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Padre Fernando Aogusto da Silva

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Paroquia de
Santo Antonio da
Ilha da Madeira
Alguns subsidfos para a sua historla

Ediçio do autor
Funchal
PAROIUIA DE SANTO ABTONIO
Padre Fernando Aogusto da Silva
.-- , , ,, ,.

Paroquia de
Santo Antonio da
Ilha da Madeira
Alguns subsidfos para a sua historla

Ediçio do autor
Funchal
A inolvidavel memoria

DOI IAMUEI AGOSTN


IO
I BARRETO
Ilustre Bispo clo fi$bcizal cle 1877 a 1911

Deszlaliosn mas sentida homenagem,

C.. . Agt'aduu-nos wauito a sua Cicialiffade colig4r algamus


.
gioticias referefites a paroguia d e . . Desde ha o~tuilo
.
1 2 0 s iriculcado esle s e ~ v i ç o . »ias -
seni @to
- atl.
hoje. Oxald que se desperte tio cspirito dos seas c o l e
gas esle desejo e que possa tradiizir-se em factos.. ..h

(Extracto duma carta dirigida, ha 35 anos, ao autor destc


opuseiilo pelo eminenle prelado Dom Mapile1 Warreto)
Origem e criaçáo
da paroquia

A coloi~isaçãoda Madeira começou pelo litoral, r a


pouco e pouco a população se foi alargando para o inte-
rior, estendendo-se pelas lombas, ocupando os vales e
outeiros e até procurando ás vezes lugares invios e
quasi iiiacessiveis. O mesmo se daria certamente nesta
paroquia. Determinar, porém, a epoca em que os primi-
tivos povoadores, afastando-se da orla do oceano, foram
prolongando o roteio das terras e o desbravamento dos
matagais até ás alturas de Santo Antonio não 6 hoje
possivel fazel-o ainda com relativa aproxitnação.
Deve supor-se com bons fundamentos que os terre-
nos circunvisinhos do Funchal fossem sujeitos a uma
quasi imediata exploração agricola após a descoberta,
mas nem sempre o estabelecimento dos povoados anda-
va a par e passo dessas explorações. No entretanto, não
andará muito distanciado da verdade quem supozer que
pouco depois da chegada dos primeiros colonisadores
s e principiaram a arrotear terrenos dentro dos actuais
limites desta freguezia e que se não fez esperar largo
tempo para que alguiis centros de população começas-
sem a surgir num ou noutro polito dela.
Dos primitivos povoadores que vieram colonisar a
Madeira, alguns tiveram terras de sesinaria em Santo
1
2 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Antonio, como João de Braga, de familia nobre e conhe-


cida no reino, e Vasco Gil, senhor do sitio que ainda"
hoje conserva aqui o seu nome e que em 1472 era dos
homens bons da goveraança do Funchal.
Em 1460, segundo o ilustre anotador da$ Sautiades
nir. Terra, fundára Garcia Homem de Sousa, genro d o
descobridor da Madeira, a capela de Santo Ainaro , no
local onde tinha grande fazenda e casa acastelada, como
em outro logar teremos ocasião d e referir, o que nos
leva a acreditar que, nesse tempo, já por aquele sitio
haveria algum começo de população, a par de outros
pequenos nucleos, que porventura se encontrariam dis-
persos em varios pontos da futura freguezia.
Os terrenos que na actuaiidade constitiiem esta
paroquia pertenceram primitivamente á freguesia da Sé,
que entzo alargava a sua vastissima área até ás faldas
dos montes que circuitam o Curral das Freiras, que scí
em I 790 se desmembrou de Santo Antonio.
Quanto á criaçjo desta paroquia, diz-nos o dr.
Alvaro de Azevedo, numa das suas notas á obra d e
Gaspar Frutuoso, o seguinte: a A freguesia de Santo An-
tonio, subiirbana do Funchal foi criada, provavelmente,
pelo mesmo tempo que a de S. Pedro, em 1566, tendo
ambas sido separadas da Sé: indubitavelmente existiu
desde antes de 1574, porque, como se vê do alvará de
16 d e Setembro desse ano foi aumentada a anterior
congrua do seu vigario*. Noutro lugar e noutra obra
fixa o dr. Azevedo a data de 1568 como a do ano da
sua creação.
Escasseiam-nos os indispensaveis elementos para
determinar com absoluta precisão o ano em que se esta-
b:l eczu esta paroquia, mas parece-nos dever remontar a
sua criasão a epoca anterior áquela, ao menos como
curato autónomo, á semelhança de outros que houve
nesta diocese e que constituiam freguesias quasi inteira-
mente independentes e com vida civil e religiosa
proprias. Os assentos mais antigos que encontramos no
respectivo arquivo paroquial são de 1557, e a partir
desta época é regular a escrituraçtío dos termos d e
batismos e casamentos, o que nos leva a supor que data
precisamente deste ano a criaçào dum cuíato.autonomo,
que mais tarde seria elevado defitiitivamente a paroquia
em ano que hoje não se pode fixar.
Neste bispado, e não sabemos se em outros, exis-
tiam curatos independentes e até capelas com pé de
altar k soliduiil e capelães curados, que depois se trans-
formaram em outras tantas freguezias ou antes foram a
verdadeira origem delas. Grandes probabilidades, pois,
para não dizer inteira certeza, militam a favor da nossa
afirmativa, determinando o ano de i557 como o da cria-
ção dum curato, elevado definitivamente a paroquia
pelos anos de I 566.
Pelos respectivos livros do registo se sabe que foi o
padre Gonçalo Jardim Rodrigues o primeiro sacerdote
que no periodo decorrido de 1557 a 1559 desempenhou
aqui as funcções paroquiais, não fazendo nunca indica-
ção da categoria do cargo que exercia. O seu sucessor,
Francisco Afonso, de 1559 a i 569, intitulou-se sempre
cura bem como outros que se lhe seguiram. Torna-se
muito estranhavel que, ainda depois da criação da paro-
quia, que é sem sombra de duvida anterior a 1574, como
se vê num documento deste ano citado em varios luga-
res, continúem alguns sacerdotes que exerciam aqui o
munus 'pastoral a intitular-se curas, e outros ora curas
4 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

ora vigarios, como sucede com Afonso Lopes, de 1585 a


I 586.
Esta paroquia d e Santo Antoiiio tirou a sua deno-
minação da capela do mesmo nome, que existia nas
proximidades da actual igreja paroquial e que prova-
velmente fazia parte dalguma fazenda povoada, como
outras que houve na ilha, dando o seu nome ás terras e
sitios que a circundavam e sendo a origem da futura
paroquia. Quando esta definitivamente se estabeleceu
ou se criou o curato autoilomo, foi aquela capela con-
vertida em igreja paroquial e ficou sendo a séde da
nova freguesia.
É a paroquia suburbana mais antiga do Funchal e
aquela que mais rapidamente se deseiivoiveu, atingindo
em breve uma popalação superior as freguesias citadi-
nas. Ainda hoje é uma das mais vastas e a mais popu-
losa d e todo o arquipelago.
Igreja Paroquial

Antiga.-Corno já fica dito, foi numa capela da


invocação de Santo Antonio, que decerto fazia primiti-
vamente parte duma fazenda povoada, que, por meados
do.seculo XVI, se criou esta paroquia ou ao menos um
curato autonomo, a exemplo de outros que existiram
nesta diocese.
Essa capela, séde da nova freguezia, sofreu com o
decorrer dos anos algumas mí~dificaçõese mesmo acres-
cimentos, mas sendo, apesar disso, ainda insuficiente
para a população, que ia crescendo notavelmente, tor-
nou-se necessaria a construção dum templo d e mais
amplas proporções. O local escolhido foi o terreno, que
fica entre a actual casa paroquial e a estrada publica e
que' fazia parte do passal, cedido para esse fim pelo
paroco de então o padre Antonio Afonso d e Faria,
datando a sua construção do primeiro quartel do século
XVII. No periodo decorrido de 1665 a 1682, se acrescen-
tou a capela-mór e s e construiram as capelas do Santis-
simo Sacramento e das Almas, realisando-se ainda
outros melhoramentos importantes.
Por alvará episcopal de 4 de Junho de 1694 se con-
cedeu licei~çapara ser colocado o Santissimo Sacramen-
to na sua capela, que ha dez ou doze anos começára a
ser construida. Não era um templo de acanhadas dimen-
6 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

sões, pois tinha seis altares, sendo interiormente bem


ornado em obra de talha dourada. Num provimento de
1756 se ihe chama $gweja rica, debaixo do ponto de
vista da sua decoração, mas já nesta epoca estavam os
seus altares velhos e iritproporcionados, segundo o dizer
do mesmo provimento.
Supomos que no fim do seculo XVII ou principio do
seguinte se fizeram na antiga igreja importantes obras
de reedificação ou acrescentamento, pois que no lizdice
Geral do registo lia aanfigaProvedovia da Real Fazenda,
nesta ilha, encontramos referencia ao alvará regio de g
d e Setembro de 1711, que manda continuar as obras da
igreja de Santo Antonio orçadas em 2.233$920 reis.
Não temos dados para afirmar que as obras se tivessem
concluido em conformidade com aquele orçamento, mas
é certo que em diversas epocas se procederam a gran-
des repairos na antiga igreja paroquial desta freguesia.
Com a construção do templo actual se começou a de-
molir a velha igreja em 1785, ficando de pé a capela
do Saritissimo Sacramento, que serviu de paroquial até
o ano de 1789. Junto á residencia do paroco existe
ainda um pedaço de muro que a tradiç8o afirma perten-
cer á antiga igreja.

Actual.-O aumento sempre crescente da popu-


lação e o estado de ruina em que o terramoto de 1748
deixou a igreja, aconselharam desde logo a construção
dum novo P mais vasto templo. Diz uma relação coeva
do terramoto: < A egreja de Santo Antonio no frontespi-
cio tem varias aberturas: a cantaria da porta principal
está desconjuntada e as paredes do 'corpo da egreja
partidas em diversos lugares, como tambem o estão as
IGREJA PAROQUIAL 7

das oficinas, e o que se sente mais é o této que está em


grave dano*.
Apesar da igreja ficar extremamente danificada e
dos diligentes esforços empregados pelo respectivo pa-
roco de então, o dr. Antonio Pereira Borges, a cons-
trução do novo templo só começou em 1783, isto é, 35
anos depois daquele g r a d e abalo de terra. O lugar
preferido foi uma courela quasi contigua á antiga igre-
ja, constando da tradição que, não se encontrando ter-
reno suficientemente seguro nas escavações para ai se
foimar o alicerce das paredes, se lançaram nos funda-
mentos grandes troncos de castanlieiros e sobre eles
os primeiros blocos de pedra que serviram d e base aos
muros do novo templo. Pode isto constituir novidade
para a Madeira, onde, a pequena profundidade do sólo,
se descobre sempre terra firme e segura, mas não em
outros lugares em que a natureza dos terrenos obriga a
fançar mão daqueles e doutros processos semcl\iailtes.
Levou seis anos esta construção, que foi dada por
concluida em 1789, embora ainda por alguns anos con-
tinuassem os trabalhos da ornamentação interior da
igreja e em especial dos altares. Foi fiador e inspector
das referidas obras o olferes Aiitonio Francisco da Cruz
Camacho, que faleceu no sitio da Ladeira desta fregue-
zia a 21 de Agosto de 1815. Teve sepultura debaixo do
arco da capela-mór, em cuja pedra tutnular se lê este
epitafio: Sepultl.tra do alferes Atztoizio P~rnzzciscoda O u o
Gmacko è de sua wr~llhere j l k o s e heva'ciros, o ptal foi o
fiador e iizspector desta igreja, qur teve seu pri?zc@o no
anno de 1783 e se concluizd em 1 7 8 9 Mostrou sempre a
maior dedicação e desinteresse pelo adiantamento das
obras, que por vezes prosseguiram com grande lentidão,
a PAKOQUIA DE SANTO ANTONIO

embora 'por motivos extranhos á sua vontade, devendo-


se grande reconhecimento á sua memoria pelo inexcedi-
vel zelo que desenvolveu em favor do completo acaba-
mento desta igreja.
No frontespicio e sobre a porta principal está utna
lapide onde se encontra a seguinte inscrição:
ANTONIO LUSITANORUII
PROTECTOR1 TEMPLURI DEDI-
CAT AUG. REG. MARIA PRI-
hIA ILLIUS LIBEKAI.ITATEM
EFFUNDENTIBUS SUIS IN
HAC INSULA AB AERA-
RIO AD I11INISTRIS. AN-
NO MDCCLXXXIII
Apesar do serviço religioso começar a realizar-se
no riovo templo em 1789, o seu definitivo acabamento
interior levou ainda largos anos. Os trabalhos da capela
d e Nossa Senhora de Guadalupe só foram dados por
terminados em 1798, a capela-mór ainda em 1801 não
eçtava de todo acabada e a conclusão da capela do San-
tissimo Sacramento sòmente se deu no principio do se-
culo XIX.
Em 1850, sendo governador civil deste distrito o
conselheiro José Silvestre Ribeiro e por seu mandado,
realizaram-se importantes obras nesta igreja, que con-
sistiram principalmente no assoalhamento da capela-
mór, reparaç0es nas paredes e torres. retelhamento de
todo o templo e outros pequenos repairos. Tambem
em 1852 se introduziram alguns melhoramentos d e rela-
tiva importaacia na casa do lavatorio e noutras depen-
dencias da igreja.
IGREJA PAROQUIAL 9

Nunca tinham sido concluidos os campanarios e foi


em ISSO que o conego Feliciaao Teixeira, deputado
por esta ilha, conseguiu do governo central a verba
necessaria para o acrescentamento das torres e seu defi-
nitivo acabamentó. As respectivas obras só se realisa-
ram e concluiram em 1883.09 corucheus das torres não
foram construidos com a indispensauel solidez, pois que
um golpe mais rijo d e vento derrubou o do lado sul a S
de março de 1899, havendo i~ecessidadedc apear-se o
do0.1 norte, por não oferecer seguras garantias de
resistencia.
Em 1821 iniciaram-se nesta Igreja Paroquial impor-
tantes melhoramentos, que ainda prosseguem,*contan-
do-se entre eles a reconstrução das torres, de que tudo
darémos larga e completa noticia em outro artigo deste
livro. Depois da primitiva construção, são estas as obras
de maior vulto realisadas neste terriplo, em que se teem
dispeadido avultadas somas, provenientes da exclusiva
generosidade dos habitantes desta freguesia.
C u r r a l das Freiras

O Curral das Freiras até o ano de 1790, em que foi


desmembrado da freguesia de Santo Antonio, fazia
parte integrante dela, sendo portanto comum ás duas
par:quias,atè o ano referido, todos os acontecimentos
que possam interessar á hjstorja de amhas.
Fica o Curral situado no interior da ilha e assenta
no fundo da cratera dum extinto vulcáo, segundo varios
geologos o afirmam. Para alcançar este logar, mister é
subir altas e ingremes montanhas e descer pelas decli-
vosas ravinas que circuitam o profundo vale, que se
mostra como um Ilorroroso e insondavel abismo, ao ser
observado dos pincaros da serrania. E talvez o ponto da
Rladeira em que a natureza se apresenta mais notavel-
mente grandiosa e de aspectos mais surpreei~dentes,
pela grande elevação e forma caprichosa dos montes,
pelo alcandùrado e aprumo das encostas, pelos desfila-
deiros e abismos que se encontram disseminados por
toda a parte; pelo tom agreste e selvagem da paisagem,
o que tudo dá ao conjunto um ar de tamanha grandeza
e majestade e d e tão extraordinaria e encantadora bele-
za, que o visitante, ainda o menos apercebido e sensivel,
fica surpreso e estatico ao deparar com este scenario de
tantas e tão incomparaveis maravilhas. vimos um bo-
queirão, diz um distinto escritor, de muitos metros de
CURRAL DAS FREIRAS II

largo e cortado quasi a pique, voragem espantosa, cavi-


dade imetísa em volta da qual, excepto pelo sul, se er-
guem pincaros titanicos, de fantasiosos perfis, e, no
.
kindo do abismo. . » a miniatura campesina d e um
paraiso. . . Sobranceiros ao Curral das Freiras, ficam
alguns dos mais elevados picos da Madeira, sobresaindo
entre todos o conhecido Pico Ruivo, que se eleva a
uma altitude aproximada de dois mil metros acima do
nível do mar. Em inumeras obras nacionais e estrangei-
ras se encontram largas referencias ao Curral, tendo
sido este lugar bastante visitado por muitos homens
ilustres e entre eles alguns que se notabilizaram nos
dominios das sciencias e das letras.
Nos tempos primitivos da colonização teve apenas
o nome de:Curral, que lhe provinha do facto d e ser um
centro de abundantes pastagens. d e gado lanigero e
caprino, que pastores entregando-se a uma vida quasi
nómada, por ali pastoreavam livremente os seus reba-
nhos. Foram-se-lhe reunindo alguns escravos, que,
fugindo do povoado, alcançaram ali a sua carta de alfor-
ria, e tambem varios criminosos escapados á acção da
justiça, formando-se deste modo um pequeno nucleo de
povoação naquele longíquo e apartado ermo, que a dis-
tancia e as dificuldades das comuuicações, através de
montes fechados de arvoredo e semeados d e perigosos
abismos, tornavam quasi inacessivel. Começou depois o
arroteamento e cultura das terras e já nos principios
do seculo xvr hav~iaali um pequeno centro d e popu-
lação de habitantes de moradia fixa e legalmente coiis-
tituida. Deixou então d e ser um valhacoito de fora-
gidos e criminosos. Teve pouco desenvolvimento este
primitivo nucleo de população, pois que em 1794 e r a
12 PAROQUIII DE SANTO ANTONIO

apenas d e cento e dez o numero dos seus habitantes.


Em 1480 eram proprietarios do Curral, Rui Teixei-
ra e sua mulher Branca Ferreira, que tinham residencia
no Campanario. Foi a 11 de Setembro deste ano que
celebraram a escritura d e venda desta vasta proprieda-
de ao segundo capitão donatario do Funchal, João Gon-
çalves da Camara, propriedade cuja área se estendia
4 desde o Passo da Cruz e Ribeirão dos Socorridos até
onde ela nasce de arrife a arrife, de uma a outra banda?.
O preço desta compra foi de <<23$500reis de cinco
ceitis ao real e 50 cruzados de ouro, valendo 380 reis
cada um>>. Destinava o capitão donatario esta aquisição
de terrenos á dotação que fez a suas filhas T3. Elvira e
.D. Joana, quando estas professaram em Santa Clara,
mosteiro qu6 o mesmo donatario fundara em 1492, en-
trando para ele as primeiras religiosas em 1497. Deve
ter sido realizada no periodo decorrido de I492 a 1497
a dotação do Curral, que a partir desta epoca passou a
denominar-se Curral das Freiras.
Em 1566 foi a cidade do Funchal saqueada por cor-
sarios francêses luteranos, d e que falam com tanto
horror as antigas cronicas madeirenses. As freiras de
Santa Clara viram-se forçadas a abandonar o seu con-
vento para não serem victimas daquela horda de selva-
gens, e, como diz Frutuoso, * sahiram por entre os ca-
iiaviaes e, se acolheram e não pararam até ao seu
Cuurnl, que dista bom pedaço da cidade, e assim se
foram sem salvar nenhum ornamento, deixando tudo tio
mosteiro, salvo a custodia do Santissimo Sacramen-
to. . . ». Os francêses permaneceram no Funchal, na sua
faina de destruição e de matança de 3 a 17 de Outubro,
e Ibgo depois da sua saida desta ilha deixaram as reli-
CURRAL DAS FREIRAS 13

giosas o Curral, recolhendo-se ao seu convento, na cida-


de. Não sabemos se já então tinham as freiras de Santa
Clara construido 110 Curral a capela de Santo Antonio,
que ali existiu até meados do seculo passado e que era
pertença do mesmo mosteiro.
Ignoramos quando se estabeleceu no Curral um
nucleo de população permanente, mas conjecturamos
que a colonisação com habitantes de moradia fixa sb se
começou a fazer no primeiro ou segundo quartel do
seculo xvrr. Afirma-se aque tão dificil era o ingresso tio
Curral, que se tornou no tempo da colonisação como
que um local de guarida para onde fugiam varios escra-
vos escapados á furia dos seus senhores e ali cotistitui-
ram o nncleo duma mestiça população~.
É hoje dificil, senão impossivel, determinar ainda
aproximadamente, o tempo em que principiou a ser
regularmente povoado o Curral das Freiras. A referen-
ria mais antiga que eiicontro aos seus nloradores, como
povoação d~finitivamenteconstituida, é d e 1635. Deve-
ria no entretanto scr bastante limitada a sua população,
pois que em 1794, já depois da criação do curato d o
Curral, contava ele apenas I IO habitantes, como acima
deixamos dito.
Antes do estabelecimento da paroquia, teve o
Curral seus capelães privativos com residencia mais ou
menos permanente ali, sendo em 1687 passada carta de
capelão ao padre Cristovão Vieira. O serviço religioso
fazia-se na capela d e Santo Antonio, pertencente ao
mosteiro de Santa Clara como já referimos. Na visita
que o visitador episcopal dr. Antonio Mendes de Almei-
da fez á igreja de Santo Antonio no ano de 1756, deter-
minou que se avisasse a abadessa de Santa Clara para
I4 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

prover aquela capela dos objectos necessarios ao exer-


cicio do culto, como a isso se obrigara, sob pena de
procedimento ulterior.
No Index Geral cio registo rln antiga Provedoria da
Real Fasenda desta ilha, encontramos o seguinte: Alva-
rá da senhora rainha D. Maria I d e 17 d e Março de
I790 da criação da nova igreja d e Nossa Senhora d o
Livramento na ermida de Santo Antonio do Curral das
Freiras e Fajã dos Cardes, desinembrando-se da fregue-
zia de Santo Antonio e ficando filial da mesma fregue-
zia, com ordenado anual de 8oSooo reis, I moio - d e
trigo e meia pipa de vinho ao novo paroco,.
Ha visivel engano no anotador das Sauda~les dtz
Terra, quando afirma que a paroquia ou curato .do
Curral foi criado na ermida de Santa Quiteria, como
veremos no artigo que consagraremos a esta capela. Foi
na pequena ermida d e Santo Antonio que se criou a
nova freguesia do Curral e ali teve a sua séde até aos
primeiros anos do seculo XIX, em que se coiistruiu a
actual igreja paroquial.
Vigairaria e C u r a t o

Em tempos idos, andava tão estreitamente ligada a


vida civil e social á vida religiosa que á criação duma
freguezia correspondia logo a criação de uma vigairaria
com o seu respectivo cura de almas. Em Santo Antonio,
ao estabelecer-se a paroquia ou um curato autonomo,
que quasi significa o mesmo, implicitamente trouxe esse
facto a criação da vigairaria, em ano que não podemos
fixar com al>soluta exactidão pelos motivos que já
cxpuzémos 110 artigo Criaçâo da Paroquia.
Não sabemos o nome do primeiro sacerdote que
aqui exerceu as funções paroquiais, mas o mais antigo
d e que temos noticia foi o padre Gonçalo Jardim Rodri-
gues, na periodo decorrido de 1557 a 1559. Ignoramos
tambem a congrua que fora arbitrada aos primeiros
curas d e almas, congrua que era então proporcional ao
numero de fogos de cada paroquia.
Sòmente a partir d e 1574 é que podemos fixar o
qúanturut das respectivas congruas, em vista dos diplo-
mas que encontramos citados no I n d e ~geral do registo
da antiga Provedoria da Fazenda Reenl neste arquipe-
lago.
O mais antigo desses diplomas é o alvará regio d e
D. Sebastià;~,de 16 de Setembro de 1574, passado a
favor do paroco Antonio de Lima e seus sucessores,
I6 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

elevando a congrua anual, que era então de 13$3oo


a'asbooo reis, tambem anuais, visto já ter a paroquia
atingido o numero de 120 fogos.
Esta congrua foi sucessivamente aumentando e
decerto em conformidade com o movimento sempre
crescente da poputação, Como se vê dos seguintes di-
plomas: alvará de 7 de Julho de 1588 acrescentando 30
alqueires de trigo á congrua anterior de 25Sooo reis;
alvará de 14 de Dezembro do mesmo ano aumentando a
importancia de &o00 reis anuais pelas missas dos saba-
dos pelas almas dos infantes; alvará de 26 de Agosto de
1645, alterando a forma do pagamento da cougrua, que
passou a ser de ~oo$oooreis em dinheiro e duas e meia
pipas de 'vinho; e finalmente o alvará de I de Outubro
de 1775 acrescentando dois moios de trigo á congriia
fixada no diploma anterior. Outras modificações sofre-
ria o quailtitativo das congruas dos parocos desta fre-
guezia, mas delas não temos conhecimento. A carta d e
lei de 26 de Maio de 1845 alterou, profunda mas não
equitativamente, a distribuição das congruas nesta dio-
cese, mas não tendo porém a tabela anexa arbitrado o
vencimento do paroco de Santo Antonio, devido certa-
mente a lapso ou inadvertida omissão. A coiigrua supri-
mida pelo decreto de 20 de Abril de 191I era de
20oSooo reis anuais.
O desenvolvimento da população com o seu corre-
lativo serviço paroquial levou o bispo diocesano D.
Luiz Figueiredo de Lemos a impetrar o estabelecimento
dum curato nesta. freguezia, cujo deferimento se deu
por alvará de Filipe 11 de 29 de Outubro de 1602, que
autorizou a criação deste lugar, sendo nele provido o
padre Domingos Braz.
VIGAIRARIA E CURATO 17

O seu vencimento era primitivamente d e zo$ooo


reis anuais em dinheiro e d e uma pipa de vinho. Esta
congrua foi acrescentada com um moi0 de trigo pelo
alvará de 14 de Agosto d e 1609. A já citada carta d e lei
de 26 de Março de 1845 fixou ao curato desta freguezia
a congrua d e 2o$ooo reis em dinheiro e ama pipa e 1 5
almudes d e vinho e um moio e 30 alqueires de trigo.
b decreto de 20 de Abril d e 1911 suprimiu a ultima
congrua, que era d e 130$620 reis anuais.
Temos razões para acreditar que os curas foram,
em determinada epoca, d e apresentação regia, pois
vemos que o cura Fernão Gomes se assinava curo pua.
prietario por el-rei, e tambem cara cofizfirmndo,e encon-
'tramas citado o alvará regio de D. João IV, d e 18 d e
Dezembro d e 1648, em que é apresentado cura desta
freguezia o padre Francisco d e Gouveia.
Embora não possamos afirmar, como verdade ave-
riguada, que a antiga Capela de Santo Antonio, em que
foi instituida a paroquia, tivesse tido seus capeiães pri-
vativos, anteriormente á criação da nova freguezia,
todas as probabilidades nos levam, porém, a julgar que
assim pouvesse acoiltecido, fundando-nos para esta su-
posição em muitos factos identicos, que se deram com
fazendas povoadas e nucleos de povoaçào muito infe-
riores em importancia a Santo Antonio pela sua situa-
ção e numero de seus habitantes.
Parocos

Na relação, que em seguida apresentamos, dos pa-


rocos desta freguezia, indicamos os anos em que aqui
exerceram as funções paroquiais, acrescentando as cir-
cunstancias pessoais que ácerca de cada um deles pudC-
mos obter.
Goncalo Jorge Rodrigues de I 5 57 a I 5 59.É o pri-
meiro sacerdote de que temos noticia haver desempe-
nhado funções eclesiasticas iiesta freguezia, sendo
possivel que antes dele, a admitir a existencia da fre-
guezia ou dum curato autonomo anterior ao ano de
I 5 57, outro ou outros exercessem iguais funções, como
se poderá vêr no artigo Crençdo da Pnroquin.
Francisco Afonso, I 5 59-I 569.
Miguel Rodrigues, I 569-I 573..
Manuel Lopes, 1573.
Vicente Afonso, r 571
Afonso de Leme, 1574-1 575.
Domingos Fernandes, I 575- I 584.
Antonio Lopes, 1584-1586. Foi em seguida vigario
de S. Roque.
Domingos Fernandes, I 586.I 596.
Fernão Gomes, I 596-160I.
Gaspar Moreira, i601 -1Go3.
Domingos Braz, 1603-1605. Foi o primeiro cura
desta freguezia em 1602.
Luís Gomes, 160j- 1606.
Antonio Afonso d e Faria, 1606-1627.
Pedro Borges, 1627-1636.
Inacio Spranger Bazalir, 1638.1647.Passou a cone-
go da Sé do Funchal.
Dr. João d'Araujo, 1648.
Pedro Alvares Pereira, 1648-1649.
Bartolomeu Soares Serrão, 1649.
João Simão de Abreu, 1649-1653.
Manuel Pereira da Silva, 1653-1655.
Dr. Francisco de Castro, 1656. Foi afamado prèga-
dor do seu tempo e exerceu diversos cargos importaii-
tes. Diz dele Barbosa Machado nci Biblioteca Lusita~ztr:
«Francisco de Castro, natural da cidade do Funchal,
capital da ilha da Madeira, presbitero de vida inculpri-
vel, mestre em artes, doutor em Teologia pela Universi-
dade de Evora, onde foi colegial do colegio tfa Purifica-
ção. Foi vigario da coiegiada de S. Pedro da cidade do
Funchal, dondc passando a Cabo Verde a buscar reine-
dio para o mal da lepra passou a melhor vida em o ano
de 1665.De muitos sermões que prègou, shmeiite s e fi -
zeram publicar Seruttdo da Cojzceiçuo de Nossa SerzAoua,
Rochella, 1656 e Serunüo da Visitaçdo da &'de de Detts,
Rochella, 1655.
Inocencio diz no seu ~DicioiiarioBibliografico)~que
esses sermões são rarissimos, pois que não deparou
com exemplar algum deles. NO arquivo desta igreja pa-
roquial d e Santo Antonio existe um exemplar do pri-
meiro destes sermões, que foi prégado na igreja de
S. Pedro, no dia da festa de Nossa Senhora da Con-
20 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

ceição do ano de 1653, por ocasião de celebrar a sua


primeira missa o presbitero Matias de Aguiar de Mene-
zes. É um discurso em que o autor revela incontestavel
talento, mas escrito no estilo gongorico da epoca, a
que nem o genio do proprio padre Antonio Vieira se
poude subtrair inteiramente.
Dr. Manuel da Costa da Silva, 1657. Foi apresenta-
do nesta igreja por carta regia de 6 de Março de 1652
e tomou posse dela a 18 de Marco da 1653, mas sòmen-
te exerceu o munus pastoral no ano referido.
Manuel Pereira da Silva, 1657-1660.
Dr. João de Araujo, 1660-1677.Foi conego da Ç t
do Funchal e vigario geral deste bispado.
Antoiiio Fernandes Pimenta, 1678-1679.
Dr. Lourenço Franco de Azevedo, 1679-1694.Foi
apresentado nesta igreja por carta regia de 16 de Se-
tempro de 1678 e tomou posse a 12 de Abril de 1679.
Ausentou-se da p a r o q ~ i aem Setembro de 1692 para
Lisboa e não voltou mais á freguesia.
João de Barros Ferreira, 1694-1696.
Dr. Estevão 1,omelino de Vasconcelos, 1696.1697.
João de Barros Ferreira, 1697- I 708. Apresentado
por carta regia de 12 de Março de 1695 e apossado a
12 de Abril do mesmo ano.
Cristovão Moiiiz de Menezes, 1709-1730.
Manuel Marques de Moura, 1730-173I .
André Escorcio Drumond, 1632-1737.
Dr. Antonio Pereira Borges, 1738-1772.Foi o paro-
co que por mais largo periodo de tempo esteve na
direcção espiritual desta freguezia. Aqui faleceu a 7 de
Outiibro de 1772.
PAROCOS 21

João Paulo Berenguer, como vice-vigario, d e 14 de


Abril de I772 a Junho de 1773.
Domingos Gomes da Cruz, 1773-1775. Por morte
do vigario colado Dr. Antonio Pereira Borges, foi esta
igreja posta a concurso, aparecendo oito opositores e
sendo classificado em primeiro lugar o padre Domingos
Gomes da Cruz e logo despachado em Janeiro de 1783.
' ~ i n h asido vigario da Madalena do Mar, cuja pobreza
contemplou no seu testamento, «deixando tambem por
luctuosa ao ex.'"O e rev.' sr. bispo um bocado de cordão
de ouros. Morreu nesta freguesia a 2 de Junho de 1775.
João Paulo Bereaguer, 1775-1776. Foi conego da
Sé do Funchal.
Padre Antonio Savier, I 776- I 797. Posta a igreja a
concurso por morte do seu antecessor, apareceram 12
opositores a ela, sendo em Junho de 1775 despachado o
padre Antonio Xavier. Deixou esta igreja em 1797 por
ter sido nomeado conego da Sé do Funchal.
Leandro José Spinola de Macedo, 1798.
Pedro Marques Caldeira e Campos, I 798- r 807. Fa-
leceu nesta freguesia a 26 de Agosto de 1807.
Manuel José Pereira de Sousa, 1807- 1808. Foi cura
desta freguezia e como tal prestou relevantes serviços
na construção da capela de Nossa Senhora de Guadalu-
pe, como se verá no artigo subordinado a este titulo.
Morreu nesta paroquia a 21 de Junho de 181I.
José Joaquim de Sousa, 1808. Tomou posse a 10
de Janeiro deste ano.
José Marques Velosa, I 808- I 8 10 Foi vigario cola-
do do Monte e em seguida encomendado nesta de
Santo Antonio, onde depois foi apresentado. Faleceu
nesta paroquia a 5 de Outubro de 1810.
22 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

José Joaquim de Sousa, 1810-1814.Foi em seguida


apresentado na igreja paroquial do Monte.
Francisco João da Silva, 1814-1815.
Fr. Antonio Joaquim Correia, 1815-1817.
Antonio Joaquim Batista, 1817-1821.
Januario Vicente Camacho, 1821-1825.Era vigario
colado na Serra d'Agua quando foi nomeado vice-viga-
rio de Santo Antonio. Apresentado mais tarde pelo go-
verno bispo de Castelo Branco e do Funchal, não
chegou a ser confirmado pela Santa Sé. Militalndo acti-
vamente na politica, exerceu importantes e elevados
cargos como os de deputado, par do reino, deão da
nossa Sé, governacfor dos bispados do Funchal e Angra,
etc. Representou a Madeira em cortes na legislatura de
1848 a 185 I e foi deputado substituto em algumas legis-
laturas anteriores, sendo elevado ao pariato em 1851.
Faleceu em I.isboa a 22 de Dezembro de 1852.
Frailcisco Rodrigues Camacho, 1825.
Manuel Joaquim de Oliveira, 1825-1829.
Manuel Joaquim de Freitas. 1830.
Alexandre Alvares da Silva, I 830- 1834. Por carta
regia de 8 de Janeiro de 1840 foi apresentado num dos
curatos da Sé Catedral e depois conego da mesma Sé.
liorreu a 2 1 de Maio de 1878.
Manuel Joaquim de Sousa Gouveia, 1834-1841.Era
natural da freguesia da Ponta do Pargo. Foi procurad6r
á Junta Geral do distrito. Faleceu nesta freguezia de
Santo Antonio a 10 de Julho da 1841.
João Pedro dos Santos, 1841.1858. Foi apresentado
nesta freguesia por carta regia de r7 de Agosto de 1841
e exercia então funções paroquiais no Caniço na quali-
dade de vice-vigario.
José Maria de Faria, 1855-1860. Era um musico
abalisado. Desta freguesia passou para S. Martinho por
permuta que fez com o padre Claudio João Ferreira.
Claudio João Ferreira, I 860-1868. Foi em seguida
tonego da nossa SC.
Agostinho Teodoro Pita, 1868.1869. Nasceu na fre-
guesia da Ponta do Sol a 28 de Agosto d e 1800. Sendo
vigario da Quinta Grande foi transferido para Santo
-Antonio. Faleceu a 16 de Fevereiro d e 1878.
Teodoro TJrbano Ferreira Pita, 1869-1897.Nasceu
na Ponta do Sol a 25 de Maio d e 183 r e ali jaz sepulta-
do, tendo falecido nesta freguesia de Santo Antonio a 12
de Novembro de 1897.
Teodoro João Henriques, I 897-1900. Foi, imediata-
mente antes, cura desta freguesia desde 1888.Nasceu no
Funchal a I 5 de Novembro d e 1861 e faleceu a 6 de Ou-
tubro de 1912.Dele nos ocuparemos em artigo especial.
Frederico Augusto de Freitas, 1900-1905.Nasceu
no Funchal a 24 de Março de 1850 e morreu nesta fre-
guesia a 25 de Janeiro de 1906. Era vigario colado d e
S. Vicente e foi apresentado em Santo Antonio por
carta regia d e 27 d e Julho de 1899.
Joaquim Teixeira, 1906-1908. Era cura desta fre-
guesia desde 1901, passalido a vice-vigario por morte
do antecessor. Nasceu na freguesiá do Monte no ano d e
1872 e é actual paroco da freguezia da Tubúa.
Ferilando Augusto da Silva, paroco actual. Foi
apresentado por carta regia de 27 de Junho de I907 e
assumiu a direcção da paroquia a I de Junho de 1908.
Curas

O desenvolvimei~tosempre crescente da população


e portanto o correlativo aumento dos serviços religiosos
levaram o bispo D. Luís Figueiredo de Lemos a impe-
trar a criação dum curato nesta freguesia, o que perfei-
tamente se justificava com o já importante nucleo de
população existente no Curral das Freiras, que distava
algumas leguas do centro da paroquia. D. Filipe 11, por
alvará de 29 de Outubro de 1602, criou o curato de
Santo Antonio com a coiigrua aiiual de ~O$OOO reis em
dinheiro e de uma pipa de vinho, sendo nele provido o
padre Domingos Braz.
Os sacerdotes que nesta freguesia tcem exercido o
cargo de cura são os que em seguida apresentamos,
com a indicação dos anos em que aqui desernpenha-
ram as suas funções paroquiais.
Domingos Braz, 1602- 1606.
Fernão Gomes, 1606-1610.
Francisco Dias, 161I.
Matias Lopes, 1612.
Pedro de Faria, 1615-1632.
Jeronitno Vieira, 1632. Era licenceado em teologia.
Manuel Fernandes, 1634-1647. Deixou o curato
por ter sido nomeado paroco da freguezia de S. Roque.
CURAS 25

Francisco Adão, 1648.


Francisco de Gouveia, 1649-1666.
Antonio Fernandes Pimenta, 1668-1678. Foi em se-
guida paroco durante alguns mezes, voltando iiovamcn-
te a desempenhar o lugar de cura.
Sebastião Gomes de Oliveira, 1678.
Antonio Fernandes Pimenta, 1679-I 700. Era natu-
ral desta freguesia e aqui faleceu a 8 de Julho de 1700.
Foi o doador das terras do passa]. Serviu esta paroquia
por mais de trinta anos.
Francisco da Costa Pereira, I 700- I 7 12. Morreu
nesta freguesia a 3 de Março de 1714, dizendo-sc no
respectivo assento de obito .que não fez testamento por
não ter de quê>.
Manuel Rodrigues, I 726- 1730. Era natural desta
paroquia, onde faleceu a 17 de Junho d e 1746.
Lucas Pereira de Oliveira, 1730-1780. Foi o sacer-
dote que por mais largo tempo desempenhou aqui as
funções paroquiais, tendo servido esta freguesia duraiite
o longo periodo de cincoenta anos. Aqui morreu em
avançada idade a 6 de Fevereiro de 1787.
RZaiiuel João Pereira de Sousa, I 782- I 807 Faleceu
nesta paroquia a 21 de Junho de 181I. No artigo iiititu-
lado Nossa Selzhot-a de Guadalupt., se fará deste sacerdo-
te mais larga e honrosa menção.
Josó Antonio Gomes, 1807-1814. Era filho de Aires
~ o m e se de Antonia Gomes. Morreu nesta freguesia a
31 de Dezembro de 1814. Deixou nas suas disposições
testamentarias o legado de 200,$000 reis á capela de
Santo Amaro destinado á compra de paramentos.
João Nepumeceno Camacho, 18I 5 - 1828. Era natu-
ral desta paroquia. Morreu na freguesia dos Canhas.
26 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Valerio Antonio Camacho, 1828. Nasceu nesta fre-


guesia a 6 de Marco d e 1799 e era filho do alferes Aa-
tonio Joaquim Rodrigues e d e Ana Joaquiua Rodrigues.
Foi mais de vinte anos paroco da freguesia de Camara
de Lobos, onde faleceu a 8 de Agosto de 1856.
Pllanuel Joaquim d e Freitas, 1829. Passou a vice-
vigario e voltou a servir de cura.
Manuel Joaquim de Freitas, 1831-1834.
Francisco Antonio d e Gouveia, r 834- I 868. Nasceu
no sitio do Salão desta freguesia a 21 de Maio d e 1793
e era filho de Gregorio Antonio d e Gouveia e de Maria
Quiteria de Gouveia. Morreu, sendo cura desta paro-
quia: a 8 de Junho de 1868.
João Antonio de Caires, 1870. Era vigario colado
dos Canhas.
Henrique Modesto Betencourt, I 87 I -1888. Passou a
sacristão-mór da Sé Catedral e depois a conego da
mesma Sé.
Teodoro João Henriques, I 888-I 897. Passou a vice-
vigario.
Antonio h'iarcolino, 1898. Nasceu na ilha d e S3o
PlIiguel no ano de 1874 e ali faleceu em Dezembro d e
I91 I.
Fausto Lopes Ribeiro, 1898-1899. Era natural do
continente português. Foi conego da Sé d o Funchal e
paroco na freguesia de Santa Cruz, onde morreu a 7 de
Abril de 1928.
João Correia, IW. Nasceu na freguesia d e S. Mar-
tinho e ali faleceu, sendo paroco, a 6 de Janeiro de
1921.
Joaquim Teixeira, I W I - 1906. Passou a vice-viga-
rio.
CURAS 27

