados quanto à movimentação de terras. Para consolidar essa
movimentação de terras bastariam 30 dias. A ideia era a de abarcar todo o trabalho de
movimentação de terras e consolidação das plataformas até ao ajuste directo referido no
ponto 1.4.
O ajuste directo a que se reporta o ponto 1.4 da pronúncia serviu para pagar os
serviços que iriam ser prestados pela “Resin” sendo certo que o concurso a que se

269
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

reporta o ponto em causa serviu para pagar os trabalhos efectuados desde o final do
período coberto pelo aditamento ao contrato de transacção celebrado com o Eng.
Menezes Basto até à concretização do ajuste directo (entre Janeiro/Fevereiro de 1995
até Abril de 1996).
Havia a expectativa de que os encargos entretanto transitassem para a AMVS.
Recorda-se que na fase de indefinição da resolução da questão dos pagamentos à
“Resin” por banda da CMF, o arguido Vitor Borges ameaçou abandonar os trabalhos
pois “tinha de dar satisfações aos franceses”.
Foi-lhe então comunicado a abertura do concurso a que se reporta este ponto da
pronúncia em ordem a resolver o problema dos pagamentos e o arguido Vítor Borges
recomendou cuidado acerca das empresas a convidar para apresentar as respectivas
propostas visto que quem ganhasse teria de falar com a “Resin” dado ser ela quem de
facto operava no terreno. Dessa forma acalmou-se o arguido Vítor Borges. Admite o
depoente que possa ter sido quem lhe comunicou a decisão de realização desse
concurso, salientando em todo o caso que agiu sempre com base em instruções
superiores, relembrando que responde directamente perante a presidente da CMF.
Partiu assim do pressuposto, na altura, que a “Resin” não iria concorrer, até
porque não dispunha de alvará, daí que tenha apenas constatado que ela concorreu
aquando da abertura das propostas.
Nesse contexto, não achou estranho que a “Resin” tivesse indicado as empresas
a convidar.
Não se recorda de ter recebido ordens para contactar a “Resin” em ordem a
indicar as empresas a convidar. A esse propósito, foi confrontado com as declarações
prestadas perante o JIC, constantes do 2º parágrafo de fls 2267 e do 2º parágrafo de fls
3918, esclarecendo que as declarações que ali constam correspondem a respostas
parcelares. Reconheceu que na altura lhe foi presente o fax já referido e que lhe era
endereçado, mantendo a posição já adoptada perante o JIC. Em todo o caso, não põem
de parte que possa ter recebido instruções da arguida Fátima Felgueiras no sentido de
contactar a “Resin” com aquele desiderato. Adiantou que tal possa ter sido
eventualmente feito pelo Eng. Ferreira (responsável pela área dos concursos) ou pela
funcionária Conceição Ferreira, a qual dava apoio à área dos concursos.
Como achou na altura que a “Resin” não iria concorrer não entendeu então
imprudente solicitar-lhe a indicação de empresas a convidar para o concurso. Seja como
for, reafirmou não se lembrar se ter contactado a “Resin” para esse fim, reafirmando
ainda que esse contacto também poderia ter sido feito pelo Eng. Ferreira Leite
(responsável pelos concursos) ou pela funcionária Conceição. Admite em todo o caso
que possa ter conversado com o Eng. Ferreira acerca desse assunto. Seja como for,
nunca teve a percepção do cometimento de alguma ilegalidade, pois caso contrário o fax
de fls 301 do apenso 21 não constaria, como consta, do processo respeitante ao
concurso em causa.
Referiu então que o fax de fls 301 do apenso 21 (indicação das empresas pela
“Resin”) não lhe chegou às mãos, pois nesse caso teria despachado no mesmo, o que
não se verifica, sendo certo que os serviços administrativos já sabiam que se aguardava
essa indicação. Só mais tarde viu esse fax quando a Drª Maria Natal, a propósito de um
inquérito à CMF pela IGAT, o abordou acerca desse assunto. Sobre este ponto não foi
muito assertivo, admitindo que eventualmente já tivesse visto tal documento, embora
não se recorde de tal facto.
Confrontado com o convite dirigido à “Resin” (cfr. fls 70 o apenso 95-A),
salientou que esse convite foi feito sem o seu conhecimento, sendo certo que a letra
desse documento é de uma funcionária camarária (Conceção Ferreira, chefe de secção).

270
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Reconheceu que ela deverá ter redigido e dirigido os convites conforme a


indicação dada pela “Resin” no documento de fls 301 do apenso 21.
Esclareceu que todos os veradores sabiam do objectivo do concurso.
Ignora se a apresentação das propostas pelas diferentes empresas foi feita de
forma concertada por forma a que uma delas ganhasse o concurso, sendo certo, em todo
o caso, que os concorrentes teriam de garantir a continuação dos trabalhos até ao ajuste
directo à “Resin”.
Não havia a possibilidade da CMF ter de pagar duas vezes os trabalhos em causa
(à “Resin” e à empresa que ganhasse o concurso) na medida em que só pagaria à
empresa que ganhou o concurso os trabalhos que ela própria eventualmente executasse
(porém, estes trabalhos que formalmente constavam do caderno de encargos estariam já
praticamente concluídos aquando do concurso e seguramente concluídos aquando da
celebração do contrato de empreitada respectivo. Em todo o caso, segundo o depoente,
este concurso serviu para efectuar o pagamento de trabalhos que se estenderam até Abril
de 1996). A CMF controlava os trabalhos efectuados porquanto eram medidos os
trabalhos de escavação e aterro, ao qual se pagava o preço unitário previsto na proposta
que ganhou o concurso. Nessa medida, a CMF acabou por pagar uma quantia inferior a
2.800 cts + IVA por mês.
De resto, se a empresa ganhadora do concurso não estivesse concertada com a
“Resin”, teria de cumprir o volume de movimentação de terras previsto no concurso.
De facto, quando preparou o concurso, previu 6 meses de escavação e aterro, na
ordem de 20.000 m3 de movimentação de terras, à razão de 3.350 m3 por mês (cfr. os
convites endereçados às empresas convidadas).
A apreciação das propostas incidiu basicamente na verificação e comparação dos
preços apresentados, tendo ganho a proposta mais económica (da “Norlabor”).
A formalização do contrato de empreitada respectivo só ocorreu a 24.01.96 (cfr.
documento de fls 128 do apenso 97) na medida em que só então o cabimento
orçamental da CMF o permitiu.
Só existiu um auto de medição efectuado pelo Eng. Ferreira Leite a 23.02.96,
aprovado pela arguida Fátima Felgueiras a 06.05.96.
Referiu que hoje sabe que a “Norlabor” directamente não executou qualquer
trabalho pois subempreitou-os à “Translousada” sem o comunicar à CMF.
Confrontado com as declarações de fls 2268, 2º parágrafo, por remissão das
declarações prestadas a fls 3918, 2º parágrafo, entende inexistir qualquer contradição
com o que referiu, salientando a veracidade do que agora referiu e do que a propósito
declarou na fase de inquérito. Em todo o caso, nessa altura ignorava que a
“Translousada” tinha executado trabalhos (forneceram camiões e máquinas; ignora se
sem ou com condutor, sendo em todo o caso normal que esse fornecimento incluísse o
manobrador), sendo do seu conhecimento que a “Resin” operava no local com pessoal e
com o seu “know how” (sucede que a “Resin” pagou à “Translousada” os trabalhos por
esta efectuados, pelo que conclui que terá sido de facto subempreitada pela “Resin” e
não pela “Norlabor”).
Não teve conhecimento que a “Norlabor” considerou de cobrança duvidosa o
crédito que formalmente detinha sobre a CMF. Adiantou em todo o caso que a CMF
pagava sempre com grande atraso. Ignora também se algum outro credor teve o mesmo
procedimento.
Chamou por fim à colação uma notícia do Jornal de Notícias de 23.01.96 acerca
da lixeira de Sendim e um estudo elaborado pela “Quercus” para o Ministério do
Ambiente (e remetido por este à CMF), datado de 17.05.96, acerca da produção e
encaminhamento dos resíduos sólidos industriais do sector do calçado na região Norte

271
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira


Enquanto inspector da IGAT fez uma análise da relação de entregas em
numerário da “Resin” a alguém relacionado com a CMF e pagamentos efectuados à
“Norlabor”.
Para o efeito efectuou uma auditoria contabilística e financeira aos documentos
de suporte.
Como apareceram elementos documentais ligados à “Translousada” e à “Resin”
resolveu alargar o âmbito da sua análise.
Apurou então, em face da análise efectuada, que os pagamentos efectuados pela
CMF à “Norlabor” (a qual emitiu a factura nº 427, cuja cópia consta de fls 1899) foram
transferidos para a “Translousada” e desta para a “Resin” nos moldes descritos na
pronúncia, confirmando assim o teor do seu relatório de fls 2285 e ss, do 10º volume.
Assim, o primeiro pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”, no valor de
4.738.095$00, foi efectivado através do cheque cuja cópia se acha a fls 1903 do 8º
volume; tal cheque foi endossado pela “Norlabor” à “Translousada”, a qual por sua vez
o endossou à “Resin”.
O segundo pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor” cifrou-se em
6.633.334$00 (o valor ilíquido era de 7.000.000$00, tendo sido efectuadas as
respectivas deduções relativas a caução e para a Caixa Geral de Aposentações – cfr.
doc. de fls 158 do 1º volume) e foi efectivado através do cheque cuja cópia se acha a fls
1910 do 8º volume (ou fls 158 do apenso 95-A), o qual foi depositado por esta empresa
na sua conta. Entretanto a 14.05.98 a “Norlabor” emitiu um cheque de igual valor à
“Translousada”, sacado de uma conta particular conjunta dos respectivos sócios, a qual
por sua vez o endossou à “Resin”, empresa que por sua vez o depositou a 15.05.98.
O terceiro pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”, no montante de
7.155.153$00, foi efectivado através do cheque cuja cópia se acha a fls 151 do apenso
95-A (ou fls 1915 do 8º volume), a qual procedeu ao seu depósito bancário (cfr. fls
1917), tendo na mesma data emitido um cheque de igual valor a favor da
“Translousada”, a qual por sua vez o endossou à “Resin”, empresa que efectuou o
respectivo depósito a 21.10.98.
Para justificar a transferência dos pagamentos efectuados para a “Translousada”
esta emitia notas de débito à “Norlabor”.
Por outro lado, as perdas que foram contabilizadas na conta de provisões de
exercício da “Resin”, que no total ascendem a 28.231.803$00 (2.894.985$00 +
24.187.400$00 + 1.129.418$00), não aparecem no relatório de contas nem nas
declarações fiscais. Em conversa informal com o revisor oficial de contas da “Resin”,
pelo mesmo foi-lhe dito não se recordar da explicação para tal facto, o que ao depoente
não parece normal.
Essas situações de perda decorreram do facto da CMF não ter efectuado o
pagamento respectivo.
Confrontado com os manuscritos de fls 159 e 163 do 1º volume, referiu que do
ponto de vista contabilístico não pode retirar qualquer ilacção que lhe permita concluir
que foram feitas entregas de dinheiro pela “Resin” para o chamado “saco azul” (cfr. o
relatório de fls 1893 do 8º volume).
Por outro lado, não encontrou na “Resin” qualquer documento de suporte
relativa às supostas entregas de dinheiro, designadamente as saídas de caixa. Em todo o
caso, em face da sua experiência profissional, referiu que este tipo de operações não
passam pela contabilidade.

272
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Seja como for, existe proximidade temporal entre as datas de pagamento pela
CMF (cfr. os cheques acima referidos) e as datas de “retorno”, segundo o que consta
dos documentos de fls 159 e 163, do 1º volume. Existem também algumas
coincidências ao nível dos montantes.
Confrontado com o documento de fls 22 do apeso 12 (mapa apreendido num
computador da “Resin” – cfr. fls 7 do relatório referido, correspondente a fls 2291 dos
autos), o qual no seu verso tem aposta uma frase manuscrita (“recebemos e devolvemos
os valores de Norlabor e João Tello quase na integra”, referiu não ter assistido à
apreensão, tendo no entanto instruído os inspectores da PJ acerca dos documentos
contabilísticos que deveriam ser apreendidos.

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães


Enquanto especialista superior da PJ efectuou o relatório de fls 1893 e ss.
Analisou a factura nº 427 (constante de fls 1899), no valor de 19.550.664$00,
emitida a 26.02.96 pela “Norlabor” à CMF e relativa à “Manutençao do Aterro Sanitário
– Execução de Plataformas” (inclui IVA a 5%).
A 24.06.96 foi emitido um recibo no montante de 5.000.000$00, correspondente
a liquidação parcial de tal factura (cfr. doc. de fls 1901), feita pela CMF através do
cheque cuja cópia se acha a fls 1903 (cfr. ordem de pagamento de fls 1902, com as
retenções descritas a fls 1904; cfr. ainda extrato de conta-corrente de fls 1900 a 1903).
Ficou assim em dívida a quantia de 14.550.664$00 após esse pagamento parcial.
No final de 1997 na conta 2110444 a CMF apresentava um saldo devedor nesse
montante que a “Norlabor” saldou através da transferência para uma conta de clientes
de cobrança duvidosa (cfr. fls 1906), criando a respectiva provisão, o que não faz
sentido pois os créditos em causa não são incobráveis e como tal aliás não são
considerados pelo fisco (as autarquias podem demorar a pagar mas pagam), pelo que
nenhuma vantagem fiscal obteria com essa operação.
Como o cheque emitido pela CMF a favor da “Norlabor” foi por esta endossado
a favor da “Translousada” esta última emitiu o respectivo recibo a favor daquela (cfr.
documento de fls 1905).
A fls 1909 consta cópia da ordem de pagamento da quantia de 7.000.000$00,
com a dedução legal de 366.66600, conforme descrito no documento de fls 1911.
Consequentemente, a 12.05.98, foi emitido um cheque de 6.633.334$00 pela
CMF a favor da “Norlabor” (cfr. documento de fls 1910), a qual por sua vez emitiu o
recibo nº 649, de 15.05.98, no valor de 7.000.000$00 (cfr. documento de fls 1907, o
qual foi apreendido nas instalações da “Norlabor”). Apesar do recibo em causa,
constante de fls 1907, apresentar um traço de anulação, o certo é que foi contabilizado o
pagamento parcial respectivo e, como tal, registado na conta-corrente da “Norlabor”
(cfr. fls 1908). De resto, na CMF encontrava-se uma cópia desse recibo sem esse traço
de anulação.
Tal montante foi depositado pela “Norlabor” na sua conta (cfr. documento de fls
1912).
Em face deste pagamento a provisão que tinha sido criada no final de 1997 pela
“Norlabor” foi anulada (cfr. fls 1908).
A fls 1914 encontra-se a ordem de pagamento relativo ao último pagamento, no
montante de 7.550.644$00, o qual, após as legais deduções, prefez o montante de
7.155.153$00 (cfr. documento de fls 1916), na sequência do qual foi emitido o
correspondente cheque pela CMF a 08.10.98 (cfr. documento de fls 1915), o qual por
sua vez foi depositado na conta da “Norlabor” a 21.10.98 (cfr. fls 1917) e registado tal
pagamento na conta-corrente existente entre as duas entidades (cfr. fls 1908).

273
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quanto aos supostos “retornos” para o chamado “saco azul”, partiu das
informações fornecidas pela investigação quanto às entregas em numerário pela “Resin”
(conforme consta do seu relatório).
Porém, não detectou nas contas e na caixa da “Norlabor” a saída de montantes
semelhantes ou iguais, pelo que não lhe foi possível fazer a ligação entre os pagamentos
efectuados pela CMF à “Norlabor” e as entregas para o “saco azul”.
Aquando da elaboração do seu relatório analisou o documento de fls 159 e estará
relacionada com a segunda entrega a 16.06.98, segundo depreende (o valor inicial
considerado – 7.000 cts – corresponde ao recibo do 2º pagamento pela CMF à
“Norlabor”, sendo certo que o montante líquido corresponde ao que de facto foi pago
pela mesma entidade, isto é, 6.633.334$00, depois de feitas as legais deduções –
33.343$00 + 333.333$00).
A referência nesse manuscrito a 800.000$00 (que não conseguiu explicar no
relatório) prender-se-á, ao que depreende, com o reembolso da diferença da taxa de IVA
(nas relações com a CMF foi de 5% por se tratar de uma empreitada, ao passo que entre
as empresas era de 17%, o que dá uma diferença de 12%).
Não consegue explicar as demais indicações contidas no manuscrito de fls 159.
Constatou-se que no manuscrito está aposta uma data de pagamento de cerca de
1 ano depois do 2º pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”.
Segundo o documento a entrega ao arguido Horácio ocorreu no dia 16.06.98,
sendo certo que o cheque emitido pela CMF a favor da “Norlabor data de 12.05.98 e o
depósito foi efectivado a 15.05.98.
Já o manuscrito de fls 163 estará relacionado com o 3º pagamento efectuado
pela CMF à “Norlabor”, efectuado a 21.10.98 (cfr. fls 162), segundo deduz (cfr. com
relevâcia o quadro de fls 22 e 22 verso do apenso 12). Constatou-se que 798.000$00
corresponde a 12% do valor da prestação em causa (7.000 cts) deduzida de 5% .
Nas contas que fazem os manuscritos referidos percorrem caminhos diferentes.

- Testemunha José António de Sousa Ferreira


Segundo ouviu dizer (não se recorda se numa reunião de vereação ou da boca do
arguido Barbieri Cardoso, na altura seu superior hierárquico) que o acordo com a
testemunha Menezes Basto terminava em determinada data (que não soube precisar),
mas o tratamento do lixo tinha de continuar, daí que a solução encontrada tenha sido a
da realização de um concurso limitado de modo a permitir a continuação dos trabalhos
na lixeira de Sendim (o lixo era despejado na lixeira, onde era compactado e
acondicionado, sendo então coberto por terra).
Tal concurso terá ocorrido em 1995 ou 1996.
Segundo se recorda as empresas convidadas a apresentar as respectivas
propostas foram a “Resin”, “Norlabor” e a “Craveira”, além de outras duas de que não
se recorda (não tem a certeza se eram a “ECOP” e a “Translousada”).
Segundo se lembra, o depoente elaborou os convites que foram endereçados às
empresas referidas a 30.11.95 (segundo lista que lhe foi fornecida pelo arguido Barbieri
Cardoso, a qual lhe havia sido remetida pela “Resin” por fax – cfr. fls 301 do apenso 21,
datado de 24.11.95), os quais, ao que pensa, foram assinados pelo director de
Departamento (o dito arguido Barbieri Cardoso).
Posteriormente a testemunha em causa admitiu que o documento de fls 301 do
apenso 21 talvez não tivesse passado pelas mãos do arguido Barbieri Cardoso na
medida em que ele normalmente despacha e assina no próprio documento,
designadamente se o quisesse remeter ao depoente, o que no caso em apreço não
sucede.

274
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi então confrontado com o documento de fls 70 e 71, do apenso 95-A, datado
de 30.11.95, e nele reconheceu a assinatura da arguida Fátima Felgueiras (trata-se do
convite dirigido à “Resin”).
Não é normal que uma das empresas a convidar para o concurso indique outras
empresas concorrentes, mas sucede por vezes perguntarem a empreiteiros a indicação de
outras empresas com capacidade para executarem os trabalhos que estiverem em causa,
sobretudo se se tratarem de trabalhos muito específicos.
As propostas deveriam ser apresentadas até 18.12.95, conforme consta dos
convites, e o prazo de execução da obra era de 30 dias.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se quando o concurso foi aberto se
destinava ao pagamento de trabalhos já efectuados ou por fazer respondeu que não
controlava no terreno os trabalhos que iam sendo executados; em todo o caso, tem a
ideia de que alguns trabalhos já haviam sido realizados, pelo que pelo menos parte dos
trabalhos a que se reporta o concurso já estariam realizados (outros trabalhos porém
ainda não estariam realizados).
Confrontado com o manuscrito de fls 2275, do 10º volume, datado de 11.04.95,
nele reconheceu a letra da testemunha Terezinha, sendo certo que referiu não conhecer o
documento em causa. Em todo o caso, depois de o ter lido referiu que lhe parece não ter
qualquer relação com o concurso em causa. Referiu porém ignorar se a proposta nele
inserta de realização de um concurso se reporta ao concurso da “execução de
plataformas” (sendo certo que não tem conhecimento de outro concurso com essa
finalidade).
O depoente não fez a apreciação das propostas apresentadas, tendo a “Norlabor”
ganho o concurso, o que lhe causou estranheza dado o facto de ser a “Resin” quem
operava na lixeira (daí que pensou que esta iria vencer o concurso). Não sabe se falou
com alguém acerca desse assunto, designadamente com o arguido Barbieri Cardoso.
Ignora também se a “Norlabor” se associou ou não à “Resin” (na altura ignorava
que a “Resin” não dispunha de alvará que lhe permitisse sozinha realizar as obras
necessárias).
Fez o auto de medição de fls 119 do apenso 95-A (o auto de consignação consta
de fls 118 do apenso 95-A), não obstante não ser o depoente quem fazia a gestão dos
trabalhos que iam sendo executados no terreno. Aliás, não foi sequer à lixeira quando
fez o auto de medição (explicou que nem sempre vai ao local fazer os autos de
medição). Recorda-se que por curiosidade passou por lá três ou quatro vezes e constatou
que os trabalhos iam sendo executados.
Era o Eng. Leite quem fazia a gestão do lixo e deve ter sido ele quem reportou
ao arguido Barbieri que os trabalhos haviam sido executados.
Não foi elaborado o auto de recepção definitiva da obra porque não houve
iniciativa nesse sentido nem da dona da obra (CMF) nem do empreiteiro.
Porém, confrontado com o documento de fls 125 do apenso 95-A (trata-se de
uma informação feita pelo depoente e dá conta de um pedido de recepção definitiva da
obra pela “Norlabor” para permitir a libertação da caução prestada), esclareceu que a
“Norlabor” apenas pediu a libertação da garantia, tendo acrescentado na informação o
pedido de recepção definitiva da obra na medida em que se trata de um pressuposto
necessário à libertação da caução.
Nessa informação referiu que a execução da obra se prolongou para além dos 30
dias previstos (indicou o dia 06.05.96 como a data da conclusão da obra), o que não se
compagina com a data do auto de medição constante de fls 119 do apenso 95-A.
*

275
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Barbieri Cardoso salientou que nunca foi chefe da testemunha José
António de Sousa Ferreira, chefiando antes um Departamento Técnico, do qual fazia
parte uma Divisão chefiada pela referida testemunha. Não obstante, não existia
propriamente com ele uma relação de subordinação.
Tem com ele uma relação de amizade pois trabalham juntos na CMF há mais de
20 anos.
A Divisão dessa testemunha era a responsável pelos concursos e pelo
acompanhamento das obras.
No concurso em causa neste ponto da pronúncia desde Abril que a testemunha
referida tinha conhecimento da sua realização, visto que o despacho do arguido Júlio
Faria a abrir o concurso é-lhe dirigido.
Ademais, a cabimentação orçamental tem de ir à Assembleia Municipal e pode
demorar meses a ser aprovada.
O Eng. José Ferreira tinha dificuldade em saber que firmas convidar, daí o fax
remetido pela “Resin” indicando as empresas a convidar (cfr. fls 301 do apenso 21).
O depoente tinha a ideia que a “Resin” não iria concorrer na medida em que não
dispunha de alvará (porém, na lista fornecida por ela, vem a mesma referida como
empresa a convidar).
De resto, não obstante lhe ter sido dirigido, o fax em causa pode nem sequer ter
chegado às mãos do depoente, pois não era responsável pelos concursos.
Seja como for, colaborou com a testemunha José Ferreira na elaboração do
concurso em causa.
Tal concurso serviu para regularizar o pagamento de obras já executadas.
Quanto ao auto de medição (cfr. documento de fls 119 do apenso 95-A), referiu
que foi elaborado na sequência de conversa com o depoente. Aliás, já explicou de que
forma se chegou à quantidade m3 ali referidos.
Ademais, o facto de não se ter ido ao local aquando da elaboração do auto de
medição prendeu-se em grande medida com o facto dos trabalhos à data já terem sido
executados.
*
- Testemunha Célia da Conceição Pacheco Lopes Martins
Referiu ter sido técnica de contas da “Norlabor” desde meados dos anos 90 até
2002.
Enquanto tal classificava e arquivava os documentos que lhe eram apresentados
e que se relacionavam com a contabilidade dessa empresa.
A PJ visitou duas vezes as instalações da “Norlabor” e pretendiam apreender
documentos relacionados com as relações estabelecidas entre essa empresa e a CMF.
Em face dos elementos de contabilidade que processou (facturas e recibos) acha
que a “Norlabor” prestou serviços para a CMF, mas não tem conhecimento pessoal
desse facto.
Como não se tratava da sua área de actividade, ignora se havia ou não na
“Norlabor” algum processo de obra relativa à lixeira de Sendim (não se recordando
mesmo se foi questionada acerca dele pela PJ aquando de uma das visitas às instalações
da “Norlabor”).
Falou com o Dr. Carlos Sousa (responsável da “Norlabor” e também sócio-
gerente da “Translousada”) acerca desse assunto.
Por norma deveria haver um processo de obra, o qual deveria estar na posse do
Eng. Barros (engenheiro responsável pela obra) ou no Departamento de Engenharia da
“Norlabor”.

276
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Acerca disso foi confrontada com as declarações prestadas perante a PJ a fls


1831, as quais confirmou, reafirmando que não acompanhou os agentes da PJ ao
arquivo da empresa para procurar o processo de obra, sendo certo que o arquivo da
contabilidade é distinto.
A esse propósito referiu que foi a Susana Maria Marques Alves quem ficou de
falar à gerência da empresa por causa do processo de obra.
A “Norlabor” colocou o crédito que tinha junto da CMF como sendo de
cobrança duvidosa, assumindo ter sido a depoente a cometer esse erro contabilístico (era
o 1º ou o 2º ano que fazia contabilidade), erro esse corrigido no ano seguinte, depois de
ter falado acerca desse assunto com o revisor oficial de contas (foi aliás ele quem a
alertou para aquele erro).
Tratou-se de um erro na medida em que a nível contabilístico não é permitido
colocar entidades do Estado como “clientes de cobrança duvidosa”.
Nega que a rectificação da situação se tivesse prendido com algum pagamento
efectuado pela CMF (conforme emerge de fls 1910 ocorreu um pagamento em 12.05.98
e a anulação da provisão teve lugar a 31.05.98, conforme mais adiante reconheceu a
testemunha).
A esse propósito foi confrontada com o extracto de conta da “Norlabor” no que
respeita às suas relações com a CMF, designadamente com fls 1906 do 8º volume (onde
consta a indicação da colocação da CMF como cliente de cobrança duvidosa no final de
1997, numa altura em que – segundo a testemunha – estaria há cerca de 1 ano na
“Norlabor”), referindo então que o documento em causa foi feito em Março de 1998,
constando que a dívida ascendia a 14.550.664$00.
Foi ainda confrontada com fls 1908 do 8º volume (onde consta a indicação do
recebimento da CMF e a anulação da provisão), tendo esclarecido que tal terá sido
afinal efectuado em 31 de Maio de 1998 porque foi nessa altura que teve a reunião com
o revisor oficial de contas.
No recibo de 7.000.000$00 emitido pela “Norlabor” com data de 13.07.98 a
favor da CMF (mas contabilizado a 31.05.98), em face do facto de inicialmente ter sido
dada como anulada, escreveu que o dito recibo é válido, ignorando se o original do
recibo (entregue na CMF) tem a mesma anotação.
Não faz ideia do valor da empreitada e do recibo global.
O recibo referido de 7.000.000$00 diz respeito à factura nº 427, constante de fls
199 do apenso 11 (18.619.680$00 + IVA).
Trata-se de um valor que considera normal para o volume de negócios da
empresa.
Confrontada com cópia do cheque emitido pela CMF, no valor de 4.738.095$00,
de 17.06.96 (constante de fls 1903), disse que, ao que pensa, reporta-se a um pagamento
parcial da factura nº 427 (de fls 199 do apenso 11), conforme se vislumbra no extracto
de fls 1908, sendo certo que a fls 1901 consta o respectivo recibo de 5.000.000$00 (cfr.
ainda a respectiva ordem de pagamento da CMF no valor líquido de 4.738.095$00 e a
nota de fls 1904 referente à retenção).
A propósito do recibo de 5.000.000$00, de 24.06.96, da “Translousada” à
“Norlabor” (cfr. fls 1905) referiu que se tratou da regularização de duas notas de débito.
A “Norlabor” comprava e tomava de aluguer máquinas à “Translousada” e é
natural que existissem notas de débito que tenham sido liquidadas conforme recibo de
fls 1905.
Ignora se o cheque cuja cópia se acha a fls 1903 foi ou não endossado à
“Translousada”.

277
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontada com cópia do cheque de fls 1910, da CMF para a “Norlabor”, no


valor de 6.633.334$00, datado de 12.05.98 (e que motivou o já referido recibo de 7.000
cts, de 13.07.98), referiu ignorar se o respectivo valor, directa ou indirectamente, foi
entregue à “Translousada” (cfr. fls 1912 – depósito desse montante na conta da
“Norlabor” a 15.05.98).
Confrontada com o documento de fls fls 38 do apenso 97 (onde consta um
recibo da “Translousada” a favor da “Norlabor” nesse valor de 6.6.33.334$00, datado de
21.10.98), referiu que nada mais sabe para além do que resulta dos documentos.
Confrontada com o cheque de fls 1915, no valor de 7.155.153$00, datado de
08.11.98, emitido pela CMF a favor da “Norlabor” e do recibo de fls 41, do apenso 97,
no mesmo valor, emitido a 22.10.98 pela “Translousada” a favor da “Norlabor”,
manteve a mesma posição (cfr. o depósito a 21.10.98 na conta da “Norlabor”, conforme
documento de fls 1917).
Referiu que a “Craveira” também teve relações comerciais com a “Norlabor”.
Ao invés, desconhece a firma “João Tello”.
Quanto ao teor das suas declarações de fls 2036, com as quais foi confrontada,
referiu não estar já recordada, pugnando no entanto pela veracidade do que então
declarou.
Referiu que deve ter perguntado à Susana como é que deveria fazer a operação
de saída de caixa.
Confirmou ainda as suas declarações de fls 2037, salientando que não tem
conhecimento de outra situação igual, a qual não é usual, mas é possível que tenha já
existido.

- Testemunha Carlos Soares da Silva


Referiu ter sido o técnico oficial de contas da “Translousada” entre 1986 até
1992, após o que foi administrador da mesma firma até 1998 (responsável pela área
comercial).
A “Translousada” estabeleceu relações comerciais com a “Resin” quando esta
iniciou o tratamento do lixo, alugando-lhe máquinas para obras, sendo certo que numa
primeira fase foram contactados pelo arguido Vítor Borges e posteriormente por
técnicos dessa empresa.
Assim, durante meses, ao que pensa em 1994 ou 1995, a “Translousada” alugou
máquinas (com o respectivo manobrador) à “Resin”, as quais operaram na lixeira de
Sendim (tais como retroescavadoras, camiões e máquinas escavadoras rotativas).
Tal maquinaria não exibia qualquer identificação da “Translousada”, sendo certo
que por vezes socorriam-se de máquinas de outras empresas.
Recorda-se que a “Resin” pagava à “Translousada” quando obtivesse o
correspondente pagamento da CMF.
Foram confrontados com o problema da “Resin” não poder obter da CMF os
pagamentos a que tinha direito por questões de ordem legal.
A “Resin” não tinha alvará e por esse motivo não podia concorrer aos concursos.
O concurso em causa neste ponto destinava-se a que a CMF pudesse pagar à
“Resin” 6 meses de trabalhos na lixeira de Sendim.
Normalmente o depoente contactava com o arguido Carlos Marinho
(responsável pela área financeira da “Resin”) ou com a Engª Cláudia. O Engº Paulo
Ribeiro (também funcionário da “Resin”) estava também a par da situação.
Uma vez que a “Translousada” não recebia da “Resin” os pagamentos a que
tinha direito (na medida em que esta não recebia o pagamento da CMF), foram
contactados por alguém da “Resin” (ao que pensa o arguido Vítor Borges, pois falava

278
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

sempre com ele a respeito deste assunto) no sentido de prestarem o respectivo auxílio
em ordem a que fossem ultrapassados os constrangimentos legais que impediam a CMF
de proceder aos pagamentos.
Para o efeito, foi-lhe dito que era necessário o lançamento de um concurso e que
para isso seria necessária a indicação de quatro ou cinco empresas a quem se iriam
endereçar convites (tratava-se de um concurso limitado).
Salientou que a “Translousada” tinha todo o interesse em manter com a “Resin”
as relações comerciais estabelecidas já que esta operava numa área de negócio que na
altura era nova (área do tratamento dos lixos).
Assim, o depoente contactou com a “Norlabor” (que tinha um sócio comum à
“Transloudada” – a testemunha Carlos Sousa), a qual aceitou ser incluída na lista de
empresas a enviar à CMF pela “Resin”, para que esta entretando remetesse depois os
respectivos convites.
Pese embora já não se recorde admite ser possível que tenha indicado outra
empresa para além da “Norlabor”.
Admitiu ainda conhecer a “Craveira” e manifestou então ter a ideia de que
contactou alguém da administração dessa empresa, já que sabia que ela tinha o alvará
necessário para que se pudesse apresentar a concurso em caso de convite.
A empresa ganhadora do concurso deveria fazer parte da lista a remeter à CMF
para que estivesse assegurado o encaminhamento para a “Resin” dos pagamentos que
iriam ser efectuados pela CMF. Tinham assim de ser convidadas empresas da confiança
da “Translousada” (a “Norlabor” era uma empresa de confiança porque tinha um sócio-
gerente comum, a testemunha Carlos Sousa).
Revelou que quando se indicaram as empresas a convidar ficou combinado que
seria a “Norlabor” a vencer, apresentando para o efeito o melhor preço (escudando-se
no facto de não ter acompanhado os pormenores desse acordo, referiu ignorar em
concreto que pessoas firmaram esse acordo).
Foi a “Resin” quem indicou os preços de cada uma das propostas apresentadas
(tem a ideia que foi a Engª Cláudia que os indicou ao depoente no que concerne às
propostas a apresentar pela “Translousada” e pela Norlabor”; pese embora sem tanta
assertividade, admite que também possa ter recebido a indicação do preço a apresentar
pela “Craveira”).
Foi o depoente quem posteriormente transmitiu essas indicações às empresas
referidas.
Por indicação da testemunha Carlos Sousa contactava o Engº Barros Sousa da
“Norlabor”.
No que concerne aos aspectos técnicos das propostas, cada empresa apresentou a
respectiva proposta conforme estava habituada a fazer.
Referiu porém que os técnicos da “Resin” deram orientações quanto a aspectos
técnicos específicos (seja como for, no anúncio do concurso constam os items a que
teriam de dar resposta).
Sabia assim de antemão que a “Norlabor” iria vencer o concurso.
Segundo lhe foi transmitido, a “Resin” não venceria o concurso porque não tinha
alvará (e nessa medida não iria concorrer).
Referiu que a “Translousada” concorreu consorciada com outra empresa (acha
que é possível que o tenha feito consorciada com a firma “Cunha Soares e Filhos, Ldª –
de que é o actual director comercial – por ter o alvará necessário. Tal empresa estava
porém mais vocacionada para a instalação de cabos de alta tenção ao passo que a
“Norlabor” estaria mais vocacionada para a área em questão, além de que a testemunha

279
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Carlos Sousa era sócio gerente dessa empresa e da “Translousada, daí que fosse uma
empresa de confiança).
Tem a ideia que a CMF convidou assim a “Translousada”, a “Norlabor” e a
“Craveira” (cfr. os convites, constantes de fls 70 e 71 do apenso 95-A).
Salientou porém que, não obstante, os trabalhos já estavam executados e
reportavam-se a trabalhos levados a cabo pela “Resin” durante 6 meses na lixeira de
Sendim.
Referiu não se recordar do preço apresentado pela “Norlabor”, mas andaria na
casa dos 17 ou 18.000 cts (admite ser possível que rondasse os 19.000.000$00).
A “Norlabor” facturava os serviços prestados na lixeira à CMF (como se tivesse
executado a obra), a “Translousada” facturava os mesmos serviços à “Norlabor” (depois
de ver os documentos de fls 63 a 67 e 70 do apenso 97 corrigiu o seu depoimento e
reconheceu que a “Translousada” facturava à “Norlabor” o aluguer de máquinas, mas
exactamente no mesmo valor do débito da CMF, sendo certo que nenhuma máquina foi
alugada à “Norlabor” no âmbito daquela obra pois não foi executada por esta mas pela
“Resin”) e a “Resin” facturava à “Translousada” os serviços levados a cabo na lixeira de
Sendim (nas facturas respectivas, constantes de fls 161 a 167 do apenso 97 consta a
cedência de know how técnico; a testemunha confirmou serem as facturas em causa as
que foram emitidas pela “Resin”). Consequentemente, a CMF pagava esses serviços à
“Norlabor”, a qual por sua vez fazia chegar à “Translousada” esses pagamentos, os
quais por sua vez tinham como destino final a “Resin”.
Para o efeito, os cheques da CMF eram endossados à “Resin” ou as quantias por
eles tituladas eram depositadas e depois emitidos cheques da “Translousada”.
Se não lhe falha a memória, expressou a convicção de que os serviços foram
pagos em 3 ou 4 vezes.
No que respeita ao primeiro pagamento da “Norlabor” à “Translousada” referiu
que esta última depositou o cheque que recebera da CMF e um dos sócios (Eng. Barros
Sousa) emitiu um cheque pessoal à “Translousada” do valor correspondente (especulou
que tal se deveu ao facto da “Norlabor” ter sido pressionada a transferir de imediato o
pagamento que recebera da CMF, pelo que um dos seus sócios adiantou o dinheiro,
numa altura em que o pagamento pela CMF ainda não estaria disponibilizado).
Expressou ter a ideia de ter sido a “Norlabor” a levantar na CMF os pagamentos
respectivos, mas acerca desse facto não se mostrou muito assertivo.
Referiu que não foi exigida qualquer caução pelo dono da obra (CMF) pois já
estava executada.
O camião mencionado, segundo expressou sem grande assertividade, reporta-se
a outra obra e destinou-se ao transporte de resíduos.
Uma vez que a CMF atrasou-se nos pagamentos (segundo invocava por
dificuldades de ordem financeira) tentou-se diligenciar no sentido desses pagamentos
serem efectuados, razão pela qual o Dr. Carlos Sousa chegou a ter uma reunião na CMF,
ao qual o depoente não esteve presente. Ignora se nessa reunião participou alguém da
“Resin” ou da “Ecop”, embora admita tal possibilidade.
Não tem presente se nessa reunião se acordou numa caladarização dos
pagamentos, mas tem a ideia de que a CMF se comprometeu a ser mais célere nos
pagamentos.
Tem a ideia de uma dilação de cerca de 2 anos entre o primeiro e o último
pagamento, num total de três.
Uma vez que o dinheiro não pertencia à “Norlabor” esta empresa não
diligenciou pela obtenção do pagamento por parte da CMF.

280
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ignora se a “Norlabor” colocou a CMF como “cliente de cobrança duvidosa”.


Tal não seria uma situação normal uma vez que se tratava de uma câmara municipal,
ignorando se alguma situação idêntica alguma vez teve lugar.
Referiu porém que é frequente as câmaras municipais atrasarem-se nos
pagamentos, o que poderá motivar a instauração de acções judiciais para cobrança
desses créditos. Nesse contexto, o crédito deve ser considerado de cobrança duvidosa
(ou quando o credor tem essa percepção).
Foi então confrontado com cópia dos cheques emitidos pela CMF (a fls 1903,
datado de 17.06.96; 1910, datado de 12.05.98; e 1915, datado de Outubro de 1998).
Constata-se que o valor líquido pago pela CMF (deduzidas das legais retenções
e com uma taxa de IVA a 12%) coincide com o valor da empreitada.
Referiu ignorar de que forma as empresas tratavam da diferença de valores, mas
o normal seria que as verbas em causa, respeitantes à diferença, ficassem em conta-
corrente até se encontrar forma de regularizar essa diferença de valores.
Ignora se essa diferença de valores foi considerada pela “Resin” como perda de
exercício no que se refere à “Translousada”.

- Testemunha Susana Maria Marques Alves


Referiu ser escriturária na “Norlabor” desde 1992, ocupando-se da área
financeira da empresa, no âmbito da qual processa os salários dos trabalhadores, emite
facturas e recibos. Já esteve também nos recursos humanos dessa empresa.
Em 1995/96 fazia um pouco de tudo nas suas funções de escriturária.
Admitiu ter sido a depoente quem elaborou a factura de fls 1899 referente à obra
em causa (factura nº 427), uma vez que tinha a função de elaborar as facturas.
Uma vez que elaborou a mencionada factura parte do pressuposto que a
“Norlabor” executou os trabalhos nela mencionados. Tem a ideia aliás da “Norlabor” ter
tido uma empreitada cujo dono da obra era a CMF, pelo que essa factura deverá referir-
se a essa empreitada de que tem memória.
Ignora se a factura nº 427 se reporta ao valor global da obra em causa.
Confirmou que a PJ visitou as instalações da “Norlabor” mas não se recorda
muito bem desse episódio.
Recorda-se de ter andado com colegas (pensa que com a testemunha Célia
Martins) à procura do processo referente à obra em causa no arquivo da empresa mas
não o encontrou. Não pode assegurar se mais tarde tentaram ou não localizá-lo.
Esclareceu que normalmente o processo de referente a determinada obra
encontra-se com o engenheiro responsável, o que não sucedeu neste caso, situação que
não é normal.
Não se recorda de ter falado acerca desse assunto com algum responsável da
empresa.
Confrontada com o documento de fls 1901 do 8º volume referiu ter sido
elaborado pela depoente, explicando que se tratou de um recibo referente a um
pagamento parcial efectuado pela CMF (5.000.000$00).
Idêntica posição assumiu relativamente ao documento de fls 1907 do 8º volume
(7.000.000$00). Relativamente a este documento esclareceu que apôs quer a expressão
“anulado” quer a expressão “não está anulado”, sendo certo que pela letra parece-lhe
que terá sido a testemunha Célia Martins quem apôs a expressão “este recibo é válido”.
Referiu não se recordar da razão de ser da aposição daquelas menções.
Também no que respeita ao recibo de fls 1913 do 8º volume, no valor de
7.550.664$00, referiu tê-lo elaborado (tanto mais que tem a sua rubrica).
Os valor dos 3 recibos prefaz o valor da factura nº 427.

281
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontada com os documentos de fls 1903 do 8º volume (cópia de um cheque


emitido pela CMF, no montante de 4.738.095$00, a que corresponde o recibo de fls
1901, de 5.000.000$00; cfr. ainda a ordem de pagamento de fls 1902), 1910 do 8º
volume (cópia de um cheque emitido pela CMF, no montante de 6.633.334$00, a que
corresponde o recibo de fls 1907, de 7.000.000$00; cfr. ainda a ordem de pagamento de
fls 1909) e de fls 1915 do 8º volume (cópia de um cheque emitido pela CMF, no valor
de 7.155.153, a que corresponde o recibo de fls 1913, de 7.550.664$00; cfr. ainda a
ordem de pagamento de fls 1914), referiu não ter memória deles, embora os deva ter
visto.
Os cheques normalmente eram depositados pela empresa.
Foi então confrontada com os talões de depósito na conta da “Norlabor” dos
cheques de fls 1910 e 1915, respectivamente a fls 1912 e 1917.
Assegurou não saber se a “Norlabor” fez pagamentos de igual montante à
“Translousada”.
Em todo o caso, existiam relações comerciais entre as duas empresas (a
“Norlabor” comprou máquinas à “Translousada”), as quais aliás tinham um sócio
comum (ao que pensa o Dr. Carlos Sousa).

- Testemunha Maria de Salomé Ferraz da Silva Vale


Referiu ter trabalhado para a “Norlabor” há cerca de 12-14 anos durante cerca de
1 ano e meio (terá sido em 1995/96, mas não tem a certeza).
Competia-lhe ir ao correio, proceder ao pagamento dos salários dos
funcionários, entregar propostas, fiscalizar se os funcioinários estavam a trabalhar nas
obras para controlar as faltas.
Recorda-se de ter ouvido falar na “Translousada”, mas não tem conhecimento de
relações comerciais entre essa empresa e a sua então entidade patronal.
A “Norlabor” desenvolvia a sua actividade na área da construção civil e fazia
também empreitadas para a “Portugal Telecom”.
Não conhece a “Craveira”.
O Dr. Carlos Sousa era o gerente da “Norlabor”. Não sabe se era sócio de outras
empresas.

- Testemunha José António Brandão Barros Sousa


Referiu que é accionista da “Norlabor” desde que se transformou em sociedade
anónima (em 1994), tendo sido o respectivo gerente entre 1994 até por volta do ano
2003 (antes disso, desde 1989/90 que tinha uma quota nessa firma, então sociedade por
quotas).
Referiu ter sido formalmente sócio da “Translousada” em 1996/97. Só o foi
“formalmente” na medida em que a respectiva quota pertencia de facto a um seu sócio
na “Norlabor” (a testemunha Carlos Pereira de Sousa), o qual lha transmitiu
ficticiamente porquanto estava em ruptura conjugal, correndo já o respectivo processo
de divórcio.
Teve também uma quota na “Craveira”, talvez em 1994/95. A testemunha
Carlos Sousa tinha também uma quota nessa empresa.
A “Norlabor” só ganhou um concurso limitado aberto pela CMF a pedido da
“Translousada” (haveria de mais tarde construir o ecocento em Felgueiras para a
AMVS). De facto, o Sr. Carlos Silva (da “Translousada”) disse-lhe que necessitava de
rectificar uma situação para poder receber o pagamento dos trabalhos que efectuava no
aterro de Felgueiras e que para o efeito seria necessária a participação da “Norlabor”
num concurso limitado referente precisamente a trabalhos já efectuados no dito aterro

282
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pela “Translousada”. Tal testemunha transmitiu-lhe assim que necessitava de um grupo


de empresas para concorrerem ao dito concurso limitado, uma das quais a “Norlabor”.
Ele explicou-lhe aliás que a CMF pagaria os trabalhos realizados através desse concurso
e deu a entender que seria a “Norlabor” a ganhá-lo. Deduz que não seria a
“Translousada” a vencer esse concurso por não ter alvará.
Deduz que idêntico pedido tenha sido feito aos outros concorrentes, mas a como
a “Norlabor” estava mais próxima da “Translousada” pelo facto de ter um sócio comum
e de serem empresas pequenas terá sido essa a razão pela qual se dicidiu que seria
aquela a vencer o concurso.
Em face do pedido que lhe foi feito falou com os outros sócios da “Norlabor” (as
testemunhas Carlos Sousa e Adriano Rafael de Sousa Ferreira) e acederam então em
fazer esse favor à “Translousada” (até porque a testemunha Carlos Sousa era também
sócio dessa empresa).
Aguardaram então o convite da CMF como lhe havia sido dito pela testemunha
Carlos Silva, o que de facto se veio a verificar.
A proposta de candidatura foi então elaborada na “Norlabor” mas de acordo com
as indicações fornecidas pela testemunha Carlos Silva.
Confrontado com as diferentes propostas apresentadas (cfr. fls 118 e ss. do
apenso 98) constatou-se que todas, com excepção da proposta apresentada pela
“ECOP”, têm a mesma estrutura, só divergindo nos preços.
Ficou combinado com a “Translousada” que a “Norlabor” só lhe pagaria na
medida em que recebesse da CMF.
Confrontado com o documento de fls 129 do apenso 97 (contrato de adjudicação
da empreitada à “Norlabor”) nele reconheceu a sua assinatura e a assinatura de Adriano
Rafael de Sousa Ferreira em representação da “Norlabor” e a assinatura da arguida
Fátima Felgueiras em representação do Município de Felgueiras.
Esclareceu que esse contrato foi assinado na CMF e que a arguida Fátima estava
presente. Todas as assinaturas foram apostas de resto naquele acto (facto negado pela
arguida Fátima Felgueiras, a qual assegurou que não esteve presente e que apôs a sua
assinatura no contrato em momento diferente. De resto, segundo referiu, só
esporadicamente e por deferencia é que está presente no momento da assinatura de
contratos de empreitada pelos legais representantes das firmas empreiteiras. Não foi este
o caso segundo assegurou).
Assegurou que a “Norlabor” nada fez no âmbito dessa empreitada.
Ficou convencido que a CMF sabia que a realização do concurso limitado em
causa mais não era do que um meio de regularizar os pagamentos a quem executou os
trabalhos.
Confirmou que assinou o auto de consignação da obra, datado de 29.01.96 (cfr.
documento de fls 118 do apenso 95-A). Explicou que não esteve presente nesse acto e
que foi a testemunha Carlos Silva quem lhe trouxe tal documento para assinar (o auto de
medição consta de fls 119 do apenso 95-A).
A “Norlabor” emitiu apenas uma factura (cfr. fls 122, do apenso 95-A ou fls
1809 dos autos), no valor de 18.619.680$00 + IVA (19.550.664$00).
Tal factura foi paga pela CMF em dois ou três cheques. Recorda-se que os
pagamentos demoraram muito a serem efectuados e que o Sr. Carlos Silva pedia à
“Norlabor” que pressionasse a CMF no sentido de concretizar os pagamentos. Foi nesse
sentido que se remeteu a missiva de fls 293 do apenso 97 à CMF a solicitar uma reunião
por causa do atraso nos pagamentos (tal missiva foi assinada por uma funcionária
administrativa da “Norlabor”).

283
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Recorda-se aliás que certa vez o Sr. Carlos Silva compareceu na “Norlabor” e
trazia um cheque da CMF referente a um dos pagamentos em causa, que o depoente, em
representação da “Norlabor”, endossou à “Translousada” (cfr. cheque de fls 1903 do 8º
volume, de 17.06.96.
De resto, era o Sr. Carlos Silva que entregava os recibos da “Norlabor” à CMF
contra o recebimento dos cheques desta.
Outro dos pagamentos efectuados pela CMF foi concretizado através do cheque
cuja cópia se acha a fls 1910 do 8º volume (ou fls 158 do apenso 95-A), de 12.05.98.
Não endossou esse cheque à “Translousada” na medida em que só ficaria
disponivel cerca de 5 dias depois, daí que tenha emitido um cheque pessoal naquele
valor, concordando assim em antecipar o pagamento à “Translousada” (cfr. o respectivo
depósito a fls 1912 dos autos), pois estavam “aflitos” para receber.
Por fim, o cheque de fls 1915 do 8º volume, datado de 08.10.98, no montante de
7.155.153$00, diz respeito ao terceiro e último pagamento efectuado pela CMF (cfr. o
depósito a fls 1917 dos autos).
Confrontado com o documento de fls 1906 do 8º volume (extracto de conta da
“Norlabor” relativo à CMF), referiu não saber explicar porque motivo o crédito que
detinham sobre a CMF foi considerado de cobrança duvidosa, deduzindo que se tratou
de algum arranjo contabilístico. Certo é que nada percebe de contabilidade e não deu
qualquer instrução para que se procedesse daquele modo.
Os documentos contabilísticos que justificaram os pagamentos da “Norlabor” à
“Translousada” são as facturas de fls 63 a 67 do apenso 97 emitidas por esta àquela
(reportam-se a aluguer de equipamento), sendo certo que, no que toca à obra em causa,
a “Translousada” não alugou qualquer equipamento à “Norlabor”. Tal pretexto foi a
justificação encontrada para os referidos pagamentos da “Norlabor” à “Translousada”.
No que toca a outras obras a “Translousada” chegou a alugar equipamento à
“Norlabor”, mas não na obra em causa (até porque a “Norlabor” nada executou na
mesma).
A propósito da “cedência” de alvarás de empresas que depois nada farão na obra
referiu que tal é prática corrente para que as empresas possam cumprir todas as
exigências dos concursos aos quais concorrem.
Não sabe que trabalhos foram executados no local pela “Translousada” mas
disseram-lhe que se tratou de movimentação de terras.
Quando passou pelo local viu uma placa que dizia “Resin”(empresa que aliás só
conhecia de nome) e viu equipamento sem identificação da empresa proprietária mas
que o Sr. Carlos Silva dizia ser da “Translousada”.

- Testemunha Adriano Rafael de Sousa Ferreira


Referiu ter sido gerente da “Norlabor” desde 1995 até 2003. Foi também
accionista dessa empresa. A testemunha Carlos Sousa é seu irmão e foi também
accionista dessa empresa.
A “Norlabor” concorreu a uma obra ligada ao aterro de Felgueiras. Tratou-se de
um favor que fizeram à “Translousada”.
O Sr. Carlos Silva (da “Translousada”) falou com a testemunha José António
Brandão Barros Sousa no sentido da “Norlabor” concorrer ficiticiamente a um concurso
para execução de uma empreitada na lixeira de Felgueiras e que iria ser aberto de modo
a poderem receber os respectivos pagamentos pelos trabalhos já ali executados, segundo
lhe foi dito.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Como o depoente estava mais ligado à área de produção da “Norlabor”


desconhece todos os pormenores, tanto mais que tudo foi tratado com a testemunha José
António Brandão Barros Sousa.
Acederam ao pedido do Sr. Carlos Silva na medida em que ele era sócio com o
seu irmão Carlos Sousa numa empresa (acha que precisamente na “Translousada”).
A proposta apresentada pela “Norlabor” foi “trabalhada” pelo Sr. Carlos Silva.
Confrontado aliás com as propostas apresentadas pela “Norlabor”,
“Translousada” e “Craveira” constatou que eram exactamente iguais, divergindo apenas
nos preços.
Ganharam o concurso mas nada executaram na obra em causa.
Assinou o respectivo contrato (cfr. doc. de fls 129 e 130 do apenso 97) com a
testemunha José António Brandão Barros Sousa em representação da “Norlabor” e a
arguida Fátima Felgueiras em representação do Município de Felgueiras. Ela aliás
esteve presente e as assinaturas foram apostas no mesma altura (só estavam 4 pessoas na
sala). Essa foi a única vez que se deslocou à CMF (a arguida Fátima Felgueiras negou
que tivesse estado presente no momento em que esta testemunha e a testemunha Barros
Sousa assinaram o contrato em representação da “Norlabor”, sustentando que as
testemunhas em causa se equivocaram).
O depoente limitou-se a assinar o respectivo contrato sendo certo que tudo o
resto foi tratado entre a “Translousada” e a testemunha José António Brandão Barros
Sousa.
Não se recorda de ter visto algum cheque da CMF, mas sabe que o pagamento
foi efectuado em várias prestações. Não sabe de que modo esses pagamentos se
processaram e de que forma chegaram à “Translousada”.
Não sabe se a CMF foi colocada como cliente de cobrança duvidosa.
O que consta do contrato corresponde aos trabalhos que haviam sido já
executados pela “Translousada”.
Esclareceu que a “Translousada” tinha relações comerciais com a “Norlabor”
pois esta última comprou-lhe e recebeu de aluguer equipamento.
Era habitual (hoje não é tão frequente) o “empréstimo” de alvarás entre
empresas a fim de serem usados nos concursos a que concorriam.

- Testemunha Carlos Ferreira de Sousa


Foi sócio da “Translousada” desde a sua fundação (em 1986) até 2001 ou 2002,
mas com períodos de interregno.
É accionista da “Norlabor”, tendo deixado de ser administrador dessa empresa
em 2002 ou 2003.
Não tem qualquer ligação com a firma “Craveira”.
Existiam relações comerciais entre a “Translousada” e a “Norlabor” na medida
em que aquela vendia e alugava equipamentos para a área do ambiente.
A “Translousada” tinha de resto um parque de máquinas que vendia ou alugava.
Uma vez que não estava ligado à área dos concursos não tem conhecimento
directo dos factos em causa, sendo certo que era o Sr. Carlos Silva quem tratava desses
assuntos.
De resto, só aquando da busca pela PJ à “Norlabor” é que se apercebeu que essa
empresa havia feito um favor à “Translousada” num concurso aberto pela CMF. De
facto, a “Norlabor” dispôs-se a concorrer ao concurso em causa porque tinha o alvará
necessário e a “Translousada” não, de modo a que o dinheiro referente ao pagamento
dos trabalhos (que já tinham sido executados) chegasse à “Translousada”, pois tinha
sido ela quem os tinha executado.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi a testemunha Carlos Silva quem contactou a testemunha Barros Sousa no


sentido da “Norlabor” concorrer a esse concurso. Nessa altura os sócios da “Norlabor”
eram, para além do depoente e do dito Barros Sousa, o seu irmão Adriano Rafael de
Sousa Ferreira.
Só o depoente tinha uma ligação à “Translousada” (era sócio).
Salientou que o favor efectuado pela “Norlabor” à “Translousada” o foi à sua
revelia e numa altura em que por razões de ordem familiar tinha cedido
temporariamente a sua quota à testemunha Barros Sousa.
Não se recorda de lhe ter sido transmitido o pedido efectuado pela
“Translousada”. Em todo o caso, se o tivessem consultado daria o seu assentimento,
pois era sócio da “Translousada”.
Posteriormente foi-lhe dito que a “Translousada” necessitava desse favor para
cativar um seu cliente (a “Resin”). De facto, a “Translousada” pretendia receber da
“Resin” os pagamentos a que tinha direito por força dos trabalhos que levou a cabo na
lixeira de Felgueiras a título de subempreitada e tal seria mais fácil se por sua vez a
“Resin” (o empreiteiro) recebesse o pagamento da CMF referente aos trabalhos levados
a cabo na dita lixeira de Felgueiras.
Ignora que trabalhos ali foram desenvolvidos.
Desconhece a identidade dos outros concorrentes ao dito concurso promovido
pela CMF.
Não sabe mesmo se a “Translousada” concorreu, sendo certo porém que não
tinha o alvará necessário para o efeito, a menos que concorresse associada a uma
empresa que dispunha do necessário alvará.
Ignora ainda qual o tipo de concurso promovido pela CMF.
Segundo lhe disseram mais tarde foi a “Norlabor” quem venceu o concurso.
Disseram-lhe ainda que foi o Sr. Carlos Silva quem orientou a apresentação da
proposta da “Norlabor” e da “Craveira” (das demais concorrentes não sabe).
A “Norlabor” estava vocacionada para obras em telecomunicações mas queria
diversificar os seus negócios para empreitadas de obras públicas, daí o seu interesse na
“Craveira”.
Como quando se pede um favor se contactem as pessoas conhecidas, deduz que
foi por essa razão que o Sr. Carlos Silva terá contactado a “Norlabor”, empresa que
conhecia. Em todo o caso, seria a CMF quem teria de endereçar os convites respectivos.
Ignora se a testemunha Carlos Silva recebeu por sua vez orientações da “Resin”,
designadamente do arguido Vítor Borges.
Tem a ideia de que a PJ não encontrou o processo de obra referente ao concurso
em causa e que lhes foi dito que provavelmente estaria nas antigas instalações da
empresa, tendo sido sugerida a requisição de uma 2ª via à CMF.
Teve então a oportunidade de se inteirar da situação e de ver a factura emitida
pela “Norlabor” (factura nº 427, constante de fls 1899, datada de 26.02.96) e de conferir
os pagamentos efectuados pela CMF.
Segundo lhe foi dito, não obstante a celebração do contrato a que se reporta fls
129 e 130 do apenso 97 com a CMF, a “Norlabor” nada fez na lixeira de Felgueiras,
pois as obras teriam sido executadas pela “Translousada”.
Foram as testemunhas Carlos Silva e Barros Sousa quem lhe disseram que os
trabalhos já haviam sido executados e que o concurso mais não serviu do que para
permitir a realização dos pagamentos pela CMF.
Não se recorda de ter tido qualquer conversa com a testemunha Carlos Silva em
que ele tenha mencionado que as máquinas que operavam na lixeira de Felgueiras
pertencessem à “Translousada”.

286
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi-lhe ainda dito que a CMF emitiu 3 ou 4 cheques e que a “Norlabor” tinha de
entregar as quantias recebidas à “Translousada”.
Não sabe se a testemunha Carlos Silva pediu à “Nrlabor” para insistir junto da
CMF pelos pagamentos.
A testemunha em causa foi então confrontada com os cheques emitidos pela
CMF à “Norlabor” e constantes de fls 1903 (datado de 17.06.96, no valor de
4.738.095$00), 1910 (datado de 12.05.98, no valor de 6.633.334$00) e 1915 (datado de
08.10.98, no valor de 7.155.153$00).
Em face da demora nos pagamentos ignora que atitude tomou a “Norlabor”,
designadamente a transferência do crédito em causa para a conta de clientes de cobrança
duvidosa, como resulta do documento de fls 1906 dos autos.
Em todo o caso referiu que sendo a CMF a devedora o crédito em princípio não
seria de cobrança duvidosa, sucedendo porém normalmente atrasos no seu cumprimeito.
Deduz que terá sido um arranjo contabilístico para efeitos fiscais.
Por outro lado, confrontado com a missiva de fls 293 do apenso 97, referiu que
deveria ter sido a “Translousada” que estaria por detrás da remessa dessa missiva da
“Norlabor” à CMF por causa do atraso nos pagamentos pois era ela quem estava
interessada no recebimento.
Normalmente a “Norlabor” depositava os cheques da CMF e emitiria cheques
seus à “Translousada”. Se chegou a endossar cheques da CMF fugiu à prática habitual
na empresa.
Não tem conhecimento de outras obras em Felgueiras da responsabilidade da
“Norlabor”, ainda que para a AMVS, conforme é referido no ponto 1.5.
Nunca existiu a percepção dos responsávies da “Norlabor” de que se estava a
cometer qualquer ilícito criminal.

- Testemunha Manuel Ferreira de Faria


Tem a ideia da “Norlabor” ter vencido um concurso promovido pela CMF, mas
em concreto ignora qual o objecto do concurso .
Nunca foi à lixeira de Sendim.
Não sabe quem são as empresas “Translousada” e “João Tello”.

- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal


Foi o departamento do Engº Ferreira Leite (Chefe da DATA até 2000 – Divisão
de Apoio Técnico e Administrativo, integrado no Departamento Técnico) que elaborou
o programa de concurso e o caderno de encargos respectivo. A DATA tinha a seu cargo
os concursos até 2000 e a partir de então tal competência passou para o Departamento
de Obras.
Como o concurso em causa era limitado, pelo Departamento Técnico foram
feitos e remetidos os convites (ao que pensa o número mínimo de convites era de 5 –
cfr. o fax de fls 301 do apenso 21, datado de 24.11.95, dirigido à CMF, à atenção do
Director do Departamento Técnico – o arguido Barbieri Cardoso - e que se reporta à
lista das empresas a convidar segundo indicação da “Resin” à CMF; cfr. ainda um dos
convites a fls 70 do apenso 95-A, datado de 30.11.95, assinado pela arguida Fátima
Felgueiras na qualidade de presidente da autarquia).
A depoente esteve presente no acto público de abertura das propostas e preparou
o contrato que viria a ser celebrado com a “Norlabor”.
Não sabe o que esteve na origem da decisão de abertura deste concurso.
Confrontada com o documento de fls 2275 do 10º volume, datado de 11.04.95,
referiu tratar-se de um manuscrito da testemunha Terezinha dirigido ao então presidente

287
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

da CMF (o arguido Júlio Faria). Referiu desconhecer a existência de tal documento, só


dele tendo ouvido falar recentemente pela testemunha Terezinha, a qual inclusive lhe
referiu que foi questionada acerca dele pela PJ e que não se recordava com nitidez do
teor da informação em causa. Em todo o caso, aquando da preparação do concurso não
se recorda de lhe ter sido comunicado o teor da informação em causa.
A depoente confirmou a identidade das concorrentes conforme descrito na
pronúncia e referiu não encontrar qualquer explicação para que uma das concorrentes (a
“Resin”) tenha indicado as outras empresas a convidar, não tendo mesmo ideia de
semelhante coisa ter ocorrido noutro concurso limitado.
Em todo o caso, o Engº Ferreira Leite perguntava pela indicação de empresas
que operavam na área em causa nos concursos se as não conhecia para que se pudessem
endereçar os convites respectivos.
Os contratos normalmente são assinados no seu gabinete pelos empreiteiros, mas
não se recorda se o contrato de fls 129 e 130 do apenso 97 foi assinado no seu gabinete
ou no gabinete da arguida Fátima Felgueiras.
Tratam-se de contratos dos quais já existem minutas e muitas vezes a arguida
Fátima assinava normalmente ao fim do dia, em momento diferente do momento da
assinatura pelos empreiteiros. No caso em apreço não se lembra se todos assinaram na
mesma altura.

- Testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues Carvalho


Salientou que apenas tem conhecimento dos contratos para os cabimentar e
depois proceder aos pagamentos. Antes disso deles não tem conhecimento.
Consequentemente, a situação em causa neste ponto não foi excepção, pois não se
recorda de ter tido qualquer intervenção anterior no que respeita à celebração do
contrato em causa com a “Norlabor”.
Porém, confrontada com o documento de fls 2275, reconheceu tratar-se de um
documento manuscrito e assinado por si (trata-se de uma informação dirigida ao
presidente da autarquia, à data o arguido Júlio Faria). Explicou que se trata de um
resumo de uma reunião ocorrida na CMF (no gabinete da presidência) a 11.04.95 e em
que esteve presente (não se recorda a que horas ocorreu tal reunião). Além da depoente
estiveram presentes os arguidos Júlio Faria, Vítor Borges e Barbieiri Cardoso. Nesse
documento fez um apanhado da situação relativamente ao contrato de transacção (à data
tinha sido paga apenas uma prestação), ali se referindo que esse dinheiro se destinava à
“Resin”. Não obstante formalmente esse contrato ter sido celebrado com a testemunha
Menezes Basto o certo é que ele não esteve presente nessa reunião.
Faz-se ainda nesse documento alusão ao valor que faltava liquidar relativamente
ao contrato de compra e venda do terreno onde se situava a lixeira e à facturação da
“Resin” e que estava pendente na contabilidade por inexistir suporte legal para a pagar
(inexistência de qualquer contrato).
Para ultrapassar a situação foi decidido abrir um concurso limitado nessa
reunião, segundo o que se observa na aludida informação. Explicou que teria de
verificar se no orçamento camarário existia ou não verba disponível que permitisse a
concretização desse concurso e a celebração do subsequente contrato de empreitada
com a firma vencedora. É por isso que nessa informação dá conta da necessidade de
reforçar a rúbrica respectiva em 60.000 cts, de modo a poder-se resolver o pagamento
das facturas pendentes e das facturas futuras. Para o efeito era necessário ir buscar esses
60.000 cts a outras rúbricas do orçamento, o que implicou o cancelamento de outros
investimentos por parte da CMF.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A “Resin”, por sua vez, prontificou-se a anular as facturas já emitidas (o


contrato deveria preceder a emissão das facturas, o que não sucedia neste caso, razão
pela qual não poderiam ser pagas). Não sabe se as facturas em causa são aquelas que
foram juntas pelo arguido Carlos Marinho já no decurso da audiência de julgamento
(cfr. fls 12320 e ss.), mas admite essa possibilidade.
A solução encontrada teria contudo de ser aprovada em reunião de Câmara.
Explicou a expressão contida na informação “outra justificação que não o
tratamento do lixo” com o facto de se tratar apenas de uma prestação de serviços que
não tinha cabimento na rúbrica referida, daí a necessidade de se dar “outra justificação”.
De facto, se as facturas em causa referissem o tratamento do lixo a rúbrica deveria ser
outra.
Explicou ainda que existe sempre a possibilidade de se fazer alterações
orçamentais de modo a reforçar uma rúbrica à custa de outras. Como a solução
encontrada foi a abertura de um concurso de empreitada a rúbrica teria de ser aquela que
naquele documento é referida.
Constata-se que nessa informação, no canto superior direito, o arguido Júlio
Faria apôs um despacho no sentido de que tomou conhecimento e de concordância com
o respectivo teor, mais determinando a extracção de cópia da informação para si, para o
Chefe da Divisão de Saneamento Básico (Eng. Ferreira Leite) e para o Director do
Departamento Técnico (o arguido Barbieri). Salientou que a remessa de cópia para cada
um deles nada tem a ver com o facto de terem estado ou não presentes em tal reunião,
pois quer o arguido Barbieri quer o arguido Júlio Faria estiveram presentes em tal
reunião.
Depois disso nunca mais esteve ligada a esse assunto.
Ignora se o contrato entretanto celebrado com a “Norlabor” se prendia ou não
com a execução de plataformas. Salvo erro tratava-se de uma empreitada a ser
executada na lixeira de Sendim.
Tal contrato entretanto chegou à contabilidade e os procedimentos
desencadeados seriam então os normais em idênticas situações: eram-lhe dirigidas as
facturas emitidas pelo empreiteiro para proceder ao respectivo pagamento e os
respectivos autos de medição, se os houver, devendo o responsável pela fiscalização da
execução da obra confirmar a respectiva execução com a colocação de um visto nas
facturas. Havendo verba disponível as facturas seriam pagas por orientação superior
através da respectiva ordem de pagamento.
No caso em apreço não se recorda quem visou as facturas.
Não se recorda igualmente do valor do contrato.
Os cheques de pagamento eram remetidos pelo correio ou eram entregues
pessoalmente (hipótese menos frequente). Por via de regra eram entregues contra a
entrega do respectivo recibo, mas como os cheques nunca eram emitidos ao portador
existia prova bastante do pagamento ter sido efectuado.
Quando os cheques eram entregues pessoalmente a identificação da pessoa a
quem eram entregues era feita apenas verbalmente, daí que pudesse suceder a entrega
indevida de cheques a certa pessoa que se fazia passar por outra.
Não se recorda se o pagamento à “Norlabor” foi pago numa ou em várias
prestações (cfr. as respectivas ordens de pagamento, os três cheques emitidos pela CMF
e respectivos recibos a fls 1902 e ss. dos autos).
Tem a ideia de que a CMF apenas celebrou com essa empresa um único contrato
(em causa no ponto em questão).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi então confrontada com a cópia da única factura emitida pela “Norlabor” no
âmbito do contrato referido, cuja cópia se acha por exemplo a fls 1891 do 8º volume (no
valor de 19.550.664$00, datada de 26.02.96 e reportada à execução de plataformas).
Referiu que essa factura lhe deve ter passado pelas mãos mas não se recorda
dela. Constata que tal factura não está visada (o documento em causa foi apreendido na
“Norlabor”). Também no respectivo original (constante de fls 199 do apenso 11) não
consta qualquer visto.
No que respeita ao primeiro pagamento a ordem de pagamento respectiva consta
de fls 1902, no valor de 4.738.095$00 (valor líquido depois de efectuadas as legais
retenções; o valor ilíquido é de 5.000 cts) e o cheque emitido pela CMF nesse valor
líquido, datado de 17.06.97 consta de fls 1903.
No que respeita ao segundo pagamento a ordem de pagamento consta de fls
1909 (no valor líquido 6.633.334$00) e o cheque emitido pela CMF nesse valor a
12.05.98 consta de fls 1910. O recibo de fls 1907 (igual ao que consta de fls 188 do
apenso 11, o qual só apresenta uma via), tem a indicação de anulado e depois a
indicação de que é válido, o que significa que terá sido entregue na CMF (no
documento de fls 200 do apenso 11 existem já 3 vias desse recibo).
No que concerne ao terceiro pagamento a respectiva ordem consta de fls 1914
(no valor líquido de 7.155.153$00, a que corresponde o valor ilíquido de 7.550.664$00)
e o cheque, datado de 08.10.98, consta de fls 1915, no valor de 7.155.153$00.
Os valores ilíquidos correspondem ao valor da factura apresentada pela
“Norlabor”.
Não se recorda se em face no atraso nos pagamentos a “Norlabor” tomou
alguma iniciativa em ordem a obter mais prontamente os pagamentos. Admite que possa
ter reclamado junto de si o respectivo pagamento.
Ignora se algum credor da CMF a colocou como cliente de cobrança duvidosa,
nunca tendo ouvido de quem quer que seja tal menção.
Confrontada com o documento de fls 1906 (extrato da conta-corrente entre a
“Norlabor” e a CMF, documento apreendido naquela e onde tal menção é feita), referiu
nunca o ter visto.
*
A propósito das declarações prestadas até ao momento pela testemunha
Terezinha o arguido Barbieri Cardoso refutou que tivesse estado presente na reunião
de 11.04.95, acima referida, pois tem a firme convicção de nela não ter participado.
Foi aliás o depoente quem entregou à PJ o manuscrito de fls 2275 e dele falou à
mesma entidade, sendo certo que nessa altura deu nota desse facto à testemunha
Terezinha, a qual lhe disse então não se recordar de nada. Entregou-lhe então cópia
desse documento.
Quanto ao seu conteúdo explicou que é difícil alterar o orçamento no que
concerne às despesas correntes, sendo mais fácil proceder alterações nas verbas adstritas
aos investimentos de capital, como por exemplo as empreitadas.
Além disso, se se considerasse a obra em causa como uma empreitada (e não
como uma mera prestação de serviços ou fornecimento) o IVA a liquidar seria menor.
Por outro lado, no orçamento, em face do equilíbrio orçamental que se exige, a
despesa não pode ser superior à receita.
*
A propósito das declarações acabadas de referir a testemunha Terezinha referiu
não se recordar do arguido Barbieri Cardoso lhe lhe ter fornecido uma cópia do
documento de fls 2275, pois só tem memória de o ter visto quando foi inquirida pela PJ.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Reafirma que o manuscrito traduz um resumo dos assuntos abordados na reunião


ocorrida a 11.04.95.
Não se recorda da identidade do participante nessa reunião que sugeriu a
realização do concurso limitado, sendo certo que não foi a depoente, até porque não
dispunha dos conhecimentos jurídicos necessários para o efeito. Admite que tenha sido
a assessoria jurídica a sugerí-lo, mas não assistiu a esse facto.
O arguido Vítor Borges chegou a telefonar-lhe para saber dos pagamentos, o
mesmo tendo sucedido com o arguido Carlos Marinho, contabilista da “Resin”.
A CMF paga aos seus credores com atraso, sendo certo que no último orçamento
o passivo ronda os 16.000.000,00 euros.
*
Nesta altura a arguida Fátima Felgueiras referiu que tem a convicção de que a
testemunha Terezinha não dependia do Presidente Júlio Faria. Seja como for, quando a
depoente assumiu a presidência ela não dependia de si, pois era funcionária da CMF.
Quanto aos pagamentos era ela quem dava a informação com a proposta dos
pagamentos a efectivar. Como a verba do passivo é verba que não se pode usar e porque
as despesas não podem ultrapassar o valor do passivo, as várias rúbricas do passivo
eram explicadas.
Quanto ao problema das facturas emitidas pela “Resin” e que não poderiam ser
pagas por falta de contratualização assegurou que andaram meses sem encontrar a
solução adequada. Não cabia à parte política encontrar a dita solução jurídica e
financeira, sendo certo que o Departamento de Administração Geral não havia
conseguido encontrar a solução para sair do impasse.
*
- Testemunha Mário Barbosa Silva
É encarregado de construção civil, tendo trabalhado durente cerca de 4 ou 5 anos
(entre 1994 até 1997 ou 1998) na firma “Ecorumo”, a qual pertence ao mesmo grupo da
“Translousada”. Assegurou que nessa altura trabalhou no aterro de Felgueiras com
máquinas (pás carregadoras de arrasto e giratória), na compactagem do lixo, desde
Dezembro de 1994 até cerca de 4 ou 5 anos depois.
De vez em quando, segundo assegurou, iam para esse local máquinas e camiões
alugados pela “Resin”, sendo certo que era esta última que explorava o aterro referido.
No local existia um escritório com um funcionário da “Resin” (o Sr. Pereira).
Havia também um encarregado no aterro (o Sr. Fernando Ramos).
A certa altura os funcionários da “Resin” passaram a trabalhar no local por
turnos, inclusive à noite quando passou a haver vigilância (o que sucedeu pouco tempo
depois do depoente ter ido para lá trabalhar com máquinas).
As máquinas com que o depoente trabalhava não apresentavam qualquer sinal
alusivo à “Translousada”. Existiam porém máquinas a operar no local que ostentavam a
identificação da firma “JCL”.
O nome da firma “João Tello” nada lhe diz. No tempo em que trabalhou naquele
local nenhuma máquina dessa firma operou ali.
Conhece a firma “Norlabor” (hoje trabalha nesta empresa como encarregado de
obras) mas também esta empresa não operou no local, pelo menos no tempo em que o
depoente ali trabalhou.
Assegurou que os trabalhos nunca chegaram a ser suspensos.
As máquinas usadas no local pelo depoente eram da “Translousada” (fazia
movimentação de resíduos, escavações e tapagem de resíduos). Não obstante, era
funcionário da “Ecorumo”, uma empresa do mesmo grupo da “Translousada”.

291
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tais trabalhos eram efectuados por força de subempreitada da “Resin” à


“Translousada”.
Recorda-se que quando foi trabalhar para essa lixeira já lá operavam duas
máquinas que não eram da “Translousada” e muitos trabalhos já haviam sido
executados.
Era o Sr. Fernando quem lhe dizia o modo como os trabalhos deveriam ser
executados. Por vezes iam ao local engenheiros da “Resin”.
O Sr. Carlos Silva (sócio-gerente da “Ecorumo”) deslocava-se à obra duas ou
três vezes por semana.

- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro


Enquanto Presidente da Comissão Política do PSD local tinha responsabilidades
acrescidas na Assembleia Municipal.
Referiu que a 28.07.2000 realizou-se uma Assembleia Municipal Extraordinária
(depois de ter sido inviabilizada uma primeira assembleia convocada com o mesmo fim
por falta de quorum) onde apresentou vários documentos que lhe chegaram às mãos
(não se recorda quem lhos entregou, não confirmando que tenha sido o Sr. Vítor
Vasconcelos, então Vice-presidente da Comissão Política do PSD local), de modo a
obter, sobretudo da arguida Fátima Felgueiras, esclarecimentos.
Tais documentos foram objecto de análise no seio do seu partido e analizaram-
nos de modo a separar as questões do foro criminal das questões do foro politico.
A 30.11.2000 entregou à PJ cópia desses documentos, tendo acrescentado mais
dois documentos que não tinham sido entregues na Assembleia Municipal (cfr. docs de
fls 457 até 466; a fls 268 e ss. constam dos autos os documentos entregues pelo Dr.
Barros Moura, ao tempo presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras).
Ignora quem manuscreveu o documento de fls 269, tendo-lhe suscitado dúvidas
a expressão “reembolsos” e “entregar”. Em regimes de empreitada o IVA a pagar pela
CMF era de 5%, daí que tais expressões se refiram à diferença do IVA entre 17% e 5%.
Tal documento de fls 269 relaciona-se com a guia de receita de fls 268, pois o valor é
coincidente.
O valor final é igual ao do valor do cheque emitido pela CMF à “Norlabor”.
Já tinha ouvido falar dessa empresa, pois ouvia dizer que prestava serviços à
CMF.
Falava-se que esse pagamento relacionava-se com a lixeira.
Recorda-se que na altura não lhe foram dadas quaisquer explicações para esse
pagamento, remetendo-a para a “Justiça”, alegando que era a entidade competente para
proceder à investigação.
Colocava-se a questão de se saber a que título é que um fornecedor da CMF é
pago por um serviço que prestou e depois tem de entregar certa quantia ao arguido
Horácio Costa, o que na sua óptica indicia um uso indevido de dinheiros públicos.
Quanto aos documentos de fls 270 e 271 constatou tratar-se de documentos
semelhantes aos já referidos, ignorando quem é o seu autor.
Pediu também esclarecimentos em relação a eles (designadamente se estavam ou
não a ser usados indevidamente dinheiros públicos) não tendo obtido da arguida Fátima
qualquer explicação. Esse alegado uso indevido de dinheiros públicos foi aliás a razão
de ser da convocação da dita Assembleia Extraordinária.
A fls 457 e ss. consta uma cópia da exposição que fez nessa assembleia. Tratou-
se de um guia da sua intervenção nessa assembleia.
Tomou conhecimento da conta do BES por força das declarações públicas dos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.

292
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não sabe se a “Norlabor” prestou ou não efectivos serviços à CMF. Não sabe
qual foi o destino final dos pagamentos efectuados a essa empresa.
Seja como for, a “Resin” procedia à recolha do lixo em Felgueiras e operava na
lixeira, não compreendendo por isso a que título a CMF procedeu a pagamentos à
“Norlabor”.

- Testemunha Luís Vieira Lemolino Velosa


Confrontado com o documento de fls 199 do apenso 97, referiu não saber a
quem diz respeito a conta nº 211043 (com um saldo de 1.129.418$00). Porém, em face
do teor do documento de fls 200 do apenso 97, verifica que o extracto dessa conta diz
respeito à “Translousada”.
À pergunta efectuada no sentido de saber se o montante ali referido também foi
considerado de cobrança duvidosa, tendo sido efectuada a respectiva provisão referiu
que não na medida em que não foi considerado no cálculo da provisão visto que o valor
desta é de 24.000.000$00.
Não obstante tal resposta, confrontado com o quadro em baixo, o qual apresenta
um valor de 28.211.803$00, admitiu tratar-se afinal do montante da provisão, pelo que,
em face disso, corrigiu o respectivo depoimento, admitindo assim que de facto o
montante de 1.129.418$00 foi considerado de cobrança duvidosa.

- Testemunha Paulo José Bento Ribeiro


Antes da construção do aterro RIB de Felgueiras a “Resin” fazia a manutenção
da lixeira de Sendim (a “Resin” recolhia e depositava naquele local os lixos) e para o
efeito celebrava acordos com a “Translousada” para alugar equipamento
(retroescavadoras), apresentando as facturas à CMF. A “Translousada” tinha alvará que
lhe permitia movimentar terras e fazer terraplanagens.
Chegaram também a socorrer-se de outras empresas conhecidas da
“Translousada”, sendo certo que era sempre a testemunha Carlos Silva o seu
intorlocutor.
Por razões de ordem administrativa as facturas foram-se acumulando sem
qualquer pagamento, o que levou a que se procurasse encontrar uma forma
administrativamente viável para que a CMF as pagasse.
Recorda-se de ter insistido com a administração da “Resin” dando conta de que
desse modo seria difícil continuar. Foi-lhe então transmitida a ideia de que se tratava de
um investimento para apresentação de trabalhos junto de outros potenciais clientes por
forma a expandirem a sua actividade. O depoente, porém, insistia que era necessário
obter o pagamento dos trabalhos efectuados na lixeira.
Esclareceu que era o depoente quem fazia as facturas.
Não se recorda do montante em dívida, mas ultrapassou a centena de milhar de
contos.
Relativamente aos expedientes legais engendrados para que a situação do
pagamento fosse desbloqueada referiu que não participou nas reuniões pelo que não tem
acerca deles grande conhecimento de causa.
A recolha do lixo era diária e não podia parar, razão pela qual as soluções
encontradas eram tardias e concretizadas à posteriori.
A testemunha Carlos Silva, para além de ser o seu intorlocutor no que diz
respeito à “João Tello”, estava também ligada à “Norlabor” (não sabe de que forma),
empresa da região que se propunha fazer trabalhos de subempreitada para a “Resin” na
lixeira e que tinha alvarás de maior dimensão para o efeito.

293
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Sabe que essa empresa operou nas lixeiras de Lustosa e Penafiel. Não se recorda
porém se ela desenvolveu ou não alguma actividade na lixeira de Felgueiras, sendo
certo que se ela ali operou deverão existir facturas emitidas por essa empresa à
“Resin”.
A “Norlabor” fazia parte de um grupo de empresas de que a “Resin” se socorria
para a manutenção e encerramento de lixeiras, uma vez que não dispunha de alvará que
lhe permitisse executar essas obras.
Não tem qualquer ideia da “Norlabor” ter vencido qualquer concurso promovido
pela CMF relativamente à lixeira de Sendim.
De resto, a partir de Julho de 1997 Felgueiras passou-lhe ao lado, pois a partir
dessa altura foi o arguido Gabriel quem assumiu as funções de Director Geral da
“Resin” e tomou a seu cargo a responsabilidade pelo acompanhamento das obras que
iam sendo executadas em Felgueiras.
Referiu não ter conhecimento de alguma situação em que uma câmara municipal
tenha solicitado a um potencial concorrente para lhe indicar outros possíveis
concorrentes a um concurso limitado. Em todo o caso, tal é possível se se tratar de um
concurso promovido para regularizar situações passadas, circunstância em que terá de
existir um acordo entre todos.
Confrontado a propósito com o documento de fls 301 do apenso 21 (listagem de
empresas enviadas por fax pela “Resin” à CMF, à atenção do Director do Departamento
Técnico – o arguido Barbieri Cardoso -, fax esse assinado pelo arguido Vítor Borges,
indicando as seguintes empresas: “Resin”, “Translousada”, “Norlabor”, “Craveira” e
“Ecop”), referiu não se recordar desse documento; em todo o caso, disse ser provável
que na altura tinha tido conhecimento dele, visto ser na altura o responsável pelo
Departamento Técnico da “Resin”.
Tal documento relaciona-se com um concurso limitado promovido pela CMF,
em que são convidadas cinco empresas a apresentar as respectivas propostas (o número
legalmente estabelecido de empresas a convidar nesse tipo de concursos).
Terá pois havido concerteza um acordo entre a “Resin” e essas empresas,
tratando-se de um caso claro de uma tentativa de se encontrar uma forma de se justificar
pagamentos através do lançamento de um concurso limitado. Se esse concurso fosse
vencido por exemplo pela “Resin” estavam legalmente justificados os pagamentos
relativamente a trabalhos efectuados na lixeira.
Tal situação era aliás comum em todo o país (de modo a proceder-se ao
pagamento de trabalhos já efectuados).
Não tem conhecimento que o concurso em causa tenha sido vencido pela
“Norlabor”. Se tal aconteceu, tal situação poderá prender-se com o facto dessa empresa
dispor do alvará necessário (e a “Resin” não) para levar a cabo as obras necessárias na
lixeira de Sendim, de sorte que a “Resin” poderia, nessa hipótese, ter feito um acordo
com ela no sentido de que, vencendo essa empresa o dito concurso, faria chegar os
pagamentos à “Resin”, tratando-se assim a “Norlabor” de uma mera intermediária no
que toca ao recebimento dos pagamentos. Nesta hipótese, o concurso em causa poderia
destinar-se a dar cobertura legal a pagamentos necessários para que os trabalhos
prosseguissem.
Ainda a propósito do fax de fls 301 do apenso 12 referiu que era o arguido
Barbieri o elo de ligação da CMF com a “Resin”, daí que o fax seja dirigido ao Director
do Departamento Técnico da CMF.
Conheceu vagamente o Engº Ferreira da CMF, pois ele não era o intorlocutor da
“Resin” junto da CMF.

294
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não está a ver a arguida Fátima Felgueiras a assinar de cruz qualquer despacho
sem que previamente se informasse. Porém, no que diz respeito aos contratos celebrados
pela CMF, são os assessores jurídicos quem detêm o conhecimento dos respectivos
aspectos jurídicos.
Ignora se a arguida Fátima tomou ou não conhecimento do fax de fls 301 do
apenso 12.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


A CMF, salvo erro com vista a ajuste directo (tratou-se porém de um concurso
limitado), endereçou cinco convites a outras tantas empresas (“Ecop”, “Resin”,
“Norlabor”, “Translousada” e “Craveira”) – cfr. documento de fls 70 do apenso 95-A.
A PJ encontrou um documento alusivo a uma reunião prévia (cfr. informação
efectuada pela testemunha Terezinha, constante de fls 2275, datada de 11.04.95, onde
foi aposto um despacho pelo arguido Júlio Faria no canto superior direito, datado de
19.04.95. Nessa informação alude-se a uma reunião ocorrida na CMF com o arguido
Vítor Borges.
O prazo de execução da obra era de 30 dias, conforme consta dos convites.
Todas as firmas convidadas apresentaram as suas propostas, tendo vencido a
“Norlabor”, a qual apresentou a proposta com o preço mais baixo (18.619.680$00 +
IVA – cfr. documento de fls 81 do apenso 95-A).
A PJ apreendeu um documento na “Resin” onde se indicavam as empresas a
convidar pela CMF (trata-se de um fax dirigido ao director do Departamento Técnico da
CMF – o arguido Barbieri), constante de fls 301 do apenso 21 e datado de 24.11.95.
Pensa tratar-se de uma situação anómala o facto de um dos oponentes ao
concurso indicar outros concorrentes a quem endereçar os convites.
A “Translousada”, a “Craveira” e a “Norlabor” tinham sócios comuns.
Existia por outro lado um consórcio entre a “Resin” e a “Norlabor” (cfr. fls 145
do apenso 97), o qual se reportava à manutenção e exploração do aterro de Sendim.
A “Resin”, por sua vez, tinha um contrato de consórcio com a “Ecop”.
A fls 69 do apenso 95-A consta cópia do despacho da arguida Fátima Felgueiras,
datado de 27.11.95, a determinar a abertura do concurso em causa.
A fls 129 do apenso 97 consta o contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor”
(datado de 24.01.96) na sequência do facto de lhe ter sido adjudicada a obra pelo valor
de 18.619.680$00.
A fls 141 do apenso 97 consta um fax remetido pela testemunha Carlos Silva
(sócio-gerente da “Translousada”) para o arguido Vítor Borges, remetendo um
documento da CMF, assinado pelo arguido Barbieri, dirigido à “Norlabor”,
comunicando-lhe que lhe foi adjudicada a obra. Este documento diz respeito à CMF e à
“Norlabor”, pelo que não é normal que tenha sido remetido ao arguido Vítor Borges por
um sócio-gerente da “Translousada”.
Entretanto a “Norlabor” emitiu à CMF a factura nº 427, datada de 26.02.96,
constante designadamente de fls 1899.
O auto de medição da obra foi feito pela testemunha Ferreira Leite (engenheiro
que é funcionário da CMF), conforme documento de fls 119 do apenso 195-A.
A CMF, por sua vez, procedeu ao respectivo pagamento em três prestações.
No que se refere ao primeiro pagamento, a respectiva ordem consta de fls 1902
(4.738.095$00, montante já deduzido das legais retenções).
A fls 1903 consta uma cópia do cheque emitido pela CMF a favor da “Norlabor”
(datado de 17.06.96), no aludido montante de 4.738.095$00.

295
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A “Norlabor”, em face do recebimento daquele pagamento, emitiu um recibo a


24.06.96 no valor de 5.000 cts (cfr. documento de fls 1900).
A fls 1906 consta um extracto da conta-corrente existente entre a “Norlabor” e a
CMF, reportada a 1997, apresentando um saldo a favor daquela no montante de
14.550.664$00 (valor deduzido já do montante entretanto pago pela CMF).
Nesse extracto faz-se a referência a uma transferência do valor desse crédito
para a conta de clientes de cobrança duvidosa.
Da sua experiência profissional nunca constatou que um débito de uma câmara
municipal fosse considerado como sendo de cobrança duvidosa, sendo certo que a PJ
não detectou qualquer indício de que se tenha tentado cobrar coercivamente tal crédito.
Em todo o caso, consta de fls 243 do apenso 97 uma carta da “Norlabor” para a
CMF a solicitar uma reunião pelo não pagamento da quantia em dívida, carta essa que
data de 08.05.96, portanto anterior ao primeiro pagamento.
No que se refere ao segundo pagamento, foi emitida pela CMF a respectiva
ordem de pagamento no valor líquido de 6.633.334$00, na sequência da qual foi
emitido o cheque cuja cópia se acha junta a fls 1910, datado de 12.05.98.
A “Norlabor”, em face desse recebimento, emitiu um recibo reportado ao
montante de 7.000 cts, constante de fls 1907 (esse recibo tem a indicação de anulado e
depois uma anotação de que é válido, sendo certo que no duplicado constante da CMF
essas anotações não existem).
No que se refere ao terceiro pagamento, a CMF emitiu a respectiva ordem de
pagamento, no valor líquido de 7.155.153$00 (valor ilíquido de 7.550.664$00), na
sequência da qual emitiu o cheque cuja cópia consta de fls 1915 (datado de 08.10.98 e
naquele montante líquido), em face do qual a “Norlabor” emitiu um recibo no valor de
7.550.664$00 a 02.10.98 (cfr. documento de fls 1913).
Estes pagamentos à “Norlabor” acabaram por ir parar à “Resin”, passando pela
“Translousada”, tendo a PJ feito a análise às contas bancárias no sentido de seguir o
rasto dos cheques emitidos pela CMF.
Assim, o cheque de fls 1903 foi endossado pela “Norlabor” à “Translousada” e
desta para a “Resin”, a qual procedeu ao respectivo depósito na sua conta bancária.
A fls 1905 consta um documento da “Translousada” para a “Norlabor”, datado
de 24.06.96, onde são referidas duas notas de débito de 30.12.95 e referentes a uma
regularização de 5.000 cts.
O recibo emitido pela “Translousada” à “Norlabor” tem o montante de
4.738.095$00 (valor coincidente com o primeiro pagamento efectuado pela CMF) – cfr.
documento de fls 191 do apenso 97, datado de 25.06.96 (onde aliás é referenciado o
número do cheque que serviu de meio de pagamento, bem como a respectiva entidade
bancária sobre a qual foi sacado, elementos identificadores coincidentes com o primeiro
cheque emitido pela CMF à “Norlabor”).
Já o cheque de fls 1910 emitido pela CMF à “Norlabor” (correspondente ao
segundo pagamento) foi depositado na conta da “Norlabor”, tendo sido entretanto
emitido um cheque de uma conta particular (do Banco “Totta & Açores”) dos seus dois
sócios para a “Translousada” no mesmo montante (cfr. documento de fls 4097, de
15.05.98).
A “Translousada” emitiu à “Norlabor” o respectivo recibo, no valor de
6.633.334$00 a 21.10.98.
Esse cheque de fls 4097 foi endossado à “Resin”, que o depositou, tendo emitido
o respectivo recibo a 14.05.98 à “Translousada”, no valor de 6.633.334$00, conforme
documento de fls 195 do apenso 97. Tal documento tinha no verso manuscrito uns
dizeres a lápis e que foi possível recuperar pelo Laboratório de Polícia Científica, apesar

296
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

de terem sido apagados (“acerto de contas. Diferença de IVA. Resin factura à


Translousada 17%. Translousada para a Norlabor 17%. Norlabor – CMF 5%).
O depósito desse valor na conta da “Resin” ocorreu a 15.05.98 (cfr. documento
de fls 196 do apenso 97).
O cheque de fls 1915 emitido pela CMF à “Norlabor” (correspondente ao
terceiro e último pagamento) foi depositado na conta da “Norlabor”.
Desse montante a “Translousada” passou um recibo à “Norlabor” a 22.10.98
(cfr. documento de fls 41 do apenso 97) e a “Resin” emitiu um recibo à “Translousada”,
no mesmo valor, também a 22.10.98 (cfr. documento de fls 198 do apenso 197).
Para justificar estes movimentos da “Norlabor” para a “Translousada” foram
emitidos os documentos de fls 61, 62, 68, 69 e 71 a 74 do apenso 97.
No extracto de conta-corrente da “Translousada” para com a “Norlabor” são
referidas notas de débito (cfr. fls 61 e 62 do apenso 97), encontrando-se os originais
dessas notas de débito a fls 68, 69 e 71 a 74.
Por sua vez, para justificar os movimentos de verbas da “Translousada” para a
“Resin”, esta emitiu àquelas as facturas de fls 161 a 166 do apenso 97, tendo ainda
emitido três recibos à “Translousada”, conforme documentos de fls 191 (4.738.095$00),
195 (6.633.334$00) e 198 (4.738.095$00), todos do apenso 97.
Tem a ideia que o consórcio existente entre a “Resin” e a “Norlabor” dizia
respeito à obra mencionada no ponto 1.3., mas que nunca chegou a ser accionado
(porquê a interferência da “Translousada” se existia esse contrato de consórcio?).

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A autarquia felgueirense convidou cinco empresas (“Norlabor”, “Translousada”,
“Ecop”, “Craveira” e “Resin”) para apresentar as respectivas propostas e a empreitada
em causa foi adjudicada à “Norlabor”, a qual apresentou a proposta com o preço mais
baixo.
A “Norlabor”, a “Translousada” e a “Craveira” tinham sócios comuns e a
“Ecop” tinha um participação no capital social da “Resin”.
Pela PJ foi apreendido na CMF o manuscrito de fls 2275, do 10º volume, onde
se faz alusão a uma reunião que teve lugar na CMF no dia 11.04.95 com o arguido Vítor
Borges, documento esse da autoria de uma funcionária da autarquia.
Nesse documento foi aposto um despacho pela arguida Fátima Felgueiras,
declarando que tomou conhecimento e de acordo ao que era proposto.
Foi na sequência dessa reunião que foram convidadas as cinco empresas
referidas para apresentarem as respectivas propostas.
Foi aliás apreendido um fax remetido pela “Resin” à CMF a 24.11.95 (do
arguido Vítor Borges para o director do Departamento Técnico, na circunstância o
arguido Barbieri), onde se indicava a esta quais as empresas que deveria convidar (as já
referidas) – cfr. documento de fls 301, do apenso 21.
A “Resin” não dispunha de alvará de construção civil mas tinha celebrado com a
“Norlabor” um contrato de consórcio e que tinha por objecto a realização de trabalhos
na lixeira de Sendim (cfr. documento de fls 145, do apenso 97, datado de 19.04.95), o
qual nunca foi utilizado (não sabe porque razão).
A fls 129 do apenso 97 consta cópia do contrato de adjudicação da obra em
causa à “Norlabor” pelo prazo de 30 dias, contrato esse celebrado a 24.01.96.
A PJ foi várias vezes à “Norlabor”, tendo efectuado uma busca com o objectivo
de se apreender documentos respeitantes a esta empreitada, mas nada foi encontrado
nessa empresa que dissesse respeito à dita obra.

297
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A “Norlabor” apresentou uma factura (nº 427) à CMF, datada de 26.02.96, no


valor de 19.550.664$00 (cfr. documento de fls 1899, do 8º volume).
A quantia em causa foi paga em três tranches e teve como destinatária final a
“Resin”, mas antes disso a “Norlabor” remeteu à CMF uma missiva solicitando o
pagamento da factura nº 427 (cfr. documento de fls 293 do apenso 97, datado de
08.05.96). Para além desse documento não se recorda de qualquer outra interpelação
escrita por banda da “Norlabor” para que a CMF pagasse o montante em dívida.
Assim, no que respeita ao primeiro pagamento, a fls 1902 dos autos encontra-se
cópia de uma ordem de pagamento emitida pela CMF a 13.06.96, no montante ilíquido
de 5.000 cts, o que, após as legais retenções, prefez o montante líquido de
4.738.095$00.
A fls 1903 dos autos encontra-se cópia do cheque emitido pela CMF a 17.06.96
a favor da “Norlabor”, no montante de 4.738.095$00, cheque esse que foi endossado à
“Translousada”, a qual, por sua vez, o endossou à “Resin”, tendo esta emitido a favor
daquela o respectivo recibo, a 25.06.96, naquele valor de 4.738.095$00 (nesse recibo
faz-se referência ao número do cheque que serviu de meio de pagamento, coincidente
com o número do cheque emitido pela CMF).
No extracto de conta-corrente entre a “Norlabor” e a CMF, faz-se referência a
um valor em dívida deduzido do primeiro pagamento (14.550.64$00), reportado a
22.02.2001, sendo certo que no descritivo refere-se uma transferência para a conta de
clientes duvidosos.
No que se refere ao segundo pagamento, consta de fls 1909 a respectiva ordem
de pagamento por banda da CMF, no montante de 7.000 cts (valor ilíquido), o que
perfez o montante líquido, após as legais retenções, de 6.633.334$00.
A fls 1910 consta uma cópia do cheque emitido pela CMF a favor da
“Norlabor”, no montante de 6.633.334$00.
Esse montante foi depositado pela “Norlabor”, a qual depois emitiu um cheque
no mesmo valor a favor da “Translousada”, cheque esse sacado de uma conta titulada
pelos respectivos sócios daquela empresa (cfr. o cheque de fls 4097, de 15.05.98), tendo
a “Translousada” emitido o respectivo recibo a favor da “Norlabor”, constante de fls 38
do apenso 97, datado de 21.10.98. Esse cheque foi entretanto endossado pela
“Translousada” à “Resin”.
No que se refere ao terceiro e último pagamento, a CMF emitiu o respecivo
cheque a favor da “Norlabor”, datado de 08.10.98, no montante de 7.155.153$00 (cfr.
documento de fls 1915; a fls 1916 consta a guia de receita alusiva às deduções).
Esse valor foi depositado pela “Norlabor” (cfr. documento de fls 1917), a qual
por sua vez emitiu um cheque de igual valor a favor da “Translousada”, tendo esta
emitido o respectivo recibo (cfr. docuumento de fls 41 do apenso 97).
Entretanto a “Resin” emitiu o respectivo recibo nesse valor à “Translousada”,
conforme documento de fls 198 do apenso 97.
Não percebe porque razão a “Translousada” interveio no circuito dos
pagamentos, sendo certo que tal facto dificultou a investigação.

- Testemunha Rui Manuel Correia de Pinho


É revisor oficial de contas.
Deve-se considerar um cliente como sendo de cobrança duvidosa quando há
atrasos no recebimento do crédito e existem dúvidas acerca do respectivo recebimento
(a incerteza do recebimento pode advir do atraso ou do conhecimento de algum facto
que leva a essa dúvida). A provisão deve assim ser constituída quando há mora e há
dúvida quanto à cobrança.

298
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A provisão em causa prende-se com a prudência na gestão da empresa.


Do ponto de vista fiscal existem regras acerca da percentagem da provisão e que
tem a ver com a idade do crédito.
Uma dívida com mais de dois anos, por prudência, deve ser provisionada, a não
ser que existam garantias sólidas de pagamento.
Os ROC pedem a confirmação de saldos a terceiros, segundo selecção que
efectua, normalmente os que têm mais movimento com a empresa cujas contas petende
certificar.
Se entendesse que deveria ser feita determinada provisão faria à empresa a
respectiva sugestão, a qual, se não fosse acatada, poderia levar a que o depoente
colocasse reservas às contas apresentadas.
Existe uma cultura em Portugal de que as dívidas das autarquias e do Estado não
devem ser provisionadas como cliente de cobrança duvidosa, mas como ROC entende
que sim nas circunstâncias que já descreveu.
Foi então confrontado com o documento de fls 1906 do 8º volume (conta-
corrente da “Norlabor” com a CMF, donde consta que procederam a uma transferência a
31.12.97 para provisionar a conta de clientes de cobrança duvidosa). Explicou que o
“software” inclui o mês 13º e 14º, sendo certo que alguns incluem um 15º mês.
Os seviços efectuados devem ser facturados independentemente de serem pagos
ou não ou da factura respectiva ser devolvida ou não.
A fls 1908 do mesmo documento consta um recebimento em Maio e outro em
Outubro. A provisão referida foi invertida (isto é, anulada), o que se traduziu num
procedimento correcto e perfeitamente comum.
Explicou que existem situações em que só pelo atraso no pagamento é legítimo
fazer-se a provisão na conta de clientes de cobrança duvidosa, não acreditando que antes
a empresa não diligencie pelo respectivo pagamento.
Conhece outras situações em que idênticas provisões foram feitas relativamente
a débitos de câmaras municipais.
À pergunta efectuada no sentido de saber se é razoável que uma empresa facture
a uma câmara municipal quando cerca de um ano antes lhe foi comunicado que seria
outra entidade a pagar, referiu não poder responder em abstracto, tudo dependendo de
quem encomendou de facto o serviço prestado. Se o serviço foi prestado à câmara
municipal é a ela que a factura deve ser emitida ainda que diga que é outra entidade a
pagar.
O responsável pela preparação das contas é o órgão de gestão da empresa, contas
essas que são elaboradas pelo contabilista porque tem preparação técnica para as fazer.

- Testemunha Luís Manuel Moura Esteves


É revisor oficial de contas e amigo do arguido Carlos Marinho, que conhece há
cerca de 20 anos (foram colegas na faculdade).
A propósito de se saber quando é que se deve constituir uma provisão na conta
de clientes de cobrança duvidosa, referiu que tal deve ser feito quando há incerteza
quanto à sua cobravilidade. Uma dívida pode ser de cobrança duvidosa passados dois ou
três dias, como pode ter 4 ou 5 anos e não ser de cobrança duvidosa.
Salientou que o critério fiscal é diferente do critério económico. De facto, se é o
Estado o devedor e há incerteza quando à boa cobrança desse crédito, as leis fiscais
impedem que essa dívida seja fiscalmente considerada como um custo, mas isso não
quer dizer que não possa ou não deva ser criada a respectiva provisão por questões de
gestão, daí a questão dos impostos deferidos para reflectir essa diferença.

299
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Deu como exemplo os credores da Câmara Municipal de Lisboa. Aconselhava-


os a fazer a respectiva provisão.
Se o ROC remete missivas a um cliente particular para conferência de saldos e
se ele ao longo dos anos confirma os respectivos saldos e depois deixa de responder há
que ver se a dívida se tornou incerta. Em caso afirmativo deve ser constituída a
provisão.
A facturação dos serviços prestados, por outro lado, é uma obrigação legal.
Foi confrontado então com a situação dos autos, em que existe uma dívida da
CMF perante uma entidade particular vencida em Março de 1996. Houve uma
insistência pelo respectivo pagamento em Maio de 1996. A 25.06.96 há um primeiro
pagamento parcial de 5.000 cts. Em face disso pergunta-se: a colocação da CMF, no dia
31.12.97, como cliente de cobrança duvidosa (pela “Norlabor”) é uma medida acertada?
A testemunha respondeu que se a provisão foi constituída em Dezembro de 1997 não
lhe parece descabido. O tempo é apenas um dos indicadores.

- Testemunha José Vitorino da Cunha Loureiro


Referiu que foi admitido ao serviço na “Resin” em Janeiro de 1993 como
funcionário administrativo (expediente geral). A pouco e pouco foi tomando também
conta da caixa da empresa, passando a ser o tesoureiro cerca de 2 ou 3 anos depois.
No início o Sr. Florentino Borges dava-lhe apoio e mais tarde ficou apenas
ligado à Direcção Financeira da “Resin”.
Quando não tinha estafeta era o depoente quem procedia aos depósitos. Também
fazia levantamentos para suprimentos de caixa. Os depósitos e levantamentos que
efectuava diziam apenas respeito à conta da empresa, negando que tivesse procedido a
levantamentos de contas pessoais dos respectivos sócios ou funcionários.
Explicou que a testemunha Luciano Barreira foi o seu superior hierárquico, pois
foi Director Financeiro da “Resin”. Tal testemunha ingressou na “Resin” enviada pela
“ECOP”, ao que pensa, em 1994 (tendo permanecido ao serviço da “Resin” até 1998,
salvo erro). Aquando da reinquirição a testemunha expressou então que tem a ideia que
ele terá entado para a “Resin” quando a “Ecop” entrou para o capital social da “Resin”,
ao que pensa em 1995. Nega que alguma vez lhe tenha entregue qualquer quantia em
numerário.
Na altura o arguido Vítor Borges era o único a obrigar a empresa.
Até Setembro de 1993 o depoente preparava os documentos para a
contabilidade, altura em que foi admitido um contabilista (o arguido Carlos Marinho).
Em finais de 1999 o arguido Carlos Marinho deixou de ser contabilista da
“Resin” por ter tido um desentendimento com o director geral de então, passando a ser o
respectivo director financeiro a partir de 2000.
Confrontado com as facturas juntas pelo arguido Carlos Marinho a fls 12320 e
ss., referiu que se reportam à segunda fase (as primeiras facturas haviam sido emitidas à
testemunha Menezes Basto). Como essas facturas foram todas devolvidas de uma só vez
pela CMF, foram emitidas outras de uma só vez.
Não sabe como é que o valor de 2.800 cts + IVA era apurado.
A “Resin” começou a trabalhar em Felgueiras em finais de 1993, sendo certo
que nessa altura chegou uma máquina provinda de França para trabalhar na lixeira de
Sendim (veio com um funcionário chamado Pereira, tendo operado na lixeira 6 ou 7
meses). Recorda-se que nessa altura o arguido Vítor Borges estava em França e
telefonou para ele saber o que fazer à máquina referida.
Entretanto contratou-se a “Translousada” como subempreiteira, facto de que tem
conhecimento na medida em que em recepcionaram facturas dessa empresa respeitante

300
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

a esses serviços. O depoente contactava o Dr. Carlos Silva da “Translousada”. Os


assuntos relacionados com a “Norlabor”, “João Tello” e “Ecorumo” eram também
tratados com essa testemunha.
Na lixeira a “Resin” manteve-se a operar com funcionários até ao seu
encerramento (não se recorda em que data). Sabe disso por causa das facturas que eram
emitidas à CMF (o depoente falava sempre com a testemunha Terezinha).
Só em 1997 é que o depoente deixou de fazer facturação e de contactar com
clientes para pagar.
Entretanto, mais tarde, ficou incumbido da cobrança a clientes.
Precisou que com a testemunha Terezinha só contactava por telefone, sendo
certo que ela nunca lhe transmitiu que inexistia suporte legal para que as facturas
fossem pagas. Dizia-lhe apenas que a CMF não tinha disponibilidade de tesouraria para
proceder ao pagamento.
Nesse período a “Resin” continuava a operar na lixeira de Sendim e pagava ao
subempreiteiro (“Translousada”) apesar de não ter recebido da CMF.
Só quando o Dr. Carlos Silva, em face das dificuldades de tesouraria da “Resin”,
propunha o pagamento com letras é que mandaram falar com o director financeiro.

Análise crítica
Conforme emerge do documento de fls 142 e ss. do apenso 97 (documento
apreendido na “Resin”) a abertura do “concurso limitado” em causa foi igualmente
simulado (nos termos já referidos), pois na verdade tratou-se do estratagema encontrado
para pagar à “Resin” os trabalhos que esta realizou na lixeira de Sendim entre Fevereiro
de 1995 e Julho do mesmo ano (“3ª fase”), sendo certo que a forma encontrada para que
a “Resin” obtivesse o pagamento dos trabalhos realizados até Dezembro desse ano (“4ª
fase”) seria através do expediente mencionado a fls 144 do apenso 97, portanto, ainda
com recurso ao contrato de adjudicação em causa celebrado com a “Norlabor”,
designadamente pela existência de “trabalhos a mais”.
Isso mesmo aliás emerge de forma mais ou menos pacífica dos depoimentos
prestados (não totalmente coincidentes porém quanto ao período de trabalhos que foram
pagos através desse expediente), em especial dos arguidos envolvidos e dos
representantes da “Norlabor” e da “Translousada” (cfr. os depoimentos das testemunhas
Carlos Soares Silva, José António Brandão Barros Sousa, Adriano Ferreira e Carlos
Sousa).
Sinal dessa simulação (relativa) é ainda o facto de ter sido a “Resin” quem
remeteu à CMF a relação das empresas a convidar e de ter sido ela a destinatária final
dos três pagamentos efectuados pela autarquia felgueirense.
Consequentemente, os convites endereçados, as propostas apresentadas, a
respectiva abertura e análise tratou-se de um encadeado de actos combinados e
conformados numa espécie de concurso limitado em ordem ao desfecho que se viu,
culminando numa adjudicação de trabalhos que já se haviam realizado à data e no
almejado pagamento dos mesmos à “Resin”.
De facto, a “Norlabor”, por seu turno, nada fez na lixeira de Sendim (foi a
“Translousada” quem no terreno forneceu maquinaria com condutor - cfr com relevo o
depoimento da testemunha Mário Silva), como admitiram os seus então responsáveis
(de resto, o contrato foi assinado a 24.01.96 e a 26.02.96 foi emitida a respectiva factura
nº 427, elaborada pela testemunha Susana Alves, sinal evidente de que os trabalhos já
estariam realizados, visto que nesse curto período de tempo não seria possível executar
os trabalhos previstos no caderno de encargos).

301
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

De resto, curiosa foi a forma como foi assinado o auto de consignação da obra
(cfr. documento de fls 118 do apenso 95-A e o depoimento da testemunha José António
Brandão Barros Sousa).
O surgimento das empresas concorrentes (para além da “Resin”) tratou-se pois
de um mero favor, dadas as relações existentes entre umas e outras (referida na parte
introdutória da pronúncia) – cfr. os depoimentos prestados a esse propósito,
designadamente pelos responsáveis de algumas dessas empresas.
Note-se que essa solução terá sido engendrada na reunião ocorrida na CMF a
11.04.95 e a que o documento de fls 2275 do 10º volume faz alusão (trata-se de uma
informação elaborada pela testemunha Terezinha).
O documento em causa foi explicado de forma convicente pela testemunha
Terezinha, a qual foi muito assertiva na afirmação de que estiveram presentes na aludida
reunião as pessoas mencionadas na pronúncia.
Os arguidos Júlio e Barbieri Cardoso negaram porém terem estado presentes,
mas fizeram-no de forma pouco assertiva e estribados, “grosso modo”, no facto daquele
apontamento escrito da testemunha Terezinha ter sido dirigido ao presidente da
autarquia - o arguido Júlio Faria - e deste ter aposto um despacho de concordância,
mandando remeter cópia, designadamente, ao arguido Barbieri, o que na sua óptica não
faria sentido se eles tivessem estado presentes na dita reunião; a este argumento ripostou
porém a testemunha Terezinha, afirmando que tal não é necessariamente assim, pois
limitou-se a colocar por escrito o resumo do que nela foi discutido, sendo certo que essa
reunião ocorreu no gabinete da presidência, o que naturalmente pressupôs a presença do
presidente da edilidade, além de que a remessa de uma cópia dessa informação a cada
uma das pessoas mencionadas no despacho aposto pelo arguido Júlio Faria nada tem a
ver com o facto de terem estado presentes ou não nessa reunião; o arguido Vítor Borges
referiu, por seu turno, não se recordar quem esteve presente nessa reunião, não tendo
porém a ideia de ter estado nela com o arguido Barbieri pois não se discutiram ali
questões de ordem técnica. Ora, tratando-se de um assunto de suma importância, tendo
aliás chegado a “Resin” a ameaçar não continuar com o tratamento do lixo por falta de
pagamento, mal se compreenderia que o presidente da edilidade não estivesse presente
nessa reunião. Deu pois o Tribunal crédito ao depoimento da testemunha Terezinha,
sendo certo que não se vê por parte desta testemunha qualquer interesse em sustentar
uma posição que prejudica as posições assumidas pelos arguidos Júlio e Barbieri, tanto
mais que manifestou claro desconforto pelo facto de depôr como testemunha neste
julgamento, dada a circunstância de ser funcionária camarária e de algumas das suas
afirmações poderem prejudicar, designadamente, as posições de um ex-presidente da
CMF, da actual presidente da edilidade e de um colega de trabalho. Além disso, a
suposta ausência do arguido Barbieri coaduna-se mal com o facto de ter sido a ele quem
foi dirigida a relação das empresas a convidar para o dito concurso, conforme fax de fls
301 do apenso 21, sinal de que estava por dentro da maquinação em causa.
É certo que o arguido Barbieri referiu que não deve ter recebido o documento de
fls 301 do apenso 21 (pois não o despachou, além de que os serviços já estavam a contar
com a dita lista de empresas a convidar). Fê-lo porém sem assertividade e estribado
apenas no facto de não ter aposto qualquer despacho nesse documento.
Ora, o certo é que a testemunha José Ferreira referiu inicialmente que foi o
arguido Barbieri quem lhe forneceu essa lista para que o depoente elaborasse os
respectivos convites, acabando mais tarde por manifestar dúvidas acerca do facto desse
arguido ter recebido o fax de fls 301 do apenso 21 na medida em que mereceria por
parte dele um despacho.

302
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Porém, por um lado, a inexistência de um despacho nesse documento por banda


do arguido Barbieri é uma premissa pobre em ordem a dar-se como demonstrada a
versão desse arguido e, por outro lado, a verdade é que o dito fax foi-lhe dirigido (e não
a quem tinha a responsabilidade pelos concursos nessa área – a testemunha Ferreira
Leite), o que certamente não sucedeu por acaso conforme apontam as regras da
experiência comum (alguém acredita que esse documento iria ser remetido a quem não
estivesse por dentro do esquema? 8 ).
De resto, convencemo-nos que o arguido Barbieri colaborou no favorecimento à
“Resin” quando o interesse desta coincidiu com o interesse da CMF (quando isso não
sucedeu este arguido adoptou posições que contrariaram as pretensões daquela empresa,
conforme o mesmo salientou ao explicar alguns dos documentos que fez juntar com o
recurso das medidas de coacção que lhe foram impostas – cfr. apenso 137).
Tal não significa, porém, que o Tribunal se tenha convencido que o arguido
Barbieri soubesse que dessa forma a “Resin” procederia a “retornos” de verbas, com as
quais o PS de Felgueiras e a arguida Fátima se financiaram.
Convencemo-nos porém que ele bem sabia e participou no encadeado de actos
que visavam pagar os trabalhos efectuados ou a efectuar pela “Resin” na lixeira de
Sendim, já que isso coincidia com o interesse da autarquia.
A sua actuação, acima descrita, demonstra isso mesmo.
Não podia contudo ignorar que dessa forma a “Resin” – através do expedidente
da simulação do concurso e da adjudicação dos trabalhos à “Norlabor” – viria a auferir
das inerentes vantagens económicas através dos pagamentos que de facto lhe foram
efectuados pela CMF através de interposta empresa (a “Norlabor”), passando ainda pela
“Translousada”.
Isto é, os trabalhos foram de facto adjudicados à “Resin” – a qual daí retirou as
inerentes vantagens económicas – sem que fosse adoptado o legal procedimento
administrativo que pudesse conduzir a essa adjudicação de facto dos trabalhos
realizados na lixeira de Sendim. O procedimento adoptado não pode assim deixar de
representar um desvio aos deveres inerentes a quem, na CMF, desempenhava as funções
próprias dos cargos para os aquais foram eleitos (arguidos Júlio Faria e Fátima
Felgueiras, com a conivência do arguido Barbieri).
Resta saber se esse facto, neste caso, tem relevância penal, conforme iremos
analisar a propósito da fundamentação de direito.
Seja como for, note-se que o arguido Barbieri não é político, não se encontra
filiado no PS e é um simples funcionário camarário, sendo certo que nenhum meio de
prova produzido aponta no sentido inequívoco de que ele sabia que o PS de Felgueiras e
a arguida Fátima se financiaram daquela forma.
Além disso, ele explicou que o Eng. Ferreira Leite não integrou as comissões de
análise na medida em que não tem formação académica que lhe permitisse analisar as
propostas (é licenciado em engenharia electrotécnica), explicação que parece ter lógica
e, nessa medida, é credível (cfr. ainda o quadro de pessoal alusivo às competências dos
funcionários camarários, juntos no apenso 137 pelo arguido Barbieri Cardoso).
Quanto ao despacho que determinou a abertura do concurso, quanto aos convites
endereçados às empresas indicadas pela “Resin” (e a esta), quanto às propostas
apresentadas, quanto à respectiva abertura a 19.12.95, quanto ao respectivo relatório de
análise pelo Departamento Técnico da CMF (chefiado pelo arguido Barbieri), quanto ao
contrato de adjudicação dos trabalhos à “Norlabor”, quanto à emissão da factura nº 427,
quanto à interpelação de pagamento de fls 293 do apenso 97, quanto às autorizações de
8
A expressão “esquema”, neste contexto, reporta-se apenas à simulação do concurso limitado, com vista
à efectivação dos pagamentos da CMF à “Resin”.

303
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pagamento, quanto aos três pagamentos efectuados pela CMF, quanto aos recibos
emitidos pela “Norlabor” e quanto ao circuíto do dinheiro até chegar à “Resin”,
passando pela “Translousada”, remete-se para os documentos mencionados na
pronúncia, para os depoimentos acima transcritos por súmula, em especial dos arguidos
Fátima Felgueiras, Vítor Borges, Barbieri Cardoso e Carlos Marinho, e das testemunhas
José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira (em conjugação com os relatórios de fls
2285 e ss. e 4140 e ss.), Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães (que fez a
análise da factura nº 427 no relatório de fls 1893 e ss.), Carlos Soares Silva, Susana
Alves, José António Brandão Barros Sousa, Adriano Ferreira e Carlos Sousa.
Terá sido por alturas da reunião referida (em Abril de 1995) que os arguidos
Júlio Faria e Fátima Felgueiras, conluiados com o arguido Vítor Sousa, terão concebido
o plano que lhes permitiu obter o financiamento, designadamente das suas actividades
partidárias, aproveitando o lançamento do referido concurso limitado.
Esse facto decorre da circunstância da reunião onde foi decidida a abertura desse
concurso ter ocorrido em 11.04.95, de no âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a
“Norlabor” terem existido dois “retornos” e de terem sido os ditos arguidos Júlio e
Fátima os beneficiários últimos de tal arrecadação de verbas.
Cerca de dois meses depois o arguido Júlio é convidado para integrar as listas do
PS às eleições legislativas e é pelo menos nessa altura que a arguida Fátima vê mais
próxima a expectativa de comandar os destinos da CMF e de naturalmente vir a
encabeçar a lista do PS à CMF nas eleições autárquicas que iriam ocorrer em Outubro
de 1997, factos que, com toda a naturalidade, se vieram a concretizar.
Acerca da suposta sobrevalorização dos trabalhos em ordem a permitir os
“retornos” e os recebimentos, mais à frente melhor explicitaremos a razão de ser da
convicção do Tribunal (sendo certo que, adiantámos já, da simples análise dos fluxos
financeiros não é possível tirar qualquer ilacção a esse propósito – cfr. os relatórios de
fls 1893 e ss., 2285 e ss. e 4140 e ss. -, de modo que então veremos se foram produzidos
outros meios de prova atendíveis que corroborem ou não a versão dos factos sustentada
na pronúncia, designadamente o mapa de fls 22 do apenso 12 e os documentos de fls
159 e 163 dos autos principais, em conjugação com as declarações prestadas a propósito
pelo arguido Horácio Costa, as quais, na óptica do Tribunal, podem e devem ser
valoradas – cfr. a este propósito a posição expressa pelo Tribunal na 75ª sessão da
audiência de julgamento, fls 13609 dos autos principais).
O crédito formalmente detido pela “Norlabor” sobre a CMF, antes da sua
liquidação total, foi considerado entretanto de cobrança duvidosa (cfr. a respectiva
conta-corrente e as declarações da testemunha Célia Martins).
A explicação dada pela testemunha Célia Martins não foi inteiramente
convincente, sendo certo que, tratando-se de facto de um crédito que a “Resin” detinha
sobre a CMF, percebe-se que nenhuma acção judicial tenha sido intentada de modo a
que coercivamente viesse a obter o respectivo pagamento, tanto mais que a “Resin”
viria a compensar-se através da empolação de valores no âmbito do concurso
internacional referido no ponto 1.5., conforme mais à frente iremos ver.
Concluiu em todo o caso o Tribunal que do ponto de vista contabilístico nenhum
óbice existe a que uma empresa que detenha um crédito sobre uma autarquia efectue a
provisão respectiva caso, por qualquer motivo atendível, venha a considerar de cobrança
duvidosa tal crédito; simplesmente, de tal operação não resultará qualquer benefício em
termos fiscais (cfr. o depoimento das testemunhas Lemolino Velosa, Rui Manuel
Correira de Pinho e Luís Esteves).
Por fim, tendo-se consorciado a “Resin” com a “Norlabor” (cfr., designadamente
o depoimento do arguido Vítor Borges e o respectivo contrato), ultrapassando-se dessa

304
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

forma a dificuldade daquela não dispôr de alvará, percebe-se que o facto dela não ter
afinal vencido o “concurso limitado” (chamemos-lhe assim) e de no circuito do dinheiro
se ter interposto a “Translousada”, só pode significar que se procurou deliberadamente
ocultar o “esquema” montado, sinal de que os seus mentores estavam perfeitamente
cientes da ilegalidade do procedimento adoptado.
Isto é, o facto do concurso limitado em causa ter sido vencido a “Norlabor” e de
no circuito do dinheiro se ter interposto a “Translousada”, inculca a ideia de que, de
facto, o esquema engendrado pelos arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria e Vítor
Borges foi delineado de modo a esconder os “retornos”. Se assim não fosse, que
necessidade haveria de fazer vencer o dito concurso limitado pela “Norlabor” (a “Resin”
poderia perfeitamente ter vencido esse concurso, associada a uma empresa com o
necessário alvará, já que o objectivo primordial era o do pagamento dos serviços que
prestara na lixeira entre Fevereiro e Julho de 1995)? E que necessidade haveria de fazer
interpor a “Translousada” no circuito dos pagamentos efectuados pela CMF? Aliás, nos
procedimentos referidos nos autos, esse esquema de movimentação de verbas é mais
complexo nesta situação, o que por certo não terá sido por acaso (o próprio arguido
Barbieri mostrou-se surpreendido pelo facto da “Resin” não ter apresentado a proposta
com o preço mais baixo e assim não ter vencido o “concurso”, pois era ela quem
operava na lixeira de Sendim e o procedimento em causa destinava-se a pagar-lhe esses
trabalhos).

O ajuste directo referente à adjudicação da empreitada de “Exploração e


Manutenção do Aterro de Felgueiras”

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu que os serviços camarários propuseram a realização de um concurso
público limitado para a adjudicação da empreitada de “Exploração e Manutenção do
Aterro de Felgueiras”, no valor de 33.600.000$00, pelo prazo de 1 ano, tendo sido
enviados os respectivos convites às empresas mencionadas no despacho de pronúncia e
nas condições também ali mencionadas (cfr. fls 196 e ss. do apenso 98).
Reconheceu ainda os termos da pronúncia quanto às propostas apresentadas
pelas firmas convidadas (cfr. fls 210 e ss. 223 e ss., e 235 e ss. do apenso 98).
Em face do parecer técnico emitido pelo Departamento Técnico da CMF (ao
tempo chefiado pelo arguido Barbieri Cardoso), referiu ter proferido o respectivo
despacho decidindo a adjudicação dos trabalhos em causa à “Resin”, datado de 17.04.96
(cfr. fls 241 do apenso 98 – despacho de 16.04.96 a determinar o ajuste directo à firma
ordenada em 1º lugar -; e fls 242 e 243 do mesmo apenso 98 – despacho datado de
17.04.96 a adjudicar os trabalhos à “Resin”).
O contrato respectivo veio a ser outorgado a 24.04.96, conforme descrito na
pronúncia, sendo certo que os pagamentos ficariam dependentes do visto do TC (cfr. fls
317 e ss. do apenso 98).
Sucede porém que, segundo referiu, o TC não emitiu o respectivo visto, tendo
perguntado à CMF pelo necessário alvará da empresa que iria executar as obras em
causa (cfr., em todo o caso, o teor do documento de fls 316 do apenso 98 e os
documentos de fls 219 a 222 do mesmo apenso, alusivos ao alvará da “João Tello”).
Na sequência disso, referiu que, por lapso dos serviços, não terá sido enviado ao
Tribunal de Contas o alvará da firma que, nos termos da proposta apresentada pela
“Resin”, por subempreitada, iria executar esses trabalhos (a firma “João Tello”).

305
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ora, como não era opção a paragem dos trabalhos (já que a recolha e tratamento
do lixo era uma necessidade diária e inexistiam alternativas) e porque era premente a
resolução do problema (o que não se compadecia com o tempo necessário para
responder e pela concessão do visto, isto é, segundo calcula, cerca de 30 dias), optou-se
por não responder ao TC e pelo ajuste directo à “João Tello” de tais trabalhos
(formalizado a 10.09.96; cfr. fls 325 do apenso 98), não se recordando já das demais
opções que se chegaram a equacionar na altura, sendo certo que a “Resin” trabalhou no
local até à recusa do visto pelo TC, sem qualquer contratualização entre Janeiro e Abril
de 1996, serviços esses que teriam de ser pagos, daí a celebração com esta empresa do
contrato de transacção referido nos autos, a 20.09.96 (cfr. fls 314 do apenso 98).
Quanto ao documento de fls 255 do apenso 98, onde é feita a referência à
reunião de 04.09.96, pelas 17.30 horas, referiu ter sido a primeira vez que o viu,
parecendo-lhe no entanto que a letra é da Drª Fernanda Castro Leal e que no verso
reconhece a letra do arguido Barbieri Cardoso.
Em todo o caso, assegurou ignorar se naquela data as pessoas mencionadas na
pronúnica se reuniram ou não.
Quanto aos pagamentos efectuados à “Resin” no âmbito desse contrato de
transacção, referiu que as respectivas facturas não lhe chegavam às mãos, sendo os
serviços que controlavam o que devia ser pago, pelo que a depoente apenas se limitava a
assinar as respectivas ordens de pagamento.
Do mesmo modo se processavam os pagamentos à “João Tello”, admitindo que
os pagamentos sofreram atrasos, em face das disponibilidades financeiras da CMF.
Confirmou o teor do documento de fls 343 do apenso 98 (cfr. a missiva da “João
Tello” com a qual remete a factura nº 49, onde a arguida Fátima apôs um despacho
datado de 11.06.97, onde chamava a atenção para o términus do contrato e que a partir
daí seria de imputar ao aterro da Lustosa – selagem da lixeira de Sendim) e o teor da
comunicação à AMVS constante de fls 168 do apenso 21, de sorte que a facturação dos
serviços de selagem da lixeira de Sendim foram remetidas à AMVS (o que só ocorreu
com a construção do aterro de RIB do calçado).
Mais referiu ignorar se de facto a “João Tello” trabalhou ou não na lixeira de
Sendim, sendo certo que para a depoente só a “Resin” trabalhou no local.

- Arguido Vítor Borges


Explicou que na continuidade dos trabalhos que iam sendo executados na lixeira
controlada de Sendim houve a necessidade de pagar à “Resin” os serviços em causa.
Sem grande assertividade, referiu que o concurso em causa reportava-se
essencialmente à execução de trabalhos ainda não prestados e, talvez, também ao
pagamento dos trabalhos efectuados entre Janeiro e Abril de 1996 pela “Resin” (entre a
data da adjudicação dos trabalhos à “Norlabor”, conforme referido no ponto 1.3., e o
ajuste directo a que se reporta este capítulo).
Não se recorda de qualquer reunião onde se tenha abordado este assunto, pese
embora admita que a mesma possa ter acontecido.
De resto, o depoente não foi consultado acerca das empresas que deveriam ser
convidadas a apresentar as respectivas propostas (naturalmente que a CMF aproveitou a
indicação anterior referida a propósito da matéria vertida no ponto 1.3 da pronúncia).
Ainda sem grande assertividade, referiu que pensa não ter existido consertação
entre as diferentes empresas no sentido da “Resin” apresentar a melhor proposta (não
descarta porém essa hipótese).
Confirmou o teor do documento constante de fls 83 do apenso 98 (sinal de que a
“Resin” continuava a prestar os seus serviços no terreno). A esse propósito referiu que

306
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

não foi o depoente quem enviou o fax em causa – como aliás se depreende do seu teor -,
sendo certo que a “Resin” alugava camiões para transporte de terra e gravilha,
necessária para a execução dos trabalhos (mormente para a cobertura do lixo), daí a
solicitação que efectuou à “Translousada” não obstante ela operar no terreno.
Confirmou a celebração a 24.04.96 do contrato com a CMF por ajuste directo,
nos termos descritos na pronúncia, e que o Tribunal de Contas recusou o visto, ao que
parece, pelo facto de não ter sido apresentado o alvará da “João Tello” (com quem
formalmente concorreu associada, pese embora esta empresa apenas tenha
“emprestado” o seu alvará) – cfr., em todo o caso, o teor dos documentos de fls 317 e
ss. do apenso 98 (contrato de adjudicação à “Resin”) e o teor de fls 219 a 222 do mesmo
apenso (apresentação do alvará da “João Tello” com a proposta).
Foi então chamado à CMF a fim de se resolver o problema, na medida em que,
em face da recusa do visto pelo T.C. as obras teriam de parar, o que na realidade nunca
chegou a suceder (visto que os lixos eram depositados diariamente), pelo que mais uma
vez foram prestados serviços pela “Resin” sem qualquer contratualização formal (cfr. o
documento de fls 255 do apenso 98, alusivo a essa reunião ocorrida a 04.09.96).
Para solucionar o impasse equacionaram-se várias hipóteses, tendo-se optado
pelo ajuste directo à “João Tello” dos trabalhos mencionados na proposta apresentada
formalmente por ela e pela “Resin” (afastou-se a possibilidade de se adjudicar os
trabalhos ao segundo classificado por ter uma proposta mais onerosa para a CMF).
Seja como for, não obstante, a “João Tello” nada fez no terreno, pois, como
disse, essa empresa apenas “emprestou” o seu alvará (tal empresa tinha sido aliás
indicada pela “Translousada”. Do mesmo modo, a “Craveira” foi também indicada por
aquela).
Subsistia porém o problema do pagamento dos trabalhos efectuados pela
“Resin” entre Janeiro e Agosto de 1996, isto é, entre a data da celebração do contrato
referido no ponto 1.3. entre a CMF e a “Norlabor” (a 24.01.96) e a recusa do visto pelo
TC (comunicada à autarquia no dia 23.08.96).
Consequentemente, foi celebrado o contrato de transacção cuja cópia se acha a
fls 314 e ss. do apenso 98, onde se constata que o valor ali encontrado corresponde ao
preço praticado pela “Resin” referente a 4 meses e 10 dias (a 2.800.000$00 por mês +
IVA).
Pese embora formalmente tivesse sido expresso nesse documento que se
destinavam a pagar os trabalhos efectuados entre 25.04.96 (dia seguinte ao da
adjudicação) e a data cessação dos trabalhos na sequência da recusa do visto pelo TC,
certo é que tal paragem nunca ocorreu.
O montante ali em causa terá sido pago (tem quase a certeza desse facto,
segundo expressou – cfr. a factura de fls 320 do apenso 98, datada de 30.09.96, e o
recibo de fls 321 do mesmo apenso, datado de 16.01.97).
Confirmou a celebração do contrato a que se reporta o documento de fls 325 e
326. do apenso 98 entre a CMF e a “João Tello” (o valor de 16.800.000$00 + IVA
corresponde a 6 meses de trabalho a 2.800.000$00 + IVA).
Confirmou que a “João Tello” recebeu os valores acordados e fê-los chegar à
“Resin”.
Explicou ainda que a selagem da lixeira de Sendim estava incluída no concurso
a fundos comunitários para a construção do aterro de Felgueiras, pelo que a partir do
momento em que no âmbito do concurso internacional lançado para o efeito ganhou a
proposta apresentada pela “Resin/Sita/ECOP” a arguida Fátima Felgueiras deu
instruções para que a facturação fosse emitida em nome da AMVS (cfr. documento de
fls 168 do apenso 21).

307
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A propósito do documento de fls 286 do apenso 98 (comunicação da


“Translousada” para a CMF) explicou que nunca falou com alguém da “João Tello”,
pois foi a “Translousada” ou a “Norlabor” – na pessoa do Sr. Carlos Silva, sócio de
ambas as empresas - que indicou essa empresa e diligênciou pelo “empréstimo” do
alvará.
A propósito dos cheques de fls 2450 e 2451 e do respectivo endosso pela “João
Tello” não sabe quem apôs o respectivo carimbo e quem assinou o respectivo endosso,
tanto mais que na altura não sabia sequer a identidade dos sócios dessa empresa.
Ignora de quem é a assinatura que subscreveu (em representação da “João
Tello”) a declaração de recebimento na ordem de pagamento da CMF constante de fls
336 do apenso 98.
No auto de recepção definitivo da obra, datado de 19.02.98 (cfr. fls 311 do
apenso 98) constatou-se que não existe a assinatura do legal representante da “João
Tello”, o que terá motivado o envio pela CMF, na pessoa do arguido Barbieri Cardoso,
da missiva de fls 310, datada de 24.03.98, o que terá pressuposto a dificuldade da CMF
em contactar a “João Tello”.
Entretanto, a fls 307 do apenso 98 consta uma comunicação da “João Tello” à
CMF solicitando o levantamento da caução prestada (por retenção de 5% do valor da
empreitada), datada de 11.02.98 (onde se verifica que o carimbo aposto e supostamente
da “João Tello” é diferente do carimbo dessa firma que consta do verso dos cheques de
fls 2450 e 2451 referente ao endosso e das facturas por si emitidas à CMF (cfr. fls 307;
os carimbos apostos a fls 330 e 331 não são da gerência).
Concluiu ter a ideia de que a “João Tello” entretanto foi declarada falida em data
muito posterior a esses factos.

- Arguido Carlos Marinho


Foi-lhe dito pelo arguido Vítor Borges que o Tribunal de Contas chumbou o
visto, pelo que deixou de ser possível o ajuste directo da obra de “exploração e
manutenção do aterro de Felgueiras”.
Foi então emitida uma factura à CMF no valor de 12.133.334$00, constante de
fls 320 do apenso 98, reportada aos trabalhos efectuados entre 24.04.96 (data da
celebração do contrato de empreitada com a CMF) e 20.09.96 (cfr. ainda o respectivo
recibo de fls 321 do apenso 98, datado de 16.01.97; cfr. ainda o contrato de transacção
celebrado entre a CMF e a “Resin” a 20.09.96, constante de fls 314 do apenso 98).
A partir desta última data passaram a facturar à “João Tello” pela mesma razão
que antes haviam facturado à “Translousada”, isto é, tal facturação reportava-se a
trabalhos já realizados pela “Resin”, sendo pois esta a destinatária final dos pagamentos
efectuados pela CMF à “João Tello”, a qual apareceu neste circuito pela mão do Sr.
Carlos Silva da “Translousada”.
Foi confrontado então com o teor do documento de fls 242 do apenso 98
(despacho que decidiu adjudicar a empreitada à “Resin”), com o teor do contrato cuja
cópia se acha junta a fls 317 do apenso 98 (contrato de empreitada celebrado entre a
CMF e a “Resin” a 24.04.96) e o contrato de empreitada celebrado entre a CMF e a
“João Tello” (constante de fls 325 do apenso 98), celebrado na sequência da recusa do
visto pelo Tribunal de Contas relativamente ao primeiro dos contratos de empreitada
referidos, documentos esses que não pôs em causa.
Esclareceu que a administração da “Resin” lhe deu instruções para facturar à
“João Tello” a partir de 20.04.96 (não se recorda da explicação que então lhe foi dada,
mas que se intui do teor das suas declarações e do facto de formalmente o contrato de

308
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

empreitada respectivo apenas ter sido validamente celebrado entre a CMF e a “João
Tello”, empresa que, segundo referiu, nada fez na lixeira de Sendim).
Além disso, confirmou os seguintes pagamentos à “Resin”:
- cheque da CMF de 12.12.97, endossado pela “João Tello” à “Resin”, constante
de fls 2450 do 10º volume, tendo sido emitido a 15.12.97 (data do endosso) o respectivo
recibo no valor de 9.472.400$00, constante de fls 241 do apenso 97, montante esse que
serviu para pagar a factura nº 97009, de 14.01.97, constante de fls 237 do apenso 97, e
parte da factura nº 970021, de 31.01.97 – 1.610.000$00 -, constante de fls 238-A do
apenso 97 (cfr. ainda o talão de depósito na conta da “Resin” de fls 242 do apenso 97 e
a ordem de pagamento da CMF a favor da “João Tello” a fls 327 do apenso 97, no valor
de 9.996.000$00, o que perfez o valor líquido de 9.472.400$00 após as legais
retenções);
- cheque da CMF de 09.02.97, endossado pela “João Tello” à “Resin”, constante
de fls 2451 do 10º volume, no montante de 7.253.077$00 (cfr. a guia de pagamento da
CMF, constante de fls 246 do apenso 97. O valor referido é o valor líquido após as
legais retenções, sendo pois o valor ilíquido de 7.288.615$00), tendo sido emitido o
respectivo recibo pela “Resin” à “João Tello”, conforme fls 245 do apenso 97 (cfr. ainda
o talão de depósito na conta da “Resin” constante de fls 244 do apenso 97). Tal quantia
destinou-se a liquidar o remanescente da factura nº 970021, de 31.01.97, constante de
fls 238-A do apenso 97 (1.666.000$00), a totalidade da factura nº 9700218, de 28.02.97,
no montante de 3.276.000$00 (cfr. fls 238 do apenso 97) e parte da factura nº 9700349,
de 31.03.97 (2.346.615$00), constante de fls 239 do apenso 97.
Deu a mesma explicação que já havia dado relativamente à “Translousada” para
o facto desta última factura não ter sido integralmente liquidada pela “João Tello”
(diferença da taxa de IVA).
Nega também qualquer sobreavaliação do preço da empreitada.

- Arguido Barbieri Cardoso


A decisão do ajuste directo surgiu sensivelmente na mesma altura em que se
decidiu proceder ao aditamento ao contrato de transacção com o Eng. Menezes Basto e
à realização do concurso referido no ponto 1.3.
Tal decisão foi tomada pela arguida Fátima Felgueiras, visto que a “Resin”
deveria prosseguir os trabalhos pelo menos até ao momento em que os encargos
pudessem passar para a AMVS e se pudesse implementar uma tarifa relativa à
deposição do lixo a impor às empresas de modo a cobrir uma parte das despesas com
esse serviço.
Nessa medida, foi solicitada à “Resin” um estudo acerca do valor da tarifa a
cobrar, estudo esse que ela remeteu a 10.11.95 e pelo qual a CMF nada pagou.
Depreende que esse estudo foi pedido em face de determinações superiores dadas pela
arguida Fátima Felgueiras, não se recordando se foi o depoente quem fez a respectiva
solicitação ou se tal foi solicitado numa reunião com responsáveis da “Resin”.
Esclareceu que era a “Resin” quem tinha os dados necessários para esse estudo, daí que
o mesmo lhe tenha sido solicitado, além de que essa empresa tinha experiência na
deposição de resíduos provenientes da indústria do calçado (dando mesmo
recomendações a esse propósito, como se observa, por ex., no documento de fls 302 do
apenso 21, datado de 15.11.95) e forneceria tal estudo graciosamente, sendo certo que
inexistia qualquer conflito de interesses a esse propósito. Foi pois com base nesse
estudo que se elaborou o regulamento de tal taxa, aprovado por deliberação camarária
em Janeiro de 1996 para entrar em vigor a 01.03.96 (cfr. documento de fls 55 do apenso
137).

309
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Era porém necessário sensibilizar os industriais para o pagamento dessa tarifa,


tanto mais que havia o risco dos lixos não serem então depositados na lixeira por forma
a se evitar o pagamento da respectiva taxa.
Foi assim pedida à “Resin” a listagem das empresas que depositavam os seus
resíduos na lixeira, bem como o tipo de resíduos depositados, tendo a “Resin”
respondido por fax de 05.01.96, onde indicou uma lista com 129 empresas que
procediam ao depósito dos seus resíduos na lixeira de Sendim.
Redigiu-se então uma carta de sensibilização aos industriais para o pagamento
da dita tarifa, a qual lhes foi enviada.
Em Março desse ano foram preparadas as normas de admissão dos resíduos
industriais na lixeira de Sendim.
A 01.04.96 foram remetidos os convites às empresas mencionadas na pronúncia
para apresentarem as suas propostas com vista ao ajuste directo, missivas essas onde se
defeniam as condições que as mesmas deveriam obedecer bem como as condições de
exploração da lixeira (cfr. fls 43 a 45 do apenso 137 e fls 196 e ss. do apenso 98).
Foi apenas para se cumprir os formalismos legais que se endereçaram tais
convites, visto que a ideia era a de proceder ao ajuste directo com a “Resin”.
Aliás, com o parecer jurídico do Departamento Administrativo, optou-se pela
modalidade de ajuste directo para se evitar os constrangimentos anteriormente
verificados com o pagamento dos serviços prestados pela “Resin”. Não se recorda se
alguma entidade externa à CMF opinou sobre a modalidade a adoptar, tendo então sido
confrontado com as suas declarações prestadas perante o JIC e constantes de fls 2269,
por remissão de fls 3918, 2º parágrafo, onde declarou que a Resin” facultou à CMF um
parecer jurídico sustentando como viável a modalidade do ajuste directo com consulta,
declarações essas que precisou do seguinte modo: na CM de Lousada já tinham lançado
mão dessa modalidade em situação idêntica. Em todo o caso, o parecer jurídico
reportava-se à qualificação jurídica dos trabalhos em causa, sustentando que se tratava
de uma empreitada, de sorte que teriam de partir desse pressuposto para não correrem o
risco do TC recusar o respectivo visto.
Confirmou o teor das propostas apresentadas, conforme descrito na pronúncia,
admitindo que se tivesse aproveitado a anterior indicação de empresas pela “Resin” a
propósito do concurso mencionado no ponto 1.3.
A “Craveira” e a “Translousada” foram inclusive notificadas para apresentarem
documentos em falta, o que fizeram.
O depoente fez a análise das propostas, tendo sido a “Resin” que apresentou o
melhor preço.
Adjudicaram-se os trabalhos à “Resin” nos termos descritos na pronúncia.
Tratava-se de uma execução mensal de serviços e não uma quantidade pré-
definida de trabalhos como no concurso a que se fez alusão a propósito do ponto 1.3.
(daí a desnecessidade de autos de medição)
A 22.04.96 a CMF remeteu à “Resin” as normas de admissão dos resíduos na
lixeira de Sendim e informaram-na de que a partir de 01.05.96 iria iniciar-se a tarifação
referida, o que só se viria a concretizar a 07.05.96 pois só nessa data foi possível pesar o
lixo (devido a problemas informáticos da báscula) – cfr. fls 6728 do volume 26-A (a
primeira cobrança ocorreu a 24.06.96, conforme emerge do documento de fls 6730 do
volume 26-A).
A 24.04.96 a CMF celebrou com a “Resin” o respectivo contrato de empreitada.
O TC, a 23.08.96, comunicou porém a recusa do visto (cfr. fls 6727 e 6728 do
volume 26-A), tendo sido determinado pela arguida Fátima Felgueiras ao Departamento
Administrativo que propusesse uma solução.

310
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É sugerida então a suspensão imediata dos trabalhos por parte da “Resin” e o


apuramento do valor dos trabalhos entretanto efectuados a fim de serem pagos através
de um contrato de transacção ou solicitar-se a renegociação do processo.
Em 30.08.96 foi fornecida ao depoente cópia dessa decisão e remete à “Resin”
um fax a pedir a suspensão imediata dos trabalhos (cfr. fls 253 do apenso 98).
Foi agendada então uma reunião com a “Resin”, a que assistiu, tendo apenas o
depoente dado apoio técnico à área administrativa a fim de se dar cumprimento às
determinações dadas pela arguida Fátima Felgueiras.
Reconheceu no documento de fls 255 do apenso 98 a letra da Drª Fernanda
Castro Leal e no verso a sua própria letra.
Precisa que o depoente foi chamado à reunião pela Drª Fernanda Castro Leal já
no decurso da mesma.
A hipótese prevista na al. a) não se reporta à situação em apreço (ver documento
de fls 3726 e 3727 do volume 26-A, datado de 26.10.96).
A hipótese prevista na al. b) não era alternativa para a continuação dos trabalhos.
Era apenas uma solução com vista ao pagamento dos trabalhos efectuados até à
suspensão dos mesmos (suspensão essa que nunca chegou a ocorrer).
Consequentemente, só as hipóteses c) e d) é que realmente foram equacionadas
de forma a se ultrapassar as dificuldades criadas pela recusa do visto pelo TC.
Não se lembra quem na reunião sugeriu a adjudicação à “João Tello”, sendo
certo que, em todo o caso, a CMF iria sempre optar pela solução que lhe fosse
economicamente mais vantajosa.
Confrontado com as suas declarações de fls 2270, penúltimo parágrafo, por
remissão de fls 3918, 2º parágrafo, confirmou-as, esclarecendo que a “Resin” apenas
deu conta da disponiblidade da “João Tello” no sentido de que os trabalhos lhe fossem
adjudicados nas condições previstas, sendo certo que na altura ignorava que essa
empresa nada faria na lixeira de Sendim e para a CMF apenas existia a preocupação de
que os trabalhos fossem bem executados, o que passaria pela manutenção da
coordenação dos trabalhos por banda da “Resin” (a decisão de adjudicação à “João
Tello” foi tomada na reunião de 04.09.96, a que alude o documento de fls 255 do
apenso 98, e onde nela participaram o depoente, a Drª Fernanda Castro Leal, o arguido
Vítor Borges e Paulo Ribeiro).
Assim, dada a necessidade imperiosa e urgente da manutenção dos trabalhos na
lixeira de Sendim, o facto da “João Tello” trabalhar com a “Resin”, a circunstância da
CMF estar satisfeita com o trabalho desenvolvido, optou-se por efectuar o ajuste directo
à “João Tello”, por um período de 6 meses e na base das condições estipuladas para o
ajuste directo, assumindo esta empresa o compromisso de se manter vinculada à
“Resin” de modo a que esta última continuasse a disponibilizar o seu “know how” para
este tipo de trabalho. A redução do prazo justificou-se devido à então recente
adjudicação para a construção do aterro intermunicipal para os lixos domésticos.
Confirmou ter visado algumas facturas apresentadas pela “João Tello” em ordem
ao seu pagamento (como por exemplo as que constam de fls 330, 331, 340, 342, 343 e
344 do apenso 98).
Assegurou que a missiva de fls 168 do apenso 21 não lhe passou pelas mãos.
Porquanto o que estava em causa era uma prestação mensal de serviços não
havia a necessidade de se proceder a autos de medição. O “feedback” dos clientes era a
melhor garantia de que o serviço estava a ser bem executado, além de que mensalmente
a “Resin” fazia chegar à CMF a relação dos depósitos mensais, confirmadas pelos talões
de depósito (a propósito das receitas geradas com a deposição do lixo juntou aos autos
documento que ilustra o teor do seu depoimento).

311
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No auto de recepção definitiva da obra (cfr. fls 311 do apenso 98) não consta a
assinatura do representante legal da “João Tello” (só foi assinado pelo Eng. Ferreira).
Sem essa assinatura não é possível o levantamento da garantia bancária, razão
pela qual se remeteu uma missiva à “João Tello” para regularizar a situação (cfr.
documento de fls 310 do apenso 98, datado de 24.03.98). Ignora se entretanto a situação
foi ou não regularizada. Ignora as razões pelas quais existiam dificuldades no contacto
com a “João Tello” e não sabe em que data essa empresa cessou a sua actividade.
De resto, como prova de que a “Resin” operava no local, juntou os seguintes
documentos: fotos; um fax da “Resin” à CMF, datado de 22.05.96, dando conta de um
incêndio na lixeira e que a arguida Fátima Felgueiras despachou no mesmo dia; um fax
da “Resin” dirigido ao depoente, datado de 15.04.97, a dar conta da tonelagem
depositada e dos m3 ocupados, bem como a estimativa de ocupação e a solução técnica
a ser adoptada de entre duas hipóteses apontadas; fax de 17.06.96 do Director da
Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais do Norte para o Eng. Ferreira
Leite acerca da localização de um aterro intermunicipal para a indústria do calçado em
Felgueiras.

- Arguido Horácio Costa


De útil, referiu apenas que em data que não conseguiu precisar mas já depois de
1998, recorda-se do arguido Gabriel Almeida lhe ter pedido para transmitir à arguida
Fátima Felgueiras que a firma “João Tello” estava em estado de falência, tendo-lhe
entregue uma cópia da sentença do Tribunal de Comércio de V.N. de Gaia que a
decretou, documento esse que facultou à arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que
esse recado se prendia com o levantamento de uma caução.

- Arguido Joaquim Freitas


Confrontado com o documento de fls 22 verso do apenso 12, designadamente na
parte manuscrita, limitou-se a referir que parece ter uma relação com a questão dos
“retornos”. Porém, acerca dessa matéria não revelou conhecimento de causa.
Não tem conhecimento de que alguém alguma vez tivesse colocado a CMF
como cliente de cobrança duvidosa, pois não vai à “falência”.

- Testemunha José António de Sousa Ferreira


Referiu que fez uma informação no sentido de libertar a garantia prestada num
concurso ganho pela “João Tello” (cfr. o requerimento nesse sentido efectuado pela
“João Tello”, constante de fls 307 do apenso 98 e a informação em causa, constante de
fls 309 do mesmo apenso 98). A arguida Fátima despachou favoravelmente na própria
informação e mandou elaborar o auto de recepção definitiva da obra, o que foi feito (cfr.
o documento de fls 311 do apenso 98).
Confrontado com o auto de recepção definitiva da obra constatou que não está
assinado pelo representante da “João Tello”, mas apenas pelo arguido Barbieri Cardoso.
A esse propósito referiu que existem obras em que não se poderá justificar a presença de
um representante do empreiteiro. Em todo o caso devvem sempre estar presentes a fim
de assinarem o auto de recepção definitiva.
Foi então confrontado com o documento de fls 310 do apenso 98 (ofício da
CMF dirigido à “João Tello” dando conta que sem a assinatura do auto de recepção
definitiva não poderia ser libertada a garantia, pelo que um representante dessa empresa
deveria dirigir-se à CF para assinar tal documento).

312
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que o concurso em causa foi realizado para garantir a continuidade dos
trabalhos na lixeira de Sendim na medida em que o aterro sanitário da Lustosa
(concelho de Lousada) não foi concluído no prazo previsto.
Tem a ideia que a “João Tello” concorreu associada com a “Resin” mas o TC
não concedeu o necessário visto, tendo-se então optado por fazer um ajuste directo à
“João Tello”, empresa que aliás o depoente não conhecia.
Perguntado acerca do seu conhecimento no que respeita à “Translousada” referiu
saber que se tratava de uma empresa que possuía maquinaria pesada e que mais tarde
também concorreu a concursos abertos a propósito de outras obras.
Reafirmou que era a “Resin” quem operava na lixeira de Sendim, ainda que se
pudesse socorrer de máquinas de outras empresas (conheceu aliás um seu encarregado
que ali prestava serviço em permanência).
Sabe que essa empresa não dispunha de maquinaria pesada na medida em que as
suas viaturas (carros do lixo e carrinhas) estavam identificadas com o logotipo da
“Resin”, tendo observado na lixeira maquinaria pesada a operar e que não faziam
qualquer referência à empresa a que pertenciam, presumindo assim que não pertenciam
à “Resin”. Reconheceu porém que não conhece o seu parque de máquinas.
A esse propósito foi confrontado com o doc. de fls 242 do apenso 21 (missiva da
“Resin” dirigida à CMF, datada de 30.07.96, dando conta da dificuldade de um seu
subempreiteiro em executar o serviço de máquinas no aterro de Sendim por falta de
pagamento ao mesmo subempreiteiro, na medida em que a “Resin” também não recebia
da CMF).
De resto, recorda-se que a lixeira já era em Sendim quando em foi trabalhar para
a CMF (em 1983/84) e quando a “Resin” começou a trabalhar no local a situação
modificou-se radicalmente, pois foram executadas plataformas para a correcta
deposição do lixo.
Até o lixo ser levado para o aterro intermunicipal da Lustosa a “Resin”
permaneceu no local.
Foi confrontado com o fax de fls 286 do apenso 98, remetido a 04.10.96 pela
“Translousada” à CMF, ao cuidado da testemunha Fernanda Leal, e acompanhada de
fotocópia dos BI dos sócios da “João Tello”.
Foi ainda confrontado com o fax de fls 292 do apenso 98, remetido pela
“Translousada” à CMF, ao cuidado da testemunha Fernanda Leal, com o qual envia
cópia do seguro-caução da “João Tello”.
Em face de tais documentos presume que os documentos em causa tenham sido
solicitados pela testemunha Fernanda Castro Leal, pois é ela quem faz os contactos com
os empreiteiros.
De resto, como o visto pelo TC foi recusado competia à “parte juridica” da CMF
encontrar soluções alternativas.
Foi então confrontado com o documento de fls 255 do apenso 98, datado de
04.09.96, onde reconheceu a letra da testemunha Fernanda Leal e no verso a letra do
arguido Barbieri Cardoso.

- Testemunha José Manuel de Pinho Reis de Almeida


Referiu que foi sócio-gerente da firma “João Tello” (juntamente com a
testemunha José Miguel Santos Vieira Neves) até ao encerramento da respectiva
actividade, em Agosto ou Setembro de 1997, sendo certo que foi declarada falida por
sentença proferida pelo Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia em 1998 ou 1999.

313
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Conhece o arguido Vítor Borges há cerca de 5 anos, com quem travou amizade,
na sequência do facto do seu filho ter tido uma relação de namoro com a filha do dito
arguido.
Conhecia a “Norlabor” só de nome.
A “João Tello” construía escolas e a partir de certa altura, nos anos 80,
começaram a exigir nos concursos a apresentação de alvará de electricidade, que não
tinha, tendo-lhes então sido indicado que a “Norlabor” possuía esse tipo de alvará e que
o podia “emprestar”, o que veio a suceder 3 ou 4 vezes.
É aliás prática corrente as empresas emprestarem os alvarás umas às outras.
Muitos anos depois, talvez em 1996, recebeu um telefonema do chefe de
escritório da “João Tello”, o qual lhe transmitiu que um responsável da “Norlabor” tinha
pedido para que aquela firma (“João Tello”) “emprestasse” o seu alvará, pedido a que
acedeu.
Um pouco mais tarde o seu sócio (a testemunha José Miguel Santos Vieira
Neves) disse-lhe que teriam de se deslocar à CMF para assinarem o contrato de
empreitada relativamente ao qual haviam cedido o respectivo alvará (já que a “João
Tello” só se obrigava com a assinatura de ambos; não se recorda se quando esteve na
Alemanha, em 1996, deixou-lhe ou não alguma procuração que lhe permitisse obrigar
sozinho a “João Tello”).
Assim, alguns dias depois deslocaram-se ambos à CMF onde, em representação
da “João Tello”, assinaram o contrato cuja cópia se acha a fls 325 e 326 do apenso 98
(onde reconheceu a sua assinatura e a assinatura da testemunha José Miguel Neves).
Na escadaria do edifício da CMF cruzaram-se com um indivíduo que, segundo
pensa, seria representante da “Norlabor” (não o pode porém garantir).
Referiu que não foi a “João Tello” que tratou do expediente que levou à
celebração daquele contrato com a CMF, sendo certo que o depoente e o seu então sócio
limitaram-se a deslocar à CMF e a assinar o dito contrato.
Nas declarações da “João Tello” anexas ao contrato e constantes de fls 220 e 221
do apenso 98 parece-lhe reconhecer a sua assinatura.
Não obstante a celebração do dito contrato com a CMF, certo é que a “João
Tello” nenhuma obra executou, além de que não tinha capacidade a nível de maquinaria
para executar as obras em causa.
Esclarece que nessa altura ainda não conhecia o arguido Vítor Borges (o que só
viria a suceder em 2001 ou 2002 no contexto já referido), nem as firmas “Resin” e
“Translousada”.
Não conhece igualmente a testemunha Carlos Silva nem os arguidos Carlos
Marinho e Gabriel Almeida.
Afirmou nunca ter visto as facturas de fls 330, 331, 340, 342 e 344 do apenso
98, nem reconhece a assinatura nelas aposta.
O Sr. José António era o responsável de escritório da “João Tello” e a assinatura
não é a dele; tão pouco é a sua ou a do seu então sócio (cfr. porém as declarações da
testemunha José António Araújo Pereira).
No que respeita ao recibo de fls 328 do apenso 98 alegadamente passado pela
“João Tello” à CMF e respeitante ao pagamento das facturas de fls 330 e 331 do apenso
98, assegurou que, apesar de ali constar como sendo a sua assinatura, não assinou tal
documento.
No que respeita ao auto de recepção definitiva da obra, constante de fls 311 do
apenso 98, nega que tenha estado presente, ao contrário do que ali é afirmado. Ignora se
o seu então sócio esteve ou não presente.

314
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No que respeita à missiva de fls 307 do apenso 98 (onde a “João Tello” pede à
CMF a libertação dos 5% legalmente retidos) referiu que não assinou tal documento
nem o carimbo nele aposto pertencia à “João Tello”.
Aliás, a “João Tello” só usava um carimbo (sendo certo que em vários
documentos estão apostos carimbos diferentes alegadamente da “João Tello”).
De resto, também no documento de fls 330 do apenso 98, segundo lhe parece, o
carimbo ali aposto também não pertencia à “João Tello” .
Ignora quem forjou os carimbos e os apôs naqueles documentos.
Confrontado com cópia do cheque de fls 2450 (cheque emitido pela CMF à
“João Tello” no valor de 9.472.400$00, alegadamente endossado por esta à “Resin”
através da assinatura do depoente em representação da firma de que era sócio-gerente)
assegurou que não assinou o endosso à “Resin”, o qual é assim forjado, ignorando quem
foi o autor de tal falsificação.
O mesmo se diga no que respeita ao cheque de fls 2451, emitido pela CMF à
“João Tello” no valor de 7.253.077$00, pois também aqui a sua assinatura foi forjada no
local respeitante ao endosso à “Resin”.
Foi confrontado com a proposta da “Resin” de fls 107 do apenso 98, referindo
desconhecer a assinatura nele aposta (tal assinatura pertence ao arguido Vítor Borges).
No que respeita à declaração da “João Tello” constante de fls 115 do apenso 98,
supõe que a respectiva assinatura seja do seu então sócio.
O mesmo se diga no que respeita ao documento de fls 116 do apenso 98
(esclareceu que na altura se encontrava na Alemanha e que o seu sócio se encontrava
em Portugal).
Confirmou que o documento de fls 117 do apenso 98 é o alvará da “João Tello”.
Não tem conhecimento das circunstâncias que levaram ao ajuste directo à “João
Tello”.
Confrontado com o documento de fls 286 do apenso 98 (é a “Translousada” que
envia à CMF cópia dos BI dos sócios da “João Tello”) referiu ignorar porque motivo foi
essa firma a remeter a cópia dos referidos BI já que não conhece tal firma.
Da mesma forma não sabe explicar porque razão foi a “Translousada” a remeter
à CMF cópia do seguro-caução da “João Tello”, conforme emerge do documento de fls
292 do apenso 98.
Não tem memória da “Norlabor” ter pedido uma segunda vez por “empréstimo”
o alvará da “João Tello”; em todo o caso era frequente deixar folhas em branco
assinadas, a que o responsável pelo escritório tinha acesso, sendo certo que só com o
uso de uma dessas folhas admite que o alvará da “João Tello” possa ter sido usado uma
outra vez pela “Norlabor”. Reafirmou porém que com o seu conhecimento só se
efectuou um “empréstimo”.

- Testemunha Carlos Soares da Silva


Referiu ter a ideia da “Translousada” ter concorrido a outro concurso mas do
qual já não se recorda.
Foi então confrontado com a proposta apresentada pela “Translousada”, cuja
cópia consta de fls 223 e ss. do apenso 98, no valor de 39.600.000$00.
Em face dos documentos que viu no processo (no apenso 98) verificou que a
“Resin” concorreu consorciada com a “João Tello”, tendo ambas apresentado uma
proposta com um preço de 33.600.000$00, e que a “Craveira” apresentou uma proposta
no valor de 40.800.000$00 (cfr. fls 235 e ss. do apenso 98).

315
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ou pelo arguido Vítor Borges ou por alguém a mando dele foi-lhe dito que seria
necessário a CMF abrir novo concurso (por razões idênticas ao referido anteriormente,
isto é, para que a CMF pudesse pagar os serviços já efectuados na lixeira de Sendim).
Foi o consórcio “Resin”/”João Tello” que venceu esse concurso, pois apresentou
o preço mais baixo.
Aliás, os preços a apresentados foram combinados de modo a que a
“Resin”/”João Tello” vencesse o concurso.
Disse ter sido abordado para indicar outra empresa que não a “Norlabor”, tendo
sido então indicada a firma “João Tello”, que aliás não conhecia e que lhe foi
apresentada pela testemunha Barros Sousa, sócio da “Norlabor”. O depoente limitou-se
então a apresentar à “Resin” essa empresa.
Ignora se o visto pelo TC foi ou não recusando, sabendo apenas que a “João
Tello” celebrou com a CMF o respectivo contrato de empreitada.
Confrontado com o fax de fls 286 do apenso 98 (documento da “Translousada”
com o qual se remeteu à CMF cópia do BI dos sócios-gerentes da “João Tello”) referiu
que o mesmo não está assinado pela gerência dessa empresa (talvez tenha sido assinado
por um funcionário administrativo dessa firma, segundo hipotisou).
A mesma posição adoptou em relação ao fax de fls 292 do apenso 98 (com o
qual se remeteu cópia do seguro-caução da “João Tello” à CMF).
Explica o facto de ter sido a “Translousada” a remeter elementos da “João
Tello” à CMF com a circunstância desta última estar interessada em fidelizar a “Resin”
como cliente, além de que em princípio só receberia na medida em que a “Resin”
também recebesse, daí estar disponível para prestar a sua colaboração. Existiram porém
situações em que a “Resin” pagou à “Translousada” ou emitiu letras antes de receber os
pagamentos da CMF.
De resto, esses elementos foram pedidos pela “Translousada” junto da
testemunha Barros Sousa, que foi quem lhes indicou essa empresa.
Não foi a “João Tello” a remeter esses documentos pois ela apenas estava a fazer
um favor, não sendo na verdade parte interessada no concurso em causa, apesar de
formalmente lhe terem sido adjudicados os trabalhos.
Referiu que a “Translousada” foi subempreiteira da “Resin” entre 1994 e
1998/99.
Salientou que nenhum prejuízo sofreu a CMF na medida em que pagou os
serviços que foram efectivamente realizados, sendo certo que os preços praticados
mantiveram-se nos dois concursos referidos nos pontos 1.3 e 1.4.

- Testemunha José António Araújo Pereira


Referiu ter sido funcionário administrativo da firma “João Tello” entre 1974 a
1990 e de 1993 até ao seu fecho, em Setembro de 1997.
Incumbia-lhe fazer o processamento dos salários, apoiar a contabilidade e
proceder ao tratamento das facturas. Não existia propriamente um responsável pelo
sector administrativo da empresa (onde trabalhavam 3 funcionários: além do depoente,
António Vidal e Orlando Conceição).
Não conhecia a “Translousada” e tem uma vaga ideia da “Resin”, sendo certo
porém que não tem memória de alguma vez esta empresa ter estabelecido qualquer
relação comercial com a “João Tello”.
Conhecia porém a firma “Norlabor” pois era frequente a “João Tello” recorrer a
essa empresa no sentido de lhe “emprestar” o seu alvará de modo a poder concorrer a
concursos de obras públicas. De facto, nos concursos exigiam alvarás de especialidade e

316
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

era vulgar o “intercâmbio” de alvarás e de declarações acessórias entre as empresas de


construção civil para apresentar nos ditos concursos.
Recorda-se de ter sido aberto um concurso para uma empreitada pela CMF e da
“Norlabor” pedir à “João Tello” o alvará respectivo (esses pedidos eram feitos ao nível
da gerência das empresas, normalmente por contacto telefónico, limitando-se os
funcionários administrativos a executar as ordens que lhes eram dadas).
Acha que a “Norlabor” apenas pediu dessa vez o alvará à “João Tello” no que
respeita a uma obra levada a cabo pela CMF.
Na sequência do referido, tem a ideia da “João Tello” ter emitido uma ou duas
facturas à CMF (foi o depoente quem as elaborou).
Foi então confrontado com as facturas de fls 330, 331, 340, 342 e 344, as quais
reconheceu como tendo sido emitidas pela “João Tello”, as quais de resto foram
elaboradas e assinadas pelo depoente.
Mais referiu que o carimbo da “João Tello” nelas aposto era o que na altura
estava em uso por essa empresa. Havia um outro carimbo similar com menção expressa
da gerência e que só era usado pela mesma quando subscrevia algum documento em
nome da empresa.
Assegurou que a “João Tello”, não obstante a emissão dessas cinco facturas,
nada fez na obra em causa.
Desconhece se a “João Tello” subscreveu algum contrato com a CMF, mas é
provável que sim. Eram os gerentes quem se deslocavam e assinavam os contratos.
Confrontado com o documento de fls 325 e 326 do apenso 28 (contrato
celebrado com a CMF) nele reconheceu as assinaturas dos gerentes da “João Tello”.
Confrontado com o recibo de fls 328 do apenso 28 referiu que a assinatura foi
forjada pois não pertence a nenhum dos gerentes da “João Tello”, ignorando porém
quem foi o autor dessa assinatura.
Confrontado com o pedido de restituição da importância retida pela CMF,
constante de fls 307 do apenso 28 (datado de 11.02.98) referiu que a assinatura não
pertence a nenhum dos gerentes de então da “João Tello” e quer o formato do
documento quer o carimbo usado não pertenciam à “João Tello”. Consequentemente,
quer o carimbo quer a assinatura foram falsificados, sendo certo que esse documento foi
emitido numa altura em que a “João Tello” já tinha encerrado a sua actividade.
Assegurou nunca ter visto os cheques emitidos pela CMF a favor da “João
Tello” (constantes de fls 2450, datado de 11.12.97, e de fls 2451, datado de 09.02.98).
Uma vez que a “João Tello” nada executou na obra referida tais pagamentos não
lhe eram devidos.
Assegurou que o carimbo aposto como sendo da “João Tello” não lhe
pertenciam, assim como foi forjada a assinatura (um e outro no local destinado ao
endosso dos cheques). Consequentemente, o endosso nos dois cheques foi forjado,
sendo certo que pelo menos no que respeita ao segundo cheque a “João Tello” já tinha
fechado as portas. De resto, só a gerência poderia, em nome da “João Tello”, endossar
os ditos cheques.
Constatou que o endosso foi efectuado a favor da “Resin”, com quem a “João
Tello” não manteve qualquer relação comercial (se a “João Tello” tivesse executado
algum serviço para a “Resin” teria de ter conhecimento).
Foi então confrontado com os documentos de fls 107 (proposta da “Resin” para
a execução das plataformas), 114 (declaração da “Resin” apresentando o alvará da
“João Tello”) e 115 (cópia do alvará da “João Tello”), todos do apenso 98. Reconheceu
neste último documento que o papel timbrado era o que se usava então nessa firma,

317
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

assim como o carimbo da mesma, o qual aliás se mostra assinado por um dos gerentes
de então.
Esclareceu que nunca teve qualquer contacto com quem quer que seja da
“Resin” e ficou surpreendido pela emissão dos cheques de fls 2450 e 2451 pela CMF,
dos quais só ouviu falar na fase de inquérito deste processo.
Por outro lado não tem presente na sua memória os documentos de fls 237 a 240
do apenso 97 (facturas emitidas pela “Resin” à “João Tello”), não tendo qualquer ideia
de lhe terem passado pelas mãos.
Por outro lado, os recibos emitidos pela “Resin” à “João Tello” foram-no numa
altura em que esta já tinha encerrado a sua actividade (cfr. documentos de fls 241 e 245
do apenso 97), pelo que nunca lhe passaram pelas mãos.
Confrontado com o documento de fls 97 do apenso 97 (missiva de Outubro de
1996 enviada pela “Translousada” à CMF remetendo cópia dos BI dos gerentes da
“João Tello”), referiu desconhecer porque razão foi a “Translousada” a remeter aqueles
elementos à CMF. Como já referiu, essa empresa nada lhe diz. Em todo o caso, deve ter
sido algum funcionário administrativo da “João Tello” quem por fax remeteu à
“Translousada” aqueles documentos (ou a outra entidade), que por sua vez os terá
remetido à CMF.
Com a “Norlabor” o depoente contactava com um indivíduo do sexo masculino
cujo nome não se recorda (terá sido a testemunha Carlos Silva).
Depois da declaração de falência a respectiva massa foi gerida por um
administrador nomeado judicialmente e não sabe o que ele fez (designadamente se
emitiu algum dos documentos atribuídos à “João Tello” já depois de ter fechado portas).

- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal


Foram seleccionadas três empresas às quais se endereçaram os respectivos
convites, entre as quais a “Resin”.
O ajuste directo foi celebrado com a “Resin” (cfr. documento de fls 317 e ss. do
apenso 98, datado de 24.04.96).
É a depoente quem organiza os processos e os remete ao Tribunal de Contas
(TC).
Consequentemente, no caso em apreço efectuou-se o ajuste directo à “Resin” e
foi a depoente quem preparou os documentos necessários ao visto pelo TC e os remeteu
àquele tribunal para esse efeito.
Porém, o TC devolveu o contrato, não sabendo porque razão não constava a
declaração da “João Tello”.
Remeteu de novo o contrato ao TC com a declaração em falta e que só por lapso
não havia sido inicialmente enviada.
De novo o contrato foi devolvido na medida em que subsistiam dúvidas quanto à
natureza do contrato celebrado, isto é, se seria um contrato de empreitada ou de
fornecimento, tendo sido prestados os esclarecimentos que se julgaram pertinentes.
Porém, não obstante ter aceite que se trataria de um contrato misto, o TC entendeu que a
empreitada assumia maior relevo pelo que se deveria aplicar o regime jurídico da
empreitada de obras públicas.
Por esse motivo, em Agosto de 1996, foi recusado o visto (cfr. documento de fls
316 do apenso 98), o que não compreendeu na medida em que a “João Tello” dispunha
do alvará necessário e concorreu associada à “Resin”.
Fez então uma informação à arguida Fátima Felgueiras dando conta da recusa do
visto pelo TC e das respectivas consequências, isto é, os trabalhos deveriam ser
imediatamente suspensos e deveria ser paga à “Resin” os trabalhos que entretanto

318
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

efectuara através de um contrato de transacção (presentemente tal solução está prevista


na Lei do TC).
Realizou-se entretanto uma reunião na CMF, no seu gabinete, onde estiveram
presentes a depoente, o arguido Barbieiri Cardoso (não se recorda se esteve presente de
início ou se chegou depois da reunião já ter começado), o arguido Vítor Borges e Paulo
Ribeiro (ambos da “Resin”), onde se tratou da questão do pagamento dos trabalhos
efectuados até então.
Nessa reunião foram avançadas várias hipóteses para que o problema fosse
resolvido, designadamente a celebração de um contrato de transacção, recorrer da
decisão do TC, pedir a reapreciação ao TC, proceder a um ajuste directo à “João Tello”
(esta última solução pareceu-lhe legal, tendo sido a adoptada), sendo certo que a
elaboração de um aditamento ao contrato de recolha não se prendia com a recusa do
visto mas com o facto de, na altura, a CMF ceder trabalhadores à “Resin” para a recolha
de lixo e que às vezes faltavam, daí aliás a celebração do aditamento ao contrato de
recolha entre a CMF e a “Resin” conforme emerge do documento de fls 6725 e 6726 do
volume 26-A, datado de 29.10.96 (cfr. ainda o documento de fls 255 do apenso 98,
datado de 04.09.96 e que se reporta à dita reunião, confirmando a testemunha que se
tratam dos apontamentos que a respeito dela tomou na altura).
Não obstante a reunião em causa ter sido agendada por causa da recusa do visto
por parte do TC, o assunto do aditamento ao contrato de recolha foi abordado nessa
reunião por iniciativa do arguido Vítor Borges por se tratar também de um assunto
pendente entre a CMF e a “Resin”.
Recorda-se que quando os elementos da “Resin” chegaram à CMF foram em
primeiro lugar falar com a arguida Fátima Felgueiras e só depois é que foram
encaminhados ao seu gabinete.
Ainda no que respeita ao documento de fls 255 do apenso 98, não se recorda se
os valores ali apostos dizem respeito a contas efectuadas na altura e reportadas ao valor
dos trabalhos efectuados até então; seja como for, o valor global coincide com o valor
global da empreitada.
Não se recorda se fez esse apontamento no mesmo dia da reunião ou se o fez no
dia seguinte.
No verso desse documento constam tópicos apostos pelo arguido Barbieri
Cardoso para fundamentar do ponto de vista técnico o ajuste directo à “João Tello”.
Recorda-se que este aspecto foi analisado em conjunto, mas não se recorda se esses
tópicos foram apostos aquando da elaboração do rosto do documento.
Não conhecia os representantes da “João Tello”, só os tendo visto quando eles se
deslocaram à CMF para assinar o contrato (o qual consta a fls 325 e 326 do apenso 98).
A remessa de cópia dos BI dos representantes da “João Tello” (constantes de fls
287 e 288) foi feita por fax e remetida à depoente, conforme se constata a fls 286 do
apenso 98, a qual apôs um despacho no dito fax.
Também por fax dirigido a si foi remetida cópia do seguro-caução dessa
empresa, conforme se verifica no documento de fls 292 do apenso 98, o qual foi
despachado pela arguida Fátima Felgueiras e pela depoente.
Do mesmo modo por fax foi-lhe remetida a certidão da conservatória do registo
comercial respeitante à “João Tello”.
Constata-se que esses faxes foram remetidos por fax pela “Translousada”, facto
que na altura não reparou, ignorando porque razão foi essa firma a enviar aqueles
elementos.
Aliás, não se recorda da CMF ter celebrado qualquer contrato com a
“Translousada”, sendo certo que não conhece quem quer que seja dessa empresa e só

319
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

tem a percepção da existência dela pelo facto de ter concorrido a concursos abertos pela
CMF.
Não tem memória de ter falado com quem quer que seja da “Translousada”,
designadamente com o Sr. Carlos Silva, acerca dos supra referidos elementos da “João
Tello”
Não sabe se a “João Tello” fez alguma coisa no local.
Os engenheiros da CMF é que têm por missão fiscalizar o andamento das obras
e proceder a autos de medição.
Quanto ao pagamento do visto explicou que o TC remete a guia respectiva, o
empreiteiro é notificado para a pagar e depois a CMF remete ao TC o comprovativo do
pagamento.
Em face do documento de fls 226 do apenso 97 verifica-se que foi a “Resin” a
pagar o visto, ignorando porque motivo foi essa empresa a liquidar essa despesa e não a
“João Tello”.
*
A propósito das declarações prestadas pela testemunha Maria Fernanda Dá
Mesquita Castro Leal o arguido Barbieri Cardoso referiu que a decisão política do
arguido Júlio Faria foi no sentido da “Resin” permanecer a operar na lixeira após a
missão de reabilitação da mesma, o que criou embaraços jurídico-financeiros aos
serviços.
Refuta que a testemunha Fernanda Leal apenas tivesse conhecimento da “Resin”
após a mesma ter apresentado propostas nos concursos, pois antes disso ela teve de
tomar conhecimento de que a “Resin” operava no local, já que as facturas apresentadas
pela “Resin” à CMF, constantes de fls 12320 e ss. – e que foram devolvidas – foram
despachadas pelo arguido Júlio Faria à testemunha em causa, a qual também nelas
apunha um despacho. Consequentemente, ela teve comhecimento que a “Resin” operava
na lixeira antes de ter sido lançado qualquer concurso.
Aliás, tais facturas eram acompanhadas de uma missiva por parte da “Resin”, o
que sucedeu durante cerca de um ano.
*
A testemunha Fernanda Leal, porém, manteve o seu depoimento, reafirmando
que só se lembra da “Resin” dos concursos.
Os despachos referidos pelo arguido Barbieri Cardoso são de mero expediente,
onde se limitava a mandar remeter as facturas em causa ao serviço respectivo, sendo
certo que por dia despacha “montes” de facturas. Aliás, não tem qualquer ideia das
facturas de fls 12320 e ss. Porém, confrontada com os documentos em causa, confirma
que despachou nas missivas de envio de cada uma dessas facturas, mas não se recorda
de lhes ter aposto os despachos em causa, já que por dia despacha inúmeros papéis e a
sua intervenção foi secundária, já que não lhe cabia sequer fiscalizar o pagamento
dessas facturas.
De resto, o arguido Júlio Faria nunca lhe pediu qualquer parecer jurídico acerca
da problemática do pagamento à “Resin”.
*
A este propósito a arguida Fátima Felgueiras, referiu que uma vez que inexistia
suporte legal para que a CMF pagasse as facturas da “Resin” juntas a estes autos pelo
arguido Carlos Marinho (cfr. fls 12320 e ss.), concerteza que a testemunha Terezinha
colocou o problema à testemunha Fernanda Leal, até porque as mesmas acabariam por
ser devolvidas.
Aliás, acha estranho que a testemunha Fernanda Leal não se lembre da “Resin”
antes desta concorrer ao concurso a que se reporta o ponto 1.4. da pronúncia, pois

320
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

ameaçava deixar de prosseguir com os trabalhos na lixeira caso esses trabalhos não lhe
fossem pagos (o que na altura não poderia ser efectuado por falta de suporte legal, como
disse), problemática que foi abordada em todas as reuniões de coordenação de serviços.
*
A testemunha Fernanda Leal, porém, manteve a sua versão dos factos, pois não
se recorda desses assuntos (que se prendem com a “Resin”) terem sido abordados em
reuniões de vereação (ou reuniões de coordenação, designação mais recente mas que
tem o mesmo significado) a que tenha assistido.

- Testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues Carvalho


Ouviu falar da “João Tello” por ter recepcionado o contrato que celebrou com a
CMF (cfr. documento de fls 325 e 326 do apenso 98, datado de 18.10.96 e no valor de
16.800 cts + IVA) e por ter procedido aos pagamentos, segundo facturação que lhe foi
presente.
Não se recorda com exactidão do conteúdo desse contrato mas tem a ideia de
que se reportam a trabalhos na lixeira.
Não se recorda igualmente em quantas prestações se liquidou o pagamento
respectivo.
Foi então confrontada com os cheques emitidos pela CMF a favor da “João
Tello, constantes de fls 2450 e 2451 dos autos, respectivamente no valor de
9.472.400$00 e 7.253.077$00.
Não tem qualquer ideia de na altura ter ouvido que esses pagamentos se
destinavam à “Resin”, tal como não tem ideia de ter ouvido tal coisa a propósito dos
pagamentos respeitantes ao contrato de empreitada referido no ponto 1.3.
Foi então confrontada com as declarações que prestou a fls 2820, linhas 113
115, tendo-as então confirmado, referindo que comentava-se na CMF que o dinheiro, tal
como sucedeu no contrato celebrado com a “Norlabor”, se destinava à “Resin” pois era
ela quem operava na lixeira.
Não soube concretizar de quem ouviu aqueles comentários na CMF.
Explicou que não se sente intimidada ao prestar o seu depoimento, mas ficou
nervosa em face da intervenção da arguida Fátima Felgueiras a propósito das suas
declarações, sendo certo que sendo funcionária da CMF não é cómodo o seu papel de
testemunha.
Foi então confrontada com as suas declarações prestadas a fls 2818 e 2819,
linhas 45 a 54 e 66 a 70, tendo-as confirmado.
*
O arguido Barbieri Cardoso referiu então, ainda acerca das facturas emitidas
pela “Resin” e que foram devolvidas, que a testemunha Terezinha apenas lhe
perguntava se as visava ou não e porque motivo as não visava, tendo-lhe dito que a
razão era a falta de suporte legal para o respectivo pagamento, apesar de saber que era a
“Resin” quem levava a cabo os trabalhos na lixeira.
Deu-lhe ainda nota que o Departamento Técnico não visaria tais facturas
enquanto não estivesse regularizada a situação.
O Departamento Técnico tinha também de curar da legalidade dos pagamentos.
*
A este propósito a testemunha Terezinha referiu que não se recorda bem de
quem lhe deu orientações para manter as ditas facturas na contabilidade até o problema
ser resolvido, manifestando a ideia de que era necessário falar com o arguido Júlio
Faria, na altura presidente da edilidade, para resolver a situação. Em todo o caso,

321
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

aquando das suas declarações à PJ tinha a memória mais fresca, daí que as declarações
que então prestou sejam mais credíveis.
*
Por sua vez o arguido Júlio Faria reafirmou a importância do problema de
recolha do lixo e seu tratamento, razão pela qual essa problemática foi suficientemente
ventilada na altura.
A responsabilidade política era sua.
Consequentemente, seguramente que deu instruções ao Departamento de
Contabilidade para que as facturas em causa aguardassem uma solução para que a
“Resin” pudesse ser paga pelos serviços que prestava.
O Departamento Técnico e o arguido Barbieri Cardoso apenas tinham de se
preocupar com a aposição do visto nas facturas se estivessem em conformidade com os
trabalhos executados (não foi essa, como vimos, a posição do arguido Barbieri, pois
apenas invocou a falta de suporte legal para o pagamento para a recusa do visto).

*
- Testemunha Luís Vieira Lemolino Velosa
Relativamente à conta nº 211102, apresentando um saldo de 2.894.985$00, a
que se reporta o documento de fls 201 do apenso 97 (diz respeito à “João Tello”),
referiu que também foi considerado esse montante de cobrança duvidosa, constituindo-
se a respectiva provisão.
O somatório dos montantes em dívida relativos à testemunha Menezes Basto
(24.187.400$00), à “Translousada” (1.129.418$00) e à “João Tello” (2.894.985$00)
prefaz 28.211.803$00, valor que coincide com o valor da provisão constituída
relativamente aos créditos de cobrança duvidosa.
Referiu que apenas tomou conhecimento da “Translousada” e da “João Tello”
por serem clientes da “Resin”.
Pensa que terá sido o chefe da contabilidade da “Resin” quem terá aposto as
anotações manuscritas no documento de fls 199 do apenso 97 (arguido Carlos Marinho),
mas não reconhece a respectiva letra.
Em face dos elementos que consultou revelou que o volume de negócios da
“Resin” (volume facturado) em 1997 foi de 1.467.824.000$00, tendo sido apurado um
lucro de 15.604.781$00.
Explicou que era também revisor oficial de contas noutras empresas, algumas
das quais com maior volume de facturação.
Não considera problemática para a “Resin” a diferença de 20.000.000$00 entre
as projecções de lucro e o lucro efectivamente obtido no ano de 1997. Uma falha de
previsão nessa ordem de grandeza não é significativa numa empresa que teve um
volume de negócios na ordem do milhão e meio de contos, não sendo habitual a
emissão de uma factura no final do ano para cobrir essa diferença (não se factura o que
se quer mas o que se pode). Em todo o caso, se dissessem respeito a trabalhos
efectuados pela “Resin” não vê razões para a sua não emissão. A antecipação de
facturas porém não é um procedimento normal. O orçamento é uma mera previsão (um
instrumento de previsão do exercício), havendo que verificar por que motivo não se
atingiu a meta delineada e quem é o responsável.
Acabou por referir que se as metas estipuladas forem rigorosas, uma diferença
de 20.000 cts já pode ter algum significado. A cobrança de qualquer factura é
importante para a obtenção dos resultados do exercício.
Explicou que não tinha acesso às contas particulares dos sócios da “Resin”, mas
na contabilidade haviam contas atribuídas aos sócios (contas de suprimento).

322
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Salientou que a contabilidade tem de espelhar que efectivamente se passou na


vida da empresa, independentemente do orçamento em termos patrimoniais.
*
O arguido Carlos Marinho referiu então que em 1997 a “Resin” fazia parte de
um consórcio em que essa empresa facturava tudo, mas nem tudo dizia respeito a
trabalhos executados por ela. A parte facturada pela “Ecop” aparece na contabilidade da
“Resin” como custo.
Reconhece que, de facto, 20.000 cts não é significativo num volume de
facturação de 1,5 milhões de contos.
Porém, a rentabilidade projectada pelo orçamento não foi cumprida e optou-se
por criar um proveito operacional, sendo certo que com a emissão da dita factura de
cerca de 20.000 cts em 31.12.97 (devolvida em Janeiro de 1998 pela CMF) conseguiu-
se obter uma rentabilidade de 15.000 cts, caso contrário teriam uma rentabilidade
negativa de cerca de 5.000 cts.
Teve-se a preocupação de encerrar o exercício com lucro, o que era importante
para criar certa imagem junto dos bancos, do accionista (“Ecop”) e de terceiros.
*
- Testemunha Paulo José Bento Ribeiro
Referiu lembrar-se que para a recolha dos resíduos fez-se um concurso limitado
(para pagar serviços já prestados), mas tal não mereceu o visto do Tribunal de Contas.
Tem a ideia de ter estado presente numa reunião na CMF em que se discutiu
precisamente a recusa de visto pelo Tribunal de Contas (tem a ideia que tal recusa se
prendeu com a recolha de resíduos), não se recordando em que ano ocorreu. Nessa
reunião estavam presentes a testemunha Terezinha do Nascimento e o arguido Barbieri
Cardoso (cuja presença foi solicitada pelo depoente, de modo a que desse o seu
contributo no sentido de se encontrar uma solução que permitisse a continuidade dos
trabalhos na lixeira). O arguido Barbieri era o seu intorlocutor da CMF no que diz
respeito às questões técnicas relativas à manutenção da lixeira. Foi ele aliás quem nessa
reunião sugeriu que se fizesse um ajuste directo ao empreiteiro apresentado pela
“Resin” (a “João Tello”), desde que a “Resin” lhe desse todo o apoio técnico (admite
que nessa reunião outras soluções tenham sido adiantadas, mas manifestou falta de
memória acerca delas). Não tem presente se a Engª Cláudia (sua assistente) esteve ou
não presente, embora fosse habitual ela deslocar-se consigo às reuniões e tomar notas.
Não tem também a certeza se a testemunha Fernanda Leal esteve ou não presente nessa
reunião, embora seja provável que ela tenha estado presente. Que se recorde o arguido
Vítor Borges não esteve presente. Tem a ideia de que alguém da CMF tomou notas no
decurso da referida reunião. Só participou numa única reunião (a que referiu) em que
tenha estado presente a testemunha Terezinha e Fernanda Leal.
Ignora se a “João Tello” chegou a ter alguma intervenção na lixeira de Sendim,
admitindo que possa ter fornecido equipamento. Seja como for, mesmo em relação a
essa empresa, o seu intorlocutor continuava a ser a testemunha Carlos Silva, tanto mais
que foi ele quem enviou à “Resin” o alvará dessa empresa (usado pela “Resin” para se
apresentar ao concurso).
Conforme já referiu, o arguido Barbieri era o seu intorlocutor com a CMF em
termos técnicos, pois reunia com ele para discutir os trabalhos que estavam a ser
executados (ele fazia também uma fiscalização à execução da obra, verificando se tudo
estava a ser executado de acordo com o caderno de encargos e de acordo com o contrato
celebrado). Ele era rigoroso, por exemplo quando a cobertura dos resíduos não era feita
com a frequência adequada.

