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ROUBO

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35.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS DO


CRIME

O roubo é o furto realizado com o emprego de violência, de grave ameaça ou de


qualquer outro recurso que reduz a possibilidade de resistência da vítima. No furto, viu-se,
o agente limita-se a subtrair, usando violência, quando muito, em relação à coisa ou a
algum obstáculo à subtração. Não há ataque à vida ou à integridade, física ou moral, de
qualquer pessoa.

Quando a subtração é acompanhada de agressão à pessoa, ocorre o roubo.

Assim, o bem jurídico é não somente a posse ou a propriedade de coisa alheia móvel, o
patrimônio, mas também a integridade corporal, a saúde, a liberdade e até a vida da pessoa.
É, portanto, um crime complexo, de múltipla objetividade jurídica.

Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo. Sujeito passivo do crime, igualmente, pode ser
qualquer pessoa, inclusive o não possuidor ou proprietário da coisa, desde que contra ele
venha a ser empregada violência, no curso da subtração ou após ela, como se verá adiante.

35.2 TIPICIDADE

No caput e no § 1º do art. 157 estão as duas figuras típicas fundamentais, o roubo


próprio e o roubo impróprio. No § 2º encontram-se causas de aumento de pena, dando
lugar ao denominado roubo circunstanciado ou roubo agravado. No § 3º o roubo
qualificado pelo resultado, lesão corporal grave ou morte.
2 – Direito Penal II – Ney Moura Teles

35.2.1 Formas típicas simples

No caput do art. 157 está descrita a primeira figura típica fundamental,


denominada roubo próprio: “subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante
grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência”. A pena cominada é reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

O chamado roubo impróprio está previsto no § 1º: “na mesma pena incorre quem,
logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a
fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro”.

A diferença entre a primeira e a segunda figura típica está no momento em que o


agente emprega a violência ou a grave ameaça contra a pessoa. No roubo próprio a
violência, a grave ameaça ou o meio que neutraliza a vítima antecede a subtração, que é
ação subseqüente, ou é realizada simultânea ou concomitantemente – durante a subtração.

No roubo impróprio a subtração acontece primeiro, e em seguida, imediatamente,


para que o crime fique impune ou para assegurar a detenção da coisa, o agente emprega
violência ou grave ameaça.

As penas cominadas são idênticas.

35.2.1.1 Conduta e elementos objetivos

A conduta será sempre positiva. De subtração e de coisa móvel falou-se quando do


exame do crime de furto, significando tirar a coisa do poder de quem a detém. Apoderar-se
dela, tornar-se seu senhor, tê-la consigo, contra a vontade de quem a tinha.

Tanto quanto no furto, a coisa não precisa estar na posse legítima do sujeito
passivo, sendo, portanto, possível o roubo de coisa que esteja na posse da vítima em
virtude de outro crime, como o próprio roubo, furto, estelionato, receptação ou qualquer
outro fato ilícito, ainda que de natureza civil.

Ladrão que rouba ladrão não tem 100 anos de perdão.

Deve, igualmente, ser coisa alheia, isto é, não pertencer ao agente, nem em parte.
Sobre esse elemento normativo valem as observações feitas no item 33.2.1.3.

Havendo subtração violenta de coisa própria, será exercício arbitrário das próprias
razões (art. 345 ou art. 346 do Código Penal), em concurso formal imperfeito com as lesões
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corporais, ameaça, constrangimento ilegal, ou seqüestro ou cárcere privado, conforme


tenha sido o meio empregado pelo agente.

A diferença entre o roubo e o furto está em que, para subtrair a coisa, o agente
emprega não os meios astuciosos, fraudulentos, nem a destreza, a esperteza, mas a
violência, física ou moral, desta feita contra a pessoa, havendo crime quando a emprega
após a subtração.

Pode provocar lesões corporais, praticar vias de fato, privar a liberdade de


locomoção, proferir grave ameaça ou empregar meios externos que minem a capacidade de
resistência da vítima, como a hipnose, a ingestão de substância entorpecente, enfim,
qualquer outro meio capaz de reduzir a possibilidade de reação da vítima.

De notar que, na construção típica do roubo impróprio não há referência ao uso de


meios outros que diminuam a possibilidade de resistência da vítima. Estes, portanto, só
estão presentes no roubo próprio.

Não é necessário para configurar o roubo que a vítima se oponha materialmente,


reagindo ou resistindo à subtração, havendo fato típico ainda quando ela colabora, diante
da violência, facilitando-a.

Não é também indispensável que a violência ou grave ameaça seja dirigida contra a
pessoa que tem a coisa, podendo ser empregada contra terceiro, a fim de minar a
capacidade de resistência do detentor.

O arrebatamento da coisa, tirando-a de inopino das mãos ou do corpo de seu


detentor, produzindo ainda que apenas lesões corporais leves, constitui inequivocamente o
crime de roubo, porque é o comportamento violento que constitui a condição da consumação
da subtração, não se podendo considerá-lo um mero furto.