Antonio de Gouveia e Freitas, 1906.É actual paro-


co da Ponta do Sol.
João Prudencio da Costa, cura actual desta paro-
quia, desde o ano de 1906
Telesforo Lourenço da Costa, actual cura-coadjn-
tor desde 1906.
O serviço religioso da paroquia d e Santo Antonio,
que vai sempre notavelmente aumentando em virtude
do grande desenvolvimento da sua população, justifica
inteiramente a nomeação dum cura-coadjutor, que esta
freguesia tem tido desde o ano de 1906até ao presente,
sendo o padre Telesforo Lourenço da Costa o primeiro
sacerdote que exerceu este cargo eclesiastico.
Damos em seguida a relação completa dos sitios ou
bairros desta freguesia, conservando-lhes a niesma de-
nominação e a mesma ordem com que se encontram
inscritos nos artigos rois paroquiais. É certo que dentro
dos limites destes sitios se conservam na tradição local,
outros nomes para designar algum ou alguns tratos d e
extensão mais ou menos consideravcl d e terreno, mas a
nomenclatura geralmente adotada e que até pode dizer-
se de caracter oficial é aquela que a seguir apresenta-
mos.
Casas Proxifi~~us.-Tira o seu nome das primitivas
habitações que se constituiram em torno d o primeiro
nucleo de população, formado provavelmente por uma
fazenda povoada com capela, conforme dissémos no ca-
pitulo Criuçno da paroqltia.
Ficam neste sitio a igreja paroquial, casa de resi-
deiicia do respectivo paroco com seu passa1 anexo,
uma escola oficial do sexo feminino, uma caixa postal
que permuta correspondencia diaria com. a estação
central d o ~ u n c h a le um marco fontenario que come-
SOU a fornecer agua ao publico a 18 de Maio de 1909.
Encontra.se neste sitio a quinta chamada de Santo An-
tonio.
3O PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

temente o nome de João Boto, que foi um dos primeiros


colonisadores desta freguesia e que neste sitio teve
terras de sesmaria, dando-lhe o seu proprio nome, que
ainda hoje conserva, embora corrompido em Jamboto.
Neste sitio se encontra uma fonte de agua ferruginosa e
tem 309 moradores.
~ontes.-É provavel que algumas fontes ou nascen-
tes dessem origem ao nome deste sitio, que conta 261
moradores.
Ladeira.-A configuração do terreno explica esta
denominação. A sua população é de I 59 iiidividuos.
Chamorra.-Uma antiga familia Chamorros, que ali
possuia uma quinta ou casa de campo, deu origem ao
nome deste sitio. Tem 250 almas.
Encruair'han'ns.--Os caminhos que num ponto deste
sitio s e cruzam são a origem provavel desta denomina-
cão. Tem duas escolas oficiais, uma para cada sexo, e
uma caixa postal com recepção e transmissão de mala
diaria 'com a estação central do Funchal. Tem este
bairro 271 habitantes.
Vaxo ~ i l . - É o nome dum dos primitivos povoa-
dores da Madeira e que nesta freguesia possuiu terras
de sesmaria no sitio a que deu o seu proprio nome e
apelido. Diz-nos o Dr. Alvaro Rodrigues de Azevedo
que este Vasco Gil era em 1472 um dos homens botzs da
govemança do Feiachal. Fica ncste sitio a conhecida
Fonte do Senhor, assim chamada por ter pertencido á
Confraria do Santissimo Sacramento desta paroquia,
que constitue o caudal que alimenta os marcos fontena-
rios donstruidos nesta freguesia em 1908 pela Junta
Geral do distrito. Os seus habitantes atingem o numero
de 362.
casas.--É dos sitios meiios povoados, pois conta
apenas 85 almas.
Casa Branca.-Tem I 33 moradores.
Bo1iquerne.-Ha na provincia do Algarve uma fre-
guesia de nome Boliqueme, e, sendo algarvios a maior
parte dos col6iiisadores que do continente veiu po-
voar esta ilha, não é para extranhar que algum fllho
daquela freguesia, que por ventura tivesse terrenos de
sesmaria neste sitio, Ihe dêsse o nome da terra onde
ngsceu. É tambem possivel que as condições orograficas
e hidrograficas da freguesia algarvia e deste sitio do
Boliqueme ou ainda quaisquer outros pontos d e seme-
lhança dessem origem a esta denominação, como fre-
quentemente se vê na historia das nossas descobertas.
Tem 328 moradores.
Barreira.-Ao que com inteira propriedade se
deve chamar barreira dá o povo nesta ilha o nome de
bardo, que quer significar o tapume ou trincheira feita
de estacas c ramos de arvores e destinada a impedir
que o gado, que pasta livremente nas serras e baldios,
desça ao povoado e terras cultivadas. Neste sitio, que é
um dos mais proximos das montanhas que limitam esta
freguesia, existia um destes bardos ou barreiras tão
comuns em toda a ilha e, dai lhe provém aquela deno-
minação. É de 227 o numero dos seus habitantes.
T@iche.-Dão os modernos dicioiiaristas á pala-
vra Trapiche o significado de arrnazem para deposito
de mercadorias ou ainda d e hangar, mas em obras anti-
gas encontra-se este termo para significar cngenho,
lagar, azenha ou moinho. Donde provém semelhante
denominação, que sabemos não ser usada na Madeira
nem t9n pouco a temos encontrado em quaisquer docu-
32 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

mentos antigos referentes 6 sua histeria? Seria apelido


ou alcunha dalgum primitivo povoador e assim désse o
nome ao sitio? Ií, talvez hoje impossivel averigua-lo.
Encontra-se nele a chamada quinta e capela do Trapi-
che, onde os benemeritos irtnáos de S. João de Deus
manteem um hfanicomio para homens, a que iioutro
lugar teremos que fazer mais desenvolvida refcreiicia.
Tem 342 visinhos.
Curral velho.-Conta r 87 habitantes.
Ln~anjal.-O nome parece indicar que por ali
existia algum pomar de laranjeiras ou que estas arvo-
res fossem cultivadas neste sitio em grande escala.
Marcos de Braga, um dos primitivos povoadores desta
ilha e d e quem as cronicas madeirenses rezam muitos
actos d e bravura, teve neste sitio terras de sesmaria,
que um dos seus descendentes, Domingos d e Braga,
converteu em vinculo e que foi chamado o morgado do
Laranjal, como veremos no artigo consagrado aos mor-
gadios e casas vinculadas desta freguesia. Conta 368
habitantes.
Lom60 dos Aguinres.-Diogo Afonso d'Aguiar, um
dos quatro fidalgos que D. Afonso v mandou á Madeira
para casarem com as filhas do descobridor João Gonçal-
ves Zarco, teve terras nesta freguesia na lombada a que
deu o seu nome e que ainda actualmente conserva. É o
sitio mais populoso da freguesia e conta 444 habitantes.
P o ~ z a rdo ~i~adozzro.-Éo prolongamento d o sitio
antecedente, disfrutando-se dali um soberbo panorama,
que talvez justifique a sua denominação. Tem 233 alinas.
Ribeirn Grande.-Fica na margem esqu&da da Ri-
beira d e Santo Antonio e dela tira decerto o seu nome,
Conta 99 moradores.
Lugar do Meio.-Tem 92 habitantes.
Salão.-Este nome deriva da natureza do terreno.
Tem ali uma escola oficial do sexo masculino e uma es.
cola municipal. A sua população é de 204 visinhos.
Alamos.-Talvez provenha esta denominação de
algumas arvores daquele nome, que ali existissem em
outros tempos. Fica neste sitio a capela de Nossa Se-
nhora do Amparo, séde do antigo morgadio de Agua de
Mel. Neste mesmo sitio, onde chamam o Til, liavia terras
vinculadas, que constituiam um morgado administrado
_pela família Velosa. A sua população é de 68 moradores.
Penteada.-«Em 148I , dizem as Satm'ades da Ttvrn,
era da Camara do Funchal uin Feriião Penteado, escu-
deiro, o qual teve sesmaria no sitio que, por isso, ficou
,chamado Penteada*. Poi um dos primeiros colonisado-
res desta freguesia e, como tantos outros, deu o seu
nome ao lugar onde se estabeleceu e fixou residencia.
Contaveste sitio 44 almas.
Quinta do Leme.-Deriva este iiotile da capela e
graude casa de habita~ão,que foi séde do morgado dos
Lemes. O seu nutnero de habitantes é de 292.
i1Tadnbza.--Tira esta de~~orninaçào da capela d e
Santa Maria Madalena, que ali existiu e de que hoje
restam apenas algumas ruinas. Ha ali uma escola do
sexo masculino. Tem 341 almas.
Levada cio Cavalo.-É o primeiro sitio da fregue-
sia que se encontra ao sair do Funchal em direcçáo a
Santo Antonio e fica em partilha com outro sitio do
mesmo nome pertencente á freguesia de S. Pedro. Nele
existiu e até ha poucos anos funcionou uma fabrica de
cortume de peles de certa irnportancia, onde chamam
ainda hoje o Pelnme. Conta 253 visinhos.
34 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Pilar.-Fica em partilha com outro bairro d e igual


nome d a freguesia d e S. Martinho, tirando ambos os
sitios a sua denominação da capela d e Nossa Senhora
do Pilar, fundada em 1676 por Gonçalo de Freitas Dru-
mund e situada na referida freguesia d e S. Martinho.
Neste sitio encontra-se a quinta d e que é proprietaria
D. Luiza Crowford Rodrigues. É de 3 3 5 o seu numero
d e habitantes.
Pico dos Barcelos.-Fica neste sitio o chamado Pico
dos Barcelos, donde se disfruta um vasto e surpreeil-
dente panorama, um dos mais arrebatadores do conce-
lho do Funchal, e que é hoje ponto obrigado de exciir-
são para todos os turistas e pessoas que visitam o
Funchal. A ele nos referiremos mais de espaço em outro
lugar deste opusculo. Tem 220 almas.
Santo Amnro.-Tirou o nome da capela ali exis-
tente. Dela e do seu fundador Garcia Homem de Sousa
nos ocuparemos em artigo especial. Tem este sitio 360
moradores.
7aque.- sua população é de 145 habitantes.
Alecritzs.-Neste sitio ficavam a quinta e a capela
de Nossa Senhora da Quietação, fundada por Lourenço
d e Matos Coutinho e de que já nem restam hoje vesti-
gios. Tem 217 almas.
Preces.-Este nome deriva da capela e quinta d e
Nossa Senhora das Preces, que ali existem ainda. É de
3 5 1 o numero de seus habitantes.
Pittheiro dos Voltas.-O numero de seus moradores
é de 102.
Santa Quiteria.-A capela de Santa Quiteria, que
ali houve, deu o nome ao sitio. O seu numero d e almas
é d e 157.
Pico do Cardo.-Os jesuitas tiveram uma residencia
neste sitio com seus terrenos anexos e uma capela da
invocação de Nossa Senhora do Populo. Conta 193 visi-
nhos.
Tres Paus.-Eni tempos mais antigos fez parte do
sitio do Vasco Gil. Nos Tres Paus se encontra um im-
portante predio rustico pertencente a A~itoniaFernan-
des Frita, falecida nesta freguesia a 19 de Dezembro de
1670, e que o legou á Confraria do Santissimo Sacra-
mento desta freguesia, para ser administrada por ela e
pelo respectivo paroco, com a obrigação de satisfazer
determinados encargos pios. Tem I 5 7 habitantes.
Rlbeira dos Socorridos.-Fica na margem esquerda
desta ribeira e dela recebeu o nome. Tambern tem a
denominação, bastante antiga, de Engenho Velho,
talvez por existir a!i algum engenho de fabricação de
assucar, como tantos que havia espalhados em varios
pontos da ilha. A sua população é de 83 habitantes,
~ a j ã . - É o sitio que se acha mais distanciado da
igreja paroquial e fica, com9 o anterior, situado na
margem esquerda da Ribeira dos Socorridos. Tem I 18
almas.
Para a indicação do numero de habitantes de cada
um destes sitios, socorremo-iios do Cefzso da Popzd-
laçdo a2 Povtugal, realisado no ano de 191I , visto não
achar-se ainda publicado o vol~imedo Cefzso de 1920,
que interessa ao assunto deste artigo.
Capela d e Santo
Arnaro

É a capela d e Santo Amaro a mais antiga desta


paroquia e tambem uma das mais antigas d e toda a
diocese. Das poucas igrejas e capelas edificadas no
seculo xv, que ainda restam nesta ilha, é ela uma das
q u e se encontram em excelente estado d e conservação,
embora a cotistrução primitiva tenha sofrido profundas
mbdificações no decorrer de quatro seculos.
O dr. Alvaro Rodrigues de Azevedo, por evidente
lapso, faz esta capela situada na freguesia de S. Marti-
riho, quando é certo que sempre pertenceu a esta paro-
quia de Santo Antonio. É possivel que o engano prove-
nha d o facto d o seu fundador possuir vastos terrenos
em ambas estas freguesias e porventura coiitigilos, dan-
do-se talvez, em epoca não recente, a capela como indi-
ferentemente situada numa ou noutra freguesia. A
circunstancia d e ter sido construida num sitio que é
limite das duas paroquias e, mais ainda, dar a entrada
da quinta, que circundava a capela, acesso para a estra-
da que separa as mesmas freguesias, facilmente induzi-
ria em erro e levaria a supor-se que a pequena igreja d e
Santo Amaro não ficaria dentro da área da paroquia de
Santo Antonio.
Os medianamente lidos nas cronicas madeirenses
CAPELA DE SANTO .\MAR0 37

'%bem que do contineiite do reino vieram expressameii-


te quatro fidalgos enviados a esta ilha por L). Afonso v
afim de contrair casamento c o k as filhas do descobri-
dor da Madeira e primeiro capitão donatario d o
Funchal. A terceira delas, por nome D. Catarina da Ca-
mara, casou com Garcia Homem de Sousa, que foi o
fundador desta capela. Diz textualmeutc o anotador das
Saudades da 7erra: a . . .Sauto Amaro, que foi fundada
por Garcia Homem dc Sousa, genro de Zargo, em 1460,
na grande fazenda povoada onde tinha aposento acaste-
lado.. DO mesmo Garcia de Sousa dizem tambem as
Sau(la&s noutro lugar: a . . .fez ele a capela e casa forte
ou acastelada para se defender de seus cunhados; era
orgulhoso e violento. e acrescentam finalmente que
(por ter diferenças com seus cunhados.. . fez uma torre
que está junto da Madre de Deus..
Que era a Madre de Deus? Xome primitivo da ca-
pela ou sitio de Santo Amaro? Não sabemos dize1.0,
mas segundo consta de antiga tradição e afirma o douto
anotador das Saudades na Terra foi em Santo Amaro,
onde Garcla Homem de Sousa levantar; a casa acaste-
lada de que falam as velhas cronicas deste arquipelago
para defender-se d e seus cunhado9 nas lutas sangrentas
que com eles tivera. Com efeito ainda ali se encontram
umas casas em ruinas, de construção bastante antiga,
que provavelmente constituem restos da morada sola-
renga com aspecto de fartaleza que o orgulhoso e tur-
bulento Garcia d e Sousa construira para pôr-se ao
abrigo das investidas dos seus inimigos.Uma porta de
cantaria, em ogiva, que ali se vê ainda e que parece ter
o cunho das construções duma epoca remota, devia ser
cuidadosamente conservada. Tambem restam vestigios
38 PAROQUIA I)E SANTO ANTONIO

duma antiga cisterna e não ha muitos anos ainda que


ali se viam igualmente as paredes duma velha torre,
parecendo ser tudo dc construção bastante antiga.
Ilavia ali uma quinta, dentro d e cuja área ficavam a
capela e a provavel construção de Garcia de Sousa, res-
tando apenas hoje uma portada d e certo aparato arqui-
tectonico e que noutro tempo serviu tambem de entra-
da principal para as referidas quinta e capela.
Santo Amaro é uma das mais importantes capelas
deste bispado pela sua antiguidade e tradições histori-
cas, pelo'seu tamanho e ainda pela concorrelicia d e fieis
na sua festa patronal. Parece-nos que pouco lhe resta
da sua primitiva construção, que, com o andar dos
tempos, foi passando por sucessivas transformações.
Com o fim manifesto do isola-la da propriedade rustica
e urbana, em cujo recinto ficava, levantaram-lhe um alto
muro em frente do frontespicio e a tres ou quatro
metros de distancia deste, que fizeram ligar ao pequeno
templo por meio dum alpeiidru, o que tudo notavelmen-
te desfeiou a frontaria do edificio e ainda prejudicou
bastante a beleza do conjunto. Foi provavelmente a
partir desta epoca, qne não podemos determinar com
precisão, que o serviço da capela começou a fazer-se
exclusivamente pela entrada actual, vedando-se a comu-
nicação que dava para o caminho do Tanque e Alecrins.
Presumimos que os administradores da capela se tives-
sem desligado dos seus deveres de padroeiros e a aban-
donassem ao cuidado e direcção da fabrica paroquial, a
cujo encargo se encontra ha largos anos, e deste modo
a isolassem do resto da quinta ou propriedade onde se
achava edificada.
Decorrem dois loligoç seculos depois da fundação
CAPELA DE SANTO A M A R 0 39

desta capela sem que, de tão largo periodo de tempo,


tenha chegado até nós qualquer noticia que possa inte-
ressar á sua historia. Esta deficieiicia d e informações
deve em boa parte atribuir-se ao estravio,-que se deu
ha algumas dezenas de anos, do primeiro livro de Provi-
mentos desta igreja paroquial, que constitue hoje uma
perda irreparavel. Sómente a partir do principio d o se-
culo dezoito encontrámos algumas referencias á capela
de Santo Amaro, de que faremos rapida menção,
Das seis ou sete capelas vinculadas que existiam
nesta freguesia, foi esta a unica que, no largo periodo
de quatro seculos e meio, isto é desde a sua fundação
até o presente, se conservou na posse dos descendentes
ou sucessores do seu primitivo fundador. Escasseiam-
neste momento, o que talvez possamos fazer no capitulo
Instituições lGncz4lnres, os elementos indispensaveis para
apresentar a serie sucessiva dos administradores desta
pequena igreja desde Garcia Homem de Sousa, em
1460, até Filipe de Carvalhal Esmeraldo, capitão-múr
de Camara d e Lobos, que em 1700 era o administrador
da propriedade vinculada d e Santo Amaro e cuja posse
passou em seguida a seu filho José Joaquim de Carva-
Ihal Esmeraldo. Foi imediato sucessor seu irmão Fran-
cisco Antonio de Betencourt Carvalhal Esmeraldo, que
a transmitiu a sua filha D. lzabel Esmeraldo Barbosa da
Camara, a qual por sua morte a legou a sua irmã D.
Julia Esmeraldo, ultima proprietaria.
A capela de Santo Amaro, como atrás dissémos,
sofreu varias modificações no decorrer dos seculos e
julgamos até que seria completamente reedificada nos
fins do seculo XVII ou principios do seculo xvrri. Exami-
nando detivamente a construção actual, reconhecer-se-
40 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

ha sem esforço que ela não pode pertencer ao seculo


xv e mesmo 'aos primeiros quarteis do seculo xvr. Não
podemos no entretanto precisar a epoca em que teria
sido feita akeco~istruçãoe nem sequer determinar apro-
ximadamente os anos em que nela se realisaram
grandes repairos ou profundas modifica$ões na edifica-
ção primitiva. As referencias que a tal respeito temos
encontrado apenas 110s permitem constatar o facto, mas
não nos deixam indicar datas precisas e menos ainda
apontar a natureza dos grandes coiicertos e reparações
que ali se fizeram.
Em 1748, o visitador episcopal conego Caetano de
Caires julga a capela necessitada de varios repairos, que
certamente s e não fizeram, pois que oito anos depois,
em 1756, um visitador diocesano, o dr. Pedro Pereira da
Silva, em provimento exarado no arquivo desta paro-
p i a , lamenta o estado d e ruina em que encontrou a
pequena igreja e ordena ao zelador dela que colha es-
molas entre os fieis para ocorrer aos necessarios roncer-
tos, que urgentemente se impunham. É certo que tais
repairos se realisaram, mas não com a urgeiicia e pron-
tidão que o visitador recomeiidou.
No seculo xrx, e em diversos anos, se realisaram ali
obras importantes de reparação nas paredes e no tecto,
de pintura no interior e douramento dos altares, aquisi-
ção de paramentos etc. S6 no periodo decorrido de
1870 a rgoo se dispenderam nesta capela cerca de
600$000 reis. A pintura que se fez em 1899 custou
I zo$ooo reis.
Foram feitos varios legados a esta capela, mas
apenas temos conhecimento dum d e zoobooo reis, que
em disposição testamentaria lhe deixou o cura desta
CAPELA DE SAXTO A M A R 0 41

freguesia padre José Antocio de Gouveia, que aqui fale-


ceu 31 de Dezembro d e 1814, e outro d e 8 o b m reis,
]?ara ser satisfeito em anuidades d e 3$000 reis, deixado
por Eloi Figueira d e Ornelas, falecido nesta paroquia a
31 d e Julho de 1S77.
José Rodrigues de Goiiveia, cuja data de faleciinen-
to não podemos dar agora, entre as sus ultimas disposi-
ções pias deixou a da celebração perpetua duma missa
catitada em cada an9 na capela de Santo Amaro. Igno-
ramos em que sitio ficava o predio onerado com este
encargo perpetuo, mas sabemos que em 1837 foi esta
pensão satisfeita pelo morgado João Antonio d e Gouveia
Rego. Posteriormente áquele ano não cncontrairios no-
ticia d e ter sido cumprida e presentemente o não é.
Possue esta capela dois pequenos predios rusticos,
um no sitio das Romeiras e outro no Vasco Gil, igno-
rando-se a data da doação e os'liomes dos doadores.
Nela se celebram anualmente a solenidade do
mago, recedida do prespectivo novenario, e a festa
de Sauto Antão, que é ali tambem objecto d e veiieração
especial, havendo um tradicioilal arraial a que concorria
uma grande afluencia de pessoas d e divcrsas freguesias.
A capela de Santo Amaro e a propriedade rustica
que lhe fica anexa foram doadas pela ultima propricta-
ria D. julia Esrneraldo ao reverendissimo monsenhor
Manuel Joaquim de Paiva e destinados os seus rendi-
mentos aos encargos gerais do diocese do Funchal.
Capela d e Santa M a r i a
~adalena

Quem sair do Funchal e seguir o caminho de Santo


Antonio depara á beira da estrada, a uns dois quilome-
tros do centro da cidade, com as ruinas duma velha e
desmantelada capela. Desse montão de escombros er-
gue-se ainda altaneiro, como a desafiar as furias dos
seculos, o arruinado frontespicio, com o seu portico em
ogiva, denunciando a sua antiguidade e a carateristica
das construções duma época de glorias. É um dos raros
vestigios do estilo gotico que ainda restam nesta ilha.
Esta é a capela de Santa Maria Madalena, que deu
o nome ao sitio, mais comumente conhecido pela sim-
plificação popular de Rladalena. Depois de Santo Amaro,
é a capela mais antiga desta fregucsia, escasseando-nos,
porém, os precisos elementos para determinar-lhe a
epoca da sua fuiidação, que não nos parece ser poste-
rior ao primeiro quartel do seculo XVI. No entretanto a
referencia mais remota que a ela encontramos é d e
1593, ano em que lhe foi feita a doação dum foro. Era
tambem, depois da referida capela de Santo Amaro, a
mais importante pela sua antiguidade, pelas suas dimen-
sões e estilo arquitectonico e ainda pela devoção que os
fieis manifestavam pela sua padroeira, chegando a pos-
suir bens proprios, de relativa importancia, para a ina-
CAPELA DE SANTA MARIA 'IADALENA 43

nutenção do seu culto, o que não nos consta que outra


capela desta freguesia tivesse.
Parece, porém, que não diirou largo tempo esse
primitivo fervor religioso pelo culto da santa d e Magda-
10, pois que em 1684 estava a capela de todo arruinada,
conjecturando-se que nesse tempo já nela se não cele-
bravam os oficios divinos, como se vê do seguinte docu-
mento, que apesar d e extenso, transcrevemos na integra
pelo interesse que oferece ao objecto deste capitulo:
.Em nome de Deus Ameri. Saibam quantos este
instrumento de obrigação e como melhor em direito
haja logar que no anno do Nascimento de Nosso Sanhor
Jesus Christo de mil siscentos oitenta e quatro, aos onze
dias d o mez de março do dito anno, ii'esta cidade do
Funchal da ilha da Madeira, nas casas de morada do
muito reverendo vigario gcral d'este Bispado o doutor
Marcos da Fonseca Cerveira, mestre escola da santa sé
desta dita cidade, onde eu tabellião fui e sendo ali José
&!achado de Aliranda, morador ii'esta cidade, de uma
uma parte e brm assim da outra o dito reverendo viga-
rio geral, pessoas de mim tabellião e testemunhas ao
diante nomeados c assignadas, que elle pela grande de-
voção que tinha a Santa Maria Rlagdalena e ter grande
pena de vcr a sua errnida que está na freguesia de
Santo Antonio junto d'esfa cidade, arruinada e incapaz
de se poder dizer ii'ella missa e se fazerem suas festas,
fizera petição ao reverendo cabido que hoje serve dc
governador do bispado pelo Illustrissimo e Reverendis-
simo Senhor Bispo d'este Bispado Dom Estevào Brioso
d e Figueiredo, para que lhe concedesse licenqa para a
reedificar de novo, visto estar arruinada quasi toda, e
ornal-a de frontaes, casulas e tudo o mais necessario
44 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

para n'ella se poderem celebrar os officios divinos, com


a clausula c condição que ficaria elle dito José Machado
d e Miranda e seus herdeiros por padroeiro da dita er-
mida e aaministrador d'ella com todos os privilegias e
prerogativas que o direito permitte e concede aos pa-
droeiros de qualquer egreja que edificam, reedificam c
dotam, e porque sendo vista pelo revereildo cabido a
dita petição e procedendo-se ás diligeiicias necessarias
e iiiformações que tomaram do reverendo vigario d e
Saiito Antonio, remetteram a este dito reverendo
Senhor Mestre Escola vigario geral d'este Bispado os
papeis, para que se fizesse a escriptura com elle dito
José Rlachado de Miranda, dos quaes dou eu tabellião
minha fé de como me foram inostrados os ditos despa-
chos e reconhecido ser o ultimo da letra e signal do re-
vereiido deão e doutor Simão Gonsalves Cidrão e os
signaes breves dos dois deputados e doutores Antonio
Velloso de Lyra e Luiz Telles de Meneze; e a informa-
ção da letra e signal do dito reverendo vigario da fre-
guezie dc Santo Antonio o doutor Lourenço Franco d e
Azevedo que tambem reconheço, que tudo ficou em
poder do dito José Machado de Miranda pelo que re-
queria a elle dito senhor, que na forma do dito despa-
cho e informação lhe fizesse a concessão do ditro padro-
ado.
E porquailto na informação do dito reverando viga-
rio se dizia que obrigando-se elle contraente a fazer a
dita ermida de Santa Maria Madalena d e pedra e cal,
armada de castanho e branqueada só lhe podia conce-
der o que pedia, disse que por este publico instrumento
se obrigava por sua pessoa e bens a fazer a dita ermida
d e pedra e cal armada de castanho forrada de pinho e
CAPELA DE SANTA MARIA hlADALENA 45

branqueada, e assim mais oriial-a com frontal, toalhas e


casulas e todo o mais que necessario fôr para n'ella se
dizer missa e poder fazer as festas da dita santa, o que
tudo se obriga a fazer dentro d'um ano que começará a
correr da factiira d'esta com a condição que logo n'este
verão d'este anno em que estamos dará principio á dita
obra e que acabada ella dentro do dito anno na forma
acima declarada d'ali em diante se obriga por si e por
seus herdeiros digo por si e por seus bens e por seus
herdeiros a pagar em cada um anno quatro mil reis, que
é o dote que faz para ornato do dito altar c concerto da
dita egreja, além dos dois mil reis que paga de
á dita erinida o morgado dos Machados deixados pelos
instituidores d'elle e que para o pagamento dos ditos
quatro mil reis do novo dote que lhe applica á dita er-
mida em cada um atino para ernquanto o mundo durar
obriga todos os seus bens livres havidos e por haver e
em especial um foro de quatro mil reis que lhe paga em
cada um anno pelo mez de janeiro fechado para sempre
Gonçalo d e Freitas Rettencourt imposto na fazenda
onde chamam as Maravilhas de entre os caminhos desta
cidade que elle contrahente houve de ligitirna de sua
mãe Dona Autonia de Moura e que outrosini para maior
segurança d o dito foro que dota a dita ermida da Mag-
dalena obriga a parte que tem livre na quinta da dita
Magdalena que herdou por legitima de seu pae Bartho-
lomeu Machado de Miranda e que dos cincoenta mil
reis que o morgado dos Machados deve á dita erinida
assim por parte d e seu irmão João Machado Miraiida
defuncto como d'elle contrahente do foro de dois rnil
reis que se paga á dita ermida se obriga elle dito con-
trahente mandar fazer dois castiçaes d e prata para a
46 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

mesma ermida em tempo de seis mezes que começarão


a correr da factura desta, e que feita a dita egreja e
acabada na forma acima declarada estará a chave d'ella
lia mão do vizinho mais chegado e de mais confiança
para que a todo o tempo que o revereudo vipario da
dita freguesia ou cura ou outro qualquer sacerdote qui-
zerem celebrar na dita ermida o possam fazer com toda
a commodidade e sem estorvo algum com a declaração
que faltando elle co~~trahente a alguma das clausulas
desta escriptura e não acabando de aperfeiçoar a dita
ermida no tcmpo acima declarado ou faltando-se com o
dote que aqui lhe faz por si ou por algum dos seus her-
deiros tocante aos quatro mil reis logo perderá elle ou
seus herdeiros as honras e prerogativas de Padroeiro,
e sendo ahi, como dito é, prezente o dito reverendo
senhor mestre escola vigario geral d'este bispado disse
que por virtude da comissão a elle concedida do illustre
e reverendo cabido por despacho de que eu tabellião
acima dou fé em nome do dito reverendo cabido accei-
tou a obrigação do dito José Machado Miranda na torma
acima declarada, que pelo poder a elle concedido pelo
dito despacho do dito reverendo cabido acabada que
fosse a dita ermida e posto tudo corrente na forma da
obrigação acima concedida ao dito coiitrahente José
Machado de Miranda e a seus herdeiros os direitos do
padroado n'ella com todas as prerogativas e preeminen-
cia que o direito perrnitte e concede aos legitimos Pa-
droeiros das egrejas e que por tal o conheçam e seus
herdeiros os parochos da dita freguezia que de presente
são e ao diante forem até ao fim d o mundo, e outrosim
declarou elle dito senhor que, para com mais brevidade
se aperfeiçoe a dita obra, se poderá aproveitar dos ma.
CAPELA DE SANTA MARIA hIADALJ3NA 47

.
teriaes. . que estão em ser e tem a dita ermida e que
acabada ella se restituirão os ornamentos e tudo o mais
que era e havia na dita ermida, o que tudo o dito José
Machado de Miranda disse aceitava por si e seus herdei-
ros, e o díto reverendo vigario geral disse que acabada
a dita ermida poderá o contrahente tomar posse do dito
padroado por este instrumento, e em fdi e testemunho
da verdade um e outro, tudo como dito é, outorgaram
e aceitaram, e eu tabeilião o acceito em nome.. e .
mandaram fazer este instrumento como dito é, e dar os
trabalhos riecesçarios: Testemunhas presentes R'larros
de Fonseca Cerveira, sobrinho do dito reverendo viga-
rio geral, Antonio Vogado Sotomaior, moradores n'esta
cidade de que assignam com elles partes, Manuei Escor-
cio de hlendonça, tabellião de notas o escrevi. José Ma-
chado d e Miranda, hlarcos da Foi~secaCerveira, Anto-
nio Vogado Sotomaior».
Foram aceitos por José Machado de i\Iiranda os
encargos pios a que se refere o doc~imeiitoacima trans-
crito, mas nào pudémos averiguar como nos primeiros
anos se cumpriram as clausulas a que ele voliiritaria-
mente se obrigou. No entretanto sabemos que em 1 7 3 2 ,
isto é, 48 anos depois da celebração daquela escritura,
já havia muito que não era pago o foro de 4$ooo reis
imposto na fazenda das Maravilhas, ordenando então o
bispo D. Manuel Coutinho que se procedesse judicial-
mente contra a pessoa obrigada áquele pagamento e de-
terminando tambem o mesmo prelado que a capela s e
fechasse ao serviço do culto, se porventura o seu admi-
nistrador a não provesse dos indispensaveis paramentos
e alfaias. E ainda 34 anos mais tarde, em 1766,os zela-
dores ou mórdomos da coiifraria d e Santa Maria Mada-
48 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

lena requereram um traslado daquela escritura para o


lançar nos livros da mesma confraria, levados a isso
pela n$o observancia dalgumas das contições contidas
na mesma escritura.
Parece terem sido pouco eficazes as providencias
adotadas por D. hlaiiuel Coutinho, porque 24 anos
depois, em 1756, o visitador episcopal Pedro Pereira da
Silva lamenta o estado de adiantada ruina em que a
capela se encontra e indica os urgentes repairos de que
ela necessita e que eram na verdade miiitos importantes
e da mais imediata execução.
Pelas contas da receita e despeza da capela da Ma-
dalena, lançadas no ano de 1732, se vê que Bartolomeu
Machado e sua mulher D. Francisca d e Vasconcelos,
respectivamente nos anos de 1533 e 1598, doaram á
mesma capela dois foros d e mil reis cada um auuais, des-
tinados 5 sua conservação e manutenção do respectivo
culto.
Foram estes tres fóros pagos com maior ou menor
regularidade até o auo d e 1806, não tendo noticia de
que tivessem sido cobrados posteriormente a esta data.
Coilvém acentuar que o primeiro destes fóros era im-
posto na quinta d e Nossa Senhora das Maravilhas, á
freguesia de S. Pedro, no sitio que ainda hoje conserva
o nome e onde ficava a capela desta denominação, fun-
dada em 1657 por Diogo Berenguer Correia.
Nos anos de 1733 e 1753 procederam-se a alguns
repairos na capela da Madalena, sendo porém, bastante
importantes os melhoramentos que ali se realisaram em
1773, devido sobretudo ao zelo do respectivo paroco,
Berenguer, tendo-se então feito todo o assoalhamento
d a pequena igreja, no que se dispenderam mais d e
CAPELA DE SANTA IIARIA LIADALENA 49

ZOO$OOO reis, quantia já não muito pequena pzra aquela


epoca.
Em 1806 fizeram-se ali novos repairos e adquiri-
ram-se uin calix de prata, algumas casulas o outros or-
namentos, d e que muito necessitava a capela para a
celebração dos oficios divinos.
Pouco zelo e cuidado houve, por certo, na sua con-
servaçfio, porque em 1820 era já adiantado o estado d e
ruina da capela, tendo os moradores das suas circunvizi-
nhanças feito nela importantes repairos naquele ano,
como se vê dum requerimento que então dirigiram ao
prelado diocesano, solicitando licença para que um ca-
pelão ali fosse celebrar nos dias santificados.
Nada mais sabemos relativamente a esta capela em
anos posteriores a 1820. E certo que ha j 5 algumas de-
zenas de anos se acha reduzida a um montgo informe de
ruinas.
Nos anos d e I 596 e I 597 celebraram-se nela casa-
mentos, batizados e. outros actos de culto, devido pro-
vavelmeute a alguns repairos que se estivessem então a
fazer na antiga ireja paroquial. Tamhem durante o pe-
riodo da construção da igreja actual e nos anos d e I 786
r787 se sepultaram ali varias pessoas, e se realizou
tambem um batizado em 1810, servindo de padrinl-io o
bispo diocesano D. Luis Rodrigues de Vilar.
Capela Filipe

É uma das mais antigas capelas desta freguesia.


Fazia parte da quinta e casa d e moradia dos Lemes,
que ali constituiram a séde dum morgadio, como melhor
se verá no capitulo I~tstituiçõesL7inculares. Fica no sitio
chamado da Quinta do Leme, não sendo a actual resi-
dencia e capela adjunta as construções primitivas, como
facilmente se reconhece ao primeiro lance de vista.
Foi construida no seculo xvr e reedificada nos se-
culos XVII e XVIII, como veremos pelos documentos que
abaixo inserimos. Martim de Leme, pai do instituidor
da casa vincular, tundou a capela d e S. Filipe, que o
anotador das Sauclndes da Terrtz afirma ser no ano de
1536, não havendo a sua menor duvida que a sua exis-
tencia data do seculo XVI. Não encontrámos quaisquer
referencias ácerca dela, senão em 1654 e pelo seguinte
alvará de licença:
«O doutor Pedro hloreira, deão da Santa Sé deste
Bispado do Funchal da ilha da Madeira, Provisor, viga-
rio geral official pelo muito reverendo cabido sede vn-
cante. Aos que este meu alvará de licença e erecção de
altar virem, faço saber que Ignacio da Camara Leme
me enviou a dizer por sua petição que elle tinha feito
Lima ermida na sua quinta jnnto a Santo Antonio, aonde
CAPELA DE S. FILIPE 5r

queria levantar altar para se dizer missa, e que não


podia fazer sem licença minha, pedindo-me licença para
isso, e que queria dotar e obrigar-se a que a dita er-
mida se sustentasse e reparasse. O que visto por mim e
me constar por certidão do reverendo vigario de Santo
Antonio estar devidaineiite ornada a dita ermida, e es-
tando dotada de dois mil reis cada ano de f0ro como
constava d e uma escriptura publica que se acha no car-
torio do reverendo cabido feito pelo tabellião Manuel
Ribeiro para sustentar a fabrica da dita erinida, lhe dou
licença para que possa levantar altar e celebrar-se ii'ella
os officios divinos como nas mais ermidas deste Bispa-
do, salvo seu direito a egreja paroquial. Este se cunipri-
r i como n'elle se contém e se lavrará no livro do registo
grande da catnara do dito Bispado para que a todo o
tempo conste da dita licença. Dado no Funchal sob
meu signal e sello da Sé vagante aos 1 2 d e Janeiro de
1654. Francisco da Fonseca, escrivão da camara e visi-
tações o fez. Doutor Deão*.
É bastante para estranhar que teudo apenas passa-
do pouco mais dum seculo depois da primitiva constru-
ção, se procedesse a uma nova edificação, que shniente
podemos categoricamente explicar pela necessidade da
remoção da capela para outro local ou d e a transformar,
de oratorio privado situado no interior da habitação, se
porventura o era, em ermida mais acessivel ao publico.
Decorre um novo seculo e trata-se duma nova rc-
construção, mas agora pelo conhecido e justificado mo-
tivo do violento tremor de terra de 3 I d e Março de
1 7 4 ter deixado a capela em estado muito adiantado
de ruina. L,eiam-se os dois seguintes documentos, que
bastante interessam ao assunto deste capitulo:
5 "- PAROQUIA DE S A N T O ANTONIO

«Dom Frei João d o Nascimento, por mercê de


Deus e da Santa Sé Apostolica, Bispo no Funchal, ilha
d a Madeira, Porto Santo e Arguini, do conselho d e Sua
Majestade Fidelissima. Fazemos saber que Francisco
Aurelio da Camara Leme, desta cidáde, nos enviou a
dizer por sua petição e por Provisão nossa de cinco de
Janeiro do presente anno lhe concederainos licença para
edificar e erigir uma capella da invocação de S. Filippe
Martyr na quinta chamada dos Lemes na freguesia de
Santo Antonio, termo desta cidade, a qual se achava
acabada, ornada e paramentada com os ornamentos
necessarios e dotada com quatro mil reis por anno na
forma d e escriptura que nos apresentou lavrada nas
tiotas do tabellião André d e Sousa aos vinte e um de
Junho de mil setecentos e cincoenta e s e n t h ç a de sua ap-
provação que se acha na nossa Camara, pedindo-nos con-
clusão da sua supplica lhe fizessemos mercê de mandar
visitar a dita ermida e fazer vistoria n'ella e achando-se
capaz e decentemente ornada e paramentada coilcedes-
semos licença para levantar altar, benzer e dizer missa,
o que visto e constar pela vistoria que n'ella se fez que
se acha perfeitamente acabada, ornada e paramentada e
estar outro sim benta pelo reverendo ar'cediago nosso
provisor e governador do bispado, havemos por bem de
conceder licença para que na dita ermida se possa cele-
brar e dizer missa sem prejuizo dos direitos parochiaes
e ficando sujeita á nossa jurisdicção ordinaria, pelo que
mandamos passar a presente Provisão que se registará
na nossa camara e no tombo da egreja parochial da
dita freguezia. Dada no Funchal sob o sello da nossa
chancellaria aos 1 2 d e Novembro d e 1752%
.Dom Frei João do Nascimento, por mercê de
CAPELA DE S. FILIPE 53

Deus e da Santa SC Apostolica, Bispo do Furichal, ilha


da Madeira, Porto Santo e Arguim, do conselho de Sua
Majestade Fidelissirna. Fazemos saber que Fraticisco
hurelio da Camara Leme e sua mulher D. Antonia
Maria de Sá e hlenezes nos enviararii a dizer que tendo
elies uma ermida da invocação d e S. Filippe Martyr na
sua quinta chamada do Leme sita na freguezia de Santo
Antonio, termo desta cidade, se lhe arruinara por occa-
sitio do grande terramoto do primeiro de Abril de mil
setecentos e quarenta e oito de tal sorte que n'ella se
não podia decentemente celebrar missa, motivo por que
a pretendiam edificar de novo, mas em sitio e logar que
ihes era mais conveniente na mesma quinta para pode-
rem ouvir missa e sua familia para cujo effeito apresen-
taram uma escriptura feita nas notas do tabeliião André
de Sousa aos vinte e um dias do mez de Junho de mil
setecentos e ciiicoenta pela qual se obrigam a dotar a
mesma ermida com quatro mil reis de pensão em cada
anno imposta tia fazenda chamada a quinta nova na
forma declarada da mesrna escriptura d e dote e senten-
ça de approvação d'elle que se acha na nossa camara,
pedindo-nos conclusão da sua supplica que na conformi-
dade do referido lhe concedessemos licença para edifi-
car a nova ermida com a mesma invocação de S. Filippe
Martyr; e visto o que allegam a escriptura d e dote e
informação que tivemos, havemos por bem de 1Se con-
ceder a licença para edificar a nova ermida com porta
publica para o povo poder tambem ouvir missa, ficando
sujeita á visitação do prelado ordinario e sem prejuizo
dos direitos parochiaes, e feita a dita ermida se dê licen-
ça por sentença para se benzer, levantar altar e dizer
54 PAKOQUIA DE S A N T O ANTONIO

missa. Dado no Funchal sob sello da nossa Camara aos 5


d e Janeiro de 17523.
Desta vez, fez-se a construção da capela contigua a
casa de habitação, mas com porta e acesso exteriores.
A residencia data da mesma epoca e tanto esta como a
capela se e~icontramem excelente estado de coiiser-
vação.
Capela d e N o s s a
Senhora do Amparo

No sitio dos Alamos desta freguesia levanta-se a


capela de Nossa Senhora do Amparo, que se acha em
regular estado de coilservação, celebrando-se ali, d e
quando em quando, o santo sacrificio da missa. O local
em que se encontra a capela fica na partilha desta fre-
guesia e da de S. Roque, no sitio conhecido pelo nome
de Agua de Mel, que era denominação comum a um
vasto terreno pertencente a ambas as paroquias. Na
parte deste sitio, compreendida nos limites de Santo
Antonio erguiam-se a capela, grande casa de habitação
e outras dependencias, que constituiam a séde da anti-
ga instituição vincular chamada de Agua de Mel, como
se poderá vêr no capitulo q w a ela consagraremos.
O anotador das Sauclnrz'es da Terra fixa o ano de
1698 como o da fundação desta capela, mas inclinamo-
nos a acreditar que ela é muito mais antiga e talvez
mesmo coeva da instituição do morgadio, que data do
ultimo quartel do seculo xv.
Vejamos o seguinte documento que encontrámos
na Camara Eclesiastica desta Diocese:-«D. José de
Castello Branco, por mercê de Deus e da Santa Sé
Apostolica, Bispo do Funchal, Porto Santo e Arguim,
do conselho de Sua Magestade que Deus guarde etc.
56 PAROQGIA DE SANTO ANTONIO

Aos que este nosso alvará d e erecção d e altar virem paz


para sempre em Jesus Christo Nosso Senhor, que de
todos é verdadeiro remedio e salvação. Fazemos saber
yue Dom Bartholomeu de Sá Machado nos envia a
dizer por sua petição que elle tinha novamente edifica-
do uma ermida na sua quinta de Agua de IlIel da invo-
caçào de Nossa Senhora do Amparo na qual queria le-
vantar altar para nelle sc dizer missa, a qual estava
decentemente ornada d e todo o necessario para o culto
divino e se poder celebrar, e qce lhe tinha dotado quatro
mil reis para a fabrica della como constava da escriptura
que offerecia, feita na nota do tabellião Manuel Escorcio
d e Xlendonc;a, aos doze dias d o mez d e Outubro deste
presente anno d e mil seiscentos noventa e oito, pedin-
do-nos que lhe fizessemos mercê de lhe mandar passar
alvará d e licença, sendo primeiro visitada, a qual peti-
ção nos foi apreseutada e mandámos fazer vistoria que
com efeito s e fez na dita ermida e se achou estar decen-
te e com os paramentos necessarios para dizer missa,
pelo que lhe mandámos passar o presente pelo que lhe
havemos por bem de lhe conceder licença para levantar
altar no dita ermida para *lia se dizer missa e celebrar
os oficios divinos, como se celebra nas mais ermidas
deste bispado, ficando sujeita ao direito parochial e gu-
ardando-se em tudo a forma das constituições, e damos
faculdade ao Padre Frei Pedro de Sá para que a possa
benzer, e este se registará na nossa Camara para a todo
o tempo constar desta licença. Dado no Funchal sob
nosso sigtial e sello aos oito de Outubro d e mil seiscen-
tos noventa e oito. Bartholomeu de Brito e Abreu escri-
vão da Camara o escrevi. José Bispo do Funchal,.
Por este alvará d e licença se deduz claramente que
CAPELA DE: NOSSA SENHORA DO AMPARO 57

se trata duma reconstrução, pois ali se diz novamente


edificada, o que é já uma grande presunção a favor da
existencia duma capela ou oratorio iiaquele local, que,
como já disséinos, julgamos ser coeva ou quasi coeva da
instituição vincular. E provavel que a antiga ermida,
pela ausencia dos seus primeiros possuidores na ilha dc
S. Miguel ou por outros motivos desconhecidos, trvesse
caido em ruinas, sendo D. Bartholomeu de Sá hlachado
que em 1698, logo no ano imediato áqucle em que her-
dou de seu irmão o vincu!o de Agua de Mel, a recons-
truiu ou restarou com a arquitectlira e da maneira em
que ainda actualmente se eiicontra. Faleceu o fundador
ou restaurador desta capela a 15 de Abril de 1708.
Algum ou alguns dos seus sucessores na admiiiis-
traça0 vincular deste morgadio e capela anexa mostra-
ram-se pouco zelosos lia conservac;ão do pcqueiio
templo, pois que o prelado diocesano D. Manuel Couti-
nho, na visita pastoral que fez a esta paroquia em Se-
tembro d e I 73 r , deixou esarado provimento áccrca
desta ermida, ordenando ao seu administrador, que era
então o morgado Jose d e Vasconcelos Betencourt de Sá
Machado, que a reparasse e dotasse com os riecessarios
paranientos e alfaias, sob pena de ser liela proibida a
celebração de qualquer acto de culto.
Iilacio Rodrigues de Gouveia, que morreu nesta
freguesia, no sitio dos Alamos, a 2 de Fevereiro de
1813, deixou em testamento que em sufragio da sua
alma se celebrassem trinta missas nesta capela.
Capela d e Nossa
Senhora da Quietação

Rlo sitio dos Alccrins desta freguesia ficava a capc-


Ia de Nossa Senhora da Quietação, de que nem hoje
restam vestigios. Era mais coilhecida pelo iiome de ca-
pela dos Alecrins e até numa referencia a ela feita no
ano de 1680 se lhe chamava igreja dos Alecrins, apesar
das suas acanhadas dimensões. A denominação pouco
vulgar de Quietação provém da circunstancia de ter a ca-
pela como orago o misterio que representa o socego e
a tranquilidade que, no retiro da casa de Nazaré, gosa-
va a Santissima Virgem em companhia do Nlenino Jesus
e do patriarca S. José.
Segundo dizem as Sauu'urtes da Terra e o docu-
mento quc abaixo transcrevemos, trasladado textual-
mente do arquivo da Camara Eclesiastica deste bispado,
foram Lourenço de Matos Coutinho e sua mulher D.
hlariaiia de Ornelas de Vasconcelos, que no ano de 1670
fundaram esta capela, em cumprimento dum voto que
haviam feito á Santissima Virgem, na q ~ i n t aque pos-
suiam no sitio dos Alecrins e que tinham herdado de
seu pai e sogro e morgado Bento de Matos Coutinho, o
qual por sua vez a houvera, por compra, de Simão Gon-
çalves da Camara e Jorge da Camara Esmeraldo.
O documento é assim concebido:--«O Doutor
Pedro Moreira, deão da Santa Sé deste Bispado d o
Funchal, provisor, vigario geral pelo mui reverendo ca-
bido séde vacante e goveriiador do Bispado, confirmado
por sua magestade, e Commissario sub-delegado da
Bulla da Santa Cruzada em todo o dito Bispado. Aos
que este meu alvará de licença e erecção de altar virem,
faço saber que Lourenço de Mattos Coutinho e
sua mulher D. blarianna de Vasconcellos moradores
nesta cidade me enviaram a dizer por petição que elles
por sua devoção e voto que fizeram, no tempo em que
impetraram dispensação a sua santidade, promessa á
Virgem Maria de edificar uma ermida lia sua quinta da
invocação da Quietação da mesma Senhora, represen-
tando o misterio e quietacão que gozava em sua casa na
educação do Menino Jesus em companhia do Patriarcha
S. José, a qual estava acabada e preparada d e todo o
ne~essario,para nella se poder dizer missa e se celebrar
os officios divinos como nas mais ermidas do Bispado,
pediram-me licença para isso, indo ou mandando visitar
a dita ermidade, o que visto por mim e me consta da
materia referida na petição dos supplicantes e pela vista
dos meus olhos que fiz no painel e imagem referidas
n'ella e a julgo por mim decentes para collocar no altar
e por reconhecer estar a dita ermida decentemente or-
nada de todo o necessario, e estar dotada com dois mil
reis de foro em cada um anno para a fabrica della, isto
em umas courellas pertença da mesma quinta que
herdaram de seu pae e sogro Beilto de Mattos Couti-
nho, que as houve de compra a Simão Gonçalves da
Camara e seu irmão Jorge da Camara Esmeraldo, como
consta d e uma escriptura feita por Manuel da Silva, no-
tario nesta cidade, que fica no archivo do Reverendo
60 PAKOQUIA DE SANTO ANTONIO

