do conhecimento
cl audio mendonç a
Solidariedade
do conhecimento
Copyright © Claudio Mendonça
Fotos:
Giovanni Darienzo
Distribuição:
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.
M494s
ISBN 85-906298-0-5
rede de solidariedade 9
13 o mapa da freqüência 87
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29 conclusão 197
agradecimentos 201
Rede de Solidariedade
Q uando o Programa Sucesso Escolar foi lançado, em 2004, no ano passado, não
tínhamos a certeza de que as aulas de reforço iriam, realmente, ajudar os alu-
nos da rede pública estadual de ensino a passar de ano, conhecendo efetivamente, o
conteúdo das disciplinas.
O ano letivo foi encerrado e vieram os resultados das provas de avaliação externa,
realizadas pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Poderíamos, aqui, colocar todos
os indicadores e comparar os resultados numericamente, mas penso ser melhor falar so-
bre uma das conseqüências mais bonitas e frutíferas que já vi em Educação nos últimos
tempos: o estabelecimento de uma rede de solidariedade do conhecimento.
As aulas de reforço escolar contavam com um professor supervisor e um aluno
monitor, e este último foi uma verdadeira descoberta. O entusiasmo, o compromis-
so e a responsabilidade com que esses alunos assumiram a tarefa de auxiliar seus
colegas a vencer as dificuldades de conteúdo acabaram por desenvolver novas habi-
lidades e competências em todos os envolvidos no processo.
A vontade de compartilhar com o colega aquilo que se sabe, pelo simples fato de
possuir aquilo que ele não tem, fez surgir a solidariedade do conhecimento. E isso
se popularizou como nunca esperado!
Os alunos não se inscreveram na monitoria do Programa Sucesso Escolar com o
intuito de ganhar a bolsa de valor simbólico (R$ 65) e que, na verdade, servia mais
como uma ajuda de custo para as passagens e a alimentação.
Eles se inscreveram na monitoria para exercer uma das práticas mais valoriza-
das da humanidade, que é ensinar. Dentro do mesmo programa foram feitas ginca-
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nas em que uma das tarefas era resgatar um colega que abandonou a escola e levá-lo
de volta às salas de aula.
Que prática pode ser melhor do que esta combinação para o futuro dos nossos
jovens?
A solidariedade do conhecimento é a obrigação universal de todo ser humano
compartilhar informações e conteúdos a que teve acesso no decorrer de sua vida, ou
seja, aqueles que tiveram mais oportunidades educacionais têm o dever de auxiliar
aqueles que tiveram menos.
O conhecimento não pertence a ninguém individualmente, mas sim a toda a so-
ciedade. Nem aqueles que produziram o conhecimento podem se julgar detentores do
mesmo, na medida em que sempre houve uma série infinita de conteúdos anteriores
que embasou uma descoberta.
Cl audio Mendonç a
Artigo publicado no jornal O Globo
em 9 de maio de 2005
A Educação como exemplo de vida
Nesse sentido, o combate à repetência e à evasão se deu pelo belo programa Su-
cesso Escolar cujos números são animadores, uma das predileções de Claudio à
frente da secretaria, e que tem componentes da proposta educacional de Darcy Ri-
beiro. “O Sucesso Escolar é a questão do reforço – como pais de alunos gostam de
chamar – e que tecnicamente chama-se Estudo Dirigido, uma proposta criada pelo
Darcy, e que é um dos alicerces do horário integral. A monitoria é um dos eixos do
estudo dirigido e o programa de leitura tem um animador cultural, que é outro eixo
contido na proposta dos CIEPs. Estamos buscando reproduzir todo o ensinamento
do Darcy”, ele fala com entusiasmo.
O Sucesso Escolar nasceu da necessidade de se reduzirem as altas taxas de re-
petência e evasão escolar no Rio, uma das maiores do país. Claudio reconhece que a
reprovação é um dos maiores males da educação no país. “A repetência não melhora
o desempenho do aluno. Ele não aprende mais quando repete o ano e ainda causa
problemas, como a evasão escolar. Para acabar com isso, a solução que vários estados
e municípios adotaram – e eu sou contra – é a aprovação automática. Se por um lado
a repetência é ruim, por outro a aprovação automática é igualmente ruim”, afirma.
O secretário chama a atenção para o fato de se formarem, em poucos anos, pro-
fissionais semi-alfabetizados prevendo que: “Se você somar a aprovação automática
ao sistema de cotas, haverá um impacto no sistema educacional brasileiro e em pou-
quíssimo tempo o país terá engenheiros e advogados com péssima formação.”
Claudio descreve que há um momento em que o desestímulo do aluno é tama-
nho que ele abandona a escola. “Muitas vezes isto se dá lá para setembro, quando
ele acha que não vai mais conseguir passar de ano. Ele sai e só volta no ano se-
guinte. O programa de reforço consegue evitar que esse aluno abandone a escola
neste período.”
A análise dos indicadores de desempenho da rede pública estadual de ensino
apontava para índices alarmantes em questões como distorção idade/série, tempo
de conclusão, qualidade de ensino e taxa de aprovação.
Com base nesta análise, a Secretaria de Estado de Educação (SEE) propôs a imple-
mentação de um programa específico de melhoria dos índices de aprovação dos alunos
da rede pública estadual, que seja capaz de mudar esta cultura de reprovação em nosso
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Uma misteriosa magia intercede para que pessoas iluminadas sejam colocadas nos
caminhos de outras também assim privilegiadas, para que suas jornadas sejam felizes.
Abençoados sejam os que modificaram o curso dos seus intentos e fizeram de
Claudio um ser completo de vocações e ideais.
“Como o professor Darcy Ribeiro nos ensinou, tínhamos como objetivo trans-
formar as escolas tradicionais em CIEPs. O nosso plano educacional contemplava o
horário integral, mas de outra forma”, conta. “O horário integral nunca foi proposto
para além da 8ª série do ensino fundamental, pois esse público era atendido pelos
ginásios públicos. É muito difícil pegar um aluno com mais de 14 anos e colocá-lo
em horário integral na escola.” A saída encontrada por Claudio foi colocar o horário
integral como opção nas 5ª e 8ª séries.
Ao fazer um balanço da rede física, ele percebeu que muitos CIEPs foram trans-
feridos para as prefeituras, mas que ainda havia 226 escolas funcionando em ho-
rário integral, em pelo menos uma modalidade de ensino. Desse total, a secretaria
escolheu quarenta CIEPs como referência. A idéia era colocá-los em pleno funciona-
mento nos moldes do projeto de Darcy Ribeiro. A recuperação da parte física tam-
bém entrou no programa dos CIEPs. Uma empresa foi contratada para reformular o
projeto arquitetônico, sob supervisão do próprio Oscar Niemeyer, responsável pela
concepção dos prédios do CIEP. A intenção era diminuir os ruídos que perpassam de
uma sala para outra, além de outros problemas de ordem material, observados ao
longo desses anos de experiência.
Mas não foi só a questão pedagógica que preocupou Claudio Mendonça. Quando
assumiu a secretaria em janeiro de 2004, ele encontrou em andamento um projeto
de ampliação do número de alunos. Em 1999, o então governador Anthony Garoti-
nho assumiu o estado com 383 mil matriculados no ensino médio. Em 2004, o es-
tado fechou o ano com 564 mil – um aumento de 79%. Apesar do crescimento, não
houve fonte de financiamento adicional. “Construímos e alugamos escolas sem ne-
nhum recurso extra. Foi um esforço realmente grande. O Estado do Rio gasta entre
R$ 50 milhões e R$ 80 milhões em obras de construção e reforma de escolas. Em
2003, foram R$ 53 milhões, enquanto em 2004 chegou a R$ 82 milhões. No gover-
no Rosinha, nós já construímos 199 salas de aula”, destaca o secretário.
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do, a secretaria passou a encarar a capacitação dos diretores como algo de extrema
importância. A partir de 2005, todos os 3.500 diretores e diretores adjuntos come-
çaram o Curso de Capacitação de Gestores Escolares – Pró-Gestão, uma espé-
cie de pós-graduação em gestão administrativa.
Outro passo dado foram as parcerias com o meio acadêmico. Desde 2004, foram
celebrados convênios com a UFRJ, UFF, UFJF e com a Fundação Darcy Ribeiro. “Es-
tamos usando a academia a nosso favor. Essas quatro instituições deram uma con-
tribuição enorme na elaboração das políticas e na reorientação curricular, o que não
era feito desde 2003, além da unificação do sistema de avaliação. Essa contribuição
acadêmica é inestimável para o nosso trabalho.”
Claudio gosta de dizer, em linhas gerais, que sua administração não traz sur-
presas e o que ele tem feito nada mais é do que buscar idéias já pensadas no passado,
adaptá-las para a realidade atual e aplicá-las de forma conjunta. “Não há nenhuma
inovação nos projetos que estamos realizando. Todos são questões tradicionais da
educação que estão sendo viabilizadas. São idéias antigas, agora materializadas. O
Projeto REGUA, por exemplo, é a concretização daquele sistema único de Educa-
ção que o Hésio (Hésio Cordeiro, ex-secretário de Estado de Educação) propalava aos
quatro ventos. Já o Sucesso Escolar foi inspirado na proposta do Darcy Ribeiro.”
Na verdade, o que se propôs nesses dois anos de administração de Claudio Men-
donça foi tentar debater o universo pedagógico da escola em si, algo que até recen-
temente não se falava. “Só havia a preocupação com a questão da infra-estrutura.
Era a carteira, a reforma do telhado, a pintura das salas de aula. O que fizemos foi
priorizar a discussão educacional, que é mais importante”, afirma.
Uma das medidas tomadas, neste sentido, foi a volta dos orientadores pedagó-
gicos, relegados ao esquecimento durante anos. “Tiramos os professores de sala de
aula para serem orientadores pedagógicos. O resultado é que as escolas com orien-
tador têm 36% de notas abaixo da média, enquanto aquelas sem orientador peda-
gógico, 40%. Não é uma diferença pequena. É uma redução de quase 10% no quadro
geral”, ressalta o secretário.
Hoje, há cerca de 2.200 orientadores pedagógicos espalhados pela rede estadu-
al de ensino. “É inconcebível um conselho de classe sem um orientador pedagógico.
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Art. 4º - Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, revo-
gadas as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 06 de dezembro de 2005.
Roberto Boclin
Presidente do Conselho Estadual de Educação
Paixão pela Educação
Q uando ouvia falar sobre o sistema educacional, sempre me contavam sobre gabi-
netes abarrotados de papéis, sinônimo de um intrincado caminho burocrático a
ser percorrido. Desde que pude acompanhar de perto a trajetória do Claudio, primeiro à
frente da Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), em 2003, e depois quando as-
cendeu ao cargo de secretário de Estado de Educação, em 2004, ele perseguiu o rumo da
praticidade e da simplificação, buscando colocar no centro das questões do setor, os seus
personagens principais, muitas vezes esquecidos neste enredo: o aluno e o professor.
O papel do educador esteve presente em sua vida desde a infância – a mãe de
Claudio, a Lecisa, era professora e foi diretora de escola e o pai, Ingo, um dentista.
Nascido em Porto Alegre no dia 5 de junho de 1965, Claudio Roberto Mendonça
Schiphorst veio de lá, com a família, de origem holandesa e espanhola, para o Rio
de Janeiro, aos14 anos. Estudante do Colégio Militar em Porto Alegre, no Rio foi
cursar Direito na UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) onde, até a for-
matura, no ano de 1988, participou ativamente do movimento estudantil. Antes de
terminar os estudos, estagiou no setor jurídico da COMLURB, na gestão de Manoel
Sanches. Logo em seguida, foi convidado para trabalhar no Palácio da Cidade com o
secretário especial do então prefeito Saturnino Braga, Noel de Carvalho.
Em 1987, Noel foi candidato a deputado federal constituinte. Eleito, chamou
Claudio para ser seu chefe de gabinete. O então estudante de Direito teve que equa-
cionar a mudança para Brasília e os estudos no Rio. Em 1989, após os trabalhos
constituintes, Noel foi eleito prefeito de Resende e, devido à confiança estabelecida,
o convidou para que se tornasse seu assessor especial na prefeitura.
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Claudio era, então, um jovem advogado, mas passou a exercer diversas funções:
além da assessoria especial, tornou-se diretor de Administração, mais tarde secre-
tário de Recursos Humanos, Fazenda e, por fim, secretário geral de Administração
municipal e diretor Administrativo-Financeiro de todas as autarquias, fundações e
sociedades de economia mista da prefeitura. Isso, aos 24 anos.
Em 1991, foi convidado a montar um curso de cidadania no Instituto São José,
Colégio Salesiano de Resende, a pedido do orientador pedagógico da escola, no mes-
mo ano em que se lançava candidato a vereador. Foi eleito, em 1992, sendo o segun-
do vereador mais votado da cidade. Mas, hoje, confessa, seu desejo teria sido o de
voltar a ser secretário geral de a Administração municipal.
O estilo aguerrido impresso à sua vereança, porém, praticamente tornava este
sonho inviável. Com os olhos no retrovisor, ele próprio reconhece: “na época provo-
quei muita polêmica na Câmara, defendia o fim do recesso parlamentar e cheguei
até a fazer uma emenda popular contra isso, o que me trouxe muita animosidade
entre os vereadores”.
Pagou o preço. Por um lado, o trabalho desenvolvido ao lado de Noel de Carva-
lho, que assumiu a secretaria de Educação a convite do então governador Leonel Bri-
zola, lhe rendeu o convite para ser subsecretário. Por outro, Claudio viu seu pedido
de licença do cargo de vereador ser negado pela Câmara. Por um ano e três meses,
viveu uma situação atípica: era subsecretário de fato, mas ainda continuava verea-
dor de direito.
Foram momentos de muita tensão, pois as críticas choviam de todos os lados.
Principalmente sobre Noel, por não ser um técnico do setor.
“Quando foi tomar posse como secretário de Educação, o Noel ouviu numa rádio
que o novo secretário de Educação era um prefeito que não tinha sequer nível supe-
rior e estava completamente perdido. Só não estava mais perdido do que aquele que
o nomeou, o governador Leonel Brizola”, lembra. “Nós aprendemos muito, erramos
muito, sendo que nosso maior orgulho foi ganhar, em 1993, uma nota 10 do Minis-
tério da Educação como o estado com a melhor performance da federação. Na época
o ministro era o Murílio Hingel, que não era nosso aliado político, além de reconhe-
cidamente um profundo especialista em Educação.”
solidariedade do conhecimento | 29
Em abril de 1994, quando Noel deixou o cargo para ser candidato, Claudio
Mendonça recebeu um telefonema de um assessor do Brizola, dizendo que o go-
vernador queria conversar com ele, em sua casa, no Rio. “Fui até lá e, na reunião,
o Brizola me disse: ‘Olha, essa secretaria de Educação não é uma secretaria de
pequeno porte, ela é das mais importantes e está muito acima das questões polí-
ticas.’ Ele, então, sugeriu que eu fizesse uma entrevista com o Darcy Ribeiro. Fui
à casa do Darcy, ficamos até umas duas horas da manhã conversando e, depois
dessa entrevista, ele ligou para o Brizola para dizer que eu estava pronto para ser
secretário de Educação.” Entre abril e dezembro de 1994, Claudio finalmente as-
sumiu um posto executivo, não mais como subsecretário, mas, sim, como secre-
tário estadual de Educação. Tinha, então, 28 anos e com a oportunidade a paixão
pela Educação ficou evidente.
O feeling de Darcy foi, mais uma vez, certeiro. Na gestão de Noel e Claudio, ocor-
reram muitos avanços. Foram instituídas a incorporação da gratificação por re-
gência de turma para aposentados, em 1993; a elaboração do 1º Plano Básico da
Educação, além da criação de um centro tecnológico de qualidade na Educação, que
funcionava no Instituto de Educação do Rio de Janeiro, na Tijuca (Zona Norte).
