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O aldeamento do grupo indígena Xucuru está situado na Serra do Ororubá,

a cerca de 6 km da cidade de Pesqueira, que se encontra na zona


fisiográfica do Agreste, e dista da capital do Estado, em linha reta, 204 km.
Os 6.363 índios que vivem na Serra do Ororubá, em pequenos lotes de
terra dispersos na serra entre propriedades de civilizados, e a inexistência
de uma área contínua dificulta seriamente o contato mais estreito entre os
grupos familiares. Existem a as aldeias de Afeto, Bentevi, Boa Vista,
Brejinho, Caetano, Caípe, Caldeirão,Canabrava, Gitó, Courodanta, Guarda,
Lagoa, Oité, Pendurado, Pé de Serra, Santana, São José e Cimbres. Estas
aldeias não formam propriamente arruados, mas simples ajuntamento de
casas. Canabrava, além de ser o núcleo mais habitado, destaca-se por aí
serem encontrados ainda vestígios marcantes dos traços culturais dos
índios. Algumas localidades apontadas pelo cacique nas quais ainda
existem "caboclos puros, altos e fortes, cabelos que não dão uma volta e
habitam maocas", foram Boa Vista e Canivete. Arredios, nunca descem à
cidade e não têm conttos com as populações dos arredores.
Cimbres, que no passado foi local de grande concentração dos índios
Xucuru, conta hoje com poucos remanescentes, porém é ainda o centro
das manifestações comunitárias, como a festa de Nossa Senhora da
Montanha.
- SITUAÇÃO DA TERRA
A presença dos índios Xucuru na Serra do Ororubá vem desde a época da
colonização portuguesa, provavelmente nunca dai tenha se afastado.
Documentos de 1690 falam da presença na região, como se pode observar
nesse trecho de uma carta de doação de Sesmaria: "Carta de Doação e
Sesmaria que passou ao Alferes Custódio de umas terras para parte do
Urubá que se lhe derão por devolutas... "Senhor" Diz o alferes Custódio
Alves Martins morador no Sertão do Pajeú termo desta Cidade de Olinda,
que ele a custa de muito trabalho de sua pessoa, dispêndio da fazenda, e
risco de vida descobriu terras chamadas Aimbó, que só habitão gentios
Tapuyas, em parte como é das cabeceiras e nas ancas do riacho Pajeú são
todas muito capazes de se povoarem até um alto pequeno d’água, junto a
uma serra também pequena de moengica que algum tempo foi Aldeia de
Tapuyas bravos, chamados Xocurus que ao presente estão de paz mística
com os Tapuyas do Ararobá mais cem léguas desta praça e por as ditas
terras estarem devolutas. Dada nesta cidade de Olinda em os vinte cinco
dias do mez de mayo, Antonio Nunes de Oliveira a fez, anno de mil seis
centos e noventa e cinco."
Um relatório publicado pelo Diário de Pernambuco em 1873 traz também
informações importantes sobre esses índios que formavam na época o
aldeamento de Cimbres: "É uma das maiores propriedades dos índios
desta província. Está situada na serra do Uruá na Comarca do Brejo da
Madre de Deus, e dista 64 léguas desta capital. Nunca houve demarcação
das suas terras, nem a comissão encontrou documentos ou informações
exactas da extensão da extensão da sesmaria; entretanto de alguns dados
que se acham no arquivo dessa providência, se pode depreender que as
terras dos índios de Cimbres tinham três léguas de comprimento sobre
uma de largura, estendendo-se até as águas do rio Ipojuca. Os terrenos da
Serra são excelentes para a lavoura e os da baixa para a criação do gado. A
expoliação das terras desta aldeia parece que foi feita principalmente pela
Câmara Municipal. Estando o terreno desta encravado na aldeia, é isto
origem de rixas e demandas freqüentes..."
Outras referências sobre a Aldeia de Cimbres se encontram no relatório
Olympio Costa Júnior: "Sobre esta aldeia diz Aires do Casal na sua
Coreografia: Cimbres, anteriormente, Ororubá, pequena vila de índios
Chucurus com alguns brancos e mestiços cultivadores d’algodão e
mantimentos do país. Os índios tem fama de saber compor remédios que
fazem alienar o juízo. Suas mulheres trabalham em ollaria com arte, fiam e
tecem algodão e fazem um pranto lugubre quando os maridos não trazem
caça de mato. Em 1749 a aldeia era ocupada por 642 índios, nos anos 1855
e 1861 por 861 e 789 índios compondo 238 famílias".