Cabido. Hei por bem de lhe dar licença para que na


dita ermida se possa levantar altar, dizer missa e cele-
brar os officios divinos como nas mais ermidas deste
Bispado sem prejuizo do parocho, guardando em tudo o
costume e constituições do Bispado e mando em tudo
se cumpra e seja lançado este alvará no livro do registo
grande da Camara para que a todo o tempo conste
desta licença. Dado no Funchal sob o meli signal e sello
da sé vagante aos dezoito de Junho de mil seiscentos e
setenta annos. Francisco de Fonseca escrivão da Cama-
ra e visitações o fez, Doutor Deão..
Foi nesta quinta a capela que em 1677 instituiu o
seu fundador o morgado dos Alecrins, como mais larga-
mente se poderá vêr no capitulo hzstituições Vincula-
res.
Em 1732 já a ermida dos Alecrins se eticontrava
em estado adiantado de ruina, pois o bispo D. Manuel
Coutinho, na visita pastoral que fez a esta freguesia ;ia-
quele ano, mandou «fechar com travessas, a mesma
capela, e o visitador episcopal Antonio Mendes de Al-
meida ordenou em 1736, que, com respeito ella, e já
então se achava fechada para o serviço do culto, exa-
minasse o paroco se lhe estava imposta alguma pensão
de missas ou qualquer outro encargo pio.
Num interessante e valioso mapa da Madeira, que é
exemplar unico e que existe na freguesia da Camacha
na casa do conselheiro Aires de Ornelas, feito pelos en-
genheiros Dias d e Almeida e Francisco Alincourt s o
ano de 1771, se vê apontada a capela dos Alecrins,
sendo esta a refereucia mais recente que ácerca dela
pudémos encontrar.
Constança d'Aguiar, numa propriedade que possuia
nas proximidades da capela de S. Paulo, deixou-a one-
rada a seus herdeiros com a obrigação perpetua da ce-
lebração ailual de nove missas rezadas na capela da
Quietação.
Nesta ermida se batisarain, com as necessarias li-
cenças, em 1694 e 1705, Mariana e José, filhos do capi-
tão Bartolomeu d e Vasconcelos e sua mullier 3.Inacia
de Noronha, administradores da mesma capela.
N o s s a Senhora das
Brotas

No sitio da Q~iintadas Freiras e na margem direita


da ribeira de Santo Antonio erguia-se a capela conheci-
da pelo nome de Nossa Senhora das Brotas. Procurando
investigar a origem desta, para n6s, tão estranha deno-
.mimqão, apenas puddmos, apezar das nossas boas dili-
gencias, chegar a meras presunçòes e conjecturas, que
talvez estejam muito longe da verdade. Suposémos pri-
meiramente que aquele nome provinha, não da invoca-
ção ou orago da capela mas do lugar em que fôra edifi-
cada. Havendo uma erva medicinal com tal nome, seria
possivel que, existindo ali essa planta, désse o nome ao
local e depois á ermida. Depois conjéturámos que tendo
a provincia do Alentejo uma freguesia chamada Brotas,
onde existe um notavel santuario com a invocação de
Nossa Senhora das Brotas, poderia porventura, por mo-
tivos hoje desconhecidos, dar-se á capela aquela deno-
minação. Ambas as ipotesrs se verificam em varios
pontos desta ilha, sendo vulgar darem os primitivos co-
lonisadores, vindos de Portugal, os nomes das suas terras
ou sitios da sua predilecção a muitos logares onde aqui
se estabeleceram ou tiveram terras de sesmaria.
Em corroboração da primeira ipotese, temos que
referir a circunstancia de, noutros tempos e ainda pre-
NOSSA SENHORA DAS BROTAS 63

sentemente, se prestar culto a Nossa Senhora das


Brotas debaixo da invocação de Nossa Senhora d a Luz,
o que nos leva a presumir que aquela denominação diz
respeito ao lugar e não ao orago da capela.
Segundo o documeiito que em seguida transcreve-
mos, foi Manuel Martins Brandão, que em 1678 fundou
a capela das Brotas na quinta que possuia na margem
direita da ribeira, um pouco acima da ponte de Santo
Antonio.
.Dom Antonio Telles da Silva, por mercê d e Deus
e da Santa Sé Apostolica, Bispo do Funchal, Porto
Santo e Arguim, do conselho de Sua Alteza. Fazemos
saber aos que o presente alvará virem que Manuel
Martins Brandão morador nesta cidade 110s enviou a
dizer por sua petição que tinha fabricado na sua quinta
da Ribeira Grande da freguesia de Santo Antonio uma
ermida da invocação de Nossa Senhora das Brotas, á
qual tinha dotado de fòro em cada um anno para
sempre dois mil reis impostos da dita quinta para repa-
ro da dita ermida na fortila costumada, a qual
como constava
da escriptura que offerecia feita pelo notario Francisco
pelo que nos pedia que lhe
concedessemos licença para que na dita ermida se po-
desse levantar altar e dizer missa como nas mais ermi-
das deste nosso Bispado, mandando-se fazer vistoria e
que achando-se capaz com todo o necessario e decencia
devida lhe concedessemos a dita licença, e nos constando
pela visita que mandámos fazer pelo nosso escrivão da
cainara que este passou, estar a dita ermida decente-
mente ornada e com todo o necessario para se dizer
missa e celebrar os officios divinos e dotada com dois
64 PAROQUIA DE SANTO ANTOXIO

mil reis de faro impostos ria Quinta da Ribeira Grande,


como consta pela eseriptura feita na nota d o iiotario
Francisco
em 4 de Julho deste presente anno de 1678 que
fica no cartorio da camara. Havemos por levantar a
dita ermida e lhe damos licença para n'ella se dizer
missa e poder celebrar os afficios divinos como nas mais
ermidas deste nosso bispado, salvando sempre o nosso
direito e da pasochia a que pertence e que não prejudi-
cará, guardando-se sempre em tudo o costume e Coiis-
tituições do Bispado e mandamos que em tudo se
cumpra este nosso alvará como nelle se coiitém, sendo
lançado no livro grande dos registos d a camara para a
todo o tempo contar esta licença. Dado no Fnnchal sob
liosso signa! e sellos de nossas armas aos dias do
mez de Julho de 1678. Matheus Gomes escrivão da ca-
mara o fez .
D

Não sabemos se a quinta das Brotas tirou o nome


da capela ou se porventura lho deu. Resta ainda hoje
um predio urbano, que nos parece ser uma parte coiisi-
deravel da antiga casa solarenga. Da velha ermida estão
ainda de pé o portico e qiiasi todo o frontespicio e parte
das paredes laterais. Consta da tradição que as aguas
da ribeira, desviando-se do seu curso natural, em virtu-
de d a violencia d o corrente, destruiram uma parte con-
sideravel do adro, deixando o edificio ameaçado de imi-
nente desmoronamento.
Em 1732, visitando pastoralmente esta fregue-
sia o prelado D. Manuel Coutinho ordenou que o
administrador desta capela a provesse dos indispen-
saveis paramentos, pois de contrario a mandaria
fechar, e em 1736 notou ainda o visitador episcopal que
NOSSA SENHORA DAS BROTAS 65

tinha ela falta d e alguns objectos necessarios ao culto.


No primeiro quartel do seculo passado, e não sabe-
mos se ainda no principio do segundo, se celebravam os
oficios divinos nesta capela. Pouco depois d e 1843, ano
da construção do cemiterio, se levantou neste recinto
uma pequena capela, sendo para ela levados o altar e a
imagem da ermida d e Nossa Senhora das Brotas, que ao
presente ali se encontram ainda.
Acerca d o orago da capela e nome da imagem, en-
contramos o seguinte, num livro do arquivo paroqui-
ah-.Não se sabe ao certo qual a iiivocação da iniagem
de Nossa Senhora que está na capella do cemiterio. Sa-
bease que aquella imagein era da capella de Nossa Se-
nhora das Brotas, mas este titulo refere-se ao sitio onde
estava a capela e não á imagein. Representa esta a
Senhora com o menino nos braços, tendo no pedestal,
do lado direito, um peregrino de joelhos e ao lado es-
querdo uma vaca brava em atitude ameaçadora. O povo
venera aqiiela imagem sol) o titulo de Nossa Senhora da
Luz e por isso se lhe faz a festa a S d e Setembro*.
Pelas referencias que encontramos dispersas ein
alguns livros do arquivo desta freguesia, parece clue a
imagem d e Nossa Senhora da Luz ali venerada era
objecto d e cultos fervorosos, pois, além do mais, vemos
que Antonio Garanito, falecido no primeiro quartel do
seculo XVIII, deixou a sua mulher Joaquina de Freitas a
terça parte dos seus bens com o encargo da celebração
duma missa anual e perpetua nesta capela, que Manuel
Fernandes, nas diversas disposições com que morreu em
1776, inclue o d e serem ali celebradas setenta missas e
que Maria d e Freitas, falecida em 1746, dispõe em tes-
tamento que na mesma capela se digam trinta missas.
5
66 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Em 1736 era o morgado Pedro José de Faria Be-


tencourt, que juigo ser um sucessor do fundador Manuel
Martins Braiidão, o proprietario de capela e quinta das
Brotas e ali tinha residencia, tendo nela falecido um seu
filho menor em Março d o mesmo ano e que na mesma
capela foi sepultado.
Num antigo livro de linhagens, encontrámos o se-
guinte trecho, que nos parece ter alguma afinidade com
o objecto deste capitulo.
aIgnacio de Bettencoiirt e Camara.. . nasceu em
1643 e casou. . . com D. Antoiiia Rrandão, filha herdei-
ra de Pedro Gonçalves Brnndão. . . Fizeram morgado de
seus bens e o anilexarão ao que nelles tinha feito Ma-
nuel Martiils Brandão ( o fundador da capella) e em
todos elles succedeu Henrique Henriques d e Noronha,
filho de seu irmão Pedro Bettencourt Henriques».
Cremos que a capela e quinta das Rrotas perterice-
raili, em outros tempos, á casa 'l'erre Relia.
Capela d e Santa
Qui teria

O alferes Simão d e Nobrega e Sousa e sua mulher


Maria Tavares de Sousa, moradores na cidade do
Funchal, possiiiam uma quinta e casa de campo no sitio
do Pico do Cardo desta freguesia e resolveram levantar
ali uma capela da invocação d e Santa Quiteria, onde se
prestasse culto a esta bemaventurada lusitana e podes-
sem cumprir os preceitos religiosos durante o tempo em
que na mesma quinta houvessem resideacia.
A 3 de Julho de 1727, nas notas do tabeliào Do-
mingos de Abreu, se exarou a escritura da dotaçzo
anual de dois mil reis, feita por Simão de Nobrega e
sua mulher a favor da capela de Santa Quiteria que
acabavam de edificar, dotação imposta na sua quinta do
Pico do Cardo, afim de assegurar a conservação e esta-
do de asseio da mesma ermida, em conformidade com
as leis então vigentes. Por meados do mês de julho d o
anno referido, foi passado pelo bispo diocesano D. Ma-
nuel Coutinho alvará de licença para se poder celebrar
os actos do culto na nova capela.
A pag. 547 das notas ás Saz~dadesn'R Terra, diz o
dr. Alvaro Rodrigues de Azevedo o seguinte ácerca
.
desta ermida: n. . fundada por Simão d e Nobrega, no
Curral das Freiras, a qual foi, nnuito depois, por alvará
68 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

d e D. Maria r, d e 17 d e Março d e 1790, elevada a nova


freguezia~.No capitulo que neste opusculo consagrámos
ao Curral das Freiras, tivémos já ocasiáo de desfazer
o equivico do ilustre aaotador da obra de Frutuoso, e
agora acrescentaremos que na Camara Eclesiastica
deste bispado examinámos cuidadosamente uma copia
autentica da escritura a que acima fazemos referencia e
o original da petição dirigida ao prelado para a edifica-
ção da capela, não podendo existir sombra d e duvida
ácerca do local em que a mesma capela foi erigida. A
freguesia do Curral das Freiras foi na verdade criada
em 1790, mas a sua séde instalou-se na capela de Santo
Antonio, unica que ali existiu e que era pertença do
convento de Santa Clara, sendo a actual igreja paro-
quial construida por meados do seculo passado.
Apenas durante tres quartcs de seculo ou pouco
mais se celebraram os oficios divinos na capela de
Santa Quiteria. Em 1814 estava inteiramente profanada
e havia já alguns anos que ali não se realisavam os
actos do culto, tendo em 1813 o administrador dela, o
alferes Manuel Joaquim Rodrigues, enviado para a igre-
ja paroquial desta freguesia um calix de prata que á
mesina capela pertencêra.
Em 1783 e 1787 sepultaram-se nesta ermida dois
filhos menores do capitão Manuel Gomes da Silva, que
julgo seria então o administrador dela. .
Nem hoje restam vestigios da capela de Santa Qui-
teria, existindo ainda algumas pessoas que conservam
lembrança das suas ruinas.
Foi, edificada no sitio do Pico do Cardo, mas os
terrenos circunvisinhos tomaram o nome da ermida c
constituiram sitio iiovo e separado do do Pico do Cardo.
Capela d e N o s s a
Senhora d o Populo

A invocaçao desta capela é de Nossa Senhora d o


Populo, mas ninguem a conhece por este nome, sendo
comumente chamada do Pico do Cardo ou da Quinta
dos Padres. Esta denominação provém d e ficar a ermi-
da naquele sitio e na residencia que ali possuiam os
padres jesuitas.
Ignoramos o ano da sua fundação, presumiiido que
não seja anterior ao primeiro quartel do seculo xv111. A
quinta, que já o era em 1635, pertencera nesta epoca ao
morgado Gaspar d e Retencourt e Sá, que no seu testa-
mento, feito naquele ano, deixa a suas filhas D. kabel
de Betencourt e D. Ana d e Aguiar a terça dos seus
bens, com o encargo perpetuo da celebração anual d e
cinco missas, imposto na referida quinta. Desta verba
testamentaria SE: conclue que em 1635 não tinha sido
ainda construida a capela do Pico do Cardo, pois não é
provavel, a avaliar por muitos outros casos analogos
conhecidos, que ao ser onerada a quinta com aquele en-
cargo pio, não lhe estivesse ligada a obrigação d e
serem celebradas alguma das niissas na capela que por-
ventura ali existisse.
Esta propriedade, como mais largamente diremos
noutro lugar, foi adquirida pela Companhia de Jesus
7O PAROQGIA DE SANTO ANTONIO

entrc o periodo decorrido d e 163j a 1714, c foram por


ela construidas a casa e capela ainda hoje ali existenles,
que não nos parece serem anteriores ao ultimo quartel
do çeculo XVII ou primeiro do sCculo seguinte. A capela
e sem duvida anterior ao ano de I 74 j, como claramente
se vê da inscrição ali existente e que transcreveremos
no capitulo c011sagrado a Santo Inacio de Azevedo.
Em 1759, por ocasilo da expulsào dos jesuitas, foi
esta capela com a casa de residencia e terrenos anexos,
eiicorporada na Real Fazenda, e em 1770 comprada em
hasta publica por Francisco d e Agrela Espiiiola, perten-
cendo já em 1796 ao comerciante Pedro Jorge Moti-
teiro.
Ali se realisou em Agosto daquele ano o casamen-
to de Yedro de Sant'Ana e Vasconcelos com D. Jaciiita
d e la Tuelliere.
Esta capela, que tem a fornia hexagonal e fica quasi
contigua á residencia, está em bom estado de eonserva-
ção e nela se celebram os actos do culto catolico.
Pertence actualmente bem como a casa e predio
adjuntos a Antonio de Faria, que a houve por he-
rança d e seu pai Antonio de Faria, falecido em De-
~ e m b r ode 1 8 9 1 Pertenceu anteriormente ao prelado
desta dioccse Dom Manuel Agostinho Barreto, servindo
ent5o d e recreio e passatempo aos aluiios do Seminario
Diocesano, que ali iam frequeiitemente nas quiutas-feiras
c outros dias feriados do alio lectivo.
Os capitulas que dedicaremos aos jesuitas e á esta-
da de Santo Inacio de Azevedo nesta freguesia, comple-
terão as informações que pudémos obter acerca desta
pequena capela.
Capela d e N o s s a
Senhora das Preces

Fica a capela d c Nossa Senhora das Preces no sitio


a que ela mesma deu o nome. O povo, que em virtude
da lei do menor esforço, tende imperiosamente a sim-
plificar e a resumir a linguagem, chama-lhe apenas ca-
pela das Preces e o mesmo ao sitio onde ela s e en-
contra.
Apesar do anotador das Sciudades da Terra não
fazer menção desta ermida, sabemos que ela não é de
fundação muito recente. No altar-mór lê-se uma inscri-
~ ã latina
o alusiva á invocação d a capela e a data de
1768, que é provavelmente a da fuiidação, se nâo qui-
zermos admitir que ela se refere a urna reconstrução ou
a repairos importantes ali realisados. A falta d e mais
segura informação, vamos considerando o ano de 1768
como o da primitiva edificação desta pequena ermida.
Ignoramos o nome do seu fundador e se seria ca-
pela vinculada ou s6de de algum morgadio. Sabemos,
porém, que por 1770 era administrador dela o capitão
Rodrigo da Costa e que em 1796 pertencia ao morgado
Joaquim Manuel de F r a n ~ a .Em 1856 foram a capela e
casa contigua reconstruidas pela sua então proprietaria
D. Joana de Albuquerque e França. Sendo posto em
praça todo o predio rustico e urbano, foi em 1888 ar-
72 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

rematado em hasta publica por Francisco Eleuterio


Martliis, que por venda os cedeu, cm 1898, ao proprie-
tario desta freguesia, João Rodrigues d e Aguiar, per-
tencendo hoje aos seus herdeiros.
O capitão Joaquim RIanuel de França obteve de
Roma dois Breves, datados de 6 de Dezembro de 1796,
concedendo um deles indulgencia plenaria a todas as
pessoas que devidamente preparadas visitarem esta ca-
pela em qualquer dos nove diás que precederem o dia 5
de Agosto e outro concedendo a graça de Jubileu aos
que igualmente a visitarem no dia 8 de Setembro de
cada ano.
Damos em seguida uma copia dos dois diplomas
pontiiicios, que fielmente trasladámos dos respectivos
originais quc se encontram lia Camara Eclesiastica desta
diocese.
* PILS P. Y. V I -Aa' pcvpetuawr rei me~aoriam- Ad
augendam fidelium religionem et animarum salutem cc-
lestibiis ecclesiae thesauris pia charitate intenti suplica-
tionibus quoque dilecti filii Joachim Emanuelis da
F r a q a , omnibus et singulis utriusque sexus Christi fide-
libus vere penitentibus et confessis ac S. Comunione
refectis qui Eclesiam seu Capelain publicam B. Mariae
vulgo das Preces nuncupata villa a Pico do Cardo sub
Parochia S. Antoiiii Insulae Rladeirae Funchalen Dio-
cesis; in novem diebus coiitinuis imediate antecedentibus
diem quintam mensis augusti singulis annis devote visit.
et ibi pro chistianorum Principum concordia, Iiaeresum
extirpatione et S. Matris Ecclesiae exaltatione pias ad
Deum preces efuderint Plenariam spatio predictorum
novem dierum per unumquemque Christifidelem semel
tantum quolibet anno ad sui libitum eligendo lucrifaci-
CAPBLA DE NOSSA SENHORA DAS PRECES 73

endam Insuper iisdem Christifidelibus et vere peniten.


et confessis ac. S. Comunione refectis, qui predictam
ecclesiam die quinta mcnsis augusti a primis vesperis
usque ad occasutn solis diei hujusmodi ut supra visit. et
ibidem oraverint, Plenariam similiter omnium pecato-
rum suorum indulgentiam et remissionem misericorditer
in Domino concedimus. 111 contrarium facien. non
obstaii. quibuscu~nque, Presetitibiis perpetuis futuris
temporibus valituris. Datum Romae apud S. Petrum sub
annulo pis catoris die V I Decembris hIDCCXCV1. Pontit.
Nostri. Anno Vigessimo secundo..
UPIUS P. P. IV -Ad perpetuam rei nie~.ro~iuurz.
-Ad
augendarn fideiium salutem celestibus Ecclesiae thesau-
ris pia charitate intenti omiiibus e t singulis utriusque
sexus Christifidelibus vere peniten. et confessis ac S.
Comunione refectis qui Ecclesiam seu Capelam publi-
cam sub titulo Nostrae Dominae das Preces villa d e Pico
do Cardo in parochia sancti Antonii Funchalen in uno
anni die per ordinarium desigiianda primis vesperis
usqiie ad occasum diei hujusmodi singulis annis devote
visitat et ibi pro christiaiiorum principum concordia
hoeresum extirpatione ac S. Matris Ecclesiae exaitatio-
ne pias ad Deum preces efunderint Plenariam omiiium
peccatorum suorum Indulgentiam et rcmissionem mise-
ricorditer in Domino concedimus. Ut autem iidem chris-
tifideles coelestium munerum hujusmodi faciiius valeaiit
esse participes venerabili frati nunc et pro tempore
existenti Episcopo Funchalen aliquos presbyteros secu-
lares vel conjusvi; ordinis Congregationis et Instituti
Regulares ad excipiendas ipsorum sacramentales confes-
siones, alios aprobatos deputare qui eosdem christifide-
les eorum confessionibus diligentes auditis ab omnibus
74 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

et quibuscumque exccqsibus et criminibus ac casibus


sedi apostolicae reservatis, (haeresis, simoniae, duelli,
violationis clausurae monasteriorum monialium et recrir-
sus ad judices laicos contra'formam sacrorum canonum
exceptis) necnon excomunicationis, aliisque ecclesiasti-
cis seiitentus, censuris, et poenis, imposita cuilibet arbi-
trio suo poenitentia salutari in foro conscientiae tantum
absolvere atque vota simplicia in aliud pium opus eorum
similiter arbitrio et prudentia comutare possint, faculta-
tem pari auctoritate tenere pontificium tribuimus et
elargimur. Non obstan, apostolicis ac universalibus con-
ciliis editis generalibus vel specialibus, constitutionibus
et ordinationibus, coeterisque contrariis quibuscumque.
Presentibus perpetuis futuris temporibus valituris.
Datum Romae apud S. Petrum sob annulo piscato-
ris die VI Decembris MDCCXCVI. Pontif. Nostri Anno
Vigessimo sacundo».
Estes Breves obtiveram o Beneplacito Regio a 26
de Janeiro d e 1797, mas por motivos que desconhece-
mos s6 começaram a ter execução no ano de 1803.
A 2 de Novembro de 1800 sepultou-se nesta capela
1).Francisca Paula Espranger Castelo Branco, niulher do
capitão Joaquim Manuel de França, entáo proprietario
da mesma capela.
Tem junto uma excelente casa de moradia, talvez
de construção coeva da capela, e que, como acinia dis-
sémos, fui reedificada em 1856 por D. Joana Tereza dc
Albuquerque e França, que ali faleceu a 1 2 de Feverei-
ro de 1884.
Capela d e S. J o â o
e Santana

De muito longe vem a ideid da constru~ãoduma


capela no sitio do Trapiche desta freguesia. Já em 1606,
o bispo diocesano D. Luis Figueiredo de Lemos, na
visita pastoral que fez a esta paroquia, reconhecendo
que era uma necessidade a construção duma ermida
naquele bairro, determiAu que o paroco de então, o
padre Antonio Afonso de Faria, promovesse essa cons-
trução, socorrendo-se para tal fim dos auxilios que d e
certo lhe prestariam os habitantes dos sitios a que a
mesma capela ia especialmente aproveitar. O mesmo
mesmo prelado fez identica recomendação em 160s e o
bispo D. Lourenço d e Tavora, na visitação episcopal de
1613, novamente ordenou que se cumprissem as deter-
minações do seu antecessor, mas resultaram sempre in-
frutiferas as diligencias daqueles prelados. Só passados
dois longos seculos é que a ideia da construção duma
capela no sitio do Trapiche chegou a ser realisada. No
més de Fevereiro de 1791 requereu O capitão-mór An-
tonio Francisco d e Gouveia Rego, que possuia terras no
sitio d o Trapiche, licença para construir á sua custa e
como propriedade sua uma capela da invocação d e S.
João e Santana na fazenda que ali possuia. Sendo man-
dado ouvir o respectivo paroco, Pedro Antonio Xavier,
76 PAR0QUI.I DE SANTO ANTONIO

deu este, com data de 6 de Abril de 1791, o seguinte


informe, que, por nos parecer bastante interessante, tex-
tualmente transcrevemos:
*O sitio denominado Trapiche, onde o suplicante
pretende edificar a capella, dista desta parocliia uma
legua ou pouco mcnos e os caminhos são tão empinados
que em cahindo qualquer rocha é muito dificil subil-os e
descel-os sem perigo de precipicio. É por isso mesmo
que em tempo d e inverno os habitantes daquelles sitios
e dos que lhe ficam visinhos, principalmente mulheres,
não poderem vir á parochia nem a algumas das ermidas
que lhe ficam na mesma distancia e é com bastante tra-
balho e fadiga que acodem os parochos aos sacramea-
tos a que são chamados daqueiles mesmos sitios, o que
faz vêr não só utilidade mas grande necessidade que ha
duma ermida naquelle sitio. Esta mesma necessidade
existia já quando no anno de 1606 sendo bispo desta
diocese o ex.'"O sr. D. Luiz de Figueiredo na visitaçgo
desta Egreja deixou provido que os freguezes daquelles
sitios se juntassem para fazerem ali uma ermida, reco-
mendando ao vigario promovesse isto mesmo, determi-
nação que se repetiu na visitação do anno d e i608 e se
tornou a recomendar na de 1613, em que era bispo
desta mesma diocese o ex.'"O sr. D.Lourenço de Tavo-
ra, o que nunca se efectuou talvez pela pobreza
daquelles moradores, e o que tudo se deixa vêr dos
provimentos das antigas visitações desta Egreja. E se já
naquelle tempo, do qual até ao presente tem decorrido
185 aniios, em que naquelles sitios era muito limitada a
povoacão havia necessidade e repetidamente advertida,
quando será essa hoje havendo-se dilatado tanto aquella
povoação que até já pelas serras se vae estendendo e
cada dia s e dilata mais. A vista pois d o exposto julgo
que não só se deve permitir ao suplicante a implorada
icença mas fomentar-lhe o zelo, em que tanto interessa
la utilidade espiritual daquelles habitantes. Isto é o que
devo informar a V. E x . ~Rev.Ina, que determinará
sempre o que lhe parecer mais justo».
A 19 de Abril de 1791 o bispo diocesano D. José
da Costa Torres concedeu a licença pedida, julgando
de todo aceitaveis as considerações feitas pelo paroco
no seu informe. Apesar da concessão da licença, ainda
desta vez se não realisou a ideia, já bastante antiga, da
construção da capela no sitio do Trapiche. Ignoran~os
os motivos que obstaram a que o capitão-mór Antonio
Francisco d e Gouveia Rego desistisse d o seu intento,
dando de mão á edificação que projectara e que parecia
prestes a realizar-se, em vista da licença que lhe fora
concedida. Só passado o periodo relativamente longo
de 23 anos e depois do,kdiecimento dele, é que seu filho,
o sargento-mór João Antonio de Gouveia Rego levou a
cabo a projectada construção, cumprindo deste modo os
desejos manifestados por seu pai.
Eln virtude das disposições legais então vigentes,
teve o capitão João Antonio de Gouveia e sua consorte
D. Maria Paula d e Gouveia Rego de dotar a capela com
a importancia anual de quatro mil reis, destinada á sua
conservação, e que foi imposta numa propriedade rusti-
ca, que os mesmos proprietarios possuiam no sitio dos
Casais da freguesia do Arco de S. Jorge e que houve-
ram por compra feita a Antonio Gomes da Silva e sua
mulher, moradores na referida freguesia, celebrando-se
a respectiva escritura de dotação a 27 de Junho d e
1814.
7S PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

O vigario desta freguesia José Joaquim de Sousa,


em cumprimento d e ordens superiores, procedeu á vis-.
toria d o estilo a 12 de Agosto d e 1814, e sendo a cape-
la encontrada nas coiidições exigidas pelas leis canoni-
cas, se coilcedeu a respectiva licença para nela se pode.
rem realisar os oficios divinos. Foi benzida e ali se
celebrou a primeira missa a 14 de Agosto de 1814.
A propriedade desta ermida passou do seu funda-
dor, o capitão-mùr João Antonio de Gouveia Rego, a
seu filho o morgado Manuel d e Gouveia Rego e deste a
sua filha a ~ r D.. Maria
~ Paula Kniglofer Rego, que dela
fez doac;ão ao reverendo motisenhor Manuel Joaquim de
Paiva, vigario da freguesia de S. Pedro.
Fica esta capela contigua á excelente casa de mo-
radia da quinta do Trapiche. Nesta bela casa d e campo,
donde se disfruta um vasto e surpreendente panorama
sobre a cidade e arredores, teem tido permanenciz mais
ou menos demorada algumas personagens ilustres, como
sejam os prelados desta diocese D. Patricio Xavier de
Moura, D. Aires de Ornelas de Vasconcelos, D. Manuel
AgostillhO Barreto, D. Antonio Manuel Pereira Ribeiro
e ainda outras pessoas notaveis.
O distinto madeirense, o arcebispo de Goa, D.
Aires de Ornelas, ali passou parte do vergo de 1879, e
na biografia deste ilustre prelado escrita por seu irmão
o conselheiro Agostinho d e Ornelas encontramos áquele
facto a seguinte referencia:.-«ainda depois de voltar da
India, doente d e doença mortal, carecendo do mais
absoluto descanso,foi confessar e ajudar a bem morrer
um pobrissimo jornaleiro visinho da quinta onde passa-
va o verão».
D. Manuel Agostinho Barreto, o eminente e nunca
esquecido bispo da Madeira, ali passou a estação cal-
mosa durante alguns anos e tinha por aqueles sitios, que
percorria em frequentes passeios, uma predilecção espe-
cial, que não procurava ocultar.
Esta quinta e casa de campo, com seus terrenos e
construções anexas, constituem hoje as diversas depen-
dencias do Manicomio, que ali manteem os benerneritos
irmgos d e S. Joáo de Deus com o nome d e Casa de
Sazide cio Tmpiche de que adiante daremos desenvolvida
noticia.
Capela de Santa
C r u z e Almas

Projectou-se no seculo XVII a construção duma ca-


pela, especialmente consagrada ao culto e sufragio pelas
almas do purgatorio, que teria a invocação de Santa
Cruz e Almas. Esta ideia só parcialmente se executou,
pois que a edificação da erniida não chegou nunca a
concluir-se.
No mês de Junho de 1667 foi concedida a licença
para aquela construçlo, mas ignoramos se ela começou
desde logo ou se decorreram anos para dar-se inicio
aos respectivos trabalhos. É todavia certo que as obras
não chegaram a uma conclusão definitiva e nem mesmo
sabemos em que alturas ficou a iniciada construção.
Tambem não parece haver duvida que a ermida 1180
chegou a ser consagrada ao serviço do culto e apenas
nela se sepultou, em Outubro de 1706, um individuo
por nome Francisco Fernandes, do sitio do Vasco Gil,
Segundo a legislaçiio então vigente, foi feita á ca-
pela a respectiva dotação, imposta em uns terrenos,
que, 69 anos depois da mesma dotação, ~ s t ocS em 1736,
já se não sabia onde ficavam situados nem se conheciam
as pessoas que indevidamente os possuiam. A isto se re-
fere o seguinte trecho do provimento do'ano de
1736:-=A ermida de Santa Cruz e Almas, para que se
CAPELA DE S A N T A CRUZ E ALJIAR 8I

&u licença aos maiordomos dela em Junho d e 1667,foi


dotada com os rendimentos de uns pedaços de terra
e como a dita ermida nso está acabada nein
a Confraria possue os taes pedaços de terra
se manda com pena de excomunhão maior a qualquer
pessoa que tenha noticia de taes p e d a ~ o sde terra
o descubra a o reverendo parocho* . .
Supomos que esta capela se levantava nas imedia-
ções da igreja paroquial ou talvez mesmo fosse coi~tigua
a esta, tendo sido demolida quando a antiga igreja foi
substituida em 1783 pelo tempo actual.
Havia nesta freguesia a Confraria das Almas, a que
esta capela pertencia, e que certamente por falta de re-
cursos não ultimou as obras da mesma capela, que seria
a séde da referida Confraria.
No capitulo consagrado ao Cemiterio desta íregue-
sia, daremos noticia da capela q u e ali se encontra c que
C conhecida pelo nome de Nnssa Senhora da 1 ~ 7 .
N o s s a Senhora de
Guadalupe

É sabido que principalmeiite em Espanha se presta


desde seculos culto fervoroso a Nossa Senhora de Gua-
dalupe, passando depois para o nlexico, onde tambem a
devoção para com a Virgem Imaculada, debaixo desta
invocação, é grande e muito generalisada, existindo na-
queles paises santuarios celebres, centros de inumeras
romagens e aceiidrada piedade, que teem por especial
objecto importantes manifestações de culto em honra da
Santissima Virgem.
Em Portugal tambem ha varios templos, em que se
cultiva a devoção para com Nossa Senhora de Guada-
lupe, e nesta diocese sabemos que a igreja paroquial do
Porto da Cruz lhe é consagrada e que nesta de Santo
Antonio existe uma bonita capela, que igualmente lhe 6
dedicada. Lembra-nos d e ter lido ha aiios um sermão
de Nossa Senhora de Guadalupe, em lingua espanhola,
em que se dizia que da ilha da hladeira iam anualmente
para Espanha avultadas esmolas destinadas ao culto
desta invocação. Não sabemos se tem fundamento serio
esta afirmativa e menos ainda conhecemos quaisquer
outras particularidades que lhe digam respeito.
Ignoramos até onde remonta, nesta freguesia de
Satito Antonio, o culto prestado a Nossa Senhora de
N0SS.Z SENHORA DE G U A D A L U P E s3

Guadalupe, mas é indubitavelmente anterior a 1652,


pois já então existia a confraria daquela denominação,
'sendo d e presumir, e ha bons fundamentos para acredi-
ta-lo, que muito anteriormente áquele ano já aqui esti-
vesse generalisado este culto. Na antiga igreja paroquial
era-lhe consagrado um altar OU capela especial, que
sempre fôra objecto de fervorosos cultos por parte dos
habitantes desta paroquia. Em diversas epocas e no-
meadamente no ano de 174: se fizeram importantes re-
pairos nesta capela, custeados pela respectiva irman-
dade.
Na nova e ampla igreja, que se edificou em 1783,
foi-lhe destinado o principal altar, depois do do orago e
doSaiitissimo Sacramento. A nova capela, embora despi-
da de grandes primores artisticos e apesar da sobriedade
dos seus ornatos, 6 de uma notavel elegaticia e dá-nos,
no seu coiijiincto, um certo ar de magestadc c de bele-
za, que impressiona muito agradavelmente.
Quando se projectou a construção da nova igreja
paroquial, estava naturalmente indicado que seria a
confraria de Nossa Senhora de Guadalupe que princi-
pafmeiite concorreria para o custeamento da capela da
sua padroeira, mas a irmandade disponha d e parcos re-
ciirsos e não teria talvez entre os seus confrades quem
tomasse a iniciativa duma obra relativamente importan-
te e dispeiidiosa como esta. Tudo o que se fez, deve-se
quasi inteiramente ao acendrado zelo e inexcedivel dedi-
cação do então cura desta paroquia o padre Manuel
João Pereira de Sousa. Se ele não fôra, certamente que
no novo templo só teria sido consagrado a Nossa Se-
nhora de Guadalupe um pcqueao e n~odestoaltar. O
dr. Antonio Pereira Borges, vigario desta freguesia na
84 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

epoca da edificação da actual igreja, dizia em Dezembro


d e 1797, referindo-se ao mesmo cura:-«. .. a cujo in-
dizivel zelo se deve a obra da mencionada capella, que
se não fora a sua diligencia e louvavel zelo ella nunca
se completaria, pois que ninguem se sejeitaria ao
grande trabalho e fadiga a que elle se tem sujeitado
por mera devoção, o que não deixará de lhe ser recom-
pensado pela mesma Senhora, o que tudo não só se faz
digno d e aprovação mas d e louvor, e se lhe deve supli.
car queira continuar no mesmo zelo e fervor,. Foi o
padre Manuel J. Pereira de Sousa, que não só tomou a
iniciativa da construção da capela, como tambem anga-
riou os necessarios donativos e presidi~idesveladamen-
te á direcção de todos os trabalhos até á sua conc1usã.o
definitiva, tendo tambem contribuido com uma quantia
avultada para as mesmas obras.
Os trabalhos da respectiva edificaçZo começaram
em Abril de 1784 e só terminaram em Juiilio de 1797,
tendo havido varias interruções por falta de recursos
e tambem por algumas imprevistas dificuldades que
surgiram. O total da sua construção elevou-se a cerca
d e dois contos e setecentos mil reis, tendo sido custea-
da esta despeza com as esmolas dos fieis arrecadadas
em toda a paroquia e com varios donativos particula-
res. A respectiva Confraria, dispondo de minguadas re-
ceitas, teve uma parte diminiita no custeamento daque-
las obras. As cantarias do arco, portas e janelas atingi-
ram a importancia de 604$00o reis, tendo a mão de
obra do altar custado 532$000 reis e a sua pintura e
douramento aproximadamente 500$0oo reis. O altar foi
construido em 1797 pelo artifice Estevão Teixeira e o
seu douramento e ornatos executados pelo pintor
NOSSA SENHORA DE GUADALUPE S5

francês Boaventura Beze. Por esta epoca adquiriram-se


dbze castiçais de madeira dourada, que custaram
76$oo0 reis.
Foi a 18 de Dezembro de 1808, quando os traba-
lhos de construção e pintura se achavam definitiva-
mente concluidos, que se colocou a imagem de Nossa
Senhora d e Guadalupe na sua capela, realisando-se por
essa ocasião um imponente prestito religioso, em que
se encorporou a maior parte dos fieis desta paroquia,
manifestando a mais indizivel satisfação pelo total aca-
bamento das obras, que todos se empenharam em levar
a cabo.
O proprio iniciador desta obra deixou exarado
num livro d o arquivo paroquial: < A mesma Senhora
permitta remunerar-me na eternidade a dedicação, zelo
e trabalho que tive com esta obra e a todos os paro-
chianos que deram suas esmolas, pois sem estas nada
se fazia,.
Quiz ele manifestar o seu reconhecimento aos que
tão dedicadamente o auxiliaram na realisaçso daquele
empreendimento, dando-lhes e aos seus vindouros um
testemunho perpetuo do apreço em que tivera o seu
zelo pelo culto da Virgem Senhora de Guadalupe. Soli-
citou e obteve de Roma um Breve d e indulgencia ple-
naria, que pode ser lucrada por todas as pessoas que
devidamente dispostas, visitarem aquela capela na
quarta dominga de Agosto, dia em que se realisava a
a festa da sua padroeira. Transcrevemos o documento
comprovativo daquela concessão:
.Pio Papa Setimo. Para perpetua memoria desta
graça, applicados Nós com paternal caridade a aug-
mentar a religião dos fieis e a salvação das almas com
86 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

os celestia~sthesouros da Egwja-Concedemos miseri-


cordiosamentc em o Salvador, indulgencia Plenaria e
remissão de todos os seus pecados a todos os fieis ckiris-
tãos d'urn e outro sexo, que verdadeiramente contritos,
confessados e commungados, visitarem devotamente
todos os alinos, a parochial egreja de Santo Antonio da
ilha da Madeira, do Bispado do Funchai, desde pri-
meiras vesperas da quarta dominga do mez de Agosto
até o pôr do sol do mesmo dia, e ahi fizeram piedo-
sas suplicas a Deus pela paz e concordia entre os prin-
cipes christãos, extirpação das heresias e exaltação da
santa madre egreja. As presentes valerão por todos os
seculos futuros. Dado em Roma junto da Santa Rlaria
Maior, debaixo do annel do pescador, em os trinta dias
de Julho d e mil oitocentos e cinco, no anno sexto do
:iusso Pontificado. Pelo senhor Cardeal Broschio de
Honestis, G. Bernie, substituto..
O referido sacerdote Manuel João Pereira de Sousa
sempre devotado ao culto da Virgem Imaculada sob a
invocação de Nossa Senhora de Gnadalupe, alcançou
tambem da Santa Sé um breve datado de 14 de Julho
de 1805, em virtude do qual é permitido, na quarta do-
minga de Agosto, celebrar-se na igreja paroquial desta
freguesia missa cantada votiva de Nossa Senhora, se-
gundo as clausulas e restrições que no mesmo breve
veem indicadas. Esse documento, cujo original 'se con-
serva no respectivo arquivo paroquial, é assim conce-
bido:
S. Srnus Diius Noster Pius v11 Pont. Max. ad hunii-
limas preces hodierni parochi ecclesiae parocliiaIis titulo
de S. Antonii Aladerae Funchalen Diocesis me infrascro
Secretario benigne indulsit ut quotannis in domiilica rv
NOSSA SENHORA D E GUADALUPE 87

mensis augusti modo non occurrat officium ritus dupl.