“No centro, disponibilizamos em um número expressivo de salas de aula, data
shows com computadores, e desenvolvemos software de trigonometria, ensino à
distância, de química, com a tabela periódica em CD-Rom. Foram os primeiros CDs
educacionais em português. Além do nosso CD-Rom, o que mais se aproximava da
nossa idéia era apenas o Almanaque Abril, na época, em sua primeira edição”, afir-
ma. O centro tecnológico, porém, viria a ser desmanchado logo depois da saída do
grupo da secretaria.
Ainda em sua gestão, Claudio criou uma equipe de auditoria na secretaria, que
percorria as escolas com máquina Polaroid para registrar os problemas mais co-
muns. “Fazíamos um questionário, havia um grande banco de dados, para depois
tentar achar soluções para esses problemas.”
Após o governo Brizola, Claudio foi para a iniciativa privada. Em 1995, traba-
lhou no CELTEC, o Centro Tecnológico do colégio CEL, na Lagoa. No CELTEC, aju-
dou a montar vários CD-ROMs voltados para a capacitação e treinamento de pessoal.
30 | claudio mendonça
Em 1997, ao deixar o CELTEC ele voltou a sua universidade, a UERJ, agora como um
dos coordenadores do programa de bibliotecas populares, sob a responsabilidade do
professor Luiz Henrique Bahia.
O projeto previa a criação de uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de
Interesse Público), que pretendia montar bibliotecas públicas em parceria com os
governos estadual e federal. Em 1999, o projeto saiu do papel. Na mesma época, o
então governador eleito Anthony Garotinho montava sua equipe. Claudio era um
dos nomes mais cotados para a pasta da Educação. Encontros políticos daqui, outros
dali, e nada de se encontrar um nome.
O próprio Claudio, então, sugeriu a Noel de Carvalho o nome do professor Hé-
sio Cordeiro, que havia sido reitor da UERJ. Noel acatou a sugestão e levou o nome
de Hésio Cordeiro, durante um encontro em Brasília, ao governador Garotinho, que
aceitou a indicação.
Claudio foi convidado pelo então secretário executivo do gabinete do governador
(SEGAB), Luiz Rogério Magalhães, para ser coordenador setorial de Desenvolvimen-
to Institucional, diretamente ligado ao gabinete do governador. “Eu ajudava na coor-
denação das áreas de Fazenda, Administração e Planejamento do governo”, lembra.
Mesmo nesta função, volta e meia Garotinho o chamava para seu gabinete apenas
para conversar sobre Educação.
“Ele me chamava para falar sobre Educação e eu, naturalmente, tecia severas
críticas à gestão do sistema educacional. O então secretário inaugurou um longo
debate em torno do setor, quando, na verdade, o que a Educação precisava era de
respostas rápidas.”
Em 2002, Claudio foi designado consultor de Educação do Banco Mundial, onde
desenvolveu um trabalho comparativo. O estudo possibilitou levantar as mais di-
versas experiências educacionais no Brasil e em outros países. Eleita governado-
ra, Rosinha resolveu chamar de volta o seu jovem colaborador. Claudio trabalhou
na equipe de transição de governo, na qual ajudou a formular um plano de Educa-
ção para o estado. Estava pronto para ser secretário. “Em 2003, fui para a FAETEC,
onde fiquei por um ano, como presidente. Em 2004, quando Rosinha me chamou
para ser secretário, disse: ‘Claudio, quero que você implemente aquele plano que
solidariedade do conhecimento | 31
Avaliando o sistema
1
Avaliando Lideranças e Gerenciamento
A falta de integração dos esforços com os dos demais agentes educacionais estava-
se tornando crítica, visto que era bastante relevante a atuação dos municípios, tanto
na Educação Infantil como nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental.
Dados de 2001 indicaram que a participação municipal nas matrículas da Edu-
cação Infantil era de 42% – também ela superada pela da iniciativa privada com
51%. Enquanto isso, o estado detinha somente 7% nessas matrículas. No caso das
quatro séries iniciais do Ensino Fundamental a participação municipal alcançava
64%, enquanto a estadual ficava em 18%.
Mesmo diante da política de ‘separação de atribuições’ na esfera pública – con-
centração da atuação municipal na Educação Infantil e nas quatro séries iniciais do
Fundamental, e a SEE buscando atender às quatro séries finais do Ensino Funda-
mental e ao Ensino Médio –, esta falta de articulação entre as duas esferas mostrou-
se negativa. A prática criava verdadeira dependência da ação da rede pública estadu-
al frente ao desempenho das escolas municipais.
Há registro de iniciativas que buscaram a articulação entre as redes públicas de
ensino, como ocorreu no planejado e não implementado Sistema Integrado de
Educação Básica – SIEB, em 1996. Para melhor exemplificar o já mencionado tra-
ço cultural da ‘focalização na rede própria’, é interessante observar o trecho trans-
crito abaixo, onde se lê a seguinte recomendação da Primeira Conferência Estadual
de Educação (1999).
“A utilização de prédios próprios desvinculados das administrações municipais é con-
dição estratégica para melhor adequar o projeto de uma escola mais integrada com as re-
alidades e necessidades do educador e aluno da rede estadual. Nas circunstâncias em que
essa opção não se possa materializar deve-se buscar a implantação urgente do SIEB, como
forma de assegurar o bom funcionamento das escolas onde funcione a modalidade de en-
sino de educação de jovens e adultos, assim como nos colégios estaduais que funcionem em
prédios municipais.”
Pode-se constatar que o conceito de integração predominante na Primeira
Conferência Estadual de Educação (1999) não foi o de que o SIEB deveria consti-
tuir-se em mecanismo capaz de promover o compartilhamento de esforços entre os
distintos níveis governamentais. Apesar de seu papel ser o de incentivar a eficiência
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O utro aspecto prejudicial ao setor, demonstrado no estudo feito pelo BIRD foi
o de uma elevada rotatividade de dirigentes na Educação. Contudo, foi feita a
ressalva de que essa tem sido uma característica presente em todo o país, e nos di-
versos níveis de governo. Até mesmo no Ministério de Educação essa foi uma práti-
ca presente até o ano de 1995, quando se constatou maior estabilidade dos titulares.
Assim, não se constituiu novidade atestar que também no Estado do Rio de Janeiro
ocorresse elevada mudança de dirigentes.
Observou-se que desde 1982 vinha ocorrendo na SEE, em média, uma mu-
dança de dirigentes a cada ano (desde então foram designados vinte titulares).
A explicação para tal situação pode ser encontrada na importância política do
Setor da Educação na Administração Estadual. Verificou-se, também, que vários
fatores contribuíam para este quadro: a alocação de 25% do orçamento do gover-
no do estado; a gestão incidente sobre aproximadamente cento e quarenta mil
servidores públicos, em atividade ou inativos; poder de influenciar a ação pública
44 | claudio mendonça
estadual sobre uma clientela de quase 1,4 milhão de alunos e, por decorrência, as
suas famílias.
Tudo isso levou a que a designação do titular da SEE fosse objeto de permanente
negociação político-partidária, tendo em vista o alcance da governabilidade estadu-
al. Os governadores eleitos não têm obtido maioria na base de sustentação política, o
que os obriga à busca de composições partidárias para garantir apoio à sua gestão.
Essa instabilidade do titular da SEE repercutia, de imediato, sobre seus escalões
intermediários. Apesar de constituídos por profissionais de carreira da secretaria,
essa composição sofre a influência da linha partidária prevalecente ou das preferên-
cias de abordagem pedagógica da nova direção. Assim, a cada mudança de titular
quase sempre ocorre uma ampla substituição de responsáveis nos níveis gerenciais
a ele subordinados.
Acontece uma completa mudança de pessoas e, como conseqüência, alterações
de prioridades e de diretrizes de ação da SEE. O resultado levava à inexistência de
uma política estadual de Educação com visão de longo prazo.
4
Descentralização da Gestão Educacional
Aspectos organizacionais
O estudo do BIRD que analisou o funcionamento da Secretaria de Estado da Edu-
cação tomou por base os seguintes aspectos organizacionais:
tir esse quadro, a SEE acabaria abrindo mão de delimitar o campo de atuação para
cada unidade administrativa que integra a Administração Central. Foi o que atestou
o diagnóstico dos analistas do BIRD.
Mesmo em áreas para as quais a SEE vinha dedicando maior atenção, face ao ele-
vado crescimento da demanda, como o Ensino Médio, Educação de Jovens e Adultos
e Educação Especial, por exemplo, havia enorme dificuldade em se buscarem recursos,
a despeito dos esforços do governo do estado.
A esta altura, o que se tentava eram recursos no Ministério da Educação para
o Programa Escola Jovem, em operação desde 1998, e com a possibilidade de fi-
nanciar a construção de novas escolas e equipá-las de acordo com as especificações
típicas desse nível de ensino.
A saída era a SEE instalar novas escolas de Ensino Médio em prédios alugados e
equipá-los com recursos próprios.
Quanto à avaliação das ações, as informações disponíveis mostravam que elas
eram feitas nas escolas, sem interferência da SEE. O aproveitamento dos dados cole-
tados nessa avaliação, mediante processamento e análise adequados, poderia levar
à identificação dos principais problemas e dificuldades da rede escolar.
7
Gestão de Recursos Humanos
dos níveis de gestão. Foi detectado que inexistiam sistemas de informação gerencial
que propiciassem a integração e compartilhamento de informações essenciais aos
processos decisórios.
Em algumas unidades da Administração Central existiam soluções isoladas,
muitas vezes decorrentes de condicionantes externos à organização, como é o caso
da gestão orçamentária e financeira e do processamento do pagamento de pessoal.
O relacionamento entre a sede e as unidades descentralizadas, até mesmo as Coor-
denadorias Regionais, à época do estudo, era feito por meio da tramitação de papéis. A
SEE não dispunha de redes de comunicação ou suporte de informática, à exceção de al-
guns poucos procedimentos, com destaque para a alimentação de dados de alterações da
situação funcional do pessoal (e para fins de processamento da folha de pagamento).
O parque de microcomputadores disponíveis era restrito e utilizado basicamen-
te para aplicações como editor de texto e com alguns aplicativos de uso individual,
não estando conectados em rede, e as comunicações eram de acesso e navegação vol-
tados para a utilização dos recursos da Internet.
Diagnóstico
Ficou constatado, a partir do estudo aprofundado feito pelo BIRD que o Sistema
Estadual de Educação do Estado do Rio de Janeiro merecia atenção tanto em termos
institucionais, como organizacionais.
Foi aconselhada uma gestão global do setor, uma vez que cada agente estava en-
volvido e mais dedicado à gestão da rede escolar que lhe era subordinada. O resultado
era a fragmentação dos elos mais fracos da cadeia de agentes que compõem essa rede,
em especial os municípios com menor capacidade de gerenciamento da Educação.
Por fim, verificou-se a existência de uma multiplicidade de projetos concebidos
e implantados a partir da Administração Central, cujos recursos seriam melhor uti-
lizados se diretamente entregues às escolas. Esses projetos nada mais eram que me-
canismos de preservação de espaços institucionais para equipes com atuação prati-
camente autônoma na SEE.
O planejamento da SEE ocorria sob forma atomizada – evidenciou o estudo do
BIRD – na qual cada unidade administrativa ou equipes que nelas atuavam elabo-
solidariedade do conhecimento | 63
ravam suas próprias propostas de ação, disputando os meios de que dispõe a secre-
taria, sem a existência de procedimentos capazes de garantir a otimização no uso
desses recursos.
Na gestão de recursos humanos, vinha ocorrendo um processo de gestão por re-
ação aos embates salariais, faltando uma política que permitisse equacionar a per-
manente escassez de professores na rede pública subordinada à secretaria.
Seja por decorrência da política de segmentação do mercado de Ensino Funda-
mental, entre o estado e os municípios, seja pelo crescente aumento da demanda no
Ensino Médio, o estado vinha caminhando para um quadro de estrangulamento fi-
nanceiro no setor Educação.
A face mais visível desse quadro era a locação sistemática de áreas para o funcio-
namento das novas unidades escolares necessárias à cobertura da sua clientela, ten-
do em vista a não disponibilidade de recursos para a construção de novas escolas e a
dificuldade para garantir mobiliário e equipamento adequados à rede preexistente.
Quanto à tecnologia de gestão adotada pela SEE de então, a análise do BIRD des-
tacou a não adoção de técnicas e mecanismos mais modernos, em especial a utiliza-
ção dos recursos gerenciais propiciados pela informática e pela comunicação.
Esse conjunto de disfunções apontou para a necessidade urgente de ter como
prioridade o desenvolvimento institucional das entidades que conformam o Siste-
ma de Educação do Estado do Rio de Janeiro, com foco na SEE.
Ficou evidente, também, a premência da busca de um desenvolvimento institu-
cional, a longo prazo, no sistema educacional do estado, bem como de mudanças na
cultura organizacional. Para os analistas, a saída seria um esforço para que, a curto
prazo, se indicassem medidas operacionais que permitissem às diversas unidades
da estrutura organizacional da SEE operarem seus programas e atividades de ma-
neira continuada, garantindo a coesão e a convergência das ações desenvolvidas.
A longo prazo, seria necessário – aconselharam os técnicos– dispor de uma
proposta que, à luz dos condicionantes legais e programáticos que determinam a
organização e o funcionamento dos sistemas estaduais de educação, garantisse efi-
cácia na formulação e na execução das políticas de âmbito estadual estabelecidas
para o setor.
64 | claudio mendonça
Apesar disso, o concurso público para docente I e II, realizado em 2001, pela Secre-
taria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, registrou 63.444 inscritos. O índice de
aprovação de 37% representa 23.473 professores classificados e, portanto, qualificados
para o exercício do magistério.
O objetivo desse concurso era preencher 3.900 vagas de Docente I, em diferen-
tes disciplinas, em todas as Coordenadorias Regionais. No entanto, o quadro de va-
gas indicava 450 vagas para a disciplina de química; 596 para matemática; 905 para
física e 1220 vagas para educação artística. É importante ressaltar que tais discipli-
nas apresentavam carência crônica na rede pública estadual.
Compatibilizando o número de vagas oferecidas com o número de preenchidas,
verificou-se que a necessidade de vagas era atendida pelo conjunto de aprovados. No
entanto, detectamos distorções.
Geograficamente, havia excedente de aprovados em algumas Coordenadorias
Regionais e carência em outras, especialmente nas regiões mais distantes da capi-
tal. Permaneceram em aberto 143 vagas na disciplina de educação artística e 446
na disciplina de física.
O quadro de vagas apresentado pelas coordenadorias excluiu as relativas aos
7.500 concursados habilitados, remanescentes do concurso de 1998, que ainda não
haviam sido chamados pela SEE.
A estratégia de suprimento das carências apoiou-se em três vertentes:
ver, divulgado de dois em dois meses. Neste caso, os arquivos gravados são apenas
para leitura, sem risco, portanto, de sofrerem qualquer modificação.
O serviço é apenas mais uma maneira de os pais se informarem sobre a situa-
ção escolar dos filhos, porque os colégios continuam entregando, normalmente, o
tradicional boletim de papel, impresso pelo SGE. “É um ganho para os pais, que po-
dem acompanhar melhor o desempenho dos filhos, já que temos avaliações a cada
bimestre”, afirma o subsecretário. Segundo Sylvio Jorge, por enquanto, só não estão
inseridos no sistema os 320 mil alunos da Educação Especial, Infantil e da 1ª à 4ª sé-
rie do Ensino Fundamental, que são avaliados por relatório. “Mas brevemente esta-
remos viabilizando uma forma de divulgar essa informação também”, completa.
