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“Terceiro setor” e ressignificagao da sociedade civil’ EDILSON JOSE A visio predominante em relagio ao “‘terceiro setor” As teoria jue definem o “terceiro set mporinea bora articuladas. De acordo com essas andlises, o primeito set artem da tese de que sociedades cont s, ues esferas distintas, em- e refere a esfera do Estado, © segundo seria aquele representado pelo mercado, isto é, pela produgao e circulagao de bens ¢ servigos visando © lucro Jao "te nal, encarnada ‘0 setor” se configuraria como sendo a sociedade civil, composto de individuos, grupos ¢ instituicoes ne agem de acordo nciada em relagdo aos outros dois. Nessa ectiva, Rubem César Fernandes escreve: “Marcando um espaco de integracdo cidada, a sociedade civil distingue-se, pois, do Estado; mas, caracterizand6-se. pela promocio. de_intefesses coletivos, diferencia-se também da 16 assim dizer, um.‘terceiro setor ica do mercado. Forma, por ideram o mercado como primero setor venment ond the Voluntary Sec ban latte sse se distinguiria por expressOes de solidarie atividades auténom: meio de € voluntirias que implicam a “doacao de tempo, alento para causas sociais”. Engloba desde priticas tradicionais opia e caridade até trabalho e de fil Ses com sentidos mais amplos de cidadania, jesa de diversos direitos e de melhores condigdes dle vida. De forma re nid, bordagens, pode-se ara tais mar que, na esfera overnamental, os agentes, a finalidade dos servicos prestados € dos direitos estabelecidos sao puiblicos — desconsiderando-se aqui a cormupsio, através da qual tais Por sua vez, o mercado é in intes realizam seus interesses privados regrado por agentes privados que buscam. atender seus proprios interesses, pois objetivam o lucro individual. O los que no governamental € nao visa 0 erceiro setor”, para esses aulores, é composto de agentes priv almejam fins publicos — quer dizer, é n 1 seguir esclarece essa dupla negagio: jicro, O extenso trech¢ No Terceito Setor, 0 poder € © lucro no constituem razbes suficiente 1 ago, Dizer que sto “nto govern onganizagoes nilo fazem parte do governo e nilo se con- junclem com o poder do Estado. Nao estio no governo ag fins lucratives") faz refer stimentos ais retomnos financeiros, O que elas fazem & simplesmente caro lemais para os mercados disponiveis. [..] requeremn recursos humanos € materials que ultrapassam com frequéncia a capacidade de pagamento dos bs, Supondo que o Estado nao dé conta de substliar toda esta vidade, ou nao se disponha a fazé-lo, resulta que elas s6 podem subsist contarem com doagdes feitas por ter audi Impostos com eisos. Recoloca-se, assim, a distingio o financkados por enquanto os servigos oferecides pelo Est ris, os servigos ofereciclos em grande medic, de doagées voluntiias* ntifica- iediato, De convém mencion do entre governo e Estado assagel que hd uma indevi nfoque. Mase: um aspecto menos relevante ao escopo desta aniilise: No mesmo diapasao, pode-se perceber um eco invertido da concepeao de Adam ardoso, Fortalecmento da desenvolirento social sustentado (2. ed, § uber César Fernandes, Prvado, de ane'ro, Civcus, 2002), p. 23-4 Smith acerca da raza0 para que haja atividades desempenhadas pelo Estaclo— 0 qual, para esse autor, poderia, de forma complementar, atuar as em que a iniciativa privada no pudesse ou nio quises: se fazer presente. Conforme a tese antes, 0 “terceiro setor' xpo: ado nao ‘© que nosmalme: assume frentes de acho que 0 Est 2 como assumit Como ja foi apont ntifica c re se id mo “te setor” € formado por um conjunto muito diferenciado de agentes tipos de organizagao. E por isso que Fernandes afirma que “terceiro setor € constituido por concepgdes e priticas diver ndirem, nase contra ar de no injo complexo ¢ instavel de num eSpaco piblico no estat intarias, instituigdes filantrépicas destinadas & prestacio dos mais, diversos