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Belém/Pará
2008
2
Trabalho de Conclusão de
Curso apresentado à faculdade de
Ciências Sociais do Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas como
requisito para a obtenção do grau
de bacharel em Ciências Sociais
com ênfase em Antropologia.
Belém/Pará
2008
4
Trabalho de Conclusão de
Curso apresentado à faculdade de
Ciências Sociais do Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas como
requisito para a obtenção do grau
de bacharel em Ciências Sociais
com ênfase em Antropologia.
Conceito:____________________
Banca Examinadora:
_________________________________- Orientadora
Profª. Drª. Cristina Donza Cancela
Doutora em História/UFPA
_________________________________-Examinadora
Profª. Drª. Jane Felipe Beltrão
Doutora em História/UFPA
6
AGRADECIMENTOS
Esta é a parte que me cabe neste estudo. É também aquela que já esperava
desde o início. Valho-me dessa honra para concluí-lo agradecendo, primeiramente, a
essa força sobrenatural que não sei de onde vem e nem o que quer, mas que todo dia
me exige forças e empenho, para que de pé caminhe e siga em frente nesta
desbravadora jornada que é a vida, e também a pessoas estimáveis que contribuíram
indubitavelmente para a minha chegada nesta fase.
Ao meu pai Francilton, pela sua capacidade em me estimular a pensar que os
obstáculos impostos pela experiência de viver são importantes muros que eu adoro
derrubar. À minha mãe Lisete pelo investimento em minha formação pessoal e as
duras bravatas que travamos para tornar nossos sonhos realidades possíveis.
À minha tia Zelma e meu tio Itamar pela generosidade, o crédito conferido e o
colchão macio nos finais de semana.
Aos meus avós “postiços” Bruno e Laurita que, às vezes, no silêncio de seus
atos me deram as mais importantes lições da vida.
A minha avó Ziulália e ao meu bisavô Pedro Barbosa que onde quer que
estejam (e sei que estão bem) me geram força quando os abraços rareiam por aqui.
Aos meus irmãos Wilson, William, Wilkins, Julliana, Leilton, João Paulo e
Paula Fernanda pelo amor que nos une e me faz atuar procurando ser espelho.
À minha orientadora Cristina que com a sua jovialidade intrínseca e o sorriso
permanente soube confiar no meu trabalho entendendo que isto é parte constitutiva
da amizade que nascera entre nós.
Às secretárias das paróquias e aos seus respectivos párocos pela concessão dos
livros de casamento e dos espaços onde foram realizadas as pesquisas.
Aos meus colegas do curso de Ciências Sociais, sem distinção, que foram todos
importantes na elaboração de minha personalidade acadêmica, principalmente os
que sentaram ao meu lado e curtiram a inesquecível brisa do Rio Guamá.
À Alice Maria pela confiança e carinho que há entre nós, mas, sobretudo por
seu companheirismo que me estimula a buscar excelência em tudo que faço.
8
RESUMO
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Freqüência dos casamento ocorridos nas paróquias segundo o dia do casamento.
Gráfico 2: Faixa etária dos nubentes ao casar.
Gráfico 3: Idade ao casar. Paróquia de SPSP.
Gráfico 4: Idade ao casar. Paróquia de NSCA.
Gráfico 5: Idade ao casar. Paróquia de SFA.
Gráfico 6: Distribuição dos nubentes segundo faixa etária e origem. Paróquia de SPSP.
Gráfico 7: Distribuição dos nubentes segundo faixa etária e origem. Paróquia de NSCA.
Gráfico 8: Distribuição dos nubentes segundo faixa etária e origem. Paróquia de SFA.
Gráfico 9: Distribuição dos nubentes nas paróquias segundo a faixa etária e origem.
LISTA DE QUADROS
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Número de casamentos e porcentagem de dados válidos para cada uma das variáveis
segundo as paróquias. Belém, 1995 a 2006.
Tabela 2: Densidade demográfica do município de Belém: (2000-2005).
Tabela 3: Anos de estudo dos responsáveis pelos domicílios particulares permanentes
(Guamá).
12
Tabela 29: Local de residência dos nubentes em relação à paróquia de SPSP, segundo o sexo.
Tabela 30: Distribuição dos nubentes da paróquia de SPSP entre os principais logradouros do
bairro do Guamá segundo a proporção de ocupação dos mesmo.
Tabela 31: Local de residência dos nubentes em relação à paróquia de NSCA, segundo o
sexo.
Tabela 32: Distribuição dos nubentes da paróquia de NSCA entre os principais logradouros do
bairro da Pedreira segundo a proporção de ocupação dos mesmos.
Tabela 33: Local de residência dos nubentes em relação à paróquia de SFA, segundo o sexo.
Tabela 34: Distribuição dos nubentes da paróquia de SFA entre os principais logradouros do
bairro de São Brás segundo a proporção de ocupação dos mesmos.
Tabela 34: Distribuição de casamentos comunitários e proporção dos mesmos em relação à
amostra geral por paróquia e bairro.
LISTA DE MAPAS
Mapa 13: Distribuição espacial dos homens que contraíram matrimônio na paróquia de São
Francisco de Assis.
Mapa 14: Distribuição espacial geral dos nubentes que contraíram matrimônio na paróquia de
São Francisco de Assis.
LISTA DE DESENHOS
Desenho 1: Distribuição dos nubentes em relação à paróquia de SPSP - Guamá, segundo a
localização no espaço urbano.
Desenho 2: Distribuição dos nubentes da paróquia de SPSP segundo a distância entre as suas
residências.
Desenho 3: Distribuição dos nubentes em relação à paróquia de NSCA - Pedreira, segundo a
localização no espaço urbano.
Desenho 4: Distribuição dos nubentes da paróquia de NSCA – Pedreira segundo a distância
entre as suas residências e distância média entre estas.
Desenho 5: Distribuição dos nubentes em relação à paróquia de SFA - São Brás, segundo a
localização no espaço urbano.
Desenho 6: Distribuição dos nubentes da paróquia de SFA - São Brás segundo a distância
entre as suas residências.
LISTA DE SIGLAS
APRESENTAÇÃO................................................................................................................... 03
Capítulo II – ESPAÇOS.......................................................................................................... 28
2.1 Os espaços urbanos onde ocorreram os casamentos................................................... 29
2.1.1 Belém................................................................................................................. 29
2.1.2 Guamá (Paróquia de São Pedro e São Paulo).................................................... 32
2.1.3 Pedreira (Paróquia de Nossa Senhora da Conceição Aparecida)....................... 36
2.1.4 São Brás (Paróquia de São Francisco de Assis)................................................. 39
REFERÊNCIAS....................................................................................................................... 117
ANEXOS................................................................................................................................... 119
3
APRESENTAÇÃO
4
Esta definição, porém não pretende ser a síntese dos múltiplos significados atribuídos
ao fenômeno do casamento, uma vez que este sofrera ao longo de sua trajetória importantes
mutações que podem ser iniciadas com a escolha do(a) parceiro(a) e sofrer as influências da
parentela. Para a escolha do cônjuge estes processos importam para na hora de compreender a
dinâmica atribuída pelos indivíduos ao seu papel e função diante da família, inicialmente, e
por conseqüência no interior de grupos mais amplos (amigos, vizinhança, etc). Algumas
dessas mutações tornaram-se importantes fontes de discussão e hoje são vistas tanto pela
ciência (psicologia, sociologia, demografia, história, antropologia) como em meio ao
conhecimento popular sob diferentes ópticas.
1
GONÇALVES, T. A. E o casamento, como vai? Um Estudo da conjugalidade em camadas médias urbanas.
(Dissertação) Mestrado em Antropologia Social. Belém: UFPA, 2000.
2
O reconhecimento social do casamento como elemento de estudo para as Ciências Sociais, reflete a atenção
dada ao grande número de uniões consensuais ocorridas no Brasil, um fenômeno com poucas chances de ser
estatisticamente analisado, devido ser muito dinâmico e não estar entre as três categorias de casamento
monogâmico formalmente reconhecidas pelo Direito Civil brasileiro: religioso (de caráter sacramental: Direito
Canônico), civil (estabelecido por Decreto) e religioso com efeito civil.
5
3
Neste sentido levar em consideração as produções interdisciplinares da Associação Brasileira de Estudos
Populacionais (ABEP). Cf. GOLDANI, A. M. M.; WONG, L. R. Padrões e tendências da nupcialidade no
Brasil. In: Anais do II Encontro Nacional de Estudos Populacionais (ABEP), v. 1, 1980, pp. 343-415 e XAVIER,
I. B. A nupcialidade em família faveladas. In: Anais do V Encontro Nacional de Estudos Populacionais (ABEP),
v. 2, 1986, pp. 965-981.