Graças ao SGE, as escolas da rede de ensino do estado chegaram ao final de 2005
totalmente integradas. Das 1.673 unidades, 1.600 estão no sistema, o que significa
35 mil turmas. Mesmo as escolas ainda não informatizadas repassam as suas infor-
mações para as 29 Coordenadorias Regionais.
Programou-se, para 2006, que as informações das escolas rurais também vão
estar no SGE. Esses dados já estão sendo utilizados na descentralização de recursos
(merenda e manutenção). Também já foram assinados 32 convênios entre o estado
e as prefeituras, para que o sistema seja implantado em diversos municípios. O ob-
84 | claudio mendonça
Taxa de Abandono na Rede Estadual do RJ, segundo o Nível de Ensino (1999 - 2004/2005)
nível de ensino
Ano Fundamental Médio total
1998 12,1 16,6 14,4
1999 13,4 19,5 16,6
2000 13,2 18,7 16,1
2001 10,7 17,9 14,5
2002 11,2 19,2 15,4
2003 11,3 20,0 15,8
2004 10,4 21,2 16,0
2005 8,8 19,5 14,3
Fonte : Programa Nova Escola e INEP
solidariedade do conhecimento | 85
Taxa de Abandono na Rede Estadual do RJ, segundo o Nível de Ensino (1999-2004 / 2005)
nível de ensino % de abandono 2005
En. Fundamental 1º seg 5,4%
En. Fundamental 2º seg 10,5%
Ensino Médio 19,5%
En. Fund-EJA 1º seg 22,0%
En. Fund-EJA 2º seg 25,2%
Ensino Médio-EJA 19,8%
Fonte : Programa Nova Escola
Taxa de Abandono na Rede Estadual do RJ, segundo o tamanho da escola (1999 - 2004 / 2005)
Quant. de alunos por escola Total alunos Abandonos % Abandono
Até 100 alunos 4.467 16,6 14,4%
101 a 250 alunos 30.463 19,5 16,6%
251 a 500 alunos 143.087 18,7 16,1%
501 a 1000 alunos 346.307 17,9 14,5%
Mais de 1000 alunos 676.837 19,2 15,4%
1.201.161 172.166 14,3%
Fonte : Programa Nova Escola
Isso gerava distorções porque acabava premiando com mais recursos aquelas
que tinham maior índice de evasão escolar. Por exemplo, uma escola que declarava
ter 2 mil alunos em março, passava a ganhar a verba sobre essa base durante todo o
ano letivo, mesmo que chegasse a dezembro com oitocentos alunos. Com o SGE, os
recursos são repassados de acordo com a freqüência mensal dos alunos.
O programa também tem um forte caráter social, porque permite inserir na
sociedade legal, muitos alunos que sequer têm uma carteira de identidade. Um con-
vênio entre a Secretaria de Educação e o DETRAN garante que o registro emitido
para o estudante possa ser transformado, mais tarde, no número de sua carteira de
identidade, caso ele não a tenha.
Ao cruzar dados do SGE com os do REGUA, por exemplo, é possível saber
quem é o aluno da rede, em que série está, sua idade e quando se formará. Essas
informações são fundamentais para outro programa da secretaria: o Vale-Edu-
cação, que é o cartão que dá acesso gratuito aos estudantes da rede estadual, às
linhas intermunicipais, e também para o cartão Riocard/FETRANSPOR para as
linhas municipais.
Com essa base de dados, que ainda está sendo construída, será possível passar
à Fetranspor – a Federação das Empresas de Ônibus do Estado do Rio de Janei-
ro – o cadastro de todos os que estão matriculados na rede estadual e que utilizam
linhas intermunicipais. De posse desse cadastro, a Fetranspor emitirá para cada
aluno o Riocard, o cartão que dá acesso livre aos ônibus. Como a base de dados ain-
da não está pronta, foi feita uma estimativa de custo e o governo do estado repas-
sa R$ 6 milhões por mês à Fetranspor para garantir a gratuidade aos alunos da
rede estadual, desde que estejam uniformizados.
Um outro projeto importante é o Georreferenciamento, que, como o SGE, é
um grande banco de dados que cruza informações das 11.397 escolas do Estado
(federais, estaduais, municipais e privadas) com o Censo Escolar do INEP/MEC, o
REGUA e os dados sociais do IBGE. Com o Georrefenciamento, é possível saber,
por exemplo, quantas escolas de Ensino Médio existem em regiões com alto índice
de analfabetismo do estado. E, ainda, se há falta de professores nessas regiões, e em
quais modalidades de ensino.
solidariedade do conhecimento | 89
A ssim como a crônica falta de professores na rede estadual, outra questão igualmen-
te grave, encontrada logo quando assumimos a secretaria, foi o sistema de matrí-
cula. Quem não se lembra daquela imagem clássica dos pais ou avós de alunos varando
a madrugada em frente a uma escola, para tentar matricular seus filhos e netos?
O problema da vaga não é o dos que já estão alocados na rede, mas daquele aluno
que vem da rede municipal e está entrando na 5ª série do Ensino Fundamental ou
na primeira série do Ensino Médio. Existia mesmo a fila, a vaga era de quem chegas-
se primeiro. Era uma grande confusão.
O crescimento da demanda por vagas no Ensino Médio, a partir da década de
1990, foi o gerador da pressão sobre o sistema, na medida em que ocorreu apenas
na rede pública estadual, que sofreu um acréscimo de aproximadamente 125,69% e
ainda enfrentou a redução do volume de matrículas nas outras redes.
Enquanto isso, as matrículas no Ensino Fundamental apresentaram queda, o
que demonstra que as redes municipais estão absorvendo cada vez mais alunos e,
92 | claudio mendonça
O aumento da procura pelo Ensino Médio com a redução dos indicadores de re-
petência, além do acréscimo do número de alunos do Ensino Fundamental com o
advento do FUNDEF, criou um quadro de explosão da demanda e de grande diferen-
ciação da clientela. O crescimento se deu sem identidade própria e de forma desor-
denada, ocupando os espaços ociosos do Ensino Fundamental.
A partir de 1998, a Secretaria de Estado de Educação deixou de realizar concur-
sos de acesso ao Ensino Médio e, em 1999, passou a realizar a matrícula informati-
zada, com inscrições para a 5ª série do Ensino Fundamental e a 1ª série do Ensino
Médio feitas pela Internet ou por telefone, por meio de uma Central de Atendimen-
to. Tal sistema fez-se necessário, como forma de enfrentar a crescente demanda,
causada, também, pelos reprovados em concursos anteriores que ofereciam número
insuficiente de vagas, além de extinguir as longas filas formadas pela concentração
de estudantes em busca de acesso à rede pública. Para as demais séries, continua vi-
gorando o sistema de matrícula realizada diretamente nas unidades escolares.
Este sistema criou condições para a ampliação da oferta de vagas no sistema público
de ensino, permitindo melhor planejamento da rede em função das informações arma-
zenadas, principalmente no que diz respeito à localização e turno de maior procura.
Outro ponto que deve ser ressaltado é a explicitação das chamadas “Escolas Pre-
ferenciais”. Estas escolas concentram grande parte dos candidatos às vagas. Geral-
mente, são escolas tradicionais ou tidas como detentoras de alto padrão de quali-
dade de ensino. Esse tem sido um fator complicador para a alocação dos candidatos
nas vagas existentes, gerando concentração nessas escolas e ociosidade nas demais.
Essa procura por escolas preferenciais leva a SEE a realizar outras fases de matrícu-
la a fim de que os candidatos possam proceder às novas escolhas e que possam ser
realizados os necessários remanejamentos.
O sistema de matrícula informatizada vem sendo aperfeiçoado e já alcança altos
índices de alocação de alunos em primeira opção. Estudos mais detalhados reorde-
naram o serviço de oferta na rede estadual, possibilitando a ampliação de vagas em
áreas de real carência.
A realização da matrícula por esse sistema tem permitido a visualização de três
tipos de problemas: a qualidade do ensino oferecido de forma muito diferenciada nas
94 | claudio mendonça
Vigário Geral e Cidade de Deus); Mesquita (bairros: Edson Passos, Centro, Chatuba,
Rocha Sobrinho, Banco de Areia, Jacutinga e Santo Elias); Itaperuna (Niterói); Volta
Redonda (Santo Agostinho); Duque de Caxias (bairros: Parque Centenário, São Ben-
to e Jardim Vila Nova); São Francisco de Itabapuana (Centro); Resende (Centro e
Engenheiro Passos); Queimados (bairro: Alzira); Quissamã (Caxias) e Belford Roxo
(bairro: Parque Amorim). Este estudo, ainda que preliminar, já aponta uma tendên-
cia, em algumas regiões, diferente daquela apresentada quando referenciamos a de-
manda a partir do local de inscrição.
Além da matrícula informatizada da 5ª série do Ensino Fundamental e da 1ª
série do Ensino Médio, a Secretaria de Estado de Educação realiza a matrícula
para permanência e ingresso nas demais séries de forma descentralizada, sob a
supervisão das Coordenadorias Regionais, para as escolas que compõem a Rede
Pública Estadual, normatizada pela Resolução nº 2.508, de 14 de agosto de 2002.
Os municípios que optaram pela matrícula integrada atuam de forma conjunta:
Coordenadorias Regionais, Secretaria de Estado de Educação e Secretarias Muni-
cipais de Educação.
“Quando começamos a discutir o projeto, logo veio essa preocupação: não adian-
tava construir novos laboratórios no estado se não déssemos a eles uma utilidade.
Os roteiros digitais vieram agregar valor no processo de aprendizagem dos alunos.
Ele é o elo entre a sala de aula e este novo espaço de ensino”, corrobora Laura.
No caso das áreas de Línguas e Humanas, os roteiros se debruçaram sobre a
matriz de competências, e isso representou um salto de qualidade. Hoje, vivemos
na sociedade do conhecimento, na qual a informação circula em excesso e por vá-
rios meios – TV, rádio, Internet, jornal. Não precisamos mais buscá-las, porque elas
nos chegam naturalmente. É preciso, portanto, saber como e para que essas infor-
mações serão usadas. Os roteiros digitais trabalham com isso. O aluno tem acesso
à informação pelo computador, mas é provocado, por meio de atividades digitais, a
trabalhá-la construtivamente, fazendo, desta forma, uma interação com o conheci-
mento. “Por exemplo, em um determinado roteiro de língua portuguesa, o aluno po-
derá ser instado a transformar um conto em uma história em quadrinhos, ou vice-
versa. Ao final, ele será o ator principal da ação, por meio dos subsídios que adquiriu
no contato com a informação”, conclui Laura.
Outro projeto que usa tecnologia de ponta é o Rede Escola, um sistema de te-
leconferência, que permite a transmissão de som e imagem para 127 pontos de re-
cepção no estado em tempo real. O Rede Escola é transmitido de um mini-estúdio
montado na Secretaria de Educação, com câmeras de vídeo que captam as imagens,
enviadas, por Internet, em banda larga, para salas e auditórios espalhados em es-
colas estaduais.
O projeto foi inaugurado no dia 3 de agosto, pela governadora Rosinha Garoti-
nho, durante a abertura do segundo semestre do ano letivo, direto do Salão Verde
do Palácio Guanabara, com a presença de mais de cem diretores e coordenadores de
ensino do estado.
Os 127 pontos de conexão do Rede Escola cobrem os 92 municípios do Rio e
podem atingir, simultaneamente, um público de até 13 mil pessoas por encontro.
O projeto permite que o participante faça perguntas, por meio de um chat, para o
palestrante, em tempo real. Trata-se de uma TV interativa, que mantém o material
disponível para novas consultas sempre que for desejado, via internet.
102 | claudio mendonça
À medida que o espectador tem uma dúvida, uma opinião, uma crítica ou quer
se posicionar, ele fala por meio da Internet. Isso é trazido para a mesa, fornecemos
a resposta, coletamos a opinião geral. É uma forma de aproximar as pessoas. Con-
seguimos um público diferenciado, porém unido pelo mesmo interesse: o diretor de
escola, a equipe pedagógica, o professor de determinada disciplina e o aluno repre-
sentante ou monitor.
A utilização de nova ferramenta ajuda no avanço do ensino. Nosso papel é tentar
fazer chegar às escolas, propostas educacionais mais modernas. Quem ganha com
as novas tecnologias, sem dúvida nenhuma, são os nossos professores e alunos, na
medida em que, a cada momento, eles estarão diante da possibilidade de melhorar a
qualidade de ensino no estado, por meio de novas formas de aprendizado.
16
A municipalização das escolas
e a distribuição de recursos
na verdade, um bem público. Além disso, antes de fazer qualquer municipalização, a se-
cretaria faz um levantamento da região. Se ela chegar à conclusão de que, no futuro, po-
derá haver maior demanda naquela localidade por Ensino Médio, o prédio não é repas-
sado para a prefeitura”, explica o Subsecretário de Gestão Escolar, Carlos Guimarães.
Ex-deputado estadual, professor aposentado, Carlos Guimarães ficou responsá-
vel por toda a interface administrativa entre a secretaria e a rede de ensino do Estado.
A subsecretaria era uma espécie de filtro dos problemas da escola e funcionou como
uma “ouvidoria”. O ex- deputado acabou acumulando, também, funções na orien-
tação de outros programas. Entre os mais importantes, estão o de Municipalização
de Escolas, Escolas Multi-seriadas, Visitadores, Inspeção Escolar e o Cheque-Escola.
Esse último, um programa do governo do Estado, cuja execução fica a cargo da Secre-
taria de Educação. Cerca de 2 mil famílias – a maioria da Baixada Fluminense – são
beneficiadas mensalmente com um cheque-alimentação no valor de R$ 100.
Pelo programa, a municipalização só ocorre após manifestação do município.
Não é o estado que, por si só, oferece o projeto à prefeitura.
Entre 1999 e 2003, foram municipalizadas 82 escolas contra 180 entre 2004 e
fevereiro de 2006. No dia 8 de dezembro de 2005, assinamos um convênio com 33
prefeituras para municipalizar mais 154 escolas em todo o estado, abrangendo 14
mil alunos. Veja quadro abaixo:
atenção devida ao aluno. A maioria das crianças não estava nem sequer alfabetizada
e, para dificultar ainda mais o trabalho, os professores tinham o tempo inteiro de tra-
balhar a auto-estima dos alunos, a fim de evitar a evasão escolar.
De acordo com a coordenadora da Serrana II, vencidas as resistências iniciais de
pais e professores, o passo seguinte foi o da implantação das escolas seriadas. Em Su-
midouro, que tem 80% de sua população vivendo na Zona Rural, o trabalho foi mais in-
tenso. No município, eram dez multisseriadas, num total de 245 alunos. “Não se podia
trazer as crianças para o centro da cidade. Então, escolhemos dois pólos na Zona Rural
para abrigar essas crianças: as escolas estaduais Maria Carvalho Pires e Benfica.”
Para que o projeto pudesse dar certo, ônibus foram disponibilizados pela coorde-
nadoria para fazer o trajeto dos alunos entre a casa e a escola. “A novidade do transpor-
te era, para eles, uma distração, um passeio, que os deixou muito empolgados. Além
disso, estar com outras crianças da mesma idade era uma experiência nova. A reação
foi muito positiva em relação à mudança. Até porque, eles começaram a ter acesso a
espaços organizados, tais como: biblioteca, sala de leitura, sala de informática. Isso
acarretou a melhoria da qualidade do ensino de cada um”, lembra Ângela.
Sem dúvida, a nova experiência ajudou a aumentar o bom desempenho dos alu-
nos daquela região. Eles passaram a ter mais intimidade com conteúdos específicos
de suas séries correspondentes. “O salto de qualidade no ensino foi algo visto clara-
mente. A desenvoltura dessas crianças, agora, é outra. E, com a auto-estima resgata-
da, eles podem realizar seus sonhos”, completa a professora. Em julho de 2004, não
havia mais nenhuma escola multisseriada na área da Serrana II.