primae vel secundae classis, occasione peculiaris festi,
quod agitur in dicta ecclesia in honorem B. M. V. quae
dicitur de Guadalupe ab omnibus sacerdotibus ad Sa-
crum faciendum convenientibus in eamdem Ecclesiam
celebrari possit Missa propria jam approbata de eadem
B. M. V. cum commemorationibus tamen offici diei, do-
minicae aliisquc occurrentibus xta rubricas in omnibus
missis privatis atque etiam in missis cum cantu si pres-
teria ecclesia celebrata non fuerit missa conventualis de
die. Occurrente ver0 officio ritus dupl. secundae classis
dumtaxat, indulsit ut celebrari possit una tantum missa
cantu ut supra.
Die 14 julii 1 8 0 5 .
O padre M. Pereira J. de Souça continuou até á
morte, prestando á Confraria e devoção de Ciuadalupe os
mais desintèressados e rcvelantes serviços na qualidade
de zelador, que foi da mesma confraria, melhoran-
do e dotando a capela com valiosos objectos destinados
ao culto, como foram uma lampada de prata que impor-
tl)u em quantia superior a 300$0oo reis, uma corba do
mesmo metal para a imagem de Nossa Senhora que
custou 58$880 reis, além dum frontal do altar comprado
em Lisboa por 125$480 reis, não contando ainda coni
varios repairos e outros melhoramentos realisados na
mesma capela. Faleceu este benemerito sacerdote a 21
de Junho de r81 I . Jaz sepultado, segundo sua propria
disposição, na capela de que foi o mais dedicado bem-
feitor e á qual se acha indissoluvelmente ligado o seu
nome.
Como dissémos no principio deste capitulo, a refe-
rencia mais antiga que encontrámos á confraria de Gua-
88 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

dalupe remonta ao ano d e 1652, conjecturando, porém,


que a sua criação é muito anterior aquela data. Era,
depois da do Saiitissimo Sacramento, como ainda o 6
actualmente, a irmandade mais importante desta paro-
quia. Possuia varios predios, onerados com encargos de
missas perpetuas, no Vasco Gil, Jamboto, Curral Velho,
Roa Vista e outros sitios. Teve escrituração regular da
sua receita e despeza até 1842. NO ano de 1897 organi-
zou seu compromisso ou estatutos, que receberam a
aprovação da autoridade competente, mas a falta de
cumprimento das respectivas prescrições legais reduzi-
ram-na a um simples agregado de pessoas, que se desti-
na unicamente á celebração duma festa anual em honra
de Nossa Senhora d e Guadalupe.
Entre os mais devotados bemfeitores desta irman-
dade conta-se o padre Pedro Gonçalves d e Aguiar, na-
tural desta freguesia e que nela faleceu a 20 de
Setembro de 1722, jazendo sepultado na capela d e Gua-
dalupe com lagea tumular e epitafio proprios. Tambem
ali se sepultou Ana de Oliveira, bemfeitora d a mesma
confraria, á qual legou varios bens de raiz com encargo
de algumas pensões pias.
Por ocasião d a missão religiosa que houve nesta
freguesia em 1878, dirigida pelos padres Thomaz Vitale
e Joaquim hlachado se estabeleceu a liga do Apostolado
d a Oração e d o Sagrado Coracão de Jesus, dando-se-
lhe como séde a capela de Nossa Senhora d e Guadalu-
pe, onde se encontra o competente diploma d e agrega-
ção, que tem a data de 2 d e Outubro daquele ano.
Pouco tempo depois se adquiriu a imagem do Sagrado
Coração de Jesus, que até ha poucose~veiieravano mesmo
altar e onde, em todas as primeiras sextas-feiras de cada
mez se faziam os actos religiosos que estão preceitua-
dos para estas ocasiões.
Em 1894, a pia associação do Sagrado CoraçSio d e
Jesus mandou proceder a importantes repairos lia pin-
tura e douramento desta capela, devido principalmente
ao zelo e diligentes esforços do padre Teodoro João
Henriques, cura da paroquia, dispendelido-se aproxima-
damente trezentos mil reis nesse melhoramento. Nunia
das faces laterais de altar se encontró. o seguinte:-.Esta
capella foi mandada pintar e dourar em 1894 pela As-
sociação do Sagrado Coração de Jesus, sendo director o
cura Teodoro João Henriques)~ .
O decreto d e 2 1 de Setembro d e 1835 mandou
proceder á construção d e cemiterios em todas as fre-
guesias, proibindo, sob qualquer pretexto, os enterra-
mentos nas igrejas. Esta importante providencia gover-
nativa não teve por toda a parte uma pronta e imediata
execução, como sucedeu nesta freguesia, não sendo, to-
davia, a ultima paroquia deste concelho, que foi dotada
com esse importante e indispensavel melhoramento.
Foi na Quinta das Freiras e no predio rustico que
ali existia, pertencente ao convento de Santa Clara, o
local escolhido para a construção do cemiterio, tendo a
Camara Munieipal tomado esta deliberação na sua
sessão de 18 de Julho de 1837. O engenheiro Vicente
Paulo Teixeira apresentou o projecto e orçamento dos
trabalhos a executar na sessão ordinaria d e 25 de
Agosto de 1837, mas, sómente no ano imediato se deu
começo ás obras de construção. O paroco, que então se
encontrava á testa desta freguesia, o padre Manuel Joa-
quim de Sousa Gouveia, foi encarregado pela Camara
Municipal d e dirigir e superinteiider nos serviços d e
construção, o que fez com o maior desinteresse e com
todo o zelo e competencia.
Os respectivos trabalhos decorreram com bastante
lentidão e só foram dados por inteiramente concluidos
no ano de 1843. No entretanto realisou-se ali o primeiro
enterramelito a 12 de Outubro d e 1839, dando-se á se-
pultura o cadaver duma criança, por nome José Martins,
filho d e Francisco Pllartins e d e Gregoria Rosa, mora-
dores no sitio da Ladeira. A partir desta epoca, cessa-
ram completamente os enterramentos na igreja paro-
quial, sendo a 6 de Outubro de 1839 o ultimo que ali
se fez.
Com o notavel aumento da população, tornou-se o
recinto do cemiterio de acanhadas dimensões para o
serviço da paroqcia, tendo a Camara Municipal proce-
dido ao seu alargamento no ano d e 1w3. A ben<;ão,que
foi lançada pelo Prelado Diocesano e que revestiu a
maior imponencia, realizou-se no dia 27 de Dezembro
daquele ano, com a assistencia da vereação e duma
grande multidão de pessoas. Depois do cemiterio das
Angustias, ficou sendo o mais vasto de todo o distrito.
O primeiro guarda deste cemiterio foi João Jose
dos Santos, nomeado a 8 de Outubro d e 1839, com o
vencimento anual de GO$OOO reis. Teem sido guardas
deste cemiterio Teodoro João Henriques, Augusto Er-
nesto Afonso e Antonio Gornes dos Santos.
No concelho do Fuachal, além do cemiterio das
Angustias, é o unico que tem capela privativa para o
serviço religioso dos funerais. Foi erigida pouco depois
de 1843 e quando se achavam já concluidas as obras
da construção do cemiterio, sendo portanto a capela
desta freguesia d e mais recente fundação. Quem exami-
nar o seu altar, descobre sem esforço que é duma epoca
muito anterior á da edificação da capela. Pertenceu á
g2 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

ermida d e Nossa Senhora das Brotas e por isso remete-


mos o leitor para o capitulo que, ácerca desta, inserimos
já neste opusculo. A antiga imagem, ali existente, foi
ha poucos anos substituida por outra, tendo-se ganho
pouco com a substituição, debaixo do ponto d e vista
artistico.
Nesta capela celebra-se de quando em quando o
santo sacrificio da missa e no principio do outono reali-
sa-se ali a festa de Nossa Senhora da Luz, que é o ora-
go da referida ermida.
Epidemias

Acerca das doenças d e caracter epidemico, que


grassaram na Madeira nos seculos xv, XVI e XVII, não
pudémos alcançar noticia dos estragos que elas por ven-
tura teriam causado nesta freguesia. Devemos, porém,
supor que a epidemia da peste, que tão intensamente
se alastrou neste arquipelago no longo periodo d e 1 5 2 0
a 1538 e que vitimou uma parte consideravel da sua
população, causasse a morte a muitos individuos doini-
ciliados nos limites desta paroquia, ignorando-se o que
aqui teria acontecido com relação ás molestias epidemi-
cas do seculo XVII e primeira metade d o seculo XVIII.
1751 e 1787.-Em 1 7 5 1 desenvolveu-se nesta ilha
uma terrivel epidemia d e sarampo, que causou inume-
ras vitimas. Fala dela com horror o distinto madeirense
dr. Julião Fernandes da Silva no seu curioso livro
Carta critica sobre o metodo curativo dos meclicos fufuncha-
Zenses, publicado no ano de 1 7 5 2 . Nesta freguesia gras-
sou essa doença com caracter benigno, tendo sucumbi-
gio a ela cerca d e trinta individuos. No ano d e r787 foi
esta paroquia assolada por .uma epidemia de variola,
sendo bastante consideravel o numero de casos fatais.
r808 e 1816.-Uma molestia de caracter epidemico
94 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

que grassou nos mêses de Julho, Agosto, Setembro e


Outubro de 1808, causou uma grande mortandade nas
crianças, trazendo muito alarmada a população. No alio
d e 1816 tambem se fez sentir largamente nesta paro-
quia, com o ataque e morte de muitas pessoas, a doen-
ça epidemica que então lavrou em toda a ilha, sendo o
alastramento do mal atribuido em boa parte aos enter-
rameiltos nas igrejas, que passaram a fazer-se proviso-
riamente rios adros e em torno dos respectivos
templos.
r834 - ~835.-Nos fins do ano d e 1834, começou a
grassar urna molestia epidemica, cuja natureza desco-
nhecemos, tendo vitimado muitos crianças e adiiltos. A
Camara Municipal estabeleceu um hospital provisorio
na casa d e habitação da quinta do T,eme, para trata-
mento dos atacados, nos primeiros dias de Janeiro de
1835, que fuiicionou durante algu~ismêses e que era
mantido pela mesma Camara.
Epide~ziucoler{ci.n de I ~ ~ ~ .hojc
- Éimpossivel ave-
riguar a data precisa em que a colera, irradiando-se
pelas freguesias circunvisinhas da cidade, tivesse apare-
cido em Santo Antonio. O primeiro caso fatal, porém,
deu-se a 1 7 de Julho, isto é I 5 dias depois das primeiras
manifestações da doença no regimento d'infantaria 1 i . O I ,
sendo vitimada por ela uma mulher d e nome Maria
Rosa, casada com João Gomes e moradora no Vasco
Gil. No dia imediato deu-se o segundo caso fatal numa
criança d e iiome Carolina, filha de José Gomes Cama-
cho e residente no sitio das Foiites.
A epidemia tomou aqui em poucos dias um aspecto
muito grave, difui~diiido-secom grande rapidez, o que
desde logo aconselhoii a criação dum hospital proviso-
rio, especialmente destinado a receber os colericos
menos favorecidos da fortuna. O hospital estabeleceu-se
na casa da Quinta do Leme e começou a funcionar nos
primeiros dias de Agosto, encerrando-se no fim do mês
de Setembro seguinte.
Segundo a estatistica oficial, faleceram ali I 10 co-
lericos, devendo contar-se neste numero alguns das vi-
sinhas freguesias de S. Martinho e S. Roque. Ainda
conforme a mesma estatistica foi de 214 O numero total
de individuos que nesta freguesia sucumbiram vitimas
da epidemia, assim distribuidos por idades: de I a 10
anos 35 individuos; de 10 a 2 0 anos 9; de 20 a 30 anos
20; de 30 a 40 anos 44; d e 40 a 50 anos 39, de 50 a 60
anos 40; de 60 a 70 anos '15; d e 70 a 80 anos I I; d e
mais de 80 I .
Os dados fornecidos pelo respectivo livro de
obitos da igreja paroquial desta freguesia diferem das
notas oficiais, prestando n6s antes credito áqueles do
que a estas, pois que no referido livro se encontra um
termo para cada falecido, com a designação do nome,
filiação, dia e sitio em que morreu etc., o que exclui a
ideia de engano de numero para mais, podendo, quanto
muito, haver engano para menos. Por esse livro se vC
que a totalidade dos que sucumbiram á epidemia atingiu
o numero de 289, isto é, mais 75 do que o indicado
pelo relatorio oficial.
Como dizemos acima, o primeiro caso fatal mani-
festou-se no dia 17 d e Julho, tendo-se dado o ultimo a rg
d e Outubro seguilite. A mortalidade atingiu a sua maior
intensidade no dia 10 de Agosto, em que sucumbiram
I 5 individuos á terrivel epidemia. Foi no periodo de-
corrido de 5 a 10 do mesmo mês que o mal mais se
9'5 PAROQUIA DE SANTO ANTOflIO

exacerbou, tendo naqueles dias respectivamente morri-


do 9, 5, 14, 4 e 15 pessoas.
A molestia espalliou-se por todos os sitios, sendo
nas Encruzilhadas, Courelas, Madalena, Fontes, Bolique-
me, Pomar d o Miradouro, Pico dos Barcelos e Lombo
dos Aguiares aqueles em que foi maior a percentagem
da mortalidade.
r872, 1890 e 1891.-Nestes anos graçsou a epide-
mia d a variola nesta paroquia, tendo causado bastantes
vitimas, especialmente em individuos de tenra idade.
Pneiunonias pestosas dè 1907.-No mês de Julho do
ano d e 1907 apareceu no sitio da Madalena desta fregue-
sia uma molestia de csracter suspeito, que, atacando çu-
cessivamente treze individuos, sucumbiram todos á vio-
lencia do mal que os acometera., A insolita doença alar-
mou os rnedicos, alarmou profundamente a população e
criou uma situação muito melindrosa ás autoridades
civis e sanitarias, que tiveram d e intervir no estranho
caso. Um grande panico se ia apoderando dos espiritos,
pois já não era segredo para ninguem que quasi todos
os atacados, depois duma curta doença de dois ou tres
dias, eram vitimas da inexoravel epidemia. Um indivi-
duo que fôra assistir á missa no domingo, sem pressen-
tir qualquer incomodo d e saude, morria na terça-feira
imediata e nesse mesmo dia era o cadaver dado á se-
pultura.
Felizmente que as providencias adotadas para com-
bater o alastramento da terrivel doença foram energicas
e imediatas. Ao governador civil de entào, o capitão-te-
nente Boaventura Mendes de Almeida, se deve princi-
palmente a atitude que tomaram a Junta de Saude, as
entidades oficiais, as autoridades sanitarias e os medi-
,tos, e ainda tambem o rigor que se manteve no i-ola-
mento c no cordão sanitario que se tornou iiccessario
estabelecer. A doença, que logo tomou a feiçso dum
terrivel e implacavel flagelo, foi eficazmente combatida
e dominada, voltando em breve á normalidade o e'jtado
sanitario desta paroquia.
Foi victima da sua dedicação profissional o medico
Luis Vicente da Silva, que então exercia clinica e tinha
residencia nesta paroquia. Contraiu a doença no trata-
mento dos atacados, aos quais atendeu e assistiu com o
maior zelo e desinteresse, devendo-se á sua memoria
um preito de gratidão pelos altos e relevantes serviços
que prestou em tão aflitiva conjuntiira. Foram mais feli-
zes os parocos desta freguesia, que, embora tivessem
pronta e abnegadamente ministrado aos doentes os
socorros espirituais sem pensar no perigo do contagio,
não contrairam a molestia, saindo incolumes do desem-
penho das suas funções eclesiasticas. O mesmo aconte-
ceu ás benemeritas franciscanas, da Congregação da Irrnã
Wilson, que, durante o tcrnpo em que se manteve o
cordão sanitario, prestaram os mais assinalados e desin-
teressados serviços.
Acerca das causas remotas e proximas desta doeii-
ca epidemica, do seu diagnostico, etiologia, medidas
adotadas para a dzbelar etc. enviou o delegado de
saude do distrito dr. Nuno Silveste Teixeira ao gover-
no um extenso e interessantissimo relatorio, que foi pu-
blicado em vinte e um numeros do antigo Dinrio (10
Comercio dos mezes de Julho e Agosto de 1908. Nesse
relatorio classificou o dr. Nuno Teixeira a doença d e
piaetrmonins rutnlignns, talvez com o receio de que a
palavra peste podesse ainda ferir a sensibilidade dos
g8 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

madeirenses, depois dos acontecimentos tragicos do La-*


zareto, que ainda estavam bem frescos na memoria de
todos. Desse notavel documento transcrevemos os se-
guintes trechos:
*A Junta Districtal de Hygiene, reunida no dia 8
de Agosto, para ser ouvida sobre os meios a empregar
afim de impedir a propagação da molestia, foi de pare.
cer, visto o Lazareto não se achar em condições de
serem lá internados os doentes, por ter ainda em trata-
mento alguns variolosos, que fossem os pneumoiiicos de
Santo Antonio rigorosamente isolados nas suas casas,
empregando-se n'este serviço de policia sanitaria os sol-
dados do regimento de infantaria 27, aquartelado n'esta
cidade; e se preparasse, quanto antes, no Lazareto, a
casa do hospital, principalmente, por ser a mais afasta-
da, para n'ella serem isolados os casos que appareces-
sem fóra dos domicilios dos que já estavam atacados.
N'esse mesmo dia fui ao Lazareto, e, de accordo com
Miss Wilson, ficou resolvido que os variolosos que se
achavam no hospital d'aquelle edificio fossem n'esse dia
removidos para o 2 . O andar do armazem das bagagens,
que tinha servido d e enfermaria dos variolosos do sexo
feminino, e que estava devoluto, e se procedesse, desde
logo, á desinfecçáo e arejamento d'aquelle hospital.
Camo a casa desinfectada deve arejar-se durante nove
dias, e, entretanto, poderiam manifestar-se alguns
casos de pneumonia fóra das familias que estavam isola-
das, de accordo tambem com Miss Wilson, resolvi que,
nJesta eventualidade, fossem os doentes recolhidos no
2.' andar da casa grande do Lazareto, sendo cada uma
das metades d'aquelle vasto edificio destinada a cada
sexo.
#Estava, pois, tudo preparado para se proceder ao
internamento imediato dos doentes se a molestia irra-
diasse além do cordào sanitario formado pelos soldados:
mas, felizmente, ficou limitada aos fócos primitivos, não
havendo um unico caso fóra das familias que se conta-
minaram nas casas de Antonio Teixeira de Almada ( 1 . 0
caso) e d e Maria Augusta de Jesus (4.0 caso), mercê do
rigor com que foi mantido o isolame~ito.
<As casas foram desinfectadas imediatamente aos
obitos, com formo1 e lavagens de solução d e sublima-
do, as roupas que estavam em hom estado foram desin-
fectada~ na estufa do posto, e as mais usadas e de
menor valor completamente destruidas pelo fogo.
< A revisáo medica durante nove dias, de todas as
pessoas que se averiguou terem visitado os doentes
antes de isolados, e o isolamento das proprias familias
pelos mesmos dias, com revisão medica tambem diaria,
vieram completar a serie de medidas postas em pratica
para evitar a propagação da molestia, que se póde
considerar coinplctamente extinta, não se tendo mani-
festado nenhum caso mais depois do dia 10 d'agosto.
<Tratando-sedo combate da epidemia, julgo do meu
dever fazer aqui uma menção honrosa ao meu illustrado
colega, o sub-delegado de saude do concelho do
Funchal, pelos intelligentes esforços e inexcedivel acti-
vidade com que dirigiu os serviçào de desinfecção, não
se limitando sómente a distribuil-os pelos empregados,
techilicos do Posto, mas apparecendo em toda a parte
que julgava a sua presença necessaria para fiscalizar a
plena execução d'aquelles serviços. Ao rigor com que
fsi mantido o isolamento dos atacados e á cuidadosa
inspecção medica das pessoas que os haviam visitado, e
IO 0 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

á superior direcção dos serviços de desinfecção se deve,


de certo o ter-se tão rapidamente extinguido a epide-
mia».
O dr. Nuno Silvestre Teixeira, no seu importante
relâtorio, faz uma descrição, com todos os dados scien-
tificos, de cada caso clinico, impedindo-nos a sua trans-
crição neste lugar a demasiada latitude dessa descrição.
Para completo esclarecimeilto dos leitores deste opus-
culo, vamos transcrever o que áccrca deste ponto publi-
cou um jornal do tempo, que, embora em quadro mais
resumido, não difere essencialmente do relatorio oficial.
São os seguintes os casos clinicos a que nos refe-
rimos:
u I-Antonio Teixeira de Almada, por alcunha o Le-
zindeiro, morador ao sitio da Magdzlena, da freguezia
de Santo Antonio, com 38 annos de edade, casado, tra-
balhador, servente do estabelecimento dos Figueiras dos
Varadores, natural de Santo Antonio da Serra, filho de
Antonio Teixeira de Almada e Jesuina da Conceição,
adoeceu em 16 de Julho e morreu em 21. Enterrou-se
em 21. O registo da Camara diz que faleceu em 20
pelas 7 h. da t., nias não é exacto. Parece que é costu-
me antecipar-se a hora do falecimento por causa de a
lei obrigar a fazer-se o enterro só passadas 24 horas
depois do falecimento. Nota-se esta mesma discordancia
em outros casos que citarei.-.Pneumonia-Teve um
delirio tão forte que chegou a sair para a rua. Medico:
dr. Luiz Vicente da Silva, residente em Sanio Antonio.
a2-Maria Augusta Pereira, moradora ao sitio da
Magdalena, em Santo Antonio, com loja d e venda, de
64 aniios, casada com Antonio Pereira Camacho, filha
d e Luiz Gomes d'Aguiar e d e Maria Augusta Gomes,
adoeceu nos fins de Julho, 29 ou 30, com muita febre e
delirio e faleceu em I de Agosto ás 6 e meia h. da m.
Enterrou-se no dia 2 ás 6 h, da t. O registo da Camara
chama-lhe Maria Pereira de Jesus, mas parece que era
conhecida pela Maria Pereira. Dá o obito em I de
Agosto, ás 8 h. da m.-Pneumonia. Esta doente velou o
cadaver do i 1 . O I durante toda a noite. Medico: dr. Luiz,
acima citado. O cadaver de Maria Pereira foi velado por
varias pessoas e consta quc deitou algumas aguas que
foram limpas no chão com um pano e aparadas em uma
bacia durante a noite.
'3-Maria Gomes Jardim, 16anilos, solteira, filha d e
José Gomes Jardim, por alcunha o Ferrobilha, e de Ca-
rolina Gomes Jardim, moradora no sitio da Rlagdaleiia.
Adoeceu no dia 3 com febre e delirio e morreu no dia 5
á noite. Enterrou-se no dia 6 d e tarde.-Pneumonia.
Velou o cadaver da n . O 2. Medico: dr. Abel. O registo
da Camara diz que faleceu no dia 6 ás 3 h. da t., mas
não é exacto.
'+-Maria Luiza Pinto Correia, moradora no sitio
da Magdaleiia, na mesma casa em que morava a viuva
de José Gomes Serrão, Claudina Ferreira, d e que ade-
ante se fala. Tinha 35 antios e era viuva d e José Pinto
Correia, natural de Santo Antonio, filha de Antonio d e
F r a n ~ ae de Maria Luiza. Adoeceu no dia 3 e morreu
no dia 6 no Hospital da Misericordia. Parece que se en-
terrou no mesmo dla.-Pneumonia.
U O dr. Abel viu esta doente em Santo Antonio.
temb bem velou o cadaver da n.O z .
u 5-Adelaide Bella Ferreira, 20 annos, solteira, filha
de Antonio Ferreira Bacalhau p'ra Baixo e de Julia
Ferreira, moradora no sitio da Magdalena. Adoeceu no
I02 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

dia 4 de manhã (domingo); ainda foi á missa e morreu


na terça-feira 6, ás !r horas da noite. Enterrou-se na
quarta-feira 7 ás 6 horas da tarde.-Pneuitioiiia.
<bledicos: drs. Abel e Vicente Machado.
~ T a m b e mvelou o cadaver da n." 2.
~6-Maria Christina, moradora no sitio das Casas
Proximas, em Santo Atitonio, acima da egreja, d e 48
annos, casada com Ezequiel de Oliveira Rodrigues, filha
de Francisco Pereira de Sousa e de Maria Candida.
Adoeceu na segunda-feira, 5, de manhã c morreu na
quarta-feira, 7, de madrugada. Enterrou-se no mesmo
dia de tarde.-Pneumonia.
*Medico: dr. Luiz Vicente.
*O registo da Camara diz que faleceu cm 7, ás g
horas da manhã, mas não é verdade.
< 7-Claudiaa Ferreira, moradora no sitio da Mag-
dalena, na mesma casa com a n.O 4, viuva de José Gomes
Serrão, com 45 aiinos, filha de Antonio Ferreira e de
Alaria de Jesus, tia da n.O 5 e irmã do Bncdlhnu p'ra
Baixo. Tratou de todos os doentes anteriores menos os
11.0' 4 e 6. Adoeceu na terça-feira de manhã (6) e
morreu na quinta-feira, (8), ás 7 horas da noite. Enter-
rou-se na mesma 11oite.-Pneumonia.-Medico: um dos
Tolentinos.
<Esta mulher morreu abandonada. Tinha duas filhas
de 17 a 19 annos e ambas fugiram d e casa apavoradas.
<Foram encontral-a morta atraz da porta.
«S-Leonardo Gomes Jardim, 19 annos, solteiro,
irmão do n.' 3, filho de José Gomes Jardim e de Caroli.
na de Abreu, sitio da Magdalena. Adoeceu no domingo
(4), e morreu na quinta-feira (8), ás 8 horas da noite.
Enterrou-se no noite de 8.
a 0 registo da Camara diz que morreu no dia 8, ás
8 h. da m. mas não é. exacto.
.Era visinho muito proximo do n.O7.-Pneumonia.
Medico: ignoro-o, mas ha quem diga que fora o
Abel.
49-Maria Eulalia Pereira Camacho.-Sitio da Mag-
dalena, 19 snnos, solteira, filha de Antonio Pereira Ca-
macho e de Maria Augusta Pereira, a 1i.O 2. Adoeceu no
domingo (4) e morreu em I I (domingo), ás 10 horas da
manhã.
<Diz o registo da Camara que morreu em 11, ás 7
h. mas não é exacto.
*Pneumonia.-h4idicos: foi vista pelo Abel e estava
sendo atendida por um dos Toleatinos.
4 10-Dr. Luiz Vicente da Silva. Medico que tratou
as doentes que acima vão indicadas. Adoeceu em 6
(terça-feira) e morreu em I I , ás 8 h. n.-Medico: Carlos
Leite e creio que muitos outros foram vel-o, Carva-
lho, Barreto, Nuno, etc.
.Tinha 52 ailnos, casado, filho d e Luiz Vicente da
Silva e de Guilhermina Augusta da Silva. Sitio das Casas
Proximas.-Pneumonia.
I I -Ezequiel de Olivcira Rodrigues.-Casado com
a n.0 6. Adoeceu no sabado de tarde (10) e morreu na
noite d e I I para 12. llorador no sitio das Casas Proxi-
mas em Santo Antonio, com 58 annos, viuvo, filho de
Januario Joaquim de Oliveira Rodrigues.-Pneumonia.
hledico: ignoro. Foi visto pelo C, Z. e Carvalho.
4 12-Maria Eulalia d e Oliveira Rorlrigues, 27 annos,
solteira, filha de Ezequiel de Oliveira Rodrigues e de
Maria Christina. n.0" 11 e 6, adoeceu no sabbado d e
tarde (10) e morreu na manhã d o dia 1 2 (segunda) ás 8
104 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

e meia horas da manhã.-Casas Proximas.-Pneumo-


iiia. Medico: ignoro. Foi vista pelo C. Z. e Carvallio.
u 13-Georgina da Conceição Oliveira Rodrigues, 24
annos, solteira, filha dos n.0" I e 6 e irmã da n.O 12.
Adoeceu no sabado de tarde (10) e morreu no dia r3
de manhã (terça).-Pneumonia.-Casas Proximas:, .
Epideenzia colericn de rgzo-zgrz.-A doença de cole-
ra, que no mês de Outubro se manifestou no sitio do Paiol
da freguesia de S. Pedro, teve o seu reconhecido apare-
cimento, nesta paroquia de Santo Antonio, a 20 de No-
vembro, num individuo d e nome Antonio Kodriguès
Figueira, morador no sitio de Santo Amaro, que não su-
cumbiu ao ataque da molestia. Suspeitou-se, mas não
houve disso inteira certeza, que poucos dias antes apare-
ceram alguns casos benignos de doença suspeita no sitio
do Vasco Gil.
O primeiro individuo victiniado por esta epidemia
colerica foi uma criança, por nome Maria, de idade de
dois anos, filha de Antonio Gomes Gina, que faleceu a
30 de Novembro no sitio do Pilar. Tornou-se este
bairro o fóco mais intenso da epidemia, sendo dali re-
movidas para o hospital de isolamento de Gonçalo
Aires cerca de 15 pessoas das quais morreram 7. No
dia I de Dezembro, faleceu, no sitio do Boliqueme, José
Gomes da Silva, proprietario, o primeiro adulto vitima-
do pela epidemia.
Alastraildo-se a doença nesta e na freguesia d e S.
Martinho, impunha-se a necessidade da criac;ão dum
hospital, que se destinasse a estas parochias e tambem
á de S. Roque. Ouçamos o dr. Carlos França, director
dos serviços sanitarios da Madeira durante a epidemia,
no seu brilhante relatorio dirigido ao governo central:
~ C o i n oa área de expansão da epidemia, ncste con-
celho, fossc muito grande e houvesse certo perigo, além
de muito incomodo para os doentes, em os transportar
a grandes distaiicias, houve necessidade de crear uni
hospital, para servir as freguezias ruraes de S. RSartinho
e Santo Antonio, reservando o antigo 1,aeareto para a
hospitalisaçiio dos doentes da cidade e dos outros con-
celhos, antes de nelles haver hospítaes.
« O hospital de Sailto Antonio instaliado na quinta
do Leme, na casa da Escola, não podia pela sua redu-
zida capacidade receber mais do que os doentes, tendo
os contactos de ser removidos para outro hospital. Ten-
do-se reconhecido que os seus serviços estavam longe
de corrcsponder ao dispendio a que dava logar, em
breve ordenei o seu encerramento. Tinha umas boas
enfermarias para doentes e cotivalescentes e ilellc se fi-
zeram as obras para crear uma zona limpa, bem separa-
da da zona suja. Ali, como em todas os hospitaes de
isolamento que se estabeleceu na hfadcira, havia duas
fornalhas: uma na zona suja, em que se procedia á fer-
vura das fezes, as quais não eram laoçadas na canalisa-
ção ou enterradas sem previa fervura, c outra na zona
limpa para fervura das aguas d e bebida do pessoal c
doentes.
<Foi epliemera a diiração deste hospital, mas a sua
acção moral foi boa, visto que a população das fregue-
sias ruraes, a qual a principio odiava o Lazareto, foi-se
familiarisando com a hospitalisação e acabou por aceitar
bem o Hospital de Gonçalo Aires.
neste hospital que, dirigido pelo dr. Alfredo Ro-
drigues, o foi em seguida pelo dr. Rodrigucs da Silva,
foram tratadas 31 pessoas, das quaes falleceram I j. A
1 6 PAROQUIA DE S A N T O ANTONIO

grande percentagem da mortalidade neste hospital


deve attribuir-se á excessiva relutaiicia, que, no princi-
pio, os habitantes das freguezias ruraes tinham pelas
hospitalisações, sendo a custo e forçadametite que ali
entravam, em regra em estado avançado de doença.
xAICm disso, o tratamento ali posto em pratica foi
em geral muito simples e os clinicos que ali prestaram
serviço, com quanto recorressem ao soro pliisiologico,
empregaram-11'0 em injecção hypodermias e não intra-
venosas,.
Um jornal do Funchal, ao acusar a recepção do
interessante relatorio, diz o seguinte:
«Na parte referente ao hospital de Santo Antonio,
o illustre bactereologista foi mal informado, pois a mor-
talidade ali foi pouco mais ou menos a mesma que a do
Lazareto; e senão vejamos os proprios numeros dados
pelo Sr. dr. França:
Quinta do Leme entraram 3 I pessoas
w morreram 1 5
Lazareto entrarm 327 »
a morreram 126 »
Quanto á therapeutica ali seguida foram emprega-
das as injecções intravenosas d e soro da Hayem que
não deram os resultados que seria de esperar, pois que
muitos doeiites, entraram no hospital quasi cada-
veres».
O hospital da Quinta do Leme começou a funcio-
nar a 16 d e Dezembro, sendo o boletim, referente a este
dia e fornecido á imprensa, concebido nos seguintes
termos: ((Ás dez horas da manhã entrou Juliaoa de
Jesus, d e 65 annos d e edade, casada, moradora ao sitio
d o Arieiro, freguezia de S. Martinho, a qual apresentou
sinptomas manifestos d e cholera morbus. O pessoal bem.
O Director Alfredo C. Rodrigues~.
Este hospital foi dirigido pelo dr. Alfredo da Con-
ceição Rodrigucs até o dia 26 de Dezembro, sendo
então substituido pelo dr. João Miguel Rodrigues da
Silva, tendo tambem prestado ali serviço clinico o d r .
Antonio Alfredo da Silva Barreto, facultativo do partido
medico de Santo Antonio e S. Alartinho, encerrando-se
definitivamente a r8 de Janeiro d e 19x1.Foi visitado,
durante a epidemia, por varios medicos e entre eles
pelo dr. Carlos Franqa, director dos serviços sanitarios
da Madeira. O padre João Prudencio da Costa, cura
desta paroquia, prestou ali os socorros espirituais aos
doentes.
No hospital da Quinta do Leme deram entrada 3 I
individuos e destes ali morreram 15, sendo 4 desta fre-
guesia, 5 de S. Roque e 6 de S. Martinho.
Foi neste mesmo edificio da Quinta do Leme, que
em I 856 esteve estabeleci,lo o hospital de colericos a
que atrás nos referimos.
Correu o boato infundado d e que o povo desta fre-
guesia tentava assaltar o hospital, tendo um jornal, d e
18 de Dezembro, publicado a tal rcspeito a seguinte
local:
.Relativamente á noticla que circulou n'esta cidade
ácerca da exaltação do povo d'aquella freguezia não
consta nada de fundamento, corno hontem tivemos oc-
casião de saber por pessoa que nos merece toda a con-
fiança.
<<Opessoal enfermeiro ci'aquelle hospital, tendo a
frente o zeloso director sr. dr. Alfredo Rodrigues, conti-
núa a trabalhar com muita dedicação e coragem, sendo
I 08 PAROQGIA DE SANTO ANTONIO

de justiça salientar os seus valiosos serviços prestados


em favor das victimas da epidemia.
«Dizia-se quc parte do pessoal enfermeiro havia
abandonado o hospital por suspeitas infundadas e que 6
povo mantinha-se na attitude d e o assaltar: a versão
authentica é que apenas os enfermeiros serventes, por
correr, destituida de verdade, a noticia de que alguns
moradores da freguezia, mais supersticiosos, se mostra-
vam injusta e levemente exaltados, dirigiram-se ao me-
dico director pedindo-lhe que requisitasse uma força,
que pouco depois ficou guardando o hospital, para
conter o povo que porventura promovesse quaesquer
manifestações hostis».
O dr. José Maria Ferreira, que exercia clinica nesta
freguesia, foi nomeado sub-delegado de saude na zona
formada por esta paroquia, afim de superintender nos
diversos serviços clinicos durante a epidemia.
Numa depeildencia da igreja paroquial ficou insta-
lado o pessoal destinado ao serviço d e desinfecção e do
respectivo material, que funcionava sob a direcção do
referido clinico.
O dr. Luis Pedro Gomes, medico nesta localidade,
e o dr. Antonio Alfredo da Silva Barreto, facultativo mu-
nicipal c residente em S. Martinho, foram, no dia 1 5 de
Dezembro, presos nos seus domicilios e conduzidos em
carro á cadeia do Funchal, acusados de sonegarem á
respectiva autoridade sanitaria alguns casos de colera
aparecidos na sua cliiiica. Verificando-se que não tinha
fundamento a acusação, foram no dia seguinte postos
em liberdade e restituidos ao exercicio da sua clinica,
de que tinham sido suspensos por alguns dias.
Aléni de 8 ou g individuos desta freguesia, que fa-
EPIDEMIAS 109

leceram no hospital do Lazareto d e Gonçalo Aires e


dos 4 no hospital da Quinta do Leme, morreram nos
seus domicilios mais 13 pessoas vitimadas pela epide-
mia, o que prefaz a totalidade de 25 ou 26, sendo a
percentagem de 3 por mil habitantes.
V i s i t a s pastorais

Ha muitos anos que desapareceram os livros mais


antigos dos Provi~renfos,sendo impossivel darmos uma
noticia completa ácerca das primeiras visitas que os
prelados diocesaaos fizeram a esta paroquia. Temos de
socorrer-nos de notas avulsas l a n ~ a d a sem outros livros,
que geralmente constam apenas da simples indicaçáo do
nome do visitante e data da visita, com excliisão de
quaisquer ~ u t r o sesclarecimentos.
1575-Foi D. Jeronimo Barreto o primeiro prelado
diocesano que visitou pastoralmente esta freguesia. Rea-
lisou a visita a 24 d e Outubro, teitdo por essa ocasião
administrado o sacramento da Confirmação a 5 2
pesssoas.
1578-0 mesmo prelado fez segunda visita pasto-
ral a esta igreja no dia 20 de Julho de 1578, tendo então
crismado 59 individuos.
7 59. . .--No dia 29 d e Abril de I 59. . . , o bispo D.
Luís Figueiredo de Lemos visitou esta igreja e nela
crismou 3 I pessoas.
1606-Nova visita do mesmo prelado e nela deter-
miiiou que se promovesse a fundação duma capela no
sitio do Trapiche.
VISITAS PASTORAIS I11

1608-Ainda o mesmo prelado, pouco antes da sua


morte, fez neste ano a sua visita pastoral a esta igreja, e
voltou a recomendar insistentemente a construção duma
ermida no referido sitio do Trapiche.
1611-0 prelado diocesano D. Lourenço de Tavo-
ra fez neste ano sua visita pastoral e ministrou a Confir-
mação a 27 pessoas.
1613-Nova visita do mesmo prelado.
1621-Neste ano foi esta igreja visitada pastoral-
mente pelo bispo da diocese D. Jeronimo Fernando,
apresentando-se 16 individuos para receber o sacramen-
to do crisma.
1632-A I I de Dezembro d e 1632, o mesmo pre-
lado visitou novamente esta igreja, crismando por essa
ocasião 7 I pessoas.
1635-Ainda o mesmo, de novo fez visita pastoral a
esta freguesia, a 22 de Abril deste ano.
1637-Pela quarta vez visitou D. Jeronimo Fernan-
do esta igreja, a 2 de Março d e 1637, e nela crismou 52
pessoas.
1643-D Jeronimo Fernando veiu pela quinta vez
em visita pastoral a esta freguesia no ano de 1643.
1673-0 bispo D. Gabriel d'Almeida esteve nesta
freguesia, visitou-a pastoralmente e nela crismou em
1673.
1677-A 5 de Setembro deste ano, recebeu esta
igreja a visita pastoral de D. Antonio da Silva Teles.
1691-0 prelado D. José d e Santa Maria veiu a esta
igreja em visita pastoral a 14 de Novembro d e 1691.
1695-0 mesmo prelado diocesano visitou esta
igreja em 1695, crismando nela 24 pessoas.
1702-Foi esta igreja pastoralmente visitada a 29
I I2 PAROQOIA DE SANTO ANTONIO

de Janeiro de 1702 pelo bispo D. José Castelo Branco,


que nela administrou o sacramento da Confirmação a
137 individuos.
1713-D. José de Sousa Castelo Branco veiu se-
gunda vez, em visita pastoral a esta freguesia em Outu-
bro de 1713, tendo então crismado o avultado numero
de 527 pessoas.
1726-A r9 de Maio deste ano visitou esta fregue-
sIa o bispo diocesano D. Manuel Coiitinho, que crismou
I 36 individuos.
1732-A I3 de Setembro deste ano, o prelado D.
Manuel Coutinho fez sua visita pastoral a esta paroquia,
administrando o sacramento da Confirmação a 13I indi-
viduos e deixando os provimentos do estilo. Neles se
ocupa especialmente da falta d e instrução religiosa, im-
pondo aos parocos e mais sacerdotes desta freguesia e
ainda aos capelães das ermidas a estritissima obrigação
do ensino da doutrina cristã nos domingos e dias de
preceito, cominando penas graves Aqueles que não cum-
prissem este dever do seu ministerio.
Tomou certas medidas ácerca da arrecadação dos
rendimentos das Confrarias e da rigorosa observancia
dos seus compromissos e satisfação dos legados pios,
aplicando severas penas canonicas aos transgressores
do que a tal respeito se acha determinado. Adotou
ainda outras providencias para o bom regimen espiri-
tual da paroquia.
1738-0 mesmo prelado visitou novamente esta
paroquia, no ano de 1738, tendo aqui crismado 68
pessoas.
1743-Visitou pastoralmente esta igreja a 2 de fe-
vereiro de 1743 o dispo diocesano D. Frei João do Nas-
VISITAS PASTORAIS Ii3

cimento, que, nos provimentos que deixou exarados,


determinou se fizessem as procissões dos Domingos
Terceiros e as dos defuntos, e em especial recometidou
a todos os clerigos o ensino da doutrina christã. Aucto-
risou o paroco a mandar fechar as capelas, cujos edifi-
cios não estivessem em bom estado de conservação ou
sa encontrassem desprovidas das alfaias precisas para a
decente celebração dos oficios divinos.
1759-0 bispo D. Gaspar Afonso da Costa Rran-
d50, a 4 de Novembro de 1759, visitou pastaralmentz
esta igreja e nela admiiiistroii o sacramento da confir-
mação.
1775-0 mesmo prelado fez visita pastoral a esta
freguesia a 5 de Dezembro de 1775.
1779-A 23 d e Novembro dcste ano visitou pela
terceira vez esta igreja o I~ispodiocesano D. Gaspar
Afonso da Costa Brandão.
1791-A 6 de Novembro de 1791 visitou esta igrc-
ja o bispo diocesano D. José da Costa Torres, deixando
provimento, em que primeiramente exorta os paro-
quianos desta freguesia a que acompanhem os defuntos
á sepultura, e recomenda aos irmiíos da Confraria do
Santissimo Sacramento que toiilein parte na procissão
dos Domingos Terceiros e noutros actos religiosos. Or-
dena aos sacerdotes, que nos domiiigos celebram lirir,
capelas, façam sob pena de suspensão, suas homilias
aos fieis, porquanto estes, não assistindo á missa paro-
quial ficariam privados & necessaria instruçáo religiosa.
Faz algumas advertencias ao paroco do Curral das
Freiras, freguesia ha pouco criada, e manda que os ad-
ministradores da capela ali existente façam nela os in-
dispensaveis repairos.
I I4 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

1801-0 prelado D. Luís Rodrigues de Villares


fez sua visita pastoral a esta igreja a 22 de Abril de
1801 e, entre ouiras cousas, deixou exarado o seguinte,
no livro respectivo: Que o paroco faça coibir, empre-
gando para isso os meios aecessarios, aa escandalosa
indecencia~ com que os fregueses assistem aos oficios
divinos e no caso de reincidencia os faça ir, bem como
os pecadores publicos, á preiença do prelado para que
este aplique o devido remedio, srgundo as circunstan-
cias; que os irmãos da Confraria tlo SS. S. assistam aos
actos religiosos a que são obrigados e que os fieis
tomem parte nos funerais de seus irmãos, como foi de-
terminado na visitação proxima passada; que se proi-
bam as armações e ornatos que tantos prejuizos causam
ao templo. Crismou 612 pessoas.
1814-D Frei Joaquim de Menezes e Ataide visitou
pastoralmente esta paroquia a 12 de Agosto de 18x4,
fazendo provimento, em que estabelece algumas provi-
dencias ácerca das festas e ornamentações da igreja, re-
gisto paroquial, cobrança da cera e azeite na alfandega,
sepultura nas igrejas, etc. Deixou tambem provimento
especial para a igreja do Curral das Freiras, curato filial
de Santo Antonio. Crismaram-se 1.030 pessoas.
1819-0 mesmo prelado visitou esta freguesia a
20 de Setembro de 1 8 1 9 No provimento apenas se
refere á falta de paramentos, e aconselha o estabeleci-
mento dum cemiterio 110 adro.
1835--0 vigario capitular e governador do bispa-
do Antonio Alfredo de Santa Catarina Braga, visitou
pastoralmente esta igreja a 20 d e Setembro d e 1835,
observando tudo o que dispõe o Ceremonial dos Bispos
para a visita dos prelados e tendo nessa ocasião drofe-
VISITAS PASTORAIS I1S

rido um discurso adequado ao acto. A esta cerimonia


assistiram o governador da Madeira Luís da Silva Mou-
sinho de Albuquerque e D. Domingos de Saldailha, go-
gernador geral d e Angola, que então se achava de
passagem nesta ilha.
1845-A 22 de Junho de 1845 fez visita pastoral a
esta igreja o bispo D José Xavier Cerveira e Sousa,
tendo crismado 2.016 individuos, numero muito cresci-
do, mas que tem sua f x i i explicação no facto de não ter
sido administrado o sacramento da Confirmação ilc%ta
paroquia havia 3 I anos.
1854-0 prelado diocesano D. Manuel Martins
Iiilanso, que neste ano visitou esta igreja a 23 de Setem-
bro, crismou 187 pessoas.
1861-D. Patricio Xavier de AIoura visitou esta
igreja e nela crismou cerca de 700 individuos a 9 dc
Junho de 1861.
1884-0 prelado desta diocese D. i\lanuel Agosti-
nho Barreto fez visita pastoral a esta igreja no dia 10 de
Fevereiro de 1884, enviando depois seu provimento, em
que são dirigidos aos parocos e fregueses varios consr-
lhos e advertencias, e adotadas algumas medidas para o
bom regimen da paroquia.
1909- A 1 2 de Setembro de 1908 o mesmo prela-
do diocesano visitou esta igreja paroquial, administraii-
nela o sacramento da confirma~ãoa 752 pessoas.
1916-0 actual prelado o ex.In0e rev."O snr. D.
Antonio Manuel Pereira Ribeiro visitou pastoralmente
esta freguesia, pela primeira vez, a 30 de Julho d e 1916,
fazendo novas visitas pastorais a esta paroquia nos anos
de 1919, 1922 C 1928.
Os visitadores episcopais, eiiviridos ein frequentes
I 16 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

visitas a todas as freguesias deste bispado pelos prela-


dos diocesanos, inquiriam do estado moral e religioso
das paroquias e fiscalisavam minuciosamente a maneira
como eram dirigidos os serviços em que os parocos su-
perintendiam, adotando em nome dos ordinarios, as
provideiicias que exigia a boa regularisação dos mesmos
serviços.
Nos seculos XVII, XVIII e xix, mais de 3 0 visitadores
episcopais vieram a esta paroqiiia na sua especial
missão de fiscalisaç50 e pesquisa, deixando alguiis deles
exarados os seus prozriuize~ztos,em que a maior parte das
vezes tomaram acertadas e proveitosas medidas para o
bom regimen espiritual e religioso da paroquia. Levar-
rios-ia longe se quizessemos fazer delas menção especial e
por isso as omitimos para iião dar a este capitulo uma
demasiada latitude.
Ribeiras, l e v a d a s e

Ribeiras-Esta paroquia é banl~ada numa grande


extensão pelo abundante caudal conhecido pelo nome
de Ribeira dos Socorridos, que lhe serve de limite e a
separa das freguesias de Camara de Lobos e do Estreito
de Camara de Lobos. 0 s sitios da Fajã e da Ribeira dos
Socorridos da freguesia de Santo Antonio ficam na mar-
gem esquerda daquela ribeira. É neste importante cur-
so d e agua que encabeçam a levada dos Piornais e a do
Curral e Castelejo.
As ribeiras do Vasco Gil e da Lapa, que nascem
dentro do limite desta paroquia, sào afluentes da Kibei-
ra dos Socorridos e nela se vão lançar no referido sitio
da Fajã.
A ribeira de S. João, que atravessa a cidade d o
Funchal, tem sua origem nesta freguesia, sendo aqui co-
nhecida pelo nome de ribeira d e Santo Antonio e
tambem de Ribeira Grande. Na sua margem esquerda
existe um sitio com esta ultima denominação e nela
ficam egualmente os sitios do Logar do Meici, Salão,
Alamos e Penteada. Na sua margem direita encontram-
se os sitios do Lombo dos Aguiares, Quinta das Freiras,
Quinta do Leme, Riladalena e Levada do Cavalo, fazen-
do uns e outros parte desta paroquia.
I 18 PAROQUIA DE bANTO ANTONIO

evadas-A levada dos Pioriiais, que, depois da de


Santa Luzia, é a mais importante d o concelho do
Funchal, tem sua origem como acima fica dito, na mar-
gem esquerda da ribeira dos Socorridos e dentro da
área desta freguesia, nas proximidades do sitio da Fajã.
Destina-se á irrigação das paroquias de S. Pedro e S.
hlartinho, sendo o sitio da Ribeira dos Socorridos o
unico da freguesia de Santo Antonio a que a mesma
leva aproveita.
A levada nova do Curral e Castelejo, que, como a
dos Piornais, data do seculo XVI, é. ;m importante aque-
duto, que fertilisa os sitios d e Santo Amaro, Tanque,
Alecrins, Santa Quiteria, Pinheiro das Voltas e Viana
desta freguesia e ainda extensos tratos d e terreno na
paroquia de S. Martiriho. Tambem nasce na margem es-
querda da Ribeira dos Socorridos.
Um mais importante e mais volumoso caudal é o
da levada da hladalena, assim chamada por fazer a irri-
gação do central e conhecido sitio deste nome. A sua
primitiva tiragem data do ultimo quartel do seculo XVIII,
cotistituindo então um aqueduto de minguada importan-
cia, tanto pela sua extensão como pelo volume de agua
que conduzia. Foi pelos anos d e 1870 que o proprietario
e comereiante João d e Sales Caldeira, ao tempo adminis-
trador da levada, lhe deu a importancia que actual-
mente tem, com a acquisição e exploração de novas
fontes subsidiarias e grandes melhoramentos realisados
iio aqueduto, fazendo-se recuar o encabeçamento dela
ao Pico Escalvado, que é hoje o logar da sua origem. O
manancial mais abundante que a alimenta é constituido
pelas fontes chamadas Aguagens, situadas no sopé do
Lombo das Achadas. Fertilisa extensos tratos de terre-
KIBEIRIIS LEVADAS E FONTENARIOS 119

no desta freguesia e tambem das paroquias de S. Roque


e S. Pedro.
É tambem uma levada de relativa importancia a
que é conhecida pelo nome de Pico do Cardo, que irri-
ga este e outros sitios desta freguesia.
Embora com caudais menos abundantes e aprovei-
tando a áreas menos extensas, tambem prestam bons
serviços á agricultura as levadas do Lombo e Paredão,
da Negra, da Serra, c ainda outras que ficam dentro
dos limites desta paroquia.
No livro do conde de Canavial, intitulado «Aponta-
mentos para o estudo da crise do distrito do Funchala
e publicado em 1879, encontramos alguns dados ácerca
da medida do caudal de cada levada, referente ao seu
fluxo continuo, em litros e por segundo, e que é o se-
guinte:
Levada dos Piortiais 165,)8
do Curral e Castelcjo 75,7
z da Madalena 1437
>> do Pico do Cardo I3
» da Negra 513
» da Serra 415

I;o!tteçtrcrios-No sitio do Jamboto, existe cma nas-


cente chamada de Agua Ferrea, que se afirma ter qua-
lidades terapeuticas para determinadas doenças e que,
por esse motivo, adquiriu uma certa nomeada, chegan-
do a Camara Municipal a fazer construir ali um pequeno
fontenario e a mandar proceder á analise quimica e
bacteriolagica dessa agua pela distinto analista Charles
Lapierre. Cremos que actualmente pouco ou nenhum
uso se faz dela. No entretanto vamos deixar arquivado
120 PXKOQUIA DE SANTO ANTONIO

tiestas paginas o resultada dessa alialise, que, lium pe-


queno opusculo, foi publicado pela Cainara deste coiice-
lho no ano de rgoo.
<Tendo sido encarregado pelo Ex.'"O Snr. Presiden-
te da Camara Riunicipal do Fuiiciial d e proceder ao
exame chimico c bacteriologico d'uma agua ferrea da
Ilha da Madeira, apresentarei n'este relatorio o resulta-
do das minhas investigações.
Foi dividido em 3 partes o presente relatorio:
I .O-Analyse chimica.
3.0-Aiialyse bacteriologica.
3.6-Conclusões.
I-ANALYSE CHIMICA
A-E~zsnios q~tnlitntivos-Demoiistrarain-me estes
ei~saiosque a agua continha:
bastantes chloretos
poucos sulfatos
poucos carboiialow
pouca cal
pouca magncsia
bastante ferro
bastante sodio
pouco potassio
vestigios d e lithio
vestígios d e nitratos.