4
CANCELA, C. D. “Casamento e famílias em uma capital amazônica: estrutura e valores (Belém, 1995-
2005)”. Projeto de Pesquisa vinculado ao Programa de Auxílio ao Recém-doutor (PARD). Instituto de Filosofia
e Ciências Humanas/ Universidade Federal do Pará, Belém. Em desenvolvimento.
5
A idéia de usar esta expressão surgiu durante a elaboração da apresentação dos resultados preliminares da
pesquisa quando de minha participação na disciplina do mestrado do Programa de Pós Graduação em Ciências
Sociais da UFPA “Tópicos Temáticos: Métodos e Técnicas em Pesquisa Antropológica e Direito” ministrada
pela Prfª. Dra. Jane Felipe Beltrão.
6
transição entre os séculos XX e XXI, mais precisamente dos matrimônios católicos ocorridos
entre 1995 e 2006.
Portanto, as questões levantadas e os dados apresentados auxiliam o processo de
interpretação de uma especificidade da cultura urbana, aquela envolvida pelo fenômeno do
casamento, sobretudo no que diz respeito à relação que o mesmo estabelece com os dados
referentes à mobilidade espacial dos nubentes. Neste sentido pretende-se dialogar com uma
literatura que favoreça uma intervenção interdisciplinar sobre o objeto investigado.
A base empírica do trabalho é constituída por um conjunto de 1635 (mil seiscentos e
trinta e cinco) registros de matrimônio católico, todos ocorridos no período citado acima.
Estas informações foram levantadas nos assentos de matrimônio existentes nas secretarias das
paróquias de São Francisco de Assis (SFA), localizada no Bairro de São Brás, Nossa Senhora
da Conceição Aparecida (NSCA), localizada no bairro da Pedreira e São Pedro e São Paulo
(SPSP), localizada no Guamá 6.
O trabalho neste sentido se compõe de oito partes incluindo esta Apresentação cinco
capítulos, as Considerações Finais e os Anexos.
O Capítulo I aborda o processo de inserção na pesquisa e a formação da personalidade
de pesquisador em meio as contingências do campo acadêmico vivenciadas pelo autor, assim
como as metodologias utilizadas para a realização da investigação.
O Capítulo II analisa os espaços dos bairros onde ocorreram os casamentos, de acordo
com as paróquias localizadas em seu interior. Para cada bairro estudado foram utilizadas
informações censitárias relativos à sua composição demográfica, distribuição de renda,
instrução e urbanização.
O capítulo III procura entender o tempo dos casamentos a partir da sua freqüência em
relação aos anos, meses e dias da semana em que ocorreram. Nele é também analisada a idade
dos nubentes segundo o sexo e de acordo com as faixas etárias correspondentes.
6
É importante considerar que o levantamento do material realizado para a execução do Projeto de Pesquisa e
analisado neste trabalho diz respeito única e exclusivamente aos registros religiosos da Igreja Católica. Este foi
também um procedimento adotado por CANCELA, C. D. Casamento e relações familiares na economia da
borracha (Belém, 1870-1920). (Tese) Doutorado em História Econômica. São Paulo: Universidade de São Paulo
(USP), 2006. Para que não se imponha uma interpretação anacrônica em relação ao seu estudo é necessário
admitir que atualmente o prestígio do casamento religioso feito pela Igreja Católica se esvaeceu, embora ainda
faça parte dos planos de sua população. Competem com ele outras formas aliança que, embora não sejam
admitidas enquanto "oficiais" para um ou outro segmento, são significativos indícios das mudanças promovidas
pelo processo de secularização imposto pelo Estado republicano através do casamento civil (Decreto nº 181, de
24 de janeiro de 1890), pela ampliação da presença de outras formas de manifestação religiosa e pelo aumento de
uniões consensuais (que se instituem ora pela ausência de recursos econômicos capazes de custear o rito, ora
pela sua re-significação no interior de certos grupos e relações sociais).
7
CAPÍTULO I
TRAJETÓRIAS PARA A PESQUISA
9
7
Para que se possa obter uma melhor compreensão do contexto institucional no qual se desenvolveu a obra de
Malinowski pesquisar KUPER, Adam. Antropólogos e Antropologia. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1978;
para entender as críticas a Malinowski ver KUPER, Adam. Histórias Alternativas da Antropologia Social
Britânica. Etnográfica, Vol. IX (2), 2005, pp. 209-230.
10
8
A primeira vez que utilizei este termo foi durante a palestra “Trajetórias em Antropologia” proferida pelo
professor Doutor Roque de Barros Laraia, no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFPA (25.09.2007).
Questionei-o sobre a trajetória da antropologia no Brasil e no que ela se diferenciava das outras ocorridas tanto
nos Estados Unidos quanto na Europa, a saber, precursoras de “Africanismos, Oceanismos, Orientalismos”, que
se diferenciavam da Antropologia Brasileira considerada por Viveiros de Castro (1992) como estrutural-
culturalista, já que apresentava ao contexto antropológico mundial pesquisadores que investigavam as suas
próprias contingências.
9
Artigo publicado na Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 5, n. 10, 1992, p. 170-190 e está
disponível no site http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/103.pdf.
11
interétnica 10. Além disso, há de se considerar que o valor e sentido da ciência no território
brasileiro sofre com as idiossincrasias de classe e com o próprio processo de formação de uma
cultura intelectual, que é tão restritiva e desigual quanto a econômica, de tal forma que há um
paralelo entre ambas capaz de classificar o Brasil tanto como dependente quanto marginal em
relação aos grandes centros financeiros e de prestigio intelectual do planeta.
Destarte, considero que minha experiência de vida como brasileiro que desenvolve,
através da educação um alpinismo social, está envolvida por essas idiossincrasias, e muitas
outras, que por sinal revelam não só o campo e seu labirinto, mas os conflitos históricos pelos
quais os sujeitos, que almejam partilhar com dignidade da vida intelectual migrando das
camadas mais pauperizadas da população, tem de passar até alcançar seus objetivos.
Um ponto chave desse trabalho e que considero pertinente quando relacionado à
problemática em discussão é a própria abordagem que dou ao termo “migrar”. Sou migrante
e, sobretudo, um migrante filho de nordestinos e rurais que percebeu haver a existência de
uma transferência de valores, idéias, gostos e sentidos para a metrópole, que não só
representava o meu olhar quando mudei de Castanhal com mala e sanfona 11 para Belém, mas
o de um grupo estereotipado e generalizado, os nordestinos. As minhas primeiras impressões
ao entrar em contato com a população da cidade é a de que estes são vistos como retirantes e
inconvenientes grupos migratórios, assim como protagonistas do cenário envolvendo a cidade
e o país principalmente no que diz respeito a pobreza, a marginalidade e a violência.
Por ter sido exotizado por meus colegas no início do curso devido a fala, o traje e o
comportamento “diferente” fui seduzido pelo tema da identidade do migrante tendo, inclusive,
recebido o convite para apresentar um breve estudo sobre este fenômeno na Assembléia
Legislativa do Estado do Pará. Mas a aproximação com o ambiente político e os conflitos que
este encerra dentro de um curso onde “não se pode ser um sem ser inimigo” me afastaram de
um aprofundamento nesta discussão, muito embora insistisse por entender os seus efeitos
sobre a população nordestina que habita a cidade.
10
CARSODO DE OLVEIRA considera fricção interétinica “o contato entre grupos tribais e segmentos da
sociedade brasileira, caracterizados por seus aspectos competitivos e, na maioria das vezes, conflituiais,
assumindo esse contato muitas vezes em proporções ‘totais’, envolvendo toda a conduta tribal e não tribal que
passa a ser moldada pela situação de fricção interétnica. Entretanto, essa ‘situação’ pode apresentar as mais
variadas configurações (...) Desse modo, de conformidade com a natureza sócio econômico das frentes de
expansão da sociedade brasileira, as situações de fricção apresentarão aspectos específicos” (CARDOSO DE
OLIVEIRA, R. “Problemas e hipóteses relativos à fricção interétnica”. In: A sociologia do Brasil Indígena. Rio
de Janeiro: Tempo Universitário, 1978. )
11
O uso desta expressão se dá pelo contraste com o habitualmente ouvido na cidade de Belém onde se enfatiza
que uma mudança envolve a cuia (artefato utilizado principalmente para tomar o tacacá, prato típico da região, e
banhar-se) : “mudar de mala e cuia”. Castanhal dista cerca de 70Km da capital, Belém.
