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A Fazenda da Esperança e Bento XVI: um encontro muito lindo.
 No último dia 12 de maio, a Fazenda da Esperança de Guaratinguetá, a primeira entre todas essascomunidades, recebeu um visitante ilustre. Ninguém menos que sua Santidade, o Papa BentoXVI.Ele mesmo quisera vir até a Fazenda, encontrar-se com os 2 mil jovens em recuperação dedrogas, internos nas mais de 40 comunidades espalhadas pelo Brasil, Argentina, Paraguai,México, Guatemala, Filipinas, Moçambique, e 2 na Europa: na Alemanha e na Rússia.Tudo começou a quase 25 anos atrás, ligada a vida de uma comunidade paroquial. O então pároco, o franciscano Hans Stapel, pregava nas Missas a importância de viver o Evangelho, econtava suas próprias experiências. É assim que muitos quiseram viver dessa forma, constituindoum grupo. Um desses integrantes era o jovem Nelson Rosendo, que sempre ao voltar do trabalho,encontrava na esquina de sua casa um grupo que não freqüentava a paróquia, mas sim um grupode dependentes químicos. Interessado neles, e motivado pelo Evangelho, nasceu umrelacionamento entre eles, até que um pediu ajuda. Era a noite de 29 de junho de 1983. Nasciaassim um projeto que cresceria rapidamente: a Fazenda da Esperança.O método é muito simples. Muitos o consideraram ingênuo. Baseado na espiritualidade, na vidacomunitária e no trabalho, os jovens permanecem um ano de suas vidas, desde que eles mesmotomaram essa iniciativa. Ali descobrem um rosto amoroso de Deus, que os acolhe sem perguntar  pelo passado e toda a miséria da vida na criminalidade, na prostituição ou nas drogas.Por isso já foram acolhidos cerca de 10 mil jovens. Uma vez renascidos na fé, descobrem umnovo sentido de vida e podem retornar à sociedade, não somente livres da droga, mas comoverdadeiros protagonistas da nova evangelização tão sonhada pela Igreja do pós-Concílio. De fatoa experiência que se iniciou na esquina correu o mundo sobretudo pelo testemunho dos jovensrecuperados, que em suas cidades atraíram com seu exemplo outros a se libertarem dos vícios.Muitos nos perguntam porque não valorizamos a psicologia, a medicina, a psiquiatria. Não éverdade esta afirmação, porque também recorremos à ciência, quando percebemos que o caso oexige. A base porém da terapia em nossas comunidades é a espiritualidade sobretudo, a vivênciado Evangelho. Diariamente os jovens se reúnem em suas casas logo pela manhã, e escolhem umafrase do Evangelho para ser vivida durante o dia. Algumas vezes pela semana se encontramnovamente para comunicarem reciprocamente suas experiências concretas.Este estilo de vida comunitária atraiu além dos recuperantes, muitos outros jovens que queriamvoluntariamente viver, trabalhar, rezar com os internos. Aos poucos eles se tornaram uma grupogrande, inclusive com famílias, religiosas, padres, pessoas de todas as idades, sexo, religião,origem social. Por causa deles a Igreja recomendou Frei Hans Stapel a constituir uma famíliaespiritual que os amparasse e acompanhasse. Nasceu em 1999 a Família da Esperança, associação privada de fiéis, aprovado pelo bispo diocesano de Aparecida, o cardeal Aloízio Lorscheider.Hoje são cerca de 280 consagrados, aqueles que escolheram essa vida, essa espiritualidade, essetrabalho em meio aos jovens excluídos da sociedade.Com certeza tudo isso atraiu Bento XVI a vir encontrar-se com os 2 mil jovens naquele dia 12 demaio. Nós o havíamos convidado, mas não sabíamos se ele teria tempo para isso, em sua viagemtão curta e breve no Brasil. Ele porém o quis e iniciamos a preparação para o encontro com ele.
 