323
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No final de cada mês era feito um balanço dos trabalhos executados e


apresentada a respectiva factura, que o arguido Barbieri visava.
Os trabalhos efectuados para a CMF foram feitos e não são fictícios.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Foram endereçadas missivas a três empresas pela CMF (“Resin”, a qual
apresentou uma declaração da “João Tello”, constante de fls 220 do apenso 98,
“Craveira” e “Translousada”).
Os trabalhos foram adjudicados à “Resin”, a qual apresentou a proposta com o
preço mais baixo (de 33.600 cts), por ajuste directo.
A fls 241 e ss. do apenso 98 consta a análise das três propostas apresentadas
pelo Departamento Técnico da CMF, no qual foi aposto pela arguida Fátima um
despacho no sentido de se fazer o ajuste directo à firma melhor classificada, que
segundo a análise era a “Resin”.
A fls 242 do apenso 98 consta uma cópia de um despacho da arguida Fátima
Felgueiras a justificar o aludido ajuste directo (e a adjudicar os trabalhos à “Resin”).
A fls 317 do apenso 98 consta o respectivo contrato celebrado entre a CMF e a
“Resin” (adjudicação dos trabalhos pelo período de um ano), datado de 24.04.96.
Porém, a 06.08.96 o Tribunal de Contas não concedeu o necessário visto (cfr.
documento de fls 316 do apenso 98 e o documento de fls 252 do apenso 98 –
notificação da CMF da decisão a 19.08.96).
Em face disso foi suspenso o contrato celebrado entre a CMF e a “Resin”, salvo
erro no dia seguinte ao da notificação da recusa do visto pelo TC, segundo documento
elaborado pelo arguido Barbieri Cardoso, datado de 04.09.96 (cfr. documento de fls 253
do apenso 98).
Entretanto foi celebrado um novo contrato entre a CMF e a “João Tello”, onde
aquela adjudicava agora os trabalhos a esta, pelo valor de 16.800 cts, conforme
documento de fls 325 do apenso 98.
Tal terá sido decidido numa reunião ocorrida na CMF em Setembro de 1996,
conforme emerge de um manuscrito elaborado pela testemunha Fernanda Leal a
04.09.96, constante de fls 255 do apenso 98, onde se equacionaram as várias hipóteses
para se ultrapassar o impasse criado pela recusa do visto pelo TC.
No verso desse documento consta um manuscrito pelo arguido Barbieri Cardoso.
Desse documento não se extrai, como seria normal em face da solução adoptada,
que tenha estado alguém em representação da “João Tello”.
Entretanto, supostamente para ressarcir a “Resin” dos trabalhos que entretanto
teria levado a cabo, foi celebrado entre esta e a CMF um contrato de transacção,
conforme emerge do documento de fls 314 do apenso 98, datado de 20.09.96 e no valor
de 12.133.384$00.
A fls 311 do apenso 98 consta o auto de recepção definitiva da obra a 19.02.98,
assinado pela testemunha Ferreira Leite. Porém, não está assinada pela adjudicatária, o
que não é normal.
A “João Tello” emitiu cinco facturas (cfr. documentos de fls 328 a 344 do
apenso 98), sendo certo que no ofício que remeteu a factura de fls 344 do apenso 98
(documento de fls 343 do mesmo apenso) a arguida Fátima manuscreveu um despacho
dirigido à testemunha Terezinha a chamar a atenção para o terminus do contrato e para a
partir dessa altura fazer a imputação ao aterro da Lustosa (situado em Lousada e cujo
dono da obra era a AMVS).

324
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 179 do apenso 21 consta um fax dirigido, em 24.03.97, pela “Resin” à


CMF (para a arguida Fátima e para a testemunha Terezinha), solicitando o pagamento
das facturas.
Ora, os trabalhos supostamente efectuados pela “João Tello” foram pagos em
duas prestações, sendo certo que a ordem de pagamento referente ao segundo
pagamento não se acha assinada por alguém em representação da “João Tello” (no lugar
destinado à pessoa que recebeu a verba), o que não também normal.
Os cheques emitidos pela CMF à “João Tello” (cfr. os cheques emitidos pela
CMF a essa empresa, constantes de fls 2450 – no valor de 9.472.400$00 e datado de
11.12.97 - e 2451 dos autos – no valor de 7.253.077$00 e datado de 09.02.98) foram
endossados à “Resin” (endosso aposto no verso), que assim foi a destinatária desses
pagamentos.
Deduz portanto que o contrato celebrado entre a CMF e a “João Tello” mais não
foi do que a forma encontrada para contornar a recusa do visto por parte do TC, acima
referida.
Tem a ideia que um dos carimbos usados não pertenciam de facto à “João Tello”
(tratava-se de uma imitação), bem como a assinatura do respectivo legal representante
havia sido falsificada, no que se refere ao endosso para a “Resin” dos cheques emitidos
pela CMF a favor da “João Tello”.
Por outro lado, foi a “Translousada” a remeter à CMF cópia dos BI dos sócios
da “João Tello” e cópia do seguro-caução dessa empresa.
O documento de fls 310 do apenso 98 (ofício do arguido Barbieri de 24.03.98),
ilustra a dificuldade da CMF em contactar a “João Tello” por fax ou telefonicamente
(designadamente para assinar o auto de recepção definitiva da obra, sem o que não lhe
era possível levantar as verbas retidas).
Não se recorda se a investigação concluiu ter existido sobrefacturação dos
trabalhos relativamente às obras a que se referem os pontos 1.3 e 1.4 da pronúncia.
Os documentos de fls 22 e 23 do apenso 12 (apreendidos na “Resin”), relativos
ao aterro de Felgueiras, apresentam como valor em dívida as quantias de 92.394.905$00
e 101.214.905$00, respectivamente.
Porém, no verso do documento de fls 22 do apenso 12 consta um manuscrito
com os dizeres “recebemos e devolvemos os valores de Norlabor e João Tello quase na
íntegra”.
E o documento de fls 1112 dos autos reporta-se aos valores a serem
compensados via aterro RIB (documento que estava gravado num dos computadores da
“Resin” e que a investigação teve acesso através do auto de exame de dois discos
rígidos de computadores dessa empresa, constante de fls 1108 e ss. dos autos).
O objecto social da “Translousada” reportava-se ao aluguer de máquinas para a
construção civil.
O objecto social da “Resin” era o fornecimento de know how na área dos lixos.
À “Norlabor” foi adjudicada a construção dos ecocentros pela a AMVS, sem que
a “Resin” tivesse qualquer tipo de participação na execução dessa obra.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A CMF convidou três empresas (a “Resin”, a “Translousada” e a “Craveira”).
Na apresentação da sua proposta, a “Resin” declarou que iria recorrer à “João
Tello” (cfr. doc. de fls 219 do apenso 98), tendo apresentado declaração desta última
nesse sentido (cfr. doc. de fls 220 do apenso 98).

325
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A obra foi adjudicada à “Resin” (cfr. o contrato de exploração e manutenção do


aterro de Felgueiras por um ano, celebrado a 24.04.96 entre a CMF e a “Resin”, pelo
preço de 33.600.000$00, cuja cópia consta de fls 317 do apenso 98.
Porém, a 06.08.96 o Tribunal de Contas recusou o visto já depois da obra ter
sido adjudicada à “Resin” (cfr. doc. de fls 316 do apenso 98), decisão que foi notificada
à CMF a 18.08.96.
Em face disso, teve lugar uma reunião na CMF com o arguido Vítor Borges a
fim de se encontrar uma solução, conforme emerge do manuscrito de fls 255 do apenso
98 (feito em papel timbrado do Departamento Administrativo da CMF, ou pela
testemunha Terezinha ou pela testemunha Fernanda Castro Leal). Nesse documento
alude-se à presença de duas pessoas da “Resin”, Vítor Borges e Pedro Ribeiro.
Nesse documento não se faz qualquer alusão à presença de alguém em
representação da “João Tello”, ignorando se alguém dessa empresa esteve presente ou
não.
No verso consta um manuscrito aposto por outra pessoa, aludindo ao que deveria
constar na minuta do contrato a celebrar com a “João Tello” no que se refere ao
remanescente dos trabalhos a efectuar.
Foram adjudicados os trabalhos à “João Tello” por ajuste directo a 18.10.96
(pelo valor de 16.800.000$00, conforme documento de fls 325 do apenso 98) e foi
celebrado um contrato de transacção entre a CMF e a “Resin” a 20.09.96 pelo valor de
12.133.334$00 + IVA (cfr. documento de fls 314 do apenso 98).
A fls 286 do apenso 98 consta um fax da “Translousada” para a CMF (ao
cuidado da testemunha Fernanda Castro Leal), remetido a 04.10.96, a enviar cópia dos
BI dos sócios da “João Tello”, documentos que se prendem com a instrução do processo
de ajuste directo. Não tem qualquer explicação para o facto de ter sido a “Translousada”
a remeter esses documentos à CMF.
A fls 136 do apenso 97 consta um fax remetido pela “Translousada” (a 08.04.97)
para a “Resin” (ao cuidado da testemunha Luciano Barreira) a enviar cópia do contrato
celebrado entre a CMF e a “João Tello”.
Quando a PJ procurou contactar a “João Tello” não o conseguiram porquanto já
tinha cessado a sua actividade (tem a ideia que terá cessado a sua actividade pouco
depois do ajuste directo em causa neste ponto da pronúncia).
Entre Dezembro de 1996 e Março de 1997, a “João Tello” emitiu cinco facturas
à CMF (cfr. documentos de fls 328, 330, 331, 340, 342 e 344 do apenso 98).
Na factura de fls 344 do apenso 98 (remetida através da missiva de fls 343 do
apenso 98) foi aposto um despacho pela arguida Fátima Felgueiras, datado de 12.06.97,
mencionado no 1º parágrafo de fls 105 da pronúncia (cfr. ainda o ofício da CMF para a
AMVS, mencionado no 2º parágrafo de fls 105 da pronúncia, constante de fls 168 do
apenso 21).
A CMF, entretanto, procedeu a dois pagamentos:
- O primeiro através de um cheque emitido a 11.12.97, no montante de
9.472.400$00;
- O segundo através de um cheque emitido a 09.02.98, no montante de
7.253.077$00.
Tais cheques mostram-se endossados à “Resin”.
A fls 241 do apenso 97 consta um recibo da “Resin” à “João Tello”,
correspondente ao valor do primeiro pagamento efectuado pela CMF (nesse recibo faz-
se referencia a esse cheque)
Recorda-se que a autenticidade desses endossos (através das assinaturas e
carimbos usados) foi posta em causa.

326
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É perceptível que os carimbos usados para o endosso dos ditos cheques é


diferente dos carimbos usados pela “João Tello” nas facturas que emitiu à CMF.
A fls 311 do apenso 98 consta o auto de recepção definitiva da obra da parte
adjudicada à “João Tello”, datado de 19.02.98, mas só está assinado pela testemunha
Ferreira Leite (funcionário da CMF), não tendo qualquer assinatura do legal
representante da “João Tello”.
Na sequência de buscas efectuadas às instalações da “Resin” foram encontrados
documentos alusivos ao historial dos contratos referidos nos pontos 1.2. a 1.4 da
pronuncia, tendo por objecto serviços prestados na lixeira (cfr. fls 142 e ss. do apenso
97).
A fls 143 e 144 do apenso 97 alude-se a seis fases de trabalhos (com a respectiva
delimitação temporal) realizados pela “Resin” para a CMF, bem como ao respectivo
suporte documental e facturações.
Desse documento resulta que os contratos celebrados mais não eram do que
formas encontradas para que os pagamentos à “Resin” pela CMF pudessem ser
efectuados.
Com esses contratos a CMF beneficiou a “Resin”.
Nessa empresa foi apreendida documentação referente aos montantes em dívida
pela CMF (e valores não facturados), designadamente os quadros de fls 22 e 23 do
apenso 12 (no primeiro quadro consta uma dívida no montante de 92.334.000$00 e no
segundo quadro uma dívida no montante de 101.214.000$00).
Encontraram no entanto documentos que o levaram a concluir que o pagamento
foi efectuado pela AMVS no âmbito de outra empreitada (mencionada no ponto 1.5 da
pronúncia) – cfr. auto de exame dos discos rígidos dos PCs da “Resin”, constante de fls
1108 a 1112 dos autos principais.
A fls 1112 consta uma quadro referente a “valores a serem compensados via
aterro RIB”, reportados de 31.01.95 até 18.04.97 (as entidades envolvidas eram as
seguintes: testemunha Menezes desde 22.11.93 até a Janeiro de 1995; “Norlabor”; “João
Tello” e CMF).
Como o pagamento dos montantes em dívida iriam ser feitos através do aterro
RIB, deduz que foi por essa razão que a “Resin” não intentou qualquer acção a reclamar
o pagamento dessa quantia.

- Testemunha José Vitorino da Cunha Loureiro


Confrontado com o teor dos cheques emitidos pela CMF de fls 2450 e 2451 a
favor da “João Tello”, referiu que foi a testemunha Carlos Silva quem lhos entregou,
sendo certo que nessa altura já vinham endossados, tendo apenas aposto o carimbo da
“Resin”.
Foi o depoente quem preencheu o talão de depósito de fls 244 do apenso 97
(referente ao depósito do cheque de fls 2451).
Explicou que os cheques emitidos pela CMF eram sempre entregues em mão e
que o Sr. Carlos Silva tinha interesse em que esses cheques fossem pagos para que
dessa forma a “Resin” pudesse pagar à “Translousada”.
Em caixa o depoente tinha disponíveis cerca de 100/200 cts por mês, no máximo
300 cts. Tais quantias destinavam-se a pagar pequenas despesas (como por exemplo,
despesas de correio, reconhecimento de assinaturas, combustíveis e portagens).
Só o depoente e o Florentino Borges é que tinham a chave do cofre. Quando ele
faleceu, em finais de 1999, o depoente ficou com as duas chaves do cofre. Em 2000
entregou as chaves ao director financeiro da “Resin” (ao arguido Carlos Marinho).

327
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Os accionistas da “Resin” eram a “Sita”, a “Ecop” (desde 1999) e o arguido


Vítor Borges (a única pessoa singular que era accionista da empresa).
O depoente nunca movimentou contas de sócios.
Todos os contactos no sentido de solicitar o pagamento na área do Vale do
Sousa eram efectuados pelo Dr. Marça quando ele era o director financeiro da “Resin” e
pelo depoente no período de tempo em que a “Resin” esteve sem director financeiro.
O arguido Gabriel Almeida era o director-geral da “Resin” e era ele quem
contactava com as diversas entidades no Vale do Sousa.
O arguido Carlos Marinho apenas tratava da contabilidade, a qual era certificada
pelo ROC. Além disso, existiam auditorias por parte dos accionistas.
O arguido Gabriel ocupava-se muito da zona do Vale do Sousa e da Terra Fria.
Ouviu-o falar com o Sr. Florentino acerca de contratos, deduzindo que era ele quem
levava a cabo as negociações em representação da “Resin” pois era o director-geral da
empresa com responsabilidade pelos negócios naquela zona do país.

Análise crítica
Antes de mais, cabe referir que a adjudicação da empreitada de “exploração e
manutenção do aterro de Felgueiras” foi efectuada através de ajuste directo e não
através de um qualquer concurso público, conforme certamente por lapso emerge da
pronúncia.
O arguido Barbieri Cardoso referiu que a decisão de se proceder ao ajuste
directo em causa foi tomada pela arguida Fátima Felgueiras e que surgiu sensivelmente
ao mesmo tempo que a decisão de realização do concurso limitado a que respeita o
ponto 1.3 da pronúncia (logo, por alturas de Abril de 1995, numa altura em que ainda
era presidente da autarquia o arguido Júlio Faria. Aliás, ainda segundo o arguido
Barbieri, a decisão política da “Resin” permanecer na lixeira após a missão de
reabilitação foi tomada pelo arguido Júlio Faria, facto que este confirmou, o que
provocou embaraços jurídico-financeiros aos serviços camarários pelos motivos já
referidos).
Depreende-se assim que se tratam ambos de expedientes que visaram pagar à
“Resin” os trabalhos efectuados ou que entretanto esta houvesse de efectuar, já que a
deposição dos resíduos era diária e nunca parou, conforme parece ter resultado de forma
pacífica do depoimento de quem revelou conhecimento de causa acerca dessa
factualidade.
A ideia seria assim encontrar cobertura legal que permitisse à CMF pagar à
“Resin” tais trabalhos até ao momento em que essa responsabilidade passasse para a
AMVS, o que sucederia com a selagem da lixeira da Lustosa (cfr. o despacho de
11.06.97, manuscrito pela arguida Fátima Felgueiras na missiva remetida pela “João
Tello” à CMF e que acompanhou a factura nº 49 – cfr. fls 343 do apenso 98; cfr. ainda a
comunicação da CMF à AMVS de fls 168 do apenso 21, a missiva da “Resin” para a
CMF de fls 20 e 21 do apenso 12 e ainda o quadro de fls 22 do mesmo apenso).
Não foi posto em causa que a CMF endereçou os convites referidos na
pronúncia e que foram apresentadas as propostas pelas firmas ali referidas (cfr.fls 210 e
ss., 223 e ss. e 235 e ss. do apenso 98).
A “Resin” porpôs-se realizar os trabalhos, pelo período de um ano, ao preço de
2.800 cts mensais + IVA, partindo-se do pressuposto que se depositariam diariamente
65 toneladas de resíduos sólidos urbanos e 52 toneladas de resíduos industriais banais
(valor que parece ficar aquém da realidade, em face da anotação manuscrita aposta no
documento de fls 144 do apenso 97; cfr. ainda as declarações proferidas pelo arguido
Barbieri Cardoso a propósito da quantidade crescente de deposição dos resíduos ao

328
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

longo do tempo na lixeira de Sendim, em conjugação com o teor do documento de fls


12391 e ss.).
Foi na sequência de um parecer técnico que versou sobre as propostas
apresentadas, emanado pelo Departamento Tecnico da CMF (chefiado pelo arguido
Barbieri – cfr. fls 241 do apenso 98, onde a arguida Fátima apôs a 16.04.96 um
despacho a determinar o ajuste directo à firma ordenada em primeiro lugar) que a
arguida Fátima Felgueiras proferiu um despacho a 17.04.96, assim decidindo proceder à
adjudicação por ajuste directo dos trabalhos em causa à “Resin” (cfr. documentos de fls
242 e 243 do apenso 98).
O contrato respectivo viria a ser outorgado a 24.04.96, conforme documento de
fls 317 e ss. do apenso 98.
Naturalmente que os pagamentos ficariam dependentes do visto do TC.
Com essa adjudicação visava-se pagar à “Resin” os trabalhos que não estavam
cobertos em termos de pagamento pelo contrato referido no ponto 1.3 da pronúncia (que
cobria os pagamentos até Dezembro de 1995 – “3ª e 4ª fase”, segundo o documento de
fls 142 e ss. do apenso 97), conforme referiu o arguido Vítor Borges, e os que entretanto
se iam realizando na lixeira, já que os trabalhos não pararam (a deposição do lixo era
diária e era a “Resin” quem operava no local, ainda que subempreitando trabalhos,
designadamente à “Translousada” – cfr. a propósito os depoimentos da testemunha
Carlos Silva, dos arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho e sobretudo do arguido
Barbieri, o qual juntou aos autos documentação – que assertivamente analisou -, donde
emerge que, de facto, os trabalhos foram executados pela “Resin”; para além disso, o
pagamento de uma taxa pelos empresários pela deposição dos resíduos (a partir de
Junho de 1996 – cfr. documentos de fls 6729 e 6730, em conjugação com o teor do
depoimento dos arguidos Fátima Felgueiras e Barbieri Cardoso a esse propósito) atesta
que de facto na lixeira eram depositadas dezenas de toneladas de resíduos industriais
por dia; cfr. ainda o fax de fls 83 do apenso 97, dirigido pela “Resin” à “Translousada”,
à atenção da testemunha Carlos Silva, mencionado na pronúncia, donde emerge também
que a “Resin” operava no local, alugando equipamento com condutor à
“Translousada”).
Naturalmente que já se sabia que seria com a “Resin” que o contrato em causa
neste ponto iria ser celebrado (o arguido Vítor Borges referiu não ter existido qualquer
combinação no sentido da “Resin” apresentar a melhor proposta, mas fê-lo com tão
pouca assertividade que acabou por não descartar essa hipótese, a qual emerge de forma
clara do depoimento do arguido Barbieri Cardoso e dos responsáveis da “João Tello” e
das empresas a quem foram endereçados os “convites” – cfr. designadamente os
depoimentos das testemunhas José Manuel de Pinho Reis de Almeida, José Miguel
Santos Vieira Neves, Carlos Soares da Silva e José António Araújo Pereira).
Assim se explica que a “Translousada” (uma das empresas convidadas) tenha
remetido à CMF elementos referentes à “João Tello” e aos seus sócios-gerentes.
Acerca da falta de visto pelo TC (cfr. fls 316 do apenso 98), com assertividade
depuseram, designadamente, as testemunhas Fernanda Castro Leal e Terezinha do
Nascimento (sobretudo a primeira).
O arguido Barbieri Cardoso remeteu então um fax à “Resin” no sentido da
suspensão dos trabalhos (cfr. fls 253 do apenso 98), o que nunca viria a suceder,
conforme o próprio aliás referiu (daí que os trabalhos que viriam a ser adjudicados à
“João Tello” acabassem por ser pagos de facto à “Resin”, pois aquela empresa nada fez,
conforme unanimemente reconhecido por quem revelou conhecimento de causa acerca
dessa factualidade).

329
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Consequentemente, em face do facto desse contrato não poder produzir os


respectivos efeitos financeiros – vendo-se assim a CMF impedida de proceder a
qualquer pagamento à “Resin” por força do mesmo -, foi realizada uma reunião a
04.09.96, pelas 17.30 horas, de modo a encontrar-se uma solução para o impasse, nos
moldes descritos na pronúncia (cfr. documento de fls 255 do apenso 98 e,
designadamente, os depoimentos dos arguidos Vítor Borges e Barbieri Cardoso e das
testemunhas Fernanda Castro Leal e Paulo Ribeiro).
O documento de fls 255 do apenso 98 foi elaborado pela testemunha Fernanda
Castro Leal, no qual, no verso, o arguido Barbieri apôs também uma anotação.
Desse documento emerge que pelo lado da “Resin” estiveram presentes o
arguido Vítor Borges e a testemunha Paulo Ribeiro e da CMF a testemunha Fernanda
Leal e o arguido Barbieri (o qual terá sido chamado à reunião já no decurso da mesma).
A testemunha Paulo Ribeiro ter-se-á equivocado ao referir que a testemunha Terezinha
esteve presente, pois esse facto não foi referido por nenhum dos outros participantes;
igual equivoco incorreu ao referir não ter ideia da presença do arguido Vítor Borges (a
testemunha aliás não se recorda se a testemunha Fernanda Castro Leal esteve ou não
presente, quando é inequívoco que sim).
As hipóteses alternativas consideradas são as que se encontram descritas na
pronúncia, com excepção da primeira alternativa ali expressa, já que foi explicado com
assertividade que o “adicional ao contrato de recolha” não se prendia com a questão em
causa, tratando-se antes de outro assunto abordado na dita reunião (isto é, a “Resin”
aproveitou essa reunião para abordar também esse assunto – cfr. as declarações
prestadas a esse propósito pelos arguidos Vítor Borges e Barbieri Cardoso e pela
testemunha Fernanda Castro Leal, bem como o documento de fls 6725 e ss.).
A testemunha Fernanda Leal referiu ainda que a reunião em causa teve lugar no
seu gabinete, mas os elementos da “Resin” que nela participaram foram encaminhados
para si provindos do gabinete da arguida Fátima Felgueiras.
A mesma testemunha referiu já não se recordar se os dois valores apostos no
documento de fls 255 do apenso 98 (11.200 cts e 22.400 cts) o foram na reunião ou
posteriormente e se se reportam ou não aos valores dos trabalhos até então executados
pela “Resin” e ao valor dos trabalhos que faltavam executar por força do ajuste directo
(tudo parece indicar que sim, sendo certo que o valor global coincide com o valor da
adjudicação à “Resin”).
Entretanto, a solução adoptada foi a de formalmente adjudicar os trabalhos à
“João Tello” (cfr. despacho nesse sentido da arguida Fátima, datado de 10.09.96), pese
embora quem continuasse no terreno fosse a “Resin”, razão pela qual todos os
pagamentos efectuados à “João Tello” pela CMF (que foram dois) acabaram naquela
(de resto, nenhum representante da “João Tello” esteve presente na reunião ocorrida na
CMF a 04.09.96, sinal de que ali se abordou um assunto que de facto não lhe dizia
respeito).
A hipótese de se pedir uma reapreciação ao TC foi posta de parte, segundo a
arguida Fátima, porquanto seriam necessários cerca de mais 30 dias para a obtenção do
visto e os trabalhos na lixeira não poderiam parar.
O contrato celebrado entre a CMF e a “João Tello” foi assim formalizado a
10.09.96 (cfr. documento de fls 325 e ss. do apenso 98).
Como a “Resin” operou no local entre Janeiro de 1996 até à recusa do visto pelo
TC haveria que encontrar uma solução que permitisse à CMF pagar os trabalhos que ela
executara nesse período, razão pela qual foi celebrado o contrato de transacção de fls
314 e ss. do apenso 98, segundo, por exemplo, referido pelos arguidos Fátima
Felgueiras e Vítor Borges, o que faz todo o sentido.

330
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A justificação mencionada nesse contrato para a sua celebração refere que a


transacção em causa visava o pagamento dos trabalhos efectuados entre 25.04.96 e
5.09.96 (daí o valor de 12.133.334$00, à razão de 2800 cts/mês ou fracção; neste caso 4
meses e 10 dias).
Porém, do depoimento dos arguidos Fátima e Vítor retira-se que na verdade
pretendia-se compensar a “Resin” pelos trabalhos executados entre Janeiro de 1996 e a
data de recusa do visto pelo TC.
Certo é que o valor da transacção apenas cobre 4 meses e 10 dias (de 25.04.96
até 05.09.96), valor esse que foi pago, conforme emerge do teor dos documentos de fls
320 e 321 do apenso 98 (facto confirmado pelo arguido Vítor Borges).
Parece assim haver um período compreendido entre os meses de Janeiro e Março
de 1996 sem que exista qualquer cobertura legal que permitisse à CMF proceder ao
pagamento dos trabalhos realizados na lixeira de Sendim (a “5ª fase” mencionada no
documento de fls 142 e ss. do apenso 97).
Entretanto, a 18.10.96 foi celebrado o contrato de adjudicação da empreitada de
“exploração e manutenção do aterro de Felgueiras”, pelo valor de 16.800 cts + IVA,
conforme documento de fls 325 e 326 do apenso 98.
Tal valor corresponde a 6 meses de trabalhos, à razão mensal de 2.800 cts + IVA
(formalmente cobriria assim o período compreendido entre 19.10.96 e 18.04.97, altura
em que se previa que a responsabilidade do pagamento passasse para a AMVS – cfr.
documento de fls 168 do apenso 21 e o quadro de fls 22 do apenso 12).
Depreende-se da análise do documento de fls 142 e ss. do apenso 97 que quando
ele foi elaborado o problema da recusa do visto pelo TC ainda não se punha, na medida
em nesse documento previa-se que o ajuste directo à “Resin” cobrisse o pagamento dos
trabalhos entre Abril de 1996 e Março de 1997 (“6ª fase”), além de que então se previa
para Março de 1996 o pagamento dos trabalhos relativos à “3ª fase” (o documento foi
pois elaborado pelo menos antes de Março de 1996) . Ora, como se viu, os pagamentos
referentes (sensivelmente) ao período de tempo reportado à “6ª fase” acabaram por ter
como fundamento formal o contrato de transacção celebrado entre a CMF e a “Resin” e
o ajuste directo à “João Tello”.
Seja como for, já aquando da elaboração desse documento inexistia e não se
sabia qual seria o fundamento legal a que se lançaria mão para que a CMF procedesse
ao pagamento dos trabalhos realizados entre Janeiro e Março de 1996 (a “5ª fase”).
Na sequência da celebração do ajuste directo à “João Tello” esta emitiu 5
facturas (cfr. fls 328 a 340 do apenso 98), visadas pelo arguido Barbieri Cardoso.
Esta empresa porém nem sequer assinou o auto de recepção definitiva da obra
através de um seu legal representante, pois à data já tinha encerrado a sua actividade,
tendo aliás sido declarada falida pelo Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia. Isso
aliás explica algumas falsificações de documento, designadamente de endossos dos
cheques emitidos pela CMF a favor dessa empresa, que assim nem sequer os teve na sua
posse - cfr. o depoimento dos legais representantes da “João Tello” e de um funcionário
administrativo dessa empresa.
Naturalmente que sem a assinatura do auto de recepção defenitivo da obra não
seria possível o levantamento da caução (cfr.o auto referido a fls 311 do apenso 98 e a
missiva dirigida pela CMF, assinada pelo arguido Barbieri, à “João Tello” de fls 310 do
apenso 98).
No que se refere às ordens de pagamento e aos pagamentos efectuados pela
CMF e a forma como essas quantias acabaram na “Resin”, remete-se para os
documentos referenciados aquando da reprodução por súmula dos diversos depoimentos
acerca dessa matéria (e para os depoimentos em causa), de que se destacam os

331
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

depoimentos do arguido Carlos Marinho e das testemunhas Terezinha do Nascimento,


José Manuel de Pinho Reis de Almeida, José António Araújo Pereira e Carlos Soares
Silva, bem como o relatório de fls 4140 e ss..
A testemunha Lemolino Velosa, ROC da “Resin”, explicou ainda que os
montantes em dívida relativos à testemunha Menezes Basto (cfr. fls 199 do apenso 97),
à “Translousada” (cfr. fls 200 do apenso 97) e à “João Tello” (cfr. fls 201 do apenso 97)
foram considerados de cobrança duvidosa e perfazem o valor global de 28.211.803$00,
valor que coincide com o valor da provisão.
Acerca da relevância de uma falha de 20.000 cts nas previsões dos resultados de
exercício, em face do volume de facturação anual da “Resin” (a propósito da explicação
dada para a emissão de uma factura a rondar os 20.000 cts no final de 1997, quando já
se sabia que não iria ser paga pela CMF – cfr. a factura de fls 444 do apenso 96-A,
devolvida pelo arguido Barbieri a 08.01.98), entendemos que o depoimento desta
testemunha e do arguido Carlos Marinho não foi conclusivo.
Diga-se aliás que nenhuma relação foi possível estabelecer entre a emissão dessa
factura e a concessão do donativo de 20.000 cts ao FCF, matéria que mais à frente irá
ser abordada (de facto, nenhum elemento de prova produzido permite estabelecer essa
ligação – cfr., designadamente, as declarações prestadas pelo arguido Carlos Marinho).
Quanto a eventuais sobrevalorizações dos trabalhos (facto de que não nos
convencemos), oportunamente melhor explicitaremos qual a razão de ser da convicção
do tribunal a esse propósito.

Proventos e benefícios obtidos da Associação de Municípios do Vale do Sousa

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Admitiu que no decurso do ano de 1997 a AMVS lançou um concurso
internacional para a construção de três aterros sanitários e ecocentros, beneficiando dos
fundos comunitários previstos para o efeito.
Confirmou a composição da comissão de análise das propostas apresentadas,
conforme consta da pronúncia, sendo certo que no acto de abertura das propostas (que
teve lugar a 18.07.97) esteve presente um magistrado do MP, conforme legalmente
imposto.
No relatório da comissão de análise, por unanimidade, apontava-se o consórcio
“Resin/Sita/Ecop como aquele deveria vencer, sendo certo que nunca influenciou tal
comissão nem a AMVS no sentido de se adjudicar àquele consórcio tal empreitada (cfr.
fls 452 e ss. do apenso 105-B e o quadro de fls 3477, do 15º volume).
Por outro lado, visto que desde Outubro de 1995 o arguido Júlio Faria era
deputado na Assembleia da República, este nenhuma participação ou influência teve
naquela decisão da AMVS.
Confirmou a celebração do protocolo entre a CMF e a AMVS conforme consta
da pronúncia (cfr. documento de fls 5642 e 5643 dos autos, que terá sido elaborado pelo
assessor jurídico da CMF, Dr. Marques de Carvalho), explicando que tal se deveu à
circunstância de ter sido a CMF quem custeou a construção da estrutura em causa na
parte não financiada pela Comunidade Europeia e dado que eram essencialmente os
industriais do calçado de Felgueiras quem suportavam os custos do tratamento dos RIB
(já que na altura era a única estrutura que tinha prevista o pagamento de uma taxa em
função da tonelagem dos resíduos depositados, pesados por uma báscula, sendo por isso
a única estrutura que podia ter alguma viabilidade económica).

332
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quanto aos ecopontos, não pôs em causa a composição da comissão de


avaliação, tal como consta da pronúnucia, negando no entanto ter exercido qualquer
influência de modo a que o concurso viesse a ser ganho pela “Norlabor” (cfr. fls 452 e
ss. do apenso 105-B).
Referiu ignorar qual o montante em débito da CMF para com a “Resin”.
Em todo o caso, referiu que a CMF não pagou a quase totalidade dos serviços
prestados pela “Resin”, no que se refere ao aditamento ao contrato de transacção
celebrado com o Eng. Menezes Basto (trabalhos executados entre Abril de 1994 e
Dezembro do mesmo ano), aos serviços prestados entre Janeiro e Dezembro de 1995
(não contratualizados) e entre Abril de 1997 a Junho do mesmo ano, sendo certo que
entretanto a “Resin” processou a AMVS reclamando o pagamento do montante que
entendia estar em dívida.
Nega qualquer alteração do valor orçamentado nos moldes referidos na
pronúncia, sendo certo que a obra em causa, ao contrário do habitual, não teve trabalhos
extra, além de que a mesma foi fiscalizada por uma empresa contratada para o efeito
pela AMVS.
Referiu ignorar se o caderno de encargos foi integralmente respeitado, sendo
certo que os técnicos nunca lhe transmitiram qualquer alteração de preços.
A propósito do documento de fls 21 a 23 do apenso 12 referiu ainda que o preço
mensal de tratamento do lixo praticado pela “Resin” era de 2.800.000$00 mensais.
Referiu nunca ter visto os documentos de fls 386 e 388, ignorando do que se
trata.
O mesmo se diga relativamente aos documentos de fls 1108 a 1112 do 5º
volume, salientando nada saber acerca das relações existentes entre as empresas do
consórcio liderado pela “Resin”.

- Arguido Júlio Faria


Começou por estranhar estarem-lhe imputados factos no âmbito da matéria em
causa, visto que nessa altura já se tinha desligado por completo dos assuntos camarários,
pois era deputado na Assembleia da República.
Nega assim que alguma vez tenha influenciado o resultado do concurso em
causa, ao qual é absolutamente alheio, referindo desconhecer a respectiva matéria de
facto.

- Arguido Vítor Borges


Começou por referir os três concursos lançados pela AMVS, referentes a três
aterros, um situado em Felgueiras e referente aos resíduos da indústria do calçado, e
outros dois situados em Lustosa (Lousada) e Penafiel, referentes a resíduos industriais
banais.
De modo a concorrer a esses concursos a “Resin” consorciou-se com a “SITA” e
a “ECOP”, sendo a líder desse consórcio (reportava-se à concepção, construção e
exploração dos aterros).
Segundo ouviu falar em reuniões em que participou, a AMVS transferiu para a
CMF os direitos e deveres inerentes à exploração do aterro de Felgueiras, de sorte que a
partir dessa altura a CMF passou a ser a única intorlocutora (na fase de construção do
aterro a intorlocutora com o consórcio era a AMVS) – cfr. documento de fls 5642 e
5643 dos autos.
Quanto aos ecocentos (e não ecopontos, conforme referido na pronúncia) tem a
ideia de que a obra foi adjudiciada ou à “Norlabor” ou à “Translousada” (cfr. fls 542 e
ss. do apenso 105-B).

333
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Pese embora o não saiba com precisão, tem a ideia de que a CMF tinha uma
dívida na ordem dos 100.000.000$00 para com a “Resin” em meados de 1997.
Negou terminantemente qualquer alteração do valor global do orçamento com o
intuito expresso na pronúncia.
Porém, confrontado com os documentos de fls 21 a 23 do apenso 12, referiu ter
sido a primeira vez que os viu, desconhecendo em absoluto o seu conteúdo e remetendo
para o arguido Carlos Marinho a respectiva explicação, em face das funções que este
desempenhava então na “Resin” (arguido este que curiosamente também nada explicou
a esse propósito).
Do mesmo modo, referiu nada lhe dizer o documento de fls 1108 e 1112 do 5º
volume (documento recolhido num computador da “Resin”). Em face do seu conteúdo,
admitiu que esse documento tenha sido extraído do computador do Director Comercial
da “Resin”, Eng. Matias Rodrigues, o qual nunca tratou que qualquer assunto
relacionado com o aterro de Felgueiras.
O documento em causa não tem data, mas em face do seu conteúdo (refere 19
meses depois do dia 18.04.97) terá sido elaborado em Dezembro de 1998. Ora, nessa
altura a proposta de fls 336 já havia sido apresentada e adjudicada a empreitada em
causa. Consequentemente, interpretando o documento em causa e em face do seu título
(que aponta para o futuro), ele nada terá a ver com a matéria a que se reporta o ponto
1.5. da pronúncia.
Referiu em todo o caso que nenhuma compensação foi efectuada no aterro
“RIB”, não obstante o conteúdo do documento de fls 1112, do 5º volume.
Confrontado com o teor do documento de fls 302 do apenso 12, a propósito da
indicação dos 140.000.000$00 ali referida, explicou-a do seguinte modo:
Na altura os fundos comunitários cobriam 85% do custo de construção a fundo
perdido (mas já não os custos de manutenção, os quais seriam suportados a 100% pelo
dono da obra).
Como a exploração não era financiada no caderno de encargos apresentado
diminuiu-se em 140.000.000$00 os custos de exploração e distrubuíu-se essa verba em
vários items do caderno de encargos referente à construção do aterro.
Antes da entrega do caderno de encargos a “Resin” chegou a acordo com a
“ECOP” (na pessoa da testemunha Pedro Panzina) para que esses 140.000.00$00
revertessem para si, apesar de incluídos nos custos da construção (já que na verdade tal
verba – repartida e camuflada nos custos de construção - reportava-se antes aos custos
da exploração), sendo certo que as verbas destinadas à construção deveriam ser
entregues à “ECOP” e as verbas referentes à exploração destinavam-se à “Resin”.
Aliás, foi a ECOP quem procedeu à distribuição desses 140.000.000$00 pelos
vários items (cfr. fls 302 do apenso 12), sendo certo que a Comissão de Análise não
tinha qualquer possibilidade de detectar esse facto.
Os items escolhidos para a distribuição dos ditos 140.000.000$00 em princípio
não se reportavam a trabalhos que pudessem no futuro não estar previstos, já que nos
trabalhos a mais não poderia haver nem revisão nem empolamento de preços.
Confirmou que a “Resin” já possuia uma báscula, mas achou-se por bem incluir
na proposta referente ao aterro da Lustosa esse equipamento porque seria financiado a
85% pelos fundos comunitários.
Admitiu que o documento de fls 335 do apenso 12, datado de 14.07.97, é uma
cópia de um manuscrito constante de um papel timbrado da “ECOP”, sendo certo que a
proposta foi apresentada a 15.07.97 (cfr. fls 336 do mesmo apenso).
Do mesmo modo o documento de fls 328 consta de papel timbrado da “ECOP” e
que era usado para apontamento de notas.

334
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quanto ao adiantamento recebido da AMVS, foi todo remetido à “ECOP” (cfr. a


missiva da “Resin”, assinada pelo depoente, datada de 11.11.98 e dirigida à “ECOP”,
onde aquela se comprometia a remeter-lhe esse dinheiro quando cobrado).

- Arguido Carlos Marinho


Esclareceu no consórcio RESIN/SITA/ECOP era a “Resin” a líder do mesmo,
confirmando que os trabalhos em causa foram adjucados nos termos constantes da
pronúncia (cfr. fls 452 e ss. do apenso 105-B, relativamente às propostas apresentadas a
concurso e respectiva análise; fls 388 e ss. do mesmo apenso 105-B, respeitante ao
contrato de empreitada celebrado entre a AMVS e o dito consórcio).
Confirmou que foi recebida pela “Resin” o adiantamento da quantia de
371.400.731$00 (cfr. factura nº 9801239, de 22.10.98), sendo certo que, segundo
explicou, esse dinheiro foi remetido na sua totalidade à “ECOP” para a aquisição dos
materiais de construção. De resto, a “ECOP” encarregou-se da construção do aterro e a
“Resin” da sua exploração.
Quanto à alegada alteração do valor global do orçamento em 140.000.000$00 a
mais, referiu nada poder explicar visto que desconhece a matéria em causa. Em todo o
caso, tal como já havia feito o arguido Vítor Borges, referiu que os fundos comunitários
apenas incidiam sobre os custos da construção da obra.
Quanto aos quadros de fls 21 a 23 do apenso 12, negou ter sido ele o autor
desses documentos, desconhecendo o respectivo teor.
Idêntica posição assumiu relativamente ao documento de fls 1112 do 5º volume
(retirado de um computador da “Resin”) e ao documento de fls 302 do apenso 12 (o
qual se reporta aos 140.000.000$00 referidos na pronúncia).

- Arguido Barbieri Cardoso


Começou por referir que, ao contrário do que consta da pronúncia, a candidatura
reportou-se a um fundo de coesão (que visa o apoio à construção de infra-estruturas
essenciais ao desenvolvimento dos Estados-membro da União Europeia) e não a um
quadro comunitário de apoio.
O sistema intermunicipal do Vale do Sousa consistia em dois aterros
intermunicipais para resíduos sólidos urbanos (em Lustosa – Lousada e Canelas-
Penafiel), num aterro de resíduos sólidos industriais banais do sector do calçado (em
Sendim – Felgueiras), duas centrais de transferência de resíduos, vários ecocentros e
ecopontos.
Fez parte da Comissão de Análise referida na pronúncia – cuja composição
confirmou - na medida em que a AMVS recorria aos técnicos dos municípios
respectivos (as câmaras municipais indicavam os respectivos técnicos que integravam a
comissão de análise relativa a concursos de obras a edificar no concelho respectivo).
No concurso em questão salientou que a Tutela (Instituto dos Resíduos) encetou
um acompanhamento sistemático.
Foi feito o respectivo anúncio (com publicação no Jornal Oficial das
Comunidades Europeias - cfr. fls 197 e ss. do apenso 105-B), bem como o anúncio dos
critérios de apreciação das propostas (cfr. fls 203 e 219 do apenso 105-B), que elencou.
Foi elaborado o programa do concurso (cfr. fls 208 e ss.do apenso 105-B).
Foi ainda elaborado o respectivo caderno de encargos (cfr. fls 223 e ss. do
apenso 105-B).
A Comissão de Análise subdividiu os critérios de apreciação em subcritérios de
modo a fazer uma apreciação mais rigorosa.

335
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O trabalho de preparação do concurso foi conjunto entre o director do GAT e o


Ministério do Ambiente, acompanhado pelo Instituto dos Resíduos (que tutelava os
concursos).
A abertura de propostas ocorreu em Julho de 1997, tendo sido apresentadas 10
propostas e 5 concorrentes.
Foi defenido o método de trabalho na apreciação das propostas, tendo-se
efectuado grelhas.
Refutou veementemente qualquer favorecimento na apreciação das propostas,
que reputou de rigorosa, tendo-se procedido à análise dos documentos de fls 329 e ss.
do apenso 105-B, em especial os quadros de fls 345 e ss do mesmo apenso (de modo
aliás muito assertivo e que nos pareceu plausível).
De resto, segundo referiu, a Comissão de Análise não era obrigada a apresentar
tais quadros, mas fê-lo por uma questão de transparência.
A “Abrantina” reclamou da apreciação efectuada pela Comissão de Análise, sem
sucesso, na medida em que apresentou uma proposta dimensionada para 5 anos quando
deveria ser para 10 anos. Naturalmente que por esse facto a sua proposta tinha um preço
menos elevado.
O TC levantou problemas quanto à modalidade do concurso adoptado pois
entendia ser uma concessão.
O consórcio liderado pela “Resin” venceu o concurso sobretudo devido à sua
melhor solução técnica (pois previa a triagem e o enfardamento do lixo, o que permitia
aumentar o tempo de vida útil do aterro).
A diferença de preço era de apenas 50.000 cts relativamente à segunda proposta
classificada.
O preço de exploração do consórcio liderado pela “Resin” era mais alto (devido
ao enfardamento e à triagem), daí o teor do ponto 3 das conclusões do relatório de
análise das propostas, constante de fls 351 do apenso 105-B.
Confrontado com o quadro de fls 302 do apenso 12, a propósito da
sobrevalorização do preço em 140.000 cts, referiu desconhecer tal matéria, nunca tendo
visto tal documento.
Porém, em face do que ouviu aos arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho,
referiu que qualquer empreiteiro revê preços antes de apresentar as respectivas
propostas.
Salientou em todo o caso que a obra custou exactamente o orçado, sem qualquer
derrapagem, o que significa que a proposta vencedora era exequível pelos preços nela
apresentados.
Não tem qualquer conhecimento do historial da dívida da CMF à “Resin”,
segundo declarou após ser confrontado com o documento de fls 22 e 23 do apenso 12.
Revelou ainda desconhecer o teor do documento de fls 1112 do 5º volume
(“valores a serem compensados com o aterro RIB”).
Referiu ainda que o concurso para a construção do aterro da Lustosa
contemplava a exploração provisória das lixeiras no que se refere aos resíduos
domésticos. Porém, na lixeira de Sendim continuavam a ser depositados resíduos
industriais. Ora, o preço praticado pela “Resin” apenas contemplava os resíduos
industriais e não os resíduos domésticos, razão pela qual exigia o pagamento desse
serviço.
Esse argumento não foi aceite pela CMF remetendo a decisão para a AMVS,
que deixou de lhe pagar esse serviço porque a verba se esgotou, tanto mais que a
“Resin” não cumpriu o prazo de construção do aterro da Lustosa, onde o lixo doméstico
deveria ser depositado.

336
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O mesmo problema surgiu relativamente aos resíduos industriais, pois também


houve atraso na construção do aterro de Sendim.
Quanto aos ecocentos, o depoente confirmou ter integrado também a Comissão
de Análise das propostas apresentadas, conforme referido na pronúncia.
Estava prevista a construção de três ecocentros em Felgueiras (Felgueiras, Lixa e
Barrosas), acabando por apenas se construir um ecocentro em Várzea.
A 05.08.97 procedeu-se à abertura das propostas.
Os critérios de avaliação foram também anunciados (tendo-os explicado), tendo
a Comissão de Análise procedido à sua subdivisão em subcritérios pelas mesmas razões
anteriormente referidas (cfr. o respectivo anúncio a fls 481 e ss. do apenso 105-B).
A proposta da “Norlabor” destacou-se no critério a3 (qualidade arquitectura e
esquema operativo) e no critério a2 (dimensionamento da solução), tendo sido assim a
proposta vencedora (o depoente não tem conhecimento de qualquer reclamação).
Comparando-se os critérios dos dois concursos referidos neste ponto da
pronúncia, verifica-se que o critério “preço” não é tão importante no concurso referente
ao aterro de Sendim.
O depoente explica esse facto pela circunstância dos ecocentros serem estruturas
mais simples, pelo que nos aterros relevam mais os aspectos técnicos das soluções
apresentadas. Seja como for, entende que nos concursos dos aterros o critério “preço”
deveria ter uma valoração superior a 10%, mas tal assim não foi estipulado.
Em todo o caso, fez questão de salientar que não foi ele quem definiu os
critérios de avaliação das propostas.
A construção do ecocentro importou em cerca de 50/60.000 cts e ocupou uma
área de cerca de 3.000 m2 (já a área ocupada pela lixeira e aterro de Sendim é de 93.000
m2).
Mais uma vez nega qualquer favorecimento de algum concorrente neste último
concurso.
Salientou aliás que a “Resin”, devido aos valores em causa, pretendia sobretudo
vencer o concurso referente à prestação de serviços de recolha e transporte a aterro dos
resíduos sólidos urbanos e varredura das ruas nos concelhos de Felgueiras, Lousada e
Paços de Ferreira, a que ela concorreu consorciada com a “SITA”. Porém, não venceu
esse concurso, de sorte que se alguma vez tivesse pretendido favorecer a “Resin” seria
por certo nesse concurso e não nos que são mencionados na pronúncia (quem venceu foi
a “SUMA”, a qual apresentou uma proposta de 3.999.780.000$00, ao passo que o
consórcio “Resin/SITA” apresentou uma proposta de 3.060.510.000$00).
De resto, os documentos de fls 59 e ss., juntos por si no apenso 137, ilustram
precisamente que nunca procurou favorecer a “Resin”, documentos esses que explicou.

- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira


No relatório de fls 4140 e ss. procedeu-se à análise das relações existentes entre
a CMF, a AMVS, a “Sita”, a “Ecop”, a “Resin” e a “Norlabor”, tendo-o confirmado.
Acerca do quadro de fls 302 do apenso 12 (cfr. fls 13 do relatório de fls 4140 e
ss.) referiu não o conseguir explicar (só quem o elaborou é que o poderá explicar).
A propósito do documento de fls 1112 do 5º volume – que referiu não se
recordar – disse que a anotação a lápis é da sua lavra (reporta-se ao quadro dos valores a
serem compensados via aterro RIB).
Também no documento de fls 335 do apenso 12 (manuscrito) aparece a
referência aos 140.000 cts, ignorando qual a sua proveniência (ao que parece terá sido
elaborado pela testemunha Panzina, segundo declarou esta última).

337
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Conforme consta do relatório referido, a “Resin” perdoou as quantias de


24.187.400$00, 1.129.418$00 e 2.894.985$00, valores que considerou incobráveis.
Criaram-se provisões e utilizaram-nas simultaneamente. Considerou-se um custo de
provisões para créditos de cobrança duvidosa, anulando-se o saldo da dívida. Não
obteve qualquer explicação para esse facto.
Normalmente as ditas provisões só são anuladas quando se obtém a cobrança do
crédito. No caso, porém, essas provisões foram logo anuladas.
A esse título existem percentagens presumidas pelo fisco. O método usado pode
ter como consequência evitar o pagamento de IRC.
No caso dos autos tal vantagem não se coloca porquanto as provisões foram logo
anuladas, de modo que nem sequer aparecem nos mapas fiscais e no relatório de contas
da “Resin” (só aparece na conta de custos por natureza).
Seria sempre, em todo o caso, uma provisão não aceite.

- Testemunha Adriano Rafael de Sousa Ferreira


Tendo sido gerente e accionista da “Norlabor” desde 1995 até 2003 assegurou
que a “Norlabor” não foi favorecida na adjudicação da construção do ecocentro de
Felgueiras por conta da AMVS, tendo cumprido o respectivo caderno de encargos.

- Testemunha Albino Pinto Leitão


Foi Director do Departamento Administrativo da CMF, tendo dado apoio
administrativo ao Conselho de Administração da AMVS desde 1991 até Dezembro de
2004.
No âmbito desse apoio teve intervenção na área dos concursos referentes aos
aterros de Lustosa (Lousada), Penafiel e RIB do calçado de Felgueiras (procedeu à
orientação administrativa dos respectivos procedimentos, como por exemplo,
diligenciava pela publicação dos avisos no Diário da República e nos jornais e assistia à
abertura das propostas, onde era assessorado pela jurista da CM de Lousada).
Explicou que era o Gabinete de Apoio Técnico da AMVS que elaborava o
caderno de encargos dos concursos.
Os pagamentos das facturas aos empreiteiros era feito em função dos autos de
medição.
Recorda-se que o consórcio formado pela “Resin”, “Ecop” e outra de cujo nome
já não se recorda venceu os concursos internacionais para a construção dos aterros
acima referidos. Um dos consorciados tinha de ter no pacto social como actividade o
tratamento dos resíduos sólidos.
À “Norlabor” foi adjudicada a construção dos ecopontos em cada um dos
municípios referidos.
Só conhecia as empresas dos concursos, não tendo qualquer relacionamento com
as mesmas.
Quando terminou a construção do aterro de Felgueiras a AMVS delegou na
CMF a gestão dessa infra-estrutura, ignorando porque foi tomada tal decisão, deduzindo
porém que tenha exisido um pedido da CMF nesse sentido.
Mencionou que existiram 3 casos de pedido de adiantamento de verbas, o que
foi concedido ao abrigo do regime jurídico das empreitadas de obras publicas.
O objecto desses concursos era novo para a AMVS e a nível nacional, sendo
certo que o Aterro RIB do Calçado de Felgueiras foi o primeiro do país. Foi de resto
nessa altura que surgiram empresas cujo objecto social era o do tratamento dos resíduos
sólidos.

338
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em 1998 foi aberto um concurso internacional para a recolha dos resíduos


sólidos nos concelhos de Felgueiras, Paços de Ferreira e Lousada, tendo sido ganho pela
“Suma” (a “Resin” também concorreu).
No âmbito da sua actividade na AMVS nunca se apercebeu de qualquer
favorecimento à “Resin”.
De resto, a AMVS foi fortemente fiscalizada pela União Europeia e nada de
anormal foi encontrado, tendo mesmo merecido um elogio pela organização
demonstrada.

- Testemunha José Pedro Martins Panzina


Referiu ter trabalhado na “ECOP” durante 25 anos até princípios de 2002.
Exerceu as funções de assessor da administração dessa empresa e dela foi administrador
durante 3 anos (desde 1999 até 2002).
A “ECOP” teve uma relação de accionista e de consórcio com a “Resin”
relativamente a algumas empreitadas, em finais dos anos noventa e durante cerca de 2
ou 3 anos.
A “ECOP, SGPS”, empresa do grupo “ECOP” chegou a deter 20% do capital
social da “Resin”.
Esclareceu o depoente que trabalhava na “ECOP” (construtora civil) e não na
“ECOP, SGPS”.
No tempo em que a “ECOP, SGPS” deteve uma participação na “Resin” o
depoente exerceu funções nesta última no Conselho Fiscal. No âmbito das suas funções
na “Resin” cabia-lhe reunir uma vez por ano com o presidente do Conselho Fiscal (a
testemunha Velosa, o qual era revisor oficial de contas) a fim de subscrever os relatórios
que esse Conselho tinha de elaborar.
A ECOP consorciava-se com outras empresas para a construção e exploração de
obras públicas quando era necessária a junção de várias empresas com objectos sociais
diferentes mas complementares.
Foi o caso dos concursos promovidos pela AMVS no que concerne à construção
e exploração de aterros sanitários.
Nos consórcios o depoente outorgou quase todos os contratos como procurador
da “ECOP”.
Participava nas reuniões com a AMVS quando não se circunscreviam a questões
técnicas (isto é, quando estavam em causa questões ligadas com a gestão dos projectos).
Regra geral era o depoente quem elaborava ou revia o texto dos contratos
celebrados pelo consórcio.
Em todo o caso, por norma, os termos dos contratos de empreitada são impostos
pelos donos da obra, não deixando grande margem de manobra às empresas de
construção.
O consórcio com a “Resin” venceu três concursos promovidos pela AMVS
(relativos ao aterro da Lustosa, ao aterro de Penafiel e ao aterro RIB de Felgueiras).
Entre a “Resin” e a “Ecop” estabeleceu-se que a empresa que tivesse mais
trabalhos a seu cargo é que procedia à emissão das facturas para o dono da obra e
recepcionaria as facturas dos trabalhos efectuados pelo outro membro do consórcio.
A facturação ao dono da obra passou a ser efectuada separadamente pelas duas
empresas quando cessou a relação accionista e a relação de confiança até então
existente.
No que respeita à empreitada referente à construção do aterro RIB de Felgueiras
crê que foi a ECOP quem inicialmente facturou directamente à AMVS, mas não tem a

339
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

certeza desse facto (passando depois ambas as empresas a facturar directamente à dona
da obra quando cessou entre ambas a relação de confiança).
Não se recorda se existiu algum adiantamento de pagamento pela AMVS, sendo
certo que em caso afirmativo tal facto estaria plasmado no contrato e coberto por
garantias bancárias.
Foi então confrontado com os documentos de fls 223 e 224 do apenso 20 e com
o documento de fls 269 do apenso 12 (este último reportado a uma missiva da AMVS
autorizando que a factura emitida pela “Resin” referente ao montante de
389.970.778$00 fosse apresentada para adiantamento a uma empresa de factoring).
Confrontado também com o documento de fls 371 e ss. do apenso 105-B
(contrato de consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” para a construção do aterro de
Felgueiras), constatou que afinal era a “Resin” a líder do consórcio (pelo que seria ela a
facturar directamente à AMVS). A razão de ser desse facto é a circunstância de caber à
“Resin” a exploração do aterro, pelo que a relação com a dona da obra seria mais
duradoira, factor que afastou a regra de que quem facturaria à dona da obra seria a
empresa com mais trabalhos, que neste caso era a “ECOP” (a qual se encarregou da
construção).
Confrontado com o documento de fls 4160 referiu tratar-se do mapa da obra em
causa (quadro elaborado no âmbito de uma das perícias efectuadas na fase de inquérito)
e, em face da sua análise, deduziu que o adiantamento beneficiou ambas as empresas
(segundo a perícia o recibo do adiantamento data de 08.02.99, ao passo que o
manuscrito do arguido Júlio Faria, constante de fls 170 data de 06.11.98, a mesma que
consta da missiva da AMVS para a “Resin” de fls 269 do apenso 12 a propósito da
autorização concedida para a apresentação de uma factura a uma empresa de factoring
respeitante a um adiantamento).
Confrontado com a missiva de fls 273 do apenso 12, da “Resin” para a “ECOP”
(onde aquela dava conhecimento a esta do teor da missiva da AMVS de fls 269 do
apenso 12 e onde se comprometia a liquidar o montante referido imediatamente após
boa cobrança), deduz agora que todo o montante do adiantamento tenha ido para a
“ECOP”, o que faz sentido na medida em que o adiantamento para materiais em
princípio deveria destinar-se a quem iria proceder à construção (no caso a “Ecop”) e não
para quem apenas iria proceder à exploração do aterro (a “Resin”). Em todo o caso, a
perícia chegou a conclusão diversa, pois segundo ela, uma verba que ronda os 50.000
cts ficou para a “Resin”.
Ignora se antes dessa obra a “Resin” tinha tido já alguma relação comercial com
a CMF.
Confrontado com os documentos de fls 20 (missiva da “Resin” à CMF), com os
quadros de fls 22 e 23, todos do apenso 12 e com o documento de fls 1112 (“Valores a
serem compensados via aterro RIB”) revelou acerca deles desconhecimento.
Referiu ainda ignorar se a “Resin” concedeu ou não algum donativo ao FCF,
pois o Conselho Fiscal não analisava esse tipo de assuntos e as respectivas reuniões
eram muito rápidas.
A propósito do quadro de fls 302 do apenso 12 referiu que quando foi ouvido
pela PJ foi confrontado com esse documento.
Esclareceu que a AMVS não tinha qualquer dívida para com a ECOP.
Havia um valor que se reportava a custos indirectos com a gestão da obra (por
exemplo os custos com a montagem do estaleiro).
O valor de 140.000.000$00 constante da coluna a azul no documento de fls 302
do apenso 12 não lhe é estranho e pode estar relacionado com o fecho da obra.

340
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assegurou que nunca discutiu com o arguido Vítor Borges a distribuição dessa
verba de 140.000 cts (ao contrário do que foi referido por este).
O arguido Ferreira de Almeida era o único interlocutor da “Resin” com a “Ecop”
nas obras para a AMVS, o qual aliás foi contratado pela “Resin” para director-geral com
o acordo da “Sita” e da “Ecop”, tendo como missão desenvolver os negócios na zona
Norte do país (por seu turno, o arguido Vítor Borges, para além de ser administrador da
“Resin”, passaria a ocupar-se do desenvolvimento dos negócios noutra zona geográfica
de Portugal).
O arguido Carlos Marinho, por seu turno, era contabilista na “Resin”.
No fecho da proposta a apresentar ao concurso os representantes das empresas
do consórcio (no caso o arguido Ferreira de Almeida pela “Resin” e o Engº Paranhos
pela “Ecop”) faziam a distribuição dos custos indirectos e a margem de lucro pelos
vários items da proposta, de modo que esse facto é encapotado na proposta apresentada.
Um dos critérios utilizados era a da distribuição percentual por todos os items da
proposta ou então fazia-se incidir essa distribuição de custos indirectos e margem de
lucro num dos capítulos da proposta.
Explicou que a estrutura das propostas segue a estrutura dos cadernos de
encargos apresentados pelo dono da obra, sendo assim comum a todos os concorrentes.
Confrontado com o documento de fls 386 do apenso 12 (missiva dirigida por
advogados à “Resin” a propósito alterações a algumas cláusulas de uma minuta de um
contrato de consórcio, minuta essa que inexiste nos autos), referiu desconhecer esse
documento. Explicou que os representantes das duas empresas reuniram-se, tendo
ficado definido que um valor daquela ordem de grandeza deveria ser distribuído pelos
items da proposta a apresentar a concurso. Tal circunstância sucedia com todas as
empreitadas tanto quanto pôde experienciar. Deduz que a verba de 140.000 cts referida
se prenda com isso mas não tem a certeza.
A propósito da matéria em causa assegurou não ter visto qualquer manuscrito
dos arguidos Vítor Borges, Ferreira de Almeida e Carlos Marinho.
Não tem qualquer ideia de ter discutido o assunto da distribuição da verba de
140.000 cts com o arguido Vítor Borges.
Explicou que o fecho da proposta é diferente do fecho da empreitada. Nesta, no
final da execução dos trabalhos, há um acerto de contas.
Assegurou que não houve qualquer acréscimo ao valor da proposta
(designadamente de 140.000 cts) depois de ter sido apresentada a concurso. O que
existiu, conforme já referiu, foi a inclusão de um valor adicional antes da apresentação
da proposta, respeitante a lucros expectáveis e a custos indirectos, valor esse que foi
distribuído por vários items da proposta.
Confrontado com o documento de fls 335 do apenso 12, referiu que é o autor
desse documento, manuscrito em papel da “Ecop”.
Conforme resulta da proposta apesentada pela “Resin”, a mesma foi apresentada
a 15.07 (cfr. documento de fls 336 e ss. do apenso 12) e a reunião para fecho da
proposta realizou-se no dia anterior (14.07). Essas reuniões aliás nunca são feitas com
muita antecedência para evitar a violação do segredo industrial.
Explicou que as diferenças entre as propostas dos vários concorrentes
(designadamente no que respeita às principais empresas naquele segmento de mercado)
normalmente situa-se ao nível dos custos indirectos e nos custos de gestão. Tais
questões devem ser decidias por apenas uma pessoa e o mais em cima possível do fecho
da proposta para evitar fugas de informação.
Referiu que na reunião referida (de fecho da proposta, ocorrida no dia 14.07), o
depoente serviu de secretário e admite que tenha feito nessa altura o documento de fls

341
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

335 do apenso 12, onde de facto aparece a dita verba de 140.000 cts. Aliás, à data, desse
documento apenas tinham conhecimento o depoente, o arguido Gabriel e a testemunha
Paranhos.
Explicou então o conteúdo do dito documento, referindo, em síntese, que nele se
retrata a distribuição da dita verba sobre os “preços secos” no fecho da proposta.
Esclareceu que 36.800 cts já estavam acrescidos e distribuídos pelos vários
items antes da reunião em causa, sendo certo que nesta foi acordado o remanescente do
acréscimo à proposta e respectiva distribuição pelos vários items.

- Testemunha Paulo José Bento Ribeiro


Referiu que a “Resin” fez consórcios com a “Hidroprojectos”, com a
“Aciconstrói” (para a zona Sul) e com a “ECOP”, aquando esta entrou no seu capital
social (para a zona Norte, isto é, Norte de Leiria).
A “ECOP” entrou no capital social da “Resin” quando o depoente já era
funcionário desta. Recorda-se que inicialmente a questão foi debatida consigo e
verificaram que a maioria das empresas do mesmo ramo da “Resin” associavam-se a
empresas de construção civil.
Assim, de modo a terem campo de expansão, tinham de se associar a uma
empresa de construção civil de alguma dimensão.
Procuraram então empresas desse ramo (participou inclusive a propósito numa
reunião com a “Mota e Companhia”, mas o negócio não se concretizou com esta visto
querer ter uma participação maioritária na “Resin”, o que não foi aceite pelos outros
accionistas), até que certo dia o arguido Vítor Borges lhe transmitiu que a “ECOP”
estaria interessada em adquirir, salvo erro, 25 ou 30% do capital social da “Resin” (que
era o capital que o accionista francês estava disposto a alienar).
Esclareceu que quando entrou ao serviço da “Resin” esta já recolhia o lixo e
fazia a manutenção das lixeiras do Vale do Sousa (Sendim, Lustosa e Paços de
Ferreira).
Em 1995 a Secretaria de Estado do Ambiente lançou o programa de irradicação
das lixeiras e construção de aterros sanitários.
A “Resin” propôs-se fazê-lo (um dos accionistas – a “Frace-Dechéts – construía
aterros anitários e a “Sitá” recolhia resíduos urbanos).
O depoente, em ordem a exercer as suas funções, fez um estágio em França.
A lixeira de Sendim, em Felgueiras, encontrava-se com controle e com uma
actividade de manutenção (rudimentarmente eram acamados os resíduos e tapados com
terra).
Inicialmente essa lixeira recebia todos os tipos de resíduos urbanos e industriais
do calçado.
Com a construção do aterro da Lustosa (Lousada) encerraram-se as lixeiras e a
lixeira de Sendim passou a receber apenas os resíduos industriais banais.
Posteriormente foi construído em Sendim o aterro RIB.
De facto, foi lançado o concurso enunciado no ponto 1.5 da pronúncia e o
consórcio “Resin”/”Ecop”/”Sitá” venceu-o.
O depoente participou na concepção do projecto que esse consórcio apresentou a
concurso. Porém, não foi esse o projecto que na verdade viria a ser executado em face
das alterações que entretanto se tornaram necessárias por força do que se constatou
posteriormente no local.
Assim, aquando da assinatura do respectivo contrato de empreitada entre o
consórcio e a AMVS as alterações ao projecto já estavam concluídas (nas quais o
depoente não teve qualquer participação), o que provocou alterações orçamentais.

342
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tal obra implicou o encerramento definitivo da lixeira de Sendim, a qual ainda


continuava em actividade durante a fase de construção do aterro RIB de Felgueiras,
recebendo apenas os resíduos industriais do concelho de Felgueiras.
À “Resin” competia a manutenção e exploração do aterro RIB de Felgueiras,
bem como o encerramento da lixeira de Sendim, com a respectiva selagem. Para o efeito
a “Resin” socorria-se de subempreiteiros com o alvará necessário (que a “Resin” não
tinha).
À “Ecop” coube a construção do aterro RIB de Felgueiras, mas o fornecimento
de equipamento técnico podia e deveria ser feito pela “Resin”, já que foi ela que os
escolheu.
No primeiro projecto (o que se apresentou a concurso) contemplava-se quer a
exploração do aterro quer o encerramento da lixeira de Sendim.
Uma vez que não teve intervenção ao nível das alterações entretanto
introduzidas a esse projecto, ignora qual foi o concreto objecto da empreitada celebrada
entre o consórcio e a AMVS.
Em todo o caso, sabe que a “Ecop”, para além da construção do aterro, a partir
de determinada altura deveria proceder às alterações de projecto com a “Hidroprojecto”,
do qual o arguido Gabriel Ferreira de Almeida (director-geral da “Resin”) era
informado.
Confrontado com o documento de fls 1112 (“Valores a serem compensados via
aterro RIB”), referiu tratar-se de um quadro que desconhece, paracendo-lhe um
documento de natureza contabilística.
Em face do respectivo título, deve corresponder à dívida da CMF para com a
“Resin”.
O aterro RIB de Felgueiras foi promovido pela CMF com o intuito de resolver o
problema do destino a dar aos resíduos industriais do calçado; porém, foi a AMVS que
lançou o respectivo concurso por forma a que fossem utilizados fundos comunitários.
Não sabe explicar de que forma a dívida da CMF iria ser saldada através de
compensações via aterro RIB.
Confrontado com o quadro de fls 302 do apenso 12 referiu ser o respectivo autor
desse documento.
Tal mapa reporta-se ao projecto inicial submetido a concurso e ao respectivo
orçamento, o qual, como já disse, não foi aquele que acabaria por ser contratualizado
em face das alterações entretanto introduzidas.
Explicou que, enquanto director do Departamento de Estudos e Orçamento da
“Resin”, esse documento reflecte aquilo que o depoente pretendia no que se refere à
distribuição das verbas, cabendo à “Resin” o fornecimento do equipamento (tratamento
físico-químico dos resíduos, báscula, contentor com laboratório, unidade de triagem e
prensagem e queimadores atmosféricos), além da impermeabilização e selagem da
lixeira e exploração do aterro.
A verba de 140.000 cts que surge na coluna a azul no documento de fls 302 do
apenso 12 foi explicada pela testemunha em causa da seguinte forma:
1º - Havia uma parte na factura do orçamento que incluía encargos de estrutura e
que seriam devidos (apesar de não constarem expressamente do orçamento);
2º - Colocaram-se valores nos items referentes à construção do aterro que
compensavam o menor valor da exploração por 5 anos por parte da “Resin”, já que a
construção do aterro era subsidiada por fundos comunitários e a exploração não, o que
poderia sensibilizar o dono da obra; isto é, sobrevalorizavam-se os custos de construção
e subvalorizavam-se os custos de exploração, pelo que a “Ecop” receberia um valor que
na verdade pertencia à “Resin” como complementarização do valor da exploração (pois

343
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

não obstante formalmente, segundo a proposta, se reportasse à construção, esse valor na


verdade dizia respeito à exploração).
Provavelmente esses valores foram-lhe fornecidos pela “Ecop” quando fez o
fecho final da obra.
Ignora se tais valores foram considerados no projecto final da obra, pois, como
disse, o projecto incialmente apresentado viria a ser alterado.
Referiu ainda que o documento de fls 302 do apenso 12 deve ter sido feito pelo
depoente depois de apresentada a proposta pelo consórcio, tendo acerca disso falado
com o Engº Figueiredo (“Ecop”) e com a testemunha Panzina (da direcção comercial da
“ECOP”).
O fecho do orçamento da obra é feito pelos administradores das empresas que
integravam o consórcio. Tais valores devem ter sido acordados na véspera da
apresentação da proposta e, já depois de apresentada, foram-lhe transmitidos, altura em
que elaborou o documento de fls 302 do apenso 12.
Foi com os valores que resultaram da reunião que antecedeu a apresentação da
proposta que fez o quadro em causa (cfr. o documento da autoria da testemunha
Panzina, constante de fls 335 do apenso 12). Aliás, se não foi com base no documento
de fls 335 do apenso 12 que elaborou o quadro de fls 302 do mesmo apenso, terá sido
com uma transcrição desse documento, o qual provavelmente lhe foi fornecido pela
testemunha Panzina ou pelo Engº Figueiredo da “Ecop”. O documento que o depoente
elaborou trata-se de um documento interno da “Resin” e que se destinava a servir de
guia.
Refutou a ideia de que esses 140.000 cts representassem um inflaccionamento
do preço final da proposta para que dessa forma fosse saldada a dívida da CMF à
“Resin”.
Pelo menos grande parte dos 140.000 cts reporta-se à explicação que deu
(reconheceu não saber exactamente qual o valor que foi deslocado da exploração para a
construção pelas razões referidas). De facto, parte dessa verba destinava-se também a
compensar a “Resin” de alguns encargos gerais que a “Ecop” não tinha (pois prendiam-
se com a exploração e não com a construção). Tal verba serviu ainda em parte para
cobrar o custo respeitante aos encargos de estrutura, os quais eram elevados.
Tem pois a ideia de que a totalidade dessa verba se destinava à “Resin”, mas não
tem a certeza desse facto.
A dona da obra não sabia nem poderia saber, em face da proposta apresentada,
da inclusão desses 140.000 cts no orçamento respeitante à construção do aterro.
No orçamento respeitante à exploração durante 5 anos previa-se uma verba de
238.000 cts, o que não dá sequer 50.000 cts por ano, o que representa um preço de
1.000 a 1.100$00 por tonelada de resíduos depositados, preço que entende ser muito
baixo, pois na altura eram depositados cerca de 30 a 40.000 toneladas por ano de
resíduos, considerando que, para inexistir prejuízo, seria necessário que o preço a
tonelada se cifrasse no mínimo em 2.000$00, o que implicaria uma verba de 340 a
350.000 cts para a exploração do aterro por 5 anos.
Explicou que os custos de exploração subdividem-se em custos de exploração e
custos indirectos (inclui alguns encargos gerais, como por ex. seguros, provisão para
atrasos previsíveis no pagamento de facturas e para alterações de projecto, segurança
social, etc.).
Assim, o custo industrial da obra é-nos dado considerando-se um coeficiente que
se multiplica pelos preços directos ou, em alternativa, considerando o valor dos custos
indirectos, que se acrescem aos custos de produção (“preço seco”).

344
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Os encargos estruturais e alguns encargos gerais eram decididos pela


administração.
Não faz sentido que uma empresa de construção inclua nos seus custos serviços
para os quais não está habilitada.
Elaboram-se capítulos específicos nas propostas e inflacciona-se o preço da
construção em deterimento da exploração – sem alterar o valor global da proposta -
porque o dono da obra é mais sensível a ter que pagar mais na fase de construção e
menos na fase de exploração, pois é ele quem tem de suportar a totalidade do custo de
exploração na medida em que não era subsidiada por fundos comunitários (na
construção esses fundos subsidiavam 85% do respectivo valor). Foi esta a fislosofia
seguida na elaboração do documento de fls 302 do apenso 12, já depois de apresentada a
respectiva proposta.
Reconheceu que a báscula (contemplada com um valor de 7.800 cts) já existia,
pois já a tinham colocado na lixeira e aquando do seu encerramento iria ser deslocada
para o aterro. É certo que para o aterro estava prevista a aquisição de uma báscula, mas
como já dispunham de uma na lixeira não faria sentido a sua aquisição, pelo que o valor
correspondente (7.800 cts) reverteu todo para a “Resin”. Esse valor corresponde ao
preço da venda desse equipamento ao dono da obra.
Conforme já referiu, existiram alterações à proposta que venceu o concurso
(apresentada a 14.07.97, tendo o respectivo contrato sido assinado a 23.01.98, cfr. doc.
de fls 67 do apenso 20), por força de alterações ao projecto técnico (que segundo o
arguido Barbieiri Cardoso comportava apenas um estudo prévio e que mais tarde foi
melhor concretizado e alterado em face, além do mais, dos condicionalismos
evidenciados pela execução da obra), o que pressupôs um orçamento diferente (mas
que, ainda segundo o arguido Barbieri, não levou a um acréscimo no preço final da
proposta vencedora), visto que:
- construiu-se por exemplo uma estação de tratamento de lixiviados, pelo que, ao
contrário do que inicialmente estava previsto, não se confinaram ao respectivo
tratamento físico-químico (estação essa que o tribunal constatou ter sido construída
aquando da inspecção judicial ao local, conforme fotos entretanto juntas aos autos e
plantas analisadas e explicadas pelo arguido Barbieri nessa diligência);
- construiu-se uma unidade de triagem e prensagem dos resíduos (constatada
pelo tribunal no local);
- quando se iniciou a construção da estação de tratamento dos lixiviados, com a
construção de um tanque a juzante da lixeira, entre esta e o aterro, verificaram que
existia um veio de água que encheu essa zona, pelo que se procurou estancar essa linha
de água e em função disso tiveram de deslocalizar o próprio aterro, o que implicou uma
alteração do projecto, bem como as quantidades de movimentações de terras previstas e
telas necessárias para a impermeabilização (salientou que nesta altura já não participava
nas reuniões técnicas, nelas participando antes o arguido Gabriel e um técnico que veio
de França, de nacionalidade brasilera e que se chamava Octávio, o qual era especialista
no tratamento de lixiviados).
Foi a “Hidroprojecto” que procedeu a todas essas alterações ao projecto inicial
em articulação com a “Ecop” e com o apoio técnico do dito engenheiro Octávio
(fornecido pela “Resin”).
O contrato celebrado com a AMVS data de 23.01.98, conforme documento de
fls 67 do apenso 20, sendo certo que apresenta um valor de 981.467.000$00, ao passo
que a proposta vencedora do concurso apresentava um valor de 1.016.000.000$00.
*

345
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A propósito das declarações prestadas pela testemunha Paulo Ribeiro referiu o


arguido Barbieri Cardoso que em termos técnicos os concorrentes ao concurso
mencionado no ponto em causa tinham a obrigação de apresentar um estudo prévio na
medida em que se tratava, além do mais, de um concurso de concepção e construção.
Nunca houveram assim dois projectos, o que existiu foi um estudo prévio e um
projecto de execução, o qual foi elaborado posteriormente.
Assim, por exemplo, houve a necessidade de se alterar um alvéolo pelas razões
apontadas pela testemunha.
O projecto foi pois o desenvolvimento do estudo prévio apresentado com a
proposta vencedora, sendo certo que o “esqueleto” do projecto de execução foi
delineado numa reunião ocorrida no Porto, em Setembro de 1998, na Direcção Regional
do Ambiente.
*
A testemunha Paulo Ribeiro não pôs em causa as declarações acima exaradas e
referentes ao arguido Barbieri Cardoso.
Acrescentou que o aterro RIB de Felgueiras era um projecto piloto, sendo certo
que a Ministra do Ambiente de então veio a Felgueiras lançar a primeira pedra.
Acrescentou ainda que os projectos para os aterros tinham de ser aprovados pela
Direcção Regional do Ambiente e pelo Instituto dos Resíduos, instituto este que aliás
exercia fiscalização sobre a execução da obra de modo a que os fundos comunitários
fossem correctamente aplicados.
Como não acompanhou a construção do aterro RIB de Felgueiras ignora qual a
concreta fiscalização exercida por essas entidades, mas, com conhecimento de causa
relativamente aos aterros da Lustosa e de Penafiel, garantiu que o Instituto de Resíduos
exerceu a respectiva acção fiscalizadora.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


No que se refere ao concurso em causa neste ponto a “Resin” concorreu
consorciada com a “Ecop” e a “Sita”. O valor da proposta apresentada no dia 15.07.97
por esse consórcio rondava os 900.000 cts + IVA, dos quais 35% seria para a “Resin” e
65% para a “Ecop”.
Existiu um adiantamento a rondar os 390.000 cts (cfr. ofício da AMVS,
constante de fls 269 do apenso 12, ao que pensa para ser dividido entre as duas
empresas, mas já não pode precisar).
Confrontado com o documento de fls 269 do apenso 12, precisou que a AMVS
autorizou (com condições, isto é, desde que não lhe fossem imputados juros) a emissão
de uma factura antes do início das obras a fim de ser apresentada junto de uma entidade
financeira, a quem a “Resin” cedeu esse crédito e a qual terá então adiantado essa verba,
pelo que foi junto dessa instituição de aquisição de créditos que o consórcio se
financiou, pelo que mais tarde a AMVS pagaria esse valor (sem juros) a essa instituição,
sendo certo que tal prática é corrente (contrato de factoring) – cfr. ainda documentos de
fls 223 e 224 do apenso 20 (este último documento reporta-se a um fax de 27.10.98
remetido pela “Resin” à “AMVS” remetendo uma minuta tipo).
Obtida a autorização por parte da AMVS, a “Resin” comunicou esse facto à
“Ecop” por fax enviado a 11.11.98 (cfr. documento de fls 272 do apenso 12).
Confrontado com o quadro de fls 4160 conclui que a “Resin” recebeu, desse
adiantamento, uma verba de cerca de 50.000 cts.
Apreenderam na “Resin” o documento de fls 302 do apenso 12, onde nesse
quadro, na coluna a azul, se referencia uma verba de 140.000.000$00, o que relaciona

346
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

com o documento de fls 335 do apenso 12, cujo valor final é do mesmo montante.
Trata-se de uma fotocópia de um manuscito com contas elaborado em papel da “Ecop”.
Existe designadamente uma verba de 7.800 cts supostamente destinada à
aquisição de uma báscula, que aliás já existiria.
Nos documentos de fls 1108 e 1112 (encontrados num computador da “Resin”)
faz-se referência aos valores a serem compensados via aterro RIB.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


O documento de fls 302 do apenso 12 foi apreendido na “Resin”, e reporta-se a
um quadro onde se delimitavam os valores a serem distribuídos pelos elementos do
consórcio vencedor do concurso internacional aberto pela AMVS, referido neste ponto
da pronúncia.
Uma das colunas reporta-se à quantia de 140.000 cts e relaciona essa verba com
os quadros que se reportavam à dívida da CMF para com a “Resin” por serviços
prestados na lixeira de “Sendim”. Tem a ideia de ter visto uma referência a uma báscula
que já existia.
Concluíram assim que essa coluna da direita era um empolamento dos custos
(até porque essa coluna está destacada das outras).
O documento de fls fls 386 do apenso 12, datado de 11.12.97, reporta-se a uma
missiva remetida por uma sociedade de advogados à “Resin” a propósito de termos do
contrato de consórcio (tratam-se de acertos à minuta do respectivo contrato, minuta essa
que não consta dos autos) e onde se refere a verba de 140.000 cts (que teriam a ver com
a forma de distribuição das verbas relativas ao adiantamento pelos membros do
consórcio) – segundo concluiu em face de outros documentos e de elementos a que não
pode legalmente fazer referência -, não parecendo relacionar-se com a introdução desses
140.000 cts na proposta (cfr. a este propósito o manuscrito de fls 335 do apenso 12,
elaborado pela testemunha Panzina em papel da “Ecop”).
Ademais, a proposta para o concurso em causa pelo dito consórcio foi
apresentada a 15.07.97, conforme emerge do documento de fls 336 do apenso 12, pelo
que a missiva de fls 386 do apenso 12 não se poderia referir ao dito concurso (pois tem
uma data posterior à da apresentação da poposta).
No quadro de fls 1108 a 1112 refere que a data final da prestação de serviços
reporta-se a 18.04.97.
No quadro de fls 142 e ss. do apenso 97 refere-se que o início dos trabalhos
ocorreu a 22.11.93.
O valor mensal facturado pela “Resin” seria de 2.800 cts (cfr. fls 147 do apenso
97).
A “Resin” remetia à CMF documentos referentes à tonelagem de resíduos que
eram depositados, pois tem a ideia que a CMF cobrava uma taxa aos empresários pela
deposição dos resíduos.
Admite, em face dos documentos referidos, que a “Resin” tenha prestado
serviços na lixeira de Sendim.

- Testemunha Luís Gonzaga de Sousa Monteiro


É assessor do quadro de pessoal da AMVS. É colaborador dessa associação
desde 02.02.95.
Conhece o arguido Carlos Marinho desde 2000/2001 por causa de questões
relacionadas com facturação, dadas as relações existentes entre a “Resin” e a AMVS,
aquela enquanto membro de consórcios que prestaram trabalhos para esta.

347
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Até essa data as facturas eram emitidas à “ECOP”, contactando com os Drs
Lima e António Marça (direcção financeira) relativamente aos assuntos que diziam
respeito ao consórcio.
Só a partir de 2000/2001 é que o arguido Carlos Marinho passou a ter essas
funções, razão pela qual passou a ter contacto com ele.
O pessoal da AMVS era requisitado à CMF e com avençados, pois nessa altura
não podia ter pessoal próprio (só a partir de 1999 é que passou a ter um quadro de
pessoal próprio).
O depoente era o coordenador na área administrativa relativamente aos contratos
(juntamente com a testemunha Albino Pinto Leitão).
Relativamente ao fundo de coesão, a AMVS decidiu fazer uma candidatura na
ordem dos 4.500.000 contos, relativamente à construção de três aterros, seis ecocentros
e duas estações de triagem.
Tiveram a fiscalização da União Europeia, tendo tudo decorrido normalmente,
não se registando qualquer tipo de anomalia. Aliás, a fiscalização reconheceu a
regularidade do que encontraram.
O arguido Carlos Marinho perguntava ao depoente quando é que a AMVS
poderia pagar.
Ganhou com ele uma relação de amizade em face dos contactos que mantinham.
Ao que pensa em 2004, a “Resin” propôs uma acção contra a AMVS por causa
de uma dívida vencida há muito tempo. Houve uma sentença condenatória e processo de
execução. Entretanto, por acordo, a “Resin” concedeu um prazo de pagamento mais
longo, tendo sido entretanto liquidado esse débito da AMVS.
Não estavam em causa serviços prestados pela “Resin” na lixeira de Sendim
numa altura em que já deveria estar encerrada. O objecto daquela acção prendiam-se
com serviços prestados nos concelhos de Paredes e Penafiel.
Existiriam outros litígios que deram origem a processos judiciais, mas a AMVS
foi sempre absolvida.
No âmbito do Conselho Superior de Obras Públicas, em sede de tentativa de
conciliação, chegou-se a acordo relativamente a outros litígios.

- Testemunha Isabel Maria Soares Brandão Vasconcelos


É técnica superior na Comissão de Coordenação de Desenvolvimento da Região
Norte, a qual resultou da fusão entre a Comissão de Coordenação da Região Norte e a
Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território (a depoente desde 1993
que trabalhava neste último organismo).
Esses organismos estavam dependentes do Ministério do Ambiente.
Foi aliás nomeada pelo Ministério do Ambiente para fazer parte da comissão de
análise das propostas apresentadas nos concursos lançados pela AMVS (tem a ideia de
ter feito parte da comissão de análise das propostas apresentadas no âmbito de três
concursos lançados pela a AMVS para a construção de outros tantos aterros, entre os
quais o aterro RIB de Felgueiras).
No que ao concurso lançado pela AMVS para a construção do aterro RIB de
Felgueiras concerne, fez parte da respectiva comissão de análise das propostas com a
testemunha Fernando Moreira (presidente dessa comissão, o qual fazia parte do
Gabinete de Apoio Técnico de Penafiel, organismo pertencente à Comissão de
Coordenação de Desenvolvimento da Região Norte) e com o arguido Barbieri Cardoso
(indicado pela AMVS, dona da obra, sendo certo que devem ter nomeado um elemento
da CMF porque a obra iria ser executada em Felgueiras).
Do ponto de vista técnico tudo decorreu normalmente na análise das propostas.

348
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tinham uma matriz e ponderaram os parâmetros avaliados em conjunto


relativamente a cada proposta (o relatório elaborado por essa comissão consta de fls 329
e ss. do apenso 105-B).
Os parâmetros foram avaliados de acordo com o caderno de encagos.
A depoente analisou mais a parte de concepção dos projectos.
Os critérios de análise estão plasmados a fls 6 do relatório da comissão de
análise (cfr. fls 335 do apenso 105-B).
A fls 345 e ss. do apenso 105-B encontram-se os quadros com a classificação
ordenada, tendo vencido o consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop”.
O resultado apresentado pela comissão de análise é tecnicamente sustentável e
está de acordo com os parâmetros já estabelecidos no caderno de encargos.
Pelo menos a depoente não sofreu qualquer tipo de influência ou pressão que
pudesse condicionar a apreciação das propostas pela comissão de análise.
Referiu que a comissão de análise passou três dias fechada numa sala a analisar
as propostas, sendo certo que os seus elementos discutiam em conjunto o mérito das
propostas.
O critério preço estabelecido foi de 10%, ignorando – por falta de experiência –
se essa percentagem era a habitual em concursos similares.
O aterro RIB de Felgueiras era um projecto piloto a nível nacional e de
concepção difícil.
A depoente não participou na elaboração do programa de concurso e do caderno
de encargos, presumindo que tenha sido a AMVS a orientar a respectiva elaboração.
A proposta apresentada pelo consórcio vencedor não era a mais cara. Porém,
quando confrontada com a acta de abertura das propostas, constante de fls 325 a 328 do
apenso 105-B, constatou-se essa proposta era de facto a mais cara. Verificou-se ainda
que o Dr. Fernando Miranda era o magistrado do MP presente. Explicou que essa acta
é-lhes presente no momento da avaliação das propostas. Esclareceu que não fez parte da
comissão de abertura das propostas.
A depoente é engenheira química e à data a questão do tratamento dos resíduos
era nova. As lixeiras estavam a ser encerradas e a experiência não era muita em termos
de construção de aterros.
Em 1997 foi publicado o programa de irradicação das lixeiras, tendo sido à data
inventariadas 347 lixeiras, tendo sido encerradas 95 no Norte.
Como a “Resin” concorreu a vários concursos, presume que apresentava já
algum dinamismo nessa área.
Tem a ideia que a “Resin” geria a lixeira de Felgueiras (Sendim), a qual já
estava controlada. Aliás, chegou a ver a lixeira e tem a ideia que o nível de controlo ia
sendo melhor ao longo do tempo, sendo certo que actualmente está recuperada
paisagisticamente.
Confrontada com a conclusão do relatório da comissão de análise, a fls 351 do
apenso 105-B (onde se refere que poderia ser deixada em aberto a adjudicação da gestão
do aterro, adjudicando-se apenas a sua construção, pois tal poderia ser mais favorável
para a dona da obra), referiu não saber porque razão não foi seguida essa via (de facto, o
preço pela gestão do aterro era muito mais elevado em relação à proposta dos demais
concorrentes).
Depois da adjudicação da obra em causa neste ponto houveram reuniões a
propósito da execução da obra em que a depoente participou. Reúnia na obra com a
“Ecop”, que era a empresa que estava a construir o aterro.
Teve contactos com os arguidos Vítor Borges e Gabriel Almeida e também com
o engenheiro Octávio (de nacionalidade brasileira).

349
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Os responsáveis do consórcio vencedor foram também convocados para


reuniões técnicas na Direcção Regional do Ambiente.
Ignora que fiscalização foi efecuada durante a execução da obra.
O aterro foi construído e está em funcionamento, sendo certo que essa obra foi
licenciada.

- Testemunha Joaquim Fernando Moreira


O depoente acompanhou desde o início o processo do concurso relativo ao
aterro de Felgueiras (o depoente era o director do GAP do Vale do Sousa), tendo feito
parte da comissão de abertura das propostas e presidido à comissão de análise das
propostas apresentadas pelos concorrentes.
A exigência de rigor da AMVS levou a que na comissão de análise integrasse
um elemento indicado pela Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do
Território (a testemunha Isabel Vasconcelos).
Para além do depoente e da testemunha Isabel Vasconcelos, o arguido Barbieri
Cardoso integrou a comissão de análise (o qual não integrou a comissão de abertura).
As propostas apresentadas estavam de acordo com o caderno de encargos.
A abertura das propostas foi efectuada por uma comissão de abertura de
propostas.
As propostas são apresentadas lacradas de modo a evitar a respectiva violação.
Só são abertas no acto público de abertura das propostas, sendo as respectivas folhas
rubricadas pelos elementos que integram a comissão de abertura. Antes disso a AMVS
não conhecia o teor das diversas propostas apresentadas.
Depois de abertas, as propostas não foram alteradas.
A fls 205 e ss. do apenso 105-B consta o anúncio do concurso, o respectivo
programa e o caderno de encargos.
A fls 286 a 324 do apenso 105-B encontra-se a proposta da
“Resin”/”Sita”/”Ecop” (não está completa), sendo certo que dos autos não constam as
propostas dos demais concorrentes (cfr., em todo o caso, a acta de abertura das
propostas, de fls 325 do apenso 105-B).
A fls 329 e ss. do apenso 105-B consta o relatório da comissão de análise das
propostas apresentadas.
As propostas são analisadas segundo critérios pré-estabelecidos e subcritérios
definidos pela comissão de análise antes da abertura do concurso.
A testemunha referiu os critérios em causa conforme constam dos docmentos já
referidos.
O critério menos valorado é o critério do preço. Explicou que num concurso de
concepção e construção isso é normal na medida em que a componente técnica é mais
valorizada.
Explicou que cada membro da comissão de análise faz uma análise individual
das propostas e depois disso reuniram-se várias vezes para discutir a análise, tomando
então uma decisão por concenso quanto à classificação das propostas.
Assegurou não ter sentido qualquer pressão de quem quer que seja para decidir
num ou noutro sentido.
Nenhuma das pessoas referidas na pronúncia contactou sequer a comissão de
análise.
Não admite sequer a possibilidade que qualquer elemento da comissão de
análise tenha a veleidade de procurar influenciar a decisão dessa comissão ao arrepio
dos critérios técnicos de análise.

350
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Só mais tarde, em data que não sabe precisar, conheceu o arguido Carlos
Marinho.
Conforme emerge da acta de abertura das propostas (cfr. fls 325 e ss. do apenso
105-B), a proposta apresentada pelo consórcio da “Resin”/”Sita”/”Ecop” era a que tinha
o preço mais elevado, seguida da proposta da “Soares da Costa”.
No que toca aos ecocentros foram efectuados três concursos, tendo a “Norlabor
vencido no que respeita à construção dos ecocentros em Lousada, Paredes e Felgueiras,
sendo certo que foi adjudicada a outra empresa a construção dos ecocentros nos
concelhos de Castelo de Paiva e Penafiel.
A transferências e competências da AMVS para a CMF relativamente ao aterro
RIB de Felgueiras ocorreu já no século XXI. Tem a ideia que essa transferência de
poderes já se equacionava logo desde o início do processo de abertura do concurso (a
CMF comparticipou com 15% do custo de construção do aterro).
A obra em causa teve a fiscalização da União Europeia, que a exerceu por duas
vezes através de comissões de análise (compostas por dois espanhóis, um italiano e um
português).
Após a abertura das propostas não é possível inflacioná-las.
Confrontado com o ponto 3 das conclusões do relatório da comissão de análise
(cfr. fls 352 do apenso 105-B), explicou que havia a possibilidade de dividir em duas
partes a adjudicação, faculdade aliás prevista no caderno de encargos (uma para a
construção e outra para a exploração). A proposta apresentada pelo consórcio
“Resin”/”Sita”/”Ecop” foi a melhor pontuada mas era muito mais cara no que diz
respeito à exploração.
Na altura, a AMVS não tinha capacidade para gerir o aterro.
Mesmo que pudesse ser adjudicada separadamente a construção e a exploração o
certo é que em determinadas áreas existe uma ligação entre ambas, daí que a ideia fosse
adjudicar tudo ao mesmo concorrente, evitando-se desse modo problemas ao nível da
exploração, razão pela qual achou boa a decisão da AMVS de adjudicar tudo ao
consórcio vencedor.
A “Resin” era a líder desse consórcio, cabendo-lhe a gestão ambiental do aterro
e à “Ecop” a respectiva construção.
Explicou que o concurso mais relevante lançado pela AMVS foi o da recolha
dos resíduos sólidos urbanos, no montante de 4.000.000 cts (não era comparticipado
pela União Europeia). Era o concurso mais apetecível pelas empresas da área do
ambiente. Foi a “Suma” quem venceu esse concurso, tendo o depoente integrado a
respectiva comissão de análise. Que tivesse chegado ao seu conhecimento, nenhuma
pressão foi exercida pela “Resin” em relação a algum elemento que integrou a comissão
de análise das propostas apresentadas no âmbito desse concurso.
Na região Norte a “Resin” era a única empresa a trabalhar na área do tratamento
do lixo porque tinha uma parceria com a “France Dèchets”.
Confrontado com o fax de fls 2273 do 10º volume (fax que foi remetido pela
“Resin” a 20.06.94 à CMF com conhecimento ao depoente), explicou que na altura era
já o coordenador da AMVS no que respeita aos resíduos sólidos urbanos e foi-lhe dado
conhecimento desse fax na medida em que havia a possibilidade de se construir em
Unhão o aterro, onde aliás se fizeram testes ao solo.
Em Junho de 1994 abriu-se o primeiro concurso da AMVS para a construção de
um aterro (aterro da Lustosa).
Conheceu os presidentes da CMF desde o 25 de Abril devido às suas funções.
O arguido Júlio Faria já foi presidente da AMVS e nessa altura tinha a
supremacia normal inerente a esse cargo. Foi aliás o grande impulsionador da AMVS.

351
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Depois dele deixar a presidência da AMVS (em 1995) não se lembra de o ter
visto nas reuniões dessa associação, mas tinha uma sala onde, como deputado, podia
receber munícipes.
*
Ainda a propósito do fax de fls 2273 do 10º volume, o arguido Júlio Faria
referiu que em Junho de 1994 a AMVS já tinha decidido que a construção do aterro iria
ser efectuada em Lustosa.
Porém, o presidente da C.M. de Lousada tinha dificuldade em obter a aprovação
da respectiva assembleia municipal, razão pela qual ele pediu que se procedessem a
estudos em locais alternativos (Sendim e Unhão, ambos em Felgueiras, e mais dois
locais em Paços de Ferreira), de modo a que pudesse justificar perante a Assembleia
Municipal de Lousada a construção em Lustosa do aterro. Esse facto atrasou o arranque
das obras de construção desse aterro.
*
Em face das explicações agora dadas pelo arguido Júlio Faria, a testemunha
Joaquim Fernando Moreira admitiu que ele esteja correcto.

- Testemunha Maria Eduarda Dias de Sousa Brandão


Entre Fevereiro de 1995 e 2006 foi administradora delegada da AMVS, de que o
município de Felgueiras era associado.
Como administradora delegada da AMVS era a responsável máxima por todo o
serviço (por delegação de competências do conselho de administração dessa
associação).
Vinha à CMF com frequência.
Nunca o arguido Júlio Faria exerceu sobre a depoente qualquer pressão para que
a AMVS celebrasse determinados contratos. Considera-o demasiado correcto para
tomar esse tipo de atitude.
Nenhuma pressão recebeu igualmente dos outros presidentes de câmara.
O arguido Júlio Faria sempre procurava obter concensos.
Os autarcas estavam sobretudo preocupados com a questão dos resíduos.
Antes de ter sido administradora delegada da AMVS foi vereadora na C.M. de
Paços de Ferreira e já na altura o problema dos resíduos era premente, com protestos das
populações por causa das lixeiras a céu aberto (sobretudo em Lousada e em Felgueiras).
Tiveram problemas com as populações no que se refere à escolha da localização
dos aterros.
À data não existiam muitas empresas com “know how” suficiente nessa área.
Quando o arguido Júlio Faria foi para a Assembleia da República passou a ter
com ele um contacto muito mais raro, com pena sua na medida em que tinha sido
convidada por ele para exercer funções na AMVS apesar de ser do PSD, o que denota a
sua imparcialidade.
Ele tinha um gabinete de atendimento ao munícipe na AMVS quando já era
deputado na Assembleia da República, tendo-o usado apenas uma ou duas vezes.
Ele não era pessoa para se intrometer em assuntos que não lhe diziam respeito.
Em Felgueiras ele tinha um peso político muito relevante, pelo que é natural que
lhe pedissem a opinião.
Antes do lançamento do concurso a relação que a depoente tinha com a “Resin”
era de aconselhamento, visto que ela tinha “know how” nessa área.
Nunca existiu qualquer favoracimento da “Resin” no seio da AMVS.
Os concursos internacionais duram cerca de um ano (período de aceitação das
propostas, abertura das propostas, apreciação das propostas – feita por técnicos da

352
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

AMVS e com a participação de técnicos das câmaras municipais e do GAP de Penafiel


– e adjudicação, que é sujeita a recurso).
No que se refere à arguida Fátima ela era também uma autarca preocupada em
encontrar soluções, sobretudo numa área nova em que o enquadramento legislativo por
vezes não era claro.
Não se apercebeu que ela alguma vez tentasse exercer qualquer influência
obscura na tomada de decisões pela AMVS.
O concurso mais relevante lançado pela AMVS foi o da recolha dos resíduos,
que a “Suma” venceu (no valor de cerca de 5.000.000 cts), sendo certo que a “Resin”
também concorreu a esse concurso.
A depoente esteve presente nas reuniões de deliberação da AMVS (o seu nome
consta das actas constantes dos autos).
Devido às suas funções na AMVS relacionou-se com os arguidos Vítor Borges,
Gabriel Almeida e Carlos Marinho (sobretudo com os primeiros).
Nunca lhe tentaram exercer qualquer influência.
Tem a ideia que por volta do ano 2000 celebrou-se um protocolo de
transferência da gestão do aterro RIB de Felgueiras para a CMF pelo período de 5 anos
(cfr. documento de fls 400 do apenso 105, sendo certo que esse protocolo foi celebrado
a 14.12.2000, na sequência de deliberação da AMVS de 27.11.2000 e da CMF de
04.12.2000). A depoente teve intervenção na celebração desse protocolo. Não sabe se
nessa data estava pago o valor da concepção, construção e exploração desse aterro.
Escudou-se no facto de serem muitos os concursos e pagamentos efectuados pela
AMVS.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se as empresas que concorriam aos
concursos internacionais lançados pela AMVS tinham ou não “know how” nessa área,
referiu não ter competência para o avaliar.
Quase todos os concorrentes eram consórcios que incluíam empresas de
construção civil. Em todo o caso, presume que teriam competência nessa área pois
doutro modo concerteza não concorreriam.
O arguido Vítor Borges tinha um relaçionamento pessoal com o presidente da
C.M. de Paços de Ferreira, o que pode ter facilitado a aproximação da “Resin” à
AMVS.

- Testemunha Ricardo Luís Ramos Bahia Ferreira


Referiu ser engenheiro civil, funcionário da “ETECLDA”, responsável pelo
respectivo Departamento de Projecto de Ambiente e Fiscalização de Obras.
Era o responsável da “ETECLDA” pela fiscalização das obras nos aterros
construídos no Vale do Sousa.
Explicou que a “ETECLDA” concorreu e venceu um concurso público para
fiscalizar essas obras, concurso esse promovido pela AMVS.
Fiscalizaram assim várias obras nos aterros e apreciavam o respectivo projecto,
emitindo então os inerentes pareceres.
Elaboravam relatórios mensais, faziam autos de medição e participavam em
reuniões mensais.
Na sequência de alterações ao projecto durante a execução das obras, houveram
alterações orçamentais em quase todos os contratos e, segundo ideia que tem, incluindo
o referente ao aterro de Felgueiras (tem quase a certeza que esse facto motivou também
alteração de valores em relação ao orçamentado no caso de Felgueiras). Julga que
140.000 cts de alteração orçamental é um valor exagerado.

353
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na altura havia pouca experiência no país no que respeita à construção de


aterros. Os aterros em causa eram relativamente pioneiros.
A entidade licenciadora da obra também a fiscalizou.
A construção do aterro RIB de Felgueiras sofreu atrasos devido aos problemas
verificados durante a respectiva execução com a contaminação de aquíferos e da
estabilidade de um dos taludes.
Acabou por referir se esses problemas levaram à alteração do valor global da
adjudicação.
No Norte do país não existiam empresas com “know how” nessa área, só no Sul.
Que se lembre, no que concerne ao tratamento do lixo, só a “Resin” tinha “know how”
no Norte.
Quem procedia à construção do aterro era a “Ecop” e não a “Resin”. Era com a
“Ecop” que tinha os contactos a propósito da fiscalização. Tem a ideia que 80% da
facturação foi para a “Ecop”.

- Testemunha Fernanda Paula Correia Mariano Cardoso


Referiu ser engenheira civil, funcionária da CMF há cerca de 7 ou 8 anos
(Departamento de Obras, Ambiente e Serviços Urbanos).
Fez parte da comissão de análise das propostas apresentadas no âmbito do
concurso lançado pela AMVS para a construção dos ecocentos de Felgueiras.
O concurso incluía a construção de três ecocentros em Felgueiras, mas acabou-
se por apenas construir um.
Cada câmara municipal fornecia um elemento para a comissão de análise das
propostas relativas aos concursos para a construção dos ecopontos nos respectivos
concelhos.
A depoente não fez parte da comissão de abertura do concurso referido.
O arguido Barbieri Cardoso e o engenheiro Moreira (do GAP) faziam também
parte da comissão de análise.
Foram definidos subcritérios (os critérios já estavam definidos) e o engenheiro
Moreira forneceu uns quadros em “Excel” numa reunião com todas as comissões de
análise.
Os critérios eram iguais no que diz respeito a todos os concursos abertos para a
construção dos ecocentros.
Reuniu várias vezes com o arguido Barbieri Cardoso na CMF para a análise das
propostas. Não se recorda do engenheiro Moreira se ter reunido com eles nessas
reuniões.
Entretanto sucedeu a reunião final com todas as comissões de análise de forma a
que fossem apresentados os respectivos relatórios de análise relativamente a cada
concurso e para que então se discutissem as respectivas conclusões. Nessa reunião o
engenheiro Moreira esteve presente.
Nega qualquer tentativa de influência na apreciação feita pela comissão de
análise de que fez parte.
O engenheiro Moreira é que supervisionava as várias comissões de análise
(explicou que se tratou de um único concurso para várias câmaras e com várias
comissões de análise compostas por dois técnicos da cada câmara municipal do
concelho onde os ecocentos iriam ser construídos).
Não conhece ninguém da “Resin”, a qual aliás nem sequer concorreu a esse
concurso (que a “Norlabor” venceu).

- Testemunha Mário Rui Castro Marques de Carvalho

354
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Para além de advogado, leccionou na Universidade de Coimbra até ao ano


transacto durante 21 anos, e lecciona na Universidade Portucalense e na Universidade
Livre (área de Direito Público, designadamente Direito Administrativo).
O depoente é ainda consultor jurídico da AMVS para a área do Direito
Administrativo desde a década de 90.
Há cerca de 6 anos que conhece o arguido Barbieri Cardoso, tendo ficado com
uma boa imagem da sua pessoa, de competência técnica e rigor. Revelou grande
empenho e determinação na defesa do interesse público, designadamente da CMF.
O depoente patrocinou várias acções contra a “Resin” e a convocação dele foi
sempre determinante no Conselho Superior das Obras Públicas (em sede de tentativa de
conciliação obrigatória, que tem lugar antes de se poder propor qualquer acção).
O depoente recomendava a indicação dele para ser convocado na medida em que
ele argumentava de forma sólida e convincente, excedendo mesmo as suas expectativas.
A “Resin” instaurou mais de 10 acções contra a AMVS e todas elas “correram
bem” para a associação.
Ficou com uma grande consideração e estima pelo arguido Barbieri Cardoso em
face do facto dele sempre procurar defender o interesse público.
Ficou com a ideia de que ele nunca procurou defender os interesses da “Resin”,
antes pelo contrário.

Análise crítica
Antes de mais, cabe referir que os concursos mencionados neste ponto,
lançados pela AMVS, não terão beneficiado de qualquer quadro comunitário de apoio
mas de fundos de coesão, conforme explicou o arguido Barbieri Cardoso, já que se
tratava da construção de infraestruturas (cfr., a este propósito, por exemplo, o
documento de fls 486 do apenso 105-B).
Quanto à sequência cronológica dos acontecimentos, no que ao concurso
internacional concerne, a descrição efectuada na contestação apresentada pelos arguidos
Carlos Marinho e Vítor Borges é a que de facto se adequa com o teor dos documentos
juntos aos autos a propósito dessa matéria e referenciados naquela contestação (cfr.
documentos de fls 193 a 196 do apenso 105-B; fls 336 e ss. do apenso 12; fls 325 e ss.
do apenso 105-B; 329 e ss. do apenso 105-B; 353 e ss. do apenso 105-B; fls 388 e ss. do
apenso 105-B; fls 391 e ss. do apenso 105-B; fls 400 e ss. do apenso 105-B; e fls 355 do
apenso 12).
Os elementos que integraram a comissão de análise em ambos os concursos
negaram que tivessem sido exercidas quaisquer influências no sentido de favorecer
qualquer concorrente a esses concursos.
De forma assertiva foi explicado de que modo essas comissões eram compostas,
de sorte que nenhum reparo nos merece a inclusão de elementos da CMF nessas
comissões no que respeita aos concursos lançados pela AMVS referentes à construção
de infraestruturas no concelho de Felgueiras (cfr., com interesse, o documento de fls
6738 dos autos).
Por outro lado, os elementos dessas duas comissões, em particular o arguido
Barbieri, explicaram os critérios de análise das propostas e o trabalho de análise
desenvolvido de forma que nos pareceu assertiva e credível (cfr. os respectivos
relatórios de análise, constantes de fls 329 e ss. e de fls 452 e ss., ambos do apenso 105-
B).
Como se viu, pelas razões expressas pelo arguido Barbieri Cardoso, no que toca
à concepção e construção dos aterros, o critério “preço” não era o mais importante,

355
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

tendo apenas um peso de 10% em relação aos demais factores de ponderação (cfr. ainda
o depoimento da testemunha Joaquim Moreira).
Consequentemente, nenhum reparo pode o Tribunal fazer a esse propósito.
Não se provou pois que os arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras tenham
influenciado a AMVS no sentido de favorecer o consórcio liderado pela “Resin” no que
respeita à construção dos aterros ou a “Norlabor” no que concerne à construção dos
ecocentros (e não ecopontos como por lapso é referido na pronúncia, já que o concurso
respectivo dizia respeito à construção de ecocentros, conforme emerge dos documentos
constantes do apenso 105-B e já acima referenciados aquando da reprodução por súmula
dos depoimentos prestados a esse propósito).
Note-se que nenhum indício existe de que a realização desses concursos
internacionais tenham sido simulados, de modo que cada concorrente apresentou as suas
melhores propostas, as quais, segundo nos pareceu, foram analisadas com rigor, tendo
em conta os factores de ponderação previamente definidos.
Conforme explicou o arguido Barbieri, no que toca ao concurso internacional
para a construção do aterro RIB, com as propostas os concorrentes apresentaram um
estudo prévio, tendo-se depois elaborado um projecto de execução quando a obra foi
adjudicada, sendo certo que não terá existido derrapagem de custos (obra que aliás foi
fiscalizada pela Tutela e pela dona da obra, designadamente através de uma empresa
contratada para o efeito – a “ETECLDA”; cfr. o depoimento da testemunha Ricardo
Ferreira).
Por outro lado, o protocolo celebrado entre a AMVS e a CMF acerca da
transferência de competências, poderes, deveres e obrigações relativas ao aterro RIB de
Felgueiras, consta de fls 5642 e 5643 dos autos (ou de fls de 400 e 401 do apenso 105).
Acerca desse facto nenhum comentário em especial cabe fazer, sendo certo que,
ao que parece, seria normal essa transferência de poderes e deveres da AMVS para os
municípios associados relativamente aos aterros que se situassem no respectivo
território concelhio, tanto mais que comparticiparam com 15% do respectivo custo de
construção (já que os fundos comunitários financiavam 85% do custo de construção).
Conforme confirmou o arguido Vítor Borges, em 1997 a dívida da CMF para
com a “Resin” era de 101.214.905$00 (cfr. os documentos indicados a fls 21 a 23 do
apenso 12), sem contabilizar eventuais juros de mora e encargos.
Ademais, a propósito dos 140.000 cts referidos na pronúncia, resultou de forma
pacífica dos depoimentos prestados que essa verba foi distribuída pelos vários items da
proposta apresentada pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” antes da mesma ter sido
apresentada (não se vê aliás que doutra forma possa ter sido – cfr., em especial, os
depoimentos do arguido Vítor Borges e das testemunhas Panzina e Paulo Ribeiro, bem
como os documentos de fls 302 do apenso 12 e de fls 286 a 324 do apenso 105-B).
Não se convenceu porém o Tribunal da explicação dada pelo arguido Vítor
Borges e pelas supra referidas testemunhas para a distribuição daquela verba pelos
vários items da proposta pelas seguintes ordens de razões:
1ª - a ser verdadeira a explicação dada, mal se compreende que, mesmo
retirando-se 140.000 cts ao custo da exploração, o respectivo preço, ainda assim, seja
bem mais elevado que os valores apresentados pelos demais concorrentes, mesmo
considerando-se que a proposta apresentada pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” fosse
a única que contemplava um sistema de compactagem dos resíduos (cfr. documento de
fls 325 e ss. do apenso 105-B);

356
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

2ª - a explicação dada não se coaduna com os próprios termos do contrato de


consórcio (cfr. fls 372 e 373 do apenso 105-B), segundo o qual a “Resin”/”Sita” 9
receberia 37,5% dos valores contratualizados e a “Ecop” 62,5% desse valor, o que
significa que o preço da construção teria de ser cerca de 25% mais elevado em relação
ao preço da concepção/exploração. Ora, se retirarmos 140.000 cts ao preço da
construção 10 e o somarmos ao preço da concepção/exploração, em face da explicação
dada, não se percebe a que título é que caberia à “Ecop” receber 62,5% do valor
contratualizado e à “Resin”/”Sita” apenas 37,5% (pois nesse caso o real preço para a
exploração seria de 378.660.099$00 e o real preço da construção seria de
567.801.461$00). Por outro lado, Se somarmos o valor do preço da exploração -
incluindo já os 140.000 cts - ao preço da concepção obteremos o preço de
413.660.099$00 para a concepção/exploração. Nessa medida, percentualmente o preço
da concepção/exploração, em relação ao preço glogal da proposta, em face da
explicação dada, representaria uma percentagem de 42,14%. Em face disto, a ser
verdadeira a explicação dada, como se compreende que a “Resin”/”Sita” só devesse
receber 37,5% do valor global, quando, como foi referido, tinha de suportar custos
adicionais com a exploração e não expressos na proposta. Dito doutro modo, a
percentagem acordada no contrato de consórcio para a repartição dos valores entre os
respectivos membros só fará algum sentido se expurgarmos do preço global da proposta
a quantia de 140.000 cts (tendo presente os preços apresentados para a concepção –
35.000 cts -, construção – 707.801.461$00 – e exploração – 238.666.099$00 -, sendo
certo que a expurgação dos 140.000 cts teria de ser feita ao preço da construção, que na
realidade será assim de 567.081.461$00, valor que representa assim 67,47% do preço
global 11 ). É certo que o critério de repartição das verbas pode não dizer apenas respeito
aos preços parcelares apresentados e entrar em linha de conta com factores não
mencionados expressamente, já que, como foi referido pela testemunha Paulo Ribeiro, a
“Resin” teria de suportar custos não expressamente contabilizados e que se prendiam
exclusivamente com a exploração, pelo que deveria ser compensada, o que aliás poderá
explicar que adicionalmente cerca de 5% do valor global do preço revertesse para si
(67,47% – 62,5% = 4,97%), mas nunca justificaria uma discrepância tão grande entre o
que foi acordado e o peso relativo, em face do preço global da proposta, de cada um dos
preços parcelares (concepção/exploração por um lado e construção por outro);
3ª - a explicação dada coaduna-se ainda mal com o título constante na coluna da
direita no quadro de fls 302 do apenso 12 - “VERBAS DA DÍVIDA DE 140.000
Contos” 12 (documento elaborado pela testemunha Paulo Ribeiro, segundo a qual o terá
composto em função do documento manuscrito pela testemunha Panzina e constante de
fls 335 do apenso 12). Se se trata de uma “dívida”, alguém será o credor (a “Resin”) e
alguém o devedor (a CMF), sendo certo que esses dois sujeitos – credor e devedor - não
são actores na “história” contada pelas testemunhas Panzina e Paulo Ribeiro e pelo
arguido Vítor Borges;
4ª - tal posição não se coaduna também com o teor do documento de fls 1112,
donde emerge que se procuraram compensar os valores em dívida via aterro RIB (sobre
esse documento nenhum dos elementos ouvidos e que prestaram serviço na “Resin” deu
qualquer explicação, documento esse que é aliás filho de pai incógnito – o arguido Vítor

9
A “Sita” procedeu à concepção e a “Resin” à exploração, ao passo que a “Ecop” procedeu à construção
do aterro RIB.
10
Consideram-se aqui os preços sem IVA.
11
O preço global real será assim de 841.467.570$00 (981.467.560$00 – 140.000$00) + IVA.
12
Não se coaduna ainda com o título aposto na segunda metade do documento – “ARTIGOS DA
PROPOSTA A CARGO DA ECOP MAS COM VERBAS INSCRITAS DA DÍVIDA DE 140.000 C”.

357
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

admitiu porém que tenha sido elaborado pelo então director comercial da “Resin”, ante
o facto inquestionável de que tal documento foi retirado do disco rígido de um dos
computadores então em uso naquela empresa – cfr. o respectivo auto de busca e
apreensão de fls 697 e o auto de exame 1108 e ss.). De resto a interpretação desse
documento efectuada pelo arguido Vítor Borges – aliás a reboque do seu ilustre
mandatário -, orientou-se no sentido de se procurar demonstrar que esse mesmo
documento não se reporta à matéria em causa, mas com argumentação que nos pareceu
inconsistente, já que, mesmo que o documento tenha sido elaborado em Dezembro de
1998 (facto que não é líquido), certo é que nitidamente se reporta aos vários contratos
mencionados no 1º capítulo de apronúncia. Ademais, o “adiantamento” foi pago por
uma empresa de factoring no último trimestre de 1998 (Outubro/Novembro), conforme
emerge dos documentos de fls 269 e 272 do apenso 12 e documentos de fls 223 e 224
do apenso 20, sendo certo que desse documento resulta que metade do valor em dívida
da CMF tinha sido já pago em Novembro de 1998, facto que se relaciona com a
circunstância da “Resin” ter ficado com esse valor, que retirou do “adiantamento”
recebido nessa altura da dita empresa de factoring, conforme aliás já referimos. Além
do mais, tratando-se de um documento retirado de um ficheiro constante de um dos
computadores em uso na “Resin”, pode muito bem ter sucedido ter sido elaborado
muito antes de Dezembro de 1998 e de ter sido entretanto alterado e actualizado sem
que se alterasse o respectivo título (justificando-se pois o título desse documento,
apontando para o futuro, tanto mais que então só metade do valor em dívida havia sido
“compensado” via aterro RIB, pese embora os montantes nele expressos tivessem como
pressuposto a liquidação total da dívida da CMF em Novembro de 1998, o que, como se
viu, não sucedeu);
5ª - dos montantes que ainda permanecem em dívida para com a “Resin” por
banda da CMF, nenhum esforço efectuou aquela empresa para os cobrar coercivamente,
não obstante considerar algumas desses créditos como sendo de cobrança duvidosa.
Essas verbas foram aliás “perdoadas” em face dos movimentos contabilísticos já
referidos acima, o que só se percebe à luz do facto desses montantes terem sido
liquidados via aterro RIB (cfr. documento de fls 1112).
Convenceu-se pois o Tribunal de que a verba de 140.000 cts não dizia respeito
ao preço global da proposta apresentada pelo referido consórcio e que tal expediente se
tratou da forma encontrada pela “Resin” para, via aterro RIB, ser compensada dos
valores então em dívida pela CMF (claro está, caso vencesse o respectivo concurso
internacional, como efectivamente veio a suceder), conforme nesse sentido aponta o
documento de fls 1112 (que ninguém soube ou quis explicar).
Questão diferente é saber se esse facto, por si só, tem alguma elevância penal,
matéria que iremos dar atenção aquando da fundamentação de direito.
É que, além do mais, não dispõe o Tribunal de qualquer elemento que, com
segurança, permita concluir que tenha sido a arguida Fátima Felgueiras a execer
qualquer influência nesse sentido junto da “Resin”.
De resto, não se convenceu o Tribunal que os arguidos Júlio Faria e Fátima
Felgueiras se tenham concluiado com a “Resin” (representada pelo arguido Vítor
Borges) no sentido desta inflaccionar daquela forma a proposta do consórcio liderado
por si, de modo a obterem para si ou para terceiro vantagens económicas. Parece-nos
mais lógico que esse facto tenha sido feito à revelia e sem o conhecimento daqueles,
pois tratou-se da forma encontrada pela “Resin” para ver os seus créditos para com a
CMF solvidos (evitando assim o recurso aos tribunais), sendo certo que pelo menos
parte dos valores respeitantes àquele montante de 140.000 cts apenas foram acertados

358
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

em vésperas da apresentação da respectiva proposta (cfr. os depoimentos do arguido


Vítor Borges e das testemunhas Panzina e Paulo Ribeiro e o manuscrito já referido).
É certo que os arguidos Vítor Borges, Júlio Faria e Fátima Felgueiras
beneficiaram desse facto (ou melhor, por intermédio deles, terceiros foram
beneficiados), aproveitando-se da circunstância do consórcio liderado pela “Resin” ter
vencido o respectivo concurso internacional (ainda que com empolação do preço, sendo
certo que, como se viu, o critério “preço” tinha um peso de apenas 10% no universo dos
factores de ponderação a tomar em consideração pela respectiva comissão de análise.
Essa empolação não seria pois um factor determinante na avaliação da proposta do
consórcio “Resin”/”Sita”/”ECOP”; dito doutro modo, esse empolamento do preço na
proposta não comprometeria o seu sucesso, como aliás não comprometeu).
Mas, mesmo partindo o Tribunal de factos conhecidos para dar como assentes
outros que com eles estão numa relação de logicidade, em face das regras da
experiência comum, e tendo presente que:
- da empolação do custo da concepção/construção do aterro RIB resultou um
maior adiantamento de verba pela AMVS (ou melhor, a autorização para que uma
factura no respectivo valor, também ele por essa via inflaccionado, fosse apresentada a
uma empresa de factoring, assim se transmitindo esse crédito para esta, recebendo a
“Resin” o valor correspondente);
- desse facto o arguido Júlio Faria já tinha antecipado conhecimento em finais de
1998 (cfr. manuscrito de fls 170 dos autos, donde resulta aliás que o pagamento do
donativo de 20.000 cts estaria dependente do recebimento do adiantamento pela
“Resin”) e;
- que os beneficiários dessa conduta foram a “Resin” e o FCF (através da acção
dos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras, clube que assim conseguiu um donativo de
20.000 cts);
ainda assim não se pode depreender que todos eles se conluiaram no sentido da
empolação do valor da proposta apresentada a concurso e em ordem a obter essa
vantagem patrimonial indevida, para si ou para terceiros.
É certo que por essa via, como se disse e se reafirma, a “Resin” veria o seu
crédito para com a CMF liquidado pela AMVS (com o apoio de fundos de coesão em
85% desse valor) e estaria em condições de conceder um donativo de 20.000 cts ao FCF
(não terá sido assim por acaso que do montante do adiantamento recebido parte tenha
revertido para a “Resin”, conforme emerge do relatório de fls 4140 e ss., - cfr. quadro de
fls 4160 dos autos - não obstante o teor da missiva de fls 273 do apenso 12 - cfr. ainda o
depoimento da testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira. Aliás, só assim
faz sentido que o donativo concedido ao FCF estivesse dependente do recebimento
desse adiantamento, sendo certo que se ele se destinasse apenas à “Ecop” era indiferente
o recebimento do adiantamento referido – cfr. também o manuscrito de fls 170 da
autoria do arguido Júlio Faria. Assim se explica também que em Novembro de 1998,
por via do adiantamento, a “Resin” tenha recebido metade do valor que lhe era devido
pela CMF, isto é, o valor em singelo e respectivos encargos resultantes da mora – cfr. a
nota constante no documento de fls 1112).
Não se demonstrou porém de todo que desse facto tenha resultado mais algum
benefício patrimonial.
Assentemos pois que dessa empolação de valores efectuada pelo consórcio
“Resin”/”Sita”/”Ecop” resultaram apenas dois benefícios: um para a “Resin” (que viu
assim liquidado o montante em dívida que a CMF tinha para consigo, tendo recebido
metade do respectivo valor em Novembro de 1998 com a parte que do adiantamento
reservou para si); e outro para o FCF (em face desse empolamento, imputado à

359
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

construção do aterro RIB, o valor do adiantamento, também ele refererente à construção


dessa infraestrutura, foi igualmente inflaccionado, o que permitiu à “Resin” ter
disponibilidade financeira para apoiar o FCF).
Porém, é de salientar que o contrato de transacção celebrado entre a CCAM e o
FCF (que pôs fim a vários processos judiciais emergentes de dívidas do clube para com
aquela instituição financeira) só foi firmado em 15.09.98 – cfr. documento de fls 109 a
113 do apenso 14 - e foi nessa altura, segundo o arguido Horácio Costa – cujo
depoimento nos pareceu credível pela forma assertiva com que depôs – que o donativo
de 20.000 cts foi solicitado pelo arguido Júlio à “Resin”, só vindo a ser pago em
Dezembro desse ano, já depois da “Resin” ter recebido o adiantamento de uma empresa
de factoring, a quem esse crédito foi transmitido.
Consequentemente, em face da sequência temporal destes factos e não se tendo
demonstrado que tenha sido exercida qualquer influência sobre a AMVS ou sobre a
comissão de análise das propostas no sentido de favorecer o consórcio liderado pela
“Resin”, nenhum sentido lógico teria um concluio entre os arguidos Fátima, Júlio Faria
e Vítor Borges de modo a inflaccionar o valor dessa proposta para aqueles fins, quando
é certo que esses arguidos então não saberiam se o consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” iria
vencer ou não o concurso internacional, além de que a necessidade dos 20.000 cts só
surgiu mais de um ano depois da apresentação dessa proposta ao dito concurso (donde
resulta que antes da apresentação da proposta do consórcio liderado pela “Resin” ao
mencionado concurso internacional para a concepção/construção/exploração do aterro
RIB ainda não se perspectivava a necessidade do FCF de liquidar uma verba de 50.000
cts em 30.09.98, ao abrigo do contrato de transacção celebrado com a CCAM – mesmo
considerando-se um processo negocial que se arrastou por alguns meses -, e,
consequentemente, da necessidade desse clube em obter uma verba de 20.000 cts, pois
30.000 cts já haviam sido entretanto assegurados por força de um apoio financeiro
concedido pela “Zima”).
Convenceu-se pois o Tribunal que os arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras
nada tiveram a ver com a inclusão dessa verba de 140.000 cts na proposta apresentada
pelo consórcio “Resin”/”Sita”/”Ecop” (ou mesmo que tivessem tido conhecimento
desse facto), dando assim crédito, nessa parte, às respectivas declarações. Tal inclusão
tratou-se assim de uma solução levada a cabo por decisão interna dos responsáveis da
“Resin” de modo a verem saldado o passivo da CMF para com essa empresa (ante as
evidentes dificuldades em receber o pagamento do que lhe era devido).
Assim, os arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras apenas aproveitaram o facto
do consórcio liderado pela “Resin” ter vencido o dito concurso internacional para
solicitar a esta o dito donativo para o FCF, cujo pagamento ficou dependente do
recebimento do adiantamento já referido (o donativo foi solicitado pela boca do arguido
Júlio, mas a arguida Fátima não foi alheia a esse pedido, já que foi ela quem pediu ao
arguido Horácio que acompanhasse o arguido Júlio a Matosinhos, à sede da “Resin”,
para esse fim, conforme resultou claro das declarações prestadas pelo arguido Horácio,
a que demos crédito, sendo certo que se depreende das declarações do arguido Júlio
Faria que este terá conversado com ela em ordem encontrar-se uma solução para o
pagamento da prestação vencida em 30.09.98, sendo pois neste contexto que se percebe
a ordem que a arguida Fátima deu ao arguido Horácio e que tenha sido por intermédio
deste que o FCF viria a receber o donativo em causa).
No que toca ao arguido Barbieri, ainda que a título de cumplicidade, não se
demonstrou que ele tivesse tido qualquer participação consciente em qualquer
“esquema”, na medida em que o Tribunal se convenceu que a análise das propostas nos
dois concursos foi rigorosa e que ele não beneficiou da empolação de custos na proposta

360
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

vencedora relativamente ao concurso referente à concepção/construção/exploração do


aterro RIB de Felgueiras, além de que inexiste qualquer dado objectivo que nos permita
concluir que ele conhecia sequer esse facto.
No que respeita ao arguido Carlos Marinho, em face do cargo que
desempenhava ao tempo na “Resin” parece-nos pouco provável que não tivesse
conhecimento dessa factualidade, tendo aliás procedido à entrega do dito donativo de
20.000 cts ao arguido Horácio na CMF, conforme este referiu, e já antes tinha efectuado
um dos “retornos” respeitantes ao contrato celebrado com a “Norlabor”, além de que
forneceu o suporte contabilístico que justificou os recebimentos das quantias pagas pela
CMF a propósito dos contratos mencionados nos pontos 1.2 a 1.4.
Seja como for, ele apenas terá auxiliado na execução daquele plano (nitidamente
não foi ele quem tomou as decisões de simulação de concursos e de contratos ou de
empolação do valor da proposta apresentada pelo consórcio liderado pela “Resin” no
que respeita ao concurso internacional para a concepção/construção/exploração do
aterro RIB – empolação essa que pressupôs conversações entre a “Resin” e a “Ecop” -,
mero auxílio esse que se deduz com propriedade das funções que desempenhava então
na “Resin” e se retira quer da prova testemunhal produzida quer das declarações
proferidas pelos arguidos que sobre essas matérias depuseram (note-se que ele nunca
participou em nenhuma reunião na CMF onde se tivesse discutido os procedimentos a
adoptar para que a CMF pudesse pagar à “Resin” os serviços prestados por esta na
lixeira de Sendim). O seu auxílio traduziu-se assim na camuflacção contabilística dessas
realidades, já que era o contabilista da “Resin” primeiro e depois o respectivo director
financeiro, e na entrega de duas verbas, com destinos diferentes, ao arguido Horácio
Costa).
Mais à frente iremos explicar porque razão não demos crédito aos arguidos Vítor
Borges e Carlos Marinho no que respeita à sua versão dos factos quanto à concessão de
um donativo de 20.000 cts ao FCF (facto que negaram) e porque razão também não
demos crédito ao depoimento do arguido Júlio no que respeita ao momento em que esse
donativo foi solicitado.

Recebimentos

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Negou a matéria constante do intróito, pois nunca recebeu qualquer quantia da
“Resin”.
1. Quanto ao documento de fls 199 do 1º volume, negou que quando proferiu o
despacho “TC. Òptimo. 97.06.10”, estivesse exarada nesse documento a informação
manuscrita, cuja veracidade aliás nega, mas apenas a informação dactilografada
constante do mesmo.
Manifestou aliás estranheza pelo facto de tal informação estar manuscrita
naquele documento, circunstância de todo anormal.
Reafirmou a sua posição de alheamento quanto à angariação de fundos para a
campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de Dezembro de 1997, pois só
conduzia os aspectos políticos da campanha, sendo certo que quem decidiu abrir a conta
no BES foram os elementos da comissão de angariação de fundos.
Aliás, não esteve sequer presente na reunião ocorrida a 09.06.97, onde foi
decidida a distribuição de tarefas (cfr. a respectiva acta).

361
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nega ter dado qualquer ordem ao arguido Horácio Costa para se deslocar a
Matosinhos, aos escritórios da “Resin”, a fim de receber a quantia de 5.000.000$00,
conforme alegado na pronúncia.
Confrontada com o documento de fls 156, do 1º volume, reconheceu a letra do
arguido Júlio Faria, sendo certo que nunca falou com ele acerca do seu conteúdo.
Explicou que, por indicação do arguido Bragança (cunhado do arguido Horácio
Costa e secretário-coordenador do PS local), o arguido Horácio Costa foi inicialmente
recrutado como avençado para gerir a Central de Camionagem e elaborar alguns
projectos de desenvolvimento, devendo apresentar uma informação mensal (cfr. doc. de
fls 5797, datado de 01.10.97).
Esse contrato de avença foi alterado depois das eleições de 1997, pois o arguido
Horácio Costa, não tendo sido eleito pelo PS (pois concorreu em 5º lugar da lista e só
foram eleitos os primeiros 4 da lista do PS), entendia que deveria auferir uma
remuneração equivalente a vereador, o que lhe foi concedido.
Pese embora a arguida Fátima Felgueiras assegurasse que com o arguido
Horácio Costa tinha uma relação normal como qualquer avençado da CMF, sem que
tivesse na CMF qualquer estatuto de privilégio (raramente entrando aliás no seu
gabinete e não dispondo de gabinete próprio no edifício da CMF), certo é que referiu
que ele participava em algumas reuniões de cordenação na CMF e substituiu-a na sua
ausência em algumas reuniões das várias comissões existentes no concelho (como por
ex. a Comissão de Promoção e Protecção de Menores).
Referiu ignorar se o texto do documento de fls 64 do 1º volume foi elaborado
em casa do arguido Júlio Faria, numa reunião que teve com o arguido Horácio Costa,
pois se a mesma teve lugar nela não participou.
Entretanto, o arguido Horácio Costa assumiu as funções de verador, partilhando
um gabinete com o verador Lickefold da Silva.
Reconheceu no documento de fls 171, do 1º volume, a letra do arguido Júlio
Faria, sendo certo que o mesmo nunca lhe foi entregue.
Já o documento de fls 168, do 1º volume, datado de 08.03.98, é da sua autoria.
Nunca participou na angariação de fundos para o FCF, limitando-se a participar
em jantares para o efeito.
O documento de fls 185 é da sua autoria, salientando que se fosse verdade que
tinha poderes de facto para dispor da conta do BES e se nessa altura ela tinha um saldo
que variava entre 2.000 e 3.000 contos (cfr. documento de fls 30 e 31), jamais teria pago
do seu bolso aquela despesa de campanha.

2. Referiu desconhecer o recebimento pelo arguido Horácio Costa da quantia


mencionada no despacho da pronúncia, mantendo a posição já anteriormente assumida
de alheamento quanto à recolha de fundos para a campanha eleitoral.
A propósito dos documentos mencionados na pronúncia e que segundo alegado
estariam acondicionados numa pasta com o timbre da “Resin”, mencionou a forma
como os cheques da edilidade eram emitidos (assinava-os depois de terem sido
assinados pelo tesoureiro – a quem cabia verificar se o pagamento era devido ou não –,
cheques esses acompanhados da pertinente documentação de suporte).
Não pôs em causa a veracidade do cheque cuja cópia se acha a fls 158, do 1º
volume; referiu nunca ter visto o manuscrito de fls 159 do mesmo volume (sendo certo
que não reconhece a letra); desconhece o teor do manuscrito de fls 163 (ignorando a
quem pertence a respectiva letra); declarou que a expressão “retorno” contida no
documento de fls 163 é uma maquinação levada a cabo para a prejudicar, criando a
aparência de uma realidade falsa, além de que o “esquema” mencionado na pronúncia (a

362
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

propósito do “retorno”), se tivesse lugar, teria ocorrido em 1997 – ano em que decorreu
a campanha eleitoral - e não em 1998, já que segundo a pronúncia as verbas
alegadamente entregues pela “Resin” destinavam-se a pagar despesas relacionadas com
a campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de Dezembro de 1997 (admitiu
porém que houveram pagamentos respeitantes a despesas de campanha que ocorreram
depois das eleições respectivas); referiu ainda desconhecer a letra constante do
documento de fls 22 verso do apenso 12.
Mais referiu que o arguido Horácio Costa não tinha qalquer incumbência na
CMF que exigisse a realização de contactos com a “Resin” enquanto avençado (não se
mostrou tão assertiva quanto a esse facto quando ele assumiu as funções de vereador).
Não obstante, admitiu que a letra no corpo principal do documento de fls 73 do apenso
139-A é sua (datado de 28.05.97, numa altura em que o arguido Horácio Costa ainda era
avençado), onde este é encarregue de uma incumbência junto da “Resin”.

3. Nega ter adquirido 1550 bilhetes de um sorteio promovido pelo FCF por
ocasião do Natal de 1998 (quando muito terá adquirido 3 ou 4 bilhetes a título pessoal).
Ignora quais os movimentos efectuados na conta titulada pelo Júlio Faria e se
nela foi ou não efectuado o depósito referido no despacho de pronúncia, sendo certo que
algumas despesas de campanha foram liquidadas pelo arguido Júlio Faria, tendo
posteriormente sido reembolsado do respectivo valor.
Quanto ao mais negou ter qualquer conhecimento da factualidade ali descrita,
sendo certo que nunca recebeu qualquer quantia da “Resin”.

4. Referiu ignorar qualquer entrega de 20.000 contos pela “Resin” ao arguido


Horácio Costa, sendo certo que nunca tinha visto o cheque cuja cópia se acha a fls 218
do 1º volume.
Em todo o caso, esclareceu que ouviu dizer que a “Resin” fez publicidade no
estádio do FCF por um valor de 12.500 contos. Confrontada com o teor do documento
de fls 443 do apenso 96-A (contrato de publicidade) referiu nunca o ter visto.
Confrontada com o depósito de 7.500 contos em numerário constante do
documento de fls 447 do apenso 96-A, referiu desconhecer tal facto.
Além disso, manifestou desconhecer que o arguido Júlio Faria e outros
dirigentes do FCF assumiram pessoalmente perante a CCAM a obrigação de pagar uma
dívida do clube para com aquela instituição, sendo do seu conhecimento que o clube
tinha um passivo de cerca de 1.000.000 contos e variadíssimos credores.
Esclareceu que apenas foi presidente da Assembleia Geral do FCF, pois era
presidente da CMF e era costume o presidente da elididade assumir aquele cargo no
clube.
Consequentemente, apenas tinha um conhecimento superficial da situação do
FCF.
Reconhece no documento de fls 170 a letra do arguido Júlio Faria, ignorando
porém a que reunião se refere tal documento.
Informou que o executivo camarário teve muitas reuniões com os dirigentes do
FCF, em face das dificuldades financeiras que o clube atravessava, já que se tratava de
uma associação de utilidade pública do concelho, porventura a mais representativa.
Reconheceu no documento de fls 63 do apenso 17 a assinatura do arguido Júlio
Faria, documento esse que nunca tinha visto antes.
A mesma posição assumiu em relação aos documentos de fls 465 do 2º volume
(factura do FCF alusivo a um donativo de 20.000 contos e que terá sido anulada) e 427
do apenso 96-A (factura do FCF alusiva à quantia de 12.500 contos alegadamente

363
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

recebida por força do contrato de publicidade constante de fls 443 do apenso 96-A,
sendo certo que na mesma ocasião tinha sido já celebrado um outro contrato de
publicidade entre o FCF e a “Resin”, conforme documento de fls 442 do mesmo apenso
96-A, sendo pois estranha a celebração de 2 contratos na mesma ocasião, de valor
substancialmente diverso, o que, conjugado com o teor das facturas anuladas, inculca a
ideia de que o dito contrato de publicidade de 12.500 contos não foi celebrado na altura
e que terá sido forjado para encobrir o donativo efectuado pela “Resin” ao FCF).

- Arguido Júio Faria


1. Negou ter recebido qualquer quantia da “Resin” bem como a ocorrência das
reuniões a que se reporta o documento de fls 142 do 1º volume e a propósito da abertura
da conta do BES.

3. A propósito deste ponto referiu que o FCF realizou, por alturas do Natal de
1998, um sorteio com o objectivo de angariar fundos (nessa altura era já o presidente da
Comissão Administrativa do clube) para reembolsar os avalistas do clube do que
haviam pago a uma instituição financeira relativamente à prestação vencida em Outubro
(1.600 cts cada um). Cada bilhete tinha o preço de 1.000$00 (cfr. os bilhetes respectivos
juntos aos autos e que são precisamente 1.550 ao preço referido, de que o bilhete de fls
84 é exemplo).
A propósito dos 1.850 cts depositados na sua conta do BES – facto que
confirmou (cfr. fls 167) -, referiu que lhe coube distribuir pelos seus camaradas do PS e
presidentes de Junta 1.850 bilhetes referentes ao sorteio referido, cada um ao preço
nominal já mencionado (tem a ideia, sem certeza, que foi o secretário-coordenador do
PS Felgueiras – O arguido Bragança - quem remeteu esses bilhetes aos militantes, não
fazendo ideia se a presidente da Comissão Política – a arguida Fátima Felgueiras - ou o
arguido Bragança remeteram algum desses bilhetes aos presidentes de Junta, pese
embora aquele tivesse um contacto mais fácil com estes últimos; quer crer que não terá
entregue pessoalmente nenhum bilhete a algum militante).
Consequentemente, em resultado da venda desses bilhetes foi depositada na sua
conta a quantia respectiva (cfr. o talão de depósito da quantia de 1.850.000$00,
constante de fls 167 e datado de 23.11.98), sendo certo que já havia depositado idêntica
quantia na conta do FCF, referente aos valor dos bilhetes que lhe coube distribuir (certo
é que só foram apreendidos 1.550 bilhetes que, assim, aparentemente, não terão sido
distribuídos).
Esta versão não é pois inteiramente coincidente com o que consta do artº 61º da
sua contestação (onde se afirma que os 1.850 bilhetes eram destinados à CMF; refere
agora que afinal eram destinados aos seus camaradas do PS e presidentes de Junta).
Não se recorda se entregou esses bilhetes acondicionados num envelope da
Assembleia da República (sendo certo que na altura era deputado), tendo referido que
naturalmente seria mais lógico acondicioná-los num envelope do FCF
(consequentemente, apesar de expressar ignorar como foram acondicionados tais
bilhetes e de numa primeira resposta ter referido ignorar se entregou os ditos bilhetes
acondicionados dessa forma, acabou por excluir tê-los entregue acondicionados num
envelope da Assembleia da República).
Reconheceu em todo o caso que fez chegar à CMF documentos acondicionados
em envelopes da Assembleia da República pelo que sugeriu que alguém tivesse usado
um desses envelopes para dar a aparência de que os bilhetes em causa nele foram
acondicionados.

364
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quanto ao “post-it” de fls 84, confirmou ter sido escrito por si, não tendo
explicado a quem era dirigido, limitando-se a referir que se tratava da indicação dos
bilhetes e do preço respectivo destinado aos seus camaradas (nesse documento alude-se
a 1550 bilhetes e não a 1850 bilhetes, como seria de esperar em face das declarações
prestadas por este arguido).
Além disso, no saco onde estavam esses bilhetes tem a expressão “Drª Fátima
Felgueiras” manuscrita pelo depoente.
Tendo-se constatado que nem todos os bilhetes apreendidos são sequenciais,
manifestou ingnorar se eles fazem parte ou não do lote de 1.850 bilhetes já referidos por
si. Em todo o caso, não sabe se todos os 1.850 bilhetes que lhe foram entregues eram ou
não sequenciais.
Além disso, não sabe se todos os bilhetes emitidos (que eram milhares) foram
vendidos pelo FCF.
Quanto ao mais referiu desconhecer qualquer entrega de dinheiro pela “Resin”
para além do auxílio monetário que prestou ao FCF e já relatado, sendo certo que se
desligou dos assuntos autárquicos desde que assumiu as funções de deputado na
Assembleia da República.
Confrontado com o documento de fls 199 do 1º volume (relatório do arguido
Horácio Costa dirigido à arguida Fátima Felgueiras), referiu desconhecer a respectiva
matéria, não tendo tido qualquer intervenção nessa situação.
Idêntica posição assumiu relativamente aos documentos de fls 158 a 161 do 1º
volume.
O mesmo se diga ao manuscrito de fls 163 do 1º volume, ignorando a que se
reporta a expressão “retorno”.
A propósito do documento de fls 22 e 23 do apenso 12, referiu desconhecê-lo,
ignorando a que se refere a anotação manuscrita a fls 22 verso.
Referiu também ignorar a que se refere o documento de fls 302 do apenso 12.
Da conta do BES titulada pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas,
referidas nos autos, recebeu dinheiro para o reembolsar de despesas que pessoalmente
adiantou no âmbito da campanha eleitoral de 1997.
A esse propósito, não tem a certeza se foi esse facto que justificou a emissão a
seu favor do cheque cuja cópia se acha a fls 120 do apenso 1, no montante de
600.000$00, datado de 02.12.97, cheque esse que foi endossado pelo depoente
(reconhece no verso a sua assinatura e a assinatura do seu filho).
Não se recorda a que corresponde a quantia de 170.000$00, titulada pelo cheque
cuja cópia se acha a fls 197 do apenso 1, datado de 18.11.99, cheque esse emitido à sua
ordem (referiu ignorar de quem é a rúbrica do respectivo talão de depósito cuja cópia se
acha a fls 165 do 1º volume).
Quanto ao cheque cuja cópia se acha a fls 199 do apenso 1, no montante de
57.090$00 e datado de 25.02.99, emitido a seu favor, recorda-se que serviu para o
reembolsar do montante que despendeu num jantar em Lisboa, na altura do Congresso
Nacional do PS, em que os elementos de Felgueiras jantaram juntos (ignora de quem é a
rúbrica do talão de depósito dessa quantia cuja cópia se acha a fls 166 do 1º volume).

4. Explicou que o FCF entrou numa situação de pré-ruptura financeira depois de


ter participado na 1ª Divisão do Campeonato Nacional de Futebol, acompanhado de um
vazio directivo.
A presidente da CMF foi então abordada, tendo sido posta ao corrente da
situação e tendo-lhe sido feito um apelo no sentido de auxiliar o FCF a encontrar uma
solução directiva.

365
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nesse contexto, o depoente em 1996 tornou-se o presidente do clube durante os


5 anos seguintes, sendo certo que quando assumiu esse cargo não tinha a noção da
dimensão real do problema financeiro do FCF, situação agravada pelo facto dos apoios
financeiros terem diminuído muito quando o clube desceu de divisão.
De resto, reconheceu terem existido reuniões quer com o executivo camarário
quer com elementos da Assembleia Municipal de Felgueiras com vista a se ultrapassar
as dificuldades financeiras do clube (não se recorda se nessas reuniões participaram os
Srs. Álvaro Costa e Fernando Lima, dirigentes do FCF). A alusão à arguida Fátima
Felgueiras no documento de fls 170 do 1º volume reportar-se-á a esses contactos
institucionais, embora não descarte a possibilidade dela ter sido contactada noutro
contexto, que não precisou.
Cerca de 1 ano depois de ter sido eleito presidente do FCF propôs a contratação
de um serviço de assessoria destinado a organizar a contabilidade do clube, verificando-
se então que o passivo do mesmo era de cerca de 800.000.000$00, de curto e longo
prazo.
A CCAM era um dos credores do clube, tendo inclusivamente instaurado várias
acções judiciais para cobrar os seus créditos quer contra o clube quer contra ex-
dirigentes do mesmo.
Aliás, enquanto presidente da Assembleia Geral do clube, chegou a avalisar uma
letra de 100.000.000$00 (juntamente com outros dirigentes), letra essa descontada
algures em 1995 (o montante emprestado pela CCAM destinou-se a custear as obras do
estádio).
Assim, confirmou que se procurou chegar a acordo com a CCAM, confirmando
o teor do documento de fls 109 a 113 do apenso 14, datado de 15.09.98 (no qual
interveio na qualidade de presidente da Direcção do FCF), pondo-se assim fim aos
vários processos judiciais pendentes e consolidando-se a dívida do clube perante aquela
instituição financeira.
Consequentemente, o FCF teria de pagar 50.000.000$00 até 30.09.98.
Em ordem a obter o respectivo pagamento, procuraram-se apoios financeiros no
meio empresarial, entre as quais a “Resin”.
Nessa altura já tinham obtido 30.000.000$00 junto da firma “Zima” (relativo a
um contrato de publicidade que celebraram), faltando pois 20.000.000$00, que
procuraram obter junto da “Resin”.
Em ordem a tal, pediu ao arguido Horácio Costa que se deslocasse com ele a
Matosinhos, à sede da “Resin” para obter dela um apoio financeiro no contexto já
referido, o que ocorreu em finais de Dezembro de 1997 (esta data não parece fazer
sentido, visto que o acordo com a CCAM foi realizado a 15.09.98, daí que só depois
dessa data se tornasse imperioso angariar os 20.000 cts em falta para completar a
primeira prestação de 50.000 cts.).
Explicou que fez aquele pedido ao arguido Horácio Costa na medida em que ele
é cunhado do arguido Bragança, com quem tinha uma relação mais próxima, e dado o
facto daquele estar a ter uma vida mais activa em termos políticos e porque o encontrou
num camarote do estádio do FCF (era frequente o FCF enviar concvites à CMF),
aproveitando essa ocasião para lhe fazer o dito pedido. Deu aliás a entender que o
arguido Horácio Costa era o braço direito da arguida Fátima Felgueiras (nesse contexto
se compreende a razão pela qual o arguido Horácio Costa era encarregue por ela de
alguns assuntos “sensíveis” e a razão pela qual o seu nome surge ligado a boa parte da
matéria de facto em apreciação).
Depois de confrontado com o teor das suas declarações de fls 3892, prestadas
perante o JIC, salientou que na altura o seu estado de espírito não era o mais apropriado

366
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

e que ter-se-á equivocado, admitindo que na altura da reunião com a “Resin” o arguido
Horácio Costa não era ainda vereador (o arguido Horácio Costa iniciou funções como
avençado da CMF a 01.10.96 e a 01.01.99 inicou as funções de verador).
Foram então recebidos pelos arguidos Vítor Borges e Gabriel Ângelo Ferreira de
Almeida, sendo certo que não foi efectuada qualquer apresentação do arguido Horácio
Costa pois, ao que perspectivou, o arguido Vítor Borges já o conhecia. Em todo o caso,
só conheceu nesse dia o arguido Gabriel.
Propuseram então a celebração de um contrato de publicidade no valor de
20.000.000$00 entre o FCF e a “Resin”, sendo certo que o arguido Vítor Borges acedeu
em celebrar tal contrato mas que o montante dependeria das disponibilidades de
tesouraria daquela empresa, pois referiram muitos créditos a receber da CMF e da
AMVS, dependentes do desbloqueamento de verbas comunitárias.
Ficou assim prometido que logo que esses montantes fossem recebidos pela
“Resin” comunicariam a ajuda que poderiam dar (da forma como depôs, parece mais
que os arguidos Júlio Faria e Horácio Costa foram pedir um donativo à “Resin” do que
propriamente propôr a celebração de um novo contrato de publicidade, sendo certo que
para o mesmo período já existia um contrato de publicidade, conforme confirmou o
arguido Júlio Faria, mas por valores substancialmente inferirores – cfr. doc. de fls 442
do apenso 96-A).
Já depois de Setembro de 1998 (vencida que estava a primeira prestação de
50.000 cts a pagar à CCAM) a “Resin” contactou-o dando conta de que já tinha
condições para ajudar o FCF, mas que havia na CMF a necessidade de haver uma
reunião com o arguido Barbieri Cardoso, reunião essa que, ao que pensa, se prendia
com os moldes em que aquela empresa continuaria a operar em Felgueiras.
Deu conta desse contacto ao Horácio Costa e pediu-lhe para que fossem criadas
condições para que o acordo com a CCAM fosse honrado.
Confirmou assim ter manuscrito o documento de fls 170 do 1º volume, datado
de 6.11.98 (esse manuscrito não faria sentido se nessa altura o arguido Júlio Faria já
soubesse que em Dezembro de 1998 o FCF iria receber pelo menos 12.500 cts a coberto
do alegado contrato de publicidade que consta de fls 443 do apenso 96-A, o que indicia
que este contrato é simulado, isto é, foi forjado pelo menos em finais de 1998 e serviu
apenas para disfarçar um donativo da “Resin” ao FCF no valor de 20.000 cts, dos quais
7.500 cts em numerário).
Não descarta a hipótese de ter abordado esse assunto com a arguida Fátima
Felgueiras (facto que parece resultar do manuscrito de fls 170 do 1º volume), não
sabendo já se essa abordagem ocorreu antes ou depois do compromisso assumido
perante a CCAM.
No final de 1998, mais concretamente a 30.12.98 (e segundo lhe contou o Dr.
Barata Feio em momento posterior), o Horácio Costa contactou o FCF no sentido de
que alguém fosse ter com ele (a local que desconhece) para receber os 20.000 cts, o que
foi feito pelo Dr. Barata Feio (que fazia a contabilidade do clube) e pelo Sr. Figueiredo,
os quais receberam um cheque de 12.500.000$00 (cfr. doc. de fls 466 do 2º volume) e o
montante de 7.500.000$00 em numerário, num total de 20.000.000$00, valores esses
que foram depositados na conta do clube (cfr. depósitos de fls 431 e 447 do apenso 96-
A, bem como o talão de fls 453 do mesmo apenso, de onde se vê que esses valores não
foram depositados pela mesma pessoa, visto ser diferente a letra; cfr. também as
entradas de caixa no FCF, datadas de 30.12.98, constantes de fls 430 e 432 do apenso
96-A, a primeira no valor de 12.500 cts e esta última referente ao IVA, no montante de
2.125.000$00) e que serviram para pagar a dita prestação de 50.000 cts à CCAM na
sequência do acordo com ela celebrado e já referido.

367
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não deu qualquer explicação para o facto do dinheiro ter sido entregue ao
arguido Horácio Costa e não directamente no FCF.
Confirmou ter remetido à CCAM a missiva de fls 63, do apenso 17, não se
recordando de quem recebeu a indicação de que a poderia mandar porquanto estaria
para breve o recebimento da quantia em falta (20.000 cts). Em todo o caso, referiu que
ou recebeu essa indicação da “Resin” ou do arguido Horácio Costa.
Ainda a propósito desse documento, onde se referem apoios de entidades, disse
que a “Resin” foi uma delas, não se lembrando se a CMF foi também uma dessas
entidades que apoiou financeiramente o clube.
Partiu do pressuposto que os 7.500 cts em numerário provieram também da
“Resin” dados os factos que relatou (cfr. ainda a factura anulada de 20.000 cts do FCF
referente a donativo e constante de fls 465 do 2º volume/425 do apenso 96-A e a factura
de 12.500 cts + IVA do mesmo clube, datada de 31.12.98, referente ao alegado contrato
de publidade de fls 443 do apenso 96-A, constante de fls 429 do mesmo apenso, bem
como a factura anulada referente a donativo de 12.500 cts e constante de fls 427 do
penso 96-A).
Ainda a propósito do pretenso contrato de publicidade constante de fls 443 do
apenso 96-A (igual a fls 9147), assinado por Fernando Sampaio em representação do
FCF e pelo arguido Vítor Borges em representação da “Resin” e datado de 03.08.98 (e
nos termos do qual o pagamento dos 12.500 cts estaria previsto para Dezembro desse
ano), o arguido Júlio Faria não soube precisar se ao respectivo valor correspondeu um
acréscimo de publicidade no estádio, admitindo porém que a publicidade que se vinha
efectuando se manteve nos mesmos moldes, muito aquém daquele valor de 12.500 cts
(o que reforça a ideia de que se tratou de um contrato simulado, de modo a disfarçar um
donativo).
Este arguido não conseguiu dar qualquer explicação para o facto de aparecerem
duas facturas referentes a donativos, uma referente a 20.000 cts (factura nº 1583, de
30.12.98) e outra referente a 12.500 cts (factura nº 1586, de 30.12.98), ambas anuladas,
e uma outra de 12.500 cts + IVA, datada de 31.12.98, referente ao dito contrato de
publicidade (cfr. fls 443 do apenso 96-A), pese embora tenha negado que o contrato de
publicidade já mencionado tenha sido simulado (se assim é, não se compreende que o
mesmo tenha sido celebrado em Agosto de 1998, em face do manuscrito de fls 170, do
1º volume. Essa posição coaduna-se ainda mal com o facto de ter declarado que o
montante que a “Resin” estaria disposta a disponiblizar dependeria dos montantes que
recebesse da CMF e da AMVS, sendo certo que desta apenas recebeu luz verde quanto
ao adiantamento referente à construção do aterro RIB de Felgueiras a que se reporta o
documento de fls 291 do apenso 12 em Novembro de 1998), tendo sido por isso apenas
contactado pela “Resin” - eventualmente através do arguido Horácio Costa - já depois
de vencida a primeira prestação a pagar à CCAM, vencida em 30 de Setembro de 1998,
no âmbito do contrato de transacção celebrado com essa instituição e já referido, no
sentido de que estariam dispostos a contribuir com os 20.000 cts em falta)
De resto, as incongruências assinaladas, o contexto em que se desenrolou a
reunião dos arguidos Júlio Faria e Horácio Costa na sede da “Resin” (onde se procurou
obter uma contribuição de 20.000 cts) e a veracidade do manuscrito de fls 170 do 1º
volume (confirmado pelo seu autor) parecem afastar o facto insinuado de que as
facturas anuladas e já referenciadas tenham sido forjadas.

- Arguido Vítor Borges


Negou a matéria constante do intróito.

368
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

1. A propósito do documento de fls 199, negou ter efectuado qualquer


telefonema ao arguido Horácio Costa, sendo certo que com ele se encontrou duas vezes
em Matosinhos e duas ou três vezes na CMF em reuniões com outras pessoas,
assegurando que com ele nunca falou a sós.
Nega terminantemente ter-lhe dado qualquer dinheiro.
De resto, a primeira vez que com ele se encontrou em Matosinhos, na sede da
“Resin”, ele havia-se deslocado ali para pedir um donativo para a campanha eleitoral
das autárquicas de 1997 da arguida Fátima Felgueiras (segundo ele vinha a mando da
arguida Fátima Felgueiras), em dinheiro e sem documento comprovativo, o que
recusou. Estava presente o arguido Gabriel Ferreira de Almeida, então Director-geral da
“Resin”. Estranhou tal facto pois contactava frequentemente com a arguida Fátima
Felgueiras e ela nunca lhe falou de qualquer assunto relacionado com qualquer donativo
para a sua campanha eleitoral (conheceu-a apartir do momento em que ela substituiu o
arguido Júlio Faria na presidência da CMF). Certo é que, dado o melindre da situação,
também não conversou com ela acerca da descrita actuação do arguido Horácio Costa.
A segunda vez que o arguido Horácio Costa se deslocou à sede da “Resin” foi
acompanhado do arguido Júlio Faria e com o intuito de pedir um donativo para o FCF.

2. Confirmou o teor do documento de fls 158, referindo desconhecer a letra


constante do documento de fls 159 (sustentando ser falso o seu conteúdo) e confirmou o
teor dos documentos de fls 160 e 161.
Não tem qualquer explicação para o facto desses documentos estarem na posse
do arguido Horácio Costa.
Confrontado com o teor dos documentos de fls 38 e 41 do apenso 97 (recibos da
“Translousada” à “Norlabor”), com o teor dos documentos de fls 131 do apenso 95-A
(ordem de pagamento da CMF a favor da “Norlabor”, datado de 12.05.98, no valor
líquido de 6.633.334$00, deduzido de 333.333$00, valor esse recebido a 17.07.98),
recibo da “Norlabor” à CMF de 7.000.000$00, de 13.07.98, constante de fls 133,
cheque datado de 12.05.98, no valor de 6.633.334$00 (quantia coincidente com o recibo
de fls 38 do apenso 97, datado de 21.10.98, emitido pela “Translousada” à “Norlabor”),
e de fls 158 do apenso 97 (guia de receita da CMF de 12.05.98 emitida pela CMF à
“Norlabor”) e documento de fls 159 (recibo da “Resin” à “Translousada” no mesmo
montante, datado de 14.05.98) explicou que existia uma conta-corrente entre a “Resin”
e a “Translousada”, tendo aquela inclusive chegado a pagar a esta sem receber
previamente da CMF.
Não soube porém explicar as datas constantes dos documentos de fls 158 e 195,
bem como de fls 38 do apenso 97, pois parecem não ter lógica.
Confrontado com o teor das fotocópias de fls 138 e 139, alusivas às fotos das
pastas referidas nos autos (tendo-lhe depois sido exibidas as pastas em causa),
reconheceu que a de fls 138 diz respeito a uma pasta usada pela “Resin”, sendo certo
que, relativamente à de fls 139, não pode assegurar que tenha sido usada pela “Resin”,
reconhecendo, em todo o caso, ser igual a pastas normalmente usadas por essa empresa.

3. Nega que o arguido Garbriel Ferreira de Almeida tenha entregue qualquer


quantia monetária ao arguido Horácio Costa, sendo certo que só com o seu
consentimento essa quantia poderia ter sido entregue caso tal tivesse ocorrido.
Confrontado com o cartão de fls 164 do 1º volume (da “Resin”), referiu ignorar
se a letra em causa é do arguido Gabriel (pois não a conhece), ignorando ainda a que se
reporta o agradecimento nele constante.

369
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não pôs em causa o teor do documento de fls 162 do 1º volume (guia de receita
emitida pela CMF a favor da “Norlabor”, datada de 07.10.98, e um cheque emitido pela
CMF, ambos no valor de 7.155.153$00, datado de 08.10.98; cfr. ainda a respectiva
ordem de pagamento, constante de fls 136, do apenso 95-A, datada de 06.10.98, bem
como o recibo de fls 188 do apenso 97, emitido pela “Resin” à “Translousada” a
22.10.98), referindo porém desconhecer o teor do documento de fls 163 do 1º volume,
não conhecendo inclusive a respectiva letra.
Reafirmou que a “Resin” não efectuou o pagamento em causa e muito menos em
numerário, sendo certo que a “Resin” não fazia pagamentos em numerário desse
montante e não tinha a prática de distribuir dinheiro pelos autárcas das autarquias onde
prestava os seus serviços.
Quanto ao documento de fls 22 do apenso 12, referiu nunca o ter visto (cfr. a
anotação a lápis).

4. Referiu que o arguido Horácio Costa, em finais de 1997 ou inícios de 1998,


dirigiu-se com o arguido Júlio Faria a Matosinhos (este na qualidade de presidente da
Direcção do FCF), à sede da “Resin”, com o intuito de obterem desta uma contribuição
para o FCF no montante de 20.000.000$00, verba que o clube necessitava.
Nessa altura já conhecia o arguido Horácio Costa da reunião que com ele teve
em Matosinhos quando ele ali se dirigiu para pedir um donativo para a campanha
eleitoral da arguida Fátima Felgueiras nas eleições autárquicas de Dezembro de 1997.
Assegurou que nunca almoçou com ele. Em todo o caso, referiu não se lembrar se foi
por ele contactado a propósito da publiciade efectuada no “Sovela”, na edição desse
jornal publicada a 6.06.97 (conforme instruções manuscritas da arguida Fátima
Felgueiras para o arguido Horácio Costa, datadas de 28.05.97, sendo certo que à
margem consta ter sido contactado a 30.05.97, anotação que será da lavra do arguido
Horácio Costa, segundo referiu este arguido – cfr. doc. de fls 73 do apenso 139-A).
Confrontado com as suas declarações no auto de interrogatório judicial de fls
3920, do 16º volume, explicou que na altura não se lembrou da reunião em causa com
os arguidos Júlio Faria e Horácio Costa.
O arguido Júlio Faria (tem a ideia que o Horácio Costa pouco falou) deu-lhe
conta da situação dificil do clube e propôs a celebração de um contrato de publicidade
na ordem dos 20.000.000$00, verba que o clube necessitava (e que o depoente entendia
ser mais um donativo pois a publicidade a efectuar não tinha nem de longe nem de perto
o referido valor).
Deu conta que eles apareceram de surpresa, não estando pois a contar com
aquela solicitação.
O depoente mostrou então abertura em apoiar o clube mas na medida das
disponibilidades financeiras da “Resin” e remeteu-os para o arguido Gabriel Ferreira de
Almeida, Director-geral da empresa, pois era ele quem se ocupava desses assuntos, de
sorte que todos se dirigiram para o gabinete deste e deram-lhe conta do assunto em
causa.
Disse-lhes que era de todo impossível aceder ao seu pedido, pois nunca tinham
dado um donativo ou celebrado um contrato de publicidade naquela ordem de valores.
Entretanto, deixou-os à conversa com o arguido Gabriel no gabinete deste.
Mais tarde acederam em celebrar com o FCF um contrato de publicidade de
12.500.000$00 + IVA, tendo dessa forma esgotado para esse ano o valor previsto para
os gastos em publicidade. Ignora em concreto que publicidade foi efectuada,
perspectivando aquele montante mais como um apoio ao clube cuja contrapartida em
publicidade não tinha de facto o valor pago.

370
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nada entregaram em numerário, confirmando a emisssão do cheque de


12.500.000$00, datado de 29.12.98, constante de fls 466 do 2º volume (por si subscrito),
depositado a 30.12.98, conforme documento de fls 431 do apenso 96-A.
Assegurou ignorar a quem o cheque em causa foi entregue, mas o mais natural
seria o envio pelo correio ao FCF.
Referiu terem efectuado vários contratos de publicidade com o FCF, no valor de
1.500.000$00 e 3.000.000$00.
Confrontado com os contratos de publicidade constantes de fls 442 e 443 do
apenso 96-A, no montante de 1.500.000$00 e de 12.500.000$00 respectivamente,
datados de 03.08.98, referiu ter a ideia de que esses contratos foram celebrados no dia
ali indicado.
Não deu qualquer explicação para a celebração de dois contratos de publicidade
distintos para a mesma época desportiva.
Foi confrontado com o teor do manuscrito de fls 170 do 1º volume, datado de
06.11.98, da autoria do arguido Júlio Faria, dele revelando desconhecimento. Porém,
não se percebe o seu conteúdo se, em face do contrato de publicidade de fls 443 do
apenso 96-A, já seria expectável o pagamento de 12.500.000$00 em Dezembro de 1998,
o que inculca a ideia de que o alegado contrato de publicidade foi celebrado em data
posterior a este documento e para justificar uma entrega de 12.500.000$00 ao FCF pela
“Resin”.
De resto, assim se percebe a emissão inicial de uma factura de 20.000.000$00
pelo FCF, alusiva a donativo, entretanto anulada (cfr. documento de fls 465, do 2º
volume), a emissão de um outra factura com a mesma data e o mesmo número de
12.500.000$00 também alusiva a um donativo e entretanto também anulada (cfr.
documento de fls 427 do apenso 96-A) e finalmente uma factura de 12.500.000$00
alusivo ao contrato de publicidade referido (cfr. documento de fls 429 do apenso 96-A).
Para esses factos o arguido não deu qualquer explicação plausível à luz da
versão por si sustentada, limitando-se a dizer que lhe foi dito pelo Departamento de
Contabilidade da “Resin” que as facturas em causa foram anuladas porquanto foram
emitidas incorrectamente e já depois de instaurado este processo (o que inculca mais
uma vez a ideia de que se pretendeu encobrir um donativo de 20.000.000$00).
Refutou que o depósito em numerário de 7.500.000$00 a 30.12.98 (cfr. doc. de
fls 447 do apenso 96-A) tivesse algo a ver com alguma quantia em numerário entregue
pela “Resin”, pois se a “Resin” tivesse de facto pago 20.000.000$00 teria emitido um
cheque nesse montante (pese embora tal quantia monetária, somada aos 12.500.000$00,
correspondesse à soma inicialmente solicitada pelo arguido Júlio Faria e necessária para
honrar o compromisso assumido pelo FCF para com a CCAM e pese embora tal quantia
tenha sido depositada ao mesmo tempo que o cheque de 12.500.000$00 entregue pela
“Resin”).
Referiu que na reunião havida com os arguidos Júlio Faria e Horácio Costa não
se abordou a questão da antecipação de qualquer pegamento por banda da CMF ou da
AMVS.
Confrontado com o teor da factura de fls 444 do apenso 96-A, datada de
31.12.98, emitido pela “Resin” à CMF e respeitante à reabilitação e manutenção da
lixeira de Sendim entre 11.05.97 e 11.05.98, no valor de 23.806.575$00, não pôs em
causa a sua emissão, factura essa que viria a ser recusada pela CMF (cfr. fls 445), pois
entendia ser da responsabilidade da AMVS o respectivo pagamento. A AMVS, por seu
turno, também se recusava a pagar tal montante pois entendia que deveria ser a CMF a
fazê-lo.

371
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Arguido Carlos Marinho


Salientou que nunca entregou a quem quer que seja qualquer quantia monetária
em numerário da “Resin”, nem a administração – que tenha conhecimento – nos moldes
descritos na pronúncia.

2. Segundo referiu, terá avistado o arguido Horácio Costa numa reunião na


CMF, a que só assistiu, e que se prendia com a problemática da recolha e tratamento de
resíduos sólidos urbanos. Nessa altura não falou sequer com ele.
Recorda-se que posteriormente deslocou-se à CMF, mais concretamente ao
Departamento Administrativo e Financeiro em ordem a reclamar o pagamento à “Resin”
de serviços por esta prestados (seriam cerca das 9.00 horas da manhã), e alguém lhe
disse para falar com o arguido Horácio Costa, o que fez. Aguardou por ele na recepção e
abordou-o no sentido de agilizar um pagamento à “Resin” por parte da CMF.
Em data posterior, pela mesma razão, num gabinete situado no edifício da CMF,
teve com ele uma reunião.
Nega ter-lhe entregue qualquer quantia monetária conforme referido no ponto 2
do ponto 1.6 da pronúncia.
Esclareceu que normalmente contactava a Drª Teresinha, responsável pela área
financeira da CMF, no que toca a assuntos relacionados com pagamentos (e pelos vistos
também o arguido Horácio Costa).
Confrontado com o teor das suas declarações prestadas em interrogatório
judicial perante o JIC, constantes de fls 3927, 6º parágrafo, esclareceu agora que apenas
se reportou à reunião acima referida inicialmente, em que não conversou sequer com o
arguido Horácio Costa.
Confrontado com as pastas apreendidas nos autos, confirmou que a que tem o
logotipo da “Resin” era usada por esta empresa, não assegurando o mesmo
relativamente à pasta que não apresenta tal logotipo (referiu aliás, em contradição com
arguido Vítor Borges, que todas as pastas usadas pela “Resin” tinham o logotipo dessa
empresa).
Confrontado com o manuscrito de fls 159 referiu que a letra não é sua, nunca
tendo visto tal documento.
O valor referido de 6.633.334$00 coincide com um valor recebido pela “Resin”
no âmbito da empreitada de “Manutenção do Aterro Sanitário – Execução de
Plataformas”, mencionado no ponto 1.3 da pronúncia (cfr. fls 1910 dos autos – cheque
particular dos sócios da “Norlabor”).
Já os 800.000$00 ali referidos, segundo interpreta, reporta-se à diferença de IVA
entre 17% e 5%.

4. Nega a matéria constante neste ponto, visto que não entregou qualquer
quantia ao arguido Horácio Costa.
Esclareceu que apenas procedeu à contabilização do cheque de 12.500.000$00,
datado de 29.12.98, destinado ao pagamento do contrato de publicidade celebrado com
o FCF.
Reconhece que o valor em causa é exagerado para a publicidade, mas a decisão
não passou por si mas apenas pela administração da “Resin”.
Referiu que inicialmente o FCF tinha emitido uma factura de 12.500.000$00
referente a donativo (cfr. fls 427 do apenso 96-A), a qual viria a ser devolvida, pois
tinha de fazer referência ao contrato de publicidade referido. Foi por essa razão que a
mesma foi anulada e emitida nova factura no mesmo valor.

372
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No documento de fls 2133 do 9º volume reconheceu a sua letra no que se refere


aos números ali redigidos.
Não deu qualquer explicação para o facto do FCF ter inicialmente emitido a
factura de 20.000.000$00 referente a donativo, datada de 30.12.98, também anulada e
constante de fls 465 do 2º volume, explicando que recebia dezenas de facturas e
documentos que devolvia, daí que não possa precisar com exactidão o que se terá
passado.
Esclarece que as facturas em causa era remetidas ao seu departamento pelo
correio, sendo certo que primeiro passava pela administração da “Resin”.
Confrontado com o talão de depósito de fls 447 do apenso 96-A (de
7.500.000$00 em numerário, a 30.12.98) revelou igualmente desconhecimento quanto à
proveniência dessa quantia.
Esclareceu que no final de 1997 verificaram que a “Resin”, ao encerrar as suas
contas, perspectivou uma rendibilidade inferior às expectativas, daí que necessitassem
de 20 a 25.000.000$00. Consequentemente, visto que tinham sido efectuados trabalhos
na lixeira de Sendim sem que as facturas estivessem emitidas, emitiram então uma
factura no valor respectivo de 23.806.575$00, de 31.12.98 (cfr. fls 444 do apenso 96-
A), a qual foi contabilizada no exercício de 1998. Porém, tal factura veio a ser devolvida
em finais de 1999 pela CMF, o que não constituiu surpresa pois não estavam reunidas
as condições para que a CMF aceitasse tal factura, apesar de corresponder a trabalhos
efectivamente realizados (cfr. o ofício da CMF a devolver tal factura, constante de fls
445, subscrito pelo arguido Barbieri Cardoso).
Em todo o caso, discorda dos fundamentos invocados na missiva de fls 445 para
essa devolução.
Ora, em face da necessidade da “Resin” realizar aquela quantia monetária no
exercício de 1998, foi-lhe perguntado como explica então a celebração de um contrato
de publicidade no valor de 12.500.000$00 nesse ano (além de um outro para a mesma
época desportiva celebrado no mesmo dia de Agosto desse ano), ao qual não deu
qualquer resposta conclusiva, remetendo a mesma para a administração da “Resin”.
Não pôs em causa o teor do documento de fls 20 e 21 do apenso 12, datado de
01.06.98, em que a “Resin” solicita à CMF o pagamento de trabalhos feitos e não
contratualizados formalmente.
Quanto ao manuscrito a lápis no verso do documento de fls 22 do apenso 12,
referiu desconhecer a respectiva letra e o respectivo conteúdo.

- Arguido Barbieri Cardoso


4. Não tem qualquer conhecimento do historial da dívida da CMF à “Resin”,
segundo declarou após ser confrontado com o documento de fls 22 e 23 do apenso 12.
Revelou ainda desconhecer o teor do documento de fls 1112 do 5º volume
(“valores a serem compensados com o aterro RIB”).
Idêntica posição revelou acerca da alegada entrega de 20.000 cts pela “Resin” ao
FCF e quanto aos manuscritos que referem as expressões “retorno” e “devolução”.
A factura nº 31/12 da “Resin”, explicada pelo arguido Carlos Marinho (cfr. fls
444 do apenso 96-A) passou-lhe pelas mãos. Nessa factura colocou o motivo pelo qual
não poderia ser aceite e assim foi devolvida.
O respectivo ofício de devolução, datado de 08.01.98, foi redigido pelo
depoente. Explicou que entendeu não ter qualquer cabimento a CMF pagar o valor em
causa na medida em que a partir de Abril de 1997 tinha sido transferida para a AMVS a
responsabilidade pelo respectivo pagamento.
Foi a única factura que devolveu à “Resin”.

373
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Admite que possa ter falado desse assunto com a arguida Fátima Felgueiras, mas
não se recorda desse facto.
Recorda-se porém de ter sido questionado acerca desse assunto, numa reunião de
coordenação, pelo Vereador Manuel Faria.

- Arguido Horácio Costa


1. Quando remeteu o documento de fls 199 (relatório mensal a dar conta do
desenvolvimento dos assuntos que lhe foram confiados) já tinha aposta a informação
manuscrita no mesmo, razão pela qual a arguida Fátima Felgueiras apôs o despacho
“TC. Óptimo. 97.06.10”.
Confirmou a veracidade da informação, sendo certo que se limitou a receber o
recado do arguido Vítor Borges e a transmití-lo daquela forma à arguida Fátima
Felgueiras.
Nessa altura ignorava a existência de qualquer relação contratual entre a CMF e
a “Resin”.
Explicou que os seus relatórios mensais eram encadernados pela D. Laura, a
qual fazia duas cópias (uma para o depoente e outra para a arguida Fátima Felgueiras).
Era a D. Leonor quem colocava o relatório na secretária da arguida Fátima Felgueiras,
sendo certo que esse relatório foi-lhe devolvido nos exactos termos que constam dos
autos.
De resto, por vezes os seus relatórios iam para o arquivo e outras vezs eram
devolvidos ao depoente e então arquivava-os num arquivo pessoal que organizou.
Outras vezes ainda os seus relatórios eram remetidos aos serviços camarários. Ora, o
relatório de fls 199 e ss. foi-lhe devolvido, conforme aliás indicação que dele consta.
Juntou o depoente 3 relatórios mensais da sua lavra, respeitantes da Dezembro
de 1996, Janeiro de 1997 e Março de 1997, relatórios esses que lhe foram devolvidos
(viria ainda a juntar uma cópia de um relatório respeitante a Novembro de 1996, que
não lhe foi devolvido – sendo certo que antes de o entregar dele retirou uma cópia - com
o qual pretendeu demonstrar que nessa altura não existiam condições para que pudesse
ocupar qualquer gabinete no Centro Coordenador de Transportes, uma vez que ainda
estava em construção).
Mais esclareceu que o relatório constante de fls 199 e ss. reporta-se a Maio desse
ano de 1997 e não, como por lapso dele consta, a Março de 1997, gralha que facilmente
é perceptível pelo facto de ter elaborado o relatório em causa a 05.06.97 conforme dele
consta.
Afirmou que quando o seu gabinete foi destruído (derrubaram paredes e o
mobiliário desapareceu) tomou conhecimento por terceiros de que a arguida Fátima
Felgueiras por despacho lhe tinha retirado o estatuto de verador em regime de
permanência, tendo-lhe então chegado às mãos uma missiva dela a solicitar-lhe a
devolução das chaves do armário e do gabinete que ocupava. O depoente pediu então a
devolução dos artefactos pessoais que guardava no dito gabinete pelo que, certo dia,
combinou encontrar-se no salão nobre dos paços do concelho com o Sr. José Júlio
Pereira, o qual chamou o Sr. Armindo Brochado e ordenou-lhe que fosse buscar umas
caixas para nelas colocar os pertences do depoente. O Sr. José Júlio Pereira nelas
colocou o que bem entendeu e pediu ao Sr. Armindo que ajudasse o depoente a levar as
caixas para a respectiva viatura. Foi assim que ficou na posse dos documentos referidos
e de outros que fez juntar aos autos.
Esclareceu que conheceu o arguido Vítor Borges em 1996 numa altura em que
foi-lhe apresentado no edifício da CMF pela arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que
nessa altura ele fazia-se acompanhar de uma pessoa que parecia ser estrangeira (o seu

374
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

cunhado, o arguido Bragança da Cunha, é que o apresentou ao pessoal que trabalhava na


CMF e a arguida Fátima Felgueiras é que o apresentava a pessoas exteriores à CMF).
Em Dezembro de 1996 queriam fazer a iluminação de Natal com o patrocínio da
“Resin”. Chegou a telefonar para a “Resin” e a falar com o arguido Vítor Borges mas o
patrocínio não se concretizou.
Foi-lhe dada ordem para se deslocar a Matosinhos para se encontrar com o
arguido Vítor Borges no dia 10.07.97 a fim de que este lhe entregasse um donativo para
a campanha eleitoral, o que fez na sua viatura pessoal.
Recorda-se que depois de ter estacionado a sua viatura e depois de contacto
telefónico foi o próprio arguido Vítor Borges quem foi ter consigo e convidou-o para
almoçar num restaurante, convite que aceitou.
Na conversa que se seguiu ao almoço o arguido Vítor Borges comentou a ida
para Lisboa do arguido Júlio Faria e da sua sucessão na CMF. Foi este arguido quem
pagou o almoço com um cartão.
À saída ele disse-lhe que presumia que o depoente sabia ao que tinha ido e
confirmou-lhe que iria fazer uma entrega de dinheiro.
Deslocaram-se então na viatura do arguido Vítor Borges (um BMW da série 5,
de cor escura, com estofos em pele e muito sujo) à “Resin” e, quando chegaram, ele
pediu-lhe para aguardar. Ele deslocou-se então ao interior das instalações daquela
empresa e voltou com um envelope grande almofadado e fechado, que lhe entregou.
Regressou então a Felgueiras sem abrir o dito envelope. Esclareceu que pela
apalpação lhe pareceu conter notas no seu interior.
Porém, no mesmo dia, ou um ou dois dias depois de o ter entregue à arguida
Fátima Felgueiras (que não abriu o envelope na sua presença), ela devolveu-lhe o
mesmo envelope com 5.000.000$00 mais 1.000.000$00 em notas acondiccionadas com
um elástico. Ordenou então ao depoente e ao arguido Joaquim Freitas para abrirem a
conta no BES com esse dinheiro, o que fizeram.
Esclareceu que foi a única vez que se deslocou às instalações da “Resin” para
recolher um donativo para a campanha eleitoral (haveria de lá voltar com o arguido
Júlio Faria para tentarem obter um donativo para o FCF).
O arguido Vítor Borges forneceu os seus números de telefone quando recebeu o
telefonema a que se faz menção no documento de fls 199 (eram eles os seguintes:
0931569167, 0931810908 e 917810908).
A propósito da recomendação de “reserva” efectuada pelo arguido Júlio Faria no
manuscrito de fls 64 no que respeita ao financiamento da campanha eleitoral que se
avizinhava referiu que se tratava de matéria “sensível”, sendo certo que os candidatos
não tinham de saber em concreto quanto é que cada um contribuía. Nega porém a versão
da arguida Fátima Felgueiras, que sustentou estar completamente alheada da angariação
de fundos.
O documento de fls 3720 do 15º volume (é o mesmo documento que consta de
fls 73 do apenso 139-A), datado de 28.05.97 e cujo assunto se reporta à comemoração
do “Dia do Ambiente” e à publicidade no “Sovela”, na margem esquerda o depoente
escreveu os dizeres que ali constam, sendo certo que a referência a D. Elisabete explica-
se pelo facto dela ser funcionária da “Proeme” ou da “Portcom”, empresas que
pertenciam aos mesmos donos (designadamente o Sr. Renato Guerra) e que eram
responsáveis pela colocação da publicidade no jornal “O Sovela”.
Contactou o arguido Vítor Borges conforme ordenado pela arguida Fátima
Felgueiras e conforme consta desse documento. A alusão ao Sr. Francisco explica-se
porque tal indivíduo era um prestador de serviços para a “Resin” a propósito de
publicidade e foi-lhe indicado pelo arguido Vítor Borges.

375
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Limitou-se a cumprir a ordem que lhe havia sido dada pela arguida Fátima
Felgueiras.
Na sequência do que consta no documento de fls 3720 do 15º volume (ou fls 73
do apenso 139-A), foi efectuada a publicidade da “Resin” na edição de 06.06.97 no
jornal “O Sovela” (cfr. documento de fls 3117 do 15º volume ou fls 68 a 70 do apenso
139-A).

2. Referiu que, ao que pensa, o arguido Carlos Marinho foi-lhe apresentado pelo
arguido Gabriel aquando da entrega da pasta com o dinheiro conforme referido na
pronúncia (o arguido Gabriel, por seu turno, já lhe havia sido apresentado pelo arguido
Vítor Borges). Recorda-se aliás do arguido Vítor Borges lhe ter dito que o arguido
Carlos Marinho ficaria responsável pela área do Vale do Sousa já que estava muito
ocupado noutros negócios em outras áreas do país.
Partiu do pressuposto que o arguido Carlos Marinho já tinha sido apresentado à
arguida Fátima Felgueiras na medida em que em certa ocasião o tinha visto a sair do
gabinete dela.
Sucede que, segundo referiu, a 16 de Julho de 1998 o arguido Carlos Marinho
(que se fazia acompanhar, ao que pensa, pelo arguido Gabriel) fez-lhe a entrega de uma
pasta com o timbre da “Resin” no seu gabinete, a qual era proveniente da empresa
referida e destinava-se à arguida Fátima Felgueiras. Tem a certeza que a pasta foi-lhe
entregue nesse dia pois anotou a data, tal como habitualmente fazia quando algo lhe era
entregue.
Entregou então a dita pasta à destinatária a qual, na sua presença, abriu-a e
verificaram que continha 5.250.000$00, dinheiro essa que ela lhe mandou guardar. Na
pasta vinham também papéis a que não prestou atenção (os documentos referidos na
pronúncia).
A pasta em causa não é senão aquela que foi já exibida na audiência de
julgamento e que ostentava o timbre da “Resin” (pasta essa que o arguido Vítor Borges
reconheceu ser da dita empresa).
Explicou que parte desse dinheiro foi usado na aquisição da viatura “Audi A4”
referida nos autos e 200.000$00 destinou-se à celebração do contrato de seguro
referente à mesma, o qual foi celebrado em Fafe num agente de seguros que o depoente
conhecia (o Sr. Palhares), tendo levado os documentos necessários para o efeito, os
quais mais tarde foram devolvidos à arguida Fátima Felgueiras, ao que pensa por
remessa para a sua residência, situada no “Edifício Águia”. Recorda-se que não se
aproveitou o seguro da viatura “Citroën BX” de que ela era proprietária.
Ainda a esse propósito, quando se começou a falar na aquisição de uma viatura
nova para a arguida Fátima Felgueiras o depoente expressou-lhe que a conta do BES
não estava aprovisionada com os fundos necessários para o efeito, ao que ela lhe
respondeu que o dinheiro haveria de aparecer.
Foi com ela no início do ano de 1998 a uma exposição automóvel que decorreu
na “Exponor” (acompanhava-os o filho dela e o arguido Joaquim Freitas), tendo na
altura ficado indecisa entre um “Volvo” e um “Audi A4”, tendo optado mais tarde por
esta última viatura por influência da filha.
Consequentemente, escolhida a viatura bem como a respectiva cor e os estofos,
ela ordenou-lhe que diligenciasse pela aquisição da referida viatura nova, o que fez em
Junho de 1998, mediante a obtenção de vários orçamentos (num stand em Guimarães,
onde foi recebido pelo Sr. Paulo Todo Bom e que pelo telefone lhe deu o respectivo
orçamento, tendo-lhe aliás querido impingir uma viatura já usada; contactou a
“Machado e Costas, SA” que o remeteu para a VW de Guimarães a fim de entrar em

376
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

contacto com o Sr. Carlos Santos, o que fez, tendo então telefonado à arguida Fátima
dando-lhe conta de que já tinham arranjado a viatura).
Ela, o depoente e o arguido Joaquim Freitas deslocaram-se então ao stand para
recolher a viatura (algures entre Junho ou Julho de 1998, sendo certo que entre a
encomenda da viatura e a respectiva entrega demorou cerca de um mês) e ela mostrou-
se desagradada com o facto de ter sido pintada na carroçaria, na traseira, o nome do
stand, tendo então o arguido Joaquim Freitas chamado um funcionário para remover da
pintura a alusão a “M. Costa, SA”.
Por volta da hora do almoço chegaram à CMF nessa viatura e o depoente
estacionou-a.
Explicou que a arguida Fátima Felgueiras exigiu que o dinheiro usado para a
aquisição da viatura passasse pela conta pessoal do arguido Joaquim Freitas, segundo
este lhe contou. Como este se recusou a tal colocou-se a hipótese de levar o dinheiro em
numerário, hipótese que foi posta de parte pois seria um comportamento desadequado
que poderia causar estranheza. Entretanto, durante um jantar em que estavam presentes
a arguida Fátima Felgueiras, o filho desta e o arguido Joaquim Freitas, aquela disse ao
depoente que o dinheiro deveria passar pela sua conta pessoal. Não obstante não ter
ficado agradado com tal situação teve de ceder. Consequentemente, retiraram
4.700.000$00 da pasta e procederam ao respectivo depósito na sua conta pessoal no dia
28.07.98 juntamente com um depósito de 50.000$00 (esses 50 cts reportavam-se a uma
prenda de aniversário que o seu sogro lhe tinha dado, já que faz anos no dia 27.07.). No
dia seguinte os 4.700 cts saíram da sua conta. Foi com esse dinheiro mais 1.000.000$00
depositados na conta do BES que a viatura foi adquirida (custou 5.700.000$00) – cfr. os
cheques de fls 77 do 1º volume (de 1.000 cts e de 4700 cts, datados de 29.07.98); o talão
de depósito de fls 79, a 28.07.98, de 4750 cts + 50 cts no “Banco Mello” (na sua conta
pessoal); fls 80 e ss., referente à proposta de seguro com os dados da arguida Fátima,
onde se verifica que a proposta foi aprovada a 29.07.98, tendo sido emitida a 11.08.98 a
respectiva apólice de seguro, com o nº 4598431-80, sendo certo que o “Audi A4” foi
matriculado a 29.07.98; fls 32 e ss, do apenso I, referente ao extracto da conta do BES
(onde é perceptível o movimento a débito de 1.000 cts a 31.07.98 referente ao cheque nº
59214457, de 29.07.98, cuja cópia consta de fls 77 do 1º volume).
Assegurou que nunca lhe passou pela cabeça que se poderia tratar de “lavagem
de dinheiro”.
O manuscrito de fls 159 encontrava-se também na dita pasta, sendo certo que a
nota a azul (ao fundo do documento), ao que presume, terá sido feita pelo arguido
Carlos Marinho (a dar conta que entregou ao depoente os ditos 5.250 cts); em todo o
caso não o viu a redigir essa nota.
Também o documento de fls 158 se encontrava na pasta referida (ordem de
pagamento da CMF à firma “Norlabor”), sendo certo que desconhecia em absoluto a
existência da firma referida.
Da mesma forma os documentos de fls 160 e 161 encontravam-se
acondicionados no interior da pasta a que se vem fazendo referência.
Explicou que por alturas das festividades (mormente pelo Natal) era costume a
arguida Fátima Felgueiras receber muitos presentes.
Salientou que documentos que tinha na sua posse só lhe suscitaram suspeitas da
prática de crime desde o momento em que surgiram notícias na comunicação social e
desde o momento em que sofreu pressões e das inquirições a que foi sujeito no âmbito
do inquérito a que respeitam estes autos.
Como surgiam também notícias que reputou de infundadas dando conta da sua
responsabilidade e da responsabilidade criminal do arguido Joaquim Freitas decidiram

377
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

proceder à entrega dos documentos que tinham na sua posse à PJ (cfr. fls 63 e ss. e
ainda a respectiva contestação à acção de prestação de contas que lhes foi movida pelo
PS, cuja cópia consta de fls 2897 e ss.). Explicou aliás que chegaram a guardar os
documentos num cofre do “Banco Mello” ao qual só tinham acesso com duas chaves
(cada uma delas ficou em poder respectivamente do depoente e do arguido Joaquim
Freitas), de sorte que só na presença dos dois é que podiam abrir o dito cofre.
Procederam desse modo porque sentiu que não podia guardar os documentos em sua
casa em condições de segurança (cfr. o extracto bancário da conta do “Banco Mello” de
fls 14738, onde se faz referência à caução paga pelo cofre – 13.200$00 -, e à respectiva
anuidade de 4.900$00).

3. Em Outubro ou Novembro (inclina-se mais para esta última hipótese) foi


procurado no seu gabinete pelo arguido Gabriel, o qual lhe fez a entrega de uma pasta
dirigida à arguida Fátima Felgueiras, a qual lhe ordenou que a guardasse.
Trata-se da pasta que foi já exibida em julgamento e que não continha qualquer
logotipo (o arguido Vítor Borges confirmou que a “Resin” usava aquele tipo de pasta,
não confirmando porém que aquela pasta apreendida tenha sido usada pela empresa
referida).
Posteriormente a arguida Fátima Felgueiras abriu-a na sua presença e constatou
que ela continha a quantia de 5.381.653$00 em numerário, um cartão dirigido à arguida
Fátima (cfr. fls 164 do 1º volume), fotocópia de um cheque (cfr. fls 162 do 1º volume,
documento que não soube explicar) e o manuscrito de fls 163 (referiu desconhecer a que
se reporta o seu conteúdo).
Esclareceu que nada colocou na dita pasta e que o entregou à arguida Fátima tal
como a tinha recebido. Também a arguida Fátima nele nada colocou.