12
Iniciei por causa disso o que considero minha carreira acadêmica de pesquisador
esboçando alguns estudos sobre as práticas e representações dos feirantes da Feira da Prainha
(localizada no bairro do Entroncamento, em Belém) durante o processo de transferência de
patrimônio familiar (bancas, barracas, clientes, ponto, crédito). Percebia que haviam muitos
migrantes nordestinos ou filhos de migrantes. Daí o estalo. Contudo, fui orientado a
desenvolver um artigo sobre a temática “espacialidade”, descrevendo, à maneira geertziana 12
(etnografia com base numa descrição densa) todo o seu ambiente, o complexo organizacional
que a engendrava, a estrutura das barracas, os hábitos e performances dos feirantes, clientes e
passantes, suas falas e toda uma teia de significados que somente após o desfecho do trabalho
comecei a entender.
Dessa experiência tive o mérito, e por que não dizer a honra, de estar em meu primeiro
congresso acadêmico 13. Dali em diante não só me encontrei no campo, como também vi que o
mesmo a cada dia me encontrava e me envolvia, e passei desde então a ser orientado pelo
desejo de participar, escrever, apresentar, e principalmente desafiar o medo que toma conta de
nossos espíritos e corpos ao longo da graduação.
Embora não possuísse uma bolsa e sofresse com os imponderáveis do cotidiano
acadêmico, como a falta de recursos para obtenção de livros e/ou apostilas, a inacreditável
deficiência da Biblioteca Central em fornecer livros (isso quando possuía) capazes de
auxiliarem-me na realização de minhas pesquisas, os conflitos existenciais que as leituras
provocam em nosso ser e na forma com que passamos a ver o mundo “lá fora”, procurava
compensar desafiando tais obstáculos e com muita criatividade inserindo o novo em minhas
primeiras análises sociológicas. Um desses empreendimentos merece uma breve citação por
ter ocorrido durante o contexto da disciplina Didática Geral 14, do qual era o único aluno de
Ciências Sociais de uma turma absolutamente formada por graduandos do curso de música.
Naquela ocasião foi-nos recomendado como requisito para a avaliação final o
desenvolvimento de uma aula sobre um tema da área em que estávamos nos formando e que
poderia ser aleatoriamente escolhido por nós. Tendo levado em conta a necessidade por
12
GEERTZ, C. Uma Descrição Densa: Por uma Teoria Interpretativa da Cultura. In: GERTZ, C. A interpretação
das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara, 1989.
13
Tratasse do Primer Congreso Latinoamericano de Antropologia ocorrido em Rosário, Argentina (2005), no
qual apresentei o artigo “‘O meu pedaço é na Prainha’: conflitos e espacialidades de uma feira paraense” no
Grupo de Trabalho “Mercados e cidades: conflitos de urbanidades e concepções do público na especialização das
práticas sociais e econômicas” e que foi coordenado pelos professores Marco Antonio da Silva Mello (UFF) e
Luis Roberto Cardoso de Oliveira (UnB).
14
Disciplina ministrada pela saudosa professora Dra.Wilma Baia Coelho a quem devo com muita satisfação
meus mais sinceros agradecimentos, uma vez que fora ela quem pela primeira vez me mostrou o real sentido das
palavras determinação e competência.
13
traduzir o que sabia sobre música resolvi, caprichosamente, falar de Mozart e do Jazz.
Consegui, embora estivesse apreensivo sobre a avaliação que a professora faria sobre tal feito,
e conquistei importantes amizades com aqueles alunos, que embora expressassem não
compreender o que de fato eu estudava terminaram por me mostrar que a interdisciplinaridade
é algo fundamental em nossa formação acadêmica. Interdisciplinaridade essa que procurei
transferir para o presente trabalho não só através da metodologia aplicada, mas também da
valorização às categorias e conceitos de áreas afins.
No entanto, tomar consciência disso demorou tempo. Entender-me diante do campo
era dialogar com seus obstáculos e isso só foi possível após algumas frustrantes tentativas 15
de inserção em linhas de pesquisa da Universidade Federal do Pará. Talvez essa insistência
por tentar forçou-me a compreender que uma seleção para pesquisa representava um objetivo
pessoal. Após entender que um objetivo deste porte requer alguns abandonos e deixas, refleti
sobre a possibilidade de trabalhar com um tema assaz novo em minha trajetória acadêmica:
casamento e família. Havia sido, nesta ocasião, selecionado para o projeto “Casamento e
família em Belém: estrutura e valores (1995-2006)” da Prof. Dra. Cristina Donza Cancela. A
experiência de pesquisa “oficial” trouxe á tona não mais uma curiosidade por descobrir, mas
por tentar entender, como diria Geertz, que diabos as pessoas (incluindo eu) acham que estão
fazendo 16. Daí em diante passei a perceber como era vasto e distante o novo mundo em que
aportava.
Com o aparecimento da oportunidade de trabalhar com esta pesquisa surgiram as
seguintes indagações: será que eu tenho alguma coisa haver com esse tema? Será que eu vou
dar conta? O que eu entendo por casamento e família? Algumas questões envolvendo estas
problemáticas requerem uma análise para além do eu intersticial por que dizem respeito ao
método e a teoria pesquisada, e isto ocorrerá no capítulo em que abordo a metodologia de
pesquisa.
Em seguida a seleção fui “apresentado” à área. Iniciei as leituras recomendadas, assim
como uma profunda reflexão sobre o tema. Minha primeira pergunta naquele momento foi:
por que as pessoas casam? Algumas respostas encontrei nos livros, outras foram surgindo
com as conversas que estabelecia com amigos e parentes, contudo as mais significativas
15
Para ser mais claro, obtive algumas oportunidades nada confidenciáveis que foram abruptamente necessárias
para que eu, enquanto um aluno disposto a penetrar o mundo científico, entende-se o campo acadêmico como um
espaço político envolvidos por conflitos de poder, onde as pessoas que transitam por ele estão envolvidas
também por seus respectivos interesses pessoais. Essa compreensão foi necessária para que eu, tolo, aguçasse
meus sentidos em relação à elas, separando, assim, o joio do trigo na hora de realizar minhas escolhas
intelectuais.
16
GEERTZ, C. Do ponto de vista dos nativos. In: O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa.
Petrópolis, Vozes, 1997.
14
obtive quando num curto período de tempo pude vivenciar todo o processo matrimonial
envolvendo dois parentes patrilineares .
É necessário que se diga que ambos os matrimônios envolviam famílias de migrantes
que se caracterizam primordialmente pela realização (e valorização) de uniões matrimoniais
entre grupos familiares das classes médias da capital, Belém, e da cidade de Castanhal. Casar,
naquele contexto, significava um contrato que, de acordo com minha observação e as falas
dos envolvidos ao longo de todo processo do consórcio, favorecia economicamente tanto os
pares quanto os interesses das suas famílias; isto por que pela legalidade do acordo firmado
garantiam a manutenção de determinados bens materiais e simbólicos, expansão da rede de
aliança, assim como a geração de novos “lucros 17” através desta relação. O cenário
econômico em que atuam as famílias diz respeito a setores comerciais, como supermercado,
consórcio e venda de carros, boutique e madeireira.
Em uma das ocasiões envolvidas pelo rito matrimonial percebi que o pai do noivo,
depois de arrumado e pronto para ir à capela onde ia ser realizada a cerimônia, respirou
profundamente e, levantando seu olhar para o teto, praguejou: “agora tá na hora de eu
entregar o burro pra carga”. Esta fala marcou uma importante fase da pesquisa, isto é, a de
interpretar o casamento como uma categoria utilizada para legitimar a união entre indivíduos
e seus respectivos grupos de filiação, ou seja, famílias.
Percebi com isto que “o dar conta” ou “ter algo a ver” com o trabalho (minhas
preocupações iniciais) sofria de perguntas erradas. A questão principal é “que oportunidades
e obstáculos o campo cria em meu desenvolvimento intelectual e pessoal?”.
