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ESTUPRO
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O tipo está contido no art. 213 do Código Penal: “Constranger mulher à conjunção
carnal, mediante violência ou grave ameaça.” A pena: reclusão de seis a dez anos.
O bem jurídico protegido é a liberdade sexual da mulher. A liberdade que ela tem
de escolher quando, como, onde e com quem exercerá sua sexualidade.
A sexualidade é um dos mais importantes atributos do ser humano, que só pode ser
exercida segundo a própria vontade da pessoa, qualquer pessoa.
A mulher recebe, no art. 213, a proteção contra as ações que se voltam para
compeli-la a aceitar a conjunção carnal, quando não for essa sua vontade.
1.2 TIPICIDADE
2 – Direito Penal III – Ney Moura Teles
As formas qualificadas pelo resultado, lesão corporal ou morte, são construídas pela
incidência das normas do art. 223. O art. 224 contém normas que tratam da presunção de
violência. O art. 9º da Lei nº 8.072/90 impõe acréscimo de pena para o estupro. E o art.
226 contém causas de aumento de pena.
1.2.1.1 Conduta
A oposição da mulher ao ato sexual não precisa ser justificada, nem motivada.
Basta que ela não o queira. Seja porque não o quer com a pessoa do agente, seja porque
não quer naquele momento ou nas condições propostas ou sugeridas. Simplesmente
porque não quer, porque está em sua liberdade querer ou não, qualquer que seja a razão.
A mulher não está obrigada à conjunção carnal nem quando o agente é seu próprio
marido. As relações sexuais entre marido e mulher, companheiros em união estável,
concubinos, namorados ou noivos serão sempre, segundo o ordenamento jurídico
brasileiro, consentidas por ambos.
Se é um direito do outro não é, entretanto, absoluto e, por isso, não pode ser
exercido como imposição, mas como fruto do acordo de vontades. Nenhuma condição
especial ou característica própria de qualquer homem tem a força para criar, para ele, o
direito de impor sua vontade sexual sobre a da mulher.
Nem a prostituta está obrigada ao ato sexual com o cliente que, na casa de
prostituição, deseja realizá-lo. A liberdade da vítima sobrepõe-se a qualquer outro
interesse, ainda quando ela tenha se colocado habitualmente na posição de quem oferece o
corpo como mercadoria, disponibilizando-o, mediante pagamento, para quem quiser usá-
lo para satisfazer seus desejos sexuais. É que também a prostituta tem a plena liberdade de
exercer sua sexualidade apenas quando o desejar.
Daí que não se deve, como no passado, exigir que a mulher tenha, efetivamente,
realizado lesões defensivas no corpo do agente ou, pelo menos, tentado se opor, fugindo,
debatendo-se contra o agressor, gritando por socorro ou tendo suas vestes rasgadas.
Quer a norma dizer que se alguém tiver conjunção carnal com uma mulher que
esteja numa das condições referidas terá agido com violência, mesmo quando não a tiver,
efetivamente, empregado. Claro que, se o agente tiver, efetivamente, empregado violência
ou grave ameaça contra uma pessoa nessas condições, haverá estupro, mas com violência
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real. Nesse caso a tipicidade é verificada diretamente, pela adequação imediata do fato ao
tipo básico do art. 213, sem o concurso da norma do art. 224.
O fundamento do preceito é que, nos dois primeiros casos, a vítima não tem
capacidade de consentir e no último não tem capacidade de resistir, embora pudesse
dissentir.
A violência não precisa ter acontecido, nem necessita ser provada, mas a
circunstância que autoriza sua presunção, sim, só será reconhecida quando evidenciada. Se
houve, realmente, violência ou grave ameaça, nem se analisam essas circunstâncias. Haverá
estupro, sem sombra de dúvidas, com violência ou grave ameaça.
Se, por outro lado, é necessário proteger as pessoas mencionadas no art. 224,
porque se pode, mesmo, entender que elas não têm capacidade de consentir ou de resistir,
ou nenhuma das duas capacidades, basta que o legislador, visando protegê-las, crie tipos
específicos, incriminando a conduta de quem com elas mantiver conjunção carnal ou
qualquer relação de natureza sexual. Basta proibir a prática de tais fatos e aí, sim, a norma
se conformará aos princípios da legalidade e da culpabilidade.