Logo em Novembro desse ano a arguida Fátima Felgueiras instruiu-o no sentido


de fazer os seguintes pagamentos:
- 1.850.000$00 ao arguido Júlio Faria (o depósito foi efectuado a 23.11.98, cfr.
fls 167 do 1º volume). Na altura a arguida Fátima Felgueiras não lhe explicou a razão
do depósito na conta do arguido Júlio Faria.
- 1.550.000$00 para pagar 1.550 bilhetes de um sorteio realizado pelo FCF
(apreendidos nos autos), à razão de 1.000$00 cada um, os quais vinham acondicionados
dentro de um saco dos produtos “Wella”, onde também estava um envelope da
Assembleia da República meio rasgado e o post-it de fls 84 do 1º volume (da autoria do
arguido Júlio Faria). Não chegou a contar os bilhetes nem as cadernetas de bilhete. A
este propósito foi-lhe dito que existia um sorteio de um automóvel e que os
responsáveis do FCF (entre as quais a arguida Fátima) ficaram com bilhetes que tinham
de vender para angariar fundos para o clube. O depoente pagou assim esses 1.550
bilhetes e guardou-os conforme instruções recebidas da arguida Fátima Felgueiras.
Disso foi dado conhecimento ao arguido Joaquim Freitas. Esclareceu que entregou o
dinheiro em mão à arguida Fátima, a qual lhe deu aquele destino.
Salientou ser totalmente alheio a qualquer “esquema” ilícito que estivesse por
detrás da entrega daquela quantia monetária e pensou tratar-se de donativo concedido
pela “Resin”. Só desconfiou que assim não poderia ser durante o inquérito a que se
reportam estes autos, em face das inquirições a que foi sujeito, das várias idas à PJ (nem
todas documentadas pois nem todas deram origem a autos de inquirição) e das notícias
que entretanto saíam nos jornais. De resto, se tivesse qualquer implicação no dito
“esquema” não teria entregue à PJ os documentos referidos. Aliás, enquanto vereador,
suspeitando de que as entregas em dinheiro pela “Resin” não se tratavam de meros

378
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

donativos, propôs a retirada de competências delegadas pela Assembleia Municipal à


arguida Fátima na área financeira (cfr. fls 5809 do 23º volume).
Na sua caixa de correio “choveram” então documentos alegadamente
comprometedores e que fez chegar à PJ.
Sofreu inclusive muitas pressões para se calar. De facto, a 05.02.2000 foi
chamado à Federação Distrital do Porto do PS (o respectivo presidente era o Narciso
Miranda) para fornecer explicações, mas queriam que se calasse. Nessa altura o
Guilherme Pinto era também dirigente distrital do PS (hoje é presidente da C.M. de
Matosinhos) e pediu-lhe a pasta com os documentos para os analisar. Como estavam
junto ao mar, apenas os exibiu com receio que ele os lançasse ao mar. Também o Dr.
Barros Moura (já falecido) e o Renato Sampaio (este ligado à Federação Distrital do
Porto do PS) prometeram-lhe um emprego para se calar. Foi processado 15 vezes em
face das suas revelações e a 16.05.2000 chegou a pedir uma audiência ao então Ministro
Jorge Coelho, que coordenava o PS em termos autárquicos (pedido efectuado por fax),
nunca tendo obtido resposta (cfr. fls 5819 do 23º volume ou fls 1186 do 6º volume).
Mandou ainda cartas às várias comissões do PS (cfr. fls 1189, 1190 e 5821 e ss.).
Relatou ainda que em Março ou Abril de 2000 o arguido Gabriel Almeida pediu
para se encontrar consigo e com o arguido Joaquim Freitas num restaurante em Santa
Quitéria, tendo-os pressionado a não colaborar com a PJ, alegando que em face do que
era noticiado o seu novo relacionamento estaria a ser posto em causa, numa altura em
que estava a tentar reconstruir a sua vida depois de falhado o seu casamento.
Nesse encontro ele chegou a telefonar a alguém que estaria em Espanha e que
pertencia aos quadros de uma empresa francesa, segundo depreendeu.
Chegou ainda a propor-lhe contrapatidas financeiras para se calar mas o
depoente não deixou que a conversa tomasse esse rumo, ficando esse assunto por ali.
Recorda-se inclusive que ele teve de ir à casa de banho por se ter sentido mal, tendo-o
depois acompanhado à sua viatura.
Cerca de um mês depois ele pediu um novo contacto (no início do Verão do ano
2000) em Lousada. Ali se encontraram, entre as 23h e a meia-noite, mas com receio de
que algo lhes acontecesse, levou consigo o seu irmão (Orlando Costa), o qual
inicialmente se escondeu a alguns metros de distância do local onde se realizou esse
encontro (num café no centro de Lousada). Transmitiu-lhes então o arguido Gabriel
Almeida que o decurso desse encontro dependia de uma reunião que estava a ter lugar
entre os arguidos Fátima Felgueiras e Vítor Borges nas instalações da CMF. Passearam
então um pouco pelas ruas de Lousada e ele voltou-lhes a pedir silêncio, revelando-lhes
então que o arguido Vítor Borges procurava “amansar” a arguida Fátima Felgueiras para
que na comunicação social parasse de atacar o depoente e o arguido Joaquim Freitas.
Entretanto ele transmitiu-lhes que o arguido Vítor Borges não conseguira os seus
intentos, tendo o arguido Gabriel Almeida repetido os mesmos argumentos que já antes
tinha exposto, de natureza pessoal, para que o depoente e o arguido Joaquim Freitas se
calassem.

4. Em Agosto de 1998, tinha o depoente acabado de regressar de férias, quando


a arguida Fátima Felgueiras deu-lhe nota de que deveria ir com o arguido Júlio Faria à
“Resin” a Matosinhos. Como não lhe explicou de que assunto se tratava depreendeu que
se tratava de um assunto pessoal do arguido Júlio Faria.
Acompanhou-o então até à sede da “Resin” em Matosinhos, algures na primeira
ou segunda semana de Setembro de 1998 (desmentindo nessa parte o que a propósito foi
referido pelos arguidos Vítor Borges e Júlio Faria, isto é, de que se deslocaram ali em
finais de 1997).

379
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que o arguido Júlio Faria deslocou-se a Matosinhos de Lisboa (pois era
deputado na Assembleia da República, sendo certo que o depoente tem a ideia de que
ainda decorriam as férias parlamentares), tendo sido combinado entre ambos que se
encontrariam em Matosinhos. Chovia torrenciamente e aguardou por ele cerca de duas
horas num café próximo da sede da “Resin”.
Como ele o não contactava via telemóvel telefonou-lhe, tendo-lhe então
transmitido que já se encontrava na sede da “Resin” e pediu-lhe para se deslocar para lá,
o que fez.
Uma vez ali chegado subiu umas escadas e dirigiu-se à recepção onde perguntou
pelo arguido Vítor Borges. Após lhe ter sido fornecida a informação pedida subiu outro
lanço de escadas e penetrou num gabinete (não sabe a quem pertencia), onde estavam à
conversa os arguidos Vítor Borges, Gabriel Almeida e Júlio Faria, de sorte que não
assistiu à maior parte do que entre ambos foi dito. Ouviu então o arguido Vítor Borges
dirigir-se ao arguido Gabriel pedindo-lhe que fosse buscar “aquilo” para o Júlio Faria, o
que este fez (uma vez cá fora o arguido Júlio Faria confidenciou-lhe que se tratava de
2.000.000$00 em numerário). O arguido Vítor Borges transmitiu ainda ao arguido Júlio
Faria que num futuro próximo iriam ver o que poderiam fazer (o arguido Júlio Faria
disse-lhe que se tinha deslocado à “Resin” para pedir um donativo avultado uma vez
que o FCF atravassava por grandes problemas financeiros). Despediram-se e
regressaram a Felgueiras.
Deu conta do que se passou à arguida Fátima Felgueiras e nunca mais esse
assunto veio à baila com o arguido Júlio Faria, à excepção de uma carta dele dirigida a
si (e que recolheu no GAPP), a qual faz referência a esse assunto, datada de 06.11.98
(cfr. fls 170). Era perceptível, não só pelo depoente mas por outras pessoas, que existia
mau estar entre os arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras por causa do futebol (a
arguida Fátima chegou a participar num peditório para o FCF juntamente com alguns
dos seus dirigentes, como por exemplo os Srs Fernando Lima e Álvaro Costa).
Deu-a a ler à arguida Fátima Felgueiras e ela disse-lhe para “deixar correr”.
A propósito da versão apresentada pelo arguido Júlio Faria acerca da forma
como foi abordado para ir consigo a Matosinhos, explicou que foi uma única vez ao
estádio Dr. Machado Matos a propósito de uma iniciativa que envolvia as escolas do
concelho.
Só alguns vereadores e o presidente da Assembleia Municipal é que recebiam
convites do FCF para o camarote presidencial. O depoente nunca recebeu tal convite.
Nunca viu aliás com bons olhos o relacionamento existente entre o FCF e a
CMF.
Algures em Novembro de 1998 recorda-se de estar a sair com o arguido Joaquim
Freitas de um restaurante quando um empresário (dirigente do FCF) interpelou o
Joaquim Freitas e perguntou-lhe se já tinha vindo a “massa” da “Resin” para o FCF.
Sucede que cerca de um mês depois, nos últimos dias de Dezembro de 1998
(30.12.98) o arguido Carlos Marinho (não se recorda se acompanhado do arguido
Gabriel Almeida) dirigiu-se ao seu gabinete na CMF e entregou-lhe dois envelopes, um
com um cheque e outro com dinheiro em numerário e transmitiu-lhe que se destinava ao
FCF.
Pouco depois foi ao gabinete da arguida Fátima Felgueiras e deu-lhe conta do
sucedido, ao que ela lhe perguntou se era para o FCF, tendo-lhe respondido
afirmativamente. Instruiu-o então no sentido de guardar os envelopes e informou-o que
iria contactar alguém para os ir buscar.
Cerca de 1 ou 2 horas depois apareceram no seu gabinete o Dr. Barata Feio e o
Sr. Figueiredo os quais lhe transmitiram que vinham buscar o dinheiro destinado ao

380
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

FCF. Na altura o depoente não os conhecia. Entregou-lhes então os envelopes e o Dr.


Barata Feio abriu-os na sua presença, pelo que o depoente verificou que num deles
continha um cheque (não sabe precisar o montante) e que no outro estava contido
dinheiro em numerário, o qual foi contado pelo Dr. Barata Feio (o depoente ignora
porém qual é o montante, pese embora tivesse ficado com a ideia que o valor titulado
pelo cheque era superior, sendo certo que o valor global prefazia 20.000.000$00).
Transmitiram-lhe então que iriam depositar os montantes em causa – 20.000 cts, ao que
lhe disseram - na CCAM, tendo saído apressados.
Entretanto deu conta do que se passou à arguida Fátima Felgueiras.
Na altura não relacionou a entrega desses envelopes com a reunião ocorrida em
Matosinhos em Setembro de 1998 nas instalações da “Resin”.
Relacionou porém a entrega desses envolopes com o manuscrito de fls 170.
Ignora o teor dos contratos de publicidade eventualmente celebrados entre a
“Resin” e o FCF, sendo certo que não se recorda de na altura alguém os ter mencionado.
Foi confrontado com o teor do cheque de fls 218 do 1º volume, no montante de
12.500.000$00, admitindo poder tratar-se do cheque contido num dos envelopes (não
tem a certeza desse facto na medida em que na altura não viu o montante titulado pelo
mesmo).
Em todo o caso, se os 12.500 cts se referissem a um contrato de publicidade cujo
pagamento estaria já previsto para o final do ano, o manuscrito de fls 170 não faria
qualquer sentido.
Recorda-se aliás de ter ouvido dizer que primeiro “veio o dinheiro e depois a
justificação”.
Numa reunião de Câmara, a testemunha Manuel Faria questionou o arguido
Barbieri Cardoso a propósito de uma factura da “Resin” de vinte e tal mil contos, a qual
não tinha sido visada pelo Departamento Técnico, ao que este respondeu que não visava
facturas correspondentes a serviços não prestados.
Reconheceu no documento de fls 464 a assinatura do arguido Júlio Faria (trata-
se de uma carta que acompanhou a factura/recibo nº 1583 de 20.000 cts dirigida pelo
FCF à “Resin” e onde se agradece a comparticipação monetária; cfr. ainda o documento
de fls 465).
Confrontado com o documento de fls 457 e ss (respeitante à intervenção de um
deputado municipal do PSD na Assembleia Municipal) referiu nunca o ter visto.
Salientou aliás que os documentos alusivos a esta matéria foram entregues por
esse deputado e não pelo depoente.
Confrontado com o teor do documento de fls 109 do apenso 14 (acordo entre a
CCAM e o FCF), celebrado a 15.09.98 (de resto, é dessa data o reconhecimento das
assinaturas), referiu nunca o ter visto.
A fls 113 desse apenso 14º consta a declaração de quitação de 100.000.000$00
(a 15.09.98), sendo certo que, segundo o clausulado, deveria ser paga uma prestação de
50.000.000$00 até 30.09.98 (segundo já referido, 30.000 cts tinham sido já fornecidos
pela “Zima”, faltando pois 20.000 cts).
A fls 92 do apenso 14º consta a missiva da CCAM dirigida ao FCF, datada de
16.10.98, a exigir o pagamento do remanescente (20.000 cts)
Em resposta o FCF dirige à CCAM a missiva de fls 92, a 04.12.98, dando conta
que até ao final do ano iriam liquidar os 20.000 cts em falta, além dos respectivos
encargos, carta essa assinada pelo arguido Júlio Faria. Na óptica do depoente estes
documentos provam que foi com o arguido Júlio Faria à “Resin” em Setembro de 1998
e não na altura que por ele e pelo arguido Vítor Borges foi referida (de resto, não faria
sentido terem ido lá em 1997 quando o acordo celebrado entre o FCF e a CCAM data de

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

15.09.98, além de que, a ter sido celebrado um contrato de publicidade que já previa o
pagamento de 12.500 cts pela “Resin” no final do ano, não faria sentido o manuscrito de
fls 170. Não tem igualmente logica a celebração de dois contratos de publicidade no
mesmo dia e para a mesma época desportiva).
O depoente não tem memória de outra empresa que não a “Resin” ter entregue
quantias monetárias em circunstâncias semelhantes, não encontrando para esse facto
qualquer explicação.
A arguida Fátima Felgueiras nomeou-o seu representante na Assembleia Geral
da AMVS, em 1999, nos quais participaram os arguidos Vítor Borges e Gabriel
Almeida; nessa assembleia foi debatido o aterro da Lustosa (eram reclamações que
estavam em cima da mesa).
Em reunião de Câmara foi-lhe retirada essa representação e passou a ser o
verador Manuel Faria (principal opositor da arguida Fátima) quem assumiu esse papel,
justificando-se essa nomeação com o facto de estar distanciado dos contactos com as
pessoas da “Resin”.
A propósito do “Dia Mundial do Ambiente”, para além do manuscrio referido a
este propósito, não teve qualquer outra intervenção (limitou-se a proceder conforme
instruções que tinha).
Fez também contactos para a celebração de eventuais contratos de publicidade
entre o FCF e outras entidades, nomeadamente empresas, a pedido do arguido Júlio
Faria.

- Arguido Joaquim Freitas


1. Na parte manuscrita do documento de fls 199 do 1º volume reconheceu a letra
do arguido Horácio Costa. Reconheceu ainda a letra da arguida Fátima no despacho ali
exarado (“TC. Óptimo.”).
O arguido Horácio Costa disse-lhe que a arguida Fátima Felgueiras lhe tinha
entregue 1.000.000$00 (dinheiro que juntamente com os 5.000.000$00 entregues pela
“Resin” serviram para abrir a conta do BES com 6.000.000$00).
Ignora qual é a proveniência dos mencionados 1.000.000$00.
Esclareceu que para a emissão de cheques da conta do BES eram necessárias as
assinaturas dos titulares da conta em causa (a sua assinatura e a assinatura do arguido
Horácio). Antes de assinar os cheques respectivos o arguido Horácio Costa explicava-
lhe a razão de ser dos pagamentos.

2. Quanto ao recebimento em causa referiu que certo dia (que não especificou),
no edifício da CMF, entrou no gabinete do arguido Horácio Costa sem bater à porta e
deparou-se com os arguidos Gabriel Almeida e Carlos Marinho à conversa com o
arguido Horácio Costa. Pediu desculpa e saíu. Aguardou então que aqueles saíssem,
tendo então questionado o arguido Horácio acerca da visita daqueles sujeitos, tendo-lhe
então explicado que tinham entregue um donativo acondicionado numa pasta, a qual na
altura viu e tinha aposto o nome da “Resin”. Tal pasta (igual à que lhe foi exibida e que
se encontra apreendida) foi guardada pelo arguido Horácio num armário. Não
inspeccionou o conteúdo dessa pasta, mas sabe que continha de 5.000 e tal contos (pelo
que lhe disse o arguido Horácio) e que tal dinheiro serviu para comprar o Audi A4
referido nos autos conforme melhor explicitará mais à frente. Nessa altura o arguido
Horácio não lhe referiu que no interior dessa pasta estavam acondicionados os
documentos referidos na pronúncia. Entretanto, tendo feito um esforço de memória,
admitiu que já não se recorda se os factos ocorreram conforme descreveu inicialmente
quando encontrou os arguidos Gabriel e Carlos Marinho no gabinete do arguido

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Horácio ou se afinal estava com o arguido Horácio no gabinete deste quando surgiram
os arguidos Gabriel e Carlos Marinho e saíu para que pudessem conversar à vontade,
tendo depois questionado o arguido Horácio Costa nos termos referidos quando aqueles
funcionarios da “Resin” saíram.
Ignora porque razão a “Resin” entregou aquele donativo.
Na sequência do que lhe revelara a testemunha Manuel Faria num almoço de
trabalho que ocorreu cerca de 1 mês antes do telefonema para a PJ (testemunha com
quem mantém relações comerciais) – isto é da suspeita da existência de um “saco azul”
que se destinou a financiar a campanha eleitoral de 1997, o “Sovela” e o FCF –
vasculhou com o arguido Horácio Costa no gabinete deste os documentos que tinham na
sua posse e que poderiam indiciar a prática de um crime. Na sequência dessa recolha de
documentos remeteu à PJ a missiva de fls 63, datada de 28.03.2000, onde remeteu
igualmente vários documentos, entre os quais cópia de um cheque titulando o montante
de 6.633.634$00, emitido a favor da “Norlabor” (cfr. fls 66). Segundo lhe disse o
Horácio Costa, foi a arguida Fátima quem lhe ordenou que guardasse no seu arquivo
esses documentos.
Tais documentos estavam todos acondicionados numa pasta da “Resin”, a qual
continha o dinheiro acima referido (cinco mil e tal contos) - seria a pasta apreendida e
que lhe foi exibida -, segundo lhe disse o arguido Horácio quando o questionou acerca
da existência do dito “saco azul”.
Quanto ao documento de fls 67 (igual ao de fls 159) esclareceu que só o viu
quando verificou com o arguido Horácio os documentos que tinham na sua posse cerca
de 2 ou 3 dias antes de ligarem à PJ. Não sabe explicar o teor desse documento,
designadamente qual o concreto significado da expressão “retornos”.
Não conhece a firma “Norlabor”.
Nessa altura o depoente era apenas membro da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
A “Resin” prestava serviços na área dos lixos à CMF, tendo sido a primeira
empresa a trabalhar com a CMF nessa área.
Ignora se a “Resin” prestava esses serviços por intermédio de outra empresa
(designadamente por subempreitada).

3. Soube pelo arguido Horácio Costa – no próprio dia ou no dia seguinte, ao que
pensa em 1998 (mas sem ter a certeza) - que a “Resin”, por intermédio do arguido
Gabriel Almeida, entregou-lhe mais um donativo, em montante que ignora, e que vinha
acondicionado numa pasta sem o logotipo dessa empresa.
Não se recorda se o donativo foi entregue em numerário ou em cheque, mas tem
a ideia de que foi em numerário na medida que, segundo se recorda, todos os donativos
da “Resin” foram entregues em numerário (à excepção de um donativo para FCF no
montante de 12.500.000$00).
Ainda segundo o que lhe foi dito pelo arguido Horácio, com esse diheiro foi
ainda entregue o cartão de fls 164 do 1º volume. O documento em causa foi rubricado
pelo depoente e pelo Horácio Costa, pois tinham o costume de rubricar todos os
documentos que recebiam, quer em termos de entrada quer em termos de saída de
dinheiro (isto é, rubricavam os respectivos documentos de suporte), para assim evitar
suspeitas de aproveitamento pessoal e para poderem prestar as respectivas contas.
Não sabe explicar o que está manuscrito nesse cartão.
Já o documento de fls 162 não está rubricado nem pelo depoente nem pelo
arguido Horácio na medida em que nada tinha a ver com a recolha de fundos ou com

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

algum pagamento com os dinheiros angariados, quer existentes na caixa quer


depositados na conta do BES.
Também não sabe explicar o teor desse documento e não sabe ainda como o
mesmo chegou às mãos do arguido Horácio.
Esclarece aliás que chegou a ver a dita pasta mas não a abriu para inspeccionar o
seu conteúdo.
Pelas mesmas razões que já expôs o documento de fls 163 não foi rubricado nem
pelo depoente nem pelo arguido Horácio Costa. Ignora se se encontrava ou não
acondicionado na pasta referida.
Salientou que inexistiam outras entidades, para além da “Resin”, que tenham
doado para a conta do BES montantes em numerário de semelhante ordem de grandeza,
sendo certo que normalmente em numerário recebiam até 250.000$00 (500.000$00 no
máximo), sem qualquer documento a acompanhar.
Confrontado a propósito com os movimentos nºs 61, 96 e 97 da conta do BES
(depósitos em numerário das quantias de 2.500 cts, 5.000 cts e 2.000 cts,
respectivamente – cfr. fls 100, 123 e 124 do apenso 1, ou fls 2790 dos autos), justificou-
os com o facto de procederem a esses depósitos sempre que a caixa reunia muito
dinheiro e de modo a não ficar tanto dinheiro em caixa.
Ignora em concreto qual o destino dado ao dinheiro em causa, mas os donativos
serviram para pagar as despesas da campanha referente às eleições autárquicas de 1997,
para pagar despesas do arguido Julio Faria (por ex. despesas que ele custeou com um
cartão de crédito a propósito de um almoço na Lixa, o qual foi realizado no âmbito de
uma iniciativa partidária - Congresso Nacional do PS -, tendo sido a arguida Fátima
quem ordenou o respectivo reembolso ao arguido Júlio – cfr. doc. de fls 199 do apenso
1, o qual se reporta a um cheque assinado pelo depoente e pelo arguido Horácio, no
montante de 57.090$00 e datado de 15.02.99; cheque de fls 197 do apenso 1, o qual se
reporta a um cheque assinado pelo depoente e pelo arguido Horácio, emitido a favor do
arguido Júlio Faria, no montante de 170.000$00 e datado de 28.01.99, tendo sido
depositado no mesmo dia conforme documento de fls 73 do 1º volume, não se
recordando em concreto a razão de ser da emissão desse cheque da conta do BES, sendo
certo que o mesmo foi emitido por ordem da arguida Fátima Felgueiras; cheque cuja
cópia se acha a fls 120 do apenso 1, emitido a favor do arguido Júlio, no montante de
200.000$00 e datado de 02.12.97, cheque esse que foi endossado pelo arguido Júlio ao
seu filho, não se recordando porém da razão de ser da emissão desse cheque da conta do
BES; e, a 23.11.98, depósito de 1.850.000$00 na conta do arguido Júlio em numerário -
na medida em que havia dinheiro suficiente na gaveta, conforme doc. de fls 76 do 1º
volume, não se recordando da razão de ser desse depósito); despesas relacionadas com a
campanha para o Referendo da Regionalização (cfr. o cheque de 200.000$00 datado de
08.09.98 emitido para pagamento de placards fornecidos pela firma do Sr. Renato
Guerra – ao que pensa no âmbito da campanha para o Referendo da Regionalização -,
segundo indicação manuscrita na fotocópia do cheque, aposta ao que pensa pelo arguido
Horácio – cfr. doc. de fls 205 do apenso 4; e cheque sacado sobre a conta do BES e
datado de 30.11.98 e que serviu para pagar o serviço de insonorização na campanha
respeitante ao Referendo da Regionalização, segundo indicação manuscrita na fotocópia
desse cheque, ao que pensa aposta pelo arguido Horácio – cfr. doc. de fls 213 do apenso
4); despesas relacionadas com as eleições europeias (cfr. o cheque cuja cópia se acha a
fls 218 do apenso 4, o qual se reporta ao pagamento de uma instalação sonora na
campanha para as eleições europeias) e para pagamento de despesas do PS local, como
por exemplo de água e telefone (o documento de fls 173 do 1º volume reporta-se a um
orçamento de 30.07.97 referente à instalação do ar condicionado no espaço que

384
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

funcionava como sede do PS de Felgueiras – o qual nunca foi posto em nome do partido
porque assim não quis a arguida Fátima - e foi pago segundo indicação manuscrita
aposta pelo arguido Horácio nesse documento, indicando ainda o cheque que serviu de
meio de pagamento no valor de 776.000$00 – cfr. doc. de fls 56 do apenso 1, datado de
08.08.97 -, já que se obteve um desconto num orçamento de 800.000$00).
A conta do BES serviu ainda para pagar bilhetes de um sorteio realizado pelo
FCF em 1997 ou 1998 (são aqueles que se encontram apreendidos nos autos e que
foram exibidos na audiência de julgamento), de que o documento de fls 84 é um
exemplo.
Confrontado com o manuscrito que acompanha esses bilhtes referiu ignorar a
quem pertence a respectiva letra.
Foi a arguida Fátima quem entregou ao arguido Horácio 1.550 bilhtes e pediu
para os “desenrascar”, segundo este lhe disse. Foi o arguido Horácio quem entregou o
dinheiro referente a esses bilhetes (a 1.000$00 cada um), não sabendo se o fez
directamente a ele (Júlio Faria) ou por entreposta pessoa.
Esclareceu que o arguido Horácio apenas lhe mostrava todos os documentos
relacionados com a conta do BES e com a caixa, sendo certo que quer uma quer outra
foram movimentadas também depois da campanha eleitoral, designadamente para pagar
despesas relacionadas com o “Sovela”, com as campanhas para o Referendo da
Regionalização e Legislativas e ainda para proceder a outros pagamentos, alguns dos
quais já referiu.
O arguido Júlio Faria tinha perfeito conhecimento dos movimentos da conta do
BES.
Depois de referir não se recordar de nenhuma ordem de pagamento dada pelo
arguido Júlio Faria foi confrontado com o documento de fls 171 do 1º volume e
explicou que se trata de um “post-it” amarelo escrito pelo arguido Júlio Faria (cuja letra
reconhece) e entregue ao arguido Horácio, reportando-se a uma ordem dada pelo
arguido Júlio no sentido de se proceder ao pagamento de 800.000$00 ao Sr. Orlando
Costa (o qual forneceu pendões e bandeiras para a campanha eleitoral de 97), tendo sido
por isso emitido o cheque cuja cópia se acha a fls 137 do apenso 1, emitido ao portador
a 09.12.97.
Sinal de que eram minuciosos em todas as despesas que pagavam deu como
exemplos os documentos de fls 226 do apenso 4 (manuscrito que se reporta à compra de
selos) e de fls 286 do apenso 4 (manuscrito alusivo a várias compras sem recibo
justificativo).
Recorda-se de que houve um donativo da “Resin” em que chegaram a entregar
centavos (em moedas), sendo certo que a “Resin” só efectuou um donativo em cheque
para o FCF no montante de 12.500.000$00, conforme já referido.
Confrontado com o documento de fls 289 do apenso 4 referiu tratar-se de um
manuscrito com referência a saídas em numerário. Tal documento está rubricado pelo
depoente e pelo arguido Horácio (pelas razões que já acima explicou) e relaciona-se
com a aquisição do “Audi A4” referido nos autos (4.700 cts referentes à aquisição da
viatura + 200 cts referentes ao seguro) e com a aquisição dos 1.550 bilhetes acima
referidos.
Referiu que esses pagamentos devem ter sido feitos com a terceira entrega por
parte da “Resin” pois antes disso tinham pouco dinheiro em gaveta e na conta do BES
(em Dezembro tinham um saldo que não chegou aos 800.000$00, conforme emerge do
respectivo extracto bancário constante do apenso 1, fls 42 a 44) e só a “Resin” fazia
donativos na ordem dos 5.000 cts.

385
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

4. Ao que pensa no final do ano de 1998 (pouco tempo depois o arguido Horácio
haveria de assumir as funções de vereador na CMF), encontrou o Dr. Barata Feio e o Sr.
Figueiredo (os quais faziam a contabilidade do FCF) nas instalações da CMF e
perguntou ao arguido Horácio o que tinham ido lá fazer, ao que este lhe respondeu que
tinham ido buscar 20.000.000$00 que tinham sido doados pela “Resin” e que esse
donativo tinha sido conseguido através da arguida Fátima Felgueiras (cerca de 1 mês
antes, num jantar num restaurante em Santa Quitéria, esta tinha dito ao depoente que se
ia afastar do futebol. O Dr. Sousa Oliveira tinha aliás pedido ao depoente e ao arguido
Horácio para tentarem convencê-la a deixar o futebol).
Ignora se entre o FCF e a “Resin” foi ou não celebrado algum contrato de
publicidade.
Entre os documentos que foram remetidos às PJ com a missiva de fls 63 do 1º
volume encontra-se o documento de fls 88, o qual se trata de uma missiva do arguido
Júlio Faria dirigida ao arguido Horácio Costa alusivo à dívida do FCF à CCAM e ao
facto de faltar liquidar a quantia de 20.000.000$00 relativa a uma das prestações
acordadas entre aquelas duas instituições.
Recorda-se aliás que, antes da entrega desses 20.000 cts, estando o depoente
num restaurante acompanhado do arguido Horácio, ouviu da boca de um dos donos da
“Irmalex” que iria haver um grande donativo para o FCF por parte da “Resin”. Esse
indivíduo dirigiu-se-lhe antes de mais para saber se essa entrega já tinha ocorrido ou
não. Tratava-se de uma questão que era já do domínio público.
Esclareceu que durante menos de um mês foi vice-presidente do FCF (o arguido
Júlio era o presidente). Foi a arguida Fátima Felgueiras quem o aconselhou a sair
porque caso contrário iria ter problemas.
O arguido Horácio não ia assistir a desafios de futebol (apesar do FCF endereçar
para a CMF convites) e o depoente não gosta desse desporto e, enquanto vice-presidente
do FCF, apenas assistiu a 3 ou 4 desafios. Em 1997 foi uma vez ao estádio com o
arguido Júlio.
Normalmente eram a presidente da autarquia, o arguido Bragança, um verador
da oposição, o Sr. Júlio Pereira, entre outros, quem usavam os convites endereçados
pelo FCF à CMF.
Não tem conhecimento do facto da “Resin” ter procurado cobrar uma factura de
cerca de 20.000 cts à CMF no final do ano.

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães


4. Enquanto especialista superior da PJ elaborou o relatório de fls 1970 e ss. a
propósito do ponto em causa.
Analisou a factura nº 1853 (cfr. fls 465 dos autos, entregue pelo arguido Horácio
Costa na fase de inquérito; cfr. também o documento de fls 425, recolhido na
contabilidade do FCF) emitida pelo FCF a favor da “Resin” e respeitante a um donativo
de 20.000.000$00. Tal factura foi anulada pelo FCF.
O FCF emitiu então a factura nº 1586 a favor da “Resin”, respeitante a um
donativo de 12.500.000$00, a qual também foi anulada na contabilidade daquele clube.
Tal factura terá sido enviada à “Resin” através da missiva que a acompanhou e cuja
cópia consta de fls 464 dos autos (datada de 30.12.98), a qual parece estar assinada pelo
arguido Júlio Faria (faz alusão a um donativo). Tal missiva não tem carimbo de entrada
na “Resin”, nem um número de entrada nem despacho (segundo referido, aos
documentos recebidos pela “Resin” eram apostos carimbos de entrada e um número e
eram despachados; a título exemplificativo foram exibidas as missivas remetidas à
“Resin” pelo FCF e constantes de fls 9145 e 9146 do 34º volume dos autos).

386
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por fim, foi emitida a factura nº 1596 pelo FCF a favor da “Resin”, respeitante a
um contrato de publicidade de 12.500.000$00 (+ IVA a 17%, o que representa mais
2.125.000$00, pelo que a factura prefaz o total de 14.625.000$00).
A esse propósito, a “Resin” emitiu o cheque nº 9112924417, de 12.500.000$00,
datado de 29.12.98.
Porém, só em Janeiro de 1999 pagou a quantia de 2.125.000$00, respeitante ao
IVA, através do cheque nº 812924566 (cfr. talão de depósito de fls 433 do apenso 96-A,
efectivado a 29.01.99).
O normal seria que o IVA fosse pago desde logo com o valor de 12.500.000$00.
Por outro lado, partindo do pressuposto que tal quantia se tratou de um donativo
não faria sentido a emissão de uma factura, a qual é emitida apenas quando se presta um
serviço. Em caso de donativo, o normal é apenas a emissão do respectivo recibo (e não
de uma factura). Ademais, se se tivesse tratado de um donativo não seria devido
qualquer IVA. Admite que poderia ser fiscalmente mais vantajoso para a “Resin” a
consideração de um donativo, mas tal depende da situação da empresa. Se a “Resin”
tivesse que pagar IVA ao Estado poderia deduzí-lo, o que será a situação normal), mas
se não tivesse que pagar IVA ao Estado não tinha qualquer interesse em considerar
como donativo a quantia referida. Em todo o caso, sempre poderia pedir o reembolso do
IVA pago a mais.
Ora, nesse ano de 1998 a “Resin” já tinha pago ao FCF a quantia de
1.750.000$00 + IVA respeitante ao contrato de publicidade datado de 03.08.98 para a
época desportiva de 1998/1999, o qual previa o pagamento desse valor aquando da
assinatura desse contrato, isto é, a 03.08.98.
Em face disso foi emitida pelo FCF a factura nº 1424, de 29.09.98, a favor da
“Resin” (esta por seu turno remeteu pelo correio, acompanhada de missiva, um cheque
datado de 14.10.98).
Sucede porém que consta dos autos um outro contrato de publicidade
semelhante ao já referido, datado de 03.08.98, celebrado entre o FCF e a “Resin”,
respeitante a um painel de publicidade situado no topo poente do estádio, pelo preço de
12.500.000$00, referente à mesma época desportiva (98/99). Ora, apesar do contrato ter
a mesma data, as assinaturas não são exactamente as mesmas em relação ao contrato de
publicidade incialmente referido.
Ademais, na época 96/97, a título de publicidade, a “Resin” pagou ao FCF
1.500.000$00 (cfr. factura nº 389, de 07.04.97, no valor de 750.000$00, e a factura nº
1030, no mesmo valor, datada de 30.06.97). Já na época desportiva seguinte (97/98) a
“Resin”, a esse título, pagou ao FCF 3.510.000$00 (cfr. factura nº 1193, de 21.01.98).
A fls 170 dos autos encontra-se um manuscrito escrito pelo arguido Júlio Faria e
dirigido ao arguido Horácio Costa (manuscrito esse datado de 06.11.98).
A fls 447 do apenso 96-A encontra-se cópia de um talão de depósito da quantia
de 7.500.000$00 em numerário, depósito esse efectivado a 30.12.98 às 16.27 horas na
conta do FCF.
No mesmo dia, às 16.25 horas, foi efectuado o depósito do cheque da “Resin” no
valor de 12.500.000$00, acima referido, conforme documentado a fls 431 do apenso 96-
A.
As duas quantias depositadas prefazem o total de 20.000.000$00.
Não é possível saber qual a proveniência da quantia de 7.500.000$00 em
numerário apenas pela análise dos documentos (cfr. ainda o documento de fls 430 do
apenso 96-A, referente às entradas de caixa no FCF).
Conforme consta de fls 444 do apenso 96-A, a “Resin” emitiu a factura nº
9801535 à CMF, no valor de 20.347.500$00 + IVA, o que prefaz o total de

387
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

23.806.575$00 (a título de serviço de reabilitação e manutenção da lixeira de Sendim


entre 11.05.98 e 19.12.98.
Em resposta a CMF remeteu à “Resin” o ofício de fls 445 do mesmo apenso 96-
A, datado de 08.01.99, assinado pelo arguido Barbieri Cardoso, ao mesmo tempo que
com essa missiva devolvia tal factura, sustentando que era a AMVS a responsável pelo
pagamento e não a CMF.
Cerca de um ano depois (a 27.12.99) tal factura foi anulada pela emissão da nota
de crédito nº 990024 (cfr. fls 446 do apenso 96-A).
Ignora se a dita factura foi ou não apresentada a pagamento junto da AMVS.
Quanto à questão de se saber se existe alguma relação entre a emissão dessa
factura e a concessão de um donativo de 20.000.000$00 ao FCF referiu que apesar de
existir proximidade de valores não pode relacionar uma coisa com a outra.
Conforme se pode constatar a fls 109 a 113, do apenso 14, foi celebrada entre a
CCAM e o FCF uma transacção nos termos da qual era fixada em 325.000.000$00 a
dívida do dito clube para com a referida instituição bancária, pondo-se dessa forma
termo aos processos judiciais em curso.
Tal acordo previa o pagamento de uma prestação de 50.000.000$00 até
30.09.98.
Porém, até 01.10.98 apenas uma parte dessa prestação – 10.000.000$00 - tinha
sido paga (cfr. cheque do FCF nº 975645742), sendo certo que a 15.10.98 foram pagos
mais 20.000$00.
Em face de tal a CCAM remete ao FCF uma missiva a 16.10.98 a solicitar o
pagamento do remanescente em falta, isto é, 20.000.000$00 (visto que 30.000.000$00 já
haviam sido pagos).
Em resposta o FCF remete uma missiva à CCAM (a 04.12.98), referindo que até
ao final do ano estaria em condições de pagar o restante (cfr. fls 63 do apenso 17).
Esse montante foi de facto pago à CCAM a 31.12.98 (cfr. o cheque cuja cópia se
acha a fls 450 do apenso 96-A), sendo certo que no dia anterior havia sido depositada
essa quantia na conta do FCF, conforme já referido.
*
O arguido Carlos Marinho ironizou então com a incongruência da pronúncia
em face do facto da “Resin” ter pago o IVA cerca de um mês mais tarde (relativamente
ao pagamento da quantia de 12.500.000$00), por se tratar do cumprimento de uma
prestação no âmbito de um contrato de publicidade, sinal de que lhe era mais favorável
a consideração daquela entrega como um donativo.
Referiu ainda que quando a primeira factura chegou à contabilidade e verificou
que mencionava um donativo, foi a mesma devolvida ao FCF para correcção, o que foi
feito, tendo sido então emitida nova factura de 12.500.000$00 + IVA, o qual foi pago
em Janeiro de 1999.
Quanto à emissão da factura nº 9801535 da “Resin” à CMF (cfr. fls 444 do
apenso 96-A) referiu o seguinte:
No final de cada ano a “Resin” fazia uma reunião de preparação de contas. No
final do ano em causa verificou que se estava aquém dos resultados que tinham sido
propostos aos accionistas. Foi por essa razão que decidiram emitir a factura em causa
(que correspondia de facto a serviços prestados na lixeira de Sendim), admitindo em
todo o caso que a mesma talvez devesse ter sido remetida à AMVS e não à CMF.
Não ficou admirado com a respectiva devolução pois na verdade não havia
suporte legal que permitisse à CMF pagar a dita factura, sendo certo que a emissão da
mesma foi a forma que se arranjou para solucionar um problema interno perante os
accionistas da “Resin”.

388
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Só no final de 1999 é que tal factura foi anulada porque existia a expectativa de
que a mesma pudesse ser paga quando fosse legalmente possível encontrar uma solução
que permitisse à CMF pagar os trabalhos que iam sendo executados na lixeira de
Sendim pela “Resin”. Como até ao final de 1999 não foi possível encontrar tal solução
anulou a factura em causa.
Além disso, em Outubro de 1999, a “SITA” (accionista maioritário da “Resin”)
decidiu recomprar a participação de 20% que a “ECOP” detinha no capital social da
“Resin” e vender a totalidade da sua participação à “CESPA”. Ora, o valor da venda
dessas acções seria superior ou inferior consoante os lucros ou prejuízos da “Resin”.
Consequentemente, a “CESPA” tinha todo o interesse que a “Resin” desse o mínimo
lucro possível. Tal foi a principal razão para que a factura em causa fosse anulada.
*
- Testemunha Manuel Ferreira de Faria
4. A oposição explorou politicamente os rumores e as notícias de que a “Resin”
tinha facturado à CMF serviços que não tinha prestado, designadamente uma quantia
que rondaria os 20.000 cts e que se relacionaria com um donativo dado por essa
empresa ao FCF.
Confrontado com o documento de fls 457 e ss. do 2º volume, referiu que se
tratou de uma intervenção política na assembleia municipal da testemunha Joaquim José
Teixeira Ribeiro, Presidente da Junta de Freguesia de Refontoura, eleito pelo PSD (a
este propósito o arguido Horácio Costa referiu ter estado presente e que a testemunha
Joaquim José Teixeira Ribeiro fez a sua intervenção na qualidade de líder do PSD na
assembleia municipal, sendo certo que ele era o porta-voz da comissão política do
PSD).
Ao que pensa em 2001, já depois da denúncia que deu origem a este processo,
numa reunião de câmara, o depoente questionou a CMF e o arguido Barbieri Cardoso
acerca desse assunto e ele respondeu-lhe que não visava “facturas falsas” (não tem a
certeza se a expressão usada foi esta mas a expressão empregue por ele tinha o sentido
de que a quantia em causa não era devida pela CMF).
Segundo foi dito na reunião de câmara a factura ou facturas (não sabe se era uma
ou mais do que uma) em causa foi devolvida (cfr. factura de fls 444, do apenso 96-A,
datada de 31.12.98, no montante de 23.806.575$00; cfr. a carta que acompanhou a
devolução dessa factura, subscrita pelo arguido Barbieri Cardoso e datada de 08.01.99,
constante de fls 445 do apenso 96-A).
O arguido Horácio Costa estava presente em tal reunião.
Pensa que existia um contrato de publicidade celebrado entre o FCF e a “Resin”
no valor de 20.000.000$00, sendo certo porém que nunca o viu (cfr. o contrato de
publicidade alusivo a um painel, no valor de 12.500.000$00, constante de fls 443).
Nunca tinha visto os documentos de fls 464 a 466.
Essas questões de ordem financeira do FCF discutiam-se sobretudo aquando da
apresentação do orçamento, no sentido de se saber que receitas iriam suportar os custos.
Não sabe se a “Resin” chegou a fazer publicidade nas camisolas do FCF, mas
tem a ideia de se falar disso.
Ouviu dizer que o FCF encontrava-se em incumprimento das suas obrigações
relativamente à CCAM e que com a dita verba de 20.000 cts regularizou esse débito,
mas não tem conhecimento directo desse facto (a este propósito, porém, o arguido Júlio
Faria referiu que a transacção celebrada entre a CCAM e o FCF a 15.09.98 pôs fim a 2
ou 3 acções nas quais a testemunha Manuel Faria figurava como demandado – enquanto
ex-dirigente do FCF -, facto que este confirmou. Referiu porém não ter tido parte activa

389
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

na celebração desse acordo; manifestou a sua convicção, não fundamentada, de que esse
acordo nenhuma relação teve com o aludido contrato de publicidade).
Ignora que dirigentes do FCF “bateram à porta” da “Resin” para lhe pedir um
donativo.

- Testemunha José Vitorino da Cunha Loureiro


4. Referiu que foi admitido ao serviço na “Resin” em Janeiro de 1993 como
funcionário administrativo (expediente geral). A pouco e pouco foi tomando também
conta da caixa da empresa, passando a ser o tesoureiro cerca de 2 ou 3 anos depois.
No início o Sr. Florentino Borges dava-lhe apoio e mais tarde ficou apenas
ligado à Direcção Financeira da “Resin”.
Quando não tinha estafeta era o depoente quem procedia aos depósitos. Também
fazia levantamentos para suprimentos de caixa. Os depósitos e levantamentos que
efectuava diziam apenas respeito à conta da empresa, negando que tivesse procedido a
levantamentos de contas pessoais dos respectivos sócios ou funcionários.
Explicou que a testemunha Luciano Barreira foi o seu superior hierárquico, pois
foi Director Financeiro da “Resin”. Tal testemunha ingressou na “Resin” enviada pela
“ECOP”, ao que pensa, em 1994 (tendo permanecido ao serviço da “Resin” até 1998,
salvo erro). Aquando da reinquirição a testemunha expressou então que tem a ideia que
ele terá entado para a “Resin” quando a “Ecop” entrou para o capital social da “Resin”,
ao que pensa em 1995. Nega que alguma vez lhe tenha entregue qualquer quantia em
numerário.
Na altura o arguido Vítor Borges era o único a obrigar a empresa.
Até Setembro de 1993 o depoente preparava os documentos para a
contabilidade, altura em que foi admitido um contabilista (o arguido Carlos Marinho).
Toda a correspondência recebida pela “Resin” era registada (era aposto um
número de registo e a data de entrada), segundo referiu quando confrontado com a carta
recebida pela “Resin” do FCF e junta na 99ª sessão de julgamento.
Explicou que F. Fonseca era o estafeta. Essa missiva tem também a rúbrica do
Dr. Maça, então director financeiro da “Resin” (onde esteve em 1998 e 1999).
Em finais de 1999 o arguido Carlos Marinho deixou de ser contabilista da
“Resin” por ter tido um desentendimento com o director geral de então, passando a ser o
respectivo director financeiro a partir de 2000.
Conhece o arguido Horácio Costa na medida em que o viu uma vez na sede da
“Resin”, pois ele foi falar com o arguido Gabriel Almeida no gabinete deste.
Ele fazia-se acompanhar de outra pessoa, que não reconhece.
Eles entretanto saíram e passaram pelo gabinete do arguido Vítor Borges para o
cumprimentar. O Sr. Florentino Borges disse-lhe que um deles era deputado na
Assembleia da República (foi aliás ele quem lhe disse que o arguido Gabriel estava
ocupado com “os senhores de Felgueiras”, tendo então esperado que saíssem para falar
com o dito arguido).
Tal passou-se em finais de 1997 ou em princípios de 1998 porque o arguido
Gabriel Almeida tinha sido admitido há pouco tempo na “Resin” (ao que pensa, este foi
admitido em Setembro de 1997, sucedendo ao Gil Paulice). Era Inverno na medida em
que o arguido Horácio Costa envergava um quispo ou um sobretudo.

- Testemunha Artur Teixeira de Faria


4. Referiu ser funcionário da CCAM desde 1988, sendo certo que desde
Fevereiro de 1997 passou a assumir as funções de presidente da Direcção de várias
agências da CCAM, entre as quais a de Felgueiras.

390
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confirmou que entre o FCF (representados pelos seus directores) e a CCAM foi
celebrado um acordo, nos termos do qual a dívida daquele clube à sua entidade patronal
foi consolidada em 325.000.000$00, acordo esse celebrado em finais de 1997 ou 1998.
Confrontado com o documento de fls 109 a 113, do apenso 14, datado de
15.09.98, confirmou tratar-se do acordo a que se referiu (o qual inclusive também foi
assinado pelo depoente enquanto representante da CCAM). Tais assinaturas, conforme
observou nesse documento, foram reconhecidas notarialmente no dia 15.09.98.
Explicou que o FCF tinha uma dívida para com a CCAM, de proveniência
variada (financiamentos concedidos até 1997, contas a descoberto bem superiores a
20.000 cts e porventura para além da prática bancária, etc), que esta procurou cobrar
pela via judicial, tendo para o efeito intentado várias acções judiciais em 1996 e 1997
(em que eram demandados quer o FCF quer os respectivos directores), processos esses
que terminaram por transacção. Foi pois para pôr fim a esses processos que se celebrou
a transacção a que se reporta o documento de fls 109 a 113 do apenso 14.
Conforme se observa em tal acordo, o FCF teria de pagar 50.000.000$00 até
30.09.98. Presume a testemunha que tal prestação tenha sido paga porque essa dívida
não existe. Tal testemunha não conseguiu precisar de que modo tal prestação foi paga.
Foi confrontado com o documento de fls 51 e 52, do apenso 17 (missiva da
CCAM ao FCF, de 16.10.98, solicitando o pagamento dos 20.000.000$00 em falta
relativos à prestação vencida em Setembro desse ano, pois já tinham sido pagos
30.000.000$00).
Foi ainda confrontado com o documento de fls 63 do apenso 17 (missiva do FCF
à CCAM, assinado pelo arguido Júlio Faria e por Álvaro Costa, a dar conta de que o
remanescente dessa prestação – 20.000 cts – iria ser pago até ao final do ano).
Confrontado com o manuscrito de fls 170, do 1º volume (exarado pelo punho do
arguido Júlio Faria e dirigido ao arguido Horácio Costa) assegurou ser a primeira vez
que vê esse documento, não garantido que esteja relacionado com a dívida de 20.000 cts
referente ao remanescente da prestação acima referida. Em todo o caso, para aquela data
inexistia qualquer outro compromisso do FCF para com a CCAM nesse valor.
Para além disso, concedeu que só após a celebração da aludida transacção é que
as partes passaram a conhecer qual o plano de pagamentos estipulado.
As negociações que levaram à celebração de tal acordo passaram por várias
etapas, envolvendo aliás o Dr. Tavares Moreira da Caixa Central (em cujas reuniões
com os responsáveis do FCF o depoente não participou), mas não acredita que estivesse
já apalavrado cerca de 9 meses antes da sua formalização. Já não o pode assegurar, mas
tem a ideia de que as negociações demoraram cerca de 1 a 3 meses, pois a CCAM teve
de avaliar o terreno dado em cumprimento parcial da obrigação, pelo que antes dessa
avaliação não era possível saber se esse acordo se iria concretizar ou não.
Confrontado com cópia do cheque de 20.000 cts emitido pelo FCF, datado de
31.12.98 e com cópia do respectivo talão de depósito de fls 451 do mesmo apenso,
admitiu que possam dizer respeito ao pagamento dos 20.000 cts referidos, salientando
porém que só poderia ter a certeza desse facto com o extracto da conta-corrente entre
ambas as entidades.
Ignora se o FCF pagou juros de mora pelo atraso na liquidação da totalidade da
prestação vencida a 30.09.98.
Referiu que por força do acordo celebrado o arguido Júlio Faria não assumiu
qualquer compromisso pessoal de pagar o débito do FCF, pois apenas teve intervenção
enquanto representante do clube.
*

391
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Júlio Faria salientou então que quando assumiu a presidência do


FCF as dívidas a que diziam respeito as acções judiciais mencionadas já existiam, daí
que não tenha sido um dos demandados.
O FCF nomeou o Dr. Machado Costa para negociar com a CCAM (através do
Dr. Moutinho de Almeida, advogado da CCAM). Foram pois os advogados quem
iniciaram as conversações.
Foi na sequência disso que se realizaram várias reuniões, entre as quais uma em
Lisboa com o Dr. Tavares Moreira (presidente da Caixa Central).
Os responsáveis do FCF encetaram contactos com várias entidades de modo a
permitir a celebração do dito acordo, designadamente junto de muitas empresas, entre as
quais a “Zima” e a “Resin”, esta em Dezembro de 1997.
Foi em face dos contactos referidos que se apontou o dia 30.09.98 para o
vencimento da primeira prestação (de 50.000.000$00), compromisso esse que ficou
vertido no acordo.
Pouco antes da data de celebração do acordo realizou-se em Felgueiras uma
reunião final com o Dr. Tavares Moreira.
O processo negocial iniciou-se em 1997, numa altura em que as acções judiciais
já estavam propostas (e numa altura em que a CCAM já estava intervencionada;
segundo a testemunha Artur Faria a CCAM foi intervencionada cerca de 6 meses antes
de ter sido nomeado Director pelo Banco de Portugal, em Fevereiro de 1997).
Confirmou o arguido Júlio Faria que o cheque de fls 450 do apenso 96 diz
respeito ao pagamento dos 20.000 cts referidos.
*
Confrontada a testemunha Artur Faria com o documento de fls 490 do apenso
17 – carta da CCAM para o Dr. Tavares Moreira a remeter cópia da proposta de acordo,
carta essa datada de 29.04.98 – confirmou que existiu uma reunião em Felgueiras com o
Dr. Tavares Moreira.
Confrontado com a missiva da CCAM ao FCF (ao Sr. Álvaro Costa), de
29.04.98, não reconheceu de quem é a assinatura nela aposta, assegurando não ser de
quem quer que seja da CCAM.
Referiu então que em 03.04.98 as negociações estavam em curso, segundo
resulta desses documentos.

- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro


4. A propósito do documento de fls 277 (manuscrito do arguido Júlio Faria, pois
reconhece-lhe a letra, dirigido ao arguido Horácio e datado de 06.11.98) e 278, referiu
que se trata de mais uma das situações em que pediu esclarecimentos na Assembleia
Extraordinária realizada a 28.07.2000, pois entendia que indiciava também o uso
indevido de dinheiros públicos.
Faz a ligação de tal manuscrito a um donativo concedido pela “Resin” ao FCF.
A “Resin” era uma empresa que tratava dos resíduos em Felgueiras (não percebe
por isso por que razão foram passados cheques pela CMF à “Norlabor”, conforme acima
referiu).
Os Srs Álvaro Costa e Fernando Lima estavam ligados ao FCF.
À data o arguido Júlio Faria era o Presidente da Direcção do clube.
Relaciona esse manuscrito com os documentos de fls 464 (factura/recibo do
FCF), 465 (factura/recibo do FCF) e 466 (cheque da “Resin” de 12.500 cts passado a
favor do FCF).
Também nesta matéria nenhuma explicação lhe foi dada na Assembleia
Municipal Extraordinária realizada a 28.07.2000.

392
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ouviu dizer que a “Resin” procurou cobrar cerca de 20.000 cts à CMF (cfr.
cópia de factura de fls 444, de 31.12.98, a qual foi devolvida pela CMF através da
missiva de fls 445, de 08.01.99, assinado pelo arguido Barbieri).
A esse propósito a testemunha Manuel Faria (então vereador eleito pelo PSD)
perguntou ao arguido Barbieri Cardoso por que razão não tinha visado a factura
apresentada pela “Resin”, ao que este lhe respondeu que “não visava serviços que não
tinham sido prestados”. Soube dessa conversa através da testemunha Manuel Faria,
conversa essa que, segundo ele, teve lugar num dos corredores da CMF aquando da
realização da Assembleia Municipal Extraordinária realizada a 28.07.2000.
O Sr. Vítor Vasconcelos era vice-presidente da Comissão Política do PSD local
à data e membro da Assembleia Municipal, ignorando se foi quem forneceu ao partido
algum desses documentos, os quais só poderiam provir dos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas.

- Testemunha Luciano José da Cunha Barreira


Durante cerca de dois anos (de 1997 a 1999) foi funcionário da “ECOP” na área
de compras.
Teve também funções administrativas na área de pessoal e compras na “Resin”
durante cerca de ano e meio, por alturas de 1996/1997, sendo certo que desempenhou
funções nesta última por designação da ECOP (empresa que era accionista na “Resin”).
Na “Resin” o seu cargo tinha a designação de director administrativo e
financeiro, mas de facto nunca exerceu funções de ordem financeira.
Não sabe se a “Ecop” confiava ou não na “Resin”.
Quem mandava na “Resin” era o arguido Vítor Borges, já que era o
administrador dessa empresa.
Tinha com ele um relacionamento meramente institucional.
Sabia que a “Resin” tinha relações comerciais com a CMF (serviços prestados
na lixeira de Felgueiras, designadamente de recolha de resíduos) porque se falava desse
assunto na empresa (já não se recorda de quem ouviu falar nesse assunto).
Não sabe se existiam outras empresas envolvidas nos serviços prestados pela
“Resin” para a CMF.
Segundo crê, falava-se que a “ECOP” chegou a participar em algumas obras
(não precisou que obras nem de quem ouviu esses comentários).
Ouviu dizer que a testemunha Menezes Basto, a firma “Norlabor”,
“Translousada” e “João Tello” tinham relações comerciais com a “Resin”, mas não se
recorda se esse relacionamento se desenvolveu no âmbito das relações existentes entre a
“Resin” e a CMF.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se a CMF pagou serviços não
prestados na totalidade para que depois parte desses pagamentos fossem devolvidos,
referiu ter ouvido comentários acerca desse assunto na “Resin” e que estavam
envolvidas verbas a esse propósito. Porém, não conseguiu dizer de quem ouviu esses
comentários e referiu já não se recordar desse assunto em termos concretos.
Em todo o caso, não tem conhecimento que parte do dinheiro recebido pela
“Resin” da CMF fosse devolvido a alguém desta última.
Transmitiu à PJ certos factos de que ouviu falar mas acerca dos quais não dispõe
de provas, como sejam facturas falsas que seriam emitidas (não sabe por quem, para
quem e nem para quê).
Tem a ideia que a “Resin” usava umas pastas com o seu timbre, não se
recordando em concreto como eram.

393
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tendo-lhe sido exibidas as pastas apreendidas nos autos, confirmou que a


“Resin” usava pastas desse género, acrescentando que tem a ideia de ter uma pasta
desse tipo em casa e que recolheu na “Resin”.
A testemunha José Vitorino da Cunha Loureiro era o tesoureiro da “Resin”, não
fazendo ideia se ele procedia ao levantamento de dinheiro de contas pessoais de sócios.
Esclareceu que a única parte financeira que tratava na “Resin” prendia-se apenas
com o pagamento aos fornecedores. Nunca fez pagamentos nem recebimentos das
entidades acima referidas (CMF, testemunha Menezes Basto, “Translousada”,
“Norlabor” e “João Tello”).
Ignora se foram celebrados contratos simulados entre essas entidades e a CMF.
O arguido Carlos Marinho, por seu turno, era o contabilista da “Resin”, não se
recordando de alguma vez ele lhe ter comentado acerca de um pedido para arranjar
dinheiro para determinada finalidade.
Confrontado com os manuscritos (com contas) de fls 67 a 71 do 1º volume,
referiu nunca ter visto tais documentos nem saber de que tratam.
Escudou-se no tempo que entretanto já passou e com a sua idade para não se
recordar do que a esse propósito ouviu dizer na “Resin” (e que terá transmitido à PJ nas
suas declarações exaradas a fls 3410 a 3414, declarações essas prestadas a 19.11.2002, e
cuja valoração está vedada ao tribunal). Aliás, expressou ao tribunal que se soubesse o
que sabe hoje nada teria dito à PJ, pois só tem sido incomodado por esse facto,
pretendendo por isso esquecer tudo o que se passou.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


1. Os documentos de suporte à pronúncia neste ponto foram fornecidos pelos
arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
O documento de fls 198 e ss. do 1º volume reporta-se a um relatório do arguido
Horácio Costa à arguida Fátima Felgueiras (não se recorda se seria um relatório
períodico), na qual ela apôs na respectiva capa (cfr. fls 198) um despacho de devolução
desse documento, datado de 10.06.97 e apôs um outro despacho (a fls 199) também
datado de 10.06.97, ao que supõe na sequência da informação manuscrita que consta
dessa folha (com interesse ver o manuscrito do arguido Júlio Faria de fls 156 e 157 –
que a testemunha referiu não saber se está ou não completo - e o teor da contestação dos
arguidos Horácio e Joaquim à acção de prestação de contas contra eles movida, nos seus
artigos 35º e ss.).
Não sabe porque razão o arguido Horácio exarou no relatório à mão (e não de
forma dactilografada como o texto do relatório) o teor dessa informação.
A fls 2 do apenso 1 consta o ofício da PJ a pedir ao BES vários elementos
relativos à conta bancária referida nos autos, designadamente a data da sua abertura.
De fls 8 do apenso 1 retira-se que a data da última modificação data de 11.07.97,
sendo certo que a ficha assinada pelo arguido Joaquim Freitas o foi a 17.07.97 (cfr. fls 7
do apenso 7). Em face disso especulou a testemunha que a conta não foi aberta pelos
dois arguidos referidos ao mesmo tempo, pelo que o arguido Joaquim se deve ter
associado à dita conta a 17.07.97 ou então nessa data procedeu-se a alguma modificação
de dados (cfr. os esclarecimentos solicitados ao BES pelo tribunal já no decurso da
audiência de julgamento).
2. Pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas foi entregue à PJ uma pasta
com o logotipo da “Resin”, contendo no seu interior os documentos referidos a
propósito na pronúncia (constantes de fls 158 a 161).
No que se refere ao documento de fls 159, entende que as contas nele constantes
correspondem ao segundo pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor” através de um

394
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

cheque emitido a 12.05.98 (cfr. documento de fls 1910), quer quanto ao valor ilíquido
(7.000 cts) quer quanto às legais deduções (de que resulta um valor líquido de
6.633.334$00), fazendo ainda referência à diferença de IVA (pago pela CMF e pelas
empresas envolvidas). Suspeitou a investigação que esses dizeres tenham sido
manuscritos pelo arguido Carlos Marino, que era o responsável pela área de
contabilidade da “Resin”, não tendo sido possível efectuar prova pericial acerca da
respectiva letra (cfr. auto de recolha de autógrafos de fls 2131 e a cota de fls 2132).
Nesse documento faz-se referência a um pagamento a 14.05.97, devendo tratar-
se de lapso de escrita no que respeita ao ano (o cheque da CMF tem a data de 12.05.98,
tendo a “Resin” recebido o respectivo montante – via “Norlabor” e “Translousada” -
pouco tempo depois, sendo certo que o recibo que emitiu tem a data, precisamente, de
14.05.98, embora o depósito na conta da “Resin” se tenha verificado a 15.05.98,
conforme documento de fls 196 do apenso 97).
Os documentos constantes de fls 2009 a 2011 e 4627 a 4629 foram apreendidos
na “Translousada”.
Como já referido, a “Resin” foi a destinatária final dos pagamentos efectuados
pela CMF, tendo emitido à “Translousada” o respectivo recibo a 14.05.98, no valor de
6.633.334$00, conforme documento de fls 195 do apenso 97. Tal documento tinha no
verso manuscrito uns dizeres a lápis e que foi possível recuperar pelo Laboratório de
Polícia Científica, apesar de terem sido apagados (“acerto de contas. Diferença de IVA.
Resin factura à Translousada 17%. Translousada para a Norlabor 17%. Norlabor – CMF
5%). Tal tem ligação com o documento de fls 159, entendendo que tais documentos
possam estar relacionados com um retorno de 5.250 cts (provenientes do segundo
pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”, montante que, entretanto, através desta e
da “Translousada”, teve como destinatário final a “Resin”).
A expressão “custo do justificativo – 10%” reporta-se habitualmente a um custo
imputado a quem emite o documento (factura/recibo) e que serve para dar um aspecto
legal à operação. É prática habitual na fraude fiscal, conforme constata em função da
sua experiência profissional.
Porque tal recebimento se prende com a aquisição do “Audi A4” referido nos
autos (cfr. o capítulo 3º, al. b), da pronúncia), contactaram a firma “Machado e Costas”,
a qual comercializa viaturas da marca “Audi” e “VW”, solicitando-lhe documentos
contabilísticos alusivos ao negócio em causa.
Tal viatura foi adquirida tendo sido entregues, como meio de pagamento, um
cheque da conta do BES de 1.000.000$00 e um cheque de uma conta particular do
arguido Horácio Costa no montante de 4.750.000$00 (cfr. fls 103 do volume 1).
Conforme se pode verificar a fls 79, no dia 28.07.98 (véspera da dita aquisição),
foi efectuado um depósito nessa conta do “Banco Mello” titulada pelo arguido Horácio
Costa, no montante de 4.750 cts. em numerário.
O seguro da viatura foi feito num mediador em Fafe (através do arguido
Horácio).
A esse propósito é relevante o documento de fls 289 do apenso 4 (manuscrito do
arguido Horácio de 28.07.98 dirigido à arguida Fátima alusivo ao seguro do “Audi A4”
(cfr. ainda a contestação dos arguidos Horácio e Joaquim Freitas à acção de prestação
de contas, artigos 81º e 82º).
Já o documento de fls 106 (de 08.07.98) foi elaborado em papel da CMF (tem no
entanto riscada a palavra “presidente”).
3. Os documentos de fls 162 a 164 foram entregues pelo arguido Horácio Costa.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Relaciona tais documentos com o terceiro pagamento efectuado pela CMF à


“Norlabor” (cfr. ponto 1.3 do 1º capítulo da proúncia) em face do facto dos valores
serem coincidentes.
A expressão “comissão” reporta-se ao custo pela emissão do documento de
suporte (típico dos crimes de fraude fiscal) e, em face da sua experiência profissional,
sabe que costuma variar entre 10 e 20%.
O verso do quadro de fls 12 do apenso 22 tem manuscrita a expressão
“recebemos e devolvemos os valores recebidos de Norlabor e João Tello quase na
íntegra”, documento esse apreendido na “Resin” numa das buscas iniciais. Tal
documento coaduna-se com os documentos que lhes foram entregues pelo arguido
Horácio Costa.
Existia uma conta-corrente entre essas empresas.
No fax de fls 211 do apenso 21 (enviado pela “Resin” à CMF a 13.11.96) eram
solicitados os bons ofícios no sentido de serem pagas as facturas, até para que ela
pudesse pagar à empresa que lhe alugava as máquinas e sob pena de ter de parar os
trabalhos.
Já a 30.06.96 a “Resin” havia remetido um outro fax à CMF solicitando o
pagamento das facturas com os mesmos fundamentos.
Constatou-se, em todo o caso, que na conta do BES, depois de 08.10.98 não
existe um depósito igual ou superior ao montante de 5.384.653$00 (cfr. fls 38 e ss. do
apenso 1).
Foi depositada a verba de 1.850 cts na conta pessoal do arguido Júlio Faria (cfr.
documento de fls 167º, do 1º volume, e a contestação dos arguidos Horácio e Joaquim
Freitas à acção de prestação de contas contra eles movida).
A fls 84 do 1º volume consta uma fotocópia de um bilhete de sorteio do FCF
com um manuscrito alusivo a 1550 bilhetes a 1.000$00 cada um (foram os arguidos
Horácio e Joaquim quem lhes entregaram esse documento bem como os bilhetes desse
sorteio – cfr auto de entrega de fls 152 e ss., 2º p., nº 10).
O arguido Júlio Faria chegou a fazer parte dos cargos directivos do FCF.
Nessa conta pessoal do arguido Júlio Faria foram efectuados outros depósitos de
verbas provenientes da conta do BES, como ilustram os documentos de fls 165 (170 cts)
e 166 (57.090$00).
Do apenso 4 constam os documentos de suporte das saídas de dinheiro da conta
do BES, entregues pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas (cfr. cota de fls 622
dos autos).
À data o arguido Carlos Marinho não tinha qualquer função de direcção na
“Resin”.
4. Através da carta anónima de fls 217 chegou ao conhecimento da PJ outro
contributo da “Resin” no montante de 20.000 cts. para o FCF.
Com essa carta anónima foi junto aos autos cópia de um cheque de 12.500 cts da
“Resin” a favor do FCF, datado de 29.12.98 (cfr. fls 218).
A 30.12.98 foi depositado na conta do FCF esse cheque no montante de 12.500
cts e em numerário a quantia de 7.500 cts, operação que foi concretizada através de dois
talões de depósito efectuados às 16.25 h. e 16.27 h., respectivamente (assinados por
pessoas diferentes), desse dia 30.12.98 (cfr. documentos de fls 431 e 447 do apenso 96-
A).
A testemunha Barata Feio era o responsável pela área financeira do FCF (salvo
erro era o contabilista do clube).
A testemunha Figueiredo, por sua vez, era funcionário do FCF.

396
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi emitido um cheque de 20.000 cts dessa conta do FCF a favor da CCAM na
medida em que existia um acordo celebrado entre essas instituições de que resultava a
obrigação do clube de pagar uma prestação de 50.000 cts até 31.12.98 (porém, segundo
o acordo, essa obrigação venceu-se em 30.09.98) – cfr. os termos desse acordo,
conforme documento de fls 109 e ss. do apenso 14, datado de 15.09.98.
A fls 92 do apenso 14 consta cópia de um ofício da CCAM para o FCF, datado
de 16.10.98, solicitando o pagamento do remanescente em falta da prestação vencida
em 30.09.98 (20.000 cts, já que tinham sido pagos apenas 30.000 cts).
A fls 170 do 1º volume consta um manuscrito do arguido Júlio Faria para o
arguido Horácio Costa, datado de 06.11.98, onde se alude ao mencionado acordo e ao
montante de 20.000 cts em dívida, referente à prestação vencida a 30.09.98,
referenciando ainda o facto da “Resin” já poder ter recebido o “adiantamento”.
Nessa altura o arguido Júlio Faria fazia parte da comissão administrativa que
geria o FCF.
Os Srs Álvaro Costa e Fernando Lima eram directores ou pessoas ligadas ao
FCF, sendo certo que aquele tinha sido já presidente do clube.
Desse manuscrito resulta que a arguida Fátima estaria a par da situação na
medida em que faz alusão a uma conversa com a “Srª Presidente” (entre ela, o arguido
Júlio e os ditos Àlvaro e Fernando Lima), tendo sido na sequência dessa conversa que o
acordo foi assinado.
Entretanto, o FCF remeteu à CCAM uma carta onde se compromete a liquidar
os 20.000 cts em falta até ao final do ano, na sequência do facto de terem contactado
várias entidades no sentido de apoiar o clube (cfr. fls 63 do apenso 17).
O “adiantamento” referenciado no manuscrito referido só poderá referir-se ao
adiantamento recebido da AMVS (ou melhor, de uma empresa de aquisição de
créditos).
Ora, por missiva da AMVS para a “Resin”, de 06.11.98, foi comunicada a
deliberação favorável de desconto da factura referente ao adiantamento (cfr. doc. de fls
269 do apenso 12). A data dessa missiva é coincidente com a data do manuscrito do
arguido Júlio Faria de fls 170 do 1º volume, o que significa que este já teria
conhecimento da deliberação favorável da AMVS (o recebimento propriamente dito terá
sido posterior) – cfr. ainda o ofício de fls 268 do apenso 12 e a factura de fls 286 do
mesmo apenso, no valor de 389.970.771$00 (coincidente com o valor do adiantamento),
emitida a 22.10.98 pela “Ecop” à “Resin” (esta última era a líder do consórcio).
Em face do recebimento pelo FCF da quantia de 20.000 cts, o clube emitiu uma
factura nesse montante, alusivo a donativo (factura nº 1583, de 30.12.98 – cfr. fls 425
dos autos).
A missiva do FCF para a “Resin” a remeter essa factura consta de fls 464 dos
autos, onde se agradece a comparticipação monetária. Em face desse agradecimento
acha pouco provável que a quantia entregue pela “Resin” diga respeito ao cumprimento
de uma obrigação no âmbito de um contrato de publicidade.
Essa factura foi anulada e substituída por outra (constante de fls 427 do apenso
96 – factura nº 1586, datada de 30.12.98), desta feita no montante de 12.500 cts, mas
ainda alusiva a um donativo.
Não parece razoável que a referência a donativo se trate de um lapso se de facto
se reportasse ao pagamento de uma obrigação no âmbito de um contrato de publicidade
que à data já tivesse sido celebrado entre ambas as partes.
Esta factura foi também anulada e substituída por outra (factura nº 1596, de
31.12.98), no mesmo montante de 12.500 cts + IVA a 17%, fazendo agora alusão ao

397
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

contrato de publicidade (cfr. documento de fls 429 do apenso 96). O IVA foi pago mais
tarde (em Janeiro de 1999).
A fls 9144 (ou a fls 443 do apenso 96) consta uma cópia do aludido contrato de
publicidade, no valor de 12.500 cts, referente a publicidade estática (painel no topo
norte, o mesmo do ano anterior) no estádio para a época desportiva 98/99, datado de
03.08.98, o qual previa o pagamento dessa verba em Dezembro de 1998.
Ora, a publicidade estática nesse mesmo painel, no ano anterior, custou à
“Resin” mil e tal contos.
O contrato de publicidade de fls 443 do apenso 96 não lhes foi exibido aquando
das buscas à “Resin”, o que significa que foi recolhido pela investigação.
Em Dezembro de 1998 a “Resin” emitiu uma factura à CMF (mais precisamente
a 31.12.98 – cfr. documento de fls 444 do apenso 96), reportada ao serviço de
reabilitação e manutenção da lixeira de Sendim de 11.05.98 até 19.12.98, no montante
de 20.347.500$00 + IVA a 5%, num total de 23.866.565$00, factura essa que não foi
visada pelo arguido Barbieri Cardoso, tendo sido devolvida pela CMF a 08.01.99 (cfr.
ofício de fls 445 e 446 do apenso 96), pois nessa altura o pagamento deveria ser feito
pela AMVS.
A investigação presumiu que essa factura tinha uma relação com o donativo de
20.000 cts (procurava assim reaver uma quantia semelhante da CMF).
À data, segundo ideia que tem, a arguida Fátima era presidente da Assembleia
Geral do FCF.
Na CMF encontraram uma série de documentos relacionados com o FCF,
designadamente uma lista de credores do clube.
Em face do que encontraram na CMF a arguida Fátima estaria a par do que se
passaria no clube.
Não sabe precisar em que data começou a funcionar o aterro.
No ofício da “João Tello” para a CMF (cfr. fls 348 e 344 do apenso 98), de
06.06.97, em Junho de 97 foi aposto pela arguida Fátima um despacho a chamar a
atenção de que se deveria fazer a imputação ao aterro da Lustosa (Lousada), portanto à
AMVS.
No ofício de fls 168 do apenso 21, de 30.06.97, remetido pelo Departamento
Tecnico da CMF para a AMVS, assinado pelo arguido Barbieri, informava-se que a
“Resin” tinha sido instruída para apresentar à AMVS a facturação referente à
manutenção da lixeira de Sendim a partir de Abril de 1997.
Não sabe se quanto à questão de se saber que entidade deveria proceder a esses
pagamentos existiu ou não algum conflito.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


1. Foi o arguido Horácio Costa que entregou à PJ os documentos alusivos a
“retornos”.
Entregou-lhes assim o documento de fls 198 e 199, onde nesta última folha tem
uma informação manuscrita pelo arguido Horácio e dirigido à arguida Fátima (trata-se
do documento original, cuja cópia consta de fls 142). Trata-se de um documento
referente a um relatório do arguido Horácio e que tem aposto dois despachos da arguida
Fátima, um a fls 198 – que parece reportar-se ao relatório propriamente dito – e outro a
fls 199, aludido a fls 110 do despacho de pronúncia – “TC. Óptimo” -, o qual parece
reportar-se à dita informação manuscrita).
Não faria sentido a aposição de dois despachos no mesmo documento reportados
ao mesmo relatório, de modo que conclui que o despacho de fls 198 diz respeito ao

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

relatório e o despacho de fls 199 reporta-se à informação manuscrita aposta pelo


arguido Horácio.
Esse documento de fls 198 e 199 não se encontrava na CMF, sendo certo que
não se recorda de ali ter visto alguma cópia do mesmo.
À data o arguido Joaquim Freitas era membro da Assembleia Municipal de
Felgueiras.
O manuscrito do arguido Júlio Faria de fls 156 – alusivo ao pelouro das finanças
– parece ser dirigido aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas.
A PJ relacionou este documento com o documento de fls 198 e ss.
O PS intentou uma acção de prestação de contas contra esses arguidos, acção
essa que foi por eles contestada (cfr. cópia da contestação a fls 2896 e ss.,
designadamente os artgs 26º e 30º, onde se alega que a conta do BES foi aberta por
solicitação dos arguidos Júlio e Fátima, o que se coaduna com o documento de fls 156.
Na dita contestação explica-se o modo como a conta foi aberta, a solicitação de quem e
quem a controlava).
Nessa conta o primeiro depósito efectuado foi em numerário (no montante de
600.000$00), a 11.07.97 (ver fls 9 do apenso 1).
*
Referiu o arguido Horácio Costa que na CMF desapareceram todos os
relatórios que elaborou (os mesmos foram pedidos à CMF na fase de instrução e ela
respondeu não os possuir).
*
2. Foi o arguido Horácio Costa quem entregou à PJ os documentos referenciados
na pronúncia a propósito da entrega relatada neste ponto.
O arguido Horácio entregou ainda duas pastas, referidas nos autos (cfr.
fotografias de fls 138 e 139), as quais são adequadas ao transporte de dinheiro e de
documentos.
No documento de fls 159 constam mauscritas contas.
No âmbito da investigação de facturas falsas, viu muitas vezes a expressão
“custo do justificativo” e tratava-se da soma a pagar a quem emitia a factura falsa
(normalmente uma percentagem calculada sobre o valor da factura).
Constataram que o dinheiro que foi depositado na conta do BES era insuficiente
para fazer face a todas as despesas pagas em face dos documentos justificativos dessas
despesas, também entregues pelo arguido Horácio Costa. Daí que concluíssem que
existia dinheiro em caixa.
O dinheiro entregue (mencionado neste ponto) terá servido para pagar o “Audi
A4” referido nos autos, cuja aquisição se efectuou pouco tempo depois desta entrega.
Recolheram elementos na firma “Machado e Costa”, em Guimarães,
designadamente cópia dos dois cheques que serviram de meio de pagamento, um da
conta do BES (no valor de 1.000 cts) e outro da conta pessoal do arguido Horácio Costa
(no valor de 4.700 cts) – cfr. os documentos de fls 77.
A fls 78 dos autos consta um extracto dessa conta do BES, onde é perceptível o
levantamento da quantia de 1.000 cts a 31.07.98.
Por outro lado, a fls 79 consta cópia de um talão de depósito de 4.700 cts na
conta particular do arguido Horácio (efectivado a 28.07.98).
A fls 104 consta a respectiva factura emitida pela Firma “Machado e Costa”,
referente à venda da viatura.
A fls 106 consta um manuscrito do arguido Horácio a confirmar a encomenda da
viatura.

399
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 80 e 81 constam os documentos referentes ao seguro da viatura na “Axa”,


sendo certo que esse seguro foi pago com dinheiro proveniente da conta do BES (cfr.
doc. de fls 289 do apenso 4 – manuscrito escrito com esferográficas de tinta diferente,
negro e azul, supostamente dirigido à arguida Fátima, pese embora nele não se refira a
quem é dirigido, onde se faz referência às verbas usadas no pagamento da viatura e do
respectivo seguro). Na contestação à acção de prestação de contas é também referida a
forma como foi paga a viatura e o seguro (cfr. documento de fls 2896 e ss.).
A viatura em causa foi apreendida à arguida Fátima Felgueiras.
No documento de fls 159 é referido que o primeiro pagamento foi efectuado a
14.05.97. As contas que se seguem devem referir-se a esse primeiro pagamento, mas o
depoente não sabe em concreto a que se referem. Se essas contas se reportam às que são
referidas a fls 158 as datas são diferentes, já que se reportam ao segundo pagamento à
“Norlabor” (13.05.98).
No documento referenciado no relatório de exame levado a cabo pelo
Laboratório de Polícia Científica da PJ, constante de fls 4628 a 4630, recuperaram-se os
dizeres que dele constavam a lápis e que foi apagado por alguém, documento esse
apreendido na “Translousada” (trata-se de um recibo emitido pela “Resin” à
“Translousada” a 14.05.98, no montante de 6.633.334$00, valor coincidente com o
segundo pagamento à “Norlabor” pela CMF).
Relacionando o documento de fls 159 com o segundo pagamento à “Norlabor”
pela CMF, admite que no documento de fls 159 tenha havido um lapso de escrita quanto
ao ano (1997 em vez de 1998). Certo é que a data de 14.05.98 reporta-se ao segundo
pagamento à “Norlabor” e não ao primeiro pagamento.
*
Pelo arguido Horácio Costa foi então referido que, quando foi expulso do seu
gabinete na CMF, na gaveta existiam quase 200 cts, um pequeno bloco de notas onde
apontava a proveniência do dinheiro, tendo tudo isso desaparecido quando removeram o
mobiliário do seu gabinete nas circunstâncias que já relatou.
A propósito da hipótese de ter contribuído do seu bolso para a aquisição da
viatura, assegurou que em 2000 não tinha condições financeiras para tal, sendo certo
que no final de Julho de 1997 pagou 65.708$00 a título de prestação referente à sua
viatura (um “Peugeot 407”).
Entregou à PJ todos os documentos comprovativos dos pagamentos referentes
quer à conta quer à caixa.
*
Por seu turno, o arguido Carlos Marinho explicou as razões que o levaram a
recusar a recolha de autógrafos.
Combinou com a PJ para ser ouvido, tendo-lhe colocado questões acerca das
quais desconhecia a resposta. Gerou-se um momento de alguma crispação, o que o
deixou preocupado. Mandaram-lhe então fazer uma cópia, o que recusou sem a presença
de um advogado.
Foi entretanto constituído arguido.
Combinou no dia seguinte ir à PJ com um advogado (Drª Sónia Carneiro) e,
segundo instruções da sua advogada, recusou prestar mais declarações, mas que
aceitava manuscrever números (cfr. auto de recolha de autógrafos de fls 2131, reportada
só a números), sendo certo que nessa altura não se recorda de lhe ter sido solicitada a
elaboração de uma cópia de um texto.
Não foi o depoente quem manuscreveu o documento de fls 159. Não conhece
esse documento nem em que circunstâncias foi elaborado.
*

400
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves, a propósito do episódio relatado


pelo arguido Carlos Marinho, chamou à colacção a cota de fls 2133 e 2134 (foi o seu
colega que a fez, mas o depoente estava presente).
Como ele se recusava a esclarecer certos pontos, tornou-se suspeito.
Assegurou que ele se recusou a escrever um texto, cedendo apenas a
manuscrever números.
3. Os documentos referenciados neste ponto foram entregues pelo arguido
Horácio Costa (cartão de visita de fls 164; fotocópia de guia de receita de fls 162 da
CMF e fotocópia de um cheque da CMF, de 08.10.98, no montante de 7.155.153$00,
correspondente ao último pagamento à “Norlabor” pela CMF; e manuscrito de fls 163).
No documento de fls 163 encontra-se a referência ao valor pago de
7.155.153$00 (coincidente com o último pagamento da CMF à “Norlabor”) e a um
valor final de retorno no montante de 5.381.653$00.
A comissão de 12% ali referida, segundo a sua interpretação, seria igual ao
“custo do justificativo” (expressão constante do documento de fls 159), isto é, o
montante a ser pago a quem emite a factura e que, segundo a sua experiência
profissional ronda os 10 e os 12% (a esse propósito não lhe parece estranha a diferença
de percentagens expressa nos documentos de fls 159 e 163).
A expressão “retorno”, na sua interpretação, só poderá significar um retorno à
CMF ou à “Translousada”. Porém, nesta última empresa não detectaram a entrada de
qualquer montante a esse título. Concluíram assim que o “retorno” seria a devolução à
autarquia de parte do dinheiro pago.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se normalmente os retornos não são
feitos em números redondos, admitiu que na maior parte das vezes é assim, mas não
necessariamente.
O arguido Gabriel era um quadro na “Resin”, ignorando em concreto quais as
funções que desempenhava.
Segundo presume, o cartão de visita acima referido terá sido assinado por ele.
Não faz ideia do significado do que consta manuscrito nesse cartão. Admite que
se possa reportar aos bons ofícios no sentido de que fosse pago o que era devido à
“Resin”.
Admite que essa frase manuscrita pudesse ter sido dirigida ao arguido Horácio,
visto ser assessor da arguida Fátima.
As dimensões de ambas as pastas eram semelhantes e serviam para transportar
documentos de tamanho A4.
Os peritos analizaram o destino que foi dado ao dinheiro entregue.
Esse tipo de movimentações normalmente não são espelhadas na contabilidade
de forma clara, pois procura-se ocultar essa realidade.
Assim, em termos contabilísticos, não existe qualquer elemento que permita
comprovar que esse dinheiro saíu da “Resin”.
A fls 167 do 1º volume consta uma cópia de um talão de depósito em numerário
de 1.850 cts na conta do arguido Júlio Faria, sendo certo que acerca desse depósito o
arguido Júlio fez declarações públicas, relacionando esse montante com um reembolso
de despesas que assumiu perante o FCF.
Recorda-se que o arguido Horácio entregou 1.500 ou 1.550 bilhetes relativos a
um sorteio promovido pelo FCF, a 1.000$00 cada um.
A fls 166 do 1º volume, consta uma cópia de um talão de depósito de 57.090$00
na conta do arguido Júlio Faria (depósito de um cheque da conta do BES; cfr. ainda o
manuscrito de fls 84 da arguida Fátima).

401
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 165 do 1º volume consta uma cópia de um talão de depósito de 170 cts na
conta do arguido Júlio Faria (depósito de um cheque da conta do BES).
A fls 72 dos autos consta uma cópia de um cheque da conta do BES no montante
de 600 cts, emitido a favor do arguido Júlio Faria.
Esclareceu ainda que recolheram na CMF alguns documentos iguais aos que
foram entregues pelo arguido Horácio Costa, como por exemplo cópia dos cheques e
guias de receita referidos.
O documento de fls 22 do apenso 11 reporta-se a um quadro alusivo ao aterro de
Felgueiras/valor em dívida, apreendido na “Resin”. Esse quadro não está datado e dele
não consta qualquer valor semelhante aos valores constantes dos documentos entregues
pelo arguido Horácio Costa.
No verso desse documento tem um manuscrito com os dizeres “recebemos e
devolvemos os valores de Norlabor e João Tello quase na íntegra”. Relaciona esse
documento com os documentos entregues pelo arguido Horácio e alusivos a “retornos”.
4. Na denúncia anónima de fls 217 fazia-se alusão a um donativo ao FCF.
Existia uma dívida do FCF à CCAM que foi consolidada em 325.000 cts através
de um acordo celebrado entre as partes, ao que pensa em 1998 (cfr. o documento de fls
109 a 112 do apenso 14, de 15.09.98).
Até 30.09.98 o clube tinha de pagar uma prestação de 50.000 cts.
Tem a ideia que 10 ou 20.000 cts foram pagos através de um cheque emitido
pela esposa de um dirigente do FCF.
Certo é que o FCF apenas tinha pago 30.000 cts relativamente à prestação
vencida em Setembro de 1998, pelo que faltava a liquidação dos restantes 20.000 cts.
Esse remanescente em falta foi pago através de um donativo de 20.000 cts por
parte da “Resin” ao FCF.
A fls 92 do apenso 14 consta uma cópia de uma missiva da CCAM para o FCF,
datada de 16.10.98, dando conta do atraso no pagamento desses restantes 20.000 cts,
referentes à prestação vencida a 30.09.98.
A fls 170 consta um manuscrito do arguido Júlio Faria, datado de 06.11.98.
A PJ associou esse donativo da “Resin” ao adiantamento recebido da AMVS (ou
melhor, esta entidade autorizou a “Resin” a obter esse adiantamento de uma entidade
financeira de aquisição de créditos, referente ao aterro RIB de Felgueiras).
A esse propósito, a fls 223 e 224 do apenso 20 consta um fax da “Resin”
(assinada pelo arguido Carlos Marinho) para a AMVS a 27.10.98 remetendo uma
minuta para ser transcrita em papel timbrado desta última (esse fax foi remetido à Drª
Eduarda Brandão), minuta essa constante de fls 224 do apenso 20 (reporta-se a uma
autorização da AMVS para que a “Resin” pudesse receber o montante do adiantamento
por conta do aterro RIB).
A AMVS respondeu a 06.11.98 (a mesma data do manuscrito de fls 170 do
arguido Júlio Faria), conforme documento de fls 269 do apenso 12, comunicando que o
conselho de administração havia deliberado autorizar o desconto do adiantamento
pretendido desde que não viesse a pagar juros.
Pensa que essa decisão era já previsível, pois já era falada, pelo que a
deliberação do conselho de administração da AMVS constiuiu um mero formalismo.
Quanto à repartição desse adiantamento pelas empresas do consórcio, tem a
ideia que existem uns mapas alusivos a isso (cfr. o quadro de fls 4160 efectuado pela
perícia, donde emerge que uma verba aproximada de 50.000 cts destinou-se à “Resin” e
o restante à “Ecop”).
Relacionaram o adiantamento aludido no manuscrito do arguido Júlio, constante
de fls 170, com o adiantamento referido.

402
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Desse manuscrito resulta que existiram contactos com a “Resin” e que essa
empresa se disponibilizou por contribuir com 20.000 cts.
Ora, o FCF respondeu à missiva de fls 92 do apenso 14 que lhe havia sido
remetida pela CCAM, conforme cópia da missiva de fls 63 do apenso 17 (data de
04.12.98), comunicando que estaria em condições de proceder ao pagamento dos 20.000
cts em falta até ao final do ano, depois de terem contactado várias entidades. Essa
missiva mostra-se assinada pelo arguido Júlio Faria e pela testemunha Álvaro Costa.
A PJ recolheu documentos que comprovam o depósito desses 20.000 cts na
conta do FCF, 12.500 cts em cheque da “Resin”, datado de 29.12.98 (cuja cópia foi
remetida com a denúncia anónima de fls 217; cfr. ainda o talão de depósito de fls 431 do
apenso 96-A, alusivo ao depósito desse cheque no dia 30.12.98, às 16.25 horas), e o
restante em numerário (ver talão de depósito de fls 447 do apenso 96-A, respeitante ao
depósito dessa verba em numerário na conta do FCF, no banco “Totta & Açores”, em
30.12.98, às 16.27 horas).
O FCF emitiu uma factura no montante de 20.000 cts a favor da “Resin”, datada
de 30.12.98 (cfr. fls 465 do 2º volume), alusivo a donativo (a testemunha referiu que
tinha a ideia que essa factura era alusiva a publicidade).
A fls 464 consta a respectiva carta que enviou essa factura à “Resin”, onde se
procede ao agradecimento da comparticipação monetária concedida para ajuda do
normal desenvolvimento da época desportiva 98/99. Tratando-se de uma carta em que
se agradece a comparticipação, o respectivo teor é compatível com o recebimento de um
donativo.
Essa factura, porém, foi substituída por outra, no montante de 12.500 cts, ainda
alusiva a donativo (a testemunha tinha a ideia que seria alusiva a publicidade) – cfr.
documento de fls 427 do apenso 96-A).
Esta factura foi também substituída por uma outra, no mesmo valor de 12.500
(mais IVA, o que perfazia o montante global de 14.625.000$00), mas desta feita alusiva
a publicidade no estádio (cfr. documento de fls 429 do apenso 96-A).
A fls 433 do apenso 96-A consta um talão de depósito na conta do FCF de um
cheque da “Resin”, no montante de 2.125.000$00 e datado de 29.01.99, respeitante ao
pagamento do IVA a que se reporta a factura de fls 429 do apenso 96-A.
A fls 443 do apenso 96-A consta cópia do aludido contrato de publicidade, no
montante de 12.500 cts, contrato esse que foi datado de 03.08.98.
Tem a ideia que a “Resin” emitiu uma factura à CMF (de 31.12.98, no valor de
23.806.575$00) - cfr. documento de fls 444 do apenso 96-A - e que veio a ser
devolvida (o arguido Barbieri não a visou) porquanto nessa data competia à AMVS
proceder ao pagamento dos serviços descritos nessa factura (serviços de reabilitação e
manutenção da lixeira de Sendim) – cfr. a carta da CMF que devolveu essa factura,
constante de fls 445 do apenso 96-A, datada de 08.01.99 e assinada pelo arguido
Barbieri Cardoso.
No documento de fls 198 e 199 do apenso 105-A (anúncio a publicitar o
concurso internacional para a construção do aterro RIB), ponto 4.2.3., al. b), está
incluída a selagem da lixeira de Sendim.
A fls 233 e ss. do apenso 105-A (caderno de encargos dessa obra), no ponto
2.4.1., está prevista a recuperação e o encerramento das lixeiras, sendo certo que no
ponto 3.3.3. (cfr. fls 235 do apenso 105-A) faz-se referência ao encerramento da lixeira.
A fls 340 e ss. do apenso 105-A, consta a análise das propostas apresentadas,
onde se contempla também o encerramento das lixeiras (tratava-se de um dos
subcritérios de apreciação das propostas).

403
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 388 e ss. do apenso 105-A consta uma cópia do contrato de empreitada
celebrado entre a AMVS e o consórcio vencedor do concurso internacional em causa,
onde está incluído o encerramento da lixeira.
De resto, na última factura remetida pela “João Tello” à CMF a arguida Fátima
apôs um despacho chamando à atenção para o facto de que a partir de Abril 1997 a
responsabilidade do pagamento é da AMVS.
Deduz pois que não haveria nenhuma razão para que a “Resin” emitisse à CMF
a factura de fls 444 do apenso 96-A.
Tem a ideia que esta factura foi anulada a 27.12.99 (cfr. fls 446 do apenso 96-
A), quase um ano depois de ter sido emitida.
No seu entendimento, a emissão desta factura tratou-se de uma tentativa de
reaver da CMF o que doou ao FCF.
Confrontado com o documento de fls 545 e ss. constatou-se tratar-se de uma das
propostas de acordo entre a CCAM e o FCF. Nesse documento está aposto um carimbo.
Não parece lógico fojar-se um contrato de publicidade para esconder um
donativo, não percebendo qual a razão que lhe está subjacente (relativamente aos 12.500
cts que estão contabilizados). A “Resin” teria interesse fiscal em que a entrega dessa
quantia se tivesse processado a título de donativo e muito mais interesse teria se fosse
contabilizado a esse título os 20.000 cts.
Relativamente à lixeira de Sendim não existem outras empresas, para além das
que referiu a propósito deste ponto da pronúnica e dos outros a que já foi ouvido, que
tenham emitido facturas à CMF.
Pensa que só depois da construção do aterro é que se criaram condições para a
selagem da lixeira de Sendim.
Presume assim que tenha existido um hiato de tempo em que continuou a
deposição do lixo na lixeira de Sendim sem que esta estivesse assim selada.
Parece-lhe que a “Resin” não tinha suporte legal para remeter à CMF a factura
de fls 444 do apenso 96-A.
Não sabe porém se os trabalhos nela referidos se reportam a trabalhos efectuados
antes do encerramento da lixeira de Sendim.
À época a arguida Fátima Felgueiras era a presidente da Assembleia Geral do
FCF.
Era uma pessoa informada acerca do que se passava no FCF, até porque na CMF
apreenderam muitos documentos alusivos ao FCF (por exemplo, iniciativas para recolha
de fundos para o clube e comunicação de assuntos relacionados com o FCF).
Ela, enquanto autarca, aprovou subsídios concedidos ao FCF.
Sem o apoio da CMF não seria possível o acordo celebrado entre a CCAM e o
FCF.
O FCF era a entidade desportiva mais representativa do concelho e por isso
considera legítimo que a arguida Fátima, enquanto presidente da edilidade, se
preocupasse com esse clube.
Em Portugal o futebol é que movimenta as massas, sendo certo que o FCF teve
um período de grande projecção quando subiu à 1ª divisão, mas quando desceu de
divisão começou a existir um afastamento das pessoas em relação ao clube.
Da experiência que tem na investigação de câmaras municipais, constatou que o
futebol costumava ser uma preocupação dos autarcas.
A esse propósito, recorda-se que a CMF usou um documento que copiou da CM
de Guimarães.

- Testemunha Maria Leonor Alves da Costa

404
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

3. Referiu que o arguido Gabriel Almeida, ao final da tarde, em Outubro ou


Novembro (não se recorda do ano, mas à data o arguido Horácio ainda não era vereador,
pois era o responsável pelo Centro Coordenador de Transportes), num dia que estava
chuvoso, já que ele trazia uma gabardina cinzenta, na CMF (estava a depoente no seu
posto de trabalho), dirigiu-se-lhe e perguntou-lhe pelo arguido Horácio Costa, tendo-lhe
então transmitido que ele tinha saído há minutos e que provavelmente voltaria. Ele
trazia uma pasta escura e disse-lhe que aguardaria pelo regresso do arguido Horácio.
Algum tempo depois o arguido Gabriel disse-lhe que não poderia esperar mais,
tendo-lhe deixado a dita pasta escura (própria para transportar documentos, não se
recordando como fechava) e um cartão (não sabe se ele o redigiu ali ou se já o tinha
redigido).
Porquanto não verificou, não sabe o que estava escrito no cartão de visita
(acabou por referir não ter reparado se o cartão era manuscrito ou se era pré-impresso).
O dito arguido Gabriel pediu-lhe então para entregar a dita pasta e o dito cartão
ao arguido Horácio Costa.
A depoente não verificou qual era o conteúdo da dita pasta, tendo entregue tudo
ao arguido Horácio nesse dia, dizendo-lhe que lhe fora entregue pelo arguido Gabriel,
cujo nome já era familiar à depoente (já o tinha visto algumas vezes).
O arguido Horácio não fez consigo qualquer comentário acerca desse assunto.
Só dessa vez entregou algo ao arguido Horácio proveniente do arguido Gabriel.
*
O arguido Horácio Costa assegurou, por seu turno, que, proveniente da
“Resin”, nada recebeu das mãos da testemunha Maria Leonor.
Reafirmou que quem lhe entregou a pasta referida nos autos foi o arguido
Gabriel pessoalmente.
Isto não quer dizer que a “Resin” não tenha entregue algo à testemunha Leonor,
mas não era dirigido ao depoente.
*
Pela testemunha Maria Leonor foi entretanto reafirmada a sua versão dos
factos.

Análise critica
No que se refere ao intróito, já se deixou expresso que o Tribunal não se
convenceu que o arguido Carlos Marinho tenha sido um dos cérebros do plano
engendrado e que permitiu, por um lado, à “Resin” ver os serviços prestados de facto à
CMF totalmente pagos e, por outro, que o PS de Felgueiras, o FCF e a arguida Fátima,
por essa via, obtivessem verbas daquela.
Seja como for, ele terá auxiliado os arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e
Júlio Faria a levar por diante tal plano, em face das funções que exerceu na “Resin”
(como contabilista primeiro e depois como director financeiro), facto que aliás se
depreende da circunstância de ter elaborado as facturas e procedido a pelo menos duas
das entregas em numerário, conforme infra se irá melhor analisar.
Por outro lado, é certo que o arguido Gabriel Almeida apenas foi admitido ao
serviço da “Resin” em Setembro de 1997, conforme cópia do respectivo contrato de
trabalho que juntou com o seu requerimento de abertura de instrução, assumindo as
funções de director-geral de exploração, sendo o responsável pelas lixeiras e aterros,
designadamente da zona do Vale do Sousa.
Porém, a prova testemunhal produzida não foi de molde a que o Tribunal
pudesse em concreto definir os parâmetros da sua acção, conforme alegado na
respectiva contestação, artgs 20º e 21º.

405
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

De facto, a razão de ciência das testemunhas que a propósito depuseram


pareceu-nos algo genérica e vaga.
Seja como for, quando foi admitido ao serviço da “Resin”, a 01.09.97 (cfr. cópia
do respectivo contrato de trabalho), o plano que permitiu a efectivação de “retornos” no
âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor” há muito que tinha sido já
engendrado pelos arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e Júlio Faria (plano esse
que naturalmente precedeu a celebração desse negócio jurídico e terá sido engendrado
por ocasião da reunião realizada na CMF em 11.04.95), pelo que o arguido Gabriel ter-
se-á limitado a proceder à entrega em numerário referida na pronúncia, conforme
confirmado pelo arguido Horácio, sendo certo que, em face das funções que então
exercia na “Resin” (inclusive com poder para, em nome dela, firmar contratos,
conforme chegou a ser referido) e do teor dos documentos que então entregou a este,
conclui-se que teria de ter conhecimento do aludido plano e que a quantia entregue
constituía um “retorno”.
A razão alegada na sua contestação para o facto de, a propósito da lixeira de
Sendim, sempre contactar o arguido Horácio Costa é, no mínimo, bizarra e só se
percebe no âmbito de entregas em dinheiro, visto que à data o arguido Horácio já estava
encarregue da angariação de fundos para a campanha eleitoral de 1997, além de que só
em Janeiro de 1999 assumiu as funções de vereador.
Isto posto, cabe referir que nem todos os contratos viram o seu valor empolado,
sendo certo que a “Resin” de facto prestou os serviços que lhe foram pagos (não se
provou pois que ela não tenha executado qualquer serviço na lixeira de Sendim ou que
os preços praticados relativamente a esses serviços prestados naquela lixeira tenham
sido empolados).
O único empolamento provado reporta-se apenas à proposta apresentada pelo
consórcio “Resin”/”Sita”/“Ecop” no concurso internacional para a
concepção/construção/exploração do aterro RIB de Felgueiras, conforme já tivemos a
oportunidade de referir (não se demonstrando porém que a arguida Fátima e o arguido
Júlio tenham ido qualquer coisa a ver com essa empolação de valores).
De facto, no que se refere ao contrato de transacção celebrado com a testemunha
Menezes Basto e respectivo aditamento, ao contrato celebrado entre a CMF e a
“Norlabor”, ao contrato de transacção celebrado entre a edilidade e a “Resin” e ao
contrato celebrado entre a CMF e a “João Tello”, não se provou que os valores
envolvidos não correspondam a trabalhos efectivamente efectuados (pela “Resin”) ou
que esses valores tenham sido empolados.
A simulação do contrato de transacção e respectivo aditamento celebrados entre
a CMF e a testemunha Menezes e a simulação das adjudicações à “Norlabor” e “João
Tello”, também pela CMF, são relativas, nos moldes já acima explicitados (o que a
CMF pretendia de facto, com a celebração daqueles contratos, era, além do mais, pagar
os serviços prestados na lixeira de Sendim pela “Resin”, de sorte que a testemunha
Menezes Basto e as empresas “Norlabor” e “João Tello” mais não foram do que “testas
de ferro”).
Ora, nenhum meio de prova produzido – pericial, documental, testemunhal ou
por declarações de arguidos – aponta no sentido inequívoco do empolamento de valores
no que a esses contratos se refere, antes pelo contrário (a “Resin” aliás não terá
facturado todos os trabalhos que efectuou na lixeira de Sendim, sendo certo que o
volume de deposição de resíduos foi crescente e prolongou-se no tempo para além do
previsto – cfr., a propósito, designadamente, as declarações que foram assertivamente
proferidas pelo arguido Barbieri Cardoso, em conjugação com a documentação que
juntou aos autos já no decurso do julgamento e já acima mencionada).

406
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É certo que a existência de “retornos” no âmbito do contrato celebrado com a


“Norlabor” poderá fazer levantar a suspeita de um empolamento de valores dessa ou de
outras empreitadas de modo a permitir esses mesmos “retornos”.
Porém, é de salientar que esse contrato cobre 6 meses de trabalhos a 2.800 cts +
IVA, conforme já tivemos a oportunidade de explicitar, sendo certo que não foi possível
estabelecer qualquer ligação entre a primeira entrega de 5.000 cts e qualquer um dos
contratos mencionados no 1º capítulo da pronúncia, bem como não foi possível apurar
qualquer outro “retorno”, para além dos que se assinalaram (apenas circunscritos ao
contrato celebrado com a “Norlabor”), já que, além do mais, não se provou que no
âmbito do contrato celebrado com a “João Tello” tivesse existido qualquer “retorno”.
Nessa medida, os pagamentos efectuados pela CMF ao abrigo desses contratos
eram devidos de facto à “Resin”, apesar dos pagamentos formalmente terem sido
efectuados a outras entidades (com excepção naturalmente do contrato de transacção
referido no ponto 1.4 da pronúncia).
Consequentemente, por força da celebração de tais negócios jurídicos nenhum
prejuízo patrimonial sofreu o município felgueirense.
Também não se convenceu o Tribunal que os contratos de locação celebrados
com a testemunha Menezes Basto tenham sido simulados, pois a CMF de facto utilizava
à época o terreno pertencente àquela testemunha para a deposição dos resíduos
domésticos e industriais do concelho, tendo sido explicado em que circunstâncias essas
contratos de locação foram celebrados e porque razão os respectivos termos se tornaram
mais gravosos para a autarquia (era uma forma de pressão por banda da testemunha
Menezes para que a CMF abandonasse o local – cfr., designadamente, os depoimentos
do arguido Júlio Faria e das testemunhas Menezes e Campos).
Seja como for, conforme já referido, pelo menos parte dos valores recebidos pela
“Resin” no âmbito do contrato mencionado no ponto 1.3 da pronúncia foram
“devolvidos”, isto é, parte desses valores foram entregues aos arguidos Fátima
Felgueiras e Júlio Faria, na pessoa dos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas, os
quais procederam ao respectivo depósito na conta do BES ou na “caixa”, segundo plano
delineado em Abril de 1995.
Tal não significa porém que tenha existido qualquer empolamento de valores
que permitisse à “Resin” devolver essas verbas; significa apenas que, de facto, a
“Resin” abdicou de parte das verbas a que tinha direito por força dos trabalhos
efectudos na lixeira de Sendim (naturalmente que se tende a “dar com uma mão e a
receber com a outra”, mas as razões que estiveram na base desse abrir mão de verbas
por parte da “Resin” não foram apuradas, não cabendo ao Tribunal alvitrar cenários
especulativos que não têm real sustentação na prova produzida).
Ademais, como já se deixou antever, não se demonstrou de todo quaisquer
outros “retornos”, provenientes de pagamentos respeitantes a outros contratos em que a
CMF foi parte.
Na verdade, conforme infra se procurará demonstrar, a “Resin” procedeu a três
entregas em numerário aos arguidos Fátima e Júlio (através dos arguidos Horácio e
Joaquim Freitas) e concedeu um donativo de 20.000 cts ao FCF.
Não se demonstrou porém, como já se deixou antever, que a primeira entrega
(de 5.000 cts) se reporte a qualquer “retorno”, pois não é possível estabelecer qualquer
ligação entre a entrega dessa verba e qualquer pagamento efectuado pela CMF ao abrigo
de qualquer um dos contratos mencionados nos pontos 1.2. a 1.4 da pronúncia.
A segunda e terceiras entregas de dinheiro pela “Resin” são claramente
“retornos”, conforme infra se verá, reportados a pagamentos efectuados no âmbito do
contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor”, referido no ponto 1.3. da pronúncia.

407
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Já vimos que com a celebração do contrato entre a CMF e a “Norlabor”


pretendia-se o pagamento dos trabalhos executados pela “Resin” entre Fevereiro de
1995 e Julho do mesmo ano.
A CMF, por seu turno, no âmbito de tal contrato, procedeu a três pagamentos, os
quais tiveram como destino final a “Resin” (cfr., designadamente, o relatório de fls 2286
e ss.).
Chama-se à atenção para o facto da primeira entrega em numerário (em Julho de
1997, no valor de 5.000 cts e que serviria para abrir a conta do BES, juntamente com
mais 1.000 cts cuja proveiniência não foi explicada) ser a primeira de outras que haviam
sido previamente combinadas, conforme emerge dos termos do documento de fls 199 do
1º volume dos autos.
Assim, pode-se concluir com propriedade, que o arguido Vítor Borges combinou
com os arguidos Fátima Felgueiras e Júlio Faria entregas em numerário
(designadamente para o financiamento das actividades do PS de Felgueiras, mormente
para custear as despesas da campanha eleitoral de 1997 - note-se que essas entregas
ocorreram já perto do período de campanha eleitoral – e para custear despesas da
arguida Fátima, designadamente com a aquisição de uma viatura automóvel).
Porém, no que toca a essa entrega de 5000 cts (a que adiante iremos dar mais
atenção), nenhuma relação segura pode ser estabelecida com o primeiro pagamento
efectuado pela CMF no âmbito do contrato mencionado no ponto 1.3 da pronúncia (o
primeiro pagamento ocorreu em Junho de 1996 e foi no montante líquido de
4.738.095$00). É certo que com o recebimento do valor retido pela CMF referente a
esse pagamento obtemos o valor global de 5.000 cts, mas, como se disse, nenhuma
relação pode ser estabelecida entre esse pagamento e essa entrega em numerário (tanto
mais que os dois “retornos” reportados a essa empreitada calcularam-se com base nos
valores efectivamente recebidos, deduzidos do valor correspondente à diferença de IVA
e de uma “comissão” ou “custo do justificativo”).
Aliás, em consciência, para além da mera suspeita, não pode o Tribunal
relacionar essa entrega de 5.000 cts com qualquer pagamento efectuado pela CMF no
âmbito de qualquer um dos contratos celebrados pela edilidade com as supra referidas
entidades (Menezes Basto, “Norlabor” e “João Tello”). Teremos pois que partir do
pressuposto de que se tratou de um donativo concedido pela “Resin” (o que não é de
todo de estranhar pois a lixeira controlada de Sendim era um projecto emblemático para
a “Resin”, o qual lhe serviria de “cartão de visita” relativamente a outros potenciais
clientes dos seus serviços, conforme emergiu das declarações prestadas pelo arguido
Vítor Borges, de modo tal que essa empresa esteve disposta a trabalhar não obstante os
relevantes atrasos no pagamento pela CMF e apesar de ter praticado um preço que
grosso modo pouco mais cobria que os custos de produção).
Em todo o caso, conforme já se deixou antever, convenceu-se o Tribunal que a
totalidade do segundo pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor”, no montante
líquido de 6.633.334$00 e deduzido do valor correspondente à diferença da taxa de IVA
(de 17% para 5%) e do “custo do justificativo” (segundo os inspectores da PJ ouvidos
corresponderá ao custo da emissão de facturas falsas 13 ) foi entregue nos moldes
descritos pelo arguido Horácio, estribado nos documentos de fls 158 a 161 dos autos.

13
As facturas emitidas para justificar contabilisticamente os pagamentos e recebimentos efectuados entre
as empresas envolvidas, de modo a que os pagamentos efectuados pela CMF fossem parar à “Resin”, são
falsas na medida em que não correspondem à existência de qualquer relação jurídica que justifique
qualquer pagamento da “Norlabor” à “Translousada” (cfr. facturas de fls 63 a 67 do apenso 97, onde se
refere o aluguer de equipamento) e desta à “Resin”. As facturas emitidas pela “Resin” foram elaboradas
pelo arguido Carlos Marinho, o qual não podia deixar de saber da respectiva falsidade, isto é, que não

408
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Tribunal convenceu-se pois que o documento de fls 159 se reporta ao segundo


pagamento efectuado pela CMF à “Norlabor” na medida em que o valor ilíquido e o
valor líquido do pagamento em causa é coincidente com o que de facto foi pago pela
CMF no âmbito desse contrato (não se vislumbrando a que outro pagamento efectuado
pela CMF se possa referir que não esse), pelo que terá havido lapso na data indicada
como tendo sido a de pagamento 14 (ali se refere que o pagamento foi efectuado em
14.05.97, quando na verdade o cheque referente ao segundo pagamento efectuado pela
CMF data de 12.05.98 – cfr. documento de fls 1910 dos autos -, que a “Norlabor
depositou na sua conta, tendo emitido um cheque de igual valor à “Translousada”, o
qual foi endossado à “Resin” – cfr. documento de fls 4097 dos autos -, tendo esta
finalmente procedido ao depósito da respectiva quantia a 15.05.98 – cfr. documento de
fls 196 do apenso 97 – e devolvido a quantia de 5.250.000$00 cerca de um mês depois,
a 16.06.98, nos moldes indicados na pronúncia).
Ainda a propósito da data, poder-se-á questionar por que razão no documento
em causa foi aposta a data de 14.05 (quando o cheque da CMF é de 12.05. e o depósito
pela “Resin” foi efectivado a 15.05.). Ora, tendo presente que a “Resin” emitiu o
respectivo recibo à “Translousada” a 14.05. (cfr. documento de fls 4630 dos autos),
assim se explica que apareça aquela data no documento de fls 159 (com o lapso na
indicação do ano, conforme já referido).
É de salientar ainda que no verso desse recibo tinha sido aposto a lápis
referências a um acerto de contas em virtude de entre as empresas se facturar o IVA a
17% e da “Norlabor” facturar à CMF o IVA a 5%, conforme então legalmente
estabelecido quando se tratassem de empreitadas de obras públicas, como era o caso,
referências essas que foram apagadas à pressa por uma funcionária da “Norlabor”
aquando da “visita” da PJ às respectivas instalações, as quais, não obstante, entretanto
viriam a ser recuperadas pelo LPCPJ – cfr. o relatório de exame fls 4628 e as
declarações prestadas a esse propósito pelos inspectores da PJ ouvidos (curioso é o facto
da “Resin” ter facturado à CMF a taxa de 17%, conforme se constata nas facturas juntas
aos autos pelo arguido Carlos Marinho, o que só seria legítimo se apenas se tratasse de
uma mera prestação de serviços e não de uma empreitada; note-se que a dada altura
colocou-se a questão na CMF de se saber se os serviços prestados pela “Resin” diziam
respeito a uma mera prestação de serviços ou a uma empreitada – cfr. as declarações
proferidas pelos arguidos Carlos Marinho e Barbieiri Cardoso e pela testemunha
Fernanda Leal a esse propósito).
Outro factor que levou o Tribunal a convencer-se que o documento de fls 159 se
reporta ao segundo pagamento efectuado à “Norlabor” é o facto de, aquando da entrega
da respectiva quantia em numerário ao arguido Horácio, no rol dos documentos que lhe
foram entregues, constar precisamente cópia da respectiva guia de receita e do cheque
emitido pela CMF a favor da “Norlabor”.
Salienta-se mais uma vez a absoluta credibilidade que, na apreciação do
Tribunal, mereceram as declarações prestadas a esse propósito pelo arguido Horácio
Costa, em face da forma assertiva como depôs, do relato cheio de pormenores dos
encontros aquando das entregas em numerário e do seu depoimento ser corroborado por
prova documental, alguma da qual apreendida na “Norlabor” (o recibo por esta emitido
e a que se reporta o auto de exame de fls 4628) e na “Resin” (note-se por exemplo que

correspondiam a qualquer serviço prestado pela sua entidade patronal à “Translousada”. Sabia pois do
“esquema” e auxiliou na sua execução (quer através da aparência contabilística que assim criou, quer
através de uma das entregas em numerário que protagonizou).
14
O pagamento ocorreu em 1998 e não em 1997.

409
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

no documento de fls 1112 15 dá-se conta de que tinham sido entregues em numerário
25.000 cts - relacionar-se-á essa indicação com os primeiros 5.000 cts entregues aos
arguidos Horácio e Joaquim Freitas e com o donativo de 20.000 cts concedido ao FCF?
Note-se ainda que no documento de fls 12 do apenso 22 16 , no verso, existe uma
inscrição manuscrita que refere o recebimento e a devolução das verbas entregues pela
“Norlabor” e “João Tello”. Procurou-se fazer crer que essa “devolução” o teria sido à
“Translousada” – empresa que se interpôs no circuito do dinheiro -, ante a circunstância
dela receber na medida em que a “Resin” também recebesse, sendo certo porém que,
não obstante esse acordo entre ambas, a “Resin” chegou a pagar antecipadamente os
serviços prestados por ela, segundo o arguido Vítor Borges. Essa explicação parece não
fazer grande sentido, pois, a ser verídica, não se perceberia por que razão a
“Translousada” não reteria os valores a que teria direito, uma vez na posse das quantias
monetárias e antes de as remeter à “Resin”, a destinatária final das mesmas. Essa
explicação foi apenas levantada como mera hipótese e não colheu qualquer crédito por
parte do Tribunal).
Além disso, não foi possível esclarecer – porquanto nenhuma explicação se
obteve – por que motivo, aquando da segunda entrega em numerário, no rol de
documentos entregues, constava uma cópia de duas facturas emitidas pela “Resin” à
AMVS, reportadas a trabalhos levados a cabo na lixeira de Sendim, constantes de fls
160 e 161.
Também o terceiro pagamento efectuado de facto à “Resin” (valor líquido) foi
devolvido na íntegra (deduzida da quantia referente a IVA calculado a 17% e da
“comissão” de 12% - verba que terá a mesma explicação que o “custo do justificativo”,
segundo os inspectores da PJ ouvidos, estribados na respectiva experiência
profissional). A este propósito foram relevantes as declarações prestadas pelo arguido
Horácio Costa, para as quais se remete. A forma assertiva como depôs e os documentos
pertinentes que referiu tornam credível o teor do seu depoimento, nessa parte.
Parece que para alguns o débito de pormenores a propósito dos encontros será
motivo de descrédito do depoimento do arguido Horácio. Esse facto foi apreciado de
forma radicalmente diferente pelo Tribunal, pois os pormenores contados pelo arguido
Horácio a propósito dos vários acontecimentos, na nossa óptica, conferiram
credibilidade ao seu depoimento (e não se equipara à situação descrita com humor negro
nas alegações pelo ilustre mandatário dos arguidos Vítor e Carlos acerca da mulher que,
ao ser violada, tem presença de espírito para contar os 37 peixinhos que nadavam num
aquário, facto que pelos vistos relatou ao Tribunal que procedia ao julgamento do
suposto violador; ora, a profusão de pormenores pode ser um factor de descrédito ou de
crédito de determinado depoimento, tudo dependendo do respectivo contexto; e, no caso
dos autos, não se vislumbra qualquer semelhança, ainda que remota, com a “história dos
peixinhos” e da pouco provável violação).
Ademais, convencemo-nos que o documento de fls 163 se reporta ao terceiro
pagamento (efectivado a 21.10.98) na medida em que o valor líquido apresentado é
coincidente com ele, não se vislumbrando a que outro pagamento tal documento se
possa reportar, em face dos fluxos financeiros ocorridos entre a CMF e as empresas
referidas, além de que esse “retorno” efectivou-se a já no final do ano de 1998 (Outubro
ou Novembro, segundo o arguido Horácio, o qual se inclina mais para a segunda
hipótese).
Além disso, fazendo ainda fé nas declarações proferidas pelo arguido Horácio
Costa, com a entrega da respectiva quantia em numerário foi ainda entregue, além do
15
Apreendido na “Resin”.
16
Apreendido na “Resin”.

410
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

mais, cópia da guia de receita alusiva a esse pagamento à “Norlabor” pela CMF, daí que
se possa e deva estabelecer a ligação evidente entre esses documentos (acondicionados
numa pasta então em uso pela “Resin”).
Não atribui o Tribunal particular significado às diferenças registadas nos
documentos de fls 159 e 163 quanto à forma de cálculo do valor a devolver. Quem as
poderia explicar não o fez porque não quis, segundo nos convencemos.
Rejeita-se por completo que tais documentos tenham sido forjados pelo arguido
Horácio Costa ou por qualquer outra pessoa para dar a aparência dos factos tal como
plasmada na pronúncia, já que, como se disse e se reafirma, as declarações prestadas por
aquele arguido pareceram-nos credíveis – tanto mais que têm sustentação em prova
documental, alguma da qual apreendida pela PJ quer na “Resin” quer na “Norlabor” -,
além de que não se vislumbra qualquer interesse da sua parte em ocultar a “verdade dos
factos” contando uma versão que em última análise também o poderá prejudicar. Ser-
lhe-ia mais fácil e seguro, pura e simplesmente, negar o recebimento de qualquer
quantia em numerário por parte da “Resin” e inclusive não ter fornecido à PJ os
documentos referenciados.
Ademais, se tais documentos tivessem sido forjados, como expressão de um
plano cerebralmente levado a cabo para prejudicar a arguida Fátima Felgueiras e seus
sequazes, certamente que deles não constariam diferenças quanto à forma de cálculo dos
“retornos” nem qualquer lapso em termos de datas.
Isto posto, cabe agora salientar que não se convenceu o Tribunal da efectivação
de algum “retorno” no âmbito do contrato celebrado pela CMF com a firma “João
Tello” (como de resto com a testemunha Menezes Basto).
Se em relação ao contrato de transacção e seu aditamento celebrado entre a CMF
e a testemunha Menezes Basto inexiste qualquer elemento de prova que aponte no
sentido da existência de qualquer “retorno”, é certo que no que respeita ao contrato
celebrado entre a edilidade e a “João Tello”, no documento de fls 12 do apenso 22, no
verso, estão manuscritos uns dizeres donde parece resultar que a “Resin” recebeu e
devolveu os pagamentos efectuados à “Norlabor” e à “João Tello” (esse documento foi
apreendido na “Resin”).
Ora, já vimos que não se convenceu o Tribunal que esse retorno se reporte à
“Translousada”.
O certo, porém, é que não sabemos quem apôs esses dizeres nem em que
circunstâncias essa aposição ocorreu, sendo certo que, para além desse elemento – que
reputamos de insuficiente – nenhum depoimento ou documento confirma ou desmente
algum “retorno” no âmbito desse contrato mencionado no ponto 1.4 da pronúncia
(quanto à “Norlabor” estamos já conversados).
Dito doutro modo, essa inscrição no verso daquele documento de fls 12 do
apenso 22 é insuficiente em ordem a dar-se como demonstrado qualquer “retorno” no
âmbito do contrato mencionado no ponto 1.4 da pronúncia, em obediência ao princípio
in dubio pro reo.
Ora, tendo-se apenas provado a entrega em quatro ocasiões distintas de verbas
em numerário pela “Resin”, que duas delas se reportam a dois “retornos” referentes a
pagamentos emergentes do contrato celebrado com a “Norlabor”, não tendo sido
possível relacionar a entrega dos primeiros 5.000 cts com qualquer “retorno” e que o
donativo de 20.000 cts ao FCF não se prende com nenhum dos contratos mencionados
nos pontos 1.2 a 1.4 da pronúncia, conclui-se que não demonstrou que alguma verba
tenha sido devolvida no âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a “João Tello” ou
do contrato de transacção e seu aditamento celebrado entre a CMF e a testemunha
Menezes Basto.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Convenceu-se pois o Tribunal que existiram apenas dois “retornos” respeitantes


ao contrato mencionado no ponto 1.3. da pronúncia.
A efectivação desses “retornos” não significa necessariamente, conforme já se
disse e se reafirma, que os valores da empreitada a que se reporta o ponto 1.3. da
pronúncia tenham sido sobreavaliados, sendo certo que a “Resin” viria a ser
compensada dos valores em dívida via aterro RIB. Note-se que o arguido Vítor Borges
pretendia mostrar “obra feita” de modo a angariar potenciais clientes, apresentando a
reabilitação da lixeira de Sendim como exemplo, nem que para isso a “Resin”, nessa
obra, não retirasse lucros (daí talvez a sua obstinação em prosseguir com os trabalhos
não obstante as dificuldades na obtenção dos pagamentos, seja por questões de índole
formal e administrativa seja por falta de verbas por banda da CMF, sendo certo que uma
paragem nos trabalhos implicaria o retornar à deposição descontrolada dos resíduos,
deitando a perder os trabalhos de reabilitação entretanto levados a cabo pela “Resin” na
lixeira de Sendim). De resto, em face dos montantes em dívida pela CMF e em face do
facto dos trabalhos, por esse motivo, não terem cessado (de modo a evitar o avolumar
da dívida), terão existido atritos com os accionistas da “Resin”, conforme se depreende
de alguns depoimentos.
Não se demonstrou porém, como já se deixou expresso, que essa forma de
compensação dos valores em dívida (via aterro RIB) tenha passado pelo acordo da
arguida Fátima Felgueiras e do arguido Júlio Faria (no que a este último concerne, cabe
referir que a decisão da simulação dos concursos já vinha do tempo em que ele era
pesidente da autarquia – cfr. o depoimento do arguido Barbieri Cardoso – e o donativo
de 20.000 cts concedido pela “Resin” ao FCF dependeu do recebimento do valor do
adiantamento no que se refere à empreitada mencionada no ponto 1.5. da pronúncia;
aliás, se esse montante se destinasse na íntegra à “Ecop”, mal se perceberia essa
dependência, a qual emerge do manuscrito de fls 170 dos autos. Além disso, esse
arguido – Júlio Faria - teve uma acção decisiva na abertura da conta do BES e, segundo
o arguido Horácio, era-lhe dado conhecimento dos respectivos movimentos, de sorte
que era ele e a arguida Fátima quem controlavam essa conta bancária. Assim se explica
que tenha beneficiado de alguns pagamentos, que tenha ordenado pelo menos um
pagamento a favor da testemunha Orlando Sousa – cfr. manuscrito de fls 171 - e que por
essa via tenha conseguido um donativo de 20.000 cts para o FCF).
Seja como for, tendo-se demonstrado que foi a “Resin” quem operou na lixeira,
subcontratando os serviços da “Translousada”, e que o valor aposto no contrato referido
no ponto 1.3 da pronúncia diz respeito a 6 meses de trabalhos (2.800 cts + IVA), não se
vislumbra nos autos qualquer elemento documental seguro que permita ao Tribunal
concluir que houve sobreavaliação dos trabalhos executados (nem isso emerge da prova
pericial, documental e testemunhal produzida ou das declarações proferidas pelos
arguidos, antes pelo contrário).
Pela mesma razão também não se demonstrou qualquer empolação de valores no
que respeita aos contratos mencionados nos pontos 1.2. e 1.4. da pronúncia.
De facto, já vimos que o contrato de transacção celebrado entre a CMF e a
testemunha Menezes Basto visou o pagamento dos trabalhos levados a cabo pela
“Resin” na lixeira de Sendim (isto é, a respectiva reabilitação sumária, que durou 6
meses), tendo sido entretanto celebrado o respectivo aditamento para permitir o
pagamento dos trabalhos de exploração no período subsequente.
Além disso, vimos ainda que a celebração do contrato de transacção celebrado
entre a CMF e a “Resin” cobriu 4 meses e 10 dias de trabalhos, tendo sido essa a forma
encontrada para se ultrapassar a dificuldade criada pela recusa do visto pelo TC, no que
se refere ao pagamento dos trabalhos executados pela “Resin” entre a data seguinte à

412
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

data da formalização do ajuste directo efectuado a essa empresa e a recusa daquele visto
e, finalmente, também vimos que a adjudicação dos trabalhos à “João Tello” cobriu um
período de 6 meses de trabalhos (de meados de Outubro de 1996 a meados de Abril de
1997), sendo os respectivos valores consistentes com esses lapsos de período de tempo
(2.800 cts + IVA a 5% por mês).
Demonstrou-se assim que apenas houve empolação de valores no que se reporta
ao contrato celebrado entre a AMVS e a “Resin”, mencionado no ponto 1.5., e nas
circunstâncias já referidas (a que os arguidos Fátima e Júlio terão sido alheios).
Cabe ainda referir que o empolamento do valor da empreitada respeitante ao
concurso a que se reporta o ponto 1.5. da pronúncia atingiu o valor de 140.000 cts,
conforme já tivemos a oportunidade de referir.
Esse empolamento foi dissimulado na proposta apresentada a concurso e visava
essencialmente que a “Resin” visse liquidada a quantia que a CMF lhe devia (cerca de
100.000 cts + encargos resultantes da mora), sendo certo que foi esse empolamento que
permitiu ainda inflacionar o valor do adiantamento recebido pela “Resin” – de que uma
parte ficou para si, conforme já acima referido – e dessa forma proceder à concessão de
um donativo de 20.000 cts ao FCF (esse donativo foi pedido pelo arguido Júlio em
Setembro de 1998, conforme referiu o arguido Horácio Costa, e a sua concessão ficou
dependente do adiantamento referido nos autos, conforme se depreende do manuscrito
do arguido Júlio Faria de fls 170, datado de 06.11.98).
1. A propósito da entrega da quantia de 5.000 cts referida neste ponto da
pronúncia tivemos a oportunidade de ouvir duas versões radicalmente opostas:
Por um lado, os arguidos Vítor Borges, Carlos Marinho e Fátima Felgueiras
negaram a respectiva entrega (os primeiros referiram aliás que a “Resin” nunca
concedeu qualquer donativo em numerário; se assim é, como explicar a anotação
constante do documento de fls 1112, donde emerge que a “Resin” havia entregue
25.000 cts em numerário?) e a versão do arguido Horácio Costa (não se consideram
aqui, pelas razões já mencionadas, as declarações prestadas a esse propósito pelo
arguido Joaquim Freitas), as quais vão no sentido de confirmar a versão dos factos
plasmada na pronúncia (no que se refere à entrega desse donativo pela “Resin”), a qual
tem o suporte documental providenciado pelo documento de fls 198 e 199 dos autos.
É certo que a arguida Fátima assegurou que quando apôs o despacho “TC.
Óptimo. 97.06.10” não constava desse relatório a informação manuscrita aposta pelo
arguido Horácio, a qual, na sua versão, terá sido aposta posteriormente para dar aos
factos a aparência tal como consta na pronúncia.
Argumentou-se que não teria qualquer lógica a aposição dessa informação
manuscrita nesse documento, pois poderia ser comprometedora.
Porém, não se convenceu o Tribunal que esse documento tenha sido adulterado,
além do mais, porque nesse relatório foram apostos dois despachos pela arguida Fátima,
um na capa (de devolução) e outro o já referido na segunda página desse documento
(ora, apenas faria sentido a aposição de um único despacho). A aposição de dois
despachos inculca assim a ideia de que o segundo despacho apenas se refere à
informação manuscrita (cfr. os demais relatórios juntos pelo arguido Horácio, onde
apenas existe um despacho da arguida Fátima nas respectivas capas – cfr. documentos
de fls 12670 e ss., 12681 e ss. e 12689 e ss.; no documento de fls 13156 e ss. não existe
qualquer despacho na medida em que se trata de uma cópia tirada pelo arguido Horácio
antes de o entregar à arguida Fátima, conforme explicou).
Do cotejo dos documentos de fls 198 e 199 com o documento de fls 12681 e ss.
retira-se que, de facto, o documento de fls 198 não se pode referir à actividade
desenvolvida pelo arguido Horácio em Março de 1997, como por lapso é ali referido (a

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

actividade reportada a esse mês está plasmada no documento de fls 12681 e ss.), pelo
que é credível que esse relatório se reporte à actividade desenvolvida em Maio de 1997,
tanto mais que foi elaborado a 05.06.97 e os dois despachos apostos pela arguida Fátima
datam do dia 10.06.97, conforme emerge desse documento e foi referido pelo arguido
Horácio Costa.
Naturalmente que a informação manuscrita constante desse documento terá sido
exarada já depois de elaborado em computador e imprimido o documento em causa, daí
que tenha sido tal informação manuscrita pelo arguido Horácio Costa.
Além disso, não se vê qualquer motivo para estranheza quanto ao conteúdo de
tal informação, designadamente o teor da comunicação telefónica ali reportada e ao
facto do arguido Vítor Borges não ter contactado directamente com a arguida Fátima
acerca desse assunto e de o ter abordado com o arguido Horácio, o que reforça a ideia
de que este gozava da total confiança por banda da arguida Fátima Felgueiras, sendo
certo que, à data, relembra-se, ele já havia sido designado para integrar com o arguido
Joaquim Freitas o pelouro das finanças, pelo que esse assunto teria necessariamente de
passar por si, já que essa verba serviu para abrir a conta do BES, com mais 1.000 cts de
proveniência não concretamente apurada – cfr. o depósito de 6.000 cts a 11.07.97 a fls 9
do apenso 1 (faz assim sentido que a reunião em casa do arguido Júlio Faria tenha
ocorrido antes desse contacto telefónico do arguido Vítor Borges, isto é, como referiu o
arguido Horácio Costa, em Março de 1997, onde lhe terá sido entregue o manuscrito de
fls 156 e 157. Caso contrário, a que título é que o arguido Vítor Borges se sentiria à
vontade para fazer aquela comunicação ao arguido Horácio, de modo a transmití-la à
arguida Fátima? O teor dessa informação coaduna-se ainda com a circunstância do
primeiro depósito na conta do BES ter sido efectuado a 11.07.97, o que pressupõe,
conforme anunciado pelo arguido Vítor, que os 5.000 cts tenham sido de facto recebidos
no dia anterior pelo arguido Horácio Costa em Matosinhos, nos moldes por este
referidos).
Ademais, parece-nos inverosímil que o arguido Horácio adoptasse uma versão
dos factos que em última análise poderia prejudicar a sua posição, ainda que com
suicídio processual, fabricando, como foi sugerido pelos defensores da tese da cabala,
uma história e adulterando documentos que a conta-gotas fez juntar aos autos, na
execução de um plano cerebralmente delineado, na ânsia de prejudicar a arguida Fátima,
em face do suposto ódio visceral que lhe vota, pouco se importando com a possibilidade
de também vir a ser condenado.
Note-se que ao longo do julgamento o seu discurso foi sempre muito assertivo e
coerente, pelo que a defesa intransigente dessa “história” do princípio ao fim haveria,
aqui ou acolá, mais cedo ou mais tarde, de fazer notar a sua falsidade, o que nunca
sucedeu.
Mais uma vez, a abundância de pormenores relatados acerca do encontro que em
Julho de 1997 teve em Matosinhos com o arguido Vítor Borges (onde lhe terá sido
entregue o donativo) conferem credibilidade ao depoimento do arguido Horácio.
Demos pois crédito à versão apresentada a esse propósito pelo arguido Horácio
Costa, convencidos que estamos que o documento de fls 198 e 199 não foi adulterado.
Reafirma-se, em todo o caso, que não foi possível estabelecer a ligação entre
essa entrega em numerário e qualquer pagamento efectuado pela CMF no âmbito dos
contratos mencionados nos pontos 1.2. a 1.4. da pronúncia. Dito doutro modo, não se
apurou que tal donativo de 5.000 cts tenha constituído um “retorno”.
2. Acerca da entrega da quantia em numerário de 5.250.000$00, pelas razões já
acima explicitadas, demos crédito à versão dos factos tal como relatados pelo arguido

414
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Horácio Costa, quer no que respeita à entrega propriamente dita quer no que concerne
ao destino dado a esse dinheiro, conforme mais à frente melhor iremos analisar.
Consequentemente, nenhum crédito nos merece a posição sustentada, sobretudo,
pelos arguidos Vítor Borges, Fátima Felgueiras e Carlos Marinho, os quais negaram
pura e simplesmente essa factualidade.
Seja como for, não podiam os arguidos Horácio e Joaquim Freitas ignorar qual a
proveniência desse montante em numerário, em face dos documentos que com essa
verba recepcionaram, como aliás o demonstra a forma como pretenderam (mal)
camuflar o emprego de parte dessa quantia na aquisição da viatura “Audi A4” referida
nos autos.
De facto, a relação de confiança existente entre os arguidos Horácio e Joaquim
Freitas por um lado e a arguida Fátima Felgueiras por outro, a circunstância de ter sido
ao arguido Horácio (na presença do arguido Joaquim) que essa verba em numerário foi
entregue – acompanhada dos documentos referidos na pronúncia - e a forma como
pretenderam camuflar a utilização de parte dessa quantia na aquisição da viatura “Audi”
mencionada nos autos – de modo até a que não se estabelecesse qualquer ligação com a
arguida Fátima - levam-nos a crer que eles bem sabiam da proveniência desse dinheiro,
isto é, que se tratava de um “retorno” no âmbito do contrato celebrado entre a CMF e a
“Norlabor”.
Note-se que o arguido Carlos Marinho, segundo referiu, chegou a abordar o
arguido Horácio no sentido de agilizar um pagamento à “Resin” por parte da CMF, pelo
que naturalmente o dito Horácio Costa teria de se inteirar ou de estar inteirado da
situação da CMF para com a “Resin”, pois caso contrário não faria sentido que o
arguido Carlos Marinho tivesse sido encaminhado para o arguido Horácio em ordem a
que essa questão fosse resolvida (questão essa que aliás extravasava, e de que maneira,
as competências do arguido Horácio Costa, em face do contrato de avença que então o
ligava à CMF).
Quanto ao mais, a propósito da matéria em causa, remete-se para tudo quanto,
relacionado com ela, acima já se disse.
3. Mais uma vez, pelas razões já referidas e repetidas, demos crédito à versão
dos factos tal como contada pelo arguido Horácio Costa.
Ao invés, a contrario sensu, devemos dizer que nenhuma credibilidade nos
mereceu o depoimento dos arguidos Vítor Borges, Carlos Marinho e Fátima Felgueiras
a propósito dessa factualidade.
Nenhum crédito nos mereceu ainda o relato efectuado pela testemunha Leonor
Costa, que ao longo do seu depoimento, acerca das várias matérias a que foi ouvida, se
mostrou muito tendenciosa.
Assim, com entrega da quantia em numerário de 5.381.653$00, foram entregues,
acondicionados numa pasta (apreendida), os documentos referenciados na pronúncia e
já acima analisados (inclusive o cartão comercial também entregue pelo arguido
Gabriel, constante de fls 164, que parece relacionar-se com um agradecimento
antecipado pelos bons ofícios no sentido da obtenção dos pagamentos em atraso pela
CMF. Dos termos do dito cartão comercial retira-se que pertence ao arguido Gabriel,
mas não se retira a quem o mesmo é dirigido, se à arguida Fátima – conforme
sustentado pelo arguido Horácio - se ao próprio arguido Horácio, o qual, pelos vistos,
também foi abordado, designadamente pelo arguido Carlos Marinho, relativamente à
questão do atraso nos pagamentos. Em todo o caso, tem lógica que esse cartão fosse
dirigido à arguida Fátima na medida em que o arguido Gabriel não contactou
directamente com ela, mas apenas com o arguido Horácio, fazendo fé nas declarações
deste último).

415
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É de destacar o à vontade com que essas entregas eram efectuadas ao arguido


Horácio, acompanhadas daqueles documentos, o que naturalmente, além do mais, faz
presumir que ele bem sabia da proveniência dessas verbas, designadamente que
constituíam “retornos” (reportados ao contrato formalmente celebrado entre a CMF e a
“Norlabor”). Do mesmo modo o arguido Joaquim Freitas saberia da respectiva
proveniência, pois actuava em equipa com o arguido Horácio, o qual aliás foi assertivo
ao declarar que de tudo lhe ia dando conhecimento.
Por outro lado, quanto ao destino dado a essa verba, demos crédito ao
depoimento do arguido Horácio Costa, pelas razões já referenciadas (de que se destaca a
respectiva assertividade) – cfr. assim o respectivo depoimento e os documentos
referenciados aquando da respectiva reprodução por súmula a propósito da matéria em
causa.
Em todo o caso, no que ao destino dessa verba concerne, nos iremos deter com
mais detalhe a propósito do 3º capítulo da pronúncia.
4. No respeita ao donativo em causa, as versões apresentadas pelo arguido
Horácio Costa, por um lado, e pelos arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho, por outro
são radicalmente diversas, sem esquecer que de permeio, a posição assumida a esse
propósito pelo arguido Júlio Faria, com excepção da data em que esse donativo terá sido
solicitado, a qual não se coaduna inteiramente com a posição dos ditos Vítor Borges e
Carlos Marinho.
A arguida Fátima Felgueiras, por seu turno, para não variar, mais uma vez
“sacudiu a água do seu capote”.
Aquando da reprodução por súmula das declarações prestadas a este propósito
tivemos a oportunidade de expressar algumas interrogações que apontam no sentido da
incongruência das posições assumidas pelos arguidos Vítor, Carlos e Júlio.
Desde logo, não faz qualquer sentido que o donativo em causa tenha sido
solicitado no final de 1997 ou princípios de 1998 para que com a sua concessão o FCF
pudesse liquidar o remanescente de uma prestação vencida em 30 de Setembro de 1998,
ao abrigo do acordo celebrado entre esse clube e a CCAM a 15.09 desse ano.
Note-se que o arguido Júlio Faria solicitou expressamente à “Resin” um “apoio”
de 20.000 cts (cfr. também o documento de fls 170), pelo que nessa ocasião já saberia
que era essa a verba de que o FCF necessitaria para liquidar o remanescente da
prestação que se venceria em Setembro de 1998, segundo os termos do acordo
celebrado entre esse clube e a CCAM (cfr. documento de fls 109 a 113 do apenso 14 e
as circunstâncias em que esse acordo foi celebrado, segundo explicação assertivamente
fornecida pelo arguido Júlio Faria).
Na verdade, a necessidade dos 20.000 cts só surgiu com a celebração do acordo
entre o FCF e a CCAM em meados de Setembro de 1998 e depois de garantido um
apoio de 30.000 cts da “Zima” (assim, mesmo que as negociações se tenham iniciado
em finais de 1997, o certo é que, naturalmente, só muito depois é que as prestações
poderiam ser definidas, até porque foi necessário proceder à avaliação de um imóvel
transmitido à CCAM a título de dacção em cumprimento parcial da obrigação em causa
e sem esquecer que o valor em dívida foi consolidado num montante significativamente
inferior ao real valor dessa mesma dívida do FCF e respectivos garantes, o que
pressupôs, pelo menos durante algum tempo, negociações com desfecho incerto – cfr. o
depoimento dos responsáveis da CCAM. Dito de outro modo, nunca em finais de
1997/princípios de 1998 o arguido Júlio Faria saberia a que porto iriam parar as
negociações com a CCAM e muito menos que para Setembro de 1998 necessitaria de
20.000 cts e, ainda assim, depois de garantir um apoio de 30.000 cts de uma outra
empresa que não a “Resin”).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A esse propósito, nenhum crédito mereceram pois as declarações proferidas


pelos arguidos Vítor Borges e Júlio Faria (bem como o testemunho prestado por José
Loureiro, ex-funcionário administrativo da “Resin”, o qual se “lembrou” que o arguido
Horácio, aquando dessa visita à “Resin”, envergava um quispo ou um sobretudo, pelo
que deduz que era Inverno; referiu mesmo finais de 1997/princípios de 1998, como se
esse acontecimento tivesse sido marcante na sua vida 17 , sendo certo que o próprio
arguido Horácio havia referido que o dia estava chuvoso. O curioso é que se lembra
perfeitamente de um simples assessor da CMF e não reconhece o arguido Júlio Faria,
então deputado da nação...A memória selectiva dessa testemunha ilustra bem a falta de
credibilidade do respectivo depoimento).
É claro que o facto desse donativo ter sido solicitado em Setembro de 1998 não
se coaduna de todo em todo com a data expressa como sendo a da celebração do
alegado contrato de publicidade e que justificou a emissão de dois cheques pela
“Resin”, o primeiro de 12.500 cts e mais tarde de um outro cheque para pagamento do
IVA (a que acresceu 7.500 cts em numerário, segundo afirmado assertivamente pelo
arguido Horácio, totalizando assim os tais 20.000 cts que, à pressa e em vésperas de
Ano Novo – a 30.12.98 -, dois elementos do FCF se apressaram a recolher na CMF
junto do arguido Horácio e a depositar tais verbas na conta do clube, que à “perna” tinha
a CCAM a solicitar o pagamento do remanescente da prestação já vencida em 30.09.98
– cfr. documentos de fls 92 do apenso 14 e de fls 63 do apenso 17, respeitantes às
missivas trocadas a esse propósito pela CCAM e o FCF; os documentos de fls 431 e 447
do apenso 96-A, alusivos aos depósitos dessas verbas, em cheque e em numerário; e
ainda o documento de fls 450 do apenso 96, alusivo ao depósito pela CCAM do cheque
emitido pelo FCF no montante de 20.000 cts).
Com efeito, se o arguido Júlio soubesse de ante-mão que a “Resin” estava
obrigada a pagar ao FCF a quantia de 12.500 cts no final de 1998, por força dos termos
do contrato de fls 443 do apenso 96-A (alegadamente celebrado a 03.08.98), nenhum
sentido faria uma visita em Setembro de 1998 às instalações da “Resin”, de chapéu na
mão, pedindo a esta uma “contribuição” de 20.000 cts em ordem a liquidar o
remanescente da prestação vencida em 30.09.98, por força da transacção celebrada entre
o FCF e a CCAM.
Ademais, não faz qualquer sentido que para a mesma época desportiva a “Resin”
tivesse celebrado dois contratos de publicidade estática com o FCF (portanto com
objectos idênticos) e por valores radicalmente diversos, um de 1.750 cts + IVA e outro
de 12.500 cts + IVA (cfr. os documentos de fls 442 e 443 do apenso 96-A).
O documento de fls 443 do apenso 96-A é, na realidade, um “não-contrato”, pois
na verdade, sob a capa de um contrato de publicidade, o que a “Resin” pretendeu foi
conceder ao FCF um donativo de 12.500 cts + 7.500 cts.
Só assim se explica aliás a “dança” das facturas emitidas pelo FCF (cfr.
documentos de fls 464 e 465, ambos do 2º volume, bem como documentos de fls 427 e
429 do apenso 96-A, e ainda o relatório de fls 1970 e ss. e o depoimento de quem o
elaborou).
E se dúvidas houvessem em relação ao dito “contrato”, elas desfizeram-se com o
depoimento da testemunha Barata Feio (então contabilista do FCF), o qual referiu que
emitiu a primeira factura (alusiva a um donativo de 20.000 cts) segundo instruções do
arguido Júlio Faria – sinal de que este estava convencido de que se tratou de um
donativo de 20.000 cts concedido pela “Resin”, tendo-se aliás mostrado surpreendido
pelo facto desta empresa ter concedido esse donativo em cheque e em numerário,
17
Aí está um pormenor relatado pela testemunha que, naquele contexto, confere descredibilidade ao seu
depoimento E já agora, o que envergava o arguido Júlio Faria?.

417
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

segundo conversa posterior relatada pela dita testemunha Barata Feio -, sendo certo que
com o envio da primeira factura remeteu pelo correio, a fim de ser assinado, um
contrato referente a um donativo de 20.000 cts, o qual entretanto viria a ser devolvido
com a indicação (segundo contacto telefónico que recebeu) de que deveria ser emitida
uma factura alusiva a um contrato de publicidade, razão pela qual foi inutilizada com
um furo a assinatura de tal contrato e, com o envio de uma nova factura (alusiva a
contrato de publicidade), remeteu o contrato de fls 443 do apenso 96-A, a fim de ser
assinado pelo legal-representante da “Resin” (a testemunha já não se recordava da
emissão factura alusiva a um donativo de 12.500 cts, constante de fls 427 do apenso 96-
A, documento com o qual foi confrontada, mas confirmou que inutilizou as facturas nºs
1583 e 1586).
Consequentemente, este contrato só foi “celebrado” aquando do envio da factura
de fls 428 do apenso 96-A, em Dezembro de 1998 e nunca a 03.08.98, conforme dele
consta, o que faz sentido, pois foi ele que justificou contabilistamente a saída da
“Resin” de uma verba 12.500 cts + IVA, na sequência do pedido de “apoio” efectuado
pelo arguido Júlio àquela empresa em Setembro de 1998 (dos restantes 7.500 cts em
numerário nem rasto, como seria de esperar). O IVA, por seu turno, só viria a ser pago
em Janeiro (cfr. documento de fls 433 do apenso 96-A).
Quanto às razões que terão estado na base de tão estranho comportamento da
“Resin”, que assim teve de pagar desnecessariamente 2.125.000$00 de IVA, só os seus
responsáveis o poderiam explicar, mas estes optaram antes por contar uma “história”
sem pés nem cabeça.
Seja como for, tendo presente a explicação dada pelo arguido Carlos Marinho
para a emissão da factura nº 444 do apenso 96-A, no montante de 23.806.575$00 (que
não conseguimos relacionar com a concessão do donativo de 20.000 cts, isto é, como
sendo uma tentativa frustrada da “Resin” para reaver uma verba semelhante ao donativo
concedido), ante a necessidade de compor resultados de exercício, difícil seria à “Resin”
explicar aos seus accionistas a razão de ser da concessão de tão avultado donativo ao
FCF, entidade que, à data, ainda não tinha o estatuto de utilidade pública (cfr.
documento de fls 4906), pelo que da concessão desse donativo não resultaria qualquer
benefício fiscal. Terá assim esse facto justificado a simulação (relativa – cfr. artgs 240º
e 241º do CC) do aludido contrato e a entrega em numerário (sem rasto contabilístico)
de uma verba de 7.500 cts?
Em face de tudo isto, só a posição expressa pelo arguido Horácio Costa parece
fazer sentido, pelo que nos convencemos que o donativo em causa foi concedido pela
“Resin” conforme descrito na pronúncia (e entregue pela mão do arguido Carlos
Marinho).
Quanto à participação da arguida Fátima Felgueiras, já tivemos a oportunidade
de a ela nos referirmos a propósito do ponto 1.5 da pronúncia (foi ela quem deu
indicações ao arguido Horácio para se deslocar a Matosinhos, às instalações da “Resin”,
com o arguido Júlio Faria, a fim do donativo em causa ser então solicitado, sendo certo
que a ela de tudo deu conta o arguido Horácio).
Não se provou porém que tenha sido ela a contactar directamente com o arguido
Vítor Borges no sentido de solicitar aquele donativo, em face dos depoimentos dos
arguidos Vítor Borges, Júlio Faria e Horácio Costa.
Questão diversa é a (ir)relevância penal destes factos, matéria que mais à frente
irá ser abordada aquando da fundamentação jurídica.

- A convicção do Tribunal relativamente à matéria do 2º capítulo da


pronúncia

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Introdução

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Negou a matéria em causa, mormente quanto ao facto de ter entregue qualquer
lista aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas referente a pessoas que pudessem
contribuir com donativos para a campanha eleitoral, sendo certo que nunca contactou
pessoalmente quem quer que seja a fim de lhe serem concedidos donativos. Da mesma
forma, nunca indicou essas pessoas verbalmente aos arguidos Horácio Costa e Joaquim
Freitas.
Negou ainda qualquer relação entre os donativos efectuados e o decurso dos
processos de licenciamento em curso na CMF, bem como alguma interferência entre
esses donativos e uma menor acção fiscalizadora da CMF nesse domínio.

- Arguido Horácio Costa


Assegurou que nunca lhe foram entregues quaisquer listas de pessoas a contactar
a fim de dar o respectivo contributo com donativos para a campanha eleitoral. Porém,
viu tais listas nas mãos do arguido Joaquim Freitas, o qual as designava por “listinhas”.
Tais “listinhas” eram elaboradas em papel de formato A3 normalmente usado pela
arguida Fátima Felgueiras quando lhe mandava recados escritos. Era pois o arguido
Joaquim Freitas quem as transportava no bolso e lhe transmitia que se tratavam de listas
de pessoas que tinham de contactar para o fim já referido (listas essas fornecidas pela
arguida Fátima Felgueiras).
Explicou ainda que era o arguido Joaquim Freitas quem transportava essas listas
na medida em que tinha maior facilidade nos contactos, já que grande parte das pessoas
a contactar eram industriais, tal como o arguido Joaquim Freitas (além de que este já
desempenhara estas funções na campanha de 1993 e é natural de Felgueiras).
Confrontado com o documento de fls 168 do 1º volume referiu que se trata de
uma lista de pessoas e que nunca antes vira tal documento. Segundo depreende de tal
documento, o mesmo era dirigido ao arguido Bragança pela arguida Fátima Felgueiras.
Assegurou que é o arguido Joaquim Freitas quem melhor tem conhecimento
dessa matéria pois era ele quem possuía os contactos.
Por vezes o dito Joaquim Freitas chegava ao ponto de dizer que determinada
pessoa a contactar teria de dar um donativo de determinado montante porque tal
montante já antes lhe havia sido exigido pelo Dr. Sousa Oliveira quando o acompanhou
na recolha de donativos para outras campanhas.
Reafirmou que só integrou o “Pelouro das Finanças” na medida em que o Dr.
Sousa Oliveira se zangou com o arguido Júlio Faria, designadamente por causa de um
acordo celebrado entre a CMF e o FCF onde eram dados apoios ao clube na ordem dos
300.000.000$00, o que não mereceu de todo o acordo daquele. Referiu ainda problemas
relacionados com a venda de terrenos pertencentes à família do arguido Júlio Faria e na
qual o Dr. Sousa Oliveira teve intervenção, além de que este se queixou que existia uma
dívida de cerca de 3.000.000$00 referente à campanha de 1993 e que era ele quem tinha
de dar a cara perante os credores.

- Arguido Joaquim Freitas


Confirmou que a arguida Fátima Felgueiras lhe forneceu “listinhas” de pessoas a
contactar a fim de serem concedidos donativos. Porém, não se recorda se essas listas lhe
foram fornecidas a propósito do financiamento da campanha eleitoral das eleições

419
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

autárquicas de 14.12.97, se lhe foram entregues para angariar fundos para o “Sovela” ou
para outra causa (que não a angariação de fundos para o FCF, na qual nunca participou).
Seja como for, muitas vezes a arguida Fátima indicava verbalmente as pessoas a
contactar (o Dr. Sousa Oliveira também lhe deu indicações nesse sentido) e chegava a
indicar com quanto elas deveriam contribuir (por exemplo, disse-lhe que o Eng.
Machado teria de dar um donativo de 6.000.000$00, donativo que ele se recusou a dar,
pedindo ao depoente para mentir à arguida Fátima transmitindo-lhe que o não tinha
conseguido contactar pois tinha problemas em recusar esse donativo; de resto, era difícil
dizer “não” à arguida Fátima).
Confrontado com o documento de fls 168 do 1º volume reconheceu nele a letra
da arguida Fátima Felgueiras. Porém, tal documento nada lhe diz.
A aposição de uma cuz à frente dos nomes de pessoas significava que elas
teriam de contribuir com mais dinheiro (não sabe explicar porquê). A lista respectiva
foi-lhe fornecida pela arguida Fátima no gabinete desta e mostrou-a ao arguido Horácio
Costa.
No GAPP perguntavam ao arguido Bragança e ao Sr. Júlio Pereira se já tinham
contactado as pessoas que iriam visitar no sentido de obter donativos (pois tal era
prática corrente).
Se alguém não contribuía com donativos comunicavam esse facto à arguida
Fátima Felgueiras.

- Testemunha Albino Moreira Fernandes


Confrontado com o documento de fls 526 do 3º volume (cópia de um cheque
datado de 23.12.97) confirmou ter sido por si assinado juntamente com o seu sócio
Fernando Machado.
Relaciona a emissão desse cheque com as contribuições concedidas para as
festas de S. Pedro em Felgueiras (que se realizam a 29.06), sendo certo que quem ia
pedir e recolher o donativo era o Sr. Silva, funcionário camarário.
O cheque em causa está à ordem do arguido Horácio Costa, cuja razão disse
desconhecer, tanto mais que não foi o depoente ou o seu sócio a preencher o cheque no
local destinado ao tomador; ignora mesmo quem apôs esse nome nesse local (admite
que possa ter sido um tal de Júlio, pessoa que já foi funcionário de escritório da sua
empresa mas não o pode afirmar com toda a certeza).
Não tem conhecimento do seu sócio ter dado dinheiro para campanhas políticas.
Confrontado com cópia do talão de depósito, conforme documento de fls 156 do
apenso 1, constatou que o supra referido cheque foi depositado a 05.01.98 (ignorava que
o cheque iria ser depositado na conta em causa).

- Testemunha António Sérgio da Costa Oliveira


Há 28 anos foi admitido ao serviço da CMF como oficial de diligências, funções
que exerceu duante cerca de 2 anos. Entretanto passou a escriturário, funções que
exerceu durante cerca de 4 anos. Exerceu então funções como oficial administrativo
durante cerca de 8 ou 9 anos. Entretanto foi chefe de secção durante cerca de 4 ou 5
anos. Exerceu entretanto as funções de chefe de repartição durante cerca de 3 ou 4 anos,
sendo certo que desde 2001 ou 2002 passou a chefe de divisão (actualmente é chefe da
Divisão Administrativa, do Departamento de Planeamento).
Organizava os processos de licenciamentos de obras e loteamentos e tramitava
processualmente o pedido dos pareceres exteriores à CMF (por determinação legal).
Procedia à liquidação das taxas de licenciamento e à emissão de alvarás.

420
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Arquitecto Vítor Martins e a Engª Fernanda Adriana exaravam informações


técnicas nos processos de licenciamento.
Quer a Polícia Municipal quer a Fiscalização levantavam autos de notícia no
caso de alguma infracção ligada à área do urbanismo, a qual dava entrada no Serviço de
Contra-ordenações. Era elaborado um despacho tipo que era assinado pela presidente da
autarquia no sentido do embargo da obra (se fosse o caso) ou no sentido de se instaurar
o respectivo procedimento contra-ordenacional.
Os processos de licenciamento eram arquivados, sendo certo que todos os
funcionários camarários tinham acesso a esse arquivo.
Nunca se apercebeu de qualquer privilégio concedido a algum munícipe no que
se refere a licenciamento de obras e loteamentos.

- Testemunha Helena Meireles


É funcionária da CMF (assistente administrativa especialista) há cerca de 19
anos.
Iniciou as suas funções a título de ocupação de tempos livres, tendo depois
ingressado no Departamento de Planeamento, Secção de Obras.
Presentemente exerce funções no Gabinete de Atendimento ao Munícipe.
Quando desempenhou funções na Secção de Obras dava entrada dos processos
de licenciamento e juntava o respectivo expediente a esses processos, remetendo-os a
quem se destinassem (para os técnicos ou para a presidente).
Nunca notou qualquer favorecimento a algum munícipe.

- Testemunha Maria da Conceição Peixoto dos Santos


Entrou para a CMF a 05.12.85 como escriturária no Departamento
Administrativo.
Há cerca de 12 anos que é chefe de Secção no Departamento Técnico (hoje
Departamento de Planeamento), onde lhe cabia supervisionar o serviço desde a entrada
dos processos de licenciamento até à emissão dos alvarás.
Recebia o expediente, o qual era junto ao processo respectivo e organizado.
Fazia a apreciação liminar no sentido de verificar se tinham sido juntos todos os
documentos necessários. O processo depois era encaminhado para os técnicos e em
função disso poderia ir para a presidente.
Nunca notou qualquer tratamento de favor a quem quer que seja.

- Testemunha Edgar Pinto da Silva


Tendo sido eleito vereador nas eleições autárquicas de 1997, já no decurso do
mandato assumiu o pelouro das contra-ordenações.
Assumiu esse pelouro por proposta da arguida Fátima Felgueiras em reunião de
câmara. Só soube que ela iria propor a sua pessoa para esse pelouro quando ela lho
comunicou na altura em que se dirigiam para essa reunião.
Não tinha à data qualquer conhecimento nessa área (assim como nenhum
vereador a teria à data).
Era a testemunha Helena Félix quem estava à frente dessa área.
Quando assumiu esse pelouro teve uma reunião com essa testemunha e ela
instruiu-o acerca do modo como deveria proceder.
Haviam muitos processos atrasados que se foram resolvendo; talvez por isso
mais para o final do seu mandato notou ter existido uma diminuição dos processos de
contra-ordenação.

421
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Julga que não teve qualquer conversa com a testemunha Helena Félix acerca
desse facto, designadamente no sentido de indagar qual o motivo de tal diminuição de
processos.
Julga não ter tido conhecimento de qualquer decisão de suspensão da tramitação
dos processos de contra-ordenação num período pré-eleitoral.
Porém, a esse propósito, foi confrontado com as declarações que prestou perante
a JIC a fls 3291, linhas 85 a 93 (tomou conhecimento pela testemunha Helena Félix que
a arguida Fátima Felgueiras ordenara que ela suspendesse a tramitação dos processos de
contra-ordenação cerca de 1 ano antes das eleições), reputando de mais fidedignas essas
declarações porque na altura tinha a memória “mais fresca”. Em todo o caso, no
momento presente recorda-se mal dessa conversa.
Referiu ainda que existiam pareceres de ordem geral quanto à tramitação dos
processos de contra-ordenação.

- Testemunha Rui José da Silva Pinto de Almeida


É arquitecto e funcionário da CMF há cerca de 16 ou 17 anos. Trabalha no
Departamento de Planeamento, Divisão de Planeamento Urbanístico, desde há cerca de
10 anos.
Faz a apreciação dos processos de licenciamento de obras particulares, exara as
informações que julga pertinentes nesses processos, faz vistorias e projectos ligados à
área do urbanismo.
Faz igualmente atendimento ao público (às 2ªs e 4ªs de manhã) para
esclarecimentos, quer antes quer no decurso dos processos de licenciamento de obras
particulares pendentes.
Faz projectos, estudos e análises de projectos de obras particulares (isto é, se o
projecto é adequado à função pretendida e se respeita os requisitos legais (REGEU,
PDM e regulamentos municipais de edificação e dos loteamentos), não analisando se o
processo estava ou não bem instruído. Cruzava essa informação com os estudos
urbanísticos em curso de modo a não haver incompatibilidade.
Essas análises são sempre documentadas. O objectivo último é habilitar o
presidente da autarquia para decidir acerca do deferimento ou indeferimento do
licenciamento pretendido.
Nunca deu qualquer informação que não respeitasse as regras a que está
vinculado.
Não tem conhecimento da arguida Fátima Felgueiras ter alguma vez
desrespeitado qualquer parecer técnico.
É normal ser chamado para estar presente em audiências concedidas aos
munícipes pela presidente da edilidade quando existam dúvidas de ordem técnica.
Não se recorda de alguma vez alguém ter apresentado verbalmente à arguida
Fátima Felgueiras um projecto de licenciamento antes de ter dado entrada na CMF o
respectivo requerimento.
Não se recorda de ter participado em alguma audiência concedida pela arguida
Fátima Felgueiras ao Engº Manuel Machado.
Esclareceu que quando se detecta alguma irregularidade o procedimento habitual
é o de notificar o interessado para sanar a irregularidade, se possível, ou da intenção da
autarquia em indeferir o requerido licenciamento.
Um auto de notícia pode dar origem a um embargo total ou parcial, sendo certo
que em caso de desobediência deverá ser feita a respectiva comunicação ao MP (trata-se
de uma função administrativa que não cabe nas funções que em concreto desempenha
na CMF).

422
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Salientou não ter conhecimento de qualquer situação em que a desobediência


não tenha sido comunicada ao MP, mas, como disse, tal comunicação não passa por si.
Quando faz a gestão urbanística tem de ter em atenção o PDM.
Esclareceu que não participou na elaboração do PDM de Felgueiras.
Assegurou que só por lapso é que a autarquia poderá ter licenciado construções
em desrespeito pelo PDM.
Em caso de dúvida questionavam acerca dos limites de propriedade.
Em todo o caso, é prática da autarquia aceitar declarações dos vizinhos
confinantes no sentido de permitir que a construção a licenciar não respeite os
afastamentos aos limites legalmente estabelecidos, pelo que, desde que não se levantem
questões urbanísticas, o projecto é aprovado (o Dr. José de Barros – assessor jurídico da
CMF – não via qualquer problema jurídico nessa prática).
Acrescentou que no passado existiam muitos processos de legalização
(licenciamento de obras iniciadas anteriormente) que eram penalizados com taxas
acrescidas. No presente ainda existem muitos processos de legalização, mas essa taxa
acrescida deixou de ser cobrada pela autarquia.
Referiu ainda que no passado não existia controle da autarquia sobre a
actividade dos fiscais na área do urbanismo.
A primeira vez que ouviu falar de problemas em processos de licenciamento
(referidos nos autos) foi nos corredores da CMF e das notícias que a esse propósito
saíam na comunicação social, o que o deixou espantado.
Fez então a análise de cada um dos processos em causa, até porque poderia estar
em causa o seu trabalho, e ficou descansado em face do que viu, pois nada de irregular
encontrou.
Recorda-se que num dos processos em causa nestes autos constavam fotografias
com a construção já edificada.
Trata-se de uma situação comum, mas ilegal.
A CMF não tinha capacidade de resposta a todas as solicitações a nível dos
licenciamentos, até porque à data não dispunham de meios informáticos.
Assim, a análise dos processos de licenciamento era demorada, o que constituía
um empecilho para os particulares, os quais tinham pressa em ver licenciada a obra.
Assim, as pessoas arriscavam e iniciavam a obra sem qualquer licenciamento.
Por sua vez, a fiscalização era composta por duas equipas de dois elementos
cada, o que era manifestamente insuficiente para cobrir todo o território do concelho,
tanto mais que tinham a seu cargo um grande leque de serviços.
Como havia essa consciência, existia uma taxa agravada em caso de legalização
de obras (taxa agravada em cinco vezes), segundo um regulamento aprovado pela
Assembleia Municipal de Felgueiras.
Em Matosinhos, por exemplo, existia um pelouro do clandestino.
Ainda hoje é difícil à CMF controlar a construção clandestina.
O processo de fiscalização e o processo de obra são processos distintos. Da
análise do processo de obras não se extraía se tinha existido ou não algum processo de
fiscalização em relação à mesma obra. Tratavam-se de processos autónomos.
Não constava igualmente dos processos de obras a informação acerca da
instauração de algum processo de contra-ordenação.
Esta falta de informação nos processos quer acerca da instauração de um
processo de contra-ordenação quer da existência de fiscalização da obra, quer ainda a
cobrança de taxas agravadas em caso de legalização, acabou na sequência da
fiscalização efectuada pela IGAT ao município felgueirense.

423
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Fátima despachava os processos de licenciamento em função das


informações técnicas (quer internas quer externas à autarquia, designadamente entidades
que tinham de ser consultadas a propósito de determinados licenciamentos). Ela só
questionava as informações técnicas se as não entendesse, ou se, em audiências que ela
concedia, os munícipes vinham protestar acerca da bondade dos pareceres prestados.
Há milhares de processos em que estão em causa o mesmo tipo de problemas
que aqueles que estão relatados nos autos.
Nunca a arguida Fátima Felgueiras lhe sugeriu qualquer parecer e nem sequer
lhe admitia esse tipo de atitude.
A arguida Fátima Felgueiras por vezes despachava os processos de
licenciamento de forma inconveniente e com uma linguagem rústica. Ela escrevia
abertamente e “puxava as orelhas” aos serviços quando achava que eles não tinham
actuado bem.
O licenciamento industrial tem especificidades.
A Comissão de Coordenação da Região Norte acompanhava esses processos.
Emitiam-se certidões de localização.
O pedido era instruído no Ministério da Economia.
A CMF poderia licenciar a obra se o requerente demonstrasse que tinha dado
entrada o processo de licenciamento da actividade industrial no Ministério da
Economia, com certidão de localização. Isso sucedia porque o processo de
licenciamento da actividade industrial era moroso. Recorda-se que tal aconteceu no caso
da “Pinfel” e “Solpré”.
Haviam casos em que o Ministério da Economia aprovava um projecto diferente
do que tinha sido licenciado pela CMF.
A comissão de ligação entre a CCRN e a CMF tinha de homologar a acta da
respectiva reunião, sem a qual o projecto não poderia ser licenciado.
Antes da aprovação do PDM tiveram a preocupação de integrar nessa comissão
de ligação um elemento do gabinete do PDM, de modo a que a aprovação dos projectos
não fosse incompatível com a elaboração do PDM, então em curso (o Arquitecto Jordão
é o director do PDM e integrava a comissão de ligação).

- Testemunha Helena Maria Paiva Gonçalves Valdigas Félix


É jurista na CMF desde Junho de 1995.
Trabalha na área das contra-ordenações, competindo-lhe elaborar pareceres
jurídicos mais simples, colabor com o Dr. José de Barros na elaboração de pareceres
mais complexos a propósito de licenciamentos, integrar comissões de abertura de
propostas em concursos, fazer regulamentos, tratar do ressarcimento de danos no
domínio público, elaborar pareceres disciplinares e instruir processos de averiguação.
Referiu que a testemunha Edgar Pinto da Silva em 2000, então vereador,
assumiu o pelouro das contra-ordenações.
Quando ele assumiu essas funções chamou a depoente de modo a poder
explicar-lhe o funcionamento dos processos de contra-ordenação.
Referiu que em 2001 exisitam mais de 4.000 processos de contra-ordenação por
falta do pagamento das tarifas relativas aos resíduos, processos esses que já tinham
aposta a chancela da arguida Fátima Felgueiras. Tal volume de processos verificou-se
devido ao excesso de trabalho, o que se prendeu com o facto de muitas notificações
virem devolvidas, já que as moradas que a CMF conhecia baseavam-se nas listas da
EDP.

424
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Consequentemente, posteriormente, é natural que progressivamente se


começasse a sentir uma diminuição do volume de trabalho ao nível dos processos de
contra-ordenação.
Não tem qualquer ideia de alguma vez a testemunha Edgar ter conversado
consigo acerca da diminuição do volume de trabalho.
Esclareceu que em 2000 foi emitido um parecer jurídico pelo Dr. José de Barros
em matéria de prazo prescricional (cfr. fls 11894 e ss.), na sequência do qual a arguida
Fátima Felgueiras fixou prazos muito curtos de suspensão (em que o processo era
suspenso por 90 a 120 dias) para que os visados regularizassem a situação.
Não tem a mínima ideia de ter referido à testemunha Edgar Pinto da Silva que os
processos de contra-ordenação estavam suspensos na sua tramitação por ordem da
arguida Fátima.
A preocupação da depoente era a de evitar a respectiva prescrição.
Admite que a testemunha Edgar se tenha equivocado ao referir tal conversa pois
deveria reportar-se à situação a que fez alusão na sequência do parecer jurídico aludido
(cuja cópia consta aliás de fls 11894 e ss., do 46º volume).
Explicou que na sequência do despacho aposto naquele parecer jurídico fez um
pedido de informação para que lhe fosse indicado qual o prazo dentro do qual os
visados poderiam regularizar a situação, altura em que a arguida Fátima despachou no
sentido de serem concedidos entre 90 a 120 dias para os arguidos rgularizarem a
situação.
Nunca se sentiu pressionada ou condicionada no exercício das suas funções, de
modo a acelarar ou a atrasar a normal tramitação dos processos de contra-ordenação.

- Testemunha Alexandre Amaro Sousa Guimarães Martins


É empresário e sócio das firmas “Irmalex”, “Irmatim” e “Idcofel”.
Confrontado com a cópia do segundo cheque constante de fls 514 referiu que foi
por si emitido, não se recordando porém em que circunstâncias o emitiu, tanto mais que
foi um dos seus irmãos (Joaquim Martins) quem o mandou passar e não lhe disse qual a
respectiva finalidade.

- Testemunha Alberto José Gonçalves Peixoto Abreu


Referiu ser sócio-gerente da firma “Abreu e Abreu, Ldª”.
Confrontado com o teor da fotocópia do segundo cheque de fls 523 do 3º
volume, datado de 22.12.97 e no valor de 50.000$00, referiu ter sido emitido pelo
depoente e pelo seu irmão. Explicou que foi o Sr. Silva (funcionário da CMF) quem lho
solicitou, sendo certo que ele pediu-lhe um donativo para as festas do concelho.
Referiu ignorar em que data têm lugar tais festas e qual o destino concreto que
foi dado ao dinheiro que doou.
Confrontado com cópia do talão de depósito dessa quantia de 50 cts (juntamente
com outras) na conta do BES, titulada pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
(cfr. doc. de fls 148 do apenso 1), referiu não conhecer o arguido Horácio Costa.

- Testemunha António Magalhães Meireles


Confrontado com cópia do cheque de fls 492 do 3º volume, datado de 16.09.97 e
no valor de 50.000$00, referiu que o emitiu e o entregou ao arguido Horácio Costa no
café “Jardim” para a campanha eleitoral do PS.
Explicou que antes de lho entregar não foi previamente contactado por alguém
da CMF (o respectivo depósito foi efectuado na conta do BES a 24.09.97, conforme
documento de fls 72 do apenso 1).

425
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

*
A propósito desta testemunha o arguido Horácio Costa referiu que é um
pequeno empreiteiro e que fez pequenas obras para a CMF.
Ele entregou-lhe o cheque de 50 cts na CMF, no seu gabinete, depois do
respectivo donativo lhe ter sido solicitado pelo GAPP.
*
- Testemunha António Ferreira Pereira
É sócio-gerente da firma “António Ferreira Pereira, Ldª”
Confrontado com cópia do cheque de fls 3241 do 14º volume (no valor de
585.000$00 e datado de 24.09.97), confirmou tê-lo emitido.
Entregou-o ao arguido Joaquim Freitas e pensa que se tratou de um pagamento
de publicidade no jornal “O Sovela”, mas não tem a certeza.
Também não tem a certeza se ele ia ou não acompanhado pelo arguido Horácio
Costa quando lhe entregou tal cheque, embora tenha essa ideia.
Não se recorda de previamente ter sido contactado telefonicamente antes do
arguido Joaquim Freitas ter aparecido na sua empresa, local onde procedeu à entrega do
dito cheque (o qual foi depositado na conta do BES a 25.09.97, conforme documento de
fls 74 do apenso 1).

- Testemunha Armando Jorge Almeida Moreira


É sócio-gerente da firma “Calçado Raly, Ldª”.
Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 493 do 3º volume, datado de
23.09.97 e no valor de 200.000$00, confirmou tratar-se de um cheque emitido por si e
sacado sobre uma conta pessoal, tendo sido preenchido pela empregada de escritório da
sua firma.
Tratou-se de um donativo para uma campanha eleitoral, mas não se recorda de
que partido (é habitual contribuir para as campanhas de todos os partidos).
Não conhece pessoalmente o arguido Horácio Costa, só dele tendo ouvido falar
em face do que lê nos jornais por causa dos presentes autos.
Não se recorda ainda em que altura entregou tal cheque.
Confrontado com cópia do talão de depósito de fls 72 do apenso 1, constatou-se
que essa quantia foi depositada a 24.09.97 na conta do BES. Em face dessa constatação
referiu ignorar por que motivo essa quantia foi depositada em tal conta.
Explicou que normalmente eram os seus amigos que lhe pediam os donativos.
A sua firma normalmente recorria à firma “Projecto Lixa” (da testemunha
Fernando Sampaio) para apresnetar na CMF os projectos de licenciamento.
*
A propósito do depoimento desta testemunha referiu o arguido Horácio Costa
que o conhece muito bem, pois encontraram-se várias vezes quer na CMF quer noutros
locais, sendo certo que ele tem uma irmã que estudou com o depoente.
O depoente deslocou-se à empresa da testemunha em causa acompanhado da
testemunha Fernando Sampaio para levantar o cheque na medida em que recebeu
indicações nesse sentido.
A testemunha Fernando Sampaio elabora e apresenta projectos de obras na
CMF, tendo feito esse serviço inclusivamente para a testemunha Armando Jorge.
À data a testemunha Armando Jorge tinha em construção uma moradia e antes
de construir as actuais instalações fabris dispunha de instalações mais pequenas em
Estradinha (era também proprietário nesse local de lojas comerciais).
*
- Testemunha Joaquim Ferreira Pinto

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu que a sua firma é a titular da marca “Calçado Rambóia”.


Confrontado com cópia do cheque de fls 514 do 3º volume, no valor de
300.000$00 e datado de 20.11.97, confirmou que o mesmo foi emitido por si e foi
sacado sobre uma conta pessoal de que é titular.
Tratou-se de um donativo para a campanha eleitoral de 1997 da arguida Fátima
Felgueiras.
Nem se recorda de quem lho pediu nem a quem o entregou. Tem a ideia de que
alguém lhe bateu à porta da empresa para lhe pedir o donativo e na sequência disso
entregou-lhe o cheque em causa.
Tem ainda a ideia de que foi a única vez que contribuíu para campanhas
eleitorais.

- Testemunha Deolinda Maria Dias de Lima


Referiu ser empregada de escritório na firma “José Andrade David Pereira, Ldª”,
exercendo também as funções de gerente nessa firma.
Confrontada com cópia do primeiro cheque constante de fls 522 do 3º volume,
datado de 12.12.97 e no valor de 200.000$00, confirmou que o assinou em
representação da firma acima mencionada, já que tal cheque foi sacado de uma conta da
mesma.
Foi o seu marido quem lhe deu instruções para emitir tal cheque para a
campanha eleitoral e para o entregar na CMF, tendo procedido desse modo.
Entregou o cheque acondicionado num envelope a uma das “meninas” que se
encontravam na CMF (funcionárias camarárias), depois de ter subido umas escadas.
Ignora qual é a identidade de qualquer uma dessas “meninas”. Disse-lhes que tal cheque
era para ser entregue ao arguido Horácio Costa, pois era ele o responsável pela gestão
dos fundos da campanha. Esclareceu no entanto que não o conhece.
Referiu que estava convencida que o cheque emitido era de 50 cts (mas afinal
era de 200 cts), quantia essa depositada a 18.12.97 na conta do BES conforme
documento de fls 141 do apenso 1.
Esclareceu que a empresa acima referida dedica-se à construção civil e obras
públicas tendo já executado obras para a CMF.
*
A propósito da testemunha Deolinda Lima referiu o arguido Horácio Costa que
é esposa de um empreiteiro de terraplanagens (Sr. David). Conhece-os de vista mas
nunca falou com eles.
Recebeu o cheque entregue pela testemunha Deolinda das mãos da arguida
Fátima Felgueiras. Ignora se ela o entregou na CMF a alguma das duas “meninas” que
referiu pois não assistiu a tal facto.
*
- Testemunha Joaquim Luís Lobo Félix
Referiu ser sócio-gerente da firma “Joaquim Luís Lobo Félix e Filhos, Ldª”
(“Felfim”).
Confrontado com cópia do cheque de fls 494 do 3º volume, datado de 22.09.97 e
no valor de 100.000$00, confirmou ter emitido esse cheque sacado sobre a sua conta
pessoal (tal cheque foi depositado a 24.09.9 na conta do BES, conforme documento de
fls 72 do apenso 1).
Emitiu-o para auxílio das despesas da campanha eleitoral do PS nas eleições
autárquicas de 1997.
Fê-lo na sequência do facto de terem ido à sua empresa solicitar um donativo e
decidiu concedê-lo, assim como também concedeu donativos a outros partidos políticos.

427
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quem lhe solicitou tal donativo foi o arguido Joaquim Freitas, o qual ia
acompanhado de um outro senhor (que agora sabe ser o arguido Horácio Costa).
Explicou que teve processos de contra-ordenação na CMF, tendo pago por isso
duas coimas, uma de 500 cts e outra de 400 cts.

- Testemunha Joaquim Luís Sousa Guimarães Martins


É industrial e proprietário de várias empresas, como por exemplo a “Irmalex” e a
“Irmatim”.
Confrontado com cópia do segundo cheque de fls 514 do 3º volume, no valor de
200 cts e datado de 20.11.97, confirmou que esse cheque foi assinado pelo seu irmão
Alexandre Martins e foi emitido ao portador (sacado sobre uma conta pessoal do dito
Alexandre Martins).
Foi o arguido Joaquim Freitas quem lhe solicitou um donativo para a campanha
eleitoral do PS, tendo-lhe entregue o dito cheque (ele fazia-se acompanhar de um outro
senhor). Antes de ser visitado pelo Joaquim Freitas não foi avisado desse facto por
quem quer que seja.
Esclareceu que conhece o arguido Joaquim Freitas desde a infância, mas com
ele, à data da emissão do cheque referido, apenas tinha uma relação comercial.
Era habitual conceder donativos para o FCF, pois como adepto desse clube
preocupava-se com a sua situação financeira. Conseguiu até que uma firma italiana (sua
cliente) patrocinasse o clube.
Ouviu dizer que “firmas de fora” deram donativos ao arguido Horácio Costa e
que a “Resin” havia concedido um donativo de 20.000 cts ao FCF (não se recorda a
quem ouviu tal informação).
Admite que possa ter questionado o arguido Joaquim Freitas à saída de um
restaurante acerca disso, mas não se recorda desse facto.
Conhece a testemunha Leonor (funcionária camarária) e que se lembre nunca lhe
entregou qualquer cheque sacado sobre uma conta da “Incofel”.

- Testemunha Jorge Fernando Moreira da Fonseca


É sócio-gerente da “Anglomex – Componentes para Calçado, Ldª”
Confrontado com o cartão de fls 2183 (da “Anglomex – Componentes para
Calçado, Ldª”), confirmou tê-lo manuscrito com excepção do montante ali aposto de
500.000$00.
Escreveu esse cartão e colocou-o num envelope com a quantia de 500.000$00
em numerário, o qual entregou à arguida Fátima Felgueiras num dos corredores da
CMF.
Antes disso tinha sido contactado, ao que pensa pelos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas, no sentido de conceder um donativo, respondendo-lhes que iria pensar
qual o montante que iria doar e que mais tarde o entregaria na CMF.
Conhece a arguida Fátima desde que se conhece, mas não tinha com ela uma
relação de amizade. Tinham um relacionamento meramente circunstancial.
Entregou-lhe pois o envelope e desejou-lhe felicidades. É evidente que ela sabia
que lhe estava a entregar um donativo para a campanha eleitoral. Porém, na altura não
lhe disse qual o montante em causa, sendo certo que ela aceitou o dito envelope.
*
A propósito desta testemunha referiu o arguido Horácio Costa que é seu parente
afastado.
Recebeu das mãos da arguida Fátima Felgueiras os 500 cts em numerário
entregues por ele.

428
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É falso que tenha sido o depoente a fazer-lhe o pedido de donativo.


Ignora quem manuscreveu a quantia de 500.000$00 no cartão entregue pela
testemunha em causa à arguida Fátima e constante de fls 2183.
*
- Testemunha Joaquim Guimarães Moreira
Referiu ser sócio-gerente da firma de construção civil “Joaquim Guimarães
Moreira Universal, Ldª”.
Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 529 do 3º volume, em baixo,
no valor de 100.000$00 (sem data), sacado dobre uma conta da firma “Morcima” (do
qual foi sócio com o Sr. José Guimarães Sampaio de 1991 até 2001), referiu que junto
do Mercado Municipal foi abordado por dois senhores no sentido de conceder um
donativo para a campanha eleitoral (um desses senhores era o arguido Horácio Costa).
Falou entretanto com o seu então sócio e decidiram emitir o cheque referido.
Entregou-o ao arguido Horácio Costa num gabinete situado na CMF, situado ao
lado do Serviço Técnico de Obras, no 1º andar (num corredor existia uma porta que
dava para o gabinete do arguido Barbieri e outra que dava para o dito gabinete).
Confrontado com o teor de fls 160 do apenso 1, constatou-se que o depósito
desse cheque foi efectuado a 22.01.98, sendo certo que o depoente referiu que a entrega
do cheque deverá ter ocorrido por essa altura, recordando-se que lhe foi dito que o
donativo destinava-se a pagar despesas que tinham sido efectuadas na campanha
eleitoral (não sabe precisar qual).
Referiu ainda que teve de pagar várias coimas na CMF.
*
Referiu o arguido Horácio Costa que conhecia a testemunha Joaquim
Guimarães Moreira como sócio de José Maria Guimarães Sampaio (ex-vereador).
A testemunha em causa nunca lhe entregou qualquer cheque.
Confirma que ele emitiu um cheque de 100 cts e que lhe foi entregue, ao que
pensa, pelo dito José Maria Guimarães Sampaio.
Disse-lhe o Dr. Sousa Oliveira que a firma “Morcima” (a que a testemunha
estava ligado) devia favores à CMF e que por isso contribuiria (por ex. construíram um
edifício junto ao Mercado Municipal e cujas sacadas estão sobre um espaço de domínio
público, por cima dos passeios, segundo lhe disse o Dr. Sousa Oliveira. Dizia-se ainda
que construíram um edifício na Longra que ultrapassava o índice de ocupação).
*
- Testemunha José Anselmo Peixoto Pereira
Referiu ter sido sócio-gerente da firma “Filan – Fábrica de Calçado, Ldª” (firma
que desde finais de 2005 pertence aos seus filhos).
Confrontado com a cópia do primeiro cheque constante de fls 516 do 3º volume,
no valor de 120.000$00, sem data, confirmou a respectiva emissão (foi a sua esposa
quem o assinou) e referiu que foi sacado sobre a sua conta pessoal.
Tem a ideia que tal cheque foi emitido para auxiliar a custear as despesas
realizadas na campanha eleitoral do PS, embora não o possa assegurar porque não se
recorda do ano em que tal cheque foi emitido.
Não se recorda ainda a quem foi entregue o dito cheque.
Esclareceu que quando existem campanhas eleitorais costuma conceder
donativos.
Conhece os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas (este último só aquando
da acareação na PJ na fase de inquérito deste processo), sendo certo que recorda-se
deles lhe terem pedido um donativo para uma campanha eleitoral. Porém, não pode

429
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

assegurar que o donativo em causa tenha sido concedido através da emissão do cheque
referido.
Confrontado com o teor do documento de fls 121 do apenso 1, constatou-se que
o mesmo foi depositado a 04.12.97.
Que se lembre, nunca foi visitado pelo arguido Joaquim Freitas e pelo Dr. Sousa
Oliveira na sua fábrica. Sabia que este era marido da arguida Fátima Felgueiras e que
entretanto se separaram (não sabe de resto que profissão ele exerce).
*
Referiu o arguido Horácio Costa que a solicitadora São Rocha é muito próxima
do Dr. Sousa Oliveira e certo dia ela apareceu-lhe no gabinete e disse-lhe que a tinha de
acompanhar a um tal de Sr. Anselmo de Jugueiros (ao que pensa, segundo indicação do
Dr. Sousa Oliveira).
Assim fizeram e quando lá chegaram ela tratou a testemunha Anselmo com
muita familiaridade e disse-lhe que já sabia ao que iam e que tinha de contribuir como
das outras vezes. Ele lamentou-se então que estava farto de contribuir com donativos,
que tinha um problema com um ex-sócio e que tinha a vida desgraçada. Em suma, não
se mostrava disposto a conceder qualquer donativo.
Ela então insistiu para que ele concedesse um donativo e que tudo iria mudar
com a eleição da arguida Fátima Felgueiras. Ele então acedeu a contribuir com 120 cts e
a São Rocha ficou de ver com o Dr. Sousa Oliveira o que se passava acerca do problema
referido pela testemunha em causa.
Mais tarde o Dr. Sousa Oliveira passou pelo seu gabinete na CMF e
condidencou-lhe que o Sr. Anselmo tinha tido um sócio, com o qual se zangou, temendo
que ele pusesse em causa património que não lhe pertencia, existindo umas habitações
que não estavam legalizadas.
Segundo ouviu ao Sr. Anselmo, ele já teria contribuído com 500 cts nas últimas
eleições (de 1993) – quantia que entregou ao Dr. Sousa Oliveira - e que nada tinha sido
feito.
Foi-lhe pedido para ver o que poderia fazer e fê-lo de forma desinteressada,
sempre no sentido de lhe dar indicações acerca do que poderia fazer para licenciar a
obra.
Assim, na sequência dessa solicitação, pediu o processo de licenciamento de
obra respeitante à testemunha em causa e viu que já tinha sido aposto pela arguida
Fátima um despacho no sentido de legalizar a obra em causa (uma casa, com um
pavilhão no rés-do-chão).
A testemunha Fernando Pereira Sampaio tomou conta do processo de
licenciamento e conseguiu licenciar a obra.
*
- Testemunha José Luís Pereira Mendes
É sócio-gerente da firma “Rilix”.
Conhece de vista os arguidos Horácio e Joaquim Freitas.
Nunca contribuiu para campanhas políticas.
Normalmente todos os candidatos solicitavam donativos. Chegaram-lhe a pedir
donativos mas nunca o procuraram especificamente para esse fim.

- Testemunha Casimiro Gomes Lobão


Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 515 do 3º volume, no
montante de 350.000$00, datado de 26.11.97 e sacado sobre a sua conta pessoal,
confirmou tê-lo emitido ao portador.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esclareceu que à data era secretário da junta de freguesia de Idães e foi o


presidente dessa junta (o Sr. Augusto Coelho Faria) quem lhe solicitou o donativo para
a campanha eleitoral do PS (das eleições autárquicas). Entregou tal cheque ao Sr.
Augusto Coelho Faria.
Mais tarde soube que esse cheque foi depositado na conta do BES referida nos
autos, titulada pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas (depósito efectuado a
27.11.97 – cfr. doc. de fls 117 do apenso 1).
Ignora se existia alguém encarregado de angariar fundos para a campanha
eleitoral pois não ligava a esses assuntos.
Conhecia de vista o arguido Horácio Costa e não tem a certeza se ele tinha
alguma ligação à CMF.

- Testemunha João Reinaldo da Cunha Teixeira


Confrontado com o teor das cópias dos cheques de fls 500 (o segundo, no valor
de 100.000$00, datado de 07.10.97, emitido ao portador) e 538 (também no valor de
100.000$00 e datado de 01.07.98), confirmou tê-los emitido e terem sido sacados sobre
uma conta pessoal.
Recorda-se que os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas deslocaram-se à
sua empresa por duas vezes e solicitaram-lhe um donativo. Como conhecia o arguido
Horácio desde os tempos de escola (não conhecia o arguido Joaquim Freitas) acedeu em
contribuir das duas vezes em que foi visitado por eles. Na segunda visita eles disseram-
lhe que o dinheiro não havia chegado e que o arguido Horácio era o responsável. Sabe
por isso que o arguido Horácio estava encarregue de angariar fundos para o PS (não
sabe exactamente para quê), não sabendo qual o destino dado aos donativos que
concedeu. Não se recorda se ocorreram eleições na altura em que os concedeu.
Confrontado com os documentos de fls 82 e 180, ambos do apenso 1, constatou-
se que o cheque de fls 500 foi depositado a 10.10.97, ao passo que o cheque de fls 538
foi depositado a 01.07.98.
Sabe que o arguido Horácio Chegou a ser vereador mas ignora se à data ele já
tinha assumido essa função. Em todo o caso, estaria ligado à CMF.
*
A propósito das declarações da testemunha João Reinaldo, negou o arguido
Horácio Costa que tivesse andado com ele na escola, pois o depoente frequentou a
escola de Margaride e ele a de Pombeiro.
Ele estabeleceu contactos na CMF com o arguido António José Leite Bragança
da Cunha, que aliás conhecia desde os tempos de escola, pois foram colegas nesse
tempo.
O depoente nunca o visitou nem lhe solicitou qualquer donativo. Que saiba, o
arguido Joaquim Freitas também não.
Ele sempre se movimentou com pessoas ligadas ao PS, sobretudo em Pombeiro.
Durante muitos anos laborava numa fábrica instalada numa habitação.
Mais tarde construiu uma fábrica e uma vivenda, cortando para o efeito um
caminho público, o que provocou problemas com as pessoas que por ali passavam e
com a Junta de Freguesia de Pombeiro.
Ele teve de se multiplicar em contactos para resolver o problema a seu contento.
O Dr. Manuel Faria (do PSD) é que pediu à arguida Fátima Felgueiras para resolver a
situação, segundo ouviu dizer ao arguido Bragança, o qual se mostrava agastado por ela
atender mais aos pedidos da oposição que aos seus.
Recorda-se que lhe chegaram às mãos dois cheques, um deles foi-lhe entregue
pelo David e o outro foi-lhe entregue na CMF, ao que pensa no GAPP.

431
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ouviu dizer que ele acedeu ao pedido da arguida Fátima para integrar uma
comissão administrativa para gerir o FCF e que doou 2.000 cts ao FCF, o que motivou
problemas conjugais.
*
- Testemunha José Carlos Ferreira Pereira
Confrontado com a cópia do primeiro cheque constante de fls 524, de
300.000$00, datado de 22.12.97, emitido ao portador e sacado sobre uma conta pessoal,
confirmou tê-lo assinado.
Esclareceu que os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas o visitaram e
pediram-lhe um donativo para uma campanha eleitoral do PS e que já tinha decorrido.
Confrontado com o documento de fls 148 do apenso 1, constatou-se que o
depósito de tal cheque ocorreu a 23.12.97.
Mais esclareceu que os conhecia de vista e que sabia que o arguido Horácio era
funcionário da CMF (ignora que funções exercia), ignorando qual a profissão do
arguido Joaquim Freitas.

- Testemunha Jorge Ramiro Magalhães Fernandes


Confrontado com a cópia do cheque de fls 501, no montante de 500.000$00,
datado de 09.10.97, emitido ao portador e sacado sobre uma conta pessoal, admitiu tê-lo
assinado.
Emitiu o dito cheque, segundo lhe foi referido, para ajudar a pagar a nova sede
do PS local.
Tal donativo foi-lhe solicitado por três pessoas que o visitaram na sua empresa
(“Savana Calçados”), duas das quais o arguido Júlio Faria e a testemunha Engº Manuel
Machado (já o conhecia porque fez o projecto do edifício da sua empresa). O terceiro
elemento (que não identificou) entretanto saiu e manteve-se à conversa com os outros
dois.
Confrontado com o teor do documento de fls 83 do apenso 1, constatou-se que
esse cheque foi depositado na conta do BES a 13.10.97.

- Testemunha Júlio Sampaio Teixeira


Disse ser sócio gerente da “Fábrica de Calçado Lagarto”.
Confrontado com a cópia do cheque de fls 502 (ao fundo), no montante de
200.000$00, sem data e emitido ao portador (sacado sobre a sua conta pessoal),
confirmou tê-lo emitido.
Tal cheque foi depositado na conta do BES a 16.10.97, conforme documento de
fls 36 do apenso 1.
Entregou esse cheque na sequência de ter recebido a visita dos arguidos Horácio
Costa, Joaquim Freitas e Maria Augusta, os quais lhe solicitaram um donativo para uma
campanha eleitoral do PS (não se recorda qual).
Conhecia de vista os arguidos Horácio e Joaquim Freitas.
Quanto à arguida Maria Augusta referiu que são da mesma terra, tendo acedido
em conceder o donativo por consideração para com ela.
Não se recorda a quem dos três fez a entrega do cheque referido.

- Testemunha Manuel David Lima Freitas


Disse ser sócio-gerente da firma “Freitas e Alves, Ldª” e primo do arguido
Joaquim Freitas.