Arrancar o relógio, a corrente ou a bolsa da vítima no meio da calçada, vindo o


agente e continuando em desabalada carreira, é roubo e não furto. É que a subtração,
nesses casos, se dá com o emprego de força física e, portanto, violência que se dirige não à
coisa, mas principalmente à pessoa, que a mantém atada ou presa ao corpo. Não há furto
com rompimento ou destruição de obstáculo porque, nesses casos, o próprio corpo da
vítima é o obstáculo, e corpo humano de pessoa viva não se equipara a coisa.

O emprego de arma de brinquedo ou a simulação de posse de arma verdadeira


pode, evidentemente, constituir grave ameaça, quando a vítima é atemorizada pela
conduta do agente que, mostrando artefato que imita arma de fogo ou representando, por
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meio de gestos, estar armado, consegue infundir-lhe o temor capaz de reduzir-lhe a


capacidade de resistência.

São relevantes, nessas hipóteses, as condições pessoais do sujeito passivo, tais como
o sexo, a idade, a compleição física, a saúde debilitada, elementos que devem ser
apreciados pelo julgador para considerar a efetiva ameaça, ainda que por meio virtual. Se
houve a intimidação, o temor ou a diminuição da possibilidade de resistência, o meio é
eficaz e roubo terá havido.

35.2.1.2 Elementos subjetivos

No roubo, crime exclusivamente doloso, a consciência do agente deve abranger a


subtração, os meios empregados e o elemento normativo “coisa alheia”.

Haverá erro de tipo, excludente do dolo e, portanto, da tipicidade, uma vez que não
há tipificação de roubo culposo quando o agente subtrai coisa alheia móvel com violência,
imaginando tratar-se de coisa própria. Deverá responder por exercício arbitrário das
próprias razões, porque esse foi seu dolo.

Além do dolo é indispensável que o agente tenha subtraído a coisa alheia móvel
com o fim de tê-la para si ou para outrem, o animus furandi, a intenção de se assenhorear
da coisa. É o mesmo elemento subjetivo do furto, de que já se falou (item 33.2.1.5).

No roubo impróprio, do § 1º do art. 157, há um outro elemento subjetivo: o emprego


da violência ou da grave ameaça deve ter como finalidade específica assegurar a impunidade
do crime ou garantir a detenção da coisa, para si ou para outrem.

Se o agente subtraiu a coisa alheia móvel, consumando-se o delito de furto, não


havendo reação do detentor ou de terceiro e, ao depois, emprega violência ou grave ameaça
por prazer sádico, para se divertir com a desgraça da vítima ou por qualquer outro motivo
que não o de assegurar a impunidade do furto ou a detenção da coisa, não haverá roubo
impróprio, mas furto em concurso material com o crime de lesão corporal ou ameaça.

35.2.1.3 Consumação e tentativa

A consumação do roubo próprio ocorre, como no furto, quando a coisa sai da esfera
de disponibilidade da vítima, ingressando na do agente. O Supremo Tribunal Federal
pacificou a matéria, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 102.490/SP, no qual
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ficou assentado que

“o roubo se consuma no instante em que o ladrão se torna possuidor da coisa móvel


alheia subtraída mediante grave ameaça ou violência. Para que o ladrão se torne
possuidor, não é preciso, em nosso direito, que ela saia da esfera de vigilância do
antigo possuidor, mas, ao contrário, basta que cesse a clandestinidade ou a
violência, para que o poder de fato sobre a coisa se transforme de detenção em
posse, ainda que seja possível ao antigo possuidor retomá-la pela violência, por si
ou por terceiro, em virtude de perseguição imediata. Aliás, a fuga com a coisa em
seu poder traduz inequivocamente a existência de posse. E a perseguição – não
fosse a legitimidade do desforço imediato – seria ato de turbação (ameaça) à posse
do ladrão”.1

O roubo impróprio, entretanto, consuma-se no momento em que o agente emprega


violência ou grave ameaça contra a vítima. É que, enquanto não o faz, o que existe é apenas
um furto. No instante em que, para assegurar a impunidade da subtração já praticada ou
para assegurar a detenção da coisa subtraída, empregar a violência ou a grave ameaça, aí o
furto terá se transmudado, consumando-se o roubo impróprio. O emprego dos meios
violentos deve ser imediato à subtração.

A tentativa é possível nas duas formas típicas, desde que haja início de execução, não
se consumando o roubo por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Atos preparatórios não são puníveis, em nosso direito, salvo quando constituírem
crime autônomo. Assim, se o agente aborda a vítima e tenta conduzi-la a local escuro para,
ali, empregar violência a fim de subtrair-lhe o relógio, mas é impedido pela chegada de
policial que suspeita de seu comportamento, não há tentativa de roubo, ainda que dolo
houvesse de realizá-lo, porque não houve início de execução.