6 – Direito Penal III – Ney Moura Teles
Dito isto, é necessário analisar as três hipóteses em que, tendo havido conjunção
carnal sem o emprego de violência ou grave ameaça, haverá estupro por violência
presumida.
Pessoas com essa idade, segundo o Direito, não têm a capacidade de consentir.
Quando consentem, seu consentimento é inválido.
É de todo óbvio que essa presunção não deve ser tida como absoluta, pois é certo
que há determinadas pessoas, com idade inferior a 14 anos, que têm perfeita capacidade de
consentir, daí que a presunção pode ser afastada, no caso concreto, quando ficar
demonstrado que a menor, por sua história de vida, por sua experiência pessoal, tinha
perfeito entendimento sobre as conseqüências de seu comportamento e, portanto, sabia e
podia decidir sobre a realização do ato sexual.
A idade da vítima pode ser provada por todos os meios em direito admitidos, mas é
claro que a certidão de nascimento válida é a melhor das provas, a qual, todavia, pode ser
impugnada por meio de prova idônea, mormente quando não tenha sido feito o registro ao
tempo do nascimento dela constante.
A conjunção carnal com criança de tenra idade, de dois, três, cinco e até nove ou
dez anos, é, em realidade, obtida mediante violência real, impregnada na própria
realização do ato material, não sendo necessário o socorro da norma do art. 224, porque o
bom-senso impede se admita que ela tenha consentido na realização de um ato do qual não
tem a menor compreensão. A violência está ínsita no próprio ato sexual. A falta de
consentimento está implícita na absoluta incapacidade da criança. É estupro com violência
real.
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Não basta que a vítima seja portadora de doença mental ou que tenha
desenvolvimento mental incompleto ou retardado. É indispensável que, por uma dessas
causas, não tenha a capacidade de entendimento ou de autogoverno, o que deverá ser,
necessariamente e para o reconhecimento da incidência da norma, devidamente
demonstrado através de exame pericial. A condição de alienada ou débil mental deve
implicar a total incapacidade de consentir ou de resistir.
Entretanto, nada impede que uma mulher seja autora intelectual de um estupro,
quando, por exemplo, contrata alguém para exercer a violência sexual contra uma rival.
Tendo o domínio da ação, por tê-la encomendado, será autora do crime.
Quando uma mulher apenas colabora para a execução de um estupro, dele será
partícipe, mas quando tenha realizado atos materiais de constrangimento ou dirigido,
intelectualmente, a ação típica, será co-autora.
necessita ser completa ou profunda, nem se exige que o agente tenha ejaculado ou que haja
rompimento da membrana himenal.
Assim, haverá início de execução quando o agente realizar o primeiro ato violento
contra a vítima ou quando proferir ou realizar a primeira ameaça grave.
Indispensável que a interrupção da execução seja por ato voluntário, o que não
acontece, por exemplo, quando o agente desiste de introduzir o pênis na vagina em razão
das dificuldades da penetração por ser o órgão genital da criança de pequenas dimensões.
Neste caso, impõe-se a certeza da tentativa. O mesmo quando ele deixa o local, sem
realizar a conjunção carnal, por causa dos gritos dados pela vítima.
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O art. 9º da Lei dos Crimes Hediondos (nº 8.072/90) determinou que a pena
cominada no caput do art. 213 será acrescida de metade, “estando a vítima em qualquer
das hipóteses referidas no art. 224” do Código Penal.
O art. 224, já mencionado, é o que se refere à vítima: (a) não maior de 14 anos; (b)
alienada ou débil mental, conhecendo o agente essa circunstância; (c) incapaz, por
qualquer outra causa, de oferecer resistência.
Este acréscimo de pena, entretanto, não pode ser aplicado na hipótese de violência
presumida. É que a violência presumida, por força do que determina o art. 224, constitui
elemento do tipo do art. 213.
pena determinado pelo art. 9º da Lei nº 8.072/90, o qual somente incidirá nas hipóteses
de estupro com violência real ou grave ameaça e também nas formas qualificadas pelo
resultado, que se analisa a seguir.