Do lado intelectual pesa a tradição do método, ou seja, só vou compreender o campo
lendo, questionando, refletindo, indo a campo e, particularmente, escrevendo. Já do lado
pessoal que não se define sem a estreita relação com o anterior pesa a relação com os outros, e
neste caso com as outras, que num ou noutro momento apresentam-se declaradamente
surpresos com o fato de um homem estudar e principalmente se interessar pela temática
gênero! Não é interessante para o trabalho destacar o conflito existente nesta área, onde não
só as muitas autoras mais o meio acadêmico em si acabam deixando claro o sectarismo
envolvendo os sexos, mas é importante que se destaque a sua relevância envolvendo meu
17
Considerar que existem lucros com o casamento não é atribuir um desfecho utilitarista para a relação de
casamento nem atribuir-lhe um sentido econômico — embora seja possível e difícil negar —, mas é considerar
que existem ganhas e perdas. Em ambos os casos ficou claro (apesar de não se ter produzido nenhuma descrição
densa em relação ao assunto) que casar proporcionava um lucro já que atendia necessidades específicas de
ampliação da rede de relações comerciais assim como de auto-afirmação das famílias e dos seus interessados
diretos, os noivos.
15
crescimento pessoal e por conseqüência aqueles que num mundo machista e violento me
cercam e vêem minhas idéias como uma coisa “boa para pensar”.
16
1.2.1 Iinterdisciplinaridade
Para dar conta da discussão é importante destacar que a intenção de trabalhar
interdisciplinarmente não é a de abordar o tema pegando um pouco disso, um pouco daquilo,
misturar bem (ou mal) e, “voilá, eis um trabalho interdisciplinar!” Mas sim evidenciar a
exuberância do objeto e a sua capacidade em promover um diálogo entre áreas que embora
atuem na disciplina de suas especificidades possuem pontos em comum. Levando em
consideração a problemática proposta por Burity 18 sobre este procedimento afirma-se que as
contribuições de um trabalho deste tipo envolve 1) a integridade e especificidade "originais"
das disciplinas utilizadas quando objetiva contribuir num campo que lhes é estranho, porém a
partir de seu próprio "jeito de ser", chamando a si a hegemonia do discurso sobre o objeto; 2)
a capacidade de misturar abordagens e técnicas de investigação "pertencentes" a disciplinas
distintas, como possibilidade de perceber a complexidade do objeto (ou de sua inserção no
real) e a necessidade de adequação da metodologia e teoria às mudanças historico-sociais; 3) a
possibilidade de retomada do projeto totalizante da ciência como reveladora da racionalidade
intrínseca do real - a interdisciplinaridade repondo a idéia de um super- ou meta-discurso
sobre o real que consegue apreendê-lo em todas as suas particularidades e reentrâncias; 4) a
identificação de novos objetos, novas questões e novas abordagens, que constituiriam um
terreno irredutível ao "próprio" de cada disciplina, requerendo das mesmas que se descentrem,
ou se pluralizem, para darem conta do novo; e 5) a estratégia de questionamento da lógica
18
BURITY, J. A. Interdisciplinaridade, discurso e diálogo. In.: Anais do Simpósio Interdisciplinaridade em
questão. Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, 1998, pp. 53-81.
17
disciplinar e dos arranjos institucionais por ela produzidos, que opera a partir de um lugar
disciplinar, sem contudo deixar de fazer-lhe violência, expandindo e contraindo suas margens
de modo a produzir efeitos políticos no campo do saber (tanto o campo coberto pelo saber
quanto as instituições que velam pela produção do saber) 19.
O primeiro efeito desta perspectiva diz respeito à coleção dos dados, isto por que o
método utilizado, ou seja, o levantamento dos registros paroquiais é um tipo de procedimento
que assemelha-se ao método elaborado pela Demografia Histórica, ciência que desponta na
metade do século XX quando Goubert organiza um estudo sistemático de demografia sobre o
contexto francês do século XVII, tendo como base os registros eclesiásticos de batizados,
casamentos e óbitos. Esta iniciativa foi posteriormente adaptada por Henry, que desde então
passou a ser considerado o mentor do método de reconstituição de famílias. Sua proposta
inicial era desenvolver um método minucioso de levantamento e análise dos antigos registros
com a finalidade de transformá-los em dados demográficos básicos sobre micropopulações.
Havia proposto, pois, uma coleta individual por ato e o posterior cruzamento das
informações 20. No entanto pelas características que marcam o desenvolvimento da pesquisa e
a elaboração deste trabalho não serão realizadas as reconstituições de famílias, mas apenas
utilizado o sistema de coleta das informações elaborado por estes autores.
19
BURITY, Joanildo. op. cit. pp. 16-8
20
Para uma análise pontual envolvendo os conceitos, os métodos de coleta de dados e a história de formação da
Demografia Histórica tanto na Europa como no Brasil ver MARCÍLIO, M. L. (org.). Demografia histórica:
orientações técnicas e metodológicas. São Paulo: Pioneira, 1977. Sobre o levantamento dos registros paroquiais
e a técnica de reconstituição de famílias ver HENRY, Louis. O levantamento dos registros paroquiais e a
técnica de reconstituição de famílias, nesta mesma coletânea (pp. 41-63). A discussão sobre o método utilizado
por Henry é feita por SCOTT, A. S. V. & SCOTT, D. Cruzamento Nominativo de Fontes: desafios, problemas e
algumas reflexões para a utilização dos registros paroquiais. In: Anais do XV Encontro Nacional de Estudos de
População (ABEP). Caxambu / Minas Gerais, setembro de 2006. É preciso salientar que, embora a metodologia
de reconstituição de famílias de L. Henry não seja utilizada neste trabalho, ela serve como referência na
abordagem do tema, uma vez que este pesquisador é considerado o mais expressivo expoente deste tipo de
análise demográfica.
21
As secretarias as quais cito são espaços destinados à visita e consulta dos livros de casamento, batismo, etc.
por parte da comunidade. Em alguns dos casos (paróquia de São Pedro e São Paulo) a secretaria por ser o mesmo
espaço de trabalho das secretárias, o tornava pequeno para a realização do levantamento dos dados, neste caso a
pesquisa se dava no gabinete do pároco.
18
As fichas possuem campos que devem ser preenchidos com os seguintes dados:
a) Igreja ou paróquia da qual o Livro de Casamento pertence;
b) Data do casamento;
c) Local onde foi realizada a cerimônia;
d) Se fora ou não um casamento in extremes 22;
e) Se fora não um casamento com efeito civil;
f) Nome dos noivos;
g) Condição dos noivos (se solteiro ou viúvo) 23;
h) Idade dos noivos;
i) Atividade dos noivos;
j) Nome do pai e da mãe dos noivos;
l) Origem dos noivos;
m) Local e igreja onde foi realizado o batizado dos noivos;
n) Moradia dos noivos; e
o) Observação 24.
Este procedimento foi adotado por Cancela 25 e Conceição 26 . A primeira fundamentou
sua análise a partir dos registros matrimoniais elaborados entre as décadas de 1870 a 1930 na
cidade de Belém/PA e o segundo abordou as Habilitações de casamento da cidade de São
Carlos/SP produzidas entre os anos de 1890 e 1939. Muitos mecanismos de organização e
seleção do material compilado utilizados neste trabalho se assemelham aos que estes autores
utilizaram em suas abordagens, o que em geralprovocou a comparação dos resultados obtidos
e com isto a observação de algumas nuances envolvendo a qualidade dos dados 27.
22
É um termo que se refere ao casamento realizado entre pessoas das quais uma encontra-se sob risco de morte
ou em estado de decrepitude. Em geral são realizados em hospitais ou na própria casa dos indivíduos e ocorrem
conjuntamente com a entrega da extrema-unção.
23
Ao longo da pesquisa observou-se a necessidade de inclusão do termo “divorciado” devido este aparecer em
muitos registros analisados.
24
Este campo em geral é utilizado para anotar certos eventos ou atos ocorridos durante o processo de registro do
casamento no Livro de Casamento, tais como “casamento anulado”, “apresentaram o registro civil de
casamento”, “casados no civil em...”, “eram vizinhos”, etc. Serve também para designar se os nubentes moravam
ou não juntos, o que dá para ser definido comparando as moradias de ambos.
25
CONCEIÇÃO, S. Imigração e casamentos: ocaso de São Carlos (1890 a 1939). (Dissertação) Mestrado em
Ciências Sociais. São Carlos: UFSCar, 2004.
26
CANCELA, C. D. op. cit.
27
Genericamente, quando tratamos da qualidade dos dados de uma pesquisa de levantamento de dados, tal como
esta, devemos ter em mente que a qualidade das informações fornecidas e anotadas dependem, e muito, da
pessoa que preenche os documentos e da condição social das pessoas que estão se casando.