No roubo próprio há início de execução quando o agente começa a realizar atos de


violência, grave ameaça ou relativos ao outro meio que diminua a capacidade de resistência
da vítima, para subtrair a coisa em seu poder. O emprego, no tipo, da expressão
“mediante” – que significa aquilo que medeia duas coisas – conduz à certeza de que a
violência ou a grave ameaça que caracteriza o roubo próprio deve preceder ou ser
concomitante à subtração. Quanto ao meio que diminui a capacidade de resistência, deve

1 RTJ 135/161 e seguintes.


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ser, necessariamente, precedente à subtração, como se dessume da expressão “depois de”,


contida no tipo.

Logo, não é necessário, para se considerar tentado o roubo, que o agente inicie a
execução da subtração, bastando que dê início a qualquer ato de violência.

Há também início de execução de roubo quando o agente realiza um primeiro ato


executório de subtração, acompanhado simultaneamente de atos de violência ou, ainda,
quando estes se iniciam após o início da subtração e enquanto perduram as ações visando
à tomada da coisa. Não concluída a subtração por circunstâncias alheias à vontade do
agente, há tentativa de roubo, mesmo quando não se completam os atos de violência, mas
desde que iniciados.

Nos crimes complexos como o roubo, não é necessário que todos os tipos integrantes
do tipo complexo sejam tentados ou iniciados, bastando que um deles seja pelo menos
iniciado, desde, é óbvio, que o dolo do agente alcance a integridade do crime complexo.

No roubo impróprio, dizem a doutrina e a jurisprudência majoritárias, não é possível


falar-se em tentativa. É que, subtraída a coisa, o agente, imediatamente, para assegurá-la,
para si ou para outrem, ou para garantir a impunidade do crime, emprega violência contra
a pessoa. Ao fazê-lo, já estando consumada a subtração, consuma-se, instantaneamente, o
roubo impróprio, com a agressão ou a grave ameaça, com o primeiro ato de lesão corporal,
vias de fato, ou de intimidação. Um único ato de violência ou grave ameaça é suficiente
para transmudar o furto já consumado em roubo impróprio consumado, ainda que, depois,
o agente venha a ser desapossado da coisa, recuperada pela própria vítima ou por terceira
pessoa.

Reitere-se que o emprego de violência ou grave ameaça deve ser imediato à


subtração, daí que se ocorre bem depois não se pode mais falar em roubo impróprio, mas
em furto em concurso material com o crime contra a pessoa.

Mas, penso, concordando com FRAGOSO e MIRABETE, não ser absolutamente


impossível a tentativa de roubo impróprio, que haverá de ser reconhecida, por exemplo,
quando o agente, imediatamente depois de subtraída a coisa, estando prestes a empregar
violência contra a vítima, desferindo-lhe uma paulada, é interrompido pela intervenção
precisa de um terceiro que lhe obsta o golpe, não ocorrendo a lesão corporal pretendida,
sendo preso em seguida. Terá havido a consumação da subtração e o início da execução da
violência, interrompida, embora pretendida, por circunstâncias alheias à vontade do
agente.
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No roubo é possível a desistência voluntária. Se o agente, após empregar violência e


estando prestes a subtrair a coisa, resolve, ainda que a pedido da vítima, não se apoderar
dela, deverá responder apenas pela lesão corporal causada. Não se admite o
arrependimento eficaz porquanto, concluída a execução, já se terá consumado o crime,
sendo, portanto, impossível impedir o resultado, que já terá ocorrido, com a posse da coisa
pelo agente. Nem o arrependimento posterior, do art. 16 do Código Penal, porque este
somente se aplica aos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.

Não há falar em tentativa de roubo, mas crime impossível, quando o agente não
encontra, porque não existe, em poder da vítima, a coisa que pretendia subtrair, embora
tenha empregado violência ou grave ameaça contra a pessoa. Haverá, sim, lesão corporal
ou ameaça, porque, no caso, era impossível a consumação da subtração, por absoluta
impropriedade do objeto.

Se o agente tenta ameaçar a vítima com uma arma de brinquedo, não conseguindo,
porém, intimidá-la, porque o artefato foi facilmente identificado como inócuo, não
ocorrendo, de conseqüência, a subtração pretendida, forçoso é reconhecer aí um crime
impossível, não remanescendo qualquer fato típico.

35.2.2 Aumento de pena (roubo circunstanciado ou roubo


agravado)

O § 3º do art. 157 determina o aumento da pena, de um terço até metade, caso


esteja presente uma das circunstâncias descritas nos incisos I a V, os dois últimos
introduzidos no dispositivo pela Lei nº 9.426, de 24 de dezembro de 1996. Reconhecida
uma dessas causas, pelo menos, diz a doutrina que se trata de roubo circunstanciado ou
roubo agravado.

As causas de aumento de pena aplicam-se apenas às figuras típicas simples, do


caput e do § 1º do art. 157, não incidindo sobre as formas qualificadas pelo resultado
descritas no § 3º, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do
Recurso Especial nº 255650/RS2.