O art. 223 do Código Penal estabelece: “Se da violência resulta lesão corporal de
natureza grave: Pena – reclusão, de oito a doze anos. Parágrafo único. Se do fato resulta
a morte: Pena – reclusão, de 12 (doze) a 25 (vinte e cinco) anos.”
O caput do art. 223 exige que o resultado qualificador decorra da violência empregada
para a realização do crime. O parágrafo único, diferentemente, reporta-se à morte
decorrente do fato. O tratamento é, portanto, distinto.
A morte que qualifica o estupro, entretanto, pode ter sido causada tanto pela violência
empregada, quanto por outra causa eficiente e integrante do fato, como, por exemplo, a
grave ameaça feita por meio de arma que tenha desencadeado um enfarto na vítima ou a
ingestão da substância entorpecente que o agente, fraudulentamente, ministrou à vítima.
Mas, é óbvio, deve ter sido produzida por uma ação do agente, violenta ou não, que tenha
sido realizada com a finalidade de neutralizar a resistência da vítima, minando-lhe as forças,
para obter a conjunção carnal.
Não basta que exista nexo causal entre a violência e a lesão corporal ou entre o fato e a
morte. É preciso que, em relação a esses resultados qualificadores, tenha o agente se
comportado culposamente, isto é, com negligência, imprudência ou imperícia. É que, se o
agente tiver atuado com dolo quanto ao resultado mais grave – desejando-o ou aceitando-o
–, haverá concurso material ou formal imperfeito de dois crimes, estupro e lesão corporal
grave ou morte.
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Determinou o art. 9º da Lei dos Crimes Hediondos que a pena será acrescida de
metade quando a vítima não for maior de 14 anos, for alienada ou débil mental –
conhecendo o agente essa circunstância – ou não puder, por qualquer causa, oferecer
resistência.
É evidente que se o agente, diante de uma pessoa nas condições do art. 224, emprega
violência ou grave ameaça não há presunção, mas violência real. Quando tem conjunção
carnal com uma criança de tenra idade a violência é real e, nesses casos, é certo que o
resultado qualificador terá decorrido da violência ou do fato.
Determina o art. 226 do Código Penal, com as modificações introduzidas pela Lei n°
11.106, de 28.03.2005, que a pena será aumentada em duas situações.
Haverá aumento de quarta parte, quando o crime é cometido com o concurso de duas
ou mais pessoas. O aumento incide não apenas quando mais de duas pessoas tiverem
executado o procedimento típico, mas também no caso em que haja apenas co-autoria
intelectual ou participação, bastando a observação do mínimo de duas pessoas.
caso do professor, do mestre ou do instrutor, enfim, de todo que exerça alguma autoridade,
de fato ou de direito.
Se sobre o mesmo fato incidir mais de uma dessas causas de aumento de pena o juiz
somente aplicará uma delas, devendo as demais ser levadas em conta no momento da
fixação da pena-base como circunstância judicial.
Há concurso formal com o crime descrito no art. 130 quando o agente sabe ou deveria
saber que está contaminado de doença venérea. Se o agente, ao estuprar, deseja também a
morte da vítima ou a causação de lesões corporais graves, através da própria conjunção
carnal, o concurso será formal imperfeito com lesão corporal grave ou homicídio, porque
presentes desígnios autônomos, aplicando-se a pena cumulativamente segundo a regra do
concurso formal.
pressupõe a de gênero.
Crimes de mesma espécie são crimes que têm a mesma essência e essa está no bem
jurídico protegido. Os tipos de estupro e de atentado violento ao pudor descrevem
violações diferentes do mesmo bem jurídico: a liberdade sexual da pessoa. Essa é sua
essência, sua alma. Há diferenças, evidentemente, mas elas não alteram a substância de
serem, ambos os crimes, agressões à liberdade sexual.
Esse entendimento, entretanto, não é comungado por grande parte da doutrina e dos
Tribunais que vêem, nesses casos, concurso material de crimes.
A Lei nº 8.072/90 – que definiu os crimes hediondos –, por sua imprecisão técnica,
permitiu o surgimento de dúvidas quanto à classificação do estupro como crime hediondo. Há
decisões dos Tribunais brasileiros, de todos os níveis e de várias unidades federadas,
abraçando os mais diversos entendimentos. Para uns só as formas qualificadas pelo resultado
estão incluídas entre os hediondos, outros entendem que também a figura simples, porém não
quando cometidos com violência presumida.