19
Tabela 1: Número de casamentos e porcentagem de dados válidos para cada uma das variáveis
segundo as paróquias. Belém, 1995 a 2006.
bairros quer por se tratarem de filhos nascidos ilegitimamente, quer pelo abandono
realizado pela população masculina. A paróquia de São Pedro e São Paulo localizada no
bairro do Guamá neste sentido apresentou um índice que margeia os 10% tanto em
relação ao pai do noivo quanto da noiva 28.
Alguns dados, em contrapartida, eram aparentemente dispensáveis, sobretudo no
que se refere às mulheres, o que dá margem a interpretação de que estas informações
são pensadas como menos relevantes do que as referentes a população masculina. É o
caso de um dos Livros de Casamento da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição
Aparecida, na Pedreira, cujas informações relativas às nubentes do sexo feminino
passaram a ser desconsideradas a partir da abertura do novo livro de casamento, em
outubro de 2002. Havia nele apenas espaço para inclusão do nome. Este também foi o
único em que encontrou-se um espaço destinado a inclusão do novo nome da noiva, isto
é, aquele em que é exigida a alteração do seu nome em função do casamento 29.
28
As ausências do nome do pai se reproduzem nos dados relativos às outras duas paróquias só que em
menor escala. Para a paróquia de São Francisco de Assis, localizado em São Brás, o índice analisado
chegou a 4%; já em relação à Paróquia de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Pedreira, tal índice
alcançou os 6%. Vale frisar que em apenas nove casos do total geral da amostra foi constatada a ausência
do nome da mãe.
29
Nestes casos podem ocorrer dois processos: 1) o nome da noiva (por exemplo, Maria Eduarda da Silva
Teixeira) tem substituído o sobrenome referente à mãe (Teixeira) pelo sobrenome referente ao pai do
noivo (se neste caso for, por exemplo, Rafael Andrade de Albuquerque), o que a tornaria Maria Eduarda
da Silva Albuquerque; 2) Houve também casos em que, se apropriando dos mesmos exemplos, foi
possível observar a inclusão do sobrenome do noivo referente ao seu pai ao nome da noiva. Aludindo o
exemplo anterior a mesma nubente passaria então a se chamar Maria Eduarda da Silva Teixeira
Albuquerque. (Os nomes são fictícios).
22
30
Vale lembrar que depois de coletadas e organizadas as informações num banco de dados, elaborou-se
um arquivo digital em formato de CD-r que posteriormente foi devolvido para as paróquias.
31
Termo utilizado por Geertz para designar uma relação que se mantém com os informantes e que leva ao
risco de elaborar um detalhismo que nos afoga em miudezas e pode nos deixar preso a um emaranhado
vernacular (GEERTZ, C. Do ponto de vista dos nativos. In: O saber local: novos ensaios em
antropologia interpretativa. Petrópolis, Vozes, 1997). Aqui vale uma reflexão sobre a natureza dos
informantes, uma vez que a experiência de trabalho com os livros levou a observação de signos que além
de serem a expressão de uma cultura simbólica são também índices de inúmeros contextos comunicativos,
portanto de pessoas que deixaram expressas em grafemas o significado de uma relação. Considerar-los-ei
como sistemas de representação visual, aos moldes do que indica RIBEIRO, B. G. “A linguagem
simbólica da cultura material. Introdução". In: RIBEIRO, Berta. (org.). Suma Etnológica brasileira vol.
3. Petrópolis, Vozes/Finep, 1987a; para a autora estes sistemas, na sua qualidade de código cultural, são
mecanismos de ordenação e comunicação da experiência culturalmente determinada.
23
32
BASSANEZI, M. S. C. B. Migrantes no Brasil da segunda metade do. século XIX. In: Anais do XII
Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP). Caxambu / Minas Gerais, outubro
de 2000, p. 1.
33
Para entender o conceito de rede matrimonial com base na origem é fundamental que se perceba o
nubente que casou em uma localidade, mas nasceu em uma outra como fruto de um sistema migratório
que exige dele uma seletividade marcada por códigos de identidade. Segundo MATOS & BRAGA as
análises sobre a formação de redes deste tipo “devem considerar o migrante não somente por seus
atributos pessoais ou intenções individuais, mas sim como uma entidade dotada de relações que se
conecta a outros conjuntos definidos por laços de parentesco, amizade, conhecimento, trabalho. Nesta
perspectiva, os movimentos populacionais são, também, a expressão das possibilidades criadas por um
conjunto de relações [sobretudo de identidade] nas quais o individuo se insere” (MATOS, R.; BRAGA, F.
Redes Sociais, Redes Territoriais e Migrações. XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais
(ABEP), Caxambú /Minas Gerais, Setembro de 2004, p.4).
34
AGUIAR, K.S. “Arigó casa com arigó”: casamento e família entre os migrantes cearenses em
Santarém-Pará. (Dissertação) Programa de Pós-Graduação em Antropologia. Belém: UFPA. No prelo.
24
como migrações fortuitas ocorridas no interior da zona urbana. Isto pode ocorrer entre
regiões ou vias distintas do bairro ou entre bairros da mesma cidade ou das cidades que
compões a zona metropolitana. O problema no caso do casamento está em saber para
onde vão os nubentes depois de casados, mas isto, pelo que se verá em capitulo
posterior, será menos importante (ao menos neste trabalho) do que descobrir como estão
inseridos os indivíduos em meio aos fluxos realizados no interior do espaço urbano de
Belém.
Excluindo-se as nuances e as deixando clara como evidentes questões a serem
discutidas em trabalhos posteriores é que se torna necessário destacar que a metodologia
utilizada refere-se única e exclusivamente a uma sistematização de dados seriais
relativos a esta origem e ao local de moradia, que vale repetir, não foram itens criados
para a pesquisa, mas sim um dado contido nos livros de casamento 35.
Ao longo da pesquisa foram realizados dois procedimentos para esta
sistematização: um direto, através de digitalização das informações contidas nos livros
de casamento no banco de dados Aplicativo Microsoft Access 2003, e outro indireto,
devido estas informações terem sido, num primeiro momento, transcritas manualmente
para as “Fichas de Casamento” que ao término, reunidas, permitiram, num segundo
momento, sua digitalização no mesmo banco de dados. Todo este mecanismo facilitou o
passo seguinte, isto é, permitiu que fosse realizado um “vínculo” entre os programas
Aplicativo Microsoft Access 2003 (a base de dados utilizada para sistematizar os
registros) e a Planilha Microsoft Excel 2003. A intenção foi adequar as informações aos
objetivos da pesquisa: instrumentalização dos índices e os índices de mobilidade dos
nubentes na intenção de compreender a estrutura do casamento tanto no que diz respeito
ao local de nascimento dos noivos como aos espaços de moradia no interior da cidade,
procurando investigar a presença de migrantes em ambos os casos e a possível
existência de uma homogamia em suas alianças matrimoniais.
Para que isso se tornasse compreensível os nubentes foram classificados a partir
dos registros obtidos nos livros de casamento, segundo a naturalidade e o local de
moradia. Dessa forma tal classificação segue o interesse por entender a dinâmica de
mobilidade espacial dos nubentes, e ao mesmo tempo as relações que isto encerra entre
35
É necessário afirmar que estes procedimentos dão suporte a uma metodologia especifica da área de
demografia histórica com base na reconstituição de famílias, na medida em que se busca interpretar
“séries de dados [...] como indicadores de determinadas relações sociais e padrões culturais” (NADALIN,
S. O. História e demografia: elementos para um diálogo. Campinas: Associação Brasileira de Estudos
Populacionais (ABEP), 2004. p.71.).
25
36
É importante considerar que não só o Estado do Pará como outros Estados da federação apresentam
regiões habitadas que são definidas como vilas, comunidades, colônias e que muitas das vezes não são
interessantes para quem vai lavrar um determinado documento. Às vezes procura-se a cidade mais
próxima desta localidade como referência para indicar o local de moradia das pessoas. O contrário
também acontece, isto é, identifica-se o lugar, mas não são dadas as referências capazes de identificá-los
nos mapas sem que para isto seja necessário recorrer a uma análise “microscópica”. Há também casos em
que duas cidades possuem o mesmo nome e por circunstâncias que não são possíveis de identificar
deixam de apresentar uma referência relativa ao estado da federação à qual pertencem. Para diminuir o
índice de lacunas referentes a esta informação foi necessário recorrer ao sistema Google Search, ao
programa Google Earth, ao site dos Correios e ao catálogo telefônico Listel, os mesmos utilizados para
identificar os locais de moradia dos nubentes.