servigos socials, organizagdes ndo governamentais (ONGs) com projetos de intervengio sis direitos de grupos sociais especificos. Assim, sob tal conceito, englobam emitica e entidades de defesa de 's patemnalista © conser até intervencSes bastante estruturadas no seio da sociedade, orientadas ania Diante dessa complexidade, torna-se inchusi concepsées mais amplas de dificil agrupar tan- tos compo! Ao, Fernandes wes em um mes nceito. Por essa essalta quatro convergéncias fund: sossibilita m ntais que uniao no interior do m ontraponto as agdes do govemo; 2) faz contraponto as agoes do mercado; 3) empresta um sentido maior aos elementos que o comp rio, superando dlivisdes dicotémicas 4) projeta uma visio integradora da vida péblica, ao presumir que ela nao se limita ao Ambito do Estado e por isso nao se restringe a atos de governo®. Essas quatro caracteristicas estariam presentes nes mais os do “terveiro setor Nas teorias afirmativas quanto a validade explicativa do conceito em questo, esse “setor” & apresentado como uma alternativa inovadora num processo de consolidacio da democracia e do desenvolvimento social. Por isso que Ruth Cardoso fala espago de participacio e experimentagao de novos modos de pensar e ai social” que jr sobre a realidade nriquece ¢ comple dindmica social", Dai o “te ceiro setor” ser enaltecido como detentor d e uma lOgica diferenciada para o enfrent ento de desigualdades sociais e problemas ambientais crescentes, pois a burocracia estatal se mostearia inoperante e d eo mercado, em si, nao teria interesse em tais demandas soci rta de Jeremy Rifkin é esclarecedor dessa perspectiva. Sem lavras, ele proclama aos quatro cantos “uma nova v E neces pais tem trés setores e nao dois, Uma vez que sompreenda isso, abrir-se-d a possibilidade de um novo contrato social para esta civilizagao sede uma nova visio e de uma nova misslo para © século XXI. O setor do mercado, sficiente, © setor dk cria capitais e empregos dle mercado, mas capitais e empregos de governo, mas isso também nito & lente, Existe ainda a sociedade Ge pital social ¢ emprege aioria dos autores Je certa maneira guram 0 “terceiro setor” Sio antigas, a ponto de Apesar disso, ticas que cc iizarem que tal “setor’ é O aspecto “inovador" se referiria, no entanto, a s na verdade, o primero historicamente. 2 consolidacio cot forma distinta e estruturada cle interveneao social, Nesse sentido é pode fazer Jango da emergéncia recente das pi concepgoes: ro setor” no Brasil e na América Latina. Na década de 1940, c nte se identifica como ON 8 jas, instituigdes de solidarieda que abrangem o “te que at ea zacoes de cooperacao internacional ~ formadas relacionado a ¢ etc. ~ que ajudavam outras por ig. ntidades movimentos sociais nos paises pobres. A partir dos anos 1960 ¢ 1970, tanto agui como em gi de parte da América Latin: as ONGs ganharam grande foie Iternativos Xprimindo modos nes ditatoriais. No final da década de de oposicio politica aos regi 1980, os processos de democratizagao fora: anhados por politicas mndmicas regressivas que afetiramt a ‘0s quais as ONG: amente grupos sociais co $ mantinham forte vinculo: os setores populares. Diante disso, tais organizagdesda Sociedade civil passa ram por processos de redefinicio: Sua visio como instrumento"de » Andrés Thompson, “cede lugar de acordo co fissionalizag’ reivindicacao politic a pressio pela pi no provimento dos servigas soci iyn Berg loschpe (org aliviando, assim, o papel do Estado e a pressio sobre o mercado”. A “partir desse periodo, além do “nao governamental”, seu cardter “sem fins lucrativos” tornou-se fundamental, dando vigor a0 conceito de “terceiro setor’. Portanto, em alguma medida, a emergéncia desse conceito se vincula as transformacées pelas quais passaram certos movimentos sociais, No que se refere particularmente 4 relagio com os governos, o “terceiro setor’ conheceu uma inflexio