A norma do art. 1º, inciso V, da Lei dos Crimes Hediondos, é clara e precisa,
quando diz:
tentados: (...) V – estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput e
parágrafo único).”
Não há, no Código Penal, tipo de estupro com violência presumida. O único tipo de
estupro que existe é o do art. 213, o qual contém, como elementar, a violência real ou a
grave ameaça. Conquanto existam, no art. 224, normas que mandam presumir a violência
numa conjunção carnal, é de se ter que o fato por uma delas alcançado é adequado ao tipo
do art. 213, estupro. Essa adequação típica, que se faz por extensão, indiretamente, não
constitui um tipo diferente de estupro. O estupro simples é um só, com violência real ou
com violência presumida. Logo, também o estupro com violência presumida é crime
hediondo.
Dispõe o art. 225 do Código Penal que a ação penal relativa aos crimes definidos nos
Capítulos I, II e III do Título VI, dentre os quais o estupro, é, em regra, de iniciativa privada,
REGIME PRISIONAL INTEGRALMENTE FECHADO. O plenário desta Corte, ao julgar o HC nº 81.288, rel.
p/o Acórdão o Min. Carlos Velloso (sessão de 17.12.2001), firmou o entendimento de que o estupro e o atentado
violento ao pudor, mesmo nas suas formas básicas, em que não há lesão corporal de natureza grave ou morte,
constituem crimes hediondos, nos termos do art. 1º, inciso V e VI da Lei nº 8.072/90” (STF).
que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, nas suas formas qualificadas ou simples, ou seja,
mesmo que deles não resulte lesão corporal grave ou morte, e ainda que praticados mediante violência
presumida, são considerados hediondos, devendo as suas respectivas penas serem cumpridas em regime
integralmente fechado, por aplicação do disposto no artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90” (STJ).
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Ocorre que o estupro praticado com violência real ou grave ameaça é um crime
complexo. Há, no seio da Doutrina, respeitáveis posições no sentido de que o estupro não é
crime complexo porque não contém, em sua definição legal, a junção de dois ou mais tipos
penais, uma vez que não passa de uma espécie de constrangimento ilegal, com um
elemento diferenciador que é a conjunção carnal, a qual, como é óbvio, não constitui, por si
só, um delito. Assim, no estupro não há a reunião de dois ou mais tipos penais.
“Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que,
por si mesmos, constituem crimes, cabe ação pública em relação àquele, desde
que, em relação a qualquer destes, se deva proceder por iniciativa do Ministério
Público.”
Ora, se é o art. 101 que aponta para a construção do conceito de crime complexo, é de
ver que, nele, não se exige a junção ou reunião de dois tipos penais formando um terceiro. O
que o preceito menciona é a presença, num tipo penal, de fatos que sejam “elemento ou
circunstâncias (...) que, por si mesmos, constituem crime”.
A propósito, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 608, segundo a qual “no
crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada”.
lesão corporal grave ou morte, porque aplicando-se o art. 101 do Código Penal ter-se-á que
o fato que integra o tipo de estupro – lesão corporal leve – é crime cuja ação penal é
pública, mas condicionada à representação.
A Súmula 608 do STF carece, pois, de revisão, para excluir o estupro cometido com
lesão corporal leve.
A ação penal será de iniciativa pública incondicionada quando o estupro tiver sido
praticado com abuso do pátrio poder ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador. Não
só quando o pai ou o padrasto, tutor ou curador tiver sido o agente, mas também quando
tenha contribuído para o estupro realizado por outro homem.
A norma do inciso II do § 1º do art. 225 não exige que aquele seja o agente, mas que
o estupro tenha sido cometido com abuso do pátrio poder ou do dever imposto pelo Direito
ao padrasto, tutor ou curador.
Quando o estupro é qualificado por lesão corporal grave ou morte a ação penal é de
iniciativa pública incondicionada porque, induvidosamente, no delito complexo está
integrado o resultado qualificador que constitui crime para o qual é prevista a ação de
iniciativa pública incondicionada.