26
b) Região Limítrofe: residentes dos bairros que fazem fronteira com o bairro
onde está localizada a paróquia;
c) Cidade: residentes de outros bairros da cidade de Belém;
d) Zona Metropolitana: residentes das cidades que compõem a região
metropolitana de Belém;
e) Outras cidades, estados e países: residentes em áreas que não se identificam
com as anteriores;
f) Não declarados/não identificados: moradias não registradas ou que não
permitiram ser identificadas.
Através destas classificações é possível visualizar a distribuição das redes
matrimoniais influenciadas pela variável “origem” e “moradia”. Porém, de acordo com
a advertência de Levy & Pagliaro qualquer uma dessas classificações onde se propõe o
estabelecimento de áreas “seja região, seja microrregião, seja estado, para estudo de
certos dados demográficos globais, acarretam problemas de análise”. Segundo estas
autoras “[m]uitas vezes a partir de efeitos líquidos de processos contraditórios, se obtém
índices globais idênticos para situações que diferem radicalmente em seus aspectos
específicos”. Foi pensando nisso que a classificação sugerida não se restringiu apenas a
uma análise em conjunto, mas também segundo um recorte por bairros.
Tal processo permitiu que se atribuísse ao modelo investigativo à noção de
“homogamia 37 geográfica”, que surge de acordo com a necessidade de interpretar as
alianças surgidas a partir da associação estabelecidas entre os indivíduos tendo por
referência o espaço.
Como não houve a oportunidade de obter acesso a entrevistas, quer pelo tempo
escasso devido o dispendioso trabalho de elaboração do banco de dados ou por que isto
não correspondia aos objetivos pontuais desta fase da investigação, procurou-se
interpretar os nubentes em meio a esta homogamia tendo em vista que as suas escolhas
matrimoniais podem ser influenciadas não só pela origem comum mas também pela
idade e local de moradia. Assim é que foi produzida um reflexão sobre os diferentes
tipos de aliança (homogâmica ou heterogâmica) estabelecidas. Este procedimento
demandou fôlego, pois previa o cruzamento de diversas informações e a produção de
inúmeros gráficos e tabelas. A elaboração das mesmas resultou naquilo que
37
Vale ressaltar que o termo homogamia reflete uma “preferência dada em certos grupos ao casamento
com indivíduos da mesma raça, nacionalidade, classe, religião, profissão, etc” (NADALIN, S. O. A
demografia numa perspectiva histórica. Belo Horizonte: Abep, 1994).
27
38
Embora haja a possibilidade de concordar com o uso do termo não manifesto um compromisso pela sua
defesa, uma vez que o mesmo é empregado na academia sem que os seus usuários se reportem ao
significado da palavra “fichamento”. Para problematizar esta questão Lakatos & Marconi desenvolvem o
conceito de “ficha”, e dizem que o mesmo tem por função receber a descrição do material analisado (quer
seja bibliográfica, citação, resumo ou de conteúdo, esboço, comentário ou analítica). Por tanto o
pesquisador elabora e utiliza fichas, já “fichamento” é o ato de fazer as fichas (LAKATOS, E.M.;
MARCONI, M. A. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1989). Contudo durante a pesquisa foi
desenvolvida uma estratégia que remonta aos anos de graduação que ainda não pude identificar nos
manuais de metodologia e que ocorre com o exercício de fichamento do livro, absorvendo com isso as
interpretações surgidas na ocasião da leitura e inseridas em espaços destinados a este procedimento, que
se denomina “mapa conceitual”.
28
CAPÍTULO II
ESPAÇOS
30
2.1.1 Belém
Por estar inserida às margens da maior bacia hidrográfica do mundo, a do
Amazonas, e ser considerada a maior cidade da região Norte brasileira, Belém, com
seus círios, festejos e santos, é um dos principais eixos de interlocução entre as regiões
sul, sudeste, nordeste e centro-oeste do país. Segundo o AEMB Belém possui uma área
territorial de 1.065,30 Km² e é ocupada atualmente por uma população de cerca de 1
280 614 habitantes, dos quais 608 253 são homens e 672 361 são mulheres 39.
Tendo em conta este perfil é que podemos considerar esta capital como uma das
metrópoles mais densamente ocupadas do Brasil, sobretudo por que o seu índice de
densidade demográfica, que é de 1 301,49 hab./km², tem variado em cerca de 8% 40 nos
últimos cinco anos e encontra-se na faixa limite entre 200 hab/km² a 12 901,465
hab/km² calculada pelo IBGE quando este refere tal estudo as grandes metrópoles
brasileiras. Aliás, no período entre 1991 e 2000 a população de Belém, segundo
39
ANUÁRIO ESTATÍSTICO DO MUNICÍPIO DE BELÉM, v. 11, 2006 – Belém: Secretaria Municipal
de Coordenação Geral do Planejamento e Gestão, 2006.
40
Tabela 2: Densidade demográfica do município de Belém: (2000-2005)
ANOS DENSIDADE(hab./km²)
2000 1 196,72
2001 (1) 1 244,36
2002 (1) 1 241,61
2003 (1) 1 259,93
2004 (1) 1 301,49
2005 (1) 1 301,49
FONTE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
Elaborado: SEPOF/DIEPI/GEDE
(1) População estimada.
31
Baeninger (apud Pasternak e Bógus) 41, cresceu a uma taxa de 3,4% a.a., uma das
maiores do país. Esse crescimento foi, sobretudo incrementado pela imigração ocorrida
desde a década de 1970 em seu interior 42.
Deve-se considerar, contudo, que os dados sobre densidade não pretender tornar
homogêneo o espaço em questão, uma vez que o Guamá, para citarmos como exemplo,
embora seja o bairro mais populoso da cidade por conta dos seus 102 124 habitantes,
possui uma demografia muito diferente daquela observada em bairros como o Curió-
Utinga, cuja área é sete vezes maior que a sua (29 897,06 Km² versus 4 127,78 Km²),
muito embora possua uma população de apenas 18 892 habitantes.
41
PASTERNAK, S.; BOGUS, L. M. M. Migração na metrópole. São Paulo Perspec., São
Paulo, v.19, n.4, 2005.
42
BRITO, F. O deslocamento da população brasileira para as metrópoles. Estudos Avançados, 20 (57),
2006
32
A paróquia de São Pedro, que registrou 304 casamentos entre 1995 e 2006, está
localizada no bairro do Guamá, o mais densamente povoado da cidade, concentrando
em seu interior 102 124 mil habitantes, ou 8% da população de Belém. Segundo o
Anuário Estatístico do Município de Belém 43 (AEMB) sua população encontra-se
distribuída entre 52 084 homens e 49 040 mulheres.
Este bairro está situado às margens do rio de mesmo nome e faz fronteira com os
bairros da Condor, Cremação, Universitário, Terra-Firme, Canudos e São Brás. Possui
área de 4 127,78 Km². Em termos geográficos é o mais importante do chamado Distrito
Administrativo do Guamá, muito embora do ponto de vista urbanístico seja um dos que
menos é alcançado pelas ações da municipalidade.
É um bairro com poucas ruas asfaltadas em relação à sua extensa área
geográfica, por sinal somente aquelas pelas quais circulam carros e ônibus em direção á
sua agitada feira ou à Universidade Federal, como a Bernardo Sayão, Barão de Mamoré
e José Bonifácio; as outras vias, em geral distribuídas entre passagens e vilas, recebem
apenas uma camada superficial de pinche ou piçarra. A área em que está localizado o
bairro, aliás, por possuir grande quantidade de córregos e canais e forçar a sua
população a construir passarelas de madeira, apresenta dados de infraestrutura urbana
que abrangem a métrica das pontes existentes em seu interior e que chegam a ocupar
cerca de 1 063,2 m² de sua área territorial.
De sua população total, 19 425 habitantes são responsáveis pelos domicílios
particulares; o valor do rendimento nominal médio mensal dessas pessoas é de R$ 555,
24. O que indica uma população com renda média de pouco mais de um salário
mínimo 44.
Do ponto de vista educacional o Guamá é um bairro que concentra um
percentual significativo de população analfabeta, ou seja, 11,3%. Os 88,7% da
população com mais de 5 anos de idade alfabetizada encontram-se assim distribuídos:
43
AEMB, p.119.
