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O ponto de partida do utilitarismo de Bentham encontra-se na sua crítica à teoria do direito natural
que supõe a existência de um "contrato" original pelo qual os subordinados devem obediência aos
soberanos. Conforme Bentham expõe, a doutrina do direito natural é insatisfatória por duas
razões: em primeiro lugar, não é possível provar historicamente a existência de um tal “contrato”;
seguidamente, porque, mesmo provando a existência ou realidade do contrato, ainda subsiste a
pergunta sobre qual a razão porque o homem está obrigado a cumprir compromissos em geral. Na
sua opinião, a única resposta possível reside nas vantagens que o contrato proporciona à
sociedade. O cidadão, segundo Bentham, deveria obedecer ao Estado na medida em que a
obediência contribui mais para a felicidade geral do que a desobediência. A felicidade geral, ou o
interesse da comunidade em geral, deve ser entendida como o resultado de um cálculo
hedonístico, isto é, a soma do bem comum e dores dos indivíduos. Assim, Bentham substitui
a teoria do direito natural pela teoria da utilidade, afirmando que o principal significado dessa
transformação está na passagem de um mundo de ficções para um mundo de factos. Somente a
experiência, afirma Bentham, pode provar se uma acção ou intuição é útil ou não.
Consequentemente, o direito de livre discussão e crítica das acções e intuições constitui-se em
necessidade da maior importância.
Para sustentar o seu princípio utilitarista, Bentham lutou a vida toda, criticando severamente as
instituições tradicionais e, particularmente, legislação caótica do seu país. O antecessor mais
importante na vida de Bentham foi Beccaria (1738-1794), que também sustentava o princípio da
maior felicidade possível para o maior número possível de pessoas como o objectivo último de
toda legislação. Orientado por esse princípio, Beccaria criticou a existente legislação penal.
Bentham deu àquele princípio uma aplicação ainda mais ampla e por essa razão incompatibilizou-
se com os conservadores. Por outro lado Bentham, também se opôs aos revolucionários franceses,
quando estes apelavam para o direito natural e afirmavam os direitos universais do homem. Para
Bentham, o indivíduo somente possui direitos na medida em que conduz suas acções para o bem
da sociedade como um todo, e a proclamação dos direitos humanos, tal como se encontra nos
revolucionários franceses, seria demasiado individualista e levaria ao egoísmo. Neste sentido
Bentham, explica que, o que deve realmente ser procurado é a reconciliação entre o indivíduo e a
sociedade, mesmo que seja necessário o sacrifício dos supostos direitos humanos.
Em relação a essas questões, é importante salientar a análise de Bentham, sobre os motivos que
levam o homem a agir de certa forma e não de outra. Essas razões devem de ser designados
“bons” na medida em que têm a capacidade de conduzir harmonia entre os interesses individuais
e os interesses dos outros, enquanto que os nomeados “maus” seriam todos aqueles motivos que
contrariassem esse objectivo de equilíbrio entre os homens. Para Bentham, entre os motivos bons,
e o que mais certamente conduz, à promoção do princípio de utilidade, é a benevolência ou boa
vontade. Em consequência, viriam a necessidade de estima dos outros, o desejo de receber amor,
a religião e os instintos de auto preservação, de satisfação, de privilégio e de poder.
A prática do utilitarismo
Bentham não ficou apenas na análise teórica dessas ideias sobre o homem como ser moral e
social. Procurou suas possíveis aplicações práticas, dedicando-se, sobretudo, à reforma da
legislação de acordo com princípios humanos, à codificação das leis afim de que pudessem ser
compreendidas por qualquer pessoa, ao aperfeiçoamento do sistema penitenciário e ao
desenvolvimento do regime democrático através da introdução do sufrágio universal.
Nas suas lutas reformistas, o princípio de utilidade desempenha um papel principal teórico. Na
opinião do historiador Harald Hölffding, Bentham sempre deu por certo e seguro esse princípio,
transformando-o em um princípio dogmático, válido para todo o sempre. Por essa razão, não
sentiu necessidade de investigá-lo mais profundamente, como também não percebeu que podia
contestar a sua própria ideia de forma semelhante, à que ele fez em relação aos defensores do
direito natural. Jeremy Bentham indagou qual a razão porque os homens devem de cumprir
compromissos, assim também se poderia perguntar qual o motivo que os homens deviam
conduzir-se em função da felicidade de todos. Essa verdade sobre este princípio não era assim tão
evidente.