O desbravamento dessa região pelos portugueses no séc.XVIII atingiu
locais já habitados pelos índios Xucuru, que dominavam toda a região da
Serra do Ororubá, juntamente com os Paratiós estabelecidos nos
contrafortes da mesma Serra. Por alvará de 1762, o primeiro núcleo de
população - Aldeia Ororubá - já com a denominação de Cimbres foi elevada
à categoria de vila e sede do município do mesmo nome.
As informações que se seguem dão conta da extinção pelo governo, da
Aldeia dos Índios de Cimbres em 1879, como aconteceu com outras
aldeias que ainda sobrevivem a invasão do seu território. A partir de então
não há notícias de uma área a eles reservada. Vagando pela serra, foram
alvo de perseguições dos novos moradores e quando não, os ajudavam no
desbravamento da região.
Nessa situação chegaram os índios Xucuru aos nossos dias com uma área
delimitada e identificada, mas sem ser demarcada, para que possam reunir
sua comunidade.
- SITUAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA
Os Xucuru vivem essencialmente da agricultura e tem suas lavouras de
milho, feijão e mandioca condicionadas pelo regime de chuvas. Entretanto,
as condições climáticas e topográficas da serra possibilitam fruticultura e
horticultura expressivas desenvolvidas naturalmente por aqueles que
dispõem de terras nas diversas vargens existentes. O trabalho é feito com
a utilização de técnicas e implementos rudimentares mas o maior
impedimento a uma maior produção é sem dúvida o fator da terra.
Do número total de famílias, apenas uma pequena parte dispõem de terra
própria, em lotes de aproximadamente ½ ha. As demais trabalham em
terras de outros índios ou de civilizados criadores de gado. Assim, quando
usam as terras de brancos, obrigam-se a plantar junto com o milho e o
feijão, capim fornecido pelo proprietário da terra. Após a colheita, o
restolho e o capim deixados servem como alimentação para os rebanhos,
constituindo-se assim na forma de pagamento pelo uso da terra.
Como ocupação da área é Sazonal, o proprietário, além de se garantir
contra a permanência do usuário, gradativamente aumenta a área de
pastagem, pois o processo tende a se repetir em outro local.
Grande parte do que é produzido se destina ao consumo das famílias,
ficando apenas o suficiente para uma pequena comercialização nas feiras
do município de Pesqueira. No inverno o percurso de 6 km da Serra até a
cidade só é possível a pé ou em lotação devido as precárias condições das
estradas. Alguns índios também utilizam carros de aluguel no período seco
para o transporte de seus produtos.
Além da produção agrícola, não foi possível identificar nesta comunidade
outros meios de subsistência, tendo sido observado que não é
desenvolvido pelos índios qualquer artesanato mais significativo. É
contudo provável que os índios residentes na cidade de Pesqueira, sejam
obrigados a desempenhar pequenas atividades de prestação de serviços
para obtenção de alguma renda.
Esta limitada atividade econômica decorrente da escassez de terra para o
desempenho da atividade agrícola, reflete-se diretamente nas condições de
vida da população. A aparência geral é de pobreza e isto pode ser
percebido na situação das habitações locais. Estas casas, em sua maioria
de alvenaria, caracterizam-se pela sua extrema simplicidade, poucos
utensílios domésticos, alguns bancos, potes e panelas de barro. A água
para consumo doméstico é retirada dos olhos d’água existentes.
Os problemas de saúde da comunidade não fogem à regra dos
encontrados na região. São as seqüelas típicas da precária situação de
subnutrição e das condições de higiene: gripes, vermi noses, etc. Os
serviços de saúde são da responsabilidade da FUNAI. A enfermaria
existente no Posto dispõe de uma farmácia e conta com uma enfermeira
diplomada, sendo esta responsável não só pelos atendimentos de
emergência, como também dos partos nas aldeias. Duas vezes ao ano
recebem a visita da equipe volante de saúde, que comporta dois médicos e
um dentista. Recentemente foi designada uma atendente de enfermagem
para Cana-brava e nesta aldeia está prevista a construção de um posto de
saúde.
Em relação a situação escolar, a FUNAI mantém três unidades de ensino
com duas salas de aulas, nas vilas de Canabrava, Brejinho e São José. Há
ainda algumas classes sob a responsabilidade da prefeitura de Pesqueira
que funcionam geral mente na casa da professora. Segundo informações
colhidas no local, a freqüência a escola é regular, não se observando
maiores problemas de evasão, como acontece em outras comunidades.
Convém, contudo, ressaltar que o ensino oferecido a população de 7 a 14
anos, ficando sem atendimento as crianças fora dessa faixa etária. A
continuidade do primeira grau é feita através de bolsas de estudo nos
colégios da cidade de Pesqueira, sendo que atualmente apenas 12
crianças fazem uso dessas bolsas.