de numos: de, oposicao 20s governos ditatoriais, enveredou pelo ‘estabelecimento de parcerias com: © propésito de complementar a implementagio de politicas puiblicas. Quanto 20 mercaclo, as parcerias sacramentadas tiveram e tém o infuito de ampliar o alcance do “terceiro setor’, utiizando-se do poder social ¢ la eficiéncia organizacional das empresas, que, por sua vez, cOmecaTamT~ & buscar maior legitimidade ¢ aceitacao, valendo-se de uma relacio _inais harmonica com as comunidades em que estio insefidas. Enifim, conforme as teorias que Ihe dio suporté, o grande desafio do “terceiro setor’, quando confrontado com as outras duas esferas, é reinventé-las no sentido de defender e realizar interesses comuns, criando uma nova cultura em oposicio ag-individualismo reinante?. Nesse contexte, afiSE Je apresenta como a estruturagao da influéncia dos valores de solidaiedade e cidadania na acio das empresas, sendo uma ampliacdo, para além da produgio de bens e servigos, da gover. anca corporativa, eivada por determinadas modalidades de eficiéncia € cileulo. Configura-se como um fendmeno recente, porém bastante revelador, ji que expressa a grande complexidade ¢ amplitude do que se denomina “terceiro setor", que abarca, além dos dliversos grupos itados, mais recentemente, as chamadas “empresas cidacs’ “Mundo da vida”, sociedade civil e “terceiro setor” Uma reflexio mais profunda sobre a nogio de “terceiro setor” exige que 0 conceito de sociedade civil nela implicito seja analisaco de forma detalhacla. Assim, na tentativa de identificar os fundamentos dlessa concepeao de sociedade civil, sera analisado aqui o conceito de “mundo da vida”, de Jiingen Habermas, e suas influéncias nas teorias sobre 0 “terceiro setor’ 1 Aner Thompson, ‘Do compromissod efi? Os carnhos do terceira stor na América Latina’, em Evelyn Berg loschpe (org), 3*setor:desernohimento social sustentave, chp. 46, » ‘tbider, p47, 1 A segmentacio da realidade social, tipica das teorias até aqui tra- balhadas, guarda, direta ou indiretamente, relagao com a reflexao de Esse filsofo distingue duas esferas da vida social: o “mundo " ¢ 0 “mundo da vida”. O primeiro, constituido pelo Estado yercado, esté lastreado na‘ Tazo instrumental e é marcado Por relagées heterénomas-préprias do capitalismo, Em contrapartida, © “mundo da vida” € caracterizado por uma azo comunicativa que se opée 2 reificacio imposta. pelo “sistema” (mercado e Estado). Sua fizio funda-se na linguagem e tem como peculiaridade a busca do consenso entre os individuos por intermédio do didlogo. E a esfera da autonomia, que se acha em constante luta contra a colonizagio imposta pelo munclo sistémico. Assim, para Habermas, a disputa politica por ex- celéncia das sociedades contemporineas € aquela que se d nos pontos de encontro = conflito — entre o “sistema” e o “mundo da vida", E importante ressalvar que a anilise de Habermas tem como inspira- io em especial os paises de capitalismo desenvolvido, especificamente 0s europeus, no contexto da crise do Estado de bem-estar social (Welfare State) © do que ele aponta como “esgotamento das energias utépicas da sociedade do traballio”. Além disso, essa formulacao de Habermas se insere numa perspectiva mais ampla de rearticulacao do projeto da modemidade através da énfase em potencialidades racionais pouco ‘ou nada exploradas pelas sociedades capitalistas guiadas pela razio instrumental. H4 de se dizer, ainda, que Habermas possui inestimavel importincia por ter recolocado a politica como atividade humana que comporta a intervencao da vontade e de projetos em disputa 'Nao obstante, € evicente a proximidade das formulagdes dos defenso- res do “terceito setor” com alguns elenientos que ancoram as concepgoes de Habermas, Ao analisara situagio dos paises capitalistas desenvolvidos, Habermas" frisa que a crise do Estaclo de bem-estar social nao pode ser resolvida