432
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontado com a cópia do cheque de fls 524, ao fundo, no valor de


100.000$00 e datado de 22.12.97, confirmou tê-lo emitido (ao portador), cheque esse
sacado sobre uma conta pessoal.
Confrontado com o teor do documento de fls 148 do apenso 1, constatou-se que
esse cheque foi depositado na conta do BES a 23.12.97.
O seu primo Joaquim Freitas e o arguido Horácio (que apenas conhecia de vista)
deslocaram-se a sua casa e receberam o dito cheque, dizendo-lhe que se tratava de uma
contribuição para a campanha eleitoral do PS.
Pediu-lhes um recibo mas eles nunca o entregaram apesar de se comprometerem
a tal.

- Testemunha Joaquim Fernando Melo


Referiu ser sócio-gerente da firma “Fernando Melo e Marinho, Ldª”.
Confrontado com cópia do cheque de fls 499 do 3º volume, datado de 09.10.97 e
no montante de 200.000$00, confirmou ter sido emitido por si (ao portador) e sacado
sobre uma conta pessoal de que é titular.
Confrontado com o documento de fls 82 do apenso 1, constatou-se que esse
cheque foi depositado na conta do BES a 10.10.97.
Esclareceu que costuma conceder donativos para vários eventos, tendo a ideia
que o cheque foi emitido na data que dele consta (não conseguiu precisar qual a razão
de ser da emissão desse cheque).
Recorda-se que esse donativo foi-lhe pedido pelo arguido Joaquim Freitas, o
qual estava acompanhado da arguida Fátima Felgueiras (segundo crê, mas sem ter a
certeza), sendo certo que tem a ideia de ter sido a única vez que a arguida Fátima se
deslocou à sua empresa. Também não se recorda se a arguida Fátima chegou a assistir
ao pedido efectuado pelo arguido Joaquim Freitas. Precisou que a arguida Fátima surgiu
pouco depois (2 ou 3 minutos depois) do arguido Joaquim Freitas, tendo sido um seu
funcionário que lhe comunicou que ela estava à porta da fábrica. A arguida Fátima
entrou e ficaram à conversa, sendo certo que a arguida Fátima apenas lhe perguntou se
os negócios corriam bem e se estava tudo bem, cumprimentando-o antes de se ausentar.
Não se recorda ainda se então se vivia em período de campanha eleitoral.
Recorda-se que o cheque já estava passado quando o arguido Joaquim chegou
pois ele ligara-lhe antes a avisar que iria passar para levantar o cheque.
Ignora se foi coincidência ou não a arguida Fátima ter surgido naquela altura ou
se eles foram juntos.
Assegurou que ela não assistiu à entrega do cheque ao arguido Joaquim Freitas.
O depoente tem vários projectos de obras na CMF, que sofreram vários
embargos.
Chegou a responder em tribunal pela prática do crime de desobediência (por ter
violado um embargo).
Assegurou que na CMF nunca lhe fizeram favores.

- Testemunha José Sebastião Ferreira Moreira


Confrontado com cópia do primeiro cheque constante de fls 512 do 3º volume,
no montante de 200.000$00 (sem data e emitido ao portador), confirmou que esse
cheque foi emitido, assinado pelos 3 sócios da “Itaflex”, uma das quais é a sua
assinatura, cheque esse sacado sobre uma conta dessa empresa.
Tem a ideia que foi-lhe pedido esse donativo pelo arguido Joaquim Freitas em
1994 para uma campanha do PS.

433
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Porém, confrontado com o documento de fls 111 do apenso 1, constatou-se que


esse cheque foi depositado na conta do BES a 19.11.97, consequentemente, terá sido um
donativo para a campanha eleitoral de 1997.
Recorda-se que certa vez foi-lhe pedido um donativo pelo arguido Joaquim
Freitas e pelo Dr. Sousa Oliveira e uma outra vez foi-lhe pedido um donativo pelos
arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa.
Costuma conceder donativos ao PS, ao PSD e à CDU para as campanhas
eleitorais.
*
Referiu o arguido Horácio Costa que conhece de vista a testemunha José
Sebastião.
Fazia-se acompanhar do arguido Joaquim Freitas (com quem ele tem relações
comerciais) quando ele lhe entreegou o cheque acima referido.
Terá sido o arguido Joaquim Freitas quem lhe solicitou o dito donativo.
*
- Testemunha Manuel Benjamim Fernandes Rodrigues
Disse ser, além do mais, sócio-gerente da firma “Manuel Benjamin Fernandes
Rodrigues e Cª Ldª”.
Confrontado com cópia do cheque de fls 535, do 3º volume, no valor de
1.000.000$00, datado de 26.02.98 e emitido ao portador, sacado sobre a sua conta
pessoal, confirmou a respectiva emissão.
O respectivo depósito na conta do BES foi efectuado a 27.02.98, conforme
documento de fls 171 do apenso 1.
Tratou-se de um donativo para a campanha eleitoral do PS, para o FCF e para a
sede do PS (tal donativo deveria ser dividido para essas três finalidades).
Entregou o dito cheque aos arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa em sua
casa (tem a ideia que o Sr. Sampaio da Lixa estava presente).
Não se recorda se as eleições autáquicas já tinham ou não decorrido.
Emitiu o cheque na altura em que o foram buscar a sua casa.
O pedido de donativo já tinha sido efectuado antes pelos referidos arguidos,
tendo prometido que iria contribuir.
Conhecia o arguido Joaquim Freitas por ser da sua terra e por terem sido colegas
de escola.
Conhecia de vista o arguido Horácio, o qual estava ligado à CMF mas ignora
quais as funções que então ali desempenhava.
Para a campanha eleitoral do PS referente às eleições autárquicas de 1993 tem a
ideia que a respectiva contribuição não lhe foi pedida nem pelo arguido Joaquim Freitas
nem pelo Dr. Sousa Oliveira.
*
Assegurou o arguido Horácio Costa que se deslocou à fábrica da testemunha
Manuel Benjamim acompanhado do arguido Joaquim Freitas e da testemunha Fernando
Pereira Sampaio, mas ele só permitiu a entrada a este (que, como já disse, elabora e
apresenta projectos de obras de construção civil).
Quando o dito Sampaio se juntou de novo a eles, trazia um donativo de 1.000
cts. Recorda-se que estava um dia quente.
Veio a saber que a testemunha Manuel Benjamim é um dos melhores clientes da
testemunha Sampaio, pois este projectou-lhe várias obras.
É pois falso que ele tenha entregue o donativo em sua casa.
Ele costumava contribuir para o PS.

434
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É igualmente falso que esse donativo se destinasse às três causas que ele referiu
(campanha, FCF e sede do PS). De resto, relativamente à sede do PS, só faltava pagar
500 cts ao vendedor aquando da realização da escritura.
*
- Testemunha Manuel Martins Leite
Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 504 do 3º volume, no valor de
100.000$00, datado de 16.10.97 e emitido ao portador, confirmou ter assinado esse
cheque, o qual foi sacado sobre a sua conta pessoal.
Confrontado com o documento de fls 88 do apenso 1, constatou-se que o mesmo
foi depositado na conta do BES a 17.10.97.
Tem a ideia que se vivia em período de campanha eleitoral (não soube dizer qual
delas) e concedeu através daquele cheque um donativo para a campanha do PS.
Foram os arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa quem lhe solicitaram esse
donativo.
Pese embora tenha referido que não se recorda se tinha sido previamente
contactado dando-lhe conta de que eles iriam recolher o donativo, certo é que já tinha o
cheque passado.

- Testemunha António José Pinto Alves


É sócio-gerente da firma “Palmitex – Componentes de Calçado, Ldª”.
Confrontado com cópia do cheque de fls 891, ao cimo, no valor de 250.000$00,
datado de 24.09.97, emitido ao portador e sacado sobre a sua conta pessoal, confirmou a
respectiva emissão.
Confrontado com o documento de fls 72 do apenso 1, constatou-se que esse
cheque foi depositado na conta do BES a 24.09.97.
O cheque em causa foi-lhe pedido por clientes que possívelmente estavam
“metidos” na política. Acedeu para não perder os ditos clientes. Entretanto referiu que
esse donativo deve ter-lhe sido pedido pelo arguido Joaquim Freitas.
Foi emitido para patrocinar concertos e festas, eventualmente no âmbito da
campanha eleitoral (não se recorda qual), ao que pensa do PS.

- Testemunha António Pinto da Cunha


Referiu ser sócio-gerente da firma “Cunha e Costa, Ldª” (calçado “Morris”).
Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 510, datado de 14.11.97, no
montante de 625.000$00, referiu ter sido emitido por um cliente, cheque esse que viria a
ser endossado pelo depoente.
Confrontado com cópia do cheque de fls 534, no valor de 375.000$00, datado de
17.02.98, sacado sobre a sua conta pessoal, confirmou tê-lo emitido.
Disse já não se recordar a quem entregou esses cheques e que provavelmente se
destinaram a apoiar financeiramente uma campanha eleitoral (não sabe qual ou de que
partido) ou a apoiar financeiramente o FCF, pois foi várias vezes contactado para
conceder donativos a esse clube.
Era normal irem à sua fábrica (situada na sua casa) pedir os donativos.
Não tem ideia de ter sido contactado para esse fim pelo telefone.
Entretanto, depois de fazer um esforço de memória, referiu que entregou esses
cheques para apoiar financeiramente a campanha eleitoral da arguida Fátima Felgueiras.
Acrescentou que conhece o Sr. Silva, funcionário da CMF, e admite que tenha
sido a ele que entregou os cheques (ele aliás solicitou-lhe por diversas vezes donativos
para festas populares). No caso em apreço não sabe se de facto foi ele quem se dirigiu a
sua casa para recolher tais cheques.

435
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Revelou ainda que o arguido Joaquim Freitas também lhe solicitou vários
donativos, o mesmo sucedendo com o arguido Júlio Faria.
Em 1993 o Dr. Sousa Oliveira também lhe solicitou a concessão de um
donativo.
O arguido Bragança nunca o contactou para lhe pedir qualquer donativo.
Confrontado com o teor do documento de fls 106 do apenso 1, constatou-se que
o cheque de fls 510 foi depositado na conta do BES a 17.11.97.
Confrontado com o teor do documento de fls 170 do apenso 1, constatou-se que
o cheque de fls 534 foi depositado na conta do BES a 17.02.98.

- Testemunha José Luís Alves Magalhães Cunha


Confrontado com cópia do cheque de fls 530 do 3º volume, no valor de
500.000$00, datado de 28.01.98, emitido ao portador e sacado sobre a sua conta
pessoal, reconheceu tê-lo emitido.
Confrontado com o teor do documento de fls 163 do apenso 1, constatou-se que
tal cheque foi depositado na conta do BES a 30.01.98.
Tem a ideia que emitiu tal cheque para apoiar a campanha eleitoral do PS (não
sabe qual).
Também concedeu donativos a outros partidos.
À pergunta efectuada acerca da identidade da pessoa que lhe pediu o donativo
em causa, referiu ter sido ou o arguido Joaquim Freitas ou o Dr. Sousa Oliveira. Acabou
por confessar não saber se algum dos donativos pedidos por eles dizem ou não respeito
ao cheque em causa. Manifestou porém a ideia de que entregou tal cheque ou ao arguido
Joaquim Freitas ou na sede do PS.
Admitiu também que possa ter entregue esse cheque ao arguido Horácio Costa,
sendo certo porém que não foi ele quem lhe solcitou o donativo em causa.
A razão da sua falta de lembrança reside no facto de ter concedido vários
donativos.
Pensa que nunca foi contactado pelo arguido Bragança a propósito dos
donativos.
Ao arguido António Pereira chegou a entregar um donativo na sede do PS.
Era natural conceder donativos após a ocorrência das eleições, pois era frequente
as solicitações terem sido efectuadas antes das mesmas mas os donativos serem
concedidos à posteriori.

- Testemunha Manuel Joaquim de Oliveira Magalhães


É socio-gerente da firma “Pavilixa”.
Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 498, no valor de 100.000$00,
datado de 08.10.97, emitido ao portador e sacado sobre a sua conta pessoal, confirmou a
respectiva emissão.
Referiu ter emitido tal cheque para a campanha eleitoral da arguida Fátima
Felgueiras e que esse donativo lhe foi pedido pela testemunha Fernando Sampaio (o
qual se fazia acompanhar do arguido Horácio Costa, que na altura não conhecia).
Esclareceu que era a testemunha Fernando Sampaio quem lhe fazia os projectos
de obras.
Teve um processo de licenciamento na CMF e chegou a pagar uma coima no
âmbito de um processo de contra-ordenação.
Confrontado com o teor do documento de fls 82 do apenso 1, constatou-se que
tal cheque foi depositado na conta do BES a 10.10.97.

436
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Veríssimo Sampaio Costa


Referiu que em 1997 era gerente da firma “Calçado Taiti, Ldª”.
Confrontado com o teor da cópia do cheque de fls 500 (ao cimo), no valor de
50.000$00, sem data e emitido ao portador, confirmou a respectiva emissão (sacado
sobre uma conta da firma referida).
Tem a ideia que entregou tal cheque em 1997 ou 1998 e emitiu-o porque os
arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa lhe solicitaram um donativo para a campanha
eleitoral da arguida Fátima Felgueiras.
Conhecia muito bem o arguido Joaquim Freitas e conhecia de vista o arguido
Horácio Costa, não tendo com este qualquer tipo de relacionamento.
Chegou a ter um processo de licenciamento na CMF e a pagar várias coimas.
Confrontado com o teor do documento de fls 82 do apenso 1, constatou-se que o
dito cheque foi depositado na conta do BES a 10.10.97.

- Testemunha Sidónio Marinho Ribeiro da Silva


Confrontado com cópia do cheque de fls 513, datado de 19.11.97, no valor de
400.000$00, confirmou tê-lo emitido ao portador e sacado sobre a sua conta pessoal.
Confrontado com o documento de fls 112 do apenso 1, constatou-se que tal
cheque foi depositado na conta BES a 20.11.97.
Tratou-se de um donativo para a campanha eleitoral da arguida Fátima
Felgueiras, sendo certo que foi o arguido Bragança quem lhe solicitou tal donativo.
Sabia que ele trabalhava na CMF, sendo certo que o conhece desde a infância,
tendo sido inclusivamente colegas de escola.
Recorda-se que lhe entregou o dito cheque em frente à sede de campanha.

- Testemunha José Manuel Pinto Ribeiro


Confrontado com cópia do cheque de fls 516, no valor de 200.000$00, datado de
02.12.97, sacado sobre a sua conta pessoal, confirmou tê-lo emitido ao portador.
Tal depósito foi efectuado a 04.12.94, conforme se constatou por força do
documento de fls 121 do apenso 1.
Tem a ideia que o emitiu para apoiar financeiramente a campanha eleitoral da
arguida Fátima Felgueiras (PS).
Foi o arguido Horácio Costa quem lhe solicitou o donativo na fábrica do
depoente, tendo-lhe entregue o cheque em causa.
Não se recorda se o arguido se fazia acompanhar de alguém, designadamente do
arguido Joaquim Freitas, que conhece bem.

- Testemunha Arnaldo Soares Félix


Confrontado com o cheque de fls 537, no valor de 500.000$00, datado de
23.03.97, sacado sobre a sua conta pessoal, confirmou a respectiva emissão.
Tal cheque foi emitido ao portador segundo a testemunha (mas encontra-se
emitido a favor do arguido Joaquim Freitas), tendo-o entregue para apoiar a campanha
eleitoral do PS.
Recorda-se que foi contactado na sua empresa pelos arguidos Joaquim Freitas e
Horácio Costa (já os conhecia a ambos, sendo certo que o Joaquim era da sua terra e o
Horácio trabalhava na CMF, sabendo que ambos eram mandatários da campanha da
arguida Fátima Felgueiras).
Confrontado com o teor do talão de depósito de fls 173 do apenso 1, constatou-
se que o depósito de tal cheque foi efectuado na conta do BES a 24.03.98.

437
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu que se deve ter enganado na data aposta no cheque (em vez de 23.03.97
deve tê-lo emitido a 23.03.98).

- Testemunha Horácio António Magalhães Lopes dos Reis


Confrontado com o cheque de fls 533, referiu que foi o seu pai (fundador da
“Marfel”) quem o emitiu, o qual foi sacado sobre uma conta de que o depoente era
contitular.
Tratou-se de um donativo entregue em Fevereiro de 1998, donativo esse
solicitado pelo telefone pelo arguido Joaquim Freitas para pagar despesas de campanha.
Foi o depoente quem entregou esse cheque ao Joaquim Freitas, ao que julga, nas
instalações da fábrica da “Marfel” (pensa que ele se encontrava sozinho).
Confrontado com o teor do talão de depósito de fls 169 do apenso 1, constatou-
se que o cheque em causa foi depositado na conta do BES a 11.02.98.
Conhece o arguido Horácio Costa há muitos anos (o pai do depoente era
padrinho de baptismo desse arguido), o qual começou por ser assessor na CMF (não
sabe dizer de quem era assessor). Entretanto substituiu o veredor Lickfold.
Conhece também o Dr. Barata Feio, pois esteve ligado ao FCF. Aliás, ele era
director financeiro de um empresa do qual um sócio do seu pai era sócio. Tal empresa
fechou e por esse motivo ele encontrou novo emprego no FCF.
Conhece muito bem o arguido Júlio Faria. A certa altura ele esteve ligado ao
FCF.
Não se recorda de ter falado com ele acerca da possível admissão da testemunha
Barata Feio para trabalhar no FCF. Admite, em todo o caso, que possa ter exercido
influência nesse sentido.
Como vogal fez parte do concelho editorial da revista “Rubeas”.
Não fez parte da direcção de campanha nas eleições de 1997.
O arguido Júlio Pereira chegou-lhe também a pedir donativos.

- Testemunha José Carlos Mendes dos Santos


Confrontado com o cheque de fls 525, no valor de 500.000$00, emitido ao
portador a 26.12.97 e sacado sobre a sua conta pessoal, admitiu a respectiva emissão.
Tratou-se de um donativo para a campanha eleitoral do PS (não se recorda de
que eleições), não se recordando como é que tal donativo lhe foi solicitado.
Entegou tal cheque no seu escritório no Alto da Lixa a dois senhores que
representavam o PS.
Confrontado com o documento de fls 149, do apenso 1, constatou-se que esse
cheque foi depositado na conta do BES a 29.12.97.
Costumava conceder donativos para várias causas (para o FC da Lixa, para
bandas musicais e para o PSD).

- Testemunha Manuel Ferreira da Cunha


Confrontado com o cheque de fls 512 (em baixo), no valor de 100.000$00, de
18.11.97, sacado sobre a conta da sua firma (“Ferreira da Cunha e Filhos, Ldª”),
confirmou a respectiva emissão.
Tal cheque constituiu um donativo para a campanha eleitoral da arguida Fátima
Felgueiras, sendo certo que o entregou ao arguido Joaquim Freitas na sua fábrica (tal
donativo foi-lhe solicitado por ele nessa ocasião), arguido que se fazia acompanhar de
um outro indivíduo que não conhecia.
Confrontado com o documento de fls 111 do apenso 1, constatou-se que o
depósito na conta do BES ocorreu a 19.11.97.

438
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Miguel Rodrigo da Silva Freitas


Referiu ter sido vendedor da “Incopel”.
Confrontado com o teor dos cheques de fls 540 (no valor de 250.000$00 e
datado de 20.07.98), 542 (no valor de 200.000$00 e datado de 05.11.98), 543 (no valor
de 250.000$00 e datado de 21.11.98) e 545 (no valor de 250.000$00 e datado de
11.02.99), todos sacados sobre uma conta da “Incopel”, esclareceu que a administração
da empresa decidiu acerder aos pedidos de donativos efectuados ao depoente pelo
arguido Joaquim Freitas.
Não se recorda em concreto para que fim se destinavam os donativos, pois a dita
empresa concedeu donativos para várias finalidades (para os bombeiros e para o futebol
por exemplo).
Não se recorda de ter sido concedido qualquer donativo para alguma campanha
eleitoral.
Recorda-se que, no que toca à entrega de um dos cheques referidos (não
conseguiu precisar qual), que o arguido Joaquim Freitas lhe pediu para proceder à
respectiva entrega na CMF ao arguido Horácio Costa, o que fez pessoalmente.
Não conhece a testemunha Leonor (funcionária camarária) e não tem qualquer
memória de ter entregue a uma funcionária camarária, na CMF, qualquer um desses
cheques.
Confrontado com o teor do documento de fls 182 do apenso 1, constatou-se que
o cheque de fls 540 foi depositado na conta do BES a 27.07.98.
Confrontado com o teor do documento de fls 200 do apenso 1, constatou-se que
o cheque de fls 545 foi depositado na conta do BES a 24.02.99.

- Testemunha Manuel Maria de Araújo Lopes Machado


Referiu ser engenheiro civil (tem um gabinete de projectos em Felgueiras e em
Fafe) e vereador na CM de Celorico de Basto (foi candidato derrotado nas eleições de
2005 à presidência da CM de Celorico de Basto).
Referiu apresentar muitos projectos na CMF.
Confrontado com o teor do cheque de fls 503, no valor de 500.000$00, datado
de 16.10.97, emitido à ordem do arguido Joaquim Freitas, confirmou a respectiva
emissão.
Explicou que se tratou de um donativo para a campanha eleitoral do PS nas
eleições autárquicas ocorridas em 1997, o qual lhe foi solicitado pelos arguidos Joaquim
Freitas e Horácio Costa no próprio dia em que emitiu tal cheque. Tal solicitação foi-lhe
feita no seu gabinete de projectos em Felgueiras.
Não tem memória de antes dessa data alguém lhe ter mencionado esse assunto.
Recorda-se que o arguido Joaquim Freitas, na altura em que entregou o cheque,
lhe disse que poderia contribuir com mais de 500 cts, mas o depoente entendeu que um
donativo daquele montante era suficiente.
Nunca o arguido Joaquim Freitas lhe pediu qualquer donativo em sua casa na
ordem dos 6.000 cts.
Conhece a testemunha Jorge Ramiro Magalhães Fernandes (da fábrica de
calçado “Savana”), pois é seu cliente (isto é, fez-lhe projectos de obras) e porque
também fizeram parte de associações (ele por ex. foi vice-presidente da “Casa do
Benfica”).
Admite que lhe possa ter recolhido um donativo mas em 1995/96, aquando das
eleições legislativas de 1995 (fez angariação de fundos para essa campanha juntamente
com o arguido Júlio Faria, designadamente na empresa do dito Jorge Ramiro).

439
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Antes da campanha eleitoral de 1997 o depoente fez parte de um grupo de


recolha de fundos para a sede do PS.
Confrontado com o segundo cheque de fls 501 (emitido pelo dito Jorge Ramiro,
datado de 09.07.97), referiu que não sabe a quem esse cheque foi entregue, sendo certo
que não se trata de um donativo recolhido por si para a sede do PS.
Não participou na campanha eleitoral de 1997
*
A propósito destas declarações da testemunha Manuel Machado, referiu o
arguido Horácio Costa que ouviu falar muito dela quando foi trabalhar para a CMF,
pois diziam-lhe que apresentava muitos projectos na CMF.
Em 1999 recebeu um convite para jantar em casa dele na medida em que a sua
esposa reencontrou a esposa dele (foram colegas) e esta formulou o dito convite para
jantar.
Foi só nesse jantar (ocorrido em Outubro/Novembro de 1999) que conheceu a
testemunha em causa, pelo que é falso ter-lhe pedido qualquer donativo.
Os donativos que reverteram para a campanha eleitoral de 1997 através dessa
testemunha chegaram à sua mão da forma que já explicou (o contributo dessa
testemunha chegou-lhe via arguida Fátima; sabe que ele entregou ao arguido Joaquim
Freitas um cheque de um cliente seu nas imediações do seu gabinete, pois o depoente
estava presente).
O gabinete dele em Felgueiras fica situado no edifício localizado nas traseiras da
CMF e numa fracção desse prédio contígua à fracção onde estava instalada a sede do
PS.
Essa testemunha, o arguido Joaquim Freitas e outra pessoa (que não identificou)
tinham-se comprometido a resolver o pagamento da dívida do “Sovela” a uma empresa
gráfica (“Nafprinter”, da Maia), razão pela qual não existia grande à-vontade para lhe
pedir qualquer donativo.
A testemunha em causa e a respectiva esposa desde a primeira hora que deram o
seu apoio à arguida Fátima quando as questões abordadas nos autos vieram a público.
*
Em face destas declarações a testemunha Manuel Maria de Araújo Lopes
Machado confirmou que o arguido Horácio e a sua esposa foram jantar em sua casa na
medida em que as respectivas esposas foram colegas.
Poucas vezes contactou com o arguido Horácio, mas quanto ao donativo que
entregou, reafirmou a sua versão dos factos.
*
O arguido Joaquim Freitas, a propósito das declarações da testemunha Manuel
Maria de Araújo Lopes Machado, reafirmou que, aquando da entrega do respectivo
donativo de 500 cts, lhe disse que ele poderia contribuir com 6 ou 7.000 cts.
Explicou que por causa de dívidas do “Sovela” ele aceitou ao progenitor do
depoente uma letra no valor de 6 ou 7.000 cts, sendo certo que a arguida Fátima chegou-
lhe a dizer que ele tinha a obrigação de pagar essa dita letra porque tinha muitos
projectos na CMF, razão pela qual lhe falou desse assunto em casa da dita testemunha
(estava presente o Sr. Augusto de Faria, presidente da Junta de Freguesia de Barrosas),
ao que ele lhe respondeu que iria falar com a arguida Fátima, que era muito dinheiro
(quando se referiu a este assunto aquando das suas declarações não revelou este aspecto
para não o ”acusar”. Admitiu que ele não lhe disse para transmitir à arguida Fátima que
o não tinha encontrado, ao contrário do que tinha referido aquando da tomada de
declarações).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Precisou que a dita letra foi aceite quer pela testemunha em causa quer pelo
depoente, sendo certo que não foi paga.
Foi ele quem lhe entregou os donativos angariados junto de clientes seus, sendo
certo que se não fizesse qualquer contribuição os projectos que apresentou na CMF não
seriam aprovados.
*
Em face destas declarações, a testemunha Manuel Machado referiu que de
facto aceitou uma letra no valor de 6.000 cts conforme referido pelo arguido Joaquim
Freitas.
Explicou que foi o primeiro director do “Sovela”, ainda em 1994, e já então o
jornal debatia-se com inúmeras dificuldades financeiras, pelo que os credores
começaram-lhe a bater à porta. Era pois necessária a obtenção de donativos, subscrição
de assinaturas e publicação de publicidade.
Decidiu em face disso não continuar cerca de 8 ou 9 meses depois.
Foi entretanto confrontado com os problemas financeiros do jornal
(designadamente a dívida perante a gráfica) pelos arguidos Joaquim Freitas e Júlio Faria
e pelas testemunhas Horácio Reis e Bessa Pinheiro.
Dada a iminência do fecho do jornal, esse grupo de pessoas decidiram recorrer
ao pai do arguido Joaquim Freitas de modo a que ele pagasse as dívidas do jornal, ao
que ele aceitou desde que o depoente e o filho aceitassem uma letra no valor
disponibilizado por ele.
Certo dia o arguido Joaquim Freitas telefonou-lhe dando-lhe conta de que era
necessário resolver o problema do pagamento da letra, pois o seu pai aborrecia-o com
esse assunto.
Para o efeito era necessário reunir o grupo de pessoas co-responsáveis pelo
pagamento desse montante (as pessoas que acima referiu – incluindo o depoente e o
arguido Joaquim Freitas - comprometeram-se verbalmente a solidariamente pagarem
aquele montante, mas só estes últimos aceitaram a dita letra), o que até ao momento não
sucedeu.
Na ADEC chegou-se a fazer reuniões devido aos problemas financeiros do
jornal, mas sem dinheiro nada se resolvia.
Quando o arguido Joaquim Freitas lhe abordou esse assunto não lhe disse que
iria falar com a arguida Fátima Felgueiras a esse propósito.
*
Em face das contradições existentes entre o depoimento das testemunhas Jorge
Ramiro Magalhães Fernandes e Manuel Maria de Araújo Lopes Machado,
procedeu-se à respectiva acareação.
A testemunha Jorge Ramiro reafirmou o teor das suas declarações (assegurou ter
a certeza que era a testemunha Manuel Maria e o arguido Júlio Faria quem lhe
solicitaram o donativo a que respeita o cheque por si emitido e constante de fls 501,
tendo-lhe referido que andavam a pedir para a sede do PS, sendo certo que o terceiro
elemento que os acompanhava ficou à porta da sua empresa ao telemóvel). Não tem
memória de lhe terem solicitado um donativo para outro fim, sendo certo que emitiu o
referido cheque na data que nele consta (09.07.97).
Por sua vez, a testemunha Manuel Lopes Machado reafirmou que participou
num peditório para a sede do PS muito antes das eleições de 1997 (tal peditório foi
efectuado em 1996), não reconhecendo por isso que o cheque de fls 501 lhe tenha sido
entregue.
Explicou que após a ida do arguido Júlio Faria para a Assembleia da República
ele passou a ter mais disponibilidade para tratar dos assuntos respeitantes ao PS,

441
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

designadamente a respectiva sede local, daí que foi constituída uma equipa em 1996 de
recolha de fundos para a sede do PS (de que faziam parte, além do depoente e do
arguido Júlio Faria, o arguido Joaquim Freitas e a testemunha Fernando Sampaio).
No âmbito da recolha de fundos, visitaram a fábrica de calçado “Savana”.
O depoente também fez parte de uma equipa constituída para recolher fundos
para o “Sovela”, não se recordando em que ano esse peditório foi feito, mas pensa que
terá sido também em 1996 (andou no dito peditório – à data era o director do jornal -
com o Dr. Horácio Reis – à data subdirector do jornal – e o Dr. Bessa Pinheiro –
economista do jornal). Quando deixou de ser director do jornal colaborou ainda na
recolha de fundos para o “Sovela” com o arguido Júlio Faria, com o Dr. Bessa Pinheiro
e o Sr. Augusto Faria (eram ao todo 5 elementos, não se recordando da identidade do
quinto elemento).
*
Em face da acareação realizada entre as testemunhas Jorge Ramiro e Manuel
Machado, referiu o arguido Júlio Faria que esteve envolvido no processo de aquisição
da sede do PS.
Explicou que no final de Março de 1996 tomou posse como presidente da
Comissão Política do PS de Felgueiras.
Em Maio de 1996 o PS local ocupou as instalações da sua sede e a Comissão
Política viu-se confrontada com o problema da liquidação do preço da sede.
Constituíram-se assim equipas de angariação de fundos entre Junho/Julho de
1996 (data em que estavam vencidos os compromissos para com o vendedor).
Manuscreveu para o efeito uma lista de empresas a contactar pelas equipas
constituídas a fim de solicitarem o respectivo donativo.
É pois plausível que se tivesse deslocado à fábrica de calçado “Savana”, que
constava da referida lista, para solicitar e recolher um donativo, mas tal terá ocorrido em
1996.
Em 1997 o depoente já não liderava a Comissão Politica pelo que já não teria
participação nessa questão.
Não tem a certeza se todo o preço de aquisição da sede foi liquidado durante o
tempo em que presidiu à Comissão Política. Em todo o caso, grande parte do preço foi
liquidado nessa altura.
Confrontado com o cheque de fls 4126, no valor de 500.000$00, datado de
16.04.99, emitido ao portador (cfr. o respectivo talão de depósito na conta do PS, a fls
301, do apenso 30, a 20.04.99), referiu que se trata de um cheque do Sr. José Manuel
Monteiro Neves (mas a assinatura aposta nesse cheque não é a dele, pois tem a
assinatura da arguida Maria Augusta Faria Ferreira Neves), tratando-se de um donativo
para a sede do PS.
Conclui portanto que em Abril de 1999 ainda não estava totalmente liquidado o
preço de aquisição da sede do PS.
Explicou que esse espaço foi entregue ao PS em Abril/Maio de 1996 e ficou
acordado com o vendedor que em finais de Junho ou Julho de 1996 teriam de liquidar a
totalidade do preço (que foi de 15.000.000$00). Foi pois nesse período que encetaram
as diligências para angariar fundos em ordem a liquidar a totalidade do preço, o qual foi
liquidado em grande parte nessa altura.
Como deixou de presidir à Comissão Politica em finais de 1996, desligou-se
desse assunto.
Em Outubro de 1997 era deputado na Assembleia da República, era dirigente do
FCF e já integrava a direcção de campanha do PS nas eleições autárquicas desse ano.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assegurou assim que nesse ano não diligenciou pela angariação de fundos para a
sede do PS.
Pode em todo o caso ter-se dirigido à fábrica de calçado “Savana” para recolher
um donativo para outras causas, designadamente para o FCF.
*
- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia
Explicou que os quadros de movimentos da conta do BES elaborados pela
investigação foram efectuados tendo por base o extracto da conta do BES (constante no
apenso 1), os documentos de suporte fornecidos pelo arguido Horácio Costa e
elementos recolhidos de depoimentos.
No quadro referente a entregas que não passaram pela conta do BES constam
três entregas em numerário (de 500 cts por Jorge Fonseca da “Anglomex”, 5.250 cts e
5.381.653$00, ambos pela “Resin”) – cfr. fls 2800 e 2801 (parece que a entrega de 500
cts deveria antes constar no primeiro quadro e não no segundo, pois na verdade esse
montante terá sido depositado na conta do BES).
De todas as entregas em numerário, segundo os quadros 1 e 2 referidos, apenas
três entregas em dinheiro não terão sido depositadas na conta do BES (parece que serão
apenas duas entregas, pois a inserção num dos quadros de uma entrega de 500 cts pela
testemunha Jorge Fonseca terá sido feita por lapso).
Não apuraram porque razão os dois valores entregues em numerário pela
“Resin” (de 5.250 cts e 5.381.653$00) não passaram pela conta do BES.
O quadro de fls 2787 a 2796 do 12º volume diz respeito aos movimentos da
conta do BES em função do extracto da conta do BES, documentos de suporte entregues
pelo arguido Horácio, documentos recolhidos pela investigação e elementos que
emergiram de inquirições.
Os documentos de fls 491 a 546 reportam-se a cópias de cheques referentes a
donativos. A generalidade deles estava datado do último trimestre de 1997 e na sua
maioria eram provenientes do tecido empresarial de Felgueiras.
A fls 2183 consta um cartão da “Anglomex” (testemunha Jorge Fonseca), onde
se faz referência a votos de vitória nas eleições, encontrando-se em tal documento
manuscrito o montante de 500 cts (correspondente ao donativo entregue. Essa inscrição
desse montante no cartão foi efectuada de forma claramente diferente dos restantes
dizeres do cartão e terá sido manuscrita por outra pessoa) – cfr. a cota de fls 2181
elaborada pelo depoente, designadamente o penúltimo parágrafo.
Referiu que é prática a recolha de donativos aquando das campanhas eleitorais.
Fizeram um cruzamento dos cheques referidos com os depósitos efectuados na
conta do BES e verificaram que todos eles ali foram depositados.
Constataram a existência de cheques emitidos com data posterior às eleições
autárquicas.
Explicou que podem acontecer recebimentos e pagamentos posteriores ao acto
eleitoral.
Nas denúncias anónimas constantes dos autos fazem-se referência a alguns
licenciamentos irregulares.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A conta do BES foi aprovisionada monetariamente com donativos de pessoas de
Felgueiras (mormente empresários), em face das cópias dos cheques juntas aos autos e
do extracto bancário dessa conta, bem como de alguns documentos apreendidos na
CMF e que aludiam ao pedido de apoios.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi o arguido Horácio Costa quem entregou cópia dos cheques referentes a
dinativos, juntos a fls 491 a 546 do 3º volume.
A PJ solicitou também aos bancos cópias dos cheques, na medida em que as
cópias dos cheques fornecidas pelo arguido Horácio reportavam-se apenas ao respectivo
rosto e muitos eram emitidos ao portador.
Ele tinha cópia desses cheques na medida em que eles lhe eram entregues.
Em face das datas dos cheques em causa, presume que a maior parte deles se
destinavam a suportar despesas de campanha.
A investigação elaborou um quadro de pessoas que deram donativos através de
cheque e que tinham processos de licenciamento na CMF.
Tentaram perceber a existência de uma relação, sobretudo temporal, entre a
entrega do donativo e certos actos praticados no âmbito dos respectivos processos de
licenciamento.
Solicitaram, para o efeito, o apoio da IGAT e da Inspecção Geral de Finanças.
Assim, dois inspectores da IGAT analisaram os processos de licenciamento e de
contra-ordenação.

Análise crítica
Em face das declarações do arguido Horácio Costa, dos documentos de fls 491 a
546, do depoimento das várias testemunhas que deram o seu donativo (designadamente
para a campanha eleitoral de 1997, ainda que por vezes esse donativo tenha sido
concedido em data posterior a Dezembro desse ano), a conta do BES e a “caixa
paralela” terão sido também aprovisionadas com donativos provenientes do tecido
empresárial felgueirense e também de outros particulares residentes no concelho.
Emerge das declarações do arguido Horácio Costa que, de facto, existiam umas
listas de pessoas a contactar, lista essa fornecida pela arguida Fátima ao arguido
Joaquim de Freitas.
Não é de estranhar que essas listas tenham sido fornecidas ao arguido Joaquim
Freitas (e não ao arguido Horácio Costa) na medida em que era aquele quem conhecia o
meio empresarial felgueirense e dado que anteriormente (a propósito da campanha
eleitoral para as eleições autárquicas de 1993) já tinha feito parelha com a testemunha
Sousa Oliveira na angariação de fundos (facto que esta testemunha aliás confirmou).
Era pois, além do mais, com base em listas ou com base em indicações verbais
da arguida Fátima que eles iam solicitando os respectivos donativos.
A lista de fls 168, da lavra da arguida Fátima, por seu turno, diz respeito a uma
angariação de fundos para o “Sovela” e não para a campanha eleitoral de 1997.
Não se apurou, em todo o caso, qual a razão de ser da aposição de cruzes em
frente dos nomes que constavam das “listinhas”, já que sobre essa matéria apenas o
arguido Joaquim Freitas depôs com melhor conhecimento de causa, sendo certo que o
seu depoimento, nessa parte, não poderá ser valorado pelos motivos que já deixamos
expressos.
Nenhuma relação pode assim ser estabelecida entre esse facto e a existência de
processos de licenciamento e/ou de irregularidades no respectivo âmbito.
Já vimos que a arguida Fátima Felgueiras assegurou, a propósito desta matéria,
que adoptou uma posição de total afastamento em relação à questão da recolha de
donativos.
Sobre essa alegação, bastamente reiterada ao longo do julgamento, já tivemos a
oportunidade de tecer alguns comentários a propósito do ponto 1.1. da pronúncia e que
aqui chamamos à colacção.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Seja como for, mesmo a fazer fé nas declarações proferidas pelo arguido
Horácio Costa, terá sido de forma residual que a arguida Fátima terá solicitado ou
recebido directamente donativos para a campanha eleitoral de 1997 (foi ela quem
entregou ao arguido Horácio, por exemplo, o donativo concedido pelo legal
representante da “Anglomex”, conforme emergiu do depoimento da testemunha Jorge
Fernando Moreira da Fonseca).
Quando os arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa não recebiam os donativos
directamente, as mais das vezes eles eram-lhes entregues por elementos do GAPP
(naturalmente que os elementos do GAPP ouvidos, sem qualquer credibilidade,
negaram terem recebido donativos, assim como negaram terem encetado alguns prévios
contactos de pessoas a serem visitadas pelos arguidos Horácio e Joaquim Freitas).
Neste particular, pareceu-nos mais credível, uma vez mais, a versão dos factos
contada pelo arguido Horácio Costa, pois pareceu-nos nítido que algumas das
testemunhas ouvidas não se quiseram comprometer (foram aliás ouvidas testemunhas
que referiram terem entregue o donativo respectivo na CMF ao arguido Horácio ou a
funcionários camarários que prestavam o seu serviço na “zona política” do edifício
camarário).
Em todo o caso, não ficou suficientemente esclarecido, em concreto, quais os
elementos do GAPP que receberam tais donativos e os encaminharam para o arguido
Horácio Costa e quem desse gabinete terá efectuado contactos telefónicos a dar conta da
visita dos arguidos Horácio e Joaquim no sentido de solicitar ou de recolher um
donativo.
Por outro lado, da análise dos processos de licenciamento referidos nos autos
salta à vista que a arguida Fátima Felgueiras decidiu sempre com base nos pareceres
técnicos (cfr. o relatório da IGAT de fls 3165 e ss.).
Seja como for, não se convenceu o Tribunal que ela, não obstante, sempre
decidiu sem qualquer intuito de beneficiar algum munícipe, sendo certo que, em todo o
caso, também não se demonstrou o contrário, até pela circunstância de – legais ou não –
as decisões tomadas se terem fundado sempre em pareceres técnicos, sendo óbvio que a
arguida Fátima não teria os conhecimentos técnicos necessários na área do urbanismo
para que, sem eles, pudesse decidir.

Anastácio Augusto Pinto Macedo

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Começou por referir não saber quem é o arguido Anastácio Macedo.
Referiu desconhecer ter ocorrido algum encontro entre o dito Anastácio e os
arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa, sendo certo que estes nunca lhe deram conta
de terem pedido algum donativo nos moldes descritos na pronúncia, além de que na
altura o arguido Horácio Costa era apenas um avençado da CMF, pelo que duvida que
os serviços camarários permitissem sequer que ele consultasse o processo de
licenciamento nº 68/83 (que é o processo de licenciamento a que se reportam os autos).
A arguida fez a análise do processo de licenciamento em causa, donde resulta
que o primeiro despacho que proferiu data de 29.01.96, sendo certo que a licença de
construção foi concedida (tendo sido posteriormente emitido o respectivo alvará) e cuja
prorrogação foi concedida por mais 30 dias (por despacho datado de 19.08.97).
Entretanto, em face da informação datada de 24.09.97 foi concedida a licença de
utilização (a qual não tem aposta qualquer data, sendo certo que o despacho final data
de 24.09.97 e as taxas devidas foram liquidadas a 25.09.97).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontada com a cópia do cheque de fls 495, do 3º volume, datado de


25.09.97, emitido ao portador e titulando a quantia de 250.000$00, bem como com o
cheque cuja cópia se acha a fls 502 do 3º volume, no valor de 250.000$00, emitido a
favor do arguido Joaquim Freitas e datado de 15.10.97 (cfr. o movimento nº 40, datado
de 16.10.97, a fls 2788, e fls 86 do apenso I, da mesma data e reportado ao depósito de
tal quantia), alegou ser falso que o arguido Horácio Costa lhe tenha pedido para emitir a
licença de utilização respectiva em contrapartida do donativo em causa, tanto mais que a
mesma já estava deferida desde 24.09.97 (isto é, um dia antes da data de emissão do 1º
cheque emitido pelo arguido Anastácio).
Alegou ainda que para a emissão da dita licença não se torna necessária a
realização de qualquer vistoria por parte dos serviços camarários.
Além disso, entre 15.10.97 e Dezembro do mesmo ano não se regista qualquer
depósito de 250.000$00 na conta paralela referida nos autos, pelo que a referida quantia
não foi depositada naquela conta mas apenas numa conta titulada pelo arguido Joaquim
Freitas (cfr. fls 16 e ss. do ap. I).

- Arguido Horácio Costa


Começou por referir que não conhecia o arguido Anastácio Macedo.
Relatou que em meados de Setembro de 1997, saía o depoente do seu gabinete
com o arguido Joaquim Freitas, nas instalações da CMF, quando o dito arguido
Anastácio Macedo se aproximava acompanhado de José Maria Guimarães Sampaio e
fez uma “grande festa” ao “Quinzinho” (o arguido Joaquim de Freitas), tendo-lhe
perguntado pela arguida Fátima Felgueiras, ao que lhe foi respondido que não sabiam se
ela se encontrava ou não no edifício da CMF. Acto contínuo o dito Anastácio Macedo
profere a seguinte expressão: “ó Quinzinho eu venho aqui resolver um problema de uma
licença”, acrescentando que tinha pendente uma verba no BES referente a um
financiamento de fundos comunitários e que se a situação se desbloqueasse iam todos
para a Madeira ou permitia que passassem umas férias num apartamento que tinha numa
zona balnear.
O depoente aconselhou-o então a falar com arguida Fátima Felgueiras pois era
ela quem tinha o pelouro das obras particulares, informando-o que o arguido Bragança e
a testemunha Júlio Pereira o poderiam informar do paradeiro da arguida Fátima,
remetendo-o pois para eles. Nega terminantemente que se comprometeu a “desenrascá-
lo”, nem tinha poderes para tal, tanto mais que a arguida Fátima não permitia que o
depoente fizesse audiências a empresários (tratavam-se, segundo ela, de audiências “de
primeira”).
Explicou que na altura não lhe foi pedido qualquer donativo por duas ordens de
razões: por um lado não tinham essa indicação da arguida Fátima; por outro lado nunca
permitiria que nas instalações da CMF se abordasse esse assunto.
Pareceu ao depoente que o arguido Anastácio se encontrava “alegre” (portanto,
sob o efeito do álcool).
Cerca de 15 dias depois o arguido Joaquim de Freitas comunicou-lhe que teriam
de recolher 250.000$00 ao arguido Anastácio, pois ele tinha-lhe telefonado a dizer que
tinha um cheque nesse montante. O depoente escusou-se a acompanhar o arguido
Joaquim de Freitas pois desagradou-lhe a conversa que o arguido Anastácio tinha tido
com eles na CMF e que já relatou, designadamente de aliciamento.
Foi o depoente quem depositou tal cheque a 25.09.97, conforme emerge do
documento de fls 495, do 3º volume.
Cerca de 15 dias depois a arguida Fátima Felgueiras entregou-lhe mais um
cheque de 250.000$00 do dito Anastácio Macedo, passado à ordem do arguido Joaquim

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

de Freitas, dando-lhe instruções para o depositar (cfr. documento de fls 502 do 1º


volume, datado de 15.10.97). Deu nota disso ao arguido Joaquim de Freitas, o qual
estranhou que o dito cheque tivesse sido passado à sua ordem.
Tal cheque foi depositado na conta do BES, a 16.10.97, conforme documento de
fls 86 do apenso 1 (trata-se do depósito de dois cheques, um de 250 cts e outro de 200
cts), sendo certo que foi o depoente quem rubricou o respectivo talão de depósito (cfr.
ainda fls 16 e ss. do apenso 1 – extracto da conta do BES).
Nega terminantemente que tenha entregue em mão qualquer licença de
utilização ao arguido Anastácio. Nunca pediu o que quer que seja à arguida Fátima
Felgueiras a propósito do processo de licenciamento em causa, de cujo andamento
estava completamente alheado.
Soube aliás que o Dr. Sousa Oliveira procurava os empresários e os “treinava”
antes de serem inquiridos pela PJ.
Mais tarde soube pelo arguido Joaquim de Freitas (já no decurso deste processo)
que o arguido Anastácio gabou-se num restaurante que tinha comprado uma licença na
CMF.

- Arguido Joaquim Freitas


Conhece o arguido Anastácio porque ele tem uma fábrica de calçado e
contribuiu para a campanha eleitoral de 1997.
Ao que pensa em Julho de 1997, estando com o arguido Horácio Costa na CMF,
no corredor à entrada do GAPP, o arguido Anastácio, ao que pensa acompanhado pelo
Sr. José Sampaio, dirigiu-se-lhes e referiu que tinha problemas com uma licença para
resolver.
Explicou que as pessoas mais velhas e conhecidas tratam-no por “Quinzinho” e
admite que o arguido Anastácio o possa ter tratado dessa forma quando o abordou na
CMF (pese embora não se recorde desse facto) e lhes prometeu um fim-de-semana na
Madeira ou na sua casa de férias (um apartamento em Cascais) se o ajudassem a
resolver um problema com uma licença. Foi logo nessa altura que o remeteram para o
GAPP, pois era ali que o poderiam pôr em contacto com a arguida Fátima. Ignora o que
se passou na sequência desse episódio e de que forma lhe foi entregue a respectiva
licença.
Recorda-se que o arguido Anastácio cheirava um pouco a vinho, sendo certo que
nessa altura não lhe solicitaram qualquer donativo.
Certo é que semanas depois o arguido Anastácio contribuiu com um donativo
(não se recorda se de 250 ou de 500 cts) – cfr. cópia do cheque de fls 495 do 3º volume,
respeitante a um cheque de 250 cts e datado de 25.09.97. Mais tarde fez um segundo
donativo de 250 cts (não sabe a quem foi entregue o respectivo cheque) – cfr. a cópia do
cheque de fls 502 do 3º volume, datado de 15.10.97.
No que respeita ao cheque cuja cópia se acha a fls 502 do 3º volume ignora
porque motivo foi emitido a seu favor. O arguido Anastácio sabia que o depoente
andava a angariar fundos para a campanha eleitoral.
Não sabe se ele resolveu o seu problema com uma licença, mas constava-se que
o arguido Anastácio tinha “comprado” uma licença, facto de que ele aliás se gabava
quando bebia uns copos.
O arguido Anastácio costuma contribuir com donativos para várias iniciativas e
causas, como por exemplo para a campanha eleitoral de 1997, para a sede do PS e para
o “Sovela”.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Anastácio Macedo emitiu dois cheques, constantes de fls 495 (de
25.09.97) e 502 (de 15.10.97).
Os processos de licenciamento suspeitos foram apreendidos e analizados por
técnicos da IGAT.
Para além das declarações recolhidas pela PJ não tem qualquer elemento
objectivo que lhe permita fazer a ligação entre os donativos concedidos e os processos
de licenciamento em causa.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


O arguido Anastácio foi um dos empresários que concedeu donativos para a
campanha eleitoral do PS (cfr. cópia dos cheques de fls 495 e 502 dos autos).
Ele tinha um problema com a aprovação do licenciamento na CMF de uma
construção.
Um dos cheques referidos foi entregue antes da aprovação do projecto e outro
depois.
Só pela análise dos documentos não pode afirmar que ele tenha sido favorecido
com a aprovação do projecto em face da concessão dos aludidos donativos.

Análise crítica
Em face da prova produzida, acima sintetizada, salta à vista que não se
demonstraram os factos indicados na pronúncia no que respeita à relação entre a entrega
dos dois donativos pelo arguido Anastácio Macedo e o andamento do processo de
licenciamento nº 68/83.
Os donativos concedidos (cfr. cheques de fls 495 e 502 dos autos e os talões de
depósito na conta do BES de fls 75 e 86, ambos do apenso 1) prefazem o valor global de
500 cts, sendo certo que, em face das declarações prestadas pelo arguido Horácio, o
segundo cheque foi-lhe entregue pela arguida Fátima (não se demonstrou em todo o
caso que esta o tenha recebido das mãos do arguido Joaquim, pois isso não emergiu de
nunhum dos depoimentos prestados).
Ademais, não emergiu de nenhum depoimento, designadamente dos arguidos
Horácio e Joaquim, que o arguido Anastácio tenha sido abordado por eles no Verão de
1997, na escadaria do edifício da CMF ou em qualquer outro local do mesmo edifício,
no sentido deste conceder o respectivo donativo e que terá concordado em concedê-lo
em duas tranches de 250 cts em face do compromisso daqueles em solucionar, junto da
arguida Fátima, o problema que ele tinha com o licenciamento de um pavilhão
industrial.
Como se viu, a versão dos factos contada pelos ditos Horácio e Joaquim foi
totalmente diferente da que consta da pronúncia, sendo certo que, com conhecimento de
causa, acerca dessa matéria mais ninguém foi ouvido.
Ao que parece, segundo o arguido Joaquim Freitas, era habitual o arguido
Anastácio conceder donativos para várias causas (entre as quais, naturalmente,
donativos para campanhas eleitorais).
Reafirma-se que nenhuma relação segura pode ser estabelecida entre a entrega
daqueles donativos e a concessão do almejado alvará de licenciamento no âmbito do
processo de licenciamento nº 68/83, tanto mais que as decisões tomadas no seu âmbito
pela arguida Fátima escudaram-se em pareceres técnicos, sendo certo que da prova
produzida não emergiu que tenha sido o arguido Horácio Costa quem entregou em mão
a dita licença ao arguido Anastácio.
Seja como for, diga-se, também não nos convencemos que a concessão da dita
licença não tenha sido a contrapartida pela entrega daquele donativo (segundo,

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

designadamente, o arguido Horácio, o arguido Anastácio gabava-se de a ter


“comprado”), mas a prova produzida – já referida – é insuficiente em ordem a dar-se
como demonstrado tal facto, pelo que terá necessariamente, neste particular, de
funcionar o princípio in dubio pro reo como manifestação da presunção de inocência
dos arguidos.
Em face desta dúvida, não pode o Tribunal dar como provado que a arguida
Fátima tenha sempre agido sem qualquer intuito de beneficiar algum munícipe em face
de vantagens económicas recebidas (pela mesma razão, em todo o caso, também não
pode dar como demonstrado o contrário, não sendo contraditória a não prova de
nenhuma das versões apresentadas no que ao seu núcleo factual concerne).

Carlos Sampaio Teixeira

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu que a firma “Ambienta” é um dos gabinetes de arquitectura que trata de
processos de licenciamento junto da CMF.
Mencionou conhecer o arguido Carlos Teixeira e que ignora se algum donativo
foi concedido por ele (confrontada com o teor da cópia do cheque de fls 520 do 3º
volume, datado de 18.11.97 e emitido ao portador, referiu não ter tomado conhecimento
desse donativo na altura; cfr. ainda o documento de depósito de fls 133 do apenso I,
efectivado a 12.12.97), negando a versão vertida na pronúncia quanto à forma como
alegadamente o donativo foi concedido.
Além disso, se algum dia falou com ele acerca do processo de licenciamento
seria na audiência que normalmente concede à Quinta-feira, sendo certo que se tal
tivesse acontecido teria de existir uma nota desse facto no respectivo processo de
licenciamento.
Analisou-se então o processo de licenciamento nº 902/97, onde se constatou que:
- O primeiro despacho proferido pela arguida data de 31.10.97, na sequência do
requerimento inicial apresentado pelo dito Carlos Teixeira;
- O 2º despacho proferido foi-o a 09.04.98 (na sequência de requerimento datado
do dia anterior a dar sem efeito o pedido de licenciamento, por motivos que alegou
desconhecer, ignorando ainda se à data os trabalhos de construção já se haviam iniciado
ou não).
Referiu ainda que nunca deu instruções aos Serviços de Fiscalização (integrados
no Departamento Técnico) para fiscalizarem aquela obra, sendo certo que é o
Departamento Técnico que coordena a actividade fiscalizadora.
Não põem em causa que a obra tenha sido fiscalizada, mas não o foi por ordem
da depoente.
Analisou-se então o novo processo de licenciamento nº 255/98.
Nele estão contidas fotos alusivas à movimentação de terras, referindo ignorar
em que data foram tiradas e se na altura delas tomou conhecimento (por norma
despacha os processos de licenciamento sem que o processo lhe seja todo presente, mas
apenas as folhas necessárias para proferir o despacho pertinente, sendo certo que os seus
despachos têm sempre por base os pareceres técnicos proferidos pelos serviços; em todo
o caso, normalmente só quando é necessário um parecer jurídico ou quando é agendada
uma audiência a propósito de algum licenciamento é que todo o processo lhe é remetido
pelos serviços).
O primeiro despacho em tal processo de licenciamento data do dia seguinte ao
da entrada do requerimento respectivo (isto é, o primeiro despacho data de 06.07.98).

449
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu não se recordar de ter falado com o arguido Carlos Teixeira acerca do
processo de licenciamento em causa, sendo certo que se isso tivesse ocorrido haveria de
existir uma folha no processo a dar conta desse facto.
Certo é que nos autos de licenciamento existe o registo de uma audiência
ocorrida a 09.07.98.
Esclareceu que se a fiscalização tivesse inspeccionado a obra, ao tempo, não
constaria essa informação no respectivo processo de licenciamento (ao contrário do que
sucede actualmente).
Com data de 15.09.98 proferiu o despacho final de indeferimento do
licenciamento.
Na sequência de novo requerimento (que entrou a 09.10.98), proferiu novo
despacho a 10.12.98, tendo sido aprovados os projectos de arquitectura e notificado o
requerente para apresentar os projectos de especialidade.
Confirmou que no dia 28.01.99 o Carlos Teixeira esteve na CMF mas não falou
com a depoente (cfr. informação da secretária da presidente e a informação da depoente
datada de 12.02.99).
Esclareceu que pode dar autorização para o início das obras, desde que tenha
sido emitida licença para caboucos e caso o projecto de arquitectura esteja aprovado
(faltando a aprovação dos projectos de especialidade).
Entretanto, a 13.10.99 despachou no sentido de conceder o respectivo alvará de
licenciamento.
Na sequência de informação do Ministério da Economia de concessão do
licenciamento industrial a depoente despacha no sentido do requerente ser notificado
para dar cumprimento ao solicitado pelo Departamento Técnico (despacho datado de
05.11.99).
Foi feita uma vistoria à obra a 03.04.2000 e notificado o requerente para se
pronunciar acerca da mesma e do parecer proferido.
Nova vistoria foi efectuada a 30.05.2000 (agora só faltava um ramal de
saneamento).
Foi efectuada nova vistoria a 27.06.2000, na sequência da qual, a 06.07.2000,
despacha no sentido de conceder a licença de utilização (em face da qual e depois de
pagas as taxas, no montante de 634.230$00, é emitido a 02.08.2000 o alvará nº
457/2000).
Em face da constatação de que a obra já estava concluída antes da aprovação dos
projectos de especialidade ignora se foi ou não aberto um processo de contra-ordenação,
sendo certo que não tinha de mandar instaurar tal processo, pois os Serviços de
Fiscalização estão integrados no Departamento Técnico, o qual têm competência para o
efeito.

- Arguido Barbieri Cardoso


Esclareceu que, não obstante o projecto ter sido elaborado pela firma
“Ambienta”, de que é sócio, não teve qualquer intervenção na sua realização.
Da análise que efectuou do processo de licenciamento nº 902/97, concluiu que:
A 31.10.97 foi apresentado o respectivo processo.
A 30.12.97 o Director do PDM deu um parecer negativo.
Em Dezembro de 1997 também o SNB deu um parecer negativo.
Entretanto a fiscalização informou que a obra não havia sido iniciada.
A 09.04.98 foi efectuado o pedido de arquivamento do processo.
Esclareceu que até à inspecção levada a cabo pela IGAT, pela testemunha Maria
Natal, os processos de licenciamento não eram numerados e à data as cópias dos autos

450
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

de notícia referentes a irregularidades verificadas não eram juntas ao respectivo


processo de licenciamento.
Mais esclareceu que, em face do regime legal em vigor à data, não era
obrigatória a realização de uma vistoria para a concessão da licença de utilização. O
técnico responsável pelo projecto era o responsável pela conformidade do projecto com
a obra edificada.
Em todo o caso, a CMF procedia a essa vistoria se ao longo do processo de
licenciamento se verificaram irregularidades ou se existiam indícios de irregularidades.
Além disso, nos prédios de habitação colectiva por norma essa vistoria era feita.
Também nos licenciamentos de obras referentes a indústrias era costume
proceder-se à vistoria, mas tudo dependia da sensibilidade do chefe de divisão.
Essa vistoria por norma era igualmente feita quando as obras eram realizadas no
domínio público.
Da análise do processo de licenciamento nº 255/98, concluiu que:
O respectivo requerimento deu entrada a 09.04.98.
Foram juntas ao processo de licenciamento em causa fotos do terreno e onde é
perceptível que no local foram efectuadas movimentações de terras e de limpeza.
Entende que para a realização dessas obras seria necessária a respectiva licença.
Esclareceu que regularmente a CMF exigia a junção de fotos do terreno onde a
obra deveria ser implantada.
Ignora – porquanto tal não é perceptível no processo referido – se o chefe de
divisão mandou fazer alguma vistoria ou se foi efectuado algum auto de notícia em face
do que se observa em tais fotografias.
Admite que tal não possa ter sido feito, visto que as movimentações de terras
referidas reportam-se sobretudo a nivelamento e limpeza do terreno, pese embora
reconheça a existência de um talude e que essas obras careciam de licenciamento.
A 15.06.98 o SNB emite um parecer favorável.
A 09.07.98 foi concedida uma audiência ao requerente pela arguida Fátima
Felgueiras (sempre concedida quando o parecer é negativo).
Em face do parecer negativo a arguida Fátima Felgueiras indefere o
requerimento.
A 09.10.98 o requerente junta novo requerimento com aditamento ao projecto de
arquitectura.
A 16.10.98 são juntas informações pelos serviços (por Adelino Leite e Jorge
Almeida).
A 10.11.98 o arquitecto Rui Almeida emitiu um parecer favorável.
A 10.12.98 a arguida Fátima Felgueiras profere despacho de aprovação do
projecto de arquitectura, decisão que é notificada ao requerente a 17.12.98, o qual foi
igualmente notificado para apresentar os projectos de especialidade.
A 13.10.99 foi emitido o alvará de licença de construção nº 711/99.
Esclareceu que o processo para a concessão da licença de utilização é autónomo.
Da sua análise concluiu que:
A 10.02.2000 foi apresentado o requerimento para a concessão da licença de
utilização.
A 28.03.2000 é efectuada uma vistoria, resultando do respectivo auto que não
existiam à data condições para que a respectiva licença pudesse ser emitida.
A 20.04.2000 o requerente respondeu.
A 30.05.2000 é elaborado novo auto de vistoria, donde resulta novo parecer
negativo por faltar o ramal de saneamento.
A 27.06.2000 é feita nova vistoria, desta vez favorável.

451
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Consequentemente, a 02.08.2000 é emitido o alvará de licença de utilização nº


457/2000.
Esclareceu que excepcionalmente pode não ser levantado o respectivo auto de
contra-ordenação em face de infracções detectadas. Qualquer funcionário pode levantar
autos de contra-ordenação, sendo certo que por norma são os fiscais que o fazem na
sequência de vistorias.
O processo foi taxado como sendo de legalização (com uma taxa acrescida),
prática que mais tarde se abandonou por ter sido considerada ilegal.

- Arguido Horácio Costa


Conhecia o arguido Carlos Sampaio Teixeira de vista por lhe ter dado boleia
várias vezes quando era estudante.
Recebeu ordens da arguida Fátima Felgueiras para se deslocar da firma de que o
arguido Carlos Teixeira e o irmão são sócios, o que fez. Porém, foi-lhe dito que ele não
estava. O depoente e o arguido Joaquim Freitas deslocaram-se ali outras vezes mas
havia sempre uma razão que por um motivo ou outro o impedia de os receber.
Transmitiram esse facto à arguida Fátima Felgueiras e ela disse-lhes que tratava desse
assunto pessoalmente. Muito mais tarde, ao que pensa em Dezembro de 1997, a arguida
Fátima Felgueiras entregou-lhe um cheque emitido pelo arguido Carlos Sampaio
Teixeira, datado de 18.11.97, no valor de 500.000$00, a fim de o depositar na conta do
BES, o que fez a 12.12.97 (cfr. o respectivo talão de depósito de fls 133 do apenso 1).
Não sabia se ele tinha ou não pendente na CMF algum processo de
licenciamento e se tinha algum problema relacionado com isso.

- Arguido Joaquim Freitas


Conhece o arguido Sampaio por ser industrial do calçado e porque
habitualmente contribuía com donativos, por exemplo para o “Sovela”, para a sede do
PS e para a campanha eleitoral em causa nos autos.
Na altura ignorava que ele tinha em curso um processo de licenciamento.
Em 1997 o depoente e o arguido Horácio tentaram contactá-lo 2 ou 3 vezes no
sentido de lhe solicitar donativos mas ele nunca os recebeu. Deu conta desse facto à
arguida Fátima Felgueiras, pois tinha sido ela quem os tinha mandado contactá-lo. Ela
então transmitiu-lhes para não o contactar e que trataria pessoalmente do assunto.
Passado algum tempo foi entregue um cheque para depósito na conta do BES,
cheque esse que foi entregue na CMF mas não sabe a quem, o qual acabou por parar nas
mãos do arguido Horácio (cfr. a cópia do cheque em causa, constante de fls 520 do 3º
volume, no montante de 500.000$00 e datado de 18.11.97), sendo certo que o depósito
na conta do BES só foi efectuado a 12.12.97 porque tal cheque não foi logo entregue ao
arguido Horácio (normalmente os cheques eram logo depositados no próprio dia ou no
dia seguinte).

- Testemunha Luís Orlando Cardoso Botelho Maia


É inspector da IGAT, tendo efectuado uma acção inspectiva ao Município de
Felgueiras (em 2001), com o desiderato de complementar um inquérito previamente
efectuado e de averiguar qual o funcionamento da CMF, tendo coadjuvado também o
trabalho da PJ (análise a um conjunto de processos de licenciamento de obras), de sorte
que foram produzidos dois relatórios, um mais sucinto e constante de fls 2002 e ss., a
propósito da sua colaboração com a PJ (dado o pouco tempo de que dispuseram para o
efectuar, isto é, cerca de duas semanas) e outro constante de fls 3165 e ss., o qual se
reporta à inspecção ordinária (onde se aborda os aspectos de funcionamento dos

452
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

serviços da CMF e a matéria alvo de queixa, que assim foi abordada de forma mais
profunda).
Esclareceu que se debruçou mais sobre as matérias ligadas ao urbanismo, ao
passo que a testemunha Silvino Perdigão centrou mais a sua acção nas outras matérias
(os relatórios estão assinados por ambos, tendo esclarecido qual o método de trabalho
que prosseguiram).
No que se refere ao processo de licenciamento nº 255/98 (Fábrica “Jonil”) foram
juntas fotografias que demonstram que a construção já se tinha iniciado, o que deveria
ter dado aso a um processo de contra-ordenação, o que não sucedeu.
Não se recorda se essas fotografias foram juntas com a apresentação de um novo
projecto a 09.08.98 e que respeitava o PDM (cfr. em todo o caso o processo de
licenciamento em causa), na sequência do arquivamento do processo de licenciamento
nº 902/97.
Aliás, por despacho datado de 12.02.99 a arguida Fátima Felgueiras salientou
que era lamentável o facto da fábrica estar já quase construída e ainda nem sequer
haviam entregue os projectos de especialidades (cfr. fls 351 do processo de
licenciamento em causa).

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


O arguido Carlos Sampaio Teixeira (firma “Jonil”) emitiu ao portador um
cheque de 500 cts, datado de 18.11.97, conforme documento de fls 520.
À pergunta efectuada no sentido de se saber a quem competia mandar instaurar o
respectivo processo de contra-ordenação (se a presidente da autarquia se os serviços
camarários), referiu não saber responder a essa questão.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


O arguido Carlos Sampaio era um industrial de Felgueiras (“Jonil”).
A fls 520 consta um cheque emitido por ele, no valor de 500 cts e datado de
18.11.97.
Não sabe em concreto quais os problemas que ele tinha acerca do processo de
licenciamento relativo à construção de uma fábrica (não sabe se dizia respeito à
“Jonil”). Certo é que todos os processos de licenciamento apreendidos apresentavam
problemas no que respeita ao licenciamento das obras.
Recorda-se, em todo o caso, de ter visto fotografias que comprovavam que a
obra já tinha sido iniciada antes da obtenção do licenciamento (fotos essas constantes do
processo de licenciamento), competindo à presidente da edilidade mandar instaurar o
respectivo processo de contra-ordenação. Existia igualmente um vereador com
competência nessa área (e que inclusive tomava decisões nos processos de contra-
ordenação).

Análise crítica
Emerge do documento de fls 520, em conjugação com as declarações prestadas
pelo arguido Horácio Costa, que o arguido Carlos Sampaio Teixeira concedeu um
donativo para a campanha eleitoral do PS relativo às eleições autárquicas de 1997, o
qual foi depositado na conta do BES conforme documento de fls 133 do apenso 1.
Da análise do processo de licenciamento nº 902/97, emerge que o requerimento
inicial deu entrada em 31 de Outubro de 1997, tendo merecido o primeiro despacho da
arguida Fátima nessa data.

453
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É de salientar que pelo menos até de Dezembro de 1997 as obras em causa não
se iniciaram, pois existe uma informação nesse processo por banda da Fiscalização e
que aponta nesse sentido.
Já em 9 de Abril de 1998 esse processo viria a ser arquivado na medida em que
foi dado sem efeito o requerimento de licenciamento em causa, na sequência aliás de
pareceres negativos do SNB e do PDM local (logo, já depois de concedido o donativo).
O arguido Barbieri Cardoso, para além de analisar na audiência de julgamento
os processos de licenciamento nºs 902/97 e 255/98, explicou assertivamente em que
condições a CMF procedia à fiscalização das obras (cfr. pois as respectivas declarações,
acima reproduzidas por súmula).
Ora, não resulta da prova documental ou testemunhal produzida que a arguida
Fátima tenha enviado a Fiscalização ao local na sequência do facto dos arguidos
Horácio e Joaquim Freitas terem sucessivamente procurado contactar sem sucesso o
arguido Carlos (como retaliação pela falta de disponibilidade do dito Carlos Sampaio
Teixeira para apoiar financeiramente a sua candidatura); não obstante, por esse motivo –
segundo o arguido Horácio -, a arguida Fátima Felgueiras ter-se-á encarregue
pessoalmente da angariação desse donativo, que viria a ser entregue já em Novembro de
1997 (tendo-lhe a dita Fátima entregue o respectivo cheque, que o mencionado Horácio
depositou na conta do BES a 12.12.97).
Em todo o caso, em face da evolução desse processo de licenciamento, nenhuma
correlação se pode extrair entre a concessão do dito donativo e o andamento do dito
processo, tanto mais que, no âmbito do mesmo, nenhuma licença foi concedida.
Sucede que a firma de que o arguido Carlos Sampaio Teixeira é o legal
representante fez chegar à CMF, a 09.04.98, novo requerimento de licenciamento, ao
qual viria a ser dado o nº 255/98.
Com o requerimento inicial foram juntas fotos donde é perceptível que se
haviam iniciado os trabalhos de limpeza e de movimentação de terras (parece que a
CMF exigia a junção de fotos do terreno a que diziam respeito os licenciamentos,
segundo declarações proferidas pelo arguido Barbieri).
Desse processo não se retira se foi efectuada ou não uma vistoria ao local em
face do teor dessas fotos, mas admite o arguido Barbieri que tal possa não ter sido feito
já que as obras em causa – embora careçam de licenciamento – reportavam-se
essencialmente a obras de nivelamento do terreno. Não se extrai igualmente desse
processo se foi ou não instaurado um processo de contra-ordenação por esse facto (ao
que parece não foi – cfr., designadamente o relatório da IGAT). Essas informações, à
data, não eram por norma exaradas nos processos de licenciamento, visto que a
Fiscalização actuava autonomamente e acerca da instauração dos processos de contra-
ordenação não ficava exarada qualquer informação nos processos de licenciamento,
procedimentos que terão sido alterados na sequência da inspecção da IGAT (cfr., de
resto, o respectivo relatório de fls 3165 e ss. dos autos e o depoimento de quem o
elaborou, onde se faz uma análise sucinta do processo de obras nº 255/98).
Entretanto, na sequência de parecer negativo, a arguida Fátima, a 09.07.98,
concedeu uma audiência ao requerente (o que sempre sucedia em caso de parecer
negativo), vindo a licença a ser indeferida a 15.09.98.
Em face da evolução desse processo de licenciamento até então, também aqui
não se vê qualquer indício de favorecimento por banda da arguida Fátima, a qual,
sempre seguindo os pareceres técnicos proferidos, indeferiu o licenciamento, não
obstante o donativo concedido em Novembro de 1997.
Sucede que já em 09.10.98 deu entrada na CMF novo requerimento, na
sequência do qual a arguida Fátima, a 10.12.98, despachou no sentido da aprovação dos

454
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

projectos de arquitectura, notificando-se a firma requerente para apresentar os projectos


de especialidade (estribando-se para o efeito em pareceres favoráveis).
Não obstante, ao que parece, a obra estaria já quase concluída e os projectos de
especialidade ainda não tinham sido apresentados, facto que a arguida Fátima registou
com indignação em despacho que proferiu a 12.02.99.
Em face da informação de 12.02.99, constacta-se que o arguido Carlos esteve na
CMF no dia 28.01.99, mas não terá chegado a falar com a arguida Fátima Felgueiras.
Entretanto, na sequência de pareceres favoráveis viria a ser concedido o alvará
de licença de construção nº 711/99, datado de 13.10.99.
Já o processo para a concessão da licença de utilização é autónomo, segundo
explicação dada pelo arguido Barbieri, licença essa que viria a ser concedida a
02.08.2000 (licença de utilização nº 457/2000), decisão que foi fundada em pareceres
técnicos favoráveis.
Também aqui não se vislumbra qualquer correlação entre a concessão do
donativo referido nos autos e a concessão da licença de utilização.
A taxa paga pela requerente foi agravada, conforme era prática habitual na CMF
quando se tratavam de processos de legalização (isto é, quando as obras iniciavam-se
antes da respectiva licença de construção ser concedida), prática que entretanto foi
abandonada por se considerar ilegal.
Em suma, pode-se dizer que as decisões proferidas pela arguida Fátima
fundaram-se sempre em pareceres, ora indeferindo, ora deferindo as pretensões de
acordo com esses mesmos pareceres, sendo certo que nenhuma relação pode ser
estabelecida entre a entrega de um donativo em Novembro de 1997 pelo arguido Carlos
e o andamento dos processos de licenciamento referenciados.
Ademais, inexistem indícios que possam levar à conclusão de que a arguida
Fátima tenha querido beneficiar a requerente e os seus sócios, designadamente o
arguido Carlos, como contrapartida de um donativo concedido por este, ao não mandar
instaurar o competente processo de contra-ordenação, na sequência do facto das obras
se terem iniciado (e quase concluído) sem a respectiva licença de construção. É que,
além do mais, ao que parece, não terá sido caso único quando os processos de
“legalização” estavam a correr e afigurava-se viável o respectivo deferimento.
Independentemente da correcção dessa prática (e para nós é uma prática ilegal, pois se
houve infracção contra-ordenacional é obrigatória a instauração do respectivo processo,
independentemente da infracção estar em vias de ser sanada, facto que apenas poderá
relevar em sede de escolha da sanção ou da medida da coima a impôr), releva aqui, para
o que agora interessa, a inexistência de indícios que nos levem ao convencimento de
qualquer intenção de benefício como contrapartida pela concessão de um donativo.
Situação semelhante é, de resto, conforme documentos juntos já no decurso do
julgamento, o arquivamento de processos de contra-ordenação, ainda que com
admoestação, quando os processos de legalização chegam a bom porto (diga-se, em
todo o caso, que nessa situação a decisão final dos processos de contra-ordenação não é
ilegal, pois é imposta uma admoestação, o que, em todo o caso, na prática, equivale a
um arquivamento, não sendo aliás sequer devidas custas pelo visado).
Para além disso, segundo o arguido Joaquim Freitas, era habitual o arguido
Carlos contribuir com donativos (como por exemplo para o “Sovela”).
Já a testemunha Sousa Martins, com conhecimento de causa, referiu que o
arguido Carlos Sampaio Teixeira costuma contribuir com donativos para várias
instituições, que aliás exemplificou, tendo incusive concedido um donativo ao PSD
local para apoiar a campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997 (essa
testemunha, à data, era de resto o respectivo director de campanha).

455
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por ausência de prova consistente nesse sentido, não se demonstrou porém a


matéria alegada nos artgs 31º a 33º da contestação apresentada pelo arguido Carlos
Sampaio Teixeira.
Seja como for, neste caso, não só não se convenceu o Tribunal que alguma
relação se tenha estabelecido entre o andamento dos processos de licenciamento
referidos e a entrega do donativo mencionado como se convenceu mesmo do inverso,
isto é, que essa relação entre uma coisa e outra foi inexistente.

Guilherme da Silva Almeida

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Admitiu conhecer o arguido.
Da análise do processo de licenciamento nº 630/97, confirmou que o respectivo
requerimento deu entrada a 30.07.97.
Por despacho de 03.10.97 mandou notificar o requerente para se pronunciar
acerca de irregularidades detectadas (mencionadas na pronúncia, sendo certo que, ao
contrário do que ali é referido, o projecto não foi inicialmente indeferido) 18 , tendo o
requerente apresentado as rectificações necessárias, razão pela qual, por despacho
datado de 10.11.97, foi aprovado o projecto de arquitectura.
Quanto a uma eventual audiência concedida ao arguido Guilherme Almeida,
reiterou a posição já anteriormente manifestada, isto é, a ter ocorrido, estará
documentada no processo de licenciamento, o que neste caso sucede, conforme se pode
verificar na folha de atendimento constante de tal processo de licenciamento, segundo a
qual tal audiência ocorreu a 02.09.97 (cfr.ainda a anotação a lápis de fls 6659 – registo
de marcações por telefone).
Nega porém que verbalmente lhe deu autorização para iniciar as obras contra o
pagamento de um donativo para a campanha eleitoral, situação que aliás nem sequer foi
abordada (o donativo de 250.000$00 foi concedido em 10.10.97 conforme emerge de fls
501 dos autos, cheque que diz nunca ter visto).
Admite porém que o autorizou a iniciar as movimentações de terras, desde que
tivesse a respectiva licença para caboucos, conforme sucede em casos similares (nessa
reunião esteve presente o técnico dele e o arquitecto Rui Almeida, funcionário da
CMF).
A 14.11.97 deram entrada os projectos de especialidade.
Consta entretanto do processo de licenciamento um auto de notícia datado de
27.11.97 – na sequência de uma fiscalização efectuada e onde se constatou que as obras
se tinham iniciado sem a respectiva licença19 -, o que deu origem ao respectivo processo
de contra-ordenação, seguindo-se depois o auto de embargo datado de 09.01.98.
A 26.01.98 é proferido o despacho a conceder a licença de construção
respectiva.
No dia seguinte são pagas as taxas devidas e o alvará é emitido no dia 27.01.98
(alvará nº 101/98).

18
A fls 74 do processo de licenciamento existe um despacho de indeferimento que não foi assinado pela
depoente, segundo explicou, por dúvidas que estão expressas em despacho proferido à mão. Daí que de
facto pareça não ter existido indeferimento.
19
Fiscalização essa efectuada na sequência de uma denúnica efectuada a 18.11.97 por Ana Maria
Sampaio Mendes, conforme consta do processo de licenciamento e que a arguida Fátima Felgueiras
mandou remeter à fiscalização.

456
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No dia 17.05.2000 foi emitido o alvará de utilização (depois de ter concluído as


obras de infra-estruturas, conforme prazo que lhe havia sido concedido).
Nega que alguma vez tenha falado com o arguido Horácio Costa acerca do
processo de licenciamento em causa, pelo que é falsa a versão constante do despacho de
pronúncia, sendo certo que nunca viu o cheque cuja cópia se acha a fls 532, do 3º
volume, no valor de 150.000$00, datado de 06.02.98 e emitido ao portador.
Da análise do processo de licenciamento nº 116/98, confirmou que o
requerimento inicial deu entrada na CMF a 19.02.98.
O respectivo pedido de licenciamento acabou por ser indeferido pelas razões
descritas na pronúncia, fundada numa informação dos serviços datada de 05.05.98.
Pelas razões aduzidas no despacho de pronúncia (participação dos Serviços de
Fiscalização datada de 25.05.98) foi emitido o respectivo auto de notícia, com data de
27.05.98 (dando origem ao respectivo processo contra-odenacional), tendo sido a obra
embargada a 01.06.98.
Consta do processo de licenciamento o registo de uma audiência concedida ao
arguido Guilherme Almeida a 15.06.98 (apenas admitindo que nessa reunião foram
unicamente abordados os assuntos constantes de tal registo escrito).
A propósito das audiências que concede à Quinta-feira, esclareceu que é habitual
os munícipes abordarem assuntos relacionados com licenciamentos de obras, sendo
certo que os chefes de divisão também fazem atendimento ao público à Segunda e
Quarta-feira, da parte da manhã.
As funcionárias que à data faziam o registo dessas audiências eram ou a Cândida
Assunção ou a Maria João.
Reafirmou que das audiências relativas a processos de licenciamento eram
elaborados registos que eram incorporados nos processos a que diziam respeito, sendo
certo que relativamente a outros assuntos elaborava notas que eram remetidas aos
serviços a que diziam respeito.
Por despacho de 22.09.98, por suspeita de loteamento ilegal, determina a
averiguação do que se passa pelos serviços.
Na sequência de requerimento nesse sentido, deferiu uma prorrogação por 60
dias para que o requerente lograsse proceder ao destaque da parcela no serviço de
finanças respectivo, condição essencial para que o projecto pudesse ser aprovado.
Entretanto, a 20.10.98, é apresentado o comprovativo da operação de destaque.
Com relevo, a 22.12.98 é mantida a informação de indeferimento do
licenciamento, sendo certo que foi elaborado auto de notícia a 11.02.99 por desrespeito
do embargo da obra, na sequência do qual, por despacho datado 15.02.99, a arguida
Fátima Felgueiras manda embargar a obra e autuar e, por depacho de 17.02.99, a mesma
arguida manda remeter o auto de notícia ao MP para efeitos de procedimento criminal
pela prática de um crime de desobediência.
Porém, tal despacho foi mandado suspender por 60 dias, com base numa
informação do Departamento Técnico da autarquia, constante de fls 133 do processo de
licenciamento em causa e datado de 29.03.99 (a qual dava conta inexistir qualquer
inconveniente no deferimento da pretensão de licenciamento). Seja como for, a
explicação dada para a suspensão do dito despacho é, no mínimo, discutível, visto que,
independentemente da obra entretanto estar em condições de ser licenciada, certo é que
à data já se havia consumado um crime de desobediência, com a inerente obrigação de
comunicação ao MP (quando muito, a evolução favorável do processo de licenciamento
poderia motivar uma suspensão provisória do processo – desde que reunidos todos os
respectivos pressupostos - ou ser tida em conta na pena a impor na sentença que viesse a
ser proferida).

457
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por fim, a 01.07.99 a arguida despacha no sentido de conceder a licença de


construção (alvará nº 690/99, de 07.10.99).
Entretanto é concedido um prazo de 30 dias para conclusão das obras de infra-
estruturas sob pena de indeferimento da licença de utilização.
Em face da conclusão desssas obras e de parecer técnico favorável, a arguida
Fátima Felgueras, por despacho de 14.04.2000, defere a emissão do respectivo alvará de
licença de utilização, o qual veio a ser emitido a 09.06.2000.
A propósito de donativos concedidos pelo arguido Guilherme Almeida, referiu
que é habitual a sua contribuição para várias causas e para vários partidos em época
eleitoral.
Confrontada com o facto do segundo cheque emitido por este arguido o ter sido
depois das eleições, referiu não saber se tal é habitual, pois nunca fez parte da comissão
de angariação de fundos para as campanhas leitorais (em todo o caso, já tinha admitido
que certas despesas são pagas depois das eleições).

- Arguido Barbieri Cardoso


Da análise do processo de licenciamento nº 630/97, concluiu que:
O requerimento inicial deu entrada a 30.07.97.
A 02.09.97 a arguida Fátima Felgueiras, numa folha de atendimento, despachou
no sentido de deferir o avanço das obras desde que pedida a licença para caboucos (o
requerente havia pedido para arrancar com a obra logo que fosse aprovado o projecto de
arquitectura).
A 26.09.97 e 29.09.97 foram juntas informações negativas (área de implantação
superior à permitida pelo PDM).
A 03.10.97 a arguida Fátima Felgueiras despachou no sentido do requerente ser
notificado para se pronunciar, o que foi feito a 06.10.97.
Ao contrário do referido na pronúncia inexiste qualquer despacho de
indeferimento do projecto de arquitectura nesta fase (cfr. as declarações da arguida
Fátima Felgueiras e respectiva nota de rodapé).
A 14.10.97 é efectuado um aditamento ao projecto de arquitectura.
A 27.10.97 e 29.10.97 são emitidos pareceres favoráveis.
A 10.11.97 é então proferido despacho a aprovar o projecto de arquitectura.
A 14.11.97 foram apresentados os projectos de especialidade.
A 19.11.97 surge então no processo uma exposição de Ana Maria Sampaio
Mendes, onde dá conta que na obra está a ser feito um desaterro e denuncia outras
irregularidades.
Na sequência dessa exposição a arguida Fátima Felgueiras mandou ao local a
fiscalização.
Com data de 27.11.97 consta desse processo um auto de notícia (nem sempre a
sequência cronológica dos factos é respeitada, o que dificulta a consulta e compreensão
dos processos de licenciamento, o que aliás terá merecido a crítica da IGAT aquando da
inspecção ao município de Felgueiras).
A 28.11.97 a arguida Fátima Felgueiras mandou instruir tal auto como processo
de contra-ordenação.
Na sequência da informação de 28.01.98, a arguida Fátima Felgueiras profere
despacho a 12.02.98, lamentando que a fábrica esteja quase concluída sem a
apresentação dos projectos de especialidade.
Em face disso não sabe se foi ou não levantado qualquer processo de contra-
ordenação.
A 09.01.98 a obra é embargada.

458
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A 19.01.98 é junto um auto de notícia a dar conta que o embargo não foi
respeitado.
Porém, ao invés desse auto ser remetido ao MP por crime de desobidência, tal
não foi feito na medida em que o processo estava já em condições de ser licenciado pelo
que lhe é dado a perceber (inexiste qualquer despacho a mandar remeter o auto ao
Ministério Público ao contrário do referido na pronúncia, pois, conforme se oberva a fls
74 do proceso de licenciamento, esse despacho – elaborado pelos serviços – não foi
assinado pela arguida Fátima Felgueiras, a qual na mesma folha manuscreveu um outro
despacho a pedir informações ao arguido Barbieri Cardoso).
De facto, na sequência desse auto de notícia a arguida Fátima Felgueiras
solicitou que lhe confirmassem se se tratava de um determinado processo (o que inculca
a ideia de que de facto os processos não iam completos para o seu gabinete quando os
despachava, conforme referiu).
A 25.01.98 o depoente esclareceu-a de que ela estava equivocada quanto à
identificação do processo.
Em face disso e colocada ao corrente da identificação do processo em causa, no
mesmo dia ela despachou no sentido de a informarem se os pareceres em falta já tinham
sido proferidos.
A 26.01.98 é então proferido despacho de deferimento, sendo certo que foi
emitido o alvará de licença de construção nº 101/98, de 16.02.98.
O proceso foi taxado como tendo sido de legalização (o que pressupõe que se
tratou da legalização de obras iniciadas sem a necessária licença).
A propósito do atendimento do requerente pela arguida Fátima Felgueiras em
Setembro de 1997, referiu ignorar quem teve a iniciativa desse encontro (cfr. o registo
diário de telefonemas da empresa requerente, constante de fls 6659 do 26º volume,
linhas 3 e 4), sendo certo que ignora a forma como o atendimento aos munícipes era
feito e de que forma eram feitas as marcações (a este propósito a arguida Fátima
Felgueiras pediu a palavra e salientou que o documento de fls 6659 não se trata de um
registo diário de telefonemas da CMF mas da empresa requerente, sendo certo que
nunca promoveu reuniões individuais com industriais, além de que existem técnicos da
CMF que também dão audiências).
Acrescentou que sucedia não se remeter os autos de notícia ao MP por
desobediência sempre que o licenciamento era eminente (quanto à circunstância de não
ter remetido o auto de notícia para o MP por força da violação do embargo a arguida
Fátima Felgueiras explicou que procede desse modo sempre que a obra esteja em
condições de ser licenciada, sendo certo que ainda hoje procede desse modo).
. Era também habitual deferir-se o início das obras desde que obtida uma licença
para caboucos. Porém, como a obtenção desta licença demora quase o mesmo tempo
que a obtenção da licença de construção, normalmente não é pedida.

- Arguido Horácio Costa


Não conhecia o arguido Guilherme.
Em todo o caso, visitou-o com o arguido Joaquim de Freitas na sua fábrica a fim
de obterem um donativo. Foram lá em Setembro ou Outubro de 1997 por indicação da
arguida Fátima Felgueiras, sendo certo que o arguido Joaquim de Freitas já o conhecia.
Anunciaram que iam da parte da Srª Presidente da Câmara e foram então
encaminhados para o escritório do dito Guilherme, sendo certo que o depoente foi-lhe
apresentado como assessor da Srª Presidente e foi o arguido Joaquim Freitas quem fez o
pedido de donativo.

459
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Guilherme acedeu ao pedido, informando-os aliás que não era a


primeira vez que contribuía com o que podia, não obstante não pertencer à “mesma cor
política” que a arguida Fátima Felgueiras.
Entretanto um funcionário do Sr. Guilherme trouxe um envelope (que continha
um cheque de 250 cts, como mais tarde tomou conhecimento nas circunstâncias que de
seguida se relatarão) e este referiu-lhes que tinha umas “coisitas” na Câmara mas que
era um técnico quem lhe tratava desses assuntos.
Despediram-se e o arguido Guilherme desejou-lhes “felicidades”.
Entregaram o envelope fechado à arguida Fátima, que o abriu, entregou-o ao
depoente e mandou-o depositar, o que fez (cfr. o cheque de 250.000$00, datado de
10.10.97, cuja cópia se acha a fls 501 do 3º volume; cfr. o talão de depósito a fls 83 do
apenso 1).
Recorda-se que entretanto a arguida Fátima Felgueiras lhe ordenou para
telefonar ao dito Guilherme informando-o de que poderia continuar com as obras. O
depoente limitou-se a cumprir o ordenado não a questionando acerca desse assunto.
Assim, em Janeiro de 1998 telefonou para a fábrica dele, tendo sido informado de que
se encontrava ausente na “Exponor”. Pediu então o número de telemóvel dele, o que lhe
foi fornecido, tendo-o então contactado dessa forma e transmitiu-lhe o recado.
Algum tempo depois a arguida Fátima entregou-lhe um cheque de 150.000$00
(cfr. a cópia do cheque em causa, datado de 06.02.98, constante de fls 532 do 3º
volume), dando-lhe nota de que se tratava de um donativo para fazer face a despesas de
campanha que ainda estavam por pagar. Conforme instruções recebidas da arguida
Fátima depositou-o (cfr. fls 168 do apenso 1).
Confirmou que foi testemunha num processo-crime em que era arguido o dito
Guilherme (por crime de desobediência), tendo relatado o teor do dito telefonema ao
JIC. Nessa altura procurou-o para se inteirar do que se passava mas não o conseguiu
contactar.
O Eng. Manuel Maria Machado era o técnico contratado pelo arguido
Guilherme, sendo certo que era pessoa muito próxima da arguida Fátima Felgueiras e
do arguido Júlio Faria, pois era militante do PS e era membro da Assembleia Municipal
(é aliás o técnico que apresenta mais projectos na CMF e sempre teve acesso fácil à
arguida Fátima, sendo certo que ele chegou a empenhar-se na angariação de fundos para
a aquisição da sede do PS Felgueiras e chegou a ser dirigiente do jornal “O Sovela”.
Consequentemente, ele não precisava do depoente para fazer a ponte para a arguida
Fátima Felgueiras. De resto, chegou a vê-lo na CMF para ser atendido por ela fora do
horário de expediente).
Esclareceu que os empresários procuravam fazer audiências com a arguida
Fátima a propósito de processos de licenciamento.
Antes de depor como testemunha não se recorda de qualquer embargo.

- Arguido Joaquim Freitas


Conhece o arguido Guilherme como empresário (embora não tenha com ele
grande confiança), sendo certo que por várias vezes ele contribuiu com donativos para
várias causas (como por exemplo para as campanhas eleitorais de 93 e 97 e para o
“Sovela”).
Na altura ignorava que ele tinha problemas com um licenciamento.
A arguida Fátima disse ao depoente e ao arguido Horácio para o procurar a fim
de dele obterem um donativo para a campanha eleitoral de 1997. Quando lá chegaram
ele já tinha um cheque emitido num envelope fechado. Na altura não chegou a abrir o
envelope.

460
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não encontra explicação para o facto do cheque em causa ter sido emitido em
nome do pai do depoente (que não andou a angariar fundos), sendo certo que o depoente
costuma ser tratado pelo primeiro e pelo último nome (cfr. cópia do cheque de fls 501
do 3º volume). O depósito respectivo foi feito a 13.10.97 pelo arguido Horácio Costa
conforme se constata no documento de fls 83 do apenso 1.
Ignora se o arguido Horácio chegou a mostrar à arguida Fátima o envelope onde
o cheque estava acondicionado.
Segundo lhe disse o arguido Horácio existiu um segundo donativo, que lhe terá
sido entregue ou entregue à arguida Fátima (cfr. cópia do cheque de fls 523 do 3º
volume, emitido a 06.02.98 ao portador e no montante de 150.000$00), o qual foi
depositado pelo arguido Horácio a 06.02.98 (cfr. fls 168 do apenso 1).
Ignora se o arguido Guilherme teve qualquer outra intenção que não fosse a de
contribuir para o financiamento da campanha eleitoral de 1997, sendo certo que o
arguido Horácio nunca lhe disse se a arguida Fátima tinha ou não dado autorização
verbal para o início das obras.

- Testemunha Luís Orlando Cardoso Botelho Maia


No que concerne ao processo de licenciamento nº 630/97 (fábrica “Recap”) –
cfr. p. 20 e 21 do relatório de fls 3165 e ss. dos autos – referiu que houve um embargo
que foi desrespeitado, não constando no dito processo que tenha sido feita a respectiva
participação ao MP por crime de desobediência, não obstante existir um despacho da
arguida Fátima nesse sentido (e que não terá assim sido cumprido).
Entende que lhe cabia (bem como ao vereador com funções na área do
urbanismo) a fiscalização do cumprimento desse despacho.
Recomendaram assim a participação ao MP.
Idêntica siuação se verificou com o processo de licenciamento nº 116/98,
respeitante a um armazém.
Depois da arguida Fátima ter despachado a 17.12.99 no sentido de se fazer a
participação ao MP por desobediência (desrespeito de um embargo), constante de fls 74
do processo de licenciamento, por despacho datado de 06.04.99, mandou suspender esse
despacho atenta a informação de 29.03.99, constante de fls 133 do referido processo
(informação técnica favorável à pretensão).

- Testemunha Manuel Maria de Araújo Lopes Machado


Referiu conhecer o arguido Guilherme da Silva Almeida, pois é um empresário
felgueirense para quem fez um projecto de dois pavilhões industriais, além de outros
trabalhos (o depoente é engenheiro civil e tem um gabinete de projectos em Felgueiras e
em Fafe).
Começou por negar que tenha existido qualquer reunião na CMF antes de
apresentar o aludido projecto.
Porém admitiu que existiu uma reunião na CMF (em que apenas participaram o
arguido Guilherme, o depoente e a arguida Fátima) por causa de um ecoponto que se
encontrava em frente à casa do arguido Guilherme e que ele queria que fosse removido
dali para outro local, tendo aproveitado essa reunião para apresentar o projecto que já
tinha dado entrada na CMF (este último assunto porém era o mais importante, segundo
admitiu).
Não se recorda se antes dessa reunião o arguido Guilherme solicitou à CMF a
retirada para outro local do aludido ecoponto (questão que era mais ou menos recente).
Esclareceu que não eram normais as reuniões antes de se apresentar os
respectivos projectos. Tem apenas memória disso ter sucedido três ou quatro vezes.

461
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Admite que possa ter sido o seu gabinete a solicitar a dita reunião, mas não tem
a certeza desse facto. A esse propósito foi confrontado com o documento de fls 6659, 4ª
linha (registo diário de telefonemas efectuados a 31.07.97 pelo seu gabinete e onde tem
anotações manuscritas nas 3ª e 4ª linha, aludindo a uma reunião na CMF para
apresentação de projecto). Porém, referiu a testemunha não saber se essa alusão se
reporta ou não à reunião referida.
Na dita reunião começou-se por abordar a aludida questão do ecoponto.
Depois, recorda-se que foram apresentados os projectos referidos e que pediram
à arguida Fátima Felgueiras, se possível, o início das obras de construção dos pavilhões
industriais (pois o arguido Guilherme tinha urgência na respectiva construção, já que a
sua empresa laborava em instalações sem as condições necessárias, além de serem
desadequadas em termos de espaço relativamente ao volume de encomendas a que tinha
de dar resposta), ao que ela respondeu que primeiro deveriam ser aprovados os projectos
e que só depois é que as obras se poderiam iniciar, ainda que a licença ainda não
estivesse emitida.
Deduziu das palavras da arguida Fátima Felgueiras que a construção se poderia
inciar uma vez aprovados os projectos de arquitectura (antes portanto da aprovação dos
projectos de especialidade).
A razão de ser da apresentação do projecto prendia-se com uma eventual
autorização para o inicio das obras, dada a urgência na sua execução.
Tem ideia que esse projecto foi apresentado em 1997 (o que poderá ser
confirmado no respectivo processo de licenciamento) e que aquando da dita reunião
ainda não tinha recaído sobre ele qualquer parecer.
As obras em causa iniciaram-se sem a respectiva licença e entretanto foram
embargadas. Ignora porém se antes da aprovação dos projectos de arquitectura o
arguido Guilherme tinha feito terraplanagens no local da obra.
Entretanto, em face da violação desse embargo, foi instaurado um processo
crime por desobediência contra o arguido Guilherme e que correu termos no TJ da
Comarca de Felgueiras, tendo sido ouvido como testemunha.
Certo é que entretanto foram obtidas as necessárias licenças de construção e
emitido o respectivo alvará de licença de utilização.
Foi confrontado com o primeiro cheque de fls 501 (emitido pelo arguido
Guilherme à ordem do arguido Joaquim Freitas).
Esclareceu que não participou na campanha eleitoral de 1997 e que já à data
mantinha (e mantém) com a arguida Fátima uma relação de amizade.
Mais esclareceu que na aludida reunião com a arguida Fátima não se abordou
qualquer assunto relacionado com donativos.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


O arguido Guilherme Almeida emitiu dois cheques, cujas cópias constam de fls
501 (de 250 cts, emitido a 10.10.97 a favor do arguido Joaquim Freitas e depositado na
conta do BES a 13.10.97, conforme fls 83 do apenso 1) e 523 (emitido ao portador a
06.02.98 e no montante de 150 cts).
Os processos de licenciamento em causa foram analizados pela IGAT.
Existiu um processo-crime por desobediência ao embargo da obra.
Tem a ideia que algumas decisões da arguida Fátima estavam em
desconformidade com os pareceres técnicos, mas acabou por referir não se recordar.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves

462
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Guilherme Almeida é outro industrial felgueirense (“Ricap”) e


entregou dois donativos (cfr. cheques de fls 501 e 532).
Não se recorda quais eram os problemas que ele tinha num processo de
licenciamento.
Tem a ideia que ele tinha pendente na CMF mais do que um processo de
licenciamento.
A IGAT analisou esses processos e a PJ procurou relacioná-los com a entrega
dos dois cheques referidos.

- Testemunha Sandra Maria Coutinho Pereira Monteiro


Conhece o arguido Guilherme Almeida na medida em que a depoente foi
telefonista da “Ricap” (“Guilherme da Silva Almeida, EIRL”), de Abril de 1994 até
Outubro de 2001.
A depoente, enquanto telefonista, fazia e recebia as chamadas telefónicas, bem
como recebia as visitas.
Havia uma folha diária dos registos dos telefonemas efectuados e recebidos, bem
como das visitas.
Era só a depoente quem elaborava esses documentos.
Confrontada com os documentos de fls 6659, 6667, 6672, 6674, 6675, 6676,
6677 e 6678 do volume 26-A dos autos, referiu tratar-se dos aludidos registos diários de
telefonemas e visitas usados naquela empresa.
A letra que consta desses documentos é a sua.
Da terceira linha do documento de fls 6659 resulta que a depoente fez uma
chamada telefónica para a CMF às 09.08 horas no sentido de marcar uma audiência para
o dia 02.09 às 11.15 horas (está aposto o seu nome – “Sandra”; colocava-se sempre o
nome da pessoa que efectuava a chamada), tendo falado com uma tal de Rosinda
(esclareceu que pergunta sempre o nome do intorlocutor nas comunicações telefónicas).
A depoente apôs a expressão “a pedido de”, presumindo que terá sido ou o arguido
Guilherme Almeida ou o Sr. Paulo (testemunha Paulo Baltazar Silveira Martins) quem
lhe pediram para efectuar essa chamada.
Na linha quatro do mesmo documento está escrita a menção “marcar audiência
para apresentar projecto”. Referiu que não sabe de quem é a respectiva letra, explicando
que esses registos eram arquivados e qualquer pessoa os poderia consultar.
A fls 6667 consta um registo diário de visitas. Na última letra está escrito
“Joaquim Costa (assessor da Drª Fátima Felgueiras)”, reportada a uma visita que
ocorreu no dia 07.10.97. Explicou que não conhece a pessoa em causa e que foi essa a
indicação que recebeu quando lhe pediu a respectiva identificação. As visitas
identificavam-se através do intercomunicador, subiam e eram recebidas pela pessoa
cujo nome consta do aludido documento. As visitas passavam pela zona de trabalho da
depoente. Não sabe se a visita em causa ia ou não acompanhada, visto que não se
recorda da visita em causa.
Não se lembra se à data recebiam na empresa telefonemas da CMF a dar nota de
que alguém iria passar por ali.
Confrontada com o teor de fls 6672, décima nona linha (a folha data de
27.11.97), referiu que desse documento consta que o arguido Guilherme Almeida
efectuou uma chamada telefónica às 15.33 horas para o gabinete do Eng. Machado
(“M2”), pessoa que a depoente conhece, ignorando se à data ele tinha feito algum
projecto para o arguido Guilherme.

463
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nos documentos de fls 6674, 6675, 6676, 6677 e 6678, onde se refere “Eng.
Machado”, faz-se sempre referência à mesma pessoa (Eng. Machado do gabinete de
projectos “M2”), pois o número de telefone é sempre o mesmo.

- Testemunha Arnaldo Batista Pinto


O depoente faz desaterros e fornece materiais de construção.
Conhece o arguido Guilherme Almeida na medida em que estabeleceu com ele
relações comerciais.
De facto, forneceu-lhe areias e britas e fez um desaterro grande em Penacova
(trabalhos que antecederam a construção da última fábrica que ele construiu para a
“Ricap”, composta por dois pavilhões industriais).
Explicou que só foram removidas terras e que esse serviço ocorreu em 1997.
Recorda-se desse facto porque tal serviço foi efectuado pouco tempo depois de ter
constituído a firma de que é sócio-gerente.
Começaram esse serviço em Novembro de 1997, o qual se prolongou até fins de
Fevereiro ou princípios de Março de 1998.
Tratava-se de um terreno que tinha pedra e porque atravassavam um Inverno
chuvoso os trabalhos prolongaram-se (pois teve de sofrer interrupções por esse facto).
A certa altura o depoente apercebeu-se que os fiscais da CMF visitaram o local,
mas não falou com eles. Depois deles irem embora o arguido Guilherme Almeida disse-
lhe para suspender os trabalhos até nova ordem. Tem a ideia que esse episódio teve
lugar em Janeiro de 1998. Na sequência dessa instrução, os trabalhos ficaram
interrompidos durante 15 dias ou três semanas. Findo esse período o arguido Guilherme
deu-lhe instruções para que o trabalho prosseguisse porque “já podia andar outra vez”
(comunicação que ele lhe fez pelo telefone), o que sucedeu.
Por ter visto os fiscais deduziu que a obra parou por ter sofrido um embargo (o
arguido Guilherme não lhe contou qual o motivo da suspensão dos trabalhos).
Na altura o arguido Guilherme tinha outras instalações (da “Ricap”) a cerca de 5
minutos de automóvel do local do desaterro (eram talvez 2 quilómetros de distância).
O depoente fez mais tarde fornecimentos de areia para o arguido Guilherme,
mas não consegue dizer em que mês (mas terá sido há cerca de um ano).
Recorda-se do episódio relacionado com o desaterro que fez para ele entre
Novembro de 1997 e Fev./Março de 1998 na medida em que iniciou a sua empresa em
1997 e o trabalho em causa foi um dos primeiros que efectuou, sendo certo que na altura
tinha pouco que fazer (só dispunha de dois camiões, sendo certo que hoje dispõe de
mais máquinas).

- Testemunha Paulo Baltazar Silveira Martins


O depoente é escriturário na firma “Guilherme da Silva Almeida e Filhos, SA”
há cerca de 18 anos. Em Fevereiro de 1998 essa firma passou a ser uma sociedade
anónima, sendo certo que antes era um EIRL (nessa altura a actividade da empresa era
exercida em nome pessoal do arguido Guilherme Almeida).
O depoente é a pessoa em que o arguido Guilherme Almeida mais confia na
empresa. Conversa consigo acerca de muitos assuntos e pede-lhe opiniões.
Inicialmente o depoente era o único escriturário. Tratava-se de uma empresa
pequena e que tinha instalações em Ladrido, Penacova.
Mais tarde essas instalações foram ampliadas.
O seu local de trabalho (escritório) incluía a recepção.
A testemunha Sandra Monteiro era a telefonista/recepcionista da empresa e dava
apoio ao escritório.

464
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A empresa tem no arquivo, desde o seu início (1984), o registo das visitas e
telefonemas, conhecendo bem os documentos em causa.
Confrontado com o documento de fls 6659, terceira linha, referiu que foi a
testemunha Sandra Monteiro quem efectuou essa chamada para a CMF, tendo falado
com uma tal de Rosinda (segundo consta do registo). Explicou que foi o depoente quem
apôs os dizeres “marcar uma audiência para apresentar projecto”, e fê-lo na altura em
que o arguido Guilherme foi constituído arguido (ou melhor, quando ele foi acusado e
era necessário fazer um levantamento dos documentos relevantes para a sua defesa).
Escreveu esses dizeres a vermelho (na audiência foi exibido o original desse
documento). A audiência foi marcada para o dia 02.09, às 11.15 horas.
Explicou que a firma “M2” pertencia ao Eng. Manuel Machado, sendo certo que
era o depoente quem fazia a ligação entre esse gabinete de projectos e o arguido
Guilherme Almeida. Normalmente o depoente falava com a esposa do Eng. Machado
(chama-se Fátima).
Apesar de ser o arguido Guilherme Almeida quem abria o correio, era o
depoente quem contactava o gabinete de projectos “M2”, normalmente por fax.
Sabe que a audiência mencionada no documento de fls 6659 teve lugar e que se
prendeu com o facto do arguido Guilherme Almeida ter urgência na construção de
novas instalações fabris na medida em que as instalações de que dispunham eram
insuficientes para dar resposta às necessidades da empresa (que já tinha na altura 80
funcionários e no espaço que então ocupavam apenas estava prevista a acomodação de
50 funcionários).
O terreno que o arguido Guilherme adquiriu para construir os novos pavilhões
tinha muita pedra (pelo que a terraplanagem seria demorada), tendo-lhe dito que fez o
pedido para iniciar a terraplanagem. Ele fez-se acompanhar do Eng. Machado nessa
audiência. Nunca antes ele tinha feito a apresentação de algum projecto dessa forma.
O arguido Guilherme disse-lhe que na dita audiência pediu à arguida Fátima
para iniciar a terraplanagem, o que ela não aceitou, admitindo apenas que a
terraplanagem avançasse quando o projecto fosse aprovado, ainda que a respectiva
licença não estivesse emitida.
Nunca foi à CMF tratar de assuntos relacionados com a construção dos
pavilhões, ignorando se o arguido Guilherme se deslocou à CMF com esse intuito (certo
é que a testemunha referiu que o arguido Guilherme tinha feito o pedido para que as
terraplanagens pudessem ser efectuadas, assunto que claramente se prende com a
construção em causa).
Em Outubro de 1997 foram visitados por causa da campanha eleitoral por um
grupo de pessoas que solicitaram um donativo.
Viu esse grupo de pessoas entrar e era composto por quatro pessoas, das quais
conhecia os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas (por os ver na companhia da
arguida Fátima em Felgueiras) e o Sr. Silvério (não se recorda do quatro elemento).
No documento de fls 6667, última linha (reportado ao dia 07.10.97), é
referenciado o nome de “Joaquim Costa”, o que atribui a lapso no respectivo registo.
Só sabe que foi nesse dia que a empresa recebeu a visita daquelas pessoas em
face do que observa no registo.
No dia em que receberam essa visita o arguido Guilherme disse-lhe para passar
um cheque (ele nunca passava os cheques) no valor de 250 cts (cfr. o segundo cheque
de fls 501, nesse valor, datado de 10.10.97, cheque esse que se mostra preenchido pelo
depoente).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que era o depoente quem fazia os depósitos na conta, depósitos esses
que então só ficavam disponíveis cinco dias depois e presume que terá sido por isso que
o cheque foi datado para o dia 10.10.97 (apesar de o ter emitido no dia 07.10.97).
Referiu que a empresa dispõe de várias contas e que o grosso dos pagamentos
são efectuados ao dia 5 de cada mês, pelo que à data da visita da comissão de
angariação de fundos as contas não deveriam ter saldo suficiente (daí a emissão do
cheque para uma data posterior, facto de que aliás já não se recordava).
O dito cheque foi emitido à ordem do arguido Joaquim Freitas na medida em
que não emitiam cheques ao portador.
Segundo lhe disse o arguido Guilherme eles comprometeram-se a passar um
recibo, visto que a empresa tinha contabilidade organizada, mas esse recibo nunca lhes
foi entregue.
O donativo em causa foi para a campanha eleitoral do PS.
Era frequente as instituições e os partidos políticos irem à empresa pedir
donativos. O arguido Guilherme sempre que pode ajuda.
Depois da obra de terraplanagem referida se ter iniciado, cerca de 8 ou 15 dias
depois, os fiscais da CMF elaboraram um auto de notícia, que foi assinado pelo arguido
Guilherme Almeida na empresa, mas os fiscais não disseram para parar a obra.
A fls 6671 consta uma cópia desse auto de notícia, datado de 27.11.97.
A fls 6672 consta um registo de telefonemas efectuados para o gabinete “M2”
(ver 19ª linha), presumindo que esses telefonemas foram efectuados depois de serem
notificados do auto de embargo da obra.
O auto de embargo da obra consta de fls 6673 e data de 09.01.98, às 15 horas.
A fls 6674 (linha 19ª) consta um registo de um telefonema (foi o arguido
Guilherme quem pessoalmente falou) para o Eng. Machado, pelas 14.34 horas.
Nesse mesmo dia foi efectuada outra chamada para o Eng. Machado, desta feita
às 17.20 horas.
Todos os documentos recebidos da CMF eram remetidos ao gabinete de
projectos “M2” (foi o depoente quem enviou para esse gabinete cópia do auto de
embargo).
A obra parou de imediato (terraplanagem), pois o arguido Guilherme, logo após
ter assinado o auto de embargo, foi à obra e ordenou a suspensão dos trabalhos.
A testemunha Arnaldo Pinto só tinha dois ou três camiões e andavam lá mais
empresas a trabalhar.
A suspensão dos trabalhos durou semana e meia.
Conforme se pode verificar a fls 6675, 6676 e 6678, foram efectuadas várias
chamadas telefónicas para o gabinete de projectos “M2” e que se prenderam com o
embargo e a forma de se ultrapassar essa situação.
Explicou que nesse período (Janeiro de 1998) foi o depoente quem fez as
chamadas e não a testemunha Sandra Monteiro na medida em que ela esteve ausente
numa feira de calçado na “Exponor”.
Num telefonema efectuado pelo arguido Horácio Costa para a empresa ele
identificou-se como sendo assessor da arguida Fátima Felgueiras.
Foi assim o depoente quem recebeu os telefonemas, tendo atendido uma
chamada do arguido Horácio Costa, o qual tinha urgência em falar com o arguido
Guilherme, razão pela qual o depoente lhe deu o respectivo número de telemóvel (isto
passou-se a meio da tarde).
Nesse mesmo dia o arguido Guilherme ligou ao depoente e disse-lhe que tinha a
autorização da arguida Fátima Felgueiras para que a terraplanagem avançasse, tendo-lhe

466
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

então dito para contactar os empreiteiros de modo a que na Segunda-feira seguinte


retomassem as obras.
Foi entretanto emitido outro cheque, que o depoente também preencheu
(dactilografou), desta feita sacado sobre a conta pessoal do arguido Guilherme (da
CCAM), o qual se tratou de mais um donativo para a campanha eleitoral do PS,
segundo lhe disse o arguido Guilherme para que o depoente fizesse o respectivo registo.
Dessa vez não receberam qualquer visita.
Explicou que o cheque foi sacado sobre uma conta pessoal do arguido
Guilherme na medida em que, na sequência da emissão do primeiro cheque, não lhes
haviam entregue recibo, situação que concerteza ocorreria em relação ao segundo
donativo.
Deve ter entregue esse cheque ao arguido Guilherme e foi ele quem lhe deu o
destino (não sabe de que forma).
O arguido Guilherme referiu-lhe que aquando da visita da comissão de
angariação de fundos para a campanha do PS eles necessitavam de 1.000 cts e que se
tinha comprometido a contribuir com mais qualquer coisa, caso fosse necessário, após
as eleições.
*
O arguido Horácio Costa referiu então que a comissão que visitou a empresa do
arguido Guilherme Almeida era apenas composta por si e pelo arguido Joaquim Freitas
(tem a certeza que niguém mais os acompanhou na dita visita).
Recorda-se que a testemunha Baltazar estava presente e que foi ele quem
entregou o cheque ao arguido Guilherme num envelope fechado, tendo sido este quem
procedeu à respectiva entrega.
Recorda-se que no gabinete do arguido Guilherme predominava o granito.
Recorda-se que o depoente e o arguido Joaquim Freitas ali se deslocaram numa
carrinha de dois lugares (da empresa do arguido Joaquim), na medida em que a estrada
de acesso às instalações fabris estava esburacada e assim em mau estado de
conservação. Foi por isso que o arguido Joaquim resolveu usar essa viatura ao invés da
sua viatura pessoal.
O Sr. Silvério, por seu turno, nunca os acompanhou para angariar donativos.
Pessoalmente o depoente nunca assumiu o compromisso de emissão de
qualquer recibo, pois não tinha responsabilidades no PS e o pelouro das finanças não
emitia recibos. Não se recorda do arguido Joaquim Freitas ter prometido a emissão de
recibo, mas se o fez não presenciou esse facto, pois não permitiria que o arguido
Joaquim Freitas fizesse essa promessa na medida em que seria enganar as pessoas.
Em todo o caso, durante a visita esteve sempre com o arguido Joaquim Freitas.
O depoente nunca pediu 1.000 cts a quem quer que seja nem nunca os
referenciou, limitando-se a receber do arguido Guilherme o respectivo donativo e a dar-
lhe o destino que já referiu.
De facto, nunca exigiu ou sugeriu qualquer montante a título de donativo.
O depoente foi a essa empresa na sequência de uma ordem directa da arguida
Fátima, que o mandou ir lá.
Quem se anunciou foi o arguido Joaquim Freitas (era ele quem tocava às
campaínhas, já que era também empresário e conhecia as pessoas), tendo a ideia que ele
fez referência à sua presença e ao facto do depoente ser assessor da arguida Fátima
Felgueiras (isto é, quando se anunciou, anunciou também a presença do depoente –
“Horácio Costa, assessor da Drª Fátima Felgueiras”).
A visita em causa ocorreu em finais de Setembro de 1997 ou em princípios de
Outubro desse ano.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

*
A testemunha Paulo Baltazar, por seu turno, confirmou que no gabinete do
arguido Guilherme predominava o granito.
Reiterou que nesse gabinete viu quatro pessoas e que o arguido Guilherme lhe
deu instruções para emitir o cheque referido (o respectivo valor e à ordem de quem).
Recorda-se que o cheque foi assinado à frente das visitas pelo arguido
Guilherme Almeida. Levou então o cheque e tirou uma cópia, tendo colocado o original
num envelope fechado.
Foi o arguido Guilherme, após eles terem saído, quem lhe disse que eles
prometeram a emissão de um recibo (presume que do PS, visto que o donativo era para
esse partido) e também foi ele quem lhe disse que queriam um donativo de 1.000 cts.

- Testemunha Silvério Morais Ribeiro


Referiu que foi membro da Assembleia Municipal de Felgueiras no tempo em
que a testemunha Sousa Oliveira era o respectivo presidente (entre 1994 e 1997).
Nas eleições em que foi eleito participou activamente na respectiva campanha
eleitoral, tendo acompanhado a testemunha Sousa Oliveira na recolha de donativos para
a campanha.
Talvez duas ou três vezes acompanhou autras pessoas, como por exemplo o
arguido Joaquim Freitas e o Sr. Silva, na recolha de donativos. Uma ou outra vez terá
recolhido donativos após essas eleições (eleições autárquicas ocorridas em 1993).
Não se recorda de ter andado com o arguido Horácio na recolha de donativos.
Não descarta porém essa hipótese (se o acompanhou foi a pedido do arguido Joaquim
Freitas).
Só falou uma única vez com o arguido Horácio Costa, na CMF.
Nas eleições de 1997 o depoente não integrou qualquer uma das comissões
constituídas a propósito da respectiva campanha eleitoral.
O depoente, aliás, nem sequer era filiado no PS.
Recorda-se de ter ido a uma casa particular em Penacova (do arguido Guilherme
Almeida, com quem não tinha confiança), à noite, mas já não se recorda se foi em 1993
ou 1997.
Não se recorda se ao lado dessa casa existiam ou não umas instalações fabris,
mas admite que sim. Referiu então que afinal terá ido de tarde a esse local e não de
noite, não tendo a certeza se esteve ou não em qualquer instalação fabril.
Recorda-se de ter ido à fábrica do Sr. Rolando da Cunha Melo, não se
recordando com quem foi e se foi em 1993 ou 1997.
Não conhece a testemunha Paulo Baltazar Silveira Martins, nem onde trabalha.
O depoente, antes de se aposentar, trabalhou na empresa de calçado
“Continental”.
O nome da “Ricap” é-lhe familiar como empresa no sector do calçado, mas
desconhece quem é o respectivo proprietário.
*
Em face destas declarações o arguido Horácio Costa reafirmou o que disse, isto
é, a testemunha Silvério nunca o acompanhou, sendo certo que só falou com ele uma
vez no GAPP, numa altura em que ele ali se deslocou para tratar de assuntos que
desconhece.
À data dessa conversa o depoente era assessor.
Nunca mais contactou com ele.

468
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não duvida que a testemunha Silvério se tenha dirigido a casa do arguido


Guilherme, mas não foi em 1997 quando o depoente e o arguido Joaquim Freitas se
deslocaram à “Ricap”.
Se a testemunha em causa, conforme disse, não tinha confiança com o arguido
Guilherme, a que propósito é que o arguido Joaquim Freitas lhe poderia ter pedido para
o acompanhar?
A testemunha em causa foi membro da Assembleia Municipal de Felgueiras
entre 1993 e 1997, sendo certo que ele nunca esteve presente nas reuniões ocorridas a
propósito da campanha eleitoral de 1997 (pelo menos nas reuniões em que o depoente
esteve presente).
Via-o porém em acções de campanha, como comícios e concertos.
*
A testemunha Silvério referiu então que frequentou reuniões em 1997, não se
lembrando porém se em alguma delas estava o arguido Horácio Costa.
O arguido Joaquim Freitas, por seu turno, era uma pessoa insegura que queria
fazer-se acompanhar de pessoas que considerava credíveis, sendo certo que o depoente
era uma delas.

Análise crítica
O arguido Guilherme Almeida emitiu dois cheques, cujas cópias constam de fls
501 (de 250 cts, emitido a 10.10.97, sacado sobre a conta da sua empresa a favor do
arguido Joaquim Freitas e depositado pelo arguido Horácio na conta do BES a 13.10.97,
conforme fls 83 do apenso 1) e 523 (emitido ao portador a 06.02.98 e no montante de
150 cts, cheque que foi sacado sobre a sua conta pessoal da CCAM; tal cheque viria a
ser depositado pelo arguido Horácio a 06.02.98, conforme documento de fls 168 do
apenso 1).
Trataram-se de donativos para a campanha eleitoral do PS relativa às eleições
autárquicas de 1997 (não obstante o segundo cheque ter sido emitido já em 1998,
reportou-se ainda a um donativo para essa campanha, já que mesmo depois da
ocorrência dessas eleições foram recolhidos donativos e procederam-se a pagamentos
de despesas relacionadas com essa campanha eleitoral, conforme emerge
designadamente das declarações que o arguido Horácio foi prestando ao longo do
julgamento a propósito dos donativos recebidos e dos pagamentos efectuados,
declarações essas sustentadas pelos documentos constantes do apenso1 e por outros
juntos aos autos principais alusivos a pagamentos).
Que tais cheques constituíram donativos resultou ainda de forma inequívoca do
depoimento da testemunha Paulo Baltazar Martins, funcionário de escritório da “Ricap”.
Ora, os processos de licenciamento em causa foram analisados muito
sumariamente pela IGAT (cfr. o relatório de fls 3165 e ss.) e mais profundamente pelos
arguidos Fátima Felgueiras e Barbieiri Cardoso, para cujas declarações remetemos.
A propósito do processo de licenciamento nº 630/97, quanto ao seu andamento,
a versão constante da contestação do arguido Guilherme parece estar “grosso modo”
correcta, em face do que se observa nesse processo e nos documentos mencionados em
tal contestação – para os quais remetemos -, em conjugação com o teor do depoimento
das testemunhas Sandra Monteiro e Paulo Martins.
Em todo o caso, há que atentar no seguinte:
Em face do que se observa na folha de atendimento constante em tal processo de
licenciamento, o arguido Guilherme e o seu técnico (a testemunha Machado) foram
recebidos pela arguida Fátima Felgueiras a 02.09.97, reunião na qual o respectivo
projecto foi apresentado, portanto já depois do requerimento inicial ter dado entrada na

469
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

CMF (a 30.07.97), mas antes de qualquer parecer e da decisão incial de indeferimento.


A propósito da marcação dessa audiência, cfr. os depoimentos das testemunhas Sandra
Monteiro e Paulo Martins, em conjugação com o documento de fls 6659.
Parece claro que, em face da urgência da obra (pelas razões explicadas pelas
testemunhas Manuel Machado e Paulo Martins), a razão de ser de tal audiência se
prendeu com a apresentação desse projecto e não com um ecoponto, conforme referido
pela testemunha Manuel Machado (pese embora não nos custe acreditar que nessa
reunião se tenha também abordado esse assunto, mas aqueloutro – referente à
apresentação do projecto – era o mais importante, conforme acabou por admitir a dita
testemunha Machado).
Nessa reunião o arguido Guilherme terá pedido autorização para iniciar as obras
de terraplanagem enquanto a CMF apreciava e aprovava o projecto de arquitectura (cfr.
designadamente os depoimentos da arguida Fátima e da testemunha Machado), pedido
que se coaduna com a urgência da construção da obra em face das necessidades de
produção da “Ricap”.
Ora, as obras de terraplanagem carecem de licença de construção, sendo certo
que podem de facto iniciar-se, conforme referiu a arguida Fátima, desde que o projecto
de arquitectura seja aprovado e desde que seja emitida uma licença para caboucos, pelo
que terá sido essa a posição transmitida pela arguida Fátima aos seus interlocutores,
posição essa que se coaduna com o teor da respectiva folha de atendimento, constante
em tal processo de licenciamento.
Não é pois inteiramente exacta a versão que a propósito é contada na
contestação do arguido Guilherme e também contada pela testemunha Machado (não
nos convencemos pois que a arguida Fátima tenha autorizado verbalmente a realização
das obras de terraplanagem logo que se obtivesse a aprovação do projecto de
arquitectura, pois convencemo-nos que para além disso ela impôs ainda como condição
para o avanço dessas obras a obtenção de uma licença para caboucos).
Nessa parte as declarações da arguida Fátima Felgueiras mereceram
credibilidade, sendo certo que essa autorização (condicionada àquelas duas condições)
não suscita assim qualquer questão do ponto de vista legal.
É claro que, conforme referiu o arguido Barbieri Cardoso, a obtenção da licença
para caboucos é quase tão demorada como a obtenção da licença de construção, pelo
que, na prática, quase ningém requer a dita licença para caboucos (terá sido por isso que
o arguido Guilherme arrancou com as obras de terraplanagem sem essa licença?).
Certo é que não se demonstrou – pois não emergiu da prova produzida – que
nessa reunião à dita autorização concedida pela arguida Fátima (autorização essa
condicionada ao preenchimento dos dois requisitos referidos) tivesse correspondido o
comprometimento do arguido Guilherme em conceder qaulquer donativo para a
campanha eleitoral de 1997.
De facto, a autorização dada nos moldes em que o foi não suscita qualquer
problema do ponto de vista legal (nessa medida não se tratava de qualquer “favor”) e
dos depoimentos prestados, designadamente por quem participou nessa reunião de
Setembro de 1997 (arguida Fátima e testemunha Machado; o arguido Guilherme
quedou-se pelo silêncio, conforme aliás direito que lhe assiste), não emerge que tenha
sido sequer abordada qualquer questão relacionada com a concessão de um donativo.
Se foi ou não abordado esse assunto não o sabemos, mas certo é que foi a
arguida Fátima quem deu indicações aos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas para
“visitarem” o arguido Guilherme na sua fábrica no sentido de dele obterem um donativo
(conforme referiu assertivamente o arguido Horácio), mas não ficou claro se eles ali se
deslocaram apenas para recolher um donativo (o que pressupunha que já teria sido

470
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

solicitado previamente por alguém, designadamente pela arguida Fátima) ou se ali se


deslocaram para solicitar e recolher um donativo (nesta hipótese, anteriormente a essa
visita, esse donativo não teria sido sequer solicitado).
Ora, a propósito dessa visita, a versão dos factos contada pelo arguido Horácio
Costa acerca de quem ali se deslocou (apenas esse arguido e o arguido Joaquim)
mereceu-nos mais credibilidade em relação ao que foi afirmado pela testemunha
Martins, por três ordens de razões: por um lado, não emergiu de forma inequívoca do
depoimento da testemunha Silvério que este tenha acompanhado os ditos Horácio e
Joaquim Freitas (a testemunha Silvério produziu aliás um discurso muito pouco
assertivo e foi-se aproximando – sem nunca chegar a ela - da posição pretendida pelo
arguido Guilherme à medida que insistentemente o seu ilustre mandatário o questionava
acerca desse assunto); a esse propósito o depoimento do arguido Horácio foi muito mais
assertivo; para além disso, no registo diário de visitas (cfr. documento de fls 6667),
consta a inscrição “Joaquim Costa (assessor da Drª Fátima Felgueiras)”, inscrição essa
que, ao que tudo indica, enferma de lapso, pois deve referir-se ao arguido Joaquim e ao
arguido Horácio (este último “assessor da Drª Fátima Felgueiras”), conforme parece
emergir do depoimento da testemunha Martins. Ora, se o dito Silvério tivesse
acompanhado os arguidos Horácio e Joaquim, naturalmente que nesse registo, com ou
sem lapso, haveria de estar indicado o seu nome, bem como o nome do suposto quarto
elemento.
Também não se demonstrou a matéria constante do artº 28º da contestação do
arguido Guilherme Almeida na medida em que não resultou das declarações prestadas
pelos arguidos Joaquim Freitas e Horácio Costa que o arguido Guilherme se
comprometeu perante os ditos Horácio e Joaquim a dar outro donativo caso viesse a ser
necessário, para além dos 250 cts referidos na pronúncia. A esse facto apenas se referiu
a testemunha Martins e, ainda assim, por ouvir dizer ao arguido Guilherme, portanto,
sem conhecimento directo desse facto.
Certo é que, em todo o caso, o arguido Guilherme concedeu o segundo donativo
para fazer face a despesas de campanha ainda não pagas, conforme referiu a arguida
Fátima ao arguido Horácio, aquando da entrega por banda daquela a este do cheque de
fls 532, segundo versão contada assertivamente pelo arguido Horácio Costa.
Dada a contradição das versões apresentadas pelo arguido Horácio e pela
testemunha Paulo Martins (e uma vez que – certamente por deficiência nossa - não
conseguimos descortinar quem depôs a esse propósito com respeito pela verdade dos
factos), não se demonstrou ainda a matéria constante do artº 30º da contestação
apresentada pelo arguido Guilherme (isto é, ficamos sem saber se esse facto
corresponde ou não à verdade).
Como não se obteve qualquer explicação para o facto de um dos cheques ter sido
emitido em nome de Joaquim de Freitas (que o arguido Joaquim Freitas, sem
credibilidade, referiu ter sido emitido em nome do seu progenitor), não se demonstrou
também a matéria constante do artº 31º da mesma contestação.
Isto posto, voltando ao processo de licenciamento nº 630/97, na sequência de
informações negativas (de 26 e 29.09.97), dando conta que a área de implantação era
superior à permitida pelo PDM, a arguida Fátima despachou a 03.10.97 no sentido do
requerente ser notificado para se pronunciar, notificação que se efectivou a 06.10.97.
Ora, na sequência disso, ao contrário do que se refere na pronúncia, inexiste
qualquer despacho de indeferimento (o que existe é uma “choca” de um despacho de
indeferimento que não foi assinada – cfr. o respectivo processo de licenciamento e as
declarações que foram prestadas a esse propósito pelos arguidos Fátima Felgueiras e
Barbieri Cardoso).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Certo é que em Setembro de 1997 – aquando da audiência concedida ao arguido


Gulherme -, inexistia qualquer despacho de indeferimento.
Esse despacho de indeferimento não viria aliás a ser proferido porquanto,
segundo se deduz da análise de tal processo de licenciamento, foi feito um aditamento
ao projecto a 14.10.97, o qual, respeitando agora o PDM, mereceu pareceres favoráveis,
pelo que naturalmente o projecto de arquitectura viria a ser aprovado a 10.11.97 (de que
o requerente foi notificado a 14.11.97), decisão que não merece qualquer reparo (não se
tratando por isso de qualquer “favor”).
Daqui não se pode inferir portanto que a concessão do primeiro donativo, em
Outubro de 1997 (a testemunha Martins referiu assertivamente que o cheque então
emitido foi pré-datado, daí que exista uma dilação de alguns dias entre a datada da sua
emissão e a data que dele consta), tenha constituído qualquer contrapartida pela
aprovação do projecto de arquitectura, sendo certo que se não tivesse ocorrido o
aditamento ao projecto inicial (conformando-o com o PDM), por certo a petensão em
causa seria indeferida, conforme aliás “choca” de despacho (não assinado) constante
desse processo de licenciamento (“choca” essa preparada e incorpoada – indevidamente,
dizemos nós – pelos serviços camarários, conforme referiu a arguida Fátima).
No dia 14.11.97 deram entrada os projectos de especialidade.
Ignoramos se as terraplanagens se iniciaram apenas a 14.11.97, mas o certo é
que pelo menos a 19.11.97 já se tinham iniciado (o testemunho de Arnaldo Batista Pinto
mereceu-nos algumas reservas, sendo certo que a razão indicada para que se lembre de
que essas obras se iniciaram em Novembro de 1997 não nos convenceu. A forma como
depôs e a expressão corporal patenteada levam-nos a crer – porventura injustamente,
mas essa é a nossa convicção – que essa testemunha na verdade já não se recorda da
data em que se iniciaram os trabalhos de terraplanagem em causa).
De facto, no dia 19.11.97 foi junta uma denúncia por banda de Ana Maria
Sampaio Mendes, na sequência da qual a arguida Fátima Felgueiras mandou a
Fiscalização ao local, tendo-se constatado que as obras de terraplanagem se haviam
ilegalmente inciado (não bastava a aprovação do projecto de aquitectura, ainda que
dessa forma o tenha entendido o arguido Guilherme da conversa que teve com a arguida
Fátima na audiência rederida; mais estranho é que o respectivo técnico – a testemunha
Machado - também tenha percepcionado dessa forma a posição então expressa pela
arguida Fátima Felgueiras).
Em face disso foi levantado o respectivo auto de notícia a 27.11.97, que a
arguida Fátima mandou instruir como processo de contra-ordenação (a 28.11.97), vindo
a obra a ser embargada a 09.01.98, tendo-se notificado o arguido Guilherme desse
embargo nesse dia.
Do processo de licenciamento não consta qualquer informação que indique que
esse processo de contra-ordenação tenha sido de facto instaurado (à data esse tipo de
informação poderia não constar dos processos de licenciamento), sendo certo que se
demonstrou que na verdade esse processo não viria a ser instaurado (a razão de ser
desse procedimento anómalo prender-se-á, especulamos, com o facto da obra ter
condições para ser licenciada, segundo prática seguida na CMF e que reputamos de
ilegal, conforme já acima deixamos expresso. Não terá sido, em todo o caso, uma
situação de excepção e, nessa medida, um “favor”).
Na sequência do facto de ter sido levantado o auto notícia referido a 27.11.97, o
arguido Guilherme terá contactado telefonicamente a testemunha Manuel Machado (do
gabinete de projectos “M2”), pelas 15.33 horas, conforme emerge do depoimento das
testemunhas Sandra Monteiro e Paulo Martins em conjugação com os registos diários
dos telefonemas efectuados (cfr. documento de fls 6672, 19ª linha).

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2º Juízo

Não foi porém demonstrada a matéria constante do artº 41º da contestação do


arguido Guilherme Almeida, pois isso não foi sequer referido pela testemunha Manuel
Machado, sendo certo que, no que toca a essa informação, o arguido Guilherme não
necessitaria de a obter junto do gabinete “M2” pois esteve pessoalmente presente na
audiência com a arguida Fátima no dia 02.09.97.
Note-se que ainda o auto de embargo da obra não se mostrava elaborado (ficou
concluído às 15 horas do dia 09.01.98) e o arguido Guilherme já tinha contactado o
gabinete “M2” pelas 14.34 horas do mesmo dia (cfr. documento de fls 6674, 19ª linha).
Foram aliás efectuados vários telefonemas para esse gabinete, sendo credível
que se reportassem ao assunto em causa (cfr. o depoimento da testemunha Martins e os
documentos de fls 6675, 6676 e 6678), mas em concreto, ignoramos qual o teor das
conversações mantidas, pois isso não resulta da prova testemunhal produzida (matéria
que assim não é dada como provada).
Segundo a testemunha Martins, normalmente atendia o telefone a esposa da
testemunha Machado, uma tal de Fátima.
Não foi porém possível apurar qual o teor concreto das conversações então
mantidas, conforme já se deixou expresso – pois nenhuma testemunha o referiu -, pelo
que não se demonstrou o que a propósito é alegado nos artgs 44º (2ª parte), 46º e 47º da
contestação do arguido Guilherme.
Na sequência do embargo da obra, segundo as testemunhas Arnaldo Pinto e
Paulo Martins, os trabalhos foram suspensos, tendo sido retomados quando obtiveram a
autorização para tal (cfr. ainda as declarações prestadas pelo arguido Horácio, o qual, a
mando da arguida Fátima, tentou contactar telefonicamente o arguido Guilherme para
lhe dar conta da autorização para o prosseguimento dos trabalhos, tendo sido atendido
pela testemunha Martins, que lhe forneceu o número do telemóvel do patrão a fim dele
o contactar pessoalmente, já que este estava ausente numa feira na “Exponor”. No
mesmo dia o arguido Guilherme comunica à testemunha Martins que já tinha a
autorização para que os trabalhos fossem retomados, encarregando-o de contactar com
os empreiteiros no sentido da obra ser retomada na Segunda-feira seguinte).
Nem o arguido Horácio nem a testemunha Martins situaram com precisão a data
desse contacto a dar conta da autorização para o prosseguimento da obra, mas o mesmo
terá ocorrido ainda em Janeiro de 1998, em data necessariamente posterior à do
embargo (meados de Janeiro portanto).
Também não foi possível apurar em concreto em que data esses trabalhos foram
retomados, mas tê-lo-ão sido por essa altura, obtida a dita autorização dada pela arguida
Fátima.
Certo é que no dia 19.01.98 os serviços de fiscalização da CMF constataram que
os trabalhos tinham prosseguido, elaborando por isso o respectivo auto de notícia,
conforme consta do processo de licenciamento da obra.
Esse auto de notícia nunca foi enviado ao MP, sendo certo porém que nunca
existiu uma ordem da arguida Fátima nesse sentido, ao contrário do que consta da
pronúncia (trata-se de mais uma “choca” que não foi assinada, tendo antes a arguida
Fátima aposto um despacho manuscrito dirigido ao arguido Barbieri no sentido de pedir
esclarecimentos, pedido esse que denota que ela estava equivocada quanto à identidade
do processo de licenciamento em causa – cfr. fls 74 do respectivo processo de
licenciamento. Em face do esclarecimento dado, a arguida Fátima despachou no sentido
de ser informada se os pareceres em falta já tinham sido proferidos.
Ora como os pareceres eram favoráveis, segundo explicado, a arguida Fátima
decidiu não remeter aquele auto de notícia ao MP (o que na nossa óptica se tratou de
uma decisão ilegal, na medida em que o suposto crime de desobediência já se tinha

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2º Juízo

consumado e porque se trata de um crime público, pelo que, independentemente da


viabilidade do licenciamento, essa comunicação teria de ser feita). Trata-se assim de
uma situação semelhante à decisão de não instaurar um processo contra-ordenacional no
caso da obra ter condições para ser licenciada.
A licença de construção viria a ser concedida a 26.01.98, tendo sido pagas no dia
seguinte as taxas (agravadas por se tratar de um processo de legalização).
O alvará de construção nº 101/98 viria a ser emitido a 27.01.98 (a notificação ao
requerente foi efectuada no dia 30.01.98), tendo sido emitida a licença de utilização em
17.05.2000.
A arguida Fátima nega ter alguma vez falado com o arguido Horácio acerca
desse processo de licenciamento, designadamente que lhe pediu para comunicar a
autorização para o prosseguimento das obras na sequência do respectivo embargo, mas
essa matéria ficou demonstrada quer em face das declarações prestadas pelo arguido
Horácio quer em face do depoimento da testemunha Paulo Martins.
Tratou-se assim de uma autorização absolutamente ilegal.
Certo é que, não obstante aquela autorização verbal, os serviços de fiscalização
da CMF cumpriram o seu papel e elaboraram o respectivo auto de notícia.
Pergunta-se: terá a arguida Fátima decidido não remeter tal auto ao MP porque a
obra estava em condições de ser licenciada? Ou porque bem sabia que tinha
(ilegalmente) dado autorização para que essas obras prosseguissem em violação desse
embargo? Ou porque o arguido Guilherme tinha acedido em conceder mais um donativo
mediante aquela autorização?
Em face da prova produzida, acima sintetizada, não consegue o Tribunal dar
resposta àquelas interrogações (por um lado, a situação é semelhante às contra-
ordenações não instauradas quando as obras tem viabilidade para serem legalizadas
mas, por outro lado, a arguida Fátima concedeu ilegalmente a dita autorização de
prosseguimento dos trabalhos de terraplanagem e pouco depois viria a ser concedido
mais um donativo pelo arguido Guilherme).
Assim, porque a aparência dos factos, neste caso, pode ter mais do que uma
explicação, em face do princípio in dubio pro reo, não nos é possível estabelecer a
ligação entre esse “favor” e a concessão do segundo donativo (através de cheque
emitido com data de 06.02.98), tanto mais que o arguido Horácio não confirmou que no
contacto telefónico com o arguido Guilherme lhe tenha transmitido que a arguida
Fátima exigia um novo donativo.
Pelo mesmo motivo não se demonstraram os factos alegados nos artgs 56º e 57º
da contestação do arguido Guilherme (conforme emerge do que acima já se expôs,
também não se provou a matéria constante no artº 64º dessa peça processual).
No que respeita à origem do processo de licenciamento nº 116/98, parecem-nos
correctos os factos alegados nos artgs 65º a 68º da contestação apresentada pelo arguido
Guilherme Almeida (cfr. os documentos ali referenciados a esse propósito, o respectivo
processo de licenciamento e o relatório da IGAT já mencionado).
Também os factos alegados nos artgs 69º a 77º da mesma contestação emergem
do dito processo de licenciamento nº 116/98.
Ora, da análise desse processo de licenciamento, além do mais, resulta que:
Pelas razões referidas na pronúncia, tendo-se iniciado a obra sem qualquer
licenciamento, foi elaborada uma participação a 25.05.98 e um auto de notícia datado de
27.05.98, dando assim origem a um processo de contra-ordenação.
Para além disso, a obra viria a ser embargada a 01.06.98.

474
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Consta do processo de licenciamento uma folha de atendimento, da qual resulta


que foi concedida ao arguido Guilherme uma audiência pela arguida Fátima a 15.06.98,
na sequência portanto desse embargo.
Por suspeita de loteamento ilegal, a 22.09.98, a arguida Fátima manda os
serviços averiguar o que se passa (por certo não o teria feito se algum dos actos
praticados neste processo de licenciamento fossem conformados tendo em atenção os
dois donativos referidos nos autos).
Entretanto, na sequência de requerimento nesse sentido, deferiu um pedido de
prorrogação por 60 dias para que o requerente efectuasse o destaque.
A 20.10.98 é apresentado o documento comprovativo do destaque.
A 22.12.98 é mantida a informação que ia no sentido do indeferimento do
licenciamento.
A 11.02.99 os serviços de fiscalização elaboraram novo auto de notícia dando
conta do não acatamento do auto de embargo.
Na sequência disso, 15.02.99 é ordenado o embargo da obra e a 17.02.99 a
arguida Fátima ordena a remessa do auto de notícia ao MP para efeitos de procedimento
criminal pela prática de um crime de desobediência.
Porém, tal despacho foi mandado suspender por 60 dias, tendo por base uma
informação do Departamento Técnico, datada de 29.03.99, constante de fls 133 do
processo em causa (ao contrário do que é referido no despacho de pronúncia, essa
informação consta de facto do processo de licenciamento referido).
A 01.07.99 a arguida Fátima despachou no sentido da concessão da licença de
construção (alvará nº 690/99, de 07.10.99), estribada em parecer técnico favorável..
Entretanto, sob pena de indeferimento da licença de utilização, é concedido um
prazo de 30 dias para a conclusão das infraestruturas.
Em face da conclusão dessas obras e de parecer técnico favorável, por despacho
de 14.04.2000, a arguida Fátima deferiu a emissão da licença de utilização (alvará nº
339A/2000, de 09.06.2000).
O auto de notícia não chegou assim a ser enviado ao MP, deduzimos que pelo
facto da obra entretanto ter sido legalizada, procedimento que, como já referimos,
consideramos ilegal mas que era e é prática habitual na CMF.
Seja como for, não se demonstrou que esse facto se deveu à circunstância do
arguido Guilherme ter contribuído com dois donativos para a campanha eleitoral de
1997, através de cheques emitidos em Novembro desse ano e em Fevereiro do ano
seguinte.
A distância temporal entre o referido despacho e a concessão daqueles donativos
afastam, quanto a nós, a suspeita de que estarão relacionados com o não envio do auto
de notícia ao MP (cfr., aliás a propósito, as declarações prestadas pelo arguido Barbieri
Cardoso no que respeita à não remessa de autos de notícia ao MP por crime de
desobediência).
Por fim, é credível que o arguido Guilherme, pelo menos à data, não tenha tido
conhecimento da decisão de suspensão do envio do auto de notícia ao MP, sendo certo
que dele aquele arguido não foi notificado.

Joaquim Teixeira Pinto e José Manuel Pimenta da Silva

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Admitiu conhecer os arguidos enquanto empresários do concelho.

475
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Manifestou recordar-se de ter sido procurada por eles, em data que não se
recorda (não se recorda ainda que outros elementos participaram nessa reunião,
admitindo porém que era natural – dado o assunto em causa – que o Arquitecto Rui
Almeida estivesse presente), manifestando-lhe então o desejo de construir duas fábricas
(relativamente a cada uma das empresas referidas na pronúncia) ou no concelho de
Felgueiras ou no concelho de Fafe.
Foi-lhe manifestado que o terreno onde as duas fábricas deveriam ser
implantadas era de grandes dimensões (situava-se em Cabeça de Porca, Sendim, numa
zona de grande concentração industrial) e que não estavam a conseguir efectuar o
destaque, tendo então a depoente questionado os serviços acerca desse assunto.
Não tendo sido possível efectuar a operação de destaque, tiveram de lotear o
terreno, no que despenderam quantia superior a 20.000 contos, sinal de que eles não
tiveram qualquer tratamento de favor.
Nega ter dado autorização verbal para o início das obras de terraplanagem (as
quais apenas seriam legalmente possíveis com uma licença para caboucos e com a
aprovação do projecto de arquitectura).
Analizou-se então o processo de loteamento nº 10/97.
O requerimento respectivo deu entrada nos serviços camarários a 30.07.97,
apresentado pela firma “José Manuel Pimenta da Silva, Ldª”.
A 13.10.97 o pedido é rejeitado por falta de apresentação de documentos
necessários à análise do pedido de loteamento.
Recebeu o interessado a 11.11.97, acompanhado do técnico responsável e onde
o Arquitecto Rui Almeida terá estado presente.
A 26.11.98 o projecto de loteamento é reformulado, mas tal pretensão veio a ser
indeferida, pelas razões constantes da pronúncia.
A 19.02.98 manda notificar a requerente para se pronunciar quanto àquela
decisão.
Do processo consta uma folha de atendimento, donde se dá conta que no dia
05.03.98 recebeu o arguido Pimenta.
Entretanto, a 06.03.98, a arguida Fátima Felgueiras remete novamente o
processo ao Director do Projecto do PDM para reapreciação.
Dá conta que na altura em que o PDM foi feito não havia cartografia digital,
razão pela qual não havia rigor absoluto, constatando-se então um erro de cartografia,
razão pela qual o terreno referido estava todo em zona de construção industrial (isto é,
ao contrário do que resultava das cartas cartográficas pouco rigorosas, esse terreno não
se situava em parte em zona de floresta dominante).
A 03.06.98 foi junto o requerimento mencionado na pronúncia e a DRAEDM,
depois de ter exigido um estudo paisagistico e deste ter sido apresentado, considerou-o
globalmente equilibrado (cfr. acta de reunião com a tutela e o regulamento do PDM).
Consequentemente, inexistindo qualquer objecção à aprovação do loteamento,
por despacho de 25.01.99 é aprovado o projecto e mandada notificar a requerente para
apresentar os projectos de especialidade.
No processo de licenciamento está entretanto documentada uma reunião com o
arguido Pimenta, a 24.06.99, pois ele entendia que era excessiva a área a ceder à
autarquia e em localização que não lhe convinha.
Por despacho de 08.10.99 a arguida manifestou concordar com a posição dos
serviços acerca desse assunto.
Surge então uma informação dos serviços acerca da área de cedência, tendo a
arguida proferido despacho de deferimento nos termos dessa informação (a 15.12.99).

476
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A 03.01.2000 é deferido o pedido de licenciamento e a 27.01.2000 são pagas as


taxas devidas e a caução exigida.
A 07.08.2000 a área do terreno a ceder é avaliada em 17.856.090$00, tendo sido
imposta ou a prestação de uma caução nesse valor ou a realização de escritura pública
quanto àquelas parcelas a ceder, no prazo de 30 dias.
Ora, depois de tudo regularizado, só em 30.11.2001 é que foi emitido o
respectivo alvará de loteamento, sendo certo que foi paga a quantia total de
22.158.550$00, conforme guia de receita junta àquele processo de loteamento.
Consequentemente, em face dos despachos que proferiu (respeitando sempre os
pareceres técnicos), da morosidade do processo e dos montantes pagos, concluiu a
arguida que não existiu qualquer tipo de favorecimento.
Por outro lado, conforme referido no despacho de pronúncia, a construção das
duas unidades industriais deram origem aos processos de obras particulares nºs 413/99 e
414/99.
Do primeiro consta uma participação da fiscalização datada de 27.05.98, a qual,
em 25.05.98, detectou a construção de dois pavilhões sem a respectiva licença de
construção.
Consequentemente, a obra foi embargada a 15.06.98.
Daquele processo não consta se foi ou não instaurado o competente processo de
contra-ordenação.
Entretanto surge uma informação de que o projecto tem viabilidade porque está
de acordo com o processo de loteamento.
A 19.01.99 a fiscalização dá conta de que os trabalhos prosseguiram e a arguida
despachou no sentido de autuar, mandando remeter o respectivo auto de notícia ao MP
(por despacho de 14.02.2000), o que é feito a 18.02.2000.
A Divisão de Planeamento entretanto informa que o pavilhão está já a ser
ocupado desde Fevereiro de 1999.
A 22.10.2001 a arguida despacha em conformidade com a informação dada
pelos serviços.
O pedido de licenciamento é deferido a 13.12.2001 e é notificada a requerente
para apresentar os projectos de especialidade.
O alvará de licença de construção é emitido a 14.12.2001.
Do processo consta o respectivo livro de obra, onde apenas está registada a
respectiva conclusão a 18.12.2001, sinal de que ela foi edificada sem a necessária
licença de construção.
Já do processo de licenciamento nº 414/99 resulta que o respectivo requerimento
deu entrada a 17.05.99, tendo sido proferido o primeiro despacho a 26.08.99.
A 27.05.98 é feita uma participação a dar conta que a obra arrancou sem a
necessária licença de construção (tinha já colocada a cobertura metálica).
A 15.06.98 a dita obra é embargada e é instaurado o respectivo processo contra-
ordenacional.
É entretanto dada a informação de que a obra tem viabilidade para ser aprovada,
por estar de acordo com o processo de loteamento.
Também a 14.02.2000 manda remeter o auto de notícia ao MP, na sequência da
constatação de que a obra prosseguiu.
Surge então uma informação dada pelos serviços de que o pavilhão está a ser
ocupado desde Janeiro de 2000 (tendo sido mandada dar essa informação ao Ministério
da Economia, pois verificava-se a laboração sem a respectiva licença).
A 25.10.2001 é autuado um processo de contra-ordenação.

477
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A licença de construção é deferida a 12.12.2001 (alvará emitido a 14.12.2201 e


concedido pelo prazo de 1 ano) e é notificada a requerente para apresentar os
respectivos projectos de especialidade.
No livro de obra apenas está registada a conclusão da obra a 15.12.2001, sinal de
que se iniciou sem a respectiva licença.
Quanto aos donativos concedidos pelos arguidos Pimenta e José Manuel Silva,
manteve a posição já anteriormente assumida quanto aos outros donativos (cfr. fls 506,
e 521, ambas do 3º volume).
Quanto ao eventual pagamento de coimas pelos arguidos, cfr. os documentos
juntos com a respectiva contestação.

- Arguido Barbieri Cardoso


No que concerne ao processo de loteamento nº 10/97, em face da sua análise na
audiência de julgamento, conclui que:
O requerimento inicial data de 30.07.97.
A 31.07.97 o requerimento é objecto de apreciação liminar pelo chefe de
Divisão Administrativa, o qual notifica o requerente para juntar os documentos em falta.
O requerente não deu cumprimento ao solicitado, pelo que o pedido foi rejeitado
a 13.10.97.
A 21.10.97 deu entrada novo requerimento para reapreciação do requerido,
juntando-se agora certidão da Conservatória do Registo Predial de Felgueiras.
A 05.11.97 o PDM emitiu o seu parecer, o que motivou um pedido de
esclarecimentos quanto à mancha de implantação.
Consta desse processo uma nota da arguida Fátima Felgueiras de que tinha
havido uma audência com o requerente na presença do seu técnico.
Foi consultada a JAE, a qual não colocou objeções mas com condicionantes.
A 29.11.98 foi emitido parecer negativo.
A 06.02.98 o PDM emitiu também parecer negativo visto que a obra não se
poderia edificar naquela área, classificada como sendo de “floresta dominante”.
A 05.03.98 a arguida Fátima Felgueiras pede para que haja reapreciação por
banda dos serviços.
A 08.03.98 ela manda remeter ao PDM um requerimento apresentado pelo
requerente.
Esclareceu o depoente que existiu um lapso dos serviços do PDM ao defenir
aquela zona como sendo de “floresta dominante”.
A 03.06.98 são juntas novas plantas que, segundo o depoente, demonstram a
incongruência do PDM (parte do imóvel está implantado em área industrial e a partir de
30 mts a área é classificada como “floesta dominante”, o que não permite a construção
de pavilhões industriais mesmo na área classificada como sendo de zona industrial).
Foi então requerido que o PDM desbloqueie a situação.
A 04.06.98 foi então pedido um parecer à Direcção Regional da Agricultura
acerca da desafectação do terreno daquela área de “floresta dominante”.
A 25.06.98 dá-se notícia de que a fábrica estava já em construção e exigiu-se um
estudo de arranjo paisagístico, o qual é junto a 15.09.98.
O plano foi então considerado globalmente equilibrado.
A 26.11.98 foi apresentado o projecto do loteamento já reformulado em face do
estudo paisagístico.
A 21.12.98 foi emitido parecer favorável do ponto de vista urbanístico.
A 25.01.99 o pedido de licenciamento foi deferido pela arguida Fátima
Felgueiras.

478
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A 16.03.99 foram apresentados os projectos de especialidade.


Em Maio de 1999 foram juntas informações favoráveis.
Porém, havia problemas com a área a ceder.
A 16.06.99 o requerente indica as áreas a ceder (tratava-se de uma área ao fundo
do loteamento).
A 10.10.99 o depoente informa a arguida Fátima Felgueiras aconselhando-a a
não aceitar a área de cedência pois não tinha qualquer interesse para a CMF, o que
mereceu um despacho em conformidade com a posição do depoente.
A 16.11.99 o requerente apresentou em alternativa um outro terreno para ceder e
que confinava com o logradouro da Capela da Nossa Senhora dos Perdidos. A área do
terreno era inferior à área de cedência pretendida pela CMF em pouco mais de 600 m2.
Tal terreno foi então aceite e o diferencial (600 m2 a menos) deveria ser paga
em numerário (1.477.250$00).
A 29.02.2000 foram pagas as taxas pela emissão do alvará de construção
respectivo.
Porém, fez-se depender a emissão do alvará da realização da escritura de
cedência do terrno.
A 26.05.2000 o requerente informa que o registo de tal imóvel a ceder está
desactualizado.
Optou-se então pela imposição de uma caução que cubra o valor desse terreno (o
qual já havia sido calculado em 17.856.090$00. Esta avaliação foi feita sem que os
serviços camarários tivessem confirmado a respectiva área).
Sucede que entretanto foi feito um levantamento topográfico desse terreno,
tendo-se então constatado que ele tinha 8.645 m2 (no registo constava uma área de
7.850 m2) e que o imóvel se tratava de uma faixa de terreno sem qualquer interesse para
a CMF.
A 11.09.2001 foi emitido um parecer jurídico da assessoria jurídica da CMF.
O depoente informa então do desinteresse do terreno a ceder, o que mereceu
concordância da arguida Fátima Felgueiras, a qual mandou notificar o requerente para
apresentar um alternativa em espécie ou o pagamento em dinheiro, tendo sido esta
última hipótese a que foi aceite pelo requerente.
O alvará de loteamento foi emitido a 30.11.2001.
A 05.12.2001 foram pagas pelo requerente as quantias de 19.343.340$00 e
2.782.500$00, tendo sido efectuado no dia seguinte o aviso da emissão do dito alvará.
Esclareceu que o alvará só foi emitido em face do parecer favorável da Direcção
Regional da Agricultura e não porque entretanto o PDM tenha sofrido qualquer revisão.
Sustentou que a desafectação do uso de “floresta dominante” não está tipificada
na lei ao contrário do que se refere à “reserva ecológica nacional” e à “reserva agrícola
nacional”, daí que seja habitual pedir-se um parecer à Direcção Regional da Agricultura
para esse fim (seja como for a emissão do alvará violou o PDM previsto para o local,
sendo certo que - incongruente ou não - antes de mais haveria que proceder à sua
revisão).

- Arguido Horácio Costa


Conhecia de vista os arguidos José Manuel Pimenta da Silva e Joaquim Teixeira
Pinto, nunca com eles tendo conversado.
O Eng. Manuel Maria Machado era sócio deles na firma “Conterfel” (empresa
ligada ao sector imobiliário), segundo comentários que ouviu. Sucede que o arguido
Joaquim Freitas recebeu um telefonema desse engenheiro (o depoente estava presente)
para passar no seu escritório a fim de receberem um donativo, o que fizeram.

479
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ele entregou-lhes então três cheques de 500.000$00 cada um. Depois de


confrontado com os cheques em causa e respectivo depósito reformulou o seu
depoimento salientando que se equivocou pois na verdade na mesma ocasião apenas
receberam os cheques emitidos pelos arguidos José Silva e Joaquim Pinto, não se
recordando já como lhe veio parar às mãos os cheques emitidos pelo Eng. Machado.
Deram conhecimento desse facto à arguida Fátima Felgueiras e depositaram os
cheques em causa (cfr. o cheque de fls 506 do 3º volume, no valor de 500.000$00, sem
data e ao portador, emitido pelo arguido José Manuel Pimenta da Silva; o cheque de fls
506 do 3º volume, no valor de 500.000$00, datado de 28.10.97 e emitido pelo arguido
Joaquim Teixeira Pinto; o cheque de fls 503 do 3º volume – não referido na pronúncia –
no valor de 500.000$00, datado de 16.10.97, e emitido pelo Eng. Machado; cfr. ainda o
depósito dos cheques emitidos pelos arguidos José Silva e Joaquim Pinto a 29.10.97,
conforme documento de fls 94 do apenso 1; o cheque emitido pelo Eng. Machado no
valor de 500.000$00 foi depositado a 17.10.97, conforme documento de fls 88 do
apenso 1).
Esse engenheiro entregou-lhes ainda um cheque de 670.000$00, sem data e
emitido pelo arguido Pimenta da Silva ao portador (cfr. documento de fls 521 do 3º
volume), o qual foi depositado a 12.12.97 conforme documento de fls 135 do apenso 1
(como se disse, não se recorda da forma como os cheques emitidos pelo Eng. Machado
lhes veio parar às mãos).
No processo de licenciamento em causa neste ponto não consta um documento
segundo o qual a arguida Fátima Felgueiras terá recebido os ditos arguidos, ao contrário
do que afirmou.
A propósito, juntou aos autos, a fls 13906 e 13907, dois documentos. Esses
documentos estavam num dossier que lhe foi entregue quando lhe devolveram os seus
pertences, depois de lhe terem destruído o gabinete e de lhe tiraram o regime de
permanência enquanto vereador, nas circunstâncias que já relatou. Esse dossier dizia
respeito a um conjunto de cópias e originais de documentos respeitantes a audiências
feitas por si ou pela arguida Fátima e a documentos avulsos da lavra da arguida Fátima
Felgueiras.
Assim, no que respeita ao documento de fls 13906, a arguida Fátima faz
referência ao facto de ter recebido aqueles arguidos (Srs. Pinto e Pimenta), dirigindo o
documento ao Departamento de Planeamento Urbanístico e à Fiscalização (Engª
Fernanda Adriana) por despacho datado de 22.10.98.
Aqueles arguidos, que saiba, à data, não tinham qualquer outro processo de
licenciamento em curso, daí que, no seu entendimento, esse documento se reporte ao
processo de licenciamento referido nos autos.
Já o documento de fls 13907 diz respeito a um formulário de comunicações
internas da presidência, dirigido ao director do Departamento Técnico.
Trata-se de uma comunicação interna da arguida Fátima ao director do
Departamento Técnico (arguido Barbieiri Cardoso), datada de 24.06.99, não sabendo se
essa comunicação consta do processo de licenciamento do loteamento referido nos autos
neste ponto.
*
Em face destas últimas declarações do arguido Horácio Costa, referiu o arguido
Barbieiri Cardoso que não se recorda de ter visto o documento de fls 13096 no
processo de loteamento em causa, supondo que nada terá a ver com esse processo, mas
antes com um processo de licenciamento no Outeiro.
Já o documento de fls 13097 consta de fls 68 do processo de loteamento referido
neste ponto, sendo certo que o documento em causa é uma mera cópia tirada antes de ter

480
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

chegado às suas mãos, pois dele não consta a informação que entretanto exarou (em que
mandava remeter à Divisão de Planeamento Urbanístico no sentido de verificar se o
terreno que se pretendia ceder era ou não contíguo ao aterro, visto que em caso
afirmativo poderia haver interesse nele por parte da CMF e assim aceitar a cedência
proposta pelos requerentes).
Entretanto a Divisão de Planeamento Urbanístico, a fls 66 do processo de
licenciamento do loteamento, exarou a respectiva informação, em face da qual o
depoente informou a arguida Fátima da não conveniência da cedência do terreno
conforme era pretendido pelos requerentes.
*
A propósito da mesma questão, a arguida Fátima Felgueiras confirmou as
declarações prestadas pelo arguido Barbieri Cardoso.
Explicou que as folhas onde são tiradas as notas das audiências concedidas por
si têm um químico. As audiências são marcadas pela funcionária (no caso a testemunha
Cândida). Assim, o documento de fls 13907 apenas deveria estar no dossier dessa
funcionária antes de chegar ao destinatário, pelo que alguém se deverá ter apropriado
desse documento, dele tendo retirado uma cópia antes ter sido entregue ao arguido
Barbieri Cardoso.
Quanto ao documento de fls 13906, esclareceu que nunca disse nunca ter
recebido os arguidos Pinto e Pimenta. Se os recebeu o respectivo documento deveria
constar no processo de loteamento.
Ora, o documento em causa nada tem a ver com o dito processo de loteamento.
Tem antes a ver com o licenciamento de um prédio no loteamento do Outeiro, o qual,
estando já devidamente licenciado, estavam a pavimentar a baia de estacionamento e
colocava-se a questão do prolongamento da pavimentação até outro limite.
Também desse documento foi tirada uma cópia abusiva antes de ser entregue aos
serviços a que se destinava.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa reafirmou o que disse em
relação ao documento de fls 13906.
Explicou que quando a arguida Fátima despachava eram muitas vezes tiradas
cópias para si.
Em 22.10.98 e em 24.06.99 a testemunha Cândida estava no Departamento
Técnico e era a testemunha Leonor quem marcava as audiências.
A partir de determinada altura, por força das ausências da arguida Fátima
motivadas por compromissos profissionais, era o depoente quem fazia as audiências
menores. Fazia então um levantamento das questões suscitadas na audiência e juntava-a
ao processo, após o que eram remetidas à arguida Fátima para que ela despachasse
quando tivesse disponibilidade. Então, a testemunha Leonor tirava uma cópia do
despacho dela e entregava ao depoente para tomar conhecimento.
Tal também sucedeu relativamente a processos em que não teve qualquer
intervenção, como foi o caso dos documentos referidos.
*
Ainda sobre o documento de fls 13906, depois de proceder a uma pesquisa na
CMF, o arguido Barbieiri Cardoso referiu que esse documento consta do processo de
fiscalização nº 131/98 (“Conterfel – Soc. de Construções, Ldª”, em que o requerente é a
testemunha Engº Manuel Maria Lopes Machado). Ignora quem são os sócios dessa
sociedade.
Esse processo de fiscalização deu origem ao processo de contra-ordenação nº
238/98.

481
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O muro em causa nesse processo de fiscalização acabaria por ser demolido.


*
- Arguido Joaquim Freitas
Conhece o arguido Joaquim Teixeira Pinto por ser industrial do calçado e o
arguido José Silva por ser industrial de componentes de calçado. Eram aliás seus
amigos.
Não sabia que eles tinham um processo de licenciamento na CMF.
Só os procurou em 1993 para contribuírem para a campanha eleitoral desse ano
e para o “Sovela”.
Os donativos que entregaram para a campanha eleitoral de 1997 foram entregues
pelo Eng. Machado, na CMF, um a pessoa que não sabe (mas que deveria ter sido ou à
arguida Fátima Felgueiras ou no GAPP ou ainda à testemunha Leonor, que na altura era
a recepcionista da parte política da CMF) e outro ao depoente e ao arguido Horácio
Costa.
Confrontado com os documentos de fls 506 do 3º volume reconheceu-os como
sendo os cheques em causa (ambos de 500.000$00, um datado de 28.10.97, emitido
pelo arguido Joaquim e outro sem data, emitido pelo arguido José Silva).
Ignora se os mesmos foram entregues no mesmo dia ou em alturas diferentes.
O depósito foi efectuado pelo arguido Horácio a 29.10.97, conforme documento
de fls 94 do apenso 1.
Por seu turno, confrontado com o cheque de fls 521 do 3º volume, no montante
de 670.000$00 e sem data, reconheceu-o como sendo um cheque entregue pelo arguido
José Manuel Pimenta da Silva (o depósito foi feito a 12.12.97, conforme documento de
fls 135 do apenso 1).
Para o “Sovela” chegou a ir com o Eng. Machado pedir dinheiro ao arguido
Joaquim Pinto e ele disse-lhes que estava farto de dar dinheiro, razão pela qual pediu ao
Eng. Machado para diligenciar junto dos sócios pela obtenção do pretendido donativo,
daí que os cheques tenham sido entregues ao dito Eng. Machado.

- Testemunha Luís Orlando Cardoso Botelho Maia


No que respeita ao processo de loteamento nº 10/97 e processos de obras
particulares nºs 413/99 e 414/99, referiu que o loteamento viola o PDM pelas razões
expostas no relatório (implantação em área de floresta dominante e área percorrida por
incêndio).
Para ultrapassar este obstáculo não é suficiente a aprovação de um plano
paisagístico pela Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho, sendo
necessário ou uma decisão judicial nesse sentido ou a alteração do PDM em
conformidade.
Foi por isso que consideraram nulo o acto de aprovação do loteamento e
propuseram que o Município de Felgueiras o reconhecesse e o declarasse caso contrário
haveria que efectuar a respectiva participação ao MP junto do TAC do Porto.
Seja como for, em face da análise do processo respectivo, a arguida Fátima
Felgueiras sempre decidiu com base nos pareceres técnicos dos serviços, motivo pelo
qual entenderam que ela não teve culpa e não propuseram qualquer sanção tutelar.
Não lhes chegou ao seu conhecimento que os donos das empresas “Pinfel” e
“Solpré” tivessem entregue qualquer quantia monetária a elementos ligados à CMF.

- Testemunha Manuel Maria de Araújo Lopes Machado


Referiu conhecer os arguidos José Manuel Pimenta da Silva e Joaquim Teixeira
Pinto, pois são industriais de Felgueiras e com quem tinha uma relação de sociedade.

482
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se recorda de ter entregue ao arguido Joaquim Freitas qualquer cheque


emitido por eles, designadamente o de fls 506.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


O arguido José Manuel Pimenta da Silva emitiu um cheque, cuja cópia consta de
fls 506 (no valor de 500 cts, sem data de emissão e emitido ao portador) e o arguido
Joaquim Teixeira Pinto emitiu um outro cheque no mesmo valor, cuja cópia consta de
fls 521 (no valor de 500 cts e datado de 28.10.97).
Fez ainda referência ao cheque de 670 cts cuja cópia consta de fls 521 do 3º
volume.
Recorda-se que a PJ tirou fotografias no local da obra (cfr. relato de diligência
externa de fls 101 do 1º volume) e constataram que tinha uma de implantação não
permitida pelo PDM.
Não sabe se um estudo de natureza paisagística que obteve um parecer favorável
da Direcção Regional de Agricultura de Entre o Douro e Minho seria suficiente para que
o projecto fosse aprovado.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Os arguidos José Manuel Pimenta da Silva e Joaquim Teixeira Pinto eram
industriais (“Solpré” e “Pinfel”).
Existia na CMF um processo de loteamento.
Uma parte dos edifícios estava implantada em terreno afecto a floresta segundo
o PDM (floresta dominante e zona percorrida por incêncidos).
A situação foi ultrapassada (e o licenciamento obtido) em face de um pedido de
parecer à Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho, que tinha a ver
com o enquadramento paisagístico do projecto. Não sabe qual o sentido do parecer, mas
deduz que tenha sido favorável.
Seja como for, tal parecer não seria suficiente para que, passando por cima do
PDM, a obra viesse a ser licenciada. Só com a alteração do PDM ou pela via judicial é
que esse problema poderia ser ultrapassado e a obra licenciada.
Esses arguidos concederam também donativos (cfr. os dois cheques de fls 506 e
o cheque de fls 521).

- Testemunha Rui José da Silva Pinto Almeida


O requerimento relativo ao processo de loteamento em causa deu entrada em
Julho de 1997 (processo de licenciamento nº 10/97).
A fls 57 desse processo de licenciamento consta uma informação do Engº
Armando (técnico do Gabinete do PDM), de 05.11.97, que remete para o processo nº
6/97.
O processo de licenciamento da obra em causa não começou com o processo de
licenciamento nº 10/97.
De facto, em 03.01.97 foi pedido um licenciamento de um armazém para aquele
terreno, mas em nome de Paulo Vasconcelos Cerpa Marques. Já nesse processo se dá
conta da realização de uma terraplanagem.
O projecto de arquitectura foi aprovado e a fiscalização informou que a
terraplanagem já tinha sido participada no dia 09.01.97 pela Polícia Municipal em nome
de Joaquim Teixeira Pinto.
A 09.01.97 a terraplanagem do terreno estava quase toda feita (numa área de
cinco hectares), terraplanagem essa que prossegiu numa pequena parte, de modo que no

483
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

dia 13.01.97 já estava concluída conforme se verifica nas fotografias juntas ao processo
de licenciamento nº 6/97.
Até essa data o depoente não esteve presente em qualquer audiência concedida
pela arguida Fátima Felgueiras ao arguido Joaquim Teixeira Pinto.
A pedido do requerente esse processo de licenciamento nº 6/97 foi suspenso.
Em 11.04.97 foi pedido um destaque de uma parcela desse terreno (pretendiam
dividir o terreno, o qual foi indeferido porque o processo nº 6/97 estava suspenso).
Isto é, tratava-se de uma zona industrial (e não um aglomerado urbano) e
inexistia um projecto aprovado para o terreno, daí que, segundo a lei, o pedido de
destaque tenha sido indeferido.
Consequentemente, tornava-se obrigatório o loteamento do terreno em ordem a
dividí-lo em dois lotes.
Foi na sequência dessa decisão que, inconformados, os requerentes pediram uma
audiência à arguida Fátima Felgueiras, que teve lugar em Abril/Maio de 1997 e onde de
facto o depoente foi chamado (estava presente, para além da arguida Fátima Felgueiras
e do depoente, um dos interessados – não se recorda qual dos dois – e o Engº Machado).
Nessa reunião manifestaram que não queriam fazer um loteamento do terreno e o
depoente explicou-lhes porque razão teriam de o fazer.
Numa fase inicial detectaram que parte do terreno a lotear estava implantado em
zona de floresta dominante e área percorrida por incêndios. Porém, a mesma área era
zona industrial, sendo certo que por erro de desenho é que se verificava a sobreposição.
Os mapas eram feitos à mão, não existindo à data meios de cartografia que com rigor
definissem os perímetros das áreas.
Para aquela área estava previsto um traçado do IC25, o qual não veio a ser
construído nessa área. Ficou assim nessa área uma clareira, tendo havido depois a
reposição da trama.
A zona industrial ficou castrada com uma profundidade que na zona
inviabilizava a construção de pavilhões industriais. Na planta 1mm corresponde a 10
mts, daí que o facto das plantas serem manualmente reproduzidas umas em cima das
outras dá aso a erros relevantes.
Assim, segundo o PDM, a parte da frente do terreno em causa era considerada
zona industrial, mas na parte de trás era zona florestal e área percorrida por incêndios.
Em face disso consultaram uma entidade externa, que definia as zonas florestais,
a qual deu um parecer favorável. Não se trata de uma desafectação, mas de uma
utilização diferente na medida em que o respectivo uso já não era de floresta, conforme
constataram no local.
Se a fábrica fosse entretanto demolida, o licenciamento de outra estrutura do
género obrigaria ao mesmo procedimento, pois uma parte do terreno continuava a estar
implantado em zona de floresta e em área percorrida por incêndios (tratava-se da zona
da lixeira, o que provocava incêndios em face da combustão dos resíduos).
A desafectação, por seu turno, só é feita em sede de alteração do PDM.
A desafectação é uma operação diversa de uma utilização diferente em relação
ao que está previsto no PDM. A desefectação é a retirada de uma determinada área, em
termos definitivos, de uma determinada utilização prevista para outra utilização
(desafecta-se assim em relação à utilização prevista e afecta-se em termos definitivos a
outra utilização, ao passo que a mera utilização diversa da prevista não é definitiva, já
que essa utilização prevista mantêm-se).
Deu como exemplo o facto de ser possível a construção de uma casa em terreno
de reserva agrícola, desde que seja autorizada pela Comissão Regional da Reserva
Agrícola (cujo paracer pode ser remetido para o Conselho Nacional da Reserva

484
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Agrícola, o qual é necessário para a desafectação. É um parecer necessário mas não


vinculativo caso seja favorável).
A CMF não aceitou às cedências propostas pelos requerentes, pelo que eles
tiveram de pagar o valor correspondente.
Pela operação de loteamento tiveram de pagar vinte mil e tal contos.

- Testemunha Joaquim Carlos Vieira Lopes Jordão


Referiu que é arquitecto na CMF há cerca de 19 anos. Neste momento é director
do Departamento do Ordenamento do Território. As funções que exerceu e exerce na
CMF sempre se prenderam com o ordenamento do território e do PDM. Foi aliás
contratado para dirigir e coordenar a elaboração do PDM.
A fls 147 do processo de loteamento em causa existe um extracto de uma planta
do ordenamento do PDM.
Trouxe consigo a planta original, feita em poliester, por ser transparente e
permitir tirar cópias. Tal era a técnica usada antes da introdução dos sistemas digitais.
Essa planta é feita com base em fotografias aéreas feitas em 1981, pelo que já
estava desactualizada. Essa actualização foi feita manualmente (mais ou menos a olho)
e por isso não era muito rigorosa.
Cada vez que se fazia uma cópia da planta o rigor da mesma era cada vez menor,
já que o mecanismo de reprodução era artesanal.
Com a alteração do traçado do IC25 ficou uma área em branco na planta, pelo
que à última hora repuseram esse espaço com as tramas e recobriu-se a área em branco
com a área de floresta, não se tendo tido em conta que deveriam ter alargado a área
industrial para uma área exequível pois, tal como está, com uma profundidade de 40 mts
naquela área, não dá para a construção de pavilhões industriais (é necessária, pelo
menos, uma profundidade de 140/150 mts desde a estrada).
Tal como consta da planta, essa área era percorrida por incêndios.
Referiu que já perto do final da elaboração do mapa para o PDM o depoente
sobrevoou a área de helicóptero para ver quais eram as zonas percorridas por incêndios
e ainda no helicóptero apontou essas áreas com as imprecisões que se podem imaginar
em cópias de papel.
Assim, a delimitação que fez (e que ficou a constar do mapa) não é de fiar.
Dentro desse perímetro não é, segundo o PDM, possível construir, mas parte
dele sobrepõe-se a parte da zona industrial, facto que classifica de um erro. Não se teve
em conta esse facto e criaram assim uma contradição.
Por outro lado, aquela área ardia por ser a zona onde estava instalada a lixeira
municipal. Assim, em bom rigor, não estava em causa a razão subjacente pela qual a
legislação proibia a construção por um período de 10 anos em áreas percorridas por
incêndio (que era o de impedir que deliberadamente se deitasse fogo a zonas florestais
com o intuito de proceder a construções).
O depoente não teve qualquer intervenção no processo de loteamento em causa.
Foi pedido um parecer a um elemento do seu Gabinete e ele fez uma
interpretação literal da planta, ao contrário do que defende o depoente, concluíndo-se
assim nesse parecer que a construção abrangia solo de floresta dominante e parte de área
percorrida por incêndio. Trata-se de um parecer que deveria ter chamado à atenção para
o erro que apontou, sendo certo que o objectivo é que as indústrias fossem localizadas
nessa parte do território do concelho.
Antes desse processo de loteamento tinha existido um processo de licenciamento
de um armazém em nome de outra pessoa (presume que em nome do anterior
proprietário do terreno), no qual o depoente exarou um parecer favorável em face da

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

forma como interpreta a planta (entende que a interpretação deve ser feita em função do
interesse público subjacente à criação da área industrial).
Recorda-se que já nessa altura se tinham feito terraplanagens no terreno.
No processo de loteamento os requerentes tiveram de juntar um estudo de
integração e recuperação paisagistica, estudo que foi imposto pelos serviços florestais,
serviços esses que tinham colaborado na elaboração do PDM no que se refere à área
florestal.
Assim, esses serviços eram consultados quando podia estar em causa a área
florestal, emitindo assim o respectivo parecer.
Em 10 anos constataram que cerca de 1/3 da área florestal do concelho havia
sido devastada, o que não tinha paralelo nos concelhos limítrofes.
Assim, a preservação da floresta era um interesse estratégico para o concelho,
interesse esse que se tinha porém de harmonizar com outros interesses estratégicos,
como seja a construção de pavilhões industriais em determinada zona.
O PDM deve ser utilizado com prudência como instrumento de gestão
urbanística. É sobretudo um instrumento orientador e estratégico. Procura representar
graficamente a estratégia de arrumação das várias componentes de ordenação do
território.
O depoente dá os seus pareceres olhando genericamente para a planta do PDM e
em face da localização indicada, as mais das vezes com uma bolinha, não curando saber
da dimensão da construção.
Mais referiu que ainda hoje encontram erros. Ainda há dias detectaram que uma
parte do território está em branco, por cartografar.
Presume que quando analisaram a pretensão dos requerentes detectaram o erro
que apontou, sendo certo que essa pretensão estava de acordo com o interesse
estratégico consagrado no PDM.
Em ordem a corrigir esse erro procuraram promover uma alteração ao PDM,
mais isso é um processo muito complicado e moroso. Tal intenção não foi entretanto
avante porque decidiu-se fazer um plano geral de alteração ao PDM.

Análise crítica
Quanto aos termos do que terá sido acordado entre os arguidos Teixeira Pinto e
Pimenta da Silva, a propósito da aquisição do terreno situado em Cabeça de Porca e da
construção das novas unidades fabris, no essencial, pareceu-nos verosímel a posição
expressa pelo arguido Pinto na sua contestação, em face do facto do terreno ter sido
apenas adquirido pela firma do arguido Pimenta da Silva (cfr. documento de fls 9003 a
9007), de ter sido posteriormente adquirido o lote que lhe competia pela sociedade de
que o arguido Teixeira é administrador (cfr. documento de fls 9008 a 9011) e desta
sociedade ter suportado metade dos custos com a operação de loteamento (cfr.
documentos de fls 8731, 9012 e 9013), sem esquecer que eles tentaram levar a cabo
uma operação de destaque (procedimento mais rápido e barato) antes de terem sido
forçados a lotear o terreno.
Não se provou que o terreno referido nos autos tenha estado registado em nome
do arguido José Pimenta da Silva, mas antes em nome da firma “José Manuel Pimenta
da Silva & Cª Ldª”, em face do teor da certidão emitida pela conservatória do registo
predial competente, junta aos autos a fls 9003 e ss.
Ora, essencialmente pelas razões indicadas na pronúncia, a arguida Fátima
Felgueiras confirmou ter recebido os arguidos Pimenta da Silva e Teixeira Pinto, não se
recordando porém em que data de 1997 tal sucedeu, mas tal terá seguramente ocorrido

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

antes de qualquer um dos processos de licenciamento referidos ter dado entrada na CMF
(isto é, antes de 30.07.97).
Não se demonstrou porém que ela tenha verbalmente autorizado o arranque das
obras de terraplanagem, pois tal não emergiu de qualquer elemento de prova produzido
em sede de audiência de julgamento.
Demonstrou-se que a testemunha Rui Almeida participou nessa reunião, facto
que a arguida Fátima admitiu, sendo certo que a testemunha Rui confirmou ter
participado numa audiência em que se discutiu a necessidade da realização de um
loteamento, na sequência do indeferimento de uma operação de destaque, ocorrida por
alturas de Maio de 1997 e antes portanto da entrada do requerimento que deu origem ao
processo de loteamento nº 10/97, sendo certo que acerca desse facto nenhum outro
elemento de prova foi produzido.
Note-se que a necessidade da reunião terá surgido pelo facto da operação de
destaque não estar a ser conseguida (cfr. as declarações da arguida Fatima e o
depoimento da testemunha Rui Almeida), sendo certo que, tendo consultando os
serviços, demonstrou-se que ela terá transmitido que apenas seria possível dividir o
terreno em duas parcelas através de uma operação de loteamento, o que naturalmente
terá desagradado os arguidos Pimento da Silva e Teixeira Pinto.
Assim, não se provou de todo que essa reunião tenha ocorrido no início de 1997.
Ora, os trabalhos de terraplanagem e a costrução dos pavilhões ter-se-ão iniciado
sem a respectiva licença, daí que a construção dos dois pavilhões tenha sido embargada
já em 1998.
Porém, não foi possível apurar em que altura de 1997 essas obras de
terraplanagem ter-se-ão iniciado de modo a permitir a construção dos pavilhões, mas o
arranque das mesma ter-se-á iniciado seguramente no primeiro semestre de 1997.
Por uma questão de brevidade, chama-se aqui à colacção as declarações
proferidas pelos arguidos Fátima Felgueiras e Barbieri Cardoso acerca da análise ao
processo de loteamento nº 10/97, com o qual tais arguidos foram confrontados na
audiência de julgamento.
De resto, da sua análise, resulta demonstrada a generalidade da matéria que a
propósito do seu andamento é referida na pronúncia.
O mesmo se diga em relação aos processos de licenciamento de obras
particulares nºs 413/99 e 414/99.
Em termos genéricos, olhando globalmente para eles, verifica-se que os arguidos
Joaquim Pinto e José Silva (ou melhor, as respectivas empresas) tiveram de, a
contragosto, proceder a uma operação de loteamento que lhes custou cerca de 26.000 cts
(cfr. documentos de fls 8730 a 8735), sendo certo que, de permeio, viram requerimentos
indeferidos, tiveram um discenso acerca das áreas a ceder, não foi aceite um terreno
como forma de cedência ao domínio público, foram efectuados embargos de obras e
pelo menos foi instaurado um processo de contra-ordenação (cfr. documentos de fls
8728 e 8729) e um processo-crime por desobediência.
A actuação da arguida Fátima, por sua vez, estribou-se sempre em pareceres
técnicos.
Em face destes dados de natureza objectiva, em consciência, não é possível
estabelecer qualquer ligação entre os donativos concedidos por banda daqueles arguidos
e o concreto andamento e deferimento das suas pretensões no âmbito dos aludidos
processos de loteamento e de obras particulares, tanto mais que o estabelecimento dessa
ligação não emergiu de qualquer depoimento ou testemunho prestado na audiência de
julgamento (o inverso, porém, também não se demonstrou – cfr. por exemplo, os artgs
7º a 13º, 28º e 29º da contestação do arguido Pimenta da Silva).

487
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É certo que o processo de loteamento foi ilegalmente licenciado, na medida em


que claramente violava o PDM, sendo certo que a forma encontrada pela CMF para
ultrapassar uma incongruência que para o local se registava no PDM, embora ilegal, não
constituía uma solução excepcional e era aplicada noutras situações (cfr., por ex. as
declarações do arguido Barbieiri Cardoso).
A incongruência que se verificava no PDM para a zona (segundo explicação que
emerge sobretudo das declarações das testemunhas Rui Almeida e Jordão) consistia no
facto de, na sequência da alteração do traçado do IC25, a zona onde antes estava
prevista a construção dessa via de comunicação ter sido preenchida como área de
floresta dominante e área percorrida por incêndios (incêndios esses provocados pela
lixeira de Sendim), sem atentar que se sobrepunha a uma zona industrial (comprimindo-
a numa estrita faixa), de sorte que a parte da frente do terreno referido nos autos situava-
se em zona industrial e a parte de trás em zona de floresta dominante e área percorrida
por incêndios, o que na prática inviabilizava a construção nesse terreno de qualquer
unidade industrial, daí o parecer negativo proferido pelos serviços, antes da arguida
Fátima ter solicitado a reapreciação, na sequência aliás de uma audiência que concedeu
ao arguido Pimenta em Março de 1998 e documentada nesse processo de loteamento.
Como é bom de ver, só em sede de alteração do PDM ou por decisão judicial é
que legalmente a classificação do solo poderia ser alterada e assim o loteamento em
causa aprovado (cfr. o relatório da IGAT de fls 3165 e ss. e o depoimento de quem o
elaborou).
Porém, parece-nos temerário concluir-se que a arguida Fátima e os arguidos
Pimenta da Silva e Teixeira Pinto, não sendo técnicos da área, tivessem consciência
desse facto, tanto mais que o deferimento daqueles licenciamentos estribou-se em
pareceres técnicos favoráveis e, como se viu na audiência de julgamento, ainda hoje não
falta quem entenda que esses licenciamentos foram correctamente atribuídos (curiosa é
a forma habilidosa – chamemos-lhe assim – como a testemunha Rui Almeida distingue
os conceitos de desafectação e de uso distinto em relação ao previsto pelo PDM e a
forma como a testemunha Jordão interpreta latamente o PDM, abrindo assim caminho a
todo o tipo de violações desse instrumento de ordenamento do território!).
Os donativos entregues pelos arguidos Pimenta da Silva e Teixeira Pinto, por
sua vez, são os que vêm referidos na pronúncia e tê-lo-ão sido através da testemunha
Machado, o qual, aliás, tinha com eles uma relação de sociedade, conforme referiu (cfr.
documentos de fls 506 e 521 dos autos principais e os documentos de fls 94 e 135 do
apenso 1 referente aos respectivos depósitos, em conjugação com as declarações
proferidas pelo arguido Horácio Costa, sendo certo que a testemunha Machado não
descartou a hipótese de ter entregue os cheques em causa, pese embora já não se recorde
desse facto, o que, além do mais, confere credibilidade ao depoimento do arguido
Horácio. Deste depoimento aliás deduz-se que os cheques terão sido entregues na data
do respectivo depósito).
Por ausência absoluta de prova, não se demonstrou porém qual a finalidade da
entrega do cheque de fls 521 (se um donativo para a campanha eleitoral se um donativo
para o FCF).
Do depoimento das testemunhas José Alves e Joaquim Oliveira, retira-se que o
arguido Pimenta da Silva costumava contribuir com donativos para as campanhas
eleitorais de vários partidos, mas não se retira que fosse habitual ele apoiar com
donativos o FCF, daí que só em parte esteja demonstrada a alegação contida no artº 6º
da sua contestação.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Já os factos alegados dos artgs 14º a 18º da contestação apresentada pelo arguido
Pimenta da Silva estão demonstrados em face da análise dos processos de licenciamento
referidos e dos documentos juntos com a contestação em causa.
Por ausência absoluta de prova, não se demonstrou a factualidade vertida nos
artgs 25º a 27º da mesma contestação.
Não se tendo convencido o Tribunal que a concessão dos supra aludidos
donativos se tenham prendido com o andamento dos processos de licenciamento
referidos, o certo é que também não nos convencemos do contrário, daí que,
naturalmente, não se tenha dado como provada qualquer uma das versões apresentadas a
esse propósito, quer na pronúncia quer nas contestações.
Por ausência absoluta de prova nesse sentido ou por prova manifestamente
insuficiente, em face do que se vem a dizer e com as ressalvas já assinaladas, não se
demonstrou a matéria constante dos artgs 2º a 5º, 7º a 16º, 19º, 28º, 29º, 35º, 36º, 37º,
46º, 47º, 56º, 63º 64º, 65º, 68º, 69º, 70º, 74º, 77º e 89º da contestação apresentada pelo
arguido Joaquim Teixeira Pinto.
Já a matéria alegada no artº 26º dessa contestação coaduna-se com a matéria de
facto alegada na pronúncia e emerge quer dos processos de licenciamento referidos quer
dos documentos de fls 9003 a 9011.

Maria Augusta Faria Ferreira Neves

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu conhecer a arguida Maria Augusta e a respectiva família, sendo certo
que travou conhecimento com ela depois de exercer funções autárquicas (porém, não
mantinha com ela uma amizade que fosse ao ponto de conviver com ela e a sua família
aos fins-de-semana).
Aliás, segundo referiu, a arguida Maria Augusta em 1997 era já militante do PS
e concorreu nas listas daquele partido (em 2º lugar) à Assembleia Municipal nas
eleições autárquicas realizadas nesse ano.
Quanto aos donativos mencionados na pronúncia e uma vez confrontada com os
documentos de fls 519, 522 e 541, todos do 3º volume, bem como de fls 4126 do 17º
volume, referiu nunca os ter visto, mantendo a posição já anteriormente assumida
relativamente aos donativos para a campanha eleitoral (cfr. ainda o extracto bancário de
fls 171 e depósito de fls 301 do apenso 30, volume D, referentes ao cheque de fls 4126
do 17º volume).
Analisou-se o processo de licenciamento nº 6/98, donde se constatou que:
O requerimento inicial (subscrito pelo marido da arguida Maria Augusta) deu
entrada a 05.11.98, nos termos mencionados na pronúncia.
A 26.02.98, por despacho da arguida Fátima Felgueiras, foi aprovado o projecto
de arquitectura, mandando notificar o requerente para apresentar os projectos de
especialidade, os quais foram apresentados a 22.07.98.
Entretanto, a fiscalização participa que no dia 02.09.98 verificou que a
construção já se havia iniciado sem a respectiva licença de construção.
Em face de tal, a arguida despacho no sentido de se proceder à respectiva
autuação contra-ordenacional, o que é feito a 03.09.98.
Na sequência da aprovação dos projectos de especialidade (cfr. despacho de
03.09.98, constante de fls 91 de tal processo) é emitido o alvará de licença de
construção nº 660/98, de 09.09.98, válido por 1 ano.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Fátima Felgueiras referiu recordar-se que a arguida Maria Augusta,


acompanhada de um técnico, informalmente, abordou-a acerca do processo em causa,
manifestando preocupação pelo seu normal desenrolar, sendo certo que alegou não se
recordar se lhe foi solicitada ou não alguma audiência ou de ter falado com ela acerca da
viabilidade do projecto antes de ter sido aberto o processo de licenciamento em causa.
Não foi assertiva quanto ao facto de nunca ter sido abordada a questão do
processo de contra-ordenação aberto contra o marido da arguida Maria Augusta
(processo de contra-ordenação nº 466/98).
Entretanto, a 15.12.99, foi emitido o alvará nº 940/99, licenciando alterações à
construção inicial, alterações essas destinadas a armazém.
Já depois do respectivo alvará ter caducado, a 23.11.2000 a fiscalização participa
que a construção está concluída de acordo com o alvará de construção emitido, mas ao
imóvel não só está a ser dado um uso como armazém mas também como unidade fabril
sem a respectiva licença de utilização.
Em face de tal, a 23.11.2000, a arguida Fátima Felgueiras concede um prazo de
60 dias para que tal situação seja regularizada.
Depois de algumas peripécias documentadas naquele processo, foi emitido o
alvará de utilização respectivo a 28.02.2002.
Entretanto, a 18.03.2002 foi efectuada nova participação que dá conta da
utilização daquela construção há mais de 2 anos sem a necessária licença de utilização,
além da desconformidade da construção com o projecto aprovado.
Desde então o processo vai a despacho do vereador Vítor Costa por delegação
de competências.
Por sua vez, dos autos de contra-ordenação nº 466/98 resulta que:
Pelo arguido foi requerido o arquivamento, na sequência do qual a arguida
Fátima Felgueiras despacha no sentido de admitir o arquivamento com admoestação se
o processo de licenciamento estivesse legalizado à data da conclusão do processo de
contra-ordenação
Explicou que era norma da CMF arquivar com admoestação os processos de
contra-ordenação relativamente a obras iniciadas sem a necessária licença de construção
desde que o respectivo processo de licenciamento fosse regularizado.
A ilustrar tal afirmação foram juntas aos autos cópias de processos de contra-
ordenação que tiveram esse epílogo pelas razões referidas.
Do mencionado processo de contra-ordenação emerge que a 27.11.99 foi
exarada uma informação a dar conta de que o processo de licenciamento estava
regularizado, daí que a arguida, por despacho datado de 27.11.99, fez constar o
seguinte: “a confirmar-se arquive-se”.
O Departamento Técnico confirmou entretanto que a obra estava legalizada,
faltando apenas a emissão do respectivo alvará de construção, o qual estava já em
condições de ser emitido (a 09.09.98 foi emitido o alvará nº 660/98 e a 15.12.99 o
alvará nº 940/99, respeitante a alterações ao projecto inicial).
Inexiste nesse processo decisão final idêntica à que se observou nas cópias dos
processos de contra-ordenação entretanto juntas para ilustrar o arquivamento com
admoestação em caso de legalização do processo de licenciamento, pois a última
decisão proferida data de 27.11.99 nos termos já expostos.
Para o facto não foi dada explicação inteiramente satisfatória, sendo certo que
não obstante se ter dado a indicação de arquivamento com admoestação o processo foi
pura e simplesmente arquivado na sequência do despacho datado de 27.11.99.