Outra questão polêmica é o FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do
Ensino Fundamental), que se transformou em um atrativo para vários administradores
municipais, mais preocupados em receber os recursos do que em investi-los na quali-
dade do ensino. Pela lei, o município deve aplicar na Educação 25% da sua receita, pro-
venientes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), do Fundo de
Participação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e da parcela do Imposto
sobre Produtos Industrializados (IPI). Esse dinheiro deve ser gasto na manutenção e de-
senvolvimento do Ensino Fundamental público e na valorização do magistério.
Os recursos do FUNDEF são destinados à Remuneração do Magistério (mínimo
solidariedade do conhecimento | 109
em 2004, foram destinados ao FUNDEF. Deste total, o governo repassou 70% para
as prefeituras e ficou apenas com 30%. Vale ressaltar que o governo do Rio não rece-
be nenhuma verba do governo federal para minimizar suas perdas com o Fundo de
Financiamento do Ensino Fundamental.
Paes explica que a perda líquida do Estado com o FUNDEF – ou seja, a diferença
entre o que fica com a Secretaria Estadual de Educação e o que é repassado aos mu-
nicípios – pulou de R$ 390,6 milhões, em 1998, para R$ 905,9 milhões, em 2004. A
projeção da perda líquida com o FUNDEF para o estado, em 2005, é de R$ 950,2 mi-
lhões (veja quadro abaixo).
Enquanto isso, a demanda de alunos no Ensino Médio saltou de 333 mil matrículas,
em 1998, para 597 mil, em 2004 – um aumento de 79%. A continuar esse descompasso
financeiro, o governo estadual corre o risco de não ter dinheiro para pagar salários de
professores e funcionários a partir de 2008, caso o FUNDEB não seja criado. A Proposta
de Emenda Constitucional (PEC) 415 que cria o novo Fundo chegou ao Congresso em
14 de julho de 2005, mas só foi aprovada pela Constituição de Comissão e Justiça (CCJ),
no dia 2 de outubro. Na CCJ, a proposta original sofreu algumas modificações, graças a
pressões de entidades da sociedade civil, como o Consed (Conselho Nacional de Secre-
tários de Educação) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).
Pela proposta original, haveria um aumento de contribuição dos estados que,
em vez de 15%, passaria a ser 16,5%, até chegar 20% em quatro anos. Não estava
prevista a inclusão de recursos de impostos municipais no montante do fundo. No
solidariedade do conhecimento | 111
Rio, mobilizamos a comunidade escolar e a bancada federal para pressionar por mu-
danças na PEC 415.
As pressões dos governos estaduais e da CNTE deram resultados. Na CCJ, a pro-
posta original sofreu duas modificações – uma das quais desfavorável aos estados.
Trata-se da inclusão das creches no FUNDEB, resultado da pressão dos sindicalistas
da CNTE. Como as creches são de responsabilidade dos municípios, os estados temem
que sua entrada no Fundo resulte em perda de recursos, já que o resgate é feito pro-
porcionalmente ao número de matrículas e há um imenso número de crianças nessa
etapa da Educação que ainda não são atendidas. Das cerca de 13 milhões de crianças
na faixa etária de zero a três anos no Brasil, somente 11,7% têm acesso às creches, e
apenas 6% recebem atendimento em redes públicas.
Não somos contra a inclusão das creches no FUNDEB, mas para que isso ocorra
é preciso repensar a forma de repasse dos recursos do fundo, considerando diferen-
ças regionais. Do contrário, não teremos Educação plena.
Outro avanço obtido na CCJ foi a supressão do parágrafo terceiro da PEC, que sub-
metia a complementação da União à “redução permanente de outras despesas”. A elimi-
nação deste parágrafo era uma reivindicação de diversos movimentos de Educação.
A proposta do governo prevê que as receitas do FUNDEB, resultantes de transfe-
rências e impostos, sejam redistribuídas para as secretarias de Educação estaduais
e municipais proporcionalmente às matrículas de suas redes.
Um investimento mínimo por aluno será determinado nacionalmente e os esta-
dos que não conseguirem viabilizar esse mínimo receberão uma verba complemen-
tar da União. Esse mecanismo tem o objetivo de promover uma redistribuição dos
recursos financeiros, diminuindo as diferenças dentro de cada estado e entre as re-
giões. As estimativas são as de que, com o novo Fundo, o número de atendidos suba
de 31,2 milhões para 47,7 milhões de estudantes.
O aporte de novos recursos do governo federal poderia vir, segundo o Ministério da
Educação, da revinculação progressiva da DRU (Desvinculação de Recursos da União),
que repassa para outras áreas 20% dos impostos federais, base de cálculo para os 18%
vinculados à Educação. A proposta do MEC é que o processo se complete em quatro anos.
No total, o FUNDEB deve beneficiar 47,7 milhões de estudantes. Ao fim do escalona-
112 | claudio mendonça
mento dos recursos, serão investidos R$ 50,6 bilhões – R$ 46,1 bilhões dos estados e
municípios e R$ 4,5 bilhões do governo federal – por ano na Educação Básica.
Acreditamos, porém, que para evitar um colapso do Estado do Rio de Janei-
ro, por conta dos repasses do FUNDEB, é preciso garantir mais de R$ 600 milhões
por ano. O nosso problema, no Rio, não é de recursos para a Educação Infantil (0
a 3 anos) e Ensino Fundamental, que não têm dificuldades tão grandes, mas para
financiar o Ensino Médio. O ideal seria o governo federal considerar os aspectos re-
gionais para fazer a transferência de verbas. Nossa sugestão é estipular os valores
repassados, com base nos dados referentes às matrículas.
Em 2005, o Estado do Rio de Janeiro repassou R$ 948 milhões para os municí-
pios, o maior repasse do Brasil. Para 2006, a previsão é de R$ 962 milhões. “Como o
Rio de Janeiro tem 98% das matrículas do Ensino Médio, o maior peso dado a esta
etapa muda drasticamente o valor das transferências aos municípios. Entretanto,
segundo simulações com parâmetros apontados pelo MEC, deve haver uma peque-
na redução nas transferências aos municípios: em torno de R$ 50 a R$ 100 milhões.
Isso representa uma perda de recursos muito grande para o estado, pois não haverá
compensações por parte do governo federal”, afirma Nestor Lima de Andrade, con-
tador-geral do Estado do Rio de Janeiro.
O texto do PEC 415, definido na CCJ, foi aprovado, sem alteração, pela Câmara,
em dois turnos – 25 de janeiro e 2 de fevereiro – mas, agora, está no Senado, onde
o Senador Sérgio Cabral apresentou duas emendas favoráveis à educação do Rio de
Janeiro. As emendas foram parcialmente acolhidas pela Comissão de Constituição,
Justiça e Cidadania. A expectativa era de que o projeto fosse votado até o fim da con-
vocação extraordinária, no dia 14 de fevereiro, o que não ocorreu. Com isso, a im-
plantação do Fundo corre o risco de só acontecer em 2007.
17
Repensando a Infra-Estrutura
Porém, esta situação acarreta uma série de problemas para ambos os governos.
As instalações da prefeitura, cuja demanda tem faixa etária diversa da atendida
pelo estado, leva os alunos da noite a conviverem com mesas e cadeiras pequenas,
com falta de espaço para atividades pedagógicas, entre outros problemas.
Administrativamente, a direção da Unidade de Ensino Estadual sofre com a fal-
ta de espaço para seu funcionamento, e conflitos com a direção da Unidade de Ensi-
no Municipal são comuns.
Além do Rio de Janeiro, outros 6 (seis) municípios contam com convênios para o
funcionamento de unidades escolares estaduais, são eles: Barra Mansa, Cardoso Mo-
reira, Itaocara, Nova Friburgo, Petrópolis e Piraí.
A locação de espaços físicos para o funcionamento de unidades escolares deve
ser vista apenas como uma necessidade emergencial e não uma política a médio e
longo prazos, porque há dificuldades legais para a realização de obras em proprieda-
des que não são do estado, impasses político-financeiros e contratuais.
Atualmente contamos com quarenta unidades escolares funcionando em imóveis
locados, sendo que 27 deles a partir do ano de 2000, para atender à crescente demanda
por vagas no Município do Rio de Janeiro. Uma das saídas para atenuar o problema da
falta de espaço é o investimento na construção de novas unidades e na reforma e am-
pliação de antigos prédios.
Em 2006, teremos concluído um amplo projeto de recuperação física da rede es-
colar, que prevê a reforma e a ampliação de 217 unidades – o equivalente 13% da
rede estadual – além da construção de mais oito novas escolas, das quais cinco de
referência para portadores de necessidades especiais. No total, 218 novas salas de
aulas serão entregues, com capacidade para atender a mais 26 mil novos alunos. Os
investimentos somam R$ 133 milhões – R$ 51 milhões, liberados ao longo do biênio
2003/2004 e R$ 82 milhões, em 2005/2006. Hoje, a rede escolar estadual é compos-
ta por 1.673 escolas, com 1,3 milhão de alunos matriculados.
As novas unidades de referência, por exemplo, vão oferecer Ensino Médio e con-
tarão com laboratórios, quadras esportivas e rampas de acesso às crianças portado-
ras de necessidades especiais, a quem damos especial atenção.
Segundo o subsecretário de Infra-Estrutura da Secretaria de Educação, Luiz Ar-
solidariedade do conhecimento | 115
“Acho que o planejamento do projeto deveria ter sido feito com mais antece-
dência. Era necessário que a secretaria tivesse reservado uma verba específica para
isso, o que não ocorreu. Trata-se de uma tarefa árdua, porque é preciso contratar
não só professores, como animadores culturais, bibliotecários, médicos e dentistas,
por meio de um convênio com a Secretaria de Saúde, enfim, muita coisa precisa ser
feita. De qualquer maneira há um esforço muito grande”, avalia a fiel funcionária
de Darcy Ribeiro, que também cuida do programa Sucesso Escolar, como veremos
mais adiante.
18
Gestão Escolar
tado, por exemplo, na maioria das vezes, são indicação política. Para ocupar o cargo
de diretor de escola, de coordenador regional ou de secretário de Educação, temos
que pesar a formação acadêmica e a experiência profissional.
Isto porque muitas vezes o dirigente de unidade toma medidas impopulares
e, neste sentido, um processo eletivo não é o mais correto. Mesmo estabelecendo
o voto universal, aquele professor que tem uma posição de liderança, acaba sendo
escolhido pelo conjunto de alunos e professores. E aí teremos um processo viciado,
no qual a eleição da pessoa encarregada de controlar o horário dos colegas, aplicar
sanções àqueles que estão descumprindo normas básicas de trabalho e relaciona-
mento fica comprometida. No final, temos um concurso de popularidade, e não de
competência.
Levando em conta todas as ponderações acima, decidimos alterar o modelo de
escolha dos diretores de unidades de ensino. Em julho de 2004, designamos para a
Subsecretaria de Gestão o professor Antônio Cláudio Gomes, que tinha no currículo
uma longa experiência como diretor de escolas – entre as quais, o Colégio Estadual
Pedro II, o maior de Petrópolis, na Região Serrana. Sua função era organizar todo o
processo de escolha dos novos diretores de 1.673 escolas da rede.
Para isso, foi adotado um sistema misto de seleção – manteve-se a consulta à co-
munidade escolar para a escolha dos diretores, mas levando-se em conta a avaliação
do plano de gestão de cada concorrente. Os três candidatos mais votados de cada
escola formaram uma lista tríplice levada ao secretário. Em 98% dos casos, o mais
votado foi o indicado.
Os 2.553 professores da rede estadual postulantes ao cargo de diretor foram
obrigados a passar por um treinamento de gestão escolar durante um fim de sema-
na. Ao todo, foram 16 horas de capacitação, dadas por 29 multiplicadores das Coor-
denadorias Regionais de Educação, em sessenta pólos espalhados pelo estado.
Foi produzida uma vídeo-aula mostrando quais eram os principais procedimen-
tos de um diretor de escola. Junto com o vídeo, os candidatos receberam uma apos-
tila com temas administrativos e pedagógicos. A intenção era que os candidatos
conhecessem suas atribuições e responsabilidades, os canais de comunicação e fi-
zessem do plano de gestão seu instrumento de trabalho.
solidariedade do conhecimento | 125
Após o curso, para garantir a isenção nas escolas, os postulantes a diretor apre-
sentaram seus planos de gestão, avaliados por uma comissão de vinte observadores,
sem direito a voto, composta por dez professores e dez pais de alunos, indicados por
um Grupo Regional formado por, pelo menos, cinco escolas. O Grupo Regional en-
caminhou ao Grupo Executivo Estadual um relatório descrevendo todos os procedi-
mentos da escolha do melhor Plano de Gestão. Em geral, coordenado pelo gerente
de Gestão e Ensino da Coordenadoria.
O processo de seleção ocupou todo o segundo semestre de 2004. Mas, mesmo
“eleitos”, os novos diretores, com “mandato” de dois anos, ainda continuaram a sua
capacitação. Em outubro de 2005, foi iniciado um curso de capacitação em gestão
escolar para 3.522 diretores e diretores-adjuntos de toda a rede estadual, com du-
ração de um ano e elaborado pela Universidade Federal de Juiz de Fora. O grupo foi
distribuído em 78 turmas, em 21 pólos por todo o estado.
Para aqueles que ainda não completaram o nível superior, a capacitação tem o
mesmo valor de um curso de extensão, com 324 horas de aula (presenciais e à dis-
tância). Para os diretores e adjuntos com nível superior, a carga horária é de 460 ho-
ras (presenciais e à distância) e tem caráter de uma especialização.
O curso foi dividido em seis módulos: a gestão política – a função social da es-
cola; gestão pedagógica; gestão do relacionamento interpessoal na escola; gestão fi-
nanceira; gestão patrimonial; e gestão administrativa da escola. No final, os alunos
são obrigados a elaborar uma monografia. O material didático é baseado em textos
elaborados pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).
“A maioria dos diretores não têm, a não ser pela prática, conhecimento de gestão.
Neste sentido, o curso tem o objetivo de preencher essa carência. Eles vão aprender
a gastar racionalmente os recursos públicos e a prestar contas corretamente. Além
disso, o curso pretende trabalhar a questão do relacionamento interpessoal na es-
cola, o que não é nada fácil”, explica Sônia Malachini, que gerencia o Projeto de
Capacitação de Gestores Escolares – Pró-Gestão.
Muitos diretores se prendem apenas à questão administrativa e esquecem o
outro lado da escola, que é o pedagógico. Em outras palavras, ele fica o tempo todo
cuidando apenas do dinheiro da escola. É o cano que furou, é a parte elétrica que
126 | claudio mendonça
não está boa ou ainda é o roubo de uma televisão. É claro que essas questões são
importantes, mas a escola não é só isso. O curso pretende fazer com que esse dire-
tor olhe a sua unidade como um todo e aprenda, com isso, a distribuir tarefas, ouvir
seus orientadores pedagógicos. O curso, neste sentido, se justifica inteiramente.
Ainda em relação à questão dos diretores, um grande avanço que conseguimos
em nossa gestão foi a criação do Fórum de Diretores, que reúne periodicamente
cerca de cem dirigentes das várias modalidades de ensino – do Infantil ao Ensino
Médio, passando pelo EJA – das diversas regiões do estado.
No Fórum, são debatidos temas administrativos e pedagógicos, visando demo-
cratizar a gestão da Educação e unificar o discurso adotado nas unidades e coorde-
nadorias. Essas reuniões funcionam também como uma pesquisa qualitativa das
ações da secretaria, porque nos permite saber a opinião dos diretores sobre os pro-
jetos e programas que vêm sendo desenvolvidos.
Muitas vezes, eles são reavaliados e redimensionados a partir dessa aferição.