por um teforco da “domesticagio social do capitalismo” pelo Estado nem pelo seu contirio, a liberalizaco completa por meio da trans- feréncia dos problemas da administeacto para-o mercado. A contencio € 0 controle precisim incidlr sobre o mercidlo e sobre a administragao piiblica. Para isso, a reflexo € o controle deyem ser buscados em outro lugar: nas relagdes estabelecidas em esferas publicas auténomas auto- "© Jargen Habermas, ‘A nova itransparéncia: a crise do Estado do bem-estar social eo esgata- mento cas energasutépicas”, Nowos Estudos Cebrop, S40 Paulo, n, 18, set. 1987, passin. "idem, p. 112. EvILs0N JOSE GAACIOLLI € MARCILIO RODRIGUES LUCAS onganizadas, que se baseiam na solidariedade © se estabelecem pela comunicacio. O trecho a seguir é emblematico: As sociedades modernas dispoem de ts poem de ts recursos que podem satisfazer 8 idacles no exercicio do govemno: o dinheito, © poder € a sotie fs As esferas de influ€ncia desses recursos teriam de set pos lum novo equilibrio. Bis o que quero dizer: o poder de integragao social da solidariedace deveria resistir 8 “forcas” dos outros dois recursos, dinein © pode tivo. Pois bem, os domini n ransmitir conhecimentos culturais, em integrar gra pose 5, sempre dependeram da solidaried Mas desta fonte também teria de brotar uma formacao politica da vontade tle exercesse influ€ncia sobre a demarcacio de fronteiras e o intercdmbio existente entre essas dreas da vida comunicativamente estruturadas, de le Habermas autonomas calcadas 1 pastante claro que a perspectiva ‘mundo da vida" — indicando esferas publi iedade € na comunicagio ~, por estar fi uma visao global cle uum projeto de modernidade, é mais ampla que a setor”. Porém, a proxi de civil s sobre o “terceiro set Liszt Vieira € um dos adeptos do modelo tri reflexdes d : > de “terceiro le existe e ¢ explicita em algumas formula- ite que Habermas ao indicar um: ; sociedade civil como 0 territérie-social-de-defesa-e afivii cipios difere -anismos politico: iados em relacdo aos existentes na 16, Iministrativos e do mercado. Vieira sustenta que a sociedac civil faz parte de “mundo da vida efinido por Habermas", No seu entender, “tem bi- eral relago, Mara to limitado, sendo pi categoria mais ampla do ‘social’ ou do mundo da vida’*". Para 0 autor, constitui a “dimensio institucional’ do “mu e formas associativas” de integraclo social comunicativamente reproduzidas, da vida", por ser composta por “instituicé Com base no pensamento habermasiano, Vieira de sociedade civil que “se refere a movimentos sociais e instituicées, Lica, com 0 objetivo ora_uMa ROG, localiz des Jos tanto na esfera privada quanto fa pal @onirapor As acdes sistémicas de mercado ¢ de Estado’ indo espacos democriticos ¢ aut6nomos de busca de consenso, mente Nessa perspectiva, as associacdes da sociedade civil, diferent dos “grupos de interesses”, desempenham o papel de formadoras da € controle ia instancia de criti nizagées estao voltadas para 40 publica e, por isso, s20 un ras palavras, tais ong: do poder. Em ov a defesa do interesse a, mais do que um Idcus social, a sociedade civil é 0 meio € 0 proprio autor, da noco anglo-saxd Essa esfera publica nao estatal, que inclui movimentos sociais, ON 1 democracia politica, concepedo que se aj asc le cidadania ©, exclui_sindicatos (gi ages Ses prd-estatais”), Se COW econdmicos) e partidos pol ca, segundo essa visio, como a alternativa inovadora para reformar-e democratizar 0 Estado e 0 mercado através da consolidagao de sujeitos politicos aurénomo: rando “a bandeira da ética, da cidadania, da no prodiiza a €XCUSIS S6¢ Sociedade civil como espaco da luta de classes Essa perspectiva de sociedade civil como defensora do mum" no € por nés partilhads. Os motivas so basicamente dois: ser entendida como sujeito hist6rico_porta- ‘ia; afinal, tratasse de tima um agente autdnonié, Além disso, a tentativa ‘le