2 DJ de 9-4-2001, p. 392.
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35.2.2.1 Emprego de arma

A primeira causa de aumento de pena é o emprego de arma na prática da violência


ou da grave ameaça. Por arma deve-se entender todo e qualquer instrumento destinado à
defesa ou ao ataque, com idoneidade para ferir a integridade física de uma pessoa.

Assim as armas próprias, destinadas especialmente à defesa e ao ataque, como o


revólver, a espingarda, carabina, punhal, como também as armas impróprias, de que são
exemplo a barra de ferro ou madeira, a faca de cozinha, a chave de fenda, o canivete, a pá,
enxada, tesoura ou qualquer instrumento que possa lesionar o corpo da pessoa.

A arma deve ser empregada na perpetração da violência ou da grave ameaça, não


devendo ser considerada a majorante da pena quando o agente apenas porta-a na cintura
ou no bolso, dela não fazendo qualquer uso, ainda que a mostre ostensivamente. Há,
contudo, decisão do Supremo Tribunal Federal reconhecendo o aumento quando do porte
ostensivo3.

A norma exige, claramente, que o agente, na realização da conduta típica, tenha


empregado a arma, o que significa que ela deve ser utilizada efetivamente, isto é,
manuseada diante da vítima, representando, portanto, um perigo iminente para sua
integridade física.

O emprego de arma desmuniciada ou defeituosa, sem nenhuma idoneidade


ofensiva, não autoriza o reconhecimento da majorante da pena, como já decidiu o Supremo
Tribunal Federal4.

Durante muito tempo travou-se no seio da doutrina, com repercussão nas decisões
dos tribunais, candente debate sobre se o emprego de arma de brinquedo ou simulação de
arma também autorizaria o aumento de pena.

Uma corrente, que chegou a ser majoritária, levando em conta considerações de


ordem subjetiva, entendia alcançada pela norma também a arma de brinquedo porque seu
emprego era de molde a causar maior temor na vítima, no momento da subtração. Nesse
sentido, o Superior Tribunal de Justiça chegou ao ponto de editar e publicar a Súmula nº
147, com o seguinte enunciado: “No crime de roubo, a intimidação feita com arma de
brinquedo autoriza o aumento da pena.”

3 HC 77.468-7, DI de 25-9-98, p. 12.


4 HC 70.534/RJ, DJ de 1-10-93, p. 20.215.
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Outra corrente doutrinária defendia pensamento oposto, por entender que, se é


verdade que a arma de brinquedo pode ter idoneidade para intimidar a vítima, autorizando
o reconhecimento da grave ameaça que tipifica o roubo, não pode, entretanto, servir ao
aumento de pena, seja porque tal se daria com violação ao princípio da legalidade – uma
vez que a norma do § 2º, I, refere-se à arma, e brinquedo não é arma, assim como arma
não é brinquedo –,5 e ainda porque restariam violados os princípios do ne bis in idem e o
da proporcionalidade.

Essas críticas contundentes, aliadas à vigência da Lei nº 9.437/97, que considerou


crime a utilização de “arma de brinquedo, simulacro de arma capaz de atemorizar
outrem, para o fim de cometer crimes” (art. 10, § 1º, II), levaram o Superior Tribunal de
Justiça a cancelar a Súmula 174, no julgamento do Recurso Especial nº 213.054, que
restou assim ementado:

“RECURSO ESPECIAL. PENAL. ROUBO. EMPREGO DE ARMA DE


BRINQUEDO. CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO
INCISO I, § 2º, DO ART. 157, DO CÓDIGO PENAL. SÚMULA Nº 174/STJ.
CANCELAMENTO.
O aumento especial de pena no crime de roubo em razão do emprego de arma
de brinquedo (consagrado na Súmula 174-STJ) viola vários princípios basilares do
Direito Penal, tais como o da legalidade (art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição
Federal e art. 1º, do Código Penal), do ne bis in idem, e da proporcionalidade da
pena.
Ademais, a Súmula 174 perdeu o sentido com o advento da Lei 9.437, de 20-2-
1997, que em seu art. 10, § 1º, inciso II, criminalizou a utilização de arma de
brinquedo para o fim de cometer crimes.
Cancelamento da Súmula 174-STJ.
Recurso conhecido, mas desprovido.”6
A Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que revogou integralmente a Lei nº
9.437/97, não contém tipo penal incriminando a utilização de arma de brinquedo ou
simulacro de arma para o fim de cometer crimes, o que não altera o entendimento do STJ

5FREIRE, Ranulfo de Melo, apud CINTRA JUNIOR, Dyrceu Aguiar Dias, Brinquedo não é arma – crítica à
Súmula nº 174 do STJ. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº 50, p. 1.

6 DJ 11-11-2002, p. 148.
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citado.

O emprego de arma de brinquedo, portanto, integra a figura típica fundamental do


roubo, como modo de execução da grave ameaça.