Construímos uma igreja especialmente para esta ocasião, uma vez que em todos esses anos, os jovens não tinham um ambiente sacro onde podiam rezar. Ela foi abençoado pelo Papa, que nomesmo local dirigiu palavras animadoras às clarissas reunidas ali. Logo depois o Papa encontroucom todos nós. Pudemos testemunhar nossa vida, através de 5 jovens que diante dele contaramsua história. Filhos de pais recuperados receberam das mãos dele a Bíblia da Criança, número 10milhões. Os menores de rua de nossas Fazendas ainda presentearam o Papa com o anel dasolidariedade, o anel preto, de tucum, sinal do amor misericordioso de Deus aos mais pobres eexcluídos. E por fim, surpreendendo a todos, o Papa quis saudar pessoalmente nossos jovens,quebrando todos os protocolos.A vinda do Papa significa muito para nós, que fazemos esta obra. É a confirmação de Deus paraeste caminho iniciado sem planejar. É a benção de Deus sobre o trabalho que fazemos com os jovens. É o coroamento desses 25 anos de trabalho com a juventude excluída da sociedade por causa das drogas. É a aprovação da sociedade ao nosso método, uma vez que por causa do Papa,a Fazenda entrou definitivamente à pauta do dia e da mídia, tornando inclusive a problemáticadas drogas atual e apresentando a Fazenda como uma resposta eficaz e de sucesso.E depois disso, o que será? Queremos continuar a amar e acolher esses jovens, que nos procuramainda mais depois de tudo o que aconteceu. Não vamos deixar para trás o que nos impulsionouaté uma boca de fumo. Queremos viver o Evangelho com simplicidade e coragem, a fim de que omaior número possível possa fazer uma experiência autentica de Deus.Abaixo segue o testemunho de vida da jovem alemã que se recuperou conosco em Berlim e quefalou ao Papa na ocasião de sua visita.
Sou de Berlim e por causa de um acidente de trabalho, aos 20 anos, fui obrigada a emagrecer. Em poucos meses pesava 60 quilos, o que atraiu de todos muitos elogios, o que me motivou a continuar assim. Mas cresceu em mimo medo de comer e adquiri bulimia anorexia, além de manter condutas de auto-mutilação. Por fim, tentei osuicídio várias vezes. Quando atingi 53 quilos, fui parar no hospital. Lá emagreci e me feri ainda mais ecomeçaram muitas discussões com meus pais. Até que em setembro de 2002, três jovens da Fazenda da Esperançame visitaram e me contaram a vida delas. Eu me senti muito amada e recomecei a comer, com a meta de visitar aFazenda. Um tempo depois já estava morando na Fazenda para me recuperar.O início foi difícil. Não tinha nenhuma experiência com Deus. Somente o tempo e o amor de todos pôde abrir meucoração e dar nele um lugar para Ele. Durante este tempo pude acordar para o desejo de viver. Comecei a lutar contra o problema de comer e de me ferir. Aprendi que não deveria desanimar e que deveria aceitar minhasdificuldades. Depois pude ainda fazer um tempo no Brasil. Morando numa Fazenda onde as mulheres podiamtrazer seus filhos, fui confrontada com uma ferida profunda: de querer ser mãe. Eu não me aceitava como mulher, por ter sido abusada sexualmente. O contato com as crianças era para mim muito doloroso. Não podia amar a mimmesma. Era o medo ser mulher. Recomecei a ferir-me, sem que as pessoas percebessem. Eu me envergonhava. Nascia o desejo de me aceitar como sou. Com a ajuda daqueles que viviam comigo, e com o auxílio da Terapia daabordagem direta do inconsciente, descobri o quanto Deus me ama e pude ver que meus pais me amam como sou,como menina. Depois disso não me feri mais. Muitas vezes ia para a capela chorar e pedia a Deus de me permitir tais desejos, como o de ser mãe. O desejo de ser mulher e mãe desabrochou. Muitas vezes ia a capela para chorar e pedir a Deus de me permitir ter tais desejos. Essa experiência me trouxe muito perto de Deus, que através do seuamor me permite ser a Silvia, que Ele mesmo colocou no mundo.
 
Hoje, moro na Fazenda de Berlim, na Alemanha e sei que através de minha experiência e minha luta constante souuma luz para as outras meninas. Escutar delas, que através de mim, elas recebem força para lutar e se tornaremmulheres novas, me faz feliz. E não existe felicidade maior que dar a vida pelo seu irmão.Sílvia Hatwich

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