Um dos bons exemplos de resultado desses encontros é o programa Sucesso Esco-
lar, que surgiu durante um debate do fórum.
Diretor do Liceu de Humanidades de Campos (Norte Fluminense), a maior esco-
la pública do estado na região, com 4 mil alunos, o professor Antônio Carlos Querillo,
ressalta que o fórum foi muito importante para aperfeiçoar a pontuação do Nova Es-
cola. “Uma das questões na qual avançamos foi a de comparar alunos de escolas de su-
pletivos não presenciais com os das escolas de Ensino Médio comum, como é o caso do
Liceu. Na pontuação geral, acabávamos perdendo pontos injustamente. Conseguimos
mudar essa distorção e, hoje, as avaliações são feitas em separado”, afirma Querillo,
professor do estado há dez anos e em seu primeiro mandato como diretor.
A escola, porém, não pode usar o fórum para colher benefícios pessoais para o
diretor e para ela mesma. Nos fóruns, não são discutidos apenas programas e gran-
des questões da Educação do Rio. Há espaço também para debates administrativos
de problemas que podem parecer pequenos, mas que influenciam diretamente o dia-
a-dia da escola.
Esse é o caso das aulas aos sábados. Eu defendia que os alunos do Ensino Médio
deveriam ter aulas aos sábados, mas o fórum se mostrou contrário e acabamos acei-
solidariedade do conhecimento | 127
tando a decisão dos diretores. “Por experiência própria, sabíamos que os alunos não
viriam à escola aos sábados. Ao final, a decisão não sairia do papel. Convencemos o
secretário da inviabilidade desta idéia e ele aceitou nossos argumentos. Esse foi um
exemplo de debate democrático”, pontua o diretor do Liceu de Campos.
Assim como Querillo, a professora Lilia Vieira de Oliveira, do Instituto de Edu-
cação Sarah Kubitschek, em Campo Grande (Zona Oeste do Rio), acredita que a ex-
periência ampliou o debate democrático da Educação no Rio de Janeiro. “Tenho 41
anos de magistério no estado, dos quais dez anos como diretora de escola e jamais
vi algo parecido. A discussão com os diretores fez surgir a idéia de se criarem as bi-
bliotecas-pólo, dentro do Programa de Leitura (Veja capítulo 24)”, diz. Lilia ressal-
ta, ainda, um outro ponto positivo da parceria: “Quando discutimos uma idéia nova,
nós, diretores, apresentamos o lado ideal. O secretário, porém, nos mostra o aspec-
to legal e a viabilidade daquela idéia. Isso é muito construtivo.”
Pa rt e 2
% de aprovação nas 200 escolas em 2003 % de aprovação nas 200 escolas em 2004
10 (31-40%) 3 (31-40%)
1 (< 30%) 0 (< 30%)
6 (81-90%)
57 (41-50%) 10 (41-50%)
39 (71-80%)
2 (31-40%) 2 (31-40%)
4 (81-90%) 0 (< 30%) 4 (81-90%)
0 (< 30%)
16 (41-50%) 147 (61-70%) 16 (41-50%)
136 | claudio mendonça
Desse total de 65%, conseguiram sair do programa 25%, ou seja, elas atingiram
o nível máximo do Nova Escola. Essas escolas passaram a participar de outros pro-
gramas, como Informática Educativa ou o Programa de Leitura, como forma
de dar continuidade à melhoria do seu desempenho.
Para a presidente da Fundar, porém, o Sucesso Escolar funcionou “muito de
afogadilho” no seu primeiro ano de implantação. “Não houve uma preparação pré-
via”, admite a presidente do Fundar, acrescentando que o projeto só conseguiu re-
sultados satisfatórios em 2005.
Em sua opinião, dois problemas comprometeram o programa: primeiro, o fato de
as aulas serem aos sábados e, segundo, por 2004 ser um ano eleitoral. “Em outubro, tí-
nhamos 85 mil alunos em recuperação. Aí vieram as eleições municipais e muitos aban-
donaram as aulas para ganhar dinheiro como cabos eleitorais”, lembra Tatiana Memó-
ria. O resultado foi que pelo menos 20 mil dos 85 mil alunos abandonaram o curso.
Em 2005, o Sucesso Escolar foi modificado. Trocou as aulas de sábado para o
contraturno, durante a semana, e aumentou a sua base de unidades escolares aten-
didas de duzentos para quatrocentos – ampliando o número dos 80 mil alunos ini-
ciais para 180 mil.
A subsecretária Alba Cruz reconhece que a mudança nos dias das aulas do Su-
cesso Escolar foi para evitar a evasão. Aos sábados, muitos alunos trocavam o co-
légio por uma atividade de lazer, principalmente no verão. Outra dificuldade esta-
va na locomoção. Muitas empresas de ônibus não aceitavam transportar os alunos
gratuitamente aos sábados. Para atrair os estudantes às aulas de reforço na escola,
a Secretaria criou a Gincana Escolar, que envolveu os alunos em atividades cultu-
rais, esportivas e didáticas dentro do próprio ambiente escolar.
Pensando na questão da evasão, criamos uma tarefa atraente. Para marcar pontos,
as equipes que participavam da Gincana tinham que tentar trazer novamente para a
escola aqueles jovens que haviam abandonado o estudo. Imagina o aluno que saiu do
colégio, está com a auto-estima lá embaixo e, de repente, se vê rodeado em sua própria
casa por amigos de sua classe, pedindo para que ele volte a estudar, porque ele vai conse-
guir superar as dificuldades, vai sair dessa. Sem dúvida, foi uma festa muito bonita. Os
colegas ainda se comprometiam a ajudar o aluno recuperado, nas matérias perdidas.
solidariedade do conhecimento | 137
Outra alteração que dinamizou ainda mais o Sucesso Escolar foi ter focado as
aulas de reforço no conteúdo sobre o qual o aluno tinha dúvida, poupando seu tem-
po para se dedicar a outros pontos da matéria. Em 2004, o que ocorria era que o es-
tudante com dificuldade em um determinado ponto específico acabava por assistir
a todas as aulas de reforço. Com essas alterações no programa, o aluno pode ser en-
caminhado à recuperação mais de uma vez, sempre que sentir dificuldades.
Para permitir essa mobilidade, foi criada uma ficha para o aluno. A cada vez que
é encaminhado ao programa, ele recebe do seu professor a ficha, contendo informa-
ções sobre as dificuldades dele em um determinado assunto. Essa providência, na
realidade, é uma espécie de compromisso, pois ele deve entregar o documento assi-
nado, ao professor, assim que retorna da aula de reforço.
Apesar de todos os ajustes que tiveram que ser realizados em 2005, o Sucesso
Escolar conseguiu, em 2004 – o seu primeiro ano de funcionamento – um bom re-
sultado. Segundo Mónica Tambucho, a consultora da SEE, naquele ano, as duzentas
escolas da rede incluídas no projeto tinham índice de aprovação de até 60% – ou seja,
com 40% de alunos reprovados.
Um ano depois, dessas duzentas escolas, apenas 33 mantiveram o mesmo resultado
de 2004. E mais: 45 atingiram índice de aprovação acima de 80%. Em seis delas, 90%
dos alunos passaram de ano. “Está aí um exemplo de como tratar essa questão da repro-
vação sem traumas”, afirma Mónica.
Em apenas quatro dias de inscrições, cerca de oitocentos universitários acessaram
o site da Fundação Darcy Ribeiro, responsável pelo cadastramento, e preencheram o
formulário se candidatando a uma vaga de monitor nas escolas estaduais de Ensino
Médio. No total, só em 2004, foram contratados 1,6 mil monitores para auxiliar na
execução do programa nas escolas. Um dos pontos positivos do programa foi oferecer
a possibilidade a alunos de 7ª a 8ª séries de serem monitores para turmas de 1ª a 4ª
séries. Os estudantes do Ensino Médio puderam dar aulas para os de 5ª a 8ª séries. Os
universitários contratados como monitores atenderam aos alunos do Ensino Médio.
Para ajudar nas despesas com as atividades fora das aulas, cada escola recebeu
R$ 500 por mês, destinados às despesas com material de limpeza, energia elétrica,
telefonia, merenda e atividades extraclasse.
138 | claudio mendonça
Na área pedagógica, 10
a SEE também lançou um plano emergencial
(31-40%) 3 (31-40%) para 291 es-
1 (< 30%) 0 (< 30%)
colas municipais do Rio, que durante a noite são cedidas ao estado. Por meio de um
6 (81-90%)
monitoramento dos resultados através do SGE (Sistema de Gestão Escolar), a se-
57 (41-50%) 10 (41-50%)
cretaria conseguiu aplicar ações pontuais que ajudaram a melhorar o desempenho
escolar dos alunos do curso noturno, que atende a jovens e adultos. A39aprovação
(71-80%)
cresceu em 11,1% nessas unidades – ou seja, 8.070 alunos a mais passaram de ano.
Em 2004, graças ao plano emergencial, 36.770 alunos foram aprovados (50,4%). Em
132 (51-60%) 57 (51-60%)
85 (61-70%)
2005, esse número subiu para 44.840 (61,5%).
% de aprovação nas 385 escolas em 2004 % de aprovação nas 200 escolas em 2005
2 (31-40%) 2 (31-40%)
4 (81-90%) 0 (< 30%) 4 (81-90%)
0 (< 30%)
16 (41-50%) 147 (61-70%) 16 (41-50%)
27 (71-80%) 45 (71-80%)
79 (51-60%)
63 (51-60%)
165 (61-70%)
108 (51-60%)
92 (51-60%)
ria dos alunos trabalha durante o dia, não tendo disponibilidade em outros horários
para assistir a aulas extras.
A partir do início de 2004, a Subsecretaria de Planejamento Pedagógico desen-
volveu, dentro do Sucesso Escolar, um projeto de grande importância para a Edu-
cação do Rio: a atualização do Currículo Escolar do Estado, pois o que vigorou até
2005 datava de 1970.
A elaboração do documento demandou vários desafios. Foi preciso considerar a
diversidade de níveis e modalidades de ensino, as diretrizes da política educacional e,
sobretudo, a participação dos professores regentes. Acreditamos que a realidade das
escolas e as práticas docentes constituem o ponto de partida de qualquer reflexão
curricular. Para tanto, foi estabelecido um planejamento criterioso que atendesse às
diversas especificidades.
Assim, no ano de 2004, foram constituídos grupos de trabalho compostos por
consultores de instituições de ensino superior e cerca de 1,8 mil professores de es-
colas da rede estadual de ensino, com mestrado e doutorado, sob a coordenação da
UFRJ (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro). O objetivo era elaborar
um documento para cada área de conhecimento, dos diferentes níveis e modalida-
des de ensino: Fundamental (5ª a 8ª séries), Médio, Normal e Jovens e Adultos.
Os trabalhos se pautaram sempre pela discussão democrática. A primeira versão do
documento foi apresentada aos professores e discutida em workshop realizado em no-
vembro de 2004. A proposta também foi enviada a todas as escolas, acompanhada de um
formulário específico para avaliação.
“Suspendemos as aulas de todas as escolas por um dia, para que os demais pro-
fessores da rede lessem a proposta e dessem suas opiniões. Eles preencheram o for-
mulário, mostrando o que estava ou não estava de acordo. Esse material foi tabula-
do e encaminhado para a UFRJ”, afirma a subsecretária Alba Cruz.
A SEE recebeu cerca de 8 mil questionários, encaminhados pelos professores,
com sugestões e críticas. A incorporação dessas contribuições, associada à revisão
realizada pelos especialistas, resultou na segunda versão do documento, entregue
ao corpo docente no início do ano letivo de 2005. Durante todo o ano, os professores
tiveram a oportunidade de desenvolver e avaliar a proposta em seu cotidiano, en-
solidariedade do conhecimento | 141
A diretora Marli Alves da Silva, do Colégio João Alfredo, na Zona Norte do Rio (Vila
Isabel), conta que o projeto teve ótima repercussão entre pais e responsáveis. “Eles fo-
ram chamados a trabalhar juntos, transformando as aulas de reforço em um trabalho
de equipe. Com isso, conseguimos um resultado muito bom na nossa escola”, afirma.
Marli ressalta a importância do papel do diretor para que o projeto prossiga.
“Quando o diretor não compra a idéia, não veste a camisa, a coisa não funciona. Cabe
a ele, por exemplo, incentivar o professor a atuar em horários diferenciados, o que
já é um sacrifício, levando-se em conta que em sua carga horária normal ele precisa
fazer seu plano de aula, manter a disciplina, enfim, arcar com toda a responsabili-
dade inerente ao seu papel”, diz.
Em sua análise sobre os resultados do Sucesso Escolar, a diretora destaca: “Ob-
servei professores buscando alternativas, se atualizando para fazer o melhor. Vi tam-
bém alunos tendo coragem de, pela primeira vez, fazer perguntas que não ousariam
fazer diante dos colegas de turma. Vivemos em uma sociedade complicada. Temos
muitos alunos cujos pais não sabem nem ler, não têm instrução. Sem ter para onde
correr, esses meninos encontram nas aulas de reforço um professor parceiro, diferen-
te daquele que em sala de aula precisa orquestrar a classe toda e cobrar resultados.”
No João Alfredo, em 2005, participaram do Sucesso Escolar, 237 estudantes,
dos quais 233 foram aprovados e, apenas, quatro ficaram em dependência. Esse é
um índice de 99,5% de aprovação.
A melhoria do desempenho escolar obtida pelos alunos com o Sucesso Esco-
lar empolga o professor de matemática do Colégio João Alfredo, Márcio Ferreira de
Abreu. De acordo com ele, há um clima de cooperação entre o professor e o orienta-
dor das aulas de reforço, que passam a acompanhar muito de perto a performance
dos alunos. Fora do ambiente da classe, assim que passa a entender melhor a matéria,
o olhar dos que têm dificuldade muda com relação ao dia-a-dia do professor. “O alu-
no passa a olhar você de outra maneira, com mais respeito e até mesmo a si próprio,
porque o projeto colabora para o aumento de sua auto-estima”, acredita.
Márcio observa ainda que a discrepância de desempenho em sala de aula gera com-
plexos que agravam ainda mais a boa compreensão da matéria que está sendo dada. O
reforço escolar permite o nivelamento da turma, contribuindo, inclusive, para a me-
solidariedade do conhecimento | 145
lhoria das relações interpessoais. “É comum, após os testes, você escutar de um aluno:
‘Puxa, nunca tirei uma nota dessas em matemática! Eu não sabia que era capaz’. Teve
aluno que antes do Sucesso Escolar tirava notas 2, 3, e acabou passando com 10.”
A experiência da recuperação de alunos no João Alfredo foi tão significativa
que muitos, apesar de terem alcançado o nível da turma, se apegaram de tal forma
ao professor-orientador que relutaram em deixar de freqüentar as aulas de reforço.
“No Sucesso Escolar, nós trabalhamos o aluno. São turmas menores, o que possibi-
lita dar maior atenção às dúvidas surgidas e, conseqüentemente, a interação profes-
sor-aluno é bem maior. Tínhamos até que liberá-los da oficina, porque já haviam su-
perado suas dificuldades, mas eles se sentiam assim tão apegados a nós que pediam,
por favor, para ficar até o fim do ano. Permitíamos, então, que eles ficassem como
alunos-ouvinte”, lembra Márcio.
Outro motivo que ajudou a incentivar os alunos das turmas do Sucesso Escolar do
Colégio João Alfredo foi o exemplo da aluna-monitora Liliane Dutra Garcia, de 43 anos.
Depois de vinte anos fora da escola, ela voltou a estudar e, com as aulas de reforço, con-
seguiu não só superar suas dificuldades, como foi escolhida para ser monitora de turma.
Hoje, ela está terminando o Ensino Médio e pretende fazer vestibular para farmácia.