490
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em todo o caso, na prática, é indiferente um arquivamento puro e simples e um


arquivamento com admoestação (em ambos os casos não há pagamento de custas nem
possibilidade de recurso para o tribunal).
Por fim, a arguida Fátima Felgueiras negou que os donativos referidos tenham
sido concedidos em contrapartida de algum favorecimento concedido no âmbito dos
processos de licenciamento e de contra-ordenação referidos, negando ainda que o
arguido Bragança tenha tido qualquer actuação conforme descrito na pronúncia.
Ainda no que respeita a donativos mencionou que ouviu dizer que em 1998
procurava-se angariar fundos para a aquisição da sede do PS local.

- Arguido Horácio Costa


Conhecia a arguida Maria Augusta no âmbito da campanha eleitoral (ela era
candidata pelo PS à Assembleia Municipal). Só nessa altura é que a conheceu.
Um dos donativos que ela entregou destinou-se a pagar a sonorização da sede de
campanha da arguida Fátima Felgueiras a propósito de um evento que ali teve lugar um
ou dois meses antes das eleições (outros também deram o seu contributo e tem a ideia
que ela deu um donativo de 70.000$00 para esse efeito – cfr. a cópia do cheque
respectivo, no valor de 70 cts e datado de 12.12.97, constante de fls 112 do apenso 4;
cfr. ainda o documento comprovativo do respectivo depósito a 18.12.97, constante de
fls 145 do apenso 1).
Precisou que a conta da sonorização do evento foi paga com o dinheiro então
depositado na conta do BES e só depois é que várias pessoas contribuíram com
donativos destinados a pagar essa despesa, entre as quais a arguida Maria Augusta.
A propósito do cheque de fls 519 do 3º volume, emitido pela “Calzeus” e no
valor de 200.000$00 (depositado a 11.12.97, conforme documento de fls 131 do apenso
1), referiu que a arguida Maria Augusta é mãe de um gestor dessa empresa na altura.
Não se recorda porém em que circunstâncias recebeu esse cheque.
Referiu não se recordar de mais algum donativo entregue por ela. Porém,
confrontado com o cheque cuja cópia se acha a fls 541 do 3º volume (cheque de
100.000$00 da “Calzeus” assinada por duas pessoas , datado de 13.05.98), referiu que a
arguida Maria Augusta esteve envolvida no projecto da revista “Rubeas”. Surgiram
então problemas de financiamento desse projecto e os credores procuraram junto do
depoente receber os seus créditos.
Sem ter a certeza, acha que foi por isso que ela lhe entregou o cheque em causa,
que depositou a 03.11.98 (cfr. documento de fls 188 do apenso 1).
Em face da data do depósito sustentou que o cheque em causa lhe terá sido
entregue muito mais tarde em relação à data nele aposta.
Acerca dos 500.000$00 entregues para o PS nada sabe, sendo certo que havia
pessoas que contribuíam com donativos para o PS e que eram depositados na conta
oficial desse partido.

- Testemunha Luís Orlando Cardoso Botelho Maia


O processo de licenciamento nº 6/98 tratou-se do licenciamento de um armazém,
mas no qual foi instalada uma indústria e com uma área de implantação superior à
aprovada (cfr. fls 35 a 37 do relatório de fls 3165 e ss.).
Com base em informações e proposta dos serviços técnicos, por despacho de
23.11.2000 foi concedida ao requerente José Manuel Monteiro Neves (“Calzeus”) um
prazo de 60 dias para regularizar a situação (o oficio de notificação data do dia
04.12.2000).

491
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na data em que procederam à inspecção nada havia sido feito para regularizar
essa situação.
Não foi instaurado qualquer proceso de contra-ordenação apesar das obras terem
sido executadas em desconformidade com o projecto aprovado.
A inspecção propôs a instauração de um processo de contra-ordenação e que se
accionasse os mecanismos de regularização, sendo certo que entenderam que já havia
decorrido o prazo para que se pudesse instaurar a respectiva acção tutelar contra a
arguida Fátima Felgueiras.
Nos demais processos entenderam que ela não agiu com culpa pois estribou as
suas decisões em informações prestadas pelos serviços.

- Testemunha José Júlio da Silva Pereira


A propósito de donativos efectuados para o PS pela arguida Maria Augusta,
referiu que ela efectuou vários.
Confrontado com cópia de um cheque constante a fls 4126, no valor de
500.000$00 e emitido por ela a 16.04.99, e com o documento comprovativo do depósito
desse montante a 20.04.99 na conta oficial do PS (cfr. fls 301 do apenso D), de que o
depoente era um dos contitulares, referiu que foi o arguido Bragança quem lhe entregou
tal cheque e que foi a testemunha Armindo Brochado quem procedeu ao respectivo
depósito.
Acha que esse donativo terá sido concedido para fazer face a despesas correntes
do partido. Não se recorda se alguém lhe disse em concreto qual a finalidade de tal
donativo.
Em sede de reinquirição, porém, referiu presumir que esse donativo terá sido
solicitado pelo arguido Bragança à arguida Maria Augusta e que tinha agora a ideia que
se destinou a custear obras na sede local do PS.
Ouviu dizer que era normal a concessão de donativos após as eleições, pois nem
tudo era liquidado até às mesmas.
A arguida Maria Augusta fazia parte da comissão política e da direcção de
campanha (na campanha referente às eleições autárquicas de 1997).
Não sabe qual o grau de amizade que existia entre ela e a arguida Fátima
Felgueiras. Em todo o caso, ela não necessitaria de interposta pessoa para falar com a
arguida Fátima Felgueiras.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


A arguida Maria Augusta era, respectivamente, esposa e mãe do presidente do
conselho de administração e de um administrador da “Calzeus”.
Ela era membro da Assembleia Municipal de Felgueiras.
Fez referência aos cheques cujas cópias constam de fls 519 (cheque da
“Calzeus”, no valor de 200 cts, datado de 07.11.97 e assinados pelo marido e pelo filho
dela), 522 (de 70 cts, assinado por ela e datado de 12.12.97) e 541 (cheque da
“Calzeus”, no valor de 100 cts, emitido a 13.05.98, assinado pela arguida Maria
Augusta e por outra pessoa).
Existe ainda um cheque emitido pelo marido dela, no valor de 500 cts (datado de
16.04.99 – cfr. doc. de fls 4126) e depositado na conta oficial do PS de Felgueiras (cfr.
o talão de depósito de fls 301 do apenso 30-D, depósito esse efectuado pela testemunha
Armindo Brochado, funcionário do GAPP; cfr. ainda o extracto dessa conta, a fls 171
do apenso 30-D).

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves

492
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Maria Augusta tinha uma ligação à firma “Calzeus” (através de


familiares).
Ela fazia parte da comissão de apoio à candidatura da arguida Fátima Felgueiras
nas eleições autárquicas de 1997.
Não tem a certeza se ela fazia parte da assembleia municipal.
Os cheques referentes a donativos constam de fls 519 (cheque da “Calzeus”,
assinado por duas pessoas, emitido a 07.11.97), 522 (cheque emitido pela arguida Maria
Augusta a 12.12.97) e 541 (cheque da “Calzeus”, assinado por ela e por outra pessoa) e
fls 4126 (cheque emitido pelo marido dela, datado de 16.04.99, no valor de 500 cts, não
lhe parecendo que se relacione com a campanha eleitoral).
Este último cheque foi depositado, mas não sabe em que conta (porém,
confrontado com o talão de depósito de fls 301 do apenso 30-D, constatou-se que o
mesmo foi depositado na conta oficial do PS, depósito esse efectuado pela testemunha
Armindo Brochado, segundo emerge desse documento, tendo a ideia que esta
testemunha fazia parte do GAPP).
A “Calzeus” tinha pelo menos um processo de licenciamento na CMF.
Não se recorda de qualquer situação em que a arguida Fátima, nos processos de
licenciamento, tenha decidido contra o que constava dos pareceres técnicos.
*
A arguida Fátima Felgueiras reafirmou que todas as decisões que tomou no
âmbito dos processos de licenciamento estão de acordo com os pareceres técnicos.
Por vezes remetia os processos aos técnicos para repreciação quando existiam
informações contraditórias.
Os enganos do PDM devem ser corrigidos com revisões parcelares, mas à data
tinha-se um entendimento diferente, pois muniam-se de pareceres. Os interessados aliás
recorriam directamente a entidades externas para obter esses pareceres.
*
O arguido Horácio Costa salientou que, independentemente dos pareceres
técnicos nos processos de licenciamento, a última palavra cabia sempre a quem tinha o
pelouro das obras particulares, isto é, à arguida Fátima Felgueiras.
Existiam processos que ela devolvia aos técnicos para repreciação por sua livre
vontade e sem que nada o justificasse.
*
- Testemunha António Carlos Sepúlveda Machado e Moura
Conhece a arguida Maria Augusta desde finais dos anos 70 e inícios dos anos
80. Era professor de matemática num externato quando teve com ela os primeiros
contactos.
Entre 1986 e 2001 o depoente foi docente na Universidade Portucalense, onde
manteve com ela um contacto quase diário.
Em Janeiro de 2000 ela concluiu o doutoramento, sendo certo que o depoente
fez parte do juri.
O depoente fez também parte do juri para o concurso de professor coordenador
no ESCAP, tendo ela prestado provas.
Sabia que os familiares dela estavam ligados à indústria do calçado, que tinha
uma casa de Verão em Esposende e que vivia em Felgueiras.
Chegou a conhecer o filho e o marido dela.
A actividade dela era a docência e é autora de vários manuais de matemática.
Julga assim que não teria tempo para outras actividades.

493
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Presume que ela era amiga da arguida Fátima Felgueiras (segundo lhe transmitiu
a arguida Maria Augusta e porque viu fotos de jornal em que apareciam as duas,
designadamente numa inauguração).
Julga que ela teria acesso directo à arguida Fátima Felgueiras se necessitasse de
contactar com ela.

- Testemunha Fernando José Melheiro de Magalhães


O depoente referiu que conhece a arguida Maria Augusta há cerca de 15/18
anos.
O depoente é professor no ESCAP há 20 anos (hoje é o presidente do respectivo
Conselho Directivo).
Ela concorreu para professora coordenadora no ESCAP para a área de
matemática. Na altura o depoente era professor adjunto. Ela entrou então para o ESCAP
e foi sua coordenadora até ao momento em que ela assumiu a presidência da Escola
Politécnica de Felgueiras.
No início não manteve com ela uma boa relação. Após 5 anos o depoente foi
para Inglaterra e quando regressou ocupou o lugar de professor coordenador no ESCAP,
tendo ambos decidido que se tinham de dar bem na medida em que teriam de trabalhar
em conjunto.
Além de docente, ela desenvolveu trabalhos científicos e manuais escolares.
Ela tinha um subsídio de exclusividade. Ela entregava no ESCAP a sua
declaração de IRS e a respectiva nota de liquidação para se saber se ela tinha ou não
direito ao subsídio de exclusividade.
Não lhe via tempo para o exercício de outras actividades profissionais.
Sabe que o marido e o filho dela tinham uma actividade ligada ao calçado
(tinham uma fábrica).
Não sabe se ela era amiga da arguida Fátima Felgueiras, mas sabe que
mantinham boas relações.
Como membro do Conselho Executivo do ESCAP o depoente era muitas vezes
convidado para estar presente em cerimónias referentes à Escola Politécnica de
Felgueiras e notava que elas se davam bem. O mesmo sucedeu em sessões solenes que
tiveram lugar no Instituto Politécnico do Porto.
Certa vez a arguida Maria Augusta disse-lhe que teria um grande apoio da CMF
para desenvolver a Escola Politécnica de Felgueiras.
Acha por isso que se ela necessitasse de algo da arguida Fátima Felgueiras
dirigir-se-ia a esta directamente.
A arguida Maria Augusta é uma pessoa directa e com personalidade forte (como
o depoente também é assim, teve com ela um relacionamento difícil no início, conforme
já referiu).
Não a acha capaz de cometer uma ilegalidade.
Numa determinada altura ela integrou ou a Assembleia Municipal de Felgueiras
ou a CMF (não tem a certeza). Certo é que teve um cargo político em Felgueiras.
Não conhece a vida particular dela.

- Testemunha Maria Teresa Morais Taveira de Barros


Conhece pessoalmente a arguida Maria Augusta em 2002/2003, quando ela foi
directora da Escola Superior de Gestão e Tecnologia de Felgueiras.
Ela sempre desempenhou esse cargo de forma exemplar, quer em termos de
gestão quer em termos humanos.

494
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ela tem uma vida intensa de investigação na área da matemática, com livros
escolares nessa área do 7º ao 12º ano.
Ela é amiga da arguida Fátima Felgueiras. Esta era visita constante da Escola
Superior de Gestão e Tecnologia de Felgueiras e do Instituto Politécnico do Porto em
eventos.
A arguida Maria Augusta ocupava o seu tempo na vida académica.
Que saiba, ela não despendia muito tempo na vida política.
A depoente foi colega de gabinete do Dr. Jorge Neves (cunhado da arguida
Maria Augusta) e ele disse-lhe que elas eram amigas.
A arguida Maria Agusta dizia-lhe sempre “diga sem medo, o máximo que pode
acontecer é dizer não”. Ela é pessoa que “não tem papas na língua”.
Não a vê a recorrer a terceiros para pedir algo à arguida Fátima Felgueiras. Ela é
uma pessoa directa.
Não conhece qualquer ilegalidade que ela tenha cometido.
Não a imagina com tempo para uma actividade industrial.

Análise crítica
A arguida Maria Augusta era, respectivamente, esposa e mãe do presidente do
conselho de administração e de um administrador da “Calzeus” (pessoas que foram
arroladas como testemunhas mas que recusaram o respectivo depoimento, conforme
aliás direito que lhes assiste), fazendo aliás parte da administração dessa empresa, ao
que parece, sem funções executivas, centrando a sua actividade essencialmente na
docência e na autoria de manuais escolares (cfr. o depoimento das testemunhas que
arrolou e que depuseram acerca dessa matéria, bem como o seu currículum vitae
constante dos autos).
Tal empresa grangeou prestígio nacional e internacional no mercado do calçado
(cfr. os documentos referenciados a esse propósito pela arguida Maria Augusta na sua
contestação).
Ela era militante do PS antes da arguida Fátima se ter tornado militante desse
partido (cfr. documento nº 1, junto com o requerimento de abertura de instrução da
arguida Maria Augusta) e foi membro da Assembleia Municipal de Felgueiras desde
Janeiro de 1998 (na sequência de ter sido eleita nas eleições de Dezembro 1997) até ao
ano de 2000, tendo aliás desempenhado um papel activo na campanha eleitoral de 1997,
conforme aliás alegado no artº 11º da sua contestação (cfr. os depoimentos dos arguidos
Fátima Felgueiras e Horácio Costa).
Para além disso, colaborou com a revista “Rubeas”.
Ora, os donativos referenciados nos autos emergem dos cheques cujas cópias
constam de fls 519 (cheque da “Calzeus”, no valor de 200 cts, datado de 07.11.97 e
assinado pelo marido e pelo filho dela), 522 (de 70 cts, assinado por ela e datado de
12.12.97) e 541 (cheque da “Calzeus”, no valor de 100 cts, emitido a 13.05.98, assinado
pela arguida Maria Augusta e por outra pessoa) – cfr. ainda as declarações prestadas
pelo arguido Horácio Costa a esse propósito.
Não se demonstrou que tenham sido os arguidos Horácio e Joaquim a abordá-la
no sentido de serem concedidos esses donativos, pois isso não emergiu com clareza do
depoimento do arguido Horácio (o único que acerca dessa factualidade depôs).
Aliás, como o arguido Horácio Já não se recorda em que circunstâncias recebeu
o cheque de fls 519, ignoramos se ele foi entregue pela arguida Maria Augusta ou pelo
seu marido.
Já o cheque de fls 541 foi entregue, segundo o arguido Horácio, para pagar a
credores da revista “Rubeas” os respectivos créditos.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Existe ainda um cheque emitido pelo marido dela, no valor de 500 cts (datado de
16.04.99 – cfr. doc. de fls 4126) e depositado na conta oficial do PS de Felgueiras (cfr.
o talão de depósito de fls 301 do apenso 30-D, depósito esse efectuado pela testemunha
Armindo Brochado, funcionário do GAPP; cfr. ainda o extracto dessa conta, a fls 171
do apenso 30-D e as declarações prestadas pela testemunha José Júlio Pereira).
A propósito do alegado no artº 67º da contestação do arguido Bragança,
demonstrou-se que o donativo de 500 cts se destinou a auxiliar o pagamento da sede
local do PS (cfr. o depoimento da testemunha José Júlio da Silva Pereira), mas
ignoramos quem o terá solicitado pois esse facto não emergiu de qualquer meio de
prova produzido.
Da análise do processo de licenciamento nº 6/98 emerge a matéria que a
propósito do seu andamento é alegada na pronúncia 20 (cfr. ainda o relatório da IGAT de
fls 3165 e ss., mais concretamente, págs 35 a 37. desse relatório, e a resposta da CMF,
constante de fls. 3160), sendo certo que a arguida Fátima Felgueiras estribou sempre as
suas decisões em consonância com os pareceres técnicos que foram sendo proferidos.
Não se demonstrou que antes de se iniciar a construção do armazém, a arguida
Maria Augusta tenha contactado com a arguida Fátima Felgueiras para saber da sua
viabilidade legal e que esta e técnicos da CMF se tenham deslocado ao local da obra nos
termos referidos pela pronuncia, pois tal não foi referenciado por quem quer que seja na
audiência de julgamento.
Das declarações proferidas pela arguida Fátima Felgueiras retira-se que entre ela
e a arguida Maria Augusta existiriam relações cordiais, mas não propriamente de
amizade íntima.
Tudo quanto foi dito por variadas testemunhas no sentido de que a dita Maria
Augusta não tinha tempo para o exercício de actividades políticas e que não necessitaria
de interpostas pessoas para contactar com a arguida Fátima Felgueiras, mais não passou
do que meras suposições efectuadas na ânsia de defender certas e determindas posições,
visto que não revelaram a cerca dessa factualidade qualquer conhecimento de causa
directo ou sustentado em razão de ciência consistente (cfr. as declarações prestadas a
esse propósito pelas testemunhas José Júlio da Silva Pereira, António Carlos Sepúlveda
Machado e Moura, Fernando José Melheiro de Magalhães e Maria Tereza Morais
Taveira de Barros).
Na verdade, ainda que por norma o contacto com alguém que nos é próximo seja
directo, pode muito bem suceder que, por qualquer motivo, numa concreta
circunstância, não tenhamos a possibilidade de estabelecer esse contacto directo. Se
assim é em relação a pessoas que nos são muito próximas, por maioria de razão assim
será em relação a pessoas com as quais mantemos uma relação cordial mas mais
distante.
Por ausência absoluta de prova não se demonstrou a matéria alegada no artº 24º
da contestação apresentada pela arguida Maria Augusta.
Seja como, for, não se demonstrou – pois não emergiu de qualquer meio de
prova produzido na audiência de julgamento – que a arguida Maria Augusta tenha
contactado o arguido Bragança no sentido de transmitir à arguida Fátima o recado
referenciado na pronúncia.
Do mesmo modo também não se demonstrou que a arguida Fátima tenha
instruído o arguido Bragança conforme descrito na pronúncia, quer acerca da exigência
da entrega de um donativo de 500 cts quer acerca da correlação entre a entrega desse
donativo e o arquivamento do processo de contra-ordenação referido nos autos (com o
20
Apenas com uma precisão: é correcto o que está alegado no artº 16º da contestação apresentada
pela arguida Maria Augusta.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

nº 466/98, cujo auto de notícia foi lavrado a 02.09.98), já que tal factualidade não
emerge com segurança da prova produzida na audiência de julgamento.
É certo que esse processo de contra-ordenação viria a ser arquivado, mas, em
face da prova produzida, para além da mera suspeita, nenhuma relação segura pode ser
estabelecida entre esse facto e a entrega de qualquer um dos donativos referenciados,
designadamente o donativo de 500 cts.
É que, quanto ao processo de contra-ordenação nº 466/98, também analisado na
audiência de julgamento (donde emerge aliás a factualidade alegada no artº 21º da
contestação apresentada pela arguida Maria Augusta – cfr. ainda os documentos ali
referenciados), cabe referir que, a dado passo, a arguida Fátima despachou no sentido de
admitir o respectivo arquivamento se o processo de licenciamento estivesse legalizado à
data da conclusão do dito processo de contra-ordenação.
Esta posição é consentânea com a prática seguida na CMF de arquivamento com
admoestação em casos análogos, não constituindo assim qualquer tomada de posição
excepcional, pelo que, nessa medida, não deverá ser interpretada como um “favor” (cfr.
os outros processos de contra-ordenação, cujas cópias foram juntas aos autos já no
decurso da audiência de julgamento para ilustrar isso mesmo).
Ora, nesse processo de contra-ordenação, a 27.11.99, foi junta uma informação a
dar conta que o processo de licenciamento havia sido regularizado, pelo que a arguida
despachou no sentido de se arquivar, caso se confirmasse essa informação.
O Departamento Técnico confirmou entretanto que a obra estava legalizada,
faltando apenas a emissão do respectivo alvará de construção, o qual estaria já em
condições de ser emitido, o que viria a suceder a 15.12.99 (alvará nº 940/99, respeitante
às alterações ao projecto inicial).
É certo que, não obstante aquela manifestação da arguida Fátima, o processo
viria a ser pura e simplesmente arquivado sem qualquer outro despacho daquela arguida
que não aquele que exarou a 27.11.99.
Inexiste pois decisão final idêntica à que se observou relativamente a outros
processos de contra-ordenação em situação semelhante (no caso inexistiu a
admoestação).
Em face disso poderá ficar a suspeita de que esse arquivamento puro e simples
se possa relacionar com a entrega, em Abril de 1999, ao arguido Bragança, do donativo
de 500 cts para o PS (foi o arguido Bragança quem entregou esse cheque à testemunha
José Júlio da Silva Pereira, tendo sido depositado pela testemunha Brochado na conta
oficial do partido, conforme já referido).
Em todo o caso, na prática, o arquivamento puro e simples representa o mesmo
que um arquivamento com admoestação, tanto mais que nesta última hipótese nem
sequer são devidas custas.
Restará assim sempre a dúvida no que se refere à alegada correlação entre o
arquivamento de tal processo de contra-ordenação e a entrega do donativo de 500 cts em
Abril de 1999, dúvida essa que não poderá deixar de beneficiar os arguidos Fátima
Felgueiras, Maria Augusta e António José Leite Bragança da Cunha.
Quanto às funções exercidas por este último na CMF, afigura-se-nos correcto o
alegado no artº 29º da respectiva contestação (cfr. os documentos ali referenciados).

- A convicção do Tribunal a propósito do 3º capítulo da pronúncia

Pagamentos de bens e serviços efectuados através da conta do BES

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

a) acções da campanha eleitoral:

- Arguida Fátima Felgueiras


Começou por dizer que é falso que alguma vez tenha usado o dinheiro
depositado na conta do BES para custear despesas pessoais, mantendo a sua posição de
distanciamento já referida quer quanto à angariação de fundos para a campanha eleitoral
quer quanto ao pagamento das inerentes despesas, sustentando que não detinha qualquer
controle sobre a mencionada conta do BES. Por essa razão, referiu ignorar quais os
pagamentos efectuados.

- Arguido Horácio Costa


Reafirmou o que a propósito já referira.
Não pôs em causa o que a propósito consta da pronúncia, confirmando os
valores ali mencionados.
Explicou que a conta do BES ficou reduzida a saldo zero em 1999 quando se
procedeu ao levantamento de uma quantia que rondaria os setecentos e tal contos e que
se destinou ao pagamento de uma inciativa da Juventude Socialista de Felgueiras.
Além disso, quando foram retirados os móveis do seu gabinete na CMF, à sua
revelia, estavam numa gaveta cento e tal contos que desaparaceram e cujo destino
desconhece.

- Arguido Joaquim Freitas


Não tem noção do valor global dos pagamentos efectuados relativamente à
campanha eleitoral de 1997, sendo certo porém que da sua experiência retira que
normalmente em campanhas do género gasta-se à volta dos 60 a 70.000 cts no mínimo.

- Testemunha Carlos Alberto Baptista Campos Araújo


Referiu ser gerente comercial da firma “Araújo e Araújo, Ldª”, empresa que se
dedica à comercialização e instalação de ar condicionado e ventilação.
Confrontado com o orçamento de fls 173 para fornecimento e instalação de um
equipamento de ar condicionado, referiu não saber se foi o depoente quem o fez.
A instalação desse equipamento foi feita numa sala em Felgueiras, a qual,
segundo lhe disse o arguido Horácio, pertencia ao PS (não se recorda se nesse espaço
existia ou não algum símbolo do PS). Visitou esse espaço antes de apresentar o
orçamento.
Não sabe quem fez o contacto inicial e que conduziu primeiro à apresentação do
orçamento de fls 173 e depois à instalação do equipamento. Recorda-se contudo que o
primeiro contacto foi telefónico, o qual não foi recepcionado pelo depoente mas por
outro funcionário da sua empresa, o qual fez uma informação escrita acerca do contacto
(solicitando um orçamento), na sequência da qual se dirigiu a Felgueiras e foi feito o
dito orçamento.
Constata-se que esse orçamento foi dirigido ao arguido Bragança, mas assegurou
que nunca falou com ele (especula que provavelmente terá sido ele a fazer o contacto
telefónico inicial visto que os orçamentos são dirigidos a quem os solicita), pois tudo foi
tratado com o arguido Horácio (foi aliás ele quem o recebeu quando se deslocou a
Felgueiras para visitar a sala onde o equipamento iria ser instalado; recorda-se de resto
que quando foi à CMF para falar com o arguido Bragança – a pessoa que supostamente
terá feito a solicitação do orçamento – foi antes recebido pelo arguido Horácio porque

498
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

foi encaminhado para a sua pessoa. Referiu ignorar quem foi a pessoa que o
encaminhou para um gabinete onde se encontrava o arguido Horácio).
Confrontado com o talão de depósito de fls 473, confirmou que se trata de um
depósito na conta da sua empresa de um cheque do BESCL no valor de 776.000$00,
admitindo que tal cheque se trate do pagamento do serviço efectuado em face do
respectivo valor.
À pergunta efectuada no sentido de se saber a quem foi facturado o serviço
respondeu que provavelmente a uma empresa, segundo instruções que receberam nesse
sentido.
Confrontado com a factura de fls 474, constatou-se que o serviço foi facturado à
“Marfel – Empresa de Confecções” (empresa que aliás também é cliente da “Araújo e
Araújo, Ldª”). Reafirmou que o serviço foi facturado a essa empresa segundo indicações
recebidas nesse sentido. Ignora quem forneceu essa indicação, admitindo que possa ter
provindo do arguido Horácio. Assegurou que nunca contactou com a arguida Fátima
Felgueiras.
*
A propósito das declarações da testemunha Carlos Araújo, referiu o arguido
Horácio Costa que a decisão de aquisição do ar condicionado partiu da arguida Fátima
Felgueiras por alturas da realização de uma reunião na sede do PS em que ela se
queixou do calor que então se fazia sentir nesse espaço.
Instruiu então o arguido Bragança para tratar desse assunto e para ver com o
depoente a questão do respectivo pagamento.
Certo dia, depois do ar condicionado já estar instalado, o arguido Bragança
encaminhou ao gabinete do depoente, na CMF, a testemunha Carlos Araújo, tendo-lhe
sido então apresentado como o senhor que instalara o ar condicionado. Nessa altura
pagou-lhe, entregando-lhe um cheque sacado sobre a conta do BES. Fez o pagamento
com base no orçamento que na altura lhe foi presente. Recorda-se que nessa ocasião
pediu um desconto e o Sr. Araújo concedeu um desconto de 3%.
Mais tarde, já na fase de inquérito deste processo, a PJ confrontou-o com o teor
da factura respectiva, com a qual ficou espantado, pois ignorava o respectivo teor, tanto
mais que apresentava um valor superior ao que efectivamente foi pago.
Passado uns dias falou desse assunto ao arguido Joaquim Freitas e procurou o
arguido Bragança para esclarecer esse assunto, o qual entretanto lhe telefonou no
sentido de saber o que a PJ investigava acerca dessa factura, referindo-lhe que tinha
problemas com ela e que teria de explicar à PJ o respectivo conteúdo.
Assegurou o depoente que não pediu qualquer factura à firma “Araújo e Araújo,
Ldª”.
No orçamento de fls 474, em baixo, foi o depoente quem apôs os dizeres
manuscritos que ali constam e foi esse o documento que entregou à PJ.
Trata-se de um orçamento remetido por fax ao arguido Bragança.
Confirmou que o talão de depósito de fls 473 se reporta ao depósito do cheque
que entregou à testemunha Araújo.
Nega que tenha mostrado à dita testemunha a sala onde o ar condicionado foi
instalado (só falou com ele quando lhe pagou). Aliás, a chave da sede do PS estava na
mão do arguido Bragança, secretário-coordenador do PS de Felgueiras. Era sempre ele
quem abria a sede ou entregava a chave a uma pessoa de confiança para o fazer. Nunca
o depoente teve nas suas mãos essa chave.
Ouviu comentar que a “Marfel” também pagou o ar condicionado em causa.
*
- Testemunha Horácio António Magalhães Lopes dos Reis

499
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É vereador da CMF e sócio-gerente de várias empresas, entre as quais a


“Marfel” desde 1992 (o seu pai foi o fundador dessa empresa em 1939). Nas eleições de
1993 foi eleito pelas listas do PS para a Assembleia Municipal.
Confrontado com a factura de fls 474, referiu que já tinha sido confrontado com
esse documento pela PJ.
Explicou que lhe foi solicitado o pagamento do ar condicionado pela “Marfel”
ou pela testemunha Júlio Pereira ou pelo arguido Bragança.
A firma “Araújo e Araújo, Ldª” forneceu e instalou o ar condicionado num
escritório situado num edifício localizado por trás da CMF, onde funcionava a sede de
campanha do PS local.
Não se recorda de que forma a “Marfel” efectuou o pagamento desse serviço (se
por cheque se por dinheiro existente em caixa).

- Testemunha Jorge Manuel Branquinho Pimentão


Referiu ser técnico de telecomunicações, tendo sido funcionário da firma
“Audiomédia” durante cerca de 10 anos (até há cerca de 2 anos, altura em que fechou
portas), sendo certo que por alturas de 2001 era o respectivo responsável técnico.
Essa empresa começou por se dedicar às chamadas de valor acrescentado.
Recorda-se de ter-se realizado uma campanha com recurso a vozes de vários
responsáveis locais do PS de Felgueiras, efectuando-se chamadas com essas gravações
de voz. Uma dessas vozes era da arguida Fátima Felgueiras.
Referiu não se recordar que campanha seria, não se recordando mesmo se se
tratava de uma campanha eleitoral ou se de uma campanha de Natal.
Não se recorda quem encomendou esse serviço e quem o pagou.
Confrontado com os documentos de fls 182 a 185, do 1º volume, esclareceu que
o documento de fls 183 se trata da factura emitida pela “Audiomédia” para o PS
(serviço realizado nos dias 11 e 12 de Dezembro de 1997 – chamada de saída com voz
gravada; “outbound”), no montante de 219.098$00 + IVA.
Referiu não conhecer a testemunha Manuel Seabra.
A “Audiomédia” tinha sede em Lisboa. A empresa-mãe era a “Compta” e
também tinha instalações no Porto.
Os documentos de fls 182 e 184 reportam-se a cartões de visita da testemunha
Manuel Seabra com mensagens para a arguida Fátima Felgueiras e alusivas ao
pagamento à “Audiomédia”, documentos que acompanharam a remessa da factura.
Com o segundo cartão foi remetida nova factura, segundo esse documento,
sendo certo que a fls 185 consta uma nova factura diferente mas referente ao mesmo
serviço.
Confrontado com esses documentos referiu não saber por que motivo a
testemunha Manuel Seabra interviu junto da arguida Fátima Felgueiras no que se refere
ao pagamento dos serviços prestados pela “Audiomédia”.

- Testemunha José Júlio da Silva Pereira


Não se recorda se a actuação dos arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas
prolongou-se para além da campanha eleitoral de 1997, designadamente no que se
refere a outras campanhas e finalidades.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se a testemunha efectuou
pagamentos usando dinheiro não depositado na conta oficial do PS, admitiu que sim
(embora não se recorde de alguma situação em concreto), mas em todo o caso tratar-se-
iam de pequenas despesas.

500
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi então confrontado com o documento de fls 206 do apenso 4, referente a


despesas de correio (guia de pagamento dos CTT de 30.09.98 e no valor de 71.050$00)
e que, segundo manuscrito a vermelho aposto nesse documento, reportar-se-ia à
campanha do referendo da regionalização. A testemunha confirmou ter efectuado o
pagamento dessa despesa, não se recordando porém se o fez em numerário se através de
fundos depositados na conta do PS. Confirmou ter preenchido o documento, não sendo
da sua lavra o manuscrito a vermelho, não reconhecendo a respectiva letra (mas que lhe
parece ser do arguido Horácio Costa).
Se de facto foi o arguido Horácio a escrever aqueles dizeres a vermelho é porque
concerteza terá sido ele a dar-lhe o dinheiro com que pagou a dita despesa, mas não se
recorda desse facto. Não encontra qualquer outra explicação para o facto do documento
em causa ter sido entregue àquele arguido.
O saldo da conta do partido era pequeno, pelo que deverá ter recorrido ao
Horácio Costa para poder pagar essa despesa mais elevada, segundo deduz (embora
continue a sustentar não se recordar).
Apesar de nesse documento estar anotado o número do cheque que teria servido
de meio de pagamento, assegurou não se recordar de que forma pagou o montante em
causa, se em numerário se através de cheque.
O PS de Felgueiras dispõe de uma sede na qual entretanto foi instalado um
sistema de ar condicionado (talvez em 1999 ou 2000).
Ouviu dizer que tal sistema de ar condicionado foi oferecido pela testemunha
Horácio Reis.
Ignora quem fez a encomenda e qual a firma que procedeu à respectiva
instalação.
Foi então confrontado com o documento de fls 173 do 1º volume (orçamento
respeitante ao ar condicionado, datado de 30.07.97, dirigido ao arguido Bragança).
Explicou que o arguido Bragança, à data, era adjunto da arguida Fátima Felgueiras na
CMF (no GAPP trabalhavam quatro pessoas: o arguido Bragança, como adjunto da
presidente; o depoente, como secretário; e mais dois funcionários administrativos) e
membro da comissão política do PS local, além de secretário-coordenador do partido.
Enquanto secretário-coordenador era ele quem tratava de todos os assuntos
relacionados com a sede do PS.
Não se recorda porém dele lhe ter mencionado qualquer assunto relacionado
com o ar condicionado.
Não se recorda ainda da arguida Fátima se ter queixado do calor que se fazia
sentir na sede do PS.
Não se recorda também se o quadro eléctrico da sede do PS tinha potência
suficiente para esse sistema de ar condicionado, sendo certo que esses assuntos eram
tratados pelo arguido Bragança. A esse propósito foi confrontado com o documento de
fls 21 do apenso 4 (factura/recibo emitido ao PS pela “EN- Electricidade do Norte, SA”,
no valor de 62.154$00, relativos a encargos com ramal no edifício do Campo da Feira,
nº 9001, em Margaride, e cuja data de pagamento é de 31.07.97), revelando acerca do
mesmo desconhecimento. O mesmo documento tem uma anotação a vermelho alusivo
ao cheque que serviu de meio de pagamento, cheque esse da conta do BES conforme é
perceptível pelo respectivo extracto, constante do apenso 1, designadamente fls 10.
A testemunha foi também confrontada com uma factura/recibo emitida ao PS
pela mesma entidade e por motivo idêntico mas referente a outra morada (Edifício
Campo da Feira, número zero, em Margaride), datado de 10.10.97 e no valor de
62.154$00, onde consta uma anotação aludindo ao cheque do BES que serviu para

501
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pagar essa despesa, conforme se pode confirmar a fls 15 do apenso 1 (extracto da conta
do BES).
Foi ainda confrontado com o cheque de fls 56 do apenso 1, sacado sobre a conta
do BES, datado de 08.08.97, no montante de 776.000$00, emitido a favor da firma
“Araújo e Araújo, Ldª”, firma que remeteu o orçamento de fls 173 do 1º volume (neste
documento está aposto o número do cheque que serviu como meio de pagamento,
coincidindo com o nº do cheque de fls 56 do apenso 1).
Ignora porque razão foram os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas a pagar
a aquisição e instalação do dito sistema de ar condicionado na sede do PS local, facto
que aliás referiu desconhecer.
Foi confrontado com o documento de fls 187 do 1º volume (fotocópia do cheque
de 150.000$00 datado de 23.11.98 e sacado sobre a referida conta do BES, documento
esse que tem aposto uns dizeres manuscritos em baixo alusivos a uma despesa do PS).
Referiu que por norma as despesas de água e luz da sede do PS eram pagas
através da conta oficial do partido, mas pontualmente recorriam “a este ou aquele” para
pagar as despesas quando a conta não dispunha de saldo.
Nesse contexto, admite que possam ter pedido aos arguidos Horácio e Joaquim
Freitas o pagamento de despesas do PS, como pediram a outras pessoas.
Não se recorda porém porque motivo recorreram a eles, especulando que seria
talvez pelo facto de saberem que eles geriam a conta da campanha eleitoral de 1997 e
que ainda disporia de saldo.
O arguido Horácio era assessor na CMF e o arguido Joaquim Freitas era
industrial de calçado e membro da Assembleia Municipal, sendo certo que tinham
aquela conta conjunta por pertencerem ao pelouro das finanças para a campanha de
1997. Assim sendo, admite que já conheceria da existência dessa conta do BES antes de
1999/2000, mas não a associava então à conta bancária da campanha (haveria outro
motivo para terem uma conta conjunta? Não se percebe pois por que motivo tal
associação não foi logo feita pela testemunha, sabendo ela que era habitual a abertura de
uma conta para a campanha e que aqueles arguidos faziam parte do pelouro das
finanças, tanto assim que recorreram a eles, segundo a testemunha, talvez porque
soubessem que ainda haveria saldo da conta da campanha).
Confrontado com cópia da guia dos CTT de fls 219 do apenso 4, de 08.06.99 e
no valor de 94.690$00 (em que figura como cliente o PS), cópia essa em que tem uns
dizeres manuscritos alusivos à despesa em causa (reportadas às eleições europeias),
confirmou que esse documento foi por si assinado (cfr. ainda cópia do cheque que
serviu para pagar essa despesa, constante de fls 205 do apenso 1, datado de 08.06.99 e
sacado sobre a dita conta do BES).
Quanto ao facto de mais uma vez terem recorrido aos arguidos Horácio Costa e
Joaquim Freitas, deu a mesma explicação já acima referida.
Nas iniciativas da Juventude Socialista era essa estrutura do PS que teria de
suportar os respectivos custos, visto que dispunham de autonomia e com estatutos
próprios. Se não dispusessem de verba poderiam recorrer ao PS ou a pessoas.
Normalmente eram conseguidos patrocínios.
As despesas de campanha normalmente são ainda liquidadas dois ou três anos
depois de cessada a campanha.
Admite que a propósito das despesas do acampamento possam ter recorrido ao
arguido Horácio na medida em que ele continuava a lidar com o dinheiro angariado para
a campanha eleitoral de 1997.
Confrontado com o documento de fls 35 do apenso 4 (fotocópia de guia dos
CTT, de 23.09.97, no valor de 95.940$00), confirmou ter preenchido e assinado tal

502
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

guia. Tal fotocópia tem uma anotação manuscrita alusiva ao respectivo pagamento
através de um cheque ali identificado pelo número, o qual não é mais que o cheque de
fls 73 do apenso 1, de 23.07.97, naquele montante de 95.940$00, sacado sobre a conta
do BES.
Explicou que a pré-campanha inicia-se cerca de 3 a 4 meses antes das eleições e
a campanha cerca de 15 dias antes.
Quando o arguido Horácio Costa lhe entregava cheques não sabia se eram
sacados sobre a conta da campanha ou não. Ia ter com ele porque ele esteve ligado ao
pelouro das finanças para a campanha eleitoral de 1997 e poderia ainda ter fundos que
pudesse disponibilizar para custear as despesas em causa.
Acha que ele não tinha autonomia para pagar as despesas do PS. Era o
secretariado que tinha de pedir essas contribuições.
As despesas referidas prendiam-se com despesas de índole administrativa do PS,
presumindo por isso que delas a arguida Fátima Felgueiras não tivesse conhecimento.
Confrontado com cópia da Guia dos CTT de fls 8 do apenso 4 (no valor de
98.980$00 e datada de 30.06.97), confirmou ter sido por si assinada, sendo certo que o
recibo foi passado ao PS.
Confrontado com o documento de fls 2 do apenso 4, constatou-se tratar-se de
uma nota que se reporta a despesas de fax e correio com menção do cheque que serviu
como meio de pagamento.
De fls 3 até fls 7 do apenso 4 constam documentos alusivos a despesas com
correios.
Admite que se tratam de despesas de pré-campanha e que é possível que tenha
sido o arguido Horácio Costa a pagá-las.
Confrontado com a fotocópia da guia dos CTT de fls 18 do apenso 4 (de
22.07.97 e no valor de 48.461$00), afirmou ter sido preenchida e assinada por si. Tem
essa fotocópia um apontamento manuscrito a vermelho identificando o cheque que
serviu de meio de pagamento.
Confrontado com a cópia do documento de fls 209 do apenso 1 (cópia de um
cheque de 12.036$00, de 30.06.99), verificou-se que no verso consta a expressão
manuscrita “avença nº 4”, referindo não reconhecer a respectiva letra. Tal documento
deve reportar-se a despesas de correio.
Confrontado com cópia do documento de fls 208 do apenso 1 (cópia de um
cheque de 29.06.99, no valor de 11.524$00), verificou-se que no verso tem manuscrita a
expressão “avença nº 3”.
Confrontado com o documento de fls 222 do apenso 4 (cópia de guia dos CTT,
de 28.06.99, no valor de 11.524$00, referente a uma despesa da JS), referiu que esse
documento mostra-se assinado pela testemunha David Queirós.
Confrontado com o documento de fls 223 do apenso 4 (cópia de guia dos CTT,
de 03.06.99 referente a avença, documento também assinado pela testemunha David
Queirós), constatou-se que tem manuscrita uma alusão ao acampamento de Vila Fria,
organizado pela JS.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se em Junho de 1997 já sabia que o
arguido Horácio Costa fazia parte do pelouro das finanças (os documentos demonstram
que nessa altura o depoente já recorria a ele para suportar despesas), referiu não ter tido
essa percepção nessa altura. Explicou que pelo facto de ter preenchido e/ou assinado as
guias dos CTT não significa que tenha recebido os cheques em causa e que tinha
procedido ao pagamento respectivo, pois quem fazia a entrega do correio nos CTT é que
procedia ao pagamento e não era normalmente o depoente que fazia essa entrega.

503
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou ainda que, de modo a ser emitido o respectivo recibo, era necessário
fornecer o respectivo número de contribuinte. Como a comissão de angariação de
fundos não tinha número de contribuinte o PS fornecia o seu.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Através do quadro de fls 2786 e ss. demonstra-se qual o destino das verbas
depositadas na conta do BES.
No apenso 4, fls 22, consta cópia de um manuscrito que faz referência ao
pagamento de um espectáculo da artista Cândida Branca Flôr em 29.07.97.
O documento de fls 74 do apenso 4 reporta-se a uma venda a dinheiro de tecido
O documento de fls 71 do apenso 4 reporta-se a um contrato para um
espectáculo de um grupo de bombos (11.10.97).
A fls 86 do apenso 4 consta um documento referente a um contrato para um
espectáculo do artista “Quinzinho de Portugal”.
Ainda no mesmo apenso consta uma cópia de um contrato para actuação do
grupo “Santos e Pecadores”.
A fls 120 do apenso 1 consta uma cópia de um cheque de 600 cts à ordem do
arguido Júlio Faria, datado de 02.12.97.
A fls 137 do apenso 1 consta uma cópia de um cheque emitido a 09.12.97, ao
portador, no montante de 800 cts, documento que se relaciona com o “post-it” de fls 171
do 1º volume, da autoria do arguido Júlio Faria. Aliás, o arguido Horácio Costa
entregou à PJ cópia desse cheque, constante de fls 172 do 1º volume.
A fls 73 e 74 do 1º volume constam dois talões de depósito na conta do arguido
Júlio Faria , respectivamente, de um cheque da conta do BES de 170 cts e de um cheque
da mesma conta de 57.090$00 (cfr. cópia desse cheque a fls 75, de 12.02.98).
A fls 76 consta uma cópia de um talão de depósito na conta do arguido Júlio
Faria da quantia de 1.850 cts em numerário (respeitante à compra de bilhetes de um
sorteio promovido pelo FCF).
Foram também pagas despesas do “Sovela”, jornal que pertencia à ADEC,
associação criada por elementos ligados ao PS local, entre os quais os arguidos Júlio
Faria e Fátima Felgueiras.
A fls 357 consta uma listagem de pagamentos efectuados pelo “Sovela”, grande
parte desses pagamentos efectuados com fundos da conta do BES, conforme
documentos de suporte entregues pelo arguido Horácio Costa e que constam dos autos a
seguir a essa lista.
Foram ainda feitos pagamentos à “Proeme”/”Portcom” com fundos provenientes
da conta do BES (cfr. o recibo de 2.700 cts emitido pela testemunha Renato Guerra,
constante de fls 359).
1.000 cts saíram da conta do BES para pagar parte do preço da aquisição pela
arguida Fátima da viatura “Audi A4”.
O volume global dos pagamentos ascendeu a 52.577.832$00, tendo o saldo da
conta do BES ficado a zero (cfr. quadro de fls 2786 a 2796).
No segundo quadro, constante de fls 2801, extrai-se que as receitas rondaram os
11.100 cts e as despesas 14.900 cts, ignorando qual a proveniência do dinheiro gasto
para além dessa verba.
Se retirar às despesas o montante de 4.700 cts (empregue na aquisição da viatura
“Audi A4”) e somar-lhe o dinheiro recebido da conta do BES (pouco mais de 700 cts
foram levantados a final, quando o saldo ficou a zero), o saldo dá zero.
Esclareceu que parte do conteúdo deste quadro foi elaborado tendo em atenção
depoimentos.

504
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Manuel José de Faria Seabra Monteiro


Em 1997 o depoente era o presidente da comissão permanente da comissão
política distrital do Porto do PS e por esse facto relacionava-se com as 17 concelhias do
PS da zona do Porto.
Havia alguma coordenação entre a concelhia distrital e as concelhias nas
campanhas na medida em que se realizava um comício distrital no âmbito de cada
campanha eleitoral em cada concelho. Para além disso existia pouca interferência da
concelhia distrital com as diversas concelhias.
A “Audiomédia” (inicialmente referiu “Actualmédia”, só tendo corrigido a
designação dessa empresa após ter sido confrontado com as facturas) foi contratada para
fazer telefonemas de campanha em várias concelhias do distrito do Porto (como por
exemplo em Matosinhos, V.N. de Gaia e Felgueiras). Isto é, os candidatos gravavam
uma mensagem de 15 a 20 segundos e depois eram feitas as respectivas chamadas.
Essa empresa tinha sido apresentada ao depoente para fazer esse serviço e a sua
função consistiu em auscultar os potenciais interessados, assegurando que não tinha
com essa firma qualquer relação.
Cada uma das concelhias é que ficou de pagar os serviços dessa empresa, sendo
certo que não existiu propriamente uma reunião onde tal tenha sido definido até porque
a empresa contactava directamente com as concelhias.
Como entretanto em Felgueiras esse serviço ainda não havia sido pago, foi
contactado no sentido de interceder pelo respectivo pagamento, o que fez.
Nesse sentido, terá telefonado à candidata (Fátima Felgueiras) ou ter-lhe-á
escrito uma carta a pedir que esse serviço fosse pago.
Esse assunto não era matéria para ser tratada na comissão distrital do PS.
Não tem ideia de ter recebido o documento alusivo ao débito em causa.
Confrontado com os cartões de fls 182 e 184 confirmou serem seus.
Confrontado ainda com as faturas de fls 183 e 185 admitiu que as mesmas lhe
terão sido entregues, mas que não se recorda desse facto.
Uma vez que terá enviado dois cartões seus, deverá ter sido contactado duas
vezes pela “Audiomédia” no sentido de interceder pelo pagamento desse serviço (terá
pois enviado em momentos distintos as duas facturas em causa, alusivas ao mesmo
serviço).
Não sabe se à época os candidatos do PS às Câmaras tinham ou não influência
no que toca a pagamentos e a financiamentos, pois só conhece a realidade de
Matosinhos, onde aliás o PS está organizado de forma diferente.
Em Matosinhos o candidato preocupa-se mais com os aspectos políticos da
campanha.
Cerca de 5 ou 6 meses antes das eleições o depoente reuniu-se com as concelhias
no sentido de saber o ponto da situação em relação às candidaturas.
Em cima do acto eleitoral o combate político era feito mais a nível local.
Não tem ideia se a arguida Fátima encaminhava para alguém o problema no que
respeita ao pagamento do serviço efectuado pela “Audiomédia”. Não lhe parece que ela
própria se preocupasse com esse problema.
Confrontado com a factura de fls 185 constatou-se que a arguida Fátima apôs
um despacho datado de 01.04.98 e dirigido ao arguido Horácio Costa (“Veja se
consegue liquidar se não passarei cheque pessoal”).
O depoente referiu então ter a ideia de ter falado ao telefone com o arguido
Horácio Costa.

505
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O candidato é o rosto mais visível da campanha. Assim, naturalmente que se


sentiria responsável pelo pagamento se não fosse possível obter o pagamento doutro
modo.
No caso de Felgueiras desconhece como foi organizada a candidatura da arguida
Fátima Felgueiras no que tange ao aspecto financeiro.
Os principais candidatos têm menos preocupações com problemas de secretaria,
cuja resolução delegam em pessoas da sua confiança (o depoente não delegaria assuntos
de financiamentos em pessoas de quem não tivesse confiança). Em suma, estão mais
preocupados com o combate político (com a estratégia política).

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Os valores depositados na conta do BES e na gaveta serviram para pagar
despesas de campanha, para o pagamento de dívidas do “Sovela”, para a aquisição do
“Audi A4” referido nos autos, para a remuneração a jovens que trabalharam na
campanha eleitoral de 1997, para pagar bilhetes de um sorteio de Natal promovido pelo
FCF, etc.
A investigação, a esse propósito, elaborou uns quadros alusivos aos pagamentos
efectuados através da conta (cfr. fls 2786 a 2796 – mais de 52.000 cts) e da caixa (cfr.
fls 2798 a 2801 – quase 15.000 cts).
A fls 171 consta um manuscrito do arguido Júlio Faria alusivo a um cheque a
entregar à testemunha Orlando Sousa, no valor de 800 cts para pagamento
designadamente de pendões.
A fls 172 consta cópia desse cheque, ao portador, no valor de 800 cts.
Pelo menos parte das rendas da sede de candidatura foram pagas através da
conta do BES (cfr. cópia dos cheques de 250 cts referentes ao pagamento das rendas,
constantes de fls 90, 101 e 146 do apenso 1).
Através dessa conta foram também liquidadas despesas relacionadas com
despesas de espectáculos musicais (cfr. cópia do cheque de fls 213 do apenso 1, no
valor de 245 cts, emitido a favor da firma “Edimúsica”, empresa que organizava
espectáculos; cfr. cópia do cheque de fls 129 do apenso 1, no valor de 5.025.000$00; e
cfr. cópia do contrato de fls 102 do apenso 4, referente ao pagamento e ao contrato para
actuação num concerto dos “Santos & Pecadores”; cfr. o cheque de fls 138 do apenso 1,
referente a um cheque de 735.250$00, e documento de fls 104 do apenso 4).
Foi com dinheiro da conta do BES que se procedeu ao pagamento da estadia de
três pessoas (cfr. cópia do cheque de fls 30 do apenso 21, no montante de 28.500$00),
tendo o respectivo hotel remetido uma missiva ao PS com o qual lhe enviou as três
facturas (cfr. documentos de fls 177 a 181 do 1º volume).
Conforme já referiu, foram pagas também despesas do “Sovela” (cfr. a fls 357 a
relação dos pagamentos efectuados a esse propósito, sendo certo que os documentos que
se seguem dizem respeito às despesas em causa e ao respectivo pagamento).
Foram efectuados pagamentos com dinheiro da conta do BES à “Portcom” e à
“Proeme”, de que a testemunha Renato Guerra era sócio, sendo certo que essas
empresas prestaram serviços para o “Sovela” e para a CMF (cfr. o cheque de fls 71 do
apenso 1, emitido a favor da “Proeme”, no montante de 2.000 cts; cfr. cópia do cheque
de fls 93 do apenso 1, de 750 cts, emitido ao portador, e que terá sido entregue à
testemunha Renato Guerra; cfr. cheque de fls 110 do apenso 1, no montante de 2.000
cts; cfr. cheque de fls 179 do apenso 1, no valor de 200 cts, emitido a favor da
testemunha Renato Guerra; cfr. cheque de fls 185 do apenso 1, no valor de 200 cts e
emitido à ordem da testemunha Renato Guerra; cfr. cheque de fls 198 do apenso 1, no
valor de 200 cts e emitido à testemunha Renato Guerra).

506
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A dita conta do BES estava titulada pelos arguidos Horácio Costa e Joaquim
Freitas.
Na contestação à acção de prestação de contas os arguidos Horácio e Joaquim de
Freitas relataram quem controlava essa conta (os arguidos Júlio Faria e Fátima
Felgueiras).
A testemunha Carlos Alves expressou não acreditar que esses arguidos (Fátima e
Júlio) se mantivessem à margem das movimentações dessa conta.
A fls 2183 do 10º volume consta aliás um cartão da “Anglomex”, com o qual se
procedeu à entrega de um cheque de donativo, cartão esse dirigido à arguida Fátima.
A fls 185 do 1º volume consta cópia de uma factura emitida pela “Audiomédia”
ao PS, no valor de 256.345$00 (serviço de campanha através de mensagens pré-
gravadas transmitidas por telefone). Nesse documento a arguida Fátima apôs um
despacho de 01.04.98 (“Dr. Horácio, veja se consegue liquidar se não passarei cheque
pessoal”).
Nessa data o saldo da conta do BES era de 2.855.570$00 (cfr. o respectivo
extracto no apenso 1).
A fls 184 do 1º volume consta um cartão a enviar novamente uma factura da
“Audiomédia” à arguida Fátima pela testemunha Manuel Seabra.
Já antes tinha ido enviada outra factura reportada ao mesmo serviço (cfr. o
cartão de fls 182).
A fls 186 consta o respectivo cheque da conta do BES de fls 256.345$00.
*
O arguido Horácio Costa referiu que quer ele quer o arguido Joaquim Freitas
actuavam em função das ordens que recebiam.
Enquanto não lhe chegassem ordens para proceder a determinado pagamento,
não o fazia ainda que a conta dispusesse de saldo suficiente. Directa ou indirectamente
as ordens provinham da arguida Fátima Felgueiras.
Durante a campanha as ordens que recebia eram verbais, daí a inexistência de
despachos escritos a ordenar pagamentos por parte da arguida Fátima, com excepção do
despacho aposto por ela no documento de fls 185 do 1º volume.
O depoente era um “faz tudo” e agia sob as ordens dela.
Em face da relação de confiança então existente entre ambos, ela sabia que não
necessitava de dar ordens escritas no sentido do pagamento de alguma despesa.
A propósito dos depósitos na conta pessoal do arguido Júlio Faria, este deu uma
entrevista ao “Comércio do Porto”, onde referiu que esses depósitos foram feitos por
ordem da Srª presidente da comissão política concelhia do PS de Felgueiras (a arguida
Fátima Felgueiras).
Todos os cheques que chegaram à mão do depoente foram depositados na conta
do BES.
O dinheiro da gaveta era encaminhado segundo ordens que recebia.
A arguida Fátima nunca se vinculou a alguma orientação da Distrital do PS
Porto.
O pagamento à “Audiomédia” ocorreu a 09.04.98.
No entanto existe uma primeira factura de 22.12.97 no mesmo valor e não foi
paga porque não tinha ordens para proceder ao respectivo pagamento.
A segunda factura, de 30.01.98, não foi paga de imediato (só foi paga em Abril
de 1998 por ordem escrita da arguida Fátima, aposta nessa factura – cfr. fls 185 do 1º
volume) porque não teve ordens nesse sentido. Nessas datas aliás a conta tinha um saldo
suficiente para a liquidação da factura em causa (em 22.12.97 a conta dispunha de um
saldo de 2.445.481$00 e em 30.01.98 dispunha de um saldo de 1.540.081$00).

507
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

b) aquisição do veículo “Audi A4”, de matrícula 96-29-LN, pela arguida


Fátima Felgueiras:

- Arguida Fátima Felgueiras


Referiu que a aquisição daquela viatura nada tem a ver com o dinheiro
depositado na dita conta do BES. Nega aliás ter recebido qualquer pasta com 5.250 cts
conforme referido na pronúncia, sendo certo que se tal facto fosse verdadeiro jamais
entregaria tal pasta a quem quer que seja.
Na sequência do divórcio e da partilha dos bens comuns, ficou estabelecido com
o seu ex-marido que iria adquirir uma viatura automóvel nova como forma de
compensação, já que a sua viatura “Citroën BX” era já velha.
Contou então com o auxílio do arguido Joaquim Freitas, o qual serviu de ponte
entre a depoente e o seu ex-marido, sendo certo que durante a campanha eleitoral de 97
o dito Joaquim Freitas disponibilizou a sua viatura particular para as deslocações da
depoente nas suas acções de campanha.
Na verdade, o dito Joaquim Freitas era amigo do casal e entendia ser justa a
aquisição de uma viatura nova pela arguida como condição para a repartição equitativa
dos bens comuns do casal, exercendo a sua intermediação nesse sentido durante meses
(já no decurso de 1997 mas muito antes das eleições autárquicas de Dezembro desse
ano). Ele teve aliás participação activa na escolha da viatura, tendo a sua opinião sido
preterida pela preferência manifestada pela sua filha Sandra (o Joaquim aconselhou-a a
adquirir um “Volvo”, mas a sua filha preferida um “Audi”).
Não se recorda do preço da viatura “Audi” referida nem a que firma foi a mesma
adquirida, sendo certo que o Joaquim Freitas ofereceu os estofos em pele.
Referiu também não se recordar de quem tratou do seguro da viatura em causa
(ignorando aliás se se tratou da transferência do seguro da sua anterior viatura ou de um
novo seguro).
Esclareceu que foi com o arguido Horácio Costa ver a viatura a um stand para
os lados das Taipas (o Joaquim Freitas não se deslocou a esse stand alegando
compromissos profissionais), onde assinou uns papéis, tendo sido o dito Horácio Costa
quem posteriormente a foi buscar (antes disso tinha-se deslocado com ele e com o
Joaquim Freitas a uma feira automóvel que teve lugar na “Exponor”). Em todo o caso,
nada pagou e não viu a efectivação do respectivo pagamento.
Referiu desconhecer qualquer fax trocado entre a empresa vendedora e a CMF a
propósito da viatura “Audi A4” em causa.
Não se surpreendeu com o auxílio do Horácio Costa na aquisição da viatura uma
vez que era amigo do arguido Joaquim Freitas e dado o facto de ambos serem membros
da comissão angariadora de fundos para a campanha eleitoral das autárquicas de 1997.
Não foi assertiva quanto à questão de se saber com que dinheiro foi tal viatura
adquirida, sustentando, em todo o caso, que foi o seu ex-marido quem a terá pago, ainda
que eventualmente o dinheiro possa ter sido adiantado pelo Joaquim Freitas (cfr., em
todo o caso, os documentos de fls 77 do 1º volume).
Ao ser confrontada com os cheques que serviram de meio de pagamento da
viatura em causa (cfr. fls 77 do 1º volume), manifestou surpresa por dizerem respeito
um à conta do BES referida nos autos (1.000 contos) e outro a uma conta do arguido
Horácio Costa (no valor de 4.700 contos), pois, em face do que ficou dito, os cheques
deveriam ser sacados sobre uma conta do seu ex-marido (que era quem em última
instância suportou o custo da aquisição) ou do arguido Joaquim Freitas (caso tenha
adiantado o dinheiro necessário).

508
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Expressou ter sido vítima de uma maquinação no sentido de dar aos factos a
aparência plasmada na pronúncia, sendo certo que o Joaquim Freitas chegou a deslocar-
se a sua casa e a pedir-lhe desculpa por esse facto e deu-lhe conta de que colaborou
nessa maquinação (designadamente não esclarecendo a comunicação social) porque foi
ameaçado de morte e porque sofreu pressões nesse sentido. Aliás, segundo referiu, ele
lamentou-se desse facto junto de outros membros do PS local (a arguida não esclareceu
porém quem terá exercido as ditas pressões).
Assegurou nunca ter exercido qualquer pressão sobre o Joaquim Freitas no
sentido de corroborar a sua versão dos factos mas, curiosamente, não deixou de dizer
que faria revelações comprometedoras para o mesmo caso, na audiência de julgamento,
“não contasse a verdade” acerca deste assunto.

- Arguido Horácio Costa


Remete-se para o que a propósito do ponto 2, do ponto 1.6 do 1º capítulo da
pronúncia já foi referido pelo arguido Horácio Costa.
Ainda a propósito do facto de pela sua conta pessoal ter passado parte do
dinheiro para a aquisição da viatura em causa, referiu que não tinha qualquer
possibilidade financeira para oferecer à arguida Fátima uma viatura (hipótese que
considera descabida), sendo certo que à data pagava uma prestação mensal referente ao
seu veículo da marca “Peugeot”, no valor de 65.708$00 (cfr. extracto bancário da conta
do “Banco Mello”, constante de fls 14738, junta pelo arguido Horácio Costa).

- Arguido Joaquim Freitas


Em inícios de 1988 a arguida Fátima Felgueiras dizia que necessitava de uma
viatura nova porque o seu “Citroën” estava desactualizado. Transmitiu esse facto ao
arguido Horácio Costa e este referiu-lhe que não havia dinheiro suficiente para a
aquisição de uma nova viatura. A arguida Fátima porém insistiu na intenção de adquirir
uma nova viatura e procurou sossegar o arguido Horácio Costa dizendo-lhe que “o
dinheiro iria aparecer”.
Entretanto, cerca de 2 ou 3 meses depois deslocaram-se a uma exposição
automóvel na “Exponor”.
Nega porém ter dado qualquer sugestão à arguida Fátima quanto à viatura que
deveria adquirir.
Como ela gostava da marca “Volvo” estiveram no stand dessa marca nessa
exposição e ela ficou com a ideia nessa viatura. Porém, cerca de 3 dias depois, o filho
dela (o João) disse ao depoente que a mãe (a arguida Fátima) já não estava interessada
no “Volvo”, para não se confundir com a viatura da CMF (que era da dita marca), na
sequência de ter sido alertada para esse facto pelo Dr. Sousa Oliveira (pai do João e à
data ex-marido da arguida Fátima), segundo lhe contou o dito João.
O Dr. Sousa Oliveira terá então sugerido a aquisição de um “Audi A4” pois já
tinha tido uma viatura dessa marca e ficara satisfeito.
A arguida Fátima comunicou então ao arguido Horácio que pretendia adquirir
um “Audi A4” (o qual já tinha averiguado os preços do “Volvo”, ao que pensa
referentes ao modelo 460).
Entretanto apareceu o dinheiro necessário para o pagamento do preço da viatura
(por força de donativo da “Resin”).
O arguido Horácio Costa verificou então qual o stand que lhe fazia melhor preço
e acabou por negociar a aquisição do “Audi A4” num stand em Guimarães (o qual
portanto lhe fez o melhor preço).

509
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Horácio Costa não queria pagar em numerário o preço da viatura e a


arguida Fátima sugeriu então que o dinheiro do donativo efectuado pela “Resin” fosse
depositado na conta pessoal do depoente, o que recusou. Em face disso ela determinou
que a mesma quantia fosse depositada na conta pessoal do arguido Horácio Costa, o que
sucedeu.
Esse negócio foi concretizado por “5 ou 6.000 e tal contos”.
Foi confrontado com cópia dos dois cheques que serviram para pagar o preço da
dita aquisição, constantes de fls 77 do 1º volume, nos montantes respectivos de
4.700.000$00 (cheque sacado sobre a conta pessoal do arguido Horácio) e 1.000.000$00
(cheque sacado sobre a conta do BES), referindo então que nem todo o dinheiro do
donativo da “Resin” serviu para pagar a viatura (usaram desse donativo a quantia de
4.700 cts), pelo que outra parte terá servido para pagar outras despesas (segundo o
arguido Horácio serviu para pagar o seguro).
Foi ainda confrontado com cópia do talão de depósito de fls 79 do 1º volume na
conta pessoal do arguido Horácio Costa, datado de 28.07.98 (um cheque de 50.000$00,
que segundo o arguido Horácio se tratou de um presente de aniversário do seu sogro), e
da quantia em numerário de 4.700.000$00 (esta proveniente do donativo da “Resin”).
Foi também confrontado com o documento de fls 106 do 1º volume (manuscrito
do arguido Horácio em papel timbrado da CMF a confirmar a encomenda da viatura
“Audi A4”).
Concretizou-se então a compra da viatura, sendo certo que como o montante do
donativo da “Resin” era insuficiente passou-se um cheque da conta do BES de modo a,
no total, prefazer o preço da viatura.
Esclareceu que a arguida Fátima Felgueiras deslocou-se ao stand da “Audi” em
Guimarães e sabia perfeitamente qual era o preço da mesma e que para o respectivo
pagamento iria ser usado dinheiro do referido donativo e da conta do BES. Ela aliás
mandou retirar umas letras na carroçaria da viatura alusivas à firma vendedora, por
entender que era “parolo”. Vieram para Felgueiras nessa viatura, sendo certo que para
Guimarães se tinham deslocado na viatura da CMF.
Nega terminantemente que tenha emprestado ou adiantado qualquer quantia
monetária para a aquisição da referida viatura. Aliás, o Dr. Sousa Oliveira tem muito
dinheiro e muitos bens.
Nega também que tenha oferecido os estofos em pele, conforme referido pela
arguida Fátima no seu depoimento.
O seguro foi feito pelo arguido Horácio Costa em Fafe, segundo instruções da
arguida Fátima Felgueiras. Referiu que não se recorda se o pagamento respectivo foi
efectuado em cheque ou em numerário, mas após ter sido confrontado com o documento
de fls 289 do apenso 4 referiu que o pagamento do seguro foi feito em numerário
(documento rubricado por si e pelo arguido Horácio, pois dizia respeito a pagamentos
com dinheiros provenientes de donativo da “Resin”, donde resulta que foram usados
4.700 cts para a aquisição da viatura e 200 cts para a efectivação do seguro da mesma,
tendo sido pois pago em numerário o seguro em causa).
Ignora se a arguida Fátima se deslocou ou não pessoalmente a Fafe ao mediador
de seguros ou se tal terá sido feito apenas por intermédio do arguido Horácio. Em todo o
caso reconheceu no documento de fls 80 do 1º volume a assinatura da arguida Fátima
(respeitante ao seguro automóvel).
Nunca percebeu bem a ruptura conjugal entre a arguida Fátima e o Dr. Sousa
Oliveira, pois nesse contexto não sabe explicar porque motivo ele terá sugerido a
aquisição da viatura “Audi A4” ao invés de uma viatura “Volvo” e porque motivo
pressionou o depoente a alterar o seu depoimento.

510
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Aliás, ele tem as chaves de casa da arguida Fátima e entra lá quando quer.
Nega igualmente que a aquisição da viatura referida tivesse alguma coisa a ver
com as partilhas do extinto casal formado pela arguida Fátima e pelo Dr. Sousa
Oliveira.
Relatou então que em 15.08.2000 a esposa do Juiz Conselheiro Almeida Lopes
veio ter consigo à sua casa de praia (no Mindelo) e disse-lhe que o marido iria pedir-lhe
um favor e pediu-lhe para o não aceder ao favor que ele lhe iria pedir. Cerca de 3 ou 4
minutos depois surgiu o dito Juiz Conselheiro, transmitindo-lhe que lhe queria falar e
que não queria estar parado no mesmo local. Deram então uma volta pelo pinhal e ele
começou por lhe dizer que o depoente lhe iria fazer um favor, que tinha muito poder,
que pertencia à “Opus Dei” (chegou a convidá-lo para um retiro) e que se acedesse ao
favor que lhe iria pedir nada de mal lhe aconteceria (percebeu que nada de mal lhe iria
acontecer em termos fiscais, já que ele era Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal
Administrativo e Fiscal).
Referiu-lhe então que a sua prima Fátima estava “encravada” na questão da
aquisição do “Audi A4” e que tal era a única coisa que a poderia fazer condenar porque
ao resto “dar-se-ia a volta por cima”. Pediu-lhe então para depor no sentido de que lhe
tinha emprestado o dinheiro.
Porque o pedido não era normal nada lhe respondeu.
Entretanto eram já 22.58 horas (hora que verificou na factura referente ao seu
telemóvel) e ele pediu-lhe para usar o telemóvel do depoente, no que acedeu (fez tal
pedido porque o dele estava sob escuta). Ele ligou então à arguida Fátima e disse-lhe
para marcar um encontro ou um jantar com o depoente, que a iria ajudar, alterando o
depoimento na PJ, após o que se moveria um processo ao arguido Horácio. Não falou
com a arguida Fátima ao telemóvel nessa altura.
O dito Almeida Lopes queria que o depoente fizesse um depoimento por escrito
no sentido de que tinha emprestado dinheiro para a aquisição do “Audi” e que o “saco
azul” era invenção do arguido Horácio.
Salienta que nessa altura nem acedeu nem negou o pedido em causa.
Uns dias depois o Dr. Sousa Oliveira convidou o depoente para almoçar, convite
que aceitou. Almoçaram no restaurante “Estrada Real”, em Lousada, e ele disse-lhe que
tinha de safar a sua esposa e pediu-lhe para alterar o seu depoimento na PJ, ao que o
depoente lhe respondeu que tal era impossível pois já tinha prestado depoimento. Ele
retorquiu-lhe que quem mandava era o MP e não a PJ e para não se preocupar.
Acrescentou que tinha dinheiro para lhe dar de modo a sustentar a versão de que lhe
havia emprestado o dinheiro para a aquisição do “Audi A4”. Referiu-lhe ainda que
posteriormente seria movida uma acção ao arguido Horácio Costa. Ele falou consigo a
chorar e nem acabaram o almoço. Ficou incomodado e com pena dele. Porém, não
acedeu a tal pedido.
Outras pessoas a mando do referido Juiz Conselheiro Almeida Lopes
pressionaram o depoente a alterar o seu depoimento.
Relatou à PJ tais pressões.
Deu ainda conta de que foi visitado na sua fábrica, nas vésperas de ir à PJ prestar
declarações, pelo Sr. Júlio Pereira (à data funcionário do GAPP) e pelo vereador
Antonio Pereira, e pressionaram-no no sentido de alterar a verdade dos factos no seu
depoimento acerca da conta paralela e dos financiamentos, alegando que o Dr. Sousa
Oliveira resolveria tudo ao nível da justiça, o que recusou.
Já depois de ter prestado declarações perante a PJ foi ao escritório do Dr. Sousa
Oliveira, à noite, a pedido dele, o qual lhe pediu para não contar nada do que sabia, caso
contrário o pai do depoente poderia ser prejudicado pela mulher (a arguida Fátima, a

511
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

quem ele sempre se referia como “a sua mulher”), enquanto presidente da edilidade, nos
vários projectos que tinha no concelho.
Relatou também o depoente o episódio ocorrido num restaurante em Stª
Quitéria, onde jantava com os arguidos Horácio Costa e Gabriel Almeida, sendo certo
que este se mostrava muito nervoso, o qual lhes pediu para não falarem e para “não irem
para a comunicação social” na matéria respeitante à “Resin”.
Chegou a ser oferecida uma quantia monetária ao arguido Horácio para se calar,
o que não foi aceite.
Referiu ainda o encontro em Lousada, já relatado pelo arguido Horácio Costa
em termos similares. A esse propósito o Sr. Pimentel, na altura assessor da CMF, disse-
lhe para ter cuidado porque estava a lidar com gente poderosa e que envolvia muito
dinheiro. Tiveram assim medo, razão pela qual se fizeram acompanhar do irmão do
arguido Horácio no referido encontro em Lousada com o arguido Gabriel Almeida.
Pouco tempo depois de enviarem as missivas aos vários órgãos do partido a dar
conhecimento do que se passava em Felgueiras (conforme referido pelo arguido
Horácio, enviadas em Setembro de 2000, Fevereiro e Maio de 2001), o deputado Renato
Sampaio ligou várias vezes para o seu telemóvel (sendo certo que o não conhecia). Ele
pediu-lhe para estarem calados.
Tal deputado marcou um almoço no restaurante “Scala” na Praça Velasquez, no
Porto, onde estiveram os deputados Renato Sampaio, Barros Moura, o vereador Edgar
Pinto da Silva, o arguido Horácio Costa (o qual chegou no final e não almoçou) e o
depoente. O dito Renato Sampaio transmitiu ao depoente que oferecia ao arguido
Horácio um lugar de director, a ganhar bem e sem trabalhar se se calassem. Como este
ainda não tinha chegado alertou-os de que o arguido Horácio poderia levar a mal tal
oferta. Quando o arguido Horácio chegou o dito Renato Sampaio tomou a palavra, mas
foi interrompido por aquele na medida em que se apercebeu imediatamente que lhe iam
propor algo para que se calasse, tendo ido então embora aborrecido. O Renato Sampaio
recomendou então ao depoente que se mantivesse em silêncio. Pelo contrário, o
deputado Barros Moura referiu que existiam condições em Portugal para levar a cabo
uma “operação mãos limpas” à italiana e recomendou que fossem para a praça pública
contar tudo.
Chegou a ter encontros em Matosinhos com o Narciso Miranda (no restaurante
“Lusíadas”, onde, para além do depoente, esteve presente o arguido Horácio, o arguido
Bragança, Orlando Costa e o Narciso Miranda). Abordaram o assunto da aquisição do
“Audi A4” e o Narciso ironizou perguntando se tinham comprado um triciclo para o
depoente e para o arguido Horácio. O Narciso Miranda referiu ainda que as contas
deveriam ser prestadas ao Guterres e não ao Dr. Sousa Oliveira (“a esse gajo não”, foi a
expressão que utilizou). Ele referiu ainda que iria resolver o assunto, mas soube pelo Dr.
Barros Moura que ele avisou a arguida Fátima Felgueiras. Dias depois o arguido
Bragança foi expulso da CMF. Foi o depoente quem pagou o almoço e ficou com a
respectiva factura.
Reuniram-se ainda na Federação Distrital do Porto do PS, tendo sido o depoente
e o arguido Horácio convocados pelo Narciso Miranda para uma acareação com a
arguida Fátima (que não compareceu e em sua substituição mandou o arguido António
Pereira, acompanhado do presidente da junta de freguesia de Barrosas, o Sr. Augusto
Faria) e com Orlando Costa.
Como a arguida Fátima não compareceu o Narciso Miranda ausentou-se. A
reunião acabou por ser inconclusiva.
Cerca de um mês depois o depoente e o arguido Horácio encontraram-se com o
Guilherme Pinto na Foz, no Porto. Ele queria ver os documentos, os quais lhe foram

512
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

exibidos pelo arguido Horácio sem que lhes fossem passados para as mãos com receio
de que os lançasse ao mar. Depois de os observar concluiu que a situação era grave.
Chegou ainda a ter outros encontros com o Narciso Miranda, como por exemplo
na Bairrada (tendo aliás pago também o jantar).
A este propósito, foi junto aos autos documento comprovativo do pagamento
dessas refeições (quer em Matosinhos no restaurante “Lusíadas”, quer na Bairrada no
“Restaurante Típico da Bairrada”), o qual se reporta ao extracto do seu cartão de
crédito.

- Testemunha Manuel Lobo Palhares


Referiu ser mediador de seguros em Fafe e que conhece o arguido Horácio Costa
pois na altura era já seu cliente.
Confirmou que fez o seguro da viatura “Audi A4” referida nos autos a 29.07.98,
sendo certo que foi o arguido Horácio Costa quem tratou de tudo. À data o arguido
Horácio disse-lhe que era verador na CMF, sendo certo que tal informação também lhe
foi fornecida pelo sogro desse arguido, também seu cliente.
Já não se recorda se foi o arguido Horácio quem pagou o seguro.
Confrontado com os documentos de fls 80 a 83 do 1º volume confirmou tratar-se
dos documentos relativos ao seguro em causa.

- Testemunha José Meireles da Costa Rodrigues


É accionista e administrador da sociedade “Machado e Costas, SA”, empresa
que comercializa automóveis das marcas “Volkswagen”, “Audi” e “Skoda”.
Confirmou que forneceu à PJ as informações que na altura lhe foram solicitadas
(constantes de fls 103, do 1º volume).
Esclareceu que foi só nessa altura que se inteirou da situação referente à venda
pela “Machado e Costas, SA” da viatura “Audi A4” referida nos autos, já que
normalmente é o Departamento Comercial da empresa que lida com esses assuntos.
Assim, esclareceu que um dos vendedores da sua empresa foi contactado pelo
arguido Horácio Costa e mais tarde por outra pessoa cuja identidade não soube precisar.
Esse audi foi mais tarde averbado em nome da arguida Fátima Felgueiras.
À época, no distrito de Braga, a sua empresa dispunha de cinco stands, dos quais
dois em Guimarães (um stand da “Audi” perto do estádio na cidade de Guimarães e
outro stand da “VW” em Creixomil).
Em exposição só estão viaturas novas mas também vendem viaturas usadas.
Confirmou que Paulo Todo Bom (referido pelo arguido Horácio) faz parte da
equipa de vendas da “Audi” e regularmente encontra-se no stand da “Audi” nas
imediações do Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães.

- Testemunha Carlos Manuel Teles Santos


Referiu ser vendedor de automóveis na firma “M. Costas, SA” desde 1993.
Essa empresa comercializa viaturas da “Volkswagen”, “Audi” e “Skoda”.
Até há cerca de 4 anos, os vendedores da empresa vendiam viaturas dessas três
marcas, tendo-se entretanto especializado em apenas uma das marcas, uns na “VW”,
outros na “Audi” e outros ainda na “Skoda”.
O depoente trabalha no stand de Creixomil, em Guimarães.
A “M. Costas, SA” tinha também um stand na Praça Heróis da Fundação, em
Guimarães, perto do estádio do Vitória.
Vendiam carros novos, mas também usados (normalmente a comerciantes de
automóveis, provenientes de retomas ou viaturas de serviço).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confirmou que tem um colega de trabalho chamado Paulo Todo Bom. Não sabe
em que ano ele foi admitido ao serviço da “M. Costas, SA”.
Confirmou que vendeu um “Audi A4” à arguida Fátima Felgueiras.
Foi contactado nesse sentido pelo arguido Horácio Costa, não se recordando se
por fax se pelo telefone.
Ele também o contactou por telefone para acertar preços e chegaram a um
acordo. Segundo ele lhe disse, a viatura era para a arguida Fátima Felgueiras.
Tem a ideia de ter recebido um fax do arguido Horácio para confirmação do
negócio.
Confrontado com o fax de fls 106 (com o timbre da CMF) e assinado pelo
arguido Horácio Costa, confirmou que se trata do fax a que se referiu.
A PJ pediu esclarecimentos à sua entidade patronal acerca do negócio e foi a
administração que tratou de responder. Ignora o que então foi informado à PJ (cfr fls
103 – ofício da “M. Costas” à PJ a prestar os esclarecimentos em causa, onde vem
referido que a venda concretizou-se a 29.06.98, identificou os cheques entregues como
meio de pagamento – cfr. fls 77 -, refere que os cheques foram depositados a 30.06.98 e
identifica a quem foi vendida a viatura).
Não se recorda preço de venda da viatura em causa, mas tendo em atenção a
pessoa da cliente (Fátima Felgueiras), o desconto efectuado no preço foi acima do
habitual.
Foi o depoente quem fez a entrega da viatura contra o seu respectivo pagamento.
Fez a entrega da viatura ao arguido Horácio Costa (a quem explicou o respectivo
funcionamento), o qual se fazia acompanhar de mais outra pessoa (não sabe quem era).
Tem a ideia que a arguida Fátima não estava presente (pelo menos não se recorda de a
ter visto ou de com ela ter falado).
Tem a ideia que lhe foram entregues dois cheques pelo arguido Horácio, mas
não tem a certeza desse facto.
Confrontado com os cheques de fls 77, referiu não saber se se tratam ou não dos
cheques a que aludiu.
Não sabe quem ia a conduzir o “Audi” quando saíram das instalações da “M.
Costas, SA”.
A si não lhe foi comunicado para retirar a alusão à firma vendedora na traseira
da viatura, mas admite que tal tenha sido solicitado na oficina, pois é lá que se procede a
essa operação.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Referiu que, no que se refere ao pagamento do preço do “Audi A4”, 1.000 cts
foram provenientes da conta do BES, conforme cópia do respectivo cheque constante
dos autos.

- Testemunha José Alves de Sousa Oliveira


O depoente saíu de casa em 1997 e a sua filha (Sandra Felgueiras), naquele
período conturbado, era o elo de ligação entre o depoente e a arguida Fátima.
A sua filha disse-lhe que naquela época o arguido Joaquim Freitas andava
sempre atrás da arguida Fátima procurando-a convencer de que deveria adquirir uma
viatura nova. O arguido Joaquim Freitas queria agradá-la pois para ele “ela era tudo no
mundo”.
O depoente “não achou graça nenhuma” a essa ideia da arguida Fátima adquirir
uma viatura nova, mas, para não se chatear, disponibilizou-se perante o arguido
Joaquim Freitas a considerar essa possibilidade e disse-lhe para ele tratar desse assunto.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que o Joaquim Freitas ficou de fazer contas com o depoente, ainda que
pudesse adiantar o dinheiro necessário para essa aquisição. Seria o depoente a pagar o
“audi A4” porque tinha mais dinheiro que a arguida Fátima e porque os seus filhos
andavam com a mãe.
Não obstante, o depoente não foi consultado acerca do modelo, do preço e das
condições de pagamento da nova viatura.
O arguido Joaquim Freitas ficou de fazer contas consigo quando se vendesse o
“Citroën BX” referido nos autos.
Foi por isso que ficou admirado quando soube pela comunicação social que um
dos cheques era proveniente da conta do BES e que outro era proveniente da conta
pessoal do arguido Horácio Costa e só compreende esse facto à luz de uma tentativa de
assassinato político da sua ex-mulher e de uma luta pelo poder (de que a carta anónima
e a visita à testemunha Narciso Miranda por parte de um grupo de seis pessoas foi
também um exemplo disso).
Sobre a aquisição do “Audi A4” nunca conversou com o arguido Horácio Costa
(pessoa com quem conversava raramente).
O arguido Joaquim Freitas é muito mau a negociar, daí que tenha especulado
que foi o arguido Horácio a negociar a aquisição dessa viatura.
Em Agosto ou Setembro encontrou o arguido Joaquim Freitas junto à CMF e ele
mostrou-lhe o “Audi A4”, tendo-lhe perguntado se gostava dessa viatura, ao que lhe
respondeu afirmativamente, mas acrescentou que o não compraria porque lhe tinham
furtado em tempos um “Audi”. O arguido Joaquim Freitas, nessa conversa, referiu-lhe
ainda que tinha oferecido os estofos em pele (e que custaram 1.000.000$00).
Cerca de um ano depois de ter intentado a acção de divórcio por mútuo
consentimento (essa acção foi intentada em meados de 1998), encontrou a testemunha
Carlos Marinho (advogado) e, quando subia as escadas da CMF, viu o arguido Joaquim
Freitas e interpelou-o na medida em que ele nunca mais tinha aparecido (para fazerem
contas) e perguntou-lhe quando é que então apareceria, ao que ele lhe respondeu que
depois passaria por lá (pelo escritório do depoente). A essa conversa assistiu a
testemunha Carlos Marinho.
Salientou que esse perído foi difícil para si e que não se preocupou com o facto
do arguido Joaquim Freitas não ter aparecido para fazerem as respectivas contas (ele é
que ficou de aparecer), numa altura em que pouco contacto tinha com ele, de modo que
quando o encontrou lhe relembrou que deveriam fazer contas.
Explicou que a viatura “Audi A4” foi paga pelo arguido Joaquim Freitas (ele
pagava sempre as respectivas despesas com o cartão de crédito da firma), ou melhor,
pelo pai dele (pois este é que tinha o dinheiro) e se ele pedisse dinheiro ao seu
progenitor não teria qualquer problema em obtê-lo.
O depoente não teve quaisquer dúvidas de que foi o arguido Joaquim Freitas
quem pagou a dita viatura (ou melhor, o pai dele). Não sabe qual foi o preço pago pela
respectiva aquisição (embora como qualquer um tivesse uma ideia de quanto poderia
custar uma viatura como aquela), sabendo apenas que os estofos em pele custaram
1.000.000$00, segundo soube pelo arguido Joaquim Freitas já depois da concretização
da compra da viatura.
Assegurou que a sua ex-mulher é despida de qualquer interesse patrimonial.
Foi em 1999 (referiu depois que a notícia data de 21.06.2000) que saíu uma
notícia no “Público” acerca da aquisição do “Audi A4”, o que o deixou muito magoado.
Fez por isso queixa-crime contra o jornalista do público (que entretanto viria a
ser condenado), tendo ficado assente que as fontes de tal notícia foram os arguidos
Joaquim Freitas e Horácio Costa.

515
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Segundo tal notícia o preço da aquisição dessa viatura “Audi” foi de


5.250.000$00.
O arguido Joaquim Freitas tem problemas mentais.
À data ele gostava da arguida Fátima de forma doentia (nesse período já o
depoente não falava com a sua ainda esposa) e se não fosse ele ela não teria adquirido o
“Audi A4”.
Ele é persecutório em relação a quem não gosta. O depoente foi vítima de
mensagens anónimas e o arguido Joaquim Freitas chegou a fazer uma ameaça de bomba
na Assembleia da República e tentou atropelar a esposa de um tio.

- Testemunha António Celestino Magalhães da Silva


É advogado de profissão.
Conhece a testemunha Sousa Oliveira como advogado há cerca de 30 anos.
Essa testemunha foi presidente da Delegação de Felgueiras da Ordem dos
Advogados durante 12 anos e nessa altura o depoente foi o secretário dessa delegação.
Colaborou igualmente com ele em termos profissionais.
De facto, em 2000 ele sofreu um AVC e o depoente prestou-lhe um grande
auxílio em termos profissionais, fazendo-lhe muitos julgamentos e tratando dos seus
processos.
Em 1997 o relacionamento entre ambos já existia. Frequentava o escritório dele
com frequência. Ele confidenciava-lhe muitas coisas.
Ele atravessava um período de ruptura no seu casamento, o que deu origem ao
processo de divórcio, que deu entrada no tribunal de 1998, consumando-se o divórcio
em 1999.
Aliás, ao longo da década de 90 que o relaciomento entre ele e a arguida Fátima
se vinha a deteriorar.
Ele não queria essa ruptura. O filho de ambos (o João) tinha então 13/14 anos de
idade. Isso desgostou muito a testemunha Sousa Oliveira.
Em 1998/1999 eles não comunicavam pessoalmente entre si, fazendo-o apenas
através dos filhos, sobretudo do João, entregando e recebendo um do outro bilhetes.
Foi o depoente muitas vezes almoçar com a testemunha Sousa Oliveira e o João.
A certa altura, estava o depoente no escritório do Dr. Sousa Oliveira, quando
ouviu o João dizer-lhe que o arguido Joaquim Freitas queria que a mãe adquirisse um
carro novo (esse arguido era então uma pessoa próxima da arguida Fátima e da
testemunha Sousa Oliveira), na medida em que, segundo ele, parecia mal a presidente
da CMF deslocar-se com o carro que na altura tinha (o “BX”).
O Dr. Sousa Oliveira dizia-lhe que essa não seria a melhor altura para mudar de
carro, até porque estavam em processo de divórcio.
Nunca viu a testemunha Sousa Oliveira com o arguido Joaquim Freitas, mas
depreendeu que teriam bom relacionamento na altura em face do que ouviu ao Dr.
Sousa Oliveira a propósito do “Audi A4” referido nos autos. Ignora se a família de
ambos conviviam entre si. Ambos frequentavam a CMF (o Dr. Sousa Oliveira era na
altura o presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras).
Entretanto, já no Verão de 1998, viu o “Audi A4” referido nos autos estacionado
à porta da CMF.
O Dr. Sousa Oliveira ficou conformado com essa aquisição e deu conta ao
depoente que iria conversar com o arguido Joaquim Freitas por causa do pagamento
dessa viatura (disse-lhe ainda que foi o arguido Joaquim Freitas quem ofereceu os
estofos em pele).

516
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Dr. Sousa Oliveira esperou sempre que o arguido Joaquim Freitas fizesse
contas com ele, visto que era ele quem suportaria o custo de aquisição dessa viatura,
com excepção dos estofos em pele (oferecidos pelo arguido Joaquim Freitas).
Quando em 2000 “rebentou” este processo e saíu a notícia referente à aquisição
do “Audi” na televisão, estava o depoente a almoçar com a testemunha Sousa Oliveira
em Felgueiras e no restaurante fez-se silêncio porque as pessoas nessa altura prestaram
atenção ao relato dessa notícia, tendo o Dr. Sousa Oliveira ficado branco, ao ponto do
depoente recear que lhe “fosse dar alguma coisa”.
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas foram para a televisão dizer que pagaram
o “Audi A4” com dinheiro do “saco azul” (1.000 cts).
Dizia a notícia que os 1.000 cts teriam servido para sinalizar a aquisição da
viatura.
*
Em face do depoimento da testemunha António Silva o arguido Horácio Costa
referiu que se fosse verdade o que essa testemunha contou acerca da aquisição do “Audi
A4” a testemunha Sousa Oliveira teria feito uma queixa-crime contra o depoente e
contra o arguido Joaquim Freitas por calúnia, o que nunca sucedeu.
*

- Testemunha José Joaquim Almeida Lopes


Referiu que a arguida Fátima e a testemunha Sousa Oliveira casaram, mas que
entretanto as relações entre ambos esfriaram por incompatibilidade de génios, chegando
ao ponto de viverem na mesma casa mas com vidas totalmente separadas. A testemunha
Sousa Oliveira tem um irmão que é padre e procurava dissuadí-los da concretização do
divórcio entre ambos. Assim, essa situação foi-se protelando no tempo, servindo o João
de correio entre ambos.
Porém, em 1997, a testemunha Sousa Oliveira decidiu ir viver para outra casa.
Já em princípios de Agosto de 1998, em Mindelo (o depoente tem lá uma casa
que dista cerca de 200 metros da casa de férias do arguido Joaquim Freitas e quando
gozava férias encontrava-o por lá muitas vezes), estava o depoente à conversa com o
arguido Joaquim Freitas quando este lhe disse que a arguida Fátima Felgueiras havia
adquirido um carro novo, visto que ele tinha-lhe dito que não era próprio da presidente
da CMF ter um carro velho (um “Citroën BX”).
O depoente respondeu-lhe que, pelo que sabia, ela não teria dinheiro para
efectuar essa aquisição, ao que ele lhe disse que tinha emprestado o dinheiro, ao que
retorquiu que ela não lhe iria pagar, tendo-lhe respondido o arguido Joaquim que o Dr.
Sousa Oliveira se havia comprometido a pagar a viatura caso ela não o fizesse. A
testemunha Sousa Oliveira estava já separada de facto dela e tinha uma situação
financeira mais desafogada (“ele era um santo de um homem”, segundo referiu a
testemunha).
O arguido Joaquim Freitas, nessa conversa, disse-lhe aliás que o dinheiro tinha
sido “emprestadado” e sorriu.
O depoente acreditou que ele, sendo um homem tão rico, quisesse ofertar esse
carro à arguida Fátima, de quem ele na altura era muito amigo.
Verificava aliás que por vezes, ao Domingo, nesse período de férias, a sua prima
Fátima estava em casa dele no Mindelo (chegou a passar por lá e a vê-la a despachar
processos da CMF no exterior, muma mesa colocada para o efeito).
Entretanto, na sequência do divórcio entre a sua prima e a testemunha Sousa
Oliveira (que ocorreu no primeiro semestre de 1999), este último contou-lhe que
acordaram que a dívida do carro seria a cargo deste.

517
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Fernando António da Mota Marinho


Referiu ser advogado (é aliás conhecido em juízo).
Frequentou desde 1982 a casa da arguida Fátima e da testemunha Sousa Oliveira
(ela dava-lhe então explicações).
Numa altura em que a testemunha Sousa Oliveira e a arguida Fátima estavam
separados, o filho de ambos (o João) estava diariamente no escritório do pai (que o
depoente também frequentava).
Assim, ouviu-o dizer várias vezes que o arguido Joaquim Freitas procurava
convencer a sua mãe (a arguida Fátima) a adquirir uma viatura nova, sugestão a que a
testemunha Sousa Oliveira reagia um pouco mal, acrescentando que a propósito disso o
que se resolvesse seria tido em conta nas partilhas.
Recorda-se que certo dia ia na rua acompanhado da testemunha Sousa Oliveira
quando avistaram o arguido Joaquim Freitas e, tendo-se abeirado dele, a testemunha
Sousa Oliveira peguntou-lhe: “então, quando é que acertamos as contas do carro?” O
arguido Joaquim Freitas ficou então de passar pelo escritório da testemunha Sousa
Oliveira nessa semana para acertarem as contas.
*
Em face destas declarações o arguido Joaquim Freitas referiu que só viu a
testemunha Marinho em 2003 numa acareação em Fafe, sendo agora a segunda vez que
o vê.
Nega por isso a existência do encontro relatado pela testemunha em causa.
*
A testemunha Fernando Marinho, por seu turno, reafirmou a sua versão dos
factos quanto ao encontro que relatou e acrescentou que se dizia que o arguido Joaquim
Freitas “arrastava a asa” à arguida Fátima Felgueiras.

c) Pagamento de uma dívida do FCF:

- Arguida Fátima Felgueiras


A propósito das dívidas do FCF, esclareceu que ocorreram diversas reuniões
entre o FCF e o executivo camarário (às vezes inclusive com a participação do
presidente da Assembleia Municipal) no sentido de sensibilizar o município para as
dificuldades financeiras do clube, potenciadas aliás pelo facto do Governo de então não
ter honrado o compromisso de subsidiar a remodelação do estádio, essencial para que o
clube pudesse participar na 1ª divisão nacional de futebol, à qual tinha ascendido.
Negou porém que qualquer quantia adiantada à RESIN tenha servido para pagar
dívidas do clube, sendo certo que nunca contactou os arguidos Vitor Borges e Carlos
Marinho para esse fim (este último aliás só o conheceu no ano passado).
Confirmou em todo o caso o teor do fax de fls 269 do ap. 12 (fax dirigido à
RESIN pela AMVS a propósito do adiantamento da quantia de 389.970.768$00,
conforme referido na pronúncia) e de cujo teor tomou conhecimento enquanto membro
do conselho de administração da AMVS (cfr. ainda fls 223 e 224 do apenso 20).
Reconheceu que o arguido Júlio Faria fez parte da Direcção do FCF e que a
depoente, enquanto presidente da CMF, foi presidente da Assembleia geral do FCF.
Referiu desconhecer se a Resin deu algum donativo ao FCF, designadamente no
montante de 20.000 cts.
Reconheceu no documento de fls 170 do 1º volume a letra do arguido Júlio Faria
(datado de 06.11.98), referindo no entanto que nunca o tinha visto.

518
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Para justificar o facto daquela missiva ter sido dirigida ao arguido Horácio
Costa, referiu que este empenhou-se na angariação de fundos para o FCF numa altura
em que o arguido Júlio Faria era dirigente do clube, daí a proximidade entre ambos.
Confrontada com o teor do ofício de fls 64 do apenso 17, dirigido pelo FCF à
CCAM, referiu desconhecer o seu teor, reconhecendo no entanto que uma das
assinaturas é do arguido Júlio Faria (a outra assinatura é do Sr. Álvaro Costa). Referiu
ainda ignorar por que forma foi tal dívida saldada.
Nega ainda que o arguido Horácio Costa lhe tenha comunicado qualquer
recebimento de 20.000 cts da Resin (facto que aliás referiu desconhecer) e muito menos
de modo a pagar qualquer dívida do FCF.
Confrontada com o teor do documento de fls 446 (cheque emitido pela Resin a
favor do FCF), referiu que, ao que pensa, tratar-se-á do pagamento de um contrato de
publicidade celebrado com o clube, no valor de 12.500 cts (cfr. a este propósito as
declarações dos arguidos Júlio Faria, Vitor Borges, Carlos Marinho e Horácio Costa,
bem como os documentos de fls 170, do 1º vol.; 427 do ap. 96-A; 2133 do 9º vol.; 465
do 2º vol.; 466 do 2º vol.; 447 do ap. 96-A; 431 do ap. 96-A; 444 do ap. 96-A; 445 do
ap. 96-A; 22 do ap. 12; 73 do ap. 139-A; 442 e 443 do ap. 96-A; 429 do ap. 96-A; 430
do ap. 96-A, 432 do ap. 96-A; 63 do ap. 17; e 109 a 113 do ap. 14).

- Arguido Júlio Faria


Dá-se aqui por reproduzido o que propósito das declarações do arguido Júlio
Faria foi referido no ponto 4, do ponto 1.6 do 1º capítulo da pronúncia.

- Arguido Vítor Borges


Dá-se aqui por reproduzido o que propósito das declarações do arguido Vítor
Borges foi referido no ponto 4, do ponto 1.6 do 1º capítulo da pronúncia.

- Arguido Carlos Marinho


Dá-se aqui por reproduzido o que propósito das declarações do arguido Carlos
Marinho foi referido no ponto 4, do ponto 1.6 do 1º capítulo da pronúncia.

- Arguido Barbieri Cardoso


Não tem qualquer conhecimento do historial da dívida da CMF à “Resin”,
segundo declarou após ser confrontado com o documento de fls 22 e 23 do apenso 12.
Revelou ainda desconhecer o teor do documento de fls 1112 do 5º volume
(“valores a serem compensados com o aterro RIB”).
Idêntica posição revelou acerca da alegada entrega de 20.000 cts pela “Resin” ao
FCF e quanto aos manuscritos que referem as expressões “retorno” e “devolução”.
A factura nº 31/12 da “Resin”, explicada pelo arguido Carlos Marinho (cfr. fls
444 do apenso 96-A) passou-lhe pelas mãos. Nessa factura colocou o motivo pelo qual
não poderia ser aceite e assim foi devolvida.
O respectivo ofício de devolução, datado de 08.01.98, foi redigido pelo
depoente. Explicou que entendeu não ter qualquer cabimento a CMF pagar o valor em
causa na medida em que a partir de Abril de 1997 tinha sido transferida para a AMVS a
responsabilidade pelo respectivo pagamento.
Foi a única factura que devolveu à “Resin”.
Admite que possa ter falado desse assunto com a arguida Fátima Felgueiras, mas
não se recorda desse facto.

519
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Recorda-se porém de ter sido questionado acerca desse assunto numa reunião de
coordenação pelo Vereador Manuel Faria.
Referiu ainda que tomou conhecimento do adiantamento da AMVS à “Resin” do
montante de 389.970.768$00, conforme referido na pronúncia, a 01.02.99, pois a
deliberação camarária respectiva foi precedida de um parecer que deu no sentido da
“Resin” dever prestar uma caução pois o projecto ainda não estava sequer aprovado (cfr.
documento de fls 64 e 65 do apenso 137).
Nega terminantemente ter comunicado ao arguido Júlio Faria que podia
comunicar à CCAM de Felgueiras que o pagamento dos 20.000 cts em falta referente à
primeira prestação (de 50.000 cts) da transacção celebrada entre essa instituição e o FCF
(cfr. documento de fls 109 a 113 do apenso 14) a breve trecho se iria concretizar.

- Arguido Horácio Costa


Dá-se aqui por reproduzido o que propósito das declarações do arguido Horácio
Costa foi referido no ponto 4, do ponto 1.6 do 1º capítulo da pronúncia.

- Testemunha José Maria Barata Feio de Oliveira


É economista e trabalhou no FCF entre Julho de 1997 e finais de Setembro de
2001, onde exerceu as funções de chefe do Departamento Administrativo e Financeiro.
Esclareceu que foi exercer funções para o FCF porque tinha relações ao nível industrial
com amigos de Felgueiras, acabando por aceitar o convite que lhe foi endereçado pela
testemunha Horácio Reis para trabalhar naquele clube (o qual aliás, aquando da
formulação do convite, lhe referiu que já tinha falado com o arguido Júlio Faria acerca
desse assunto). Contactou então o presidente da Direcção (o arguido Júlio Faria) e foi
admitido para chefe do Departamento Administrativo e Financeiro do clube.
Tinha assim a seu cargo a contabilidade do clube e supervisionava os assuntos
de secretaria.
Foi-lhe então pedida a elaboração de um estudo acerca da situação do clube. A
contabilidade do clube até então era feita por uma empresa de contabilidade de
Felgueiras e havia falta de comunicação entre esta e o clube, visto que neste não existia
alguém que fizesse a triagem dos documentos com relevância contabilística e que os
fizesse chegar ao contabilista, o qual apenas processava os documentos que lhe eram
entregues.
Assim, quando assumiu funções no FCF teve a missão de fazer a contabilidade
do clube e de pôr em ordem a contabilidade.
Começou assim por fazer um levantamento da situação.
Verificou que tinha havido um acordo com o Fisco de pagamento em prestações
das dívidas fiscais, ao abrigo da “Lei Mateus”.
Logo ao fim de 15 dias detectou um erro na contabilidade na ordem dos 50.000
cts quanto ao plano de pagamento.
Conhece a “Resin” na medida em que existiu uma questão relacionada com
facturas.
O FCF emitia as facturas à “Resin” porque esta fazia publicidade estática no
estádio.
Esclareceu que por má interpretação sua foi emitido pelo FCF uma factura à
“Resin” referente a donativo, no valor de 20.000 cts, conforme documento de fls 465 do
2º volume dos autos – factura nº 1583, de 30.12.98 (foi o arguido Júlio Faria quem o
contactou por telefone e deu-lhe instruções para a emitir, no valor de 20.000 cts).
No dia seguinte ou dois dias depois recebeu instruções do arguido Júlio Faria
para se dirigir à CMF de modo a recolher do arguido Horácio Costa o dinheiro

520
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

proveniente da “Resin”. Deslocou-se ali com o Sr. Fernando Figueiredo (tesoureiro do


FCF). Esperou pelo arguido Horácio Costa pois na altura ali não se encontrava. Quando
ele chegou foi encaminhado para o seu gabinete e então falou com ele. Foram-lhe então
entregues dois envelopes, tendo referido o arguido Horácio que relativamente a um
deles não sabia o que continha. Acondicionado num dos envelopes encontrava-se a
quantia de 7.500 cts em numerário (ele referiu-lhe que não o tinha contado). Como já
passava das 15 horas (hora a que os bancos fecham) não conferiram ali o dinheiro e
diligenciaram logo pelo respectivo depósito (só nessa altura é que conferiram o
dinheiro). Esclareceu que os dois envelopes se encontravam fechados. Foi o Sr.
Figueiredo quem preencheu o talão de depósito do cheque (cfr. doc. de fls 431 do
apenso 96 – depósito efectuado às 16.25 horas do dia 30.12.98) e o talão de depósito
dos 7.500 cts foi preenchido por uma funcionária do banco (cfr. doc. de fls 447 do
apenso 97 – depósito efectuado às 16.27 horas do dia 30.12.98). Os depósitos foram
efectuados na mesma ocasião (30.12.98, respectivamente às 16.25 e 16.27 horas,
segundo os documentos referidos).
Esse dinheiro serviu para pagar um cheque emitido pelo FCF a favor da CCAM
no montante de 20.000 cts (cfr. a fls 450 do apenso 96 o talão de depósito do cheque
emitido pelo FCF, no valor de 20.000 cts, a favor da CCAM, depósito esse efectivado a
31.12.98).
Quando a factura inicialmente emitida pelo FCF chegou à “Resin”, em finais de
Dezembro de 1998 (no dia seguinte ao da sua emissão), foi contactado por alguém dessa
empresa no sentido de a corrigir na medida em que deveria dizer respeito a publicidade
e não a donativo. Devolveram então essa factura e emitiu uma outra alusiva a
publicidade, no valor de 12.500 cts + IVA. O IVA foi liquidado mais tarde.
As facturas emitidas a propósito dos contratos de publicidade normalmente
circulam em mão, com excepção das facturas emitidas a firmas que não eram da região
(como era o caso da “Resin”).
Em princípio, a factura emitida pelo FCF no valor de 20.000 cts, referente a
donativo (cfr. doc de fls 465 do 2º volume) terá sido enviada com cópia do contrato.
Confrontado com a carta de agradecimento remetida à “Resin”, constante de fls
464 do 2º volume, referiu que certamente foi a carta de envio da factura referida e de
agradecimento pela comparticipação, sendo certo que se encontra assinada pelo arguido
Júlio Faria. Trata-se de uma missiva igual a muitas outras que remetiam as facturas
emitidas.
As pessoas contribuíam porque queriam ajudar o clube, independentemente da
publicidade que era feita no estádio.
Mesmo em relação a contratos (por ex. de publicidade), o texto da carta que
remetia as facturas era semelhante.
Foi então confrontado com o documento de fls 427 do apenso 96-A (factura nº
1586, datada de 30.12.98, ainda alusiva a donativo, emitida pelo FCF para a “Resin”),
referindo então que não se lembra da emissão dessa factura, não conseguindo explicar
por que razão nela aparece ainda a menção a “donativo”. Estava aliás convencido que
quando a primeira factura foi devolvida remeteu à “Resin” uma factura no valor de
12.500 cts + IVA, referente a publicidade (esta última constante de fls 428 do apoenso
96-A, datada de 31.12.98).
Foi o depoente quem inutilizou as facturas nºs 1583 e 1586, pois era ele quem
tinha essa função.
Depois de ter recbido do arguido Horácio Costa o dinheiro falou com o arguido
Júlio Faria acerca da forma como o recebeu, tendo o arguido Júlio Faria manifestado

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

estranheza pelo facto do dinheiro ter sido acondicionado em dois envelopes, não
percebendo porque tinha recebido 12.500 cts em cheque e 7.500 cts em numerário.
Esclareceu que quando foi à CMF recolher o dinheiro já sabia que se tratava de
20.000 cts, tendo o arguido Júlio Faria instruído o depoente para emitir uma factura à
“Resin” no valor de 20.000 cts. Assim, quando foi buscar o dinheiro essa factura já
estava emitida (eventualmente no mesmo dia em que recolheu o dinheiro, sendo certo
que não lhe parece verosímil que a “Resin” tivesse em seu poder a dita factura no
mesmo dia em que foi emitida e que nesse mesmo dia o tivessem contactado
telefonicamente para emitir uma nova factura).
Esclareceu que não conhece quem quer que seja da “Resin”.
Mais esclareceu que não era o depoente quem elaborava os contratos de
publicidade, sendo certo que o clube dispunha de minutas já elaboradas. Acontecia por
vezes que com o envio da primeira factura seguisse um exemplar do contrato de
publicidade para ser assinado pela contraparte (não foi este o caso dos autos).
Recorda-se que quando foi contactado por alguém da “Resin” na sequência da
emissão da primeira factura, não só pediu a respectiva devolução como também pediu a
devolução do contrato referente ao donativo de 20.000 cts, que tinha sido assinado pelos
representantes do FCF e da “Resin” (aliás, com essa factura foi enviado também esse
contrato de donativo, o qual foi devolvido com essa factura pela “Resin”, tendo sido a
respectiva assinatura inutilizada com um furo no local onde foi aposta). Nessa altura
inexistia qualquer contrato de publicidade de 12.500 cts, o qual foi enviado para ser
assinado pelos legais representantes da “Resin” aquando do envio da factura de 12.500
cts + IVA referente a publicidade (esse contrato de publicidade foi assim celebrado em
Dezembro de 1998).
Confrontado com o documento de fls 443 do apenso 96-A referiu tratar-se do
contrato de publicidade em causa, no montante de 12.500 cts, datado de 03.08.98,
contrato esse assinado pelo Sr. Fernando Sampaio em representação do FCF.
Não se recorda da existência de qualquer outro contrato de publicidade nesse
montante.

- Testemunha Fernando Pereira Sampaio


Assegurou não ter tido qualquer relação com o FCF.
Depois das eleições de 1997, recorda-se que na sede do PS a arguida Fátima
Felgueiras disse-lhe que tinha de arranjar no espaço de mês e meio/dois meses a quantia
de 90.000.000$00 para o FCF. A arguida Fátima pediu-lhe então para falar aos seus
amigos no sentido de darem o respectivo contributo, tendo acrescentado “veja quanto é
que dá”, ao que lhe respondeu que tinha três filhos para criar e que tinha saído pouco
antes de uma campanha onde havia gasto muito dinheiro (onde despendeu mais de
1.000.000$00, quer nos custos da sede da Lixa quer no donativo de 500 cts que
concedeu depois das eleições para ajudar a pagar as dívidas da campanha).

- Testemunha Fernando Valdemar Rodrigues Lima


É empresário. Foi vereador na CMF entre 1990 e 1993 (pelo PSD).
Esteve ligado ao FCF de 1994 a 1997, tendo feito parte da direcção do clube em
1996 e 1997.
Assumiu compromissos financeiros perante a CCAM no âmbito de uma livrança
aceite pelo FCF, no montante de 113.000 cts (100.000 cts + juros), a qual foi avalisada
por sete dirigentes do clube, entre os quais o depoente, Álvaro Costa, Júlio Faria,
Sampaio Teixeira e Sr. Castro.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O FCF tinha subido de divisão e eram necessárias obras no estádio, tendo o


clube obtido promessas do Governo de então (feitas pelo Dr. Marques Mendes) de que o
Estado iria financiar uma parte do respectivo custo (bem como obteram promessas nesse
sentido da CMF e do tecido empresarial do concelho).
O FCF pediu então um financiamento de 100.000 cts à CCAM (razão pela qual
foi aceite a livrança em causa - ou letra, já não tem a certeza - com o aval dos sete
dirigentes do clube). Tal título de crédito foi emitido em branco.
À data o depoente era director da CCAM.
Quando avalisou tal livrança pensava que dentro de um ano a situação se
resolveria em face dos compromissos assumidos pelo Governo de então.
Essa promessa porém não foi cumprida porquanto o Governo de então caíu.
Conseguiram liquidar essa dívida com dinheiro do clube e com um
financiamento contraído junto do BES (no montante de cerca de 80.000 cts), tendo sido
emitida uma letra ou uma livrança como garantia, avalisada pelas mesmas sete pessoas.
Esta livrança ou letra foi sendo paga parcialmente e foi finalmente liquidada
com as receitas provenientes de um sorteio.
Os bilhetes desse sorteio foram distribuídos pelos sete avalistas mais alguns
elementos que se disponibilizaram para os distribuir.
Os bilhetes não vendidos foram pagos pelos mesmos sete elementos, sendo certo
que o depoente pagou o valor correspondente a 1.600 cts, à razão de 1.000$00 por
bilhete (1.600 bilhetes). As somas pagas não foram exactamente iguais em relação a
todos os elementos, pois esses sete elementos pagaram o valor correspondente a 1.600
bilhetes, ao passo que os outros elementos pagaram de acordo com as respectivas
disponibilidades financeiras.
O arguido Júlio Faria também participou, ignorando quanto é que ele liquidou,
mas tem a ideia que ele terá ficado com 1600 bilhetes.
Não sabe o que ele fez aos bilhetes que levou, mas o certo é que o dinheiro
correspondente ao seu valor foi entregue no clube.
Ele também participou nas amortizações daquele título de crédito (sendo certo
que ao todo despenderam cerca de 50.000 cts dos respectivos bolsos).
O FCF ia buscar as suas receitas à publicidade estática e sonora no estádio, à
publicidade nas camisolas, à venda dos bilhetes e às comparticipações efectuadas pela
indústria no âmbito de peditórios.
A “Resin” tinha publicidade estática no estádio (existe um contrato de
publicidade a esse propósito) e tem a ideia que essa empresa devia a esse título 20.000
cts., quantia que entretanto liquidou. Nessa altura o depoente não fazia parte da direcção
do clube. Esse montante era o que a “Resin” se tinha comprometido a pagar, sendo
certo, porém, que nunca viu o aludido contrato de publicidade.
Explicou que o FCF tinha uma prestação de 50.000 cts que tinha de pagar à
CCAM e que, segundo ouviu dizer, a “Resin” comprometeu-se a dar 20.000 cts.
A “Zima”, por seu turno, prometeu à testemunha Álvaro Costa contribuir com
30.000 cts, segundo lhe disse alguém da direcção do clube (cuja identidade agora não
consegue precisar).
Foram contactadas todas as indústrias de Felgueiras e algumas fora da área do
concelho nos peditórios que então fizeram em grupos de 2, 3 ou 4 elementos.
O arguido Júlio Faria chegou também a pedir donativos para o FCF, sendo certo
que, segundo se lembra, nunca foi com ele fazer esses peditórios, que ocorreram
sobretudo entre Agosto de 1996 e Maio de 1997).
À data desses peditórios o arguido Júlio Faria era o presidente da Direcção do
clube e a arguida Fátima Felgueiras presidente da Assembleia Geral.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Recorda-se aliás da arguida Fátima o ter acompanhado duas ou três vezes a duas
empresas em Barrosas e em Torrados no sentido de solicitarem donativos para o FCF
(não se recorda em que ano, tendo a ideia que foi em 1997, sendo certo que ela já era
presidente da CMF e os donativos reportavam-se à época desportiva de 1996/97; tem
em todo o caso a ideia que foi em 1997 na medida em que os peditórios intensificavam-
se normalmente no final da época desportiva).
Todos os felgueirenses sabiam que o clube tinha grandes dificuldades
financeiras.
*
Em face destas declarações a arguida Fátima Felgueiras referiu que enquanto
vereadora com competências na área cultural e do desporto, foi-lhe apresentada uma
proposta para que Felgueiras participasse nos “Jogos Sem Fronteiras” e que fosse
organizada em Felgueiras uma etapa da “Volta a Portugal em Bicicleta”. Como a CMF
não tinha fundos contactaram empresas para os obter, sendo certo que a testemunha
Fernando Lima auxiliou nos contactos com alguns empresários.
Nega porém que lhe tenham entregue qualquer quantia, pois era a organização
que recebia as contribuições.
Enquanto presidente da CMF e da Assembleia Geral do clube fez várias
reuniões na Biblioteca Municipal para angariar fundos.
Nega ter andado com a testemunha Fernando Lima na angariação de fundos para
o FCF.
*
A testemunha Fernando Lima, por seu turno, manteve o que disse,
confirmando que aquando das visitas às empresas nunca receberam dinheiro, pois um
funcionário do FCF é que posteriormente se dirigia às empresas para recolher o
donativo, sendo certo que por vezes já se sabia com quanto é iriam contribuir. Tem a
ideia de terem arrecadado dois ou três mil contos.
*
O arguido Júlio Faria, por seu turno, referiu que se tratou de uma livrança (e
não de uma letra) o título de crédito aceite pelo FCF à CCAM e avalisado por dirigentes
do clube, confirmando o depoente que foi um dos avalistas, apesar de apenas ser
presidente da Assembleia Geral do clube (não fazia parte da Direcção à data).
Quando foi celebrada a transacção entre o FCF e a CCAM a testemunha
Fernando Lima já não era dirigente do FCF (tem a ideia que ele se demitiu em Maio de
1997). Em todo o caso ia-lhe sendo dada nota do que se passava a esse propósito na
medida em que ele foi uma das pessoas demandadas por causa de dívidas do FCF.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se foi o depoente quem lhe contou
que esperavam da “Resin” uma contribuição de 20.000 cts, referiu que é possível que
lhe tenha transmitido a forma como se propunham resolver o problema do pagamento
da prestação de 50.000 cts respeitante ao contrato de transacção entre o FCF e a CCAM,
sendo certo que o depoente ficou incumbido de procurar obter junto da “Resin” um
esforço suplementar desta empresa ao nível da publicidade, tendo-se feito acompanhar
do arguido Horácio Costa na visita que a propósito efectuou às instalações da “Resin”,
onde lhe solicitou uma verba de 20.000 cts, montante que estava em falta para que se
liquidasse na íntegra a referida prestação.
*
O arguido Horácio Costa referiu que se recorda da família da testemunha
Fernando Lima, pois os pais deste eram clientes da mercearia dos pais do depoente,
sendo certo porém que não tinha qualquer contacto com ele.

524
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confirmou que a testemunha em causa se deslocou com a arguida Fátima


Felgueiras no sentido de contactar empresas para obter donativos para o FCF, sendo
certo que essas visitas ocorreram no período da campanha eleitoral de 1997, na medida
em que quando visitaram as mesmas empresas alguns empresários referiram ao
depoente e ao arguido Joaquim Freitas que já tinham recebido a visita da arguida Fátima
e da testemunha Lima (deslocavam-se na viatura deste, um “BMW, série 5”, preto) no
sentido de contribuírem para o FCF e mostravam-se algo desagradados por novamente
lhe solicitarem donativos, desta feita para a campanha eleitoral.
A testemunha Júlio Pereira fazia a contabilidade dos donativos para o FCF e por
vezes deslocava-se ao GAPP a esse propósito.
*
- Testemunha Fernando Ferreira Sampaio
É director desportivo, de 1998 a 2001 foi chefe do Departamento de Futebol do
FCF e presidente da Direcção desse clube de Julho de 2003 a Março de 2005.
Em 1998 foram-lhe dadas a conhecer situações acerca da situação financeira do
FCF.
Foi informado da existência de uma dívida do clube à CCAM e que havia uma
livrança num valor que rondava os 110/113.000 cts, com avalistas.
Esse crédito havia sido contraído devido às obras efectuadas no estádio por força
da subida à 1ª Divisão Nacional de Futebol.
Havia a expectativa de um financiamento a curto prazo por parte do poder
central.
Houve uma acção intentada pela CCAM contra os avalistas (não tem a certeza se
também foi intentada contra o FCF).
A livrança referida foi paga, sendo certo que em 1998 já havia sido pedido um
financiamento ao BES para a liquidar, tendo sido emitida uma nova livrança no valor de
100.000 cts. Por conseguinte, em 1998 a dívida à CCAM já havia sido liquidada, mas
faltava liquidar a quantia de 70.000 cts ao BES.
Havia uma comissão de apoio à Direcção (cerca de 10 a 12 pessoas), sendo certo
que alguns dos seus elementos eram avalistas, os quais procuraram angariar fundos
junto de empresários e fornecedores, tendo sido ainda efectuados sorteios.
Na altura de Natal faziam um sorteio cujo primeiro prémio era um automóvel.
Não conseguiram porém vender todos os bilhetes emitidos.
Cada um assumiu a passagem de um determinado número de bilhetes. O valor
total dos bilhetes emitidos era de 20.000 cts, quantia necessária para fazer face a duas
tranches trimestrais de 7.500 cts cada (a liquidar ao BES).
O arguido Júlio Faria era um dos avalistas na livrança referente ao BES (não o
era na letra referente à CCAM).
Ficou estipulado que quem não conseguisse passar os bilhetes que lhe foram
atribuídos teria de suportar o respectivo custo.
O depoente pressionou o arguido Júlio Faria a ficar com bilhetes (ele era o
presidente da Direcção), apesar dele lhe ter retorquido “como é que eu vou passar
bilhetes em Lisboa?”
Assim, ele levou 1850 bilhetes, tendo emitido um cheque datado de 08.10.98 no
valor de 1.850 cts.
Esse dinheiro serviu em parte para amortizar a dívida ao BES (1.600 cts) e outra
parte (250 cts) serviu para amortizar uma conta caucionada no BNU.
O FCF e a CCAM fizeram no notário um acordo (para regularizar a dívida
existente).

525
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em Julho de 1998 esse acordo estava praticamente concluído, tendo sido


celebrado mais tarde, talvez em Setembro (cfr. o documento de fls 109 e ss. do apenso
14, datado de 15.09.98).
Os 75.000 cts que faltavam liquidar foram garantidos através da emissão de uma
livrança que foi avalizada por 11 pessoas (deram como meio de pagamento um terreno
do clube, avaliado em 100.000 cts, sendo certo que o remancescente deveria ser
liquidado em prestações).
Em 1998 o FCF já havia descido à 2ª Divisão há dois ou três anos. O
desiquilíbrio financeiro do clube ocorreu sobretudo no ano após a descida de Divisão,
quando com receitas de 2ª Divisão tinham de fazer face a contas de 1ª Divisão.
O Júlio Faria não era um “homem do futebol”. Ele já tinha sido presidente da
Assembleia Geral do clube e em face da descida de Divisão ele foi “empurrado” para a
Direcção do FCF. No período em que ele fez parte da Direcção ele ia quase sempre aos
jogos.
Viu no estádio o arguido Horácio Costa em duas ocasiões, uma vez no camarote
presidencial e outra vez com o arguido Bragança num dos camarotes (ambas na época
desportiva 1998/99).
Sabe que os arguidos Horácio Costa e Júlio Faria procuraram arranjar 20.000 cts
junto da “Resin”, mas que depois o FCF passou uma factura no valor de 12.500 cts +
IVA (nunca percebeu porquê), sendo certo que 30.000 cts foram dados pela “Zima”
(tendo-lhe sido emitida uma factura). Não sabe quem entregou primeiro o dinheiro, se a
“Zima” se a “Resin”. O Dr. Barata Feio é quem melhor sabe esclarecer esses
pormenores.
Recorda-se que perto dos finais de Dezembro de 98 o FCF emitiu uma factura
de 20.000 cts à “Resin”.
Segundo lhe contou o Dr. Barata Feio, ele foi contactado telefonicamente pelo
arguido Horácio no dia seguinte ao da emissão dessa factura, no sentido de que deveria
ser emitida outra factura no montante de 12.500 cts, tendo sido anulada a factura de
20.000 cts.
Um ou dois dias depois a testemunha Barata Feio e a testemunha Figueiredo
dirigiram-se à CMF, tendo recebido do arguido Horácio um cheque de 12.500 cts e em
numerário a quantia de 7.500 cts, o qual, segundo lhe disse o Dr. Barata Feio, lhe pediu
para conferir o dinheiro, pois ele (Horácio) ainda o não tinha feito. De imediato essa
verba foi depositada na conta do FCF (eles saíram da CMF e foram logo ao “Banco
Totta & Açores”).
Não sabe qual é a proveniência dos 7.500 cts em numerário.
Inicialmente (não sabe quando) estava prevista uma contribuição da “Resin” no
valor de 20.000 cts. Em todo o caso, em Julho de 1998 (quando o depoente entrou para
o FCF) as diligências já haviam sido feitas pelos arguidos Horácio e Júlio Faria junto da
“Resin”, segundo foi informado.
Quando o depoente foi para o FCF existia um contrato de publicidade celebrado
entre o FCF e a “Resin” no valor de 2.500 cts.
Os 12.500 cts dados pela “Resin” foram-no a título de publicidade (concerteza
que existiria um contrato nesse valor ou de 20.000 cts, não tem a certeza, não sabendo
de que data).
A prestação de 50.000 cts vencia-se afinal em Setembro de 1998, mas só foram
entregues em Dezembro desse ano, daí que pensasse que teria essa quantia de ser
liquidada no prazo de 90 dias a contar da data da celebração do acordo.
Tem a ideia que nenhuma quantia foi entregue até 30.09.

526
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

As facturas emitidas pelo FCF a empresas do concelho eram entregues


normalmente em mão.
Tem a ideia que a factura emitida à “Resin” foi entregue ao arguido Horácio
Costa.
Normalmente com as facturas eram enviados os recibos, mas neste caso não
sabe.
Mesmo no caso de donativos não eram feitos agradecimentos.
Em 2000 o clube foi declarado instituição de utilidade pública, muito por acção
do arguido Júlio Faria, o que permitia que os donativos concedidos fossem considerados
para efeitos fiscais.
O depoente ia todas as semanas à CMF entregar convites (entregava-os à D.
Leonor).
Conhecia o arguido Horácio da Costa da CMF (ele era assessor da presidente da
CMF), o qual ocupava um gabinete, perto da recepção do GAPP (à entrada do lado
direito).
Sabe que ele era assessor da arguida Fátima e que depois foi vereador porque
ouviu essas informações na “praça pública”.
Foi confrontado com o documento de fls 465 do 1º volume (factura nº 1583,
emitida pelo FCF à “Resin”a 30.12.98, no valor de 20.000 cts e referente a donativo),
confirmando ser a factura que referiu.
Confrontado com a missiva de fls 464, datada de 30.12.98 (com a qual se enviou
a factura referida e se agradeceu vivamente a comparticipação), referiu que não é
qualquer empresa que dá uma contribuição nessa ordem de valores.
Não se recorda de agradecimentos por escrito.
Recorda-se de elaborar cartas a solicitar o pagamento da publicidade. Esta era
feita mais para ajudar o clube, visto que as empresas não iriam retirar dessa publicidade
grandes dividendos.
O depoente fez muitos quilómetros de porta em porta a pedir donativos,
acompanhado de um colega da Direcção.
Foi confrontado com a factura de fls 427 (factura emitida pelo FCF à “Resin”,
alusiva a donativo, no valor de 12.500 cts e datada de 30.12.98, a qual também foi
anulada), tendo referido que a não conhecia.
Finalmente foi confrontado com a factura nº 1596, no valor de 12.500 cts + IVA,
alusiva a publicidade no estádio e datada de 31.12.98.
Referiu, a propósito, que a “Resin” liquidou o IVA referente à factura de 12.500
cts mais tarde (não sabe porquê).
*
O arguido Horácio Costa referiu então que, no que se refere ao futebol, apenas
cumpriu as ordens da arguida Fátima Felgueiras.
Reafirmou que se deslocou com o arguido Júlio Faria à “Resin” em Setembro de
1998.
Nega que lhe tenham entregue qualquer factura do FCF com destino à “Resin”.
Quando a testemunha Fernando Ferreira Sampaio ia à CMF os assuntos eram
tratados no GAPP ou com a arguida Fátima Felgueiras.
Reafirmou que nunca foi ao estádio assistir a alguma partida de futebol.
Chegou a ir ao estádio a propósito das “Figueiríades” e é natural que a
testemunha o tivesse visto nessa altura.
Em 1998 era assessor da arguida Fátima (só em 1999 entrou para a vereação) e
os convites eram dirigidos a ela, aos vereadores e ao presidente da Assembleia
Municipal de Felgueiras.

527
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Participou numa reunião com os veradores, com os arguidos Fátima Felgueiras e


Júlio Faria e ainda com Frederico Lima, no gabinete da arguida Fátima, onde se
discutiram questões relacionadas com a aquisição do Estádio Dr. Machado Matos,
negócio a que se opôs, facto que lhe trouxe dissabores. Por isso, também não se sentiria
bem em usar um convite para ir assistir a uma partida de futebol.
Referiu ainda que ficou sem advogado em face de uma carta enviada pelo Dr.
Melo (defensor do arguido Júlio Faria) ao Dr. Pedro Martinho, pressionando o depoente
a mudar o seu depoimento no que toca ao donativo de 20.000 cts concedido pela
“Resin” (cfr. em todo o caso as missivas trocadas entre os respectivos mandatários,
juntas entretanto aos autos já na fase de julgamento).
*
- Testemunha Luís da Costa Lima
Sempre residiu em Felgueiras e exerceu alguns cargos políticos.
Foi membro da Assembleia Municipal de Felgueiras de 1996 até 2005.
É vereador da CMF (eleito nas listas do PSD) desde 2005.
Foi vogal do Conselho Fiscal da CCAM entre 1998 e 2000 (ao que pensa).
Foi presidente do Conselho Fiscal do FCF durante duas épocas desportivas (tem
a ideia que por volta dos anos 2000 e 2001).
Houve um período de euforia quando o FCF subiu à 1ª Divisão Nacional de
Futebol (pensa que foi em 1995/96). Nessa altura o depoente não estava ainda no clube.
Devido à subida de divisão foi necessário levar a cabo obras avultadas no
estádio (que custaram cerca de 300.000 cts, sendo certo que só as torres de iluminação
custaram 150.000 cts, para além do custo das novas bancadas e do relvado),
investimento para o qual o clube não dispunha de fundos, tendo assim recorrido ao
crédito bancário.
Esses investimentos foram feitos no pressuposto de que existiria financiamento
público, mas os projectos são submetidos à apreciação e não são logo aprovados. Em
todo o caso, esses projectos acabaram por ser aprovados, segundo lhe disseram. Nesse
período porém o Governo mudou, o que prejudicou as pretensões do FCF.
Chegou a ver alguns desses projectos (não se recorda agora se respeitantes às
torres de iluminação se às bancadas), tendo existido outros projectos, segundo lhe
disseram elementos da Direcção, existindo, como disse, a expectativa de que viessem a
ser aprovados, o que sucedeu, mas o financiamento não se concretizou.
Não tem a certeza se os apoios pedidos o foram apenas ao Poder Central.
Como disse, o clube recorreu ao crédito bancário, sobretudo à CCAM.
Não sabe de que forma os créditos foram garantidos.
Normalmente as pessoas ligadas ao FCF eram industriais e com crédito firmado
na praça e por isso com facilidade no recurso ao crédito. Assim, normalmente, como
forma de garantia, os directores dão o seu aval.
A certa altura a CCAM exigiu o pagamento dos créditos concedidos, o que
obrigou o FCF a procurar financiamento junto de outra instituição de crédito, como por
exemplo o BES (transformando assim créditos de curto prazo em créditos de médio
prazo e em condições mais vantajosas).
É nesse contexto que surge a livrança referida nos autos (acerca da qual não tem
conhecimento directo, tendo a ideia que terá um valor de 150.000 cts).
Explicou que depois da CCAM ter sido intervencionada e de ter uma nova
direcção a política seguida por essa instituição foi a de accionar todos os créditos de
cobrança mais difícil. Foi assim interposta uma acção judicial, onde inclusivamente os
avalistas foram accionados.

528
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esses créditos foram liquidados à CCAM através de dinheiro proveniente de um


financiamento concedido por outra instituição bancária e pela dacção em cumprimento
de um terreno.
Essas informações colheu-as na altura em que fez parte do Conselho Fiscal da
CCAM, não tendo chegado a ver a acção judicial que referiu.
Por alturas do Natal de 1998 o FCF levou a cabo um sorteio de um automóvel, o
qual se recorda de ver em exibição no estádio (prémio que acabou por ser atribuído ao
contemplado).
Sabe que todos os elementos da Direcção distribuíram entre si cadernetas de
bilhetes e que os procuraram colocar. É assim natural que o arguido Júlio Faria também
tivesse ficado com bilhetes.
Era aliás natural que os elementos da Direcção do clube se responsabilizassem
pela venda dos bilhetes que lhes coubessem, adiantando a verba correspondente.
Nessa altura o arguido Júlio Faria era presidente ou da Direcção ou de uma
Comissão Administrativa.
O clube financiava-se muito à custa das empresas locais e empresas que
operavam no concelho.
O orçamento anual do clube poderia ir de 200 a 400.000 cts.
Porém, as receitas do clube eram insignificantes (provenientes de publicidade,
venda de bilhetes e quotas dos sócios).
Assegurou que enquanto presidente do Conselho Fiscal do clube o depoente
preocupava-se com a tarefa que lhe estava adestrita. Quando ingressou no FCF o clube
atravessava por dificuldades financeiras, daí que não tenha sido uma decisão fácil ter
aceite o convite para integrar aquele órgão, sobretudo porque o presidente da Direcção,
o presidente do Conselho Fiscal e o presidente do Departamento de Futebol eram
solidariamente responsáveis pelas dívidas do clube ao Fisco e à Segurança Social.
Periodicamente o depoente reunia com os responsáveis da contabilidade do FCF
para ter a certeza de que os impostos estavam a ser liquidados e que todos os
compromissos estavam a ser cumpridos.
O FCF aderiu ao “Plano Mateus” para regularizar as dívidas que tinha perante o
Fisco e a Segurança Social.
A expectativa que tinha era de que o FCF continuasse a ser, com dignidade, um
embaixador do concelho, ainda que em divisões inferiores.
Não sendo um “homem do futebol”, não estava presente nas reuniões da
Direcção do FCF.
Apesar de ter lugar cativo no estádio e de ter acesso ao camarote da Direcção do
clube, só assistiu a duas partidas de futebol.
*
O arguido Júlio Faria referiu então que o FCF tinha débitos provenientes de
contas a descoberto e que deram origem a vários processos judiciais em 1996 e 1997,
em que os réus eram o FCF, vários ex-dirigentes do clube e também a CMF (era à data a
dona do terreno onde estava construído o Estádio Dr. Machado Matos). Nessas acções o
depoente não foi um dos demandados pois na altura em que esses débitos foram
contraídos não era dirigente do clube.
Já enquanto presidente da Direcção do FCF, o depoente procurou encontrar uma
solução para esse problema, o que sucedeu com a celebração da transacção referida nos
autos, celebrada em Setembro de 1998, consolidando-se a dívida no montante de
325.000 cts.
Por outro lado, foi o financiamento que o FCF obteve da CCAM no valor de
100.000 cts que deu origem à livrança de 113.000 cts (e não de 150.000 cts), avalisada

529
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pelo depoente, pois era presidente da Assembleia Geral do FCF (era na altura presidente
da CMF), e por outros elementos da Direcção do clube.
Tal livrança foi sendo amortizada pelo FCF e pelos seus dirigentes, valendo-se
de um financiamento concedido pelo BES.
Tratou-se de um financiamento que se pretendia liquidar quando o clube
obtivesse o financiamento público, mercê das candidaturas referentes às obras no
estádio em consequência da subida à 1ª Divisão Nacional de Futebol.
Houveram membros do Governo de então (designadamente o Secretário de
Estado Marques Mendes) que no Verão de 1994 publicamente comprometeram-se a
apoiar o clube.
O FCF apresentou essas candidaturas, mas as mesmas não foram devidamente
encaminhadas, e com a alteração de Governo as expectativas foram por água abaixo.
A testemunha Luís Lima, enquanto presidente do Conselho Fiscal do FCF,
conversou com o depoente, tendo-lhe então dado conta da situação financeira do clube,
dos objectivos a prosseguir e das formas de se ultrapassar a crise. Deu-lhe conta ainda
da intenção de se constituir a SAD.
*
A testemunha Luís Lima, por seu turno, confirmou o teor das conversas que
teve com o arguido Júlio Faria acerca do FCF.
Acrescentou que é natural que o arguido Júlio Faria tenha mais presente os
factos em causa e que os apresente de forma mais estruturada.

A “caixa paralela”:

Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu desconhecer qualquer caixa paralela, sendo certo que tal não era usual a
propósito das campanhas eleitorais (era apenas habitual a abertura de uma conta
bancária).
Não sabe se a dita “caixa paralela” – a ter existido – teve alguma coisa a ver com
a campanha eleitoral das autárquicas de 1997.
A propósito dos 1550 bilhetes referentes a um sorteio promovido pelo FCF,
negou tê-los adquirido (a título pessoal, quando muito, comprou 2 ou 3 bilhetes), sendo
certo que o FCF realizou muitos sorteios como forma de angariar fundos.
Que tenha conhecimento, a CMF nunca adquiriu bilhetes.
Quanto à quantia de 1.850 cts depositada numa conta particular do arguido Júlio
Faria, tratou-se do reembolso de uma quantia por ele adiantada para pagamento de uma
despesa efectuada no âmbito da campanha eleitoral.

- Arguido Horácio Costa


Confirmou os valores das entradas e das saídas conforme expresso na pronúncia.
Quanto à função da “caixa paralela” não pôs em causa o que a propósito é
referido na pronúncia.

Análise crítica
Quanto à matéria constante do intróito, teve-se em consideração o extracto
bancário da conta do BES, constante do apenso 1, em conjugação com as declarações
prestadas pelo arguido Horácio Costa, o qual explicou de que forma foram gastas as
verbas depositadas em tal conta, socorrendo-se para o efeito de variada documentação

530
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

aquando da sua tomada de declarações, designadamente constante dos apensos 1 e 4,


onde apunha anotações a propósito dos vários pagamentos efectuados.
Por outro lado, já tivemos a oportunidade de expressar a nossa convicção acerca
de alguns dos pagamentos efectuados, designadamente no que respeita à aquisição do
“Audi A4” referido nos autos, matéria que mais à frente iremos dar particular atenção.
a) A matéria em questão nesta alínea foi confirmada com conhecimento de causa
pelo arguido Horácio Costa, em conjugação, designadamente, com os documentos de fls
9 a 51, 90, 101, 146, 129, 138 e 213 do apenso 1, bem como fls 102, 103 e 104 do
apenso 4, documento de fls 30 do apenso 21 e ainda o quadro de fls 2786 a 2796 do 12º
volume dos autos, além de muita outra documentação referenciada por esse arguido e
constante designadamente no 1º volume dos autos e nos apensos 1 e 4 (cfr. por ex. os
documentos de fls 22, 71, 74, 86, todos do apenso 4; cheque de fls 120 do apenso 1,
emitido a favor do arguido Júlio Faria; cheque de fls 137 do apenso 1 em conjugação
com o “post-it” de fls 171 da autoria do arguido Júlio e das declarações da testemunha
Orlando Sousa; o reembolso de despesas do PS adiantadas pelo arguido Júlio Faria,
conforme documentos de fls 73 a 75 e 166 do 1º volume e de fls 197 e 199 do apenso 1
– o arguido Júlio apenas se recorda das circunstâncias em que foi reembolsado da verba
de 57.090$00, sendo certo que quanto à emissão do cheque de fls 72 do 1º volume, no
montante de 600 cts, não se obteve qualquer explicação; rendas devidas pelo PS e pagas
aravés da conta do BES, conforme documentos de fls 90, 101 e 146 do apenso 1; e
documento de fls 76 do 1º volume, respeitante ao pagamento de 1850 bilhetes referentes
a um sorteio promovido pelo FCF em Dezembro de 1998).
A propósito do pagamento de despesas da “ADEC” e do “Sovela”, consta dos
autos a lista de fls 357, a que se seguem vários documentos de suporte à mesma
(fornecidos pelo arguido Horácio Costa), donde emerge que boa parte dos pagamentos
do “Sovela” foram efectuados através de fundos depositados na conta do BES referida
nos autos.
Foram também efectuados pagamentos à “Proeme”/”Portcom” com fundos
dessa conta (cfr. o recibo de fls 359 e documentos de fls 110, 179, 185 e 198, todos do
apenso 1).
Ainda a propósito do pagamento de despesas de várias campanhas eleitorais –
com destaque para a campanha de 1997 referente às eleições autárquicas - e do PS
através da conta do BES ou da “caixa” foram ouvidas várias testemunhas,
designadamente as testemunhas Carlos Araújo (da firma Araújo e Araújo, Ldª, que
instalou o ar condicionado a que se reporta o orçamento de fls 173 dos autos, tendo
obtido o respectivo pagamento conforme se constacta pelos documentos de fls 473 dos
autos e de fls 56 do apenso 1, no valor de 776.000$00, sendo certo porém que o serviço
foi facturado – indevidamente -, segundo instruções recebidas, à “Marfel”, conforme
documento de fls 474; a este propósito, cfr. os esclarecimentos prestados pelo arguido
Horácio Costa e pela testemunha Horácio Reis); Jorge Pimentão (técnico de
comunicações da firma “Audiomédia”, a qual executou um serviço para a campanha
eleitoral de 1997, conforme facturas de fls 183 e 185, esta última remetida na sequência
da intervenção da testemunha Manuel Seabra no sentido da obtenção do pagamento
devido, conforme documentos de fls 182 e 184, pagamento esse que foi efectuado
conforme se constacta do teor da cópia do cheque então emitido, constante de fls 186
dos autos); José Júlio da Silva Pereira (a propósito do pagamento de pequenas despesas
do PS, como por exemplo despesas de correio – cfr. fls 3 a 8, 18 35, 206, 222 e 223 do
apenso 4 e documentos de fls 73, 208 e 209 do apenso 1 -, despesas de água e luz – cfr.
documento de fls 187 do 1º volume -, despesas de correio relativas às eleições europeias
– cfr. documento de fls 219 do apenso 4 - e despesas de expedição de fax e correio – cfr.

531
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

documento de fls 2 do apenso 4), Henrique Manuel da Silva Correia (em conjugação
com o quadro de fls 2786 a 2796) e Carlos Alves (em conjugação com o quadro de fls
2786 a 2789).
b) A propósito das incidências da aquisição da viatura “Audi A4”, cabe desde
logo referir que o Tribunal atribuiu credibilidade à posição expressa pelo arguido
Horácio Costa, para cujas declarações – acima reproduzidas por súmula – remetemos
(cfr. ainda a informação de fls 103 e documentos de fls 104 a 106 dos autos, bem como
o depoimento das testemunhas José Meireles da Costa Rodriguies e Carlos Santos).
Mais uma vez realça-se a assertividade do depoimento do arguido Horácio.
O depoimento do arguido Joaquim Freitas, por seu turno, não poderá ser
valorado, pelas razões que já deixamos expressas.
Por outro lado, parece-nos bem evidente que a arguida Fátima acompanhou os
arguidos Horácio e Joaquim ao “stand” da firma “Machado & Costas, SA” aquando da
entrega da viatura, pois só assim se percebe o episódio relatado, designadamente pelo
arguido Horácio Costa, de que ela exigiu que a firma vendedora retirasse da carroçaria
do dito “Audi A4” o respectivo logotipo, o que logo foi feito na hora, pois entendia que
tal era “parolo”.
Quis-nos parecer, aliás, a esse propósito, que a testemunha Carlos Santos,
funcionário dessa empresa, não relatou ao Tribunal tudo o que sabe quando à presença
da arguida Fátima aquando da entrega da viatura adquirida por ela.
Por outro lado, a “história” contada, designadamente pela arguida Fátima
Felgueiras e pelo seu ex-marido (mas com quem ainda vive no mesmo apartamento), a
testemunha Sousa Oliveira (a qual aliás revelou não ter qualquer distanciamento
emocional em relação aos factos em causa, pois as “dores” da sua ex-mulher, neste
particular, são também as suas), afigurou-se-nos altamente inverosímel, isto é, que a
compra dessa viatura se deveu a uma repartição equitativa dos bens comuns do casal, na
sequência do respectivo divórcio, tendo o arguido Joaquim Freitas adiantado a verba
necessária para que essa aquisição se concretizasse, com a obrigação de posteriormente
a testemunha Oliveira lhe devolver essa quantia (o que até hoje não sucedeu porque o
dito Joaquim ainda não lhe solicitou essa verba...), com excepção do custo dos estofos
em pele, alegadamente oferecidos pelo “benemérito” Joaquim.
Acerca da proveniência dos fundos que permitiram a aquisição dessa viatura e o
pagamento do respectivo seguro (seguro efectuado através da testemunha Palhares em
Fafe – cfr. documentos de fls 80 a 83, relativos ao seguro, e de fls 289 do apenso 4,
relativo ao respectivo pagamento), já tivemos a oportunidade de expressar a nossa
convicção (relaciona-se com a entrega pela “Resin” da quantia de 5.250 cts,
consubstanciada num “retorno” de um dos pagamentos efectuados pela CMF à
“Norlabor”, ou melhor, à “Resin”, com intervenção de permeio da “Translousada”, o
que só se compagina com uma tentativa, aliás não conseguida, de encobrir o rasto do
dinheiro).
Quanto à “história” contada e já sintetizada em traços muito gerais, começa a
mesma desde logo por ser inverosímel em face dos documentos de fls 77 do 1º volume
(um cheque de 1.000 cts da conta do BES e o restante titulado por um cheque sacado
sobre a conta pessoal arguido Horácio, domiciliada na agência de Fafe do Banco Mello,
no valor de 4.700 cts, montante esse que havia sido depositado nessa conta pessoal a
28.07.98, conforme documento de fls 79 do 1º volume, sendo certo que 50 cts referentes
a esse depósito – no valor global de 4.750 cts - trata-se de um presente de aniversário
recebido pelo arguido Horácio do seu sogro, montante que assim depositou juntamente
com os 4.700 cts, o que é verosímel na medida em que esse arguido faz anos no dia
27.07.).

532
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Se essa versão dos factos contada pela arguida Fátima e pela testemunha
Oliveira fosse verídica, como explicar então que 1.000 cts se reportem a fundos
depositados na conta do BES (cfr. ainda o extracto respectivo a fls 32 do apenso 1) e
que o restante seja proveniente da conta particular do arguido Horácio (montante que
tinha sido depositado na sua conta pessoal nas circunstâncias referidas por ele)? A
arguida Fátima, mais uma vez, adoptando a postura da vitimização e da cabala, sustenta
ser alheia a tudo isso e que tudo terá sido urdido (pelos arguidos Horácio e Joaquim)
para dar aos factos a aparência que deles consta da pronúncia (numa altura em que as
“comadres” eram unha com carne?).
Por outro lado, a testemunha Sousa Oliveira foi surpreendida (conforme emerge
das suas declarações) com a venda do “BX” referido nos autos e com a intenção da
arguida Fátima em adquirir o “Audi A4”, o que aliás só soube por terceiros. Isto é, ele
não foi tido nem achado nessas decisões, mas elas prendiam-se com a repartição
equitativa dos bens comuns do casal na sequência do respectivo divórcio?!...
E que dizer dos depoimentos “encomendados” das testemunhas Fernando
Marinho e António Celestino Magalhães da Silva e do “surpreendente” testemunho do
Sr. Conselheiro Almeida Lopes?
c) Acerca do adiantamento recebido pela “Resin” e do donativo de 20.000 cts
concedido por essa empresa ao FCF pouco mais haverá a dizer para além do que já, a
esse propósito, acima se deixou expresso.
Seja como for, terá sido o arguido Júlio Faria, acompanhado pelo arguido
Horácio (por determinação da arguida Fátima), quem terá solicitado esse apoio à
“Resin”, na pessoa do arguido Vítor Borges, em Setembro de 1998, conforme
declarações prestadas pelo arguido Horácio Costa, a que demos crédito pelas razões já
explicitadas.
Não se provou, em todo o caso, que a arguida Fátima tenha contactado
directamente, a esse propósito, com o arguido Vítor Borges, pois tal não emergiu de
nenhum dos depoimentos proferidos a esse propósito.
Do resultado desse encontro deu naturalmente o arguido Horácio conhecimento
à arguida Fátima, conforme explicou, o que de todo é verosímel na medida em que, por
um lado, foi por determinação dela que ele acompanhou o arguido Júlio a Matosinhos à
sede da “Resin” e, por outro lado, ela era pessoa empenhada na angariação de fundos
para o FCF (como o demonstram os vários documentos constantes nos autos alusivos à
angariação de fundos para esse clube e que foram, designadamente, apreendidos no
GAAP), tanto mais que era presidente da respectiva assembleia geral (nessa medida, é
credível a alegação contida nos artgs 58º a 61º da sua contestação).
Pese embora não se tenha demonstrado que a “Resin” desde logo se tenha
comprometido a apoiar o FCF com um donativo de 20.000 cts (isso não resultou das
declarações prestadas pelos arguidos Vítor Borges, Júlio Faria e Horácio Costa), embora
tenha sido esse o montante solicitado, comprometendo-se pelo menos a apoiar o clube
em face das suas disponibilidades financeiras, o certo é que com propriedade se pode
concluir que a mesma fez depender a concessão do donativo solicitado do recebimento
do “adiantamento” referido, conforme parece emergir do manuscrito de fls 170, da
autoria do arguido Júlio Faria.
Já depois da solicitação desse donativo, a “Resin”, por pessoa cuja identidade
não foi possível apurar, remeteu o fax de fls 223 e 224 do apenso 20 (a 27.10.98), tendo
o conselho de administração da AMVS autorizado o desconto de uma factura junto de
uma instituição de crédito, no montante correspondente ao adiantamento da empreitada
referida no ponto 1.5 da pronúncia, desde que à dita associação não fossem imputados

533
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

juros de mora pela sua não liquidação nos prazos previstos (cfr. fls 269 do apenso 12),
decisão que terá sido comunicada a 06.11.98.
Note-se que no documento de fls 223 do apenso 20, por debaixo do lugar
destinado à assinatura, consta a letra de máquina o nome do arguido Gabriel Almeida,
mas a assinatura manuscrita não parece corresponder à sua (parece aliás referir-se ao
arguido Carlos Marinho – veja-se em todo o caso as assinaturas empregues na outorga
das respectivas procurações, a fls fls 2130 e 3666 dos autos). Daí que, em face das
dúvidas existentes, não se tenha apurado quem da “Resin”, em concreto, terá remetido
esse fax.
Nesse mesmo dia o arguido Júlio Faria remeteu ao arguido Horácio o
manuscrito de fls 170 dos autos, em face do qual se pode concluir que existiria um canal
de comunicação entre a “Resin” e o arguido Júlio e entre este e a AMVS, apesar de, à
data, ser já deputado à Assembleia da República.
Não se demonstrou porém que tenha sido o arguido Barbieri Cardoso e a arguida
Fátima quem terão informado o arguido Júlio de que podia comunicar à CCAM que o
problema do pagamento do remanescente da prestação vencida em 30.09.98 seria
resolvido a breve trecho, na medida em que os arguidos Barbieri Cardoso e Fátima
Felgueiras negaram esse facto e sobre essa matéria resulta do depoimento do arguido
Júlio Faria que ele teve esse conhecimento por comunicação ou da “Resin” ou do
arguido Horácio Costa (do depoimento deste último não resulta porém que tenha sido
ele a dar essa informação ao arguido Júlio). Ignoramos pois quem forneceu ao arguido
Júlio Faria a dita informação.
Aliás, em boa verdade, ignoramos de que modo o arguido Júlio Faria soube que
o adiantamento ao consórcio liderado pela “Resin” havia sido autorizado, mas, segundo
o arguido Júlio Faria, ele terá sido contactado ou pelo arguido Horácio Costa ou pela
“Resin”, informando-o de que estariam já em condições de apoiar o clube e de que
poderia enviar a missiva de fls 64 do apenso 17, que confirmou ter sido remetida pelo
FCF à CCAMF (deduz-se que ele terá sido informado que a “Resin” estaria disposta a
contribuir com os almejados 20.000 cts, pois só assim fará sentido o teor da missiva de
fls 64 do apenso 17, quando é certo que o arguido Júlio esperava dessa empresa um
contributo nessa ordem de valores).
Seja como for, tendo ele obtido esse conhecimento, no dia 04.12.98 o FCF
remeteu a dita missiva à CCAM (assinada pelo arguido Júlio e por Álvaro Costa),
conforme documentos de fls 63 e 64 do apenso 17.
Quanto às incidências da entrega dos 20.000 cts pela “Resin”, através do arguido
Carlos Marinho, remete-se para tudo quanto a esse propósito já se disse a respeito da
matéria constante do ponto 1.5 da pronúncia.
Destaca-se o facto do arguido Horácio já não se recordar se o arguido Carlos
Marinho se fazia ou não acompanhar do arguido Gabriel Almeida, matéria que assim
ficou por demonstrar.
Por outro lado, conforme emerge dos próprios termos do acordo celebrado entre
a CCAM e o FCF, o arguido Júlio Faria não avalisou qualquer livrança no âmbito desse
acordo e aquele entrega de 20.000 cts serviu para pagar o remanescente da prestação
vencida a 30.09.98.
Conforme explicou de forma assertiva o arguido Júlio Faria - foi assertivo no
modo como expôs essa factualidade, manifestada na postura corporal e verbalizada sem
hesitações, o que, diga-se, nem sempre sucedeu a propósito de outras matérias,
designadamente quando a sua versão dos factos divergiu da versão dos factos contada
pelo arguido Horácio, que quase sempre se mostrou muito assertivo nas suas afirmações
-; diziamos, conforme explicou com credibilidade o arguido Júlio, ele apenas avalisou

534
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

uma livrança em branco (na qual viria a ser aposta a verba de cerca de 113.000 cts)
numa altura em que era o presidente da assembleia geral do clube, título de crédito esse
que viria a ser liquidado pelos avalistas e outros dirigentes do FCF e com recurso a um
empréstimo junto do BES, sendo certo que a contracção dessa obrigação se prendeu
com o pagamento das obras de melhoramento do Estádio Dr. Machado Matos, as quais
eram necessárias em face da subida à 1ª Divisão Nacional de Futebol do dito clube,
tendo sido entretanto frustradas as expectativas de um prometido financiamento público
para esse fim.
Ademais, acerca da factualidade referente à “conta paralela” ou “caixa
paralela” foram relevantes as declarações assertivamente prestadas pelo arguido
Horácio Costa, em conjugação com o teor do quadro de fls 2798 a 2801 do 12º volume
dos autos e vários documentos constantes do apenso 4, aliás explicados por esse
arguido.
Acerca do depósito de 1.850 cts em numerário na conta do arguido Júlio Faria
(cfr. documento de fls 162) o arguido Horácio teve a oportunidade de explicar a sua
razão de ser de modo convincente (cfr. as respectivas declarações reproduzidas por
súmula e documentos por ele referenciados a esse propósito; cfr. ainda os testemunhos
de Fernando Lima, Luís Lima e, sobretudo, de Fernando Ferreira Sampaio).
Tal depósito prendeu-se com a realização de um sorteio pelo FCF, em Dezembro
de 1998, no contexto que foi explicado de forma assertiva pelo arguido Júlio Faria.
O arguido Júlio Faria explicou que lhe coube a distribuição pelos seus
“camaradas” de 1850 bilhetes, à razão de 1.000$00 cada um (que pagou à cabeça,
cabendo-lhe depois o respectivo reembolso na medida em que os vendesse).
Confirmou assim que na sua conta foram depositados os 1.850 cts, em resultado
da venda desses bilhetes através, talvez, do arguido Bragança, ignorando se este ou a
arguida Fátima remeteram alguns desses bilhetes aos presidentes de junta para que
também estes os procurassem vender.
Certo é que pelo menos 1550 bilhetes (que não se integram naquele lote de 1850
bilhetes) terão sido destinados à arguida Fátima Felgueiras, tanto assim que vinham
acondicionados num saco onde foi manuscrita a frase “Drª Fátima Felgueiras”, sinal de
que lhe eram dirigidos.
Tais bilhetes foram também pagos com dinheiro proveniente de uma das
entregas em numerário efectuadas pela “Resin” (mencionada no ponto 3 do ponto 1.6 da
pronúncia, conforme emerge das declarações prestadas pelo arguido Horácio Costa).
De resto, a posição expressa pelo arguido Júlio Faria na audiência de julgamento
não é inteiramente coincidente com a posição que expressou na sua contestação no artº
61º, onde se afirma que esses 1850 bilhetes eram destinados à CMF.
Confirmou esse arguido que escreveu o “post-it” de fls 84, ainda alusivo a esta
matéria.
Tudo isto confere credibilidade à versão dos factos contada pelo arguido
Horácio Costa, o qual, além do mais, referiu que foi a arguida Fátima quem o instruiu
no sentido de fazer aqueles dois pagamentos, um de 1.850 cts, que depositou na conta
do arguido Júlio Faria a 23.11.98 (cfr. fls 167 do 1º volume), e outro de 1.550 cts, verba
que entregou nas mãos da arguida Fátima e que serviram para pagar 1.550 bilhetes de
um sorteio promovido pelo FCF.

- A convicção do Tribunal a propósito do 4º capítulo da pronúncia

Decisões da arguida Fátima Felgueiras usando os seus poderes de autarca no


âmbito do licenciamento em processos de obras

535
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Introdução

Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Nega o que a propósito vem alegado na pronúncia, salientando que sempre
proferiu decisões em concordancia com os pareceres técnicos proferidos pelos serviços.

Processo de obra particular nº 130/88, relativo à construção da unidade


industrial da sociedade “Teixeira Pinto & Cª Ldª” (posteriormente “Pinfel – Indústria
de Calçado, SA”):

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Confrontada a arguida com o processo de licenciamento em causa, confirmou
que de facto o respectivo requerimento inicial deu entrada na CMF a 06.04.88, nos
moldes descritos na pronúncia.
Confirmou ainda que foi emitido um parecer técnico desfavorável a 11.06.97
conforme descrito na pronúncia, bem como a subsequente instauração dos ali referidos
processos de contra-ordenação a 27.10.97, na sequência de despacho proferido nesse
sentido em Outubro desse ano (e a que se reportam aos processos contra-ordenacionais
nºs 583/97 e 584/97), sendo certo que em Novembro de 1997 foi dado um prazo de 180
dias à requerente para regularizar a situação, o que não viria a ser feito.
Conforme se constata do dito processo de licenciamento, a requerente
apresentou um novo requerimento a 16.02.2000 no sentido de legalizar as alterações
entretanto introduzidas ao projecto, tendo sido concedidos 30 dias para instruir o
requerimento com os documentos em falta.
Na sequência de audiência requerida pela requerente e que teve lugar a
05.07.2000 (conforme registo que se encontra junto ao respectivo processo de
licenciamento), a arguida, a 06.07.2000, despachou no sentido da reapreciação do
pedido de licenciamento em causa pelos serviços.
Confirmou, após análise do processo de licenciamento em causa, que depois de
2 pareceres técnicos desfavoráveis, datados de 4 e 19 de Julho de 2000, por despacho
proferido a 18.09.2000 decidiu indeferir o pedido de licenciamento/legalização das
obras.
Em 11.12.2000, em face do que consta do processo referido, reconheceu que de
facto foram emitidos novos pareceres técnicos que mantiveram a indicação de que não
estavam a ser respeitados os 5 mts de afastamento aos limites da propriedade (em todo o
caso, tal não constituíria obstáculo ao licenciamento desde que o afastamento
respeitasse o previsto no Código Civil e desde que inexistisse oposição dos vizinhos,
conforme era costume assim ser decidido pela CMF; a propósito, foram vistos processos
de licenciamento em que o problema era o mesmo e que acabaram por ser decididos
favoravelmente nas mesmas circunstâncias).
Assim, por despacho de 21.12.2000, foi aprovado o projecto de arquitectura,
ficando o processo a aguardar a apresentação dos projectos de especialidade.
Entretanto, a 18.01.2001 foi feito novo requerimento de legalização da obra, na
sequência do qual, a 14.02.2001, a arguida concede um prazo de 30 dias para a
realização de obras de demolição, sendo concedida licença para o efeito.

536
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A 21.02.2001 foram pagas as taxas devidas (agravadas em face do facto das


obras terem sido iniciadas antes da respectiva aprovação), a 23.02.2001 é deferido o
pedido de averbamento em nome da “Pinfel”, tendo sido emitido o respectivo alvará de
construção a 23.04.2001 com o nº 304/2001.
Entretanto, por despacho de 08.06.2001, na sequência de parecer técnico
favorável desse dia, é concedida a respectiva licença de utilização, o qual é emitido a
15.06.2001.
Em face do que se observa no processo de licenciamento em causa, concluiu a
arguida que sempre despachou conforme o fez noutros processos de licenciamento e de
acordo com os pareceres técnicos.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Referiu apenas ter a ideia de que existiam problemas quanto ao afastamento aos
limites da propriedade.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Recorda-se de uma situação em que o problema no processo de licenciamento
era o afastamento do edifício aos limites da propriedade. Esse problema foi porém
ultrapassado com uma declaração de consentimento do proprietário vizinho no sentido
de que esses limites não fossem respeitados.
Foi a primeira vez que viu tal situação.
Antes dessa autorização por parte do vizinho o parecer era desfavorável quanto
ao licenciamento da obra.

Análise crítica
Chama-se aqui à colação a análise que foi efectuada na audência de julgamento
do processo de licenciamento em causa pela arguida Fátima.
Dessa análise resulta, de resto, a matéria de facto que a propósito foi dada como
provada (cfr. ainda o relatório da IGAT de fls 2007 e 2008 dos autos).
O licenciamento acabaria por ser deferido na medida em que inexistiu oposição
do proprietário confinante acerca do desrespeito da implantação da construção aos
limites da propriedade, de acordo aliás com a prática habitual da CMF em situações
análogas (conforme se verificou na audiência de julgamento em casos semelhantes).
Nessa medida, porque não constitui uma situação excepcional, não se vislumbra
que qualquer “favor” tenha sido concedido neste caso.
Foi aliás referido que o Dr. José de Barros (assessor jurídico da CMF) entendia
que tal prática não constituiria qualquer problema do ponto de vista jurídico (não foi
dito expressamente porquê, mas subentende-se que essa posição se estriba na
circunstância de, dessa forma, não se pôr em causa qualquer norma de direito
urbanístico cuja ratio legis se prenda com a realização de qualquer interesse público,
designadamente de ordenamento do território).
Independentemente da bondade dessa posição, certo é que a arguida Fátima agiu
estribada em pareceres técnicos e, pelos vistos, com o aval da assessoria jurídica da
CMF.
Deste modo, a prova produzida afasta a demonstração de qualquer intenção por
parte da arguida Fátima no sentido de beneficiar a requerente em tal processo de
licenciamento, bem como a consciência de que, ao licenciar a obra em causa, estaria a
praticar uma ilegalidade.
Note-se aliás que, na parte introdutória, faz-se referência genérica à análise e
deferimento de inúmeros pedidos de licenciamento de obras particulares contra os

537
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

pareceres técnicos proferidos, para depois apenas se apontar duas únicas situações (os
processos nºs 130/88 e 5/I/93), o que de alguma forma nos parece contraditório.

Processo de obra particular nº 5/I/93 relativo à construção da unidade


industrial da sociedade “Marina Calçados, SA”:

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmada a apresentação do requerimento respectivo a 15.06.93 pela análise
do processo de licenciamento em causa e que o projecto de arquitectura foi aprovado
por despacho do arguido Júlio Faria datado de 01.02.94, em função dos pareceres
favoráveis juntos a esse processo pela Comissão de Análise (homologados pela
Comissão de Coordenação do Norte a 10.10.93), e ainda que os projectos de
especialidade deram entrada a 26.01.94 (merecendo pareceres favoráveis); constatou-se
ainda que, de facto, o respectivo alvará de construção foi emitido a 07.11.94 e ao qual
foi atribuído o nº 903/94, em violação do regulamento do PDM, conforme mencionado
na pronúncia, sendo certo que a primeira intervenção da arguida Fátima Felgueiras data
de 08.09.95 (numa altura em que havia já assumido a presidência da CMF em
substituição do arguido Júlio Faria).
Sucede porém que, conforme salientado pela arguida Fátima Felgueiras, a
decisão de concessão do alvará de licença construção fundou-se em pareceres
favoráveis, sendo certo que o Regulamento do PDM de Felgueiras foi aprovado a
28.01.94 e os serviços não deram conta desse facto quando emitiram os parecerers
favoráveis relativamente à aprovação do projecto de arquitectura (cfr. fls 3156 e ss. –
resposta da CMF à Inspecção do IGAT).
Consequentemente, tendo sido aprovado o projecto de arquitectura e em face dos
pareceres favoráveis não havia qualquer razão para recusar a aprovação dos projectos de
especialidade e a emissão do respectivo alvará de construção (que aliás foi prorrogado
já sob a égide da presidência da CMF pela arguida Fátima Felgueiras).
Entretanto, detectada a desaquação da limitação imposta pelo PDM quanto à
área máxima de ocupação do solo para aquela área (1.000 m2) – dado que a zona em
causa é uma das que apresenta maior concentração industrial, ao longo da EM 562 -,
procurou-se corrigir tal situação (até ao momento sem sucesso), embora se preveja que a
correcção se venha a efectivar aquando da revisão do PDM de Felgueiras.
Assim, pese embora admita que a construção edificada tem uma ocupação
superior a 1.000 m2, nega qualquer intenção de favorecer a requerente, pois todos os
despachos foram proferidos em consonância com os pareceres técnicos.
O alvará de utilização foi concedido a 08.04.97, depois de efectuada uma
vistoria a 14.03.97.
Referiu conhecer o Sr. Carlos Castro e o irmão António por serem empresários,
dos mais antigos do concelho.
Salientou desconhecer se procederam a algum donativo para a campanha
eleitoral, mas tal a não surpreende pois era usual contribuírem para as mais variadas
causas.

- Testemunha Luís Orlando Cardoso Botelho Maia


Sendo inspector da IGAT, o conhecimento de causa adveio-lhe da acção
inspectiva que efectuou ao Município de Felgueiras em 2002.
Relativamente ao processo de licenciamento nº 5/I/93, referiu que a mancha de
implantação é superior à prevista no PDM para o local (aglomerado de nível II. A área

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

máxima de ocupação do solo é de 1.000 m2, sendo certo que neste caso a construção
tinha uma área de ocupação de 3.996 m2).
Quando o projecto foi aprovado já estava em vigor o PDM, visto que o despacho
de aprovação data de 02.02.94 (entende que nessa altura inexistia deferimento tácito) e
o PDM de Felgueiras entrou em vigor a 29.01.94.
Referiu que a doutrina dominante vai no sentido de que à data da aprovação se
deve aplicar o PDM ainda que os processos de licenciamento se tenham iniciado antes.
Normalmente quando entra em vigor o PDM os Municípios têm consciência
desse facto na medida em que o respectivo processo de aprovação é moroso. Em todo o
caso o estudo do PDM demorará vários dias.
O licenciamento em causa é nulo, sendo certo que já estava prescrito um
eventual procedimento tutelar contra a arguida Fátima Felgueiras.
Propuseram assim que o Município de Felgueiras reconhecesse a nulidade desse
acto de aprovação e que o declarasse.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


No que se refere à obra em causa, a área de implantação excedia
consideravelmente o permitido pelo PDM.
O PDM não se elabora de um dia para o outro, pelo que presume que o mesmo
não constituísse uma surpresa para a CMF, daí que pense que seria evidente a violação
do PDM aquando da aprovação do projecto, já que uns dias antes esse PDM havia sido
publicado no Diário da República.
António Pereira de Castro era o sócio-gerente da firma “Marina”.
Tem a ideia que ele entregou 500 cts em numerário, quantia que foi depositada
na conta do BES (cfr. documento de fls 87 do apenso 1).
Referiu porém que tem conhecimento que foi ele quem entregou essa quantia
por declarações que tomou (pelo que nessa parte o seu depoimento não pode ser
valorado).

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A área máxima de ocupação permitida para o local era de 1.000 m2, sendo certo
que a construção implantada ultrapassava largamento esse limite (cerca de 5.000 m2).
Não sabe se o licenciamento foi concedido antes ou depois da entrada em vigor
do PDM.
António Pereira de Castro e Carlos Pereira de Castro são empresários (calçados
“Marina”).
A fls 87 do apenso 1 consta um talão de depósito da quantia de 500 cts.

- Testemunha Rui José da Silva Pinto Almeida


No que se refere à elaboração do PDM, começou-se por elaborar as cartas para
as reservas agrícolas e ecológica. O resto é área disponível para construção, que carecia
de regulamentação.
A dada altura só os municípios que tinham PDM aprovados é que poderiam
receber fundos comunitários, o que apressou a elaboração e aprovação de PDM por esse
país fora.
A filosofia era a de maximizar a utilização das estruturas, o que implicava que à
margem de cada estrada os lotes tivessem um mínimo de frente para permitir a
construção de vários lotes. Entendia que essa filosofia era um disparate numa altura em
que em Felgueiras se vivia uma época de prosperidade e os industriais compravam
quintas.

539
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na fase final de elaboração do PDM a filosofia foi a oposta, em que procuraram


levar as industrias para zonas industriais, o que de facto se concretizou.
Quando foram dadas as primeiras informações no processo de licenciamento em
causa o PDM ainda estava em elaboração e a filosofia subjacente era a de que a nova
legislação não se aplicaria aos processos de licenciamento em curso, caso contrário a
CMF teria se suspender todos os processos de licenciamento enquanto não entrasse em
vigor o PDM.
Assim, o PDM apenas seria aplicado aos processos de licenciamento que se
iniciaram já sob a sua égide.
Consequentemente, não tiveram a preocupação de suspender o processo de
licenciamento em causa.
Isso sucedeu em variadíssimos processos de licenciamento na altura.
É por isso que a área de construção aprovada é superior à que viria a ser
aprovada para a área pelo PDM.
Se no processo em causa tivesse existido má fé, teriam aprovado o
licenciamento antes da entrada em vigor do PDM (a aprovação foi feita três dias depois
da aprovação do PDM) e até poderiam ter alterado a data do despacho, pois inexistia
qualquer registo informático.
Acerca da localização da obra, é a CCDNN que emite a certidão de localização.

- Joaquim Carlos Vieira Lopes Jordão


No que se refere ao processo de licenciamento em causa, à data da entrada do
requerimento, inexistia PDM (o regulamento respectivo ainda não estava definido,
processo que se arrastou devido a divergências de opinião no seio do gabinete do PDM).
Assim, o depoente participou na reunião da comissão de ligação, conforme acta
de fls 354 do processo de licenciamento em causa. A existência dessa comissão de
ligação era uma forma da CCRN exercer alguma tutela naquela área.
À data já se sabia que o solo em causa seria urbano e que não colidiria com a
reserva agrícola.
O PDM foi publicado no DR a 29.01.94 e não era de aplicação retroactiva, daí
que se devesse aplicar a legislação em vigor à data em que os requerimentos referentes a
processos de licenciamento deram entrada na CMF. Tal procedimento era habitual e foi
dessa forma que procederam em todos os casos.
A industria em causa foi classificada na classe C, o que significa que o impacto
para as outras funções do território não era elevada, designadamente para as habitações.
Além disso, em face do que viu no projecto apresentado, nenhum óbice
encontrou à respectiva aprovação. Deu por isso um parecer favorável.
Assegurou que nunca a arguida Fátima Felgueiras exerceu sobre o depoente
qualquer influência quanto ao sentido dos pareceres que proferia.

Análise crítica
Em face da análise do processo de licenciamento em causa (cfr. as declarações
da arguida Fátima Felgueiras e o relatório da IGAT de fls 3165 e ss., em particular fls
18 e 19 de tal relatório), parece evidente que, tendo entrado em vigor o PDM de
Felgueiras a 28.01.94, aquando da aprovação do projecto de arquitectura a 02.02.94,
este violava esse mesmo instrumento de regulação do ordenamento do território pelas
razões enunciadas na pronúncia.
Não obstante, esse despacho de aprovação estribou-se em pareceres favoráveis,
sendo certo que o último dos quais foi emitido a 01.02.94, portanto, alguns dias depois
da entrada em vigor do PDM.

540
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Isto é, esses pareceres não tiveram em conta a entrada em vigor do PDM, de


sorte que, estribado neles, foi proferido despacho de aprovação do projecto de
arquitectura pelo presidente da CMF.
A explicação dada pela arguida Fátima (e na exposição de fls 3156), de que, em
face da circunstância de entre a entrada em vigor do PDM e a emissão dos pareceres
favoráveis ter mediado apenas 3 dias, não colhe, não só porque a elaboração do PDM é
um processo muito discutido no seio dos órgãos autárquicos e porque a sua entrada em
vigor não deixa de ser marcante, como também porque a explicação dada pelas
testemunhas Rui Almeida e Joaquim Jordão foi outra, isto é, entendeu-se na altura que
se deveria aplicar a legislação e os instrumentos de regulação do ordenamento do
território em vigor à data da entrada do requerimento respeitante ao licenciamento em
causa, o que sucedeu com muitos outros processos de licenciamento em situação
idêntica, sendo certo que o PDM não previu um regime de transitório.
Esta explicação mostra que os serviços camarários estavam alertados para a
entrada em vigor do PDM e que, não obstante, sufragando aquela posição jurídica (cujo
mérito não cabe aqui analisar), decidiram emitir os respectivos pareceres tendo apenas
em atenção a legislação em vigor e os instrumentos de ordenamento existentes à data da
entrada nos competentes serviços camarários do requerimento para o licenciamento da
construção em causa.
Dado porém que entre a aprovação desse projecto e a entrada em vigor do PDM
mediou quatro dias, ficou o Tribunal com dúvidas acerca da efectiva consciência por
banda do presidente da edilidade de que com a aprovação do projecto de arquitectura se
estaria a violar o PDM, tanto mais que o parecer proferido a 01.02.94 era favorável.
O presidente da edilidade de então (assim como a arguida Fátima) não é jurista
nem técnico na área do urbanismo, de sorte que, naturalmente, recebendo um processo
para aprovação com pareceres favoráveis, despachará favoravelmente a pretensão em
apreço.
Tendo sido aprovado o projecto de arquitectura, naturalmente que,
congruentemente, obtidos os pareceres favoráveis, emitiu-se a licença de construção e
posteriormente a licença de utilização.
Assim, não se demonstrou que a arguida Fátima tenha querido beneficiar a
requerente do processo de licenciamento mencionado e que, ao deferir-se a emissão das
licenças em causa, se estivesse a decidir conscientemente em violação das normas
previstas no PDM e seu regulamento (esse conhecimento caberá mais aos técnicos que
ao presidente da edilidade).
Por outro lado, nenhuma relação estabeleceu a pronúncia entre o donativo
referido nos autos (cfr. documento de fls 87, do apenso 1) e o deferimento da licença de
utilização entretanto concedida, pelo que se trata de um facto absolutamente inóquo.
Seja como for, para que dúvidas não restem, nenhuma prova se fez de que uma
coisa estivesse relacionada com a outra.

- A convicção do Tribunal a propósito do 5º capítulo da pronúncia

As relações entre a sociedade “Proeme” e a CMF”

Introdução

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras

541
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu que a “Proeme” prestou serviços para a CMF, tendo sido responsável
por parte da estratégia de comunicação e imagem da edilidade.
Assim, a propósito da comemoração dos “20 Anos do Poder Local”, que
ocorreria a 12.12.96, sendo certo porém que a esse propósito, em Maio desse ano, iria
ocorrer uma exposição na Exponor e em que a CMF iria marcar presença com um stand,
foi aberto um concurso limitado, efectuando-se o convite a 3 empresas: “Proeme”,
“Nortimagem” e “Isto É” (para o efeito chegou a auscultar a CM do Porto, já que o
município felgueirense não conhecia empresas do ramo para dar resposta aos serviços
que pretendia).
Nessa altura inexistia pois qualquer relacionamento entre a CMF e a “Proeme”.
Tomou conhecimento dessas empresas, para além de terem auscultado a CMP,
nas seguintes circunstâncias:
- A “Proeme” por ter organizado a representação nacional da “Bibliomédia”
numa exposição em Paris da “Rede Pública de Bibliotecas” e porque fez um trabalho
para o Instituto do Livro e da Leitura;
- A “Nortimagem” porque tratou da linha gráfica da Biblioteca Municipal; e
- A “Isto É” porque ganhou um concurso relativo à realização de uma exposição
da ADERSOUSA (Associação de Desenvolvimento Regional das Terras do Sousa).
Optou-se na altura por um concurso limitado (e portanto mais rápido) na medida
em que a referida exposição na Exponor se realizaria em Maio de 1996, tendo para o
efeito os serviços elaborado o respectivo caderno de encargos, sendo certo que só duas
empresas apresentaram as suas propostas (“Proeme” e “Isto É”), as quais foram abertas
no dia 28.02.97.
Nega ter tido qualquer reunião com os responsáveis da “Proeme” antes do
lançamento do mencionado concurso limitado (tal concurso foi lançado no dia 18.02.97
e as propostas abertas no dia 28.02.97), já depois portanto da dita exposição e do dia
previsto para a comemoração dos “20 Anos do Poder Local”).
Pese embora o Sr. Renato Guerra (pai) ter sido candidato pela lista do PS à CM
de Paredes, não o conhecia na altura.
Naturalmente que o objectivo delineado com a abertura de tal concurso resulta
do respectivo caderno de encargos junto aos autos (cfr. apenso 103, fls 29 e ss.).

- Arguido Horácio Costa


Apenas conheceu a “Proeme” em 1997 por causa do exercício das suas funções
na CMF. Ouviu comentários segundo os quais essa empresa foi dada a conhecer através
do Narciso Miranda, sendo certo que o Sr. Renato Guerra (pai) era militante do PS e era
vereador na CM de Matosinhos, tendo chegado a concorrer às eleições para a CM de
Paredes, que perdeu.
Referiu ignorar de que forma a “Proeme” começou a trabalhar para a CMF.
Teve reuniões com o Sr. Renato Guerra (quer o pai quer o filho) no âmbito de
problemas que iam surgindo em iniciativas relacionadas com a campanha eleitoral e em
iniciativas da CMF.
O Sr. Renato Guerra dizia que tinha milhares de contos a receber da CMF mas a
arguida Fátima Felgueiras entendia que não.
Foi pois nesse contexto que desenvolveu a sua intervenção, visto que,
juntamente com as testemunhas Fernanda Leal e Terezinha, numa reunião de vereação,
foram incumbidos pela arguida Fátima Felgueiras de fazer um levantamento do que
tinha sido feito no âmbito dos contratos celebrados entre a CMF e a “Proeme”.
Na sequência dessa incumbência procuraram então apurar junto dos serviços o
que na verdade tinha sido feito e por quem tinha sido encomendado, tarefa que nem

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

sempre se revelou fácil. Em face da dificuldade em apurar concretamente o que tinha


sido feito em alguns domínios solicitaram esclarecimentos por banda da “Proeme”, mas
porque a resposta por escrito que lhes foi remetida era muito genérica tiveram uma
reunião com o Sr. Renato Guerra (em que além deste participaram o depoente e as
testemunhas Fernanda Castro Leal e Terezinha), onde procuraram obter dele os
esclarecimentos necessários. Nessa reunião o Sr. Renato Guerra sustentava que
Felgueiras era um projecto global (abarcando pois quer os serviços efectuados no
âmbito da campanha eleitoral quer os serviços prestados para a CMF quer ainda os
serviços prestados para a ADEC – “Sovela” e “Rubeas”), pelo que o depoente
aconselhou-o a expôr por escrito as suas reivindicações no que se refere aos serviços
prestados no âmbito da campanha eleitoral e para a “ADEC”, visto que ali procuravam
apenas esclarecer o que efectivamente foi prestado para a CMF por banda da “Proeme”.
Em face disso o Sr. Renato Guerra entregou-lhe em mão o manuscrito de fls 2121, onde
expunha as suas contas, tendo o depoente entregue tal documento à arguida Fátima
Felgueiras.
Feito esse trabalho de campo, foi apresentado o relatório de fls 2093 e ss,
constante do 9º volume, subscrito pelo depoente e pelas testemunhas Fernanda Leal e
Terezinha (nesse documento faz-se expressa alusão à reunião que tiveram com o Sr.
Renato Guerra, a qual terá ocorrido, segundo aí consta, a 17.03.98). Foi a testemunha
Fernanda Leal quem o redigiu, tendo sido subscrito pelos três (tem a data de 18.03.98).
Foi ainda a testemunha Fernanda Leal quem o entregou à arguida Fátima Felgueiras.
Inicialmente a arguida Fátima Felgueiras optou por não pagar parte dos serviços
reivindicados, tendo exarado despacho nesse sentido no relatório a 18.03.98 (onde
também apôs as suas observações e comentários), ficando assim o depoente e as
testemunhas Terezinha e Fernanda Leal de comunicar ao Sr. Renato Guerra a posição da
presidente da autarquia, o qual se deslocou para o efeito a Felgueiras.
Foi então remetido a 18.03.98 o fax de fls 116 e 2117 - que a arguida Fátima
tomou conhecimento - e, em face da postura do Sr. Renato Guerra – que ameaçava ir
para os jornais e para a televisão –, ela resolveu mandar pagar, conforme despacho
exarado na primeira folha do relatório (esse despacho foi exarado numa cópia desse
relatório e não no original e tem a data de 29.03.98 – cfr. fls 2122). Aliás, a primeira
folha do relatório foi substituída para que a arguida Fátima Felgueiras pudesse apôr um
despacho diferente. Não sabe quem substituiu a dita folha, sendo certo que o relatório
foi feito pela testemunha Fernanda Castro Leal no computador que na CMF lhe estava
adestrito.
Ficou espantado com o teor desse despacho, sendo certo que nenhuma pressão
exerceu sobre ela no sentido de a convencer a pagar, até porque ela nunca aceitaria de si
qualquer tipo de pressão, sendo certo que não era hábito ela mudar de posição. Em todo
o caso, por motivos que desconhece, ela terá cedido às pressões exercidas pelo Sr.
Renato Guerra.
Esclarece que no “Sovela” quem tratava directamente com a “Proeme” era o
respectivo director, na altura o arguido António Pereira.
Na revista “Rubeas” quem tratava com a “Proeme” era o Dr. Horácio Reis, o
Eng. Reis e a arguida Maria Augusta. Assim, o fax de fls 2115, dirigido ao Dr. Horácio
Reis, foi-lhe entregue.
Na Campanha eleitoral era o arguido Bragança quem contactava com a
“Proeme”.
Foram pagas com dinheiro da conta do BES facturas da “Proeme” ou da
“Portcom” (ambas pertencentes ao Sr. Renato Guerra) respeitantes a serviços prestados
para o “Sovela”, para a revista “Rubeas” e em acções de campanha eleitoral.

543
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assim, o recibo de fls 359, de 2.700.000$00, diz respeito a serviços prestados


para o Sovela (o arguido anotou numa cópia do cheque que serviu como meio de
pagamento a finalidade da sua emissão e a data do pagamento – 18.09.97).
O documento de fls 360, datado de 31.12.97 e dirigido à ADEC, foi-lhe presente
para pagar, o que fez.
Por instruções expressas da arguida Fátima, manteve-se alheado dos serviços
que a “Proeme” prestou para a “Foca”.

- Arguido Joaquim Freitas


Apenas referiu que a “Proeme” fornecia material para a campanha eleitoral de
1997 e prestava serviços para a CMF (forneceu designadamente “outdoors” a propósito
da comemoração dos “20 Anos do Poder Local”).
Conheceu o Sr. Renato Guerra por causa do jornal “O Sovela”, sendo certo que
um funcionário dele chegou a ser jornalista nesse semanário.

- Testemunha Manuel Ferreira de Faria


A “Proeme” tornou-se editora do “Sovela”, bem como de algumas publicações
de carácter municipal, como por exemplo a revista “Rubeas”.
Prestou também serviços ao PS na campanha eleitoral nas eleições autárquicas
de 1997, o que suscitou a sua reacção negativa devido à promiscuidade que entendia ter-
se instalado entre a promoção de actividades municipais e as actividades de propaganda
eleitoral do PS local.
Tem a ideia da CMF ter celebrado com essa empresa um contrato de prestação
de serviços no âmbito da comemoração dos “20 Anos do Poder Local”.
Ignora como se processou o concurso que viria a ser ganho pela “Proeme”, a que
se reporta o ponto seguinte.
Não conhece a testemunha Renato Guerra (também ligado ao PS de Paredes).

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


A “Proeme” tinha como sócios as testemunhas Renato Guerra, pai e filho.
A “Portcom” tinha os mesmos sócios, mas tem a ideia que o filho da testemunha
Renato Guerra tinha uma quota maior nesta empresa.
A testemunha Renato Guerra tinha ligações a um partido político.
Em 1997 prestou vários serviços de comunicação e imagem e também
relacionados com a comemoração dos 20 anos do poder local.
Houve um concurso limitado em que concorreram as firmas “Isto É” e a
“Proeme”, tendo esta vencido esse concurso.
As propostas foram apreciadas por uma comissão de análise (cfr. fls 29 a 32 do
apenso 103, sendo certo que a fls 29 consta um despacho da arguida Fátima no sentido
de se fazer a adjudicação à firma melhor pontuada com base na informação técnica).
Foi feita uma perícia acerca desses contratos.
O limite, para aquele tipo de concurso, era de 7.500 cts.
As relações entre a “Proeme” e a CMF foram atribuladas porque a arguida
Fátima entendia que a “Proeme” não cumpriu de forma adequada os contratos
estabelecidos conforme se depreende de vários documentos constantes dos autos,
designadamente das observações apostas por ela a 18.03.98 no relatório de fls 2093 e
ss., designadamente a fls 2104, 2107 e 2113 (sendo certo que a fls 2122 consta um
despacho datado de 29.03.98, aposto no mesmo relatório mas de sentido diverso ao que
consta de fls 2093, este último datado de 18.03.98).

544
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 2121 consta um manuscrito sem data, com contas, que englobam serviços
prestados ao PS (campanha), à ADEC e à CMF (tem a ideia que foi o arguido Horácio
Costa quem entregou esse documento à PJ).
A fls 2115 consta uma missiva dirigida à CMF pela “Proeme”, datada de
11.11.97, onde são referidos uma série de valores acerca dos serviços prestados.
A fls 2116 consta uma carta dirigida ao arguido Horácio Costa, datada de
18.03.98, onde se alude a uma reunião no dia 17.03.98, alegando que havia cumprido
tudo o que estava facturado à CMF.

- Testemunha Manuel Renato Guerra Fonseca e Silva


Foi sócio-gerente da “Proeme” (inactiva desde 1998 ou 2000) e sócio da
“Portcom” (ainda em actividade e gerida pelo seu filho, a testemunha Manuel Renato
Ferreira Guerra Fonseca e Silva).
A “Proeme” dedicava-se à publicidade, comunicação e imagem.
Ambas as empresas complementavam-se, visto que a “Proeme” tratava da
logística em termos de projectos e a “Portcom” executava os produtos finais.
Foi consultado pela CMF, tendo o contacto inicial ocorrido em fins de 1996 ou
em princípios de 1997, no sentido de fornecer os seus serviços, visto que necessitavam
de uma acessoria no âmbito da comunicação e imagem. Esse contacto foi telefónico,
ignorando quem o fez (tratava-se de uma voz masculina).
Cerca de 15 dias depois recebeu uma carta da CMF (convite para apresentar uma
proposta), mas o depoente necessitou de esclarecimentos para a elaborar, dada a
vastidão do que lhe era pedido, pelo que se dirigiu à CMF (ao GAPP, na pessoa do
arguido Bragança), tendo então pedido uma reunião para o efeito.
Cerca de 3 ou 4 dias depois (ao que pensa em Janeiro ou Fevereiro de 1997) teve
uma reunião com a arguida Fátima Felgueiras mais três pessoas (dois directores e uma
senhora cujas funções na altura desconhecia, vindo a apurar mais tarde que era a
responsável financeira da CMF).
Era-lhe pedida uma acessoria de comunicação e imagem e serviços prestados no
âmbito das comemorações dos 20 anos do poder local, tendo pedido esclarecimentos
acerca deste último aspecto (pretendia-se por exemplo a criação de um stand para a
“Exponor”, em Maio desse ano, mas entretanto foi antecipada para o dia 25 de Abril a
criação desse stand na Biblioteca Municipal de Felgueiras, stand esse que mais tarde se
deslocou para a cidade da Lixa e para Barrosas).
Depois dessa reunião apresentou a proposta da “Proeme”. Ignora se a CMF
convidou mais alguma empresa para apresentar a respectiva proposta.
A CMF procurou alterar os valores acordados (no sentido da redução), tendo por
isso ameaçado não fazer a exposição.
Dias depois foi chamado à CMF para assinar os contratos, o que fez em Abril de
1997.
Quando lhe foram adjudicados os contratos pela CMF os seus contactos
passaram a ser feitos com a testemunha Fernanda Castro Leal.
Ainda a propósito do referido stand, relatou que no dia anterior à sua
inauguração na Biblioteca Municipal tudo funcionava, mas no dia em causa (25.04.97),
pelo contrário, nada funcionava.
O Gabinete de Comunicação e Imagem da CMF não tinha qualquer foto ou
boletim que pudesse ser usado nesse stand.
Levou por isso uma revista feita por si para esse stand, segundo os elementos
fornecidos pela CMF, mas foi impedido de distribuí-la na medida em que nessa revista
era referido que a Lixa era uma vila (quando já na altura era uma cidade), o que o

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

obrigou a imprimir mais 30 revistas com a galha já corrigida, apesar da informação que
lhe foi dada não ter sido da sua responsabilidade mas da CMF, tendo sido a maior
humilhação profissional por que passou, já que a arguida Fátima Felgueiras apelidou-o
publicamente de incompetente.
Também por telefone foi contactado por alguém (do sexo feminino – uma
“menina”) do jornal “O Sovela”, tendo sido combinada uma reunião com elementos
desse jornal para que o depoente procurasse alterar a respectiva imagem, tendo logo o
depoente perguntado se tinha alguma coisa a ver com alguém da CMF, designadamente
com a arguida Fátima Felgueiras (depois da humilhação que passou no dia 25.04.97
nada mais queria ter a ver com ela), tendo-lhe sido respondido que não.
Ao que pensa em inícios de Maio de 1997, reuniu-se então com cinco ou seis
elementos desse jornal na respectiva sede (entre eles estava a testemunha Horácio Reis;
a arguida Fátima não esteve presente).
Em relação ao “Sovela” não estava então disposto a acompanhar pessoalmente
esse projecto na medida em que perspectivava ser candidato à C.M. de Paredes. Pediu
então ao seu filho (“Portcom”) para acompanhar esse projecto, tendo-o esclarecido dos
preços combinados.
Essa testemunha (Horácio Reis), em Junho ou Julho de 1997 contactou-o no
sentido de realizar um trabalho para o PS, designadamente para a revista “Rubias”.
De resto, para o PS apenas colaborou nessa revista. Exigiu que essa revista
tivesse o registo oficial (ISBN) e a testemunha Horácio Reis transmitiu-lhe que usariam
o registo do “Sovela” (jornal que procedia à distribuição da revista).
A “Portcom” continuou esse projecto pelas razões já referidas.
Além dos atrasos nos pagamentos por parte da CMF, começaram a existir
problemas com o “Sovela” e com a revista “Rubias” ao nível dos pagamentos (cujos
atrasos classificou de “escandalosos”).
Quanto à revista “Rubias”, era o PS ou os anunciantes da revista que teriam de
proceder ao pagamento respectivo (segundo lhe foi transmitido na reunião que referiu
em que esteve presente a testemunha Horácio Reis).
A responsabilidade pelo pagamento dos serviços prestados ao “Sovela” era, por
seu turno, da responsabilidade deste jornal.
O seu filho (“Portcom”) debitou os serviços prestados aos assinantes do jornal,
os quais acabaram por proceder à respectiva liquidação depois de ameaçar exigir do
“Sovela” o pagamento em causa.
No que respeita à “Rubias” houve uma interpelação à testemunha Horácio Reis
para que o pagamento fosse efectuado, pedindo-lhe que intercedesse junto dos
assinantes para que procedessem ao pagamento. Essa interpelação foi feita verbalmente
pelo depoente, ignorando se o seu filho fez algum interpelação por escrito.
Foi então confrontado com o documento de fls 2126 e 2127 (fax da advogada da
“Portcom” – Drª Paula Barbosa -, de 02.04.98, enviado para o “Sovela” às 16.16 horas
desse dia, referente a um acordo extrajudicial de pagamento e onde se comunicava que,
segundo os assinantes, a publicidade havia sido paga), referiu que o seu filho melhor
poderá esclarecer o teor desse fax.
Foi confrontado com o teor do documento de fls 2125 (o fax referido terá sido
remetido pelo “Sovela” - João Ivo - à arguida Fátima Felgueiras no dia 02.04.98),
referiu ignorar quem é o dito João Ivo, não sabendo também por que razão esse
documento foi enviado à dita arguida.
As relações entre a “Proeme” e a CMF foram atribuladas, sendo certo que os
serviços que lhe foram prestados acabaram por ser pagos após intervenção do arguido
Horácio Costa.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em face do atraso no pagamento a “Proeme” esteve em risco.