( por litro )
1.0-Rzsultados directos da anaiyse:
Acido carbonico total f C 0 2 ) 0,0690 gr
Chloro 0,0389
KIREIKAS, LEVADAS E FONTENARIOS 121

Acido sulfurico f SOJ ) 0,0059 gr-


Silica 0,0150 *
Nitrato de potasçio 0,0030 >>
Potassio 0,0060 P
Sodio 0,0238 *
Ferro 0.0126 >:
hlagnesia 0,0123
Cal
Ammoiiiaco
Xlaterias orgaiiicas
0,0105
0,0000I
nullas
.
%

2.0-Agr14p~znaefzlo dos clcwcct~fos(por litro).

Composição hypothetlca da agua:

Chloreto de sodio 0,0605 gr.


Chloreto de potassio
Nitrato de potassio
Sulfato de potassio
Sulfato de magilesio
Bi-carbonato de magtiesio
Bi-carbonato d e ferro
Bi-carbonato de calcio
Silica

Acido carbotiico livre 0,0082 gr.


Ammoniaco o,o0001 »
Materias organicas nullas
Lithio Vestigios iiitidos

Soma dos elemelitos solvidos: 0,201 3 I gr.


122 PAKOQUIA DE SANTO ANTONIO

I I -ANALYSE BACTERIOLOCICA
Logo que chegou a agua, a Coimbra, tratei de
fazer as competentes semeuteiras nos diversos meios
nutritivos com o fim de determinar:
I .O-A quantidade de bacterias, susceptiveis de se
desenvolverem a zoo e existindo n'um centimetro cu-
bico d'agua.
2.0-A existencia d e bacillos pathogeneos, taes
como o bacillo typhico, o coli-bacillo, os fluoresceiites
etc.

A agua convenientemente diluida com agua esteri-


sada foi distribuida por placas de gelatina nutritiva, em
crystalisadores de Petri, e collocada á temperatura de
200 n'uma estufa.
Passados 10 dias contou-se o numero d e germens
que se desenvolveram e obtive os seguintes resultados:
Numero de geermerzs u~t!crobiafizos existindo num cen-
tifihzetro cubico d'agua: I 10.
Comparando este algarismo com os da classificação
d e 31ique1, vê-se que a agua f e r ~ e aexaminada dcve ser
considerada como sendo muito pura.
2.'-Pesquisa dos bacillos pat hogez.lzeos
As colonias microbianas que se desenvolveram nas
precedentes placas eram constituidas por saprophytas
vulgares, não existindo nenhuma especiefluorcscente.
Para reconhecer se existia o bacillo tiphico ou O
coli-bacillo recorri ao excellente methodo de Péré, que
já descrevi em precedentes relatorios entregues a Ex.'"~
Camara do Funchal:
RIBEIRAS, LEVADAS E FONTENARIOS '23

25cc de caldo de carne


12cc de peptoiia a 10~1,
250 cc
;cc de phenol a sO,,

Distribuindo o liquido por 3 frascos e collocando-os


numa estufa a 37O, não observei turvação alguma pas-
sados 5 dias. Pode-se cf'ahi concluir que a agua não
coiltém as especies nocivas indicadas.
A conclusão que se deve tirar do exame microbio-
logico da agua remetida é que, bacteriulogicamente
fallando, é muito pura.
Não contém germens pathogeneos alguns.
CONCLUSÕES G E R A E S
Sob o ponto de vista chimico, a agua examinada
pertence ao grupo das n g w s hyposalimzs, chlorefaclns c
ferrem. A somma dos elementos solvidos é de 201 milli-
grammas.
A sua mineralisação mais importante é o chloreto
da sodio seguiodo-se-lhe o óicnrbo~zatotlc,fcrro, que se
encontra nesta agua em quantidade relativamente
grande (36 milligramas correspondentes, como consta
do I." quadro, a 12,6 milligr. de ferro).
Os demais componentes são bjrcabonatos de mag-
nesia e de cal, com pequenas quantidades de sulfatos e
nitratos.
A ausencia de ammoniaco e de materias organicas
indica que a agua parece ser captada em boas condi-
ções.
Sob o ponto de vista bacteriologico tem todos os
caracteres d'uma agua muito pura.
Esta agua, bastante rica em saes de ferro facilmen-
I a4 PAKOQUIA DE SANTO ANTONIO

te assimilaveis, tem applicação naturaltiiente indicada


nos casos em que se recommetida a medicaçào ferrea
fraca, competindo aos medicos estabelecer as condições
do seu uso como agente therapeutico~.
A Junta Geral deste distrito, recoiihecendo a grande
escassês de agua potavel que se notava nesta freguesia,
tomou a deliberaçáo de fazer construir alguns fontena-
rios na estrada central que a atravessa, aproveitando as
excelentes nascentes conhecidas pelo nome d a Fonte do
Senhor, pertencentes á Camara Mnuicipal deste conce-
lho e que as cedeu áqiiela corporação administrativa
para o fim indicado. Principiou em 1908 a construção
desses fonteiiarios, tendo o das imediações da igreja pa-
roquial começado a fornecer agua ao publico no dia 18
de Maio d e 1909.
A Camara Municipal do Funchal tem mandado
construir varios fonteiiarios nesta paroquia, tendo o dos
Alamos sido inaugurado no dia 16 de Dezembro de
1913, O da Azinhaga no dia 28 do mesmo mês e ano, o
do Jamboto a 29 d e Novembro de I914 e o da Quinta
do Leme em Abril de rgr 5 .
Aos habitantes dos sitios do Laranjal e Lombo
dos Aguiares, prestou á Camara Alunicipal um assina-
lado serviço, mandando constriiir sete fontenarios, que
no ano de 1926, começaram a fornecer ao publico
excelente agua potavel.
Beato Inacio d e
Azevedo

No dia 1 3 de Junho de I570 ancorou no porto do


Funchal, vindo de Lisboa e com destino ao Brazil, uma
armada d o comando de Luís de Vascoilcelos, que,
além das tripulacões e varios passageiros, conduzia qua-
renta religiosos da Companhia de Jesus. Traziam estes
como superior o padre Inacio d e Azevedo e destinavam-
se ás missões brasileiras dirigidas pelos Jesuitas. A ar-
mada saiu da Madeira no dia 30 de Junho e a 1 5 d e
Julho seguinte, na altura das Canarias e á vista da
Ilha da Palma, foi assaltada por corsarios hugueaotes,
que saquearam os navios portuguêses e trucidaram
os quarenta religiosos, lançando os seus corpos ao
mar. Foram estes inscritos lia Martiriologio da igreja
catolica, sendo-lhes concedida a honra dos altares.
Os jesuitas tinham-se estabelecido ha poucos mêses
na Madeira, chegando aqui a g de Março daquele ano,
e albergaram-se provisoriamente no hospicio contiguo
á igreja de S. Bartolomeu e que se destinava a receber
os clerigos pobres. Não podendo os jesuitas, pelo aca-
nhado da sua moradia, receber os seus irmãos em reli-
gião, ficaram estes a bordo dos navios, passando apenas
em S. Bartolomeu quatro ou cinco em cada dia, que al-
ternadamente se revesavam.
I 26 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Ignacio de Azevedo e alguns dos seus copmanhei-


ros exerceram aqui as funções do seu ministerio, princi-
palmeate na igreja d e S. Tiago, e estiveram tambern
nesta freguesia de Santo Antonio, permanecendo algum
tempo no Pico do Cardo, como se vê d a inscrição, que
em seguida reproduzimos e que 6 a copia exacta d 3 que
se encontrava na capela de Nossa Senhora do Populo, a
que já noutro logar fizémos referencia.
EJI. 1lEMOF.l.Z. 1109. GLORIOSOS. N L R T l R -
ES. DA. (:OJ.IP.A 11E. .JESU. O. P. IGXACIO. DE. A-
ZE\-EDO. E SEUS. 39 CO~iPANITEIROS. QUE.
N.4VEGAXDO. P.A O URAZIL. NO. AKSO. DE. 1.570.A-
OS. 15. DE. JULHO. A. VISTA. DA. ILHA. DA. PALXA.
'IERECERÃO. A. DO. AIARTIRIO. PELLA. FÉ. DE.
CHRISTO. LANÇhlIOS AO. MAR. PELLOS. HE-
REJES. E. TESBO. ESTADO. NESTA\. QUINTA. DE.
PICO. DE. CARDO. VIXIIÃO. A. ESTE. LUGAR.
<:OJI. A. SI'A. CRUS. E. NELLE. F.4~1.b. AS. SITAS
I)ETOÇÕES. SE. EHIGIO. ESTA. P.* . MAIOR. GLO-
RIA. n E . DEOS. AX. DE. 1743
Esta lapide, que deveria ter sido religiosamente
conservada no logar em que os jesuitas a tinham colo-
cado, foi transferida para o Seminario Diocesano,
qualido o prelado D. Manuel Agsstinho Barreto vendeu
a quinta e capela d o Pico d o Cardo, e alguns anos
depois a levaram para o colegio de Campolide, em
Lisboa, onde talvez ainda se encontre.
Será hoje impossivel saber os motivos que levaram
aqueles religiosos ao sitio do Pico do Cardo e a perma-
necerem ali algum tempo, mas lendo a sua biografia, es-
crita pelo padre Ailtonio Franco, poderá conjecturar-se,
por oiitros casos semelhantes, que o desejo de se entre-
BEATO INACIO DA SILVA 127

garem mais livremente aos seus exercicios piedosos,


como preparação para a grande missão a que iam intei-
ramente dedicar-se no Brasil, os arrastaria para a soli-
dão daquele 'logar.
O facto teria facil explicação, se porventura a pro-
priedade que ali possuiam os jesuitas já lhes pertences-
se ao tempo, mas conjecturamos que a posse dela pela
companhia só data de meado do seculo XVII, e nem é
crive1 que pouco mais de tres mêses depois de chega-
rem á Bladeira já tivessem adquirido aquela importante
propriedade, que em 1770 foi vendida em hasta publica
por sete contos de reis.
Presumimos até que o facto de ali terem estado o
Reato Inacio d e Azevedo e os seus 39 companheiros
martires, assinalaiido aquele logar com a sua embora
curta permanencia nele, levasse os jesuitas á compra da
propriedade riistica, construindo depois a capela e casa
de residencia.
Os jesuitas em Santo
Antonio

Por aivará regio de 7 de Janeiro de 1570, estabele-


ceu D. Sebastião o colegio dos Jesuitas nesta ilha, que a
ela chegaram em b l a r ~ odaquele ano e se albergaram
num hospicio destinado a clerigos pobres adjunto á ca-
pela dc S. Bartolomeu e ali permaneceram até á cons-
trução do colegio de S. João Evangelista. Além desta
casa e magnifico templo, tinham os padres da Compa-
nhia de Jesus as residencius do Caniço, Pico dos Frias e
a do Pico do Cardo nesta freguesia de Santo Antonio,
vulgarmente coiihecida pelo nome da Quinta dos Padres.
Não sabemos quando fizeram os jesuitas aquisição
desta prcpriedade, coi~jecturando que a compra dela
fosse em boa parte determinada pela circunstancia do
Reato I ~ a c i ode Azevedo ter assinalado este logar com
a sua breve passagem por ali, ein I 570, como dizemos
no capitulo que consagramos a este santo martir. Não
se deve supor que já naquela epoca, pouco mais de dois
mezes depois dos jesuitas se terem estabelecido na Ma-
deira, fossem eles os proprietarios da Quinta do Pico do
Cardo, suposição esta que adquire quasi fúros de certe-
za com a leitura do alvará regio de 1589, em que é re-
gulada a maneira do pagamento da dotação do colegio
de S. João Evangelista.
OS JESUITAS E N SANTO ANTONIO I 29

Toda a duvida, porém, desaparece com a leitura


da verba do testamento de Gaspar de Betencourt e Sá,
do ano de 1635, em que se faz referencia á quinta do
Pico d o Cardo, que ao mesmo Betencourt e Sá perten-
ceu e em que ele lega a terça dos seus bens a suas duas
filhas D. Izabel de Betencourt e D. Ana de Aguiar com
o encargo perpetuo da celebração de cinco missas
anuais, imposto na referida propriedade. Ora esta quinta
era e é ainda a Quinta do Pico do Cardo, que depois se
chamou dos Padres, quando começou a ser pertença da
Companhia de Jesus, E nas disposiçòes testameatarias
com que a 3 de Março de 1714 faleceu Maria dos Reis
se diz que ela tinha bemfeitorias na .fazenda dos reve-
rendos padres jesuitas~.
Deve, pois, ter sido no periodo decorrido d e 1635
a 1714, que a quinta passou a ser propriedade dos
padres da Companhia. Não pode restar duvida que a
casa de residencia e a capela que lhe fica contigua
foram por eles construidas, não nos parecendo que estas
edificaçaes sejam anteriores ao ultimo quartel do seculo
XVII.
Esta residencia, capela e terrenos adjacentes foram,
como todos os bens pertencentes aos jesuitas, confisca-
dos em 17jg, por ocasião da sua expulsão de Portugal,
tendo eles saido desta ilha a 16 de Julho de 1760. Neste
ano e nos anos seguintes se fez a arrematação anual do
rendimento de todas as propriedades que a Companhia
de Jesus possuia na Madeira e depois se procedeu su-
cessivamente á venda de todas elas. A quinta do Pico
do Cardo com os seus anexos foi comprada em hasta
publica, em Abril de 1770, por Francisco de Agrela Spi-
nola pela importancia de sete contos de reis. Em 1796
130 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

já pertencia ela ao conhecido proprietario e negociante


Pedro Jorge Monteiro.
Sobre a porta da entrada da quinta lê-se a data de
1779, que parece apenas referir-se ao ano da construção
da mesma portada ou a quaisquer importantes repairos
feitos na casa e capela, pois que a construção duma e
outra devem ser anteriores áquela data.
H a aproximadamente 40 anos que o falecido bispo
desta diocese D. Manuel Agostinho Barreto comprou
esta propriedade, compreendendo então apenas a casa
de habitação, a capela e um pequeno terreno adjacente,
vendendo-a depois a Antonio de Faria, hoje falecido,
perteiicendo actualmente a um filho deste. O saudoso
prelado destinou esta casa para recreio dos alunos do
Seminario, que ali passavam geralmente as quintas-fei-
ras e outros dias feriados.
Segundo afirma o dr. Alvaro Rodrigues d e Azeve-
do, numa das suas notas ás Snudnclcs rln lerrn, o rendi.
mento da quinta do Pico do Cardo, por ocasião da ex-
pulsão dos jesuitas, ascendia a 260Soóo reis anuais.
Os jesuitas tambem possuiam um predio rustico no
sitio d a Madalena desta freguesia.
Confrarias e associa-
ç õ e s piedosas

Na Igreja Paroquial desta freguesia teem actual-


mente sua séde as confrarias do Santissimo Sacramento,
Santo Antonio, Nossa Senhora de Guadalupe c Senhor
dos Pa3sos. Em epocas mais remotas, além das que
ficam mencionadas, existiram outras irmandades, que ha
muito se desmeinbraram. De todas daremos resumida
noticia, aproveitando os escassos elementos que pudé-
mos colher no respectivo arquivo paroquial. Tamhcm
nos ocuparemos das associações piedosas, quc aqui
existem e que servem para mais intensamente conservar
e fomentar o espirito religioso nesta paroquia.
Cojzfunvin cio Santissimo ~acrnnze~~to.-I?uma das
mais antigas irmandades, cuja existencia podemos já as-
sinalar nos fins do seculo xvr. No ano de 1615 reformou
O seu Cainpromisso, tendo ainda no decorrer dos
tempos remodelado algumas vezes a sua lei organica,
sendo a ultima no ano de 1912, em que, por a!vará de
28 de Junho, aprovou o governador civil os seus estatu-
tos, ordenados em conformidade das leis então vigentes.
Era e é ainda a mais importante confraria desta
freguesia, tanto pelo numero e categoria dos seus mem-
bros como pelos recursos d e que dispõe, e tambem
pelos bons serviços que presta na realisação de muitos
132 PXROQUIA DE SANTO ANTONIO

actos do culto. Possuia varios predios rusticos nesta


freguesia e um em S. Martinho, dos quais alguns foram
vendidos em obediencia ás leis da desarmortisação, e
outros que passaram a extranhos possuidores e de que
já hoje não ha couhecimeiito. 0 s seus bens estavam
onerados com diversos encargos pios, parecendo-nos
que alguiis deles deixaram ha muito de cumprir-se,
sendo certo que ainda actualmente se celebram trinta
missas anuais em satisfação de rniiitos desses encargos.
Pertencem-lhe algumas alfaias de valor, como pixides,
um ostensorio, varas d e palio, cruzes, ceroferarios e cas-
tiçais d e prata, que são de uso quasi quotidiano no ser-
viço cultual desta Igreja.
Esta Confraria, além da sua festa patronal, faz cel
brar todos os anos as festas d o Natal, da Semana San
e da Ascensão do Senhor.
S
Cotlfvni-ia n'z Santo ~fztotzio.-É tambein muito an-
tiga esta irmandade, e talvez mesmo se possa remontar
a sua existencia a uma epoca anterior á do Santissimo
Sacramento, mas, apesar disso, poucas refereiicias
temos encontrado que possam interessar á sua historia.
Os seus estatutos foram reformados em 1871 e aprova-
dos pelo governador civil do distrito, por alvará de 5 de
Abril do mesmo ano.
Possuia algumas terras, contando-se entre elas um
predio que lhe fora legado por Antonio Jorge, no ano
d e 1707,com o encargo perpetuo duma missa anual. Na
freguesia d o Arco da Calheta tinha esta confraria uma
propriedade rustica, convertida depois na pensão forei-
ra anual d e cinco mil reis. Tudo isso se perdeu infeliu-
mente, não havendo, desde muitas dezenas de anos, no-
ticia do cumprimento destes encargos pios.
A esta irmandade, que precisa de ser remodelada
em novas bases, aorre a estrita obrigação de fazer cele-
brar anualmente a festa do seu patrono, que é tambem
o orago da Igreja Paroquial e uma das mais lidimas
glorias da nossa patria.
Confraria de ~liossaSenhora de Guadalupe.-A re-
ferencia mais remota que temos encontrado a esta con-
fraria data do ano de 1652, mas julgamos que ela ainda
é de epoca muito anterior a esta. Para evitar desneces-
sarias repetições, remetemos o leitor para o capitulo
Nossa senhora de GGzen&lupe, onde nos ocupamos deste
assunto com algum desenvolvimento. A actual confraria
faz celebrar a festa aiiual da sua padroeira, precedida
do respectivo novenario, segundo a letra expressa dos
seus estatutos.
Confraria dos Passos do Salvadou.-Esta irmanda-
de destina-se especialmente a promover o saimento da
procissão dos Passos do Salvador. Reuniu-se pela pri-
meira vez em Fevereiro d e 1924, aprovando-se então o
seu Compromisso. É a confraria desta freguesia de mais
recente fundação.
Confraria das Almas.-Já existia no ano d e 1694,
mas conjecturamos que é de epoca bastante anterior a
esta. Tinha por fim especial sufragar as almas dos de-
-funtos e mais particularmente ainda as dos seus confra-
des. Além da festa realizada no dia da Comemoração
dos Fieis Defuntos, fazia celebrar em todas as segundas
feiras do ano uma missa seguida d e procissão e outros
sufragios pelas almas do Purgatorio. No ultimo quartel
do seculo XVIII deixou esta Confraria de celebrar a sua
festa patronal e de prestar aos seus membros os sufra-
gios prescritos no Compromisso, tendo-se organisado
I34 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

d e novo e com estatutos proprios no ano d e 1805, mas


a partir de 1824 não alcançamos mais noticia dela. Ha
muito que deixou dc existir. Veja-se o capitalo Cape&
(1% Sunta Cnw e Almas.
Confiaria da Sraiztksinaa TI-indade.-Foi das mais
antigas e florescentes irmandades, constituindo ela um
factor muito apreciavel no movimento religioso desta
paroquia. JA no ano de 1630estava organisada com seu
Compromisso especial e avultado numero d e confrad
des, tendo altar privativo na antiga igreja e passalido a
te-10 na igreja actual. Possuia alguns predios rusticos,
que durante muitos anos foram administrados pela Fa-
brica Paroquial, quando a Confraria deixou de ter vida
propria e autonoma. Em 1838 e por alvará do governa-
dor civil, de 10 de Julho deste ano, reorganizou-se a an-
tiga irmandade, d e que náo ha mais noticia depois do
ano de 1852.No sitio do Curral Velho existe um peque-
no predio, que era pertença desta extinta irmandade e
que é hoje administrado pela Fabrica desta Igrela Paro-
quial.
Co~zfrarin do Se~zhovBOMI Jesus.-Tanto a antiga
como a actual Igreja Paroquial tinham um altar especi-
almente consagrado á imagem do Senhor Bom Jesus,
que nesta freguesia foi obiecto de grande veneração e
dum generalisado e fervoroso culto. O numero avulta-
do d e missas e de sufragios que muitas pessoas lega-
ram, em disposições testameiitarias, para ser celebradas
neste altar mostram a intensa e geral devoção que nesta
freguesia havia para com aquela veneranda imagem.
Eram tambem muito numerosos os irmãos alistados na
respectiva confraria, que já estava organisada no ano de
1752 e cuja existencia não foi além do primeiro quartel
do iseculo xrx. Tinha alguns bens d e raiz, d e que hoje
não ha memoria, sabendo-se apenas que lhe pertencia,
passando a ser administrado pela respectiva Fabrica
Paroquial, um foro de cinco mil reis, imposto num
predio, situado no Boliqueme, de cerca de vinte alquei-
res de terra e que se acha registado na Conservatoria
do Registo Predial desta comarca.
Cofzfraria de Nossa Senhora da ~o~acei~âo.-Éde
1727 a noticia mais antiga que encoutramos referente a
esta irmandade e nada mais sabemos ácerca dela poste-
riormente ao ano d e I 85 j, Teve altar privativo na anti-
ga igreja e possuia algumas pequenas propriedades.
Confravia cle Santa P a r i a Madalena.Por meados do
seculo xv111existia uma Confraria deste nome com séde
na sua respectiva capela. O pouco que a tal respeito
pudémos saber encontra-se no capitulo Capela de Santa
Maria Madalena.
Confraria de Nossít Selrthora â a Soledade.-Com O
fim de prestar culto especial á imagem d e Nossa Se-
nhora da Soledade, foi estabelecida nesta Igreja uma
Confraria com aquela denominação, que teve seus esta-
tutos aprovados por alvará do governador civil de 20
de Abril de 1891, recebendo a respectiva aprovação ca-
mararia, por provisão episcopal de r I d e Maio d o mesmo
ano. Sómente podiam fazer parte dela os irmãos da con-
fraria do Santissimo Sacramento. Ha muito que se acha
extinta.
Ordem Terceira de São Francisco.-No mês de Ja-
.neiro d e 1916 foi estabelecida nesta paroquia a Ordem
Terceira de São Francisco, que actualmente conta mais
de cem membros e que realisa as suas reuniões ordiila-
rias no ultimo domingo de cada mês.
136 PAKOQL'IA DF, SANTO h N S O N I O

Apostolodo da 0vaydo.-Esta associação pia, mais


vulgarmente conhecida pelo nome d e Devoção do Sagra-
do CoraçGo de Jestts, estabeleceu-se nesta freguesia no
ano de 1878, por ocasião da grande missão evangelica
que aqui deram os padrcs Tomás Vital e Joaquim Ma-
chado, tendo a data de 2 d e Outubro daquele ano o
rcspectivo diploma d e agregação. Foi e continúa sendo
ainda o principal tactor do desenvolvimento religioso,
que desde aquela epoca se tem operado nesta paroquia,
devendo lembrar-se neste lugar os nomes dos falecidos
conego Henrique hlodesto Betencourt e padre Teodoro
João Henriques, pelo acendrado zelo com que dedicada-
mente trabalharam pelas prosperidades daquela agremia-
~ ã o esforçando-se
, por que nela se mantivesse sempre
o primitivo espirito de devoção e piedade, que deve ser
a principal carateristica destas associações pias. Muitos
dos seus membros frequentam diariamente os sacramen-
tos, um numero ainda maior pratica a observaucia dos
actos preceituados para as primeiras sextas-feiras d e
cada mês, fazendo-se além disso a festa patroilal com
notavei solenidade e celebrando-se todo o novenario
d o mês dedicado ao Coração d e Jesus. O seu numero
de associados é aproximadamente de dois mil.
Co?zfi.aria do Sa~ztissivuroe Inzaczslndo Col-nção de
Mavia.-Outro factor muito apreciavel para a difusão do
sentimento religioso foi o estaSelec:imento desta confia-
ria, cabendo a esta paroquia a honra de ter sido a pritnei-
ra desta diocese em que ela se fundou. A sua inaugura-
ção solene realizou-se no dia 2 d e Fevereiro d e 1916,
sendo os seus estatutos aprovados por decreto episco-
pal de 18 de laneiro d o mesmo ano. Esses documentos,
acompanhados duma noticia historica desta Confraria e
CONFRARIAS E ASSOCIAÇÕES PIEDOSAS I37

das grasas e previlegios que lhe estão anexos, foram


publicados no a . O 2 2 da revista I'aroquia de Safzto AIZ-
totzio do Fu;ulzckal, de 2 2 de Janeiro de 1916, que por bre-
vidade não reproduzimos neste lugar. Esta Confraria
conta mil e seiscentos membros.
Outros ágvenziuçfies pias.-É já bastante antiga a
chamada Devoçdo do Rosario Viuo, cujo numero de as-
sociados se eleva a dois mil e seiscentos.
A Agregaçdo do Santissimo Sncrn~zmzto,que tem
oitocentos membros, propõe-se especialmente a adura-
ção do Sailtissimo Sacramento, fazendo-se a exposição
solene no primeiro domingo de cada mês, durante todo
o dia, e o respectivo encerramento, ao cair da tarde,
com sermão e outros actos do culto.
Existem ainda nesta paroquia a Confraria da G ~ m r -
da de Honra cio Sagrado Coraçdo h Jesus, com mais
de mil membros, e e associação dos Pagrns de Horzra
do Snntissimo Sacramento, em que se acham alistadas
mais d e duzentas creanças.
Conferencia de Srio Vicente rle Paulo.-As associa-
ções pias chamadas Cotlferencias de Sdo Vicetzfe de Paulo,
que especialmente se destinam a socorrer a pobreza en-
vergonhada, teem sua representação nesta freguesia
com a modesta Conferencia de Sfiizto Antolzio, fundada
no dia 13 d e Outubro de 1913 e agregada ao Conselho
Central d e Paris, por diploma datado de 23 d e Feverei-
ro de 1914. Tem 20 membros activos, e socorre, nos
seus domiciiios, cerca de 50 pobres. A sua receita no
ano proximo passado foi aproximadamei~tede quatro
mil escudos.
nos vinculos que estavam unidos a outros morgadios
maiores. Apenas do primeiro, o mais importante dos
tres, pudémos obter alguns esclarecimentos e do qual
daremos uma breve noticia.

I-Morgado de Agua de Mel

Uma dos mais antigas instituições vinculares da


Madeira cra certamentc o morgadio d e Agua d e AZel,
cuja existencia remonta ao ultimo quartel d o seculo xv.
Tinha a sua séde numa grande fazenda povoada donde
tirou o nome, no sitio que hoje chamam os Alamos, e
comprehendia vastos terrenos, parte dos quais perten-
cem actualmente á visinha freguesia de S. Roque. Das
antigas edificações, qile constituiam a casa solarenga e
suas dependencias, só resta a capela de Nossa Senhora
do Amparo e talvez uma construção que ali fica proxi-
ma, tudo dentro dos limites desta freguesia.
João de Betencourt, que foi rei e senhor das ilhas
Canarias, pcrtencia a uma antiga e nobre familia d e
França, onde lhe-eram guardados e reconhecidos os
fóros e previlegios da mais alta nobreza. Um seu sobri-
nho, por nome Meciote de Betencourt e sucessor de
seu tio, veiu a esta ilha nos primeiros tempos da coloni-
sação, havendo feito troca com o infante D. Henrique
da ilha de Lançarote por uns avultados rei~dimentosna
nladeira.
Uma filha de Meciote d e Betencourt, que acompa-
nhou seu pai das Canarias, D Maria de Eetencourt, foi
a instituidora do morgado de Agua de Mel a favor d e
seu sobrinho Gaspar de Betencourt, filho do seu irmão
Henrique d e Betencourt. Como instituidora que foi
I40 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

desta casa vincular, vamos integralmente transcrever o


o que a seu respeito encontramos na Historia I~tsulana,
d e Antonio Cordeiro, a pg. 222 do volume I.O, ed. de
I 866.
«O terceiro capitão, e já sb da ilha de São lliguel,
foi o dito Rui Gonsalves da Camara, que logo então
veiu para São l'iguel; veiu porém jCi casado com D.
Maria de Betencor, filha d e Nossen João Betencor, que
tinha sido segundo rei das Canarias, e succedido nellas
ao primeiro rei seu tio, mas desta senhora franceza não
teve filho algum Rui Gonsalves, e por isso com ele fez
partilhas em vida de ambos, e ella ficou com cento e
cincoenta mil reis d e foro cada anuo, e trinta tambem
de foro em Ribeira Grande e outras fazendas d e tal
renda, qne tudo junto em cada anno rendia dois mil
cruzados; e então ella mandou vir da Madeira um seu
sobrinho legitimo, por nome Gaspar Bettencor e insti-
tuiu morgado nelle; e nem em vida do marido consen-
tiu que lhe chamassem Capitoa, nem ella se iiititulava
senão D. Maria: deixou em testamento ao conselho d e
Vila Franca dois moios d e terra já limpa e frutivera,
com a condição que os gados qne viessem de ca,minho,
pudessem dormir uma noite e mais não: mandou fazer
no Funchal da Madeira, na Egreja d e São Francisco, á
mão direita do Cruzeiro unia capella e que a ella ievas-
sem seus ossos: foi enterrada na capella-mór da matriz
d o Archanjo São Miguel em ViUa Franca, muito antes
d e se subverter, porque então lá residia o governo da
ilha..
Morreu D. Maria d e Betencourt em 1491 na ilha
de São Miguel. Ignoramos se os seus despojos mortais
seriam trasladados para a capela dos hlartires, que fez
construir na igreja do antigo convento de São Francisco
do Funchal para seu jazigo e onde se via o brazão de
armas dos Betencourt. Um terramoto destruiu Vila
Franca do Campo em I 5 2 2 e reduziu a um montão de
ruinas a igreja matiz em que foi sepultada D. Maria de
Betencourt, isto é 3 I anos depois da sua morte, não se
sabendo se a trasladação teria sido ou não feita dentro
deste periodo de tempo.
Gaspar de Betencourt, primeiro administrador do
morgado de Agua de Mel, a quem o rei fez mercê das
saboarias da Madeira, acompanhou sua tia á ilha de
São hliguel e ali casou com D. Guiomar de Sá, falecen-
do em I 522 e sua mulher em I 541.
Deste consorcio nasceram varios filhos, de que
houve larga descendencia em São Miguel, tendo o mais
velho Henrique de Betencourt herdado a mercê das
saboarias e o morgadio de Agua de Mel, que passaram
depols a seu sobrinho João de Betencourt e em seguida
ao filho deste Francisco de Betencourt, o qual deixou
a ilha de São Miguel e veiu fixar residencia na Madeira,
onde faleceu a 2 6 de Março de 1557 e foi sepultado na
igrejr do convento de São Francisco na capela dos Mar-
tires, erigida por D. Maria de Betencourt.
Este Francisco de Betencourt e Sá casou em São
Miguel com D. Maria da Costa de Medeiros, de familia
muito distinta daquela ilha, nascendo deste casamento,
além doutros filhos que morreram em tenra edade,
André de Betencourt e Sá, herdeiro da casa vinculada
de seu pai. Dele disse Henrique Henriques de Noronha:
.casou clandestinamente a 1 3 de Maio de 1563 na igreja
e fregussia de S. Antonio sendo testemunhas Jeremias
de Ornellas, Francisco de Goes, fidalgos, e Sebastião
I42 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

d'Aguiar, com D. Izabel d'Ornellas dlAguiar, filha de


Kny Dias d'Aguiar e de Francisca d'Abreu, a qual
morreu a 2 de Março de 1598.. Este casamento não foi
clandestino, considerado debaixo do ponto d e vista ca-
nonico, porque houve algumas pessoas a testemunhal,-o;
se1 o-hia por ir de encontro aos desejos da familia dum
ou ambos os contrahentes e talvez realizado a não sabi-
das dos respectivos parentes ou ainda por quaisquer
outros motivos para nós hoje inteiramente desconheci-
dos. Vimos num antigo nobiliario que Rui Dias, pai de D.
Izabel. de Ornelas e Aguiar, teve que ausentar-se desta
ilha para Arzila, por haver cometido um crime, escapan-
do-se assim á acção da justiça.
Foi herdeiro e sucessor d e Francisco de Beten-
court e Sá o seu terceiro filho Gaspar de Betencourt e
Sá, que nasceu em I572 e morreu a 3 de Outubro d e
1635.
Secedeu-llie na administração do vinculo seu filho
primogenito Francisco de Retencourt e Sá, que serviu
muitos anos com bravura nas guerras de Pernambuco,
levantando nesta ilha um terço d e cem homens, do qual
foi mestre de campo, para combater em Flandres, onde
bastante se distinguiu.
Foi seu imediato sucessor o filho Gaspar de Beten-
court e Sá, que nasceu em 1649 e morreu em 1678, ha-
vendo casado com D. Madalena de Miranda, por cujo
motivo entrou nesta casa vincular o morgado dos Ma-
chados, por ser filho de Bartholomeu Machado d e Mi-
randa.
O filho primogenito havido deste consorcio, por
nome José de Betencourt e Sá, herdou o morgadio, mas
tendo-se envolvido na sedição que se deu no Funchal a
18 de Setembro d e 1668, como adiante referiremos e em
que foi deposto o governador e capitão general da Ma-
deira D. Francisco d e Mascarenlias, viu-se forçado a
abandonar esta ilha e depois ordenou-se de presbitero,
morrendo a I d e Maio d e 1697, sem haver deixado des-
cendencia, pelo que a administração vincular da sua
casa passou a seu irmão D. Bartholomeu de Betencourt.
Foi este que em 1698 edificou ou melhor recons-
truiu a capela de Nossa Senhora do Amparo, pois tios
inclii~amosa crer que ela é coeva ou quasi coeva da
instituição deste morgado, como se pode vêr no capitu-
lo que consagrámos á referida capela. Casou com D.
Lourença de Mondragão e morreu de doença repentina
a 12 de Abril de 1710.
Não deixando geração, teve a sucessão desta casa
que passar a sua irmã D. Guiomar d e Sá, que nasceu
em Janeiro de 1654 e morreu em 1682, tendo casado em
1680 com Francisco d e Vasconcelos Betencourt, irmão
de sua cunhada D. Lourença de Mondragão. Deste ma-
trimonio nasceu Francisco Luiz de Vasconcelos Beten-
court, que sucedeu no morgadio de Agua d e Mel, o
qual por sua vez se transmitiu ao seu segundo filho e
herdeiro João José de Vasconcelos Betencourt Sá Ma-
chado, falecendo em I 766, sem deixar descendencia.
Por tal motivo entrou na administração deste mor-
gadio sua irmã D. Guiomar Madalena de Vilheila Beten-
court d e Sá Machado, que sendo possuidora doutros
vinculos importantes, era embora da mais rica casa vin-
culada da madeira e dum dos mais opulentos de todo o
pais. Ficou assim o morgado d e Agua de Mel encorpo-
rado entre os morgadios da grande casa, qae poucos
anos depois se chamou a casa Carvalhal.
144 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Tendo D. Guiomar Betencourt de Sá Machad~,


morrido em 1789, solteira e sem geração, entrou logs
como administrador da mais importante instituição vin.
cular madeirense seu sobrinho João de Carvalhal Esme-
raldo Bettencourt de Sá Machado, que casou em 1763
com D. Izabel Maria de Sá Aciaioli e faleceu em 1790.
Deste consorcio nasceu Luis Vicente de Carvalhal
Vasconcelos Betencourt Sá Machado, filho primogenito
e herdeiro na administração «de mais de doze morga-
dios grandes e sucessor putativo de seu tio Francisco
Antonio da Camara Leme, o que constitue o vassalo
mais rico em bens patrimoniaes de Portugal», segundo
Iêmos num antigo livro de linhagens. Casou em 1789
com D. Ana Inacia Correia Henriques, irmã do 1.O viç-
conde de Torre Bela.
Luis Vicente do Carvalhal Esmeraldo Vascoilcelos
Betericourt de Sá Machado não teve desceiideiicia, pas-
sando a administração vincular desta grande casa a seu
irmão João José de Carvalhal Esmeraldo Vasconcelos
Retencourt de Sá hli~achado,que foi o primeiro conde
de Carvalhal.
cerca deste titular, escrevemos ha anos e publicá.
mos em outro lugar as linhas seguintes:-João de Car-
valha1 nasceu nesta cidade no segundo quartel do secu-
lo XVIII. Foi não scí o mais abastado proprietario da
Madeira, mas a sua casa uma das primeiras de Portu-
gal, em que se reuniram diversos vinculos ou morga-
dios, sendo o representante de antigas e nobres famiiias
desta ilha. Viveiido sem fausto nem ostentaqão, era no
entretanto um homem de animo generoso e liberal,
tendo sido varias vezes, sobretudo por ocasião de algu-
mas crises por que passou a Madeira, uma verdadeira
providencia para esta terra, debelando ou contribuindo
poderosamente para debelar essas crises com a força
do seu prestigio, da sua influencia e da sua grande ri-
queza. Afecto ás ideias liberais, teve que emigrar para
Inglaterra em 1828, e ali foi não s6 o desvelado prote-
tor dos madeirenses, mas socorreu ainda generosainen-
te os compatriotas que a ele recorriam. Estabelecido o
governo constitucional, foi em 1835 nomeado govcrna-
dor deste arquipelago e neste mesmo ano agraciado
cosn o titulo de conde de Carvalhal da 1,otnbada.
Morreu nesta cidade a 11 de Novembro de 1837 e foi
sepultado na capela da sua quiiita do Palheiro Ferreiro.
Alguns anos depois, o seu sobrinho e herdeiro de sua
casa, o 2.' conde de Carvalhal, fez trasladar os seus
restos mortais para o mauioleu de familia no cemiterio
das Angustias, onde jazem sepultados,.
Tendo falecido no estado dc solteiro e sem descen-
dencia, sucedeu-lhe na posse da administração desta
grande casa seu sobrinho João da Casnara Leme Carva-
lha1 Esrneraldo, fillio de sua irmã D. Ana de Carvallial
Esrneraldo. Foi este eleito senador pela Madeira para a
sessão legislativa de 1838 a 1840. Casou com D. Tere-
za Botelho, filha d e Sebastião Xavier Botelho, capitào
general e governador da Madeira de 1819 a 1821-
E m 183 I nasceu deste casamento Antonio da Ca-
mara Leme de Carvalhal Esineraldo Betencourt de Sá
Machado, 2 . O conde de Carvalhal, que faleceu no Fu:I-
chal a 4 de Fevereiro de 1888. Foi o ultimo possiiidor
da capela d e Nosso Senhora do Amparo e proprieda-
des rusticas e urbanas do sitio dos Alamos, que consti-
tuiam a séde do morgadio d e Agua d e Mel. Veja-se o
Elucidario Madezrense a pag. 228 do vol. I . O .
40
I46 PARoQUIA DE SANTO ANTONIO

2-Morgado dos Lemes

Na tomada de Arzila e Tanger distinguiram-se


pelos seus actos de heroismo os dois fidalgos flamengos
Martim de Leme e Antonio de Leme, naturais da cida-
d e de Bruges, na antiga Flandres, que por seu pai
Martim de Lemos haviam sido mandados a combater ás
ordeils do rei de Portugal, fazendo-se acompanhar dum
certo numero de homcns de guerra armados e equipa-
dos á sua custa. Na carta e brazão de armas, de 2 de
Novembro de 1471, passado2 por D. Afonso v a favor
d e Antonio de Leme, que era então cavaleiro da casa
do principe D. João, se faz nienqão honrosa daquele
facto e se lhe confere e ratifica o titulo de nobreza que
já tinha no seu país natal, dando-se-lhe por armas <em
campo d e ouro cinco melros d e preto em aspas sem pés
nem bicos e por timbre um dos melros entre uma aspa
d e ouro*.
Antonio de Leme teve, entro outros filhos, Martim
d e Leme, que parece ter nascido, como seu pai, em
Flandres e que depois de servir em Portugal c exercer
elevados cargos palatinos na sua patria, passou á Ma-
deira pelos anos de 1483, trazendo para a Camara do
Funchal cartas de recomendação do infante D. Fernan-
do, mestre da ordem de Cristo, a que esta ilha então
pertencia. Foram-lhe dadas terras d e sesmaria nesta pa-
roquia de Santo ~ a t o n i o ,que legou a seus herdeiros,
e morreu no Funchal, sendo sepultado no convento de
S. Francisco. Martim de Leme. casou com D. hlaria
Adão Ferreira, filha de Adão Gonçalves Ferreira, sendo
este filho d e Gonçalo Aires Ferreira, companheiro de
Zarco no descobrimento da Madeira.
I N S T I T U I ~ ~ XVINCULARES
S I47

Foi ele, ou um seu filho do mesmo nome, que coiis-


truiu a cass de habitação ainda hoje chamada Quinta
do Leme e tambem a capela anexa, a cuja construção o
dr. Alvaro Rodrigues de Azcvedo fixa a ano de 1536.
Consorciou-se Antonio de Leme com D. Catarina de
Barros, a qual coilstituiu um morgado da terça dos seus
bens, em terras que possuia na freguesia da Ponta d o
Sol. Viveram e faleceram na residencia da Quinta do
Leme e foram sepultados, segundo vemos num antigo
livro de linhagens, «na capella-mór de Santo Antonio do
Campo, que é indubitavelrnente a antiga igrcja paroquis
a1 desta freguesia.
Destes nasceu Pedro de I,eme, que foi o instituidar
do morgado dos Lemes, na quinta do mesmo ilome,
com a expressa obrigação de perpetuar-se o apelido dc
Leme no sucessor c administrador deste vinculo.
Por motivos que intcirameiite descoiiheceinos e
que hoje será talvez itnpossivel descobrir-se, foram
Pedro de L,eme e seu filho primogenito Cristolrào de
Leme prezos e conduzidos a Lisboa, onde alnbos falece-
ram no carcere, no mesmo ano e a curto intervalo,
sendo o ultimo etn Setembro de 1556. Estamos em
frente dum misterioso drama e talvez duma sangreiitn
tragedia, em que pai e filho, arrojados ao fundo duma
prisão por algum nefando crime, aí fossem morto? por
mão vingadora, com receio de que a comutação da pena
ou o perdão, como facilmente acontecia aos tiohrcs, os
restituisse ainda á liberdade.
D. Maria de Leme, filha de Pedro de Leme e que
casou com Pedro Gomes Galdo, entrou imediatamente
na administração da casa que herdou d e seus pais,
tendo morrido sem deixar descendencia. Seguiu-se um
148 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

largo pleito judicial, passando o morgadio da Quinta do


Leme a Francisco de Morais e sua mulher D. Maria da
Camara, filha e genro de D. Leonor de Leme, irmã d e
D. Maria de Leme, ultima administradora do vinculo.
Foi imediata sucessora na posse do morgadio a filha
daqueles, D. Filipa da Camara, que casou com Antonio
da Silva Barreto, o qual morreu em 1633, tendo deste
consorcio nascido Manuel da Silva Camara, que entrou
logo na sucessão do tnorgadio, falecendo pouco depois'
do ano de 1634.
Foi herdeiro e imediato sucessor na administração
desta casa vinculada Inacio da Camara Leme, tenente
general da Madeira, cavaleiro da ordem de Cristo e
moço fidalgo da Casa Real, que gosou de bastante pres-
tigio e influencia nesta ilha. Foi ele que por meados do
seculo xvIr reedificou a casa e capela da Quinta do
Leme, como se vê do documeiito que transcrevemos
no capitulo respeitalite ri mesma capela. Ilatrimoniou-
sc em 1647 com D. Isabel d e Castelo Branco Beten-
court, nascendo deste casamento, em 1649, o herdeiro
da casa Francisco da Camara Leme, tambem como seu
pai cavaleiro de Cristo e moço fiialgo da Casa Real.
Contraiu matrimonio com D. Fraiicisca de Sá e
hlenézes e dele nasceu o primogenito e sucessor Pedro
Julio da Camara Leme a 25 de Julho de 1695, moço fi-
dalgo e cavaleiro da Casa Real, como seu pai e avô, que
se consorcion com D. Mariana de Menezes, filha de
Pedro d e Betencourt Henriques e de D. Xlariana de Me-
nezes.
Foi seu fillio e sucessor no morgadio, Francisco
Aurelio da Caniara Leme, que casou em 1731 com D.
Antonia Maria Acciaioli de Vasconcelos Betencourt.
Teve os previlegios de cavaleiro de Cristo e moço fidal-
go que herdara de seus maiores. Foi ele que, pouco
depois de 1748, procedeu á total reconstrução da capela
de S. Filipe da Quinta do Leme, que o terramoto de
aquele ano deixara em ruinas, como se póde vêr no ca-
pitulo já citado.
Entrou na posse imediata e administração d o vin-
culo o filho destes, Francisco Antonio da Camara Leme,
que casou respectivamente com D. Ana Correia Aciaioli,
D. Maria Luisa Correia Aciaioli, irmã de sua primeira
mulher, e D. Julia da Cunha, que era filha bastarda do
conde da Cunha e que morreu de colera em Lisboa em
1832. Francisco Antonio da Camara Leme faleceu sem
geração, passando por sua morte a administração deste
vinculo a seu sobrinho João Carvalhal Esmeraldo d e
Betencourt de Sá Machado, 1 . O conde de Carvalhal,
ficando assim encorporado na grande casa Carvalhal.