hafmOnica-e-homogenea, ao se recorrer a sociedade ciyil nao pode lores de solidariedadeé e “bem comum’, tem um cariter mistif encobrir as contradigdes inerentes a uma socied lade de classes. Portanto, a reflexiio presente neste artigo, ao situar as contradigées de ¢ primeiro plano, alimenta-se da nogio de socieds campo d le civil elaborada no marxismo, especialmente nas obras de Antonio Gramsci. Nas andlises de Karl Marx e Friedrich Engels, a categoria iedade civil € utilizada sempre se remetendo 4 esfera das relagdes de produ- 0, 6 Seja, a0 dominio das relagdes econd jue estruturam a base material da sociedade, Nessa 6tica, a sociedade civil subordin: Estado, tomado como elemento “superestrutural", no sentido de dé © estabelecer sua organizacdo e seus objetivos. Quanto a esse aspecto, a perspectiva desenvolvida por Gramsci traz inovacées importantes, ja que esse a dito tor nao mais associa a sociedade civil apenas a0 4m. relacdes de producao, levando em conta, em sua definicao, aspectos ideolégicos e culturais ~ a vida espiritual e intelectual -, a0 langar mao do conceito de hegemonia Mattin Carnoy” para Gi 0 ampliada de Estado”. Isso porque, com 0 conceito de hegemonia, Gramsci amplia sofistica os aspectos que Marx classifica como “superestruturais”. © fil6sofo italiano remete a dois “niveis' su- perestruturais”: a sociedade civil, conjunto de on © para Marx a sociedade civil se amsci ela integra a “superestrut tural do uma nog anismos considerados privados, e a politica, ou Estado no seu sentido estrito. A hegemonia significa directo politica, intelect al, cultural © moral da sociedade por parte das classes dominantes, ito sentido de que sua visio de mundo € apresentada © aceita, mesn par no que de forma tensa, como universal Ses, Portanto, exprime a sintes todas as cla re consentimento, (Sociedade civil) ¢ coercao (sociedade politica). qui entre aspas devido 20s seus mites rutua” apa! clfeukam 2 apreen: 1 € governo, que precisamente & um de sociedad cx iedade ci Como lembra Carlos Montafo, “a atividade da sociedade civil, na acepcio marxiana, constitui o motor da histéria e, na interpretacio lutas de classes e gramsciana, condiciona os espagos ¢ as formas dé nacio social”!, Sob esse aspecto, € importante sublinhar Je ciyil.do transfc que, se Gramsci superou a visto mais limitada de socie marxismo tradicional, nao negou, no entanto, de forma alguma sua vinculagao intima a8 Fekigdes de produgio, estando, por isso, enr zada na esirutura de classes da sociedade capitalista, constitutiva da totalidade social. Apesar de ser a esfera de construgao do consenso, Ja visdo de mundo, a socie tendido como aceitagao de determina dade civil nao € coesa, sen la por contradigdes e sujeita 108 conflitos. Segundo Carnoy lho hegeménico, son As instituigde: he que formam 0 ap: e Gramsci, quando estabelecicdas no contexto da luta wsse dominante, que estende sen poder € controle a ido, na al de classes ¢ da € sociedade civil através Para Gramsci, a sociedade civil é a sociedade das classes em confli to = latente ou manifesto -, € nao uma esfera isolada da logica € dos producao do capital. Por isso, a andlise gramsciana E s sobre possui um profundo potencial critico em relagio as teorizag 6 “terceiro setor", jf que a segmentacao da sociedcle em trés setores n de separar o dominio das relagdes econdmicas € a sociedade ale civil, acaba por ocultar nesta © conflito de classe, que passa a ser econdmicos particularistas. Esse € visto como embaté dé interesse: © papel mistificador do conceito de “tereeiro Setor", que, a partir de uma representagio de “bem comum’, tenta transformar a sociedade cindida em classes em um todo harménico € integrado, ‘Assim, na teorizacdo sobre o “terceiro setor’, ganha ¢ fesse que se diz. mais amplo que o de classe. Nao € por vo que Liszt Vieira diferencia as organizagdes da socie ‘grupo » papel de formadoras da