O papel da FUNAI, como se pode observar é o de prestado dos serviços de
educação e saúde. A ajuda à agricultura se restringe à oferta esporádica de
sementes e algumas ferramentas. Os poucos recursos financeiros do
Posto não possibilitam a realização de nenhum projeto agrícola mais
relevante. Outro fato observado é a relativa independência dos índios em
relação, ao Posto. A distância entre as aldeias e a própria falta de uma
Reserva parecem levá-los a procurar isoladamente soluções para seus
problemas.
- MANIFESTAÇÕES CULTURAIS E RELIGIOSAS
Estes remanescentes XUCURU, que sobreviveram ao longo pro cesso de
perseguição e expropriação de suas antigas terras con servam poucos
traços de suas origens étnicas. Os índios das di versas povoações são
toalmente aculturados e suas expressões
culturais importante estão em franco desaparecimento. A unidade
do grupo parece enfraquecida e já não se observam traços signifi-
cativos da vida comunitária, a não ser no pequeno aglomerado de
Canabrava onde ainda existem vestígios da língua original, falada,
segundo dizem, por poucos índios. O toré é dançado apenas em raras
ocasiões pelos mais antigos. Mesmo em Canabrava, o cacique, grande
defensor das tradições, não reúne mais a comunidade para as danças. Os
índios se dizem ofendidos pelas humilhações dos "grandes" da redondeza
que ridicularizam seus costumes. Aparentemente não têm mais rituais
secretos, como subsistem em outras comunidades, embora não se possa
garantir que alguma forma de culto não seja mantida pelos mais velhos.
Apesar de lamentar dramaticamente a iminente perda de identidade
cultural do seu povo, o cacique deplora com muita ênfase, aquilo que é o
fator determinante da atual da comunidade e da cultura dos XUCURU: a
forma como se proce deu ao povoamento da região pelos civilizados desde
épocas remotas, e a violência e injustiça que, embora sob novas formas,
persistem até hoje, responsáveis pela perda das extensas áreas que
ocupavam livremente na Serra do Ororubá.
A vila de Cimbres, apesar de contar hoje com poucos índios, é no entanto
o centro das manifestações comunitárias de cunho místico-religiosas. Os
maiores festejos são os de São João e especialmente a festa da padroeira -
Nossa Senhora da Montanha- no dia 02 de julho. Em função desta data, a
comunidade se reúne para as festividades, típicas das pequenas cidades
do interior. Convém lembrar que não se trata de uma festa indígena, mas
da celebração da padroeira de uma região, onde índios e brancos
convivem. Segundo informações colhidas no local, as festividades em
honra da padroeira são motivo para que a população indígena reviva
anualmente costumes próprios de sua cultura, como as danças (o toré), as
cantigas em dialeto misturado com o português, etc.
Cultivam, também, lendas sobre a tribo como esta contada pelo índio
Antero: ‘’Nos tempos dos índios inocentes, encontraram a imagem de
Nossa Senhora num tronco de jucá, os padres levaram então, a Santa para
a Igreja, mas a Santa voltou para o tronco de jucá". É neste local, segundo
relato, que se realiza o ri tual dos índios. Os homens, vestindo os trajes
feitos com palha de milho, com flautos e bastões, dançam ai durante toda a
noite. Para essa comemoração vem índio até de São Paulo. O índio
identifica ainda antigas Aldeias:"Indios do Pé de Serra, Índios da Serra da
Arara, Índios da Serra Acauã, Índios da Serra do Gavião, Índios da Serra do
Maracanã, Índios da Serra da Japicanja e Índios do Juruti". A transcrição
dos vocábulos seguintes, falados pelo índio Antero é uma pequena
indicação do que ainda resta da língua nativa. O registro dessas palavras
não obedece a uma transcrição fonética mas aos referidos sons em
português.
Canecuuinengo proriú: branco que acompanha os índios, tacó do
cuinengo: roupa de branco, tucaju: branco, camqué: índio , xocó (chocó):
índia, tinago: roupa de índia, tacó: roupa de índio, lombri: água, tupã:
Nosso Senhor, Tamaratu: Senhor, Tuma-in: Nosso Senhor, Tuma-in-a:
Nossa Senhora, Juraci: sol, Iracema: lua, Clariu: estrela, lomba: terra,
maiu: panela, xigó: milho, chrichaú: feijão, echalá: fava, amum: farinha,
chochogó: baijú, incha: carne, incha de marinho: carne de boi, memengo:
bode.

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