3-Morgado dos Alecrins

O morgado de Nossa Senhora da Quietação tinha


sua séde na quinta e capela do mesmo nome, que fica-
vam situadas no bairro dos Alecrins desta freguesia. A
sua instituição remonta ao ano de 1677 e deve-se ao dr.
Lourenço de Matos Coutinho, que era filho de Bento
de Matos Coutinho, o primeiro desta familia que passou
do continente do reino á ilha da Madeira e que os li-
nhagistas afirmam ser descendente por linha varonil de
Ramiro z.", quarto rei de Leão.
Bento Coutinho tomou em Coimbra o grau de
licenceado em direito e foi neste arquipelago auditor d o
presidio cast~ihano,cargo que exerceu sem remunera-
I5O PAROQCII DE ShKTO ANTONIO

çiio alguma, em atenção ás grandes despezas que ent8a


se faziam com as guerras, pelo que lhe foi dada uma
sentença regia, que se acha registada no tombo da Ca-
rnara do Funchal, em que se diz ser ele um dos fidalgos-
mais ricos e mais ilustres desta ilha. Casou em 1625
com D. Filipa d e Vasconcelos e jaz sepultado na capela
de S. Francisco Xavier da Igreja d e S. João Evangelista
(Colegio) desta cidade.
Deste consorcio nasceu Lourenço Matos Coutinho,
que foi o instituidor do morgado dos Alecrins, como
acima fica dito. Tomou como seu pai o grau de licen-
ceado em direito na Universidade de Coimbra e con-
traiu rnatrimonio com D. Mariana de Ornelas de Vas-
concelhos em Julho de 1666. Foram estes que em 1670
fundaram a capela de Nossa Senhora da Quietaçào,
como mais largamente se pode ver no capit~iloque a
ela cotisagrámos. Na admítiistração vincular sucedeu-
lhe seu filho Bartolomeu de Vasconcelos Coutinho, ca-
sado com D. Inacia de Noroi~hae Camara, filha herdeira
do capitão João Gonçalves da Camara, que em 1680
tirou carta de brazão de armas dos Noronhas, iilacieis,
Camaras e Monizes.
Foi imediato sucessor seu filho Lourenço Manuel
da Camara de Ornelas e Vasconcelos e depois o filho
deste Luis Antonio da Camara Matos Coutinho de Vas-
concelos. Exerceu este importantes cargos civis e mili-
tares no Futichal e foi um botn administrador da sua
casa, ao contrario do que fizera seu pai, que desbaratou
uma parte consideravel dos seus haveres.
Seguiu-se-lhe na heraiiqa de sua casa e morgadio
seu filho Tristão Joaquim de Betencourt da Camara e
Vasconcelos, que, como seu pai, tambem desempenhou
entre 116s importantes cargos e varias comissões de ser-
viço publico, gosando de grande prestigio nesta ilha
pelas suas distintas qualidades de caracter,
Sucedeu-lhe na administração deste morgado seu
neto Tristão Vasco Perestrelo da Camara, o iiltimo pos-
suidor dos vinculos desta importante casa, que toda
dissipou em viagens e prodigalidades. Morreu sem des-
ccndencia e nele terminou a posse d o morgado da Quie-
tação no sitiodos Alecrins desta freguesia.
Desta antiga e nobre casa é hoje representante o
dr. Rui Betencourt da Camara, que é bisneto d e Tristão
Joaquim de Betencourt da Camara e Vasconcelos.

4-Morgado do Laranjal

Pelos anos de 1640 se passou do continente do reino


para esta ilha da Madeira, João de Braga, homem rico e
nobre, a quem foram dadas terras d e semearia nesta pa-
roquia no sitio chamado do Laranjal. Foi pai do celebre
Marcos de Braga, de quem falam com muito louvor as
antigas cronicas madeirenses pelo actos de bravura e
coragem que praticou. Casou João de Braga com uma
filha d e Nuno Gonçalves, nascendo deste consorcio Do-
mingos d e Braga, que instituiu o morgado do Laranjal
nas terras que seu avô obtivera d e sesmaria.
Este morgadio passou a um bisneto d e sua irmã D.
Maria Gonçalves d e Braga, por nome Manuel Ferreira
Drumond de Vasconcelos, e deste a seu filho João
Drumond d e Vasconcelos e sucessivamente por herança
de pais a filhos a Manuel Ferreira Drumond, Rafael
Drumond de Vascoiicelos, Francisco Monis Drumond,
João Ferreira Drumund Henriques, D. Maria Ilaria Fer-
IS2 PAROQUIA I)E SANTO ANTOXIO

reira Drumund, Aiitoiiio Sebastião Spiiiola Ferreira de


Carvalho, D. Pl'latilde Augusta Spinola, Antonio S e b w
tião Spinola Ferreira de Carvalho, que foi o ultima
administrador deste morgado, em virtude da lei que
aboliu os vinculas, e de quem é representante o seu
filho varão o dr. Remigio Aiitoilio Gil de Spinola Bar-
reto.
Vemos num Nobiliario que iio ultimo quartel dose-
ciilo xvirr era admiiiistrador do morgado do Til Caeta-
tio de Velosa de Castelo Branco.
A Sedição de 1668

Os medianamente lidos na historia rnadeirense


sabcm que a 18 de Setembro de 1668 se deu no
Funchal uma sedição popular com o fim d e depôr o
então governador e capitão general deste arquipelago
D. Francisco de RIascarenhas, que depois de ter sido
preso e sofrido os maiores vexames, foi violentamente
conduzido a bordo dum navio e transportado para o
continente português. O dr. Azevedo nas notas ás Sau-
dades da Terra faz referencia ao facto e dele se ocupa
com alguma larguesa o falecido e distinto botanico
Carlos Azevedo de Xlenezes no interessante artigo que
publicou no O Diario do Conzevcio de 14 de blarqo de
1909.
Nesse artigo lê-se o seguinte:
«Foi na tarde do referido dia 18 de Setembro de
1668 que se deu o facto que pretendemos narrar. Diri-
gia-se o governador para a quinta dos padres da Com-
panhia, a pé, acompanhado do juiz de fóra e de outras
pessoas, quando junto da casa de D. Francisco de Sá,
lhe sairam ao encontro todos os conspiradores, armados
de bacamartes e outras armas, os quais lançando-se a
ele, o derrubaram, dalido-lhe algumas pancadas, ao
mesmo tempo que feriram com uma cutilada o mesmo
154 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

juiz, que pretendeu tomar a defesa do seu compa-


nheiro~.
Este assalto á mão armada e a prisão d e D. Fran-
cisco de Marcarenhas deram-se no sitio de Agua de
Mel, desta freguesia, nas proximidades d a casa solaren-
ga que ali possuia D. Gaspar de Betencourt, quando o
governador se dirigia para a propriedade ainda hoje co-
nhecida pelo nome de Quinta dos Padres, situada no
Pico do Cardo, que então pertencia aos jesuitas e que
deles tomou o nome.
Veiu á Madeira o desembargador João de Moura
Coutinho proceder a uma larga devassa, tendo o tribu-
nal respectivo proferido a sentença a 19 de Julho de
1673 e por ela foram condenados, entre outros, D.
Gaspar d e Sá a degredo perpetuo para Angola e ao pa-
gamento d e 3000 cruzados ao auctor, D. José d e Beten-
court e Sá, seu filho, ao mesmo degredo e 10000 cru-
zados de renda ao autor e 2009looo reis para despezas
d o processo, e I). Francisco de Sá, proximo parente de
D. Gaspar d e Sá, á mesma pena de degredo para Afri-
ca e tambem ao pagamento de zooSooo reis.
Este D. Gaspar de Betencourt de Sá e seu filho D.
José de Rettencourt e Sá são os mesmos d e que fazemos
menção no capitulo Instituições Vi~zculares,na parte que
diz respeito ao morgadio de Agua d e Mel. Diz-nos um
antigo livro d e linhagens que D. José de Betencourt e
Sá, depois de sair da Madeira, por motivo do degredo a
que fôra condenado, se ordenou de presbitero, tendo
falecido a I d e Maio d e 1697.
Vejam-se os capitiilos Capela de nossa Se~zhorado
A ~ ~ p a reoInstituições YiPiculares, que teem relações de
proxima afinidade com o assunto do presente capitulo,
Escolas P r i m a r i a s

O dese~ivolvimentoda instrução primaria nesta fre-


quesia deveria ter seguido a evolução da das outras
paroquias deste concelho. Certamente que desde remo-
ta epoca existiram aqui escolas particulares das chama-
das primeiras letras, mas o serviço oficial de ensino pri-
mario apenas se iniciou em 1837, com a criação duma
escola do sexo masculino, em que foi provido proviso-
riamente o professor Manuel Joaquim Afonso, a 23 de
Agosto daquele ano. Comunicou este á Carnara Munici-
pal, em principias de Outubro, de que dera começo á
regencia do respectivo curso com a frequencia de 70
alunos. Esta escola destinava-se tambem a receber alu-
das freguesias confiriantes de São Roque e São Marti-
iiho, que sómente em 1845 foram contempladas
com o beneficio da criação de escolas. A I d e Feverei-
ro de 1839 foi Francisco Chagas nomeado professor
efectivo desta escola de Santo Antonio, por meio de
concurso realisado perante o Conselho Escolar do liceu
do Funchai. Dela foram sucessivamente profes-cores
Augusto Cesar de Freitas, Teodoro João Henriques,
Daniel Correia de Macedo e Edmundo Alberto Ubaldi-
no da Silva.
Na sessão camararia de 12 de Maio de 1845 foi
IS6 PAROQGILI DE S A N T O ANTONIO

criada a primeira escola do sexo feminino, sendo-nos


desconhecidos O nome da professora nomeada e a data
em que começou o funcionamento da mesma escola.
Deve esta corresponder i que actualmente se acha ins-
talada no sitio das Casas Proximas e de que ha muitos
anos é professora D. Maria Gomes Jardim.
O governador civil do distrito ponderou á Camara
illunicipal, em 1898, a conveniencia da criação duma es-
cola no sitio do Trapiche, tendo aquela corporação de-
liberado que o estabelecimento dessa escola se fizesse
no sitio das Preces. Em ambos os sitios se instalaram
posteriormente duas escolas, como as necessidades
locais aconselhavam, sendo a do sitio das Preces, do
sexo feminino, criada no ano de 1901 e d e que foram
professoras D. Candida Augusta Ferraz e D. Maria He-
lena d e Oliveira 1,opes Camacho. Esta escola tem
sempre funcionado no sitio das Romeiras.
Em 1906 estabeleceram-se duas escolas oficiais,
urna para cada sexo, iio sitio das Encruzilhadas, tendo
sido professores, da masculina, Francisco José de Brito
Figueiroa, Antonio José d e Brito Figueiroa e João Evan-
gelista Ferro Junior, e da fiminina, D. Maria Adelaide de
Brito Figueiroa e D. Maria Henriqueta Vicente Franco.
Esta ultima escola foi transferida, em Janeiro d e 1914,
para o sitio da Chamorra.
A escola do sexo masculino do sitio d o Salão foi
criada no ano d e 1906 e dela teem sido professores D.
Carolina Escorcio de Vasconcelos Gomes e Antonio José
d e Brito Figueiroa.
A Camara PIIunicipal, na sua sessão d e 18 de
Agosto d e 1908, tomou a deliberação d e instalar uma
escola d o sexo masculino no sitio do Laranjal, mas a
ESCOLAS PRIMARIAS I57

criaqão dela sórnente se deu posteriormente, por,decre-


to d e 29 de Abril de 1911. Não havendo neste sitio casa
apropriada para o funcionamento da escola, foi esta es-
tabelecida no sitio da Terra Chã, onde se encontra
ainda. Teem tido a regencia desta escola as professoras
D. Isidora Alice de Sousa Alves, D. Graziela Olga d e
Menezes, D. Maria Isabel da Costa Dias, D. Maria Nata-
tia de Freitas Viveiros e D. Alda do Nascimento Alves.
A escola mixta do sitio do Trapiche começou a
funcionar em 1916, tendo sido criada por decreto d e
24 de Novembro d e 1915. Esta escola, de que tem
sido professora D. Maria do Livramento Rodrigues, foi
transferida para o sitio da Madalena, continuando sob a
regencia da mesma professora.
No sitio do Lombo dos Aguiares, criou-se uma es-
cola mixta, por decreto de 24 de Novembro de 1915,
que se acha instalada no sitio da Quinta das Freiras e de
que é professora D. Maria Amalia Veiga Pestana Ferro.
No ano de 1926 resolveu a Camara criar urna esco-
la municipal no sitio do Laranjal, que tem funcionado
sob a regencia da professora D. Maria Gabriela Celeste
da Silva Martins.
Durante alguns anos funcionaram tres escolas
moveis, que ha muito foram extintas.
Teern actualmente (fins de 1928) sua séde nesta
paroquia as seguintes escolas oficiais:
Casas Proximas, do sexo feminino.
Madalena, do sexo masculino.
Madalena, d o sexo feminino.
Salão, d o sexo masculino.
Terra Chã, do sexo masculino.
Quinta das Freiras, mista.
158 PAROQUIA DE SANTO ANTONIU

Romeiras, do sexo feminino.


~ h a m o r r a do
, sexc, feminino.
Encruzilhadas, de sexo feminino.
Destas não funcionam presentemente, mas em
breve serão providas, as escolas feiniiiinas dos sitios das
Romeiras e Madalena.
Existem mais nesta freguesia as escolas municipais
dos sltios do Salão e Laranjal, e ainda tres cursos noc-
turnos, tambem municipais, que funcionam nos sitios das
Casas Proximas, Salão e Terra Chã.
Tarna-se necessaria a criação duma escola, que es-
pecialmente aproveite aos sitios d o Tanque, Alecrins e
bairros mais circumvisinhos, tendo sido presente á Ca-
mara Municipal uma representação, na sessão d e 29 de
Maio de 1914, concebida nos seguintes termos:
.Os abaixo assinados, moradores nos sitios, do
Pico dos Barcelos, Santo Amaro, Tanque, Alecrins,
Santa Quiteria e Pinheíro das Voltas, da freguesia de
Santo Antonio deste coiicelho, veem respeitosametlte
ponderar perante V. Ex." a conveniencia e necessidade
da criação duma escola primaria do sexo masculino
dentro da área dos referidos sitios, afim de que possa
ser ministrada a seus filhos e parentes a indisperisavel
instrução primaria elementar, tendo em vista o se-
guinte:
1.0-Que nos mencionados sitios residem mais de
cem individuos do sexo rnusculino em idade escolar.
2.0-Que só mui dificilmente poderão os mesmos
individuos frequentar as escolas das Encruzilhadas e
Laranjal, pelas distancias a que estas ficam dos sitios
onde eles teem as suas residencias;
3 .o-Que as ditas escolas, abrangendo áreas muito
ESCOLAS PRIMARIAS I59
--

vastas e de densa população escolar, não poderão admi-


tir á matricula individuos estranhos ás mesmas áreas;
4.0-Que dentro do perimetro formado pelos su-
pramencionados sitios, não é dificil encontrar-se um
edificio em que comodamente se possam instalar a esco-
la e residencia do respectivo professor.
Em vista do exposto, os signatarios pedem a V.
Ex." se digne promover a criação daquela escola, no
que prestará um assinalado serviço á instrução e em es-
pecial aos habitantes desta fregue~ia,.
Esta representação não teve até o presente deferi-
mento favoravel.
Entre os professores falecidos, que exerceram o
magisterio primario oficial nesta paroquia, destacam-se
os nomes de Teodoro João Henriques, de quem mais
adiante nos ocuparemos, e Teodoro Pedro de Freitas
Vieira, que morreu nesta freguesia no dia 13 de Novem.
bro de 1927. O que a seu respeito aqui poderiamos
dizer, vem tão eloquentemente exposto, e com tanta
verdade e justiça, na representação dirigida ao Alinistro
da Instrução e nas palavras que a precedem, insertas
no Dtuclivio de ilroticins, d e 15 d e Maio d e 1925, que nos
limitamos á respectiva transcrição, deixando essas pala-
vras arquivadas neste opusculo como merecida home-
nagem prestada á memoria do bemquisto e benemerito
professor.
*Os habitantes do sitio das Encruzilhadas, freguesia
d e Santo Antonio, dirigiram ao Sr. Ministro da Instrii-
ção uma representação pedindo que o professor Teodo-
ro Pedro de Freitas Vieira, da escola masculina daquele
sitio, continue a reger o mesma escola, não obstante ter
atingido o limite de idade-61; anos, tanto mais que foi
I 60 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

declarado apto para o serviço pela.junta medica a que


acaba de ser submetido.
O Sr. Teodoro Vieira, professor zeloso, sabedor e
cumpridor dos seus deveres, ha mais de 40 anos que
exerce o seu mister com rara dedicação e o maior cari-
iiho pela petizada, podendo com justiça ser considerado
um verdadeiro benemerito da instrução.
A representação dos habitantes das Encruzilhadas
tem, pois, o significado duma singela mas valiosa home-
nagem ao distinto professor:
«Os signatários, habitantes do sitio das Eucruzilha-
das, freguesia de Santo Antoriio, veem respeitosamente
representar a V. Ex." lios termos que passam a expor:
O protessor da Escola oficial do sexo masculino do
sitio e freguesia acima referidas, Teodoro Pedro de
Freitas Vieira, completou o limite d e idade para o exer-
cicio normal do magisterio, ou sejain 65 anos.
Dificil será encontrar-se, em todo o quadro do pro-
fessorado, quem o exceda em proficiencia, erri declica-
$20 pelo ensino, em rigor pelo cumprimento do seu
dever profissional. Toda a sua vida a tem consagrado
com uma isenção e uma abnegação raras ao magisterio,
deixando em todas as Escolas por que tem passado uma
tradição honroissima, que póde ser legitimamente apre-
sentada corno modelo a todos quantos queiram seguir a
carreira do professorado,
Reunindo aos dotcs morais d e um perfeito caracter
uma conduta irrepreensivel, a coinpetencia, o saber e o
amor a o trabalho-Teodoro Pedro de Freitas Vieira é
um exemplo vivo d e dedicação profissional, sein um
deslise na sua vida, sem uma mancha, sem uma falta
que possa de qualquer modo diminuir o valor da sua
ESCOLBS PRIMARIAS 161

longa, honrada e brilhante folha de serviço? á causa da


Instrução.
Na regeucia da escola do sitio das Encruzilhadas,
freguesia d e Santo Antonio (Funchal), em que presente-
mente se acha colocado e a cuja povoação pertencem
os signatarios, estão aos olhos d e todos as aptidões e o
interesse pelo serviço que tem revelado, sendo palpavel
os progressos que a população escolar tem manifestado
depois que o eniino se acha confiado em suas mãos e
geral a admiração que a freguesia nutre por tão modes-
to quão inteligente e competente professor.
Nestas circunstancias, os petencioi~ários,interprc-
tando o sentir de toda a população do sitio de que sc
trata, solicitam d e V. Ex.' a conservaçio do referido
professor na regencia da Escola oficial já mencionada,
apesar de ter atingido o limite da idade legal, porquan-
10 se encontra em condições de saude e robustez fisica
para continuas no exercicio do seu lugar, e está pres-
tando ao ensino os melhores e mais valiosos serviços,
como aliás pelos seus seperiores hierárquicos e, por
todos, em geral, é constatado.
Respeitosamente aguardam deferimento a este pe-
dido, que as mais evidentes e provadas razões de justiça
fundamentam..
O Terramoto d e 1748

Entre os abalos de terra que se teem sentido na


Madeira, foi sem duvida o mais violento e o unico que
cansou prejuizos materiais consideraveis, o que se deu
na noite de 3 I de Março para I d e Abril, de 1748.
Numa das notas ás Saudades da Terra, se encontra uma
descrição sumaria, fielmente extraida duma relação
coeva daquele acontecimento, donde trasladamos as se-
guintes linhas:
<<Pelauma para as duas horas depois da meia
noite, em 31 de X l a r ~ ode 1748, se abalou a ilha a im-
piilsos de um terramoto de pouca duração. Com este
tremor acordaram todos os moradores, uns admirados,
outros suspensos e outros duvidosos do que era. Senti-
ram segundo e terceiro, e tão forte, que além de fazer
demolir egrejas, villas, logares, campos e casas particu-
lares da cidade, e não padecer senão um homem decre-
pito, um menino e duas mulheres, não ficou edificio por
mais forte que estivesse que não esteja offendido.

«A qrejac.de Santo Antonio no frontespicio tem


varias aberturas: a cantaria da porta principal está des-
conjuntada, e as paredes do corpo da egreja partidas
o TERRAMOTO DE 1748 163

em diversos logares, como tambem o estão as das ofici-


nas; e o que se sente mais é o tecto que está em grave
damno a .
Por esta narrativa se vê o estado de notavel ruina
em que ficou a ,antiga igreja, levando o respecti-
vo paroco, o dr. Antonio Pereira Borges, a solicitar a
construção dum novo templo, o que então tambem já
era aconselhado pelo movimento sempre crescente da
população. Apesar das ponderosas razões apresentadas
e dos diligentes esforços emprega(ios pelo dr. Pereira
Borges, sómente passados 35 anos é que obteve favora-
vel deferimento aquela peefção, a que se tinham tambem
associado as pessoas mais qualificadas da freguesia, pois
que a construção da nova igreja paroquial veiu a come-
çar por meados do ano de 1783.
A capela de S. Filipe, na Quinta do Leme, que era
então uma construção separada da casa de habitação,
ficou de tal mcdo arruinada, pe!o efeito do terramoto,
que nela se não podiam celebrar os oficigs divinos,
tendo os respectivos proprietarios, os morgados Fran-
cisco Aurelio da Camara Leme e sua mulher D. Ana
Maria de Sá e Menezes, mandado reconstruir a mesma
ermida em I 7 5 2 e solicitado, neste ano, da auctoridade
eclesiastica a necessaria licença para nela celebrarem os
actos do culto, como mais largamente se poderá vêr no
capitulo que consagrámos á referida capela. Ficou esta
encorporada na casa solarenga, .que tambem foi reedifi-
cada, em virtude do estado d e ruina em que o aba16 d e
terra a deixara.
Podemos afirmar, atendendo á violencia do terra-
moto e aos grandes prejuizos que causou por toda a
ilha, que outros graves danos materiais se tivessem dado
164 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

nesta paroquia, mas a escassez de noticias não nos p'er-


inite descer a mais pormenorisados detalhes.
Quanto á perda de vidas, sabe-se, pelo curioso as-
sento de obito, que em seguida transcrevemos, que aqui
faleceu victimado pelo terramoto um individuo, por
nome Afonso Pereira Borges, pai do paroco de então,
ignorando-se, porém, as circunstancias que determina-
ram esta morte. Diz o trrmo:-<Em o primeiro de
abril do dito ano (1748), dia fatal e d e eterna memoria,
falleceu nesta egrejg Afonso Pereira Borges, meu pae,
sem sacramentos pelos estragos do terramoto, e enter-
rou-se nesta egreja, de q u M z este termo que assigno.
Era ut supra. O Vigario Antonio Pereira Borges,.
É este o velho, victima do terramoto, a que se re-
fere a nota das Saudades n'n Terra? É provavel que
seja, mas não temos elementos para categoricamente o
afirmar.
Apesar do silencio guardado pelo arquivo paro-
quial, presumimos fundadamente que outros estragos se
dariam em varios edificios e em especial nas capelas,
pois que, ao tempo, já algumas delas se encontravam
bastante arruinadas.
Movimento da P o p u -
lação

Foi esta a paroquia da antiga capitania do Funchal,


que mais rapidamente se desenvolveu, atingindo em
breve uma população superior ás proprias freguesias
citadinas e mantendo-se sempre, através dos tempos,
como a mais populosa de todo o arquipelago. Para isso
concorreriam a sua extensa área, condi~õesclimatericas,
feracidade do só10 e ainda quaisquer outras circunstan-
cias, que são hoje para nós inteiramente desconhecidas.
Pretendemos apresentar uma nota aproximada da
população desta freguesia nos seculos xvr, x v ~ ei XVIII,
aproveitando como base, para esse calculo conjectural,
o numero d e nascimentos e obitos havidos em cada ano.
Damos em seguida a indicação da média anual d o
numero d e habitantes, referente a cada quartel dos secu-
10s xvi, XVII e XVIII:
3.O Quartel do seculo XVI (I 557-1575)- 400
4.0 » » (1576-1600)- 500
1.0 » » » XVII (1601-1625)- 650
2.O r x i> z (1626 1650)- 850
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4.0 » % >> (1676- r 700)-I 300
I." P » XVIIl (1701-1725)-1600
I 66 PIROQCIA DE SANTO ANTONIO

2.O Quartel do seculo XVIII (1726-1750)-1950


3." " > >> (1751-17751-2350
4.0 c % )) w ( I 776- 1800)-2850
Com respeito ao seculo xix, apresentamos um4
nota, tambem de media anual, do numero d e habitantes,
mas relativo a cada decénio.

A natalidadc e a mortalidade foram, aproximada-


mente e na geueralidade, de 40 e 25 casos, para cada
mil habitantes. Pelos numeros que apresentamos, vê-se
que, no desenvolvimento da população, não se manteve
sempre uma proporção uniforme, devido a causas des-
conhecidas, não sendo tambem para estranhar que haja
deficiencias nos dados de que aos servimos, para orga-
nisar esta pequena estatistica.
Pelo censo oficial da populaçào, a que se procedeu
em todo o país no ano de 1910,contava esta freguesia
8839 habitantes. Pelo Censo de 1920 este numero ele-
vou-se a 991 5.
As freguesias mais populosas do distrito do Funchal
são, segundo os elementos fornecidos pelo ultimo Censo
(1920): São Pedro com 8212 habitantes, Machico com
8619, Camara de Lobos com 8749 e Santo Antonio com
9915 .
Teem aqui cabimento as indicações fornecidas pelo
capitulo, que inserimos na antiga revista Paroqzdia de
Santo Antonio do Funchal, ácerca das mortes desastro-
sas, que frequentemente se dão nesta freguesia, e por
isso extratamos desse artigo os seguintes periodos:
«Não sabemos de outra freguesia da Madeira, em
que seja tão avultado o numero de mortes ocorridas por
desastres, como nesta de SantoAiitoiiio. Escasseiam-nos
os indispensaveis esclarecimentos para afirmar com se-
gurança que esta percentagem de mortalidade seja
maior aqui do que noutras paroquias desta diocese, mas
é sem duvida muito consideravel, como vamos ter oca-
sião d e verificar. São, na sua grande maioria, provenien-
tes de quédas de individuos, que se despenliam pelas
rochas abruptas e perigosos desfiladeiros, que se encon.
tram frequentemente desde o sitio da Fajã até o Curral
das Freiras, nas margens escarpadas da Ribeira dos So-
corridos. A levada Nova do Curral e Castelejo, que num
loiigo percurso se estende dum a outro daqueles pontos,
oferece entre eles uma comunicação relativamente curta
comparada com a estrada central, rnas cheia dos
maiores perigos, em que são inumeraveis os abismos e
despenhadeiros com centenares d e metros de profundi-
dade. Apesar dos desastres mortais que por ali ocorrem
com tamanha e espantosa frequencia, não deixa de ser
o mainel da levada a estrada preferida por uma grande
parte dos habitantes do Curral das Freiras que deman-
dam o Funchal e d e muitos dos moradores de Santo
Antonio que se dirigem Aquela freguesia. Aquelas ravi-
nas aprumadas e encostas semeadas d e precipicios são
I 68 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

além disso muito exploradas para a apanha d e ervas e


matagais, destinados-para a engorda dos gados, adubo8
d e curral, combustivel, etc., sem se lembrarem os im-
prudentes que, percorrendo aqueles sitios, arriscada-
mente expõem a sua vida por tão minguados e por
vezes problematicos lucros.
Apesar da grande deficiencia, que indubitavelmente
se deu no registo daqueles desastres e da pesquiza
pouco minuciosa a que procedemos, sendo por isso
muito incompletos os elementos de que podemos dispor,
é ainda assim proporcionalmente enorme o numero de
casos de mortes desastrosas que se tem dado nesta pa-
roquia.
Nos seculos xv111, XIX e x x , pelo pouco que conse-
guimos averiguar, deram-se por desastre, nesta paro-
quia, respectivamente 71, 63 e 10 casos de morte. A
percentagem é maior para o seculo XVIII, sobretudo se
atendermos a que era então relativamente pequena a
população desta paroquia* .
Encargos Pios

Era um antigo e piedoso costume, que no nosso


país se tornou muito frequente, onerarem as pessoas
ricas e medianamente abastadas, com diversos encargos
de caracter religioso ou caritativo, as suas ultimas dis-
posições testamentarias. Esta ilha não podia subtrair-se
á regra geral. Nos arquivos paroquiais das freguesias
mais antigas, encontram-se os chamados livros de Cape-
las, que era o nome que aqueles encargos tomavam,
quando se destiuavam a fins puramente religiosos.
Nesta paroquia era consideravel o numero de Cape-
las, que principalmente consistiam na celebração de
missas, em sufragio dos doadores. Encontramos o regis-
to ou a sua descrição sumaria em muitos assentos de obi-
tos, de alguns centenares desses encargos, de caracter
perpetuo, para serem cumpridos cemquanto o mundo fõr
mundo», como frequentemeute se repete tias respectivas
verbas testamentarias. Como se sabe, ficavam essas
pensões impostas em propriedades rusticas, que os seus
proprierarios livremente oneravam, transmitindo o en-
cargo aos seus herdeiros e sucessores.
Relativamente ao numero tão consideravel dessas
pensões, poucas são aquelas que actualmente se cum-
prem tanto nesta como nas outras Igrejas da nossa dio-
I7 0 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

cese. O pouco escrupuloso cuidado dos herdeiros no


cumprimento dos legados, a falta de severa fiscalisação
por parte dos parocos e da respectiva autoridade priva-
tiva desses serriços, conhecida pelo nome de Juiz dos
Residuos e Capelas, a transmissão, ás vezes frequente,
por herança, venda ou doação, das propriedades onera-
das e ainda outros motivos, contribuiram imensamente
para que esses encargos deixassem a pouco e pouco de
ser cumpridos e quasi viessem a cair de todo no esque-
cimento. As nossas lutas civis, no periodo decorrido de
1828 a 1834, tambem contribuiram bastante para esse
esquecimento. Ocorre-nos lembrar que as inumeras
casas vinculadas existentes neste arquipelago tinham
muitas pensões desta natureza, não nos constando que
nenhum desses cargos se cumpra presentemente.
São centenares os encargos pios, impostos em
terras desta paroquia, mas vamos apenas dar breve no-
ticia dos poucos que escrupulosamente teem sido
sempre cumpridos e ainda o são na actualidade. No sitio
dos Tres Paus, faleceu a 19 de Dezembro de 1670, An-
tonia Ferreira, viuva de Antonio Fernandes Frita, que
no seu testamento, feito a g de Outubro daquele ano,
legou a esta Igreja Paroquial, para ser administrada
pela Confraria do Santissirno Sacramento e pelo respec-
tivo paroco, a fazenda que possuia no sitio referido,
com as obrigações e encargos constantes dos trechos
que vamos textualrneilte transcrever do mesmo testa-
mento:- a . . . haverão como administradores a terça
parte para a dita Confraria e das duas partes que fica-
rem liquidas lhes maudarão repartir todos os anos,
ernquanto o mundo durar, em missas resadas e obras
pias da dita Confraria, as quais missas se repartirão de
ENCARGOS-PIOS '7I

sorte que se digam vinte em São Francisco da Cidade e


outras vinte no altar privilegiado do Senhor Bom Jesus
da Sé desta cidade, as mais em Santo Antonio. . . e lhe
maiidarão dizer algumas delas no oitavario das defuntos,
tirando s e em primeiro logar das ditas duas partes d o
rendimento liquido duas tochas grandes que pesem dez
arrateis d e cera ambas para alumiar no santo sepulcro
das Endoenças. . . s
O padre Antonio Fernandes Pimenta, que era natu-
ral desta freguesia e nela exerceu por largos aiios o
cargo d e coadjutor, fez doação: aos vigarios desta
Igreja, do Passa1 anexo á casa de residencia paroquial
ou ao menos duma parte consideravel dele, com a obri-
gação perpetua duma missa celebrada nos primeiros
dias de cada mês e o pagamento dum fôro anual de
quinhentos reis á Confraria d o Santissimo Sacramento
da paroquia de Santa Maria Maior da cidade do
Funchl. Estes encargos tem sido integralmente cumpri-
dos nos ultimos vinte anos.
A Confraria do Santissimo Sacramento desta fre-
guesia cumpre-lhe tambem, em virtude de varias
doações antigas, mandar celebrar anualmente as nove
missas do Parto por alma de Isabel de Vares, as tres
missas do Natal por Luzia de Aguiar, quatro missas por
João Gonçalves Sequeira, duas por João Gonçalves,
doze por Filipe Gomes, padre Simão de Abreu, padre
João de Araujo, Antonio Rodrigues, Antonio Fernandes
Camacho, Salvador Gonçal\~es,Isabel dos Santos, Maria
d e Afonseca, padre Pedro Gonçalves de Aguiar, Angela
d e Oliveira, Inacio Fernandes e Maria Fernandes Ba-
zenga, além de dôze missas anuais por todos os membros
da mesma Confraria.
A l g u n s Melhoramen-
tos Publieos

Escasseiam-nos os elementos indispensaveis para


fazer uma resenha dos principais melhoramentos publi-
cos realisados nesta paroquia, e por isso nos limitare-
mos a apresentar as breves notas avulsas, que pudémos
colher ácerca deste assunto, embora esteja ele a exigir
uma mais larga noticia.
Varias Estracias-A ponte de Agua de Mel no sitio
da Penteada, com a sua respectiva estrada, foram cons-
truida no ano de 1841, despendendo-se nessas obras a
importancia de ~OO$OOO reis.
No bienio de 1844 a 1845 se construiu e em parte
parte se alargou o caminho do Jamboto, em que foram
gastos cerca de ~.goo$oooreis. No mesmo periodo de
tempo se alargou e prolongou o caminho do Lombo
dos Aguiares, orçando esses trabalhos por 470$000 reis.
Nos anos de 1876 e 1877 se realisou o importante
melhoramento da construção e alargamento da estrada
que conduz do sitio da Quinta de Leme ao caminho
d o Pilar, tendo esta obra custado aproximadamente
1.7oo$ooo reis. Pela mesma epoca se construiram ou
melhoraram o caminho que vai de Santo Amaro ao sitio
da Viana e o da Ribeira Grande e Alamos.
ALGUNS MELHORAMENTOS PUBLICOS I73

Ponte de Santo Antonio.-A rapida e frequente cir-


culação de automoveis, que pôs esta,freguesia em facil
comunicação com a cidade, obrigou o alargamento d a
estrada da Madalena, que constituia a mais imperiosa
necessídade a satisfazer nesta localidade. Anteriormen-
te a isso, impunha-se como melhoramento mais urgente
a construção da ponte de Santo Antonio, que estabele-
ce a comunicação da Quinta do Leme, Casas Proximas
e outros sitios da margem direita da ribeira com os
sitios da Ribeira Grande, Alamos, Salão e Penteada,
que k a m na sua margem esquerda. Era frequente, na
quadra. inverilosa, interceptarem-se as comunicações
entre os sitios das duas margens com grave incomodo e
prejuizo dos respectiyos habitantes. Não raras vezes
acontecia que, aumentando inesperadamente o volume
da corrente, tivessem de voltar á cidade aqueles que,
encontrando-se numa das margens, quizessem alcançar
a margem oposta-
Facilmente se calcula quanto seria desejada a rea-
lisação deste importante melhoramento. Não admira,
pois, que em epocas eleitorais, os influentes partidarios
agitassem a ambicionada construção da ponte como
arma politica e dela se servissem como engodo para a
pesca disputada do voto. O assunto era então versado
largamente na imprensa do Funchal, não exagerando
quem afirmar que os artigos e noticias, publicados a
tal respeito nas gazetas, chegavam á farta para preen-
cher um opusculo de muitas dezenas de paginas. Dura-
ram anos essas reclamações da imprensa e não menos
tempo levaram os politicos a fazer as suas mirabolantes
promessas.
Até que, emfim, no ano d e 1889, uma portaria do
I74 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

governo central ordenou á Direcção da Obras Publicas


deste distrito a organisação dos prejectos e orçamentos
desta obra e auctorizou o começo dos respectivos tra-
balhos. Esses projeetos foram elaborados pelo enge-
nheiro José Bernardo Lopes de Andrade e teem a data
de. 3 d e Outubro daquele ano. Por eles se vê que;
ponte, incluindo as avenidas, teria 81 metros de com-
primento e 6 d e largura. Deveria compor-se de dois
arcos abatidos, com 1gm,80 de vão, 2'"65 de flecha e I
de espessura. A obra foi orçada em onze contos de reis.
Não sabemos se a construção se realisou em inteira con-
formidade com estes dados ou se teria porventura sofri-
do quaisquer alterações no seu primitivo projecto.
Os trabalhos iniciaram-se, e nele se despenderam
aproximadamente dois contos de reis, no exercicio de
1889 a 1890. Foram nesta altura interrompidos e
sómente recomeçaram sete ou oito anos mais tarde,
tendo a obra seu seguimcnto no ano de 1898 e continu-
ando, embora lentamente, até á sua final conclusão.
Estava finalmente realisado um dos mais importantes
e urgentes melhoramentos que esta freguesia ha muito
reclamava.
Estradn da Marlalenn -O mais importante melho-
ramento de que esta freguesia necessitava era o alarga-
mento da estrada chamada da Madalena. É certo que não
faltaram pessoas que alvitrassem a peregrina ideia da
abertura duma nova via publica, que, partindo da cape-
la de São João e marginalido a ribeira do mesmo nome,
viesse entestar com a ponte d e Santo Antonio. E outras
houve ainda que conceberam o projecto da construção
dum caminho, que teria como ponto d e partida o largo
da Cruz do Carvalho e que se prolongaria até ás
ALGUNS MELHORAMENTOS PUBLICOS I75

alturas da igreja de Santo Antonio. Felizmente que pre-


valeceram a boa razão e o bom senso. Estando esta
freguesia em comunicação directa com a cidade por
meio de tres estradas, todas em regular estado d e con-
servação, não constituia um melhoramento urgente e
inadiavel a abertura duma nova estrada, mas convinha
realizar na mais central e importante dessas vias de
comunicação, OS repairos indispensaveis a torna-la
urgentemente adaptavel ao transito de todos os generos
de veiculas. De mais acresciam os ponderosos motivos
d e que a estrada da Madalena, de todas as construidas
e porventura a construir, era a mais central e a mais
movimeatada e' aquela que mais facilmente se presta-
va á construção de predios urbanos, como o futuro veiu
a demonstrar, podendo ainda acrescentar-sc que a
sua adaptação á circulação d e todos os carros seria a
mais rapida e consideraveln~entemenos despendiosa.
Foi o que aconteceu para honra de todos os que
intervieram nessa resolução. O alargamento começou a
fazer-se nos sitios da Levada do Cavalo e Aladalena,
realisando-se esta obra desde os fins de 1914 até
meados de 1 9 1 5 , Neste ultimo ano se iniciaram,no largo
das Maravilhas, os trabalhos do mesmo alargamento,
que prosseguiram no ano imediato no sitio da Quinta do
Leme até alcançar o pequeno largo da Igreja Paroquial.
Èoi tambem no fim do ano de 1914e primeiros meses
d o ano seguinte que se realisaram os importantes melho-
ramentos na estrada, que da Igreja Paroquial conduz ao
Ribeirinho, dando-se-lhe então a largura que presente-
mente tem.
Ponte dos Tres Paus.-Era uma necesidade por
todos reconhecida, a construção duma ponte, que puses-
I 76 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

se o bairro dos T r e s Paus em comunicação com o Pico


d o Cardo e outros sitios mais proximos. Em apertando
a invernia, ficava aquele sitio completamente isolado.
Quando o actual paroco presidiu á Comissão Adminis-
trativa da Camara Municipal do Funchal, mandou pro-
ceder a essa construção, satisfazendo-se assim a uma
antiga aspiraqão dos habitantes daqueles sitios. É urna
bela ponte, em cimento armado, que espera o alarga-
mento da estrada d e que faz parte. Foi construida no
ano de 1923.
Nos capitulas Cetnitevio, Levadas c Fontenarios,
G r a d e s Reparações na igreja Paroqzcinl e Campanarios
e Rebgio fazemos menção d e outros 'n~elhoramentos
realisados nesta freguesia, que pela sua importancia
mereceram artigos especiais.
Grandes reparações
na Igreja Paroquial