35.2.2.2 Concurso de duas ou mais pessoas

Havendo concurso de duas ou mais pessoas para a prática do roubo a pena será
igualmente aumentada. Considera-se a participação ou a co-autoria, desde que dolosa, de
menores ou inimputáveis, não sendo exigida a presença do concorrente na execução
material do delito. A falta de identificação de um dos concorrentes não impede a incidência
da causa de aumento, desde que reste comprovada sua efetiva presença na prática
delituosa.

35.2.2.3 Vítima em serviço de transporte de valores

Aumenta-se a pena se a vítima, no momento da subtração, encontra-se em serviço


de transporte de valores, tais como dinheiro, jóias, barras de ouro etc. Indispensável que a
vítima seja empregada de uma empresa dedicada ao transporte de valores ou, pelo menos,
no exercício eventual de uma atividade remunerada de transporte de valores, e não
transportando valores, próprios ou de terceiros, por mero favor ou por força de qualquer
outra circunstância, como é o caso do cobrador do ônibus que, no final do dia, leva,
consigo, determinada quantia em dinheiro.

Não há, também, aumento de pena quando a vítima transporta seus próprios
valores, no momento em que é abordada pelo agente.

Indispensável que o agente tenha conhecimento dessa circunstância, revelando,


assim, a maior reprovabilidade de sua conduta, que enseja a incidência da majorante.

35.2.2.4 Veículo automotor transportado para outro Estado


ou para o exterior

Introduzida pela Lei nº 9.426/96, essa causa de aumento de pena é a mesma já


comentada e também criada em relação ao crime de furto. Se a coisa roubada é veículo
automotor transportado para outro Estado ou para o exterior, a pena será aumentada.
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Valem, aqui, as mesmas observações feitas quanto ao furto, no item 33.2.3.8, cuja
leitura recomendo.

35.2.2.5 Restrição à liberdade da vítima

A última causa de aumento é a do inciso V do § 2º: “se o agente mantém a vítima


em seu poder, restringindo sua liberdade”.

Quando o agente, no curso da realização do roubo, restringir a liberdade da vítima


mantendo-a em seu poder, presa em algum lugar, pelo tempo necessário à subtração ou,
mesmo após a subtração, por um certo tempo, relativamente curto, como conseqüência
natural da própria consolidação da sua posse sobre a res furtiva, libertando-a em seguida
ou deixando-a em condições de se libertar, abandonando o local, incidirá essa causa de
aumento de pena. Trata-se, como se viu, de restrição à liberdade, e não de sua privação,
além do que, é uma continuidade típica do roubo.

Se, entretanto, depois de consumado o roubo e não havendo nenhuma necessidade


de ataque à liberdade locomotora da vítima, o agente, com desígnio autônomo, priva-a, de
sua liberdade, por tempo considerável, haverá outro crime, o de seqüestro ou cárcere
privado que, então, será reconhecido em concurso material com o crime de roubo.

A solução para qualquer dúvida sobre a natureza do ataque à liberdade, durante ou


após o roubo, deve ser buscada com base nos seguintes critérios.

A causa de aumento exige restrição de liberdade, ataque menos grave que a


privação, típica do seqüestro ou cárcere privado. Por essa razão deve ser de curta duração,
porque quando se prolongar no tempo torna-se, em verdade, privação.

A restrição à liberdade deve guardar, com a subtração, um nexo de necessidade. Se


não tem nenhuma relação com a subtração, nem em seu momento antecedente, nem em seu
momento imediatamente subseqüente, com o roubo não terá nenhuma relação, daí que
haverá crime autônomo de seqüestro ou cárcere privado.

35.2.2.6 Concurso de causas de aumento de pena

Presentes, num mesmo fato típico de roubo, duas ou mais causas de aumento de
pena – por exemplo, roubo cometido contra vítima em serviço de transporte de valores,
cometido por duas ou mais pessoas, ou roubo de veículo transportado para outro Estado,
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com o emprego de arma – o juiz aplicará uma só causa de aumento, considerando as


demais como circunstâncias judiciais no momento da fixação da pena-base.

Encontram-se, em decisões dos tribunais, os mais intrincados modelos de


quantificação do aumento, muitos dos quais assemelhados a receitas de bolo, como se a
aplicação da pena se resumisse a uma operação aritmética.

Ora, aplicar a pena é tarefa humana sobre ação humana típica, ilícita e culpável.
Havendo mais de uma causa de aumento, só uma será considerada no momento de sua
verificação. As demais não podem influir na quantificação do aumento, mas devem ser
analisadas antes, quando da fixação da pena-base, como circunstâncias judiciais.

De conseqüência, o quantum do aumento só pode ser determinado com base na


análise qualitativa e quantitativa de uma única causa de aumento escolhida pelo julgador
como majorante da pena-base já fixada antes.