44
O salário base tomado como mínimo é o de registro em carteira, que equivale em moeda corrente a R$
380,00.
35
FONTE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE / Censo Demográfico 2000
Esta tabela indica que grande parte da população alfabetizada do Guamá possui,
em cerca de 32,6%, entre 4 e 7 anos de estudo, o equivalente ao ensino fundamental 45.
As pessoas sem instrução e com menos de 1 ano de estudo representam 8,5%. Cerca de
18,3% da população possui entre 1 a 3 anos de estudos. Com 8 a 10 anos de estudo
estão 17,9% da população, percentual semelhante (17,8%) da população que possui
entre 11 e 14 anos de estudo. Sendo assim menos de 5% dos habitantes alfabetizados do
Guamá possui 15 anos ou mais de estudo. Este contexto educacional indica uma
população com nível instrucional relativamente baixo.
No que diz respeito à infra-estrutura urbana, o que já foi destacado
anteriormente, o bairro do Guamá está imerso numa grande bacia hidrográfica formada
por córregos, canais e igarapés. Um dos mais importantes é o que margeia a Avenida
Bernardo Sayão em toda a sua extensão. Por ali, além de circular boa parte da
população que habita o bairro, verifica-se o despejamento de grande quantidade dejetos
produzidos ora pelas residências que ocupam a sua margem ora pela rede de drenagem
que envolve o bairro. Podemos ter noção do saneamento da região tomando como fonte
para análise a seguinte tabela:
45
Os níveis de escolaridade se farão medidos pelo previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (n°
9394/96) através do seu artigo 21. Segundo este a educação escolar compõe-se de: I-educação básica,
formada pela educação infantil, ensino fundamental [antigo primeiro grau] e ensino médio [antigo
segundo grau]; e II-educação superior). Brasil. Lei nº 9.394 – 20 dez. 1996, Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB). Disponível no site http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf
36
46
AEMB, p. 172.
47
Há de se considerar que a presença do poço é um indicativo ambíguo de urbanização, visto que pode
tanto revelar a existência de um sistema rudimentar de abastecimento, como no caso de domicílio que
“puxam água do poço” através de baldes ou latas d’agua, como também evidenciar a presença de um
sistema hidráulico-elétrico de sucção de água dos lençóis freáticos através de bombas instaladas em poços
de “barreira” ou “artesiano”.
37
48
Está área inicial da cidade é representada pelos bairros da cidade Velha e da Campina, que foram os
primeiros a serem ocupados quando da invasão e colonização de Belém a partir de 1616.
38
Ao contrário do que ocorre no Guamá este bairro possui grande parte de suas
vias, incluindo as de menor circulação, asfaltadas. Os canais, como os da Pirajá são
canalizados, e resultam do processo de macro-drenagem da Bacia do Una ocorrida ao
longo da década de 1990.
As 14 893 pessoas que habitam o mesmo e são responsáveis pelos domicílios
particulares permanentes possuem uma renda nominal média de R$ 982,57, isto é, cerca
de mais de dois salários mínimo. Sua população conta com 94% de pessoas
alfabetizadas e 6% de analfabetos com cinco anos ou mais de idade. Os alfabetizados
encontram-se destacados da seguinte forma:
Nela é possível observar que, embora a grande parte dos domicílios particulares,
cerca de 44%, possuam fossas sépticas estas estão integradas a um sistema de esgoto
que atende 40% dos domicílios particulares existentes no bairro. Contudo fossas
rudimentares, valas, rio, lago, mar ou outro tipo de escoadouro e a ausência de banheiro
ou sanitário, juntos, ainda correspondem a 16% dos meios alternativos de evacuação
dos dejetos produzidos pela população que habita o bairro.
Tomando nota do que ocorre no Bairro do Guamá o que se observa na Pedreira é
uma diferença urbanística no sentido da melhoria dos quadros de esgotamento sanitário
dos domicílios, justamente por que neste último observa-se a presença acentuada de
uma rede geral de esgoto e fossas sépticas.
No que tange o abastecimento de água dos domicílios do Bairro verifica-se que o
mesmo é canalizado em cerca de 86,3% das residência, enquanto apenas 13,7% dos
domicílios é abastecido por meio de poços, nascentes ou outras formas de captação e
distribuição de água 49.
49
Informação retirada do AEMB, p.173).
40
Uma significativa parcela da população que habita o bairro de São Brás (cerca
de 35%) possui de 11 a 14 anos de estudo, proporção ligeiramente superior àquela com
nível instrucional que possui 15 ano ou mais de anos de estudo (33,7%). 16% possuem
de 4 a 7 anos de estudo, 3,7% estão concentrados no intervalo de 1 a 3 anos de estudo e
50
Em São Brás as pessoas com rendimento e que são responsáveis pelos domicílios particulares
permanentes são representados por 4.774 habitantes.
42
a penas 0,7% da população habitante do bairro não possui instrução ou menos de 1 ano
de estudo. Neste sentido obtém-se a informação de que sua população possui o mais
elevado nível de instrução dentre os bairros até aqui investigados.
Passando à ênfase sobre os recursos urbanísticos de esgotamento existentes no
bairro de São Brás observamos a singularidade de que neste bairro há uma grande
quantidade de domicílios com rede de esgoto ou fossa séptica, o que revela a ocorrência
de um elevado padrão de higienização do espaço privado e também público, também
por que é inexpressiva a presença de valas ou fossas rudimentares. A tabela e as
informações a seguir permitem dar conta destas considerações.
canalizado, enquanto apenas 13% são servidos por poços, nascentes ou outras formas de
abastecimento.
***
Ao analisar a estrutura sócio espacial dos bairros no que diz respeito à
demografia, renda, nível instrucional e rede de esgotamento sanitário e de
abastecimento de água foi possível observar a estrutura demográfica e o contexto
urbano em que estão inseridas as paróquias, e neste sentido verificaram-se algumas
semelhanças e muitas diferenças.
Observou-se, por exemplo, que o Guamá não só é o maior dentre os três bairros
como também é o mais populoso e o mais densamente povoado. O bairro da Pedreira
intercala-se entre este e o de São Brás por possuir tanto a segunda maior área como ser
habitado pela segunda maior população dentre os três bairros analisados. Sendo assim, o
bairro de São Brás é tanto o menor como o que possui o menor número de habitantes.
Tendo em conta que “as informações censitárias referentes à renda familiar
permitem uma caracterização mais incisiva das condições de vida da população
urbana” 51 observou-se que São Brás possui a população com o maior rendimento
nominal médio, que chega a ser 2,3 vezes maior que o da população da Pedreira e 4,1
vezes maior que a dos que habitam o bairro do Guamá. Neste sentido a população da
Pedreira possui renda superior cerca 1,7 vezes maior que a do bairro do Guamá. Assim
é possível perceber que dos três bairros destacados São Brás é o que possui melhor nível
de renda, a Pedreira é o segundo e o Guamá o último.
No que tange a educação observou-se que a maior concentração de população
analfabeta está situada no bairro do Guamá e que esta é dobro da população analfabeta
existente no bairro da Pedreira e 3,7 vezes maior do que esta existente no bairro de são
Brás.
Dentre os dados referentes à população escolarizada nota-se a elevada taxa de
pessoas sem instrução ou com menos de 1 ano de estudo habitando o bairro do Guamá
que chegar a ser 2 vezes maior que os que com esta condição habitam o bairro da
Pedreira e 12,1 vezes maior dentre aqueles que habitam São Brás.
Em relação à população que possui de 1 a 3 e 4 a 7 anos de estudo, o que seria
equivalente ao ensino fundamental, observa-se que as maiores concentrações de
população com este nível de instrução habita o bairro do Guamá, por sinal, representam
51
MARTINE, G.; TURCHI, L. A urbanização da Amazônia: realidade e significado. In. Anais do VI
Encontro de Estudos Populacionais (ABEP). Olinda,1988, v.2, p.161-190.
44
52
Vale considerar que, se analisados somente os dados relativos à população com 15 anos de estudo ou
mais, esta diferença aumenta mostrando que a população de São Brás situada neste intervalo é o dobro
daquela existente na Pedreira e cerca de 7 vezes maior que a do Guamá.
45
dos dados ou possui pouca renda para a construção de fossas sépticas ou é pouco
atendida pela rede municipal de saneamento.