“Tinha uma aluna do terceiro ano, moradora do Complexo do Alemão, que não
entendia nada por estar sempre desligada. Ela entrou para a oficina de matemática
e viu o meu exemplo, uma pessoa de 43 anos fazendo cursos nas horas vagas para
ser alguém na vida. Ela decidiu mudar, se dedicou a um curso de telemarteking e
hoje tem o seu próprio dinheiro. O Sucesso Escolar é um trabalho sério, de pessoas
que se dedicam. Acho que quem quiser ajudar o país tem que investir em Educação,
pois, assim, podemos tirar jovens do tráfico, das drogas e da vagabundagem”, con-
clui Liliane.
21
Um estudo sobre o Sucesso Escolar
nosso país. Foi ele quem primeiro disse que as escolas brasileiras não perdiam alunos,
porque eles tinham que trabalhar, mas, sim, por causa da repetência. Ora, quando um
aluno chega aos 15, 16 anos na quarta série primária, a tendência é sair da escola”, diz.
A antropóloga decidiu nos procurar e propusemos a ela que acompanhasse o
programa Sucesso Escolar, que, naquele momento, agosto de 2004, começava a ser
implementado pela secretaria.
Yvonne aceitou a proposta e escolheu 18 escolas que estavam inseridas no pro-
grama, além de mais duas unidades – uma da rede privada e outra da rede federal
de ensino. A intenção era acompanhar todo o processo da aprendizagem e a relação
entre alunos, professores e diretores nas 18 escolas, comparando-as às da rede fe-
deral e privada. Logo de início, a antropóloga desmentiu a idéia corrente de que, nas
escolas públicas do estado, falta tudo: desde o material escolar até professor.
“Eu não vi falta. Pelo contrário, eu vi os professores, vi os alunos, a comida, o
livro. Vi que as escolas, na sua grande maioria, estavam organizadas. Ficamos im-
pressionados com o aparato institucional da secretaria, que melhorou muito nos úl-
timos anos. Percebemos também que os alunos estão em massa nas escolas”, conta.
De acordo com a pesquisadora, as escolas da rede de ensino do estado não pe-
cam pela falta de estrutura ou de recursos humanos, mas, sim, pelo excesso de “au-
toritarismo” de professores e dirigentes escolares.
“Há um excesso de autoritarismo que se baseia ainda numa versão de Educação
antiga, herança arraigada de uma visão educacional portuguesa, colonial. Por esta
versão, não há possibilidade no sistema educacional brasileiro de se trilharem ou-
tros caminhos. Só há um caminho: o de seguir a trilha das séries, que te levam aos
diplomas, desde o fundamental até a universidade.”
Por essa concepção, todos seriam capazes de ir até o fim do processo de aprendiza-
gem. Na prática, porém, as dificuldades e barreiras são tão grandes que apenas alguns
conseguem chegar lá. Na opinião de Yvonne, esta visão é altamente prejudicial ao de-
senvolvimento do aluno, porque, à medida que ele é reprovado, a própria escola (leiam-
se professores e diretores) passa a vê-lo como um “ser fracassado”, “que não tem jeito”.
“Toda a explicação do fracasso escolar está, na verdade, num conceito quase so-
ciológico de que os alunos são pobres, não querem nada, e que a culpa é deles pró-
solidariedade do conhecimento | 149
meio de uma atitude jocosa, de não querer responder às perguntas, de não acreditar
que o aluno possa estar realmente em dúvida e, sobretudo, da ameaça de aplicar um
castigo em caso de quebra de sua autoridade. “É a idéia do castigo sempre associado
à autoridade do professor, que constrange os alunos toda a vez que é colocada em
xeque”, diz.
Há ainda um descompasso entre o que seja uma boa escola para pais, alunos e
professores e a que a Secretaria de Educação propõe, baseada em sistemas de avalia-
ção de ensino. Este descompasso só reafirma a visão conservadora da Educação, que,
muitas vezes, ceifa o futuro de alunos considerados “ruins”.
“A comunidade, pais, alunos e professores ainda acreditam que uma boa escola
é a que reprova, reprime e castiga”, afirma Yvonne. Neste caso, aulas que fogem à
regra da transcrição são rechaçadas pelos próprios alunos.
“Uma das minhas pesquisadoras resolveu quebrar a rotina e dar uma aula para
uma turma de Ensino Médio, em que pegou um gravador e colocou para tocar uma
música funk. Depois, ela dividiu a turma em dois grupos (pró e contra) para que os
alunos discutissem o tema. Em uma das classes, um menino levantou e gritou: ‘pro-
fessora, a gente quer aula, quer que a senhora escreva no quadro. Isso que a senhora
está fazendo não é aula’. Em linhas gerais, há um consenso entre pais, alunos e pro-
fessores sobre essa escola conservadora”, acredita.
Durante a pesquisa, a antropóloga da UFRJ aplicou um questionário com per-
guntas sobre o relacionamento dos alunos com a escola e sobre como eles viam as
ações afirmativas, entre as quais a criação de quotas para negros. Yvonne se surpre-
endeu com a grande quantidade dos que disseram gostar de freqüentar a escola.
“Cerca de 90% dos entrevistados disseram que gostam de estudar. Então, a escola,
como se diz, não é o lugar de coisa ruim, de baixa auto-estima. Ao contrário, é o lugar que
eles gostam de ir. Na realidade, os alunos querem estudar porque querem ter uma vida
melhor do que a de seus pais. Esse desejo é o que mais me emocionou ao longo da pesqui-
sa, porque os alunos pensam na possibilidade de melhoria social. Isso está claro”, revela.
Essa conclusão vai ao encontro da grande transformação na Educação pública do
país, registrada nos últimos 15 anos. Neste período, grande parcela pobre da popula-
ção brasileira decidiu entrar na escola pública.
solidariedade do conhecimento | 151
“Não vivemos mais aquele quadro de vinte anos atrás, no qual apenas 30% da po-
pulação em idade escolar estavam em sala de aula. Era uma escola feita para poucos,
para filhos da classe média. Hoje, a massa de alunos cresceu e a escola tem que en-
frentar o desafio de ensinar para muitas pessoas. Não dá mais para ter uma escola
conservadora. Neste sentido, o Sucesso Escolar é fundamental, porque rompe com
essa visão, conseguindo chegar ao aluno com dificuldade de aprendizado ao utili-
zar algo que acho revolucionário, os monitores. Ora, os monitores são os próprios
colegas desses alunos supostamente ruins, que se dispõem a ajudá-los a superar as
dificuldades.”
Quanto à questão racial, segundo Yvonne, a pesquisa apontou que ela pratica-
mente inexiste na relação professor-aluno. O preconceito aparece mais latente na
relação entre os próprios estudantes.
Aproximadamente, 30% declararam que sofriam preconceito de raça na escola.
Desse total, 89% responderam que o racismo vem dos próprios colegas. Conforme
os estudos da antropóloga há uma espécie de cultura racista que perpassa as várias
camadas sociais e faz, realmente, um estrago nas relações entre alunos.
Segundo a pesquisadora, ao contrário do que se diz, negros e brancos têm de-
sempenho mais ou menos equilibrado dentro da sua faixa etária. “Existem primei-
ros da classe negros e brancos. A raça não é determinante”, afirma. O questionário
apontou que mais de 50% concordam com as cotas para alunos provenientes de es-
colas públicas, mas a grande maioria não aceita quotas para negros.
Outro problema detectado pela professora da UFRJ ao longo de sua pesquisa foi
a forma como são levadas as discussões pedagógicas nas reuniões dos conselhos de
classe das escolas. Segundo ela, muitos se transformam em tribunais de exceção ao
final de cada semestre. “O conselho de classe é o resumo da nossa sociedade. O que
se vê nessas reuniões é a reprodução do terror, até termos utilizados pelo tráfico
eu ouvi, como ‘corta’, ‘passa a régua’, ‘joga na vala’. Portanto, em vez de valorizar as
conquistas, o que Pierre Bourdier, chama de ‘ethos da Educação’, que é a missão de en-
sinar, o conselho reproduz a violência, o preconceito moral. Fica no lado do impuro,
do ruim, de tudo aquilo que destrói a capacidade criativa do indivíduo. O aluno, em
suma, é ‘jogado na vala’”, conclui.
Yvonne constatou que essa concepção de conselho de classe ainda é reproduzi-
da pela maioria dos 18 colégios que visitou. Em contrapartida, ela ressalta que, nas
boas escolas, há a participação de alunos nas reuniões do conselho.
“A escola não é só merenda, ela precisa criar o ‘ethos da Educação’, valorizar a sua
missão de ensinar. Estou dizendo isso, porque as boas unidades são aquelas que têm
os melhores conselhos de classe, que permitem a participação dos alunos e discu-
tem, realmente, a avaliação do aprendizado e não a disciplina e a moral.”
22
Nova Escola
Em 2005, foram incluídas perguntas sobre ciências da natureza, que englobam conhe-
cimentos sobre física, química e ciências biológicas. Isso vai permitir direcionarmos um
investimento maior na área tecnológica, cujo avanço, como já vimos, vem acontecendo
por meio dos laboratórios de Informática e o uso dos roteiros digitais.
Acreditamos que qualquer nação, para se desenvolver, precisa se dedicar à for-
mação de futuros cientistas e à produção do conhecimento tecnológico. A Educação,
neste sentido, tem que investir nas disciplinas de física, química e biologia. Foi o
que a Irlanda e a Coréia do Sul fizeram. Esses países formaram uma geração inteira
de jovens que estudam e desenvolvem patentes nas áreas da medicina, farmacolo-
gia, novas tecnologias e comunicações.
A prova de desempenho, o chamado “Dia D”, foi realizada no dia 17 de novem-
bro de 2005. Cerca de 975 mil alunos fizeram o exame − 200 mil a mais do que em
2004. Eles foram distribuídos em 22.872 salas em 1.590 escolas estaduais e 324
municipais de 32 cidades do estado. Além da prova, o aluno preencheu um questio-
nário socioeconômico. O provão durou três horas.
O estudante Paulo Pereira, do 1º ano do Ensino Médio, do Colégio Júlia Ku-
bitschek, no Centro do Rio, acha que a prova do Nova Escola é importante não só
para avaliar o aluno, mas também o colégio. “Assim nós ficamos com um parâmetro
em relação a outras escolas”, diz Pereira. Sua colega de colégio, Juliana de Melo, do
2º ano do Ensino Médio, concorda: “Acho que vale a pena porque essa avaliação dá
chance aos que não estão bem, de melhorarem o ensino.”
O Colégio Júlia Kubitschek alcançou a nota máxima no programa em 2004. Na
unidade, 580 estudantes foram avaliados no último “Dia D”. Setenta deles do Ensi-
no Fundamental e 510 do Ensino Médio.
O Governo do Estado fez parcerias com o Ministério da Educação e com várias
prefeituras, o que possibilitou que a avaliação fosse aplicada em alunos das redes
municipais de Duque de Caxias, São João da Barra, Resende, entre outras. Os alu-
nos dos Centros de Estudos Supletivos também participaram, pela primeira vez, da
avaliação por desempenho.
A avaliação foi ampliada ainda em outro critério em relação ao ano passado. Em
vez de três, foram oito séries submetidas à prova de desempenho: 2ª e da 4ª à 8ª sé-
156 | claudio mendonça
fessores e funcionários vão ganhar cinco vezes mais do que aquela outra escola que
não conseguiu passar do nível um.
A gratificação reduz na mesma proporção, caso a escola apresente desempenho
pior em relação ao ano anterior. Hoje, o estado investe mensalmente R$ 16 milhões
para gratificar os servidores. Em 2005, o maior bônus foi de R$ 426,05 para profes-
sor e o menor, R$ 50 para funcionário de apoio.
Segundo o coordenador do Nova Escola, além do desempenho entre as escolas
da rede estadual, o programa considera também o desempenho da própria escola de
um ano para outro.
“Por exemplo, se, por um lado, uma escola X, em Nova Iguaçu, teve um desempe-
nho pior em relação às outras unidades daquela Coordenadoria de Educação, mas,
por outro lado, melhorou o seu desempenho em relação ao ano anterior, ela sobe de
nível na escala do programa”, explica Francisco Tadeu.
Um dos problemas do Nova Escola, porém, ainda perdurou até 2005. Como a ava-
liação externa só ocorre no fim do ano, muitos diretores são pegos de surpresa com o
desempenho da sua escola e só começam a trabalhar suas deficiências no ano seguinte.
Para evitar isso, em outubro, a consultora da SEE, Mónica Tambucho, desenvol-
veu uma cartilha com todos indicadores de rendimento escolar por bimestre, dividi-
do por escolas e Coordenadorias Regionais de Educação. “Essa cartilha, na verdade,
acaba com o problema do efeito-surpresa, porque o diretor da escola terá acesso, a
cada bimestre, a seus indicadores de rendimento, podendo melhorá-lo pontualmente
ao longo do ano, assim como as Coordenadorias Regionais”, afirma a assessora.
Em outras palavras, o projeto funciona de seguinte forma: a cada bimestre, a
escola e as coordenadorias recebem um documento informando a sua situação em
relação aos indicadores de reprovação e a quantidade de alunos. Essas informações
permitem às escolas e às coordenadorias realizarem um diagnóstico capaz de iden-
tificar os pontos mais críticos no desempenho escolar e desenvolver estratégias de
superação das dificuldades apontadas.
A cartilha permite também comparar o rendimento da escola com o rendimento
global da coordenadoria ou da rede toda. No caso das coordenadorias é possível saber
o desempenho de cada uma. Isso permite acompanhar o comportamento das escolas
158 | claudio mendonça
Gratificação de Professores
Especificação/Valor Número de Escolas
2003 2004 2005
Mínimo 100,00 100,00 100,00
Médio 165,82 230,54 240,56
Máximo (1) 400,00 426,05 435,10
(1) Valor máximo efetivamente pago Fonte: SEE-Programa Nova Escola/UFJF-CAED
solidariedade do conhecimento | 159
O relatório do Nova Escola de 2005 revela ainda que 34% dos alunos de baixa
renda conseguiram obter a nota mínima – número superior aos 29% dos estudan-
tes de classe média. Segundo a coordenadora de pedagogia da UERJ (Universida-
de do Estado do Rio de Janeiro), Bertha do Valle, esses números provam que o em-
penho dos pais, dos professores e da própria escola faz a diferença nos resultados
da Educação.
A avaliação mostra também que apenas 10,4% dos diretores das unidades in-
dicaram uma freqüência baixa dos docentes enquanto 21,7% dos alunos (mais que
o dobro) reclamaram dos professores faltosos .
Pelo estudo, metade dos alunos (cerca de 500 mil) teve rendimento abaixo do
mínimo exigido em português. Em matemática, apenas 46% conseguiram esse
patamar. Comparando com outros anos, em 49,4% das escolas o rendimento em
matemática e português foi estável ou inferior em 2004. Em 50,6%, o desempe-
nho foi melhor.
Outros números apurados são os do Fluxo Escolar, que apresentaram melho-
ra. No Ensino Fundamental, o índice de aprovação passou de 72,6% em 2003 para
73,8% no ano passado. No Ensino Médio, subiu de 64,3% para 66,6%. Nos últimos
anos, houve uma tendência de queda de rendimento que conseguimos mudar.
Apenas 255 escolas atingiram o nível mínimo, números inferiores aos de 2003,
em que foram registrados 951 no nível 1. A maioria das unidades (717) foi classifi-
cada no nível 2, seguida das unidades de nível 3 (667) e as de nível 4 (176). No nível
5 ficaram 15 escolas, o grau máximo na escala. Sete delas estão localizadas na Re-
gião Serrana Fluminense, quatro na Região Metropolitana, e as demais nas regiões
Noroeste, Norte, Médio Paraíba e Centro Sul.