Exemplo: se o roubo foi cometido com emprego de arma, havendo concurso de


mais de duas ou mais pessoas, contra vítima que transportava valores, circunstância
conhecida pelos agentes, tendo estes mantido-a em seu poder, restringindo sua liberdade,
estão presentes quatro das cinco causas de aumento possíveis. O juiz, quando fixar a pena-
base, saberá, de antemão, que somente uma das causas será considerada para aumentar a
pena, de um terço até metade. Logo, deverá considerar as outras três como circunstâncias
judiciais do art. 59 – as inominadas –, que o influenciarão, tanto quanto as nominadas –
culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do agente, motivos e
conseqüências do crime e comportamento da vítima –, na quantificação da pena-base.
Claro que elas militarão em desfavor do agente, o que fará, evidentemente, a pena-base
distanciar-se do grau mínimo.

Aliás, é bom dizer que quando, no art. 59, a lei incluiu, sem qualquer adjetivação, a
expressão “circunstâncias”, foi exatamente com a finalidade de, em todas as situações de
concurso de causas de aumento contidas no mesmo preceito legal, como essas do § 2º do
art. 157, referir-se às que não vierem a ser escolhidas pelo julgador para funcionar como
causa de aumento de pena, devendo, por isso, ser consideradas na fase da determinação da
pena-base.

Concluída a determinação da pena-base e depois de considerar as circunstâncias


atenuantes e agravantes, o juiz levará em conta a causa de aumento do § 2º do art. 157 que
não tiver sido levada em conta para a fixação da pena-base.
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Na determinação do quantum aumentativo, o juiz ficará adstrito exclusivamente à


causa por ele escolhida para aumentar a pena, analisando tão-somente seus elementos
constitutivos, variando o aumento conforme tenha sido sua intensidade e extensão, sua
quantidade e qualidade, sua inserção e a força causal que tiver na totalidade do fato em
apreciação.

O juiz será livre para escolher, dentre as várias causas, qual a que funcionará como
aumento de pena, mas estará, sempre, vinculado às regras dos arts. 68 e 59 do Código
Penal e aos princípios norteadores da garantia constitucional da individualização da pena,
não fugindo, jamais, do princípio diretor, segundo o qual a pena será apenas o suficiente e
o necessário para prevenir e reprovar o crime.

35.2.3 Formas qualificadas pelo resultado

O § 3º do art. 157 contém duas circunstâncias que qualificam o crime de roubo em


razão do resultado mais grave: “se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de
reclusão, de 7 (sete) a 15 (quinze) anos, além de multa; se resulta morte, a reclusão é de
20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa.”

35.2.3.1 Lesão corporal grave

O primeiro resultado qualificador é lesão corporal grave ou gravíssima (art. 129, §§


1º e 2º). Deve ser conseqüência da violência empregada pelo agente, necessário, portanto,
nexo de causalidade com a conduta. Será reconhecido tanto na hipótese de roubo próprio
quanto na de roubo impróprio, em que a violência é empregada imediatamente após a
subtração.

Lesão corporal leve não qualifica o roubo, é por ele absorvida.

O resultado pode ser produzido na pessoa que detém a coisa ou em terceiro contra
quem foi empregada a violência ou que, circunstante, é atingido pela conduta do agente.
Pode estar incluído no dolo do agente ou resultar de sua negligência, imprudência ou
imperícia, como resultado preterdoloso. Claro que a conduta de subtrair empregando
violência, antes, durante ou depois da subtração, é dolosa.

Haverá roubo qualificado pela lesão corporal grave ainda quando a subtração não
seja consumada. É que a norma qualificadora do § 3º do art. 157 refere-se ao resultado
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enquanto conseqüência da violência empregada pelo agente, não exigindo a efetiva


consumação da subtração: se da violência resulta lesão corporal grave. Não diz a norma:
“se do roubo resulta lesão corporal grave”, assim, basta que tenha sido empregada
violência e dela tenha resultado a lesão corporal grave, presente estará a circunstância
qualificadora.

Dessa compreensão resulta que quando a lesão corporal decorrer do emprego de


grave ameaça – possível se a vítima, emocionada diante da emoção, vem a sofrer, por
exemplo, um ataque cardíaco, correndo perigo de vida –, não haverá roubo qualificado,
mas roubo simples em concurso formal com lesão corporal.

35.2.3.2 Latrocínio

O outro resultado que qualifica o roubo é a morte resultante da violência


empregada antes, durante ou imediatamente após a subtração.

A morte deve ter, necessariamente, nexo de causalidade com a conduta violenta,


podendo ser da vítima da subtração ou de terceira pessoa.

Pode ter sido abrangida pelo dolo do agente e aí se tem um crime integralmente
doloso, ou decorrer de culpa: um roubo com morte preterdolosa, chamado latrocínio.
Nesta última modalidade, o agente emprega violência sem desejar nem aceitar a morte,
porém age de modo descuidado e acaba, sem querer, causando a morte da vítima. A pena é
a mesma nas duas hipóteses, mas o juiz, no momento da aplicação da pena, deverá levar
em conta a presença ou não do dolo quanto ao resultado morte.

O latrocínio, crime qualificado pelo resultado, é o emprego de violência para


subtrair coisa alheia móvel, para si ou para outrem, acompanhado de morte, consumada –
dolosa ou culposa – ou tentada.