Como anteriormente dissémos, os melhoratnentos


iniciados nesta Igreja paroquial, no ano de 1921, e que
ainda não estão d e todo coticluidos, são os mais consi-
deraveis e de mais avultado dispendio que nela se teem
realisado. Além da primitiva construção, terminada em
1789, nunca se empreenderam obras de tanto vulto
como agora, tornando-se este templo um dos primeiros
da diocese, não só pela elegancia e beleza da sua fron-
taria, mas ainda pelas ornamentações interiores, sem
mesmo contar com a sua vastidão e com as muitas
dependencias d e que dispõe, destinadas a diversos Ser-
viços paroquiais.
O tecto da Igreja era interiormente revestido duma
espessa camada d e estuque, que ameaçava desabar,
pondo assim em grave risco a vida das pessoas que
assistiam aos actos do culto. Esta circunstancia é que
principalmente determinou o começo dessas obras ina-
diaveis, que depois se foram multiplicando á medida
que se ia reconhecendo a necessidade da realização de
outros importantes e indispensaveis melhoramentos.
Tornando-se manifesto o erro havido de revestir-
se interiormeilte o tecto com estuque, foi este siibstitui-
1 7 ~ PAROQUIA' DE SANTO ANTONIO

do por madeira. Tambem foi totalmente renovada a


cobertura, em que devia assentar o telhado, por se
encontrar bastante danificada. Fez-se a substituição de
toda a telha de tipo antigo, por outra do moderno
modelo chamado maselhês. Era este o melhoramento
que o templo mais urgentemente reclamava.
A capela-mór desta Igreja, apesar da sua notavel
elegancia e bem equilibradas proporções, apresentava
um espectaculo desolador. As suas paredes laterais
tinham sido inteiramente cobertas, ha cerca de oitenta
anos, por um madeiramento, com colunas e ornamenta-
ções em obra d e talha, trazido da antiga igreja de São
Francisco, que é um trabalho singelo mas de aprimora-
do bom gosto. Nele se destacavam, em saliente relevo,
as superficies planas, que deveriam ser ocupadas por
seis quadros ou télas, representando alguns dos princi-
pais episodios da vida do glorioso patrono deste
templo. Todo esse revestimeiito das paredes tinha sido
coberto com uma ligeira e imperfeita pintura, a que o
tempo se encarregou de dar uma feição de velhice e de
abandono, que impressionava muito desagradavelmente
o visitante. O altar-mór, que talvez depois da sua cons-
trução, não tivera sido ainda renovado, na sua pintura e
douramento, não apresentava um aspecto menos triste e
desconsolador.
Estavam, pois, a capela-mór e seu altar a exigir
imediatas e importantes reparações. Depois da recons-
trução do tecto, foi este o primeiro trabalho a realisar.
A obra de talha teve que ser largamente reparada, pois
era já bem adiantado o seu estado de ruina. Procedeu-
se em seguida á pintura e douramento das paredes, d o
tecto, do altar e do camarim ou trono. Os quadros a
GRANDES REPARAÇÕBS NA IGREJA 179

oleo que ornam esta capela são devidos ao pincel do


distinto artista Luis Antonio Bernes. Simultaneamente
se retocaram a imagem grande de Santo Antonio e as
belas esculturas representando S. Luis d e Gonzaga e S.
João Francisco de Regis, que ocupam os nichos superio-
res do altar-mór. Tamhem se fez o completo assoalha-
mento da capela. Tudo isso foi um trabalho demorado e
dispendioso, mas que transformou inteiramente esta
capela, tornando-a objecto de admiração e apreço das
pessoas que a visitam.
As obras de pintura e decoração a realisar no tecto
do corpo principal da Igreja foram muito importantes e
de execução bastante dificil, não só pela extraordinaria
altura das paredes e custosa armação dos respectivos
andaimes, mas ainda pelo incomodo e risco, que aos
artifices pintores oferecia a realisação desse trabalho. No
centro dessas ornamentações se colocou uma grande
téla representando o Imaculado Coração de Maria.
As chamadas abocas de arco, da capela-mór e das
do Santissimo Sacramento e de Nossa Senhora d e Gua-
dalupe receberam a indispensavel pintura com uma
excelente e original ornamentação. Os antigos quadros
a oleo da Via Sacra, que ornavam as paredes da Igreja,
foram na sua maioria substituidos e alguns restaurados,
senda tambem convenientemente reparadas as moldu-
ras em talha dourada que os circundavam. Estas rélas,
bem como a do tecto, são igualmente da autoria d o
pintor Luis Bernes.
Para maior comodidade dos fieis e indispensavel
colocação d e bancadas na Igreja, tornou-se imperiosa a
necessidade de se colocarem a uma mais elevada altura
as tribunas conhecidas pelo nome de Mesas dos Irmãos,
I 80 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

contribuindo tambem este melhoramento para dar um


aspecto mais agradavel e atraente ao interior do templo.
Essas tribunas, que se encontravam em grande ruina,
foram artisticamente restauradas. O levantamento das
Mesas obrigou, para manter-se a harmonia do conjunto,
a levantar-se tambem o pulpito um metro acima do
lugar em que se achava.
O belo guarda-vento da porta principal desta
Igreja, em madeira d e nogueira, foi desenhado e execu-
tada pelo habil operario desta freguesia, João Rodrigues
Pimenta, tendo sido todas as despezas, com os materiais
empregados e respectiva mão de obra, custeadas pelo
proprietario João Gomes de Gouveia, do sitio da Cha-
morra, que é o paroquiano que mais larga e generosa.
mente tem contribuido para os grandes melhoramentos
realisados no templo desta paroquia, sendo-nos muito
grato deixar aqui consignado o seu nome e o protesto
do nosso reconhecimento.
H a muito que se impunha a necessidade da adapta-
ção duma das dependencias da Igreja para a instalação
do respectivo arquivo paroquial, que contava alguns
centenares de volumes, que se achavam dispersos e mal
acondicionados. Numa sala da antiga residencia dos
curas, devidamente acomodada a esse fim e comunican-
d o interíormente com a sacristia, se fez a arrecadação,
em condições d e segurança e de boa coaservação, de
todos os livros, documentos e papeis existentes nesta
Igreja, servindo tambem esta instalação para o funcio-
namento dos diverços servisos do cartorio paroquial.
Tornava-se urgente a instalação da luz electrica,
não só para ilumiar convenientemente o templo e dar
maior brilhantismo aos actos do culto, mas ainda para
evitar que as instalações provisorias daquela luz, feitas
por ocasião das principais solenidades, fossem daiiifi-
car os belos e custosos trabalhos de decoração, realisa-
dos em todo o interior da igreja, como frequentemente
acontecia. Além dos fócos electricos distribuidos pelas
paredes, altares, boca do camarim, Mesas dos Irmãos
etc., tornou-se indispensavel a colocação d e tres lustres
na capela-mór e oito no corpo principal da Igreja, além
do graude candelabro central, de 30 lumes, o que
perfaz uma totalidade de lampadas superior a duzentas.
O candelabro e mais lustres, com excepção dos tres da
capela-mór, foram construidos em bela madeira d e talha
e executados pelo já referido artifice João Rodrigues
Pimenta. Destinam-se a ser dourados.
Aí ficam sumariamente enumerados os principais
trabalhos de reparação e decoração executados nesta
Igreja Paroquial, não se fazendo menção pormenorisiada
d e outras obras, tamhem de relativa importancia, para
não dar a este capitulo uma demasiada extensão. No
respectivo arquivo paroquial encontram-se minuciosa-
mente descritos todos os trabalhos até agora realisados.
Antes de terminar este capitulo, queremos deixar
aqui assinalados os bons serviços, que o pintor de arte
Luis Antonio Bernes prestou a esta Igreja Paroquial
com a factura dos quadros que revestem a capela-mór e
das télas que guarnecem o tecto e as paredes do templo,
produzindo trabalhos que teem sido sobremaneira apre-
ciados por pessoas competentes e que atestarão aos viu-
douros os notaveis recursos de que dispõe o distinto
artista. O seu nome ficará a par do pintor Nicolau Fer-
reira, que pelos fins do seculo XVII deixou varios oleos a
adornar algumas igrejas desta diocese.
I 82 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

E para concluir este pequeno capitulo, é-nos extre-


mamente grato fazer uma especial e bem merecida refe-
rencia aos devotados esforços e acendrado zelo do
actual cura desta paroquia, rev.O padre João Prudencicr
da Costa, empregados para a execução de todos os tra-
balhos realisados no templo, não só na propaganda feita
nas praticas e homilias, por meio da sua palavra presti-
giosa, mas tambem na maneira de adquirir os indispen-
saveis donativos, ficando o seu nome indissolifvelmente
ligado á realisação d e tão importantes e dispendiosas
obras.
Não nos referimos neste logar á reconstrução das
torres e colocação do relogio, porque delas nos ocupa-
remos em capitulo especial.
Campanarios
e Relogio d a Igreja
Paroquial

Como fica dito em outro lugar, a construção da


actual Igreja Paroquial foi dada por terminada em 1789,
embora ainda por alguns anos continuassem os traba-
lhos da ornamentação interior, e restassem tambem por
concluir os campanarios e outras dependencias do
mesmo templo. Decorridos vinte e quatro anos, em
1813, *se formaram os telheiros das torres em cada
uma das quais se acrescentaram sete palmos,, segundo
se lê num antigo livro da Fabrica Paroquial.
São passados setenta anos depois de realisadas
estas ultimas obras e só então se procedeu a definitiva
conclusão dos campanarios com a construção de dois
elegantes corucheus, que deram ao conjunto da fronta-
ria do edificio um aspecto cheio de grandeza e harmo-
nia. Deve-se este importante melhoramento ao deputado
pela Madeira conego Feliciano João Teixeira, que a
pedido do seu proximo parente e amigo padre Teodo-
ro Urbano Ferreira Pita, então paroco desta freguesia,
conseguiu do governo da metropole a verba necessaria
para custear aquela construção. A respectiva dotação
184 PAROQCIA DE SANTO ANTONIO

orçamental é de 1880, mas sómente se realisou o aca-


bamento das torres, com o levantamento das duas pira-
mides, no ano d e 1883. Os trabalhos de edificação, que
correram sob a gerencia e fiscalisaqão da repartição de
obras publicas distritais, não revestiram os indispensa-
veis requisitos de competencia e de esmerado cuidado
em obras desta natureza, e desde logo se conjecturou
que aquela eonstrução não poderia ter uma existencia
muito duradoura. A derrocada deu-se dezaseis anos
depois, no dia 8 de Março d e 1899,tendo em golpe de
vento de maior violencia lançado á terra o corucheu do
lado sul. Houve necessidade d e apear-se o do lado
norte, por não oferecer seguras garantias d e resis-
teiicia.
O actual paroco desta freguesia, ao iniciar as
grandes reparações e melhoramentos realisados na
Igreja Paroquial, concebera tambem o projecto da
reconstrução dos campanarios, mas reservava essa obra
para o final acabamento dos trabalhos, considerando-a
como o termo e remate de todo o seu largo empreendi-
mento.
Um facto inesperado veiu, porém, apressar a reali-
sação do projectado plano: a espoiitanea e generosa
oferta dum magnifico relogio feita ao respectivo paroco
para ser colocado na Igreja Paroquial. O Diario da Ala-
deira, de 27 de Maio de 1928, publicou ácerca deste
assunto um excelente artigo, que, áparte as elogiosas
referencias dirigidas ao autor deste opusculo, coilsubs-
tancia, com inteira exactidão, o pensamento e intenções
do oferente e põe em saliente e merecido relevo o acto
de benemerencia e generosidade, que ele tão espontanea
e desinteressadamente praticou. Estas modestas pagiiias
CARIPANARIOS E RELOGIO DA IGREJA PAROQUIAL 185

ficam sobremaneira honradas com a inserçao integral


desse artigo, que vinha acompanhado dos retratos d e
Mr. EIenrique Hinton e do padre Fernando da Silva, e
de mais tres gravuras representando o frontespicio da
Igreja e d e dois diversos aspectos do magiiifico relogio.

«O Rev.' padre Fernando Augusto da Silva, sacer-


dote tão digno quanto ilustrado e cujos meritos morais
e de espirito são sobejamente conhecidos, é, como
tambem se sabe, um paroco modelar. Na qualidade de
vigario da freguesia de Santo Antonio, uma das mais
vastas e importantes desta ilha, tem o padre Fernando
da Silva demoiistrado um acendrado e persistente zelo,
não só pelo que toca ao dominio puramente espiritual,
como ainda no que respeita á conservação e melhora-
mentos materiais do templo confiado a sua guarda, tare-
fa em que tem sido dedicadamente ajudado por varios
dos seus paroquianos.
.Entre os melhoramentos ainda não realisados,
impunha-se-lhe, com a reconstrução das torres da Igreja
paroquial, a colocação, ali, dum relogio de mostrador
bem visivel ao longe e com carrilhtío que bate-<se as
horas, levando a indispensavel informação do tempb
até aos confins da povoação.
a 0 considerado e generoso industrial madeirense
Mr. Harry Hiaton, amigo e admirador do caracter,
talento e zelo religioso do padre Fernando da Silva,
conhecendo-lhe as dificuldades e desejos referentes a
esta necessidade da paroquia, encomendou, em Londres,
o fabrico dum grande relogio,do mais moderno siste-
ma e de sonoros0 carrilhão dotado com as mesmas
notas e timbres dos famosos sinos da Catedral de Wes-
I 86 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

tminster, relogio, ha semanas entre n6s, como foi noti-


ciado, e já oferecido Aquele ilustre sacerdote com desti-
no á sua Igreja.
< A este facto se reterem as estampas que ornam a
presente pagina.
<Os quatro mostradores, com ponteiros de horas e
miniitos, teem dois metros de diametro e são de grosso
vidro translucido com as letras romanas a negro, per-
mitindo que, por iluminação interior, as horas sejam
lidas, a uma grandissima distancia.
«As duas torres vão ser reconstruidas em superiores
condições d e segurança e estética, sendo instalado o
relogio na que fica situada ao lado norte.
.Comemorando o facto, será colocada na igreja uma
placa metalica com os seguintes dizeres em latim:

HOC HOROLOGIVivI
ECCLESIAE SANCTI ANTONII APVD
PVNCHALENSES, AMICITIAE ET PIETATIS
DOCVMENTVM ERGA R. P. FERDINANDVM
AVGVSTVM DA SILVA, PER MVLTOS
ANNOS IBIDERI PAROCHVM,
D. D. HENRICVS HINTON, A. S. N.
MDCCCCXXVIII

((Ao povo de Santo Antonio, na pessoa do seu mui


ilustre e virtuoso paroco, enviamos, por tão util e valio-
sa oferta, os nossos mais intimos e calorosos parabens~.
Aquela inesperada oferta criou a necessidade da
imediata reconstrução das torres, tendo-se nomeado
uma comissão, composta do respectivo vigario e dos
paroquianos Frederico da Silva, João Fernandes da
Silva, José Pedro Marques e Manuel da Corte, destina-
da a promover a realisação dessa obra, adquirindo os
indispensaveis donativos e superinteiideildo lios diver-
sos trabalhos de construção.
Do respectivo projecto se encarregou o habil dese-
nhador Fernando Augusto Camara, produzindo um tra-
balho cumpleto no seu genero, que foi devidamente
apreciado e elogiado por pessoas da maior competencia
no assunto. Em atenção ás velhas e afectuosas relações
de amisade com o paroco desta freguesia, de quem foi
antigo e distinto aluno, não quis Fernando Camara rece-
ber qualquer remuneração por esse importante trabalho,
sendo-nos grato deixar aqui consignado esse facto com
a apresentação dos nossos melhores agradecimentos.
A força imperiosa das circunstancias obrigou a intro-
duzir-se algumas modificações no primitivo projecto,
tendo neste particular, como em outros diversos deta-
lhes de construção, prestado bons e desinteressados
serviços o membro da comissào José Pedro Marques,
que é um habil e inteligente mestre dc obras.
Fez-se um concurso, por meio d e propostas em
documentos cerrados, para os trabalhos da edificação
das piramides e definitivo acabamento dos campanarios,
sendo adjudicatario o conhecido empreiteiro José da
Corte, do sitio dos Alamos e iniciando-se as respectivas
obras no dia g do mês de hIaio de 1928. Na altura
em que traçamos estas linhas, fins da Fevereiro d e
1929, vão aqueles trabalhos em via de conclusão, após
a qual se procederá imediatamente á montagem do
magnifico relogio e seus acessorios. Deve-se atribuir a
demora havida a motivos estranhos á vontade do em-
preiteiro e dos membros da comissão.
Centenario de Santo
Antonio

Lançado o pensamento da celebrasão do setimo


centenario do nascimento do glorioso Santo Antonio e
definitivamente resolvida a sua realisação em diversas
terras do país, não podia esta freguesia, que tinha o
nome do grande thaumaturgo, ficar indiferente á cor-
rente de vivo entusiasmo que aquela ideia despertara
em muitos espiritos.
E soube esta paroquia corresponder condignamen-
te ao apelo feito aos catolicos portugueses, tendo os
festejos comemorativos do centenario atingido aqui um
brilhantismo fóra do vulgar e que dificilmente poderá
ser excedido e mesmo igualado. A alma dessa coniemo-
ração festiva foi o padre Teodoro João Henriqires, cura
desta freguesia, que pôs incondicionalmente a favor
dela toda a sua dedicação e todo o seu entusias-
mo, ainda á custa da sua saude, do seu bem estar e dos
seus parcos haveres, não contando os grandes dissabo-
res e contratempos com que teve de lutar a sua energi-
ca vontade e de que tudo soube vencer triunfante-
mente..
A comissão organisada para levar a efeito a cele-
bração do centenario ficou assim constituida: presidente
CENTENARIO DE SANTO ANTONIO 189

o paroco Teodoro Urbano Ferreira Pita, vice-presidente


barão Charles Van Beneden, secretario o professor
Edmundo Alberto Ubaldino da Silva, tesoureiro o cura
Teodoro João Henriques e vogais Mauricio Carlos de
Castelo Branco, medico-cirurgião Antonio Alfredo da
Silva Barreto, Teodoro João Henriques, Augusto Ernes-
to Afonso, João Maria Henriques, Francisco Fernandes
Camacho, João Rodrigues de Aguiar e João Joaquim de
Oliveira Rodrigues.
Nomeada a comissão, iniciou desde logo os seus
trabalhos, organisando primeiramente o programa dos
diversos festejos, que teve o mais cabal ciimprimento
em todos os seus numeros. É certo que surgiram
grandes dificuldades e que escassearam os recursos
pecuniarios para se realisar integralmente utn vasto e
aparatoso programa em meio tão limitado, mas a boa
vontade de todos os membros da comissão e de modo
especial a dedicação sem limites do padre Teodoro
João Henriques souberam conjurar eficazmente todos
os obstaculos e o programa cumpriu-se ainda nos seus
mais minuciosos detalhes. Damol-o em seguida:
cc~rogrammados festejos do 7.0 centenario do Glo-
rioso Thaumaturgo portugues Santo Antonio de Lisboa,
na freguesia de Santo Antonio do Futzchal.
«No dia ZI de Agosto-1.0 dia-%Pelas 3 horas da
tarde o ex."' e r e ~ d . ~snr.
' conego deão da Sé Cáthe-
dral e governador do Bispado, doutor João Joaquim
Pinto, lançará a benção solemne á imagcm do glorioso
Santo Antonio, tendo logar essa ceremonia na egreja de
São João Evangelista, vulgo Collegio, sendo cantado em
seguida por um coro de creanças o hymno dedicado ao
centenario, composição do distincto poeta revd."' padre
I90 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Manuel Nunes. Depois sahirá a procissão conduzindo a


veneranda imagem para a egreja de Santo Antonio a fim
de ser collocada no frontespicio, como inauguração das
festas ailtonianas nesta ilha.
e 0 itinerario da procissão: rua da Carreira, Ponte
d e São João, Cabouqueira, Ivlaravilhas, Pico de S ~ Q
João e Caminho de Santo Antonio.
«Para acompanhar o prestito religioso estão convi-
dadas todas as confrarias e irmandades deste concelho,
taes como: confrarias do Santissimo Sacramento da Sé,
São Pedro, Santa filaria Maior, São Gonçalo, Nossa Se-
nhora do Monte, Santa Luzia, Silo Roque e São Marti-
nho; as da ordem de São Francisco, de Nossa Senhora
d o Evlonte d o Carmo, Nossa Senhora d o Monte, Nossa
Senhora da Soledade das egrejas das Mercês e de Santa
Clara, São Pedro Gonçalves Telmo (Corpo Santo), São
Gonçalo, Santa Luzia, São Roque e São Martinho.
*Os caminhos e ruas por onde vae passar a procisão
vão ser enfeitados com flores e bandeiras.
*Chegado que seja o prestito á egreja d e Santo
Antonio será collocada a imagem no seu respectivo
nicho; e nessa occasião subirão aos ares muitas giran-
dolas d e foguetes ao som dos repiques do sinos e do hyno
nacional e em seguida haverá um sermão adequado ás
festas deste dia.
«Apoz as festas do templo, será aberto no adro um
esplei~didobazar de mimosas prendas offerecidas pelas
damas da cidade e dos campos, cujo producto reverterá
a beneficio das despezas a fazer com os festejos.
*Haverá musica no adro, illuminações e fogos d e
artificio.
«A egreja e os arredores estarão lindamente deco-
CENTENARIO DE SANTO ANTONIO I9I

rados com arcos de buxo, flores, balões, bandeiras e


legendas allusivas aos festejos.
neste mesmo dia, de tarde, varios cavalheiros irão
ao adro da egreja offerecer objectos d e vestuario a
vinte e quatro pobres d'ambos os sexos, que já se
acham designados, em honra do grande Santo Anto-
nio.
«Dia 12-2.0 h.-Continúam os bazares de pren-
das, havendo musica pelas 3 horas d a tarde.
UA'S5 horas haverá vesperas cantadas, com o San-
tissimo exposto solemnemeilte e em seguida sermão. A'
noite iluminações e musica.
$Dia 13-3.0 dia.-Tudo como no dia antecedente,
tendo logar além disso a instituição da Obra Pia deno-
minada Pão de Santo Antonio, com o fim de soccorrer
os pobres.
<<Dia14-4.0 da.-Vespera da grande festa.-Do
meio dia em deante tocarão 3 musicas no adro e nas
immediações, com bazares e grande quantidade de
foguetes e salvas.
*Pelas 5 horas haverá, como nos dias anteriores,
vesperas solemnes com o Santissimo exposto e sermão.
«A' noite vistosas illuminações em todo o caminho
por onde tem de passar a procissão do dia 15 e grande
quantidade d e fogos de artificio, feitos pelos melhores
pyrothechnicos do concelho; que durargo até altas horas
da note.
#Dia 15.-Além das musicas, bazares e todo o mais
dos dias anteriores, haverá missa solemnissima a
grande instrumental com 30 instrumentos e outras tantas
vozes.
«O sermão ao Evangelho é do distincto orador
I92 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

sagrado padre João Batista. A' festa haverá exposição


do Santissimo em um magnifico throno.
De tarde pelas 5 haras !iaverá sermão antes da
procissão, para a qual estão convidadas as auctoridades
ecclesiasticas, civis a militares, varias corporações, as
redacções dos jornaes, <Diario d e Noticias», <Diario do
Comerciow e .Verdade».
Nesta procissão será conduzida a imagem grande
de Santo Antonio.
A procissão será o rcmate da festa religiosa, conti-
nuando porém as inusicas, bazares e foguetes até á
noite,.

Em conformidade com o programa organisado pela


comissão promotora da celebração do centenario, deram-
se inicio, no dia I I de Agosto d e 1895,aos brilhantes fes-
tejos destinados a comemorar aquele acontecimento e
que revestiram um esplendor e uma imponencia verda-
deiramente extraordiiiarios.
No frontespicio da igreja paroquial existia um
nicho, que era da construção primitiva e que havia sido
destinado á colocação duma estatua d o padroeiro. Sí,
passado um seculo é que esse nicho ia ser ocupado por
uma imagem do patrono desta freguesia, e foi a ideia
da celebração do centenario do seu nascimento, que fez
preencher aquela grande lacuna.
Adquirida uma imagem d e Santo Antonio, que se
acomodasse ás dimensões e forma do nicho, procedeu-
se á sua benção, que foi lançada na igreja do Colegio
pelo deão e governador do bispado dr. João Joaquim
Pinto, no domingo I I de Agosto, pelas 4 horas da
h ~ d e ,com uma numerosa concorrencia de fleis das
CENTENARIO DE SANTO ANTONIO 193

diversas freguesias do concelho. Por esta ocasião, um


coro d e crianqas cantou o hino do ceiitenario, composto
expressamente pelo distinto poeta o rev.O padre Manuel
Nunes e que desperto11 um vivo entusiasmo em todos os
assistentes. Aqui deixamos arquivada a letra desse hino:

Gloria a Deus que dos Céos manifesta


Nos seus Santos poder sem egual !. . .
E lá d'essa mansão sempre em festa
Nos inflama em amor divinal.
ESTRIBILHO

Salve, Salve, meu bom Santo Antonio!


Thaumaturgo de fama immortal,
Luz do mundo, nobreza d e Padua,
Honra e gloria do meu Portugal!. . .

Dos antigos leaes portuguezes


Amostremos as crenças de fé;
Pois, cantando de Antonio as virtudes,
Celebramos as glorias da f6,
111

Grande Santo ! d e lingua bemdita


Vão-lhe os peixes o verbo escutar !. ..
E tia tumba um cadaver se agita
Quando o pae vem da morte salvar.

Entre o povo creado c nascido,


Pelo povo a lidar no Senhor,
43
I94 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

É do povo exaltado e querido


Com extremos de affecto e de amor,

Eia pois, portuguezes, ávante!. .


Seja a festa uma excelsa canção
Pelo Santo que é gloria da Patriri,
Por Antonio que é nosso irmão.
Organisou-se em seguida o prestito religioso, que
devia conduzir processiooalmente a imagem e que per-
correu o itinerario indicado no programa-
Nele se encorporaram, além das irmandades da pa-
roquia, varias confrarias de outras freguesias e muitos
eclesiasticos, fechando a procissão a filarmonica aRe-
creio Artistico-Funchalensen. No longo percurso, desde
o Largo do Colegio até o adro da Igreja de Santa Anto-
nio, era enorme a afluencia de pessoas de todas as
camadas sociais, que acorriam perssurosamente de toda
a parte a ver desfilar o extenso e imponente cortcjo.
O caminho de Santo Antonio, em quasi toda a sua
extensão, achava-se vistosamente engalanado com ban-
deiras e arcos de verduras e flores, sobresaindo a orna-
mentação do pequeno largo que defronta a quinta dos
Cedros, residencia do barão de Van Beneden. A partir,
porém,da Quinta do Leme C que a decoração da estra-
da revestia maior brilho pela profusão das bandeiras e
arcos ornamentados a buxo, flores e trofeus, o que igu-
almente se via em todos os caminhos, que deviam ser
percorridos pela procissão do dia I 5 e que constituis o
encerramento dos festejos.
Ao chegar o prestito religioso á igreja paroquial e
ali recebida solenememte a imagem de Santo Antonio,
CENTENARIO DE SANTO ANTONIO 195

foi esta colocada no seu respectivo nicho, no alto da


fachada do majestoso templo, sendo o seu aparecimen-
to saudado com canticos entusiasticos, executados por
um caro d e crianças e tambem pelo hino nacional toca-
do por uma filarmonica.
A igreja, que se achava rica e artisticamente deco-
rada, foi visitada por uma enorme multidão de pessoas,
que para ali convergiam, particularmente atraidas pelo
desejo de admirar a bela e majestosa imagem d e Santo
Antonio, que se venera no altar-mór. Esta imagem, de
proporções muito superiores á estatura normal dum
homem e que vista de perto apresenta formas agiganta-
das, foi apeada do lugar que habitualmente ocupa em
posição sobranceira ao altar e colocada na capela-m6r
junto da escadaria do mesmo altar, para mais facilmente
ser admirada e venerada pelos inumeros fieis que dela
ininterruptamente se acercavam. É sem duvida uma
bem esculturada imagem e que se afirma ter vindo
duma cidade de Hespanha pelos anos de I 7 0 5 e que
mede dois metros e meio de altura.
Os brilhantes festejos da celebração do centenario,
como atrás fica dito, iniciaram-se no domingo 1 1 de
Agosto de 1 8 9 5 e terminaram na quinta-feira seguinte,
dia em que prefazia setecentos anos que o grande taii-
maturgo nascera na cidade de Lisboa.
Na segunda, terça e quarta-feira houve ern'todos
os dias missa solene a grande instrumental'e sermão ao
Evangelho, tendo prégado os reverendos padres João
José Correia, no primeiro e terceiro dias, e o padre João
Mauricio Henriques, no segundo dia. Em todos os dias
cantaram-se de tarde Vesperas solenes, em que foram
oradores os reverendos padres Jacintho da Conceição
196 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Nunes, Antonio Fernaiides Mendes e João Joaquim de


Carvalho. Todos estes actos religiosos foram imensa-
mente concorridos e revestiram uma particular impo-
nencia.
Fbra do templo, os festejos, que constaram de mu-
sicas, iluminações e fógos de artificio, foram tambem
brilhantissimos e atrairam notavel coilcorrencia não só
da paroquia como d e todas as freguesias do distrito.
A iluminação, em toda a estrada que devia ser per-
rida pela procissão do dia I 5 , merece referencia espe-
cial pela profusão de lumes e belissimo efeito que pro-
duzia. Chamava particularmente a atenção de todos o
bazar d e prendas, instalado no adro, pelo valor e varie-
dade dos obiectos que nele figuravam e que tinham
sido oferecidos pelas damas funchalenses.
Todos estes festejos e em especial as iluminações e
fógos de artificio atingiram na vespera da grande sole-
nidade o maior brilhantismo e a maior imponencia, com-
pativeis com as circunstancias e os recursos de que se
podia dispor em um meio tào acanhado. A coiicorren-
cia, como dissémos já, foi enorme e cresceu de dia para
dia, sendo nos dias 14 e 15, verdadeiramente extraordi-
naria, acudindo muita gente de todas as freguesias da
ilha. A novidade dos festejos da celebração dum cente-
iiario, a sua duração desde o dia I I a 15, o brilhantismo
fóra do vulgar que revestiram, a imponeilcia da procis-
são conduzibdo a gigantesca e majestosa imagem do
padroeiro, foram outros tantos motivos que considera-
velmente concorreram para a desusada afluencia de
povo, que em todos os dias se notou, e para o vivo en-
tusiasmo que despertou em todos os espiritos.
No dia 15 de Agosto, que era o aniversario do
CENTENARIO DE SANTO ANTONIO 197

nascimento do ilustre taumaturgo, celebrou-se na igreja


paroquial a grande festividade religiosa, que juntamente
com a procissão que se realisou na tarde desse dia,
constituiram o encerramento de todos os festejos. A'
solenidade da manhã imprimiu um desusado brilho a
grande profusão de lumes, a aparatosa ornamentação d o
templo, a grande orquestra e o numero consideravel d e
vozes que formavam o côro, servindo a tudo de fecho e
remate o notavel discurso que ao evangelho proferiu o
padre João Batista e que produziu 110 auditorio as mais
gratas e belas impressões.
De todos os numeros do programa foi indubitavel-
mente a procissão o que mais eiltusiastico alvoroço des-
pertou em todos os que se tinham associado aos feste-
jos do centenario. A grande imagem do santo padroeiro
era o maior atrativo desse imponente prestito religioso.
Julgou-se que o seu peso e extraordinario tamanho não
permitiriam a sua facil condução num andôr, que pro-
positadamente se construira para tal fim. Não falharam,
porém, as previsões dos que se abalançaram a condu-
zir processionalmente a estatua do patrono desta fregue-
sia num tão longo e dificil percurso. Dezaseis sacerdo-
tes revestidos d e sobrepelizes conduziam ás mãos, num
enorme andôr ricamente ornamentado, a imagem colos-
sal do glorioso Santo Antonio de Lisboa. Foi indiscriti-
vel o entusiasmo que se apossou das grandes massas de
povo que se estendiam ao longo da estrada. No meio do
mais profundo respeito e do mais religioso acatamento,
não se podiam conter as vozes de admiração e as excla-
mações de surpreza, á vista de tão belo e imprevisto
espectaculo.
Ao sair a procissão, prégou eioquentemeilto o
198 PAROOUIA DE S.%NTO ANTONIO

padre Manuel Nunes. O cortejo abria por um numeroso


grupo de crianças conduzirido pendões e outros emble-
mas religiosos, seguindo-se-lhe uma filarmonica. Iam
após muitas irmandades da paroquia e das freguesias
visinhas e no centro duma delas ostentava-se majestosa
a imagem d e Santo Antonio. Em seguida ao palio cami-
nhava uma filarmonica, fechando o prestito uma força
de caçadores 12 comandada por um alferes.
-O pequeno largo, juiito do adro da Igreja Paro-
quial, comunicava directamente com a ponte de Santo
Antonio por meio duma estreita e tortuosa vereda,
sendo esta convenientemente alargada e melhorada
poucos dias antes da celebração das festas, servindo
para a circulação da enorme afluencia de pessoas e
tambem para a passagem do imponente prestito religio-
so. Era um melhoramento ha muito reclamado, tendo
sido dado á nova estrada o nome de Luís Retencourt
hliranda, então secretario da Camara Municipal do
Funchal, porque aos seus diligentes esforços se ficou
devendo a realisação desse importante melhoramento.
-Por ocasião das festas centenarias, criou-se na
Igreja Paroquial desta freguesia a obra chamada d o Prio
de Snuto A~ztonio, bastante conhecida em varios países
estrangeiros, que se destina a recolher doilativos para
os pobres e que ainda aqui perdura, destribuindo em
dias determinados do ano esmolas a algumas dezenas de
indigentes.
--Em belas estampas, de dois diferentes formatos,
se reprodiiziu fielmente a grande imagem do insigne
taumaturgo que se venera na Igreja Paroquial desta fre-
guesia. Esses trabalhos, que foram muito apreciados e
tiveram uma larga difusão, são duas gravuras abertas
CENTENARIO DE SANTO ANTONIO 1 99

em madeira, devidas ao buril do distinto artísta madei-


rense Luís Antonio Bcrnes. No verso da estampa d e
maior formato, se encontra, em quadras ligeiras e de
feição acentuadamente popular, uma resumida vida do
santo, escrita pelo conhecido poeta Mauricio Castelo
Branco, que então residia nesta paroquia.
Os jornais dão-nos a noticia de que, na Italia, já se
fazem preparativos para a celebração do centenario da
morte d e Santo Antonio, que ocorre no proximo ano de
1931.Na cidade de Padua, onde morreu e jaz sepultado
na suntuosa basilica do seu nome, prometem ser extra-
ordinariamente brilhantes essas comemorações centena-
rias. É de presumir que esta freguesia d e Santo Antonio
não fiqiie indiferente a esse movimento, que se vai já
despertando em diversas cidades italianas.
Casa d e S a u d e do
Trapiche

Pertencentes ao morgadío da familia Gouveia


Rego, existiam uns vastos terrenos no sitio do Trapiche
desta freguesia, onde fizeram levantar uma casa solaren-
ga de campo, cuja construção deve remontar á primei-
ra metade d o scculo XVIII. Em 1791era administrador
do vinculo o capitão-mór Antonio Francisco de Gouveia
Rego, que naquele ano pretendeu cdificar a capela ali
existente, mas que súmente foi construida pelo seu filho e
sucessor o sargento-mór João Antonio de Gouveia Rego
no ano d e 1814, como mais largamente se pode vêr no
capitulo intitulado Cnpela de São João e Sanbalza. Aquela
casa, com os jardins, passeios e arvoredos que a circun-
davam, transformou-se então numa aprazivel e confor-
tavel vivenda, onde os seus proprietarios passavam a
epoca estival, dando ali concorridas e aparatosas festas.
A sua posse trausmitiu-se ao morgado Xlaauel d e
Gouveia Rego e deste a sua filha D. Maria Paula Kni-
giofer Rego, senhora de aprimorada cultura e de pere-
grinas virtudes, ultima representante desta instituição
vincular, que faleceu no Funchal no dia I d e Junho de
1922. A quinta do Trapiche foi doada pela sua ilustre
proprietaria ao reverendo monsenhor XIanuel Joaquim
CASA DE SAUDE DO TRAPICHE 20 I

de Paiva e destinada a acudir aos encargos gerais da


D i ~ c e s edo Funchal. Ali esteve provisoriamente instala-
do o Seminario Diocesauo no ano lectivo de 1917 a 1918.
E hoje acham-se nela funcionando as diversas dependen-
cias da Casa d e Saude do Trapiche, dirigida pelos bene-
meritos e i~icansaveisirmãos de Sao João d e Deus.
No «Eluciciario Madeirense, inserimos uma noticia
ácerca do Manicomio Camara Pestana, fazendo sentir
que as suas instalaç6es se iam tornando insuficientes
para o numero sempre crescente de alienados, a que
ora indispensavel dar conveniente hospitalisação. Impu-
nha-se imperiosamente o seu desdobramento, criando-se
um manicomio destinado sómeate a homens e aplican-
do-se a casa da Quinta Rochedo ao tratamento exclusi-
vo de mulheres. Assim veiu acontecer alguns anos mais
tarde.

A ideia do estabelecimento dum hospital para alie-


nados, nas casas do Trapiche, C anterior á fundação do
kIaiiicomio Camara Pestana. Essa concepção partiu do
bispo diocesano I). Manuel Agostinho Barreto, que
empregou os mais diligentes e aturados esforços para a
sua realisação, conseguindo que a proprietaria fizesse a
cedencia da quinta destinada áqueie fim e insistindo
junto dos irmãos de São João d e Deus para que estes
tomassem a direcção do Manicomio a fundar. As suas
diligencias não foram então coroadas d e bom exito,
tendo surgido graves dificuldades que não poderam ser
vencidas. Convém ficar bem acei-itúado que desejou ar-
dentemente, e nesse sentido trabalhou com a maior
dedicação e entusiasmo, dotar este arquipelago com
um hospital modelar de alienados, sendo este mais um
202 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

titulo de gloria a enobrecer as suas eminentes qualida-


des de benemerito e apostoliro prelado.
Criou-se o Manicomio Camara Pestana no ano de
1906 e D. Manuel Barreto continuou a julgar necessaria
a fundação do Trapiche, prevendo que num futuro pro-
ximo se tornaria absolutamente indispensavel mais essa
instituição hospitalar. Por essa epoca e talvez ainda
anterior a ela, alguns irmãos d e São João d e Deus, que
por mais duma vez tinham vindo á Madeira fazer pedi-
torios para as obras d e hospitalisação que mantinham
no continente, reconheceram quanto seria util e friitub-
sa a spa acção nesta ilha, atendendo ao numero consi-
deravel de doentes, que precisavam d e ser internados
nas condições exigidas pela sciencia e de harmonia com
os preceitos da verdadeira caridade cristã.
Por 1920 pensou-se na entrega da direcção do
Manicomio Camara Pestana aos irmãos de São João de
Deus, levantando-seP então uma grande celeuma na
imprensa e nas sessões da Junta Geral. No entanto vai
tomando corpo a antiga ideia da fundação do hospital
no Trapiche. Presta-lhe o seu mais incondicional apoio
o prelado diocesano snr. D. Antonio Manuel Pereira
Ribeiro, e a dedicação e o desinteresse do dr. João Fran-
cisco de Almada, conjugados com os bem orieiitados
esforços dalguns irmãos de São João de Deus, fazem o
resto. A obra seria em breve uma palpavel realidade.
Em principios do mês de Junho de 1922 OS irmãos
de São João de Deus ocupam as casas da quinta do Tra-
piche. É uma instalação mais que rudimentar, em que as
dificuldades surgem d e todos os lados, poiido em
grande prova o espirito de abnegação e sacrificio dos
pobres irmãos. A coragem não Ihes falta e logo rece-
CASA DE SAUDE DO TRAPICHE z03

bem alguns poucos doentes, não alienados, desta fre-


guesia. Estava iniciada a sua cruzada de bem fazer.
Os primeiros doentes privados da razão só foram
ali internados em Outubro de 1923. O periodo decorri-
do entre aquelas duas datas foi especialmente consagra-
do a realiiar alguns peditorios por varios pontos da ilha
e á aquisição dos meios indispensaveis para a adapta-
ção do edificio ao fim a que agora se destinava. Uma
parte consideravel da casa solarenga encontrava-se em
estado adiantado de ruina, sendo além disso dificil a sua
acomodação para nela se instalarem, em condições de
segurança, individuos atacados de perturbaç0es mentais.
Tiveram por isso os irmãos que lutar com grandes tra-
balhos e sacrificios, para preparar convenieiltemeilte o
edificio e torna-lo apto para a recepgão dos primeiros
doentes. O seu numero foi aumentando e desde logo se
reconheceu os assinalados e nunca excedidos serviços
que a nova instituição vinha prestar.
Em hIaio de 1924 agitou-se na Junta Geral a
questão da transferencia dos alienados d o hlanicomio
Camara Pestana para a Casa de Saude do Tripiche,
pondo-se em saliente relevo, no seio daquela corpora-
ção, não sómente a insuficiencia da enfermagem, o aca-
nhado das instalações e o tratamento brutal e deshuma-
no prestado aos doentes, mas ainda os escandalos d e
toda a ordem, que se davam no interior daquela Basti-
lha, como então foi chamado á casa de alienados da
Quinta do Rochedo. Impunha-se absolutamente a trans-
ferencia dos doentes para o hospital do Trapiche. O
principal paladino desta ideia foi o dr. Domingos Keis
Costa, que, apoiado pelo presidente da Junta Geral dr.
Vasco Gonçalves Marques e por outros vogais, advogou
'=O4 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

com o m a i ~ rentusiasmo, tanto nas sessões deste corpo


administrativo como na imprensa local, o imediato inter-
namento dos doentes do bIanicomio na Casa d e Saude
dos Irmãos de São João d e Deus. Esta transferencia
deu-se no dia 21 d e Maio de 1924, tendo sido transferi-
dos 38 alienados do sexo masculino da Quinta do Ro-
chedo para a quinta do Trapiche. Estava realisada uma
grande obra d e humanidade.
A inauguração solene deste maniconiio realisou-se
no mês d e Agosto d e 1924 com a assistencia do ilustre
prelado diocesano, provincial da ordem d e São João de
Deus e de outras pessoas de representação social.
Para a manutenção legal d a Casa de Saude d o Tra-
piche constituiu-se uma agremiação, com os seus estatu-
tos aprovados pela autoridade competente, denominada
associação dos Irmãos d e São João d e Deus». Dela foi
director, desde o inicio da fundação hospitalar até o ano
de 1928, o membro da Corporação Manuel Maria Gon-
çalves, que, apesar da simplicidade d o seu trato, desa-
fectada modestia e precaria saude, conseguiu orientar e
levar a cabo aquela obra, que é uma instituição mode-
lar da mais acendrada caridade para com os doentes e
ao mesmo tempo um calvario das mais heroicas virtu-
des por parte dos seus benerneritos e inexcediveis enfer-
meiros.
Despertou-se por toda a parte um vivo entusiasmo
pelos relevantes serviços prestados pela nova casa de
alienados. Vão aparecendo esmolas e donativos, que ali
acorrem levados pelas chamadas romagens. Grupos
muito numerosos d e individuos d e todas as idades,
sexos e condições, formam grandes romarias, que vão
depôr os seus óbulos de dinheiro, de generos alimenti-
CASA DE SAUDE DO TRAPICHE 205

cios e .de objectos de uso domestico de toda a ordem


nas mãos dos dirigentes. Essas romarias tiveram seu
inicio nesta paroquia e aqui prosseguiram por largo
tempo, sendo cspecialmedte dignas de menção as dos
sitios das Casas Proximas, Madaleiia, Preces, Tres Paus
e RoIiqueme, que constituiam extensos cortejos dum
atraente pitoresco, em que o espirito de bem fazer se
casava admiravelmente com a mais interessantq e tipica
originalidade. Outras freguesias tomaram tambem a ini-
ciativa de identicas romarias, com proporções ainda mais
aparatosas, entre as quais sobresairam as do Monte,
São Roque, Camara de Lobos e Estreito:
Dos muitos e importantes melhoramentos, realisa-
dos pelos irmãos de São João de Deus, é forçoso salien-
tar a construção da estrada para automoveis, que pôs a
casa do Trapiche em rapida e directa comunicação com
o sitio do Boliqueme e portanto com a cidade, a ligação
da mesma casa com a rêde geral dos telefones, a canali-
sação de agiias e as obras preparatorias para a edifica-
çião de novos pavilhões, sem contar a adaptação dos
antigos edificios para a instalação do hospital, como já
deixámos acima referido.
O movimento de doentes neste estabelecimento
hospitalar, desde a sua fundação, tem sido o seguinte,
referido a 3 I de Dezembro de cada ano:

I923 em 3 1 de Dezembro existiam 2


1924 » Y, * 59
I925
.
Y a " 79

..
1926 > 87
1927 >> a 88
1928 » w 104
206 P A R O Q U ~ A DE SANTO ANTONIO

Tem esta Casa de Saude, como todas as suas simi-


lares, um serviço especial do culto, de que é director o
capelão privativo do estabelecimento. Apesar da sua
acção religiosa se destinar particularmente ao uso dos
doentes e da comunidade que ali trabalha, teem os
sacerdotes irmãos de São João de Deus tomado parte
nos diversos actos do culto realisados nesta freguesia,
sendo os mais excelentes e desinteressados auxiliares
dos respectivos parocos. Na sua capela administram
prontamente os sacramentos aos fieis que os procuram,
atendem os enfermos nos seus dotnicilios com os socor-
ros espirituais, acompanham ss mortos á sua ultima jazi-
da e prestam na Igreja Paroquial todos os serviços que
Ihes são solicitados. O primeiro capelão foi o padre José
Maria Antunes, que ali serviu desde Fevereiro d e 1923
a Julho d e 1925. NO mês de Agosto do inesmo ano foi
substituido pelo padre Lazaro Ribeiro, que é o actual
capelão em serviço.
A historia desta modelar Casa de Saude, desde a
sua instalação até a actualidade, além do numero
sempre crescente dos seus internados e dos melhora-
mentos materiais que ali se v50 progressivamei~teintro-
duziildo, consiste apenas nesta cousa simplicissima, mas
admiravelinente bela e tambem admiravelmente santa:
sempre o inesmo espirito de coragem, de abnegação e
de sacrificio por parte dos incansaveis enfermeiros,
sempre o tratamento mais assiduo t: mais carinhoso
para com os doentes, sempre o mais desvelado cuidado
pelo seu bem estar material, e isto, tambem sempre,
sem uma fraquesa, sem um desfalecimento, sem um
desanimo, apesar das dificuldades, dos contratempos e
das lutas que é preciso sustentar de quando em quando.
Pessoas mais
Notaveis