Pensou mesmo agir criminalmente contra toda a gente da CMF.
Quando o depoente se candidatou à C.M. de Paredes foi a “Portcom” que
prosseguiu com os trabalhos quer ao nível da assessoria quer ao nível das iniciativas
inseridas no âmbito da comemoração dos 20 anos do poder local.
Foi então confrontado com a missiva de fls 14 do apenso 103 (missiva da CMF
dirigida a si, datada de 16.09.97, assinada pela testemunha Fernanda Castro Leal,
comunicando-lhe a suspensão do contrato de assessoria a partir de 1.08.97, conforme
despacho da arguida Fátima nesse sentido), referindo que não aceitou a posição
transmitida pela CMF.
Para além dessa comunicação não se recorda de mais alguma. Esclareceu que foi
o seu filho quem prossegiu os trabalhos.
Recorda-se de ter estado numa reunião com a directora financeira da CMF.
Teve ainda a esse propósito um encontro com o arguido Horácio Costa num
centro comercial em Guimarães, com quem desabafou, tendo ficado tranquilo na
medida em que ele lhe assegurou que iria resolver o problema dos pagamentos (não só
em relação à CMF, como em relação à campanha eleitoral, à “Rubias” e ao “Sovela”).
O arguido Horácio apresentava-se-lhe como sendo assessor da arguida Fátima.
Recorda-se que lhe deu os parabéns porque tinha acabado de ser pai (admite que
lhe possa ter dado os parabéns por estar prestes a nascer o seu filho, mas tem a ideia que
este já tinha nascido; segundo o arguido Horácio, o seu filho nasceu a 02.04.98,
conforme aliás cópia do respectivo boletim de nascimento, constante de fls 14739).
Foi no encontro que teve com o arguido Horácio em Guimarães que fez o
manuscrito de fls 2121 (onde tem contas feitas por si relativas a serviços prestados à
CMF, à campanha eleitoral, ao “Sovela” e à “Rubias”), sendo certo que nesse
documento existem apontamentos que não são da sua lavra (só o que está a preto foi
escrito pelo depoente).
Entregou esse documento ao dito Horácio Costa nesse encontro (admite que
possa ter tido a iniciativa de contactar o arguido Horácio para se encontrar com ele, o
que veio a suceder nas circunstâncias referidas. Recorda-se que ele não queria que o
encontro tivesse lugar em Felgueiras, mas não se recorda qual o motivo que invocou
para esse facto).
Esclareceu que foi o seu filho quem lhe forneceu os valores que manuscreveu
nesse documento, pois foi ele quem a partir de Junho/Julho de 1997 tomou conta dos
assuntos da “Proeme” e da “Portcom”.
Não teve qualquer reunião na CMF com a testemunha Fernanda Castro Leal e o
arguido Horácio Costa.
Em face desta declaração, foi confrontado com a missiva de fls 2116 e 2117
(missiva da “Proeme” à CMF, à atenção do arguido Horácio Costa, datada de 18.03.98,
assinada pelo depoente – conforme reconheceu -, onde se alude a uma reunião na CMF
ocorrida no dia anterior, 17.03.98).
Esclareceu que foi a sua advogada quem redigiu essa carta. Admitiu que no dia
17.03.98 teve lugar uma reunião na CMF a propósito dos pagamentos, mas não foi o
depoente quem participou nela, mas antes o seu filho. Assegurou que se nela tivesse
participado teria exigido um documento escrito acerca dos assuntos ali tratados.
As reuniões que dissessem respeito a esse assunto apenas poderiam ter lugar ou
com o depoente ou com o seu filho.
A carta de fls 2116 foi necessariamente anterior à reunião com o arguido
Horácio em Guimarães, no centro comercial.

547
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nunca teve conhecimento de qualquer decisão da arguida Fátima de não


pagamento das suas facturas ou que acusasse a “Proeme” de não ter cumprido as suas
obrigações. Aliás, os despachos dela não lhe chegavam às mãos, sendo certo que era
logo encaminhado para a parte financeira da CMF, não tendo mantido mais contactos
com a arguida Fátima.
Ignora se as contas que efectuou no documento de fls 2121 foram entregues à
arguida Fátima Felgueiras.
Na sequência das eleições de 1997 foi vereador (a tempo parcial) na C.M. de
Paredes.
Teve muitos problemas familiares. Teve de hipotecar a casa para pôr dinheiro na
“Proeme” em Maio de 1998.
Em 1998 a sua empresa foi assaltada. Em 2000 foi novamente assaltada, o que
constituiu o golpe definitivo, levando-o a uma depressão e a problemas de ordem
psiquiátrica. Se não tivesse tido o auxílio de alguns amigos ter-se-ia suicidado,
conforme sucedeu com o seu pai.
Os serviços prestados para a campanha eleitoral não foram tratados consigo, mas
com o seu filho, que assim está em melhor posição para explicar os pagamentos.
É natural que possa ter recebido do arguido Horácio algum cheque referente a
um pagamento, mas não se recorda. Ao depoente apenas interessava que o pagamento
fosse efectuado.
O “projecto global”, no que concerne à CMF, diz respeito quer à assessoria de
comunicação e imagem quer às iniciativas levadas a cabo no âmbito da comemoração
dos 20 anos de poder local.
A “Proeme” não prestou qualquer serviço para a revista “Rubeas” e para o
“Sovela”, serviços esses que foram prestados pela “Portcom”.
Efectuou muitos telefonemas para a CMF por causa dos pagamentos em falta.
Na altura não sabia que o “Sovela” pertencia à ADEC.
Os pagamentos efectuados pela CMF foram efectivados através de cheques que
eram remetidos pelo correio.
Admite que possa ter ido à CMF receber cheques para pagamento à “Portcom”.
Os pagamentos começaram a ser feitos por transferência para uma empresa de
“factoring”.
O arguido Horácio foi como que um salvador no que concerne à questão dos
pagamentos.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa reafirmou o que já antes
tinha dito acerca da “Proeme”.
A testemunha Renato Guerra (pai) contactou-o variadas vezes e dava-lhe conta
dos seus problemas empresariais. Manifestava-lhe sempre disponibilidade para o ouvir e
para o auxiliar a resolver os problemas no que respeita ao pagamento.
No dia 02.04.98 o depoente foi pai pela segunda vez (cfr. documento de fls
14739), na medida em que na “Casa de Saúde de Guimarães” (“Clínica Paulo VI”)
nasceu o seu segundo filho. Ora, como a testemunha Renato Guerra (pai) insistia muito
em falar consigo, combinou encontrar-se com ele em Guimarães num centro comercial.
Nesse encontro ele apelou à resolução de um diferendo com a CMF relativo aos
painéis e a algumas contas da campanha eleitoral (pagamento de brindes, camisolas
estampadas e guarda-chuvas).
Essa reunião teve lugar no dia seguinte ao do nascimento do seu filho (03.04.98)
e confidenciou à testemunha que tinha acabado de ser pai.

548
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Dadas as circunstâncias, nessa ocasião jamais tomaria a iniciativa desse encontro


(a sua esposa acabara de dar à luz através de um parto por cesariana).
Nesse encontro a testemunha em causa não lhe entregou qualquer documento,
designadamente o de fls 2121.
Reafirmou que ele esteve presente na reunião na CMF com o depoente e as
testemunhas Fernanda Castro Leal e Terezinha, tendo sido nela que ele elaborou o
documento de fls 2121.
Depois do encontro em Guimarães o depoente falou com o arguido Bragança e
desde então teve ordens para pagar as despesas de campanha em prestações, através de
fundos depositados na conta do BES.
Toda e qualquer intervenção do depoente era reportada sempre à arguida Fátima
Felgueiras.
A testemunha Renato Guerra (pai) teve também reuniões com o arguido
Joaquim Freitas.
Houve pelo menos um pagamento em numerário à “Proeme”, com fundos
provenientes da conta do BES e relativo a despesas de campanha.
*
A testemunha Manuel Renato Guerra Fonseca e Silva reafirmou a posição
anteriormente assumida no que respeita à sua não participação na reunião na CMF
acima aludida e quanto às circunstâncias em que entregou ao arguido Horácio o
manuscrito de fls 2121.
No encontro de Guimarães não conversaram apenas sobre as despesas de
campanha, sendo certo que a questão dos brindes foi tratada pelo seu filho.
Foi confrontado com o quadro de fls 192 do apenso 4, onde se faz referência aos
brindes, reafirmando que foi o seu filho quem tratou desse assunto.
Nesse documento foi manuscrito a vermelho que essa despesa foi paga a
12.02.98, tendo reconhecido nesses dizeres a letra do seu filho (316.250$00, pagos
através do cheque de fls 195 do apenso 4, datado de 12.06.98).
No apenso 1, fls 29 (extracto da conta do BES), aparece a referência ao mesmo
cheque (de fls 195 do apenso 4), no montante de 316.250$00 e como tendo sido pago a
12.02.98.
Não tem qualquer explicação para o facto do cheque em causa ter sido emitido
com uma data posterior (em 4 meses) em relação à real data da sua emissão.
*
Na acareação efectuada entre as testemunhas Renato Guerra (pai) e Fernanda
Castro Leal acerca da presença daquele na reunião na CMF a que se faz alusão na
missiva de fls 2116 e 2117 (ocorrida a 17.03.98), cada um manteve a respectiva versão
já expressa ao tribunal.
*

- Testemunha Manuel Renato Ferreira Guerra e Silva


É filho da testemunha Renato Guerra e director de produção de artes gráficas.
Tinha uma quota de 20% na “Proeme” (o seu pai tinha uma quota de 80%) e era
o seu director de produção e é sócio-gerente da “Portcom” (o seu pai tem uma quota
nesta empresa de 10%).
A “Proeme” era mais uma agência de publicidade e a “Portcom” dedicava-se
mais a trabalhos de pré-impressão.
A “Proeme” venceu diversos concursos para a CMF e fez vários trabalhos para
ela entre 1996 e 1998. Não sabe precisar datas.
Fizeram livros, exposições e filmes em 3 dimensões de projectos da CMF.

549
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Inicialmente foi o seu pai quem estabeleceu com a CMF os contratos e os


assinou em representação da “Proeme”. O depoente, por sua vez, coordenava os
trabalhos.
Existiram entretanto problemas com os pagamentos dos serviços prestados.
O seu pai entretanto candidatou-se à presidência da C.M. de Paredes e foi o
depoente quem passou a lidar com a CMF.
As facturas eram descontadas por uma empresa de “factoring” e se a CMF as
não pagasse teria de ser a “Proeme” a fazê-lo.
A CMF entendia que não tinha de liquidar os valores contratados.
Teve então uma reunião na CMF para esclarecer este problema. Tem a ideia que
teve essa reunião com a directora financeira da CMF (não se recorda de ter estado mais
alguém presente). Tem a ideia que a testemunha Fernanda Leal era a directora
financeira, mas não tem a certeza.
Foi a uma ou duas reuniões na CMF para pressionar esta a pagar e procurou
esclarecer porque motivo lhes era devido esse pagamento. Não se recorda em concreto
que trabalhos estavam em causa.
No âmbito da comemoração dos 20 anos do poder local fizeram livros,
brochuras, uma exposição na Biblioteca Municipal de Felgueiras, etc.
É natural que alguns pagamentos em falta estivessem relacionados com esses
pagamentos.
Conhece o arguido Horácio Costa, mas não se recorda de ter estado presente em
alguma reunião onde ele estivesse presente com a testemunha Fernanda Leal e outra
senhora.
Foi o seu pai quem assinou a carta de fls 2116, remetida pela “Proeme” à CMF a
18.03.98 e relaciona-se com o problema da falta de pagamento.
Certo é que não se recorda desta carta.
Na mesma faz-se referência a uma reunião no dia anterior na CMF, sendo certo
que não se recorda do seu pai nessa altura ter tido qualquer reunião na CMF. Pensa que
ele não terá tido nessa altura qualquer reunião na CMF porque então ele nem sequer ia à
empresa devido a problemas de saúde (depressão). Em todo o caso, não sabe se ele
esteve ou não presente nessa reunião a que se faz alusão na missiva em causa.
Em nenhuma reunião na CMF o depoente se recorda de ter entregue dossiers
fotográficos.
Para além de terem feito trabalhos para a CMF executaram trabalhos para o PS
designadamente no âmbito da campanha eleitoral de 1997 (mormente brindes,
“outdoors”, cartazes, autocolantes, etc), para a revista “Rubias” e para o “Sovela” (foi a
“Portcom” que executou os trabalhos para o “Sovela”).
O depoente não dominava a totalidade da matéria relacionada com os
pagamentos.
Era a “ADEC” que pagava os serviços prestados para o “Sovela”.
Não se recorda se recebeu algum cheque sacado sobre uma conta titulada pelo
arguido Horácio Costa. Foram muitos os cheques que receberam.
Os pagamentos dos serviços prestados para a campanha eleitoral eram tratados
pelo arguido Horácio Costa. Chegou a receber dele cheques. Não sabe se chegaram a
receber em numerário. Esclareceu que não controlava todos os pagamentos que iam
recebendo.
Não sabe se o seu pai se reuniu com o arguido Horácio fora de Felgueiras. Não
se recorda dele ter comentado esse facto consigo.
Não se recorda de alguma vez ter ouvido a expressão “projecto global”.

550
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontado com o documento de fls 2121 referiu desconhecê-lo, reconhecendo


porém nele a letra do seu pai.
Não se lembra quem forneceu os números ao seu pai e com base nos quais
manuscreveu aquele documento.
No que respeita por exemplo à revista “Rubeas” admite que possa ter sido o
depoente a fornecer o valor que consta desse documento.
Tem a ideia que, no que toca à “Rubias”, a factura foi apresentada à “ADEC”.
A carta de fls 2126 e 2127, remetida pela advogada, foi enviada a 02.04.98 ao
“Sovela” e prendia-se com a revista “Rubias”.
Depois de 4 ou 5 meses de edição dessa revista a direcção do “Sovela”
sustentava que não pagaria certos serviços prestados. Encarregaram então a sua
advogada de tratar desse assunto, razão pela qual ela remeteu a missiva em causa.
A “Rubias” era um suplemento do “Sovela” e teve um orçamento autónomo,
tendo sido acordado que o débito deveria ser apresentado aos anunciantes da revista
para que procedessem ao respectivo pagamento. Porém, estes devolveram as facturas
que lhes foram enviadas (na carta faz referência que os anunciantes já tinham pago a
outra empresa).
Não se recorda quem acabou por passar os cheques que serviram de meio de
pagamento desses serviços.

- Testemunha Elisabete Susana Pereira da Silva


Foi funcionária da “Portcom” durante cerca de 7 anos, de Janeiro de 1997 até
2004.
Nessa empresa era funcionária administrativa, tratando por exemplo da
correspondência e fazendo os contactos com os fornecedores.
Não tratava da parte contabilística, designadamente das facturas. Não emitia
também recibos.
O seu patrão era a testemunha Renato Guerra (filho).
Às vezes dava apoio à “Proeme” em funções da mesma natureza.
A depoente tinha pouca proximidade com os clientes.
Recorda-se foram feitos trabalhos para a CMF (não sabe quais, mas seriam
brochuras, desdobráveis, etc).
Não se recorda se fizeram algum trabalho para o PS.
Confrontada com o documento de fls 62 do apenso 4 verificou-se que se trata de
um cheque sacado sobre a conta do BES de Outubro de 1997, emitido ao portador e no
montante de 540 cts.
Confrontada com o documento de fls 61 do apenso 4, reconheceu tratar-se de
um recibo nesse montante e que foi feito pela depoente.
Tratou-se do pagamento de serigrafias para a campanha eleitoral.
Lembra-se executaram trabalhos para o “Sovela” (não sabe se a “Proeme” se a
“Portcom”).
Foi então confrontada com a factura da “Portcom” no valor de 2.700 cts, emitida
à ADEC (referente a trabalhos para o “Sovela”), datada de 18.09.97 (cfr. fls 360 do 2º
volume), sendo certo que a fls 359 do 2º volume consta o respectivo recibo elaborado
pela depoente a pedido da testemunha renato Guerra.
Foi confrontada com o cheque de fls 71 do apenso 1, no valor de 2.000 cts e
datado de 17.09.97, referindo ignorar se se tratou de um pagamento parcial da factura de
2.700 cts acima referida.
Explicou que os pagamentos não passavam por si.
Por esse facto, ignora se existiu algum pagamento em numerário.

551
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se lembra se existiram dificuldades no recebimento dos pagamentos por


parte da CMF.
A testemunha Renato Guerra (pai) era muito nervosa e foi deixando de estar
presente na empresa. Não sabe se teve algum problema de saúde. Era uma pessoa que
não se abria muito, sendo mesmo introvertido. Se falava era mais com a Ana (filha
dele).
Confrontada com a carta de fls 2116 e 2117, reconheceu nela a assinatura da
testemunha Renato Guerra (pai). Não se lembra se foi a depoente quem a dactilografou,
mas a maior parte das cartas eram redigidas por si.

Análise crítica
Antes de mais, cabe referir que a matéria constante da pronúncia e que diz
exclusivamente respeito ao crime de abuso de poderes imputado à arguida Fátima
Felgueiras não irá ser objecto de análise, na medida em que o procedimento criminal
relativo a tal crime foi declarado prescrito (cfr. a acta relativa à 94ª sessão de
julgamento).
Resta assim apreciar a matéria de facto invocada relativamente ao crime de
prevaricação de que a arguida Fátima também veio pronunciada (e que essecialmente se
reporta à alegada preterição da firma “Isto É” no concurso limitado referido neste
capítulo).
Acerca da factualidade em causa, é relevante o relatório da IGAT de fls 3165 e
ss. (cfr. fls 52 a 54 de tal relatório), bem como o relatório de fls 4677 e ss.
Nesses relatórios vêm descritas as relações contratuais estabelecidas entre a
CMF e a “Proeme” e entre a “ADEC” e a “Portcom” (além dos fornecimentos
efectuados para a campanha eleitoral), bem como os valores facturados e recebidos por
estas empresas. De resto, no despacho de pronúncia vêm indicados os documentos
pertinentes relativos quer ao concurso referido quer aos vários contratos celebrados,
para os quais remetemos, já que eles não suscitam qualquer dificuldade de interpretação
e a respectiva veracidade não foi posta em causa.
A conta do BES, como se viu, serviu igualmente para liquidar facturas
apresentadas pela “Proeme”/”Portcom”, mas no âmbito de trabalhos realizados por
essas empresas para a “ADEC” e para a campanha eleitoral (matéria acerca da qual já
nos pronunciamos sumariamente a propósito do 1º capítulo da pronúncia).
Por outro lado, já tivemos também a oportunidade de referir que não terá sido
por acaso que a arguida Fátima Felgueiras procurou melhorar a imagem da CMF,
divulgando a sua actividade, pois dessa forma, naturalmente, também se promovia.
Para além disso, era arguida Fátima quem de facto mandava na “ADEC” (cfr.
por exemplo as declarações proferidas pelo arguido Horácio a esse propósito; assim se
explica, por exemplo, que o fax de fls 2125 tenha sido remetido à arguida Fátima).
Tudo isto faz suspeitar da existência de um “projecto global”, a ser executado
em várias frentes (divulgação da actividade camarária, melhorando a respectiva
imagem; prestação serviços para a “ADEC”, proprietária do “Sovela”, jornal que
propagandeava a actividade político-partidária da arguida Fátima, bem como a sua
acção à frente dos destinos da edilidade; e fornecimento de material para a campanha
eleitoral de 1997).
Nesse sentido aponta o documento de fls 2121, onde a testemunha Renato
Guerra apontou os valores em dívida, sem fazer qualquer distinção entre as entidades
para quem os serviços foram efectuados (CMF, ADEC e PS) e sem fazer qualquer
distinção em relação às firmas que prestaram esses mesmos serviços (“Proeme” e
“Portcom”).

552
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Porém, não se demonstrou que tenha ocorrido qualquer reunião em finais de


1996, nos termos referidos na pronúncia.
Na verdade, esse facto não foi confirmado por quem quer que seja, sendo aliás
desmentido (cfr. as declarações prestadas pela arguida Fátima e o depoimento da
testemunha Renato Guerra).
Em todo o caso, segundo a testemunha Renato Guerra, em princípios de 1997, já
depois da “Proeme” ter recebido o convite no âmbito do concurso limitado referido nos
autos, reuniu com a arguida Fátima Felgueiras e outros elementos da CMF no sentido de
obter os esclarecimentos que entendia necessários em ordem a apresentar a respectiva
proposta.
Segundo esta testemunha, só mais tarde é que foi contactado por alguém do
“Sovela”, seguramente já depois de 25.04.97 (em face de episódio que relatou), tendo-se
reunido em Maio desse ano com os responsáveis desse jornal, explicando por que razão
foi a “Portcom” a desenvolver a prestação de serviços respectiva (na prática, as duas
empresas confundiam-se, já que os sócios eram os mesmos, mas com participações
distintas – cfr. os depoimentos das testemunhas Renato Guerra e Manuel Renato).
Também não se demonstrou que antes de 1997 tenha existido qualquer
relacionamento entre a CMF e a “Proeme”, pois tal facto não emergiu de qualquer meio
de prova produzido na audiência de julgamento.
Já a novela que envolveu o pagamento dos serviços prestados para a CMF, com
tomadas de posição radicalmente opostas pela arguida Fátima Felgueiras, é folhetim que
acaba por não assumir relevância nesta sede (cfr. em todo o caso os depoimentos
prestados pelos arguidos Fátima Felgueiras e Horácio Costa e o testemunho de
Fernanda Castro Leal e Terezinha do Nascimento, saltando à vista que sobre esse
episódio a arguida Fátima não depôs com verdade).

Adjudicação dos contratos de prestação de “serviços de assessoria de


comunicação e imagem” e de “concepção, produção e fornecimento de exposição no
âmbito das comemorações dos 20 Anos do Poder Local”, celebrados entre a
“Proeme” e a CMF:

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmou, para além do já referido, o teor das propostas apresentadas pelas
firmas “Isto É” e “Proeme”, conforme descrito na pronúncia, sendo certo que o juri que
as apreciou foi integrado pelos três directores de departamento da CMF.
Não tendo posto em causa o parecer da comissão de análise das propostas,
venceu a proposta da “Proeme” por ter sido considerada mais apelativa pela depoente,
sendo certo que, conforme se pode vislumbrar no quadro de fls 31 do apenso 103,
segundo a arguida, procede-se à comparação de coisas que não são comparáveis, dada a
diferença das propostas apresentadas.
Em todo o caso, salientou a depoente que lhe era indiferente qual a empresa que
viesse a ganhar o concurso.
Assim, por despacho constante de fls 29 do apenso 103, a arguida adjudicou à
firma melhor pontuada (nem sequer identificou a firma em causa) a execução dos
serviços previstos no ponto 5.1. do caderno de encargos, sendo certo que de fora ficou a
adjudicação dos serviços a que se reporta o ponto 5.2. do caderno de encargos, o que se
coadunou com as observações feitas pela comissão de análise no seu parecer quanto à
circunstância de, em face da modalidade do concurso em causa, não se poder ultrapassar
o valor de 7.500 contos, pelo que só deveriam ser adjudicados os serviços previstos no

553
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

ponto 5.1. do dito caderno de encargos, o que efectivamente veio a suceder com a
celebração do respectivo contrato de prestação de serviços no dia 01.04.97 com a
“Proeme”, pelo valor global de 6.450.000$00 + IVA (7.546.500$00), nos moldes
descritos na pronúncia.
Confirmou o teor do despacho constante de fls 14 do apenso 103, quanto à
suspensão dos efeitos do contrato.
Quanto aos demais trabalhos que ficaram de fora do supra aludido contrato
celebrado com a “Proeme” a depoente referiu ter decidido fazer um ajuste directo desses
serviços, cujo limite se cifrava em 25.000 contos, conforme aprovado pela Assembleia
Municipal (cfr. acta nº 26 de 16.10.95, documento junto já no decurso da audiência de
julgamento).
Consequentemente, foram celebrados os demais contratos referidos na
pronúncia.
A propósito, referiu que fiezeram ainda mais duas exposições aproveitando o
material utilizado na exposição da Exponor (na Lixa e em Idães).
Quanto às serigrafias, referiu que deveriam reportar-se a 5 temas, mas porque os
serviços não forneceram à “Proeme” as informações necessárias as mesmas
circunscreveram-se apenas a três temas. Consequentemente, houve uma redução de
preço.
Quanto às medalhas (concebidas pelo escultor José Rodrigues), referiu que os
autarcas receberam as mesmas no dia 25.04.97 (assim, quando o contrato respectivo foi
formalizado as medalhas já estavam feitas), data que coincidiu com a primeira
exposição.
No que concerne aos desdobráveis, referiu que também apenas disseram respeito
a 3 temas (ao invés de 5), pelo que se verificou igualmente uma redução no preço.
No que respeita ao aluguer dos 40 outdoors referiu que procurou baixar o preço
da adjudicação, o que não conseguiu uma vez que os mesmos estiveram em uso pela
CMF até Dezembro de 1997, independentemente das serigrafias que ali foram
colocadas.
Quanto ao videograma, esclareceu que dizia respeito à apresentação do projecto
de ampliação da Alameda de Stª Quitéria.
Quanto ao facto de terem sido celebrados contratos distintos, referiu que
relativamente aos contratos celebrados em data diferente a sua celebração foi decidida
em momento diverso.
Além disso, dada a urgência na realização desses serviços e para evitar a
realização de um concurso, os contratos só foram formalizados nas datas que deles
constam, apesar de terem sido negociados antes em datas diferentes (aliás, alguns desses
contratos dizem respeito a serviços já contemplados na proposta da “Proeme”
relativamente ao concurso limitado supra referido).
Esclareceu que teve problemas com o Sr. Renato Guerra quando reduziu o preço
de dois dos contratos celebrados (cfr. as facturas da “Proeme” constantes do apenso 133
e os respectivos recebimentos, nos moldes descritos na pronúncia).
Referiu ter ficado satisfeita com o trabalho desenvolvido pela “Proeme” (o que
parece ser contraditório com alguns despachos que a propósito proferiu; cfr. fls 2094 a
2097 do 9º volume, no qual, segundo a depoente, foi aposto um projecto de despacho) e
que sempre controlou o cumprimento dos contratos em causa, chamando à atenção dos
serviços para o facto de se verificarem atrasos no fornecimento de informação à
“Proeme”, necessárias aliás para o desenvolvimento dos seus serviços para com a
edilidade.

554
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

De resto, confirmou que teve uma reunião com o Sr. Renato Guerra em Março
de 1998 (cfr. fls 2093 do 9º volume) e que na sequência da mesma pediu um parecer ao
Departamento Administrativo da CMF.
Referiu que não tinha plena noção do que efectivamente havia sido executado
pela “Proeme” na medida em que os serviços camarários fizeram solicitações a essa
empresa sem o seu conhecimento. Daí que não tivesse a informação necessária para
saber se a “Proeme” tinha ou não razão nas reivindicações que fazia a propósito dos
pagamentos.
Explicou a depoente que mandou encerrar a assessoria de comunicação e
imagem em finais de Julho de 1997, mas os serviços só o comunicaram à “Proeme” em
Setembro desse ano, sendo certo que esse cancelamento retroagia a Agosto de 1997 (cfr.
fls 14 do apenso 103 e o fax de fls 219 dirigido ao arguido Horácio Costa). Referiu
nunca ter visto o documento de fls 2121.
Ora, a “Proeme” queria receber pelos serviços prestados em Agosto de 1997,
cujo pagamento acedeu em face do facto de juridicamente ser difícil sustentar a posição
da CMF.
A propósito do despacho de fls 2094 (recusa de pagamento), referiu que na
verdade não lhe assistia razão, visto que a responsabilidade era da CMF ao não fornecer
a informação necessária, conforme já referido.
A propósito do documento de fls 2101, que diz respeito ao stand, ironizou
dizendo que a dois meses das eleições, se tivesse querido beneficiar a “Proeme”, não
teria tomado a posição que consta daquelas notas (dirigidas à DDA – Directora do
Departamento Administrativo), sendo certo que o essencial foi a exposição da Exponor
e não as outras exposições que tiveram lugar no concelho de Felgueiras.
A propósito do documento de fls 2104, referiu que não é verdade que nenhuma
assessoria tenha sido prestada pela “Proeme” (conforme consta daquela nota), sendo
certo que esses documentos não constam do processo existente na CMF e estiveram
guardados por alguém com objectivos pouco claros (algumas dessas notas não
chegaram às mãos da DDA e terão sido subtraídas pelo arguido Horácio Costa).
Esclareceu que o Horácio Costa integrou uma comissão coordenada pela Drª
Fernanda Leal de modo a avaliar o que era devido pela CMF à “Proeme”.
De resto, referiu ainda que as suas notas (de 19.03) foram colocadas na
secretária da DDA e que o Horácio Costa pegou nelas e, confrontando a depoente com
elas, aconselhou-a a aceder às reivindicações da “Proeme”, pedindo-lhe para ponderar
melhor a sua decisão, o que acabou por fazer depois de ter falado com a DDA, Drª
Fernanda Leal (e, ao que pensa, também com o Dr. José de Barros), de sorte que
proferiu o despacho de fls 3 do apenso 103 (igual ao que consta de fls 2122), datado de
29.03.98.
Explicou o facto de aparecerem folhas iguais com despachos diferentes pela
circunstância de, tendo desaparecido as suas notas, foi produzida nova informação,
tendo então aposto o despacho de fls 3 do apenso 103 (igual ao que consta de fls 2122).
Explicou as diferenças do seu despacho conforme consta de fls 2093 e o
respectivo despacho que consta desse dossier na CMF com uma falsificação do mesmo
(cfr. as respectivas diferenças comparando o que consta de fls 2093 e o que consta de fls
3 do apenso 103 ou de fls 2122).
Conforme se pode ver nos documentos de fls 2093 e ss., a generalidade dos
mesmos estão rubricadas pela Fernanda Leal, pela Teresinha e pelo Horácio Costa, não
encontrando explicação para o facto do mesmo não suceder com o documento de fls
2101 (mapa).

555
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Mais referiu que o PS editou uma revista através do jornal “O Sovela”,


ignorando se a “Proeme” prestou serviços para esse jornal.

- Arguido Horácio Costa


Dá-se aqui por reproduzido o que referiu a propósito da introdução a este
capítulo, designadamente o que foi referido acerca da sua intervenção no diferendo que
opôs a CMF e a “Proeme” acerca do que deveria ou não ser pago a esta.

- Testemunha Silvino de Jesus Perdigão


Enquanto inspector da IGAT foi destacado, juntamente com o inspector Luís
Orlando Cardoso Botelho Maia, para fazer uma inspecção ordinária ao Município de
Felgueiras na segunda metade de 2001 e durante mais de 2 meses.
Tem a ideia que apreciaram ainda algumas queixas efectuadas e que lhes
chegaram via PJ.
Fizeram um relatório na sequência dessa inspecção (fls 3165 e ss. dos autos) e
um outro mais tarde na sequência de uma averiguação rápida de alguns processos de
licenciamento (fls 2002 e ss. dos autos).
Explicou que as matérias abordadas foram distribuídas por ambos os inspectores
subscritores dos relatórios em causa, de sorte que ao depoente tocou a matéria que não
se prendia com o urbanismo.
No que concerne às relações estabelecidas entre a CMF e a “Proeme” referiu que
esta empresa prestou serviços no âmbito das “Comemorações dos 20 Anos de Poder
Local” (a análise das propostas apresentadas pelas duas concorrentes consta de fls 19 a
22 do apenso 103).
A adjudicação não podia ultrapassar os 7.500.000$00 conforme aliás a
Comissão de Avaliação das propostas advertiu no respectivo relatório (razão pela qual
só parte dos serviços foram incialmente adjudicados).
Porém, por despacho de fls 113 a 116 do apenso 103, datado de 24.04.97, a
arguida Fátima Felgueiras adjudicou à “Proeme” a montagem de um stand por
19.000.000$00 (serviço que constava da proposta apresentada por essa empresa quando
se apresentou ao concurso referido – ver ponto 5.2, al. b) do relatório de análise das
propostas).
Por despacho datado de 24.04.97 foi adjudicada à dita firma o aluguer de 40
painéis por 8.100.000$00 (cfr. fls 104 a 106 do apenso 103).
Tal serviço também já constava da proposta da “Proeme” quando se apresentou
a concurso (cfr. o relatório de análise das propostas de fls 19 a 22 do apenso 103).
Referiu não saber se a deliberação de 28.04.90 da Assembleia Municipal de
Felgueiras, que autoriza a presidente do Município a fazer aquisições até ao valor de
25.000.000$00 anuais, tem aqui aplicação ou não.
Tratam-se de deliberações que têm de ser feitas em todos os mandatos.
Se tal deliberação não foi renovada no mandato de 1997 tem aplicação o limite
de 7.500 cts (porém, ver o documento de fls 11887, reportada a uma reunião de Câmara
de 16.10.95, onde é autorizada a realização de despesas até àquele limite de 25.000 cts
anuais).
*
A arguida Fátima, por seu turno, sustentou nesta altura que o limite de 7.500
cts reporta-se apenas ao concurso limitado, sendo certo que no ajuste directo não existe
esse limite, o qual é o determinado pela lei e pela Assembleia Municipal, que no caso
era de 25.000 cts anuais (cfr. fls 11879 a 11887), conforme acto de delegação de
competências na presidente.

556
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira


Elaborou o relatório de fls 4677 e ss. dos autos, que confirmou.
Esclareceu que a análise contabilística efectuada à “Proeme” e à “Portcom” foi
muito limitada, visto que as instalações da primeira estavam devolutas e foi-lhe dito que
o computador onde estava a respectiva contabilidade havia sido furtado.
Consequentemente, na “Proeme” apenas analisaram alguns documentos que tinham sido
arquivados.
Já na CMF estavam devidamente contabilizadas todas as operações.
No quadro de fls 4697 (anexo ao relatório) está expressa a relação dos
pagamentos à “Proeme” e à “Portcom” através da conta do BES referida nos autos.

- Testemunha Maria Fernanda Dá Mesquita Castro Leal


Relativamente à “Proeme” começou por referir que se tratou de uma firma com
a qual a CMF celebrou alguns contratos no âmbito das comemorações dos “20 Anos de
Poder Local” em 1997.
Em Fevereiro de 1997 foi aberto um concurso limitado, tendo sido endereçados
convites a três empresas (“Proeme”, “Isto É” e “Nortimagem”) para a prestação de
serviços de assessoria de comunicação e imagem, mais um stand a ser instalado na
Biblioteca Municipal, na Lixa, em Barrosas e na “Exponor” no âmbito das referidas
comemorações.
Segundo ouviu dizer ou ao Arquitecto Jordão ou à arguida Fátima Felgueiras
tais empresas já eram conhecidas, daí que lhes tenham sido endereçados os convites.
Porém, só a “Proeme” e a “Isto É” apresentaram propostas. A “Nortimagem”
limitou-se a remeter à CMF um pedido de eslarecimento, não tendo apresentado
qualquer proposta.
A depoente, o Arquitecto Jordão e o arguido Barbieri Cardoso integraram a
Comissão de Análise das duas propostas apresentadas.
No âmbito do trabalho que essa comissão desenvolveu foram solicitados
esclarecimentos.
Como não conseguiram elaborar uma proposta acerca da empresa a quem
deveriam ser adjudicados os trabalhos, deixaram a decisão à consideração da arguida
Fátima Felgueiras.
Do respectivo relatório apresentado à arguida Fátima Felgueiras consta um mapa
de pontuação das propostas (cfr. fls 29 e ss. do apenso 103, designadamente o quadro de
fls 32).
Ao mérito da concepção atribuíram um peso de poderação de 40%, à garantia
de exequibilidade 35% e ao preço 25%.
A “Proeme” conseguiu uma pontuação de 15,3% e a “Isto É” 15%.
A Comissão de Análise, não obstante o melhor resultado da “Proeme”, não
propôs a adjudicação dos trabalhos a essa empresa na medida em que apenas ganhou
num dos factores de ponderação (mérito da concepção) e ambas as propostas não eram
muito claras.
No final do relatório chamou-se à atenção de que a adjudicação não poderia
ultrapassar os 7.500.000$00.
Consequentemente, só os trabalhos referidos no ponto 5.1. acabaram por ser
adjudicados à “Proeme”.
Em relação a outros trabalhos adjudicados à “Proeme” foram os mesmos
efectuados por ajuste directo, a maior parte deles no dia 24.04.97, logo após a

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

adjudicação a que se reporta o concurso limitado (designadamente os que diziam


respeito ao ponto 5.2 do caderno de encargos do concurso limitado e trabalhos extra que
não constavam desse caderno de encargos).
O ajuste directo desses trabalhos foi efectuado tendo por base a proposta
apresentada pela “Proeme” ao concurso limitado referido.
Teve intervenção na preparação da celebração dos contratos respectivos.
Não controlou a execução dos contratos celebrados, daí que ignore se os
serviços foram ou não bem prestados.
As facturas apresentadas teriam de ser visadas por quem acompanhava a
execução dos trabalhos.
A depoente esteve presente na exposição na Biblioteca Municipal e na
“Exponor”. Viu também dois vídeos, um deles alusivo ao plano de pormenor de Santa
Quitéria.
Entretanto a “Lusofactor” comunicou à CMF que a “Proeme” tinha celebrado
com ela um contrato de “factoring”.
O Dr. José de Barros emitiu um parecer que ia no sentido dos créditos detidos
pela “Proeme” junto da CMF terem sido transmitidos para a “Lusofactor”, a qual
apresentou as facturas emitidas pela “Proeme” de modo a obter da CMF o respectivo
pagamento.
Formulou-se então a respectiva informação à arguida Fátima Felgueiras, dando
conta de que seria necessário que os serviços informassem o que na verdade tinha sido
feito pela “Proeme” (cfr. documento de fls 11 do apenso 103).
A arguida Fátima Felgueiras entretanto suspendeu a assesssoria jurídica, dando
conta de que a “Proeme” o não estava a cumprir de acordo com o que se obrigara.
Em face dessa decisão a depoente subscreveu o ofício de fls 14 do apenso 103,
onde comunicava à “Proeme” a suspensão desse contrato desde 01.08.
Na sequência dessa notificação a arguida Fátima Felgueiras proferiu o despacho
de fls 13 do apenso 103.
Na sequência de uma reunião de vereação a arguida Fátima Felgueiras
determinou à depoente, à testemunha Terezinha e ao arguido Horácio Costa que fosse
feito um levantamento de tudo o que tinha sido feito, o que fizeram, tendo assim
apresentado o respectivo relatório subscrito pelos três (esse trabalho foi liderado pela
depoente).
O dito relatório foi elaborado em computador (ou no computador que lhe estava
adstrito ou no computador adstrito à testemunha Terezinha, os quais não tinham
“password”, pelo que qualquer um poderia aceder aos mesmos).
Antes de produzirem o relatório solicitaram esclarecimentos à “Proeme”, mas
como os esclarecimentos escritos não foram esclarecedores tiveram com o Sr. Renato
Guerra (pai) uma reunião (que segundo o relatório ter-se-á realizado no dia anterior à
data do mesmo). Procuraram também juntos dos serviços apurar o que na verdade havia
sido feito e quem tinha encomendado o serviço.
Esse relatório foi entregue à arguida Fátima Felgueiras ou pelo arguido Horácio
Costa ou pela testemunha Terezinha (inclina-se mais para a primeira hipótese mas não
tem a certeza).
A propósito do facto de se saber porque motivo foi o arguido Horácio Costa
também incumbido daquela tarefa, referiu que ele era um prestador de serviços à CMF
desde Outubro de 1996 e era considerado assessor da arguida Fátima Felgueiras, sendo
certo que o respectivo contrato viria a ser alterado em 1998 (aumentou-se o respectivo
objecto e a remuneração).

558
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ele era responsável pelo património imobiliário da CMF e tinha um gabinete


próximo do gabinete da arguida Fátima Felgueiras, onde se encontrava todos os dias.
Ou o David ou o Armindo eram os funcionários que lhe davam apoio. Não sabe se
quando ele ocupou esse gabinete o partilhou inicialmente com o Vereador Lickefold.
Sabe em todo o caso que ele contactava directamente com a arguida Fátima
Felgueiras e que era seu assessor. Ignora se ele recebia munícipes. Em todo o caso, o
contacto que tinha com ele prendia-se normalmente com a aquisição de património
imobiliário para a CMF ou com a venda de património camarário (já que a depoente
exercia também as funções de notária privativa da CMF).
Ele era pessoa da confiança da arguida Fátima Felgueiras, tanto mais que
integrou logo a lista do PS nas eleições autárquicas de 1997. Tem ideia de que a relação
de confiança era mútua.
Não lhe parece que ele tivesse autonomia de decisão, pois submetia os assuntos
de que era incumbido à arguida Fátima Felgueiras.
Chegou a observar o arguido Joaquim de Freitas junto do GAAP à espera.
A arguida Fátima Felgueiras após ter recebito o dito relatório (não sabe se lhe
foi entregue ao final do dia 18.03.98) apôs um despacho na primeira folha, no qual se
determinava o pagamento dos trabalhos à “Proeme” (que tinham sido visados), segundo
viu numa cópia desse relatório que, em face da ideia que tem, lhe foi entregue pelo
arguido Horácio Costa. Esclarece que o despacho era o original, mas estava aposto
numa cópia do relatório e não no original do relatório entregue (facto de que na altura
não se apercebeu). Esclarece que o original do relatório foi entregue à arguida Fátima
Felgueiras e que o arguido Horácio Costa ficou com uma cópia, tendo a depoente e a
testemunha Terezinha ficado com outra cópia.
Não sabe porque razão tendo o relatório a data de 18.03.98, ela só proferiu o
despacho a 29.03.98, quando é certo que ela normalmente despachava no mesmo dia.
Só pelos Inspectores da IGAT é que soube que havia um despacho de sentido
contrário ao referido, o que para si constituiu uma surpresa (a fls 2093 e ss. consta cópia
do relatório com o despacho a não autorizar o pagamento aposto na primeira folha e está
datado de 18.03.98; a fls 3 do apenso 103 ou fls 2122 do 9º volume dos autos consta o
despacho que conhece, a autorizar o pagamento, datado de 29.03.98, aludindo ainda ao
fax de fls 10 do apenso 103, datado de 04.03.98, remetido pelo Sr. Renato Guerra ao
arguido Horácio Costa).
Aquando da reunião com o Sr. Renato Guerra (pai) que acima aludiu o contrato
de assessoria já estava suspenso (essa reunião terá ocorrido no dia anterior ao da data do
relatório).
Nunca viu o documento de fls 2121 (alegadamente da autoria da testemunha
Renato Guerra). A depoente referiu nunca ter estado em qualquer reunião com ele em
que tenha sido reclamado o pagamento de serviços prestados para a campanha eleitoral,
para o “Sovela” e para a revista “Rubias”.
À data dessa reunião não sabia qual era a intenção da arguida Fátima Felgueiras
quanto ao pagamento, sendo certo que não se recorda de ter tido com ela qualquer
conversa acerca desse assunto, não lhe tendo aliás dado qualquer conselho acerca do
mesmo.
Ignora porque razão existem dois despachos da arguida Fátima sobre o mesmo
assunto e porque razão o despacho que foi cumprido se acha aposto na cópia do
relatório elaborado e não no original que lhe foi apresentado.
Nega veementemente ter conversado com a arguida Fátima Felgueiras,
juntamente com o arguido Horácio Costa, no sentido de convencê-la a mudar de posição
quanto à questão do pagamento. Reafirma que nunca teve conhecimento do despacho

559
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

que consta de fls 2093 nem acerca dele teve qualquer conversa com o arguido Horácio
Costa, designadamente de que teriam de comunicar tal decisão ao Sr. Renato Guerra
(pai), desfavorável às suas pretensões.
A arguida Fátima Felgueiras é pessoa determinada e os funcionários não
ousavam contrariá-la (pelo que é inverosímil que quer a depoente quer o arguido
Horácio tenham procurado demovê-la de não proceder ao pagamento à “Proeme”).
Não tem qualquer elemento que a leve a concluir que foram pagos trabalhos não
executados pela “Proeme”, caso contrário teria concerteza elaborado a respectiva
informação. O despacho da arguida Fátima Felgueiras foi no sentido de se pagar o que
tinha sido visado pelos serviços.
Confrontada em concreto com o teor das expressões apostas pela arguida Fátima
Felgueiras no alegado despacho de 18.03.98, a fls 2093 a 2096 (anotações e
exclamações), parecem-lhe comentários ao teor do relatório, sendo certo que não é usual
a aposição desse tipo de comentários e exclamações ao longo do texto da informação.
Ignora se esse despacho foi apenas um projecto.
*
A este propósito a arguida Fátima Felgueiras referiu que a cópia do relatório
em causa com os comentários que apôs era um documento de trabalho para si.
Não sabe se esse relatório foi-lhe entregue ao final do dia na pasta da testemunha
Terezinha, hipótese que seria a mais natural.
Ignorava que havia sido tirada uma cópia desse relatório para cada um dos seus
subscritores.
Reafirma que o documento de fls 2093 e ss. era um documento de trabalho onde
apôs um projecto de despacho com as suas reflexões, as quais não facultou aos serviços.
Quanto às funções exercidas pelo arguido Horácio Costa, reafirmou que ele era
assessor da CMF e não da depoente.
De resto, ele era pessoa da sua confiança nos serviços que prestava.
Reafirmou que inicialmente ele ocupou um gabinete no Centro de Camionagem.
Admite porém que ele, quando tivesse necessidade, pudesse usar as instalações da CMF
nos paços do concelho, pois inicialmente o edifício do Centro de Camionagem estava
em conclusão.
*
Ainda propósito desta última matéria referida pela arguida Fátima Felgueiras, foi
referido pelo arguido Horácio Costa que quando iniciou funções na CMF iniciavam-se
os acabamentos no edifício do Centro de Camionagem, faltando inclusive a construção
dos respectivos acessos.
Foi por essa razão que por indicação da arguida Fátima Felgueiras que ocupou
um gabinete na CMF. Partilhou-o com o Dr. Sousa Oliveira quando ele era o presidente
da Assembleia Municipal e com a testemunha Cândida quando ela foi deslocada para a
recepção da parte política da CMF. Foi nesse gabinete que vendeu as lojas do Centro
Coordenador de Transportes. Chegaram ali (nesse gabinete) a ser dadas explicações ao
filho da arguida Fátima Felgueiras.
Quanto à “Proeme” reafirmou que numa reunião de veração ocorrida em 1998
foi incumbido pela arguida Fátima Felgueiras (juntamente com as testemunhas
Fernanda Leal e Terezinha) de apurar o que de facto havia sido executado por essa
empresa. Quem liderou os trabalhos foi a testemunha Fernanda Leal.
A informação prestada pela Comissão de Análise ao trabalho da “Proeme” foi no
sentido de não se proceder ao pagamento dos trabalhos, razão pela qual não compreende
porque razão a testemunha Fernanda Leal não alertou a arguida Fátima Felgueiras para

560
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

a anormalidade do despacho de pagamento em face do parecer dado na informação


quanto a esse assunto.
O depoente nunca procurou influenciar verbalmente a decisão da arguida Fátima
Felgueiras num ou noutro sentido, sendo certo que a sua opinião apenas foi plasmada
por escrito na dita informação (ou relatório).
Salientou não corresponder à verdade que a testemunha Fernanda Leal não tenha
tido conhecimento do primeiro despacho da arguida Fátima no sentido de não se
proceder ao pagamento, conforme referiu, tendo aliás transmitido essa decisão à
testemunha Renato Guerra (pai) o qual foi convocado para esse efeito (para além das
testemunhas Renato Guerra e Fernanda Leal, estavam presentes o depoente e a
testemunha Terezinha). De resto, a testemunha Renato Guerra (pai) ficou furioso com
essa decisão e chamou à colação os serviços prestados para a revista “Rubias”, para a
campanha eleitoral e para o “Sovela”, tendo efectuado então, ao que presume, as contas
a que se reporta o documento de fls 2121, daí o fax de fls 2116 endereçado ao
depoente, já que naquela altura lhe pediu para expor por escrito as suas reivindicações
quanto a esses serviços. Presume que o documento de fls 2121 tenha sido elaborado
nessa reunião porque a testemunha Renato Guerra (pai) tomava notas e no final
entregou esse documento ao depoente, altura em que lhe disse para colocar o problema
por escrito, o que ele fez através do fax de fls 2116. Pese embora a testemunha Fernanda
Leal o não tenha analisado, certo é que teve nessa altura conhecimento do documento de
fls 2121.
A testemunha Renato Guerra (pai) perspectivava como um todo os serviços
prestados pela sua empresa, conforme já teve oportunidade de referir.
A propósito dessa matéria referiu só ter ideia dessa reunião (onde a testemunha
Fernanda Leal comunicou a decisão negativa da arguida Fátima) com a testemunha
Renato Guerra (porém, no relatório alude-se a uma reunião com ele e que teve lugar no
dia anterior à data desse mesmo relatório, onde essa testemunha pessoalmente terá dado
as explicações que entendeu pertinentes, logo, antes de ter sido tomada qualquer
decisão).
Quanto ao facto da arguida Fátima Felgueiras ter alterado o seu despacho referiu
não ter sido tal situação a primeira.
Nega ter sido o depoente quem entregou o relatório à arguida Fátima Felgueiras,
sendo certo que não ficou para si com qualquer cópia do mesmo. Apenas a testemunha
Fernanda Leal guardou uma cópia dessa informação.
Tal documento também não foi entregue à arguida Fátima Felgueiras na pasta da
testemunha Terezinha, pelo que só pode ter sido entregue pela testemunha Fernanda
Leal.
Alguém deve ter exercido influência junto da arguida Fátima Felgueiras para ela
ter mudado de opinião, presumindo que deverá ter sido a testemunha Fernanda Leal a
fazê-lo pois era ela a interlocutora junto da arguida Fátima Felgueiras no que a essa
matéria diz respeito.
*
- Testemunha Terezinha do Nascimento Lopes Domingues Carvalho
A “Proeme” prestou serviços para a CMF no âmbito das comerações dos “20
Anos do Poder Local”.
Tomou conhecimento dos contratos celebrados com essa empresa a propósito
dos pagamentos efectuados.
Essa firma cedeu o seu crédito sobre a CMF à “Lusofactor” e era esta última que
apresentava a pagamento as facturas emitidas pela “Proeme”.

561
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Era difícil confirmar junto dos serviços camarários o que de facto havia sido
feito pela “Proeme”.
Confirmou que teve intervenção na informação que foi presente à arguida
Fátima Felgueiras acerca dos serviços realmente prestados pela “Proeme” (cfr.
documento de fls a fls 3 e ss. do apenso 103 ou fls 2122 e ss. do 9º volume dos autos,
onde contém o despacho a autorizar o pagamento; a fls 2093 e ss., do 5º volume, consta
o relatório referido com um despacho de sentido inverso, datado de 18.03.98, aposto
numa folha que é uma cópia da 1ª folha do relatório, sendo as restantes o original dessa
informação).
Quanto ao contrato de assessoria foi a depoente e a testemunha Fernanda Leal
que averiguaram os serviços prestados pela “Proeme”, na sequência da qual a arguida
Fátima Felgueiras decidiu suspender esse contrato.
Mais tarde é que foi determinado pela arguida Fátima Felgueiras numa reunião
de vereação que a depoente, a testemunha Fernanda Leal e o arguido Horácio Costa
averiguassem e informassem o que na verdade havia sido feito pela “Proeme”, na
sequência do qual produziram o relatório ou informação em causa.
Em ordem a tal procuraram junto dos serviços averiguar quais os trabalhos
efectuados, o que não fácil.
Solicitaram esclarecimentos à testemunha Renato Guerra. Ele enviou-lhes então
um fax, mas como esse documento não era conclusivo decidiram reunir com ele, o que
sucedeu no dia anterior ao da data constante na informação ou relatório, tendo então
recebido dele os esclarecimentos que se julgaram pertinentes. Não se recorda se nessa
reunião ele elaborou ou não algum apontamento. Não se recorda de nela se terem
comentado outros trabalhos que não os executados para a CMF (designadamente para a
ADEC e para a campanha).
Feito o relatório (salvo erro pela testemunha Fernanda Leal no computador que
na CMF lhe está adstrito, no qual, como em todos os da CMF, inexiste “password”) e
subscrito pelos três, foi o mesmo entregue à arguida Fátima Felgueiras.
No mesmo ela apôs um despacho a mandar pagar o que tinha sido facturado pela
“Proeme”.
Um dos inspectores da IGAT confrontou-a com um despacho de sentido inverso,
mas dele não tinha conhecimento nem ouvido falar sequer (só conhece pois o despacho
constante de fls 3 do apenso 103 ou fls 2122 do 9º volume dos autos, datado de
29.03.98).
A testemunha Fernanda Leal só conversou consigo acerca desses despachos
contraditórios aquando da inspecção da IGAT.
Foi então confrontada com as declarações que prestou perante a PJ a fls 2820 e
2821, linhas 127 a 129, tendo-as confirmado, admitindo então que soube desse
despacho que determinava o não pagamento pela testemunha Fernanda Leal antes da
referida acção inspectiva. Presume que lhe tenha falado desse despacho depois dela ter
sido ouvida na PJ.
Foi a testemunha Fernanda Leal quem lhe fez chegar o despacho proferido a
29.03.98, em face do qual diligenciou pelo pagamento das facturas apresentadas pela
“Lusofactor”, relativamente aos serviços confirmados junto dos serviços.
Constata agora que no documento de fls 2122 não consta o despacho da
testemunha Fernanda Leal para si a fim de lhe dar o seguimento normal. Não seria
anormal dar cumprimento ao despacho da arguida Fátima Felgueiras sem passar pela
testemunha Fernanda Leal, mas recorda-se que esta, na primeira página do relatório,
também apôs um despacho remetendo o documento para si.

562
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A propósito da razão de ser da intervenção do arguido Horácio Costa nesta


matéria, referiu não se recordar muito bem da sua entrada na CMF, não sabendo ao
certo que contrato foi celebrado entre ele e a CMF, mas pensa que seria de prestação de
serviços (a sua remuneração saía da na rúbrica 0409 do orçamento camarário).
Não se recorda de quanto era o seu vencimento nem se alguma vez foi revisto.
Não se recorda ainda muito bem quais as funções que exercia, pese embora saiba
que desenvolvia a sua actividade na área do património camarário.
Tem a ideia de que ele ocupava um gabinete próximo do gabinete da arguida
Fátima Felgueiras e da vereação. Não se recorda dele ocupar outro gabinete que não
esse. Ignora se ele recebia pessoas.

- Testemunha Carlos Carlos Manuel Ferreira Alves


Conheceu as testemunhas Renato Guerra, pai e filho, a propósito da investigação
às relações estabelecidas entre a “Proeme”/”Portcom” e a CMF.
A testemunha Renato Guerra (pai) era militante do PS e candidatou-se à
presidência de uma autarquia (ao que pensa, Paredes) nas eleições de 1997.
Durante o ano de 1997 a “Proeme” celebrou vários contratos com a CMF no
âmbito das comemorações dos 20 anos do poder local.
Foram convidadas três empresas, mas só duas apresentaram as respectivas
propostas (para além da “Proeme”, não se recorda do nome da outra empresa
concorrente).
Essas propostas foram apresentadas em Março ou Abril de 1997.
Houve uma comissão que apreciou as duas propostas e não foi conclusiva, mas a
proposta da “Proeme” foi melhor pontuada (a proposta da “Proeme” foi pontuada com
15,3 e a proposta da “Isto É” com 15) – cfr. o relatório da dita comissão, constante de
fls 29 a 32 do apenso 103.
A arguida Fátima Felgueiras apôs um despacho datado de 18.03.97 a mandar
adjudicar à firma melhor pontuada de acordo com a análise técnica.
Na fase de pagamento desses serviços registaram-se muitos problemas pela não
prestação de alguns serviços contratados ou pela prestação deficiente de serviços.
Consta dos autos um relatório onde foi feita uma apreciação global dos serviços
prestados pela “Proeme” à CMF, relatório esse subscrito pelas testemunhas Fernanda
Castro Leal e Terezinha do Nascimento e pelo arguido Horácio Costa (cfr. documento
de fls 2093 e ss, datado de 18.03.98).
Nesse relatório a arguida Fátima apôs vários comentários onde criticava o
trabalho da “Proeme” (cfr fls 2101, 2104, 2107, 2109 e 2113).
Em face dessas anotações a arguida Fátima apenas pretendia que a CMF pagasse
parte desses serviços.
Assim, a fls 2093 consta um despacho da arguida Fátima, datado de 18.03.98,
onde manda pagar de acordo com o que autorizou.
A PJ solicitou o original do documento à CMF e constataram que o despacho da
arguida Fátima é diferente daquele que consta a fls 2093, quer no seu conteúdo quer na
data (a cópia desse relatório havia sido entregue pelo arguido Horácio Costa).
Verificaram assim que as páginas iniciais do relatório (que era suposto ser todo
original) eram cópias, sendo certo que na folha inicial desse relatório (cfr. fls 2122)
consta um despacho original da arguida Fátima a mandar pagar o reclamado pela
“Proeme”, apesar de ter ficado longe de corresponder às expectativas, despacho esse
datado de 29.03.98.
A fls 2116 consta um fax da “Proeme” à CMF (dirigido ao arguido Horácio
Costa), de 18.03.98, o qual faz referência a uma reunião ocorrida a 17.03.98 e que teve

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

como objectivo discutir o pagamento dos serviços prestados por essa empresa (faz
referência a serviços globais).
No manuscrito de fls 2121 faz-se referência a serviços prestados para a
campanha eleitoral, para o “Sovela”, para a revista “Rubeas” e para a CMF. Presume
que esse documento tenha sido elaborado pela testemunha Renato Guerra (pai), mas não
tem a certeza desse facto.
Não considera normal que no mesmo documento estejam incluídas contas
respeitantes a serviços prestadas para entidades diferentes e autónomas entre si,
designadamente a CMF e a ADEC. Não se recorda de que forma tal documento chegou
aos autos (foi o arguido Horácio quem o entregou).
Esse documento não está datado e não tem qualquer elemento objectivo que nos
permita concluir em que data terá sido elaborado. Não obstante, liga esse documento ao
fax de fls 2116.

Análise crítica
Para além do já referido, a propósito da introdução, provou-se que em Fevereiro
de 1997 foi aberto o concurso limitado sem apresentação de candidaturas nos termos
referidos na pronúncia, tendo a CMF endereçado convites às três empresas ali referidas,
mas apenas as firmas “Proeme” e “Isto É” apresentaram as respectivas propostas (cfr.
apenso 103).
A comissão de análise respectiva foi constituída pelas testemunhas Fernanda
Leal e Manuel Jordão e pelo arguido Barbieiri Cardoso.
Ora, não obstante a proposta da “Proeme” ser a mais cara, o certo é que a mesma
foi a melhor pontuada (cfr. o respectivo relatório de análise a fls 19 e ss. do apenso
103).
De resto, nos critérios de apreciação o factor “preço” tinha apenas um peso de
25%.
Compreende-se que, em face do tipo de prestação de serviços em causa, tenha
mais relevo o mérito da proposta (no caso, 40%), factor que mereceu uma pontuação
superior em dois pontos a favor da proposta apresentada pela “Proeme” em relação à
proposta apresentada pela “Isto É”, o que terá sido decisivo na pontuação final de ambas
as propostas.
Porém, sendo a diferença entre a pontuação de ambas as propostas quase
irrisória (“Isto É” – 15; “Proeme” – 15,3), a comissão de análise não se considerou
habilitada a pronunciar-se inequivocamente quanto ao sentido da opção a tomar na
adjudicação.
Considerou-as portanto similares, remetendo a decisão para a presidente da
edilidade.
Ora, a fls 29, a arguida apôs um despacho, datado de 07.03.97, onde determinou
a adjudicação à firma melhor pontuada com base na informação técnica.
Em face destes elementos de carácter objectivo e que não foram postos em
causa, naturalmente que não se demonstrou que a arguida Fátima Felgueiras tenha
beneficiado ilicitamente qualquer uma das concorrentes, limitando-se a determinar a
adjudicação dos serviços em causa à firma melhor pontuada.
Esse contrato viria entretanto a ser suspenso, conforme descrito na pronúncia
(cfr. documento de fls 14 do apenso 103 e as declarações prestadas a esse propósito).
Quanto à celebração dos demais contratos, porquanto é matéria que diz já
respeito ao alegado crime de abuso de poderes – cujo procedimento criminal foi
declarado prescrito -, abstemo-nos de tomar posição.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- A convicção do Tribunal a propósito do 6º capítulo da pronúncia

Introdução

Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmou a matéria da introdução tal como plasmada na pronúncia, sendo certo
que acompanhou a actividade do clube de natação denominado “A Foca” enquanto
vereadora.

- Arguido Horácio Costa


Quando iniciou funções na CMF já existia a ADEC, cuja actividade se resumia
ao jornal “O Sovela” e ao clube de natação “Foca”.
Em 1997 o director do jornal era o Sr. Barros e o Sr. Manuel Freitas estava à
frente do clube de natação.
A arguida Fátima era então a presidente da Direcção e o arguido António Pereira
o secretário (ignora quem em 1997 era o tesoureiro). Por sua vez o arguido Júlio Faria
era o presidente da Assembleia Geral (mais tarde substituído pelo Dr. Horácio Reis).

- Arguido Joaquim Freitas


Foi convidado com o arguido Horácio Costa para fazer parte dos órgãos da
ADEC, sobretudo porque o jornal “O Sovela” estava falido.
Exerceu assim as funções de tesoureiro da ADEC, ao que pensa, entre Setembro
de 1998 e fins de 1999. Na altura a arguida Fátima era a presidente da Direcção,
segundo tem ideia.
A ADEC resumia-se ao “Sovela” e ao clube de natação “A Foca”.
Foi confrontado com a acta nº 4, de 01.09.98, constante de fls 126, do apenso
139-A, onde estão descritas as funções de cada um (presidente: arguido Mesquita de
Carvalho; secretário: arguido Horácio Costa; tesoureiro: o depoente), tendo tomado
posse a 07.09.98, conforme documento de fls 130 do apenso 139-A.

Análise crítica
A arguida Fátima Felgueiras confirmou a matéria alegada na pronúncia quanto à
criação da ADEC e objectivos que prosseguia.
De resto, essa factualidade emerge dos documentos de fls 98 e ss., 102 e ss. e
119 e ss. do apenso 139-A.
No âmbito dessa associação foi criado o jornal “O Sovela” (cfr. acta nº 1,
constante de fls 119 do apenso 139-A) e o clube de natação “A Foca” (cfr. acta nº 3,
constante de fls 78 do apenso 139-A).
Não obstante os objectivos e interesses que formalmente essa associação visava
prosseguir, o certo é que a mesma acabaria por se tornar numa extensão do PS local e de
quem ocupava o poder na CMF. Basta para o efeito analizar as diferentes actas para se
perceber que assim era em função dos elementos que sucessivamente integraram os seus
corpos sociais e simultaneamente desempenhavam cargos autárquicos ou exerciam
funções na CMF que dependiam da confiança política, numa promiscuidade aliás
descarada (cfr. acta de fls 134 do apenso 139-A, datada de 06.01.94, a qual se reporta à
acta de instalação da CMF, na sequência das eleições autárquicas de Dezembro de 1993,
onde a arguida Fátima toma posse como veradora; cfr. documento de fls 119 a 121 do
apenso 139-A – acta nº 1 -, onde se elegeram os corpos sociais da ADEC e se criou o
jornal “O Sovela”; cfr. acta de fls 137 do apenso 139-A, datada de 05.01.98, respeitante

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

à instalação da CMF na sequência das eleições autárquicas ocorridas a 14.12.97, onde a


arguida Fátima toma posse como presidente da CMF e António Pereira Mesquita como
vereador; cfr. acta nº 4, datada de Setembro de 1998, constante de fls 127 do apenso
139-A, onde se elegeu como presidente da Direcção da ADEC António Pereira
Mesquita de Carvalho; cfr.acta nº 16, de fls 147 do apenso 137-A, onde o dito António
Mesquita é reconduzido como director do “Sovela”; cfr. acta nº 18 de fls 97 do apenso
139-A, datada de Maio de 1998, onde a testemunha António Pimentel é nomeado
director do “Sovela” numa altura que era também avençado pela CMF para trabalhar no
Gabinete de Imprensa conforme documento de fls 96 do mesmo apenso 139-A).
Sintoma disso é ainda a propaganda política veiculada pelo “Sovela” à acção de
quem comandava os destinos da edilidade.
Consequentemente, quem mandava no PS mandava de facto na “ADEC”, isto é,
a arguida Fátima Felgueiras (cfr., a esse propósito, as declarações proferidas,
designadamente, pelo arguido Horácio Costa, além do depoimento de algumas
testemunhas que assumiram funções no “Sovela”, quase que por imposição da arguida
Fátima Felgueiras – testemunhas Pimentel Silva e Vítor Sousa -, sinal que era ela quem
na verdade puxava os cordelinhos, o que se compagina com a tendência centralizadora
que já lhe assinalámos e com a inexistência de “massa crítica” no seio do PS).

O jornal semanário “O Sovela”:

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Admitiu ter sido presidente da Direcção da ADEC no período compreendido
entre 16.03.94 e 6.09.98 e que o arguido António Pereira Mesquita de Carvalho foi
secretário da Direcção daquela associação (este último chegou mesmo a ser eleito
presidente da Direcção e director do jornal “O Sovela”, numa altura em que se
verificava grande dificuldade de mobilização para o projecto da associação).
Explicou a forma de publicitação nos jornais das actividades camarárias do
seguinte modo:
- No que concerne à publicidade obrigatória (de anúncios de abertura de
concursos, da emissão de alvarás, etc), os serviços respectivos procediam a uma
consulta dos jornais, locais e nacionais (prospecção essa a que era alheia) e a depoente
ordenava que se procedesse à publicitação do evento no jornal que apresentasse um
preço mais baixo, sendo certo que o jornal “O Sovela” apresentava sempre o preço mais
baixo (cfr., em todo o caso, as tabelas de preços de fls 174, 176 e 185 do apenso 139;
cfr. ainda documentos juntos na audiência de julgamento a esse propósito).
A ilustrar o que afirmou, chama à colação um seu despacho nesse sentido –
genérico – datado de 17.10.96.
Nega terminantemente que alguma vez tivesse querido beneficiar o jornal “O
Sovela” em deterimento de outros jornais, designadamente “O Semanário de
Felgueiras”, propriedade do líder do PSD de Felgueiras e então o seu principal opositor
político.
- No que respeita à publicidade não obrigatória, respeitante à publicitação e
promoção de iniciativas, as propostas eram feitas aos vereadores e eram eles quem
decidiam da publicação ou o responsável da área de actividade a publicitar/promover,
não interferindo nessa actividade pois era exercida pelos vereadores no uso de
competências por si delegadas. O assunto da publicidade só era chamado a si quando
existiam problemas orçamentais.

566
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou que o “Jornal da Lixa” centrava as suas notícias nos acontecimentos e


nas iniciativas levadas a cabo na cidade da Lixa e tinha menos expressão, o que podia
influenciar na escolha (de resto, quando as iniciativas ocorriam na cidade da Lixa, a
CMF normalmente escolhia esse jornal para lhes dar publicidade).
Referiu que por vezes, a propósito de iniciativas camarárias e quando era a CMF
que recolhia o material necessário à publicitação no jornal “O Sovela”, verificava o
texto jornalístico acerca dessa iniciativa. Nega porém que fora desse contexto
controlasse as matérias jornalísticas abordadas.
Admitiu que o jornal “O Sovela” atravessava uma grave crise financeira,
segundo ouviu dizer, bem como aliás a imprensa regional em geral.
Admitiu também que o jornal “O Sovela” era conotado com o PS e que o
“Semanário de Felgueiras” era conotado com o PSD, sendo certo que este último era da
propriedade do líder do PSD local, o Dr. Manuel Faria (cfr. os jornais entretanto juntos
aos autos de 12.12.97 e que ilustram isso mesmo).
A propósito do manuscrito de fls 272, do 2º volume, que assumiu ser da sua
autoria, explicou que o proferiu numa altura em que se verificava grande debandada dos
associados da ADEC e que os seus órgãos sociais não apresentavam o quorum
necessário para funcionar. Nesse contexto, o arguido Bragança forneceu-lhe uma lista
de pessoas que poderiam ser contactadas em ordem a ingressar na associação e em
ordem a contribuir financeiramente para “Os Amigos do Sovela” (documento que data
de 08.03.98), tendo sido assim enviadas missivas para o efeito, de que a que consta de
fls 532 do apenso 139-C, datada de 17.03.98, será um exemplo.
A propósito do seu manuscrito de fls 173 do Volume 139-A, datado de 28.05.97,
esclareceu que não se trata de qualquer ordem dada aos serviços mas uma sugestão feita
à “Resin”, explicando que a CMF não suportou a publicidade referente ao “Dia do
Ambiente”, já que a mesma foi suportada pela “Resin”.
À pergunta feita no sentido de se saber por que razão essa publicidade foi
efectuada no jornal “O Sovela” referiu não saber se a “Resin” também fez publicitar o
evento no “Semanário de Felgueiras” (sabe em todo o caso que também existiu
publicidade na rádio).
Referiu ainda que existia publidade efectuada em todos os jornais, como era o
caso do “Rali de “Portugal”, no troço que passava pelo concelho de Felgueiras, já que as
questões de segurança eram prementes em ordem a manter a prova pontuável para o
campeonato do mundo da modalidade.
Diferentemente se passava no caso do “Rali Felgueiras/Amarante”, pois não
pontuava para o campeonato do mundo da modalidade, ignorando qual o respectivo
custo com a publicidade ao evento efectuada no jornal “O Sovela” (cfr. fls 73 do apenso
139-A).
Esclareceu que o Dr. António Pimentel foi director do jornal “O Sovela” e
simultaneamente era assessor de imprensa da CMF (tinha por isso uma avença com a
CMF). Esclareceu que não se limitava a ser seu assessor de imprensa mas a ser assessor
de imprensa da CMF no seu todo.
Ele desenvolvia a sua actividade nas instalações da CMF, não tendo sabido
precisar qual o espaço por si ocupado no exercício das suas funções de assessor de
imprensa (tem em todo o caso a ideia de que não o faria em qualquer espaço
diferenciado).
Enquanto avençado da CMF não tinha poderes para mandar publicar o que quer
que seja (quando muito poderia sugerir).
Esclareceu por fim que era habitual juntar-se à factura emitida pelo jornal a
cópia da respectiva publidade e que esses documentos eram assim arquivados na CMF.

567
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Arguido Horácio Costa


O Jornal “O Sovela” era um veículo de informação do PS e da arguida Fátima
Felgueiras.
Esta incumbiu-o de fazer um levantamento do estado do jornal referido, tendo
então constatado que o espaço onde o jornalista deveria trabalhar estava praticamente
abandonado.
O contabilista respectivo (que exercia para o jornal essa actividade
gratuitamente) deu-lhe conta do estado calamitoso da contabilidade, queixando-se que
não lhe forneciam os documentos de suporte. Manifestou-lhe interesse em deixar de
exercer essa actividade para o jornal.
A crise financeira do “Sovela” era potenciada pelo facto do jornal ser distribuído
gratuitamente durante as campanhas eleitorais, não gerando pois as receitas necessárias
para suportar as despesas inerentes à sua publicação.
Transmitiu então à arguida Fátima Felgueiras essas informações.
Os credores do jornal eram encaminhados para o depoente, recebendo-os no seu
gabinete nas instalações da CMF, visto que o jornal dependia dos fundos depositados na
conta do BES e na “Caixa Paralela”.
Haviam problemas com os pagamentos a tipografias e funcionários, sendo certo
que tais problemas iam sendo resolvidos.
Assim, por exemplo, o jornal devia mais de 4.000 cts à “Nafprinter”, a qual
ameaçava recorrer ao tribunal para cobrar o seu crédito, tendo-lhe então sido pagas
algumas prestações consoante as disponibilidades financeiras.
Entretanto o Sr. Barros saíu do jornal e o seu lugar foi assumido pelo arguido
António Pereira.
Este por sua vez foi substituído pelo Sr. Pimentel (ao que pensa desde Maio de
1998), o qual exercia também funções como assessor de imprensa da CMF.
Recorda-se que o “Sovela” tinha uma funcionária (Isabel) a quem competia
conseguir publicidade ou publicações no jornal.
Em finais de 1998 o depoente assumiu as funções de secretário da Direcção da
ADEC (o presidente da Direcção era então o arguido António Pereira e o tesoureiro o
arguido Joaquim Freitas).
Na altura eram publicados os seguintes jornais locais: “O Sovela” (conotado
com o PS), o “Semanário de Felgueiras” (conotado com o PSD), o “Jornal da Lixa” e o
“Jornal de Felgueiras” (estes últimos sem conotação política).
O proprietário do “Semanário de Felgueiras” era a testemunha Manuel Faria
(líder da oposição e militante do PSD. Foi vereador eleito pelo PSD e principal opositor
da arguida Fátima Felgueiras).
Apercebeu-se que quando o Sr. Pimentel assumiu a direcção do Jornal “O
Sovela” muita da publicidade de acções realizadas pela CMF eram publicadas nesse
semanário para o rentabilizar, já que atravessava uma grave crise financeira. Nessa
medida, acha que terá sido beneficiado em relação ao “Semanário de Felgueiras”, mas
em concreto acerca desse facto não tem conhecimento de causa.
De resto o Sr. Pimentel diligenciava junto dos serviços camarários para que a
publicidade fosse publicada no “Sovela”. Avisou-o aliás de que não deveria cumular as
funções de director do “Sovela” e de assessor de imprensa da CMF.
Seja como for, nunca foram dadas ordens ao depoente para fazer publicar no
“Sovela” acções levadas a cabo pela CMF, com execepção da situação a que se reporta
o documento de fls 73 do apenso 139-A, a propósito da comemoração do “Dia Mundial
do Ambiente”, onde por ordens expressas da arguida Fátima diligenciou pela publicação

568
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

de publicidade no “Sovela” alusivo àquele dia (contactando, conforme ali anotado, o


arguido Vítor Borges). Nessa altura a arguida Fátima não lhe deu instruções para
diligenciar pela respectiva publicidade no jornal que apresentasse melhor preço.
Constatou que o dito Pimentel recebia ordens da arguida Fátima Felgueiras e
que respondia perante ela e não perante o depoente, apesar de ser o secretário da
Direcção da ADEC. Em face dessa desautorização abandonou a Direcção da ADEC.
Sentiu o mesmo em relação à “Foca”, do qual nada lhe era dado a conhecer
apesar de pertencer à Direcção da ADEC.
Como era uma figura decorativa demitiu-se, demissão essa que teve como causa
próxima o facto de não ter concordado com a aquisição de uma viatura para a “Foca”
através da celebração de um contrato de “leasing” (cfr. fls 435 a 441 do 2º volume).
Todas as Sextas-feiras ouvia comentários pouco abonatórios relativamente ao
“Semanário de Felgueiras” (que saía à Sexta-feira). Tal semanário era visto com
particular atenção pois era conotado com a oposição (PSD), sendo certo que utilizava
uma linguagem agressiva, provocadora e às vezes inaceitável. Esse clima agravou-se
durante a campanha eleitoral e na semana seguinte procurava-se dar adequada resposta
no “Sovela”.
Certas discussões eram feitas nos jornais e não nas reuniões de vereação ou na
Assembleia Municipal.
Depois das eleições, embora ainda crítico, a linguagem usada no “Semanário de
Felgueiras” era mais “soft”.
Consequentemente, esses jornais – que eram distribuídos por estabelecimentos
comerciais e pelas juntas de freguesia – eram instrumentos de combate político.
A tiragem expressa nesses jornais não correspondia ao número de leitores, pois
as tiragens eram aumentadas para não ficarem atrás da concorrência, sendo certo que
quem lia o “Sovela” lia também o “Semanário de Felgueiras” a fim de fazer a respectiva
comparação.
Tem a ideia que o “Semanário de Felgueiras” era economicamente viável
(apesar de ter o mesmo número de leitores do “Sovela”) porque o respectivo dono é
pessoa abastada.
Em matéria de publicações no “Sovela” era a arguida Fátima quem tinha a
última palavra, sendo certo que ela sempre se preocupou com o que era publicado na
imprensa.
Concluiu dizendo que ignora se o “Sovela” era beneficiado em relação aos
outros jornais, embora tenha suspeitas desse facto, sendo certo que vários elementos do
PSD chegaram a queixar-se desse facto.

- Arguido Joaquim Freitas


O “Sovela” era um veículo de propaganda do PS.
Teve vários directores, entre os quais o Sr. Pimentel e o arguido Mesquita de
Carvalho.
Quem tinha o controle das finanças era o arguido Horácio Costa (na altura
secretário da direcção da ADEC), pois tinha uma disponibilidade que o depoente não
tinha.
A arguida Fátima Felgueiras disse-lhes para controlarem as despesas do jornal,
já que à data inexistia qualquer controle.
Utilizaram dinheiro depositado na conta do BES e dinheiro existente na gaveta
para custearem despesas do jornal.
Chegaram a recolher donativos em empresas para financiar o jornal.

569
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Sinal de que a arguida Fátima se preocupava com a recolha de fundos para o


“Sovela” é o manuscrito de fls 272 e 273 do 2º volume, dirigido ao arguido Bragança
(recolha de donativos para “os amigos do Sovela”).
Só as empresas que trabalhavam para a CMF e esta é que pagavam a publicidade
publicada no “Sovela”.
Praticamente o jornal era oferecido, sobretudo durante a campanha eleitoral.
Antes do jornal sair da estampa a arguida Fátima controlava o que deveria e não
deveria ser publicado.
De resto, apesar dela, na altura, não fazer parte dos órgãos da ADEC, era quem
de facto ali mandava (para ilustrar chamou-se à colação os documentos de fls 424 a 430
do 2º volume).
O Jornal mais lido à época era o “Semanário de Felgueiras”, conotado com o
PSD, mas mais ao serviço do líder da oposição e proprietário desse semanário.
O “Sovela” era o segundo jornal mais lido no concelho e depois o “Jornal da
Lixa”.
Era publicada mais publicidade da CMF no “Sovela” que nos outros jornais.
Não sabe a razão para esse facto mas deduz que seria pelo facto desse jornal estar
conotado com o PS.
Ignora como na CMF se processava o mecanismo de publicação de anúncios e
de divulgação de eventos.

- Testemunha Luís Orlando Cardoso Botelho Maia


A questão do alegado favorecimento do jornal “O Sovela” em relação a outros
jornais locais em termos de publicação de publicidade foi também abordada pela
inspecção que levou a cabo (sobre essa matéria o inspector Perdigão centrou mais a sua
atenção) – cfr. fls 40 e ss. do relatório de fls 3165 e ss. dos autos.
No “Sovela” era publicada mais publicidade, mas chegaram à conclusão que os
procedimentos foram mais ou menos observados, sendo certo que poderão haver razões
que explicam a publicação de mais publicidade num jornal que noutro (como por
exemplo o facto de determinado jornal ser mais lido que os outros).
Da cópia da capa do “Sovela” (cfr. fls 196 do apenso 139-A) e do “Semanário de
Felgueiras” (cfr. fls 183 do apenso 139-A) retira-se que ambos tinham a mesma tiragem
(5.000 ex. Ver porém o que a propósito referiu a testemunha Manuel Faria).
Recorda-se que em termos de valores despendidos com a publicidade num e
noutro jornal a disparidade era enorme (cfr. o respectivo relatório a fls 3199 dos autos).
Não se recorda se compararam os preços praticados pelos jornais. Se viram e se
essa informação é relevante consta do respectivo relatório.
Crê que concluiram não existir no procedimento a expressão do fundamento
para tal disparidade. Não viram porém qualquer ilegalidade substancial (a irregularidade
detectada verificava-se ao nível do procedimento e não ao fundo da questão).
Seja como for, os procedimentos a adoptar dependem dos valores envolvidos,
sendo certo que não notaram ter existido fraccionamento de pagamentos para evitar
procedimentos mais exigentes.
Ignora se o “Sovela” tinha alguma conotação política.
Outra questão investigada prendia-se com o facto do director do Jornal “O
Sovela” assegurar também o funcionamento do “Gabinete de Imprensa da CMF” por
contrato de avença celebrado com esse desiderato (cfr. a fls 93 do apenso 139-A o
respectivo contrato de avença celebrado entre a CMF e António Nascimento Pimentel
Silva, o qual assegurava a tempo inteiro o funcionamento daquele gabinete; cfr. ainda a

570
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

acta nº 18, cuja cópia se acha a fls 97 do apenso 139-A, a qual se reporta à nomeação da
mesma pessoa como director do “Sovela”).

- Testemunha Silvino de Jesus Perdigão


O Director do “Sovela” era também o responsável pelo Gabinete de Imprensa da
CMF (antes chamado “Gabinete de Informação e Relações Públicas”). Tal era uma das
questões que se colocava (a eventual incompatibilidade), segundo se lembra (cfr. o
respectivo relatório de fls 3165 e ss. dos autos, o contrato de avença celebrado entre a
CMF e António Pimentel, a 16.08.93 – constante de fls 96 do apenso 139-A -, e ainda a
acta de nomeação para director do “Sovela” do dito Pimentel, constante de fls 97 do
apenso 139-A).
A eventual incompatiblidade de funções era duvidosa (cfr. o respectivo
relatório).
Verificaram também a publicidade publicada pela CMF no “Sovela” sob o ponto
de vista da legalidade administrativa da despesa (e não sob o ponto de vista da
“legalidade substancial”).
Constataram que o valor da publicidade publicada nesse jornal pelo município
era muito superior ao que era publicado nos demais jornais locais (cfr. o quadro de fls
3199 alusivo aos anos de 1999 a 2001, correspondente à pág. 41 do relatório de fls 3165
e ss.). Porém, não averiguaram qual a razão de ser da disparidade de valores,
perspectivando mais a sua investigação nos procedimentos adoptados e na
fundamentação (ou falta dela) para a publicação de publicidade num ou noutro jornal,
procedendo nessa perspectiva à recolha de documentos e ao respectivo esclarecimento
por parte dos serviços camarários.
Tendo sido feita a publicação por ajuste directo, deveria estar fundamentada a
opção no respectivo processo de aquisição de bens de modo a que se pudesse perceber
qual a razão da opção pela realização dessa despesa e porque razão se optou por
determinado jornal ou jornais para o efeito.
Entende que a justificação dada genericamente no despacho proferido pela
arguida Fátima, datado de 17.10.96, é insuficiente (aludido também no relatório).
A justificação para a publicação num ou noutro jornal poderia não se prender
exclusivamente com os preços praticados, pois existem outros factores que podem ser
ponderados (como por exemplo o número de leitores), sendo certo que entende ser
insuficiente uma fundamentação meramente política para sustentar a publicação.
Entende que seria ilegal a preterição de um jornal só porque era hostil ao executivo
camarário, apesar de apresentar condições mais vantajosas.
Entretanto os procedimentos terão sido alterados (pelo menos no que respeita ao
anúncio de concursos para admissão de pessoal), pois a decisão de publicação nos
jornais passou a ser feita caso a caso e com base nas informações remetidas pelos
serviços.
O “Semanário de Felgueiras” e o “Jornal da Lixa” eram dois dos jornais locais
em causa.
O “Sovela” e o “Semanário de Felgueiras” apresentavam uma tiragem de 5.000
ex. (cfr. fls 196 e 183, respectivamente, do apenso 139-A) e o “Jornal da Lixa” uma
tiragem de 1.900 ex. (cfr. fls 194 do apenso 139-A).
Entenderam pois que os procedimentos deveriam ser melhor fundamentados
(isto é, a decisão de publicação deveria estar melhor fundamentada).
Referiu ter uma vaga ideia de que o Município pediu propostas de preços de
publicação nos jornais (cujas tabelas se acham juntas aos autos a fls 181, no que

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

concerne ao “Sovela, e a 183 do apenso 139-A no que respeita ao “Semanário de


Felgueiras”. Tratam-se de tabelas genéricas).
Por falta de elementos não constataram qual era a orientação política de cada um
dos jornais (dos quais só viram um exemplar)
Ignora quem era o proprietário do “Sovela” (foi confrontado com o documento
de fls 119 do apenso 139-A, alusivo à acta nº 1, de 04.03.94, onde foram nomeados os
corpos sociais da ADEC - a arguida Fátima foi eleita Presidente da Direcção e o arguido
Júlio Faria Presidente da Assembleia Geral da associação – e criado o jornal “Sovela”).
*
A arguida Fátima Felgueiras referiu nesta altura que lhe competia, enquanto
presidente da autarquia, dar indicações acerca dos critérios que deveriam presidir à
publicitação por banda dos serviços, sendo certo que eram estes quem deveriam solicitar
as respectivas propostas aos diferentes jornais (tal não competia ao Gabinete de
Imprensa, o qual dependia mais da parte política da CMF na medida em que dedicava-
se mais à promoção do Município de Felgueiras, embora nessa actividade tivesse de
colher informações junto dos serviços), sendo certo que um dos problemas que se
verificava era o da falta de comunicação entre os serviços.
Mais referiu que quando o Sr. Pimentel foi contratado pela CMF era director do
“Semanário de Felgueiras”, ainda a depoente não era presidente da CMF, tendo sido
nomeado mais tarde director do “Sovela”.

- Testemunha António Manuel Moura Fernandes Pêga


Referiu que (juntamente com a testemunha Vítor Pinto) fez um inquérito ao
Município de Felgueiras nos inícios (Março/Abril) de 2003, na sequência de
participação efectuada à IGAT por deputados municipais eleitos pelo PSD, relacionada,
além do mais, com uma publicação efectuada em 1997 no jornal “O Sovela” a propósito
do “Dia Mundial do Ambiente”, por força de decisão que consideravam parcial da
presidente da edilidade, a arguida Fátima Felgueiras.
Chegaram à conclusão que tal denúncia não tinha fundamento na medida em que
não foi a CMF quem pagou a dita publicidade (cfr. o relatório de fls 3 e ss. do apenso
139-A, em particular fls 50 e ss., correspondente às págs. 37 e ss. de tal relatório).
Conforme consta do relatório (cfr. fls 14 e ss. do apenso 139-A), alargaram o
âmbito do inquérito em ordem a verificar se o “Sovela” teve ou não tratamento de favor
(cfr. o pedido de alargamento do inquérito a fls 84 e 85 do apenso 139-A e o respectivo
despacho a autorizar tal alargamento a fls 89 do mesmo apenso).
O “Sovela” pertencia à ADEC (cfr. acta de fls 134 do apenso 139-A, datada de
06.01.94, a qual se reporta à acta de instalação da CMF, na sequência das eleições
autárquicas de Dezembro de 1993, onde a arguida Fátima toma posse como veradora;
cfr. documento de fls 119 a 121 do apenso 139-A – acta nº 1 -, onde se elegeram os
corpos sociais da ADEC e se criou o dito jornal; cfr. acta de fls 137 do apenso 139-A,
datada de 05.01.98, respeitante à instalação da CMF na sequência das eleições
autárquicas ocorridas a 14.12.97, onde a arguida Fátima toma posse como presidente da
CMF e António Pereira Mesquita como vereador; cfr. acta nº 4, datada de Setembro de
1998, constante de fls 127 do apenso 139-A, onde se elegeu como presidente da
Direcção da ADEC António Pereira Mesquita; cfr.acta nº 16, de fls 147 do apenso 137-
A, onde o dito António Mesquita é reconduzido como director do “Sovela”; cfr. acta nº
18 de fls 97 do apenso 139-A, datada de Maio de 1998, onde o Sr. Pimentel é nomeado
director do “Sovela” numa altura que era também avençado pela CMF para trabalhar no
Gabinete de Imprensa conforme documento de fls 96 do mesmo apenso 139-A).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontado com os documentos de fls 183 e 196 do apenso 139-A, referiu que
a tiragem do “Sovela” e do “Semanário de Felgueiras” era igual (5.000 ex.). O “Jornal
da Lixa” tinha, por seu turno, uma tiragem mais baixa (1.900 ex. – cfr. fls 194 do
apenso 139-A).
Quer o Departamento de Pessoal quer o Departamento de Planeamento e Gestão
Urbanística da CMF fizeram consultas aos jornais para saber preços (em 2000 e 2002).
Por via de regra, na publicação de eventos ocasionais registou-se uma
prevalência do “Sovela”.
Constataram a existência de duas tabelas de preços por parte do “Sovela”, uma
destinada a clientes institucionais (com preços mais elevados) e outra para os restantes
clientes (cfr. fls 174 e 176 do apenso 139-A, respeitante às duas tabelas de preços
referidas).
O “Jornal da Lixa” não tinha duas listas de preços. Não se recorda se o
“Semanário de Felgueiras” tinha ou não duas listas de preços à semelhança do que
sucedia com o “Sovela” (porém tal informação não consta do relatório que elaborou).
Tem a ideia de que o “Sovela” levava mais barato nos quartos de página e mais
caro nas contracapas (o anúncio por norma saía sempre maior que ¼ de página). Nas
meias páginas o “Sovela” apresentava o preço mais elevado.
A generalidade das publicações era de ¼ de página. Porém, no figurino do
jornal, ocupava muitas vezes quase meia página (os jornais praticavam preços
intermédios quando a dimensão da publicação não coincidia com a que consta da tabela
de preços, o que poderá justificar a não coincidência entre o preço de tabela e o preço
cobrado efectivamente).
No que respeita aos anúncios na área do urbanismo de contratação de pessoal
não detectaram qualquer anormalia, tendo concordado com a exclusão do “Semanário
de Felgueiras” (cfr. fls 245 e 246 do apenso 139-A e o respectivo relatório, constante de
fls 13 e ss. do apenso 139-A, em particular fls 35 e ss. desse apenso; cfr. ainda fls 350
do apenso 193-B).
Porém, no que respeita à publicidade a outros eventos constataram o seguinte:
Antes de 2002, detectaram situações de opção por publicações mais caras e às
vezes sem consulta prévia do mercado (por exemplo, a propósito da uniformização
documental, “Dia Mundial do Consumidor” e do “Rali Lixa/Amarante”, sendo certo que
neste último caso só o “Sovela” e o “Jornal da Lixa” foram consultados, tendo sido dada
como justificação a de que se estava no final do ano e haviam constrangimentos
orçamentais. Tal argumentação não colhe porque a opção pelo “Sovela” foi mais cara) –
ver o que consta do relatório respectivo, em particular fls 39 e ss. do apenso 139-A.
Seja como for, as situações irregulares detectadas tiveram pouco peso no volume
global da publicidade mandada publicar pela CMF entre 1998 e Fevereiro de 2003 (cfr.
o relatório em causa). Quanto à prevalência do “Sovela” no volume da facturação
naqueles anos (1998 a Fev. de 2003), ver fls 14 do referido relatório (correspondente a
fls 27 do apenso 139-A).
*
A arguida Fátima Felgueiras referiu nesta altura, além do mais, que a CMF não
estava obrigada a fazer prospecção de mercado para publicitar as suas iniciativas, além
de que rebateu as conclusões vertidas no relatório aludido (em parte, diga-se, fundadas
em depoimentos colhidos).
*
- Testemunha Vítor Manuel Ribeiro Pinto
Referiu que procedeu a um inquérito ao Município de Felgueiras com a
testemunha António Pêga, entre Março e Abril de 2003, por força de ordem de serviço

573
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

que receberam na sequência de uma queixa apresentada por deputados municipais


eleitos pelo PSD, que relatava alegado favorecimento de um jornal (o “Sovela”) pelo
executivo camarário em termos de publicação de publicidade (cfr. queixa constante de
fls 66 e 67 do apenso 139-A).
Propuseram ao Inspector Geral que o inquérito versasse sobre os últimos 5 anos,
de 01.01.98 a Fevereiro de 2003, tendo efectuado uma exposição no sentido de procurar
esclarecer a delimitação do inquérito (cfr. fls 84 e 85 do apenso 139-A).
Na sequência da acção inspectiva levada a cabo, ouviram pessoas, apuraram
quantos jornais locais existiam e a sua representatividade e compararam a publicidade
publicada pela CMF nesses mesmos jornais.
Assim, constataram que o “Sovela”, o “Semanário de Felgueiras” e o “Jornal da
Lixa” eram semanários, os dois primeiros com 5.0000 ex. de tiragem cada um e o
último com 1.900 ex. de tiragem (cfr. as tabelas de preços onde consta a respectiva
tiragem – ver fls 183, 194 e 196 do apenso 139-A). Existia ainda um outro jornal
(“Notícias de Felgueiras”) mas que era de publicação irregular.
O “Jornal da Lixa” centrava-se mais nos acontecimentos ocorridos na cidade da
Lixa, ao passo que os outros semanários eram mais abrangentes a nível concelhio.
Segundo se apercebeu da respectiva leitura, o “Semanário de Felgueiras” estava
mais ligado ao PSD (ao que parece seria da propriedade de alguém ligado a esse
partido) e o “Sovela” ao PS (propriedade da ADEC – cfr. acta nº 1, constante de fls 119
e ss. do apenso 139-A, onde se elegeram os corpos sociais daquela associação e se
constituiu o jornal referido).
De resto, chegaram a existir pessoas que trabalhavam simultaneamente na CMF
e nesse jornal (como era o caso do Sr. Pimentel, o qual chegou a ser director do
“Sovela” e, por contrato de avença celebrado a 05.08.93 com a CMF, constante de fls
96 e ss. do apenso 139-A, dirigia o Gabinete de Imprensa da edilidade; bem como o
director adjunto de tal jornal, o Sr. Vítor Sousa, o qual tinha um contrato de prestação
de serviços com a CMF, constante aliás de fls 150 do apenso 139-A).
Além disso, pessoas eleitas pelo PS tiveram cargos de direcção na ADEC,
proprietária do dito jornal (cfr. as actas nº 1, 4, 14 e 18 da ADEC, constantes
respectivamente de fls 119 e ss., 127 e ss., 148 e ss. e 97 e ss. do apenso 139-A, bem
como as actas de instalação da CMF, na sequência de eleições autárquicas, constantes
de fls 134 e ss. e de fls 137 e ss. do apenso 139-A).
Procederam à análise da facturação da CMF respeitante à publicidade no período
acima referido e ouviram pessoas a esse propósito (conforme aliás emerge do respectivo
relatório de inspecção).
Concluíram que pelo “Gabinete de Comunicação e Imagem” da CMF era dada
prevalência ao “Sovela” em termos de publicação de publicidade.
Já os Departamentos de Pessoal e de Planeamento fizeram consultas ao mercado
(anúncios no que respeita à contratação de pessoal e anúncios relacionados com o
urbanismo, designadamente loteamentos). Assim, por exemplo, as tabelas de fls 174 e
176 do apenso 139-A foram obtidas para consulta.
Recolheram as tabelas de preços dos jornais referidos (constantes do apenso
139-A a fls 174, 176, 177, 184, 185, 186, 187, 188, 189, 190 e 191; cfr. ainda fls 304 e
ss. do apenso 139-D), tendo verificado que o “Sovela” tinha duas tabelas, uma para
clientes institucionais (mais cara) e outra para clientes particulares. Não sabe se tal
procedimento era normal noutros jornais.
Muitas vezes não era seguida a tabela de preços, já que os preços praticados
umas vezes eram superiores outras inferiores ao que constava da tabela.

574
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Da análise das tabelas de preços concluíram que o “Sovela” apresentava o preço


mais baixo nas publicações a ¼ de página e era mais caro nas contracapas, na meia
página e na pagina. Por sua vez, o “Semanário de Felgueiras” era mais barato nas
contracapas, na meia página e na página (era porém mais caro no quatro de página).
As publicações da CMF a nível de publicidade era feita na grande maioria num
quatro de página.
Por falta de controle verificaram situações de dupla facturação, o que viria a ser
corrigido.
Verificaram ainda pagamentos indevidos efectuados pela CMF relativa a
publicidade que se prendia com a “Casa do Risco”. Tal situação viria também a ser
corrigida.
Verificaram também a existência de vários despachos escritos a mandar publicar
em vários jornais mas cuja publicidade acabaria por ser efectuada apenas num jornal
(cfr. fls 31 do relatório).
Confirmou o teor de fls 29 (referente à “Unifornização Documental” – cfr. ainda
documento de fls 382 do apenso 139-C, documento onde a arguida Fátima apôs
“aprovado”, sendo certo porém que desse documento não consta que a publicidade
tivesse de ser efectuada em contracapa, ignorando a testemunha quem o determinou) e
31 (referente ao rali “Felgueiras/Amarante” – publicação em ¼ e mais de ½ de página a
preto e branco, tendo saído mais barata a publicação a ¼ de página no “Sovela” mas
mais cara a publicação em meio de página no mesmo jornal; cfr. ofício da CMF
constante de fls 392 do apenso 139-C, sendo certo que a testemunha ignora quem deu a
ordem para que a publicidade fosse efectuada naqueles formatos, pese embora resulte de
tal documento que a arguida Fátima despachou no sentido de mandar publicar no
“Sovela” e no “Jornal da Lixa”) do relatório referido
Entende que a justificação dada para a não publicação de publicidade noutros
jornais por falta de verba não colhe na medida em que saíria mais barata a publicação
em meio de página no “Semanário de Felgueiras” e não no mesmo formato no “Sovela”,
o que faria poupar uma verba de 4.500$00.
O “Sovela” facturou cerca de três vezes mais que o “Semanário de Felgueiras”
(incluindo neste cálculo toda a publicidade).
Objectivamente foram essencialmente estes os dados apurados, tendo baseado
porém a sua convicção de favorecimento do “Sovela” (pelo GAPP e pelo “Gabinete de
Imprensa”) também em depoimentos recolhidos durante a inspecção efectuada e que
estão plasmados no respectivo relatório, donde emerge que existiam instruções verbais
nesse sentido.
*
A arguida Fátima Felgueiras referiu que quem sempre se ocupou do rali
Lixa/Amarante era o arquitecto Jordão (que se ocupava do PDM).
A depoente afirmou que nunca consentiria duas publicações de publicidade ao
evento em causa na mesma edição do “Sovela”, sendo certo que a responsabilidade é de
quem visou as facturas entretanto pagas pela CMF.
Quanto à “Uniformização Documental” assegurou que também não foi ela quem
determinou o formato de publicidade, adiantando que tal deve ter sido determinado pela
funcionária Sílvia Martins (licenciada em jornalismo e funcionária da CMF, a qual
presta serviço no Gabinete de Atendimento, Comunicação e Imagem da CMF).
Referiu a depoente que partia do pressuposto que as publicações eram feitas em
¼ de página.

575
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontada com os anuncios publicados na mesma edição do “Sovela”,


constantes de fls 451 e 454 do apenso 139-C, constatou que são anúncios diferentes, daí
talvez a publicitação na mesma edição desse jornal.
Confrontada com o documento de fls 317 do apenso 139-B, de 17.10.96
(documento do GAPP a dar-lhe conta de que os jornais remeteram as tabelas e que o
“Sovela” é que apresentava a melhor proposta, seguido do “Jornal da Lixa”), constatou-
se que se limitou a apôr “concordo”. Concluiu assim que se limitou a dar instruções
genéricas para publicitação dos editais nos jornais que ofereciam melhores condições.
Confrontada com o documento de fls 303 do apenso 193-B (informação do
Departamento de Administração Geral relativa à publicitação do concurso para
contratação a termo certo, dando conta dos jornais de maior expressão segundo o
Gabinete de Imprensa), constatou-se que a depoente despachou a 19.04.2000 no sentido
de que a decisão deveria ter também em conta os custos, “como assim tem sido e deverá
manter-se”, devendo-se solicitar uma actualização de preços, instruindo no sentido de se
obter propostas de preços, incluindo um jornal local.
Confrontada com a informação do Departamento de Planeamento de 26.03.2002
(constante de fls 350 do apenso 193-B), no qual se informa quais os jornais para
publicação e quais os que deveriam ser considerados por reunirem todos os requisitos
necessários, propondo a publicitação no “Sovela”, constatou-se que a depoente limitou-
se a apôr “aprovo” (cfr. a este propósito fls 24 e 25 do relatório elaborado pelas
testemunhas António Pêga e Vítor Pinto).
*
- Testemunha Manuel Ferreira de Faria
Desde há cerca de 5 anos que é director do “Semanário de Felgueiras”, sendo
igualmente um dos sócios (maioritário) da sociedade proprietária desse jornal desde
01.06.90.
A distribuição da publicidade pela CMF era feita pelos jornais do concelho
(“Semanário de Felgueiras”, “Jornal da Lixa”, “Sovela” e há cerca de um ano o
“Expresso de Felgueiras”).
O “Sovela” surgiu na década de 90 depois de ter deixado de existir o “Jornal de
Felgueiras”.
Pertencia à ADEC (a qual também tinha o clube de natação “A Foca”).
Queixou-se de concorrência desleal na medida em que o “Sovela” pertencia à
ADEC e estava ligado ao PS (nesse jornal estavam pessoas ligadas à CMF e ao PS,
como por ex. os arguidos Joaquim Freitas, António Pimentel e Horácio Costa e as
testemunhas Vítor Sousa e Horácio Reis), sentindo que o seu jornal era discriminado
pela CMF no que toca à publicidade oficial.
Foi confrontado com a missiva de fls 531 do apenso 139-C, da arguida Fátima
Felgueiras, apelando ao apoio à ADEC, fazendo acompanhar tal missiva de uma ficha
de inscrição nessa associação, de modo a manter o “Sovela” e “A Foca”.
Essas publicações eram raramente feitas no “Semanário de Felgueiras”.
Não tem ideia de ter recebido da CMF qualquer pedido de envio da tabela dos
preços de publicação de publicidade. Admite porém que podia não ter tomado
conhecimento dessa solicitação, caso tenha existido, pois era a funcionária
administrativa do “Semanário de Felgueiras” que se ocupava desses assuntos.
Não tem conhecimento de qualquer situação em que tenha saído mais cara a
publicação no “Sovela” relativamente ao seu jornal de publicidade pela CMF.
O “Semanário de Felgueiras” não era apreciado pelos responsáveis camarários,
sendo certo que nos paços do concelho, no quadro destinado à colocação de recortes de
notícias de jornal, nunca figuravam notícias publicadas pela “Semanário de Felgueiras”.

576
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O “Semanário de Felgueiras” tinha uma tiragem de 3.000 ex. em 1994/95,


apesar de indicar 5.000 ex.
O “Sovela” também não tinha os 5.000 ex. que anunciava, pensando mesmo que
distribuía menos de 3.000 ex..
No início da publicação do “Semanário de Felgueiras” e durante alguns anos
fizeram publicação de publicidade da CMF, o que entretanto cessou. Nessa altura
tinham remetido à CMF tabela de preços.
A linha editorial do “Sovela” era de divulgação das acções da CMF e do PS,
nele se fazendo combate político à oposição.
O “Semanário de Felgueiras”, por seu turno, era pluralista e acolhia todo o tipo
de opiniões dos munícipes, os quais socorriam-se do seu jornal para criticar a CMF.
Não aceita a opinião de que o seu jornal alinhava pelo PSD e que fazia oposição
à CMF.

- Testemunha Edgar Pinto da Silva


Explicou que quando entrou para a CMF o “Sovela” já existia e seria uma
publicação mais ou menos recente.
Tal publicação pertencia à ADEC e tem a ideia que nasceu com a criação dessa
associação.
Tal jornal estava um pouco ligado ao PS.
Na altura o director do jornal era a testemunha Pimentel (que era assessor de
imprensa da CMF).
O arguido António Pereira Mesquita de Carvalho, por sua vez, era membro da
ADEC. Não se recorda se a arguida Fátima também chegou a pertencer à ADEC.
Segundo lhe disse a testemunha Pimentel o jornal tinha problemas financeiros.
As únicas receitas que tinha eram provenientes da publicidade.
Não faz ideia do número de assinantes que tal jornal tinha.
Era ainda publicado o “Semanário de Felgueiras”, o qual estava conotado com o
PSD, sendo tal facto do domínio público.
Esse facto não resultava tanto da linha editorial nem das notícias publicadas, que
eram semalhantes em ambos os jornais, mas normalmente era no “Semanário de
Felgueiras” que se faziam as críticas ao executivo camarário.
O depoente lia os dois jornais, os quais eram de publicação semanal.
Tem a ideia de ver publicidade da CMF nos dois semanários, mas como não
reparava nesse facto, não sabe em qual deles era publicada mais publicidade pela CMF.
Era a arguida Fátima Felgueiras quem mandava no Gabinete de Imprensa da
CMF, em face do modo de ser dela, que tudo controlava. Julga que ela tinha um
especial cuidado com tudo o que era publicado.
Nunca se apercebeu de que a arguida Fátima tivesse dado orientações ou
procedesse a correcções de artigos a publicar, o que não significa que tal não pudesse
suceder.
Da mesma forma nunca se apercebeu que o “Sovela” fosse beneficiado em
termos de publicidade mandada publicar pela CMF em deterimento de outros jornais
locais.
Foi então confrontado com as declarações que prestou perante a JIC a fls 7771 e
7775, linhas 3 a 10, tendo-as confirmado. Precisou agora que pensa que o “Sovela” foi
beneficiado em face das queixas que ouvia nesse sentido ao Director do “Semanário de
Felgueiras”, além do facto deste jornal estar ligado ao PSD e o “Sovela” ao PS. Não se
recorda em todo o caso de ver quaisquer dados estatísticos acerca dos pagamentos
efectuados a um e outro jornal a título de publicidade (manifestou a ideia de alguém da

577
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

PJ lhe ter mostrado um “estudo” comparativo dos pagamentos efectuados – cfr. fls
3199).

- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro


A propósito dos documentos de fls 272 (manuscrito da arguida Fátima dirigido
ao arguido Bragança, pois reconhece-lhe a letra, datado de 08.03.98), 273 (lista de
pagamentos) e 274 (lista dos credores do “Sovela”), referiu que se trata de mais uma das
situações em que pediu esclarecimentos na Assembleia Extraordinária realizada a
28.07.2000, pois entendia que indiciavam também o uso indevido de dinheiros públicos.
A fls 275 e 276 constam cópias de dois cheques que fazem parte da lista de
pagamentos a credores do “Sovela” (segundo deduz pois os valores coincidem com dois
dos pagamentos mencionados na referida lista de fls 274) e sacados sobre a conta do
BES referida nos autos.
O “Sovela” era um jornal local e grande parte do seu conteúdo reportava-se a
questões de ordem política, tendencialmente do ponto de vista partidário. Tal jornal
identificava-se com o PS, segundo se dizia e em face da conclusão a que chegou nesse
sentido por força da sua leitura (leu-o aliás muitas vezes).
Tal Jornal pertencia à ADEC, cujo director era o arguido António Pereira
(vereador eleito pelas listas do PS).
O Sr. Pimentel era assessor de imprensa da CMF e esteve também ligado ao
“Sovela”.
O Sr. Vítor Sousa também esteve ligado a esse jornal e fazia parte do Gabinete
de Imprensa da CMF.
Tem ideia que o Sr. João Ivo, o qual também exerceu funções no “Sovela”, era
funcionário camarário (não o pode contudo assegurar). Aliás, também a ele foram
efectuados pagamentos com dinheiro da referida conta do BES.
Na altura existiam outros jornais locais para além do “Sovela”, como por
exemplo o “Semanário de Felgueiras”, “Jornal da Lixa” e “Terras de Felgueiras”.
Os jornais ganhavam mais importância nas proximidades das eleições, sobretudo
o “Sovela” (conotado com o PS) e o “Semanário de Felgueiras” (conotado com o PSD).

- Testemunha António Nascimento Pimentel Silva


Durante 11 anos foi assessor de imprensa na CMF (entre 1993 e 2004), sendo na
altura o único elemento do Gabinete de Imprensa, tendo para o efeito celebrado um
contrato de avença (cfr. o contrato de fls 96 do apenso 139-A, celebrado a 05.08.93).
Elaborava notícias relativas à actividade da CMF e juntas de freguesia, que
enviava para a comunicação social local, regional e nacional. Elaborava também o
boletim municipal.
Foi também director do “Sovela” (ao que pensa em 1998/99). Da acta de fls 97
do apenso 139-A (acta da Assembleia Geral da ADEC de 20.05.98) consta que foi
nemeado para esse cargo a 20.05.98.
Foi convidado pelos arguidos Fátima Felgueiras e António Pereira para a
direcção do “Sovela”, sendo certo que não podia recusar dado que o seu vínculo à CMF
era precário, pois era um simples avençado. Dispensava bem o desempenho das funções
de director do jornal, tanto mais que, em face da experiência passada (no “Semanário de
Felgueiras”), já sabia quais os problemas que como director de um jornal local teria de
enfrentar.
Se recusasse esse cargo o seu lugar na CMF estaria em risco, tanto mais que o
mesmo pressupunha confiança política.

578
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esse jornal pertencia à ADEC, não sabendo em que data havia sido criado, mas
tem a ideia que cerca de 7 anos antes de ter sido nomeado o respectivo director (cfr., em
todo o caso, a acta nº 1 da Assembleia Geral da ADEC, de 04.03.94, constante de fls
119 a 121, do apenso 139-A, na qual foi criado esse jornal).
Explicou que sucedeu ao arguido António Pereira na direcção do jornal
“Sovela”.
Na direcção da ADEC estavam os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas,
não se recordando quem era o presidente da direcção dessa associação na altura em que
era o director do “Sovela”.
A arguida Fátima, por sua vez, assumira a direcção da ADEC quando ela foi
criada em 04.03.94.
A partir de certa altura a testemunha Vítor Sousa passou também a integrar o
Gabinete de Imprensa da CMF, ao que pensa, por decisão da arguida Fátima Felgueiras
(talvez em 2000 ou 2001 – cfr. porém o respectivo contrato de prestação de serviços,
datado de 01.0.97, constante de fls 150 do apenso 139-A, celebrado entre a CMF e o
dito Vítor Sousa).
À pergunta efectuada no sentido de se saber quem efectivamente mandava no
“Sovela” respondeu que ou era o presidente da dircção da ADEC (arguido António
Pereira) ou o depoente enquanto director do jornal, em matéria editorial.
As suas receitas emergiam essencialmente da publicidade, facturando por ano
cerca de 76.000 cts (no período em que foi director, de 1998 até 2003), conforme
verificou no balancete. Tinha cerca de 500 clientes que faziam publicidade no jornal.
Tratava-se de uma publicação semanal e inicialmente a sua tiragem rondava os
2.000 ex., a qual desceu progressivamente até aos 1.500 ex., sendo certo que nos
últimos anos a tiragem (real) cifrava-se entre 1.500 e 1.000 exemplares.
Pensa que no cabeçalho indicava-se uma tiragem de 5.000 ex., mas era um
número empolado, situação que considera habitual nos jornais por questões de
marketing.
À época existia ainda o “Semanário de Felgueiras” (do qual tinha sido
proprietário e director de 1990 a 1993). Explicou que vendeu a sua quota ao seu sócio
de então na sociedade detentora desse semanário, a testemunha Manuel Faria. A
respectiva tiragem era também inferior à que anunciava no cabeçalho e cuja tiragem real
era semelhante à do “Sovela” (quando saíu do “Semanário de Felgueiras” a tiragem real
rondava os 1.500 ex., sendo actualmente de 800 a 1.000 ex.).
No documento de fls 183 do apenso 139-A vem indicada uma tiragem para o
“Semanário de Felgueiras” de 5.000 ex. (tabela dos preços da publicidade em
25.03.2003), mas que não corresponderá à tiragem real.
Existia também o “Jornal da Lixa”, com uma dimensão muito menor em relação
aos jornais já referidos (não sabe em todo o caso qual a respectiva tiragem. No
documento de fls 194 do apenso 139-A, indica-se uma tiragem de 1.900 ex. por
semana), o qual se limitava sobretudo a divulgar notícias referentes à cidade da Lixa.
O “Semanário de Felgueiras” estava claramente conotado com o PSD, embora
tal não fosse assumido (a testemunha Manuel Faria aliás não assumiu esse facto no
julgamento). A testemunha Manuel Faria era o presidente da Comissão Política do PSD
local e candidato à presidência da CMF por esse partido.
O “Sovela”, por seu turno, era claramente conotado com o PS e assumia isso. De
facto, as pessoas responsáveis por esse jornal eram militantes do PS ou ligadas a esse
partido como independentes.

579
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Durante dois ou três anos, no período em que foi director do “Sovela”, este
jornal conseguiu sobreviver com as suas receitas, tendo depois entrado em défice
irreversível.
A partir de 2001/2002 o jornal entrou num declínio financeiro irreversível, não
gerando os meios necessários para pagar aos seus credores, tendo por isso chegado a
propor o seu encerramento. As receitas provenientes dos 300 a 500 assinantes pagantes
eram manifestamente insuficientes, como sucedia aliás com todos os jornais. Também
as receitas da publicidade (com cerca de 500 clientes, nem todos regulares) eram
insuficientes para que as despesas do jornal fossem pagas.
Lembra-se do arguido Horácio lhe ter referido que pagava dívidas do “Sovela”
Ele aliás tinha sido encarregue de renegociar um crédito que uma gráfica detinha sobre
o jornal, no montante de cerca de 5.000 cts. Não sabe donde proveio o dinheiro, mas
não era seguramente do “Sovela”.
O arguido Horácio, cerca de um ou dois meses depois de ter integrado a direcção
da ADEC, demitiu-se.
A CMF era cliente do “Sovela”, pois nesse jornal publicava publicidade.
Era um cliente importante mas nem de longe nem de perto era fundamental.
A CMF fazia publicar no “Sovela” editais, avisos e publicidade de eventos por si
promovidos.
À pergunta efectuada no sentido de se saber quem decidia a publicação nos
jornais, respondeu que era a arguida Fátima ou os vereadores. Ignora se os directores de
departamento tinham competência delegada para o efeito.
A publicação no “Sovela” de editais e avisos pela CMF devia-se ao facto de
apresentar o preço mais barato. Aliás, todos os anos eram convidados pela CMF a
apresentar a respectiva tabela de preços.
A demais publicidade (relativa aos eventos) era pedida verbalmente ou por
escrito (na maior parte das vezes era solicitada por escrito).
A publicidade acordada verbalmene, as mais das vezes, era combinada entre o
depoente e o arguido António Pereira, pese embora se recorde que também a arguida
Fátima e os vereadores solicitaram verbalmente a publicação de publicidade de eventos.
Essa publicidade era efectuada cerca de 3 a 5 vezes por ano no “Sovela”.
Pensa que os outros jornais locais também enviavam a respectiva tabela de
preços, mas tal procedimento administrativo passava-lhe ao lado.
As mais das vezes a CMF utilizava, para a publicação dos anúncios, ¼ de
página.
Antes de 1998 conhecia a tabela de preços do “Semanário de Felgueiras”.
Ambos os jornais tinham sensivelmente o mesmo número de leitores.
Entre 1998 e 2003 não tem ideia qual o volume de publicidade efectuada no
“Sovela” e no “Semanário de Felgueiras” pela CMF. No “Sevela” tem a ideia que o
valor da publicidade atingiu um valor na ordem dos 6 ou 7.000 cts.
Foi então confrontado com o quadro de fls 203 do apenso 139-A (documento
assinado pela testemunha Fernanda Leal), constatando que nesse período de tempo a
publicidade publicada no “Sovela” ascendeu a cerca de 52.000,00 euros, no “Semanário
de Felgueiras” 9.652,00 euros e no “Jornal da Lixa” 8.166,00 euros.
Em face da discrepância de valores entende que a justificação é meramente de
índole política, já que o “Semanário de Felgueiras” era hostil à CMF e à arguida Fátima
Felgueiras (atacava politicamente a CMF e a arguida Fátima, chegando ao ponto de
muitas vezes protagonizar ataques pessoais).

580
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É pois natural que o poder instituído na CMF não quisesse financiar os jornais
da oposição (ninguém pertencente ao poder instituído está disposto a subsidiar a
oposição para que depois ela ataque esse mesmo poder).
Era do domínio público a hostilidade existente entre a arguida Fátima Felgueiras
e a testemunha Manuel Faria.
Seja como for, a si directamente nunca lhe deram instruções no sentido de
favorecer o “Sovela” em termos de publicidade.
Regra geral a publicidade era encaminhada para o “Sovela”, para o “Jornal da
Lixa” e para a “Rádio Felgueiras”.
As pessoas que tinham o poder de dar as orientações quanto à publicação de
publicidade eram a arguida Fátima e os vereadores.
Ou a arguida Fátima, ou o arguido António Pereira ou os dois (não consegue
neste momento precisar) deram-lhe orientações no sentido da publicidade ser efectuada
naqueles órgãos de comunicação social.
Não sabe se o arguido António Pereira tinha autonomia, mas acha que ele
deveria dar nota da sua acção à arguida Fátima Felgueiras (até porque tem a percepção
de que nem ele nem vereador algum tinham autonomia na sua acção, em face do que
conhece da personalidade da arguida Fátima, pessoa que era centralizadora e que não
gostava de ser contrariada, sendo certo que o depoente não se atrevia a contrariá-la nas
questões ligadas à CMF). Nunca viu qualquer vereador a contrariar as suas indicações,
salientando porém que não assistia às reuniões.
A arguida Fátima preocupava-se com o que se passava no Gabinete de Imprensa
e no “Sovela”.
Era normal que ela se preocupasse com o Gabinete de Imprensa na medida em
que 90% da informação publicada no “Sovela” provinha daquele gabinete, informação
essa que ela controlava, pois o depoente estava na sua dependência directa. Por essa via,
indirectamente, controlava o que era publicado no “Sovela”.
A questão dos preços da publicidade era relevante na medida em que se os
preços praticados pelo “Sovela” fossem mais altos a publicidade não lhe seria atribuída.
O “Sovela” tinha duas tabelas de preços, uma para os clientes habituais (com
preços mais baixos) e outra para agências de publicidade e para clientes ocasionais.
A CMF era cliente habitual no que se refere a publicidade institucional (editais e
avisos) e um cliente ocasional no que respeita à publicidade de eventos.
Confrontado com as tabelas de preços de fls 174 (esta com um manuscrito de
10.03.2003, donde resulta ter sido enviada à Divisão Administrativa da CMF) e 176
(com preços mais baratos), ambas do apenso 139-A, referiu serem as duas tabelas de
preços do “Sovela” que referiu (tudo indica porém que se tratam de tabelas que se
reportam a anos diferentes).
Explicou que a Divisão Administrativa da CMF fazia muita publicidade
obrigatória. Não sabe assim porque razão lhe terá sido enviada a tabela de fls 174 do
apenso 139-A (e não a de fls 176 do mesmo apenso), tanto mais que não foi o depoente
quem a enviou. Argumenta que pode mesmo ter sido um lapso. Em todo o caso,
especulou que a situação deverá ter sido pontual na medida em que a solicitação do
envio da tabela de preços, neste caso, foi verbal e normalmente era feita por ofício. De
facto, a solicitação verbal da tabela só era feita em situações pontuais. Não se recorda
porém de qualquer publicidade pontual efectuada pela Divisão Administrativa.
Os orçamentos pedidos pela CMF normalmente reportavam-se a quartos de
página.
Porém, melhor analisadas as duas supra referidas tabelas, parecem as mesmas
ser de anos diferentes (a de fls 174 do apenso 139-A parece ter sido enviada a

581
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

10.03.2003, data do manuscrito aposto nesse documento, e a de fls 176 do mesmo


apenso parece reportar-se a 1997 em face do teor de fls 175 do dito apenso 139-C). Cfr.
ainda o fax de fls 177 do apenso 139-A, com o qual se fez a remessa das duas tabelas.
Foi confrontado com o documento de fls 382 do apenso 139-C, respeitante à
publicidade alusiva à uniformização documental (onde tem aposto um despacho da
arguida Fátima datado de 22.03.2002, de aprovação da respectiva publicação no
“Sovela” e no “Jornal da Lixa”).
A fls 384 do apenso 139-C consta a factura emitida pela ADEC à CMF no valor
de 466,88 euros (IVA incluído).
O documento de fls 385 do apenso 139-C reporta-se à contracapa do “Sovela”
onde está feita a publicidade em causa.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se a publicidade em contracapa no
“Sovela” era mais cara respondeu não saber.
Confrontado então com o documento de fls 186 do apenso 139-A (tabela de
preços do “Semanário de Felgueiras”), verificou-se que em 2003 o preço para a
publicidade em contracapa a preto e branco naquele jornal era de 300,00 euros, preço
que parece assim ser mais barato que o praticado pelo “Sovela”.
Não sabe em que circunstâncias essa publicidade foi solicitada pois não foi o
Gabinete de Imprensa que tratou desse assunto.
A fls 178 do apenso 139-A, consta uma outra tabela, donde resulta que até 2001
a página a preto e branco custava 35.000$00.
Porém, a fls 4203 consta uma minuta de um contrato de publicidade, constando
de fls 4204 a tabela de preços, donde emerge que uma página a preto e branco custava
25.000$00. Tratam-se assim de preços mais baratos. Não sabe a testemunha se essa
minuta é a que foi enviada à CMF (mas parece que sim em face da forma como esse
documento chegou aos autos).
Confrontado com a mesma tabela de preços do “Semanário de Felgueiras” (cfr.
fls 185 do apenso 139-A), constatou-se que em 2003 o preço da publicidade a cores em
contracapa era de 400,00 euros.
Assim, como a publicidade em causa foi a cores, concluiu que o preço em
ambos os jornais é idêntico.
Confrontado com o documento de fls 392 do apenso 139-C, referiu reportar-se à
publicação de dois editais acerca do rally Felgueiras/Amarante ocorrido em 1998.
O ofício respectivo não está assinado. Tem um manuscrito onde refere os quatro
jornais por numeração (não sabe quem elaborou esse manuscrito) e a arguida Fátima
apôs um despacho no sentido da publicação ser efectuada nos jornais indicados em 1 e 3
(“Sovela” e “Jornal da Lixa”).
O documento de fls 451 do apenso 139-C diz respeito a esse evento (treinos),
num quarto de página, na edição de 20.11.98 do “Sovela”.
Na mesma edição desse jornal, foi publicitado o mesmo evento em pouco mais
de meia página, conforme emerge de fls 454 do apenso 139-C. Explicou que como não
correspondia aos formatos constantes da tabela de preços a publicação era cobrada “a
olho”.
A fls 452 do apenso 139-C consta a factura respectiva, respeitante a meia página
(cerca de 30.000$00 + IVA), sendo certo que a meia página no “Semanário de
Felgueiras”, segundo a tabela de fls 185 do apenso 139-A, era cobrada a 25.500$00.
Entende que o critério preço era mais importante que o critério político na
escolha dos jornais para publicação da publicidade.

582
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou depois que os dois critérios eram importantes, já que determinada


publicidade era publicada em face do critério económico e outra segundo o critério
político.
Referiu que não falava com a arguida Fátima acerca desse assunto, ignorando se
o arguido Pereira o fazia, antes da publicação ser efectuada.
Na sequência da inspecção da IGAT passaram a haver despachos escritos do
arguido Pereira (na altura em que foi presidente da CMF) a determinar a publicação no
“Sovela”.
O arguido Pereira referiu-lhe que a IGAT entendia que deveria haver despacho
escrito no que se refere à publicação de publicidade pontual.
Na sequência disso, pensa que a publicidade pontual deixou de ser solicitada
verbalmente e passou a recair sobre ela um despacho a determinar a respectiva
publicação, pelo menos no que se refere à publicidade que seguia via Gabinete de
Imprensa. Quanto à demais não sabe.
O depoente foi confrontado com as declarações prestadas perante o JIC a fls
4213, linhas 27 e 28; 7802, primeiro, penúltimo e último parágrafos; 7803, penúltimo e
último parágrafos; e 7804, linhas 4 a 6 e antepenúltimo parágrafo.
No que se refere ao que então declarou a fls 4213, linhas 27 e 28 confirmou-as
mas no que se refere ao nível do que era publicado (por ex., quais as notícias que
deveriam ser publicadas e as que deveriam ser destacadas) e não em relação à parte
financeira. Em todo o caso, é evidente que a opinião da arguida Fátima era sempre tida
em conta.
No que se refere às declarações prestadas a fls 7803, penúltimo parágrafo,
referiu não se recordar de ter recebido instruções da arguida Fátima para publicitar o
que quer que seja. Quanto à publicidade institucional falava com o arguido Pereira e
está convencido que ele não tinha autonomia. Em todo o caso, em face do que tinha
conhecimento, o “Sovela” era beneficiado.
Ainda a propósito das declarações exaradas a fls 7803, referiu que o critério
político era preponderante mas que a questão do preço era também importante.
A propósito do que referiu a fls 7804, linas 4 a 6, confirmou tais declarações e
acrescentou que o critério político foi mais importante que a questão do preço.
Confirmou ainda o teor das suas declarações exaradas no antepenúltimo
parágrafo de fls 7804.
Reafirmou que no que toca à publicidade as instruções provinham da arguida
Fátima Felgueiras e do arguido António Pereira, em face dos despachos que já viu.
Neles estão subjacentes uma opção política de benefício do “Sovela”, segundo opina.
Em termos verbais não tinha instruções nesse sentido da arguida Fátima
Felgueiras, sendo certo que com ela tratava mais acerca de questões editoriais, que se
lembre.
No que se refere às suas declarações exaradas no penúltimo e último parágrafos
de fls 7802, referiu que as mesmas não correspondem totalmente à verdade, na medida
em que reafirmou que não se lembra de falar com a arguida Fátima sobre questões de
publicidade, ao contrário do que ali está expresso.
Em termos financeiros o depoente apenas sensiblizou a arguida Fátima no
sentido dela sensibilizar os outros membros da ADEC em ordem ao encerramento do
“Sovela”, dada a sua inviabilidade financeira, numa altura em que o mandato da arguida
Fátima já estava suspenso.
Assim, no que se refere à arguida Fátima, deve-se ter equivocado nas
declarações que prestou perante o JIC e constantes de fls 7802, penúltimo e último
parágrafos.

583
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O “Sovela” foi criado para fazer frente ao “Semanário de Felgueiras”.


Foi confrontado com o documento de fls 532 do apenso 139-C (carta não
assinada, de 17.03.98, supostamente da arguida Fátima, na qualidade de presidente da
ADEC, a convidar as pessoas a associar-se à dita associação, aludindo à importância da
mesma e do “Sovela”).
Em face desse documento, referiu que é claro que ela tinha preocupações com a
manutenção do “Sovela”.
Explicou o arguido que saiu da CMF em litígio com ela (CMF), o que aliás
motivou a instauração de uma acção contra ela, não tendo razões para favorecer
qualquer arguido, sendo certo que não guarda rancor de quem quer que seja.
A fls 153 do apenso 139-A constam os pagamentos efectuados ao “Sovela”
pelos serviços de publicidade prestados (há preços que não são coincidentes com os que
constam das tabelas).
Não se recorda dos preços praticados pelo “Sovela” em relação à CMF.
Quanto aos preços e valores não vê qualquer tratamento diferente do “Sovela”
em relação à CMF.
Várias vezes foi-lhe dito pelos arguidos António Pereira e Fátima Felgueiras que
não queriam publicidade no “Semanério de Felgueiras”. Não consegue precisar em que
momento isso sucedeu.
Por esse motivo, a publicidade que passava por si, não era encaminhada pelo
depoente para esse jornal.
Quando haviam despachos escritos eles eram cumpridos quando à determinação
dos jornais em que a publicidade deveria ser publicada.
Quando esses despachos escritos não existiam eram dadas instruções verbais.
Estava implicita a ideia de beneficiar o “Sovela” em circunstâncias iguais a nível
de preço. A CMF não era assim prejudicada. Certo é que se não existisse o “Sovela”
ainda assim tendencialmente a publicidade não seria encaminhada para o “Semanário de
Felgueiras”.
Está convencido que grande parte das decisões de publicação tinham em atenção
o facto do “Sovela” praticar preços mais baratos ou idênticos. Havia sobretudo a
intenção de não beneficiar o “Semanário de Felgueiras”.
Explicou que tinha interesse no desfecho financeiro do “Sovela” na medida em
que tinha uma conta conjunta com a testemunha Edgar (e outro titular) para pagar as
despesas do jornal e essa conta estava a descoberto.
Na CMF o depoente fazia a análise da imprensa e fazia recortes de artigos de
jornal, que levava ao GAPP (o qual por sua vez os encaminhava à arguida Fátima).
O arguido Horácio Costa foi para o Centro Coordenador de Transportes e depois
para um gabinete na CMF (segundo a ideia que tem, ainda no tempo em que ele era
assessor).
*
Em face das declarações da testemunha António Nascimento Pimentel Silva,
referiu a arguida Fátima Felgueiras que o Gabinete de Imprensa tinha como função
produzir informação sobre as iniciativas municipais, informação essa que era remetida
para toda a comunicação social.
A depoente era a directora do Boletim Municipal, publicação que era trimestral,
onde estava contida uma selecção de toda a informação produzida no trimestre pelo
Gabinete de Imprensa, segundo selecção determinada por si.
O “Sovela” era o jornal que mais informação municipal publicava, daí a sua
importância.
A CMF não pagava o que quer que fosse pela publicação dessas notícias.

584
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A maior parte da publicidade mandada publicar pela CMF era obrigatória e o


Gabinete de Imprensa nada tinha a ver com ela pois a publicação dessa publicidade era
encaminhada pelos serviços.
A outra publicidade (respeitante a eventos) passava pelo Gabinete de Imprensa
na ligação com os jornalistas e depois com o responsável camarário da área respectiva.
Tal publicidade era porém ínfima em comparação com a demais publicidade.
*
A testemunha António Nascimento Pimentel Silva referiu então que a
publicidade que passava por si era muito pouca, reportando-se apenas aos eventos, não
tendo qualquer poder de decisão acerca dela.
Essa publicidade tendencialmente não era publicada no “Semanário de
Felgueiras”.
Por vezes o “Semanário de Felgueiras” solicitava à CMF a publicação de
publicidade e a CMF acedia. Mas por iniciativa da CMF preferia-se proceder à
publicação de publicidade no “Sovela” ou no “Jornal da Lixa” Neste contexto, várias
vezes foi-lhe dito pela arguida Fátima e pelo arguido Pereira para não encaminhar a
publicidade para o “Semanário de Felgueiras”.
Os pedidos de publicidade eram encaminhados para decisão e nesse contexto,
por vezes, fez-se publicidade no “Semanário de Felgueiras”.

- Testemunha Vítor Manuel Fernandes Oliveira de Sousa


É jornalista de profissão, tendo colaborado a tempo inteiro para o “Público” de
Novembro de 1992 até Março de 1997. Por convite telefónico da arguida Fátima
Felgueiras, ingressou no Gabinete de Imprensa da CMF a 01.04.97, onde permaneceu
até ao final de 2005.
Quando ingressou no Gabinete de Imprensa da CMF já lá estava há vários anos
a testemunha António Nascimento Pimentel Silva.
Tinha como tarefas a elaboração de press release (elaboração de notícias acerca
da CMF) e do Boletim Municipal, além de serviços de interface entre a arguida Fátima e
vereadores e a comunicação social.
A distribuição do serviço pelo depoente e pela testemunha Pimentel era feita
casuisticamente.
A testemunha Pimentel estava mais ligado à arguida Fátima, devido até à sua
antiguidade, mas nunca sentiu a existência de qualquer relação hierárquica entre ele e a
sua pessoa. Respondiam ambos perante a arguida Fátima.
As notícias oficiais da CMF eram na maior parte dos casos inócuas. Outras
porém eram susceptíveis de causar impacto, pelo que eram submetidas à apreciação da
arguida Fátima Felgueiras, a qual fazia as correções que entendia.
A partir de 01.05.98 os elementos do Gabinete de Imprensa da CMF passaram a
ter um papel diferente na elaboração de um jornal próximo do PS (“Sovela”). De facto,
a arguida Fátima chamou o depoente e a testemunha Pimentel e ficou defenido que este
seria o director desse jornal e que o depoente seria o respectivo chefe de redacção,
cabendo ao Gabinete de Imprensa dar apoio ao “Sovela”.
Quer o depoente quer a testemunha Pimentel não viram com bons olhos o
convite para trabalhar no “Sovela”, mas não poderiam recusar tal convite pois os
respectivos vínculos à CMF eram precários. O convite aliás foi-lhes colocado como
algo já consumado, daí que tivessem sentido que foi tacitamente imposto pela arguida
Fátima Felgueiras.
Como a acumulação de funções no Gabinete de Imprensa e no Sovela” poderia
ser vista como sendo imcompatível, nessa reunião levantou essa questão, até porque

585
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

antes de ir para a CMF chegou a ser director do “Sovela” durante cerca de três meses,
tendo saído por não querer comprometer a sua independência enquanto colaborador do
“Público”. A arguida Fátima, porém, disse-lhe que não haveria problema.
Consequentemente, o depoente sentiu que se não aceitasse o convite o seu
vínculo à CMF cessaria.
Para o depoente o desempenho dessa tarefa extra era um fardo e não auferia
qualquer remuneração pelo desempenho dessa função nesse jornal.
Oficialmente a testemunha Pimentel também não, mas ele disse-lhe que auferia
algum dinheiro (não sabe quanto e com que regularidade). De facto, recorda-se que a
certa altura a funcionária administrativa e um jornalista do “Sovela” dirigiram-se ao
Gabinete de Imprensa da CMF reclamando o pagamento de salários em atraso e a
testemunha Pimentel referiu-lhes que primeiro tirava o dinheiro para si.
Inicialmente o “Sovela” tinha uma viatura muito deteriorada, tendo sido por isso
adquirida uma outra viatura (“Ford Fiesta”) pouco depois de 01.05.98, viatura essa que
mais tarde viria a ser vendida e a ser substituída por uma outra que entretanto foi
adquirida (“Fiat Uno”).
Essa viatura era usada pela testemunha Pimentel (que a levava para casa) e pelo
jornalista do “Sovela” quando se tinha de deslocar a propósito de reportagens.
O “Sovela” era um jornal semanal. Não sabe qual era a sua tiragem. Ignora
também qual o número efectivo de exemplares que eram distribuídos.
No concelho exisitiam ainda outros órgãos de comunicação (o “Semanário de
Felgueiras”, o “Jornal da Lixa” e a “Rádio Felgueiras”).
O “Sovela” era conotado com o PS e o “Semanário de Felgueiras” com o PSD
(cujo proprietário era a testemunha Manuel Faria, líder local do PSD, o qual fazia
oposição ao executivo camarário). Daí a necessidade do “Sovela” fazer o contraponto.
O “Semanário de Felgueiras” foi sempre publicado regularmente, mas o
“Sovela” não.
O “Semanário de Felgueiras” estava mais implantado, mas a partir de certa
altura “descambou” e passou a fazer oposição à CMF.
Não tem dúvidas que esse semanário tinha mais circulação que o “Sovela”, até
porque era mais antigo e não sofria flutuações em termos de publicação como sucedia
com o “Sovela” (o que prejudicava a fidelização dos leitores a este último).
O “Jornal da Lixa”, por sua vez, representava as gentes da Lixa, as quais são
muito bairristas. Era pois um jornal mais localizado. Não faz a mínima ideia de qual
seria a respectiva tiragem.
O “Sovela” em termos financeiros era alimentado pela publicidade. Lutava com
dificuldades financeiras, facto de que se apercebeu em face das dificuldades sentidas em
pagar os salários aos seus funcionários. Aliás, quando assumiu funções nesse jornal
existiam hiatos de tempo sem publicação do mesmo.
Quando o depoente entrou para a CMF conheceu o arguido Horácio Costa na
medida em que ele era assessor.
Chegaram ambos a fazer parte da direcção de campanha nas eleições autárquicas
de 1997, sendo o arguido Horácio o responsável pela parte financeira.
Ignora se foram pagas despesas do “Sovela” com dinheiro que não pertencia à
ADEC, designadamente despesas pagas pelo arguido Horácio Costa.
Nunca assistiu à negociação de qualquer dívida do “Sovela”. Tais matérias
passavam-lhe ao lado, daí que acerca delas nada saiba (cfr., em todo o caso, as
declarações prestadas pela testemunha a esse propósito perante o JIC e exaradas a fls
7781º, terceiro parágrafo, com as quais foi confrontada).

586
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O arguido Horácio chegou a pertencer à direcção da ADEC mas demitiu-se


entretanto.
A testemunha Pimentel referiu ao depoente que iria sugerir à arguida Fátima que
a CMF fizesse mais publicidade dos eventos que levava a cabo nos órgãos de
comunicação social, de modo a que esses eventos tivessem eco, já que essa publicidade
era muito pontual.
Dessa forma, dar-se-ia mais visibilidade às actividades camarárias e
simultaneamente o “Sovela” e os outros órgãos de comunicação local retirariam as
respectivas contrapartidas económicas por força da publicação de publicidade.
Todos os editais da CMF eram publicados no “Sovela”.
A partir de determinada altura (que não precisou) foi visível a publicação de
mais publicidade da CMF no “Sovela”, a propósito de eventos ou de efemérides.
Era a testemunha Pimentel, articulada com os funcionários administrativos,
quem tratavam da publicidade.
Os vendedores de publicidade, por seu turno, auferiam uma comissão, como era
o caso da funcionária administrativa do “Sovela” (angariava publicidade e auferia uma
comissão por isso).
Uma das funções do depoente era a de ler os outros jornais, tendo-se apercebido
por isso que neles era publicada publicidade da CMF em muito menor quantidade.
Atribui esse facto à circunstância do “Sovela” ser o “órgão oficial” da CMF e o
“Semanário de Felgueiras” o órgão de um membro do PSD local (a testemunha Manuel
Faria).
Sabe que o “Sovela” tinha uma tabela de preços de publicidade, mas ignora se a
CMF a solicitou e se a mesma foi enviada.
O Gabinete de Imprensa da CMF dava o seu parecer acerca da publicidade a
publicar, parecer esse que normalmente era seguido.
Em todo o caso, nunca passou por si qualquer proposta de publicação de
publicidade no “Sovela”.
O depoente recorda-se que certa vez perguntou ao “Jornal da Lixa” quanto
custava a publicidade e entregou a respectiva informação no GAPP sem ter visualizado
a respectiva tabela de preços.
Ignora quem publicava a publicidade mais barata. Supõe que os preços fossem
equivalentes, mas não tem conhecimento desse facto.
Alguma publicidade vinha para o “Sovela” por via de uma agência de
publicidade, outra por intermédio dos próprios interessados, outra ainda por força da
acção de funcionários que faziam a prospecção no sentido de angariar publicidade para
o jornal.
Não sabe se a testemunha Pimentel angariava ou não publicidade para o jornal.
É facto que nunca chegou ao seu conhecimento.
O depoente exlicou que o seu desempenho no “Sovela”, ao nível editorial,
causou-lhe alguns incómodos de ordem ética. Presume que a testemunha Pimentel
também continuou a desempenhar as suas funções no “Sovela” desagradado (cfr., em
todo o caso, as suas declarações prestadas perante o JIC e exaradas a fls 7782,
penúltimo parágrafo, e com as quais foi confrontada).
A testemunha foi confrontada com as declarações prestadas perante o JIC,
exaradas a fls 7782, penúltimo parágrafo, 7781, terceiro parágrafo, e fls 7779, quinto e
último parágrafos até terminar a fls 7780.
No que respeita ao que declarou perante o JIC e ficou exarado a fls 7779, quinto
e último parágrafos até terminar a fls 7780, referiu já não se recordar. Em todo o caso,
assegurou que em 2005 tinha a memória fresca, pois a sua passagem por Felgueiras foi

587
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

traumatizante pela forma como saíu (foi dispensado da CMF por ter apoiado um
candidato que não venceu as eleições autárquicas. Processou a CMF no Tribunal de
Trabalho e recebeu dela uma indemnização. Teve uma depressão psicológica à conta
desses factos).
Referiu que acha que a testemunha Pimentel pontualmente auferia uma
remuneração pela sua prestação no “Sovela”. Reafirmou que em 2005 (quando prestou
declarações perante o JIC) tinha a memória mais fresca.
No que se refere às suas declarações prestadas perante o JIC e exaradas a fls
7779, último parágrafo, reiterou o que aí afirmou, sendo certo que em 2005 tinha a
memória mais fresca.
No que concerne às declarações que prestou perante o JIC e exaradas a fls 7781,
terceiro parágrafo, assegurou já não se recordar do facto em causa (negociação da dívida
do “Sovela” pelo arguido Horácio), reiterando que as declarações que prestou em 2005
são mais fidedignas por ter nessa altura a memória mais fresca.
No que se refere às suas declarações exaradas a fls 7782, penúltimo parágrafo,
referiu não ter hoje a percepção que então transmitiu ao JIC, mas atribui mais
fidedignidade às declarações então prestadas pelas razões que já acima apontou.
Tem a ideia que a IGAT, quando inspeccionou a CMF, levantou problemas
quanto à falta de justificação para a publicitação, sendo certo que os procedimentos
entretanto alteraram-se. Trata-se de matéria da qual já não se recorda com muita
precisão.
Não se recorda se a testemunha Pimentel era ou não contitular de uma conta
bancária destinada a depositar as verbas geradas pelo “Sovela” e a pagar aos seus
credores.
No “Sovela” o depoente recolhia a informação e programava as notícias que
iriam ser tratadas durante a semana, após o que dava instruções ao jornalista do
“Sovela” para durante a semana em causa dar seguimento a essas notícias. Dava
também apoio na elaboração de notícias mais complexas.
Não fazia a paginação.
Pontualmente fazia entrevistas a membros do PS.
Elaborava textos no Gabinete de Imprensa da CMF para o “Sovela”. Às vezes
passava pela redacção do jornal. Recorda-se que inicialmente a redacção do “Sovela”
não tinha condições para que ali se pudesse processar o texto, usando por isso os meios
de que dispunha no Gabinete de Imprensa da CMF (ou melhor, do Gabinete de
Comunicação e Imagem da CMF).
No Gabinete de Comunicação e Imagem da CMF fazia o tratamento em termos
de imagem da publicidade da CMF e que era encaminhada para a comunicação social.
A digitalização de imagens para o “Sovela” era também feita no Gabinete de
Imprensa da CMF, bem como a paginação (elaborada pela testemunha Pimentel).
Acha que a arguida Fátima tinha conhecimento de tudo o que se passava na
CMF.
Presume que ela sabia que o depoente elaborava textos e digitalizava imagens
para o “Sovela” no Gabinete de Imprensa (tem quase a certeza desse facto).
Em todo o caso, estava no ADN da arguida Fátima Felgueiras controlar tudo de
perto.
*
O arguido Horácio Costa referiu então que quando a testemunha Pimentel
iniciou funções no “Sovela” (Maio de 1998) o depoente ainda não fazia parte da
direcção da ADEC, o que só veio a suceder em Novembro de 1998 (como secretário),

588
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

sendo então o arguido António Pereira o presidente da direcção e o arguido Joaquim


Freitas o tesoureiro.
Recorda-se que no restaurante “Zona Verde” a nova direcção da ADEC reuniu
(o António Pereira, o depoente e o Joaquim Freitas) com a testemunha Pimentel na
sequência de uma reunião onde foi determinada a abertura de contas bancárias para
acabar com os pagamentos efectuados através de contas não tituladas pela ADEC, entre
outros assuntos.
Logo nesse almoço o arguido António Pereira transmitiu que a testemunha
Pimentel iria assumir a responsabilidade pela parte financeira do “Sovela” e que deveria
retirar 50.000$00 mensais como forma de remuneração pelo seu trabalho acrescido.
Desde essa altura que a testemunha Pimentel retirou mensalmente essa verba.
Tudo foi efectuado por decisão da arguida Fátima Felgueiras, a qual iria pedir
directamente contas à testemunha Pimentel pela gestão financeira do jornal. O depoente
estranhou tal facto, o qual aliás não foi igualmente do agrado dos arguidos António
Pereira e Joaquim Freitas.
Esclareceu que pouco contacto teve com a testemunha Pimentel.
A mesma situação se passava com a “Foca”, cujo responsável (Manuel Freitas)
reportava directamente à arguida Fátima Felgueiras (passando assim por cima da
direcção da ADEC).
Foi aliás por isso que se demitiu da direcção da ADEC (não estava disposto a ser
uma figura meramente decorativa).
Recorda-se da testemunha Vítor Sousa se preocupar com o facto de ter de
abandonar o seu local de trabalho para ir a reuniões no âmbito da campanha eleitoral de
1997.
Ele contava-lhe que o “Sovela” sempre foi feito no Gabinete de Imprensa da
CMF.
De facto, o espaço da redacção desse jornal era exíguo e não dispunha de meios
informáticos.
A propósito da aquisição do “Ford Fiesta”, foi-lhe dito pela testemunha Pimentel
que tal aquisição foi efectuada por indicação da arguida Fátima Felgueiras.
Reiterou que saiu da ADEC porque quem de facto mandava na associação era a
arguida Fátima Felgueiras.
*
A testemunha Vítor Sousa, por sua vez, esclareceu que em 1996 foi director do
“Sovela” durante 3 ou 4 meses, estando sediado o jornal noutro espaço (que não aquele
que mais tarde viria a constatar), espaço esse que então dispunha de um computador.
Nessa altura era o Sr. Artur Barros o redactor, sendo certo que o jornal já dispunha de
uma funcionária administrativa.
Em 1997 o depoente colaborou com o jornal e levava as peças escritas e
gravadas em disquete.
Em Maio desse ano o jornal transferiu-se para outro local, não se recordando se
tinha ou não meios informáticos. Mais tarde tem a certeza que o jornal apetrechou-se
desses meios.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


O “Sovela” era um projecto da ADEC (ver acta nº 1, mais concretamente a fls
121 do apenso 139-A).
Inicialmente foi a arguida Fátima Felgueiras quem assumiu a presidência da
ADEC (cfr. acta nº 1, de 04.03.94, constante de fls 119 e ss., do apenso 139-A).
Os elementos da ADEC eram conotados com o PS.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Entretanto o arguido António Pereira Mesquita de Carvalho (à data vereador na


CMF) foi nomeado presidente da direcção da ADEC (cfr. acta nº 4, de 01.09.98,
constante de fls 126 e ss. do apenso 139-A).
Pode-se dizer que o PS estava conotado com o PS.
O director do jornal “Sovela” era a testemunha António Pimentel, chefe do
Gabinete de Comunicação e Relações Públicas da CMF (cfr. o respectivo contrato de
avença, datado de 05.08.93, constante de fls 96 do apenso 139-A), tendo sido nomeado
a 20.05.98, conforme acta nº 18, dessa data (constante de fls 97 do apenso 139-A),
tendo substituído o arguido António Pereira Mesquita de Carvalho nessa função (a
pedido do próprio).
A testemunha Vítor Sousa trabalhava também no Gabinete de Imprensa da CMF
(cfr. o respectivo contrato de avença a fls 150 do apenso 139-A) e chegou a ser
subdirector do “Sovela” (cfr. a acta nº 14 de 20.06.96, constante de fls 146 do apenso
139-A).
Presume assim que existia uma relação umbilical entre a CMF e a ADEC.
À época, para além do “Sovela”, eram publicados o “Semanário de Felgueiras” e
o “Jornal da Lixa”.
Em face do acompanhamento das notícias do que era publicado nestes jornais
semanais concluiu que o “Semanário de Felgueiras” era conotado com o PSD (cujo
proprietário era a testemunha Manuel Faria, líder da oposição) e o “Sovela” com o PS.
Ficou ainda com a ideia que o “Jornal da Lixa” era mais direccionado para os problemas
da cidade da Lixa. Já o “Sovela” e o “Semanário de Felgueiras” reportavam-se mais à
cidade de Felgueiras.
Nesses jornais era feita publicidade pela CMF, mas mais no “Sovela” (cfr.
relatório da IGAT, constante de fls 3198 e ss.).
Segundo uma denúncia anónima o “Sovela” seria favorecido, pelo que a
investigação procurou esclarecer esse aspecto, tendo para o efeito solicitado a
intervenção da IGAT na inspecção que fez ao município.
A fls 203 do apenso 139-A constam os valores da facturação apresentadas
relativamente aos três jornais locais referidos, de 1998 a 2003, segundo quadro que lhes
foi fornecido pela testemunha Fernanda Leal, onde se constatou que o “Sovela”
apresenta um valor superior em cerca de três vezes em relação à soma dos valores
apresentados pelos demais jornais locais
Não se recorda se no relatório da IGAT se concluiu que em alguns casos a
publicidade seria mais barata no “Semanário de Felgueiras”.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


O jornal “O Sovela” pertencia à ADEC (cfr. acta nº 1 da ADEC, de 04.03.94,
constante de fls 119 do apenso 139-A, onde foram eleitos os corpos gerentes e criado o
jornal). Para a presidência da direcção foi nomeada a arguida Fátima e para a
presidência da assembleia geral o arguido Júlio Faria.
O arguido António Pereira Mesquita de Carvalho viria a substituir a arguida
Fátima Felgueiras na presidência da direcção da ADEC (cfr. acta nº 4, de 01.09.98 – fls
126 do apenso 139-A).
Nessa altura ele era vereador da CMF.
Desde essa altura a arguida Fátima deixou de exercer qualquer cargo na dita
associação.
As pessoas que faziam parte da ADEC e do jornal “O Sovela” estavam ligadas
ao PS e algumas à CMF.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

“O Sovela” era conotado com o PS e o “Semanário de Felgueiras” com o PSD.


A testemunha Manuel Faria era o presidente da concelhia local do PSD e líder da
oposição.
O editorial de um e outro jornal revelavam de forma evidente a ligação
partidária de um e outro.
Havia também o “Jornal da Lixa”, mais focado nos acontecimentos que diziam
respeito à cidade da Lixa.
Os inspectores da IGAT analisaram a publicidade obrigatória mandada publicar
pela CMF nos jornais locais, tendo elaborado a esse propósito um relatório.
Havia uma grande diferença no volume de publicidade que era mandada
publicar pela CMF, em benefício do “Sovela” – cfr. quadro de fls 203 do apenso 139-A,
elaborado pela testemunha Fernanda Castro Leal da CMF, reportado ao período
compreendido entre meados de 1998 até 2003.
A testemunha António Pimentel (assessor de imprensa da CMF – cfr. o
respectivo contrato de avença datado de 05.08.93, constante de fls 96 do apenso 139-A)
chegou a ser director do “Sovela”, substituindo nessa função o arguido António Pereira
Mesquita de Carvalo (cfr. acta nº 18 da ADEC, de 20.05.98, constante de fls 97 do
apenso 139-A).
Antes disso, a testemunha Vítor Manuel Fernandes de Sousa – que foi admitido
ao serviço da CMF para o gabinete de imprensa (cfr. o contrato de prestação de serviços
constante de fls 150 do apenso 139-A) -, havia sido nomeado director interino do
“Sovela” (cfr. acta nº 14, de 20.06.96, cuja cópia consta de fls 148 do apenso 139-A).
Há documentos que revelam que a arguida Fátima se preocupava com as
questões ligadas ao “Sovela”.
Assim, desde logo, houveram despesas desse jornal que foram pagas com
dinheiro proveniente da conta do BES.
Para além disso, a fls 531 e 532 do apenso 139-C constam convites às pessoas
para se associarem à ADEC, endereçados pela arguida Fátima enquanto presidente da
associação.
A fls 423 a 430 do 2º volume constam despachos da arguida Fátima (numa
altura em que ela não pertencia aos corpos dirigentes da ADEC, desde 01.09.98)
apostos em cópias de cheques da conta titulada pelo “Sovela” para pagamento de
despesas desse jornal, dirigidas ao arguido António Pereira Mesquita de Carvalho (de
16.10.98, 09.10.98; 16.09.98 e de 12.09.98).
Os arguidos Horácio e Joaquim Freitas integraram a ADEC por pouco tempo,
ignorando que cargos ocuparam nessa associação.

Análise crítica
Sobre esta matéria assume alguma relevância o relatório da IGAT de fls 3165 e
ss. dos autos (cfr. fls 40 e ss. de tal relatório), bem como o depoimento de quem o
elaborou (testemunhas Luís Maia e Silvino Perdigão), em conjugação com os
documentos que acima são referenciados a propósito de tais depoimentos.
Além do mais, nesse relatório, foi abordada a questão da incompatibilidade de
funções exercidas simultaneamente pela testemunha Pimentel na CMF e no “Sovela”,
matéria que aqui só reflexamente poderá ter algum interesse.
Mais importante foi análise, do ponto de vista procedimentar, no que respeita à
publicação de publicidade pela CMF nos jornais locais, tendo-se detectado deficiências
ao nível da fundamentação das respectivas decisões, afigurando-se insuficiente, a quem
levou a cabo a acção inspectiva ao município felgueirense, a fundamentação genérica
contida no despacho proferido pela arguida Fátima a 17.10.96.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esta questão, porém, só reflexamente poderá ter interesse para o que agora nos
ocupa.
Bem mais importante, acerca desta matéria, é o relatório da IGAT de fls 3 e ss.
do apenso 139-A, bem como o depoimento de quem o elaborou (testemunhas Fernandes
Pêga e Vitor Pinto).
Esse documento, como é bom de ver, consubstancia-se em prova documental
que pode ser valorada livremente pelo Tribunal (cfr. artº 127º, do CPP).
Porém, desde logo se coloca o problema de se saber se o Tribunal poderá valorar
os depoimentos dos (aqui) arguidos Bragança e António Mesquita de Carvalho,
depoimentos esses que foram tomados no âmbito daquela acção inspectiva pelos Srs
inspectores da IGAT, tendo presente que esse organismo não é um órgão de polícia
criminal.
É que, não obstante esse relatório constituir prova documental, além do mais, as
conclusões nele vertidas fundam-se em parte em depoimentos tomados no âmbito da
respectiva acção inspectiva.
Nos termos do artº 355º, nº 1, do CPP, “Não valem em julgamento,
nomeadamente para o efeito de formação da convicção do Tribunal, quaisquer provas
que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência”, isto é, provas não
submetidas ao contraditório na audiência de julgamento.
Ressalvam-se as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida
em audiência de julgamento (cfr. nº 2, do artº 355º, do CPP).
Ora, está vedado ao Tribunal, designadamente, valorar os autos que contenham
declarações de testemunhas ou de arguidos, tomadas no inquérito ou na instrução (cfr.
artº 356º, nº 1, al.b), do CPP), sendo certo porém que, neste último caso, essas
declarações poderão ser valoradas se o respectivo auto puder ser lido nas condições
previstas no nº 3, als. a) a c), do artº 356º, do CPP (não se cura aqui da hipótese contida
no nº 4, do mesmo artigo), no caso das testemunhas, ou nas condições contidas no artº
artº 357º, nº 1, als a) e b), do mesmo diploma legal, no caso dos arguidos.
Pergunta-se: as declarações produzidas em outros processos, de natureza
diversa, vertidas em auto, poderão ser valoradas, ainda que sob a capa da prova
documental?
Sucede que as declarações tomadas a testemunhas no âmbito da respectiva acção
inspectiva foram apenas conduzidas pelos Srs inspectores sem qualquer contraditório.
Por outro lado, o estatuto de quem foi ouvido nessse processo inspectivo era o
de testemunha, com a inerente obrigação de depôr e de o fazer com verdade.
Os arguidos António Mesquita Pereira de Carvalho e António José Leite
Bragança da Cunha foram ali ouvidos na qualidade de testemunhas.
Nestes autos eles têm o estatuto de arguidos, não tendo por isso qualquer
obrigação de colaboração com a Justiça, isto é, de contribuir para a descoberta da
verdade material, podendo mesmo remeter-se ao silêncio, o que aliás fizeram.
Tendo-se remetido ao silêncio, seria estranho que o Tribunal pudesse valorar as
respectivas declarações – que estão vertidas em auto no processo inspectivo e
referenciadas no relatório mencionado -, declarações essas que nem sequer foram
proferidas no âmbito destes autos e foram-no numa altura em que os ditos arguidos
tinham outro estatuto.
Conclui-se portanto que o Tribunal não pode valorar os respectivos autos de
inquirição em tal processo inspectivo ao município de Felgueiras (bem como as
conclusões que, vertidas no relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A, se fundem
exclusivamente em tais declarações), sob pena de se postergar o direito ao silêncio dos

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

arguidos António e Bragança, direito processual esse que eles legitimamente exerceram,
designadamente, na audiência de julgamento.
Trata-se pois de uma proibição de valoração de prova semelhante à contida no
artº 356º, nº 1, al. b), do CPP, a contrario, pois a razão de ser é idêntica.
De resto, remetendo-se o arguido ao silêncio no julgamento, ele não poderá ser
confrontado, em circunstância alguma, com declarações prestadas quer na fase de
inquérito quer na fase de instrução.
Se assim é relativamente a declarações prestadas no âmbito do processo-crime
respectivo, assim deverá ser em relação a declarações prestadas no âmbito de outro
processo, ainda que de outra natureza (como por exemplo depoimentos de parte em
acções de natureza cível, depoimentos prestados enquanto testemunha em acções
inspectivas ou em processos disciplinares).
Porém, não sendo a IGAT um órgão de polícia criminal, pergunta-se: os Srs
inspectores não poderão ser inquiridos acerca do conteúdo dessas mesmas declarações?
Poder-se-á sustentar que sim, em face do disposto no artº 356º, nº 7, do CPP, a
contrario sensu.
Nesta hipótese, o Tribunal estaria apenas a valorar prova testemunhal, produzida
acerca de declarações prestadas perante essas mesmas testemunhas.
Porém, a situação em causa não é similar àquela em que alguém é ouvido como
testemunha acerca de afirmações produzidas, por exemplo, por algum dos arguidos, em
qualquer dos casos em contexto informal e sem que sobre este penda qualquer
obrigação de as produzir.
Nessa hipótese, as declarações ouvidas sê-lo-iam em contexto informal e a
pessoa que as proferiu fê-lo de livre vontade, sem que para tanto estivesse obrigada.
Nesse caso, seria lícita a inquirição de testemunha que tenha ouvido tais
declarações, desde que não seja órgão de polícia criminal, depoimento esse que assim
poderia ser valorado (cfr. artº 356º, nº 7, a contrario sensu, do CPP) e, ainda assim, nas
circunstâncias previstas no artº 129º, nº 1, do CPP.
Só nessa hipótese admitiriamos a valoração de prova testemunhal acerca do
conteúdo de tais declarações informais (produzidas por quem nestes autos assume a
qualidade de arguido).
Ora, não é exactamente esse o caso em apreço.
Os arguidos António e Bragança, enquanto testemunhas nesse processo
inspectivo, tinham a obrigação de depôr e de o fazer com verdade, conforme já se disse.
E, inexistindo liberdade de recusa de depoimento enquanto testemunhas nesse
processo inspectivo e assumindo agora, nestes autos, os ditos António e Bragança, o
estatuto de arguidos, remetendo-se os mesmos ao silêncio, a valoração daquela prova
testemunhal (tomada acerca do conteúdo das afirmações produzidas por eles na acção
inspectiva), teria como consequência a postergação desse direito ao silêncio, fazendo-se
entrar pela janela o que a lei pretende que entre pela porta.
De facto, além do mais, seria estranho que a lei fosse mais exigente
relativamente à valoração no julgamento de provas produzidas no âmbito do respectivo
processo-crime e que igual exigência, por identidade de razão, não fosse tomada em
consideração relativamente a provas produzidas no âmbito de outros processos, ainda
que de natureza diversa.
Dito de outro modo:
- choca a nossa sensibilidade jurídica que um arguido legitimamente se remeta
ao silêncio mas que o Tribunal possa valorar as declarações por ele prestadas em outros
processos, ainda que de diferente natureza, enquanto sujeito processual ou interveniente
acidental (desde que essas declarações estejam vertidas em auto), ou que sobre o

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

conteúdo dessas mesmas declarações sejam ouvidos os inspectores que conduziram as


respectivas inquirições;
- Choca essa mesma sensibilidade que essas declarações possam ser
indirectamente valoradas, sob a capa da valoração de prova documental, porquanto as
mesmas estão referenciadas num relatório e suportam algumas das conclusões ali
vertidas.
Consequentemente, salvo melhor opinião, por identidade de razão, mutatis
mutandis, em qualquer dos casos, dever-se-ão aplicar os normativos contidos nos artgs
356º, nºs 1, al. b), e 7, e 357º, nº 1, als. a) e b), do CPP.
Esta parece-nos ser assim a posição mais consentânea com os princípios da
legalidade (cfr. artº 125º, do CPP) e da imediação (cfr. artº 355º, do CPP) e ainda com o
direito ao silêncio dos arguidos (cfr. artgs 61º, nº 1, al. c) e 345º, nº 1, segunda parte,
ambos do CPP).
É pois, tendo presente estes pressupostos, que o Tribunal valorará quer o
relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A, quer o depoimento de quem o elaborou.
Aqui chegados, cabe salientar que a arguida Fátima Felgueiras negou que
alguma vez tenha produzido qualquer instrução verbal no sentido de se não mandar
publicar publicidade no jornal “Semanário de Felgueiras”, semanário que é conotado
com o PSD (por muito que a testemunha Manuel Faria o não reconheça), e assim era
entendido pelas hostes do PS (a generalidade das testemunhas ouvidas confirmaram isso
mesmo).
Outrossim, negou que tenha dado qualquer instrução verbal no sentido de
beneficiar o “Sovela” em termos de publicação de publicidade da CMF.
Por outro lado, o jornal “O Sovela” era conotado com o PS, conforme ficou
demonstrado à saciedade quer pela prova testemunhal produzida quer pela análise do
respectivo conteúdo, sendo certo que tal jornal pertencia à ADEC, associação que, na
prática, era uma extensão do PS local, conforme aliás já tivemos a oportunidade de
referir a propósito da introdução a este capítulo.
Ora, perante este cenário de fundo, é plausível que o “Semanário de Felgueiras”,
como instrumento de combate político da oposição, fosse visto com animosidade por
quem detinha o poder na CMF, conforme aliás referido, designadamente, pelo arguido
Horácio Costa.
Assim, tendo presente:
- a referida animosidade em relação ao “Semanário de Felgueiras” pelas hostes
do PS local, com a arguida Fátima à cabeça;
- a crise financeira do “Sovela”, em risco de deixar de ser de vez publicado (a
sua publicação era aliás intermitente), conforme referido pelo arguido Horácio e por
algumas testemunhas (cfr., por exemplo, o depoimento das testemunhas António
Pimentel Silva e Vítor Sousa);
- o facto da arguida Fátima se preocupar com esse estado de coisas, ao ponto de
se mostrar activa na angariação de fundos e sócios para a “ADEC”, proprietária do
“Sovela” (cfr., designadamente, os documentos de fls 272 do 2º volume dos autos e de
fls 532 do apenso 139-C);
- a circunstância de ser ela quem de facto mandava na ADEC, proprietária do
“Sovela” (cfr. declarações do arguido Horácio Costa e o episódio relatado da nomeação
das testemunhas Pimentel e Vítor Sousa para exercer funções nesse jornal); e
- o facto objectivo de ter sido canalizada quase três vezes mais publicidade para
o “Sovela” que para os outros dois semanários referidos nos autos juntos (“Semanário
de Felgueiras” e “Jornal da Lixa”), nos anos de 1998 a Fevereiro de 2003 (cfr. os
quadros de fls. 3199 dos autos e de fls 203 do apenso 139-A, bem como o relatório de

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2º Juízo

fls 3 e ss. do apenso 139-A, mais concretamente fls 27 desse apenso, correspondente à
pág. 14 do mesmo relatório, e ainda a relação dos pagamentos efectuados ao “Sovela”,
constante de fls 153 e ss. do apenso 139-A);
tem alguma consistência a suspeita de que, na verdade, pelo menos aqui e acolá,
procurou-se beneficiar o “Sovela” em detrimento dos demais jornais locais.
Isso, porém, não basta para que o Tribunal dê como assente a totalidade da
factualidade alegada na pronúncia a esse propósito.
Na verdade, dos elementos de prova produzidos resultam indícios algo
contraditórios.
É que, pese embora o acima referido quanto às várias circunstâncias que de
alguma forma apontam no sentido da factualidade descrita na pronúncia (embora com
uma extensão muito menor), o certo é que o “Sovela”, pelo menos na esmagadora
maioria dos casos, fazia o preço mais barato (cfr. as tabelas de preços de fls 174, 176,
177, 181, 183, 184 a 191, do apenso 139-A; cfr. ainda fls 304 e ss. do apenso 139-D),
pois a generalidade das publicações era efecuada a preto e branco em ¼ de página.
É certo que a concorrência era à partida desleal, pois elementos da CMF
(testemunhas Vítor Sousa e Pimentel), que simultaneamente exerciam funções no
“Sovela” (cfr., por exemplo, o contrato de avença de fls 96 do apenso 139-A, respeitante
à testemunha Pimentel, e a acta nº 18, cuja cópia se acha a fls 97 do apenso 139-A,
respeitante à sua nomeação para director do “Sovela”), dispunham de informação
privilegiada acerca dos preços praticados pela concorrência e das necessidades de
publicitação por banda da CMF.
Ser-lhes-ia pois muito fácil adequar os preços praticados pelo “Sovela” em
função dos preços praticados pela concorrência e também ser-lhes-ia mais fácil a
angariação de publicidade junto dos serviços municipais.
Neste sentido apontam as regras da experiência comum.
Seja como for, como se disse, o “Sovela” fazia o preço mais barato nas
publicitações em ¼ de página a preto e branco (a esmagadora maioria dos anúncios e
demais publicidade era publicitada neste formato), mas era o mais caro nas contracapas,
na meia página e na página; o “Semanário de Felgueiras”, por seu turno, era o mais caro
no ¼ de página.
Por vezes os preços cobrados não coincidiam com o que constava da tabela de
preços, ao que tudo indica porquanto a publicitação não se enquadrou em qualquer um
dos formatos previstos nas tabelas (por exemplo, um pouco mais que ¼ de página ou
um pouco menos que meia página), sendo então o preço cobrado ajustado em função da
dimensão da publicação (cfr. por ex. o depoimento da testemunha Pimentel Silva em
conjugação com o documento de fls 454 do apenso 139-C).
Mais difícil porém se torna a imputação dessa conduta - a dar-se de facto como
provada (e que visava o benefício do “Sovela” em detrimento de outros jornais locais,
pelo menos em situações pontuais) - a um concreto sujeito, quando é certo que o
Tribunal, pelas razões já referidas, não valora as declarações proferidas pelo arguido
Bragança no âmbito da acção inspectiva levada a cabo pela IGAT e que deu origem ao
relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A.
Na verdade, os potenciais suspeitos são vários, a começar pela arguida Fátima, a
passar pelo arguido António Mesquita de Carvalho e a terminar na testemunha António
Pimentel Silva (cujo pagamento da respectiva remuneração pelo exercício das funções
de director do “Sovela” passavam pela saúde financeira desse semanário, para além de
que, conforme disse, a conta do “Sovela”, de que ele era contitular com a testemunha
Edgar, estava a descoberto).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Para além disso, temos um despacho genérico da arguida Fátima em matéria de


publicação de publicidade, datado de 17.10.96, que não merece qualquer reserva, pelo
que, pelo menos formalmente, existiria uma orientação genérica no sentido da
publicação no jornal que fizesse o preço mais baixo (cfr. os documentos de fls 12031 a
12035; cfr. ainda, por exemplo, os despachos proferidos por ela e constantes de fls 317
do apenso 139-B e de fls 303 do apenso 193-B, os quais são consentâneos com aquela
orientação geral).
Ademais, em face do teor do relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A, a
publicitação de eventos no “Sovela” apenas merece reparos de fundo em pouquíssimas
situações ali assinaladas (a publicação de publicidade obrigatória – institucional - não
suscitou grandes reservas), sendo certo que a publicitação de eventos era residual em
relação à publicidade institucional.
Para além disso, convém não esquecer que nem sempre o critério preço deverá
ser o único a ser considerado, existindo certa margem de discricionaridade na tomada de
decisões acerca da publicitação de eventos (tratavam-se aliás de ajustes directos).
Assim, por exemplo, tendo presente que o “Jornal da Lixa” tinha uma tiragem
inferior (cfr. fls 194 do apenso 139-A) e centrava a sua linha editorial em eventos que
tinham lugar na cidade da Lixa, naturalmente que, em função do tipo de evento em
causa, poderia ser justificada a preterição desse jornal.
É claro que esse argumento já não colhe no que se refere ao “Semanário de
Felgueiras”, o qual tinha a mesma tiragem e pelo menos a mesma expressão que o
“Sovela” (cfr. fls 183 e 196, ambas do apenso 139-A; há que atender que, em ambos os
jornais, a tiragem referida era inferior à real tiragem, conforme referido por algumas
testemunhas com manifesto conhecimento de causa, como por exemplo as testemunhas
Manuel Faria e António Pimentel; em todo o caso, a publicação do “Semanário de
Felgueiras” era regular, o mesmo não sucedendo com o “Sovela”).
Ora, do depoimento das testemunhas Edgar Pinto da Silva (este apenas quando
confrontado com declarações prestadas na fase de instrução) e da testemunha Pimentel
emerge que o poder instituído na CMF não estaria disposto a financiar jornais conotados
com a oposição.
Porém, a testemunha Edgar Pinto da Silva, grosso modo, limitou-se a expressar
convicções e deduções, sem que tenha conseguido fornecer ao Tribunal qualquer facto
concreto em que tal convicção se pudesse basear, quando é certo que era o vice-
presidente da autarquia e figura destacada do PS local.
E o depoimento da testemunha Pimentel não foi nada linear na audiência de
julgamento, pois o que a esse propósito disse aqui desdisse acolá e vice-versa, de modo
que ficou o Tribunal com a percepção de que ele depôs acerca deste assunto com visível
desconforto.
Em todo o caso, essa testemunha revelou-se mais assertiva na fase de instrução,
sendo certo que das declarações então proferidas (nos segmentos com os quais foi
confrontado) resulta de forma inequívoca que ele terá recebido instruções verbais no
sentido de beneficiar o “Sovela” no que respeita à publicidade dos eventos (cfr.,
designadamente, as declarações prestadas por essa testemunha perante a JIC a fls 7803,
penúltimo e último parágrafos, em conjugação com segmentos de declarações prestadas
já no julgamento), a única aliás de que se ocupava.
Do cotejo de todas as declarações prestadas por essa testemunha (na instrução,
no segmento com o qual foi confrontado, e na audiência de julgamento), parece resultar
que ele nunca terá recebido instruções verbais nesse sentido directamente da arguida
Fátima, mas apenas por intermédio do arguido António Mesquita de Carvalho.

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2º Juízo

Ora, tal facto poderá causar alguma estranheza, já que, sendo a testemunha em
causa elemento do Gabinete de Imprensa, reunindo assim com a presidente da edilidade
– que controlava o que era publicado no “Sovela”, abordando com ele questões de
ordem editorial (cfr. o depoimento das testemunhas Pimentel e Vítor Sousa) – poder-se-
á argumentar que não teria qualquer lógica a circunstância de ter sido o arguido António
a correia de transmissão dessas ordens verbais da arguida Fátima Felgueiras e muito
menos relativas à publicitação de eventos que nada tinham a ver com os seus pelouros,
quando é certo que o arguido António, à data, nem sequer era o vice-presidente da
autarquia.
Além disso, com conhecimento de causa, a testemunha Vítor Sousa referiu a
conotação política dos jornais “O Sovela” e “Semanário de Felgueiras”; referiu as
dificuldades financeiras do “Sovela”; que era a testemunha Pimentel, articulado com os
funcionários camarários, quem tratava dos assuntos relacionados com a publicidade de
eventos; que a partir de determinada altura verificou que era publicada muito mais
publicidade de eventos da CMF no “Sovela” relativamente a outros jornais (facto que se
prende com uma sugestão da testemunha Pimentel à arguida Fátima de maior
publicação de publicidade dos eventos da CMF ou patrocinados por ela e com o facto
do “Sovela” ser o “órgão oficial da CMF”, isto é, de quem estava no poder, tanto assim
que era na CMF que parte do trabalho para o “Sovela” era feito).
Ora, tudo isto parece tornar credível o facto relatado pela testemunha Pimentel –
de forma pouco linear no julgamento e de forma mais assertiva na instrução – de que
recebeu instruções verbais no sentido da publicação de eventos se fazer no “Sovela” ou
de não se fazer no “Semanário de Felgueiras” (a despeito de despachos de sentido
diverso).
Tendo sido a testemunha Pimentel quem tratava dessa publicidade de eventos, à
partida seria ela quem estaria em melhores condições para, com fundada razão de
ciência, relatar ao Tribunal o que de facto se passou a esse propósito.
Porém, a testemunha Vítor Sousa, na fase de instrução, grosso modo confirmou
o facto alegado na contestação do arguido António Carvalho, de que a testemunha
Pimentel manifestava vaidade pelo cargo que ocupava no “Sovela”.
Não o referiu porém no julgamento (manifestando aliás que presumia que a
testemunha Pimentel tenha exercido esse cargo desagradado), razão pela qual,
confrontado com essas declarações prestadas na instrução, atribuiu-lhes mais
fidedignidade alegando que então tinha a memória mais fresca.
É claro que esta explicação não nos convenceu, já que o facto em causa não se
trata de um simples pormenor ou uma data que facilmente se possa esquecer.
Consequentemente, acerca desse facto, ficou o Tribunal convencido da versão
apresentada por ele na fase de instrução.
Ademais, de algum modo, das declarações prestadas pela mesma testemunha
perante a JIC, a fls 7779, quinto e último parágrafos, emerge que a testemunha Pimentel
teria interesse na visibilidade e rentabilidade do “Sovela” (note-se que ele auferia uma
remuneração, conforme o assegurou o arguido Horácio, e era contitular da conta desse
jornal, a qual estaria a descoberto, segundo o próprio) e que, depois de receber as ordens
escritas do arguido António Pereira, decidia onde eram efectuadas as publicações.
A testemunha Vítor Sousa foi confrontado com essas declarações prestadas na
fase de instrução, vertidas nos quinto e último parágrafos de fls 7779, sendo certo que
nos pareceu estranho que acerca da factualidade em causa a mesma tenha agora alegado
esquecimento para depois reiterar o que aí tinha dito por na altura ter a memória mais
fresca, quando é certo que essas mesmas declarações foram proferidas em Janeiro de
2005 e versaram sobre factos que, a terem ocorrido, não poderiam ter sido esquecidos.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em todo o caso, parecem ser assim mais fidedignas as declações prestadas na


fase de instrução.
Essa versão dos factos, de alguma forma, vai de encontro à versão plasmada na
contestação do arguido António de que foi a testemunha Pimentel quem, por auto-
recriação, desrespeitando despachos escritos, decidiu apenas fazer a publicação de
vários eventos no “Sovela”.
Ora, tendo presente o contexto que acima já assinalámos e a ser verídica a
existência de ordens verbais no sentido de beneficiar o “Sovela”, esperaria o Tribunal
encontrar inúmeras situações donde se possa retirar de forma inquívoca esse alegado
benefício.
Porém, as ordens escritas, quer da arguida Fátima quer do arguido António
(referenciadas aliás por este na sua contestação), grosso modo, não inculcam qualquer
ideia de benefício, pois por via de regra orientam-se ou no sentido da publicação ser
efectuada tendo em conta o preço mais baixo ou orientam-se no sentido da publicação
ser efectuada em todos os jornais locais.
Ademais, a terem existido as ditas ordens verbais (que em todo o caso
contrariam os ditos despachos escritos), o certo em que as situações em que a
publicação no “Sovela” saiu mais cara é perfeitamente residual (daí que, ao contrário do
que resulta do relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A, a desporporção do volume de
facturação relativamente à publicação de publicidade a favor do “Sovela” em
detrimento dos outros jornais, grosso modo, parece estar justificada), o que não parece
compatível com uma intenção sistemática de, ao longo dos anos (de 1998 a Fevereiro de
2003), se ter procurado beneficiar o “Sovela” para o salvar da banca rota, quando é
certo que a expressão do benefício económico é irrisória.
Conforme se disse, em face dos despachos escritos, alguns dos quais
referenciados no relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A, verifica-se que essas
instruções verbais - a terem existido de facto - contrariavam alguns desses despachos,
pelo que, a dar-se crédito à versão apresentada pela dita testemunha Pimentel, concluir-
se-ia que aqueles despachos teriam servido para dissimular o dito benefício do jornal “O
Sovela”.
Por outro lado, não nos parece plausível que o dito Pimentel, com vínculo
precário na CMF, com ou sem interesse na rentabilidade do “Sovela”, se atravesse a
contrariar as instruções que recebia, pelo que, se procedeu de modo diverso em relação
a despachos escritos, é porque teria recebido instruções verbais de sinal contrário por
quem tinha autoridade para o fazer, designadamente da arguida Fátima (mas a
testemunha Pimentel referiu que dela nunca recebeu tais ordens verbais, fazendo alguma
espécie que as tenha recebido do arguido António, a terceira figura da câmara).
Seja como for, a dimensão do benefício não é aquela que está plasmada na
pronúncia, pois na esmagadora maioria dos casos a opção pelo “Sovela” mostra-se
justificada (designadamente no que se refere à publicidade institucional e a alguma
publicidade de eventos), sendo certo que a testemunha Pimentel apenas se ocupava da
publicidade de eventos, a qual era residual em relação ao total da publicidade mandada
publicar pela CMF.
Já as testemunhas Henrique Correia, Carlos Alves, Luís Maia, Silvino Perdigão,
António Pêga e Vítor Pinto, grosso modo, não adiantaram qualquer outro dado que não
se possa extrair dos relatórios acima referenciados.
De resto, parte da factualidade alegada pelo arguido António Carvalho na sua
contestação emerge do relatório de fls 3 e ss. do apenso 139-A (cfr., designadamente, a
matéria alegada nos artgs 16º, 26º, 27º, 28º, 30º, 31º, 33º, 35º, 37º, 38º, 39º, 42º - 2ª
parte -, 43º, 44º e 45º).

598
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em face destes elementos, que decidir?


Como é bom de ver, aqui chegados, em síntese, encontra-se o Tribunal numa
encruzilhada de elementos de prova testemunhal e documental que apontam em sentido
diverso:
- existem algumas situações (assinaladas no relatório de fls 3 e ss. do apenso
139-A), em que a publicação de eventos no “Sovela” saiu mais cara (mas sendo esta
residual, não se compadece com uma intenção persistente de benefício do “Sovela” para
o salvar da crise financeira em que se encontrava mergulhado, pois a expressão
económica do benefício é irrisória);
- os despachos escritos, grosso modo, não evidênciam tal intenção;
- e desproporção em termos de publicação de publicidade no “Sovela” em
relação aos demais jornais locais encontra-se quase sempre justificada, porquanto a
respectiva publicação saiu mais barata, ou, salvo situações pontuais, não temos
elementos para afirmar o inverso;
- o “Semanário de Felgueiras” era visto com animosidade pela arguida Fátima,
pois era conotado com o PSD e com o principal opositor político daquela (a testemunha
Manuel Faria);
- o “Sovela”, mergulhado em crise financeira, era propriedade da ADEC,
constituida sobretudo por elementos ligados ao PS local, associação que na prática era
dirigida pela arguida Fátima;
- “O Sovela” era como que a “voz oficial” da arguida Fátima e do PS local;
- a testemunha Pimentel transmitiu ao Tribunal ter recebido instruções verbais
do arguido António no sentido beneficiar o “Sovela” em termos de publicitação de
eventos, ordens essas que, segundo está convencido, provinham da arguida Fátima (o
que se coaduna com a sua personalidade centralizadora);
- objectivamente, tal testemunha, na sua acção, terá contrariado despachos
escritos;
- Não parece verosímel que o tivesse feito por auto-recriação, ainda que
reflexamente tivesse interesse nisso;
- o depoimento que a testemunha Pimentel proferiu na audiência de julgamento
não foi nada linear, parecendo-nos incomodado com o assunto em causa; e
- causa alguma espécie que tenha sido o arguido António – segundo a
testemunha Pimentel – a transmitir-lhe aquelas orientações verbais de benefício do
“Sovela”, orientações essas provindas da arguida Fátima, quando é certo que a mesma
testemunha reunia com esta a propósito de questões editoriais ligadas ao “Sovela” e de
questões que se prendiam com o Gabinete de Imprensa da CMF mas, não obstante,
ainda segundo a mesma testemunha, nunca recebeu tal tipo de instruções directamente
dela.
Em face destes elementos, parmenecerá sempre a dúvida se, de facto, a arguida
Fátima proferiu alguma instrução verbal no sentido de (pontualmente) beneficiar o
“Sovela” em termos de publicação de publicidade de eventos e que as mesmas tenham
sido transmitidas à testemunha Pimentel pelo arguido António.
Consequentemente, não conseguindo em consciência o Tribunal ultrapassar essa
dúvida – que nos parece razoável -, dever-se-á aplicar o princípio in dubio pro reo.
Em todo o caso, pelas razões expostas, também não se demonstrou a matéria de
facto alegada pelo arguido António Pereira Mesquita de Carvalho na sua contestação
nos artigos 10º, 11º (parte final), 15º, 19º, 46º, 47º (na parte em que se refere que a
testemunha Pimentel desobedeceu a instruções), 48º, 49º (no sentido de que a
desconformidade entre as instruções escritas e a publicação dos eventos em causa pela

599
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

testemunha Pimentel se tenha devido à razão alegada), 53º, 54º e 55º, bem como a
matéria alegada pela arguida Fátima Felgueiras na sua contestação nos artgs 72º e 73º.

- A convicção do Tribunal a propósito do 7º capítulo da pronúncia

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Referiu que a CMF só tinha uma viatura para as deslocações da presidente, dos
vereadores e dos directores de departamento.
Consequentemente, inexistia uma viatura apenas adstrita à presidente da CMF,
sendo certo que muitas vezes usou a sua viatura particular.
Referiu que a CMF chegou a possuir uma viatura “Volvo”, a qual sofreu um
acidente, tendo sido considerada a sua perda total, razão pela qual a Cª de Seguros
respectiva pagou os salvados.
O arguido Júlio Faria, enquanto era presidente da edilidade, também dispunha de
um telefone móvel na sua viatura particular, equipamento que passou para a viatura
particular da depoente, um “Citroën BX”, quando ele foi eleito deputado na Assembleia
da República.
Entretanto, esse equipamento foi substituído por outro telefone móvel que estava
instalado na viatura “Volvo” referida, depois de ter sido acidentada e de ter ido para a
sucata.
Quando a sua viatura particular “Citroën” foi vendida, esse equipamento foi
retirado e ficou na posse da CMF, que nunca mais o usou por estar obsuleto e sem
qualquer utilidade.
Recorda-se que vendeu o seu automóvel à testemunha Fernando Pereira
Sampaio, por montante que não se recorda.
Foi o arguido Horácio Costa quem intermediou o negócio, sendo certo que ele
não a alertou para o facto do equipamento ali se encontrar instalado e de que era
necessário retirá-lo, tendo sido a depoente quem deu ordens nesse sentido, tanto mais
que ele ignorava que aquele equipamento pertencia à CMF.
Não se recorda ainda em que data o vendeu, mas assegurou que o equipamento
em causa foi retirado da viatura antes de ter sido entregue e não na sequência das
notícias que vieram a lume a propósito desse facto.
Assim, a sua viatura foi vendida sem esse equipamento, o qual já na altura
estava inutilizado (cfr. o teor de fls 5918, do 24º volume, que aparentemente diz
respeito à entrega desse equipamento na CMF).
Confrontada com o facto de na factura emitida pela empresa que instalou o
referido equipamento na sua viatura constar que o mesmo foi instalado numa viatura da
marca “Peugeot” da CMF, referiu ignorar (cfr. doc. de fls 5844 e ss., do 23º volume),
referindo que se limitou a dar ordens no sentido daquele equipamento ser instalado na
sua viatura particular, uma vez que a usava em deslocações ao serviço da CMF e dado
que a edilidade apenas dispunha de uma viatura que nem sempre estava disponível, pois
também era usada pelos vereadores e directores de departamento.
Esclareceu que só haviam três telefones móveis, um o equipamento em causa
nos autos e os outros dois instalados respectivamente na viatura do chefe dos Serviços
Operativos e outro na viatura da Polícia Municipal.

- Arguido Horácio Costa


Quando ingressou na CMF tem a ideia de que já existia a viatura “Volvo 470”.

600
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Quando a arguida Fátima Felgueiras entendeu adquirir a viatura “Audi A4”


incumbiu-o de vender a sua viatura particular “Citroën BX”, a qual estava parqueada no
edifício “Campo da Feira”, num lugar de estacionamento afecto à CMF.
Mediou cerca de 1 mês entre o momento da compra do “Audi A4” e o momento
da venda do “Citroën BX”.
Na tentativa de vender o “Cireoën BX” telefonou para a firma “Filinto Mota”
(concessionária da marca) em Guimarães para obter informação acerca do respectivo
valor. Sem inspeccionar a viatura informaram-no que a mesma deveria ter um valor
comercial de 270.000$00 se estivesse em bom estado de conservação.
Ora Sr. Fernando Sampaio (da Lixa) compra e vende carros usados pelo que
falou com ele, tendo-se então mostrado interessado em adquirir o “Citroën BX”.
Mencionou-lhe que tinha um irmão com poucas posses (que vivia em Celorico de
Basto) e que queria oferecer-lhe a dita viatura. Fez então uma oferta de 400.000$00 pela
compra da viatura.
Informou desse facto a arguida Fátima Felgueiras, a qual aceitou a proposta.
Marcou-se então dia para o comprador ir buscar a viatura.
Recorda-se que na altura perguntou à arguida Fátima Felgueiras se o rádio era
também para ir com a viatura.
Constatou-se então – quando o comprador veio buscar a viatura – que esta não
pegava porque a bateria estava em baixo. Assim, elementos da “Garagem Aniceto”
puseram os respectivos cabos e colocaram o carro em funcionamento, o qual foi levado
para a parte da frente da CMF.
O Sr. Fernando Sampaio emitiu então o cheque de 400.000$00.
Ao final da tarde (estava ali quer o filho da arguida Fátima quer o Sr. Silva) foi
retirado o material que se encontrava dentro da viatura.
Apercebeu-se então da existência de um equipamento antigo de telemóvel (não
reparou na marca) e ficou na dúvida acerca da identidade do respectivo proprietário.
Falou por isso à arguida Fátima Felgueiras (que contactou por telemóvel e na presença
do dito Sampaio) e ela disse-lhe que o equipamento em causa era antigo e já em desuso,
pelo que o deveria deixar ir com a viatura.
Comunicou então ao Sr. Fernando Sampaio esse facto. Entretanto, o filho da
arguida Fátima retirou do equipamento os respectivos auscultadores, mas o Sr.
Fernando Sampaio não se importou com esse facto.
Entretanto o Dr. Sousa Oliveira telefonou-lhe zangado pois entendia que a
viatura valia 500.000$00, ao que o depoente contrapôs que a viatura tinha sido avaliada
em 270.000$00 e que foi a arguida Fátima quem a decidiu vender por 400.000$00.
O dito Fernando Sampaio levou então a viatura dali e informou-o que a iria polir
numa oficina.
Só mais tarde é que lhe disseram que o depoente tinha vendido a viatura da Srª
Presidente com o telemóvel da CMF.
Na semana seguinte o dito Sampaio referiu-lhe que o Dr. Sousa Oliveira
procurou junto dele obter o pagamento de mais 100.000$00 pela compra da viatura.
A testemunha Sousa Oliveira, aliás, recebeu 200.000$00, referente a metade do
preço de venda da viatura “BX” (através de um cheque da conta do BES que foi
entregue pelo depoente à testemunha David Queirós, o qual posteriormente terá
entregue a quantia correspondente ao dito Sousa Oliveira).
Ignora se alguma vez esse equipamento foi ou não devolvido à CMF pois tal
nunca lhe foi dado a conhecer, sendo certo que entende que seria natural que nesse caso
o equipamento em causa tivesse sido devolvido através da sua pessoa já que foi o

601
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

depoente quem intermediou o negócio da compra e venda da viatura “Citroën BX”


referida.

- Testemunha José Manuel da Cunha Fonseca


Referiu ser o sócio-gerente da firma “Electro-auto da Gandara, Ldª”, cujo
objecto social é o da reparação eléctrica em automóveis.
A sua empresa montava também telefones nas viaturas.
Confirmou que a sua empresa prestou serviços para a CMF.
Recorda-se que foi instalado um telefone da marca “Ziemens” numa viatura
“Volvo” da CMF.
Fez a montagem de telemóveis em outras viaturas camarárias mas cujas marcas
e modelos não se recorda.
Não tem a ideia de ter montado idêntico equipamento num “Citroën BX”,
pertença da arguida Fátima, só se esse serviço tivesse sido efectuado por um dos seus
funcionários e não se tivesse apercebido desse facto. Aliás, conhecia bem a viatura dela.
Confrontado com os documentos de fls 5948 (factura nº 683, de 31.10.96) e
5949 (guia de remessa nº 1564, de 08.10.96), confirmou que foram emitidos pela sua
firma.
Trata-se da montagem de um telemóvel numa viatura. Foi o encarregado de
serviço da CMF quem levou a viatura para que nela fosse montado esse equipamento.
Tem a vaga ideia de que essa montagem foi efectuada numa viatura de serviço mas não
tem a certeza. Não tem a ideia desse equipamento em concreto ter sido montado no
aludido veículo “Citroën BX” da arguida Fátima Felgueiras (mas não descarta essa
possibilidade).
Já em sede de reinquirição, quando confrontado com as fotos do “BX”,
constantes de fls 5957 a 5962 (que à testemunha pareceu serem alusivas à viatura “BX”
que pertenceu à arguida Fátima), constatou-se que das mesmas se percebe que nessa
viatura havia sido instalado um telemóvel (designadamente, a foto de fls 5959 mostra o
suporte do telemóvel).
Referiu que José Maria Ribeiro da Silva Rocha é funcionário da sua firma e que
após ter sido inquirido neste julgamento a primeira vez perguntou-lhe o que na verdade
se passou e ele deu-lhe a entender que o “BX” esteve na sua firma, mas que não se
recorda desse facto.

