Intimidade
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Com base em sua observação do cotidiano (principalmente do carioca) e em suas pesquisas sobre a construção da vida afetiva contemporânea, Mirian aponta para distinções marcantes entre os universos masculino e feminino. Para ela, homens e mulheres ainda estão muito longe de conquistar uma relação de fato íntima, e identifica as diferentes expectativas e desejos de ambos: as mulheres reclamam da falta de intimidade – que, para os homens, se resumiria a uma proximidade física, ao sexo, enquanto para elas envolve uma maneira especial de estar juntos e se comunicar de forma profunda – e os parceiros se sentem incompreendidos, injustamente cobrados e incapazes de satisfazer as excessivas e contraditórias demandas femininas.
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Intimidade - Mirian Goldenberg
lágrimas
Uma conversa íntima
Este livro reúne vinte pequenos artigos, alguns inéditos e outros já publicados em jornais brasileiros.
Gosto de escrever para jornais e revistas, pois é uma excelente oportunidade para pensar sobre questões como gênero, intimidade, infidelidade, corpo e envelhecimento na cultura brasileira e, também, um desafio para elaborar um pouco mais as minhas reflexões para atingir um público maior de leitores.
O último texto é bastante diferente dos demais. Convidada por uma amiga para escrever algo sobre judaísmo, passei alguns meses elaborando um conto. Muitas lágrimas correram até ele ficar pronto. Enviei o conto para alguns amigos e amigas. Uns acharam que eu não deveria publicá-lo. Outros insistiram para que eu o publicasse.
Uma das características dos textos aqui apresentados é que todos, sem exceção, são frutos de profundas inquietações intelectuais e pessoais. Fatos que me intrigam, no meu cotidiano, como as meninas se vestirem de cor-de-rosa ou as mulheres reclamarem da falta de intimidade com os homens, provocaram o meu desejo de compartilhar as minhas ideias ou curiosidades.
Além das minhas observações cotidianas na cidade do Rio de Janeiro, busquei, nestes pequenos textos, apresentar as principais reflexões que têm acompanhado a minha trajetória na antropologia. Apresento, de forma simples, alguns conceitos de autores que são centrais nos meus estudos (Simone de Beauvoir, Gilberto Freyre, Pierre Bourdieu, Norbert Elias e Marcel Mauss), mas, também, algumas das ideias que elaborei a partir das minhas pesquisas (o corpo como capital, capital marital, fidelidade paradoxal, intimidade íntima, miséria subjetiva).
Muitas vezes sou parada, nas ruas do Rio de Janeiro ou nas minhas caminhadas nas praias de Ipanema e Leblon, por algum leitor ou leitora dos meus artigos. Você é a Mirian Goldenberg? Adoro o que você escreve, mas a minha mulher não concorda com as suas opiniões.
Você é a Mirian Goldenberg? Sou sua fã. Leio sempre o que você escreve. É muito importante o que você está fazendo por nós, mulheres. Nós precisamos ouvir as coisas que você diz.
Recebo, também, inúmeros e-mails de homens e mulheres comentando os meus artigos e falando de suas próprias intimidades. E-mails que guardo como um tesouro, com longas histórias de traições, paixões, sofrimentos e medos. Sempre me surpreendo com o fato de eles se abrirem comigo sem me conhecer pessoalmente. Com o fato de, na rua ou no computador, tratarem-me como uma amiga íntima.
Algumas vezes os meus leitores e leitoras me sugerem temas para artigos ou livros. Uma das sugestões mais interessantes foi a de uma mulher indignada com a preferência do marido pelas mulheres leves
.
Não aguento mais ouvir meu marido dar exemplos de mulheres leves. Ele diz que sou muito preocupada, estressada, tensa, intensa. Por coincidência, todos os exemplos que ele dá são de mulheres que não trabalham ou que têm empregos que não exigem muito. Por que você não escreve sobre esta obrigação das mulheres de serem leves? Leves de quê? De corpo? De comportamento? De personalidade? Ele vive me acusando de ser difícil, complicada, controladora, exigente, e elogiando as mulheres leves... O que isto quer dizer exatamente? Que devo ser sempre alegrinha, divertida, superficial, submissa, agradável, compreensiva e aceitar suas chatices sem reclamar? Você precisa escrever sobre a ditadura da leveza.
Em outra ocasião, estava no Shopping Leblon tomando um café com uma amiga, quando ela me sugeriu que eu escrevesse sobre as mulheres bege
.
Mirian, você tem que escrever sobre as mulheres bege. Já reparou que as mulheres ricas são todas bege dos pés à cabeça? As pobres são coloridas, exuberantes, exibem o corpo em decotes e minissaias, cabelos compridos, alisados e tingidos, unhas e batons vermelhos. As ricas são contidas, neutras, discretas, apagadas. As pobres são hipervisíveis, as ricas querem ser invisíveis.
Infelizmente, não tenho a capacidade de refletir e escrever sobre todas as boas ideias que me são sugeridas. Adoraria ter escrito sobre as mulheres leves e, também, sobre as mulheres bege, mas continuo devendo esses artigos a elas.
Em uma reunião de pesquisa, uma de minhas orientandas contou que um de seus colegas disse que ela fazia uma antropologia carioca. Ela se sentiu desqualificada por não fazer o que seria, de acordo com o seu acusador, uma verdadeira antropologia. Esta acusação pode ser interpretada de um outro ponto de vista, muito mais positivo. Faço, assim como meus orientandos, uma antropologia na cidade do Rio de Janeiro, mas, também, da cidade do Rio de Janeiro.
Apesar de ter nascido em Santos, e morado na cidade de São Paulo durante cinco anos, desde 1978 a cidade do Rio de Janeiro é o lugar onde escolhi morar e onde vivi os melhores momentos da minha vida. Apesar de o meu sotaque ainda denunciar minha origem paulista, lá, em São Paulo, todos acham que me transformei em uma verdadeira carioca, não só pelo sotaque, mas, principalmente, pelo estilo de vida e pelo amor que tenho pelo Rio de Janeiro. Em muitas