opinito taque a no- sao de uni outro m civil daquilo que ele de intere: sociages da socie s da op > e do mercado, Distinguem-se dos “grupos de inten io coletiva no’ 9s situados fora do se", caracteri- Marc dos pela ligica dos interesses econdmicos particularistas pela defesa dos interesses privados especificos, como, por Para além da “neutralidade” perversa na equiparacao feita entre organizagoes dos tra res e dos empresirios, embute. , nessa analist segundo a qual os inte la sociedade civil se juam acima do antagonisino estrutura capital melhor, os interesses da sociedade civil sto supracl versais. Estando acima dos “interesses econdmicos particula lores do “terceiro setor" sto tides e havidos também como inentes em relacto a qu gitimos e pro quer demanda alhadores como ci Ao criticar a idealizagao de uma sociedade civil defensora do “bent comum”®, Montafo acentua que 4 sociedade civil é, fundamentalm te, um espaco de tensdes e disputas. Dai falar de um pi nt subentende a ideia de na sociedade civil”, diferenten las teorias sobre o “tei 10 Seto das quais s Iutas da sociedade civil € coletiv ade total, seja na sociedade civil, no no espago do consumo, na vida cotidiana Nem mesmo a ideia de “sociedade civil organizada”® ameniza os foblemas de tomé-la como sujeito, pc jue 08_gmupos organizados fa, de a cidadania, Erm virtue di da sociedade civil, © 10, nao so apenas diversos como também ar Na sociedade civil estao pr ‘excluidos", das chamaclas “minorias", dos defensores de direitos humzanos, J mulher, da crianga © «do adole > ambiente, mas tambén comparecem organizaées representantes do capital (Sesc, Sesi, Pundagiio Bradesco) € ainda mais, organizagdes fascistoides (Tradicio Familia e Pro- priedade, grupos neonazistas, por exemplo), instituigoes fandtico-religiosas Gaiversas seitas que pregam o “fim do mundo", entre outras) ou até funda: mentalistas, Isto é F na sociedade civ uno resulta num erro rosseiro de interpretagio hist6rica” sso, Mont itenglo para o fato de que as organizagées da sociedad ansformador dev ivil que pretendem ter um cari se articular com os movimentos sociais, e nao substitui-los num processo izacao” da questio social. Para tanto, precisam abandonar 0 rolada wismo los recursos comunitatios" wgica de “gestao cor das ONGs desde 2 década de 1990, cujo is abrangentes «le socie las pontuais e in terizou a maiori resultado foi o abande lade em funcdo do atendimento d palataveis ~ e funcionats ~ a oliberal®. Afinal, © projeto neoliberal quer uma sociedade civil décil, sem confronto, cuja ce 2is) em atividacles nao criadoras nem transformadoras, witore imediatas 3s nocessid “Terceiro setor” e totalidade social Tod: a critica até aqui exposta tem como refe! Jpnero, Paz e Tera, 1995), , lua (Campinas, Autores Assocad movente e movida", nos termos de Lukacs”, de um contexto sécio- histérico amplo. Isso ecificamente a “responsabilidade social empresarial” nao devem ser tratados tio- ente a partir de sua légica interna ou de seus resultados imediatos. /POE-SE analisé-los no Ambito da sociedade capitalista, contradit6ria nifica que o “terceiro setor” &, € if e-cindida classes, em tempos de “hegemonia neoliberal” ‘Commo jf foi assinalado, a categoria “mundo da vida", desenvolvida por Habermas, mantém ch ilo com as teorias sobre o “terceiro setor” devido ao fato de distinguir uma terceira esfera n: logica diferenciada em relagio 4 do mercado e a do Es- ha entre elas outro ponto de convergéncia implic 0. Mi menos importante: 0 mundo sistémico, das rel: ©, m0 \cOes capitalistas, & cl, restando unicamente a possibilidade de se a emancipagio em u omas OU, nat nsiderado insupe 1a esfera puiblica constituida por pi ninologia de Habermas, pelo agir comunicativo, esfera autGnoma entdo coexistiria diticas sempre se defendendo da colonizagao ~ com o mundo sistémico, caracterizado pela heterono- mia, pelo trabalho