- Testemunha José Maria Mendes de Castro


Referiu ter sido funcionário da CMF (encarregado do parque de viaturas),
encontrando-se aposentado há cerca de 11 anos.
Ao que lhe parece, a arguida Fátima Felgueiras era proprietária de um “Citroën
BX”, sendo certo que a CMF dispunha de uma viatura oficial da marca “Volvo”.
Mais tarde, deu-se a perda total dessa viatura “Volvo”, por força de um acidente
de viacção, numa altura em que o depoente ainda não se tinha aposentado. A dita
viatura dispunha de um telemóvel, propriedade da CMF, objecto que foi retirado do
“Volvo” e, segundo instruções do depoente, foi encaminhado para o armazém da CMF,
onde deu entrada.
Pese embora não tenha a certeza desse facto, pensa que esse telemóvel foi
entretanto montado no “BX”.
Não se recorda de quem procedeu à operação de montagem do telemóvel na
viatura da arguida Fátima Felgueiras, mas tem a ideia que foi a firma “Electro-
Gandara”, cujo dono é a testemunha José Manuel Fonseca. Não sabe se essa operação
ficou a constar de algum documento (designadamente uma factura). Referiu igualmente

602
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

não saber se essa operação ficou registada num documento, onde consta falsamente que
o telemóvel foi montado noutra viatura.
*
A propósito das declarações da testemunha José Maria Mendes de Castro referiu
a arguida Fátima Felgueiras que ele foi funcionário da CMF e aposentou-se pouco
antes da depoente assumir a presidência da CMF, tendo também exercido as funções de
motorista.
Nunca tratou com ele de qualquer assunto relacionado com a matéria sobre a
qual versou a sua inquirição, estranhando por isso que ele tenha algum conhecimento de
causa acerca da mesma.
*
Entretando, a testemunha José Maria Mendes de Castro foi confrontada com
os documentos de fls 5948 (factura de instalação de um telemóvel numa carrinha da
CMF, da marca “Pegeot”, matrícula NO-55-23) e 5949 (guia de remessa), confirmando
apenas que a CMF era proprietária de uma carrinha com essa matrícula, não garantindo
que em tal viatura alguma vez tenha instalado um telemóvel, mas tem a ideia desse
facto.
Explicou que recolhia as facturas de quem reparava as viaturas camarárias e que
confirmava se o serviço havia sido de facto efectuado de acordo com essas facturas.
Assim, verificava tais documentos, visava-os e entregava-os ao Eng. Leite, de
quem recebia ordens.
Constatou-se que não visou o documento de fls 5948 e 5949, a propósito do que
referiu não saber se à data ainda era funcionário da CMF (isto é, em Outubro de 1996).

- Testemunha José Maria Ribeiro da Silva Rocha


Referiu ser electricista de automóveis, sendo funcionário da firma “Electro-Auto
da Gandara” há cerca de 22 anos.
Essa firma dedica-se a tudo o que é ligado à parte eléctrica dos automóveis.
Confirmou que montava telemóveis em viaturas e que a CMF era cliente dessa
firma.
Conheceu o “BX” referido nos autos, então propriedade da arguida Fátima
Felgueiras, pois via essa viatura frequentemente por passar em frente à oficina da sua
entidade patronal.
Não se recorda dessa viatura alguma vez ter estado nas instalações da “Electro-
Auto da Gandara”, mas é possível que tenha estado. Atribui a falta de memória ao facto
de lhe terem passado pelas mãos muitas viaturas.
Confirmou que depois do seu patrão ter sido ouvido neste julgamento (a
testemunha José Manuel da Cunha Fonseca) conversaram sobre o assunto em causa,
tendo-lhe ele perguntado se se recordava do “BX” ter estado na oficina, ao que lhe
respondeu o mesmo que já referiu ao tribunal: é possível, mas não se lembra.
*
Porquanto se entendeu ter existido contradição entre o depoimento das
testemunhas José Maria Ribeiro da Silva Rocha e José Manuel da Cunha Fonseca
acerca do teor da resposta que este obteve daquele em conversa ocorrida após a
inquirição desta última testemunha, procedeu-se à respectiva acareação, da qual
resultou que a testemunha José Maria Ribeiro da Silva Rocha acabou por confirmar que
a viatura “BX” referida nos autos de facto esteve na oficina da “Electro-Auto da
Gandara, Ldª”, não sabendo porém em que ano e não se recordando por que motivo ali
se encontrava.

603
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Confrontado com as fotos de fls 5957 e ss., confirmou tratar-se da viatura em


causa, tendo constatado que a viatura em causa tinha um suporte de telemóvel (cfr. fotos
de fls 5960 a 5962).
Referiu que em 1996 montavam telemóveis em viaturas, sendo certo que os
respectivos suportes eram semelhantes ao que é mostrado nas fotografias referidas.
Não sabe se o suporte que as fotografias mostram se reporta à marca “AEG”,
sendo certo que a sua entidade patronal vendia esse tipo de equipamento mas da marca
“Ziemens”.
Referiu lembrar-se de ter procedido à transferência de um telemóvel de uma
viatura para outra, mas não identificou quais as viaturas em causa por falta de
lembrança.
Por sua vez, a testemunha José Manuel da Cunha Fonseca referiu que o seu
funcionário lhe disse que o “BX” tinha de facto estado na oficina, mas que não se
recordava qual o motivo (nenhum outro funcionário da sua firma referiu ter visto o
“BX” na sua oficina).
Reafirmou não se recordar se de facto o “BX” esteve ou não na sua oficina para
se proceder à montagem de um telemóvel.
*
- Testemunha Manuel Ferreira Pinto
Referiu ser funcionário da CMF desde Agosto de 1978, exercendo as funções de
motorista desde 1979/80.
Explicou que a CMF dispunha de um “Volvo 460 Turbo”, com o qual o
depoente teve um acidente a 19.03.96 (“dia do pai”) em Lisboa, o qual determinou a sua
perda total.
Nessa viatura estava instalado um telefone, pensa que da marca “AEG” (a sua
dúvida prende-se com o facto de ter sido trocado o telemóvel várias vezes).
O telemóvel em causa foi retirado dessa viatura, talvez pela “Autosueco”, mas
não se recorda.
Sabe que o “BX” da arguida Fátima também teve um telemóvel, mas não se
recorda se isso sucedeu depois do dito “Volvo” ter sido acidentado.
Admite que o “BX” não dispusesse inicialmente de telemóvel e que o mesmo foi
posteriormente instalado. Não sabe que firma procedeu à respectiva instalação.
A CMF socorria-se da firma “Auto – Gandara” para reparações eléctricas nas
suas viaturas, ou na “Garagem dos Carvalhinhos”, do Sr. Eugénio, já falecido).
Sabe que o “BX” foi vendido ao Sr. Sampaio, da Lixa, pois viu-o entretanto a
conduzir esse veículo, ignorando se o telemóvel que nele estava instalado foi ou não
vendido juntamente com a viatura.
Não estava presente quando essa viatura foi entregue à testemunha Sampaio,
pelo que não sabe quem procedeu à respectiva entrega.
Recorda-se que certo dia o arguido Horácio Costa entrou na CMF com um saco
escuro contendo um telemóvel, que a testemunha Júlio Pereira (do GAPP) mandou ao
depoente entregar nos serviços operativos, o que fez (entregou-o ao Sr. Sousa).
Não sabe que telemóvel era esse, sendo certo que nessa altura já tinha sido
vendido o “BX” (não sabe há quanto tempo).
Para si a arguida Fátima sempre foi dialogante, sendo certo que para os demais
não sabe que postura ela adoptava.
*
A propósito destas declarações, reiterou o arguido Horácio Costa que a
testemunha Manuel Pinto assistiu à entrega da viatura “BX” à testemunha Sampaio, até
porque, conforme já explicou, aquela viatura não pegava.

604
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

De facto, quando estacionou o “BX” atrás da CMF, quer o Sr. Pinto quer o João
Felgueiras estavam presentes.
A testemunha Pinto assistiu pois à retirada dos pertences da arguida Fátima
Felgueiras, bem como assistiu o João Felgueiras a retirar o auscultador do telemóvel
nele instalado.
Além disso, negou alguma vez ter entrado na CMF com um saco contendo um
telemóvel portátil.
*
A testemunha Manuel Ferreira Pinto referiu que se recorda de ir com um
mecânico à garagem onde o “BX” estava estacionado para o pôr a trabalhar, mas
reafirmou não ter assistido à entrega dessa viatura à testemunha Sampaio.

- Testemunha Fernando Pereira Sampaio


Confirmou ter adquirido por 400.000$00 a viatura “Citroën BX” da arguida
Fátima Felgueiras, ao que pensa em Setembro de 1998 (corrigiu mais tarde para Julho
desse ano).
Fez o respectivo seguro da viatura em Setembro de 1998.
O arguido Horácio Costa foi quem intermediou o negócio, tendo-lhe dito que a
arguida Fátima já tinha adquirido um “Audi A4”.
Aliás, recorda-se que certo dia (de Setembro de 1998, ou melhor em Julho, em
face da correcção que fez quanto ao mês em que adquiriu o “BX”) perguntou ao arguido
Horácio pela arguida Fátima, partindo do pressuposto que ela não estaria na CMF por
não visto à porta do edifício camarário o “BX” (que bem conhecia), tendo sido nessa
altura que o arguido Horácio lhe referiu que ela estava na CMF e que tinha um “Audi
A4” novo, tendo perguntado ao depoente se não estaria interessado em adquirir o “BX”,
negócio em que se mostrou interessado, manifestando a intenção de inspeccionar a
viatura, o que sucedeu de imediato.
Essa viatura encontrava-se numa garagem. Deram uma volta nessa viatura (o
depoente e o arguido Horácio) e, uma vez imobilizada a viatura, emitiu um cheque de
400 cts, ao portador e sacado sobre uma conta aberta no banco “Fonsecas & Burnay”.
Os bens pessoais da arguida Fátima foram retirados e colocados num saco
plástico.
Na viatura encontrava-se um telefone fixo (da marca “AEG”), mas não sabe se
estava ou não completo. Tal equipamento estava já em desuso. Esse telefone ficou na
viatura.
Acabou por referir que esse equipamento não estava completo e que não foi
retirado o que ali permaneceu na medida em que não dispunham de ferramenta para o
efeito.
Esclareceu que não existia o auscultador do telefone (o kit de apoio do
auscultador permanecia na viatura) e não se recorda se estava ou não completa na mala
do carro a respectiva caixa, pois não prestou atenção a esse facto. Não estavam na
viatura os fios de ligação desse telefone.
Em sede de reinquirição precisou que aquando da entrega dessa viatura foi
retirado o auscultador e a central do telemóvel, tendo permanecido o resto na viatura na
medida em que era necessário usar ferramenta para a retirar (a caixa de suporte da
central, existente na mala, e o suporte do auscultador).
O depoente conhecia esse equipamento na medida em que nas suas viaturas
tinhas dois telemóveis da marca “AEG” iguais ao telemóvel em causa nos autos.
Recorda-se que nessa altura o arguido Horácio ligou à arguida Fátima por causa
do preço de venda da viatura. Nessa altura o depoente ligou à testemunha Sousa

605
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Oliveira (à data era amigo pessoal dele há já 5 anos) a dar-lhe conta do sucedido e ele
mostrou-se surpreendido pelo negócio (tendo-lhe dito que a arguida Fátima não tinha
nada que vender essa viatura), acrescentando que a mesma valia mais 100.000$00.
Demonstrou ainda ignorar que ela tivesse adquirido um “Audi A4”, segundo lhe disse
na altura ao telefone.
Tem a ideia que o arguido Horácio Costa também falou com a arguida Fátima ao
telefone acerca do telemóvel “AEG” (ouviu-o perguntar “e o telefone?”), mas depois
deixou de perceber o que ele dizia.
Aquando da dita aquisição recorda-se de ter aparecido o João (filho da arguida
Fátima e da testemunha Sousa Oliveira) e que inclusive ajudou a retirar os objectos
pessoais da mãe. A este respeito não se recorda de qualquer episódio em particular
(assegurou que não chegou a ver o auscultador do telemóvel). O filho da arguida Fátima
só apareceu quando o negócio já estava concretizado.
Em sede de reinquirição afirmou porém que os objectos retirados foram
colocados num saco plástico, que entregou ao arguido Horácio, o qual estava
acompanhado do filho da arguida Fátima (João Felgueiras), sendo certo que este não
tirou o auscultador da viatura.
Assim, o depoente apenas ficou com o kit de instalação do telemóvel, pois para
o retirar era necessária ferramenta.
Entregou então ao arguido Horácio o cheque de 400 cts por si emitido e foi-se
embora com a viatura “BX”.
O depoente manteve a viatura “BX” até Junho de 2001, altura em que o vendeu
(tinha a intenção de oferecer essa viatura à sua irmã, mas como era muito grande ela não
quis ficar com ele).
Durante esse período o telemóvel (ou melhor, o que restava dele) manteve-se
nessa viatura sem que ninguém lho tivesse pedido. O depoente, nesse período de tempo,
nunca ia à mala dessa viatura.
Chegou a emprestar a viatura “BX” durante uma semana à testemunha Sousa
Oliveira.
*
O arguido Horácio Costa referiu que quando falou à testemunha Sampaio da
possível aquisição da viatura foi em Junho/princípios de Julho de 1998 e não em
Setembro de 1998.
*
A testemunha Fernando Pereira Sampaio referiu então que a data da aquisição
da viatura coincide com a data do cheque que emitiu, sendo certo que o recibo do
seguro é posterior (data de Setembro). Pensa pois que foi em Julho que comprou a
viatura.
*
O arguido Horácio Costa manifestou estar espantado com as declarações
prestadas pela testemunha Fernando Sampaio em sede de reinquirição, reafirmando a
sua versão dos factos no que se refere ao telemóvel que estava instalado na viatura
“BX”.
Acrescentou que na altura em que se prestava para entregar o carro à dita
testemunha telefonou à arguida Fátima e que esta, a propósito do telemóvel em causa,
disse-lhe para o deixar ir na medida em que estava em desuso, tendo dito o mesmo em
relação ao rádio.
Os objectos pessoais retirados do “BX” reportaram-se apenas a uns óculos,
cassetes e material de propaganda.

606
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não sabe se o equipamento exibido na audiência de julgamento era o que estava


instalado no “BX”, mas reconhece que é idêntico.
*
- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia
Aquando da venda do “BX” em 1998 essa viatura terá sido entregue ao
comprador com um telemóvel “AEG”, propriedade da CMF, equipamento esse que
inicialmente teria estado instalado num “Volvo” da CMF, acidentado em 1996 (cfr. a
propósito o contrato cuja cópia se acha junta a fls 5865, celebrado entre a “Autosueco”
de Braga e a CMF, relativa à compra e venda de um “Volvo 460 Turbo” com um
telemóvel equipado com sistemas “mãos livres”).
A cota de fls 5844 retrata uma deslocação da PJ aos serviços operativos da
CMF, tendo concluído que foi a firma “Electro-auto da Gandara” quem fez a colocação
desse equipamento no “BX”, apesar de no respectivo documento de suporte constar que
esse equipamento foi instalado num “Peugeot” da CMF.
O “BX” foi vendido à testemunha Fernando Sampaio, o qual entretanto vendeu
essa viatura a um indivíduo que trabalha em Espanha na construção civil.
Depois da inquirição da testemunha Fernando Sampaio na fase de inquérito, esse
telemóvel terá sido devolvido à CMF.
A PJ fez a reportagem fotográfica ao “BX” e a estrutura onde o telemóvel
encaixava ainda se encontrava na viatura.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A arguida Fátima Felgueiras era proprietária de um “Citroën” (acha que era um
“BX”) antes de adquirir o “Audi A4” referido nos autos.
O depoente nunca viu a viatura “Citroën”, mas dela foram tiradas fotografias
(cfr. fls 5956 a 5961 do 24º volume).
A questão prendia-se com a existência de um telemóvel da marca “AEG”,
propriedade da autarquia, e que havia sido instalado na viatura “Citroën”, equipamento
que terá sido vendido com essa viatura.
Esse telemóvel tinha sido anteriormente instalado num veículo da CMF, ao que
pensa da marca “Volvo”, e que sofreu um acidente (pensa que na altura seria a viatura
usada pela presidente da edilidade nas suas deslocações).
Não se recorda quem adquiriu a viatura “Citroën”, mas a testemunha Fernando
Sampaio foi uma das pessoas contactadas.
As fotografias que referiu revelam que na viatura “Citroën” tinha sido instalado
o dito telemóvel junto à manete das velocidades (cfr. as fotografias tiradas a essa zona
da viatura e à mala).
Tem a ideia que esse telemóvel não foi devolvido à CMF, visto que a PJ,
aquando das investigações, procurou esse equipamento na CMF e não o encontrou.
Viram dois telemóveis semelhantes, mas nenhum deles era o mesmo que tinha sido
instalado no “Citroën” (cfr. a cota de fls 5844 e 5845, a qual se prende com a
deslocação da PJ aos Serviços Operativos da CMF no dia 25.11.2003).
Tem a ideia que entretanto obteve-se informação no sentido de que esse
telemóvel teria regressado à CMF.
Contactaram uma oficina de Felgueiras que supostamente teria instalado esse
equipamento no “Citroën” (“Electro-Auto da Gandara”).
A fls 5846 e ss. constam os documentos referentes à instalação desse
equipamento.

607
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O documento de fls 5867 reporta-se à aquisição do “Volvo 460 Turbo” pela


CMF com esse telemóvel “AEG” (cfr. o respectivo contrato a fls 5865 e ss. e o
orçamento a fls 5870).
A fls 5948 e 5949 consta, respectivamente, uma factura de 31.10.96 e uma guia
de remessa de 08.10.96 da “Electro-Auto da Gandara”, onde se faz referência à
montagem de um telemóvel.

- Testemunha Adelino José Magalhães Leite


O depoente, enquanto chefe da Divisão de Apoio Operativo, tem a
responsabilidade pelas viaturas da CMF (sendo certo que é funcionário da CMF desde
1991).
É o autor da informação de fls 5918.
Trouxe consigo (aquando da sua reinquirição na audiência de julgamento) a
caixa referente a um telemóvel da marca “AEG”, a qual estava armazenado na CMF e
referenciado na informação de fls 5918 (quanto à caixa de suporte do telemóvel, cfr.
cota de fls 5956).
Ora, constatou-se que o suporte que já estava na posse do Tribunal é adequado
ao encaixe da caixa exibida pela testemunha (objecto que também ficou à guarda do
tribunal).
O encaixe referido consta das fotografias de fls 5957 e ss. (fotos alusivas ao
“BX” referido nos autos e ao encaixe desse telemóvel, encaixe esse que se encontrava
afixado na mala da aludida viatura).
A testemunha explicou que, em 1998, quando regressou de férias (que gosa
sempre na segunda quinzena de Agosto), em Setembro, recebeu do GAPP um saco
plástico que continha uma caixa (a central) e o auscultador do telemóvel (com o
respectivo fio de encaixar), objectos que a testemunha referiu ter guardado em
armazém.
Tais objectos foram exibidos na audiência de julgamento e ficaram à guarda do
Tribunal (sendo certo que serão devolvidos a final).
Com as peças que recebeu o telemóvel não funcionava, pois seria necessário ter
recebido o que ficou na viatura (o encaixe que se encontrava na mala e restante
instalação, designadamente o suporte, cuja retirada da viatura custaria dinheiro – cfr. a
factura de fls 5925, no valor de 8.100$00 + IVA, referente à retirada do telemóvel e do
suporte numa viatura).
Referiu que esse equipamento é composto pelo auscultador, pelo seu suporte,
pela caixa e respectivo encaixe (que são instalados na mala da viatura).
Como já naquela altura esse material era obsuleto não iria ter qualquer utilização
por parte da CMF, razão pela qual não se preocupou em reaver o que faltava, sendo
certo que esses objectos não tinham assim qualquer valor comercial. Por esse motivo
esses objectos não foram incluídos no inventário efectuado pela CMF em 2004.
Explicou que normalmente efectua-se uma relação do material obsuleto, os quais
são vendidos para sucata. No que se refere ao telemóvel em causa o depoente não
procedeu desse modo por mera cautela, por causa dos presentes autos.
Explicou ainda que esse telemóvel inicialmente estava instalado num “Volvo”
pertencente à CMF e que sofreu um acidente (de que resultou a perda total dessa
viatura). Consequentemente, esse equipamento foi então instalado na viatura particular
da arguida Fátima Felgueiras (no “Citroën BX”), segundo lhe foi comunicado pelo
GAPP.
Quando essa viatura foi vendida pela arguida Fátima Felgueiras (admite que em
meados de 1998), o GAPP ficou com os objectos exibidos, os quais lhe foram entregues

608
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

em Setembro de 1998 (logo, já depois da venda da viatura é que esses objectos lhe
foram entregues).

- Testemunha José Alves de Sousa Oliveira


Entre 1993 a 1995 o depoente andava muito com o arguido Joaquim Freitas e
depois de 1995 passou a andar mais com a testemunha Fernando Sampaio.
O “Citroën BX” referido nos autos era um bem comum do casal composto pelo
depoente e pela arguida Fátima, bem esse que aliás foi arrolado na relação dos bens
comuns constante da acção de divórcio (dessa relação de bens não consta o loteamento
do Bustelo).
A viatura em causa foi vendida à testemunha Fernando Sampaio em Agosto ou
Setembro de 1998, já depois da aquisição do “Audi A4” referido nos autos (o qual foi
adquirido em fins de Junho de 1998).
O depoente não gostou da forma como essa viatura foi vendida à sua revelia,
pois, segundo lhe disse a testemunha Fernando Sampaio, ele adquiriu-a por 400.000$00,
preço que considera muito inferior ao real valor da viatura (que estava em muito bom
estado) e porque, apesar de à data andar muito com essa testemunha, ele nada lhe disse
acerca desse negócio antes de o concretizar, comportamento que considera desleal e
pouco próprio de uma pessoa que tinha por amiga.
“Faziam o que queriam” da arguida Fátima na medida em que ela nas questões
pessoais era muito desleixada e desinteressada, sendo certo que ela não ligava nem
percebia de automóveis.
Assegurou que aquando da celebração desse negócio a testemunha Fernando
Sampaio não lhe telefonou a dar-lhe conta da respectiva aquisição.
Disse à testemunha Sampaio que a viatura não valia menos de 500.000$00.
Essa testemunha afastou-se do depoente desde a altura que prestou declarações à
PJ no âmbito deste processo.
O depoente não recebeu 200.000$00 provenientes da venda do “BX” (e muito
menos através da testemunha David Queirós, conforme afirmou falsamente o arguido
Horácio Costa).
Lembra-se que teve uma avaria na sua viatura pessoal e a testemunha Fernando
Sampaio ofereceu-lhe o “BX” que havia adquirido para que o depoente se pudesse
deslocar enquanto a sua viatura era reparada. Usou assim a viatura “BX” durante uns
dias. Nessa altura o “BX” não dispunha de qualquer telemóvel, pois só tinha o
respectivo suporte. Lembra-se perfeitamente que não tinha a respectiva caixa na mala da
viatura, mas apenas o respectivo suporte.
Não sabe de que marca era o telemóvel que esteve instalado no “BX”, mas o
depoente teve instalado na viatura “Audi” que lhe furtaram um telemóvel “AEG” que
funcionava da mesma forma.

- Testemunha António Celestino Magalhães da Silva


Em Setembro de 1998 (início do ano judicial) o depoente entrou no “BX”
referido nos autos a convite da testemunha Sousa Oliveira (ambos iam consultar um
processo). Ele andava com essa viatura porquanto tinha tido uma avaria com o seu
“BMW”.
Nessa altura a viatura já havia sido adquirida pela testemunha Fernando
Sampaio e o Dr. Sousa Oliveira pediu-lhe o “BX” emprestado enquanto a sua viatura
“BMW” estava em reparação.
Sabe que a testemunha Sampaio adquiriu o “BX” na medida em que via-o na
Lixa todos os dias (o depoente tem escritório de advogacia na Lixa).

609
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não achou estranho que a testemunha Sampaio tenha emprestado à testemunha


Oliveira essa viatura na medida em que eram muito amigos e aquele tinha várias
viaturas.
Se tivesse visto um telefone instalado no “BX” esse facto chamar-lhe-ia atenção.
Não se recorda mesmo de ter visto qualquer acessório do telefone
(designadamente o auricular ou respectivo suporte).

Análise crítica
A matéria contida nos primeiros três parágrafos de fls 156 do despacho de
pronúncia emerge da cota de fls 5844 e 5845 e dos documentos que se lhe seguem (em
especial os documentos de fls 5865 a 6875, do 23º volume dos autos; cfr. ainda os
documentos de fls 5908 a 5915, 5948 e 5959 do 24º volume dos autos), em conjugação
com o teor dos depoimentos dos inspectores da PJ ouvidos.
Não nos custa acreditar que à data, existindo apenas uma viatura para o serviço
da presidência e da vereação (sobre este ponto a prova testemunhal revelou-se pacífica),
a arguida Fátima tenha usado a sua viatura particular em deslocações de serviço –
conforme referiu - e que tenha sido por esse facto que mandou instalar na sua viatura
particular (“Citroën BX”) o telemóvel “AEG” referido nos autos.
A testemunha Pinto, motorista da CMF, confirmou a perda total do veículo
“Volvo” referenciado, facto que aliás ficou bem marcado na sua memória, tanto mais
que o acidente ocorreu em Lisboa no dia 19.03.96, “dia do pai”, e era essa testemunha
quem o conduzia.
Em face do teor da cota de fls 5844 e 5845, quando a PJ se deslocou aos
Serviços Operativos da CMF, em Novembro de 2003, encontrou o telemóvel da marca
“AEG” referido nos autos, tendo-o aliás identificado.
De acordo com a informação de fls 5978, de 05.01.2004, esse telemóvel estava
desactivado e foi entregue no armazém da CMF por determinação da presidência.
Essa informação foi elaborada pela testemunha Adelino Leite (chefe da Divisão
de Apoio Operativo), o qual exibiu na audiência de julgamento o equipamento em
causa, esclarecendo que o recebeu do GAPP em Setembro de 1998 dentro de um saco
plástico (só o encaixe não lhe foi entregue, encaixe esse que permaneceu na viatura,
conforme se constacta nas fotos de fls 5957 e ss.; cfr. ainda a cota de fls 5955 e 5956).
Pese embora não tenha deposto de uma forma que nos tenha parecido totalmente
isenta, a testemunha Fernando Sampaio, pessoa que em meados de 1998 adquiriu a
viatura “BX” à arguida Fátima, por intermédio do arguido Horácio Costa, referiu que o
telemóvel foi retirado com excepção do encaixe, pois não tinham ferramenta para o
efeito.
Por seu turno, o arguido Horácio Costa assegurou que esse telemóvel não foi
retirado aquando da entrega da viatura (relatando até que o filho da arguida Fátima ficou
com os respectivos auscultadores), facto que foi negado pela arguida Fátima e não foi
confirmado quer pela testemunha Sampaio quer pelo motorista da CMF, Sr. Pinto,
pessoa que, segundo o arguido Horácio, terá presenciado esse facto.
Por outro lado, emerge do depoimento das testemunhas Fernando Sampaio e
Sousa Oliveira que aquele terá emprestado tal viatura a este, em Setembro de 1998, já
depois de concretizado o dito negócio de compra e venda do “BX”, assegurando o ex-
marido da arguida Fátima que nessa altura o automóvel não dispunha daquele telemóvel
“AEG” (quer a parte dos auscultadores que se encontravam na consola central do
tabelier, quer a caixa montada na mala, já que que se encontravam apenas montados os
respectivos suportes), facto confirmado pela testemunha António Celestino Magalhães

610
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

da Silva, a quem o dito Sousa Oliveira terá dado boleia em certa ocasião (depois das
férias judiciais de Verão, em Setembro de 1998).
Os suportes foram aliás retirados pela PJ e encaixam perfeitamente no
equipamento exibido na audiência de julgamento pela testemunha Leite, conforme se
constactou.
Ora, independentemente da credibilidade que nos merecem alguns dos
depoimentos prestados (designadamente os depoimentos prestados pelas testemunhas
Fernando Sampaio e Adelino Leite; pena foi aliás que não tivesssemos tido a
possibilidade – por impedimento legal - de confrontar essas testemunhas com as
declarações que prestaram na fase de inquérito!), no sentido da matéria constante da
pronúncia apenas temos o depoimento do arguido Horácio, o qual porém não é
corroborado por qualquer outro meio de prova no que ao busilis da questão concerne,
sendo certo que, em todo o caso, o equipamento em causa encontra-se na posse da
CMF.
Consequentemente, não se provou que a arguida Fátima se tenha apropriado de
tal equipamento ou que tivesse agido com qualquer intenção apropriativa.

- A convicção do Tribunal a propósito do 8º capítulo da pronúncia

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmou ter-se deslocado a Cabo Verde no contexto e pelas razões expressas
na pronúncia.
Fez-se acompanhar dos seus dois filhos, os quais viajaram incluídos na
delegação camarária (apenas composta por 3 pessoas: a depoente e os seus filhos),
sendo certo que em Agosto todos estavam de férias, razão pela qual ninguém se queria
deslocar a Cabo Verde, além de que a viagem foi organizada apenas com duas ou três
semanas de antecedência.
Aliás, era prática habitual o presidente da autarquia e os vereadores fazerem-se
acompanhar de familiares, tanto mais que os acordos de geminação visam promover o
convívio entre casais (sendo certo que na altura a depoente já se encontrava separada de
facto do seu marido, daí que tenha levado os filhos).
Não se recorda de ter proferido qualquer despacho onde determinava a
composição da delegação do Município de Felgueiras, sendo certo que era prática
habitual, a esse propósito, consultar os vereadores em reunião de câmara.
Esclareceu que viajou em classe económica, apesar de ter direito a viajar em
classe executiva.
Não deu qualquer explicação para o facto de no documento de fls 311 apenas se
referir uma passagem e um alojamento, quando na verdade o montante em causa
reporta-se a três passagens e a alojamento para três pessoas. Nega porém ter ordenado a
emissão daquele documento naqueles termos, não sabendo aliás se é normal a indicação
de uma passagem naqueles termos na factura, apesar de se referir a um grupo de três
pessoas.
Referiu que esteve na ilha do Sal apenas o tempo necessário para a viagem inter
ilhas, situação que é complicada no mês de Agosto devido ao grande tráfego.
Segundo se recorda, esteve um ou dois dias na ilha do Sal, tendo então viajado
para S. Vicente.
No regresso da ilha do Sal para Lisboa ficou retida mais um dia do que o
previsto, segundo tem ideia (não pode porém assegurar que tal se tenha passado nessa
viagem).

611
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assegurou que não contactou o arguido Joaquim Freitas para desbloquear a


viagem de regresso, sendo certo no entanto que foi ele quem sugeriu ao arguido
Bragança a contratação da “Navitur” para organizar a dita viagem.
Assegurou que não fez essa viagem para passar férias (resulta dos bilhetes de
avião que a arguida viajou do Porto para o Sal a 10.08.97 e a 14.08 do Sal para S.
Vicente; a 17.08.97 viajou de S. Vicente para o Sal e no dia seguinte regressou a
Portugal – cfr. fls 313).
Esclareceu que foi o Município do Mindelo (S. Vicente) que fez a reserva no
hotel naquela ilha, tendo inclusive pago a sua estadia.
Tendo sido confrontada com as declarações por si prestadas perante o JIC a fls
3875, esclareceu que na altura não foi confrontada com qualquer documento, tendo-lhe
apenas sido referido que existia nos autos um documento referente a uma passagem,
pelo que partiu do pressuposto que a CMF apenas havia pago a sua passagem, tendo
porém referido na altura que deveriam existir documentos referentes à passagem dos
seus filhos.

- Arguido Joaquim Freitas


A arguida Fátima Felgueiras, no máximo a três semanas de ter viajado com os
filhos para Cabo Verde, disse-lhe que sentia muito cansada e que necessitava de férias,
dando-lhe então conta que iria de férias com os seus filhos para esse país.
Ignora se subjacente a essa viagem estava ou não algum acto oficial. Tem porém
conhecimento que Felgueiras tem um acordo de geminação com uma cidade
caboverdiana (em todo o caso não sabe se essa viagem se realizou para a celebração do
dito acordo de geminação).
Na viagem de regresso existiram dificuldades devido à greve dos funcionários
da TAP. Em face disso o depoente foi contactado pela D. Leonor para se deslocar à
CMF onde recebeu uma chamada de Cabo Verde da arguida Fátima (a hora do contacto
telefónico tinha sido combinada), a qual lhe pediu para procurar um transporte
alternativo. Ligou então para a “Navitur” e conseguiu-lhe um voo de regresso, caso
contrário ela teria de ficar em Cabo Verde com os filhos mais 2 ou 3 dias. Esclarece que
tem facilidade em colocar um passageiro à frente de outro na TAP porque era um
passageiro muito frequente, conhecendo pessoas que trabalham nessa empresa, factos
que a arguida Fátima conhecia, razão pela qual o contactou.
Não se recorda quanto tempo a arguida Fátima Felgueiras e os filhos
permaneceram em Cabo Verde.

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães


Enquanto especialista superior da PJ efectuou o relatório de fls 1503 e ss.
Relativamente à viagem em causa a Cabo Verde apurou que a mesma se realizou
entre os dias 10 e 18.08.97.
A “Navitur” emitiu a factura respectiva a 15.10.97, no montante de 562.003$00,
correspondente à viagem de três pessoas para aquele destino, mais despesas de
alojamento.
A arguida Fátima viajou com os seus dois filhos, conforme emerge dos
documentos de fls 304, 305, 308 (bilhetes da arguida Fátima), 309 (bilhetes da sua filha
Sandra) e 310 dos autos (bilhetes do seu filho João).
O preço de cada bilhete foi de 145.201$00 (Porto/Lisboa/Sal), mais 39.100$00
referente à viagem da ilha do Sal para S. Vicente e regresso ao Sal (num total de
117.300$00), além dos transferes efectuados pela “Mapa Mundo” (9.400$00 no total –
cfr. fls 313).

612
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Resulta dos bilhetes que no dia 18.08.97, pelas 17.00 horas, ocorreu a partida e
que pela 01.00 hora do dia 18.08.97 ocorreu o regresso a Portugal.
No dia 14.08.97, pelas 13 horas, partiram do Sal para São Vicente, tendo
regressado ao Sal a 17.08.97 pelas 9.10 horas.

- Testemunha Alexandra Maria Vinagre Lopes


Referiu ter trabalhado na “Navitur”, em Matosinhos, durante 3 ou 4 anos, tendo
saído dessa empresa em 1999.
Não se recordava de nenhum serviço efectuado pela “Navitur” para a CMF até
ser ouvida pela PJ.
Confrontada com os documentos de fls 308 (passagens aéreas para Cabo Verde
da arguida Fátima), 309 (passagens aéreas para Cabo Verde de Sandra Felgueiras) e 310
(passagens aéreas para Cabo Verde de João Felgueiras), confirmou os respectivos
preços (conforme aliás constam da pronúncia: por cada passageiro - 139.600$00 + taxas
= 145.201$00 + o preço do bilhete do Sal para S. Vicente, no montante de 39.100$00. O
total respeitante aos 3 passageiros é de 552.903$00).
Os bilhetes de avião referidos foram emitidos pela “Navitur”.
Desses documentos retira que a partida estava prevista para o dia 10.08.97 e o
regressso a Portugal a 18.08.97, com a ida do Sal para S. Vicente a 14.08.97 e regresso
ao Sal a 17.08.97.
Não era a depoente quem emitia as facturas, as quais eram feitas manualmente
na altura.
Porém, foi a depoente quem fez a reserva dos bilhetes.
Confrontada com a factura de fls 311, referiu tratar-se de uma factura de
562.303$00, a qual corresponde ao valor de três viagens.
Como nunca fez as facturas na “Navitur” ignora se era normal numa factura
respeitante a três passageiros apenas mencionar-se nela um deles.
Ignora quem, por parte da CMF, fez o contacto com a “Navitur” para a
efectivação da reserva.
Confirmou ter feito o fax de reserva (constante de fls 312) junto do operador
turístico para alojamento de dois adultos e uma criança de 9 anos no Sal por 4 noites e
em Mindelo (S. Vicente) de 14 a 17 de Agosto.
Porém, o alojamento não está incluído no preço, sendo certo que se procurou
fazer a reserva do alojamento, ignorando se foi ou não confirmado.

- Testemunha Álvaro Ferreira Lemos


Referiu ser sócio-gerente da firma “Costa Pereira Lemos, Ldª – Navitur” desde
1982.
Os grandes clientes da “Navitur” são os industriais do calçado (designadamente
nas suas deslocações de negócios).
A “Navitur” fez um serviço para a CMF.
Só quando a PJ foi às instalações da “Navitur” é que tomou conhecimento que a
CMF socorreu-se dos serviços da sua empresa numas viagens a Cabo Verde, efectuada
pela arguida Fátima Felgueiras e pelos seus filhos.
Emitiram os bilhetes (cfr. fls 308 a 310) e uma factura à CMF em Outubro de
1997 (cfr. fls 311).
Ao contrário do que refere a factura, não se tratou de uma passagem mas de três,
facto que atribui a algum engano de quem fez a factura.
Admite que se o cliente tivesse pedido para a emitir dessa forma, tê-lo-iam feito
se fosse a única forma de receber o respectivo pagamento, mas tal situação não é normal

613
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

nem prática habitual na sua agência de viagens. Não tem conhecimento aliás de
qualquer situação do género na sua empresa.
À pergunta efectuada no sentido de saber se a factura seria emitida dessa forma
se se tratasse de uma viagem de grupo, referiu que normalmente na factura referir-se-ia
ao número de pessoas que viajaram e ao respectivo nome.
Explicou que o pagamento do alojamento foi oferecido pelos presidentes das
Câmaras Municipais do Sal e de S. Vicente, daí que só tenham sido pagas as passagens
mais os transferes.
Confrontado com o documento de fls 314, constatou-se que o pagamento foi
efectuado em Março de 1998.
O arguido Joaquim Freitas é seu cliente há muitos anos.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Na denúncia anónima de fls 302 faz-se referência ao facto da arguida Fátima
Felgueiras ter-se deslocado a Cabo Verde levando consigo os seus filhos e cuja despesa
terá sido suportada pela CMF.
Contactaram então a agência de viagens “Navitur”, em Matosinhos, onde
encontraram documentação que foi entregue à PJ voluntariamente.
À data foi a única viagem cujos serviços foram prestados pela “Navitur” à CMF.
Ignora qual a razão subjacente ao facto da CMF ter recorrido àquela agência de
viagens e não à agência de Viagens de “Santa Quitéria”, aquela que normalmente fazia
o serviço para a CMF.
A fls 308 constam duas passagens aéreas em nome da arguida Fátima,
Porto/Lisboa/Sal/Lisboa/Porto (no valor de 139.600$00) e Sal/S. Vicente/Sal (no
montante de 38.300$00).
A viagem foi realizada a propósito de um acordo de geminação entre as cidades
de S. Vicente e Felgueiras.
A fls 309 constam as passagens referentes a Sandra Felgueiras e a fls 310 as
passagens aéreas referentes a João Felgueiras.
A partida ocorreu no dia 10.08, tendo permanecido na ilha de S. Vicente entre os
dias 14 e 17 de Agosto.
O regresso ao Sal ocorreu no dia 17.08 e o regresso do Sal para o Porto no dia
18.08.
Na factura de fls 311, emitida pela “Navitur” à CMF, apenas se faz referência a
uma passagem aérea relativa à arguida Fátima Felgueiras, situação que não é normal já
que se trataram de três passagens relativas a três passageiros distintos. Depreende que a
emissão dessa factura nesses termos se destinou a fazer crer que apenas se tratou de uma
única passagem de uma única pessoa.
Não encontraram na CMF qualquer documento justificativo para o facto dos
filhos da arguida Fátima terem viajado com ela a propósito do referido acordo de
geminação.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se não deve ser referenciado nos
documentos de suporte ao pagamento da respectiva viagem dos familiares, normalmente
chegados, que a título de protocolo acompanham o presidente da autarquia no âmbito de
um acordo de geminação, respondeu que “naturalmente que sim”.
Aliás, nos autos estão discriminados devidamente os elementos de uma comitiva
que se deslocou a França, situação que não sucede neste caso.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves

614
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A “Navitur” entregou voluntariamente a documentação relativa à viagem em


causa a Cabo Verde por parte da arguida Fátima Felgueiras e os seus filhos (pensa que
terá sido o único serviço feito por essa agência de viagens para a CMF).
Essa viagem decorreu no âmbito de um acordo de geminação celebrado entre
Felgueiras e uma cidade de Cabo Verde (Mindelo, na ilha de S. Vicente).
Essa viagem é referenciada na denúncia anónima de fls 302, recebida pela PJ a
20.10.2000.
A fls 308 constam dois bilhetes do Porto/Lisboa/Sal/Porto (viagem que se
processou de 10 a 18 de Agosto) e Sal/S. Vicente/Sal (estadia de 14 a 17 de Agosto)
emitidos em nome da arguida Fátima Felgueiras (145.201$00).
A fls 309 constam dois bilhetes idênticos emitidos em nome de Sandra
Felgueiras.
A fls 310 constam dois bilhetes idênticos emitidos em nome de João Felgueiras.
A fls 311 consta a factura emitida pela “Navitur”, onde apenas refere uma
passagem aérea Porto/Lisboa/Sal/S. Vicente/Sal/Lisboa, com alojamento nas ilhas do
Sal e S. Vicente (incluindo transferes), no montante de 562.303$00. Nesse documento
apenas se faz referência à viagem da arguida Fátima, mas o valor cobrado diz respeito a
três viagens.
A fls 312 consta um fax da “Navitur” a reservar o hotel em Cabo Verde (faz
referência ao alojamento para dois adultos e uma criança de 9 anos).
O documento de fls 313 faz referência ao transfer no Sal da arguida Fátima, pelo
preço de 9.400$00.
Foi a CMF que pagou essas viagens (562.303$00).
Na CMF não tem ideia de ter visto qualquer documento alusivo à viagem dos
filhos da arguida Fátima (só aludiam à viagem desta).
Se eles faziam parte da comitiva que se deslocou a Cabo Verde por causa do
acordo de geminação, não há qualquer razão para essa omissão.
Sendo o Mindelo situado na ilha de S. Vicente, não sabe se existiu alguma razão
para o facto da arguida Fátima Felgueiras e dos seus filhos terem permanecido mais
tempo na ilha do Sal, designadamente se ela participou em algum acto oficial nessa ilha.
Ignora se a “Navitur” tinha um relacionamento previligiado com industriais do
calçado.

- Testemunha Anabela da Saudade Fernandes Gonçalves


É chefe da Divisão da Educação e Acção Social da CMF desde Abril de 2000.
Desde Setembro de 1996 que trabalha na CMF como técnica de relações internacionais.
Trata dos processos de geminação.
Recorda-se da viagem a Cabo Verde no âmbito de um acordo de geminação
entre S. Vicente e Felgueiras, sendo certo que antes disso receberam uma comitiva
provinda de Cabo Verde.
A geminação em causa tinha mais a ver com a cooperação entre municípios. É
por essa razão que havia um grande interesse de Cabo Verde nos acordos de geminação.
Onésimo Silva era o presidente do município de S. Vicente e em 1996 chegou a
vir a Felgueiras.
Foram feitos vários convites para que a arguida Fátima Felgueiras se deslocasse
a Cabo Verde no sentido de assinar o protocolo, mas durante esse ano ela foi sempre
adiando a viagem.
Em Junho procurou-se ver a disponibilidade de voos para Cabo Verde.
Em Cabo Verde queriam que o protocolo fosse assinado na altura do “Festival
da Baía das Gatas”.

615
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A depoente contactou a “Agência de Viagens Stª Quitéria” e verificaram que não


havia voo directo para S. Vicente, pois tinha de se fazer escala na ilha do Sal.
Existia dificuldade em conseguir um voo e em realizar os transferes, pois
tratava-se de um mês de férias e coincidia com o “Festival da Baía das Gatas” na ilha de
S. Vicente.
Contactou outras agências no sentido de conseguir voo para a arguida Fátima
Felgueiras e para os seus dois filhos. Não tem a ideia de ter contactado a “Navitur”.
Antes da depoente ir de férias a 24.07. (a depoente casaria no dia 26.07.97)
deixou a indicação dos voos que estavam disponíveis. Não se recorda a quem deixou
essa indicação, mas deve ter deixado a alguém do GAPP.
Explicou que nessas viagens a propósito dos acordos de geminação era normal
que fossem os familiares. O marido da arguida Fátima não iria na medida em que eles já
não eram casados (porém, à data ainda estavam casados).
Por norma, o município que convida paga o alojamento (no caso, não foi assim o
município de Felgueiras que pagou essa despesa).
Quando o Sr. Onésimo se deslocou a Felgueiras para assinar o protocolo foi a
CMF que pagou o respectivo alojamento, bem como as viagens de Lisboa para
Felgueiras. Não se recorda se ele veio acompanhado.
Por outro lado, era necessária a obtenção de visto para ir para Cabo Verde e os
filhos da arguida Fátima não dispunham desse visto. Contactou então a embaixada de
Cabo Verde em Lisboa no sentido de saber se era possível a obtenção do visto à última
hora visto que a viagem ainda não era certa, tendo obtido disponibilidade nesse sentido
por parte do embaixador de Cabo Verde em Portugal.
Foi assim durante um fim-de-semana que se obteve o necessário visto, tendo
sido por isso aberta a embaixada de Cabo Verde em Lisboa e a arguida Fátima e os
filhos viajado de carro para Lisboa por esse motivo. Tal facto, depois da viagem,
motivou um agradecimento da arguida Fátima.
Foi aliás por isso que eles viajaram para Cabo Verde de Lisboa.
Porém, dos documentos de fls 308, 309 e 310, alusivos aos bilhetes de avião,
respectivamente, da arguida Fátima, da sua filha Sandra e do seu filho João Felgueiras,
resulta que eles terão partido do Porto. Confrontada com esses documentos, referiu que
transmitiu ao tribunal a informação que tinha acerca desse facto.
Entende que a arguida Fátima não aproveitou a viagem para passar umas férias
em Cabo Verde.
Entre a data do casamento da depoente (26.07.97) e a viagem em causa não se
deslocou à CMF. Só soube muito pouco tempo antes dessa viagem que a arguida Fátima
iria viajar com os filhos.
Não se recorda se em 1997 já conhecia o arguido Joaquim Freitas.
Com a depoente ele não tratou de qualquer assunto relacionado com a viagem
em causa.
O regresso ocorreu no dia 17.08.97, sendo certo que a depoente só retornou ao
serviço na CMF dois ou três dias depois.
Não se recorda se eles tiveram problemas com o regresso.
Depois de regressar de férias, a única coisa que a depoente fez relacionada com
essa viagem foi o agradecimento ao embaixador de Cabo Verde, pelas razões que já
mencionou.
Constatou a depoente que o protocolo foi preparado e assinado no ano seguinte à
assinatura do protocolo em Felgueiras.
Não sabe em concreto como é que essa viagem foi paga, pois não teve qualquer
intervenção nessa matéria.

616
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Mário Hermenegildo Moura de Almeida


Quando o depoente esteve na Associação dos Municípios Portugueses o
Governo incentivava os acordos de geminação com cidades dos “PALOPS”.
O Mindelo (de Cabo Verde) já tinha acordos de geminação com várias cidades
portuguesas.
O objectivo das geminações reportava-se à valorização das pessoas, ao
intercâmbio cultural e desportivo.
Na fase da festa (assinatura do protocolo de geminação) os eleitos deslocam-se à
cidade com a qual o acordo de geminação irá ser formalizado, sendo certo que, ao que
sabe, nos termos do DL nº 106/98 (que não está regulamentado), prevê-se que os
familiares possam acompanhá-los. Normalmente os convites são endereçados aos
autarcas e cônjuges.
Julga que o presidente da Câmara tem competência para definir a composição da
comitiva, facto que em pormenor não sabe.
Quem recebia pagava o alojamento e quem se deslocava suportava o custo das
viagens.

- Testemunha Paulo Ramalheira Teixeira


A C.M. de Castelo de Paiva tem acordos de geminação com cidades espanholas.
Antes de Portugal integrar a CEE os Governos incentivavam as geminações com
concelhos de países da CEE.
Quando Portugal integrou a CEE o Governo passou a incentivar as geminações
com os PALOPS.
Nesse âmbito o depoente recebeu comitivas, as quais eram integradas por
familiares.
Recebeu por exemplo um convite para ir a Espanha e levar a sua família, tendo
mostrado o convite em reunião de Câmara.
As viagens ao estrangeiro são discutidas em reuniões de Câmara e obteve a
aprovação unânime para a respectiva viagem.
É a C.M. de Castelo de Paiva que paga a viagem a toda a comitiva que se
desloca ao estrangeiro, sendo certo que na Câmara já se sabe que o depoente pode levar
a sua esposa e filhos, em face do convite que recebeu. Normalmente faz essa
comunicação, ainda que a mesma possa ser posterior à deslocação, na medida em que as
despesas de deslocação são pagas pela edilidade.
É feito um relatório de actividade que é apresentado trimestralmente à
Assembleia Municipal de Castelo de Paiva, onde são incluídas as deslocações
efectuadas e identificam-se os elementos que integraram a respectiva comitiva.
Não vê qualquer problema no facto da arguida Fátima Felgueiras ter-se feito
acompanhar dos filhos em deslocações ao estrangeiro.
*
A arguida Fátima Felgueiras salientou que compete ao presidente de Câmara
tomar decisões no que se refere às geminações.
A legislação que impõe a remessa à assembleia municipal uma informação
acerca da actividade do presidente da Câmara é de 1999, sendo certo que remetia cópia
das actas das reuniões de Câmara ao presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras
(pensa que mesmo antes de 1999). Nas assembleias municipais o presidente da
autarquia tem de estar presente na medida em que poderá ter de prestar esclarecimentos.
Por outro lado, nas reuniões de Câmara, a depoente levava ao conhecimento as
viagens que iria fazer, mas tal informação poderá não constar das respectivas actas.

617
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Cabe ao presidente da edilidade decidir também acerca da composição das


comitivas.
Além disso, as decisões do Executivo são publicadas em edital.
*
- Testemunha José Alves de Sousa Oliveira
O depoente foi presidente da Assembleia Municipal de Felgueiras de 1993 a
1997.
No período que antecede a ordem do dia o presidente da assembleia municipal
dá voz à Câmara acerca das iniciativas da edilidade, entre as quais as geminações.
Era do conhecimento público que as comitivas integravam familiares e foi
público que a sua ex-mulher se fez acompanhar dos seus filhos na viagem em causa.

Análise crítica
A suspeita de que a viagem a Cabo Verde serviu, além do mais, para que a
arguida Fátima e os seus filhos Sandra e João ali se tenham deslocado em férias pagas
pela CMF (cfr. os documentos acima referenciados quanto às passagens aéreas e
transferes, à factura emitida pela “Navitur” e ao pagamento pela CMF, constantes de fls
308 a 310, 311, 312, 313 e 314), resulta, em síntese, para além de uma denúncia
anónima, do facto de na CMF inexistir qualquer documento onde conste a composição
da comitida (ao contrário do que sucede por exemplo com a viagem a França, que mais
à frente irá ser objecto de análise), da arguida Fátima e os seus filhos terem despendido
mais tempo na ilha do Sal do que era suposto (atenta a razão de ser oficial da viagem),
de na factura emitida pela “Navitur” apenas constar o nome da arguida Fátima (não
aludindo à viagem dos seus filhos) e do teor das declarações prestadas pelo arguido
Joaquim Freitas.
Ora, conforme já vimos, as declarações deste último não poderão ser valoradas.
Por outro lado, tendo presente:
- a razão de ser das geminações, sendo certo que neste particular não parecem
existir diferenças assinaláveis entre as geminações com cidades dos países da União
Europeia e dos PALOPS (cfr. depoimentos da arguida Fátima e das testemunhas
Anabela Gonçalves, Mário Hermenegildo Almeida e Paulo Ramalheira Teixeira);
- a circunstância da viagem em causa se inserir num acordo de geminação com
S. Vicente (cfr. os depoimentos da arguida Fátima e da testemunha Anabela);
- de ser habitual as comitivas serem integradas pelos autarcas e cônjuges ou
familiares mais próximos (cfr. os depoimentos da arguida Fátima e das testemunhas
Anabela, Hermenegildo e Ramalheira);
- dessa viagem ter sido marcada à última da hora em plena época de Verão e de
em S. Vicente se celebrar o “Festival da Baía das Gatas”, o que torna complicada a
reserva das viagens e os transferes (razão que poderá explicar o tempo despendido pela
comitiva na ilha do Sal – cfr. o depoimento da arguida Fátima e da testemunha
Anabela);
existem pelo menos dúvidas acerca da matéria constante da pronúncia no que ao
seu núcleo essencial diz respeito, isto é, que a viagem em causa, além do mais, se tratou
de uma viagem de férias suportada pela CMF.
É certo que não se obteve qualquer explicação plausível para que na factura de
fls 311 apenas conste a viagem da arguida Fátima (embora com o valor global das três
viagens e transferes – cfr. o depoimento da testemunha Álvaro Lemos e da arguida
Fátima, no confronto com declarações por si prestadas na fase de instrução a esse
propósito), mas isso não é suficiente para que aquela factualidade se tenha por
demonstrada.

618
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se demonstrou ainda que, segundo o programa inicial, a arguida Fátima


devesse permanecer em S. Vicente entre os dias 10 e 18 de Agosto de 1997, já que esse
facto não se extrai nem da prova testemunhal produzida nem da prova documental
analisada.
Outrossim não se demonstrou a matéria constante dos artgs 86º e 87º da
contestação apresentada pela arguida Fátima Felgueiras, atenta a razão de ser das
suspeitas acima referenciadas.
Seja como for, pareceu-nos plausível, em face da prova testemunhal acima
referenciada, a matéria por ela alegada nos artgs. 80º a 84º da respectiva contestação,
com a precisão de que ela, à data, não era ainda divorciada, mas viveria já separada de
facto da testemunha Sousa Oliveira (cfr., por exemplo, as declarações prestadas por esta
testemunha a respeito da ruptura da sua vida conjugal com a arguida Fátima, sendo
certo que, pelo menos nessa parte, não vislumbramos razões para duvidar da veracidade
do respectivo depoimento).

- A convicção do Tribunal a propósito do 9º capítulo da pronúncia

Introdução

Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
A matéria em causa foi negada pela arguida Fátima Felgueiras.

Análise crítica
Acerca deste ponto da pronúncia, é relevante o relatório de fls 1503 e ss. dos
autos, elaborado pela testemunha Amadeu Magalhães.
No período indicado na parte introdutória a este capítulo, no que toca ao
reembolso de despesas com as viagens, os montantes pagos à arguida Fátima – pode ler-
se no dito relatório – ascendeu a 1.434.767$00.
Todas as viagens realizadas estão justificadas por notas de despesa e a maior
parte delas foi paga através de cartões de crédito ou de débito.
Em muitas delas (30) apenas aparecem os talões de pagamento referentes aos
cartões utilizados, inexistindo qualquer documento comprovativo das viagens
realizadas, não permitindo assim apurar quem de facto terá viajado (supostamente
deveria ser a arguida Fátima).
Ainda segundo o relatório de fls 1503 e ss., elaborado pela testemunha Amadeu
Magalhães, nos anos de 1997 a 1999, o montante global pago à arguida Fátima a título
de ajudas de custo acendeu a 1.220.846$00, sendo certo que em 2000 não lhe foram
pagas quaisquer ajudas de custo.
Ora, chama-se desde já à atenção para o facto de na pronúncia se alegar que no
período compreendido entre 1997 e 2000 a CMF pagou várias despesas à arguida
Fátima, relativas a despesas aéreas efectuadas pela própria ou por seus familiares e que
suportou despesas de alojamento que não eram devidas.
Sucede que, não obstante nos traçar um quadro reiterado de comportamento
daquela índole, o certo é que só estão expressas na mesma peça processual três
situações, tendo sido apenas sobre elas que a prova produzida na audiência de
julgamento incidiu (de facto, outras situações referenciadas no relatório de fls 1503 e ss.
não foram objecto de análise, tanto assim que sobre elas nenhuma questão foi colocada
e nenhum interveniente se pronunciou e sobre elas aliás não e funda o PIC deduzido).

619
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tal bastaria para que a factualidade alegada na parte introdutória se tenha por
confinada àquelas três situações, sendo certo que, alegadamente, duas das mesmas terão
ocorrido em 1997 e outra em 1999, o que, quanto a nós, afasta qualquer ideia de
reiteração bastante para que se tenha por preenchido um dos pressupostos legais do
crime continuado.
Quanto ao mais, remete-se para o que infra se irá expressar.

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a propósito do ponto 1.


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmou a realização da viagem em causa entre os dias 18 e 22 de Agosto de
1999, a qual, segundo explicou, se inseriu numa nova política de acolhimento e
desenvolvimento empresarial, razão pela qual se procedeu a uma visita a uma zona
industrial na Irlanda do Norte (cfr. fls 442, do apenso 9, onde consta o respectivo
boletim de itinerário).
Referiu que a comitiva integrava elementos eleitos e técnicos das câmaras que
integram a AMVS, já que esta associação candidatou-se a fundos comunitários (cfr.
informação de fls 441 do apenso 9, onde estão indicados os elementos que integraram
tal comitiva).
Segundo decisão da AMVS, as câmaras antecipariam as ajudas de custo e, uma
vez recebidos os fundos comunitários, reembolsaria as câmaras dessas despesas.
Nesse contexto, no dia 18.08.99, a depoente recebeu da CMF a quantia de
118.750$00 a título de antecipação de ajudas de custo (442 do apenso 9).
Referiu que a AMVS entretanto aprovou o pagamento da quantia
correspondente a 70% ou 75% do respectivo valor uma vez que a respectiva candidatura
não recebeu a totalidade dos fundos comunitários previstos para as ajudas de custo, o
que perfez o total de 83.125$00 (cfr. fls 3398 dos autos; cfr. a respectiva ordem de
pagamento datada de 10.09.99).
Explicou que recebeu essa quantia através de cheque da AMVS no dia 24.09.99,
cheque esse datado de 29.09.99 e com o nº 33640378, pois só naquela data o Conselho
de Administração da AMVS reuniu (cfr. o documento entregue a esse propósito na 13ª
sessão de julgamento). Segundo explicou, entregou tal cheque à CMF, mas os serviços
devolveram o mesmo à depoente porque a mesma não poderia fazer o respectivo
endosso, sendo certo que os serviços camarários nunca lhe chamaram a atenção para
qualquer duplicação, já que não tinham como saber da mesma.
Uma vez que o cheque referido lhe foi devolvido pelos serviços camarários, a
depoente, segundo referiu, emitiu um cheque pessoal no valor de 83.130$00, em data
que não soube precisar (cfr. a nota de reposição de fls 3474, de 29.09.99).
Não pôs em causa as informações prestadas pela AMVS constantes de fls 3384 e
corrigidas a fls 3667.
Nega terminantemente ter tido qualquer intenção de locuptamento ilícito.

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães


No âmbito da investigação levada a cabo (na sequência da qual produziu o
relatório de fls 1503 e ss.), apurou que a arguida Fátima Felgueiras se deslocou à Irlanda
do Norte (no contexto referido na pronúncia), tendo partido no dia 18.08.99, pelas 8.30
horas, e regressou no dia 22.08.99, pelas 16 horas, segundo o respectivo boletim de
itinerário constante de fls 442 do apenso 9.
Consequentemente, as respectivas ajudas de custo reportaram-se a 5 dias.
A 16.08.99 a arguida Fátima despachou no sentido de deferir o pagamento
antecipado das ajudas de custas (cfr. fls 443 do apenso 9).

620
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Assim, ela recebeu a quantia de 118.750$00 a titulo de antecipação de ajudas de


custo.
Como o alojamento foi suportado pela AMVS pelo menos esta parte foi recebida
indevidamente pela arguida Fátima Felgueiras (35.625$00) – cfr. a informação de fls
3385, corrigida a fls 3667, prestada pela AMVS, donde resulta que, com excepção dos
pequenos-almoços, a AMVS suportou o pagamento do alojamento e das refeições.
A fls 3474 consta uma cópia da guia de reposição a quantia de 83.130$00, valor
que admite poder corresponder às ajudas de custo que a arguida Fátima recebeu da
AMVS (porém não tem conhecimento desse facto). Em todo o caso, a arguida devolveu
o correspondente a 70% das ajudas de custo que recebeu da CMF (admitindo que tal
quantia poderá ser igual à que recebeu da AMVS, facto que na verdade não sabe). Sabe
porém que 30% das ajudas de custo correspondem ao alojamento e 70% a refeições nas
deslocações ao estrangeiro.
Entende porém que falta repor a quantia de 35.625$00 referente ao alojamento,
cujo custo, como referiu, já havia sido suportado pela AMVS (e que corresponde a 30%
das ajudas de custo). Na verdade, inexistia qualquer razão para que ela ficasse com
aquele valor (pois assim não só recebeu esse dinheiro como a prestação em espécie, que
é o alojamento). Resta saber se legalmente ela tinha direito a receber essas ajudas de
custo independentemente de ter suportado ou não a despesa correspondente ao
alojamento.

- Testemunha José Júlio da Silva Pereira


Referiu que os boletins de itinerário eram preenchidos no GAPP, segundo
indicações da arguida Fátima Felgueiras.
Por norma era o depoente quem preenchia os ditos boletins, sendo certo que
excepcionalmente poderiam ser preenchidos pelo arguido Bragança ou pelo funcionário
administrativo.
No que se refere à viagem à Irlanda do Norte, foi na sequência de um convite
endereçado pela AMVS à arguida Fátima que ela participou nessa viagem, juntamente
com o arguido Barbieri Cardoso.
A fls 441 consta um fax remetido pela AMVS com o programa da viagem (que
se realizou de 18.08 a 22.08.99).
Houve uma antecipação do pagamento de ajudas de custo (cfr. fls 6732 e 6744).
O arguido Barbieri Cardoso não lhe pediu para preencher o respectivo boletim
de itinerário. Normalmente o GAPP preenchia a pedido o boletim de itenerário da
arguida Fátima ou de algum vereador e era o GAPP que tomava a iniciativa de
preencher o boletim do acompanhante. Uma vez preenchido, era assinado pela pessoa
respectiva.
Confrontado com o documento de fls 6733 do volume 26-A, constatou ser o
boletim de itinerário do arguido Barbieri Cardoso, constando de fls 6732 a respectiva
ordem de pagamento antecipado dessas ajudas de custo, datada de 16.08.99 (segundo
despacho da arguida Fátima dessa data e constante de fls 3473 do 15º volume).
A fls 442 do apenso 9 consta o beletim de itinerário da arguida Fátima
Felgueiras, que o depoente preencheu por determinação da arguida Fátima e de acordo
com o programa de viagem constante do documento de fls 441 do apenso 9. Esse
boletim tem a data de 16.08.99, pelo que houve antecipação no pagamento de ajudas de
custo.
Foi a AMVS que adiantou as ajudas de custo e o alojamento, com excepção das
despesas de alimentação, segundo deduz das informações por ela prestadas à PJ a fls
3384 e corrigidas a fls 3667.

621
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Em face disso, à primeira vista não lhe parece ser devido o pagamento das
ajudas de custo pela CMF.
Não se recorda se a arguida Fátima devolveu ou não alguma quantia (cfr., em
todo o caso, a guia de reposição de fls 3474, no valor de 83.130$00 em Agosto de
1999).

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


A viagem à Irlanda foi efectuada a propósito de uma visita de estudo no âmbito
da AMVS. Integraram a respectiva comitiva os arguidos Fátima Felgueiras e Barbieri
Cardoso.
Não obstante o alojamento já estar incluído, pela arguida Fátima foram
apresentadas AMVS as despesas na totalidade.
Assim, a AMVS pagou à arguida Fátima o alojamento mais as ajudas de custo
(cfr. as informações prestadas pela AMVS a fls 3384 e corrigidas a fls 3667).
A fls 442 e 443 do apenso 9 consta o boletim de ajudas de custo da arguida
Fátima Felgueiras, de Agosto de 1999 e referente à viagem em causa (entre 18 e
22.08.99).
Através desse documento ela recebeu a totalidade das ajudas de custo no
montante de 118.750$00.
Em Agosto de 1999 a arguida Fátima repôs a quantia de 83.130$00 (cfr. guia de
depósito de fls 3474).
Ela devolveu assim à CMF um valor inferior ao que recebeu da AMVS, tendo
ficado assim indevidamente com a diferença entre o que recebeu (118.750$00) e o que
devolveu (83.130$00).

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A viagem à Irlanda do Norte referida nos autos (que teve lugar de 18 a 22 de
Agosto de 1999) foi promovida pela AMVS.
A fls 441 do apenso 9 consta um fax da AMVS relativo à realização desta
viagem (participantes, datas, local de estadia).
A fls 442 consta o respectivo boletim de itinerário da arguida Fátima (pedido de
pagamento de ajudas de custo à CMF, documento assinado pela dita arguida e datado de
16.08.99. Trata-se portanto de um pedido de antecipação dessas ajudas de custo).
A AMVS, a propósito, prestou as informações de fls 3384 do 14º volume (a
19.11.2002), corrigidas a fls 3667 do 15º volume (a 28.11.2002).
Em face dessas informações, conclui-se que a AMVS suportou o custo das
passagens aéreas e da alimentação dos participantes e à arguida Fátima, enquanto
membro do conselho de administração dessa associação, foram pagas pela AMVS
ajudas de custo deduzidas do valor do alojamento.
A fls 3474 consta uma guia de reposição por parte da arguida Fátima no valor de
83.130$00 (a 29.09.99).
Sustenta que ela recebeu indevidamente a diferença entre o que recebeu e o que
repôs (ela recebeu duas vezes esse valor diferencial, da CMF por antecipação e da
AMVS).
Aliás, o arguido Barbieri Cardoso (que também participou nessa viagem) repôs a
totalidade do que tinha recebido por antecipação da CMF (cfr. a guia de reposição de fls
4026 do 17º volume, no montante de 85.500$00).

Análise crítica

622
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A arguida Fátima Felgueiras confirmou a realização da viagem em causa nos


moldes indicados na pronúncia e explicou a sua razão de ser (cfr. documento de fls 3386
e ss.).
De resto, o respectivo programa consta de fls 441 do apenso 9 e o boletim de
itinerário de fls 442 do mesmo apenso 9 (preenchido pela testemunha José Júlio Pereira,
segundo este referiu, por determinação da arguida Fátima e de acordo com o programa
de viagem constante de fls 441 do apenso 9).
Explicou a mesma arguida a razão de ser da composição da comitiva e que as
câmaras antecipariam as ajudas de custo e, uma vez recebidos os fundos comunitários, a
União Europeia reembolsaria as câmaras dessas despesas.
Estas declarações não suscitam qualquer reserva e a respectiva factualidade
emergiu de forma pacífica da prova testemunhal produzida a esse propósito (porém,
com uma precisão: a AMVS liquidaria directamente aos participantes, os quais, por sua
vez, teriam de repôr esse montante às respectivas câmaras, conforme se deduz dos
boletins de itinerário preenchidos pelos serviços da AMVS e das guias de reposição
juntas aos autos, quer relativa à arguida Fátima quer relativa ao arguido Barbieri).
Segundo o relatório de fls 1503 e ss. (e documentação de suporte), a arguida
Fátima terá recebido ajudas de custo diárias correspondentes a 5 dias de deslocação (cfr.
documentos de fls 442 e 443 do apenso 9).
No documento de fls 442 do apenso 9 é referido que o alojamento seria
liquidado pela “Valsousa” (entidade que organizou a viagem).
Há ainda que ter presente a informação da AMVS, junta a fls 3385 e corrigida a
fls 3667 (cfr. ainda os documentos remetidos com aquela informação).
Dessas informações e documentos resulta que a AMVS suportou o custo das
deslocações (designadamente as passagens aéreas) e o alojamento (pequeno-almoço
incluído), sendo certo que cada participante suportou as respectivas despesas de
alimentação (com excepção do pequeno-almoço) e as despesas de ídole particular (cfr.
documento de fls 3668, igual ao de fls 3472).
Ora, no dia 18.08.99 a arguida Fátima, a título de adiantamento de ajudas de
custo, recebeu da CMF a quantia de 118.750$00, o que corresponde a 23.750$00 diários
e a 100% das ajudas de custo em causa (cfr. documento de fls 442 do apenso 9), sem
contar portanto com o facto das despesas de alojamento terem sido liquidadas pela
AMVS, quando é certo que esta associação havia informado a CMF desse facto através
da missiva de fls 3668, datada de 10.08.99, antes portanto da realização da viagem em
causa e do preenchimento dos boletins de itinerário pela CMF relativos à antecipação de
ajudas de custo a que os arguidos Fátima e Barbieri teriam direito.
A AMVS, por seu turno, com referência à mesma viagem, pagou à arguida
Fátima, também a título de ajudas de custo, a quantia de 83.130$00, já em 29 de
Setembro de 1999, relativo a cerca de 70% do valor correspondente às ajudas de custo
completas, que no caso seriam de 118.750$00, precisamente o valor que recebera a
arguida Fátima da CMF antes da realização da viagem, pois fez o desconto de 30%
correspondente às ajudas de custo referentes às despesas de alojamento, que haviam
sido suportadas pela AMVS (cfr. documento de fls 3398 e os documentos entregues na
13ª sessão de julgamento, juntos a fls 12063 e ss.).
Quanto às circunstâncias em que a arguida Fátima repôs à CMF a quantia de
83.130$00, ela relatou ao Tribunal uma versão completamente diferente da que consta
da pronúncia, sendo certo que sobre essa matéria nenhum outro meio de prova foi
produzido (cfr. as respectivas declarações acima reproduzidas por súmula, bem como os
documentos de fls 12063 e ss.); ora, tendo presente os documentos referenciados, a
explicação dada por ela parece fazer sentido e, nessa medida, é credível.

623
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Entende a testemunha Amadeu Morais, de acordo com o relatório que elaborou e


já referenciado, que a arguida Fátima terá recebido a mais, a título de ajudas de custo,
35.625$00, isto é, 30% do valor adiantado. Tendo presente porém que ela repôs
83.130$00 a 29.09.99 (cfr. documento de fls 3474), precisamente o montante que
recebera da AMVS no mesmo dia, o locuptamento cifra-se em 35.620$00.
Entende tal testemunha que ela, como não teve de suportar as despesas de
alojamento, só teria direito a 70% do valor das ajudas de custo que a CMF lhe adiantara.
A arguida Fátima, por seu turno, pelos vistos, entende de modo diverso,
negando, em todo o caso, qualquer intenção ilícita de locuptamento.
Seja como for, ela não podia deixar de saber que recebera da CMF, a título de
adiantamento, ajudas de custo referentes a 100% do respectivo valor (como se o
alojamento fosse suportado pelos participantes) e que o alojamento foi na verdade
suportado pela AMVS, facto de que já tinha antecipado conhecimento em face do teor
da comunicação da AMVS de fls 3668, remetida antes da realização da viagem e da
antecipação do recebimento de ajudas de custo por banda da CMF, sendo certo que a
testemunha José Pereira (elemento do GAPP), além do mais, preencheu o respectivo
boletim de itinerário segundo instruções dela.
Isto é, ao instruir aquela testemunha quanto ao preenchimento do respectivo
boletim, não podia deixar de saber que não teria de suportar as despesas de alojamento e
que, não obstante, assim receberia as inerentes ajudas de custo (sem se fazer portanto,
como era devido, o desconto de 30% correspondente ao alojamento, pois não teria de o
suportar).
Conclui-se portanto que, conforme bem sabia, ela recebeu ajudas de custo
referentes a uma despesa que não teve de suportar.
Se esse procedimento é ou não lícito, em face do DL. nº 192/95, de 28/07, é
matéria de direito que na altura própria irá ser abordada.

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a propósito do ponto 2.


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmou a composição da comitiva que se deslocou a França no
circunstancialismo descrito na pronúncia (cfr. documento junto na 12ª sessão de
julgamento).
Reafirmou a sua posição quanto aos acordos de geminação.
Confirmou que as despesas foram pagas pela CMF.
Confrontada com o teor da informação constante da cota de fls 3358, referiu que
a Drª Anabela Gonçalves, à data membro da Divisão Sócio-cultural da CMF e, enquanto
tal, a pessoa que preparou a viagem, era a funcionária camarária mais habilitada a
prestar a informação em causa.
Consequentemente, não tendo sido a Drª Fernanda Leal a preparar a viagem, não
tinha de ter conhecimento dos elementos que integravam a comitiva.

- Arguido Horácio Costa


De útil apenas referiu que acha normal que a Drª Fátima Leal desconhecesse a
que título é que o filho da arguida Fátima Felgueiras viajou na medida em que ela por
vezes tinha dificuldade em contactar com esta (cfr. a informação prestada por essa
testemunha e plasmada na cota de fls 3358).
Normalmente quem preparava as viagens era o GAPP, ignorando se o
Departamento Administrativo tinha conhecimento prévio das viagens.

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães

624
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No âmbito da investigação levada a cabo (na sequência da qual produziu o


relatório de fls 1503 e ss.), apurou que em Maio de 1997 viajaram oito pessoas para
Paris (França), entre as quais a arguida Fátima Felgueiras e o seu filho João Felgueiras,
com partida do Porto.
Assim, no dia 16.05.97, pelas 16.35 horas, ocorreu a partida com destino a Paris.
O regresso foi efectuado a 19.05.97, pelas 12.25 horas.
A “Agência de Stª Quitéria” facturou esse serviço à CMF (cfr. factura nº 1302,
no valor de 394.296$00, datada de 14.05.97, cuja cópia se acha a fls 436 do apenso 7;
cfr. ainda o documento de fls 437, do apenso 7, relativo à requisição da dita viagem).
O preço de cada viagem cifrou-se em 49.257$00 (cfr. cópia do bilhete de João
Felgueiras, constante de fls 1549 do 7º volume dos autos).
A ordem de pagamento consta de fls 83 do apenso 10 (ordem de pagamento nº
2288/97, de 10.07.97, no montante de 752.520$00, onde estão incluídos outros serviços
realizados pela mesma agência de viagens para a CMF).

- Testemunha Maria Deolinda Teixeira Costa Magalhães


Embora na verdade fosse funcionária da firma “Autoviação de Landim”, chegou
a trabalhar na “Agência de Viagens Stª Quitéria” durante cerca de 14 anos até 2001.
Essa agência de viagens prestava os seus serviços para a CMF sempre que era
solicitada.
Normalmente era o arguido Bragança ou as testemunhas Júlio Pereira e Gonçalo
quem contactavam a agência (não se recorda de tratar de assuntos de viagens com mais
alguém que não com esses funcionários da CMF).
Esta tinha sempre que pedir os bilhtes a outra agência (agência “S. Gonçalo”, em
Amarante) ou ao operador turístico.
A depoente recebia os pedidos e entregava os bilhetes e a factura na CMF.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


A viagem a Pont Saint-Mexence foi efectuada ao abrigo de um acordo de
geminação entre essa cidade francesa e Felgueiras.
Na comitiva viajou o filho da arguida Fátima Felgueiras, João Felgueiras.
Do documento de fls 3403 a comitiva seria integrada por 7 pessoas.
Porém, em face da informação de fls 3358, prestada pela testemunha Fernanda
Leal, viajaram 8 pessoas, não se tendo apurado a que título o dito filho da arguida
Fátima viajou integrado nessa comitiva (a informação em causa também o não
esclarece). Visto a testemunha Fernanda Leal ser directora do Departamento
Administrativo da CMF entende que ela teria de saber por que razão o João Felgueiras
viajou integrado na comitiva (mas aparentemente não o sabia em face da informação
que prestou).
A fls 1549 consta o bilhete de avião do João Felgueiras, no montante de
49.287$00, verba que foi paga pela CMF (juntamente com outras quantias referentes à
dita viagem) – cfr. a fls 437 do apenso 7 a requisição desse serviço pela CMF à
“Agência de Viagens de Santa Quitéria”; a fls 436 do apenso 7 a factura emitida pela
agência de viagens “Stª Quitéria” à CMF, no valor global de 394.296$00; e a fls 83 do
apenso 10 a respectiva ordem de pagamento emitida pela CMF.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


A viagem a França referida nos autos efectuou-se também no âmbito de um
acordo de geminação.

625
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Verificaram que o filho da arguida Fátima (João Felgueiras) viajou com ela, cujo
custo da viagem foi pago pela CMF.
A restante comitiva era integrada por elementos ligados à CMF.
Solicitaram à CMF a respectiva informação, tendo exarado na cota de fls 3358
as informações então prestadas pela testemunha Fernanda Leal.
Foi a “Agência de Viagens de Santa Quitéria” que organizou a viagem.
A requisição das passagens a 14.05.97 por essa agência consta de fls 437 do
apenso 7.
A factura emitida pela mesma agência reporta-se a 8 viagens Porto/Paris/Porto e
tem o valor global de 394.296$00 – cfr. doc. de fls 436 do apenso 7.
A fls 1549 do 7º volume consta o bilhete de avião respeitante a João Felgueiras
no montante de 49.287$00 (Porto/Paris/Porto, com partida no dia 16.05.97 e regresso no
dia 19.05.97).
A ordem de pagamento dessas viagens consta de fls 83 do apenso 10 (essa
ordem de pagamento tem o valor global de 752520$00, sendo certo que a verba nº 7
reporta-se à factura de fls 436 do apenso 7).

- Testemunha Anabela da Saudade Fernandes Gonçalves


Explicou que havia a necessidade de se aproveitar os programas comunitários
existentes, daí o interesse em contratar alguém pela CMF (no caso a depoente) que
estivesse a par deles e que instruísse os processos de candidatura. Na altura não era
habitual a contratação de um técnico nessa área (a CMF foi a terceira autarquia do país a
fazê-lo).
No que concerne aos acordos de geminação, a nível europeu existia um
programa próprio. Havia o interesse por parte da União Europeia nas geminações para o
reforço dos laços existentes entre as populações dos estados membros.
Desde 1993 que a CMF tinha muitas iniciativas nesta área.
Era a depoente quem tratava do processo administrativo das geminações.
As comitivas geralmente eram compostas por um conjunto de pessoas que
representavam o município, acompanhadas dos respectivos familiares.
A nível europeu existe um programa próprio de geminações de cidade e vilas
que impõe a integração na comitiva de eleitos locais e funcionários camarários, sob
pena da candidatura não ser elegível.
Nas comitivas que receberam em Felgueiras integravam normalmente os eleitos
locais, respectivos cônjuges e outros representantes acompanhados de familiares.
No caso em apreço neste ponto da pronúncia a depoente tratou dos aspectos
burocráticos.
O acto solene de assinatura do protocolo de geminação é um acto público e
normalmente é ligado a um dia festivo do município (no caso de Felgueiras, o dia 13.07,
data em que foi elevada a cidade) e até se convidam membros do Governo.
O João Felgueiras acompanhou a mãe na viagem em causa, tendo prestado essa
informação ao município francês com o qual se iria celebrar o acordo de geminação
(tinha de os informar dos elementos que integravam a comitiva), através de um fax de
28.04.97, onde refere uma comitiva de oito pessoas.
Foi a arguida Fátima quem assinou esse fax e em anexo consta uma lista dos
participantes.
A depoente também integrou essa comitiva.
É normal ficarem alojados em famílias de acolhimento e, por esse facto,
criavam-se amizades.
Explicou que quem fazia a candidatura é que acolhia.

626
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O alojamento ficava a cargo do país de acolhimento.


A CMF pagava as deslocações dos elementos que integravam a comitiva,
recebendo depois uma comparticipação, ao que pensa no montante de 4 cêntimos ao
quilómetro por pessoa.
A depoente exibiu o dossier da CMF acerca dessa viagem, assegurando que a PJ
não lho pediu.
A testemunha Fernanda Castro Leal colocou-lhe questões acerca desse assunto,
designadamente quem integrava a comitiva e transmitiu-lhe essa informação (não se
recorda em que data essa conversa teve lugar, mas foi seguramente já depois de aberto o
inquérito a que estes autos dizem respeito).
Foi então confrontada com a cota de fls 3358, respeitante às informações que a
propósito dessa viagem foram prestadas a 15.11.2002 pela testemunha Fernanda Castro
Leal.
A esse respeito referiu não saber se antes da aludida conversa que teve com ela
esta sabia quem integrava a comitiva. Ela perguntou-lhe o nome das pessoas que
integraram a comitiva. Na comitiva foram casais de acolhimento de jovens estrangeiros
e que pertenciam ao Comité de Geminações de Felgueiras.
Não obstante na informação prestada pela testemunha Fernanda Castro Leal se
referir não saber a que título é que o João Felgueiras viajou integrado na comitiva,
assegurou que nunca poderia ter dito à testemunha Fernanda Castro Leal que
desconhecia a que título é que ele participou nessa viagem, já que ele de facto viajou
enquanto familiar da arguida Fátima Felgueiras.
Coloca a hipótese da testemunha Fernanda Castro Leal não lhe ter colocado essa
questão (isto é, a que título é que o João Felgueiras participou nessa viagem).
Neste caso, foi igualmente a depoente quem tratou dessa viagem com a agência
de viagens.
Porém, era a Divisão Financeira que tratava das comparticipações, ignorando o
montante a que os participantes tinham direito.

- Testemunha Engrácia da Conceição Dias Pereira


Referiu que foi convidada pela CMF para integrar a Comissão de Geminação de
Felgueiras.
Esclareceu que por duas vezes acolheu em sua casa o presidente da Câmara de
Paul Saint Mexence, bem como a respectiva esposa e filha.
Quando a depoente viajou a esse município francês integrada na comitiva, levou
consigo o seu então marido e os seus filhos, tendo ficado hospedada em casa de uma
família.
Explicou que nas geminações existe uma componente familiar importante. São
as famílias que acolhem em suas casas os visitantes.

Análise crítica
Quanto ao espírito que preside à celebração de acordos de geminação e quanto à
composição das respectivas comitivas, remete-se para o que acima já se disse a
propósito do ponto 1 do 9º capítulo da pronúncia (chama-se, em todo o caso, à colacção,
os documentos juntos na 12ª sessão de julgamento, a fls 12036 e ss., bem como a razão
de ser da sua inclusão nos autos, conforme requerimento de fls 12061, requerimento
esse deferido na mesma sessão de julgamento; cfr. ainda o depoimento da testemunha
Engrácia Pereira).

627
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nessa medida, entendemos como boa a explicação dada pela arguida Fátima
Felgueiras para a inclusão do seu filho João na comitiva que se deslocou a Pont-Saint-
Mexence, em França, não obstante o teor da cota de fls 3358 do 14º volume.
Ao que parece, a testemunha Fernanda Leal terá questionado a testemunha
Anabela Gonçalves antes de prestar a informação a que se reporta a cota de fls 3358,
afigurando-se-nos algo estranho que, em face do depoimento da testemunha Anabela, a
testemunha Fernanda Leal não tenha esclarecido a PJ a que título é que o João
Felgueiras viajou integrado na referida comitiva.
De resto, a pessoa que na CMF estaria em melhores condições de explicar a
inclusão do João Felgueiras na comitiva seria a testemunha Anabela Gonçalves e não a
testemunha Fernanda Castro Leal, sendo certo que o nome do filho da arguida Fátima
consta da lista de pessoas que integraram a dita comitiva, lista essa remetida a Pont-
Saint-Mexence, conforme afirmado pela testemunha Anabela e emerge do documento
de fls 14174 e ss.
Sobre a matéria em causa versou ainda o relatório de fls 1503 e ss., elaborado
pela testemunha Amadeu Magalhães.
Foi a “Agência de Viagens de Santa Quitéria” que organizou a viagem em causa
e a requisição das passagens (a 14.05.97) por essa agência consta de fls 437 do apenso
7.
A factura emitida pela mesma agência reporta-se a 8 viagens Porto/Paris/Porto e
tem o valor global de 394.296$00 – cfr. doc. de fls 436 do apenso 7.
A fls 1549 do 7º volume consta o bilhete de avião respeitante a João Felgueiras
no montante de 49.287$00 (Porto/Paris/Porto, com partida no dia 16.05.97 e regresso no
dia 19.05.97).
A ordem de pagamento dessas viagens consta de fls 83 do apenso 10 (essa
ordem de pagamento tem o valor global de 752.520$00, sendo certo que a verba nº 7
reporta-se à factura de fls 436 do apenso 7).
Seja como for, parecendo-nos justificada a inclusão do João Felgueiras na
comitiva que viajou a França, não se vislumbra qualquer locuptamento da arguida
Fátima à custa da CMF.

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a propósito do ponto 3.


- Arguida Fátima Felgueiras
A propósito do facto de terem sido efectuados dois “bordings”, um às 18.05 e
outro às 18.10 (cfr. fls 45 do apenso 9), referiu que deve ter perdido o primeiro voo e
que viajou noutro voo de outra companhia (comprando outro bilhete), pois tinha de
regressar, ou então houve atraso num dos voos e comprou outro bilhete, tendo viajado
noutro voo (daí a quisição de dois bilhetes).
Certo é porém que um dos bilhetes está em nome da arguida (cfr. fls 1650, do 8º
volume) e outro está em nome da filha Sandra (cfr. fls 1651 do 8º volume), sendo certo
que, conforme é do conhecimento geral, o passageiro só viaja se mostrar a respectiva
identificação.
Confirmou que fez o pagamento desses bilhetes no aeroporto com o seu cartão
de crédito (cfr. fls 1652 do 8º volume), daí que a CMF lhe tenha reembolsado o valor
pago pelos dois bilhetes de regresso (cfr. fls 45 do apenso 9 – ordem de pagamento
datada de 17.10.97).
Referiu que não apresentou por lapso um dos bilhetes, sendo certo porém que
essa despesa paga pela CMF apenas diz respeito à sua viagem (embora corresponda ao
valor de dois bilhetes, pelas razões que alegou).

628
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães


No âmbito da investigação levada a cabo (na sequência da qual produziu o
relatório de fls 1503 e ss.), apurou que no dia 15.09.97 foi realizada uma viagem de
avião do Porto para Lisboa, a qual foi paga às 10.44 horas desse dia com o cartão de
crédito nº 4990012004694899, cuja titular é a arguida Fátima Felgueiras, no montante
global de 56.373$00 (cfr. docs de fls 48 do apenso 9, apreendidos na CMF, os quais
estavam anexados à respectiva ordem de pagamento, constante de fls 45 do apenso 9).
De tal montante viria a arguida Fátima a ser reembolsada pela CMF (cfr. a
ordem de pagamento de fls 45 do apenso 9).
Conforme se pode verificar pelo respectivo bilhete, constante de fls 50 do
apenso 9, respeitante à arguida Fátima, no montante de 37.582$00, partiu do Porto com
destino a Lisboa às 11.15 horas do dia 15.09.97 e nesse mesmo dia partiu de Lisboa
com destino ao Porto pelas 18.10 horas. Foi este o bilhete apresentado na CMF e que
justificou o reembolso não só da dita quantia mas de mais 18.791$00, para a qual
inexiste qualquer justificação (cfr. documento de fls 46 do apenso 9, o qual se reporta ao
descritivo da justificação de pagamento).
Sucede porém que na verdade viajaram não só a dita arguida como também a
sua filha Sandra, conforme se pode verificar pela cópia do seu bilhete, constante de fls
1650 dos autos, no montante de 18.791$00, reportado ao dia 15.09.97, pelas 11.15 horas
(viagem Porto/Lisboa). Tal montante corresponde precisamente ao diferencial acima
referido, o qual, somado com a quantia de 37.582$00, prefaz a quantia paga pela
arguida Fátima e da qual viria a ser reembolsada.
O justificativo apresentado para o reembolso reporta-se apenas a uma viagem
Porto/Lisboa/Porto, no montante de 37.582$00, faltando a justificação para o diferencial
de 18.791$00.
Por outro lado, conforme se verifica a fls 48 existem dois cartões de embarque,
correspondentes a dois voos diferentes para o mesmo destino (Lisboa/Porto), um
respeitante às 18.10 horas do dia 15.09.97 e outro respeitante a um voo que partiu às
18.15 horas para o Porto, nesse dia 15.09.97 (cfr. a explicação dada a propósito pela
arguida Fátima Felgueiras, com o qual pretendeu justificar o reembolso também da
quantia de 18.791$00).
Ora, assim o pagamento abarcou duas viagens, uma do Porto para Lisboa e vice-
versa (no montante de 37.582$00), e outra do Porto para Lisboa (no montante de
18.791$00), todas realizadas no mesmo dia, conforme acima referido (segundo a
arguida Fátima o reembolso corresponderá ao valor da viagem Porto/Lisboa/Porto e à
viagem Lisboa/Porto, em face da explicação que deu para a existência de dois cartões de
embarque de Lisboa para o Porto, um às 18.10 horas e outro às 18.15 horas).
Porém, a “Portugália” não identificou o voo a que corresponde o cartão de
embarque constante do canto inferior direito de fls 48 do apenso 9 (cfr. informação de
fls 1597). Essa empresa complementou ainda a informação de fls 1597 a fls 1649,
dando conta da dificuldade em consultar os seus arquivos.
Das informações prestadas pela “Portugália” (cfr. fls 1597 a 1599 e 1648 a
1702) emerge que é possível que hajam mais voos efectuados e que não foram
identificados.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


No ponto em causa trata-se de uma viagm realizada a 15.09.97 do Porto para
Lisboa e regresso no mesmo dia pela arguida Fátima, em que na ida viajaram a arguida
Fátima e a sua filha Sandra Felgueiras (cfr. as respectivas passagens aéreas constantes
de fls 1650 – de Sandra Felgueiras, no valor de 18.791$00, voo da “Portugália” nº 0203

629
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

do Porto para Lisboa - e 1651 – da arguida Fátima, no valor de 37.582$00, referente a


ida e volta Porto/Lisboa/Porto, sendo voo de ida o já referenciado voo 0203 da
“Portugália”).
O “boarding pass” Porto/Lisboa ocorreu às 11.15h. do dia 15.09.97 (cfr. doc. de
fls 48 do apenso 9) e o “boarding pass” de Lisboa/Porto ocorreu às 18.10h. do mesmo
dia, não tendo sido possível determinar qual a companhia aérea a que dizia respeito esse
voo de regresso (cfr. documento de fls 49-A, do apenso 9).
Ainda a fls 49-C do apenso 9 consta um talão de embarque, de Lisboa para o
Porto às 18.15h., num voo da “Portugália”, no dito dia 15.09.97 (referente à arguida
Fátima).
Essa despesa (no valor global de 56.373$00) foi paga através do cartão de
crédito da arguida Fátima Felgueiras (cfr. documento de fls 1652 e o original do talão
respectivo, constante de fls 48 do apenso 9), sendo certo que a arguida Fátima foi
reembolsada dessa quantia pela CMF (cfr. documentos de fls 45 e 46 do apenso 9,
sendo certo que a respectiva ordem de pagamento data de 17.10.97).
A deslocação a Lisboa, segundo a nota de despesas constante de fls 46 do
apenso 9, importou em 77.918$00, onde está incluido o preço das três viagens e duas
refeições, no valor de 4.410$00 (cfr. fls 48 do apenso 9)
A despesa paga com o cartão de crédito da arguida Fátima destinou-se a pagar as
viagens efectuadas nos voos da “Portugália”, pelo que a viagem a que se reporta o
documento de fls 49-A do apenso 9 não foi paga com o dito cartão, sendo certo que a
Sandra Felgueiras viajou num voo da “Portugália” do Porto para Lisboa no dito dia
15.07.97 (assim, essa despesa foi paga pela mãe, a qual dela foi reembolsada
indevidamente pela CMF).
Quanto ao talão de embarque de fls 49-C do apenso 9 (fornecido pela CMF) não
existe qualquer documento que nos diga qual o preço dessa viagem.
Os documentos de suporte ao pagamento dessa despesa pela CMF reportavam-
se à cópia do talão do cartão de crédito da arguida Fátima e aos talões de embarque.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Constatou que a CMF adquiria cadernetas de 10 títulos de viagens (bilhetes de
avião pré-comprados e que depois eram utilizados).
As viagens eram também adquiridas no aeroporto, na “TAP” ou na “Portugália”.
A viagem em causa reporta-se a uma viagem do Porto para Lisboa pela arguida
Fátima e pela sua filha Sandra Felgueiras, tendo apenas aquela regressado ao Porto
nesse mesmo dia.
Os bilhetes em causa foram pagos através de um cartão de débito ou de crédito
(já não pode precisar).
A fls 1650 consta o bilhete de avião emitido pela “Portugália” em nome de
Sandra Felgueiras, referente a uma viagem Porto/Lisboa no dia 15.09.97, às 11.15
horas, pelo preço de 18.791$00.
A fls 1651 consta o bilhete de avião emitido pela “Portugália” em nome da
arguida Fátima Felgueiras, referente a uma viagem Porto/Lisboa/Porto no dia 15.09.97,
com partida às 11.15 horas e regresso às 18.10 horas, pelo preço de 37.582$00.
Confrontado com o documento de fls 48 do apenso 9, constatou que o preço
desses bilhetes foi pago com um cartão de crédito pelo preço global de 56.373$00.
A fls 48 do apenso 9 consta ainda um talão de caixa referente a duas refeições.
Os documentos relativos ao embarque constam de fls 49, 49A, 49B e 49C do
apenso 9.

630
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 49 do apenso 9 consta o canhoto do cartão de embarque de Sandra


Felgueiras, do Porto para Lisboa às 11.15 horas do dia 15.09.97.
A fls 49A do apenso 9 consta o canhoto do cartão de embarque da arguida
Fátima no voo de regresso pelas 15.10 horas do dia 15.09.97.
A 49C consta outro cartão de embarque da arguida Fátima, num voo de Lisboa
para o Porto, realizado no mesmo dia, mas com partida de Lisboa às 18.15 horas.
O pagamento das três viagens com o cartão de crédito só se pode reportar à
viagens Porto/Lisboa de Sandra Felgueiras e à viagem Porto/Lisboa/Porto da arguida
Fátima (com regresso às 18.10 horas), a que se reportam os bilhetes de fls 1650 e 1651,
já que a arguida Fátima, quando pagou essas viagens, às 10.44 horas desse dia 15.09.97,
naturalmente que não iria pagar as duas viagens de regresso em seu nome (tal não faria
sentido), tendo presente a explicação que deu para a existência de duas viagens de
regresso no mesmo dia, uma com partida às 18.10 horas e outra às 18.15 horas.
De resto, na nota de despesa apresentada à CMF, constante de fls 46 do apenso
9, como justificativo, foi apresentado o talão do cartão de crédito de fls 48 do apenso 9,
naquele valor de 56.373$00 (daí que, em face do que referiu, conclua que a viagem de
Sandra Felgueiras tenha sido paga pela CMF).

Análise crítica
A propósito da matéria em causa assume relevância o relatório de fls 1503 e ss.,
bem como o depoimento de quem o elaborou (testemunha Amadeu Magalhães).
Desse documento e da documentação analisada (cfr. documentos de fls 48 e 49
a 49-C do apenso 9, os quais estavam anexados na CMF à ordem de pagamento de fls
45 do mesmo apenso 9; documento de fls 46 do apenso 9; bilhetes de fls 50 do apenso 9
e de fls 1650 dos autos; cfr. ainda as informações prestadas pela “Portugália” a fls 1597
a 1599 e 1648 a 1702), podemos retirar as seguintes conclusões:
- Pelas 10.44 horas do dia 15.09.97 a arguida Fátima liquidou com o seu cartão
de crédito o montante de 56.373$00 (cfr. documento de fls 48 do apenso 9);
- Ela, com esse pagamento, adquiriu um bilhete de avião Porto/Lisboa/Porto,
voo de ida das 11.15 horas do dia 15.09.97, no valor de 37.582$00, emitido em seu
nome (cfr. fls 50 do apenso 98 ou 1650 do 8º volume dos autos), e um bilhete de avião
para o mesmo voo Porto/Lisboa do dia 15.09.97, às 11.15 horas, emitido em nome de
Sandra Felgueiras, no montante de 18.791$00 (cfr. documento de fls 1650 dos autos);
- Naturalmente que, tendo sido feito o pagamento às 10.44 horas do dia
15.09.97, o documento de fls 48 do apenso 9 não se reporta ao pagamento do bilhete
Lisboa/Porto, voo das 18.05 horas, desse mesmo dia 15.09.97, emitido em nome da
arguida Fátima, atenta a explicação dada por ela para a sua aquisição;
- Dos documentos de fls 49-A e 49-C do apenso 9 pode concluir-se que a
arguida Fátima embarcou duas vezes em dois voos distintos (possivelmente de
companhias aéreas diferentes) de Lisboa para o Porto, no referido dia 15.09.97, já que
um embarque teve lugar às 18.10 horas e outro (voo da “Portugália”) às 18.15 horas;
- Consequentemente, ela adquiriu um outro bilhete de avião de Lisboa para o
Porto no mesmo dia, voo no qual terá viajado, não chegando assim a utilizar na
totalidade o bilhete de ida e volta que adquirira na manhã desse dia;
Emerge do acima referido que, como justificativo para a ordem de pagamento de
fls 45 do apenso 9, apenas foram apresentados pela arguida Fátima os documentos de fls
49-A a 49-C do apenso 9, bem como o talão comprovativo do pagamento da
importância da quantia global de 56.373$00 (cfr. fls 48 do apenso 9).
Ora, como com esse talão ela pagou a viagem da filha do Porto para Lisboa
(realizado no mesmo voo em que ela viajou para a capital), concluir-se-ia que a CMF,

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

liquidando esse montante, liquidou o bilhete que ela adquirira para a filha na mesma
ocasião.
Neste sentido apontam os depoimentos dos inspectores da PJ ouvidos e da
testemunha que elaborou o relatório de fls 1503 e ss.
É certo que na CMF não foi apresentado o bilhete de avião respeitante ao voo
Lisboa/Porto adquirido pela arguida Fátima quando regressou ao Porto, pelo que falta a
justificação para o pagamento de uma verba de 18.791$00.
O argumento invocado, segundo nos parece, tem uma natureza meramente
formal, pois não atende ao facto da arguida de facto ter despendido essa verba de
18.791$00 na viagem de regresso, para além do valor referente ao bilhete
Porto/Lisboa/Porto, no montante de 37.582$00.
É claro que arguida Fátima deveria ter também apresentado nos competentes
serviços camarários o comprovativo da aquisição do segundo bilhete relativo à viagem
Lisboa/Porto, com o qual justificaria o reembolso da dita verba de 18.791$00, para além
da verba de 37.582$00 (a qual está plenamente justificada).
Seja como for, ela foi integralmente reembolsada da quantia a que tinha na
verdade direito, isto é, 56.373$00, o que, a nosso ver, salvo melhor opinião, afasta
qualquer intenção de locuptamento.
É aliás por isso que nos parece credível que só por lapso a arguida Fárima não
entregou na CMF, para além dos documentos entregues, o comprovativo da aquisição
da viagem Lisboa/Porto, no valor de 18.791$00.

- A convicção do Tribunal a propósito do 10º capítulo da pronúncia

Introdução

Reprodução por súmula das declarações prestadas a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Começou por confirmar que, de facto, a CMF tinha uma viatura “BMW”
destinada às desloções não só da depoente como de outros elementos da CMF.
Nega alguma vez a ter utilizado para fins particulares.
Ao invés, referiu ter usado muitas vezes a sua viatura particular em deslocações
onde ia tratar de assuntos da edilidade.
Nega ainda ter autorizado ou ordenado a utilização dos meios do GAPP para fins
diferentes daqueles a que estavam adstritos.

Análise crítica
No despacho de pronúncia estão descritas de forma genérica situações de uso
indevido da viatura “BMW” referida nos autos (sendo certo que o uso de uma viatura
camarária pela presidente da edilidade por razões de serviço decorre da lei).
O certo porém é que, a propósito do uso de tal viatura, a prova produzida apenas
versou acerca das duas situações referidas no ponto 10.1. da pronúncia, pelo que,
naturalmente, a matéria dada como provada a propósito do ponto introdutório a este
capítulo reflecte isso mesmo.
Quanto à utilização do GAPP, remete-se para o que infra se dirá.

A utilização, por Fátima Felgueiras, para fins particulares, da viatura adstrita


à Presidência da CMF

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Arguida Fátima Felgueiras


Quanto ao episódio reportado ao dia 05.02.99, referiu que se deslocou a Lisboa
ou com o arguido Júlio Faria ou com o presidente da AMVS (na altura o presidente da
C.M. de Paços de Ferreira) no dia anterior (na viatura de um deles), já que teve uma
audiência num dos ministérios (não soube precisar qual).
Referiu ter regressado a Felgueiras com o arguido Júlio Faria na viatura deste.
Admitiu que o BMW referido transportou a Lisboa o Prof. Edgar, o António
Pereira e a Conceição Rocha, mas sem que a depoente o tivesse permitido ou ordenado
a utilização da viatura camarária para esse efeito.
Explicou que se qualquer vereador se quisesse deslocar naquela viatura podiria
fazê-lo desde que o pedisse ao motorista (Sr. Pinto) e se a viatura estivesse livre, sem
que tal pedido passasse pela depoente.
Confirmou que estava atribuído ao motorista de tal viatura um fundo permanente
destinado a pagar combustível, portagens e estadias (tal fundo estava aliás atribuído
também a outros serviços).
Quanto à deslocação à cerimónia de casamento de um dos filhos do Dr. Pais
Martins, em Lisboa, confirmou tê-la efectuado na viatura camarária referida, já que foi
convidada para esse casamento na qualidade de presidente da autarquia, tendo sido pois
nessa qualidade que se deslocou a tal evento social.
Referiu aliás que foi nessa qualidade ao casamento dos dois filhos do Dr. Pais
Martins, o qual era na altura o presidente do Instituto Superior de Ciências Educativas
de Felgueiras, sendo certo que não era sua amiga pessoal.
Salientou que o respectivo convite foi endereçado à “Srª Presidente da CMF”,
ignorando se ficou ou não registada a entrada desse convite na CMF, pois tratou-se de
correspondência dirigida a si e não a algum serviço (cfr., a propósito, a informação
prestada pela CMF já no decurso da audiência de julgamento).

- Arguido Horácio Costa


Conhecia o “BMW” referido nos autos e estava adstrito ao uso da arguida
Fátima Felgueiras já que os vereadores não o usavam.
Aliás, o depoente, enquanto vereador, nas deslocações oficiais usava um
“Volvo” que a CMF também possuía, conduzido por elementos da Polícia Municipal (o
Sr. Pinto apenas conduzia o “BMW”).
Segundo é do seu conhecimento, os vereadores apenas usavam a viatura
“Volvo” referida.
Quanto à deslocação a Lisboa a propósito do Congresso Nacional do PS (que
teve lugar algures em inícios de 1999) foi a própria Fátima Felgueiras quem o convidou
a deslocar-se ao dito congresso.
O depoente deslocou-se a Lisboa na viatura da firma do arguido Joaquim
Freitas, tendo-os acompanhado o arguido António Bragança.
Jantaram na Mealhada. Recorda-se que a testemunha Edgar Pinto da Silva
telefonou ao arguido Joaquim Freitas e perguntou-lhe onde estavam, o qual informou
que iam a caminho da Mealhada, ao que ele se mostrou aborrecido pelo facto de não
terem dito nada e de já terem passado a Mealhada. O Joaquim Freitas perguntou-lhe
com quem ia e ele respondeu-lhe que ia com o verador Pereira e com a Conceição
Rocha no carro da câmara. A arguida Fátima não se encontrava com eles. O depoente
ficou espantado por estarem a usar uma viatura camarária numa deslocação a uma
iniciativa partidária.
Ficaram hospedados num hotel em Lisboa e cuja reserva havia sido feita pelo
arguido Joaquim Freitas.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nessa cidade viu o Sr. Pinto (motorista da CMF), o qual pernoitou em Lisboa.
Aliás, no processo constam os documentos comprovativos das despesas que ele
efectuou e cujos originais lhe foram entregues por ele. Esses documentos foram
entregues ao depoente porque pagou essas despesas com o dinheiro da “gaveta” (cfr.
documentos de fls 196, 197, 547 e 548).
Explicou que não lhe foram apresentadas despesas relacionadas com portagens
porque a viatura “BMW” tinha “via verde”, cujo pagamento era suportado pela CMF.
O Sr. Pinto dispunha de um fundo de maneio para algumas despesas. Ignora se
fez uso desse fundo nessa viagem a Lisboa.
A arguida Fátima foi também ao dito congresso e nele teve aliás intervenção.
Ignora de que modo ela se deslocou a Lisboa nem alguma vez lhe foi transmitido que
ela se tenha deslocado à capital para qualquer acto oficial relacionado com a CMF, para
além de participar no Congresso Nacional do PS.
Ora, a viatura só pôde ser usada à ida com autorização da arguida Fátima
Felgueiras, até porque certa vez o vereador Edgar Pinto da Silva lhe referiu que,
enquanto responsável pelo pelouro da educação, não tinha autorização da Fátima
Felgueiras para “pregar um prego numa escola” (a testemunha Edgar referiu não se
recordar desse desabafo mas admite tê-lo feito).
A arguida Fátima agia segundo o “quero, posso e mando”.
Quanto à viagem da arguida Fátima ao casamento de um dos filhos do Dr. Pais
Martins referiu ignorar a factualidade em causa.
Em todo o caso, à pergunta efectuada no sentido de se saber se tinha
conhecimento dela alguma vez ter sido convidada para casamentos enquanto presidente
da CMF, respondeu que tem a ideia de que ela chegou a ir ao casamento de um filho de
um presidente de uma Junta de Freguesia, mas acha que o convite foi efectuado a título
pessoal, já que os convites eram dirigidos para a sua residência e não para a CMF (neste
último caso entende que se os convites fossem dirigidos a ela na CMF deveriam estar
arquivados e com um carimbo de entrada aposto pela funcionária Maria Leonor Alves
da Costa). Aliás, até os postais de “Boas Festas” tinham registo de entrada. Porém,
quando as missivas tinham aposta a menção de “particular”, eram apenas distribuídas ao
respectivo destinatário sem qualquer registo de entrada.

- Arguido Joaquim Freitas


O depoente, o arguido Horácio Costa e o arguido Bragança deslocaram-se na sua
viatura ao Congresso nacional do PS, que se realizou em Lisboa, em data que não sabe
precisar.
Por sua vez, a testemunha Edgar Pinto da Silva e o arguido António Pereira,
pelo menos, deslocaram-se ao mesmo congresso na viatura “BMW” da CMF (tem a
ideia de que com eles viajou mais uma pessoa, para além do motorista, mas não se
recorda quem é essa pessoa). Soube desse facto na véspera porque perguntou à
testemunha Edgar Pinto da Silva em que viatura iriam viajar na deslocação a Lisboa e
ele referiu-lhe que iam na referida viatura “BMW”. Não estranhou na medida em que
não era a primeira vez que a viatura em causa era usada nas deslocações a iniciativas
partidárias (por ex., o depoente deslocou-se nessa viatura a Viana do Castelo com a
arguida Fátima a propósito de uma iniciativa do PS).
Essa viatura só foi a Lisboa para que a arguida Fátima se pudesse deslocar
dentro da cidade, designadamente do hotel para o local onde se realizava o dito
congresso e vice-versa. Ignora se nesse fim-de-semana ela teve algum encontro oficial
propósito dos interesses do município de Felgueiras.
A arguida Fátima Felgueiras, por seu turno, viajou com o arguido Júlio Faria.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Recorda-se que pararam na Mealhada para jantar e o arguido Bragança


mostrava-se muito preocupado em saber se o carro tinha ficado fechado ou não visto
que tinha colocado debaixo do tapete (da parte traseira, lado direito) vários maços de
notas, não lhes tendo explicado qual a finalidade do transporte de tal dinheiro.
Na viagem de regresso, algures entre a Mealhada e Antuã, a arguida Fátima
passou para sua viatura. Já em Vila Nova de Gaia ela passou para o “BMW” da CMF.
Normalmente era a arguida Fátima quem utilizava o “BMW” referido. O
respectivo motorista (Sr. Pinto) também estava só ao serviço da arguida Fátima
Felgueiras.
A CMF possuía também um “Volvo” que era usado pelos veradores e quadros
técnicos da CMF.

- Testemunha Edgar Pinto da Silva


Confirmou que em inícios de 1999 se deslocou a Lisboa para participar no
Congresso Nacional do PS.
Foi com o arguido Pereira e com a Srª Conceição Rocha na viatura “BMW”
referida nos autos, conduzida pelo Sr. Pinto, motorista da CMF (o qual só conduzia essa
viatura).
O arguido Joaquim Freitas, por seu turno, levou a sua viatura.
Recorda-se que na véspera ainda não sabia com quem ia, o que só ficou decidido
no dia da partida. Em todo o caso já se sabia que o “BMW” referido iria ser usado para
o transporte a Lisboa.
A arguida Fátima Felgueiras, por sua vez, ausentou-se de véspera para Lisboa
(ignora em que altura do dia e porque razão foi na véspera para a capital).
Usaram essa viatura “BMW”, ao que julga, por indicação do GAPP e de acordo
com ordens da arguida Fátima Felgueiras. Os elementos do GAPP aliás nunca tomariam
uma decisão de utilização dessa viatura à revelia da arguida Fátima Felgueiras. Por
conseguinte, só com autorização dela é que a viatura poderia ser usada para aquele fim.
Partiram de Felgueiras de manhã e estiveram em Lisboa 2 dias (tem a ideia de
ter pernoitado nessa cidade 2 noites, mas não tem a certeza).
Os trabalhos do congresso iniciavam-se por volta das 10.30 horas e terminavam
por volta das 23/zero horas.
Nas deslocações em Lisboa chegaram a usar a dita viatura “BMW”, sempre
conduzida pelo Sr. Pinto (não se recorda se a arguida Fátima Felgueiras os
acompanhava nessas ocasiões).
O depoente, o arguido António e a Srª Conceição Rocha ficaram hospedados no
Hotel Eduardo VII.
No regresso utilizaram a mesma viatura “BMW”.
Julga que a arguida Fátima Felgueiras (que também participou no dito
congresso) regressou na viatura do arguido Júlio Faria, tendo saído da mesma algures na
zona do Porto (o arguido Júlio não ia para Felgueiras), fazendo o resto do percurso até
Felgueiras, ao que julga, na viatura “BMW” referida com o depoente, com o arguido
António e com a Srª Conceição Rocha.
Não era habitual quer os vereadores quer algum militante do PS utilizarem a
viatura “BMW” da CMF nas suas deslocações.
Quando a arguida Fátima se encontrava na CMF ninguém usava essa viatura.
Para além dela isso só poderia suceder quando a arguida Fátima se encontrava ausente.
Em todo o caso, não tem memória de mais alguém ter utilizado essa viatura para além
da arguida Fátima (para além do episódio que relatou), mas admite que tal possa ter
sucedido.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A CMF tinha um veículo “Volvo” que era usado pelos vereadores.

- Testemunha Maria Leonor Alves da Costa


Referiu que por vezes a arguida Fátima Felgueiras recebia convites para eventos
sociais. Muitos desses convites eram feitos pessoalmente e outros eram feitos por
correspondência.
Recorda-se de ter visto o convite remetido pelo Dr. Pais Martins para o
casamento do filho mas não sabe se foi ou não aceite pela arguida Fátima nem sabe se
ela foi ou não a esse evento (não sabe aliás onde esse casamento iria ter lugar). Recorda-
se desse facto na medida em que lhe ligaram do Instituto para confirmar se a arguida
Fátima iria ou não aceitar o convite e por esse facto interpelou-a, a qual lhe respondeu
que depois veria.
Não se lembra em que data tal convite foi remetido.
Não se recorda igualmente de nenhum outro convite de idêntica natureza
remetido pelo Dr. Pais Martins.
Esclareceu que o Dr. Pais Martins era o responsável pelo Instituto de Ciências
Educativas e que entre ele e a arguida Fátima existia um relacionamento institucional.
Não sabe em todo o caso se eram amigos.

- Testemunha Manuel Ferreira Pinto


Referiu ser funcionário da CMF desde Agosto de 1978, exercendo as funções de
motorista desde 1979/80 (ainda no tempo em que era presidente da autarquia o Dr.
Machado Matos).
No tempo em que era presidente da CMF o arguido Júlio Faria, para além de ser
o motorista do presidente da autarquia, conduzia também carros do lixo e outras viaturas
camarárias (como por exemplo o autocarro).
Conduz não só um “BMW”, como também um “Volvo” e uma carrinha
“Mercedes Vito” (todas viaturas da CMF).
Há já alguns anos a esta parte (ao que pensa, menos de 10 anos) que
praticamente só faz serviço para a arguida Fátima Felgueiras.
Além do depoente a arguida Fátima Felgueiras nunca teve outro motorista.
Nas deslocações dela conduziu três viaturas, entre as quais um “BMW” e um
“Volvo” adquirido mais recentemente.
De um modo geral esses veículos estavam afectos às deslocações da arguida
Fátima. Porém, não eram só destinados às deslocações dela. Às vezes outras pessoas,
como por ex. técnicos da CMF, eram transportados nessas viaturas. Normalmente era o
GAPP que autorizava a utilização da viatura para o transporte dessas pessoas. A mesma
situação, por via de regra, passava-se com os vereadores. De facto quer os técnicos quer
os vereadores não dispunham de autonomia para usarem a viatura sem autorização. Não
se recorda de nenhuma situação em que tenha conduzido essa vistura nas deslocações de
outra pessoa, que não a presidente, sem a autorização do GAPP.
Havia um veículo adstrito especificamente às deslocações dos técnicos e
vereadores (a CMF normalmente tinha dois veículos para as deslocações e o mais novo
era usado por via de regra pela presidente da autarquia), socorrendo-se de outro
motorista.
Quando o “BMW” estava adstrito às deslocações da arguida Fátima existia um
“Volvo” que era usado pelos vereadores e pelos técnicos camarários.
Pese embora existisse sempre um carro adstrito às deslocações da presidente da
autarquia (o “BMW”), por ordem do GAPP (designadamente por ordem do arguido
Bragança), ele poderia ser utilizado na deslocação de outras pessoas

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

À pergunta efectuada no sentido de se saber se o arguido Bragança dava essas


autorizações sem o consentimento da arguida Fátima, respondeu que por vezes esta
dizia-lhe para ver com o GAPP o serviço que tinha que fazer no sentido de verificar se
tinha disponibilidade (para conduzir essa viatura “BMW” em serviço de transporte de
outra pessoa). Ainda hoje ela ordena ao depoente que verifique com o GAPP o serviço
de transporte que tem de fazer.
No que se refere à viagem ao congresso do PS em Lisboa, referiu não se
recordar da data em que ocorreu tal deslocação, mas tem a ideia que partiram numa
Sexta-feira, tendo almoçado na Mealhada, onde aliás chegaram a esperar pelos arguidos
Bragança, Horácio Costa e Joaquim Freitas (os quais faziam-se transportar no veículo
deste último), mas como nunca mais chegavam, acabaram por almoçar sem eles e seguir
viagem.
Transportou no “BMW” o arguido António Pereira Mesquita Carvalho, a
testemunha Edgar Pinto da Silva (ambos vereadores) e a solicitadora Conceição Rocha.
Foi por indicação do arguido Bragança que os levou nessa viatura, indicação
essa que talvez tenha sido dada no dia anterior. Esclareceu que estava previsto que o
arguido Bragança se deslocasse no “BMW”, mas acabou por ser substituído pela
solicitadora Conceição Rocha.
Não se recorda a que hora chegaram a Lisboa.
Referiu ignorar se o arguido Bragança podia dar aquela indicação sem a
autorização da arguida Fátima Felgueiras.
Assegurou que na véspera da partida a arguida Fátima não se encontrava já em
Felgueiras, pois tinha-se deslocado a Lisboa e o arguido Bragança disse ao depoente que
deveria deslocar-se a Lisboa para depois a trazer de volta.
Sucede que o depoente trouxe de volta a arguida Fátima a Felgueiras ou desde a
área de serviço de Antuã (na A1) ou desde a zona do Hotel Tuela, no Porto, pois até
esse local ela tinha-se deslocado com o arguido Júlio Faria (embora não descarte a
primeira localização referida, reportada à zona a partir da qual transportou de volta a
arguida Fátima, tem a ideia que a trouxe desde a zona do Hotel Tuela, no Porto, até
Felgueiras).
Em Lisboa o depoente só transportou as pessoas que levou (nas deslocações para
o Hotel e para o local do congresso do PS). O depoente não entrou no edifício onde
decorreu o congresso, limitando-se a ficar à porta.
A viatura “BMW” dispunha de “via verde”.
No que se refere à viagem à zona da grande Lisboa a propósito do casamento de
um dos filhos do Dr. Pais Martins, referiu que transportou a arguida Fátima a vários
casamentos.
Aliás, levou-a aos casamentos dos dois filhos do Dr. Pais Martins (o primeiro
em Poiares e o segundo em Odivelas, eventos que tiveram lugar a um Sábado).
Em ambos deslocaram-se ao local do evento e regressaram no mesmo dia.
Nas deslocações aos casamentos ela tanto poderia ir a título particular como a
título oficial, em representação da CMF. Às vezes davam-lhe os respectivos convites
para ver a localização do evento, não se recordando como era o convite que ela recebeu
no que respeita ao casamento de um dos filhos do Dr. Pais Martins ocorrido na grande
Lisboa. Não reparou se os convites que ela recebia tinham ou não carimbo de entrada na
CMF (designadamente quando se tratavam de convites oficiais).
Referiu que quando o arguido Júlio Faria foi para a Assembleia da República
não se recorda de ter transportado coisas (nomeadamente documentos) da CMF para ele
(designadamente à sua residência), a mando de alguém.

637
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Sabe onde ele habita, onde aliás almoçou várias vezes com ele (acabou por
referir terem sido duas ou três vezes).
Reiterou não se recordar de lhe levar pastas com documentos à Sexta-feira, após
a ida dele para a Assembleia da República, mas acabou por referir achar natural que sim
(admitindo pois que tal possa ter sucedido esporadicamente, pese embore insista que
não se recorda desse facto, sendo certo que se tal tivesse sucedido com frequência
concerteza lembrar-se-ia).
No seu horário de trabalho chegou a conduzir o “BX” e o “Audi A4” da arguida
Fátima, quando ela usava essas viaturas em deslocações oficiais.
Levou também o filho dela ao colégio, em Amarante, o qual tinha aulas às 8.30
horas, conduzindo para o efeito a viatura particular dela (fê-lo pois fora do seu horário
de trabalho). Raras vezes o foi buscar ao colégio, às 18 ou 18.20 horas (o depoente saía
do trabalho às 17 horas).
*
Reafirmou o arguido Horácio Costa que no âmbito das entregas que a
testemunha Manuel Pinto fazia ao arguido Júlio Faria incluíam-se jornais locais, um
jornal do Vale do Sousa (pelo menos) e expediente. Esses documentos eram retirados
por ele de uma prateleira (no GAPP) especialmente destinada aos documentos para o
arguido Júlio, sem necessidade da testemunha Pinto receber qualquer indicação nesse
sentido, pois tratava-se já de uma rotina.
*
Em face destas declarações, a testemunha Manuel Pinto assegurou não saber de
qualquer prateleira onde eram depositados os documentos destinados ao arguido Júlio
Faria, admitindo apenas que uma vez ou outra lhe tenha entregue em casa documentos,
designadamente jornais, não podendo agora precisar se iam acondicionados em capas,
não se recordando mesmo se nessa altura ele ainda era o presidente da autarquia (ainda
hoje leva os jornais a casa da arguida Fátima Felgueiras) – cfr., em todo o caso, as
declarações prestadas pela testemunha José Júlio da Silva Pereira a este propósito (no
ponto 1.1. do 1º capítulo).
*
O arguido Júlio Faria, por sua vez, reafirmou que após ter cessado funções na
CMF sempre procurou sensibilizar tanto a CMF como as câmaras do Vale do Sousa
para certas questões relevantes para a região, visto que era deputado eleito pela região
do Vale do Sousa.
Nessa medida, algumas vezes entregaram-lhe informações incorporadas em
documentos, designadamente da CMF (um dos assuntos, por ex., era o do apoio
governamental para a remodelação do hospital).
Nesse âmbito, seguramente que a testemunha Manuel Pinto ou outro funcionário
camarário lhe entregaram documentos em sua casa.
Na maior parte das vezes nem sequer os recepcionava directamente, não se
recordando mesmo de ter recebido das mãos do Sr. Pinto qualquer documento (hipótese
que, em todo o caso, não descarta).
Isso também sucedeu quando, não sendo já deputado, era o presidente da
Assembleia Municipal de Felgueiras, de Janeiro de 2002 até Janeiro de 2003 (ao que
pensa).
*
Esclareceu então o arguido Horácio Costa que quando referiu que a testemunha
Pinto entregava documentos ao arguido Júlio Faria reportou-se em especial ao período
da campanha eleitoral referente às eleições autárquicas de 1997, bem como no período
em que o depoente esteve na CMF (entre 1996 e 1998).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Acrescentou que o Sr. Pinto não cumpria um horário rígido de trabalho, sendo-
lhe por isso remuneradas muitas horas extraordinárias.
*
- Testemunha Armindo Álvaro Pimenta Brochado
Tendo integrado o GAPP desde Agosto de 1998 até 2005, com conhecimento de
causa, referiu que na altura os vereadores não tinham um veículo à disposição.
Mais tarde dispuseram de uma viatura oficial da vereação (não pode precisar
desde quando, mas tal só sucedeu quando a CMF adquiriu um “BMW”).
Quando foi adquirido o “BMW” essa viatura passou a ser usada nas deslocações
da arguida Fátima Felgueiras e o “Volvo” já existente passou a ser usado pelos
vereadores.
A testemunha Pinto era o motorista do veículo da presidência. O “Volvo” era
conduzido pelos próprios vereadores ou por um funcionário camarário (que não o Sr.
Pinto), inclusive por elementos da Polícia Municipal.
O Sr. Pinto era motorista da presidente mas admite que possa ter feito serviço
para os vereadores.
Presume que era a arguida Fátima quem dava as instruções acerca do uso do
“BMW”.
Quando ela estava ausente era talvez o vice-presidente da CMF (o arguido
António Pereira) quem dava instruções acerca do uso dessa viatura.
Julga que o GAPP não poderia dar instruções acerca da utilização dessa viatura à
revelia da arguida Fátima Felgueiras, mas acabou por referir não saber se os seus
superiores tinham autonomia nessa matéria, mas presume que não.

- Testemunha Carlos Vítor dos Santos Meneses


Foi chefe de recepção (entre 1984 e 2000) e posteriormente (de 2000 a 2004)
director da “Residencial Avenida Alameda”, situada na Avª Sidónio Pais, nº 4, em
Lisboa.
Recorda-se que o motorista da arguida Fátima Felgueiras ficou hospedado nessa
residencial, como aliás já era costume.
Se o vir, já não o consegue identificar.
Confrontado com o documento de fls 196, confirmou tratar-se de uma factura no
valor de 13.000$00 referente a alojamento de duas noites pela testemunha Manuel
Pinto, com entrada a 06.02.99 e saída a 07.02.99.
O documento de fls 549, do 3º volume, é a ficha de computador referente ao
registo do cliente, a testemunha Manuel Pinto – que tem a ideia de ser o motorista da
arguida Fátima -, sendo certo que a sua última estadia nesse estabelecimento foi a
01.04.2000.
Não reparou se ele na altura conduzia ou não algum veículo.

- Testemunha José Júlio da Silva Pereira


Referiu que inicialmente o carro da presidência era um “Volvo” e que mais tarde
a CMF adquiriu um “BMW” para esse fim. A viatura “Volvo” passou então a estar
afecta ao transporte dos vereadores e para o que fosse necessário. Preferencialmente o
“BMW” destinava-se às deslocações da arguida Fátima Felgueiras, mas ocasionalmente
era utilizada no transporte de vereadores.
Durante algum tempo o Sr. Pinto era o único motorista e às vezes era ele quem
tinha de transportar os vereadores, ignorando se nessas ocasiões usava o “Volvo” ou o
“BMW”, visto que o depoente se mantinha no GAPP e não o via sair (presume que
usaria a viatura com a qual estivesse na altura).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Referiu que em termos formais não havia poderes delegados pela presidente da
autarquia.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se sobre o uso do veículo “BMW”
tinham algum poder decisório referiu que o GAPP procurava coordenar o respectivo uso
com o motorista (a testemunha Pinto). Isto é, por vezes recebiam solicitações de
utilização desse veículo para deslocações (que não da arguida Fátima) e então
perguntavam ao Sr. Pinto se a satisfação dessa solicitação colidiria ou não com algum
serviço que ele tivesse de efectuar para a presidente da autarquia e, em caso, negativo,
ele fazia o dito serviço.
Por decisão do GAPP não poderiam determinar o uso da viatura em causa para
uma deslocação a Lisboa, pois o Sr. Pinto não faria esse serviço sem ordens expressas
da arguida Fátima Felgueiras.
Recorda-se que o Sr. Pinto transportou no “BMW” umas pessoas ao congresso
do PS em Lisboa (levou a testemunha Edgar e a Sãozinha Rocha, não se recordando se
o arguido Bragança viajou ou não com eles nessa viatura).
Reafirmou que o GAPP não poderia dar a ordem de utilização dessa viatura para
esse fim na medida em que Sr. Pinto a não acataria sem primeiro obter a anuência da
arguida Fátima Felgueiras.
Salientou que o GAPP não tinha qualquer poder hierárquico sobre o Sr. Pinto.
À pergunta efectuada no sentido de se saber se a arguida Fátima se deslocava
com frequência a Lisboa, referiu que ela teve várias audiências em ministérios e
secretarias de estado, sendo certo que se deslocava muitas vezes de avião à capital.
Durante as suas ausências acha que não era pedida autorização à arguida Fátima
para o uso da viatura “BMW”.
Recorda-se que na altura do congresso do PS em Lisboa ela não se encontrava
em Felgueiras.
Ignora quem autorizou o uso da viatura “BMW” para a deslocação a Lisboa,
sendo certo que a testemunha Edgar era o número dois e, nessa medida, não estranharia
que tivesse sido ele a dar essa autorização. Ele, aliás, deslocou-se a Lisboa nessa viatura
(o vice-presidente da autarquia era porém o arguido António).
O depoente abria o correio oficial dirigido, por exemplo, à presidente da CMF.
Às vezes recebiam correio particular dirigido à arguida Fátima Felgueiras e se
não tivessem indicações nesse sentido dela, não abriam tal correspondência e apenas a
colocavam no seu gabinete.
Essa operação tanto poderia ser feita pelo depoente como pelo arguido
Bragança.
As testemunhas Cândida e Armindo Brochado tinham funções mais
administrativas e não abriam correio.
Tem a ideia de ter aberto correspondência dirigida à arguida Fátima e respeitante
a convites para casamentos, sendo certo que ela recebia muitos convites para festas e
casamentos.
Recorda-se dela ter recebido um convite para um casamento em Lisboa (não se
recorda se foi o depoente ou o arguido Bragança a abrir a correspondência que nesse
sentido lhe foi enviada), proveniente de uma pessoa ligada ao Instituto Superior de
Ciências Educativas, convite esse que tem a ideia de ter visto, mas não se mostrou
muito assertivo neste ponto na medida em que a arguida Fátima recebe dezenas de
convites. Porém, como esse casamento iria realizar-se em Lisboa, recorda-se de se ter
falado desse evento no GAPP.

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia

640
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A viatura “BMW” referida nos autos, tanto quanto pôde perceber, destinava-se
ao uso exclusivo da arguida Fátima.
O respectivo motorista era a testemunha Manuel Ferreira Pinto.
Essa viatura foi usada numa deslocação a um congresso nacional do PS em
Lisboa durante um fim-de-semana.
O Sr. Pinto alojou-se então numa pensão de Lisboa (“Residencial Avenida”),
conforme emerge dos documentos de fls 547 a 549 do 3º volume.
A referida viatura dispunha de “via verde”.
Entende que o uso dessa viatura para a deslocação a um congresso de um partido
extravasa o âmbito do uso que deveria ser dado àquela viatura camarária.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Segundo pôde perceber, à data, existia uma viatura da marca “BMW” adstrita ao
transporte da presidente da edilidade.
Naturalmente que essa viatura apenas poderia ser usada nas deslocações oficiais.
A investigação, porém, chegou à conclusão que essa viatura foi usada para
outros fins.
Essa viatura era conduzida pela testemunha Manuel Pinto e foi utilizada no
transporte de vários elementos do PS de Felgueiras ao Congresso Nacional do PS em
Lisboa.
A testemunha Manuel Pinto hospedou-se numa pensão em Lisboa (cfr. fls 196
do 1º volume – factura/recibo respeitante à estadia de 6 para 7 de Fevereiro de 1999).
A fls 197 constam documentos alusivos a despesas de combustível e
parqueamento dessa viatura (foi feito um abastecimento a 06.02.99 às 18.16 horas em
Lisboa; foi feito outro abastecimento em Lisboa a 07.02.99, onde não é referida a hora;
consta um talão de pagamento de um parqueamento a 06.02.99; e um talão de
parqueamento no Parque dos Restauradores, em Lisboa, das 10.59 horas a 18.16 horas,
no dia 07.02.99).
O “BMW” referido tinha “Via Verde”.
Foi o arguido Horácio Costa quem entregou esses documentos à PJ.
Essa mesma viatura foi usada pela arguida Fátima Felgueiras na deslocação a
um casamento de um dos filhos do Dr. Pais Martins (presidente do Instituto Politécnico
do Porto, pólo de Felgueiras).
Não se recorda de encontrar na CMF qualquer documento alusivo a esse
casamento, designadamente o respectivo convite.
Se o convite fosse oficial (isto é, se a arguida apenas fosse convidada em face do
facto de ser presidente da CMF) deveria existir um documento alusivo a essa
deslocação, segundo presume.

- Testemunha Isabel de Sousa Dinis Martins


Foi esposa do Dr. Pais Martins, entretanto falecido.
Explicou que é sócia da “Pedago”, a qual dispõe de estabelecimentos de ensino
(Institutos de Ciências Educativas) em Felgueiras, Mangualde e Odivelas.
A arguida Fátima Felgueiras esteve presente no casamento de ambos os filhos da
depoente.
Ela foi convidada pelo seu marido e pela depoente na qualidade de presidente da
CMF, tendo sido nessa qualidade que esteve presente, assim como estiveram presentes
os presidentes das Câmaras Municipais de Mangualde e de Odivelas (onde estão
instalados institutos de ciências educativas).

641
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Se a arguida Fátima Felgueiras não fosse à data a presidente da CMF não seria
convidada para o casamento dos seus filhos, já que apenas existia um relacionamento
institucional com ela (assim como com os presidentes da Câmara Municipal de
Mangualde e Odivelas).
O convite para esses casamentos foram enviados para a CMF por escrito.

Análise crítica
Neste ponto estão descritas duas situações distintas referentes à utilização da
viatura “BMW”, propriedade da CMF, em duas deslocações que supostamente nada
teriam a ver com necessidades de deslocação em serviço para a CMF.
Começemos então pela deslocação ao Congresso Nacional do PS.
Dos depoimentos colhidos a propósito, poderemos assentar que a viatura
“BMW” era usada quase em exclusividade pela arguida Fátima nas suas deslocações de
serviço e só residualmente pelos vereadores e, ainda assim, só com autorização dela e
sobretudo na sua ausência (do cotejo das declarações prestadas pelo arguido Horácio e
pelas testemunhas Manuel Pinto, Edgar Silva, Armindo Brochado e José Júlio Pereira
parece resultar isso mesmo).
Assim, quanto à utilização desse veículo, em face daqueles depoimentos, nem se
convenceu o Tribunal que essa viatura poderia ser usada com frequência pelos
vereadores e pelos técnicos superiores da CMF, conforme parece emergir das
declarações da arguida Fátima, nem que a mesma era apenas usada em exclusividade
por esta, conforme referido pelo arguido Horácio (portanto, nem tanto ao mar nem tanto
à terra).
Em face da prova produzida, parece ser pacífico que, na véspera da partida para
Lisboa, a arguida Fátima ausentou-se para a capital (segundo ela, em serviço para a
CMF).
A generalidade das testemunhas que referiram esse facto não sabem ou não se
recordam do motivo pelo qual a arguida Fátima se deslocou a Lisboa na véspera.
Em todo o caso, não se vislumbra razão alguma para não tomar com verídica a
razão dessa deslocação segundo a versão da arguida Fátima Felgueiras.
Ora, tendo-se ela deslocado a Lisboa de véspera por motivos de serviço,
naturalmente que só poderia ser determinado por ela que a viatura “BMW”, conduzida
pela testemunha Pinto, deveria deslocar-se a Lisboa para a trazer de volta a Felgueiras
(cfr. o depoimento da testemunha José Júlio da Silva Pereira, o nº 2 de então do GAPP).
É que, a não ser assim, a testemunha Pinto não acataria a ordem de deslocação a
Lisboa.
É certo que a testemunha Pinto referiu que recebeu a ordem respectiva do
GAPP, mas naturalmente que a não acataria se não tivesse o aval da arguida Fátima,
conforme afirmado com credibilidade pela testemunha José Pereira.
A testemunha Pinto, diga-se, segundo nos pareceu, não foi totalmente isenta no
seu depoimento, pois procurou aqui e acolá puxar a brasa à sardinha da arguida
Fátima, procurando diluir a responsabilidade pela decisão de uso da viatura num
gabinete e não numa pessoa concreta, gabinete esse que dependia directamente da
presidente da edilidade e os respectivos elementos dependiam da confiança política
neles depositada por uma pessoa que era centralizadora, pois isso estava-lhe no ADN.
Note-se que a viagem em causa é longa, daí que não seja crível que a decisão de
utilização dessa viatura fosse tomada à revelia da “Srª Presidente”, a tal pessoa de feitio
centralizador.
Consequentemente, já se saberia de véspera que a viatura da CMF iria deslocar-
se a Lisboa por determinação da arguida Fátima.

642
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Naturalmente que a arguida Fátima terá permanecido o fim-de-semana em


Lisboa para participar no Congresso Nacional do PS, sendo assim suposto regressar a
Felgueiras no Domingo.
Nesse pressuposto, a testemunha Pinto apenas teria de se deslocar a Lisboa no
Domingo, mas o certo é que o fez numa Sexta-feira desnecessariamente; e só o fez
porquanto teve de transportar o arguido António Carvalho, a testemunha Edgar e a
solicitadora Sãozinha e, tendo-o feito, alguém acreditará que o fez à revelia da “Srª
Presidente”?
Seja como for, as despesas de alojamento e de parqueamento da viatura “BMW”
foram pagas pela “caixa” (cfr. as declarações proferidas pelo arguido Horácio e os
documentos que a propósito foram referenciados; cfr. ainda o depoimento da
testemunha Carlos Meneses).
As despesas em portagens foram liquidadas pela CMF porquanto o “BMW”
dispunha de “via verde”, despesas essas que não foram superiores pelo facto dessa
viatura se ter deslocado na Sexta-feira a Lisboa e não apenas no Domingo.
Porém, não se tendo demonstrado que a arguida Fátima, nesse fim-de-semana,
se tenha deslocado nessa viatura em Lisboa (nela se deslocaram os seus três passageiros,
para além do motorista Pinto), não nos parece nada verosímel que a deslocação na
Sexta-feira e na capital (do hotel para o local do congresso e vice-versa) tenha sido feita
à revelia da arguida Fátima pelas razões já avançadas.
A deslocação nesse dia da semana, reafirma-se, apenas se poderia prender com o
transporte da testemunha Edgar, do arguido António Carvalho e da solicitadora
Conceição, pois que, naturalmente, se assim não fosse, das duas uma, ou essa viatura
iria no mesmo dia para Lisboa para assegurar as deslocações da arguida Fátima na
capital (por razões partidárias) ou só iria a essa cidade no Domingo para a trazer de
volta a Felgueiras.
Tanto assim que as despesas de estadia do motorista Pinto – funcionário da
CMF, supostamente ao serviço da mesma quando se deslocou a Lisboa -, foram pagas
com dinheiro da “caixa” pelo arguido Horácio Costa (pagamentos esses que só eram
efectuados com o aval da arguida Fátima), sinal de que existia a consciência de que
essas despesas foram realizadas por motivos que nada tinham a ver com a CMF, caso
contrário seria esta a liquidá-las.
Assim, é para nós ponto assente que a testemunha Pinto recebeu instruções da
arguida Fátima para se deslocar a Lisboa para a trazer de volta.
É também para nós ponto assente que recebeu dela instruções para o fazer na
Sexta-feira, não para a trazer de volta nesse dia (pois ela iria participar no Congresso
Nacional do PS), mas para, aproveitando essa viagem, transportar elementos do PS de
Felgueiras ao dito congresso, que acabaram por se passear em Lisboa nessa viatura
camarária, a qual assim foi usada para dois fins distintos, um que se prendeu com razões
de serviço e outro com razões de ídole particular, em todo o caso, tudo por
determinação e com o aval da arguida Fátima Felgueiras.
Ora, se no que diz respeito à viagem para Lisboa se poderá concluir conforme
artigos 98º e 99º da contestação da arguida Fátima, difícil será concluir-se da mesma
forma nas deslocações dentro da capital pelo trio já referido, do hotel para o local do
congresso e vice-versa.
Curiosa, em todo o caso, é a circunstância de na sua contestação não alegar –
como agora alegou no julgamento – que a deslocação daquele trio, seus correlegionários
de partido, usando a viatura “BMW”, se fez à sua revelia.
Não consta aliás que ela se tenha surpreendido com esse facto.

643
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ao permitir o uso de tal viatura camarária para fins que nada tinham a ver com
razões de serviço da CMF, ela não podia deixar de saber que tal actuação não lhe era
permitida por lei.
Já no que concerne ao uso da dita viatura camarária numa deslocação à zona de
Lisboa a fim da arguida Fátima Felgueiras participar na cerimónia de casamento de um
dos filhos do Dr. Pais Martins, ficou demonstrado que essa viagem foi oficial, na
medida em que a arguida Fátima apenas recebeu o respectivo convite por ser presidente
da CMF e não porque mantinha com os pais do noivo uma relação de amizade.
Com assertividade foi explicado em que contexto surgiu o convite e qual a sua
razão de ser (cfr. os depoimentos da arguida Fátima Felgueiras e sobretudo da
testemunha Isabel Martins, viúva do dito Pais Martins, entretanto falecido).

A utilização do GAPP (Gabinete de Apoio Pessoal à Presidente) e respectivos


funcionários pela arguida Fátima Felgueiras para fins particulares

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Explicou que o GAPP foi criado pela lei e não por si, sendo certo que já existia
quando chegou à presidêncida da CMF.
Nega ter usado o GAPP e os seus meios para fins que não estivessem previstos
na lei, por sua ordem ou com o seu conhecimento.
Referiu que o chefe desse gabinete era o arguido Bragança (o qual era também o
secretário-coordenador do PS de Felgueiras).
Referiu ignorar se os funcionários e os credores do jornal “O Sovela” iam ou
não receber o respectivo vencimento e créditos à CMF, designadamente ao arguido
Horácio Costa, o qual chegou a ser secretário da ADEC (incialmente referiu que foi
tesoureiro, mas depois admitiu o erro em que incorreu quando confrontada com o teor
do documento de fls 3726, do 5º volume - acta nº 4 -, também constante do apenso 139-
A, donde emerge que o arguido Joaquim Freitas é quem de facto exerceu as funções de
tesoureiro daquela associação. Antes disso o Horácio Costa não fazia parte dos
respectivos corpos sociais – cfr. acta nº 1, constante de fls 3722 do 5º volume, e datada
de 04.03.94).
Acrescentou que se tal facto corresponder à verdade, faziam-no sem o seu
conhecimento.
Quanto ao teor de fls 411 do apenso 15, referiu ignorar, pois não sabe a que
iniciativa de recolha de fundos diz respeito.
A propósito dos documentos de fls 378 e 440 do apenso 15, referiu que a CMF
tem dossiers respeitantes da todas as instituições do concelho, inclusive as desportivas,
tendo assumido a presidência da Assembleia Geral do FCF por inerência do facto de ser
presidente da CMF.
Nessa medida, confirmou a autoria do documento de fls 441 do apenso 15 (onde
endereçou um convite para tomar café no seu gabinete a vários empresários de modo a
os sensibilizar a contribuir com donativos para o FCF). Explicou que as missivas foram
enviadas a uma lista de empresários elaborada pelos dirigentes do FCF.
Confirmou ter manuscrito o documento de fls 466 do apenso 15, tratando-se de
uma nota ao GAPP, explicando que eram os dirigentes do FCF quem levavam os ofícios
e os distribuíam, sendo certo que a depoente limitava-se a colaborar para dar
credibilidade à campanha de recolha de fundos para o FCF.
Quanto aos documentos de fls 466 e 476 do apenso 15, tratam-se de
agradecimentos às empresas ali referidas (respectivamente à “Calzeus” e a “CAC”).

644
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Explicou ainda que o Prof. Bragança foi afastado do GAPP por quebra de
confiança política e que foi retirada a memória do computador desse gabinete antes dos
arguidos Bragança e Horácio Costa terem retirado das instalações camarárias tal
equipamento (que mais tarde devolveram).

- Arguido Horácio Costa


O GAPP dependia da arguida Fátima Felgueiras e tinha como atribuições,
designadamente, fazer os contactos com as diversas entidades, programar as recepções
às individualidades que se deslocavam a Felgueiras, redigir os ofícios e proceder ao
respectivo envio segundo ordens da presidente da autarquia e faziam a ponte entre esta e
os serviços camarários.
Ora, o GAPP fazia também serviços que se prendiam exclusivamente com o PS,
como por exemplo era ali que se procedia ao pagamento das respectivas quotas, os seus
funcionários deslocavam-se ao correio para enviar missivas que se prendiam
exclusivamente com o PS ou enviavam faxes e-mails de conteúdo unicamente partidário
(por ex., convites dirigidos aos militantes para participarem em acções partidárias e
comunicações políticas da arguida Fátima), era ali que se procedia ao registo dos
militantes (tal registo encontrava-se na CMF, o qual era consultado sempre que um
militante se dirigia ao GAPP para pagar as suas quotas). Além disso, a pessoa que
instalou o ar condicionado na sede de campanha foi ao GAPP falar com o arguido
Bragança no sentido de receber o seu crédito, o qual o encaminhou para o gabinete do
depoente (o depoente fez também muitos pagamentos a credores do “Sovela” no seu
gabinete).
Ademais, tratavam de questões que se prendiam com a ADEC e com o FCF
segundo instruções dadas pela arguida Fátima Felgueiras.
Aliás, alguns dirigentes do FCF dirigiam-se a esse gabinete para tratar de
assuntos relacionados com esse clube (em concreto não sabe o quê).
O Sr. Júlio Pereira ali organizou a contabilidade de um peditório que foi
efectuado com o Sr. Fernando Lima e a arguida Fátima em 1997 a favor do FCF e que
segundo aquele rendeu 9.000.000$00.
Esclareceu que os elementos do GAPP eram os seguintes: o arguido Bragança, o
Sr. Júlio Pereira, o Sr. Armindo Brochado (tendo entretanto saído), a D. Rosinda (que
entretanto saíu) e a D. Leonor (a D. Cândida esteve também ali e foi substituída pela
Leonor).
Os elementos do GAPP limitavam-se a cumprir ordens e eram funcionários
subservientes. Mesmo o PS local estava desprovido de massa crítica em relação à
arguida Fátima Felgueiras.

- Arguido Joaquim Freitas


Assistiu a telefonemas que eram feitos pelo GAPP para empresas antes de ali se
deslocarem para receber donativos, para membros da Comissão Política do PS
Felgueiras e para convocar presidentes de Junta para alguma iniciativa partidária.
A sede do PS era de facto no GAPP, pois era ali que se enviavam as cartas aos
militantes a propósito de assuntos partidários e era ali que os militantes pagavam as suas
quotas.
Quando algum presidente de junta estava a ficar desaindo era chamado ao GAPP
para algumas reuniões.
A arguida Fátima elaborava listas de candidatos do PS às eleições (não eram
efectuadas pelo GAPP).

645
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Dr. António Pereira preparava os discursos políticos da arguida Fátima e para


isso usava o computador do GAPP.
Por vezes eram feitos contactos telefónicos pelo GAPP a membros da ADEC a
convocá-los para reuniões.
Era no GAPP que o Júlio Pereira fazia as contas da angariação de donativos para
o FCF.
Era também ali que se faziam contactos telefónicos no sentido de se obterem
donativos para o FCF. Chegou a receber aliás na sua empresa missivas elaboradas pelo
GAPP a propósito do FCF (cfr. por ex. a missiva de fls 441 do apenso 15 assinada pela
arguida Fátima e feita em papel timbrado do GAPP).
No GAPP entregavam-se também donativos para “O Sovela”. Aliás, a
funcionária desse jornal ia ou ao GAPP ou ao gabinete do arguido Horácio receber o
respectivo vencimento (não tem já a certeza se a um ou a outro local).
Os credores do “Sovela” iam receber o pagamento a que tinham direito à CMF,
não sabendo exactamente aonde. Chegou inclusive a assistir a arguida Fátima a dar
instruções ao Dr. António Pereira para proceder ao pagamento ou para retardar o
pagamento aos credores do “Sovela”.
Tais actividades tinham lugar no GAPP porque a arguida Fátima Felgueiras o
autorizava.
De resto, chegou a presenciar a arguida Fátima a perguntar aos elementos do
GAPP se tinham feito contactos que se prendiam com assuntos que nada tinham a ver
com a CMF.

- Testemunha Maria Leonor Alves da Costa


Nunca tratou no GAPP de qualquer assunto relacionado com a campanha
eleitoral de 1997 ou com o PS.
Salientou porém que estava na recepção da parte política da CMF pelo que não
teria conhecimento caso qualquer assunto dessa natureza ali fosse tratado.
Reconheceu porém, ainda a propósito da campanha eleitoral, que à CMF
dirigiam-se pessoas para oferecer donativos para a campanha e credores para obterem o
respectivo pagamento dos fornecimentos que faziam para a dita campanha eleitoral.

- Testemunha Armindo Álvaro Pimenta Brochado


Referiu ser técnico de informática, sendo funcionário da CMF desde Maio de
1998 (para o Gabinete de Atendimento e Informação), sendo certo que iniciou o
exercício de funções no GAPP em Agosto de 1998, onde se manteve até às últimas
eleições autárquicas (em 2005). Explicou que substituiu a testemunha Leonor Costa no
GAPP (recepção) no período de férias dela e acabou por lá ficar após esse período.
Ocupou então um gabinete com a testemunha Júlio Pereira e o arguido
Bragança.
À data era auxiliar administrativo (arquivava documentos, separava a
correspondência, fazia telefonemas, etc).
A testemunha Júlio Pereira passou a adjunto e o arguido Bragança era o chefe de
gabinete.
No exercício das suas funções tinha um contacto diário com a arguida Fátima
Felgueiras.
Acha que no GAPP só se tratavam de assuntos relacionados com a CMF.
Não se recorda de ter tratado no GAPP de algum assunto relacionado com o PS.
Não sabe se à data o PS de Felgueiras tinha computador na sua sede.
Já na altura era militante desse partido, militância que ainda hoje mantém.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Na sede local do PS existiam três salas, uma delas de acesso mais restrito,
ignorando se a mesma já dispunha de computador.
O pagamento das quotas pelos militantes era tratado pelo secretário-coordenador
do PS de Felgueiras (arguido Bragança), ignorando em que local ele tratava desses
assuntos.
Seja como for, nunca presenciou qualquer militante a pagar quotas no GAPP.
À pergunta efectuada se na CMF não se tratavam de assuntos relacionados com
o FCF referiu que ali se tratavam de assuntos relacionados com as diversas entidades do
concelho.
Em todo o caso, não se recorda de no GAPP se tratar de assuntos relacionados
com a angariação de fundos para o FCF.
Confrontado com o documento de fls 403 a 411 do apenso 15 (documento
recolhido no GAPP e referente a um mapa de recolha de fundos para o FCF, onde se
alude a contactos efectuados na CMF), referiu que tem a assinatura da testemunha Júlio
Pereira.
Ignora se no GAPP existia ou não algum dossier relativo ao FCF.
Confrontado com o documento de fls 440 do apenso 15 (missiva datada de
19.11.98, dirigida aos empresários no sentido de os convidar para um café no gabinete
da presidente com vista à angariação de fundos, documento esse feito em papel do
GAPP), confirmou que o logotipo aposto no papel alusivo ao GAPP era o que na altura
estava em uso.
Foi confrontado com o manuscrito da arguida Fátima, constante de fls 456 do
apenso 15, dirigido ao GAPP (dando instruções referentes à angariação de fundos para o
FCF, designadamente a elaboração do ofício de fls 440 do apenso 15, dirigido a vários
industriais).
Foi ainda confrontado com o documento de fls 466 do apenso 15 (ofício
assinado pela arguida Fátima em papel timbrado do GAPP e dirigido à “Calzeus,
respeitante a um agradecimento pela contribuição para o FCF) e com o documento de
fls 476 do apenso 15 (documento igual mas dirigido à “CAC, Cunha Almeida e Cª,
Ldª”, também assinado pela arguida Fátima).
Já quanto ao documento de fls 186 a 189 (que se encontrava num dossier da
CMF e relativo ao FCF, reportando-se a uma relação entre empresas e donativos para
esse clube), assegurou nunca o ter visto no GAPP, tanto quanto se recorda,
desconhecendo que se encontrava num dossier relativo a esse clube (dossier cuja
existência disse desconhecer).
Foi ainda confrontado com o documento de fls 219 do apenso 16 (ofício da
CMF, referente a uma convocatória relacionada com o FCF, a qual é assinada pela
arguida Fátima Felgueiras – em papel da presidente -, na qualidade de presidente da
autarquia, mas no texto do documento faz alusão à sua qualidade de presidente da
Assembleia Geral do FCF).
Confrontado com o documento de fls 255 a 259 do apenso 16 (listagem de
donativos), apreendido no GAPP, referiu desconhecer tal documento.
Antes dessa lista existem uma série de cópias de cheques destinados ao FCF, os
quais foram apreendidas no dossier alusivo ao FCF, dossier esse que estava no GAPP.
Não se recorda se alguma vez viu algum cheque destinado ao FCF e que tenham
sido entregues no GAPP.
Não tem qualquer explicação para o facto de no GAPP se tratarem de assuntos
relacionados com o FCF, pois esses assuntos não passavam por si.
Nessa altura quem trabalhava com os computadores existentes no GAPP eram as
testemunhas Júlio Pereira e Leonor Costa e ainda o arguido Bragança.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não se apercebeu que nos computadores do GAPP se elaborassem documentos


relacionados com esse partido.
Em todo o caso, algumas vezes levava correspondência do PS e presume que a
mesma era preparada na respectiva sede local, sendo certo que o depoente, nessa sede,
chegou a colocar correspondência (relacionada com assuntos do partido) em envelopes.
Não se apercebeu de no GAPP serem tiradas fotocópias de documentos
relacionados com acções de índole partidária.
*
A este propósito o arguido Horácio Costa garantiu que a testemunha Armindo
Brochado ficou no GAPP porque merecia a confiança política e devido à sua acção na
campanha eleitoral das eleições ocorridas em 1997.
Ele chegou a ir à CGD para depositar quotas de militantes do PS (quer no seu
horário de expediente quer fora dele) na conta que sabia ser do PS e sabia bem que na
secretária do arguido Bragança existia um livro de cheques a conta oficial do PS.
Ele aliás teve um papel relevante na preparação de um jantar comemorativo do
25 de Abril (tratava-se de uma acção partidária) e era o GAPP que tratava da
organização desses jantares (faziam dali os telefonemas necessários).
Chegou aliás a vê-lo ao telefone, com a lista dos militantes do PS, a fazer os
convites aos militantes.
*
Em face destas revelações do arguido Horácio Costa a testemunha Armindo
Brochado nada referiu, apenas debruçando o seu depoimento acerca de outros assuntos
referidos pelo dito arguido, mas retratados noutro capítulo.

- Testemunha José Júlio da Silva Pereira


Uma vez que até 2005 e durante mais de 20 anos exerceu funções no GAPP,
elencou com razão de ciência as pessoas que ali também prestaram serviço: o arguido
Bragança até inícios de 2000; as testemunhas Cândida, Leonor e Armindo Brochado e
ainda uma funcionária chamada Mara.
Após a saída do arguido Bragança o espaço em causa foi remodelado.
Antes disso o gabinete onde estava instalado o GAPP teria cerca de 12 m2 e
dispunha de três secretárias (uma ocupada pelo arguido Bragança e outra ocupada pelo
depoente) e dispunha de uma fotocopiadora.
O arguido Bragança foi o primeiro a dispor de computador, o qual mais tarde
passou a ser utilizado pelo depoente quando lhe foi disponibilizado um novo. Mais tarde
a testemunha Armindo passou também a dispor de computador.
Quando o arguido Bragança saiu da CMF (em inícios de 2000) a sede do PS
local não dispunha de computador. Só nessa altura é que o PS adquiriu para a sua sede
local um computador.
À pergunta efectuada no sentido de se saber onde eram feitos os documentos em
computador e relativos a assuntos do PS, referiu que alguns eram feitos no GAPP (como
por exemplo ofícios, comunicados e cartas), mas o grosso desses assuntos eram tratados
na sede do PS.
Explicou que primeiro tratavam dos assuntos camarários e que depois
ocupavam-se de assuntos do PS.
Explicou ainda que entrava ao serviço às 9h, fazia pausa para almoço, retomava
o exercício das suas funções após essa pausa e saía do seu posto de trabalho quando
calhava. Havia por isso flexibilidade de horários. Assim, como não tinha um horário
rígido, poderia tratar de alguns assuntos ligados ao PS no exterior da CMF durante o seu
horário de trabalho (como por exemplo ir aos correios ou à CGD), dando conhecimento

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

ao arguido Bragança desse facto (mas sem lhe dar grandes justificações), o qual não lhe
colocava qualquer entrave.
Desde que o arguido Bragança saíu do GAPP nunca mais ali foram tratados
assuntos relacionados com o PS, na medida em que o depoente entendeu que deveriam
ser tratados na sede do PS. Foi aliás por isso que o PS adquiriu um computador para a
sua sede.
Entretanto a testemunha manifestou algumas dúvidas quanto ao momento em
que o dito computador foi adquirido (em 2000 ou em 2002), mas tem a ideia que terá
sido em 2000 (talvez pelo facto de relacionar essa aquisição com a saída do GAPP do
arguido Bragança).
Explicou que o arguido Bragança era o adjunto da presidente (coordenava o
GAPP e abria o Diário da República e correspondência oficial dirigida à presidente), o
depoente era o secretário (cabia-lhe abrir a correspondência oficial e o Diário da
República, redigia documentos à máquina ou no computador, tratava das requisições e
marcava as audiências com a presidente).
As testemunhas Cândida e Armindo Borchado desempenhavam tarefas mais
administrativas.
Por via de regra a correspondência particular dirigida à arguida Fátima não era
aberta, sendo apenas colocada no seu gabinete.
Em termos formais não existiam poderes delegados pela arguida Fátima
Felgueiras.
A partir de certa altura, no GAPP, trataram de assuntos relacionados com o FCF.
A esse propósito recorda-se de dois jantares promovidos no sentido de se
angariar fundos para o FCF e para colmatar o vazio directivo que entretanto se verificou
no clube, jantares esses que tiveram lugar no restaurante “S. José”.
Nessa altura a arguida Fátima era a presidente da Assembleia Geral do clube e
foi o GAPP que organizou esses jantares (fizeram contactos telefónicos e ofícios), por
determinação da dita arguida (foi ela quem teve a iniciativa).
Tinham no GAPP um dossier relativo ao FCF e que foi apreendido pela PJ.
Tinham ainda outros dossiers relativos a outras colectividades.
Confrontado com o documento de fls 411 a 413 (mapa de recolha de fundos para
o FCF em 1998), referiu que esse documento foi rubricado e numerado por si quando
foi apreendido pela PJ no GAPP (antes disso não estava rubricado nem numerado).
Pela disposição desse documento acha que ele não foi elaborado no GAPP, pelo
que presume que tal documento deverá ter-lhes sido enviado pelo FCF. Tal documento
prende-se com a realização dos dois jantares a que aludiu.
Explicou que os documentos de fls 440 a 443 do apenso 15 se tratam de convites
com uma relação das entidades a convidar (pela forma como está elaborada acha que
esta lista deverá ter sido feita no GAPP; designadamente os documentos de fls 441 e
443 têm o timbre em uso na altura – “CMF – GAPPresidente”).
O convite (para um café no gabinete da arguida Fátima com vista a uma
comparticipação mensal para o FCF) foi feito com papel da CMF – GAPP e é assinada
pela arguida Fátima Felgueiras.
A fls 455 a 459 do apenso 15 constam ainda documentos relacionados com o
mesmo tema (a fls 455 consta um ofício em papel usado pelo GAPP dirigido a empresas
para solicitar donativos; a fls 456 uma nota da arguida Fátima no sentido de serem
remetidos os ofícios; a fls 457 e 458 consta uma lista das empresas às quais os ofícios
deveriam ser remetidos; a fls 459 consta uma lista de empresas de calçado para
patrocinar as camisolas do FCF, documento que a testemunha referiu não saber onde foi
feito).

649
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 466 do apenso 15 consta um ofício elaborado no GAPP, assinado pela


arguida Fátima, dirigido à “Calzeus” a agradecer um contributo dado ao FCF.
A fls 476 do apenso 15 consta uma carta da arguida Fátima à “CAC” de
agradecimento pelo facto dessa empresa ter concedido uma contribuição a favor do
FCF.
Explicou a testemunha que esses ofícios eram elaborados no GAPP ou pelo
arguido Bragança ou pelo depoente. Tem aliás a ideia de ter feito alguns ofícios neste
âmbito por ordem da arguida Fátima Felgueiras.
A fls 186 a 189 do apenso 16 consta uma lista (relação de empresas/donativos
para o FCF). Confrontado com ela, a testemunha ficou com a sensação de que terá sido
elaborada no GAPP.
Outra lista consta de fls 228 a 231 do apenso 16 (relativa a colaboradores
industriais), com anotações a lápis de números de telefone que a testemunha referiu
terem sido feitas por si. Explicou que tal documento foi elaborado no GAPP e serviu
para que os contactos fossem feitos no sentido de apelar à presença daqueles
colaboradores nas reuniões referidas.
A fls 216 e 218 do apenso 16 consta outra lista e a fls 219 do mesmo apenso
consta um ofício em papel do GAPP, assinado pela arguida Fátima Felgueiras enquanto
presidente da CMF (mas no corpo do documento apresenta-se como presidente da
Assembleia Geral do FCF), a convocar os destinatários para uma reunião na Biblioteca
Municipal.
A fls 255 a 392 do apenso 16 consta uma listagem de donativos para o FCF
(constante do dossier apreendido no GAPP), sendo certo que desse dossier constava
cópia de dois cheques (cfr. fls 310 e 311) que a testemunha supõe reportar-se a
donativos.
Ignora quando é que o FCF foi considerado instituição de utilidade pública (cfr.
a esse propósito o documento de fls 4905 e 4096 – Diário da República, 2ª Série, de
11.09.99, sendo certo que o despacho que conferiu essa utilidade pública data de
31.08.99).
À época o FCF era a instituição desportiva mais representativa do concelho.
Na CMF existiam também outros dossiers relativos a outras colectividades
(como por exemplo relacionados com o “Hospital da Misericórdia”, com a “Cercifel”;
com a Federação Portuguesa de Natação; com a “Felmostra”; com a “Casa do Risco” e
com a “Confraria de Stª Quitéria”) – cfr. artº 64º, da Lei nº 169/99, de 18.09, relativa à
competância das Câmaras Municipais no apoio a actividades de natureza cultural,
desportiva, social e recreativa.
Explicou que em face da disposição das mesas no GAPP a testemunha Armindo
Brochado não conseguia ver o que o depoente e o arguido Bragança estavam a fazer.
As ordens verbais proferidas pela arguida Fátima, em princípio, eram dadas ao
arguido Bragança, o qual depois as transmitia. Existiam também ordens escritas
proferidas pela arguida Fátima, algumas das quais dirigidas a si.
Todos os elementos do GAPP sabiam do teor dessas ordens no que concerne ao
FCF (acabou por referir que, pelo menos, essas ordens eram conhecidas pelo depoente e
pelo arguido Bragança. Acha em todo o caso que a testemunha Armindo Brochado se
apercebeu que no GAPP se trataram de assuntos relativos ao FCF).
*
O arguido Horácio Costa, por seu turno, referiu que a testemunha José Júlio
Pereira não tinha um horário flexível, embora fosse verdade que ele pudesse compensar
algumas ausências durante o seu horário de trabalho e que ficava muitas vezes na CMF
para além desse horário de trabalho.

650
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Reafirmou que o grosso dos assuntos do PS eram tratados no GAPP.


*
- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia
O GAPP era composto pelo arguido Bragança e pelas testemunhas Júlio Pereira,
Leonor (secretária) e Armindo Brochado.
Foi apreendida inúmera documentação relativa ao FCF no GAPP (como por
exemplo actas, ofícios, listas, mapa de recolha de fundos e missivas – como por ex.,
convites para um café no gabinete da presidente no sentido de se angariar fundos e
agradecimentos de contributos), sendo na altura a arguida Fátima a presidente da
Assembleia Geral do clube (na sua óptica é por isso que essa documentação foi
encontrada no GAPP).
De resto, no documento de fls 219 do apenso 16, de 17.03.98, elaborado em
papel da CMF, ela assina essa missiva na qualidade de presidente da CMF mas no texto
do documento invoca a sua qualidade de presidente da Assembleia Geral do FCF.
Na CMF não existia por exemplo um dossier do FC da Lixa, que também é um
clube do concelho.
Ao FCF foi concedido o estatuto de utilidade pública por despacho de 31.08.99
pelo Primeiro Ministro, tendo sido publicado no “Diário da República” de 11.09.99 (cfr.
doc. de fls 4095).
Nos discos rígidos apreendidos do computador do arguido Bragança constavam
documentos relacionados com a actividade partidária (do PS) – cfr. auto de exame de fls
760 e ss. e o auto de exame elaborado já no decurso da audiência de julgamento.
A arguida Fátima era a líder local do PS e isso não lhe poderia passar ao lado.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


O GAPP era constituído pelo arguido Bragança (secretário pessoal) e pelas
testemunhas Júlio Pereira e Pimentel (este era assessor de imprensa), não se recordando
de mais nomes, sendo certo que os dois primeiros eram ainda militantes do PS.
Apreenderam no GAPP documentos relativos ao financiamento pela CMF do
FCF e ao PS.
Apreenderam dois discos rígidos de um computador pessoal utilizado pelo
arguido Bragança e que estavam depositados num cofre bancário.
Nesses discos existiam documentos relativos ao PS (listagem dos filiados,
correspondência relacionada com o funcionamento do partido, manifestos eleitorais e
listas de candidatos do PS).
O PS local tinha uma sede e, ao que julga, não dispunha de computador.
O GAPP estava instalado num espaço contíguo ao gabinete da arguida Fátima
Felgueiras.
Esta era a líder local do PS.
Tem a convicção que esses assuntos relacionados com o PS eram tratados no
GAPP.
Encontraram ainda na CMF pastas relativas ao FCF (a maior parte seria para dar
conhecimento à arguida Fátima acerca do que se passava nesse clube, até porque ela era
a presidente da Assembleia Municipal do FCF; outros relacionavam-se com a recolha
de fundos para esse clube, como por exemplo convites endereçados pela arguida Fátima
nesse sentido).
A propósito dos documentos relacionados com a recolha de donativos para o
FCF, consta de fls 411 a 413 quadros referentes ao mapa de recolhe de fundos para esse
clube, onde refere inclusive datas de entregas desde 05.02.98 a 3.04.98. Essa pasta foi
apreendida no GAPP.

651
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

A fls 440 a 443 do apenso 15 consta uma listagem de empresas e respectivos


sócios a fim de serem convocados para uma primeira reunião.
A fls 441 do apenso 15, consta um documento elaborado em papel do GAPP, o
qual se reporta a uma carta/circular de 19.11.98 e cujo objectivo era o da obtenção de
apoios para o FCF (convite endereçado pela arguida Fátima para tomar café no seu
gabinete).
A fls 442 do apenso 15 consta uma segunda listagem de empresas e respectivos
sócios a fim de serem convocados para uma segunda reunião, sempre com o mesmo
objectivo.
O documento de fls 443 do apenso 15 é igual ao documento de fls 441 do
mesmo apenso, mas de uma data posterior.
A fls 446 do apenso 15 consta um ofício escrito em papel do GAPP à “Calzeus”,
agradecendo o contributo mensal dado por essa empresa ao FCF, documento esse
assinado pela arguida Fátima.
A fls 476 do apenso 15 consta um documento semelhante mas dirigido à “CAC”
(com conhecimento ao presidente do FCF).
A fls 216 a 218 do apenso 16 constam listagens, a primeira relacionada com os
industriais e a segunda de ex-dirigentes.
A fls 219 do apenso 16 consta uma carta/circular em papel com o timbre da
CMF (Gabinete da Presidente), datada de 17.03.98, onde se fazia a marcação de uma
reunião para o dia 23.03, pelas 18h., na Biblioteca Municipal, missiva essa que é
assinada pela arguida Fátima na qualidade de presidente da edilidade, mas no texto
dessa carta invoca a sua qualidade de presidente da Assembleia Geral do FCF.
A fls 228 a 231 do apenso 16 encontram-se listagens semelhantes às já referidas,
onde se manuscreverm os contactos telefónicos e as expressões “não” em alguns deles.
Como esses assuntos não diziam respeito à autarquia (mas ao FCF), entende que
não é normal ter-se encontrado aquele tipo de documentação na CMF, pelo que conclui
que o GAPP e os seus funcionários foram utilizados para tratar de assuntos que nada
tinham a ver com a CMF.
O FCF foi declarado pessoa de utilidade pública, segundo despacho de Agosto
de 1999 e publicado no DR de 11.09.99 (cfr. fls 4905 e 4906).

- Testemunha Artur Manuel da Silva Carvalho Borges


Quando o depoente foi presidente da Câmara Municipal de Baião não existia o
GAPP.
O GAPP era um gabinete de apoio ao presidente, o que pressupõe um trabalho
de perto com o presidente da autarquia e com a sua agenda, quer com organizações
governamentais quer com organizações não governamentais e sociedade civil.
O depoente foi chefe de gabinete da arguida Fátima Felgueiras em 2002/2003.
Ela era uma pessoa muito empreendedora, sobretudo para resolver os problemas
dos mais necessitados. Isso obrigava o GAPP a trabalhar duramente.
No GAPP haviam dossiers sobre tudo, como por exemplo, sobre comissões de
festas e associações de todo o tipo.
No que se refere ao atendimento de munícipes, fazia-se uma ficha de
atendimento, onde se apunha o assunto em causa e remetia-se a despacho da arguida
Fátima Felgueiras.
Não é normal que os elementos do GAPP tratem de assuntos do partido,
designadamente elaboração de textos.

652
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Há campanhas de angariação de fundos para determinadas causas em que o


presidente da câmara municipal pode ter intervenção, designadamente no que se refere à
angariação de fundos para causas de solidariedade social.
No âmbito do futebol profissional não lhe parece normal que o GAPP faça
textos relacionados com a angariação de fundos. Porém, se se tratar de camadas jovens,
acha normal, pois é importante o fomento do desporto. Em todo o caso, a angariação de
fundos tem de ser feita para o clube, cuja direcção posteriormente encaminhará os
fundos para as suas necessidades.
É vulgar que um presidente de câmara seja o presidente da assembleia geral de
um clube.
Não exclui que seja normal no GAPP a existência de uma lista de empresas que
dão donativos para o clube e cópia de cheques de donativos. Em todo o caso, quando
integrou o GAPP não se recorda de ter visto nada disso nem acredita que isso possa ter
sido assim.

Análise crítica
Antes de mais, cabe referir que o GAPP foi criado por lei, mas a concreta
composição desse gabinete foi definida pela arguida Fátima após as eleições de
Dezembro de 1997, na justa medida em que o exercício de funções nesse lugar
pressupõe a confiança política de quem comanda os destinos da autarquia, conforme
aliás o reconheceu a arguida Fátima Felgueiras.
Ora, da panóplia de documentos acima referidos a propósito dos vários
depoimentos (e para os quais remetemos) e dos autos de exame aos dois discos rígidos
do computador usado pelo arguido Bragança (um desses exames já realizado no decurso
do julgamento), temperados sobretudo pelos depoimentos do arguido Horácio Costa e
da testemunha José Júlio Pereira, pode-se concluir que, de facto, no GAPP tratavam-se
de assuntos relacionados exclusivamente com o PS local, com a ADEC, com o jornal
“O Sovela” e com o FCF, nos moldes dados como provados.
Argumenta a arguida Fátima que na CMF existiam dossiers a propósito das
diferentes colectividades do concelho e que cabe à autarquia apoiá-las (não existia
porém, por exemplo, um dossier relativo ao FC da Lixa).
Porém, no que respeita ao FCF, a “colaboração” – chamamos-lhe assim –
ultrapassa em muito o mero apoio da autarquia, pois dir-se-ia que o GAPP, a dada
altura, constituiu-se numa espécie de serviços administrativos desse clube e da
presidente da respectiva assembleia geral.
Essa parece-nos ser, s.m.o, a conclusão a retirar da variada documentação
referenciada (no que a esse clube diz respeito), sendo certo que quanto ao facto de
serem ali tratados assuntos do PS, da ADEC e do “Sovela” nos parece mais gritante a
exorbitância das funções para as quais, por lei, o GAPP foi criado.
Triste figura fizeram as testemunhas Leonor Costa e Armindo Brochado, os
quais, trabalhando num espaço exíguo de cerca de 12 m2, conseguiram a proesa de nada
se terem apercebido, chegando a desfaçatez da testemunha Leonor ao ponto de, tendo
estado na recepção do GAPP, ter declarado nunca ter rececpcionado pessoas que ali iam
tratar de assuntos, por exemplo, ligados ao PS.
A credibilidade de tais testemunhas é assim pouco maior do que zero.
Já as declarações do arguido Horácio, nesse particular, são fidedignas, pois a
suportá-las estão vários documentos referenciados ao longo do julgamento, ainda que
não mencionados especificamente por causa deste ponto da pronúncia.
É claro que, na senda da postura típica de quem procura a torto e a direito
sacudir a água do seu capote, a arguida Fátima Felgueiras assegurou que, caso de facto

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

tenham sido tratados assuntos relacionados com o PS no GAPP, disso não teve
conhecimento nem deu autorização.
Ora, se os vereadores não podiam espetar um prego que fosse sem o
conhecimento dela ou autorização, muito menos o fariam os funcionários do GAPP,
cujas funções dependiam da respectiva confiança política, sendo certo que o exercício
das respectivas funções era executado em estreita colaboração com a arguida Fátima
Felgueiras, como aliás não poderia deixar de ser.
Não é assim manifestamente credível que ela não tivesse conhecimento e que
não tivesse dado o aval ao facto do secretário-coordenador do partido tratar no GAPP de
assuntos relacionados com o PS, tanto mais que na sede local deste partido, à data,
inexistia qualquer computador, facto de que a arguida Fátima não podia ignorar.
Seja como for, o uso abusivo do GAPP para fins que exorbitavam a sua
competência, traduz-se, ao fim ao cabo, no uso dos respectivos funcionários, de material
informático, incluindo uma fotocopiadora e papel.
A propósito do valor dos objectos em causa (s.m.o., o uso de pessoas é
irrelevante em face do tipo legal em causa) nenhum meio de prova foi produzido.
De resto, não será já possível proceder-se a qualquer avaliação, sendo certo que
ignoramos qual era o modelo dos equipamentos usados, qual o seu tempo de uso e se
eram ou não obsuletos, sendo aliás previsível que tenham sido destruídos.
Assim, quando muito, só baseados nas regras da experiência comum poderemos
vislumbrar qual o valor global aproximado, o que, diga-se, é fundamento que não deixa
de ter pés de barro.
Na verdade, sem termos os dados já referenciados quanto àquele equipamento,
mesmo socorrendo-nos das ditas regras da experiência comum, seria temerário adiantar
qualquer valor.
Quanto à relevância penal dos factos apurados a propósito deste ponto da
pronúncia, a seu tempo tomaremos posição neste acórdão.

- A convicção do Tribunal a propósito do 11º capítulo da pronúncia

O loteamento do Bustelo

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
A propósito dos contratos-promessa referidos na pronúncia, assegurou que deles
não tinha qualquer conhecimento pois o seu então marido não lhos deu a conhecer.
Confirmou ter recebido o documento constante de fls 280 do 2º volume em fins
de 1999 ou princípios de 2000 das mãos do seu filho João (manuscrito do seu marido
relatando o historial do loteamento do Bustelo).
Na sequência do recebimento desse documento a depoente confirmou ter
manuscrito o documento de fls 287 a 291 dirigido ao seu marido, o qual lho mandou
entregar pelo seu filho João.
Explicou que a ruptura com o seu então marido já vinha de 1993, daí que
comunicação entre ambos fosse difícil e daí a necessidade dos manuscritos em causa.
Consequentemente, quando teve intervenção na apreciação do respectivo
processo de loteamento, ignorava que o seu marido se encontrava ligado a esse
empreendimento.
Em face da análise do processo de loteamento nº 173/90 (cujo requerimento
inicial deu entrada na CMF a 05.06.90) não pôs em causa a matéria invocada na
pronúncia a propósito da sua intervenção em tal processo, quer enquanto veradora quer

654
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

enquanto presidente da edilidade, salientando porém que sempre agiu de acordo com as
informações prestadas pelos serviços.
Assim, por exemplo, explicou que não foram aceites os lotes nºs 30 e 31 como
garantia de execução das obras de urbanização na medida em que eram grandes e
periféricos, sendo certo que ao longo de tal processo de licenciamento de loteamento
foram tomadas decisões desfavoráveis ao requerente, tendo sempre em conta as
informações dos serviços.
Confirmou que de facto foi instaurado o processo de contra-ordenação nº 307/92
ao Sr. Fortunato pelas razões expostas na pronúncia, por participação dos Serviços de
Fiscalização, datada de 22.10.92 (e não 20.10.92, conforme consta da pronúncia).
Explicou que, entretanto, uma vez que o processo de licenciamento do
loteamento foi regularizado, conforme era prática habitual na CMF, o processo de
contra-ordenação foi arquivado com admoestação por decisão de 14.01.98.
Ignora se o seu marido ou o Sr. Fortunato tentaram vender lotes ao arguido
Joaquim Freitas ou ao Sr. Fernando Sampaio da Lixa.
Ignora se algum dos lotes 30 e 31 se destinava ao seu marido.
Aliás, nunca teve qualquer reunião com o Sr. Fortunato a propósito do
loteamento do Bustelo.

- Arguido Horacio Costa


Em meados de 1998, o Dr. Sousa Oliveira pediu a comparência do depoente no
seu escritório, o que fez com a autorização da arguida Fátima, e pediu-lhe que encetasse
uma intervenção conciliadora junto do Sr. Fortunato, pois tinha alguns problemas com
ele. Deu-lhe então nota de alguns pormenores, como por exemplo que pediu dinheiro a
um irmão dele (que é padre); mencionou-lhe problemas relacionados com as tampas de
saneamento, as quais eram susessivamente furtadas e repostas; e problemas em acertar
contas com o dito Fortunato.
O Dr. Sousa Oliveira, logo nesse primeiro encontro, chegou a referir-lhe que
sabia que o depoente tinha contactos com uns empreiteiros de Guimarães e que esteve
envolvido em negócios imobiliários na empresa do seu sogro, manifestando então a sua
intenção de vender a sua parte no empreendimento do loteamento do Bustelo e pedindo
ao depoente que lhe arranjasse comprador. Não o fez porque não queria transferir para o
eventual comprador os problemas que o Dr. Sousa Oliveira tinha com o Sr. Fortunato.
Soube que o Dr. Sousa Oliveira pedira o mesmo ao Sr. Fernando Pereira
Sampaio e ao arguido Joaquim Freitas, informação que confirmou junto deles.
O Dr. Sousa Oliveira transmitiu-lhe ainda que a arguida Fátima tinha de o ajudar
a resolver o problema pois ela também tinha interesse nisso.
Ele chegou a elaborar uma exposição por escrito mas tal documento não lhe
chegou às mãos (cfr. manuscrito de fls 280 e ss. do 2º volume).
O arguido Bragança entregou-lhe documentos relacionados com o tema em
questão e que estavam guardados no arquivo dos assuntos pessoais da presidente da
CMF.
Expôs à arguida Fátima o que lhe tinha sido dito pelo Dr. Sousa Oliveira,
designadamente que haveria que proceder a uma vistoria pela CMF para fazer a divisão
dos lotes e que o loteamento também era dela daí que tinha também de se
responsabilizar.
A arguida Fátima forneceu-lhe então uma planta do loteamento e contou-lhe que
inicialmente os lotes 30 e 31 (os maiores) serviriam para construir duas vivendas, uma
para cada um dos casais proprietários. Quando essa hipótese foi posta de lado e porque
devido à área desses lotes era difícil arranjar comprador, ela disse-lhe que se

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

perspectivou então a alteração desses lotes no sentido de neles se proceder a uma


divisão de modo a criar mais lotes, mais facilmente vendáveis.
O depoente procurou então a Engª Fernanda Adriana (responsável pelas
vistorias) para ver em pormenor o que se passava. Ela referiu-lhe muitos problemas e
mostrou reticências em abordar consigo esse assunto, remetendo-o para o arguido
Barbieri Cardoso e para o Eng. Leite (que segundo ela terá feito os projectos de
especialidade).
Não os contactou na medida em que entendeu que era ir para além do que lhe foi
pedido (e que se prendia com a questão das vistorias).
Tem quase a certeza que se reuniu com a dita Engª Adriana e com a arguida
Fátima no gabinete desta a propósito do loteamento em causa.
O depoente conhecia um filho do Sr. Fortunato (chama-se Eugénio e é
arquitecto) e solicitou que ele se deslocasse ao seu gabinete, o que ele fez. Transmitiu-
lhe as informações que ouvira do Dr. Sousa Oliveira e procurou conciliar as partes. O
dito Eugénio referiu então ao depoente que o seu pai era um “turras” e que os problemas
com esse loteamento já vinham de longe, sendo certo que já tinham procurado obter
junto do Dr. Sousa Oliveira um acordo mas sem sucesso, pois sempre se manteve
irredutível. Mostrou-se assim renitente em meter-se nesse assunto, mas acedeu em falar
com o pai. Mais tarde telefonou-lhe e deu-lhe conta de que nada tinha conseguido.
Transmitiu então ao Dr. Sousa Oliveira e à arguida Fátima os resultados
infrutíferos da sua acção.
Ainda sobre o assunto em questão a arguida Fátima, no final de 1998, chegou a
instruí-lo para ir ao escritório do Dr. Sousa Oliveira, pois uma das preocupações dela
era a metodologia a seguir para a divisão dos lotes.
Foi confrontado com o manuscrito da arguida Fátima e dirigido ao Dr. Sousa
Oliveira (cfr. fls 287 a 291).
Por causa deste assunto foi instaurado um processo de perda de mandato da
presidente da autarquia e que terminou com a sua absolvição.
Tem uma vaga ideia do presidente da Assembleia Municipal de então (Dr.
Barros Moura) ter tomado uma posição sobre o assunto (aliás parte dos documentos
foram remetidos por ele ao MP – cfr. fls 279 a 287).
Sinal de que ela sabia que o loteamento do Bustelo pertencia de facto também ao
Dr. Sousa Oliveira são as entrevistas que deu ao “Comércio do Porto” (cfr. fls 295 e
296) e ao “Independente” (cfr. fls 294).
O Dr. Sousa Oliveira chegou a comentar consigo que numa reunião de Câmara a
arguida Fátima tinha votado em causa própria a aprovação do loteamento do Bustelo e
que o arguido Júlio Faria sabia disso.

- Arguido Joaquim Freitas


O Dr. Sousa Oliveira quis-lhe vender 50% do loteamento em causa (a parte que
pertencia ao Sr. Fortunato), ao que pensa antes do Verão de 1998. Se tivesse aceite o
negócio tudo ficaria em seu nome (redigir-se-ia um documento particular que
salvaguardasse a posição do Dr. Sousa Oliveira) porque a esposa do Dr. Sousa Oliveira
era a presidente da edilidade.
Chegou a ver o dito loteamento e observou que existiam dois lotes grandes e o
Dr. Sousa Oliveira disse-lhe que se comprasse metade do empreendimento um dos lotes
seria para si e o outro para o dito Sousa Oliveira e esposa.
A arguida Fátima sabia que o marido tinha interesses no loteamento em causa na
medida em que lhe chegou a falar desses dois lotes grandes e que se destinariam à
construção de uma moradia para cada um dos casais.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O Sr. Sampaio da Lixa foi também contactado pelo Dr. Sousa Oliveira para
adquirir o loteamento (não sabe se antes ou depois do depoente).
Recorda-se que já em 1996 o arguido Júlio Faria queria dinheiro para o FCF e
disse-lhe que que a arguida Fátima estava “refém” porque tinha participado numa
votação a propósito do licenciamento do loteamento do Bustelo e que lhe poderia
acarretar a perda de mandato.
Foi o arguido Bragança quem entregou ao arguido Horácio o manuscrito de fls
280 a 287 do 2º volume (manuscrito do Dr. Sousa Oliveira dirigido à arguida Fátima
acerca do loteamento em causa).
Era do domínio público que esse loteamento pertencia também ao Dr. Sousa
Oliveira e à arguida Fátima.
Esta, de resto, não admitia que o Dr. Sousa Oliveira lhe escondesse qualquer
informação acerca desse negócio e ele tudo lhe revelava. Até para comprar um carro
novo ele dava conhecimento à arguida Fátima (pensa que terá sido antes de 1998,
quando adquiriu um “BMW”).

- Testemunha Maria Natal Guerreiro Sousa Pinto


Foi inspectora da IGAT durante cerca de 10 anos até ao ano 2000, altura em que
fez uma acção inspectiva ao Município de Felgueiras (a 22.08.2000 e 22.09.2000),
tendo efectuado o respectivo relatório, o qual data de 11.10.2000 (cfr. fls 569 e ss.).
Não se tratou de uma inspecção ordinária e o inquérito resultou de notícias
veiculadas pela comunicação social a propósito de alegadas ilegalidades no que respeita
ao loteamento do Bustelo.
Ouviu várias pessoas, entre as quais os arguidos Horácio Costa e Joaquim
Freitas e analisou o processo de loteamento em causa.
Já não se recorda que intervenção no dito processo teve a arguida Fátima
Felgueiras, remetendo o tribunal para o relatório que então elaborou (cfr. a fls 572 a
descrição dos vários actos praticados pela arguida Fátima).
Não se recordava igualmente se tinha sido ou não aplicada alguma coima ao Sr.
Fortunato (foi de facto aplicada uma coima de 1.000.000$00, mas o processo de contra-
ordenação acabaria por ser arquivado com uma simples admoestação a 14.01.98).
Não se recorda se era prática habitual na CMF arquivar processos de contra-
ordenação com admoestação depois de ter sido imposta uma coima.
Questionada acerca da existência de um contrato-promessa referiu não se
recordar, sendo certo que a ter existido concerteza dele fará menção no relatório
referido.
Não se recorda do manuscrito de fls 280 e ss., tendo sido confrontada com ele.
A testemunha revelou grandes lapsos de memória, remetendo sistematicamente
para o seu relatório, o qual espelha a verdade que então apurou. Seja como for, em face
do que apurou, propôs a perda de mandato da presidente da autarquia, não tendo sido
ouvida no respectivo processo (como aliás nunca o foi em casos similares).

- Testemunha Manuel Ferreira de Faria


O licenciamento do loteamento do Bustelo foi apreciado na CMF numa altura
em que integrava o executivo, em 1995. Tal licenciamento foi requerido pela
testemunha Fortunato Alves. Era presidente da autarquia o arguido Júlio Faria. Nessa
reunião estava presente a arguida Fátima Felgueiras (ela era vereadora na altura e ainda
estava casada com a testemunha Sousa Oliveira).
Não se recorda do arguido Júlio Faria, na reunião do executivo, ter feito alguma
menção especial a esse loteamento.

657
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O dito loteamento era problemático por estar situado na área do Monte de Stª
Quitéria.
Entretanto começaram a surgir notícias nos jornais de que o Dr. Sousa Oliveira
era parte interessada nesse loteamento (na altura ele era presidente da Assembleia
Municipal de Felgueiras, mandato de 1994 a 1998).
Não obstante ter inicialmente referido não se recordar de alguma menção
especial em relação a esse loteamento na reunião camarária que aprovou o respectivo
licenciamento, acabou por referir que, ao que pensa o arguido Júlio Faria, informal e
lateralmente, mencionou que o Dr. Sousa Oliveira tinha um contrato não formalizado
com a testemunha Fortunato Alves relativo a esse loteamento, precisando mais tarde
que a menção em causa ou foi no sentido de que esse relacionamento próximo entre as
testemunhas Fortunato e Sousa Oliveira se devia ao facto deste, no que ao loteamento
concerne, prestar os seus serviços àquele enquanto advogado ou de serem sócios no dito
loteamento, facto que já não pode precisar (essa menção foi negada porém pelo arguido
Júlio Faria, o qual assegurou não ter na altura qualquer suspeita acerca desse assunto,
apenas tomando mais tarde conhecimento dos interesses nesse loteamento por parte da
testemunha Sousa Oliveira pela imprensa. Também a arguida Fátima negou
veementemente qualquer comentário especial na dita reunião de câmara, sendo certo
que a funcionária que prestava assistência à reunião – testemunha Fernanda Leal - tinha
o cuidado de perguntar se algum vereador estava impedido de deliberar. Reafirmou que
só mais tarde tomou conhecimento dos interesses do marido no dito loteamento).
Nos meios políticos foi comentado o facto da arguida Fátima ter participado
numa deliberação que aprovou o licenciamento de um loteamento em que o marido era
sócio, tendo mesmo circulado panfletos acerca desse assunto em 1996 e 1997.
Deduz que a arguida Fátima, enquanto esposa da testemunha Oliveira, soubesse
que o marido era sócio nesse loteamento, mas em rigor desconhece esse facto.
Em todo o caso, do que conhecia desse casal, tem dúvidas que a arguida Fátima
soubesse de tudo o que o marido fazia e vice-versa.
Não se recorda se o Dr. Barros Sousa, enquanto presidente da Assembleia
Municipal de Felgueiras, introduziu este tema a debate (cfr. fls 279 e ss.).
Chegou a ver manuscritos referentes a este assunto e que alegadamente tinham
sido redigidos pelo então marido da arguida Fátima Felgueiras (cfr. manuscrito de fls
280 a 283, da testemunha Sousa Oliveira; o documento de fls 284 a 286, dactilografado
e dirigido à arguida Fátima, reportando-se a valores de despesas; manuscrito da arguida
Fátima, de fls 287 a 291; cfr. ainda cópia de uma entrevista dada pela arguida Fátima ao
“Independente”, cuja cópia consta de fls 294).
Os documentos em causa suportaram uma intervenção na Assembleia Municipal
por um elemento do PSD (Vítor Vasconcelos), tendo sido ele quem os entregou ao Dr.
Barros Moura (cfr. ofício de fls 279 a remeter esse manuscrito à Procuradoria Geral da
República).
Não sabe se apenas existiu uma reunião em que o loteamento do Bustelo
estivesse em discussão. Recorda-se em todo o caso de ter estado numa reunião em que
esse assunto foi discutido e no qual, informalmente, o arguido Júlio fez a referência
acima mencionada (precisou que essa menção foi informal e restrita, de sorte que nem
todos os presentes a ouviram. Precisou ainda que interpretou esse comentário no sentido
de que o Dr. Sousa Oliveira tinha interesse nesse loteamento como advogado do
requerente do respectivo licenciamento).
As reuniões de Câmara referidas na pronúncia realizaram-se numa altura em que
não era vereador (1991 e 1993). Consequentemente, a reunião onde esse assunto foi
abordado não se prendia com a aprovação do licenciamento desse loteamento.

658
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Joaquim José Teixeira Ribeiro


As suspeitas relativamente ao loteamento do Bustelo levantaram-se numa altura
em que o depoente já não era presidente da Comissão Política do PSD local.
Em todo o caso, recorda-se que essa questão do abuso de poder por banda da
arguida Fátima já se comentava informalmente numa altura em que nem sequer exercia
qualquer actividade política.
Não chegou a ver os documentos referidos nos autos, mas os mesmos foram
entregues pelo Dr. Barros Moura, ao tempo presidente da Assembleia Municipal.

- Testemunha José Luís da Costa Mendes Ribeiro


Referiu ser técnico de comunicação, tendo trabalhado no jornal “O
Independente” entre 1996 e Fevereiro de 2001, onde fazia reportagens jornalísticas.
Confrontado com o artigo desse jornal cuja cópia se acha a fls 294 e 295, do 2º
volume, referiu ser da sua autoria, com excepção do título e das duas linhas de entrada
(da responsabilidade do editor).
Nesse artigo reproduz factos através de várias fontes, sendo certo que não
conseguiu encontrar os documentos de suporte a essa notícia (cuja proveniencia não se
recorda), a qual foi publicada há mais de 7 anos.
Não se recorda de ter falado com mais alguém acerca do assunto em causa a não
ser com as pessoas mencionadas no dito artigo de jornal.
No segundo parágrafo do texto de fls 294 transcreveu uma declaração da arguida
Fátima Felgueiras, explicando que citou declarações que lhe foram feitas por essa
arguida, sendo certo que o fez com fidelidade, não as tendo inventado.
A conversa que teve com ela terá sido quase de certeza pelo telefone, embora já
não se recorde (não se recorda ainda para onde efectuou o contacto telefónico).
Explicou que quando contacta alguém pelo telefone identifica-se e explica a
razão do contacto.
No caso, não teve qualquer dúvida de que contactou com ela.

- Testemunha Adelino José Magalhães Leite


Esta testemunha, conforme já acima referido, para além de ser funcionário
camarário (com formação em engenharia electrotécnica) era sócio de duas empresas
(“Reactiva” e Imoreactiva”), fazendo assim projectos de electricidade e de telefones.
Nessa medida, referiu ter elaborado vários projectos para a testemunha
Fortunato Sousa, o qual era um construtor civil felgueirense.
O depoente elaborou projectos da 1ª e 2ª fase de electricidade para o loteamento
do Bustelo, não se recordando em que data.
Nunca questionou o dito Fortunato acerca da propriedade do terreno,
presumindo que ele era o respectivo proprietário.
Alguns anos depois, depois de ler notícias na comunicação social acerca desse
loteamento, questionou a testemunha Fortunato Sousa no sentido de saber se ele tinha
algum sócio, ao que ele lhe respondeu que o Dr. Sousa Oliveira é seu sócio nesse
empreendimento. Antes disso o depoente ignorava esse facto.

- Testemunha Eugénio Simão Teixeira de Sousa


Referiu ser filho da testemunha Fortunato Alves de Sousa.
A propósito do loteamento do Bustelo, disse que o seu pai é dono de 50%, sendo
certo que a outra metade pertencia ao Sr. Armindo, o qual por sua vez a vendeu à
testemunha Sousa Oliveira, há cerca de 17 a 20 anos.