A partir dos resultados, o programa vai conceder aos professores e demais pro-
fissionais gratificações proporcionais às suas realizações educacionais. Os R$ 16
milhões empregados em 2006 foram divididos em duas partes: R$ 8 milhões des-
tinados à avaliação da escola e mais R$ 8 milhões foram dados às escolas que pro-
grediram em relação a elas mesmas.
160 | claudio mendonça
Rezende vai além para mostrar que o aprendizado do xadrez não é nenhum bicho-
de-sete-cabeças. “O caso que me fez compreender que o xadrez era muito mais que um
simples jogo de crianças inteligentes foi o de um aluno repetente de 3º Ginásio (atual-
mente, 7ª série fundamental). Ele havia sido vaticinado pelos professores como caso
perdido e, possivelmente, iria passar por uma nova repetência, porque não conseguia
aprender a matemática de jeito nenhum. Após se iniciar no xadrez com os colegas, cla-
ro, de forma naturalmente empírica, esse menino não só passou de ano, surpreendendo
amigos e professores, como foi campeão de xadrez no colégio no ano seguinte”, lembra.
Assim como Mequinho, o professor Sylvio Rezende acha que os benefícios do jogo
são muitos, principalmente na melhora da atenção e disciplina e no desenvolvimento
do raciocínio lógico. “Todos vão desenvolver o raciocínio lógico e a concentração, inci-
dindo diretamente no rendimento escolar, notadamente sobre a matemática, que de-
pende, mais que as outras matérias escolares, deste raciocínio lógico”, avalia.
Os bons resultados aparecem logo. “Costumo fazer a seguinte aposta com os pais
que me procuram: se o aluno não faltar às aulas de xadrez e fizer os exercícios propos-
tos, as notas vermelhas do primeiro semestre estarão azuis antes de encerrar o segun-
do. Faço essa aposta há mais ou menos dez anos e ainda não perdi uma só vez.”
Segundo o especialista, a matemática está presente em tudo no xadrez, desde
a compreensão do tabuleiro e suas formas, como as suas linhas (coordenadas), que
permitem uma aula de geometria, o número das filas de um a oito (progressão nu-
mérica), até o valor das peças (soma e subtração). “Utilizo muito a matemática du-
rante a aprendizagem, para a criança entender, inclusive, quem tem o controle do
centro, conceito básico para o sucesso enxadrístico”, afirma.
Paulo Silva, de 18 anos, aluno do 2º Ano do Ensino Médio do Colégio Amaro Ca-
valcanti, uma tradicional escola do Rio, localizada no Largo do Machado (Zona Sul),
confirma as teses de Sylvio Rezende.
Paulo começou a jogar xadrez, graças ao programa e seu rendimento em mate-
mática melhorou muito desde então. “Para falar a verdade, não gostava de matemá-
tica, por isso sempre tive dificuldade na disciplina. O xadrez foi bom neste sentido,
porque ele me fez enxergar que a matemática não é nenhum monstro impossível de
ser encarado”, conta.
166 | claudio mendonça
Jogos de Matemática
Outra tentativa da SEE de tornar mais acessível aos alunos o estudo da matemá-
tica foi a criação de um conjunto de jogos, nos quais o raciocínio fosse estimulado por
meio de entretenimentos mais que conhecidos dos estudantes. Frações, decimais,
números positivos, negativos, percentuais foram inseridos no carteado, no jogo de
bingo e levados para a sala de aula. O divertido conjunto foi chamado de Jogos de
Matemática, e tem o propósito de levar os alunos a aprenderem brincando. Cerca
de 7.500 professores da rede estadual ganharam kits do jogo, que se transformou em
um aliado a mais para conquistar e melhorar o desempenho em sala de aula.
Representações matemáticas substituem os naipes das cartas do baralho e os
números das cartelas dos bingos. Os jogos foram desenvolvidos pelo Departamen-
to de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro e vão ser distribuídos
para todos os professores da área.
O kit contém quatro baralhos de cores diferentes, com 52 cartas cada, 18 carte-
las de bingo e dados. Para recebê-lo, os professores passaram por uma oficina onde
aprenderam as regras dos jogos matemáticos. Os treinamentos ocorreram em 39
pólos localizados em diferentes regiões do estado.
Um fórum de discussões no site da UFRJ (www.limc.ufrj.br) foi criado para de-
bater o jogo. Ali, professores podem tirar suas dúvidas e deixar sugestões sobre o
projeto, que foi lançado no dia 19 de outubro de 2005 no Clube do Botafogo. Na oca-
sião, um grupo de quatrocentos professores testou e aprovou o jogo.
A área de ciências exatas é a que traz maior dor de cabeça nos alunos, e matemá-
tica é a matéria considerada mais difícil. Segundo dados do Sistema de Gestão Esco-
lar, 41% dos estudantes seriam reprovados na disciplina se fosse observado apenas
o desempenho no primeiro bimestre deste ano.
solidariedade do conhecimento | 167
Muitos estudantes a partir da 6a série e até o Ensino Médio não conseguem resol-
ver equações porque trazem deficiências de anos anteriores. As turmas que têm mais
dificuldade são a 7a e 8a séries do Ensino Fundamental e o 1o ano do Ensino Médio.
Os jogos de matemática beneficiaram 1,25 milhão de alunos, da 5a a 8a séries do
Ensino Fundamental, do Ensino Médio e de Jovens e Adultos. Uma das escolas be-
neficiadas foi a João Alfredo, em Vila Isabel, onde estudam 2.500 alunos.
– A matemática é o bicho-papão da Educação. O jogo é importante para que o
adolescente se desenvolva e, ainda, evita a evasão escolar – acredita a diretora da
escola, Marli Alves da Silva.
– Dentro da sala de aula, o especialista é o professor. Esperamos que este seja um
canal de interação – diz Luiz Carlos Guimarães, professor da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro), que criou o jogo, com apoio de Maria Imaculada Cabanas,
professora aposentada da rede estadual.
– Esse é um material que pode ser enriquecido por meio da parceria com os profes-
sores. Oferecemos apenas sugestões de como o jogo poderá ser trabalhado em sala de
aula, mas sabemos que, quando o material é levado às escolas, os próprios estudantes
fazem mudanças e criam novas regras – comenta a professora Maria Imaculada.
24
Programa Estadual de Leitura
Cada grupo deve escolher um livro por mês para lê-lo em sala de aula. Com base
na leitura, os alunos produzem atividades interativas, como uma música, um qua-
dro, uma peça de teatro, um ensaio ou uma fotografia. A atividade deve representar
o que foi compreendido do livro escolhido pelo grupo. Os trabalhos são expostos na
comunidade escolar e as escolas participantes recebem o selo Escola que Lê.
solidariedade do conhecimento | 171
103 unidades tiveram seu acervo literário reforçado, aberto para alunos da escola e
de outras unidades da região, além da comunidade local.
Uma das principais iniciativas para incrementar os acervos das bibliotecas-pólo
aconteceu no início de agosto de 2005. Nos dias 9 e 10 daquele mês, o Palácio Gua-
nabara abriu suas portas para a Feira Estadual de Livros, com a presença de Zi-
raldo, da governadora Rosinha Garotinho e do secretário Arnaldo Niskier (Cultura),
além do presidente do Sindicato Nacional das Empresas Editoras de Livros e Publi-
cações Culturais (SNEL), Paulo Rocco.
Nos jardins do Palácio, foram montados trinta estandes de editoras e cada uma
das 103 escolas com bibliotecas-pólo receberam da Secretaria de Educação R$ 3 mil
para adquirir os livros que quisessem.
Os diretores, junto com alunos, o professor de literatura e o orientador pedagógico
da escola, além do responsável pela biblioteca-pólo, puderam escolher seus livros. Pre-
senciamos emocionados os alunos lendo livros no meio dos jardins do Palácio Guana-
bara. Foi uma festa muito bonita, um sucesso.
Não menos emocionante foi o concurso de redação, também previsto no Pro-
grama Estadual de Leitura, que premiou, em agosto de 2005, cinco alunos da
rede estadual com uma viagem à França. O concurso, patrocinado pelas secretarias
de Educação, Cultura e pelo Consulado da França no Rio, ocorreu em duas etapas. A
primeira triagem foi feita pelas 29 Coordenadorias Regionais de Educação.
Os vinte finalistas foram julgados por um júri formado por uma professora da
rede estadual, o adido educacional do consulado francês e pelo chefe de Gabinete
da Secretaria de Cultura. O tema escolhido foi A Influência da Missão Artística
Francesa em 1816 no Rio de Janeiro.
A qualidade das redações dos alunos estava muito boa. Eles puderam desenvolver
outras áreas de conhecimento. Todo concurso de redação é um estímulo à leitura. No
caso específico desse concurso, o incentivo foi maior por causa das comemorações do
Ano do Brasil na França.
No dia 26 de setembro, os estudantes embarcaram para Paris, onde ficaram por
uma semana com hospedagens pagas pelo consulado e passagens, pelo Governo do
Estado. Na capital francesa, eles visitaram um liceu (escola de Ensino Médio), a Ca-
solidariedade do conhecimento | 173
106,5 mil alunos de 246 CIEPs e constatamos que 17,4% (18.577) precisavam de
mais de cinco intervenções dentárias, entre as quais o tratamento de canal. Em
2005, foram examinados 124,7 mil estudantes, dos quais 68% necessitavam de al-
gum tipo de tratamento odontológico. Em 2006, a previsão era de realizar os exa-
mes em cerca de 150 mil matriculados em 270 CIEPs.
Um dos grandes avanços do programa em 2005 foi a inclusão do tratamento de
canal. O CIEP 369-Jornalista Sandro Moreira, em Jardim Primavera, em Duque de
Caxias (Baixada Fluminense), serviu como modelo para as demais unidades.
“Os alunos apresentavam a necessidade de fazer tratamento de canal, mas não ti-
nham condições financeiras. O que acontecia era que o estudante acabava arrancan-
do o dente, o que, para uma criança ou um adolescente, é muito prejudicial, porque
acarreta uma série de problemas, não só na arcada dentária, mas, principalmente,
na auto-estima”, avalia o tenente Marcio Bernardino, endodontista da escola.
No CIEP, os tratamentos de canal são realizados duas vezes por semana e os
atendimentos ocorrem com hora marcada. Além dos alunos do Jornalista Sandro
Moreira, são atendidos outros estudantes indicados pelo Programa Saúde na Es-
cola. Foi o caso dos irmãos Levi, 9 anos, e Jéssica Santos, 14, do CIEP 032, de Pilar,
em Duque de Caxias. “Morro de medo de dentista, mas sei que é para o meu bem.
Sinto muita dor”, comentou Levi. A mãe do menino, Maria dos Santos Silva, reve-
la que ele estava faltando à escola por causa da dor de dente e, quando comparecia,
mal prestava atenção às aulas.
O trabalho desenvolvido pelo Saúde na Escola contribui, desta forma, para a
melhoria das condições de desenvolvimento, do rendimento escolar, da auto-estima
e da autoconfiança, bem como para a diminuição dos índices de evasão, repetência e
absenteísmo, além de promover o estímulo à adoção de estilo de vida saudável.
Além do tratamento odontológico, o PSE do CIEP 369 foi pioneiro na criação de
um espaço dedicado às mulheres. São oficinas quinzenais voltadas ao debate do pa-
pel da mulher no mercado de trabalho e da violência familiar. O projeto, dedicado às
mães de alunos, foi idealizado pelas tenentes Gabriela Franco Dias e Elaine Vascon-
celos de Andrade, respectivamente, assistente social e psicóloga da escola.
“Nos três anos em que temos atendido a comunidade da região, percebemos a im-
solidariedade do conhecimento | 177
portância que a família tem no processo de resolução dos problemas que envolvem
crianças e adolescentes. Porém, quando tais problemas são tratados de forma indi-
vidualizada, os resultados nem sempre são satisfatórios. Por ser a mulher a princi-
pal responsável por cuidar dessas crianças e jovens e, muitas vezes, por elas serem
vítimas ou mesmo algozes, acreditamos que o projeto possa reduzir a violência so-
frida por esses grupos”, afirma a tenente Gabriela.
O apoio da Secretaria de Defesa Civil do Estado foi fundamental para colocar-
mos em prática um outro programa de saúde pública na rede de ensino, o Olhando
a Escola, que contou também com a parceria imprescindível da Secretaria de Esta-
do de Saúde e da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO). Lançado em agosto de
2005, o primeiro programa foi fruto da parceria entre essas secretarias e a SOB.
O programa surgiu da observação de professores em sala de aula. Eles percebe-
ram que muitos tinham dificuldade de aprendizagem em função de problemas de
vista e, grande parte desses abandonavam os estudos, contribuindo para o aumento
da taxa de evasão escolar.
Na primeira etapa, que aconteceu durante todo o mês de agosto de 2005, fo-
ram avaliadas oitocentas escolas. Foi realizado o diagnóstico em 58 mil crianças em
todo o estado, matriculadas no Curso de Alfabetização e na 1ª série do Ensino Fun-
damental. Para isso, 2.040 professores foram treinados por especialistas da SOB
para realizar o teste de acuidade visual em suas turmas.
Daquele total, cerca de 6 mil alunos foram examinados por médicos oftamolo-
gistas. Destes, cerca de 2.500 necessitavam de óculos e 146, de procedimentos cirúr-
gicos. No início do ano letivo de 2006 as crianças receberam os óculos, fornecidos
gratuitamente pela Secretaria de Saúde. As cirurgias serão marcadas ao longo do
ano por meio do SUS (Sistema Único de Saúde).
A saúde visual é fundamental para os estudantes, mas nem todos os pais conse-
guem detectar o problema nos filhos, e este foi o motivo que levou à realização da
campanha.
“A orientação que damos aos professores é para que eles fiquem sempre alerta.
Percebi que uma menina tinha um comportamento diferente dos demais e pedi à fa-
mília que a levasse ao médico. Ficou constatado haver 7,5 graus de miopia”, afirma a
178 | claudio mendonça
Nesse caso, a dificuldade em retornar pode ser até maior do que a questão con-
creta de ter um filho precocemente, ter de cuidar dele, e ainda conciliar a nova si-
tuação com os estudos. “Muitas adolescentes conseguem. Com muito esforço, mas
elas voltam”, relata.
“Houve o caso de uma menina que já tinha tido a criança há uns 3 meses. Conver-
sando, ouvi dela que não tinha como voltar, pois o bebê estava muito pequeno, além
de ela achar que não acompanharia mais a turma a ponto de conseguir ser aprovada
no final do ano. Nós a convencemos a retornar e se matricular para 2006. Foi uma
grande vitória”, comemora.
Os argumentos para conseguir esse retorno variaram entre o apelo aos senti-
mentos, à afetividade, e a necessidade de ela crescer para educar bem o filho.
“A gente fazia a visita em dupla e brincava: ‘volta, nós estamos com saudades de
você... Por que não está indo? O que aconteceu?’ O primeiro argumento usado era o
da saudade, mas quando a pessoa falava o real motivo da evasão, tentávamos contor-
nar aquele problema, que costumava ser sério. Às vezes víamos que não havia mesmo
condições de ela voltar.”
A estudante revelou também que em vários encontros com os ex-colegas ouviu
relatos de colegas que têm a mãe muito doente e, sem pai em casa para ser o prove-
dor, todo o sustento da família dependia deles. “A gente via na cara do aluno que era
verdade. E aí dava um desânimo...”, lembrou Daiana.
Como último recurso, quando um dos estudantes contava que estava trabalhan-
do fixo, por isso não voltava às aulas, os visitadores tentavam convencê-lo demons-
trando a fragilidade de sua situação: “Argumentávamos: ‘Poxa, você tem o quê, ago-
ra, 18 anos? Daqui a uns quatro ou cinco vão te dispensar e colocar outro de 18 em
seu lugar. E aí você vai fazer o quê? Sem ter estudo, não vai arrumar nada.’ Víamos
que a gente começava a tocar o aluno, fazíamos com que refletisse, mas em geral es-
ses não voltavam atrás. As dificuldades eram grandes.”