estranhado € pela razo instrumental, Conforme Aponta Vieira, “trata-se de limitacao € regulamentacao {do mercado jo Estado por parte da sociedade civill, e nao de aboligéc No que se refere 4 sociabilidade cotidiana, essa perspectiva repre senta a afirmacao da possibilidade de existéncia stone livres & nas, apesar da permanéncia da heteronomia e do estranha. mento na esfera produtiva. Isso quer dizer que, f 1 do trabalho, os individuos encontrariam a oportunidade de envolver-se em atividades € realizadoras. O trabalho continua subordinado ao capital, porém nao é mais visto como a categoria central da autent ida social. a A processualidade hist6rica, um grande limite es sobre o *terce No que respei dessas teorizagd 10 setor” consiste em se col realidade concr a como restrigao para a ago. Em outros tern wercado e 0 Estadk © considerados como patamar dado, diante do nao se coloca a possibilidade dessa causalidacle ser modificada substantivamente, A cultura do possibilismo € | diagndstico implicite que se chega desc Ls, As bases ontolggcas da pensar ern’, em eos de Let A perspectiva de atuar a partir das “margens” da ordem sistémica, sem embates diretos, mais do que realismo, revela pragmatismo e mistificacao. © aspecto problematico de se pensar uma esfera a parte em relagdo ao “sistema” é que a logica do capital permite, de fato, encia de formas alternativas como o “agir comunicati a emer uma “economia s lidaria”, Contudo, de modo algum, na vig do ismo, essas forma de ago podem se consol lar, tornar-se Jir-se, estando fadadas 2 extingao ito menos, exp: ow a permanecer a argens da soci Como se sabe, sistema “sociometabélico do capital” nao se restringe ao plano econdmico e ao Estado, necessitando de um > conjunto das esferas de so- ita Lukiics, a forma mercadoria se expande para a totalidade social role social amplificado que stir ciabilid ress: E claro que e io nega a’ exis: fEncia e a possibilidade de ressignificagdes, tensdes e resis sejam elas cotidianas ‘capilares” ~ ou estruturadas dle forma mais sisten a utilizag concepgao gramsciana dos aparelhos de hegemonia como espacos de embates. O que se quer mostrar € que € inconcebivel u esfera que ndo seja perpassada pelas con tradicoes préprias do sistema capitalista Boiternpo, 2002; ndo corresps 30 Estado; corr o pode sera io Marx, Ge je 2 também 30 p 3s acentuava que, na sociedad capital, 0 estranhamento 10 se Smit tivo aos produtes do trabalho, manifestanda-se na to numane, Ver Kar Man estan Fernandes (0°. 62 autonomia 20 lucrative’ Ado sigifia, € caro, estar em algum outro mundo além terceiro se fet de matéria angliel.” Ct, Rubern Apesar disso, tals ponderagbes $40 ‘com a afirmacio de uma bastante suficientes, jf que sio articuladat, a cujas caractersticas préprias Ines sio dads justarnente pela negagdo do luero ou do poder ear “TETCRTO 8 Quando se examina mais a fundo a atividade pritica das ¢ do “terceiro setor’, € igualmente problema reanizagdes ico falar em autonomia, Por 8 auténom especifica, 0 “tere , com uma racionalid o setor” € empurrado ao pi \gmatismo: na disputa por verbas “tanto estatais quanto do merca que seenquadrir em determinade Ss organizagoes tein ir sobreviver e-désenvolver suas atividades, sempre. dentro do horizonte imposto pelos finaniciadores. Tal litniacio parece nao se verificar no sganizagées bancadas pelas “O) 150 dis financiadoras” internacionais. To- davia, essas retiram sos dle grandes transnacionais ou de governos ferenga, portanto, resumé ediac&o « mais; o limite estrutural é 0 m de paises ricos. A d smo. Questic 1-se, portanto, a validade do proprio co disso, como jf foi indicado, por meio da contexto s6cio-hist6rico pode-se 4 ceito de setor”. Alé : apreensio do nallisar ¢ amente a ascensio de um padrio de intervencao social que lege o “terceiro setor’ como seu grande expoente Montafio™ alude & ideia de um “tripé neoliberal” para