Consumadas a subtração e a morte, dúvida não há de que se trata de um latrocínio


consumado.

Não consumada a subtração e tendo a morte sido desejada ou aceita, mas não se
consumando, igualmente, por circunstâncias alheias à vontade do agente, haverá, sem
qualquer sombra de dúvida, tentativa de latrocínio. Houve início de execução tanto da
subtração quanto da morte, porém nenhum desses resultados ocorre, deixando de se
consumar o crime em todos os seus elementos constitutivos, por razões situadas fora da
vontade do agente.
Roubo - 15

Quando o agente subtrai a coisa empregando, para tanto, violência com dolo de
matar a vítima, mas esta, ainda assim, não morre, há tentativa de latrocínio, porque tendo
havido dolo de matar para roubar ou de roubar matando, o resultado que caracteriza o
crime de latrocínio estava no dolo do agente. Se, por circunstâncias alheias à vontade do
agente a morte não acontece, subsiste o latrocínio, na forma tentada.

Consumada a morte da vítima, dolosa ou culposa, como resultado da violência


empregada para a subtração, que, todavia, não ocorre, há latrocínio consumado porque,
como já se disse no item anterior, o tipo qualificado pelo resultado contido no § 3º do art.
157 descreve a morte resultante do emprego de violência para tirar, de alguém, coisa alheia
móvel para si ou para outrem, independentemente da efetivação da subtração.

Este entendimento é o pacificado no Supremo Tribunal Federal, como consta do


enunciado da Súmula 610: “há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda
que não realize o agente a subtração de bens da vítima”.

35.2.3.3 Acréscimo de pena no latrocínio

O art. 9º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, LEI DOS CRIMES HEDIONDOS,


incluiu, no art. 1º, o latrocínio como crime hediondo e determinou que a pena será
acrescida de metade, respeitado o limite superior de 30 anos, se o latrocínio é cometido
contra vítima que esteja nas mesmas condições do art. 224 do Código Penal, ou seja,
quando ela:

a) não é maior de quatorze anos;

b) é alienada, débil mental, e o agente conhecia essa circunstância; ou

c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.

Essa norma é, induvidosamente, inconstitucional, pelo menos em relação ao


latrocínio. A norma do art. 224, como é cediço, consagra a violência presumida e é
aplicável aos crimes contra a liberdade sexual, mas é de inequívoca inconstitucionalidade,
uma vez que manda punir alguém por presunção e não por fato proibido realmente
praticado.

Transformada em causa determinante de acréscimo de pena, constitui um inaceitável


bis in idem, porquanto considera a violência presumida como aumento de pena, quando a
violência real já é ínsita na realização do tipo de latrocínio. Viola o princípio da
16 – Direito Penal II – Ney Moura Teles

individualização da pena, pois a pena mínima, acrescida de metade, seria igual à pena
máxima, 30 anos, impossibilitando qualquer consideração acerca das circunstâncias
judiciais e legais que norteiam a aplicação da pena.

35.2.4 Conflito aparente de normas e concurso de crimes

O roubo absorve os delitos contra a liberdade individual e as lesões corporais


porque são elementares de sua configuração típica. Quanto ao seqüestro e cárcere privado,
valem as observações feitas no item 33.2.5, podendo incidir a causa de aumento ou haver
concurso material de crimes.

Há concurso material entre roubo e crime contra a liberdade sexual se, após a
subtração violenta, o agente constrange a vítima à prática de relação sexual.

Há concurso material entre o crime de quadrilha ou bando e o de roubo, inclusive


na forma de quadrilha armada, do parágrafo único do art. 288 do Código Penal, com roubo
com pena aumentada em razão do emprego de arma ou mediante concurso de pessoas,
sendo certo que não se irá considerar, para cada roubo cometido, um crime de quadrilha
ou bando, que, sendo permanente, é crime único. O crime de quadrilha armada não
absorve as causas de aumento de pena do roubo.

Quando o agente, no mesmo contexto fático, subtrai coisas de várias vítimas,


praticando o chamado roubo múltiplo, há concurso formal de crimes, entendimento
amplamente majoritário na jurisprudência, havendo, entretanto, decisões no sentido de
reconhecer o crime único.

Divergências há quanto ao reconhecimento de concurso material ou de


continuidade delitiva entre roubos praticados em contextos distintos, entre roubo e roubo
qualificado, inclusive o latrocínio, ou entre roubo e extorsão mediante seqüestro ou outro
crime contra o patrimônio.

Entre vários roubos é possível a continuidade delitiva, porque é induvidoso que são
crimes da mesma espécie, portanto, desde que realizados os pressupostos do art. 71 e seu
parágrafo único, nada impede o reconhecimento de crime continuado.

A questão está em saber o que são crimes da mesma espécie.