Na devotada peregrinação, em que durante alguns


v o s andámos empenhados, recolhendo e pesquisando
os elementos, que pudessem aproveitar ás biografias
dos mais distintos madcirenses, como o atestam as pagi-
nas do Elucihrio e outros escritos nossos, bem poucos
individuos naturais desta freguesia, já falecidos, descobri-
mos que verdadeiramente se tivessem notabilisado em
qualquer rama da chamada actividade humana. Constitui
uma excepção o general João Alfredo d e Faria. E sem o
menor intuito de ofensa ou falta de consideração para
com alguem o dizemos. Vamos, no entanto, fazer
menção das pessoas, que, sendo diplomadas com cursos
superiores ou ocupando uma posição social em desta-
que, teem o direito de ficarem inscritos nestas paginas.
Muitas ornissões porventura s e dargo, devidas á falta
dum mais amplo conhecimento do assunto e nunca a
um fim intencioiial e propositado. Adoptámos, quanto
nos foi. possivel, a ordem cronologica do nascimento,
mencionando primeiramente os mortos e em seguida os
vivos. S5o naturais desta paroquia:
Padre Antonio Fernandes Pimenta. Desempenhou
as funções de cura desta freguesia, no longo periodo de
208 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

1679 a 1700, e nela faleceu a 8 de Julho deste ultimo


ano. Foi o doador das terras do Passal anexo á casa de
residencia do respectivo paroco (Vid. o cap. <Encargos
Pios,).
Padre Pedro Goiiçalves de Aguiar. Teve residencia
habitual nesta paroquia e nela veiu a morrer a 20 de
Setembro de 1722. Foi sepultado na Capela d e Nossa
Senhora d e Guadalupe e nela se vê ainda a pedra tumu-
lar com o respectivo epitafio.
Padre Roque Pereira de Oliveira. Era filho de João
Pereira de Oliveira e de Maria dos Reis. Serviu algumas
vezes d e cura desta freguesia e aqui faleceu a 20 de
Julho d e 1731. '
Padre Rlanuel Pereira de Oliveira. Morreu na cida-
d e do Funchal a 24 d e Novembro d e 1748, mas tinha
moradia nesta paroquia no sitio do Pico do Cardo.
Padre José Gomes Camacho. Era natural desta fre-
guesia e nela residia pelos anos de 1771,mas ignora-se
o ano do seu nascimento e da sua morte.
Padre Manuel João de Gouveia. Sucumbiu, nesta
paroquia, a 18 de Agosto de 1781, vitimado pela elefan-
tíase, dispondo qne fosse sepultado na capela d e Sgo
Lazaro.
Padre Simão Antonio d e Sousa Pereira. Faleceu
nesta paroquia a I j de Abril de 179j e foi sepultado na
igreja do convento das Mercês.
Padre Antonio de Freitas. Morreu nesta freguesia
a 31 de Maio de 1810.
Padre Antonio Joaquim de Oliveira Camacho. Fale-
ceu em Santo Antonio a 7 d e Fevereiro de 1858 e aqui
residiu largos anos.
Padre João Nepumeceno Camacho. Exerceu funçijes
PESSOAS MAIS NOTAVEIS 209

eclesiasticas em diversas paroquias desta Diocese, e


sendo vice-vigario da freguesia dos Canhas, foi ali
apresentado paroco colado no ano de 1840 e na mesma
paroquia faleceu a 15 de Setembro de 1858.
Padre Francisco Antonio de Gouveia. Nasceu no
sitio do Salão a 21 d e Maio de 1793, sendo filho de
Gregorio Antonio de Gouveia e de Maria Quiteria d e
Gouveia. Foi cura desta freguesia desde 1834 até o ano
da sua morte, que ocorreu a 8 de Junho de 1868.
Padre Felix Gomes da Silva. Era filho do capitso
Julião Gomes da Silva e de D. Antonia Pereira e nasceu
no sitio de Santa Quiteria a 2 0 de Novembríj de 1796,
ignorando-se o ano da sua morte.
Padre Valerio Antonio Camacl~o.Nasceu nci sitio
da Levada do Cavaio a 6 de Março de 1799, sendo
filho de Antonio Joaquim Rodrigues e d e Ana Joaquina
Rodrigues. Paroquiou nalgumas freguesias desta ilha.
Morreu na paroquia de Camara de Lobos, onde era vi-
gari» colado desde o ano de 1835, a 8 de Agosto de
1856.
Coilego Joaquiili Gomes da Silva L.ume. Era filho
d e Joaquim Gomcs Lume e de Antonia Alaria, tendo
tiascido no sitio da Quinta das Freiras a 1 5 dc Janeiro
de 1787. Desempenhou cargos eclesiasticos em varias
freguesias e foi capelão do coilveilto de Santa Clara. De
vigario da freguesia de São Podro passou a capitular da
Sé Catedral, tendo sido mestre-escola e provisor do bis-
pado. Morreu na cidade do Funchal a 11 de Junho de
1868.
Medico-cirurgião Antonio Fernandes Teles da
Silva. Nasceu no sitio do Salão a 17 de Junho d e 1818 e
era filho d e Francisco Fernandes Neves e de Antonia
210 PAROQUIA DE SANTO ANTOXIO

Rosa d e Jesus. Concluiu o curso da Escola Medico-Ci-


rurgica do Fuiichal no ano de 1844. Faleceu na fregue-
sia de São Vicente, onde exercia clinica, a 9 de Abril de
1883.
Padre João Fernandes de Freitas. Era filho de
João Fernandes de Freitas e de Maria de Freitas, tendo
nascido no sitio da Madalena a 2 d e Janeiro d e 1822.
Exerceu funçjes paroquiais em diversas freguesias, e
faleceu na de São Roqne, a I7 de Dezembro ae 1893.
Padre JosB Augusto de Freitas. Nasceu no sitio do
Salão a 2 de Setembro de 1822, sendo filho de Antonio
de Freitas e d e Joaquina Rosa. Morreu na freguesia do
Porto da Cruz, corno paroco colado, a 22 de Abril de
1893
Padre Luis Soares d e Ornelas. Era filho de Luís
Soares d e Ornelas e de Antonia Joaquina e nasceu no
sitio d e Santa Quiteria a 24 de Março d e 1823, tendo
falecido na fregucsia da Boaventura a 25 d e Dezembro
d e 1875, sendo ali vigario colado.
João Francisco de Sousa. Era filho de Francisco
Alexandre de Sousa e de Ludovina de Sousa e nasceu
no sitio do Tanque a 1 3 de Junho de 1824. Foi um dis-
tinto funciotiario aduaneiro e poeta d e merecimento,
tendo escrito varias poesias que ficaram dispersas pelos
jornais. No livro de versos aAlbum Madeirense* encon-
tram-se algumas composições suas. Faleceu no Funchal.
Medico-cirurgião Henrique Crawford Rodrigues.
Sendo filho d e Manuel José Rodrigues e de Maria Craw-
ford, nasceu no sitio da Quinta do Leme a 29 de Junho
de 1836. Terminou o curso da Escola Medica do
Funchal em 1857 e foi enfermeiro geral do Hospital de
Santa Isabel. Por ocasião da epidemia da colera-morbus
PESSOAS MAIS NOTAVEIS 211

de 1856 prestou relegntes se.rviço clinicos, apesar d e


nào ter ainda concluido o seu curso medico. Faleceu
em São Martinho do Porto, onde era medico municipal.
Medico-cirurgiào João Cracvford Rodrigues. Era
filho de Manuel João Rodrigues e de Maria Crawford e
nasceu no sitio da Quinta do Leme a 22 de Junho de
1838. Coiicluiu a sua formatura na Escola Medico-Cirur-
gica do Funclial no ano de 1859. Sendo facultativo do
partido medico municipal de Ponte de Sôr, ali faleccii
no ano de 1886.
Medico-cirurgião Martinho Augusto Camacho. A
I I de Novembro de 1839 nasceu no sitio do Jainhoto,
sendo filho de iilanuel Pereira Camacho e de Rosalina
Rlatilde. No ano de 186j terminou a sua formatura na
Escola Medico-Cirurgica do Funchal. Foi medico muni-
cipal nos concelhos d e Santana e Machico e morreu tia
cidade do Funchal a 29 de Janeiro de 1915.
Padre Manuel Augusto de Frcitas. Era filho d e
Agostinho de Freitas e de blaria de Jesus, tendo nasci-
do no sitio da Quinta do Leme a 25 d e Novembro d e
1839, e faleceu na freguesia da lladalena do Mar, onde
era paroco, a 19 de Maio de 1891.
Xledico-cirurgião Nicolau Tolentino Camacho. Nas-
ceu no sitio do Jamboto a 16 de Março de 1842, sendo
filho d e Manuel Pereira Camacho e d e Rosalina blatilde.
Formou-se na Escola Medico-Cirurgica d o Funchal em
1868. Foi facultativo d o partido municipal dos conce-
lhos d o Porto Santo e Santa Cruz e faleczu na vila deste
nome a 25 de Janeiro de 1912.
Medico-cirurgião Antonio Alfredo Alvares da Silva
Rarreto. Era filho do consul geral de Portugal nas cida-
des anseaticas João Crisostomo da Silva Rarreto e de
212 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Matilde Augusta de Aragão Barieto e nasceu no sitio de


Santo Amaro a g de Julho de 1845. Concluiu o seu
curso na Escola Medico-Cirurgica d o Funchal no ano
d e 1869. Foi guarda-inór de saude e medico municipal
das freguesias d e Santo Antonio e São Martinho, fale-
cendo nesta ultima no ano d e 1914.
Padre Antonio da Silva Correia Valente. No sitio
da Madalena, nasceu a 14 de Junho de 1857, sendo filho
de Mailuel da Silva Correia e de Alaria Antonia Valen-
te. Tendo paroquiado em diversas freguesias, colou-se
como vigario no Porto Moniz e depois em São Vicentee
ali faleceu a 10 de Outubro de 1911.
Padre Antocio Fernandes hlendes. Nasceu no sitio
da Quinta do Leme a 10 de Janeiro de 1860, c era filho
d e Clemente Fernandes Mendes e de Carolina Candida
de Jesus. Depois de exercer funções paroquiais nalgu-
mas freguesias, colocou-se na paroquia da Roaventura.
Faleceu em Santo Antonio a 15 de Julho de 1919.
Padre João Rodrigues da Silva. Era filho d e Julião
d a Silva e de Maria Joaquina de Jesus e nasceu no sitio
da Quinta d o Leme a 30 de Janeiro de 1860, tendo fale-
cido nesta poroquia a 26 de Agosto de 1903. Desempe-
nhou funcões eclesiasticas em varias freguesias e á data
da sua morte era altareiro-mór da Sé Catedral.
General João Alfredo de Faria. Sendo Q mais dis-
tinto filho desta freguesia, foi tambem um ilustre madei-
rense, que sobremaneira honrou a sua terra natal.
Nasceu no sitio do Vasco Gil a 19 de Janeiro de 1861 e
era filho de José de Faria e de Claudia Matilde de
Faria. Frequentou o liceu do Funchal e tinha o curso de
infantaria da antiga Escola do Exercito. A sua carreira
das armas, em que verdadeiramente se notabilisou
PESSOAS BIAIS NOTAVEIS 213

como um dos mais distintos oficiais d o exercito, não


decorreu apenas nas fileiras e serviços internos dos
quarteis, mas principalmente nos tribunais e repartições
superiores, para onde fôra chamado pelos brilhantes
dotes de inteligencia, comprovada competencia em car-
gos que anteriormente exercera e uma notavel e reco-
nhecida inteireza de caracter. Foi promotor de justiça
nos tribunais militares e deputado sm diversas legisla-
turas. No desempenho destes cargos, revelou-se um
orador muito fluente, de acurada correcção d e forma e
profundo co~ihecerior das materias que versava. A sua
palavra facil, correcta e incisiva despertava particular
interesse nos auditorios e era sempre escutada com o
mais devotado apreço. Nalgumas causas celebres, em
que teve de intervir corno promotor de justiça, proferiu
discursos, que foram julgados como verdadeiros mode-
los de eloquencia forense. Não sendo um especialisado
em assuntos financeiros: causou surpresa a sua nomea-
ção para Inspector Geral dos Impostos, mas com tal
proficieiicia se houve, no exercicio dessa importante
comissão de serviço, que conseguiu provocar esponta-
neos e fervorosos louvores ainda de individuos desafec-
tos á situação politica então dominante. O extenso rela-
torio, que ácerca desses serviços publicou em dois volu-
mes, @i objecto de controvertidos juizos na imprensa,
mas nínguem pôde negar ao autor de tão valioso traba-
lho um estudo consciencioso e aprofundado d o assunto,
o mais acendrado desejo d e bem servir o seu país e as
fulgurações dum alto espirito, que nesse mesmo docu-
mento profundamente se revelou. Tinha ascendido ao
posto de general pouco antes do seu falecimonto, que
ocorreu a 24 de Janeiro de 1821.
214 PAROQUIA UE SANTO ANTONIO

Engenheiro civil João Gonies de Gouveia. Nasceu


no sitio do Salão a 19 de Abril de 1861 e era filho de
Francisco Gomes de Gouveia e de Antonio de Jesus de
Gouveia. Depois de frequentar o liceu do Funchal e os
preparatorios da Escola Politecnica. completou o curso
de engenharia civil na antiga Escola do Exercito.
Tendo ingressado como engenheiro na Companhia dos
Caminhos de Ferro após a conclusão do seu curso, ali
permaneceu até á sua morte, que ocorreu ha poucos
anos. Era muito coiisiderado a o seio daquela Compa-
nhia, tanto pela sua competencia profissional como pelas
suas qualidades de caracter.
Francisco Gomes d e Gouveia Juiiior. Era filho de
Francisco Gomes de Gouveia e de Antonia d e Jesus de
Gouveia, tendo nascido 110 sitio do Salão a 12 de Abril
d e 1864. Depois de haver cursado o licei: do Funchal,
diz-nos o Elucidario Madeirense, frequentou a antiga
Escola dos Correios de Lisboa, cujo curso completou.
Era oficial aposentado dos correios e exerceu varias
comissòes de serviço publico, entre as quais as d e vice-
presidente da Camara hlunicipal do Funchal e de presi-
dente da Comissão Administrativa da Santa Casa da
h4isericordia. Foi um habil jornalista, tendo uma larga
colaboração em muitos jornais do Funchal e havendo
sido o redactor principal do antigo periodico a Mcz.deirrz,
Morreu no Funchal a I I de Agosto de 1926.
João Maria Heririques. Nasceu no sitio das Casas
Proximas a 20 de lilarço de 1866, seiido filho de Teo-
dor0 João Henriques e de Eulalia dos Passos Henri-
ques. Tinha o curso de preparatorios do Seminario
desta diocese e possuia a habilitação para o niagisterio
primario, que exerceu durante alguns anos. Desempe-
PESSOAS BIAIS NOTAVEIS 2 15

nhou algumas comissões de serviço publico e foi redac-


tor do antigo jornal Heraldo n'R Mndeira. Faleceu no
Funchal a 5 de Janeiro de 1918.
Antonio Maria dos Passos Henriques. Era filho de
Teodoro João Henriques e de Eulalia dos Passos
Henriques, tendo nascido no sitio das Casas Proximas a
10 de Maio de 1880. Frequentou o liceu do Funchal e
era diplomado pe!o antigo Curso Superior d e Letras.
Promovia a sua entrada no magisterio secundario dos
liceus, quando a morte veiu surpreende-lo a I de De-
zembro de 1902.
Medico veteriaario Carlos Alberto de Faria. Nasceu
no sitio do Vasco Gil a I de Dezembro de 1863, sendo
filho de José de Faria e de Claudia Matilde de Faria.
É medico veterinario aposentado da Camara Municipal
d e Setubal e fuucionario da Direcção Geral dos servi-
ços pecuarios do Miiiisterio da Agricultura.
Medico-cirurgião José Maria dos Passos Henriques.
Era filho d e Teodoro João Henriques e d e Eulalia dos
, Passos Henriques, tendo nascido no sitio das Casas Pro-
ximas a 28 de Dezembro d e 1871. Cursou o liceu do
Funchal e concluiu a sua formatura na Escola Medico-
Cirurgica desta ilha no ano de 1907. Fixou residencia
em Londres ha muitos anos.
Padre José Maria Gomes da Silva. Nasceu no sitio
do Lombo dos Aguiares a 22 de Junho de 1876 e é
filho d e Antonio Gomes da Silva e de Maria Julia da
Silva. Ordenou-se de presbitero na Congregação das
Missões, chamada dos Lazaristas. Ha muito que reside
no Brasil.
Padre Augusto Prazeres dos Santos. Nasceu no
sitio do Salão a I7 de Abril de 1884 e é filho de Anto-
216 P A R O Q U ~ A DE SANTO ANTONIO

nio Gomes dos Santos e de Crispiila Augusta dos


Santos. actual paroco da Quinta Grande.
Tenente d e infantaria José Pinto Correia. É filho de
Francisco Pinto Correia e de Maria Candida Gomes
Correia, e nasceu no sitio do Lombo dos Aguiares a 5
de Junho de 1891.
Daniel Vasco da Costa. Nasceu no ~ i t i oda 32adale-
na a 28 de Janeiro d e 1892, sendo filho de Joaquim Au-
gusto da Costa e de Maria Augusta da Costa. Tem o
curso d o liceu do Funchal. Evidenciou-se como poeta
satirico em diversos jornais madeirenses. É co-autor do
opusculo, em prosa e verso, (<Cáestá o visconde», per-
tencendo-lhe toda a colaboraqão poetica.
Capitão de artilharia Pllanuel da Costa. Nasceu no
sitio da Terra Chã a 29 de Janeiro de 1892, sendo filho
de Antonio da Costa e de Julia Augusta da Costa.
Licenceado em direito Alvaro Figueira. E filho de
Francisco Gomes Figueira e de Julia Augusta Correia
Gomes Figueira e iiasceu no sitio da Madaleiia a 13 de
Xovembro de 1894
Licenceado ern direito Gastão d e Deus Figueira.
Nasceu no sitio da Rladalena a g dc Novembro de 1896
e é filho de Francisco Gomes Figueira e d e Julia Augu-
sia Correia Gomes Figueira.
Tenente de engenharia Luis Vitoria de França
e Sousa. A 4 de IZaio de 1900nasceu no sitio da Levada
do Cavalo, sendo filho de Jogo hlaria de França e Sousa
e de Isabel da Gloria de França e Sousa.
Licenceado em medicina Jacob Pinto Correia. É
filho d e Francisco Pinto Correia e d e Maria Candida
Gomes Correia, tendo nascido no sitio do Lombo dos
Aguiares a 6 de Janeiro de 1901.
Padre Teodoro J o ã o
Henriques

Já deixámos dito que nos ocupariamos em capitulo


especial deste digno e zeloso sacerdote. Cumprimos a
promessa feita, aprovcitaildo as linhas que consagrámos
á sua memoria, insertas numa revista d e Lisboa, pouco
depois da sua morte. E bem merecida C esta singela
honienagem. Entre os eclesiasticos que exerceram
funções paroquiais nesta freguesia, foi um dos que mais
notavelmente se distinguiram pelo seu assiduo e perse-
verante trabalho na evangelica doutrinação dos fieis,
nas obras d e zelo que fomentou, tias associações pias
que estabeleceu, estendendo-se a sua fecunda acção
como paroco e como cura a todas as particularidades
do ministerio pastora]. É de justiça recordar agora que
o padre Teodoro Heiiriques promoveu e fez realizar
nesta paroquia as grandiosas festas centenarias, a que
mais de espaço nos referimos no capitulo intitulado Ceiz-
temrio de Snnto Alztoizio. Tinha por esta freguesia, onde
viveu desde os mais tenros anos, a mais afectuosa pre-
dilecção, interessando se vivamente pelo seu engran-
decimento e prosperidades.

~ N á o ha vislumbre d e exagero afirmando que


218 I'AROQUIA DE SANTO ANTONIO

entre eles adquirira um logar de destaque o padre Teo-


duro João Henriques. E esse logar conquistara-o pelas
suas virtudes, pela conduta irrepreensivel do seu pro-
ceder e mais ainda pela maneira, poucas vezes excedida,
como desempenhara as funções do seu ministerio. Uma
virtude sã, benevolente, toda cheia de bondade, uma
conduta em que só seguira a linha recta do dever, sem
passos obliquos nem tergiversações indecorosas, e uma
vida inteiramente consagrada á santificação dos que
foram confiados á guarda do seu zelo, com o desprendi-
do sacrificio da sua saude e até dos seus minguados re-
cursos.
O padre Teodoro João Henriques, que nasceu no
Funchal em Novembro d e 1861 e se ordenou de presbite-
ro em 1884, foi um estudante muito inteligente e aplicado,
e sempre um exemplo modelar no exactissimo cumpri-
mento dos seus deveres de aspirante á carreira eclesi-
astica, tendo por isso captado as mais fundas simpatias
dos seus superiores e especialmente do inolvidavel
padre Ernesto Schmitz, que nutria por ele a mais arrei-
gada e afectuosa estima.
Possuia uma grande cultura theologica, e quando o
falecido bispo da Madeira reunia semanalmente na Sé
Catedral o clero da cidade e suburbios para as chama-
das Conferc~zcias Teologicas, o padre Teodoro Henri-
ques deu provas de Lima grande aplicação ao estudo e
dos seus aprofundados conhecimentos nos diversos
ramos da sciencia que ai1 se professava, sendo um dos
eclesiasticos que mais se distinguiram no seio daquelas
reuniões, que infelizmente não tiveram larga duração.
Era tainbem um rnusico muito distinto.
Foi, porém, como cura de almas, que as suas apti-
PADRE TEODORO J O . ~ O HENRIQUES 2x9

dões, o seu zelo incansavcl e a sua dedicação pelo bem


espiritual e temporal dos seus paroquianos, notavel-
mente se evidenciaram, tornando-se o verdadeiro pastor
que está pronto a dar a vida pelas suas ovelhas, segun-
do a frase e o sentir do Evangelho. Como coadjutor da
freguesia de Santo Antonio, foi o coiitinuador do resur-
gimento religioso ali iniciado pelo padre Henrique Rlo-
desto d e Betencourt e depois, como paroco da mesma
freguesia e da d e S. Martiiiho, todo se consagrou ao
seu apostolado, sem esmorecimentos nem tibiezas,
sempre com o mais acendrado Fervor, semprc com o
mais caloroso entusiasmo na constante prégação da
palavra d e Deus, no ensino assiduo da catequese, na
administração a mais acrisolada dos sacramentos, ria
visita carinhosa dos enfermos, na criação e propagação
de divcrsas obras de zelo, na prudente e eficaz reforma
dos costumes, no vigoroso combate do proselitismo
protestalite etc., que o tornaram um dos mais respeita
veis, dos mais queridos e dos mais prestigiosos parocos
da diocese funchalense.
Em junho de 191I seguiu o padre Teodoro Henri-
ques para Lisboa e dali tencionava partir para Monda-
riz, afim de fazer uma estação d e aguas que a sua abala-
da saude exigia, quando foi preso no norte do pais e
sujeito a varios incomodos e vexames, de que poude
dentro de poucos dias libertar-se, tomando então a dire-
ção de Hespanha. Feita a cura das termas, regressou
sem demora á sua terra natal, tomando a embsrcação
que o devia conduzir de Vigo ao Fuiichal. Por desgraqa
sua teve o vapor que entrar no Tejo e, apesar da reso-
lução de não desembarcar, afim de não se expor ás tor-
turas por que passou na sua ida para hlondariz, foi preso
220 PAROQCIA DE SANTO ANTONIO

a bordo e conduzido ao Limoeiro como um perigoso


malfeitor.
No Limoeiro e depois na Trafaria passou longos
meses sofrendo as torturas que neste pars teem sofrido
a maior parte dos presos politicos, mas arrostando-as
com uma tamanha serenidade, com uma tão conforma-
da resignação, que á primeira vista parecera que uma
graude atonia moral lhe atrofiara o espirito e lhe anula-
ra todas as energias. Era simplesmente uma alma cheia
daquela incomparavel coragem, que só a religião inspi-
ra e sustenta e que muitas vezes conduz intemeratamen-
te ás heroicidades do martirio.
Depois d e longo cativeiro, eil-o restituido á liber-
dade. Comprovada a sua inocencia, que a dedicação
sem limites dum irmão fizera brilhar com intensa luz,
voltou ao seio da familia estremecida, dos velhos pais
que o adoravam, mas com as forças abatidas e a saude
abalada. Em breve se manifestou a tuberculose pulmo-
nar, que certaménte contraira nas celas da Trafaria.
A 6 d e Outubro de 1912morre serenamente, con-
fortado com os sacramentos dos moribundos, descan-
sando emfim da vida afadigosa e cheia d e merecimentos
que levara neste mundo. Mas uma tragedia se desenro-
la, poucas horas depois, junto do seu cadaver ainda
quente, talvez palpitante ainda dos ultimos sopros de
vida: cai fulminado pela morte o pai que o adorava.
No dia seguinte, entre milhares de pessoas, repas-
sadas de dor e d e lagrimas, atravessavam as ruas do
Funchal dois ataúdes a caminho do cemiterio. Pai e
filho, cobre-os a mesma lagea tumularu.
O poeta Antonio
Nobre

Em procura de lenitivos aos seus graves padeci-


mentos, passou este ilustre poeta uns meses na m d e i r a ,
nos anos de 1898 e 1899. Residiu algumas seinanas, no
sitio do Boliqueme desta freguesia, numa pequena casa
que ainda ali existe e que não sofreu apreciavel modifi-
cação desde o tempo em que nela habitou o celebrado
autor do Só. Como documentação da sua estada nesta
paroquia, vamos deixar aqui transcritas duas cartas,
que particularmente interessam a este assunto. A primei-
ra, publicada em Março de 1915, no antigo Diario do
Comercio, C da autoria do falecido proprietario Manuel
Pinto Correia e concebida nos seguintes termos:
.Tendo lido no seu conceituado jornal, do dia onze
d o corrente, um artigo subordinndo á epigrafe-Festas
de homenagem ao poeta Antonio Nobre-em que se
faz referencia á sua estada na Madeira, em busca d e
alivios para a terrivel doença que o matou, lembrou-me
comunicar a v. que possuo no Trapiche, á freguesia d e
Santo Antonio, sitio onde o poeta viveu durante o
tempo em que se demorou nesta ilha, uma nespereira,
que conservo como valiosa recordação, na qual o me-
lancolico cantor do Só gravou entre outras, as seguintes
222 PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

palavras, já meio apagadas pela acção do tempo e


engrossamento natural da arvore: «Sêde de imensa luz
como a dos páraraios,.
É ccrto que Antonio Nobre esculpiu aquela frase
no caule da arvore existente no predio do sitio do Tra-
piche, que ao tempo pertencia a Manuel Pinto Correia,
mas nunca residiu nessa casa. Era esta então tempora-
riamente habitada por uma familia, ilustre pelo sangue e
pelas virtudes, das relações do poeta e que ele amiu-
dadamente visitava. Tambem é certo que não resi-
d i ~nesta
~ treguesia durante todo o tempo em que
esteve na Madeira, como parece deduzir-se da lei-
tura da carta transcrita, pois c o n certcsa se sabe que
viveu na cidade do Funchal com mais loiiga permanen-
cia do que em Santo Antenio. Manuel Pinto Correia,
que aliás era um caracter austero, equivocou-se eviden-
temente. Tendo um jornal do Funchal, fiindamentando-
se talvez naquela carta, afirmado que Antonio Nobre
residira na casa do Trapiche, veiu á imprensa o distinto
naturalista Adolfo Cesar de Noronha restabelecer a ver-
dade dos factos, dando as mais catagoricas e terminan-
tes indicações ácerca deste assunto. Reproduzimos itite-
gralmente esse escrito'
.Não senhor! A gravura que o ~Jornalwpublicou
em 18 d o corrente nãoarepresenta a casa hibitada pelo
poeta Antonio Nobre. Isto é já sabido e mais que sabi-
bo. A que ali se figura fica no Trapiche e foi habitada
pela Condessa de Cascais. Hoje lá está uma escola
oficial.
Foi ha 4 ou 5 anos que, depois de muito procurar,
consegui identificar, sem sombra d e duvida, a casa d e
habitaçào do Poeta em Sauto Antonio. E uma casa
O POETA ANTONIO NOBRE z23

terrea, muito humilde, rodeada de vinha e outros plan-


tios e situada ao oeste do Trapiche, quasi no Boli-
queme.
Fotografou-a o sr. Fernando de Figueiredo que,
para esse fim, amavelmente s e prestou a subir áquele
sitio, fotografando tambem um dos homens da rede em
que o Poeta se fazia transportar,-e que ainda vive-e
tentando tambem fotografar a cama de madeira que,
segundo dizem, é a mesma em que Antonio Nobre se
deitava.
Já anteriormente o sr. Manuel Perestrelo, com não
menos amabilidade, subira ao Boliqueme com identico
fim, mas por certas razões d e ordem tecnica não poude
aquele eximio artista executar nessa ocasião o desejado
trabalho. Seria bom que o aDiario de Noticias. fizesse
uma rectificação.
A casa do Trapiche não foi habitado pelo Poeta,
nem tal facto corre na tradição. Isto é facil de verificar
entre varias pessoas da localidade*.
O distinto homem de sciencia e professor da uni-
versidade do Porto, dr. Augusto Nobre, irmão do ilus-
tre poeta, acompanhado por Adolfo d e Noronha e por
quem traça estas desataviadas linhas, visitou comovida-
mente a casa do sitio do Boliqueme no mês de Outubro
de 1927. A modesta habitação é cercada por videiras já
anosas e coevas da estada do poeta ali, que certamente
á. sombra delas teria sofrido as tristezas do seu forçado
exilio e dum bem amargurado isolamento. Dessas videi-
ras colheu o dr. Augusto Nobre alguns bacelos, destina-
dos a serem plantados numa propriedade da familia No-
bre, onde o grande e desditoso vate passou uma parte
consideravel da sua existencia.
Breves Noticias e
Informações

Freguesia de Sànto Antonio.-Para as pessoasque


porventura não conheçam a Madeira ou apenas tenham
dela uma noticia muito incompleta, não será talvez des-
cabida reduildancia informar que a freguesia d e Santo
Antonio, de que se ocupa este opusculo, é uma das
cinco paroquias suburbanas do Funchal, capital da
mesma ilha. Tem esta paroquia, como freguesias confi.
nantes, a paroquia citadina d e SZo Pedro, as suburba-
nas de São Martinho e São Roque e as ritrais de Cama-
ra de Lobos e Curral das Freiras, sendo uma das nove
freguesias que constituem o concelho do yunçhal.
~ P a r o q u i ad e Santo Antonio do Funchals-Coin
este titulo e sob a direcção do actual paroco, publicou-
se nesta freguesia uma pequena revista quinzenal, que
teve quasi dois auos de existencia, saindo o primeiro
iiurnero a 8 de Março d e 1914e o ultimo a 22 de Janei-
r o de 1916. O seu fim fica claramente expresso, nas
seguintes palavras, extraidas do respectivo artigo 'de
apresentação: ~Destina-seesta modesta publicação a
exercer a acção social e religiosa que outras revistas
congeileras estão exercendo. . . em muitas paroquias
da Belgica, da França e da Alemanha. . . Embora tenha
esta pequena revista uma feição essencialmeiite religio-
sa, não descurará os assuntos que interessani ao bem
estar material desta paroquia, ocupando-se sempre com
zelo e dedicação d e todos os me!horamentos e de todas
as necessidades reclamadas pela opinião publica, e advo.
gpda com verdadeiro entusiasmo tudo quanto possa
concorrer para o progresso e engrandecimento desta
importante localidade».
Inseriu quarenta e seis pequenos artigos Acerca da
historia desta freguesia, que, na sua quasi totalidade e
com ligeiras modificaç6es, vão reproduzidos neste opus-
cnlo.
Dados demografic0s.-Como aditamento ao capi-
tulo Movimeato da Popukaçc80, damos uma nota extraida
dos respectivo: registos paroquiais, relativa ao numero
de batisados, casamentos e obitos ocorridos nesta fre-
guesia nos ultitnos anos:

Teadoro Joâo Henriques.-Prestou a esta fre-


guesia relevantes serviços, como zeloso e distinto pro-
fessor, no longo periodo d e trinta anos, e como presti-
gioso influente poRtico, conseguindo alguns apreciaveis

melhoramentos para esta localidade. Era a ele que ge-
ralmente recorriam os habitantes desta paroquia, quando
tinham que tratar qualquer assunto nas repartiçóes
publicas ou estações oficiais, o que sempre fazia com
grande solic$ude e desinteresse. Tinha o curso do liceu
e a habilitaçáo para o magisterio primario. Foi comis-
sionado pela Camara Municipal d o Funchal para ir a
Lisboa aperfeiçoar-se no metodo d e ensino chamado
João d e Deus,. tendo feito este aprendizado com o
proprio autor do metodo e estabelecido com o grande
poeta relações da mais afectuosa estima. Falecu no
Funchal a 6 de Outubro de 1912. Era pai do padre
Teodoro João Henriques, João Maria Henriques, dr.
José Maria dos Passos Henriques e Antonio Maria dos
Passos Henriques, aos quais já nos referimos neste
livro.
Preselitismo Protestante.-A acção da propa-
ganda calvinista do dr. Roberto ICalley, iniciada na Ma-
deira em 1838 e que notavelmente se intensificou lios
anos d e 1845 e 1846, fez-se sentir bastante nesta fregue-
sia, lançando nela profundas raizes, d e qne ainda ao
presente se encontram alguns vestigios. No periodo
decorrido d e 1846 a 1849, chegou a atingir o numero de
sessenta os que aqui abertamente seguiam as doutrinas
protestantes, sem contar com aqueles que d e qualquer
modo mostravam a sua predilecção por essas mesmas
doutrinas. Essa propaganda causou, nesta paroquia
como em todas as que ela se exerceu,grandes perturba-
no seio das familias e por vezes graves e sangrentos
conflitos nas estradas e praças publicas. Foi uma epoca
calamitosa para esta ilha, tendo as pessoas mais qualifi-
cadas e ainda os membros mais preponderantes d a colo-
nia ingleza condenado severamente a atitude dos auda-
ciosos aventureiros, que promoviam essa tenaz e preju-
dicialissima propaganda. A fuga precipitada do dr.
Kalley, 5 saida para o estrangeiro de muitos dos seus
mais activos auxiliares, a ação das auctoridades locais e
uma mais intensa apostolisação de clero catolico atenua-
ram bastante aquela grande propaganda e fizeram dimi-
nuir consideravelmente o numero de proselitos, mas
não extinguiram de todo o fermento calvinista que o
celebre medico iuglês e fanatico propagandista lançara
nesta ilha. Entre os mais acerrimos seguidores dessas
doutrinas encontrav?-se uma familia de apelido Fernan-
des da Gama, do sitio do Ttrapiche, á qual pertencia
João Feriiandes da Gama, que ausentando-se para o
Brasil, ali continuou a propagar intensamente os erros
do protestantismo. Na cidade de São João do Rio Claro,
Estado de São Patilo, publicou, em 1896, um livro inti-
tulado perseguição dos Calvinistas da Madeira,, de
2 3 0 paginas, que, apesar da manifesta parcialidade e até
requintada má fé com que está escrito, encerra elemen-
tos valiosos para a historia do proselitismo protestante
neste arquipelago.
A influencia das doutrinas calvinistas vão alargou a
sua área nesta paroquia e foi sensivelmente decrescen-
do até ficar reduzida a proporções bastantes limitadas.
Tomou alguns alentos, em 1899, com as novas tentati-
vas de propaganda dos subditos ingleses J. A. Jefferd e
sua niulher Bela Newton, que, primeiramente no sitio
da Levada do Cavalo e depois no Trapiche, onde estabe-
leceram residencia, realisaram algumas reuniões com a
assistencia dos antigos afeiçoados áquelas doutrinas e d e
outros simples curiosos. Essas reuniões foram mais fre-
228 PAROQüiA DE SANTO ANTONIO

quentes no sitio do Curral Velho, tendo-se dado ali um


grave conflito no dia 25 d e Março daquele ano, d e que
resultou ficarem feridos alguns individuos, havendo a
necessidade da intervenção da força armada. O c*
teve retumbancia no estrangeiro, seiido até levado ao
seio'do parlamento inglês. 0-resultado dessa propaganda
foi pouco eficaz, não havendo aumentado o numero d e
adeptos.
Por 1927, novas tentativas se fizeram no sitio das
Preces, que tambem surtiram infrutiferas.
Pico d o s Barcelos.-No extremo oeste desta fre-
guesia e confinando com a paroquia de São Martinho,
encontra-se o sitio que tem a denominação d e Pico dos
Barcelos. Nele se levanta um morro conhecido pelo
mesmo nome e que hoje é ponto obrigado d e atracção
para todos os turistas que visitam esta ilha. Os terrenos
que longamente se estendem desde a p o n t a do Garajau
até ao Cabo Girão formam um vasto meio circnlo em
cujo diametro e no centro dele se ergue o chamado
Picc dos Barcelos. Esta situação invejavel e a posiçtio
sobraiiceira aos terrenos circumvisinhos permitem que
do alto dele se contemple um dos mais atraentes e for-
mosos panoramas, que seja talvez dado oferecer-se á
vista dos visitantes, ainda dos mais apercebidos para
espectaculos desta natureza.
Ainda ha poucos anos que esta aprasivel estancia
era apenas conhecida pelos habitantes desta freguesia,
que, em dia d o Natal, costumam afluir ali em numero
consideravel, dando ao local um aspecto muito interes-
sante e pitoresco. Algumas noticias e correspondencias
enviadas desta freguesia para os jornais do Funchal,
tornaram aquelo logar bastante conhecido e visitado,
criando-se então a necessidade da construção duma es-
trada, que' pusesse o Pico dos Barcelos em comoda e
rapida comunicação com a cidade. Foi particularmente
devido ás diligencias do abastado proprietario Frdcis-
co Alexandrino Rebelo, natural desta paroquia e resi-
dente na de São Martinho, que a Junta Geral mandou
construir em 1917 essa estrada, que subindo em voltas
curtas, uma das vertentes daquele monte nos conduz
com facilidade á pequena esplanada, que constitue o seu
cume. Mais recentemente, construiu-se uma nova estra-
da, que liga o Pico dos Barcelos com o largo das Ro-
meiras desta freguesia.
Raramente passará um dia em que ali não vão au-
tom'oveis conduzindo turistas ou visitantes, m a s em
muitos dias C consideravel o numero de carros que
sobem áquele local. É hoje ponto obrigado de todas as
excursões que se fazem nesta ilha.
Corregedor Francisco Rodrigues. Devido á auto-
ria do dr. J. M. de Oliveira Rodrigues, publicou recente-
mente O Jornal lima seriè de artigos ácerca dos magis-
trados gue na Madeira exerceram o cargo de correge-
dor, ocupando-se particularmente do dr. Francisco
Rodriguês, que foi um distinto madeirelise, tendo no
exercicio da sua profissão prestado a esta ilha relevan-
tissimos serviços, como mais desenvolvidamente se
poderá ver nos referidos artigos. Neles se afirma que o
corregedor dr. Francisco Rodrigues faleceu nesta fre-
guesia, no ultimo quartel do seculo x v ~no
, sitio da Cha-
morra, na quinta que a familia deste apelido ali pos-
suja.
Serviços medicas.-Ha um partido medico muni-
cipal, que abrange ra área desta freguesia e das de São
23 o PAROQUIA DE SANTO ANTONIO

Roque e São Martinho, tendo a sua sede nesta ultima


paroquia. Ignoramos o ano da sua criação. Foi durante
muitos anos facultativo deste partido medico o dr. Alfre-
do Silva Barreto, que residia na freguesia d e São
Martinho e ali faleceu no ano de 1914, sendo interina-
mente substituido pelo dr. Alfredo Justino Rodrigues,
que tem residencia na mesma freguesia. Obteve este,
provimento definitivo, na sessão camararia de 3 I de De-
zembro daquele ano.
Éxercem actualmente ciinica nesta freguesia os drs.
José Maria Ferreira, Luís Pedro Gomes e Pedro Gomes
Pestana.
A 30 de Janneiro d e 1736 morreu nesta freguesia o
cirurgião Francisco da Silva, que aqui exercia clinica.
Como já fica referido no capitulo Epidemias, fale-
ceu no ano de 1907, vitima do seu dever profissional, o
dr; Luís Vicente da Silva, por ocasião da peste pneumo:
nica que grassou nesta freguesia.
Pelos anos d e 1865 e 1898 residiam nesta freguesia
e nela exerciam clinica os medicos Roberto d e Freitas e
Joaquim Ricarào da Trindade e Vasconcelos. Durante
alguns anos teve resideneia nesta freguesia o dr. João
Pedro Teixeira de Aguiar, que dela se ausentou no
ano d e 1928.
Religiosas.-O mosteiro de freiras de Nossa Se-
nhora das Mercês do Funchal, conhecido pelo nome d e
Convento das Capuchinas, foi desde a sua fundação, em
meados do seculo XVII, até o ano d e 1910, em que as
suas poftas s e fecharam para sempre, um cenaculo das
mais excelsas virtudes e correlativamente um calvario
das mais austeras penitencias. Muitas dessas religiosas
deixaram na tradição local e no arquivo do convento a
fama das suas virtudes e do eminente grau de perfeição
moral a que tinham chegado. Conta-se entre elas a
madre Mariana Rosa do Sacramento, que se afirma ter
deixado a vida presente em cheiro de santidade depois
duma existencia decorrida na pratica d e todos os
heroismos da virtude. Nasceu nesta freguesia no mês
de Agosto de 1677, sendo filha do alferes Antonio Ro-
drigues e de Luisa de Aguiar. Tinha trinta anos quando
fez a sua profissão religiosa e morreu no convento
das Mercês a i 7 de Dezembro de 1740.
Bem recentemente, a 18 do mês de Janeiro do
ano que vai decorrendo, finou-se, no Lombo dos Aguia-
res desta freguesia, outra religiosa do mesmo mosteiro,
que ali exercia o cargo de abadessa, quando aquela
casa se encerrou no mês de Outubro de 1910, com a
expulsão violenta das religiosas que nele se encontra-
vam. Chamava-se Virginia Brites da Paixão e nasceu
nesta freguesia a 2 de Outubro de 1860, sendo filha de
Manuel Gomes da Silva e de hlaria de Jesus. Entrara no
convento das Mercês no ano de 1877 e ali seguira a car-
reira monastica na observqncia mais austera e mais
perfeita das regras do seu instituto. Apesar da vida
simples, obscura e ignorada que sempre procurara ter
no seio da sua modesta familia, fez-se em torno do seu
ataúde uma verdadeira apoteose, que traduzia a crença
da multidão nas eminentes virtudes e no priveligiado
espirito de eleição da humilde religiosa.
Viana.-No capitulo Sitios não se fez menção do
bairro da Viana, que na ordem da antiga nomencla-
tura dos diversos sitios desta freguesia fica colocado
entre os bairros dos Tres Paus e Ribeira dos Socorri-
dos. Tem 72 habitantes.
Origem e Criacá0 tia Paroquia . . .
Igreja Paroquial . . . . . . . . . .
Curral das Preiras . . . . . . . . . . .
I7igairaria e Curato . . . . . . . . .
Parocos . . . . . . . . . . . .
Curas . . . . . . . . . . . .
Sitios . . . . . . . . . . . .
Capela de Sai~toA maro . . . . . . . .
Capela de Santa Maria Madaleiia . . . . .
Capela de São Filipe . . . . . . . .
Capela de Nossa Senhora do Amparo . . . .
Capela de Nossa Senhora da Quietagào . . . .
Capela de Nossa Senhora das Brotas . . . .
Capela de Santa Quiteria . . . . . . .
Capela de Nossa Seiihora do Populo . . . . .
Capela de Nossa Senhora das Preces . . . .
Capela de São João e Santana . .
Capela de Santa Cruz e Almas . . .
Nossa Seriliora de Cuadalupe . . .
Gemiterio . . . . . . . . . . .
Epidemias . . . . . . . . . . . .
Visitas Pastorais . . . . . . . . . .
Ribeiras, Levadas e Fontenarios. . . . . .
Beato Iiiacio de Azevedo . . . . . . . .
Os ~esuitasem Santo Antonio . . . . . .
Confrarias e Associagões Piedosas . . . . .
Iristitui~õesVinculares . . . . . . . .
A Sedição de 1668 . . . . . . . . .
Escolas Priniarias . . . . . . . .
O Terramoto de.1748 . . . . . . . .
Alovimento da Populacão. . . . . . . .
Encargos Pios . . . . . . . . . .
Blguiis hlelhorameiitos Publicos . . . . .
Grandes Reparações na Igreja Paroqiiial . . .
Campanarios e Relogio da Igreja Paroquiaj . . .
Centenario de Santo Atttonio . . . . . . .
Casa de Saude do Trapiche . . . . . . .
Pessoas mais Notaveis . . . . . . . .
Padre Teodoro J . Henriques . . . . . . .
O poeta Antonio Nobre . . . . . . . .
Breves Koticias e Inforniap5es . . . . . .
Algumas Erratas

Linho

1821 1921
mas não tendo não tendo
29:almas 291 almas
recedida precedida
1928 19.27
referente referentes
que é o que s8o os
seguinte seguintes
vindo vinda
conjecturando conjecturando-se

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