identi © proceso histérico em que a emergéncia do “terceiro setor” se enquadra, Esse tripé seria formado pelos seguintes processos: 1) a eestruturacho produtiva, cuja consequéncia principal desigua na ao-das'condicdes UE tribalho; 2) a geforma.do Estado, que Montaito identifica como contrarreforma, na medida em que se refere 1 desresponsabilizagio do Esta io em relagio A “questdo socia ansformacio da concepeao de sociedade civil como cor” harm Aico que assume a tarefi 2 “questio social”, ém grande m dida abandonada lizada obra e graga de acoes fo © pontuais. No quadré da hi gemonia nédliberal, em que o Estado reduz sua presenga nas Areas sociais (infraestrutura, satide, educagio, seguranca etc.), as organizagdes do “terceiro setor’ tém uma funcionalidade no sentido de substituir, complementar ou concorrer com a acao gover- namental no que diz respeito ao enfrentamento das demandas sociais, Nacka mais compreensivel, se considerarmos que, co! embra M ria penham-se em descobrir modos legitimos de desconstruir as garantias sociais como direitos uni zaclos (por seu alto custo), encolhendo seletivamente o acesso a elas ¢ apelando para a ‘criatividade social’ d Numa do “terceiro setor 6 atingidos™”. perspectiva diferente, Ruth Cardoso afirma que a ascensio nao deve ser entend como um proceso de 0 do Estado. Para ela, 0 Ambito de atuagio do Estado € 0 do “terceiro setor” estio demarcados ¢ nie coinci Jem. O Estado deve ser a esfera de garantia dos direitos basicos © lugar das acoes d amente demarcado. Cabe ao gaverno garantir os direitos essenciais e universais dos cidackios, os quais, por sua vez, podem ¢ devem exigir que isso se faga de modo eficiente ¢ equitativo. No Brasil, © papel edade civil foi bastante significativo na defesa de direitos basicos de cidadania quando eles nllo estavam garantidos. Hoje € tarefa e responsabilidade dos ministérios os deste pais. Porém, segundo Cardoso, apenas a garantia de direitos universais ndo € suficien le como a brasileira, por si profunda de desigualdade e marginalizaga0”. Nesse sentido, o papel do “terceiro setor” consiste em des volver “acdes diretas e pontuais ombatam os desequilibries historicamente consolidados. Sua funcio se liga & busca ¢ experimentagio de solu des inovadoras, que configuram uma nova maneira de agir na area e diferente em relagio ao Estado, burocritico men soctal qualita € centralizado. Na ética de Cardoso, agdes voltadas a gaupos sociais especificos - “mais frigeis e vulnersveis” ~ exigem “regras e modos de aacdo que S6 se constroem através da agho e experimentacio™. Estado, universal, mas ao mesmo tempo distante, nao tem es de atender essas demandas especificas” Em que pese tiva analitica de des terceiro setor” € sabilizagao do Estado, o processo hist6rico concreto ape ireco, Nao ha dtivida de que as politicas piiblicas estatais s e, em grande medida, ineficientes, necessitando de tansformagdes para que a maioria social, em su: multiplicidade, veja ampliados seus direitos politicos e sociais. Poré > periodo de ascensao do “terceiro setor 0 de mudancas ness direct, Nas ulimas déc 08 di Sais Est30 sendo atacados € ameagados, tanto nos paises capitalismo quai > em areas petiféricas nas quais algumas frigil". Enquanto isso, tém sido ampliaclas politicas estatais de natureza 1 de direito, E nesse processo que turais vinculados aos direitos basicos da populacac Como ressalva Montaio -se da transformacao de direitos cidadao”, dependentes da ativida- slados, ONGs ott voluntiria e fortuita de individuos solidérios peo restritiva e excludente de cida as" focalizadas, que reflete, de acordo ¢ Paoli, uma estratégia de despolitizacao da “questo social”, altam: funcional ao projeto neoliberal de reorganizacho social, tendendo a ser uma espécie de nova volta no parafuso do controle ¢ da dominagio capitalist.

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