A jurisprudência amplamente majoritária dos Tribunais, inclusive do Supremo


Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, entende que roubo, latrocínio, furto,
Roubo - 17

extorsão, extorsão mediante seqüestro não são crimes da mesma espécie, mas do mesmo
gênero, embora tenham mesma natureza. Assim, reconhecem a existência de concurso
material de crimes.

Penso, entretanto, que a razão está no entendimento defendido por ALBERTO


SILVA FRANCO, cuja lição vale ser transcrita:

“A continuidade delitiva não ocorre, assim, em relação apenas aos crimes idênticos,
isto é, aos que se abrigam sob o mesmo artigo de lei. Manoel Pedro Pimentel (Do
Crime Continuado, 1969, p. 145) acentua que devem ser havidos como ‘da mesma
espécie, os crimes que se assemelhem pelos seus elementos objetivos e subjetivos’.
Não é diverso o entendimento de Heleno Cláudio Fragoso (Lições de Direito Penal, A
Nova Parte Geral, 1987, p. 368/369), ao afirmar que ‘crimes da mesma espécie não
são apenas aqueles previstos no mesmo artigo de lei, mas também aqueles que
ofendem o mesmo bem jurídico e que apresentem, pelos fatos que os constituem ou
pelos motivos determinantes, caracteres fundamentais comuns’. Assim, apesar das
vacilações da jurisprudência, é possível a continuação entre furto e roubo, entre
roubo e extorsão, entre estelionato e qualquer outra fraude.”7

A norma do art. 71 não se referiu a crimes idênticos, preferindo empregar a expressão


“crimes da mesma espécie”. Mesma não significa única ou idêntica, mas quer dizer
semelhante, parecida, análoga. Espécie é o conjunto de seres que têm a mesma essência,
porém com diferenças particulares. Têm os seres da mesma espécie a mesma substância, a
mesma essência, mas algumas diferenças que os distinguem uns dos outros da mesma
espécie. Os entes da mesma espécie integram um único gênero. Quisesse a lei que a
continuidade delitiva fosse aplicada para crimes que têm, integralmente, os mesmos
elementos, teria empregado a expressão “crimes idênticos”, utilizada nos arts. 69 e 70 ou a
expressão “única espécie”.

Crimes de mesma espécie são crimes que têm a mesma essência, e essa está no bem
jurídico protegido. Os tipos de furto, roubo, extorsão, extorsão mediante seqüestro,
estelionato, dentre outros, descrevem violações do patrimônio. Essa é a sua essência, a sua
alma. Há diferenças, evidentemente, entre o furto e o estelionato, mas elas não alteram a
substância de serem, ambos os crimes, agressões ao patrimônio.

7 Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, v. 1, p. 1296.


18 – Direito Penal II – Ney Moura Teles

É verdade que entre o roubo e a extorsão mediante seqüestro também há diferenças,


de maior monta até, como também são maiores as diferenças entre o roubo e o latrocínio,
mas entre esses crimes há um traço comum, que é a violência empregada contra a pessoa,
cuja integridade física e mental é também tutelada, sendo essa o outro bem jurídico
protegido.

Não é a complexidade de um crime que o torna integrante de espécie distinta do


crime simples. O latrocínio, apesar de descrever uma violação patrimonial e uma morte,
não é, por essa razão, ao mesmo tempo um crime contra o patrimônio e um crime contra a
vida, mas apenas um delito patrimonial. Essa foi a vontade da lei. Crimes contra o
patrimônio é o gênero, do qual são espécies o furto, o furto de coisa comum, o roubo, o
latrocínio, a extorsão e a extorsão mediante seqüestro, enfim, todos os definidos no Título
II da Parte Especial do Código Penal.

Interpretação diferente, como é a dominante na doutrina e jurisprudência, atende,


evidentemente, a outros interesses, não à vontade da lei.

Nunca é demais lembrar, por último, que a continuidade delitiva não será
reconhecida apenas quando se tratarem de crimes da mesma espécie, devendo estar
presentes seus demais pressupostos e, tratando-se de crimes cometidos com violência ou
grave ameaça contra vítimas diferentes, indispensável, ainda, a verificação das
circunstâncias do parágrafo único do art. 71.

Se é mais fácil e cômodo para o julgador afastar a continuidade delitiva por não
considerá-los crimes da mesma espécie, não é, todavia, justo e jurídico.

35.3 ILICITUDE E CULPABILIDADE

Não há roubo lícito. Impossível reconhecer sua prática sob o pálio do estado de
necessidade, como é possível no caso de furto famélico, porque não se pode reconhecer a
inevitabilidade do emprego de violência ou grave ameaça contra a pessoa, para saciar a
própria fome.

Indesculpável, também, a conduta de quem, mesmo em estado de penúria, vem a


empregar violência, posto que, sempre, será exigível do homem não cometer violência para
o fim de subtrair coisa alheia móvel.
Roubo - 19

35.4 AÇÃO PENAL

A ação penal é de iniciativa pública, incondicionada. O latrocínio é crime hediondo,


conforme dispõe o art. 1º, II, da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990.

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