Apesar das várias vitórias obtidas, Daiana avalia que o projeto enfrentou pro-
blemas em algumas comunidades em guerra com outra facção, por causa do tráfico
de drogas. “Nesse caso, o principal argumento, para eles e para nós, era a necessida-
de de resgatar esse aluno. Afinal, estava em jogo o seu futuro. A gente falava assim:
182 | claudio mendonça
‘o que você quer para a sua vida? Quer passar o resto dos seus dias trabalhando sem
uma carteira assinada, sem benefícios nenhum, sendo explorado, ou se segurar um
pouco, estudar, ter uma profissão que você gosta e desfrutar de benefícios, garantir
uma renda melhor?’”
Segundo a estudante, eles acabavam convencidos de que a ajuda dada em casa,
com algo em torno de R$ 100,00, na verdade era apenas um paliativo. Eu os fazia ver
que futuramente eles poderiam dar à mãe doente remédios e até mesmo uma casa.
“Era assim que eu falava com eles, que paravam para pensar: ‘Pô, é verdade. Hoje
eu estou trabalhando, sou novinha, consigo esfregar o chão etc., mas e amanhã?’.”
Daiana conta que argumentava com eles que, atualmente, até para ser lixeiro, é pre-
ciso ter o Ensino Médio. “Qualquer emprego exige estudo. É complicado. Não adian-
ta só resgatar o aluno. É preciso também convencê-lo a procurar uma atividade de
meio expediente, que permita a ele trabalhar, ajudar a família sem, contudo, atrapa-
lhar o seu estudo. Ele precisa do dinheiro e se não tiver um trabalho pelo menos de
meio expediente vai se evadir”, disse, acrescentando uma sugestão:
“O estado deveria fazer convênios com empresas, a fim de colocar esse aluno ca-
rente em funções que o possibilite continuar estudando, condicionando-o a tirar
boas notas no final do mês. A maioria trabalha e o maior motivo da evasão é mesmo
o trabalho”, reafirmou.
“Muitas mães vinham chorando e dizendo: ‘Olha, eu queria muito que meu filho
estudasse, mas não dá.’ E nós realmente víamos que não era possível, só pela casa da
pessoa. E como é que fica? Eles precisam comer e pagar o aluguel. Encontrei um me-
nino que largou a escola para ganhar R$150,00 de 7 da manhã até 20h. É uma briga
difícil de vencer, mas o programa recuperou vários”, ressalta Daiana, apontando ou-
tros aspectos positivos do projeto. Um deles, o fato de colocar alunos da mesma idade
e com a mesma linguagem, para conversar com os colegas evadidos.
Ana Regina da Silva, 35 anos, uma das coordenadoras do projeto de Visitadores,
conta que, a princípio, foram selecionadas 140 unidades escolares, levando-se em conta
o número dos que abandonaram a sala de aula.
“Nosso objetivo, claro, era resgatar o maior número deles, no entorno da comuni-
dade. Quanto aos visitadores, seu perfil deveria ser o de um aluno conhecido dentro
solidariedade do conhecimento | 183
daquela comunidade, para que pudesse transitar e ter fácil acesso às diversas famí-
lias. Nesse ponto, foi fundamental a ajuda da associação dos moradores. Nós orien-
távamos os visitadores a se identificar primeiro nas associações, que geralmente di-
ziam se eles podiam ou não entrar naquele momento, se o clima estava favorável ou
não. Afinal, não podíamos expor os garotos ao risco. E, dessa forma, contribuíamos
também para que ele ficasse conhecido ali, para ter um fácil acesso”, contou.
Como coordenadora o papel de Ana era participar semanalmente, com a direção
das escolas, de uma reunião que tinha por objetivo levantar o número de faltosos e
mapear, juntamente com o aluno-visitador, essa lista de endereços. “Tínhamos um
material de identificação que era exibido quando o visitador chegava à casa de um
responsável. Nesse momento era feita uma entrevista e um cadastro do aluno eva-
dido. Eram anotadas todas as suas características e, o mais importante, chegava-se
ao motivo que o fez desistir da escola”, relatou.
Em seguida, era feita uma reunião com o aluno-visitador e, nesse bate-papo, fi-
cava-se sabendo como foi o trabalho e averiguavam-se os problemas dos alunos eva-
didos por meio da ficha de cadastro. O próximo passo consistia em saber da direção
da escola quais os que haviam retornado. Avaliava-se, inclusive, em que casos seria
eficiente uma nova visita, para atingir o objetivo.
“Muitas vezes o visitado não voltava na primeira semana, embora o responsável fi-
casse alarmado com a visita, porque a lei diz que o menor deve estar na escola. Logo, ele
se conscientizava de que estava infringindo esse princípio. O objetivo do programa é
romper essa barreira: a dificuldade da comunidade e dos pais, em dar o acesso à escola.
Acho que conseguimos mostrar aos responsáveis que a escola é também dele. Era como
se disséssemos: ‘Traga seu filho de volta, pois no que puder, vamos ajudá-lo.’”
Em raras oportunidades o coordenador acompanhava o aluno-visitador nessas
visitas. “Em geral, íamos junto quando surgia um problema maior, como no caso de
uma gravidez precoce, em que a aluna não revelaria seu estado à direção, ou a um
professor, por exemplo. Numa situação como essa, ela iria preferir contar a uma co-
lega, com quem se sentiria mais à vontade e mais confiante.”
Nesse caso, após ser informada pelo aluno-visitador, a coordenadora entrava na
questão “para pensar uma abordagem específica”, explicou.
184 | claudio mendonça
ção dela em achar que não havia sido esquecida e que estávamos ali para atendê-la
e ouvir os seus problemas. Ela me explicou que sofria de distúrbios mentais e que
precisou tirar seus filhos da escola para que eles ajudassem nas despesas. Em uma
simples conversa, conseguimos convencê-la de que era importante manter seus fi-
lhos estudando e eles acabaram retomando os estudos.”
O relato de Ana mostra que o Programa de Visitadores procura desmistificar
a idéia de que a escola é algo inatingível. Na verdade, procuramos dizer o contrário:
a escola é para todos. O projeto é abrangente, porque esmiúça as causas da evasão,
levanta o problema e apresenta soluções.
27
Acelera Jovem
Números
Total de alunos que passaram pelo projeto 23.397
Total de alunos que fizeram pelo menos uma prova 13.249
Total de alunos que fizeram cinco provas 9.813
Aprovados em três matérias 2.091
Aprovados em três matérias que foram reprovados em Mat E Cie 1.894
Aprovados em quatro matérias 1.804
Aprovados em quatro matérias que foram reprovados em Mat 476
Aprovados em quatro matérias que foram reprovados em Cie 857
Aprovados em cinco matérias 5.170
Taxas (em %)
Aprovados em cinco matérias em relação ao total 22,1
Aprovados em cinco matérias em relação aos que fizeram pelo menos uma prova 39,0
Aprovados em cinco matérias em relação aos que fizeram cinco provas 52,7
Estimativas
Aprovados em três matérias que serão aprovados em cinco 1.121
Aprovados em quatro matérias que serão aprovados em cinco 921
Taxas finais estimadas (em %)
Aprovados em cinco matérias em relação ao total 30,8
Aprovados em cinco matérias em relação aos que fizeram pelo menos uma prova 54,4
Aprovados em cinco matérias em relação aos que fizeram cinco provas 73,5
28
Outras ações
“Esta mudança é uma muito boa, porque, com minha saúde preservada, posso ter um
desempenho melhor em sala de aula.”
Alguns alunos, que antes até gostavam, hoje não são muito fãs do giz. “Sai aque-
le pó toda hora na mão, eu não gosto”, afirma Larissa Freitas, de oito anos, do Colé-
gio Júlia Kubitschek. Aqueles que já têm algum problema de pele sofrem ainda mais
as conseqüências. É o caso de Gabriel Almeida, da mesma turma de Larissa. Ele tem
9 anos e nasceu com dermatite atópica, uma doença que causa muita coceira. Em
contato com o giz, os sintomas pioram.
Segundo alergologistas, o pó de giz, em contato com a pele, aumenta a coceira,
irrita a pele e faz com que crianças, como Gabriel, tenham mais pruridos e agravem
ainda mais o quadro de dermatite atópica, além de ressecar a pele.
As escolas devem fazer a substituição gradual. Novecentas e sessenta unidades
se inscreveram no projeto. De setembro até dezembro de 2005, 309 colégios de 28
Coordenadorias Regionais já instalaram 4.716 quadros melamínicos. A verba libe-
rada para a substituição foi de R$ 1,2 milhão. Na segunda etapa, serão liberados R$
2 milhões, beneficiando mais seiscentas escolas da rede estadual.
Para comprar as novas ferramentas de trabalho, os diretores receberam os recursos
em conta-corrente e tiveram que obedecer a algumas especificações técnicas. Os novos
quadros têm que ter base de Madeira do Futuro (MDF), ou similar, com aproximada-
mente 10mm, revestida de melamínico branco de 3m x 1,20m, com moldura de alumí-
nio anodizado cor branca e apoio para apagador e canetas em toda a extensão, para fixa-
ção em parede. Além disso, foram feitas pequenas obras de adaptações nas salas.
Outro programa importante é o Escolas de Paz, que, em 2005, completou cinco
anos. A idéia do projeto, como o seu próprio nome diz, é promover a cultura de paz
na comunidade onde as escolas estaduais estão presentes. Durante os fins de sema-
na e nas férias escolares, duzentas unidades colégios da Região Metropolitana, em
áreas onde há maior carência de lazer, abrem suas portas. Cerca de 240 mil jovens,
entre 14 e 24 anos, realizam atividades artísticas, esportivas e de lazer, tomam café-
da-manhã, almoçam e, às vezes, fazem um lanche.
O Escolas de Paz segue orientações do programa Abrindo Espaços, recomen-
dado pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
solidariedade do conhecimento | 193
a Cultura) como estratégia de construção de uma cultura de paz. O estado foi pio-
neiro na implementação das idéias da Unesco. Hoje, várias unidades da federação
também aderiram ao projeto criado pela agência da ONU, que, sem dúvida, consti-
tui em uma estratégia inovadora no combate à exclusão social.
O livro Revertendo violências, semeando futuros – Avaliação de impacto do Programa
Espaços no Rio de Janeiro e em Pernambuco, dos pesquisadores Julio J. Waiselfisz e Ma-
ria Maciel, apresenta uma análise dos dois primeiros anos do Escolas de Paz e as
conclusões são animadoras.
A avaliação abrange 208 escolas de 11 cidades do Rio de Janeiro e 240, de 14 mu-
nicípios de Pernambuco, contemplando, nessa amostra, instituições integrantes e
não integrantes do Programa. Todos os gestores das unidades selecionados respon-
deram a um questionário que permite traçar um termômetro parcial da violência
nessas instituições.
Os resultados do controle da violência, envolvendo a juventude nos dois estados, fo-
ram significativos, proporcionando, inclusive, melhoria nas relações entre alunos e pro-
fessores e entre os próprios estudantes, e aumentando, conseqüentemente, o nível de
aprendizagem nessas áreas. Outra mudança apontada foi quanto ao relacionamento da
escola com pais de alunos e comunidades, diminuindo as depredações das unidades.
Os colégios do Rio, integrantes do Escolas de Paz, apresentaram índices de violên-
cia 16% inferiores às demais unidades do estado. Os incidentes graves de violência nas
escolas chegaram a 0%. Também foram reduzidos os índices de brigas entre estudan-
tes – 56%, em 2001, contra 70% no ano anterior. Os furtos também diminuíram em
27% em contrapartida aos 48% em 2000. O trabalho realizado no Rio vem servindo de
modelo para outros estados. O governo investiu R$ 13 milhões por ano no programa.
A saúde também é alvo do Escolas de Paz. Em parceria com o Ministério da
Saúde, a Unesco, a Coordenação Estadual de DST/Aids do Rio de Janeiro, o Centro
de Educação Sexual e a ONG Cidade Viva, o programa levou alunos da rede a par-
ticipar de eventos e atividades relacionadas à prevenção de doenças sexualmente
transmissíveis e a Aids.
Em 2005, para ampliar o universo cultural de alunos e professores dentro do
programa, a SEE fez uma parceria com a Fundação Theatro Municipal do Rio de Ja-
194 | claudio mendonça
Agradecimentos especiais:
Adelina dos Santos Carlos Guimarães e Equipe
Alba Rodrigues Cruz e Equipe Carolina Graciosa da Fonseca e Equipe
Aluísio Paes Claudia Galindo
Ana Maria Santoria Dalva Borges e Equipe
Ângela Maria da Silva Dalva de Oliveira Kato
Antônio Claudio Oliveira Gomes e Equipe Daniel Silva e Equipe
Antonio Lopes Neves e Equipe Fernanda Abreu
Antônio Mário Figueiredo da Silva Fernanda Lima da Silva
Antônio Olinto Francisco Tadeu Bastos Correa e Equipe
Armando Castelar Giovanni Darienzo
Carlos Alberto dos Santos Carvalho Helena Gilka
Carlos Alberto Serpa Heloísa Maciel e Equipe
202 | claudio mendonça
Coordenadores Regionais:
Coordenadoria: Serrana I
Coordenador: Maria Lúcia Alves Werneck
Gerente de Ensino: Ana Maria Lopes da Silva
Gerente Administrativo: Eunice da Silva Abreu
Coordenadoria: Serrana II
Coordenador: Angela Maria Gomes Ribeiro Fernandes
Assessor: Merilandi Esquitino Silva de Mello
Gerente de Ensino: Lucia Regina Lacerda de Deus Santos
Coordenadoria: Serrana IV
Coordenador: Robson Pereira de Melo
Gerente de Ensino: Lúcia Helena de Oliveira Silva
Gerente Administrativo: Maria Verônica Vieira Silva e Silva
solidariedade do conhecimento | 205
Coordenadoria: Metropolitana I
Coordenador: Maria Aparecida Marcondes Rosestolato
Gerente de Ensino: Mônica de Souza Marques
Gerente Administrativo: Sidney Dias Machado
Coordenadoria: Metropolitana II
Coordenador: Rosita Maria Garrido
Gerente de Ensino: Márcia Fernandes
Gerente Administrativo: Margareth Rodrigues Pinto
206 | claudio mendonça
Coordenadoria: Metropolitana IV
Coordenador: Denise Antonia Benita de Oliveira Schiavo
Gerente de Ensino: Dayse Cardoso Duque Estrada
Gerente Administrativo: Rita de Cássia Duque
Coordenadoria: Metropolitana V
Coordenador: Iraci Martins Áreas Pardal
Gerente de Ensino: Rosimara Carvalho Peixoto
Gerente Administrativo: Feliciana Alves dos Santos
Coordenadoria: Metropolitana VI
Coordenador: Maria Claudia Ciccarino Rocha
Gerente de Ensino: Vilma Rodrigues
Gerente Administrativo: Aline Angélica Severo dos Santos
Coordenadoria: Metropolitana IX
Coordenador: Rosana da Silva Rosa
Gerente de Ensino: Rosimere Magalhães
Gerente Administrativo: Ana Lucia Resende Cardoso
Coordenadoria: Metropolitana X
Coordenador: Glorinha Igídia de Paiva
Gerente de Ensino: Afonso Vargas
Gerente Administrativo: Zilda Maria dos Santos Silva
solidariedade do conhecimento | 207
Coordenadoria: Metropolitana XI
Coordenador: Sonia Maria Pinto dos Santos
Gerente de Ensino: Cristiane Mattos Silveira dos Santos
Gerente Administrativo: Luís Carlos Teixeira da Costa