659
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Tem a ideia que o terreno já estaria em nome do seu pai no tempo em que o Sr.
Armindo detinha 50%.
Manifestou não saber com exectidão por que motivo nunca o terreno passou
para o nome da testemunha Sousa Oliveira, pese embora tenha a ideia que seria por se
tratar de uma parte indevisa.
As despesas com o loteamento e com a contribuição autárquica eram pagas pelo
seu pai. Ignora se a testemunha Sousa Oliveira pagou alguma parte dessas despesas
Confrontado com o manuscrito de fls 280, da autoria da testemunha Sousa
Oliveira, referiu nunca o ter visto. As despesas que nesse manuscrito a testemunha
Sousa Oliveira referiu ter pago (até 1996) reportar-se-iam a trabalhos preparatórios às
obras de urbanização (sendo certo que estas últimas foram acompanhadas pelo
depoente).
O loteamento era composto por 36 lotes, desde 500 m2 a 9.000 m2 (dois lotes
tinham 9.000 m2, os lotes 35 e 36 segundo referiu sem ter a certeza, sendo certo que
parecem ser antes os lotes nºs 30 e 31). Seja como for, só existiam dois lotes grandes
(que faziam sentido pela configuração do loteamento).
Acerca do destino desses lotes, tem a ideia que a testemunha Sousa Oliveira
adquiriu a parte do Sr. Armindo para construir a sua casa num dos lotes, presumindo
que se trataria de um dos lotes grandes. Explicou que quando a testemunha Sousa
Oliveira fez essa aquisição os lotes já estavam definidos em projecto. Não conseguiu
identificar qual a sua razão de ciência (acerca das intenções da testemunha Oliveira),
mas deverá ter sido por conversas que ouviu.
No sentido de que as contas fossem feitas entre o seu pai e a testemunha Sousa
Oliveira, tentou que ambos se entendessem no que a essa matéria diz respeito, o que
nunca sucedeu.
Desde o inicio até ao fim das obras de urbanização do loteamento que abordou
três ou quatro vezes a testemunha Sousa Oliveira no escritório dele acerca desse assunto
(mais ou menos entre 1997 e 1999).
As obras de urbanização demoraram cerca de ano e meio a serem concluídas.
Foram apresentadas as contas à testemunha Sousa Oliveira, mas nunca chegou a
haver um consenso acerca delas.
Transmitiu entretanto ao seu pai a impossibilidade de se chegar a um acordo.
Tem a ideia que a testemunha Sousa Oliveira conversou acerca desse assunto
com outra pessoa (que não soube identificar).
Não sabe se ele procurou vender a sua parte.
Já ouviu falar da testemunha Sampaio (da Lixa), mas não o conhece
pessoalmente.
Ignora se ele foi contactado pela testemunha Sousa Oliveira no sentido de
adquirir a parte deste.
Que se lembre, referiu não ter falado deste assunto com a arguida Fátima
Felgueiras.
Tem a ideia que o seu pai também não falou com ela acerca deste assunto, mas
só ele é que o poderá esclarecer.

- Testemunha Fernando Pereira Sampaio


Não sabia que a testemunha Sousa Oliveira era sócio desse empreendimento na
proporção de 50%.
Soube desse facto porque ele lho disse quando se mostrou interessado em vender
lotes, por alturas do ano 2000. Confidenciou-lhe ainda que estava a ficar chateado com
o sócio (testemunha Fortunato).

660
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nessa altura ele referiu-lhe ainda que estava a tratar do divórcio (era à data ainda
casado com a arguida Fátima) e que precisava de despachar aquilo.
Ele manifestou-lhe a intenção de vender a sua parte e perguntou ao depoente
senão estaria interessado nesse negócio ou se conhecia alguém interessado.
O depoente não se mostrou interessado na aquisição e chegou a levar lá um
cliente seu para ver os lotes com a testemunha Sousa Oliveira.
Recorda-se que quando ele mostrava os lotes identificava aqueles que lhe
pertenciam.
Que se recorde, nunca a testemunha Sousa Oliveira lhe referiu que a arguida
Fátima era comproprietária.
Não se recorda dele utilizar a expressão “casal”.
Não tem presente se ele relacionou a venda da sua parte nesse loteamento com a
partilha dos bens comuns do casal, mas tem a ideia que nunca comentou esse facto.

- Testemunha Fortunato Alves de Sousa


Foi o depoente quem iniciou o loteamento do Bustelo.
Teve uma sociedade com o vendedor do terreno onde foi implantado esse
loteamento (Armindo Leite da Silva).
Há cerca de 20 anos comprou-lhe metade, não tendo adquirido a totalidade do
terreno apesar do Sr. Armindo pretender vender-lhe tudo. Ele acabou por vender os
restantes 50% à testemunha Sousa Oliveira, por 9.000 cts, tendo celebrado para o efeito
um contrato-promessa de compra e venda.
Acordaram entretanto lotear todo o terreno, conforme já era intenção do
depoente, combinando que cada um suportaria 50% dos respectivos encargos.
O depoente celebrou então com a testemunha Sousa Oliveira um contrato-
promessa de compra e venda como forma de garantia do dinheiro que ele iria investir no
projecto.
Precisou que a escritura de compra e venda do terreno foi feita apenas com o
depoente na qualidade de comprador (não se recorda em que data), de modo que o
registou em seu nome, tendo sido por essa razão que celebrou o aludido contrato-
promessa de compra e venda no que respeita a metade do terreno para que a posição
dele ficasse garantida.
A escritura e o aludido contrato-promessa não foram celebrados no mesmo dia.
Não sabe porque razão ele não figurou na escritura de compra e venda como
comprador e não se recorda quem sugeriu que ele não celebrasse a dita escritura.
Salvo erro, o projecto do loteamento foi feito pelo Engº Alexandre Silva.
O loteamento deve abranger uma área de cerca de 40.000 m2. Só depois de
efectuado o projecto é que souberam quantos lotes comportaria (31 ou 32 lotes; são
porém 36 lotes, conforme se verifica pelo projecto), com áreas compreendidas entre 380
m2 a pouco mais de 1.000 m2, com excepção de dois, um com mais de 8.000 m2 e
outro com com pouco mais de 9.000 m2, sendo este último para a testemunha Sousa
Oliveira (cfr. a planta do loteamento, de Dezembro de 1994, constante de fls 2895). Ele
referiu-lhe que gostava desse lote (provavelmente depois de ter sido feito o projecto,
pois antes não estavam definidos os lotes), não sabendo qual o destino que lhe pretendia
dar (não se recorda dele o ter mencionado), mas presume que seria para nele construir
uma casa.
Não existiu uma divisão de lotes entre ambos, mas acordaram que o lote maior
(de pouco mais de 9.000 m2) seria para a testemunha Oliveira e que o segundo lote
maior (de oito mil e tal m2) seria para o depoente.

661
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Foi o depoente quem assumiu todo o processo de licenciamento junto da CMF


(cfr. processos nºs 173/90 e 29/96).
Faltava cerca de um mês para arrancar com as obras do loteamento e a
testemunha Sousa Oliveira não lhe entregara ainda a sua comparticipação nos custos do
empreendimento para que a obra pudesse arrancar.
Decidiu o depoente avançar com as obras e exigiu-lhe o pagamento de metade
das despesas. Ele entretanto, no início das obras, fez-lhe alguns pagamentos que
cobriam uma pequena parte das despesas que suportara. Incompatibilizaram-se assim
por esse motivo.
Uma vez que o seu filho (a testemunha Eugénio Sousa) tem mais paciência que
o depoente, ele foi falar com a testemunha Sousa Oliveira no sentido de se chegar a um
consenso, o que não conseguiu.
Tem a ideia que a testemunha Oliveira não pagou metade das contribuições
autárquicas referentes a 1996, 1997 e 1998 (antes disso tinha pago a parte que lhe
competia a esse título).
Elencou a testemunha as despesas que suportou com as terraplanagens (foi alvo
de uma contra-ordenação pelo facto de as ter efectuado sem licença), com o registo da
aquisição do terreno, com o projecto do loteamento (não se recorda se houve ou não
aditamento), com a execução dos arruamentos e com a execução de plataformas.
Referiu já não se recordar qual a quantia que a testemunha Sousa Oliveira lhe
deu, sendo certo que foi pouco.
Foi então a testemunha confrontada com o manuscrito da testemunha Oliveira,
dirigido à arguida Fátima, constante de fls 280, do 2º volume, alusivo ao dito
loteamento, referindo ignorar quem é o seu autor, nunca tendo visto tal documento.
Realçou que no início das obras do loteamento a testemunha Oliveira pagou-lhe
uma pequena parte das despesas que suportara, tendo-lhe mais tarde apresentado uma
conta de cerca 5.000 cts, cabendo-lhe pagar cerca de 2.500 cts, altura em que o seu filho
foi falar com ele várias vezes durante uma semana, aliás sem sucesso.
Desde esse momento nunca mais esteve com essa testemunha, com quem aliás
está incompatibilizado.
Não é amigo nem inimigo da arguida Fátima Felgueiras, tendo a ideia que falou
com ela em duas ocasiões acerca do loteamento (tem a certeza que pelo menos uma vez
falou com ela acerca desse assunto – dívidas da testemunha Oliveira para com o
depoente por causa do loteamento -, numa ocasião em que se deslocou à CMF, no piso
de cima, não sabendo precisar se foi no gabinete dela ou noutro espaço, ao que ela lhe
respondeu que esse assunto deveria ser tratado com o seu marido – ou melhor, tem a
ideia de ter referido o nome da testemunha e não a expressão “marido” - e não com ela).
Não se recorda em que altura abordou com ela esse assunto.
Foi ainda a testemunha confrontado com o manuscrito de fls 288 (manuscrito da
arguida Fátima de resposta ao manuscrito da testemunha Oliveira), referindo ignorar de
quem é a autoria desse documento.
Não se recorda se à data eles ainda eram casados ou se já estariam divorciados.
Pelo menos depois de conversar com ela acerca do loteamento, se não sabia,
passou a saber que a testemunha Sousa Oliveira tinha nele interesses. Antes dessa
conversa ignora se ela estava ao corrente desse facto, mas admite que o marido lho
tenha contado.
Não se recorda se ela demonstrou surpresa por esse facto ou não quando
conversou com ela acerca desse assunto.
Salientou que até à data só vendeu 5 ou 6 lotes. Não se recorda quanto
despendeu no loteamento, mas foi uma soma elevada.

662
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Henrique Manuel da Silva Correia


Foi o arguido Horácio quem lhe entregou os documentos que se prendem com
este tema do loteamento do Bustelo (o presidente da Assembleia Municipal, Dr. Barros
Moura, remeteu também cópia desses documentos à Procuradoria Geral da República –
cfr. o respectivo ofício de fls 279, com o qual se remeteu os documentos de fls 280 a
295).
A arguida Fátima Felgueiras, enquanto veradora primeiro e presidente da CMF
depois, tomou decisões no âmbito do respectivo processo de licenciamento do
loteamento em causa.
Viu um documento alusivo ao “Historial do loteamento do Bustelo”, efectuado
pela testemunha Sousa Oliveira e dirigido à arguida Fátima Felgueiras, constante de fls
280 a 283 dos autos.
Dos autos consta ainda um documento dactilografado, de 15.12.99, constante de
fls 284 e ss., dirigido à arguida Fátima.
A fls 287 a 291 consta um documento (sem data) da arguida Fátima dirigido ao
“Zé” (testemunha Sousa Oliveira). Salientou o facto de desse texto não se constatar
qualquer estranheza pelo facto do marido ser comproprietário desse loteamento, além de
que ela também se assume como comproprietária do mesmo.
A testemunha Fortunato era proprietário de ½ desse loteamento, pese embora a
totalidade do terreno estivesse em seu nome e tenha sido em nome dele que deu entrada
na CMF o respectivo processo de loteamento.
A fls 294 consta uma notícia acerca deste assunto na edição de 09.06.2000 do
jornal “O Independente”, onde ela também se assume como comproprietária desse
loteamento.

- Testemunha Carlos Manuel Ferreira Alves


Em face dos manuscritos de fls 280 do 2º volume (manuscrito da testemunha
Sousa Oliveira para a arguida Fátima Felgueiras) e de fls 287 e ss. (manuscrito de
resposta da arguida Fátima à testemunha Sousa Oliveira) concluiu que metade do
terreno onde foi implantado o loteamento do Bustelo pertencia à testemunha Sousa
Oliveira.
A arguida Fátima Felgueiras, quer enquanto vereadora quer enquanto presidente
da edilidade, teve intervenção no respectivo processo de licenciamento do dito
loteamento, conforme exposto no relatório da IGAT, elaborado pela testemunha Maria
Natal.
Tem a ideia que em 1996 a arguida Fátima e a testemunha Olivera já estariam
separados (não sabendo se já estariam divorciados).
A primeira despesa com o loteamento data de 1989, segundo o manuscrito de fls
280.
O Eng. Leite é técnico da autarquia e, segundo esse manuscrito, fez o projecto
de electricidade do loteamento.
Existiam desentendimentos entre as testemunhas Sousa Olivera e Fortunato e
aquele elaborou esse manuscrito para que a arguida Fátima intercedesse na resolução do
conflito antes de se fazer a escritura de compra e venda.
No manuscrito de fls 287 a 291 (da arguida Fátima para a testemunha Oliveira)
são referidas reuniões com a testemunha Fortunato, além de que ela ali se assumiu como
comproprietária do terreno.

663
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

À pergunta efectuada no sentido de se saber se existe algum elemento que


aponte no sentido de se situar no tempo esses manuscritos, referiu que o documento de
fls 284 (presumivelmente elaborado pela testemunha Sousa Oliveira) data de 15.12.99.
Na resposta a arguida Fátima não mostrou qualquer estranheza ou
desconhecimento da situação de compropriedade desse terreno, aludindo inclusive a
reuniões com a testemunha Fortunato a esse propósito.
Além disso, na notícia publicada na edição de 09.06.2000 do “Independente”
são citadas declarações da arguida Fátima, onde ela assume essa compropriedade do
terreno (cfr. fls 294) .
Presume assim que ela sabia do negócio celebrado pela testemunha Sousa
Oliveira a propósito desse loteamento.
Na acção de perda de mandato que lhe foi instaurada ela viria a ser absolvida (a
testemunha Maria Natal não foi ouvida nesse processo).

- Testemunha José Alves de Sousa Oliveira


Em 1989 celebrou um contrato-promessa de compra e venda (como promitente
comprador) com o Sr. Armindo Leite da Silva, o qual era proprietário de um monte, do
qual já tinha vendido uma parte.
A testemunha Fortunato loteou a parte de baixo desse monte (parte que tinha
adquirido ao Sr. Armindo).
O depoente resolveu adquirir a parte de cima do monte (tem a ideia que por
9.000.000$00).
Explicou que em 1975, com dinheiro seu, comprou um lote de terreno para nele
construir uma casa (casou com a arguida Fátima em Janeiro de 1975).
Entretanto o arguido Júlio Faria porpôs-lhe a compra de uma parte do quintal da
casa dele e, tendo o depoente aceite essa proposta, adquiriu esse terreno, o qual vendeu
até 1988.
Foi por isso que teve dinheiro para adquirir o dito monte por 9.000 cts.
Nunca deu satisfações à arguida Fátima desse facto.
Apenas lhe disse, em 1989, que era capaz de comprar um monte (não lhe disse
qual).
Explicou que o seu relacionamento com a arguida Fátima deteriorou-se quando
ela entrou para a política
Não conversava com ela acerca de assuntos patrimoniais.
Entretanto acedeu à proposta da testemunha Fortunato para lotear a totalidade do
monte, com a condição de nele se contemplar dois lotes grandes, sendo certo que num
deles pretendia construir uma casa.
Quando fez o contrato-promessa com essa testemunha ele já tinha passado o
terreno para o nome de uma firma que possuía, facto que desconhecia à data.
O documento que manuscreveu, dirigido à arguida Fátima e alusivo ao
loteamento do Bustelo, foi redigido já no período de consumação do divórcio entre
ambos, em Dezembro de 1999, numa altura em que o filho da testemunha Fortunato
andava atrás do depoente por causa de umas despesas com esse loteamento, já que à
data se havia incompatibilizado com a dita testemunha Fortunato.
Escreveu esse documento no sentido dela mediar o conflito que tinha com a dita
testemunha.
Ela não tinha conhecimento de nada.
Remeteu esse manuscrito (constante de fls 280 do 2º volume) pelo seu filho João
Felgueiras, documento esse que foi furtado na CMF e alguns meses depois é exibido na
Assembleia Municipal de Felgueiras.

664
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Nunca recebeu qualquer resposta da arguida Fátima.


No manuscrito escreveu que o loteamento também era dela apenas e só no
sentido de a sensibilizar a mediar o referido conflito.
Nega que tenha tentado vender a sua parte nesse loteamento, designadamente à
testemunha Fernando Sampaio, pois era incapaz de endossar a alguém o problema que
tinha. Aliás, nada poderia vender porque esse imóvel não lhe pertencia.
Não se lembra de ter falado com o arguido Horácio Costa acerca desse assunto,
mas admite que sim.
O depoente foi ouvido pela inspectora Natal acerca desse assunto no âmbito da
inspeção levada a cabo pelo IGAT à CMF (cfr. fls 576 do 3º volume), sendo certo que
quando foi convocado para ser ouvido por ela não sabia ao que ia. Nega ter-lhe dito que
havia dado conhecimento à arguida Fátima da aquisição do referido monte, facto de que
só lhe deu conhecimento em Dezembro de 1999.

- Testemunha António Celestino Magalhães da Silva


Quando saíram as notícias referentes ao loteamento do Bustelo, o Dr. Sousa
Oliveira comentou consigo o que na verdade se tinha passado.
Ele disse-lhe então que nos princípios dos anos 90 havia adquirido o terreno em
causa e que nele iria construir uma casa.
Muitos anos depois (1998/99) o Dr. Sousa Oliveira mostrou-lhe o contrato-
promessa de compra e venda que havia celebrado com a testemunha Fortunato e esposa,
dizendo-lhe que queria que o depoente propusesse a respectiva acção judicial, na
medida em que esse contrato não tinha qualquer valor visto que o monte não estava em
nome dos promitentes-vendedores mas de uma sociedade comercial de que a
testemunha Fortunato era sócio. O Dr. Sousa Oliveira sentia-se defraudado.
O depoente aconselhou-o então a falar com os promitentes-vendedores, na
medida em que até poderiam não estar de má fé, sugestão que ele negou na medida em
que estava incompatibilizado com a testemunha Fortunato.
Sugeriu então o depoente que a testemunha Sousa Oliveira colocasse o problema
à arguida Fátima, no sentido de mediar o conflito e ele disse-lhe que “iria ver”.
Na altura entre ambos existia já uma ruptura total, sendo certo que era o filho
João quem servia de intermediário (eles separaram-se de facto de 1996).
O Dr. Sousa Oliveira escreveu então uma carta que remeteu à arguida Fátima
Felgueiras através do filho de ambos (o João).
Esse terreno não constou da relação de bens comuns.
Pensa que a arguida Fátima não teria conhecimento desse negócio. Se o Dr.
Sousa Oliveira contou a história do loteamento do Bustelo por escrito à arguida Fátima,
parece ao depoente um indício de que ela de nada saberia.
Essa acção ainda não foi intentada na medida em que estão à espera que este
julgamento termine.
É possível que a arguida Fátima tivesse tido conhecimento da aquisição desse
monte e da intenção da testemunha Sousa Oliveira de nele construir uma casa, mas em
bom rigor não sabe. Se o Dr. Sousa Oliveira tinha essa intenção é possível que o tivesse
comunicado à sua então esposa, numa altura em que o relacionamento entre ambos era
normal.
Desde então a testemunha Sousa Oliveira nunca mais lhe falou do monte em
causa e da possibilidade de nele construir uma casa.
Sabe que alguém violou a correspondência da testemunha Sousa Oliveira
(respeitante ao loteamento do Bustelo) dirigida à arguida Fátima Felgueiras, segundo

665
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

deduz, correspondência essa levada para esta através do João e que foi divulgada na
comunicação social e na Assembleia Municipal de Felgueiras.
Ignora se a arguida Fátima respondeu ao Dr. Sousa Oliveira.
*
Em face destas declarações, o arguido Horácio Costa referiu que a testemunha
Sousa Oliveira adquiriu uma casa em Felgueiras para viver com a família (ou antes,
celebrou um contrato-promessa de compra e venda referente a uma casa), sendo certo
que o contrato definitivo ainda não foi celebrado. Sabe disso porque foi assessor da
arguida Fátima Felgueiras.
Além disso, actualmente, a arguida Fátima vive com o seu ex-marido, a
testemunha Sousa Oliveira.
*
Da acareação efectuada entre as testemunhas Maria Natal e Sousa Oliveira
resultou o seguinte:
A testemunha Maria Natal referiu que se no seu relatório escreveu o que foi lhe
referido pela testemunha Sousa Oliveira é porque na verdade colheu essa informação do
documento onde se baseou (auto de declarações) – cfr. relatório de fls 567 a 584.
Por seu turno, a testemunha Sousa Oliveira manteve que não deu conhecimento
à sua então esposa do negócio relativo ao “monte”.
Explicou que só no dia seguinte a ter prestado declarações é que assinou o
respectivo auto.
No processo inspectivo referiu que só em 1989 é que deu conhecimento à
arguida Fátima da celebração do referido contrato-promessa e que nos anos posteriores
não lhe deu conhecimento do desenvolvimento do loteamento do Bustelo.
Explicou que na verdade existem dois loteamentos no local, um referente à parte
de baixo do terreno (que foi apresentado mais cedo), sendo certo que o loteamento
efectuado na parte de cima do terreno só veio a ser aprovado muito mais tarde.
À data da celebração do contrato-promessa, assegurou que só prometeu comprar
a parte do monte sobre o qual à data não incidia qualquer processo de loteamento
(existia um processo de loteamento, à espera de aprovação, referente à parte de baixo do
terreno e com o qual nada teve a ver).
Deu conhecimento à arguida Fátima de que tinha comprado parte do monte
depois das eleições de 1989 (mas não lhe mostrou o contrato-promessa), quando ela foi
para a CMF como vereadora, não lhe tendo dado entretanto conhecimento dos passos
subsequentes e que conduziram ao loteamento em causa nos autos.

- Testemunha José Joaquim Almeida Lopes


A propósito do loteamento do Bustelo, contou que em 1999 a testemunha Sousa
Oliveira (que se tinha divorciado da sua prima no primeiro semestre desse ano) foi
passar férias para a sua casa em Labruge (que dista cerca de 5 quilómetros do Mindelo,
onde o depoente tem uma casa onde costuma passar férias).
Conversavam muito nessa época estival e iam para a praia em Mindelo.
Assim, em Agosto de 1999, ele colocou-lhe um problema relacionado com um
contrato-promessa de compra e venda de um terreno situado para os lados de Pombeiro.
Disse-lhe que o promitente vendedor não queria celebrar a escritura de compra e venda,
o que poderia dar origem à instauração de uma acção judicial, dando-lhe conta ainda
que tinha de fazer as partilhas com a sua ex-mulher (a arguida Fátima Felgueiras).
A dúvida dele prendia-se com o facto de se saber se ele poderia instaurar uma
acção de execução específica com fundamento no incumprimento desse contrato-

666
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

promessa pelo promitente vendedor. Manifestou-lhe a intenção de propor a acção em


Setembro desse ano, após as férias judiciais.
Do contrato-promessa em causa resultava apenas um direito de crédito comum
do ex-casal Sousa Oliveira e Fátima Felgueiras.
Aconselhou-o então a resolver esse problema amigavelmente na medida em que
a acção judicial andaria anos no tribunal, lembrando-lhe que “mais vale um mau acordo
que uma boa demanda”.
Porém, como ele em Setembro/Outubro não instaurou a respectiva acção,
aconselhou-o a falar com a ex-mulher acerca desse assunto, a fim dela entrar em
contacto com o promitente vendedor no sentido de mediar o conflito, de modo a que o
mesmo se resolvesse amigavelmente.
Ele não acreditava que ela se metesse nesse assunto e então o depoente sugeriu-
lhe que ele fizesse um memorial e que o enviasse à arguida Fátima através do João. Ele
hesitou, pois ela não quereria saber desse assunto.
O depoente ofereceu-se então para telefonar à arguida Fátima, no sentido de a
sensibilizar para o problema, contando-lhe que o Sousa Oliveira lhe iria remeter o dito
memorial.
Assim, em Novembro de 1999 telefonou à sua prima e disse-lhe, além do mais,
que tinham de resolver esse problema e que tinham dois filhos, pedindo-lhe então para
que ela falasse com o promitente vendedor. Ela porém respondeu-lhe que não queria
saber desse assunto, que o problema era do ex-marido e que tinha a sua vida na CMF.
Disse-lhe então que se ficassem prejudicados também prejudicariam os filhos.
Ela acabou então por aceitar receber o memorial através do João, o que de facto
veio a suceder.
Assegurou que quando lhe telefonou por causa desse assunto ela manifestou
acerca dele desconhecimento (designadamente no que se refere à existência do contrato-
promessa, qual a localização do terreno e que existia um processo de loteamento que
versava sobre esse terreno, pois há milhares de processos de licenciamento na CMF.
Aliás, conforme emerge do relatório de inspecção do IGAT, ela indeferiu o
requerimento para a construção de moradias em dois lotes, sinal de que de facto
desconhecia esse assunto).
O João era um menino carente e algo imaturo em termos afectivos.
Esse memorial (ou uma cópia dele) veio então a parar às mãos do arguido
Horácio Costa.
*
O arguido Horácio Costa reafirmou que recebeu cópia do “memorial” referente
ao loteamento do Bustelo das mãos do arguido Bragança.
*
- Testemunha Fernando António da Mota Marinho
Explicou que desde miúdo (desde 1982) frequentava a casa da arguida Fátima e
da testemunha Sousa Oliveira na medida em que recebia explicações dela (chegou a
andar com a Sandra ao colo).
Ajudou a redigir a petição referente à acção de divórcio (por mútuo
consentimento) e a fazer a relação de bens comuns.
Assim, por volta de meados ou finais de 1999 decorria ou tinha decorrido o
processo de divórcio entre a arguida Fátima e a testemunha Sousa Oliveira, no qual a
primeira conferência decorreu em 1998 e a segunda conferência em 1999.
Assim, a propósito da elaboração da relação de bens, falou com a testemunha
Sousa Oliveira a propósito dos imóveis, tendo-lhe ele então contado o problema que
tinha com a testemunha Fortunato (tinha celebrado um contrato-promessa de compra e

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

venda sobre o terreno referido nos autos, mas o mesmo não estava registado em nome
do promitente vendedor mas a favor de uma sociedade comercial).
A testemunha Sousa Oliveira estava “à rasca” porque se tivesse que ir para
tribunal com a testemunha Fortunato teria de dar conhecimento à arguida Fátima.
Foi com o dinheiro que ele obteve da venda de um lote que ele pôde celebrar o
dito contrato-promessa (cuja data já não se recorda).
Está convencido que a arguida Fátima desconhecia esse assunto.
Referiu porém que em 1989/90 via a arguida Fátima e a testemunha Sousa
Oliveira como um casal normal e que a testemunha Sousa Oliveira lhe disse que quando
“comprou o monte” queria nele construir uma habitação, o que nunca se concretizou.
Admite assim que a testemunha Sousa Oliveira tenha comunicado à mulher a
realização desse negócio.
A arguida Fátima tinha (e tem) uma personalidade mais forte que a
personalidade da testemunha Sousa Oliveira (o que se reflectia no relacionamento entre
ambos).
Referiu ainda que quem frequentava mais o escritório de advogacia da
testemunha Sousa Oliveira era o Dr. Celestino (ouvido já como testemunha) e o
depoente.
Numa conversa sugeriu ao Dr. Sousa Oliveira que escrevesse uma carta à
arguida Fátima a contar o historial do Bustelo, o qual lhe mencionou que o Dr.
Celestino já lhe havia sugerido o mesmo.
Em 2000 a testemunha Sousa Oliveira contou-lhe que tinha enviado à arguida
Fátima a dita carta.
Assegurou que da relação de bens comuns junta ao processo de divórcio não
consta qualquer direito de crédito emergente desse contrato-promessa (só constava o
apartamento, a casa de praia e o carro do Dr. Sousa Oliveira).

Análise crítica
A testemunha Maria Natal elaborou o relatório de fls 567 a 584, no âmbito de
uma acção inspectiva ao município de Felgueiras e que se prendia, além do mais, com o
loteamento do Bustelo.
Nesse relatório estão descritos os actos mais importantes praticados pela arguida
Fátima, enquanto vereadora e presidente da edilidade, no respectivo processo de
licenciamento do loteamento do Bustelo (actos esses praticados até Julho de 2000).
Acerca da prática destes actos a arguida Fátima confirmou-os, os quais aliás
emergem do respectivo processo de licenciamento.
Negou porém que tivesse conhecimento que, ao assim agir, soubesse que o
processo de licenciamento em causa se reportava a um terreno onde tinha interesses de
ordem patrimonial por força de contrato celebrado pelo seu ex-marido.
Na sequência da inspecção em causa foi instaurada uma acção de perda de
mandato da arguida Fátima, da qual contudo viria a ser absolvida, conforme se colhe,
designadamente, da cópia da sentença proferida junta aos autos a fls 2875 e ss.
Ora, além do mais, o busilis da questão prende-se com o facto de se saber se a
arguida Fátima, ao ter a aludida intervenção no processo de licenciamento do
loteamento do Bustelo, sabia que nele tinha interesses patrimoniais.
O episódio relatado pela testemunha Manuel Faria acerca de um comentário que
ouviu da boca do arguido Júlio Faria a esse propósito acabou por ser inconclusivo, não
só porquanto este negou esse facto, mas sobretudo devido à circunstância daquela
testemunha ter acabado por referir que esse comentário foi feito por ocasião de uma
reunião de câmara onde se tomou uma deliberação sobre o loteamento em causa, mas

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

que foi feita à margem dessa reunião, não resultando muito claro se esse alegado
comentário do arguido Júlio dava conta de interesses patrimoniais nesse loteamento por
parte da testemunha Oliveira ou se dava conta que este seria o advogado do requerente
do dito loteamento.
A testemunha Sousa Oliveira, por sua vez, descreveu os negócios que teve a
propósito desse loteamento, quer com os anteriores proprietários do terreno, Armindo
Leite da Silva e esposa (com quem celebrou um contrato-promessa de compra e venda
em que figurou como promitente-comprador), quer com a testemunha Fortunato Sousa e
esposa (com quem celebrou outro contrato-promessa de compra e venda, figurando
igualmente como promitente-comprador, de modo a assegurar a sua posição numa
espécie de sociedade irregular, emergente do acordo então celebrado com a testemunha
Fortunato e que se orientou no sentido de ambos arcarem a meias com os custos da
operação de loteamento e de repartirem a meias os respectivos lucros, pese embora
viesse a testemunha Oliveira a descobrir posteriormente que esse imóvel foi afinal
registado em nome de uma firma de que esse Fortunato era sócio - “F. Sousa & Filho,
Ldª” -, em nome de quem aliás o processo de licenciamento do loteamento do Bustelo -
processo nº 173/90 - viria a ser averbado em meados de 1993).
Consequentemente, não sendo possível a execução específica desse contrato-
promessa, resta à testemuha Sousa Oliveira apenas um eventual direito obrigacional
dele emergente.
Seja como for, a testemunha Sousa Oliveira, ao celebrar tal negócio, teve em
vista, além do mais, a construção num dos lotes de uma moradia para nela habitar com a
sua família, conforme o próprio confirmou e foi referido por outras testemunhas.
Nessa altura as relações que mantinha com a sua então esposa eram normais,
causando muita estranheza que acerca desse negócio – feito além do mais na
perspectiva de no terreno construir a casa de morada de família – ele apenas lho tivesse
referido de forma altamente lacunar e genérica, conforme referiu.
Tal não constitui de todo um comportamento normal e lança sérias dúvidas
acerca da veracidade desse depoimento, nessa parte, testemunha essa que aliás –
conforme se viu na audiência de julgamento – tomou como suas as dores da ex-mulher,
com quem ainda vive aliás na mesma casa, não tendo consequentemente qualquer
distanciamento emocional em relação ao que aqui se discute.
Por outro lado, se em meados de 1998 o arguido Horácio, a solicitação da
testemunha Oliveira, teve uma intervenção de mediação no conflito existente entre esta
testemunha e a testemunha Fortunato – pois não se entendiam quanto ao montante das
despesas que a testemunha Oliveira deveria pagar -, procurando ainda junto de uma
técnica da CMF inteirar-se acerca de problemas relacionados com esse loteamento (a
testemunha Oliveira não afasta aliás a hipótese de ter abordado esse assunto com o
arguido Horácio, alegando já não se recordar), parece verosímel que pelo menos nessa
altura a arguida Fátima já soubesse do loteamento do Bustelo, dado que, na prática, o
arguido Horácio era assessor dela e de toda a sua actividade lhe ia dando conta.
Regista-se que a “história do terreno”, tal como contada pela testemunha
Oliveira à ex-mulher através do manuscrito de fls 280 e ss. e do aditamento
dactilografado de fls 284 e ss. (datado de 15.12.99), seria altamente lacunar quanto às
circunstâncias da celebração do negócio com a testemunha Fortunato se a sua
destinatária não conhecesse já os seus contornos, sendo certo que esse manuscrito, no
essencial, visava dar-lhe conhecimento em pormenor das despesas tidas com a operação
de loteamento e qual o posicionamento da testemunha Oliveira quanto ao conflito que, a
esse propósito, o opunha à testemunha Fortunato, tudo na perspectiva dela mediar e
resolver o dito conflito, que, para além de passar por um acordo quanto à questão das

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

despesas, passaria por uma de duas soluções: ou comprar ao Fortunato os 50% que este
detinha do loteamento (o qual formalmente pertenceria na sua totalidade à firma “F.
Sousa & Filho, Ldª”) ou arranjar comprador para a totalidade dos lotes e repartir os
lucros a meias por ambos os “sócios” desse negócio, deduzidas que fossem as despesas,
deixando mesmo à consideração da ex-mulher o caminho a seguir.
Certo é que, a despeito do que a testemunha Oliveira referiu, este procurou
vender pelo menos a “sua parte” (cfr. as declarações proferidas pelo arguido Horácio
Costa e pela testemunha Fernando Sampaio).
Ademais, da análise dos rascunhos de fls 288 e ss. (parece tratar-se de um
rascunho de uma missiva a dirigir à testemunha Fortunato pela arguida Fátima) não
sobressai qualquer espécie de surpresa pelo facto da testemunha Oliveira e dela própria
terem interesses no dito loteamento.
Note-se que esses rascunhos, independentemente de terem sido recebidos ou não
pela testemunha Oliveira, foram-lhe enviados pela arguida Fátima para que ele
ponderasse na solução a adoptar (cfr. fls 287 e ss.) e na nota que lhe deixou (constante
de fls 287) não sobressai igualmente a mínima ponta de surpresa quanto à questão do
loteamento e dos interesses que ambos detinham no mesmo (interesses que iam muito
para além do contrato-promessa referido, pois a testemunha Oliveira, em relação a esse
empreendimento, comportava-se como se fosse comproprietário, em face do acordo
verbal que tinha com o seu “sócio”).
Desses documentos extrai-se que a arguida Fátima se iria ausentar e que se
ocuparia da resolução dessa questão logo que regressasse.
Ora, numa altura em que eles já só comunicavam por escrito, se ela não soubesse
de nada, é verosímel que na resposta não manifestasse desde logo estranheza pelos
negócios celebrados pelo ex-marido à sua revelia?
É crível que, perspectivando a testemunha Oliveira a construção da casa de
modada de família nesse terreno, apenas tivesse reportado à sua então mulher
generalidades acerca desse negócio e sem que esta revelasse a mínima ponta de
curiosidade, numa altura em que o relacionamento era normal?
Todos estes elementos de prova parecem apontar no sentido de que a arguida
Fátima sabia que detinha interesses patrimoniais no loteamento referido no momento
em que teve intervenção no respectivo processo de licenciamento.
Para além disso, emergiu das declarações prestadas pelas testemunhas Oliveira,
Fortunato e Eugénio (cfr. ainda as declarações prestadas pelos arguidos Fátima e
Horácio) que surgiram conflitos emergentes do facto das partes não acordarem quanto
ao montante das despesas, sendo certo que era suposto a testemunha Oliveira suportar
metade de todos os encargos com o imóvel e com o loteamento (nesse sentido apontam
aliás os manuscritos referidos).
Esses conflitos ainda hoje perduram, sendo certo que revelaram-se infrutíferas
todas as tentativas de mediá-lo, quer protagonizadas pela testemunha Eugénio, quer
pelos arguidos Horácio Costa (em meados de 1998, segundo o próprio, tendo-lhe sido
fornecida pela arguida Fátima uma planta do loteamento – cfr. fls 2895), quer pela
arguida Fátima (talvez já em 2000 e na sequência do facto de ter recebido, através do
seu filho João Felgueiras, o manuscrito de fls 280 e ss., da autoria da testemunha Sousa
Oliveira).
O simples facto da testemunha Oliveira ter tido a necessidade de remeter à
arguida Fátima o manuscrito de fls 280 e ss. e desta remeter-lhe os seus rascunhos
através da nota de fls fls 287 (que a testemunha Oliveira assegurou não ter recebido), é
apenas indício de que a comunicação entre ambos era difícil (a ruptura entre ambos já se
prolongava pelo menos desde 1993 e em 1999 já só comunicavam por escrito, fazendo

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

do filho “pombo correio”) e que ela não estaria informada dos pormenores relativos às
despesas tidas com a operação do loteamento (sobre os contornos do negócio acordado
com o Fortunato, em 1989, o manuscrito faz-lhe referência como gato sobre brasas,
sinal de que ela já estaria por dentro desse assunto e que esse intróito serviu apenas para
enquadrar o que se lhe seguiu).
Por outro lado, esta testemunha confirmou que, de facto, falou acerca desse
assunto com a arguida Fátima, mas não conseguiu situar essa conversa (ou essas
conversas) no tempo, de sorte que em bom rigor não sabemos quando ocorreram (em
todo o caso, a razão de ser do manuscrito de fls 280 prendia-se com uma tentativa de
fazer intervir a arguida Fátima no sentido de procurar mediar o conflito existente entre
as testemunhas Oliveira e Fortunato – cfr. os depoimentos das testemunhas Oliveira,
Almeida Lopes, Celestino e Fernando Marinho -, daí que não seja dispiciendo poder-se
concluir que essa conversa da arguida Fátima com a testemunha Fortunato tenha
ocorrido já depois de meados Dezembro de 1999).
Ademais, as notícias de jornal chamadas à colacção pelo arguido Horácio (cfr.
fls 294 e 295) datam de 09.06.2000 e de 23.07.2000 e comprovam que pelo menos
nessa altura a arguida Fátima estaria já ao corrente que o processo de loteamento
versava sobre um imóvel onde ela e o ex-marido tinham interesses por força do
contrato-promessa referido nos autos.
Note-se que a arguida Fátima praticou o último acto em 27.07.2000,
consequentemente, já depois daquelas notícias terem sido publicadas, onde aliás os
jornalistas colheram dela declarações que apontam no sentido inequívoco de que, pelo
menos à data, ela já teria conhecimento que o processo de licenciamento referente ao
loteamento do Bustelo versava sobre um imóvel objecto de um contrato-promessa
celebrado pelo seu ex-marido (numa altura em que ainda eram casados) com a
testemunha Fortunato e do qual emerge um direito de natureza meramente obrigacional,
loteamento do qual esperavam retirar os inerentes lucros com a venda de lotes,
conforme se deduz da corresponência trocada entre ela e o seu ex-marido (quanto à
fidelidade das declarações tomadas pelo jornalista à arguida Fátima e plasmadas na
notícia de fls 294, cfr. o depoimento da testemunha José Ribeiro).
Seja como for, dos despachos por ela proferidos no âmbito do processo de
licenciamento do loteamento em causa não emerge de forma clara qualquer intenção de
beneficiar o requerente, na medida em que esses despachos fundam-se sempre em
pareceres técnicos e, conforme se constata da análise do sobredito processo, nem todas
as decisões foram favoráveis ao requerente.
Ademais, no âmbito do processo contra-ordencional instaurado contra a
testemunha Fortunato, por ter iniciado as obras de loteamento antes do respectivo
licenciamento, há que salientar que, ao contrário do alegado na pronúncia, não foi
proferida qualquer decisão em que se tivesse imposto qualquer coima (cfr. documento
de fls 12202) nem que a arguida Fátima tenha proferido qualquer despacho a alterá-la
(cfr. despacho manuscrito de fls 12203). De facto, a única decisão por ela proferida foi a
de arquivamento com admoestação, por despacho de 14.01.98 (cfr. fls 12204).
Seja como for, há que considerar aqui um facto estranho e que emerge da análise
do processo de contra-ordenação em causa: o tempo em que, sem razão aparente, esse
processo de contra-ordenação esteve parado, como que à espera da legalização das
obras do loteamento (cfr. a esse propósito o relatório produzido pela testemunha Maria
Natal).
Seja como for, em face dos elementos de prova acima mencionados, convenceu-
se o Tribunal que a arguida Fátima, no momento em que teve intervenção nos
sobreditos processos de licenciamento e contra-ordenação, bem sabia que detinha,

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

juntamente com a testemunha Oliveira, interesses patrimoniais no loteamento do


Bustelo e que, ao ter intervenção nesse processo de licenciamento, visava a obtenção da
inerente vantagem patrimonial decorrente da venda dos lotes e a construção da casa de
morada de família num desses lotes, pois tal foi a razão de ser do acordo celebrado entre
a testemunha Oliveira e o seu “sócio” Fortunato”.
Na verdade, em síntese:
- não é crível que a testemunha Oliveira a tivesse colocado à margem do negócio
celebrado com a testemunha Fortunato, quando a intenção dele seria a de construir uma
moradia para nela habitar com a sua família e numa altura em que o casal se relacionava
normalmente (decisão que, assim, teria de ser tomada conjuntamente por ambos,
segundo aliás as regras da experiência comum acerca do que é um relacionamento
conjugal “normal”), sendo certo que a personalidade da arguida Fátima é mais forte que
a personalidade da testemunha Sousa Oliveira, segundo a testemunha Fernando
Marinho, pessoa que convive com eles desde criança e que tratou do respectivo divórcio
enquanto advogado (como diria o povo, era ela quem usava as calças lá em casa);
- da correspondência trocada entre a arguida Fátima e a testemunha Oliveira
pode-se concluir que ela apenas não conheceria em pormenor as questões que se
prendiam com o litígio que à data o seu ex-marido já mantinha com a testemunha
Fortunato (o que é natural devido à ruptura do relacionamento conjugal que entretanto
sobreveio); dessa correspondência pode-se igualmente concluir – atentas as razões
acima aduzidas – que ela já conheceria os contornos do negócio celebrado em 1989;
- o depoimento da testemunha Oliveira revelou-se sempre muito tendencioso e
pouco credível, pois, tomado-se das dores da ex-mulher, procurou defender a sua dama;
- em meados de 1998 o arguido Horácio, a pedido da testemunha Oliveira, mas
com o conhecimento e autorização da arguida Fátima, procurou mediar o conflito
existente entre os ditos Oliveira e Fortunato, bem como procurou resolver junto de uma
técnica da CMF problemas relacionados com o loteamento, tendo-lhe sido fornecida
pela arguida Fátima uma planta do loteamento, a qual aliás conversou com ele nessa
altura acerca desse mesmo loteamento.
Em face de tudo isto, não poderia a arguida Fátima deixar de saber que, ao assim
proceder, estava a violar os deveres inerentes ao seu cargo, pois bem sabia que interveio
em processo de licenciamento – onde praticou actos administrativos - no qual tinha
interesses patrimoniais, com a intenção de, na concretização desses interesses, alcançar
as inerentes vantagens patrimoniais.

- A convicção do Tribunal a propósito do pedido de indemnização civil


deduzido nos autos

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados especificamente a esse


propósito
- Testemunha José Joaquim Mesquita Teixeira de Oliveira
Esclareceu que elaborou o relatório de fls 5964 e ss. (juntamente com a
testemunha Amadeu Magalhães) numa altura em que ainda não havia sido deduzida a
acusação e por isso com base nos relatórios elaborados pela PJ.
Partiu do pressuposto que os três contratos ali mencionados foram simulados,
sendo certo que o critério de imputação aos arguidos demandados se prende com a data
de emissão das ordens de pagamento, consoante os arguidos Júlio Faria ou Fátima
Felgueiras, à data da emissão dessas ordens de pagamento, eram ou não os titulares da
presidência da CMF.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Amadeu Fernando Costa Monteiro de Magalhães


Confirmou que subscreveu o relatório de fls 5964 e ss. juntamente com a
testemunha José Oliveira, numa altura em que ainda não tinha sido deduzida a acusação.
Partiram do pressuposto que o contrato a que respeita a factura nº 427 passada
pela “Norlabor” à CMF era simulado, sendo certo que a testemunha José Oliveira tratou
mais da parte respeitante às relações da CMF com a “João Tello” e com o Eng. Menezes
Basto.
Ao Eng. Menezes Basto, a propósito do contrato de transacção e respectivo
aditamento, foi paga a quantia global de 37.645.560$00, sendo certo que a
responsabilidade pelo pagamento das verbas em causa foi imputado aos arguidos Júlio
Faria e Fátima Felgueiras consoante à data do pagamento respectivo assumiam ou não a
presidência da CMF.
Quanto às viagens referiu o seguinte:
No que concerne à viagem a Cabo Verde, considerou o valor global da factura
emitida pela “Navitur” à CMF (562.303$00), sendo certo que 2/3 do respectivo valor
correspondia à viagem dos filhos da arguida Fátima (374.802$00).
Já no que respeita à deslocação a Paris de João Felgueiras, considerou a
importância de 49.287$00.
No que respeita à viagem Porto/Lisboa/Porto, considerou a quantia de
18.791$00 no que concerce à filha da arguida Fátima.
No que concerne às ajudas de custo da viagem à Irlanda, considerou a
importância de 35.625$00.
O lesado foi o Município de Felgueiras, tudo conforme fundamentos expressos
no relatório a que acima se fez alusão e em face das declarações que prestou a propósito
daqueles pontos da pronúncia.

Análise crítica
As testemunhas José Joaquim Oliveira e Amadeu Magalhães procuraram
quantificar os montantes em que a CMF terá sido alegadamente lesada.
Para o efeito elaboraram o relatório de fls 5964 e ss. (numa altura em que a
acusação ainda não havia sido proferida).
Da análise desse documento salta à vista que partiram de pressupostos fácticos
que não se demonstraram no julgamento.
Na verdade, tomaram em consideração os pagamentos efectuados pela CMF
como se eles não fossem devidos de todo em todo, imputando a respectiva
responsabilidade aos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras tendo como pressuposto a
circunstância de, em face dos pagamentos efectuados e da época em que eles tiveram
lugar, terem sido os responsáveis pelas respectivas ordens de pagamento por na altura
chefiarem os destinos da CMF.
É pois nesse pressuposto que a responsabilidade entre ambos é repartida a
propósito dos negócios celebrados por causa da lixeira de Sendim (capítulo 1º da
pronúncia).
Nesse particular, diga-se, em síntese, emergiu da prova produzida que a CMF
pagou à “Resin” (ainda que por interpostas pessoas) os trabalhos que ela realizou, não
se tendo demonstrado, por outro lado, qualquer empolamento de preços de modo a
permitir “retornos”.
Além disso, no que toca às ajudas de custo, remete-se para o que supra já
tivemos a oportunidade de referir, sendo certo que o relatório, nessa matéria, tem uma
abrangência mais vasta relativamente à que é considerada no PIC (abarca ajudas de
custo pagas – segundo esse documento indevidamente e na senda de outro relatório

673
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

elaborado a esse propósito – nos anos de 1997 a 1999, ao passo que o PIC, nesse
particular, circunscreve-as às ajudas de custo pagas a propósito da viagem à Irlanda do
Norte, mas sem atentar que a arguida Fátima tinha direito a 70% do valor total das
ajudas de custo, pelo que o locuptamento só se reporta a 30% desse valor).
No que toca às viagens dos filhos da arguida Fátima, já tivemos a oportunidade
de expressar a nossa convicção, donde emerge que eles viajaram integrados em
comitivas de geminação e, no caso da viagem a Lisboa, que a arguida Fátima recebeu o
que tinha direito, isto é, o custo de três passagens aéreas, uma Porto/Lisboa e duas
Lisboa/Porto, nas circunstâncias que já abordamos.
No que toca ao arguido Barbieri, constata-se que o PIC fundou-se na matéria da
acusação que a propósito é alegada no ponto 9.2. dessa peça processual, mas na
sequência da instrução, essa matéria acabararia por não ser vertida na pronúncia, pois
dela foi o arguido em causa despronunciado.
Dito doutro modo, essa matéria cai fora do objecto destes autos.
Em conclusão, tudo sumado e subtraído, o único prejuízo provado suportado
indevidamente pela CMF traduziu-se em 35.625$00.

- A convicção do Tribunal a propósito dos antecedentes criminais dos


arguidos, respectivos percursos de vida, condições sócio-económicas e inserção na
comunidade.

Reprodução por súmula dos depoimentos prestados a esse propósito


- Arguida Fátima Felgueiras
Confirmou, grosso modo, o teor do relatório social de fls 13219 e ss.

- Arguido Júlio Faria


Confirmou o teor do relatório social de fls 13242 e ss., bem como os factos que
alegou na sua contestação nos artgs 65º a 72º.

- Arguido Vítor Borges


Conformou o teor do relatório social de fls 13181 e ss.

- Arguido Carlos Marinho


Conformou o teor do relatório social de fls 13193 e ss.

- Arguido Barbieri Cardoso


Confirmou o teor do relatório social de fls 13185 e ss. (acrescentou que a sua
situação económica tem-se vindo a agravar).

- Arguido Gabriel Almeida


Confirmou o teor do relatório social de fls 13189 e ss.

- Arguido António Pereira Mesquita de Carvalho


Confirmou o teor do relatório social de fls 13245 e ss.

- Arguido António José Leite Bragança da Cunha


Confirmou o teor do relatório social de fls 13223 e ss.

- Arguido Guilherme da Silva Almeida


Confirmou o teor do relatório social de fls 13232 e ss.

674
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Arguido Joaquim Teixeira Pinto


Confirmou o teor do relatório social de fls 13229 e ss.

- Arguido José Manuel Pimenta da Silva


Confirmou o teor do relatório social de fls 13235 e ss.

- Arguido Carlos Sampaio Teixeira


Confirmou o teor do relatório social de fls 13226 e ss.

- Arguida Maria Augusta


Confirmou o teor do relatório social de fls 13238 e ss.

- Arguido Horácio Costa


Referiu ser casado e ter dois filhos menores.
Vive em casa própria, pagando a inerente prestação mensal relativo a
empréstimo à habitação que contraiu.
Presentemente está a montar um escritório ligado à área financeira e aos seguros

- Arguido Joaquim Freitas


A este proposito apenas temos as declarações que prestou aquando da sua
identificação (isto é, é casado e empresário).

- Testemunha Edgar Pinto da Silva


Acerca do arguido Barbieri Cardoso referiu que tinha dele uma imagem de
pessoa distante quando o depoente assumiu funções como vereador na CMF; parece-lhe
um excelente profissional e é uma das pessoas mais honestas que conhece e de uma
inteligência excepcional.

- Testemunha José Henrique Machado Pinto Barriga


Quando foi admitido ao serviço da “Resin” não conhecia o arguido Carlos
Marinho.
Tem com ele uma boa relação.
Reconhece-o como uma pessoa competente e bem formada. Era
profissionalmente exigente.
Pensa que não seria pessoa para emitir facturas para cobrir resultados.

- Testemunha Rui Manuel Correia de Pinho


Referiu ter sido colega de curso do arguido Carlos Marinho (assim, conhece-o
desde 1985).
Em 1989 o depoente entrou ao serviço de uma empresa de auditoria. Em 1990 o
arguido Carlos Marinho foi admitido ao serviço da mesma empresa, tendo então sido o
seu superior hierárquico. Ele cumpria o que lhe era determinado e chegou a ser
responsável de equipas.
Entretanto ele decidiu sair para outra empresa.
Acha-o sério e bom profissional.
O depoente foi também colega de curso da esposa dele.
Têm um filho.

- Testemunha Luís Manuel Moura Esteves

675
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É amigo do arguido Carlos Marinho, que conhece há cerca de 20 anos (foram


colegas na faculdade).
Entre 1990 e 1993 ou 1994 trabalhou com ele numa empresa de auditoria.
Conhece a sua esposa e o filho.
Este processo tem-no abalado psicologicamente e tem-no afectado
profissionalmente ao nível das novas oportunidades.
Em face do que lhe conhece, ficou espantado com a acusação que lhe foi feita.
Recomenda-o profissionalmente em face da sua integridade e profissionalismo.

- Testemunha Luís Gonzaga de Sousa Monteiro


Travou conhecimento com o arguido Carlos Marinho em 2000/2001, altura em
que passou a tomar contacto com ele por causa de questões relacionadas com
facturação, no âmbito do relacionamento existente entre a AMVS (de que o depoente
era colaborador desde 1995 – coordenava a área administrativa no que diz respeito à
celebração de contratos) e um consórcio ao qual pertencia a “Resin”.
Ganhou com ele entretanto uma relação de amizade.
Considera-o uma pessoa sociável e com valores morais.
Nunca lhe conheceu qualquer atitude que atentasse contra os valores morais com
que orienta a sua vida.

- Testemunha Luís Guimarães da Silva Pinto


Foi colega de curso do arguido Carlos Marinho no Instituto Superior de
Contabilidade. Conhece-o pois há cerca de 20 anos.
Desde então nasceu entre ambos uma relação de amizade.
Conhece a esposa dele (de quem foi também colega de curso) e o filho de
ambos.
Considera-o um bom pai de família.
As outras pessoas também o vêm da mesma forma.
Este processo apanhou o depoente de surpresa. O arguido Carlos Marinho ficou
muito perturbado com este processo, sendo certo que também perturbou a relação
familiar. Sente-o um pouco triste.
Fizeram um jantar para o apoiar.
Quanto ao desempenho profissional dele a sua razão de ciência prende-se apenas
com as impressões que recolheu das conversas que manteve com ele em que debatiam
questões técnicas.

- Testemunha Manuel Sá Pinto Pereira da Cunha


Referiu conhecer o arguido Vítor Borges há pelo menos 10 anos quer como
amigo quer em termos profissionais.
Tem por ele muita admiração (ao ponto de dizer que teria todo o gosto em ser
seu filho e de ser para o depoente quase como um segundo pai!).
Ele é pessoa empreendedora e revelou-se extremamente competente quer no seu
percurso na “Texas Instruments” quer na “Resin”.
No seu círculo profissional ele é muito elogiado (o depoente é membro da
Ordem dos Engenheiros).
Este processo e a forma como é divulgado na comunicação social tem-lhe
causado extremo prejuízo quer em termos pessoais quer em termos profissionais.
É um exemplo a seguir em termos de vivência familiar.
O estilo cantante da testemunha e o exagero nalgumas declarações (intenso se
revelou o seu animus abonatório) retirou-lhe alguma credibilidade.

676
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Alberto José Conceição Transcoso


Referiu ser amigo do arguido Vítor Borges.
Conhece-o desde a infância, convivendo um com o outro desde então.
Ele sempre se pautou pela seriedade e boa educação. Nunca lhe conheceu
qualquer atitude menos ética.
Ele começou do zero e ascendeu a pulso com muito trabalho.
É casado e tem dois filhos adultos já casados e bem orientados na vida.
Após o surgimento deste processo ele ficou gravemente afectado.
Neste momento ele encontra-se desempregado.
Ele tem uma relação fantástica com a respectiva mãe, a quem tem uma
dedicação extrema.

- Testemunha José da Silva Campos


Conhece o arguido Barbieri Cardoso desde o tempo em que é vereador na CMF.
Se não lhe reconhecesse competência técnica e honestidade não seria sua
testemunha.
Ele era conhecedor de várias matérias, que estudava a fundo, e propunha as
soluções técnicas mais adequadas.
Nunca se apercebeu qual era a sua orientação política.
Conhece o arguido Carlos Sampaio Teixeira há muitos anos.
É pessoa empreendedora.
É industrial do calçado.
Foi emigrante e é um industrial de sucesso.
Fez do trabalho uma forma de estar e de vencer.
É amigo de ajudar várias instituições (por ex. os Bombeiros de Felgueiras e da
Lixa, sendo certo que o depoente é o presidente dos Bombeiros Voluntários da Lixa
desde 1980).
Nota que nos últimos 3 ou 4 anos o espírito de solidariedade dos felgueirenses
tem decaído muito.
Se não tivesse o arguido Carlos Sampaio Teixeira como pessoa honesta não
aceitaria ser sua testemunha.
Ele é casado e tem dois filhos, um deles menor.
Conhece o arguido Bragança. Foi seu colega de vereação no primeiro mandato e
nos anos seguintes ela fazia parte do GAPP. É um cargo que tem subjacente alguma
confiança política.
Durante o tempo em que o conheceu ele sempre foi um homem fiel e leal, quer
como vereador, quer como membro do GAPP.

- Testemunha José Vitorino da Cunha Loureiro


Referiu que gostou muito de ter trabalhado com o arguido Vítor Borges.
Criou uma boa amizade com o arguido Carlos Marinho, reconhecendo-lhe
competência (ele hoje é o seu superior hierárquico).

- Testemunha Manuel Pinto Campos Neves


É amigo do arguido Vítor Borges, pessoa que conhece desde a escola primária.
Ele é correcto e íntegro. Não lhe conhece qualquer atitude menos correcta.
Ele teve algum sucesso profissional (nunca trabalhou com ele).
Conhece bem a família dele (esposa, dois filhos, com quem vive na Avª da
Boavista, no Porto). Nota que têm entre si uma boa relação familiar.

677
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ele tem ainda uma boa relação com a progenitora, senhora que aliás foi
professora primária do depoente.
Segundo a família, este processo afectou-o. Não falou com ele acerca deste
assunto.

- Testemunha Raúl Fernando Sousela da Costa Brito


Referiu conhecer a arguida Fátima Felgueiras há mais de 20 anos, tratando-se de
pessoa muito dinâmica e com características de liderança.
Tem-na como pessoa séria e íntegra. Era inquebrável (“antes quebrar que
torcer”).
Tem confiança nela, mas não “mete as mãos no fogo por ninguém”. Todos
cometem erros e irregularidades.

- Testemunha Mário Hermenegildo Moreira de Almeida


A arguida Fátima foi vogal suplente da Associação dos Municípios Portugueses
(numa altura em que o depoente era o presidente dessa associação).
Em face disso criou dela uma imagem de que era pessoa honesta, abnegada e
preocupada com os outros.

- Testemunha Paulo Ramalheira Teixeira


Conheceu pessoalmente a arguida Fátima Felgueiras em 1998.
É o presidente da C.M. de Castelo de Paiva e, enquanto tal, trabalhou com a
arguida Fátima Felgueiras na AMVS (ela foi a sua vice-presidente, já que a presidência
é rotativa), em reuniões quinzenais e preparatórias.
Antes disso ouviu falar dela quando visitou muitas empresas em Felgueiras e por
colegas de curso oriundos de Felgueiras, tendo ouvido acerca dela referências muitas
positivas, ao ponto de lhe dizerem que deveria ser dinâmico como ela caso fosse eleito
para a presidência da C.M. de Castelo de Paiva.
O concelho de Felgueiras era o que mais governantes recebia e eles só lá iam
para ter visibilidade.
Do relacionamento que teve com a arguida Fátima nasceu uma relação de
amizade.
Tem dela uma imagem de mulher íntegra e de carácter e muito dinâmica.
Quando ela acredita numa causa vai até ao fim.
O depoente também é alvo de cartas anónimas, de modo que esse facto já não o
surpreende.

- Testemunha Fernando Ribeiro Marinho


Conhece o arguido António Pereira há cerca de 18 anos. Entre 1986 e 2001 foi
autarca numa freguesia e esteve na CMF como vereador entre 09.01.2002 e Outubro de
2005.
Considera-o quase como um irmão.
Ele sempre exerceu as suas funções de forma altruista.
Em face do que conhece dele não o acha capaz de cometer de forma deliberada o
crime que lhe é imputado.
É um homem sério e honesto.
Ele vive com algumas dificuldades económicas, sendo certo que ele não
beneficiou financeiramente com a sua intervenção política.
Apesar dele gostar de conviver, é pessoa muito recatada.

678
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- Testemunha Margarida Paula Leite Faria Teixeira de Sousa


Conhece o arguido António Pereira há mais de 20 anos.
Reuniu várias vezes com ele quando a depoente era a presidente do concelho
executivo de uma escola e ele era vereador na CMF.
A depoente foi vereadora no tempo em que ele foi presidente da CMF (quando a
arguida Fátima abandonou esse cargo ao fugir para o Brasil).
Trata-se de uma pessoa honesta, correcta e sempre exerceu as suas funções com
integridade.
Pelo que conhece dele acha-o incapaz de cometer o ilícito de que é acusado e se
cometeu alguma ilegalidade fê-lo inconscientemente. Ele é incapaz de usar o cargo que
desempenhava para beneficiar terceiros.
Acha que ele é de média condição económica, mas não sabe bem qual é a sua
situação financeira.

- Testemunha João Francisco Venâncio Garção


Desde Outubro de 2005 que o depoente é vereador na CMF.
Conhece o arguido António Pereira por força do facto do depoente ter sido
docente no Instituto Superior de Educação de Felgueiras numa altura em que o dito
arguido era vereador na CMF (em 1997/1998), tendo nascido dos contactos que
manteve com ele uma relação de amizade, cimentada sobretudo no mandato anterior,
uma vez que o depoente nessa altura fez parte da Assembleia Municipal de Felgueiras,
onde o conheceu mais de perto, nascendo então entre ambos uma relação de amizade.
Ele é uma pessoa que classifica de honrada, honesta, justa e voluntariosa.
Acha-o incapaz de cometer o ilícito que lhe é imputado e muito menos de forma
deliberada.
Por força deste processo a política acabou por prejudicar o arguido António
Pereira. A vida política em Felgueiras é muito antagónica, em que o que se passa a nível
político passa a estar também no domínio pessoal.
Ele foi para a política para servir a causa pública.
Tem a ideia que ele é uma pessoa frugal, nada ostentatória e nada ligado a
questões materialistas.
Não lhe parece que seja uma pessoa abastada.

- Testemunha Joaquim Pereira Lopes


Conhece o arguido Gabriel Almeida desde 1968 na medida em que ele foi
colega de curso da sua esposa em Coimbra.
Assim, de 1968 até 1979 manteve contacto com ele, sendo certo que em 1978 e
1979 contactou muito com ele por motivos profissionais.
De 1981 a 1995 ele trabalhou numa fábrica de torneiras (onde se tornou
administrador). De 1995 até 1997 ele trabalhou na “Portucel” e de finais de 1997 até
2000 trabalhou na “Resin”.
Enquanto ele trabalhou na “Resin” o depoente manteve com ele muitos
contactos profissionais na medida em que era director de serviço no Ministério do
Ambiente. Teve assim com ele muitas reuniões técnicas na Direcção Regional do
Ministério do Ambiente por causa dos aterros.
Ele ia muitas vezes a França fazer formação já que os aterros eram uma
novidade em Portugal.
Na “Resin” ele era o director técnico, facto que ele lhe transmitiu (assim como
outras pessoas lho disseram).

679
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Não sabe se nessa empresa ele era só o director técnico ou também o director-
geral. Porém, era na qualidade de director técnico que contactava com ele nas reuniões
que referiu.
A partir dos finais de 2000 ele esteve ao serviço de uma empresa de construção
civil.
Ele deu sempre aulas no ISEP, salvo no período em que trabalhou na “Resin”.
Ele teve vários empregos na medida em que há oportunidades que não se podem
desperdiçar.
Ele sempre foi uma pessoa impecável para com o depoente.
É pessoa correcta e honesta.
Não o acha capaz de cometer o crime que lhe é imputado. Se o cometeu tal facto
constituiria surpresa para si.
Ele tem uma condição económica “normal”.

- Testemunha Noé Gonçalves Gomes


É revidor oficial de contas.
Conhece o arguido Gabriel Almeida profissionalmente na medida em que foi
ROC numa empresa em que ele foi funcionário nos anos oitenta (uma empresa que
fabricava torneiras).
Assim, durante 10 anos manteve com ele um bom relacionamento profissional,
nascendo daí também um bom relacionamento pessoal. Ainda hoje todos os anos fazem
um jantar com funcionários dessa empresa.
Não mantém com ele um contacto muito frequente (duas ou três vezes por ano).
Depois dele trabalhar nessa empresa de torneiras foi trabalhar para a “Portucel”.
Mais tarde ingressou na “Resin” (segundo lhe disse, era um director mais ligado
à área de campo, não exercendo funções de administração. Se ele fosse o administrador-
geral dessa empresa teria que gerir aspectos técnicos e de execução, excluindo o
depoente dessas funções qualquer exercício de funções administrativas. Admite porém
que o conceito de administrador-geral possa variar consoante as empresas. Numa
administração ausente o director-geral pode ter funções administrativas; não sendo a
administração ausente, entende que o cargo de director-geral se prende mais com o
exercício de funções executivas).
Tem a ideia que ele se deslocava frequentemente a França.
Entretanto ele criou uma sociedade que se dedicava a limpezas, empresa essa
associada ao grupo “Engil”, da qual ele saiu mais tarde.
O arguido Gabriel é uma pessoa muito expansiva e directa. É um caso raro de
transparência no comportamento. Acha-o uma pessoa séria. Em face do que conhece
dele, não o vê a praticar o crime de que é acusado. Não é pessoa propensa a manobras
de segredo.
É um homem de trabalho. Move-se melhor na área técnica e não na área de
gestão.

- Testemunha António Acácio Couto Jorge Lima


Conhece o arguido Gabriel desde 1978, tendo trabalhado juntos numa empresa
durante dois anos (tendo entretanto o depoente saído dessa empresa).
Voltou a encontrá-lo alguns anos mais tarde em trabalhos de investigação
ligados ao aproveitamento de resíduos.
Ele sempre foi uma pessoa aberta e prestável. É correcto e responsável.
O depoente trabalha na Faculdade de Engenharia do Porto e ele no Instituto
Superior de Engenharia do Porto.

680
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Sabe que ele trabalhou em várias empresas.


Acha impensável que ele tenha cometido o crime que lhe é imputado nos autos.
Tudo o que fez com ele (nos trabalhos em que ambos participaram) é bastante
claro.
No que respeita à sua vida pessoal sabe apenas que ele está divorciado e que tem
dois filhos.
Não conhece a sua vida económica.
Tentaram fazer um projecto em comum, mas isso não se concretizou devido ao
facto dele estar alterado por força deste processo.

- Testemunha Fernando Valdemar Rodrigues Lima


Conhece o arguido Júlio Faria há muitos anos (o depoente foi vereador da CMF
entre 02.01.1990 e o final desse mandato, em 1993, eleito integrado nas listas do PSD,
além de que fez parte da direcção do FCF).
Tem dele muito boa impressão, quer como pessoa quer como autarca.
Deu vários exemplos de obras que ele fez enquanto autarca (biblioteca, piscinas,
duas praças, duas ETAR, Centro Coordenador de Transportes – em 1995 se não estava
terminada a respectiva construção estava em fase de conclusão -, Escola C + S e
secundária, etc), confirmando assim o que consta do artº 72º da contestação do arguido
Júlio Faria.
Apesar do depoente fazer parte da oposição e das divergências políticas, sempre
manteve com ele um relacionamento impecável.

- Testemunha João José Coelho Dias


Referiu ser juiz conselheiro jubilado do STA e cunhado do arguido Júlio Faria
desde 1970 (as respectivas esposas são irmãs).
Conhece-o por isso muito bem.
Em 1961 o depoente foi delegado do procurador da república em Felgueiras.
A vida do seu cunhado sempre foi pautada pela integridade.
É zeloso para com os familiares, exigente consigo e com os outros e nada
leviano.
Teve um comportamento exemplar quer no Exército, quer no Banco de Portugal,
quer na CMF (ouvia as pessoas a dizer que ele era uma pessoa exemplar no exercício do
cargo de presidente da autarquia). Segundo ouvia dizer ele reagia mal a qualquer
“pedido” que lhe fizessem.
Assim, a personalidade dele não se adequa à prática dos crimes de que foi
acusado. Não o consegue imaginar a ter esse tipo de comportamentos.
Confirmou genericamente a matéria constante dos artgs 65º, 66º e 68º da
contestação apresentada pelo arguido Júlio Faria.
Não o vê a entrar em conluios para retirar vantagens para si ou para terceiros.
Sabe que ele foi convidado para integrar a lista do PS para a Assembleia da
República pouco antes das eleições legislativas de 1995.
Pese embora ele disponha de património, tem sentido dificuldades financeiras,
às custa, por exemplo, do facto de ter avalisado dívidas de determinadas entidades.

- Testemunha Afonso Manuel Fazenda Ferreira Martins


É médico de profissão e conhece o arguido Júlio Faria desde o tempo em que
ambos prestaram o serviço militar em Moçambique (em Mueda, localidade do Norte de
Moçambique). O depoente e o arguido Júlio Faria permaneceram um ano naquela

681
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

localidade Moçambicana (eram alferes milicianos), tendo mantido desde então uma
relação de amizade.
Ele impunha-se pela sua seriedade. Era uma pessoa muito considerada por todos.
Ele muitas vezes chamava à razão os companheiros por causa de comportamentos
próprios da juventude e menos ponderados.
Ao longo da sua vida teve a percepção de que continou a ser uma pessoa
ponderada e equilibrada.
Ele foi louvado duas vezes, sendo certo que os louvores eram excepcionais.
Quando ele regressou a Portugal casou-se (o depoente tinha-se casado alguns
meses antes), tendo ido ao casamento dele.
Entretanto ele foi bancário. Esteve no Banco de Portugal no Porto.
Almoçavam ou jantavam de vez em quando no Porto quando ele estava no
Banco de Portugal.
Falavam também por telefone.
Ele foi entretanto presidente da CMF e deputado na Assembleia da República.
Uma vez ou outra o depoente deslocava-se a Felgueiras (onde convivia com ele)
e ele deslocava-se a casa dos seus pais e à própria casa do depoente.
Passam cerca de dois ou três fins-de-semana juntos por ano.
Tem grande admiração por ele.

- Testemunha Pedro Luís da Rocha Baptista


Conheceu o arguido Júlio Faria por alturas da campanha referente às eleições
legislativas de 1995.
Foram deputados na Assembleia da República entre 1995 e 1999 (ele
permanecia em Lisboa 3 ou 4 dias por semana).
Considera-o uma pessoa impoluta.
Foi para si um exemplo de seriedade e de honestidade.
Na Assembleia da República ele tornou-se logo um deputado prestigiado, tendo-
se imposto no grupo parlamentar.
Foi eleito coordenador dos deputados do Porto dado o seu sentido de justiça.
Foi coordenador do PS na Comissão do Poder Local.
Tinha intervenção no plenário no âmbito da legislação autárquica e do poder
local.
Inculcava grande confiança.
Teve um voto de louvor da Associação Nacional de Municípios (era presidente
dessa associação a testemunha Mário Almeida).

- Testemunha Luís da Costa Lima


Referiu que o arguido Júlio Faria foi presidente da Assembleia Municipal de
Felgueiras durante um mandato (o depoente, segundo disse, integrou esse órgão entre
1996 e 2005, eleito pelas listas do PSD, partido de que é militante).
Em termos de relacionamento tem dele a melhor impressão.
Nunca foi do seu conhecimento que ele tivesse cometido qualquer irregularidade
em termos de condução dos trabalhos na Assembleia Municipal de Felgueiras.
Ele era um adversário político leal.
Teve a oportunidade de reunir várias vezes com ele a propósito da elaboração do
regimento da assembleia municipal.
Descreveu ainda as várias obras que o arguido Júlio Faria, enquanto presidente
da edilidade, durante dois mandatos e meio, iniciou ou concluiu no concelho (Biblioteca

682
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Municipal, Centro Coordenador de Transportes, Piscinas Municipais, avenidas novas ou


alargamento de vias).

- Testemunha Paulo Baltazar Silveira Martins


A testemunha em causa é funcionário da firma do arguido Guilherme Almeida
há cerca de 18 anos, onde exerce as funções de escriturário, depreendendo-se do seu
depoimento que é o seu braço direito na empresa.
Referiu que esse arguido tem dois objectivos na vida: a família e a empresa e
respectivos colaboradores.
É um excelente marido e pai.
É um empresário de sucesso.
Mais do que o seu patrão, considera-o um amigo.
Na freguesia onde habita ele é um benemérito, contribuindo para várias causas
sem esperar algo em troca.

- Testemunha Mendes de Sousa Martins


O depoente é industrial e conhece o arguido Carlos Sampaio Teixeira há mais de
20 anos.
Tem-no como uma pessoa de grande carácter, homem de família e muito
respeitado na comunidade. É um dos maiores empresários do concelho.
Era normal ele conceder donativos para várias causas.
Deu como exemplo o facto do FCF recorrer ao tecido empresarial no sentido de
obter apoios, designadamente ao arguido (Carlos Sampaio Teixeira (o depoente foi
director do FCF em 1993/94).
Ele também apoiou financeiramente os Bombeiros (o depoente já foi director da
respectiva associação humanitária).
Recordou ainda que na altura em que o Hospital Agostinho Ribeiro estava a ser
construído o respectivo empreiteiro ameaçou suspender os trabalhos se não fosse
liquidada a quantia de 100.000 cts no espaço de uma semana e o arguido Carlos
Teixeira aceitou uma livrança de 10.000 cts sem hesitar, contribuindo assim para
solucionar o impasse.
O depoente foi ainda director de campanha do PSD local nas eleições
autarquicas de 1997, tendo recorrido ao tecido empresarial no sentido de obter
donativos e o arguido Carlos Teixeira contribuiu com 500 cts.

- Testemunha Joaquim Carvalho de Oliveira


Trabalha com o arguido José Manuel Pimenta da Silva há cerca de 20 anos (ele é
o seu patrão).
Ele é uma excelente pessoa, é considerado na terra e um empresário de sucesso.
Ele é casado e tem dois filhos.
Na altura das campanhas a empresa dele era procurada no sentido de conceder
donativos. Ele contribuia sempre para todas as forças políticas.
Conhece o arguido Joaquim Teixeira Pinto há cerca de 20 anos.
Tem dele uma boa imagem. Nunca dele ouviu dizer algo em desabono.
Ele é viúvo e sabe que ele sempre deu o apoio possível e impossível à sua
falecida esposa no sentido de vencer a doença dela.
Deduz que ele estivesse sempre disposto a ajudar as instituições, mas não tem
conhecimento desse facto.

- Testemunha José Alcino Pinto Alves

683
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O depoente é empregado de escritório da firma “José Manuel Pimenta da Silva e


Cª Ldª” há cerca de 20 anos.
Conhece o arguido José Manuel Pimenta da Silva há cerca de 24/25 anos.
Tem dele uma boa imagem. Ele é um empresário de sucesso e muito
conceituado. É honesto e sério.
Era costume ele dar donativos aos partidos no âmbito das campanhas eleitorais,
sendo certo que era prática corrente os partidos visitarem as empresas no sentido de
delas obter donativos.
Sabe que ele dava donativos a todos os partidos.
Ele também contribuía para outras instituições.

Análise crítica
No que respeita aos antecedentes criminais dos arguidos, teve-se em
consideração os vários certificados de registo criminal juntos aos autos (cfr., por ex., os
mais recentes, constantes de fls 14862 a 14875 e 14879 a 14882).
Quanto ao mais, muito sinteticamente, diremos que a matéria de facto dada
como provada a propósito do percurso de vida dos arguidos reflecte quase na íntegra o
teor dos relatórios sociais juntos aos autos, sendo certo que de uma forma geral todos
eles foram confirmados pelos arguidos neles retratados.
Apenas os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas decidiram recusar-se a
colaborar com o IRS (cfr. a informação de fls 13010, os faxes de fls 13011 e 13012,
bem como o despacho de fls 13019), de sorte que, no que a eles concerne, teve-se
apenas em conta o que a propósito foi por eles referido.
No que respeita ao arguido Anastácio não foi possível a elaboração do
respectivo relatório social (pelas razões aduzidas pelo IRS), sendo certo que esse
arguido nunca se dignou comparecer em Tribunal em nenhuma das sessões de
julgamento realizadas.
No que se refere ao arguido Júlio Faria, para além do referido, diremos que o
extenso auto-elogio que efectuou na sua contestação - e que confirmou na audiência de
julgamento – vale o que vale. Assinala-se que algumas das obras mencionadas no artº
72º da sua contestação não foram executadas pela CMF e outras foram concluídas já no
mandato da arguida Fátima (de sorte que parece querer colher os louros alheios).
Seja como for, alguns dos factos ali alegados emergiram de alguma prova
testemunhal e documental entretanto junta aos autos pelo arguido Júlio.
Teve-se ainda em consideração o teor das declarações proferidas pelas
testemunhas abonatórias, acima reproduzidas por súmula, uma vez retirado algum
exagero no endeusamento de alguns dos arguidos abonados, sobretudo por algumas das
testemunhas ouvidas (veja-se por exemplo o exagero exarcebado do depoimento da
testemunha Manuel Sá Pinto Pereira da Cunha, perceptível – perdoe-se-nos a ironia -
quer no seu conteúdo, quer no tom de voz que empregou em jeito de discurso ensaiado,
quer no brilhozinho dos olhos com que enfeitou a face, quer ainda na postura corporal
abraçada por fato de fino corte e encimada por cabelo puxado para trás à custa de meia
embalagem gel).
Seja como for, salvo poucas excepções, para o que costumamos apreciar, os
depoimentos pautaram-se por alguma sobriedade.
É claro que as testemunhas em causa relataram ao Tribunal aquilo que é a sua
percepção dos abonados, umas com maior conhecimento de causa e outras nem tanto,
umas com algum floreamento no discurso e outras mais sóbrias, sendo certo que não se
deve perder de vista, sob pena do depoimento analisado não ser credível, que se está a

684
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

reportar a pessoas, com a grandeza e pequenez que lhe é inerente, pois errar é humano e
no melhor pano cai a nódoa.

II – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
2.2.1. – Qualificação jurídica dos factos dados como provados:
Feita a fundamentação de facto, importa agora proceder à respectiva
qualificação jurídica, pois, conforme refere Cavaleiro Ferreira, “o facto só é definível na
sua unidade ou pluralidade em função dum critério, duma perspectiva que em Direito
tem de provir da própria lei” (Concurso de Normas Penais, in Scientia Juridica, XXIX,
nºs 164 e 165, pág.1180), sendo certo que, conforme ensinamento de Eduardo Correia,
ter-se-á de ter em conta que para o Direito Penal o facto só interessa se perspectivado
como desvalor (cfr. Direito Criminal, I, págs. 231-237), sendo o ponto de partida de
toda a elaboração do direito criminal “a conduta, o comportamento humano, a acção em
sentido lato como juízo teleológico, como negação de valores ou interesses pelo
homem.”
Assim:
2.2.1.1. – A propósito dos 1º e 3º capítulos da pronúncia
Vieram:
- a arguida Fátima Felgueiras pronunciada pela prática de 5 crimes de
participação económica em negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de
16.07., a título de co-autoria e na forma consumada;
- o arguido Vítor Borges pronunciado pela prática de 5 crimes de participação
económica em negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07., a título de
co-autoria e na forma consumada;
- o arguido Carlos Marinho pela prática de 5 crimes de participação económica
em negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07., a título de co-autoria e
na forma consumada;
- o arguido Júlio Faria pela prática de 2 crimes de participação económica em
negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07., a título de co-autoria e na
forma consumada (referentes ao contrato de transacção celebrado com a testemunha
Menezes Basto e ao contrato celebrado entre a CMF e a “Norlabor”, factos alegados nos
pontos 1.1., 1.2. e 1.3 da pronúncia);
- o arguido Barbieiri Cardoso pela prática de 3 crimes de participação económica
em negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07., a título de
cumplicidade e na forma consumada (referentes à matéria alegada nos pontos 1.1., 1.3.,
1.4 e 1.5 da pronúncia);
- o arguido Gabriel Almeida pela prática de 1 crime de participação económica
em negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07., a título de
cumplicidade e na forma consumada (referente à matéria alegada nos pontos 1.3 e 1.6
da pronúncia);
- os arguidos Horácio Costa e Joaquim Freitas pela prática de 2 crimes de
participação económica em negócio, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei nº 34/87, de
16.07., a título de cumplicidade e na forma consumada (referentes à matéria alegada nos
pontos 1.3., 1.5 e 1.6 e capítulo 3º da pronúncia);
A propósito da qualificação jurídica dessas condutas, escreveu-se no despacho
de pronúncia o seguinte:
Estabelece o art. 23º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 16/07 que “o titular de cargo
político que, com o intenção de obter para si ou para terceiro participação económica
ilícita, lesar em negócio os interesses patrimoniais que, no todo ou em parte, lhe

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

cumpra, em razão das suas funções, administrar, fiscalizar, defender ou realizar será
punido com prisão até cinco anos e multa de 50 a 100 dias”. (sublinhado nosso)
Por sua vez, prevê o nº 2 que “o titular de cargo político que, por qualquer
forma, receber vantagem patrimonial por efeito de um acto jurídico-civil relativo a
interesses de que tenha, por força das suas funções, no momento do acto, total ou
parcialmente, a disposição, a administração ou a fiscalização, ainda que sem os lesar,
será punido com multa de 50 a 150 dias”. (sublinhado nosso)
O bem jurídico aqui tutelado consiste na “protecção de interesses públicos –
sempre o interesse na fidelidade dos funcionários, na transparência e legalidade da
administração, contra intenções lucrativas do agente (para si ou para outrem) e ainda,
no caso do nº 1, de interesses públicos patrimoniais que o agente tem a seu cargo”
(vide Conceição Ferreira da Costa, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”,
Tomo III, Coimbra Editora, págs. 723 e segs.).
Este tipo de ilícito corresponde a um crime específico, já que o agente terá de
ser um titular de cargo político, devendo ainda exercer um dos cargos referidos no tipo
legal (que em razão da suas funções tenha ao seu cuidado, no todo ou em parte,
determinados interesses), sendo ainda necessária “a relação causal entre o cargo do
agente e a vantagem patrimonial obtida (nº 2) ou que intentou obter (nº 1)” (cfr. ob.
loc. cit.).
No caso do nº 1 são lesados os próprios interesses públicos patrimoniais que o
agente, por causa da sua função, tinha o dever de defender, e este lesa-os no próprio
negócio jurídico em que participa, ou seja, “o agente na mira de obter (para si ou para
outrem) participação económica ilícita, lesa os interesses patrimoniais que lhe foram
confiados”.
No nº 2 não é necessário que estes interesses patrimoniais sejam lesados, mas
que o agente aufira vantagem patrimonial (que é exterior ao comportamento do agente)
em resultado do acto relativo aos interesses que estão a seu cargo, ou seja, “o agente
recebe, por qualquer forma, vantagem patrimonial em resultado de acto jurídico-civil
relativo aos interesses que estão ao seu cuidado” (ob., loc. cit.).
Há, assim, em qualquer dos casos um interesse lucrativo do titular do cargo
político nos actos em que, por virtude da função, intervém (negócios com a função
pública em que o titular, por força do seu cargo, tem poderes decisórios ou
fiscalizadores).
Por outro lado, a vantagem patrimonial poderá ter como destinatário o próprio
agente ou um terceiro e destina-se à satisfação de interesses particulares (os crimes
cometidos no exercício de funções públicas traduzem sempre um desvio no exercício
dos poderes conferidos pela titularidade do cargo, ou seja, “em vez de usados na
prossecução dos fins públicos a que se destinam, são deslocados para a satisfação de
interesses particulares ou privados, do agente ou de terceiro” – neste sentido,
Figueiredo Dias, in Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 121º, pág. 380).
Porém, há diferenças importantes entre o nº 1 e o nº 2:
- no primeiro, a participação opera-se ao nível do próprio acto jurídico e
adquire realidade no próprio conteúdo desse acto, exigindo, ainda, a lesão dos
interesses patrimoniais que ao agente foram confiados (não se exige que o agente tenha
efectivamente auferido uma vantagem, mas que se produza um dano patrimonial e que
a intenção do agente fosse a de auferir essa vantagem);
- no segundo, essa participação é exterior ao acto jurídico e, embora exija a
obtenção de um resultado – a recepção de uma vantagem patrimonial – não implica a
produção de um dano patrimonial.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por outro lado, a participação económica a que se refere o nº 1 terá de ser


materialmente ilícita (excluem-se as “ilicitudes formais”), devendo tal ilicitude
reportar-se ao acto praticado pelo titular do cargo político, estando, assim, em causa
“uma invalidade do acto ao nível do direito administrativo” – cfr. Conceição Ferreira
da Cunha, ob. loc. cit..
Finalmente, trata-se de um tipo legal doloso.
Todavia, o nº 1 exige o chamado elemento subjectivo específico em que o agente
actua “com intenção de obter para si ou para terceiro participação económica”.
Ora, nos termos do art. 30º, nº 1 do C.P., “o número de crimes determina-se
pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o
mesmo tipo de crime foi preenchido pela conduta do agente”.
Consagra-se aqui uma teoria jurídica e não uma teoria naturalística do
concurso, pelo que “o número de infracções determinar-se-á pelo número de
valorações que, no mundo jurídico-criminal, correspondem a uma certa actividade”,
havendo tantos crimes quantos os valores ou bens jurídicos negados e quantos os juízos
de censura de que seja passível a conduta do agente - visto que para que exista uma
infracção é necessário que a conduta seja ilícita e também culposa - (neste sentido,
Eduardo Correia, in “Direito Criminal”, vol. II, págs. 200 e 201).
Casos há, porém, e dado que não existe uma divisão estanque entre os diversos
tipos legais de crime, os quais “nas condutas que descrevem e nos bens que protegem”
“comunicam, sobrepõem-se e entrecruzam-se entre si”, em que aparentemente são
preenchidos vários tipos de crime, mas na realidade, atenta a relação existente entre os
mesmos, só um foi preenchido - são os chamados casos de concurso aparente ou
concurso de leis ou de normas: “aparentemente são chamadas várias leis mas acaba
por se aplicar apenas uma delas que exclui as demais” (cfr. Mário Paulo da Silva
Tenreiro, in “Considerações sobre o objecto do processo penal”).
Transportando estes conceitos para o caso em análise, verifica-se que entre o nº
1 e o nº 2 do normativo em apreço está estabelecida uma relação de exclusão já que
estes (tipos legais) se reportam a condutas criminosas distintas, não podendo, por isso,
as condutas dos arguidos preencher ambos os tipos de ilícitos.
Corroboramos na íntegra as considerações então expandidas naquele despacho,
pelo que nada mais, a esse propósito, haverá a acrescentar quanto à delimitação do
respectivo tipo de ilícito, objectivo e subjectivo.
Outra questão já tratada naquele despacho e de novo levantada por alguns
arguidos nas respectivas contestações, prende-se com o facto de entenderem que a
imputação em causa não lhes pode ser feita na medida em que não são titulares de
cargos políticos.
A Lei nº 34/87, de 16.07, determina quais são os crimes da responsabilidade dos
titulares de cargos políticos, desde que esses crimes sejam cometidos no exercício das
suas funções, bem como as sanções que lhes são aplicáveis e os respectivos efeitos (cfr.
artº 1º).
Segundo o artº 2º da mesma lei, “Consideram-se praticados por titulares de
cargos políticos no exercício das suas funções, além dos como tais previstos na
presente lei, os previstos na lei penal geral com referência expressa a esse exercício ou
os que mostrarem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso de função ou
com grave violação dos inerentes deveres”.
No artº 3º da mesma lei estão elencados os cargos políticos para a lei em apreço.
É inegável que os arguidos Vítor Borges, Carlos Marinho, Gabriel Almeida,
Horácio Costa, Joaquim Freitas e Barbieri Cardoso (e o arguido Júlio Faria a partir de

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2º Juízo

determinada altura) não deverão ser considerados titulares de cargos políticos no âmbito
da lei em apreço.
Porém, a esse propósito, escreveu-se no despacho de pronúncia:
Na generalidade dos casos, as normas incriminadoras não exigem qualquer
elemento típico referentes ao agente, pelo que pode ser sujeito activo do crime qualquer
pessoa.
Noutras situações, porém, verifica-se em determinadas normas incriminadoras,
uma restrição do círculo dos possíveis agentes, dando assim origem a tipos (de ilícito)
especiais.
O núcleo definidor destes crimes é o dever específico, que “só vincula certas
pessoas e cuja violação é sancionada plenamente no tipo respectivo” (cfr. Henrique
Salinas Monteiro, in “A comparticipação em crimes especiais no Código Penal”,
Universidade Católica Editora, Lisboa, 1999, pág. 16).
Por isso, as dificuldades surgem quando colaboram na prática do mesmo crime
agentes vinculados ao dever especial (intranei) e agentes não vinculados àquele dever
(extranei) – crimes especiais próprios e impróprios.
Ora, estabelece o art. 28º, nº 1, do Código Penal que “se a ilicitude ou o grau
de ilicitude do facto dependerem de certas qualidades ou relações especiais do agente,
basta, para tornar aplicável a todos os comparticipantes a pena respectiva, que essas
qualidades ou relações se verifiquem em qualquer deles, excepto se for outra a intenção
da norma incriminadora”.
Os dois referidos elementos “qualidades ou relações especiais do agente”
delimitam, assim, o âmbito de aplicação deste normativo [estão fora do seu domínio: os
elementos do tipo que não se refiram à pessoa do agente; os estados de espírito,
intenções, fins específicos, que não podem considerar-se “qualidades ou relações
especiais”; estas últimas também não o serão caso não influenciem a “ilicitude” ou o
“grau de ilicitude” do facto ou respeitem à culpa] - vide Henrique Salinas Monteiro,
ob. cit. págs. 92 a 94).
Desta forma, tal preceito é aplicável a todas as hipóteses de comparticipação
em factos cuja ilicitude ou grau de ilicitude dependa de qualidades ou relações
especiais do agente, bastando que um deles as detenha para que a pena aplicável se
estenda a todos os outros, desde que isso seja conhecido por todos (Teresa Pizarro
Beleza, in “Direito Penal – Textos de Actualização”, 2º volume, A.A.F.D.L., 1988, pág.
12).
Isto significa que basta que um dos co-autores seja intraneus para que todos
respondam pelo crime especial: o co-autor intraneus do crime especial responderá por
este crime com a pena correspondente à autoria, nos termos do art. 26º do C.P. (esta
seria, aliás, a pena aplicável pela qual teria de responder caso tivesse cometido o crime
isoladamente, não sendo esta situação alterada pelo facto de colaborar também na sua
execução um extraneus) e o agente extraneus, que executar o facto conjuntamente com
o intraneus, será punido pelo crime especial, com a pena correspondente à autoria
desse crime (neste sentido, Cavaleiro de Ferreira, in “Lições de Direito Penal”, I,
1992, págs. 464-467; Teresa Pizarro Beleza, in “Ilicitamente comparticipando”,
B.F.D.U.C., Número Especial, 1984, pág. 607 e segs.).
No caso vertente, verifica-se que os co-arguidos Fátima Felgueiras e Júlio
Faria exerciam, à data do acordo mencionado na acusação, cargos políticos na CMF
(este último, pelo menos até Outubro de 1995, momento a partir do qual passou a
ocupar o cargo de Deputado à Assembleia da República – infra veremos se esta
circunstância tem ou não relevância na sua posição), designadamente os [cargos] de
Presidente e Vereadora da autarquia, respectivamente, revestindo, por isso, uma

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2º Juízo

qualidade especial, cujo regime vem previsto na Lei nº 34/87, de 16 de Julho (diploma
que determina os crimes de responsabilidade que os titulares de cargos políticos
cometam no exercício das suas funções).
Tal qualidade era conhecida pelos co-arguidos Vítor Borges e Carlos Marinho.
Pelo que, em princípio, a punição destes arguidos seria pelo crime especial
(prevista naquele diploma) com a pena correspondente à autoria desse crime,
verificando-se, assim, a chamada comunicabilidade de que falámos supra.
No entanto, duas excepções importantes estão contidas no final do art. 28º, nº 1,
e no seu nº 2:
- aquela permitirá sempre afastar à partida a aplicação do art. 28º, nº 1, 1ª
parte, quando “a intenção da norma incriminadora” o exija;
- a do nº 2 pretenderá dar ao juiz a faculdade de atenuar o rigor da lei em casos
em que lhe pareça desfavorável, chocante, o resultado obtido através da aplicação da
regra da 1ª parte do nº 1.
Ocupemo-nos da primeira, já que só esta releva nesta fase processual.
Tal segmento contém uma ressalva, a qual teria em vista os chamados crimes de
mão própria, ou seja, aqueles cuja “definição legal torna impensáveis em qualquer
forma de autoria que não seja directa, imediata, material, dado que a acção só é
susceptível de ser praticada por “mão própria”, isto é, com o próprio corpo” (Teresa
Pizarro Beleza, ob. cit., pág. 63), ou dito de outra forma, estes ilícitos apenas podem
ser cometidos mediante execução corporal de certas pessoas, ou seja pela intraneus
(por ex. bigamia, incesto).
Mas podem ainda existir outras hipóteses de aplicação da ressalva constante da
parte final do normativo em apreço.
Na verdade, a determinação dos tipos que se devem considerar abrangidos por
tal ressalva é, assim, um problema interpretativo que só pode ser resolvido na presença
da norma incriminadora em causa (quer da parte especial do Código Penal, quer em
legislação avulsa), de forma a concluir-se se o seu conteúdo é compatível com o regime
constante da primeira parte do preceito citado (neste sentido, Henrique Salinas
Monteiro, ob. cit., pág. 248)
No caso vertente, estamos, sem dúvida, em face de uma legislação extravagante.
E analisado o diploma que referimos supra, designadamente o teor do seu art.
23º (relativamente ao art. 18º, esta problemática não tem razão de ser atenta a sua
actual redacção, já que a sua consumação não depende do preenchimento, por parte do
agente, de quaisquer qualidades especiais enunciadas na lei), nada nos permite
concluir pela sua incompatibilidade com o regime previsto no art. 28º do C.P..
Aliás, alguma jurisprudência (que corroboramos) já se debruçou sobre esta
questão e concluiu que nos crimes cometidos por titulares de cargos públicos [onde se
incluem crimes cometidos por titulares de cargos políticos] no exercício das suas
funções não está excluída a comunicabilidade da ilicitude (neste sentido, vide Ac. da
R.C. de 13/03/1996, in C.J., XXI, tomo II, pág. 51; ver, ainda, Almeida Costa,
“Comentário Conimbricense, Parte Especial”, Tomo III, Coimbra Editora, 2001, pág.
663).
Pelo que não existem razões para afastar o regime previsto no nº 1 do art. 28º
do C.P., sendo o mesmo aplicável ao caso sub judice aos co-arguidos Vítor Borges e
Carlos Marinho.
No que respeita ao co-arguido Júlio Faria, cuja questão também se coloca a
partir de Outubro de 1995, data em que deixou de ser autarca, passando a ser, desde
então, extraneus, já que não praticou quaisquer factos no âmbito das suas funções de
Deputado – é que os tipos legais falam sempre em “cargos políticos no exercício das

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2º Juízo

suas funções”, ou seja, das suas funções concretas (por ex. de membro de órgão
representativo de autarquia, Deputado à Assembleia da República, e outros) - diremos
que tal regime lhe é igualmente aplicável, nos precisos termos anteriormente
explicitados.
Donde se conclui pela aplicabilidade do regime previsto no disposto no art. 28º,
nº 1 do C.P.
As mesmas considerações valerão aqui para os arguidos Barbieri, Horácio
Costa, Joaquim Freitas e Gabriel Almeida.
Por outro lado, tendo presente o nº 2, do artº 28º, do CP, nem assim entendemos
que, em caso de condenação, fosse chocante a aplicação da regra em causa, quando é
certo que, em sede de determinação concreta da pena, por certo se teria em atenção que
a conduta do titular do cargo político é, por via de regra, mais censurável, fazendo-se
então uma diferenciação positiva ao nível da punição relativamente aos arguidos que
não tinham essa qualidade.
Chama-se agora aqui à colacção a matéria dada como provada a propósito dos 1º
e 3º capítulos da pronúncia, que não se reproduz – como costumamos - para não tornar
ainda mais incomportável a extensão deste acórdão.
Já vimos que um dos elementos do tipo objectivo de ilícito, no que respeita aos
crimes de participação económica em negócio em causa (p e p. pelo artº 23º, nº 1, da Lei
nº 34/87, de 16.07), é a lesão de interesses patrimoniais que, no todo ou em parte,
cumpra ao titular do cargo político, em razão das suas funções, administrar, fiscalizar,
defender ou realizar.
Ora, como é bom de ver, nenhuma das condutas em causa teve como
consequência a ocorrência de qualquer prejuízo patrimonial para a CMF.
Na verdade, a simulação relativa dos contratos celebrados entre a CMF e a
testemunha Menezes Basto, entre a CMF e a “Norlabor” e entre a CMF e a “João Tello”
mais não visou - em face das dificuldades administrativas que por um motivo ou por
outro impediam a CMF de contratar directamente com a “Resin” –, dizíamos, mais não
visou que a efectivação dos pagamentos dos trabalhos realizados pela “Resin” na lixeira
de Sendim, primeiro numa missão de reabilitação sumária (que durou 6 meses) e depois
na respectiva exploração (quanto às noções de simulação absoluta e simulação relativa,
cfr. os artgs 240º e 241º do Código Civil).
Tratou-se pois da contraprestação devida a quem no terreno coordenou e
executou os trabalhos, ainda que recorrendo a outras empresas.
A simulação dos concursos, dos ajustes directos e dos contratos formalizados,
mais não constituiu que uma dissimulação do real contrato celebrado entre a CMF e a
“Resin”, a qual, por ajuste directo encapotado daquela forma, viu todos esses trabalhos
lhe serem adjudicados.
Não cabe aqui ao Tribunal discorrer sobre a problemática – certamente
politicamente interessante para a vida político-partidária local - de se saber se, neste
caso, os fins justificaram os meios, cabendo-nos apenas verificar se, em face da
factualidade apurada, estão ou não preenchidos todos os elementos do respectivo tipo
legal, em face da concreta imputação fáctico-jurídica que é feita na pronúncia e que
dessa forma delimitou o objecto do processo.
Ora, no caso em apreço, estamos em condições de concluir que não se verificou
um dos seus elementos típicos essenciais, que neste caso se traduziria na ocorrência
(não demonstrada) de um prejuízo para a CMF.
O mesmo se diga, aliás, em relação à conduta imputada aos arguidos a propósito
do ponto 1.5 da pronúncia, sendo certo que, neste caso, com a agravante de que nenhum
dos respectivos elementos típicos se provou.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

É tanto quanto basta para que todos os arguidos acima referenciados tenham de
ser absolvidos daquela imputação, seja à luz da versão original da Lei nº 34/87, de
16.07, seja à luz da versão decorrente da Lei nº 108/2001, de 28.11, pelo que não haverá
sequer que proceder ao cotejo dos regimes penais em causa (que no caso é o mesmo,
pois nessa parte não se registou qualquer alteração).
É certo que, tendo presente a matéria dada como provada a propósito do capítulo
1.3 da pronúncia, os arguidos Fátima Felgueiras, Júlio Faria, Vítor Borges, Carlos
Marinho, Gabriel Almeida, Horácio Costa e Joaquim Freitas (uns como co-autores e
outros como cúmplices) deveriam ser punidos pela prática de um crime de participação
enconómica em negócio, p. e p. pelo nº 2 do artº 23º da Lei nº 34/87, de 16.07.
Na verdade, demonstrou-se que duas entregas de verbas em numerário pela
“Resin” constituíram dois retornos no âmbito do contrato formalmente celebrado entre
a CMF e a “Norlabor”, sendo certo que parte dessa verba viria a servir para a aquisição
do “Audi A4” referido nos autos e para financiar, designadamente, a campanha eleitoral
do PS local relativa às eleições autárquicas de 1997 (cfr. a matéria dada como provada a
propósito do capítulo 3º da pronúncia).
Tal conduta representa um minus em relação ao objecto do processo, pelo que
poderia aqui ser considerada, desde que se procedesse à comunicação a que alude o artº
358º, nº 1, do CPP (cfr. artº 1º, al. f), a contrario, do mesmo diploma legal).
Sucede, porém, que esse crime é punível com pena de multa de 50 a 150 dias.
Consequentemente, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de 2 anos
(cfr. artº 118º, nº 1, al. d), do CP), prazo esse que entretanto se esgotou, prescrevendo
assim o respectivo procedimento criminal.
Não podem pois os aludidos arguidos ser punidos, seja a que título for, pela
prática desse crime.
Note-se, em todo o caso, que o arguido Barbieri, em face da factualidade
apurada, não deveria ser punido pela prática desse crime, ainda que o procedimento
criminal não estivesse prescrito, pois ele ignorava que através da simulação daquele
contrato com a “Norlabor” a arguida Fátima e os seus sequazes iriam obter verbas que
lhes permitiram, designadamente, financiar as suas actividades.
Não devendo nenhum dos arguidos ser punido pela prática desse crime, perde
interesse discorrer acerca do grau de participação do arguido Carlos Marinho, em
termos de se saber se deveria ser punido a título de co-autoria ou de cumplicidade (cfr.
artgs 26º e 27º do CP), assim como já não valerá a pena fazer a distinção entre os
conceitos de consumação formal e consumação material dos crimes, em ordem a saber
se o arguido Gabriel Almeida (tendo presente que só em Setembro de 1997 entrou para
os quadros da “Resin”) poderia ou não ser punido a título de cumplicidade.
Ademais, poder-se-ia colocar o problema de se saber se a conduta provada não
integra a previsão do artº 14º, al, b), da referida Lei nº 34/87, de 16.06 (crime de
violação de normas de execução orçamental), quando é certo que a “Resin” acabou por
receber da CMF várias verbas, no âmbito de um ajuste directo encapotado por vários
outros negócios formalmente celebrados com “testas de ferro”, sem que fosse aposto
qualquer visto pelo TC (no que respeita portanto ao real negócio em causa – o contrato
dissimulado).
Sucede porém que, nestes autos, está vedado ao Tribunal a imputação de tal
ilícito penal, sob pena de nulidade, por extravasar o objecto deste processo (cfr. artgs 1º,
al. f); 118º, nº 1; 359º, nº 1; e 379º, nº 1, al. b), do CPP), além de que, em face de
certidão mandada extrair pelo MP no final do inquérito, presume-se que tal matéria seja
objecto de outros autos, ignorando-se em que fase se encontram.

691
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

2.2.1.2. – A propósito do 2º capítulo da pronúncia


Vieram pronunciados os arguidos:
- Anastácio Macedo (ponto 2.1. da pronúncia), Carlos Sampaio Teixeira (ponto
2.2. da pronúncia), Guilherme Almeida (ponto 2.3. da pronúncia), José Manuel Pimenta
da Silva (ponto 2.4. da pronúncia), Joaquim Teixeira Pinto (ponto 2.4. da pronúncia) e
Maria Augusta (ponto 2.5. da pronúncia), pela prática, em autoria material e na forma
consumada, de um crime de corrupção activa, p. e p. pelo artº 374º, nº 1, do CP;
- Fátima Felgueiras pela prática, a título de autoria e na forma consumada, de
seis crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo artº 16º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16.07 (pontos 2.1. a 2.5. da pronúncia);
- Horácio Costa pela prática, a título de cumplicidade e na forma consumada, de
dois crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelos artgs 16º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16.07, e 27º e 28º do CP (pontos 2.1. e 2.3. da pronúncia);
- Joaquim Freitas pela prática, a título de cumplicidade e na forma consumada,
de um crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelos artgs 16º, nº 1, da Lei nº
34/87, de 16.07, e 27º e 28º do CP (ponto 2.1. da pronúncia);
- Bragança da Cunha pela prática, a título de cumplicidade e na forma
consumada, de um crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelos artgs 16º,
nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07, e 27º e 28º do CP (ponto 2.5. da pronúncia).
No despacho de pronúncia, a dado passo, escreveu-se o seguinte:
Estabelece o art. 18º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 18/07 (crime imputado aos
arguidos, cfr. fls. 6211 e 6212, do 25º vol.), na redacção dada pela Lei nº 108/2001, de
28/11 que “quem, por si, ou por interposta pessoa, com o consentimento ou ratificação,
der ou prometer a titular de cargo político, ou a terceiro com conhecimento daquele,
vantagem patrimonial ou não patrimonial que ao titular de cargo político não seja
devida, com o fim indicado no art. 16º, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5
anos”.
(...)
O bem jurídico protegido pela norma consiste na “autonomia intencional do
Estado”, ou seja “a corrupção traduz-se numa manipulação do aparelho do Estado
pelo empregado público que, assim, viola a autonomia intencional do último, ou seja,
infringe as exigências de legalidade, objectividade e independência que, num Estado de
Direito, têm sempre de presidir ao desempenho das funções públicas” (sublinhado
nosso) – vide Almeida Costa, in “Código Conimbricense do Código Penal”, Tomo III,
Coimbra Editora, pág. 661; e ainda Ac. do S.T.J, de 03/10/2002, C.J./S.T.J., Tomo III,
2002, págs. 185 e segs..
A corrupção activa verifica-se quando alguém oferece ou promete (ou satisfaz a
solicitação de) uma vantagem patrimonial ou não patrimonial (excluem-se os subornos
que forem de considerar irrelevantes ou até consentidos pelos hábitos ou praxes sociais
ou de sector de actividade) indevida como contrapartida de um acto (lícito ou ilícito,
anterior ou subsequente) de um titular de cargo político (art. 3º da Lei nº 34/87, de
16/07) “no exercício do seu cargo ou dos poderes de facto dele decorrentes” (a
actuação, neste ultimo caso, traduzir-se-á em poderes de facto, nos casos em que a
gratificação representa a contrapartida de um acto realizado no exercício do cargo
quer do próprio - titular - quer daquele que se encontra numa relação funcional
imediata e directa com o serviço) - ob. loc., págs. 665, 670, e 681.
A corrupção activa prevista no art. 18º daquela diploma reveste, actualmente, a
natureza de delito comum, a qual se consome com o oferecimento ou promessa de
suborno por parte do agente, independentemente da aceitação ou recusa do titular do
cargo político (crime de resultado), sendo a mesma dolosa (de entre outros, ver Acs. da

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2º Juízo

R.P., de 14/12/1994 e 16/03/1998 e 13/05/1998, publicados na Internet no site


www.dgsi.pt/jtrp.nsf).
No que respeita ao crime de participação económica, p. e p. pelo art. 23º
daquele diploma legal, e de forma a evitar repetições desnecessárias, dão-se por
reproduzidas as considerações acima tecidas.
Pelas mesmas razões, dão-se por reproduzidas, também, as considerações
tecidas quanto ao concurso de normas.
Como refere Conceição Ferreira da Cunha (ob. cit., págs. 734 e 735) quanto ao
art. 377º (que corresponde praticamente ao art. 23º daquele diploma, pelo que as
considerações que se seguem, terão aqui plena aplicação), entre o crime de
participação económica e o crime de corrupção parece haver uma relação de exclusão
(porque consubstanciam situações diferentes), o que significa que a conduta não pode
preencher, ao mesmo tempo, ambos os tipos legais.
Para além de outras dissemelhanças, há que salientar que enquanto no crime de
corrupção (art. 18º, nº 1), a vantagem solicitada surge como contrapartida de um certo
comportamento (neste caso, a relação existente entre o comportamento e a vantagem
mostra-se essencial, já que esta é a contrapartida daquele), na participação económica
(art. 23º, nº 1), a vantagem é a própria participação económica, a qual lesa os
interesses patrimoniais confiados ao agente (ob., loc. cit.).
Assim sendo, verificando-se uma relação de exclusão entre aquelas normas
incriminadoras (exclusão que se verifica, pelas mesmas razões, relativamente ao crime
de corrupção passiva – ob., loc. cit.), não poderão as condutas descritas na acusação
preencher, simultaneamente, ambos os tipos de ilícitos, que, como se infere da
acusação são em número idêntico (isto é, cinco crimes de corrupção activa e cinco
crimes de participação económica em negócio).
Fazemos nossas estas considerações, sendo certo que são válidas quer no que
concerne ao crime de corrupção activa p. e p. pelo artº 374º, nº 1, do CP, quer no que
respeita ao crime de corrupção activa, p. e p. pelo artº 18º da Lei nº 34/87, de 16.07.
Escreveu-se ainda na decisão instrutória que:
Estabelece o art. 16º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 17/07, na redacção dada pela Lei
nº 108/2001, de 28/11, que “o titular de cargo político que no exercício das suas
funções, por si ou interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar
ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou
não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão contrários aos
deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com
pena de prisão de 2 a 8 anos”.
O preenchimento do tipo faz-se com a solicitação, aceitação ou promessa de
vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida por parte do titular do cargo
político, directamente ou por interposta pessoa a troco da prática de acto ou omissão
que implique violação dos deveres de cargo (em acto que chega a ser executado).
Assim, basta que o acto praticado por aquele agente implique a violação dos
deveres do seu cargo, podendo o crime de corrupção passiva fundar-se quer na
omissão ou demora de realização de actos funcionais quer por comportamento positivo
do arguido.
O crime fica consumado com a consciência, por parte titular do cargo político,
da dádiva ou promessa e da finalidade com que elas são feitas. – cfr. Leal Henriques e
Simas Santos, in “Código Penal”, II vol., Rei dos Livros, 2ª Ed., 1996, pág. 1181.
Chama-se agora à colacção o que a propósito foi dado como provado a respeito
do capítulo 2º da pronúncia, que aqui não se reproduz pelos mesmos motivos já acima
assinalados.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Ora, não se demonstrou a existência de qualquer correlação entre os donativos


efectuados e o andamento dos processos de licenciamento e de contra-ordenação
referidos nos autos.
Por outro lado, a arguida Fátima, bem ou mal não cabe aqui explanar, decidiu
esses mesmos processos em face dos pareceres técnicos proferidos, o que exclui o dolo,
pois não sendo técnica da área, não terá actuado com a consciência de que alguma
ilegalidade estaria a ser cometida.
Consequentemente, não se tendo sequer demonstrado todos os elementos
obejctivos dos tipos legais em causa (respeitantes à corrupção activa e passiva) – e
muito menos o dolo -, seja qual for o regime aplicável (do CP ou da Lei nº 34/87, de
16.07, esta última em qualquer uma das suas versões), deverão ser absolvidos os
arguidos Fátima Felgueiras, Horácio Costa, Joaquim Freitas, Bragança da Cunha, Maria
Augusta, Guilherme Almeida, Anastácio Macedo, Joaquim Teixeira Pinto, José Manuel
Pimenta da Silva e Carlos Sampaio Teixeira.
Não se torna assim necessário apreciar as demais questões levantadas,
designadamente pelo arguido Bragança na sua contestação.

2.2.1.3. – A propósito do 4º capítulo da pronúncia


Veio a arguida Fátima Felgueiras pronunciada, com referência ao capítulo 4º da
pronúncia, pela prática de dois crimes de prevaricação, p. e p. pelo artº 11º, da Lei nº
34/87, de 16.07.
Estabelece esse dispositivo legal que “O titular de cargo político que
conscientemente conduzir ou decidir contra direito um processo em que intervenha no
exercício das suas funções, com a intenção de por essa forma prejudicar ou beneficiar
alguém, será punido com prisão de dois a oito anos.”
O núcleo essencial do tipo legal em causa pode reconduzir-se à actuação do
titular do cargo político contra o direito, tratando-se de um crime específico (próprio),
isto é, praticado por titular de cargo político num processo em que tenha intervenção em
razão das suas funções, com as inerentes implicações em termos de comparticipação, já
abordadas acima e que neste caso não se colocam.
A criminalização deste tipo de condutas visa, ao fim ao cabo, a protecção da
autoridade e credibilidade da administração do Estado, à semelhança aliás do que
sucede com a crimininalização do abuso de poderes, mas no âmbito de um processo,
que deve ser conduzido de forma escorreita, de modo a preservar a credibilidade e a
confiança que a colectividade deve depositar no Estado e nos seus órgãos na
prossecussão das suas atribuições de natureza pública.
A acção tem de ser contra legem, isto é, desde logo, contra o conjunto de
normas vigentes na ordem jurídica positiva, independentemente da sua fonte, de
natureza material ou processual, de natureza pública ou privada.
Deve-se ainda incluir os princípios jurídicos não consignados expressamente
pelo direito positivo, já que fazem parte integrante da ordem jurídica considerada no seu
todo.
O modo de agir pode consubstanciar-se de diversas formas, seja por acção
(como por exemplo a aplicação incorrecta de normas materiais ou adjectivas) seja por
omissão (por ex. o protelamento de uma decisão), desde que seja violada de forma
ostensiva a verdade objectiva (ou de forma mais remota a verdade subjectiva do agente,
isto é, tal como por ele é apreendida) ou os seus deveres funcionais enquanto titular do
cargo político, tudo no âmbito do processo de decisão.

694
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

No que ao tipo subjectivo concerne, a acção tem de ser dolosa, mas não em
qualquer uma das suas formas (não abarca o dolo eventual, pois só assim se percebe a
expressão “conscientemente”).
De facto, a actuação contra o direito, por um lado, tem de ser consciente e, por
outro, exige-se ainda o dolo específico, consubstanciado na intenção de, dessa forma,
prejudicar ou beneficiar alguém (entendidas em sentido lato).
O tipo de consciência exigível por parte do agente (conteúdo do dolo) deverá
reconduzir-se à representação, no momento da condução ou decisão do processo, do
conteúdo das normas e princípios jurídicos conscientemente violados pelo agente, caso
contrário poder-se-ia punir a negligência (que no caso é insusceptível de punição).
Disto decorrerá, por via de regra, a ilicitude do comportamento em causa.
Ora, tendo presente estes princípios e a matéria de facto dada como provada a
propósito do capítulo em apreço, haverá, muito sinteticamente, que averiguar se no
âmbito dos processos referenciados, alguma decisão foi tomada contra o direito
(enquanto elemento objectivo do tipo) e, em caso afirmativo, se existiu alguma
consciência desse facto por banda da arguida Fátima (enquanto elemento subjectivo do
tipo de ilícito em questão).
Naturalmente que, falhando algum desses pressupostos, a decisão a proferir terá
de ser de absolvição.
Assim:
No âmbito do processo de obra particular nº 130/88, a questão que se levanta
relativamente à legalidade da emissão da licença de construção por parte da CMF
prende-se com a inobservância dos limites da construção à propriedade do vizinho.
Ora, sempre que o vizinho, nessas hipóteses, não se oponha a tal, a CMF
costuma deferir o respectivo licenciamento, desde que todos os demais requisitos
estejam preenchidos.
A declaração de vontade do vizinho terá assim algum relevo?
Tudo dependerá do facto de considerarmos se o que aqui está em causa são
interesses de natureza pública ou meramente privados.
S.m.o., o afastamento ao limite da propriedade do vizinho visa em primeira linha
a protecção do direito de propriedade deste, direito esse que, sendo disponível, pode ser
comprimido, e só reflexamente poderá a regra em causa tutelar algum interesse público
(já não assim no que respeita ao afastamento da construção à via pública).
Nessa medida, a posição adoptada pela CMF parece ser defensável.
Seja como for, ainda que assim não se entenda, inexistiu qualquer violação
consciente de qualquer norma, designadamente do RGEU, por banda da arguida Fátima
Felgueiras, tanto mais que estribou-se sempre em pareceres técnicos.
Consequentemente, deve ser absolvida no que ao crime em causa concerne
(ponto 4.1. da pronúncia).
O mesmo se diga, de resto, em relação ao outro crime, da mesma natureza,
reportado agora ao processo de obra particular nº 5/I/93 (ponto 4.2. da pronúncia).
É certo que quando foi deferido o licenciamento da obra em causa já estava em
vigor o PDM de Felgueiras e que a construção em causa, pela sua volumetria, viola esse
instrumento de ordenamento do território.
Porém, o processo de licenciamento mencionado iniciou-se antes do PDM ter
entrado em vigor, colocando-se a questão de se saber qual a lei a aplicar.
Sendo defensável qualquer uma das teses em confronto (aplicação imediata do
PDM ou aplicação dos regulamentos urbanos em vigor ao tempo da entrada do processo
na CMF) e tendo a arguida Fátima estribado as suas decisões em pareceres técnicos

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

favoráveis, não se demonstrou de todo que ela conscientemente tenha decidido contra o
direito.
Deve pois ser igualmente absolvida no que a este crime concerne.

2.2.1.4. – A propósito do 5º capítulo da pronúncia


Além do mais, veio ainda a arguida Fátima Felgueiras pronunciada pela prática
de um crime de prevaricação, p. e p. pelo artº 11º, da Lei nº 34/87, de 16.07. (o
procedimento criminal relativo ao crime de abuso de poderes de que ela também veio
pronunciada a propósito do 5º capítulo da pronúncia foi declarado prescrito na audiência
de julgamento, pelo que não foi objecto de apreciação).
Chama-se aqui à colacção, a propósito da delimitação do tipo legal em causa, o
que por nós já foi referido no ponto 2.2.1.3.
Chama-se ainda à colacção a matéria que a propósito do capítulo 5º da
pronúncia foi dada como provada, que aqui não é explanada para não tornar ainda mais
incomportável a já longa extensão deste acórdão.
Ora, tendo presente tudo isso, podemos concluir com segurança que nem sequer
o elemento fundamental do tipo objectivo de ilícito em causa se demonstrou, isto é, que
a arguida Fátima tenha decidido contra o direito.
Na verdade, no processo de escolha da empresa que viria a executar para a CMF
os serviços de comunicação e imagem descritos, ela escolheu a empresa que ficou
melhor classificada segundo avaliação efectuada pela comissão de análise das propostas
apresentadas pela “Proeme” e “Isto É”, nomeada de resto para o efeito.
Consequentemente, deverá a arguida Fátima Felgueiras ser absolvida no que a
este crime concerne.

2.2.1.5. – A prpósito do 6º capítulo da pronúncia


Veio a arguida Fátima Felgueiras pronunciada pela prática do crime de abuso de
poderes, p. e p. pelo artº 26º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/87, com referência ao capítulo 6º da
pronúncia.
Dispõe a norma em causa o seguinte:
“1. O titular de cargo político que abusar dos poderes ou violar os deveres
inerentes às suas funções, com a intenção de obter, para si ou para terceiro, um
benefício ilegítimo ou de causar um prejuízo a outrem, será punido com prisão de seis
meses a três anos ou multa de 50 a 100 dias, se pena mais grave não lhe couber por
força de outra disposição legal.
2. Incorre nas penas previstas no número anterior o titular de cargo político
que efectuar fraudulentamente concessões ou celebrar contratos em benefício de
terceiro ou em prejuízo do Estado.”
O bem jurídico protegido com a incriminação deste tipo de condutas é a
autoridade e credibilidade da administração do Estado (cfr. Paula Ribeiro de Faria, em
comentário ao artº 382º do CP – cujas considerações têm pertinência nesta sede –, in
Comentário Conimbricense do Código Penal – Parte Especial, Tomo III, Coimbra
Editora, 2001, pág. 774).
O preenchimento do tipo legal poderá ocorrer através do abuso de poderes ou da
violação de deveres inerentes às funções do titular do cargo político.
Tendo em atenção a qualidade do agente, trata-se de um crime específico
próprio, pelo que mais uma vez, em tese geral, se coloca o problema da comunicação
das circunstâncias típicas (no caso em apreço esse problema não se coloca; cfr., em todo
o caso, o artº 28º, nº 1, do CP).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

O abuso de poderes, por via de regra, consubstancia-se na respectiva


instrumentalização para finalidades estranhas ou contrárias às permitidas pelo direito
administrativo, finalidades essas que, assim, são ilegítimas.
Será o caso do titular do cargo político que, instrumentalizando os poderes
inerentes às suas funções, excede os limites das suas competências ou viola a lei (isto é,
contraria as normas jurídicas com as quais o acto administrativo se deveria conformar),
ou ainda actua com desvio de poder (poder discricionário), usando-o para fim diverso
daquele para o qual lhe foi conferido.
Do tipo legal em causa parece estar excluída a incompetência absoluta (pois
neste caso não se pode falar em abuso de poderes que não se têm) e a usurpação de
poderes (pela mesma razão).
Já a violação de deveres reporta-se aos deveres funcionais, relacionados com o
exercício da função, incluindo-se quer os deveres específicos quer os deveres genéricos.
Não se exige que o abuso de poderes ou a violação de deveres venham referidos
a um acto administrativo, apenas que os poderes ou deveres em causa sejam inerentes à
função do titular do cargo político e desde que esteja em causa um acto idóneo a
produzir efeitos jurídicos enquanto manifestação da vontade do Estado.
O respectivo tipo legal tanto pode ser preenchido por acção como por omissão (o
não exercício de poderes ou o exercício atrasado dos mesmos pode ser abusivo, desde
que praticado com a intenção de obter uma vantagem ilícita ou prejudicar alguém).
O agente terá de actuar com a intenção de obter para si ou para terceiro um
benefício ilegítimo ou de causar prejuízo a outra pessoa (se se entender que esta
intenção se reporta ao tipo subjectivo de ilícito, tender-se-á a considerá-la como sendo
um dolo específico. Caso se entenda que se reporta ao tipo objectivo de ilícito, afirmará-
se-á apenas a existência de um dolo genérico ao nível do tipo subjectivo de ilícito).
O benefício pode assumir natureza patrimonial ou não patrimonial.
Tem de ser ilegítimo, sendo certo que a sua ilegitimidade não decorre apenas da
ciscnstância de ter sido prosseguido com abuso de poderes ou com violação de deveres
funcionais, genéricos ou específicos.
O abuso de poderes ou de deveres funcionais tem de se manifestar exteriormente
através da lesão do bom andamento e imparcialidade da administração, adquirindo
assim autonomia enquanto parámetro normativo susceptível de afirmar a
responsabilidade criminal do agente.
Assim, tendo o legislador optado por colocar o abuso de poderes ou a violação
de deveres (uns e outros funcionais) como o núcleo central da ilicitude do
comportamento, mas não afastando a consideração da natureza ilegítima da finalidade
prosseguida como elemento adicional para apurar a responsabilidade do agente, aquela
particular intenção que conforma a resolução criminosa parece circunscrever-se ao tipo
subjectivo de ilícito e assim constituir um dolo específico.
O agente poderá ainda actuar com a intenção de causar prejuízo a outrem (o
destinatário do acto praticado com abuso de poderes ou com violação de deveres
funcionais), não necessariamente patrimonial.
A conduta terá de ser dolosa, afastando-se porém o dolo eventual.
Isto é, torna-se necessário que agente tenha a consciência e a vontade de exercer
uma função pública compreendida no âmbito do cargo político de que é titular,
abusando dos poderes ou violando os deveres que lhe são inerentes, exigindo-se ainda o
conhecimento do carácter ilegítimo da vantagem ou do prejuízo pretendidos.
Para efeitos de consumação do crime, é irrelevante a efectiva verificação do
dano ou da vantagem prosseguida. Basta assim a prática do acto ou do facto abusivo por
parte do agente.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Por outro lado, o agente será ainda punido se, fraudulentamente, efectuar
concessões ou celebrar contratos em benefício de terceiro ou em prejuízo do Estado.
Ainda aqui se descortina uma ideia de instrumentalização de poderes em ordem
à prossecussão de fins estranhos à razão de ser da atribuição desses poderes ou de
violação de deveres funcionais em subordinação a interesses de natureza particular, em
todo o caso consubstanciada na efectivação de concessões ou na celebração de contratos
a favor de terceiro.
Tendo presente estes considerandos e a matéria de facto dada como provada a
propósito do capítulo 6º da pronúncia, constata-se que não se demonstraram sequer os
seus elementos objectivos, isto é, que a arguida Fátima Felgueiras, abusando dos seus
poderes ou violando os seus deveres, tenha procurado beneficiar o “Sovela” (o tal
benefício ilegítimo).
Isto é, dito doutro modo, não se demonstrou que ela, instrumentalizando aqueles
poderes ou violando os respectivos deveres, tenha prosseguido qualquer fim a eles
estranho.
Deve por isso ser absolvida da imputação em causa.

2.2.1.6. – A propósito do 7º capítulo da pronúncia


Com referência ao capítulo em causa, veio a arguida Fátima pronunciada pela
prática de um crime de peculato, p. e p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07.
Dispõe essa norma o seguinte:
“1. O titular de cargo político que no exercício das suas funções ilicitamente se
apropriar, em proveito próprio ou de outra pessoa, de dinheiro ou qualquer outra coisa
móvel que lhe tiver sido entregue, estiver na sua posse ou lhe for acessível em razão das
suas funções será punido com prisão de três a oito anos e multa até 150 dias, se pena
mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.”
Tendo em atenção a qualidade do agente e a sua relação com o bem (dinheiro ou
outra coisa móvel), trata-se de um crime específico impróprio, pelo que se pode colocar
o problema da comunicação das circunstâncias típicas (no caso em apreço esse
problema não se coloca; cfr., em todo o caso, o artº 28º, nº 1, do CP).
Com a incriminação deste tipo de condutas visa-se, por um lado, a protecção de
bens jurídicos patrimoniais alheios e, por outro, a tutela da probidade e da fidelidade
dos titulares de cargos políticos para se garantir o bom andamento e a imparcialidade da
administração (cfr. as considerações que a propósito são efectuadas por Conceição
Ferreira da Cunha, em comentário ao artigo 375º do CP, in Comentário Conimbricense
do Código Penal – Parte Especial, Tomo III, Coimbra Editora, 2001, págs. 686 e ss.).
O crime em questão integra assim dois elementos: o crime patrimonial (a
similitude com o crime de abuso de confiança é flagrante, podendo-se mesmo dizer que
se trata de um crime de abuso de confiança qualificado tendo em atenção a qualidade do
agente) e o abuso duma função de natureza política (dito doutro modo, a violação do
interesse patrimonial do Estado e do interesse do Estado na fidelidade dos titulares de
cargos políticos).
Assim, existirá abuso de função quando o titular do cargo político se apropriar
ou onerar bens de que tem a posse em razão das funções que exerce, violando, com esse
comportamento, a relação de fidelidade pré-existente
Terá pois de existir uma relação de fidúcia pré-existente que é posta em causa
com o ilícito criminal a que nos vimos referindo.
O objecto do crime em causa é o dinheiro (moeda metálica ou notas do banco
que tenham curso legal no nosso país ou no estrangeiro, bem como títulos que possam
ser equiparados a dinheiro por exprimirem um valor patrimonial, como por exemplo os

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2º Juízo

títulos e os cartões de crédito) ou outra coisa móvel (nestes se pode incluir os títulos e
os cartões de crédito, se não se optar por um conceito amplo de dinheiro, na medida em
que estão corporizados em documentos; a energia; veículos, etc. Parece não ser de
incluir, face ao princípio da tipicidade, a energia de trabalho de funcionários públicos
cujo labor é desviado para fins particulares, entendimento extensível ao peculato de uso
e que terá relevância mais à frente, a propósito do capítulo 10º da pronúncia).
O dinheiro ou a coisa móvel tem de ser alheia ao agente e pode pertencer ao
Estado ou a particulares (apesar de não vir referida na norma, ao contrário do que
sucede no artº 375º, nº 1, do CP), em todo o caso, desde que eles estejam submetidos,
ainda que temporariamente, ao poder público.
Por outro lado, esses bens têm de ter sido entregues, estarem na posse ou serem
acessiveis ao agente em razão das suas funções, sendo certo que a posse deve ser
entendida em sentido lato, abrangendo por conseguinte quer a detenção material quer a
disponibilidade jurídica do bem ou detenção indirecta (isto é, o bem encontra-se na
detenção material ou directa de outrem, mas o titular do cargo político pode dispor do
bem ou conseguir a sua detenção material mediante um acto para o qual tem
competência em razão das suas funções. Será assim o caso do titular do cargo político
que – fazendo uso dos seus poderes - dá uma ordem de pagamento em seu benefício,
desde que esse pagamento não lhe seja devido).
Por via de regra, exige-se a anterioridade da posse ou da detenção do bem, mas,
em caso de detenção indirecta ou de disponibilidade jurídica do bem, a detenção
material e a apropriação poderão ocorrer simultaneamente.
No exemplo dado, o poder de disposição é exercido mediante uma ordem de
pagamento, que ocorreu antes da apropriação ou detenção material propriamente dita.
Dito doutro modo, a posse, entendida em sentido lato, é pré-existente (pois o
poder de disposição foi efectivamente exercido mediante uma ordem de pagamento) em
relação à apropriação e detenção material do dinheiro com o acto do recebimento.
Estas considerações terão sobretudo interesse a propósito do capítulo 9º, ponto
1, conforme mais adiante se verá.
O agente deverá ter a posse em razão das suas funções, factor que aliás agrava a
ilicitude da apropriação, pois dessa forma ele trai a relação de fidúcia pré-existente.
Dito doutro modo, terá sempre de existir uma relação causal entre a posse (que
facilita a apropriação) e a função exercida pelo titular do cargo político.
A apropriação (isto é, o acto de fazer seu o bem, agindo como se fosse o seu
proprietário) terá de ser ilícita (ou ilegítima), na justa medida em que a dita apropriação
não deriva de qualquer título aquisitivo do direito de propriedade e contraria as normas
existentes no ordenamento jurídico que regulam o direito de propriedade e a sua
transmissão e aquisição.
A apropriação pode ser efectuada em proveito próprio do titular de cargo
político ou de terceiro (a concepção de apropriação não coincide com a concepção do
proveito ou da vantagem).
No que ao tipo subjectivo diz respeito, trata-se de um crime doloso, pelo que o
agente terá de ter conhecimento da factualidade típica, designadamente terá de ter
consciência de que se trata de um bem alheio de que tem a posse em razão das suas
funções, conhecimento esse que pode ser de “leigo” (sob pena de se excluir o elemento
intelectual do dolo), e terá ainda de ter consciência, entrando já no elemento volitivo do
dolo, e a vontade de fazer seu o bem para o seu próprio benefício ou de terceiro.
Ora, tendo presente a factualidade apurada a propósito do 7º capítulo da
pronúncia – que aqui se invoca mas que não se reproduz para não tornar ainda mais
extenso este acórdão -, somos de imediato levados a concluir que não se provou que a

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2º Juízo

arguida Fátima se tenha sequer apropriado do telemóvel “AEG” referido nos autos,
propriedade da CMF.
Não se tendo sequer demonstrado os elementos objectivos do tipo, é óbvio que a
arguida deve ser absolvida no que ao crime em causa concerne.

2.2.1.7. – A propósito do 8º capítulo da pronúncia


Com referência ao capítulo em causa, veio a arguida Fátima pronunciada pela
prática de mais um crime de peculato, p. e p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de
16.07.
Dão-se aqui por integralmente reproduzidas as considerações que, reportadas ao
respectivo tipo legal, acima fizemos a propósito do 7º capítulo da pronúncia.
Tendo-as presente e a factualidade dada como provada a propósito do 8º capítulo
– que aqui não se reproduz pelas razões já mencionadas -, conclui-se que inexistiu
qualquer apropriação ilegítima dos dinheiros camarários, pois demonstrou-se que os
filhos dela, Sandra e João Felgueiras, deslocaram-se a Cabo Verde integrados numa
comitiva de geminação.
Não estando sequer demonstrados os elementos objectivos do tipo, deverá a
arguida ser absolvida da imputação em causa.

2.2.1.8. – A propósito do 9º capítulo da pronúncia


Veio ainda a arguida Fátima pronunciada pela prática de 1 crime de peculado,
desta feita sob a forma continuada, p. e p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07,
conjugado com o artº 30º, nº 2, do CP.
Chama-se aqui à colacção as considerações já tecidas a propósito do tipo de
ilícito em causa e invoca-se a matéria de facto que a propósito se tem por demonstrada,
que não se reproduz pelas razões já insistentemente referidas.
A imputação em causa é feita a título de crime continuado.
A propósito, dispõe o artº 30º, nº 2, do CP, que “Constitui um só crime
continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime
que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada de forma
essencialmente homogénea e no quadro de solicitação de uma mesma situação exterior
que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
Escreveu a Professora Teresa Beleza, in Direito Penal, II, p. 613, que “(...) uma
pessoa, durante um certo período de tempo, comete uma série de crimes seguidos que
têm entre si uma certa relação de homogeneidade em termos de actuação e em termos
de sucessão temporal; e, por outro lado, o traço essencial dessa situação é que a
própria continuação ou repetição criminosa deriva não tanto de a pessoa ser
especialmente persistente ou ter especiais tendências criminosas, mas do facto de que,
de alguma forma, a prática do primeiro acto favoreceu a decisão sucessiva em relação
à continuação, porque há um certo circunstancionalismo externo que facilitou essa
sucessiva reiteração de uma acção idêntica. Esse circunstancionalismo externo, na
medida em que facilita o sucessivo “cair em tentação”, se quiserem, do agente dos
crimes, significa que na medida em que há essa facilitação, a pessoa é menos
censurável por ter ido sucessivamente sucumbindo à tentação”.
Por conseguinte, a verificação do crime continuado depende da verificação dos
seguintes pressupostos:
- realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos que protejam
fundamentalmente o mesmo bem jurídico (no caso dos autos o arguido praticou sete
crimes de falsificação de documento);

700
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

- homogeneidade da forma de execução ou seja, unidade do injusto objectivo da


acção (no caso dos autos a forma de execução é idêntica);
- unidade do dolo, ou seja, unidade do injusto pessoal da acção, sendo certo que
as diversas resoluções criminosas devem conservar-se dentro de uma linha psicológica
continuada (é o caso dos autos, visto que a cada acto presidiu uma resolução criminosa
distinta mas sempre idêntica e em ocasiões distintas);
- lesão do mesmo bem jurídico, ou seja, unidade do injusto de resultado, desde
que não estejam em causa bens eminentemente pessoais 21 (no caso dos autos o arguido
violou sempre o mesmo bem jurídico – a segurança e a credibilidade do tráfico jurídico
relacionado com os sobreditos documentos);
- persistência de uma situação exterior que facilite a execução e que diminua
consideravelmente a culpa do agente (que também se verifica neste caso, dado o
contexto da actuação do arguido: num quadro de crise financeira e de insuficiência de
recursos para manter o status quo a que estava habituado, o arguido dispunha de
fotocópias dos documentos pessoais de identificação da sua cunhada Yolanda, ou seja,
dos meios essenciais de execução dos ilícitos criminais em causa).
Ora, tendo presente a factualidade apurada, apenas se pode imputar a prática de
um crime de peculato à arguida Fátima no que se refere ao ponto 1., do capítulo 9º da
pronúncia, o que desde logo afasta a ideia de qualquer continuação.
Inexiste pois qualquer violação plúrima do mesmo bem jurídico, mas apenas
uma única violação desse bem jurídico, reportada às ajudas de custo indevidamente
recebidas pela arguida Fátima no âmbito da visita à Irlanda do Norte, conforme de
seguida se verá.
Por outro lado, dispõe o artº 2º, nº 1, do DL nº 192/95, de 28.07, o seguinte:
“1 – O pessoal que se desloque ao estrangeiro e no estrangeiro, por motivo de
serviço público, tem direito, em alternativa e de acordo com a sua vontade, a uma das
seguintes prestações:
a) Abono da ajuda de custo diária, em todos os dias da deslocação, de acordo
com a tabela em vigor;
b) Alojamento em estabelecimento hoteleiro de três estrelas, ou equivalente,
acrescido do montante correspondente a 70% da ajuda de custo diária, em todos os
dias da deslocação, nos termos da tabela em vigor.
E, nos termos do artº 9º, nº 1, do mesmo diploma legal “Os funcionários e
agentes que se desloquem em serviço público por tempo determinado têm direito ao
abono adiantado das respectivas ajudas de custo.”
Ora, no caso em apreço, a arguida Fátima Felgueiras – concluímos da
factualidade apurada a propósito do ponto 1 do 9º capítulo da pronúncia – recebeu
antecipadamente ajudas de custo por parte da CMF, conforme direito que lhe assiste
(cfr. artº 9º, nº 1, do DL nº 192/95, de 28.07).
Porém, tendo presente o disposto no artº 2º, nº 1, al. b), do DL nº 192/95, de
28.07, acima citado, apenas teria direito ao recebimento antecipado de 70% do valor das
ajudas de custas respectivas (e não 100%), visto que, conforme ela já sabia
antecipadamente, seria a AMVS a suportar as despesas de alojamento (onde se incluía o
pequeno almoço).
De facto, tendo presente o disposto no artº 9º, nº 1, als. a) e b), do mencionado
diploma legal, ela teria de optar ou pelo recebimento de ajudas de custo completas
(100%), nesse caso sem direito a alojamento, ou, tendo sido providenciado o

21
Cfr, ac. do STJ, de 23.10.91, in CJ, XVI, IV, p. 43 e ss.

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

alojamento, apenas teria direito a receber, antecipadamente ou não, 70% do valor das
ajudas de custas respectivas.
Foi aliás por isso que a AMVS lhe pagou as ajudas de custo num valor
equivalente a cerca de 70%, que ela no mesmo dia devolveu à CMF.
Houve assim um locuptamento indevido da quantia de 35.620$00 (118.750$00 –
83.130$00), que não foi restituída à CMF e que, salvo melhor opinião, o deveria ter
sido.
Por outro lado, note-se que essa apropriação deu-se por causa e no exercício das
funções da arguida Fátima enquanto presidente da CMF e, por via disso, membro do
concelho de administração da AMVS.
A dita apropriação, conforme é bom de ver, reverteu, neste caso, em proveito
prórprio.
Com a conduta demonstrada ela violou a relação de fidúcia pré-existente, na
medida em que, em razão das suas funções, detendo indirectamente os fundos
camarários (que estão adstritos à prossecução das finalidades públicas prosseguidas pela
autarquia) – pois deles detinha a disponibilidade jurídica, que exerceu ao emitir a
respectiva ordem de pagamento, no exercício de poderes que lhe são conferidos
enquanto administradora da coisa pública -, vindo-se a apropriar e a deter materialmente
a verba em causa no momento em que a recebeu.
A este propósito, recorda-se o que já se escreveu:
(...) esses bens têm de ter sido entregues, estarem na posse ou serem acessiveis
ao agente em razão das suas funções, sendo certo que a posse deve ser entendida em
sentido lato, abrangendo por conseguinte quer a detenção material quer a
disponibilidade jurídica do bem ou detenção indirecta (isto é, o bem encontra-se na
detenção material ou directa de outrem, mas o titular do cargo político pode dispor do
bem ou conseguir a sua detenção material mediante um acto para o qual tem
competência em razão das suas funções. Será assim o caso do titular do cargo político
que – fazendo uso dos seus poderes - dá uma ordem de pagamento em seu benefício,
desde que esse pagamento não lhe seja devido).
Por via de regra, exige-se a anterioridade da posse ou da detenção do bem,
mas, em caso de detenção indirecta ou de disponibilidade jurídica do bem, a detenção
material e a apropriação poderão ocorrer simultaneamente.
No exemplo dado, o poder de disposição é exercido mediante uma ordem de
pagamento, que ocorreu antes da apropriação ou detenção material propriamente dita.
Dito doutro modo, a posse, entendida em sentido lato, é pré-existente (pois o
poder de disposição foi efectivamente exercido mediante uma ordem de pagamento) em
relação à apropriação e detenção material do dinheiro com o acto do recebimento.
Para além disso, ela agiu voluntariamente e ciente de que apenas teria direito a
receber a quantia de 83.130$00 e que ao embolsar o remanescente (35.620$00) se
apropriava ilicitamente (por não lhe ser devida) de uma verba camarária a que teve
acesso e se apropriou do modo descrito, bem sabendo que ao assim agir, tal conduta era
susceptível de ser punida por lei.
Deve pois a arguida Fátima ser punida pela prática de um crime de peculato, p. e
p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei 34/87 de 16.07.
Quanto às situações referidas na pronúncia no capítulo 9º da pronúncia, pontos 2
e 3., tendo presente que não se demonstrou qualquer apropriação ilegítima por parte da
arguida Fátima – concluímos nós da factualidade apurada a esse propósito -, não
estando pois demonstrados sequer os elementos objectivos do tipo do tipo de ilícito em
causa, constata-se que inexistiu qualquer outra violação do bem jurídico protegido pela

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

norma, de sorte que, conforme já referido, ela não poderá ser punida pela prática do
crime em causa a título de crime continuado.

2.2.1.9. – A propósito do 10º capítulo da pronúncia


Veio também a arguida Fátima Felgueiras pronunciada pela prática de dois
crimes de peculato de uso sob a forma continuada, p. e p. pelo artº 21º, nºs 1 e 2, da Lei
nº 34/87, de 16.07, em conjugação com o nº 2, do artº 30º, do CP.
Dispõe o artº 21º, da Lei nº 34/87, de 16.07, o seguinte:
“1. O titular de cargo político que fizer uso ou permitir a outrem que faça uso,
para fins alheios àqueles a que se destinam, de veículos ou outras coisas móveis de
valor apreciável que lhe tenham sido entregues, estiverem na sua posse ou lhe forem
acessíveis em razão das suas funções será punido com prisão até dezoito meses ou
multa de 20 a 50 dias.
2. O titular de cargo político que der a dinheiro público um destino para uso
público diferente daquele a que estiver legalmente afectado será punido com prisão até
dezoito meses ou multa de 20 a 50 dias.”
O bem jurídico tutelado com a incriminação das condutas em causa é o bom
andamento, legalidade e transparência da administração.
O bem jurídico patrimonial é ainda tutelado pelo nº 1 da norma em causa, na
medida em que penaliza a utilização indevida de bens móveis alheios (os bens móveis a
que se reporta a norma tanto podem ser públicos como particulares, mas sob a alçada,
ainda que temporária, do poder público, embora nesse particular a norma referida não
seja tão explicita como o é o artº 376º, nº 1, do CP; seja como for, é necessário que esses
bens alheios tenham sido entregues ou estejam na disponibilidade do agente por força
das suas funções políticas)
O número 2 do preceito em causa tutela ainda a posse legítima do Estado dos
dinheiros públicos.
O crime consuma-se com o uso indevido – isto é, para fins diferentes daqueles a
que se destina, ainda que lhe seja dado um uso público - de bens móveis de valor
apreciável, de veículos ou de dinheito público (tratam-se pois de situações de desvio),
através de um abuso do cargo pelo respectivo titular, independentemente de ter causado
ou de vir a causar qualquer prejuízo, factor que apenas será relevante em sede de
determinação concreta da pena.
Ora, o objecto do crime em causa, conforme emerge da norma citada, são os
veículos ou outras coisas móveis de valor apreciável.
A referência a veículos é meramente exemplificativa.
Os bens móveis (quanto à noção de bens móveis, cfr. o Comentário
Conimbricense do Código Penal – Parte Especial, em anotação ao artº 208º, do CP)
têm de ter, conforme referido, valor apreciável. Tem-se entendido que esse valor
apreciável se cifra algo abaixo do valor elevado (50 ucs – cfr. artº 202º, al. a), do CP)
mas bastante além do valor diminuto (1 uc - cfr. artº 202º, al. c), do CP), isto é, tendo
presente o valor da uc à data da prática dos factos, entre 14.000$00 e 700.000$00 22 .
Seja como for, a ideia é a de que o uso indevido de uma coisa móvel tem de ter
algum valor (cfr. Conceição Ferreira da Cunha, in Comentário Conimbricense do
Código Penal – Parte Especial, pás 708 e 709), tratando-se assim de um conceito
indeterminado (mas determinável) que terá de ser preenchido caso a caso pelo
intérprete.

22
No triénio 1998/1999/2000 a unidade de conta cifrava-se em 14.000$00, pelo que 50 Ucs, ao tempo,
representavam 700.000$00 (cfr. o DL nº 212/89, de 30.06).

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2º Juízo

A conduta, por seu turno, consiste em fazer uso ou permitir que outrem faça uso
(que neste caso parece dever-se entender como um empréstimo gratuíto), para fins
alheios àqueles a que se destinem, dos referidos veículos ou coisas móveis de valor
apreciável.
A utilização deverá ser temporária, sem que haja apropriação e intenção de
apropriação, e sem que haja alteração do bem, sendo este reposto ulteriormente no lugar
que lhe compete após o uso indevido (há pois apenas uma alteração do destino do bem).
De fora do respectivo tipo legal, segundo alguma jurisprudência, parece estar o
uso indevido de coisas fungíveis, como o dinheiro ou o combustível, pois o uso
determina o desaparecimento da coisa em si, ainda que possa posteriormente ser reposta
(cfr. ac. da RP, de 25.05.88, in CJ, XIII, tomo 3, p. 251; em sentido diverso, porém cfr.
Conceição Ferreira da Cunha, ob cit, págs. 711 e 712).
Trata-se de um crime doloso, em que a intenção do agente é o de usar
temporariamente o bem ou de permitir o seu uso temporário por outrem, o que se
compagina com qualquer uma das formas de que pode revestir o dolo (directo,
necessário e eventual).
A intenção de restituição terá, por outro lado, de existir ab initio, pois se o
agente actuou com intenção de apropriação mas depois decidiu restituir o bem poderá
estar-se perante a prática de um crime de peculato
Por outro lado, o agente terá de ter conhecimento de todos os elementos do tipo
(elemento intelectual do dolo – cfr. artº 16º, nº 1, do CP), isto é, saber que é titular de
um cargo político, ter a consciência de que se trata de um bem alheio de que tem a posse
em razão das suas funções e que o está a usar ou a permitir o seu uso para fins alheios
àqueles a que se destina. Em relação aos elementos normativos do tipo legal, exige-se
apenas que deles tenha uma percepção de “leigo”.
Tendo presente a factualidade provada a propósito do ponto 10.1. da pronúncia,
bem como as considerações de ordem jurídica efectuadas a propósito quer do respectivo
tipo legal quer do crime continuado, estamos em condições de concluir que:
1 - Quanto à conduta provada a propósito do ponto 10.1. da pronúncia
A arguida Fátima, de forma consciente, sabendo que a viatura “BMW” estava
adstrita às suas viagens de serviço e residualmente às viagens de serviço dos vereadores,
permitiu que – aproveitando uma viagem a Lisboa para a ir buscar (pois ali se tinha
deslocado na véspera em missão de serviço para a CMF) – nela viajassem a testemunha
Edgar, o arguido António Carvalho e a solicitadora Conceição, a fim de participarem no
Congresso Nacional do PS.
Permitiu ainda que esse trio, em Lisboa, nessa viautura, se deslocasse do hotel
para o local do congresso e vice-versa.
Fê-lo de forma deliberada e consciente, bem sabendo que tal comportamento não
era permitido por lei.
Parecem pois estar preenchidos todos os elementos típicos, com referência ao nº
1, do artº 21º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07.
A referência na pronúncia ao nº 2 do preceito em causa parece, por outro lado,
não fazer qualquer sentido.
Note-se que o fundo de maneio atribuído ao motorista Pinto foi usado para pagar
as portagens e o combustível, despesas essas que se podem considerar efectuadas no
âmbito da viagem que ele teria de fazer para trazer de volta a presidente da autarquia (o
nº 2 da norma em pareço pressupõe que o dinheiro público tenha sido usado
indevidamente com um destino igualmente público, pois se o foi para um fim particular,
tendo sido depois reposto, pode-se entender que se está já no domínio do nº 1 da
referida norma, se se entender que a mesma comporta as coisas fungíveis).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

De resto, as despesas que não se prenderam com o uso da viatura para as


finalidades a que estava adstrita, bem como as depesas da testemunha Pinto que não se
reportaram a serviço efectuado para a CMF, foram liquidadas pela “caixa paralela”,
sinal de que existia a noção de que a deslocação a Lisboa não cumpriu apenas o
objectivo de ali ir buscar a “Srª presidente”, tanto mais que, a ser assim, o dito Pinto
apenas teria de a ir buscar no Domingo e não na Sexta-feira imediatamente anterior,
pois era sabido que ela iria participar no Congresso Nacional do PS, ficando na capital
durante o fim-de-semana para esse efeito.
Deve pois ser punida pela prática de um crime de peculato de uso, p. e p. pelo
artº 21º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07.
Essa punição, porém, não deverá ser feita a título de crime continuado, visto que
nos autos apenas está demonstrado um uso indevido da viatura referida (cfr., a
propósito, as considerações já efectuadas acerca do crime continuado e o disposto no nº
2, do artº 30º, do CP, bem como a matéria de facto dada como provada a propósito da
deslocação ao casamento de um dos filhos do Dr. Pais Martins).
2 - Quanto à conduta provada a propósito do ponto 10.2. da pronúncia
Chama-se aqui à colacção a matéria dada por provada a esse propósito e as
consierações jurídicas já tecidas a respeito da delimitação do tipo legal em causa.
Já tivemos a oportunidade de expressar que, a propósito do crime de peculato, a
“energia de trabalho” dos funcionários utilizados para fins diversos daqueles a que estão
adstritos não parece preencher o conceito de coisa móvel.
Mutatis mutandis, esse entendimento tem aqui plena aplicação.
Consequentemente, o uso dos funcionários do GAPP para finalidades
particulares, por muito censurável que seja, não pode ser objecto de punição, sob pena
de violação do princípio da tipicidade, com referência ao artº 21º, nº 1, da mencionada
lei.
Por outro lado, também não parece fazer sentido a referência ao nº 2 do preceito
em causa.
Em face da factualidade apurada, parece estar preenhida a generalidade dos
respectivos elementos típicos, visto que a arguida Fátima, agindo de forma livre,
voluntária e consciente, querendo utilizar de forma continuada e sistemática os serviços
dos bens móveis da autarquia afectos ao GAPP e que lhe eram acessíveis em razão das
suas funções, utilizou tais bens para executar tarefas de terceiros estranhos à autarquia
(do modo descrito), apesar de bem saber que tal utilização era contrária aos seus deveres
e obrigações enquanto titular da presidência da autarquia e que tal conduta era
susceptível de punição.
Porém, deparamo-nos com duas dificuldades:
Por um lado, há que distinguir a actuação do GAPP no âmbito daquilo que pode
ser considerado um apoio da autarquia a colectividades e associações relevantes na vida
do concelho (cfr., designadamente, o artº 64º, nº 4, als. b) e f), da Lei nº 169/99, de
18.09) , como por exemplo o FCF, daquilo que vai para além disso, isto é, quase que
funcionando como os serviços administrativos desse clube e da ADEC (quanto ao PS,
não vislumbramos qualquer dificuldade em concluir que o GAPP exorbitou totalmente o
âmbito das suas funções).
Em face da factualidade apurada, entendemos que, mesmo em relação ao FCF, o
GAPP – por determinação da arguida Fátima – actuou para além de um quadro de mero
apoio a essa instituição, o mesmo sucedendo com a ADEC (na prática uma extensão do
PS local) e o “Sovela” (a voz oficial da arguida Fátima e do PS local).
De facto, dir-se-ia que o GAPP executou tarefas administrativas próprias dos
serviços administrativos dessas duas instituições.

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2º Juízo

A segunda dificuldade prende-se com o valor dos bens móveis utilizados que,
como se sabe, têm de ter valor apreciável.
Ora, não se provou qual o valor desses bens (basicamente um computador, uma
impressora e papel), de modo que não sabemos, sem margem para dúvidas, se eles
tinham ou não, à data, valor apreciável.
Note-se que ignoramos qual era o modelo daqueles equipamentos, qual o seu
estado de conservação, qual o tempo de uso, se eram actuais ou obsuletos.
Sobre essa matéria não se fez a mínima prova.
Consequentemente, não se tendo apurado esse elemento típico, deve a arguida
ser absolvida do crime em causa.

2.2.1.10. – A propósito do 11º capítulo da pronúncia


Finalmente, veio ainda a arguida Fátima Felgueiras pronunciada pela prática de
um crime de abuso de poderes, p. e p. pelo artº 26º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/87, de 16.07.
Tenha-se agora presente a factualidade apurada e as considerações de natureza
jurídica aduzidas acerca do respectivo tipo legal (cfr. ponto 2.2.1.5).
Ora, cabe salientar que o benefício prosseguido (atravez do abuso de poderes ou
da violação de deveres funcionais) tem de ser ilegítimo.
O benefício só é ilegítimo se lesar o bom andamento e a imparcialidade da
administração (cfr. ac. da RC, in CJ, ano XXXI, tomo V, p. 46).
A consumação do crime, porém, ocorre independentemente dessa vantagem ter
ou não ocorrido.
Que a arguida Fátima violou os deveres de isenção e imparcialidade 23 , bem
como o dever de lealdade 24 , uns e outros inerentes ao cargo político que à data exercia,
em face dos factos dados como provados, não restam dúvidas (o que aliás motivou a
instauração de uma acção de perda de madato, da qual porém viria a ser absolvida).
Na verdade, ela tinha a obrigação de se abster da prática de quaisquer actos no
processo de licenciamento do loteamento do Bustelo.
Violou por outro lado esse dever com a intenção de obter uma vantagem
patrimonial, emergente da venda dos lotes respectivos e de num deles construir uma
habitação.
Dessa forma, tendo presente a intenção que presidiu à sua intervenção no
aludido processo de licenciamento, pode-se afirmar que o bom andamento e a
imparcialidade da administração, neste caso, foram violados (pois só nesse caso se pode
afirmar a ilegitimidade do benefício esperado)?
Emerge da factualidade apurada que a arguida Fátima, no dito processo de
licenciamento, actuou escudada em pareceres técnicos, deferindo ou indeferindo as
pretensões nele formuladas de acordo com esses mesmos pareceres.
Parece pois que não está em causa qualquer abuso de poder no que se refere a
esse processo de licenciamento, visto que inexistem quaisquer elementos que nos
permitam concluir que não andou conforme devia.
Porém, ao tomar parte em deliberações e ao tomar decisões em processo de
licenciamento onde, de forma encapotada, tinha inegáveis interesses patrimoniais,
violando dessa forma deveres inerentes ao seu cargo, consideramos que se verificou a
lesão do bem jurídico em causa, isto é, pelo menos, a imparcialidade da administração
da coisa pública, com ou sem razão, pondo em causa a confiança dos cidadãos na

23
Isto é, o dever de não retirar vantagens directas ou indirectas, pecuniárias ou outras, das funções que
exerce, actuando com independência em relação a interesses e pressões particulares de qualquer índole.
24
Isto é, o desempenho das funções em subordinação exclusiva a objectivos do serviço e na perspectiva
da prossecussão do interesse público.

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2º Juízo

probidade das decisões que nesse âmbito foram tomadas e, nessa medida, pondo xeque
a autoridade e a credibilidade da administração, como aliás sempre acontece com a
tomada de decisões em causa própria.
Por outro lado, tendo agido consciente de todos esses factos, de forma livre e
deliberada, com aquela particular intenção de obtenção de uma vantagem, bem sabendo
que a conduta em causa era punida por lei, estão também preenchidos todos os
elementos do dolo (intelectual e volitivo), que no caso é directo (pois agiu com a
consciência do facto e com a intenção de o praticar).
Assim, s.m.o., entendemos que estão reunidos todos os pressupostos
conducentes à condenação.

2.2.2. – As consequências do crime - determinação concreta da pena:


Feito o enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido, importa agora
determinar a medida das penas parcelares a aplicar, de acordo com o disposto no artigo
71º do Código Penal, tendo presente que “as finalidades da aplicação de uma pena
residem primordialmente na tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, na
reinserção do agente na comunidade. Assim, a medida da pena há-de ser dada pela
medida da tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto, que se traduz na tutela das
expectactivas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada” (cfr.
Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime,
Aequitas, p. 227) – cfr. artº 40º, nºs 1 e 2, do CP.
Assim, para a determinação concreta da pena, balizada pela moldura penal
abstracta, importa apreciar três factores: a culpa manifestada pela arguida na prática dos
crimes por cuja prática irá ser cndenada, como limite máximo da pena concreta; as
necessidades de prevenção geral, como limite mínimo necessário para tutelar o
ordenamento jurídico, de modo a repor a confiança no efeito tutelar da norma violada
em relação aos valores e bens jurídicos que lhe subjazem; e as necessidades de
prevenção especial manifestadas pela arguida, que vão determinar, dentro daqueles
limites, qual o quantum da pena necessário para a reintegrar socialmente, se for caso
disso, e/ou ter sobre ela um efeito preventivo no cometimento de novos crimes.
Nessa conformidade, nos termos do nº 2, do artº 71º, do C.P., há que atender a
todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime (na medida em que já
foram valoradas pelo legislador ao fixar os limites abstractos da moldura legal),
funcionem como atenuantes ou agravantes, circunstâncias essas que estão elencadas
exemplificativamente no nº 2 do referido preceito legal.
Assim:
a) Quanto ao crime de peculado (ponto 1, do capítulo 9º da pronúncia):
Tendo presente que a arguida agiu com dolo directo, o concreto cargo que
exercia à data e a pouca expressão do benefício patrimonial auferido com a conduta em
causa, parece-nos não ser muito relevante o grau de censurabilidade da sua conduta.
As necessidades de prevenção geral são, por outro lado, relevantes, pois torna-se
necessário reprimir este tipo de condutas, sobretudo porque praticadas por quem deve
ser o defensor da coisa pública. A reposição da confiança dos cidadãos no efeito tutelar
da norma violada assim o impõe, pois este tipo de condutas, qual erva daninha, vai
paulatinamente minando os fundamentos do Estado de Direito Democrático em que
todos apreciamos viver.
No que respeita às necessidades de prevenção especial, cabe referir que a
arguida é socialmente bem integrada, goza de prestígio em Felgueiras (o mesmo não se
passa, como se sabe, no resto do país) e não tem antecedentes criminais relevantes.

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2º Juízo

Em todo o caso, ainda comanda os destinos da CMF, o que não sucederá caso
seja confirmada a decisão de perda de mandato, que mais à frente se irá decretar.
Consequentemente, parecem-nos relevantemente mitigadas as necessidades de
prevenção especial.
Ora, variando a moldura penal da pena de prisão entre 3 e 8 anos, parece-nos
adequada a imposição de uma pena de 3 anos de prisão.
A conduta em causa é ainda pnível com pea de multa, que varia entre 10 e 150
dias (cfr. artº 47º, nº 1, do CP, quanto ao limite mínimo).
Tendo presente as considerações efectuadas acerca do grau de censurabilidade
da sua conduta e as necessidades de prevenção geral e especial, parece-nos adequada a
imposição de uma pena de 25 dias de multa.
Sendo pessoa de condição sócio-económica mediana, parece-nos justa a fixação
de uma taxa diária de 50,00 euros, ainda assim situada relativamente perto do limite
mínimo estabelecido no artº 47º, nº 2, do CP (teve-se em consideração as despesas
acrescidas que nesta fase da sua vida a arguida tem de suportar).
b) Quanto ao crime de peculato de uso (ponto 10.1. da pronúncia):
Tendo presente que a arguida agiu com dolo directo, o concreto cargo que
exercia à data e que não foi ela a beneficiária do desvio do “BMW” para fins que nada
tinham a ver com a sua utilização no âmbito da CMF, no circunstancialismo descrito,
parece-nos não ser muito relevante o grau de censurabilidade da sua conduta.
Quanto às necessidades gerais e especiais, remete-se para o que já se referiu a
propósito da determinação concreta das penas a impor por força da prática do crime de
peculato.
O crime em causa é punível com pena de prisão até 18 meses ou com pena de
multa de 20 a 50 dias.
Conforme é sabido, sempre que possível, dever-se-á optar pela pena de multa, na
senda aliás da evolução da opção legislativa no sentido de privilegiar as medidas não
privativas da liverdade e que se acentuou com a recente reforma do CP.
Assim, nos termos do artº 70º, do CP, se ao crime forem aplicáveis, em
alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à
segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da
punição, as quais estão enunciadas no artº 40º, nº 1, do mesmo diploma legal.
Tendo presente que a arguida está plenamente inserida socialmente, não tem
antecedentes criminais relevantes, a conduta em causa terá sido pontual (pelo menos só
se demonstrou uma ocorrência do género), parecem-nos reunidas as condições para a
opção pela pena de multa.
Tudo visto, parece-nos assim adequada a imposição de uma pena de 30 dias de
multa à já referida taxa diária de 50,00 euros.
c) Quanto ao crime de abuso de poderes (capítulo 11º da pronúncia):
Tendo presente que a arguida agiu com dolo directo, os cargos políticos que
ocupava aquando da sua conduta e o concreto benefício almejado, parece-nos relevante
o grau de censurabilidade da sua conduta.
Quanto às necessidades de prevenção geral e especial, remete-se para o que a
propósito já foi referido, pois neste particular não vislumbramos qualquer especificidade
relevante.
É sobretudo tendo em atenção a relavância do grau de censurabilidade da sua
conduta que, neste caso, não se opta pela imposição da pena de multa, pois entendemos
que esta pena não tem, neste caso, a virtualidade de salvaguardar de forma adequada e
suficiente as finalidades da punição, mormente (mas não só) a de reafirmação da norma
violada e do bem jurídico que ela pretende tutelar.

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2º Juízo

Variando assim a moldura penal abstracta da pena de prisão entre 6 a 3 anos,


parece-nos adequada a imposição de uma pena de 1 ano de prisão.
d) Quanto ao cúmulo jurídico das penas parcelares impostas:
Determinadas as penas parcelares, importa agora proceder ao respectivo cúmulo
jurídico, tendo presente os critérios de determinação da pena única, ínsitos no artº 77º,
nºs 1 e 2, do CP, sendo certo que entre os aludidos crimes afirma-se uma relação de
concurso efectivo, posto que se reportam a acções distintas.
Assim, ponderando o facto da arguida chefiar os destinos da CMF ao tempo da
prática dos factos (é mais censurável a prática desses crimes por um presidente de
câmara que por um vereador), o modus operandi, o espaço temporal que mediou entre
essas condutas, o proveito que delas retirou, o facto destas práticas minarem os
fundamentos do Estado de Direito Democrático, a circunstância de se encontrar
plenamente inserida socialmente e de não apresentar antecedentes criminais relevantes
(pelo que é relevante o grau de censurabilidade daquelas condutas consideradas no seu
todo, com acuidade as necessidades de prevenção geral e com algum relevo as
necessidades de prevenção especial), entendemos adequada a imposição das seguintes
penas únicas:
- variando a moldura abstracta da pena única de prisão entre os 3 e os 4 anos de
prisão, parece-nos justa uma pena de 3 anos e 3 meses de prisão;
- variando a moldura abstracta da pena única de multa entre os 30 e os 55 dias de
multa, parece-nos justa a pena única de 40 dias de multa à taxa diária de 50,00 euros.
e) Quanto à suspensão da execução da pena de prisão:
Irá ser imposta uma pena única de 3 anos e 3 meses de prisão.
Se aplicassemos o CP na versão anterior à ultima reforma, não seria legalmente
possível a suspensão da execução dessa pena (cfr. artº 50º, nº 1, na redacção emergente
do DL nº 48/95, 15.03).
Sucede que, entretanto, entrou em vigor a Lei nº 59/2007, de 04.09., a qual
alterou a redacção daquele preceito legal, mantendo os respectivos pressupostos, mas
alargando para 5 anos de prisão a possibilidade de suspensão da respectiva execução.
No caso dos autos, conforme se verá, entendemos que se justifica a suspensão
daquela pena única de prisão, pelo que, em obediência do disposto no artº 2º, nº 4, do
CP, aplicar-se-á a lei nova, já que a sua aplicação é, em concreto, mais favorável para a
arguida Fátima Felgueiras.
Assim, tendo presente que a arguida trilhou um percurso de vida estruturado,
mostra-se bem inserida na comunidade, onde goza de prestígio, e que o risco de
continuação da actividade criminosa se acha relevantemente mitigado se vier a perder o
mandato (conforme mais à frente se decidirá), parece-nos curial suspender a execução
daquela pena única de prisão por 3 anos e 3 meses, nos termos do artº 50º, nºs 1 a 5, do
CP.
De facto, pelas razões já expandidas, neste momento é possível fazer um juízo
de prognose favorável em relação ao seu percurso de vida, concluindo-se pois que a
ameaça da prisão e a censura dos factos cometidos salvaguardam de forma adequada e
suficiente as finalidades da punição, desde que, em todo o caso, ela proceda à restituição
à CMF do montante de 177,67 euros (35.620$00), além dos respectivos juros de mora,
no período de 6 meses a contar da data do trânsito em julgado deste acórdão (cfr. artgs
50º, nº 2, e 51º, nº 1, al. a), do CP).
f) Quanto à imposição da pena acessória de perda de mandato:

709
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Prevê o artº 29º, al. f), da Lei nº 34/87, de 16.07, como efeito das penas
aplicadas a titulares de cargos políticos de natureza electiva, no caso uma presidente de
câmara municipal, a perda do respectivo mandato.
Trata-se de uma verdadeira pena acessória, pelo que dever-se-á ter em conta que
nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou
políticos (cfr. o artº 30º, nº 4, da Constituição da República, e o artº 65º, nº 1, do CP).
Dito doutro modo, a imposição daquela pena acessória não deverá ser
automática.
Julgamos aliás que entendimento diverso implicaria sempre um juízo de
inconstitucionalidade dessa norma, interpretada portanto no sentido da respectiva
aplicação automática, conforme assim se entendeu, por exemplo, no ac. do STJ de
27.01.98, com texto integral em www.dgsi.pt (nº de documento: SJ199801270006753),
para cujos argumentos remetemos.
Não sendo então de aplicação automática a pena acessória em causa, caberá
averiguar se a mesma é ou não adequada no caso em apreço, tendo-se ainda em atenção
o princípio da proporcionalidade.
Já vimos que as necessidades de prevenção geral são elevadas no âmbito dos
tipos de ilícitos em questão.
Além disso, a relativa mitigância das necessidades de prevenção especial, neste
caso, prende-se também com a impossibilidade de continuação da actividade criminosa
se a arguida se vir impedida de continuar a exercer o seu mandato.
De resto, mais do que uma pena de prisão suspensa na sua execução, cremos que
a imposição da pena acessória de perda de mandato tem um efeito dissuasor bem mais
eficaz.
É certo que se nos afiguraria algo excessiva a imposição dessa pena acessória
caso a arguida Fátima apenas devesse ser condenada pelos crimes de peculato e
peculato de uso (num caso porque a vantagem se cifrou nuns míseros 35.620$00 e no
outro porque, sendo pontual, não foi ela quem beneficiou do uso indevido de uma
viatura camarária).
Porém, considerando no seu conjunto as três infracções criminais registadas e
sobretudo o crime de abuso de poderes acima referido, parece-nos não só adequada
como proporcional à gravidade dos ilícitos cometidos a imposição da pena acessória de
perda de mandato.
Por fim, a talhe de foice, cabe referir que a consideração da prática do aludido
crime de abuso de poderes em ordem a decretar-se a perda de mandato não fere o caso
julgado material formado pela decisão que absolveu a arguida Fátima Felgueiras na
acção de perda de mandato referida nos autos.
Na verdade, chamando à colacção as breves considerações que fizemos em sede
de questão prévia acerca do caso julgado, s.m.o., conclui-se que a causa de pedir nessa
acção de perda de mandato é diversa daquela que aqui está em causa, aliás com
pressupostos fácticos e jurídicos não inteiramente coincidentes.

2.2.3. - Apreciação do pedido de indemnização civil deduizido pelo


Município de Felgueiras (representado em juízo pelo MP):
O Município de Felgueiras, deduziu pedido de indemnização cível a fls. 6214 e
ss., pedindo a condenação:
- dos arguidos Júlio Faria e Fátima Felgueiras a pagar solidariamente a
quantia global de 157.069.761$00 (ou 785.349,50 euros), como reparação pelos
prejuízos sofridos com as condutas descritas nos itens 1º a 7º do PIC em causa,

710
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos
pagamentos em causa, custas e demais despesas legais;
- da arguida Fátima Felgueiras no pagamento à CMF da quantia de 680.380$00
(ou 3.393,72 euros), como reparação pelos prejuízos sofridos com as condutas descritas
nos itens 8º, 9º, 10º e 11º do PIC, acrescida dos juros de mora à taxa legal, contados
desde a data de cada um dos pagamentos em causa, custas e demais despesas legais;
- do arguido Barbieiri Cardoso no pagamento solidário com a arguida Fátima
Felgueiras à CMF da quantia de 118.750$00 (ou 592,32 euros), como reparação pelos
prejuízos sofridos com as condutas descritas nos itens nºs 10 e 15º do PIC, acrescida dos
juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos pagamentos em causa,
custas e demais despesas legais.
A indemnização por perdas e danos emergentes da prática de um crime é
regulada pela lei civil (cfr. artº 129º, do CP, e artº 45º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07).
Por regra, vigora o princípio da adesão (artº 71º, do CPP; cfr., em todo o caso, o
artº 47º da Lei nº 34/87, de 16.07), sendo certo que o pedido deve ser deduzido pelo
lesado (artº 74º, do CPP).
Temos vindo a entender que no processo penal, em princípio, só pode conhecer
do pedido de indemnização civil por factos ilícitos quando estes se consubstanciam ou
resultam da prática de um ilícito criminal, restringindo-se tal conhecimento ao âmbito
da responsabilidade civil extracontratual decorrente da prática daqueles factos (neste
sentido, cfr. acs. do STJ, de 6.11.96, de 10.12.96, e de 09.07.97, in CJ, ano IV, tomo III,
págs. 185 e ss., 202 e ss., e CJ, ano V, tomo II, págs. 260 e ss., respectivamente; em
sentido contrário, contudo, pode ver-se, entre outros o ac. da RP, de 3.05.95, in CJ,
tomo III, págs. 248 e ss. Entretanto, por assento, fixou-se jurisprudência no primeiro dos
sentidos apontados – assento nº 7/99).
Começemos então por apreciar a responsabilidade civil da arguida Fátima
Felgueiras.
Preceitua o art. 483º, nº 1, do Código Civil:
“Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de
outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses
alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes
da violação”.
São cinco as condições que terão de se mostrar preenchidas e pelas quais
depende a responsabilidade civil extracontratual do demandado (o facto, a ilicitude, a
culpa, o dano e o nexo de causalidade) e que fundamentam o seu dever de indemnizar
enquanto agente da acção criminosa geradora de danos.
Em face da factualidade apurada a propósito do ponto 1, do 9º capítulo da
pronúnicia, ela apenas poderá ser responsabilizada pelo pagamento da quantia de que se
apropriou.
Ora, o facto reporta-se a uma acção/omissão voluntária do agente, ou seja, uma
conduta objectivamente dominável ou controlável pela vontade (no caso dos autos, a
conduta da arguida/demandada de subtrair se apropriar de uma quantia em dinheiro que
indevidamente recebeu, nas circunstâncias a propósito acima referidas; tal facto
reconduz-se a uma acção voluntária que empreendeu).

711
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Esse facto tem de ser ilícito, ou seja, antijurídico - seja pela violação de um
direito de outrem; seja pela violação da lei que protege interesses alheios 25 ; seja pelo
abuso de direito (no caso dos autos a ilicitude do comportamento voluntário da
demandada reside no facto de ter violado o direito de propriedade daquela verba em
dinheiro).
Por outro lado, terá de se afirmar um nexo de imputação do facto ao lesante
(culpa - dolo - ou mera culpa - negligência).
A este propósito diz A. Varela in Das Obrigações em Geral, vol. I, 5ª ed., 514,
que agir com culpa (apreciada em abstracto – cfr. artº 487º, nº 2, do CC) significa
actuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou a censura do
direito, o que se verifica quando ele podia e devia ter agido de outro modo - cfr. no
mesmo sentido Dario M. Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 3ª ed., 62. Dito por
outras palavras, a culpa exprime um juízo de reprovação ou de censura normativa da
conduta do agente e que tanto se pode reportar ao dolo como à negligência; quando
reportada à mera culpa, funda-se quer em inconsideração, imperícia ou negligência,
quer na inobservância de preceitos legais ou regulamentares.
Ora, no caso dos autos esse nexo de imputação é patente, visto que a demandada
agiu com dolo directo (cfr. artº 14º, nº 1, do CP).
Ademais, provou-se a existência um dano patrimonial.
Destarte, para que o demandado possa ser responsabilizado, é necessário
estabelecer-se um nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano.
Dispõe o artº 563º, do CC, que “A obrigação de indemnização só existe em
relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
Assim, em face do direito constituído, o autor do facto só será obrigado a
reparar aqueles danos que não se teriam verificado sem esse facto e que, abstraindo
deste, seria de prever que não se tivessem produzido (A. Varela in Das Obrigações em
Geral, vol. I, 6ª ed., 869), em termos tais que o facto tenha actuado como condição
adequada do dano em termos abstractos.
Além disso, conforme observa Pereira Coelho, in Obrigações, p. 166, não é
necessário uma causalidade directa, basta uma indirecta (o autor da lesão é responsável
por todos os factos ulteriores que eram de esperar segundo o curso normal das coisas,
ou foram especialmente favorecidos pela conduta do agente quer na sua própria
verificação quer a sua actuação concreta em relação ao dano de que se trata.
Ou seja, o agente só deve responder pelos resultados para cuja produção a sua
conduta era adequada, e não por aqueles em que tal conduta, de acordo com a sua
natureza geral e o curso normal das coisas, não era apta a produzir e que só produziram
em virtude de uma circunstância extraordinária (formulação negativa da teoria da
causalidade adequada, comummente aceite pela doutrina e jurisprudência no caso de
responsabilidade por factos ilícitos; a sua formulação positiva, com um âmbito mais
restrito, aplica-se normalmente à responsabilidade por factos lícitos).
. No caso dos autos, em virtude do comportamento da arguida/demandada, o
demandante viu o seu património empobrecido em 177,67 euros, correspondente ao
valor de que ela ilicitamente se apropriou.
Constituiu-se assim a demandada Fátima na obrigação de indemnizar o
demandante.

25
Nesta hipótese necessário seria a violação de uma norma legal, que a tutela dos interesses
particulares figure entre os fins da norma violada e que o dano se tenha registado no círculo de interesses
privados que a lei visa tutelar.

712
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Deste modo, quem estiver obrigado a reparar um dano, deve reconstituir a


situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (artº
562º do CC), sendo certo que a obrigação de indemnização só existe relativamente aos
danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão (artº 563º do
CC), compreendendo o prejuízo causado e os benefícios que o lesado deixou de obter
em consequência da lesão (artº 566º, nº 2, do CC).
Não perdendo de vista a formulação negativa da teoria da causalidade adequada,
em princípio, a reparação deve ser natural, nos casos em que a mesma é viável, repare
integralmente os danos sofridos e não seja excessivamente onerosa para o réu (artº 566º,
nº 1, do CC).
No caso dos autos, a reparação terá se ser efectuada em dinheiro, nos termos do
artº 566º, nº 2, do CC.
Por conseguinte, a condenação da demandada no pagamento da quantia
(actualizada) que subtraiu reporá o lesado na situação patrimoinial que este se
encontraria não fora o dano patrimonial sofrido por força da conduta da demandada.
Foi ainda pedida a condenação do demandado no pagamento de juros moratórios
desde a data de pagamento da referida quantia, isto é, desde 18.08.99.
Nos termos do disposto no artº 804º, nº 1, do CC, a simples mora constitui o
devedor na obrigação de indemnizar o credor pelos danos causados pelo atraso no
cumprimento da obrigação (de indemnização).
Em face do disposto no artº 806º, nº 1, do CC., a indemnização corresponde aos
juros contados desde o dia da constituição em mora pelo devedor.
E nos termos do nº 2 do mesmo preceito legal, aplica-se a taxa dos juros legais
civis, no caso dos autos de 7% até 30.04.2003 e de 4% desde 1.05.2003, taxa que ainda
está em vigor (cfr. Portarias nºs 263/99, de 12.04, e 291/2003, de 08.04).
Por conseguinte, no que respeita aos juros moratórios, tendo presente o disposto
nos artgs 559º, nº 1, 804º, nºs 1 e 2, 805º, nº 2, al. b) e 806º, nºs 1 e 2, do CC, bem como
a Portaria nº 291/2003, de 08.04, em princípio deveriam os mesmos ser considerados
desde a data do recebimento da referida quantia pela demandada Fátima Felgueiras,
conforme peticionado, à taxa legal de 4% (em vigor desde 01.05.2003).
Conforme referido, a mora ter-se-ia verificado desde o momento do recebimento
dessa quantia, em face do disposto no artº 805º, nº 2, al. b), do CC.
Ademais, o disposto no artº 805º, nº 2, al. b), do CC, deverá conjugar-se com o
critério geral estipulado pelo artº 566º, nº 2, do CC, o qual dispõe que o tribunal deve
atender ao momento mais recente (até ao final da discussão em 1ª instância), na
aplicação da teoria da diferença consagrada naquele preceito legal (sobre a conjugação
de um e outro regime, veja-se o ac. da RL, de 15.06.89, CJ, tomo III, ano 89, p. 123, e
Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, em anotação ao artº 805º do CC).
Sobre esta matéria, acolhendo a tese da não cumulação dos juros de mora com a
actualização da indemnização 26 , o STJ (ac. nº 4/2002, publicado no DR, Série I-A, nº
146, de 27.06.2002) uniformizou a jurisprudência do seguinte modo:

26
(sobre estes aspectos, veja-se os acs. da RC, de 07.06.94, CJ, Tomo III, p. 31; da RL, de 23.06.94, CJ,
Tomo III, p. 134; do STJ, de 21.09.93, CJ Acs. do STJ, Tomo III, p. 13; do STJ, de 30.11.93, CJ Acs. do
STJ, Tomo III, p. 53; do STJ, de 10.05.94, CJ Acs. do STJ, Tomo II, p. 91; do STJ, de 12.05.94, CJ Acs.
do STJ, Tomo II, p. 98; da RL, de 27.05.93, CJ, Tomo III, p. 117 e, finalmente, da RL, de 20.02.90, CJ,
Tomo I, Ano XV, p. 188).

713
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

“Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido
objecto de cálculo actualizado, nos termos do nº 2 do artº 566º do Código Civil, vence
juros de mora, por efeito no disposto nos artigos 805º, nº 3 (interpretado
restritivamente), e 806º, nº 1, também do Código Civil, a partir da decisão
actualizadora, e não a partir da citação.”
Por conseguinte, com recurso às taxas de inflação publicadas pelo INE (com
exclusão da habitação), poder-se-ia actualizar o montante acima referido até à data de
hoje, passando a correr desde então os respectivos juros moratórios, sendo certo que
apenas estaríamos limitados pelo valor global do pedido – artº 661º, nº 1, do CPC (cfr.
Assento nº 13/96, de 15.10, in DR nº 274, I Série, p. 4262 e ss.).
Não obstante, a demandante optou pela contagem dos juros moratórios desde a
data de recebimento da quantia de 177,67 euros, por razões que certamente ponderou,
pelo que nos parece curial respeitar tal opção, razão pela qual deverá proceder o pedido
de condenação no pagamento de juros moratórios nos precisos termos peticionados.
Procede pois em parte a pretensão do demandante.
Quanto ao mais, isto é, quanto ao pagamento de outras quantias peticionadas,
deverá a arguida/demandada Fátima ser absolvida, na medida em que os pressupostos
da responsabilidade civil extracontratual – acima mencionados – não se demonstraram,
designadamente, a ocorrência de qualquer dano patrimonial na esfera jurídica do
Município de Felgueiras.
O mesmo se diga em relação aos demandados Júlio Faria e Barbieri Cardoso,
sendo certo que, quanto a este último, conforme aliás observa na sua contestação, tendo
sido despronunciado pela prática do alegado crime que está na base da pretensão cível
em causa, sempre seria de improceder o pedido civel em apreço.

***

III - DECISÃO
Pelo exposto
3.1. Este tribunal colectivo julga a pronúncia parcialmente procedente, por
parcialmente provada, pelo que, consequentemente, decide:
3.1.1.1. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 5 (cinco)
crimes de participação económica em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º
34/87, de 16/07, a título de co-autoria e na forma consumada (reportados aos 1º e 3º
capítulos da pronúncia);
3.1.1.2. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 6 (seis)
crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo art. 16º, nº 1, da Lei n.º 34/87,
de 16/07, a título de autoria material e na forma consumada (reportados ao 2º capítulo
da pronúncia);
3.1.1.3. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 3 (três)
crimes de prevaricação, p. e p. pelo artº 11º, da Lei nº 34/87, de 16.07, a título de autoria
material e na forma consumada (reportados aos 4º e 5º capítulos da pronúncia);
3.1.1.4. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um)
crime de abuso de poderes, p. e p. pelo artº 26º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/87, de 16.07, a
título de autoria e na forma consumada (com referência ao 6º capítulo da pronúncia);

714
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

3.1.1.5. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida


de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 2 (dois)
crimes de peculado, p. e p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07, a título de
autoria e na forma consumada (reportados aos 7º e 8º capítulos da pronúncia);
3.1.1.6. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um)
crime continuado de peculado, p. e p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07, e artº
30º, nº 2, do CP, a título de autoria e na forma consumada (reportado ao 9º capítulo da
pronúncia) 27 .
3.1.1.7. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um)
crime continuado de peculado de uso, p. e p. pelo artº 21º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/87, de
16.07, e artº 30º, nº 2, do CP, a título de autoria e na forma consumada (reportado ao
ponto 2 do 10º capítulo da pronúncia).
3.1.1.8. Absolver a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira da pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um)
crime continuado de peculado de uso, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, da Lei nº 34/87, de
16.07, e artº 30º, nº 2, do CP, a título de autoria e na forma consumada (reportado ao 10º
capítulo da pronúncia).
3.1.1.9. Condenar a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um
crime de peculato, p. e p. pelo artº 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07. (reportado ao
ponto 1 do 9º capítulo da pronúncia):
- na pena de 3 (três anos de prisão); e
- na pena de 25 (vinte e cinco) dias de multa, à taxa diária de 50,00
(cinquenta euros, , num total de 1.250,00 (mil, duzentos e cinquenta) euros.
3.1.1.10. Condenar a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras
Almeida de Sousa Oliveira pela prática, a título de autoria e na forma consumada, de 1
(um) crime de peculado de uso, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07,
(reportado ao ponto 1 do 10º capítulo da pronúncia), na pena de 30 (trinta) dias de
multa, à taxa diária de 50,00 (cinquenta) euros, num total de 1.500,00 (mil e
quinhentos) euros.
3.1.1.11. Condenar a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras
Almeida de Sousa Oliveira pela prática, a título de autoria e na forma consumada, de 1
(um) crime de abuso de poderes, p. e p. pelo artº 26º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07,
(reportado ao 11º capítulo da pronúncia), na pena de 1 (um) ano de prisão.
3.1.1.12. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares acima referenciadas,
condenar a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida de Sousa
Oliveira, nas penas únicas de:
- 3 (três) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa porém na sua execução pelo
perído de 3 (três) anos e 3 (três) meses, mas subordinada à obrigação de restituição à
CMF - no período de 6 (seis) meses a contar do trânsito em julgado deste acórdão - da
quantia de 177,67 euros (cento e setenta e sete euros e sessenta e sete cêntimos), bem
como os respectivos juros de mora, contados à taxa legal desde o dia 18.08.99, até
integral e efectivo pagamento.
- 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 50,00 (cinquenta) euros, num
total de 2.000,00 (dois mil) euros.

27
Sem prejuízo da condenação constante do ponto 3.1.1.9. do dispositivo deste acórdão, visto que a
absolvição apenas se reporta ao crime continuado (pois não se provou qualquer violação plúrima do
mesmo bem jurídico) e não à prática de um crime de peculato (ponto 1 do 9º capítulo da pronúncia).

715
Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

3.1.1.13. Condenar a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras


Almeida de Sousa Oliveira na pena acessória de perda de mandato referente às
funções de presidente da CMF.

3.1.2. Absolver o arguido Júlio Manuel Castro Lopes Faria da pronúncia na


parte em que lhe é imputada a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em
negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, a título de co-autoria e na
forma consumada (reportados aos 1º e 3º capítulos da pronúncia).

3.1.3. Absolver o arguido Vítor Manuel da Silva Borges da pronúncia na


parte em que lhe é imputada a prática de 5 (cinco) crimes de participação económica em
negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, a título de co-autoria e na
forma consumada (reportados aos 1º e 3º capítulos da pronúncia).

3.1.4. Absolver o arguido Carlos António Miranda Marinho da pronúncia na


parte em que lhe é imputada a prática de 5 (cinco) crimes de participação económica em
negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e artº 28º do CP, a título de
co-autoria e na forma consumada (reportados aos 1º e 3º capítulos da pronúncia).

3.1.5. Absolver o arguido José António Barbieri Cardoso da pronúncia na


parte em que lhe é imputada a prática de 3 (crimes) crimes de participação económica
em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e artgs 27º e 28º do
CP, a título de cumplicidade e na forma consumada (reportados aos 1º e 3º capítulos da
pronúncia).

3.1.6. Absolver o arguido Gabriel Ângelo dos Santos Ferreira de Almeida da


pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um) crime de participação
económica em negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e artgs 27º
e 28º do CP, a título de cumplicidade e na forma consumada (reportado aos 1º e 3º
capítulos da pronúncia).

3.1.7.1..Absolver o arguido Horácio Rui Lourenço da Costa da pronúncia na


parte em que lhe é imputada a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em
negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e artgs 27º e 28º do CP, a
título de cumplicidade e na forma consumada (reportados aos 1º e 3º capítulos da
pronúncia);
3.1.7.2.. Absolver o arguido Horácio Rui Lourenço da Costa da pronúncia na
parte em que lhe é imputada a prática de 2 (dois) crimes de corrupção passiva para acto
ilícito, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e pelos artgs 27º e 28º do
CP, a título de cumplicidade e na forma consumada (reportados ao 2º capítulo da
pronúncia).

3.1.8.1.. Absolver o arguido Joaquim Magalhães de Freitas da pronúncia na


parte em que lhe é imputada a prática de 2 (dois) crimes de participação económica em
negócio, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e artgs 27º e 28º do CP, a
título de cumplicidade e na forma consumada (reportados aos 1º e 3º capítulos da
pronúncia);
3.1.8.2. Absolver o arguido Joaquim Magalhães de Freitas da pronúncia na
parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um) crime de corrupção passiva para acto
ilícito, p. e p. pelo art. 23º, nº 1, da Lei n.º 34/87, de 16/07, e pelos artgs 27º e 28º do

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

CP, a título de cumplicidade e na forma consumada (reportados ao 2º capítulo da


pronúncia).

3.1.9. Absolver os arguidos Anastácio Augusto Pinto de Macedo, Guilherme


da Silva Almeida, José Manuel Pimenta da Silva, Joaquim Teixeira Pinto, Carlos
Sampaio Teixeira e Maria Augusta Faria Ferreira da pronúncia na parte em que lhes
é imputada a prática, a título de autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime
de corrupção activa, p. e p. pelo artº 374º, nº 1, do CP (reportados ao 2º capítulo da
pronúncia).

3.1.10. Absolver o arguido António José Leite Bragança da Cunha da


pronúncia na parte em que lhe é imputada a prática de 1 (um) crime de corrupção
passiva para acto ilícito, a título de co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelo artº
16º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16.07, e artº 28º do CP (reportado ao 2º capítulo da
pronúncia).
*
3.2. Este tribunal colectivo julga o pedido de indemnização cível formulado
pelo Município de Felgueiras parcialmente procedente, por parcialmente provado,
pelo que, consequentemente, decide:
3.2.1. Condenar a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira no pagamento da quantia de 177, 67 euros (cento e setenta e sete
euros e sessenta e sete cêntimos) ao Município de Felgueiras, bem como no
pagamento dos respectivos juros de mora, a contar desde o dia 18.08.99 até
integral e efectivo pagamento, à taxa legal.
3.2.1. Absolver a arguida/demandada Maria de Fátima da Cunha
Felgueiras Almeida de Sousa Oliveira do pagamento da restante quantia contra si
peticionada.
3.2.2. Absolver do pedido cível o arguido/demandado Júlio Manuel de
Castro Lopes Faria.
3.2.3. Absolver do pedido cível o arguido/demandado José António Barbieri
Cardoso.
*
Condena-se ainda a arguida Maria de Fátima da Cunha Felgueiras Almeida
de Sousa Oliveira no pagamento:
- das custas criminais do processo 28 , fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte)
unidades de conta e no máximo a procuradoria 29 , contada a favor do S.S.M.J. (artº. 95º,
nº 2, do C.C.J., aprovado pelo Decr.-Lei nº 224-A/96, de 26.11.96), bem como no
pagamento do equivalente a 1% (um por cento) da taxa de justiça aplicada, a arrecadar
pelo C.G.T., nos termos do artº 13º, nº 3, do Decr.-Lei nº 423/91, de 30 de Outubro;
- das custas referentes à instância cível, na proporção do respectivo
decaimento (177,67/788750) 30
*

28
Cfr. artº 513º, nºs 1 a 3, do CPP.
29
Dada a situação económica da arguida Fátima (acima dada como provada) e a evidente complexidade
dos autos – mas tendo-se em atenção que ela foi absolvida no que respeita à maior parte dos crimes -,
optou-se pela fixação de uma taxa de justiça de 20 ucs, ainda assim situada relativamente perto limite
mínimo – cfr. artgs 82º, nº 1, e 85º, nº 1, al. a), do CCJ.
30
A demandada Fátima decaíu em 177,67 euros e o demandante em 788.572,33 euros (cfr. artg. 446º, nºs
1 e 2, do CPC, ex vi dos artgs 520º, al. a), e 523º, do CPP).

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Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras
2º Juízo

Sem custas pelo demandante (Município de Felgueiras), porque delas está


isento 31 .
Sem custas pelos demais arguidos e demandados, porquanto foram absolvidos e
não decaíram na instância civel.
*
Honorários dos ilustres defensores nomeados aos arguidos Anastácio Macedo,
José Pimenta da Silva e Horácio Costa de acordo com a tabela anexa à Portaria nº
1386/04, de 10.11, a adiantar pelo CGT.
*
Declaram-se cessadas as medidas de coacção impostas, mas só após o trânsito
em julgado deste acórdão.
*
Levanta-se a apreensão da viatura “Audi A4”, de matrícula 96-29-LN, e
determina-se a restituição à CMF dos processos de licenciamento e contra-ordenação
apreendidos, bem como a restituição do telemóvel “AEG” referido nos autos.
*
Notifique (sendo o arguido Anastácio Macedo através da OPC) e deposite o
presente acórdão - artgs. 372º, nos 4 e 5 e 373º, nº 2, ambos do Cód. de Proc. Penal.
*
Após trânsito:
- remeta boletim aos Serviços de Identificação Criminal no que respeita à
arguida Fátima Felgueiras;
- requisite e junte CRC actualizado dessa arguida;
- Dê conhecimento ao IRS do teor deste acórdão, conforme solicitado.
*
Felgueiras, 07 de Novembro de 2008.
(Processado por computador em 718 folhas, as quais foram revistas pelo juiz presidente)

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31
Cfr. Artº 2º, nº 1, al. e), do CCJ.

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