Neste sentido desponta a conclusão de que São Brás é o bairro que oferece a
melhor rede de saneamento a sua população, portanto é o mais urbanizado, enquanto a
Pedreira assim o é em menor escala e o Guamá, que apresenta um elevado índice de
privação deste recurso junto a sua população o que a obriga a construir sistemas
alternativos de esgotamento sanitário adaptados a rede hídrica, é o menos urbanizado.
Por último o sistema de abastecimento é relativamente eficaz em todos os três
bairros, devido os mesmos serem atendidos em mais de 80% dos casos, com a diferença
de que o bairro do Guamá é o mais bem assistido pela rede pública. Contudo deve-se
levar em conta que a proporção de poços ou fontes de abastecimento de água existentes
nos bairros da Pedreira e de São Brás não significam o reflexo da ausência de
urbanização, mas sim a possível presença de um elevada qualidade de vida, já que estes
poços são em geral artesianos 53 e servem para abastecer edifícios e domicílios
particulares.
53
Poço artesiano é semelhante a um poço convencional (ou “poço de barreira”) e é assim denominado
quando as águas fluem naturalmente do solo, sem a necessidade de bombeamento. Geralmente a sua
profundidade é maior que a de um poço convencional, e em geral suas águas são mais puras e muito ricas
em sais minerais.
46
CAPÍTULO III
TEMPOS
47
De acordo com esta tabela 55, que aborda os casamentos civis ocorridos no
município de Belém no período entre 1999 e 2004 percebe-se um aumento de cerca de
33,7% no número de alianças. O pico desse movimento encontra-se situado no ano de
2001 que chegou a registrar 4618 casamentos civis, número cerca de 42,5% superior ao
54
BASSANEZI, A. M. C. O casamento na colônia no tempo do café. Anais do VI Encontro de Estudos
Populacionais (ABEP), Olinda, 1988, v. 1, pp. 109-154, p. 146.
55
Embora a pesquisa aborde o matrimônio religioso católico como referência principal para esta análise
adotou-se esta fonte para que se possa entender o fenômeno matrimonial em Belém do ponto de vista de
sua expressão demográfica.
48
56
NADALIN (2004), op. cit. p. 89.
49
57
As questões que podem ser postas à discussão com estes percentuais são: o que marca a escolha do mês
mais apropriado para o casamento? E o que isto significa diante do arranjo matrimonial observado? Os
trabalhos de CAMPOS (Casamento e família em São Paulo Colonial: caminhos e descaminhos. São
Paulo: Paz e Terra, 2003) e Nadalin (1994, op. cit.) apontam para a existência de uma
preferência/resistência marcada, primeiramente, pela concepção religiosa envolvendo o tempo e, segundo,
pela posição/condição social dos contraentes no ciclo temporal determinado pela relação entre cultura e
natureza e o simbolismo do profano e do sagrado. Segundo estes o mês de abril, por exemplo, é, do ponto
de vista religioso, pouco atraente para o casamento devido estar envolvido pelo período do advento
(páscoa), isto é, tempo de reclusão espiritual e carnal, portanto impróprio para os inevitáveis festejos que
prosseguem a este tipo de ritual. Da mesma forma Marcílio (1977, op. cit.) aponta para o fato de que o
movimento sazonal dos casamentos a partir quantificação e da cartografia realizada pela Demografia
Histórica encontrava-se em íntima relação com a concepção cristã de que o período entre o Advento e a
Quaresma era um “tempo proibido”, ou seja, uma época em que deveriam ser evitados os casamentos e as
práticas sexuais. Também Nauffal Filho e Andreazza ao abordarem a obra de Gautier e Henry observam
que “em função da interdição religiosa de se casar durante a Quaresma e durante o Advento, existiam
muito poucos casamentos em março e abril e quase nenhum em dezembro. Os casamentos eram
celebrados em fevereiro e em novembro; entre estes dois picos maiores, situa-se o pico agudo de julho
precedendo a crise dos meses de grande trabalho” (NAUFFAL FILHO, Fernando; ANDREAZZA, Maria
Luiza. Tempo do sagrado e dia de casar. In: Anais - IX Encontro de Estudos Populacionais. ABEP: Belo
Horizonte, 1994. v. 1).
51
Contudo, estas considerações devem ser pontuadas tendo em conta o fato de que
as mesmas representam à média geral do que fora analisado. O que significa dizer que
os meses, ora preferidos ora rejeitados para a realização do enlace, variam entre uma
paróquia e outra, pois correspondem a escolha cultural dos grupos envolvidos por ela.
Por exemplo, no caso do mês de dezembro, tido como preferencial segundo a análise
geral dos registros de casamento, isto é verdade apenas entre os nubentes de SFA, que o
selecionam em 26,6% dos casos, seguido de Junho, que representou 13,4% 58. O mesmo
não ocorre nas paróquais de NSCA e SPSP, pois o mês de dezembro é tanto numa
quanto na outra a segunda opção (20,7% na primeira e 27,6% na segunda). Na
paróquias de NSCA o mês preferência em 22% dos casos é Outubro, enquanto na
paróquia de SPSP a preferência se dá pelo mês de Maio em 45% dos casos.
58
Isto se dá, sobretudo, por conseqüência do peso proporcional de sua população. A mesma por
representar mais da metade da população matrimonial total investigada (51,4%) influencia na média dos
dados obtidos quando analisados em conjunto com os oriundos das outras duas paróquias.
52
59
É possível que talvez a paróquia não realize casamentos neste dia em função da missa. Portanto casar
em um dia ou noutro não é uma escolha dos cônjuges e sim da administração da paróquia.
53
Neste sentido pretende-se entender é a relação estabelecida entre os nubentes no que diz
respeito as suas respectivas idades no contexto social de Belém. Isto é, com que idade
homens e mulheres estão casando em Belém? Prevalece algum tipo de homogamia
nestes casamentos? Ou, no caso de alianças heterogamicas, prevalece algum tipo de
relação? Há alguma semelhança entre as três paróquias no que diz respeito a análise
destes resultados? E no que elas diferem?
Tendo em conta a emergência destes questionamentos é que se fez necessária a
elaboração da seguinte tabela:
60
Refiro-me ao procedimento adotado pelo pesquisador no qual o resultado de sua análise depende de
fontes secundárias e não de uma inserção no campo investigado.
61
CONCEIÇÃO, 2004, op. cit.
54
% 3,5 25,1 31,1 18,2 10,0 4,5 3,0 1,5 2,4 0,7 0,0 100,0
% 14,0 31,1 24,8 14,1 6,8 2,9 2,4 1,3 2,1 0,1 0,4 100,0
Fonte: Livros de Casamento das paróquias
62
O intervalo “14 a 73 anos” é composto por nove séries, cada uma representando uma faixa etária de
cerca de 5 anos à exceção das que envolvem as séries de “14 a 20 anos”, “56 a 73 anos” e “mais de 73
anos”. A primeira por que abrange a população feminina que historicamente realiza seu matrimônio com
idades bastante inferiores aos dos homens (no caso do Brasil ver BERQUÓ, E. Arranjos familiares no
Brasil: uma visão demográfica. In: SCHWARCS, L. M. [Org.]. História da Vida Privada no Brasil, v. 4.
São Paulo: Companhia das Letras, 1998; para Belém ver Cancela (2006, op. cit.). A segunda e a terceira
por que abrangem uma população pouco expressiva em termos percentuais, mas não menos significativa
quando se busca entender a longevidade dos nubentes.
63
Guttentag e Secord (apud Greene & Rao) atribuem a diferença de idade entre o homem e a mulher às
relações de poder entre os dois sexos. Segundo as autoras “estas relações de poder resultam de uma
mistura de influencias duais e estruturais. As forças duais referem-se às dinâmicas entre os sexos criada
pela oferta relativa de homens e mulheres. As influencias estruturais refletem o status relativo dos dois
sexos na sociedade. È este status que determina o fato de que, no mundo inteiro, os maridos são em geral
mais velhos do que as mulheres” (GREENE, M.; RAO, V. "A compressão do mercado matrimonial e o
55
Esta diferença entre as idades dos nubentes ao casar também pode ser analisada
tendo em conta a descrição do perfil dos casamentos no que diz respeito ao percentual
de homens e mulheres que possuíam idade superior ou igual a do nubente no ato do
matrimônio.
aumento das uniões consensuais no Brasil". Revista Brasileira de Estudos de População (ABEP), v. 9
[2], 1992, p. 169.).
56
assim o fazem. Este percentual entre os homens é o mais significativo dentre as faixas
etárias analisadas, o que indica entre eles uma preferência pelo casamento neste período
da vida.
A proporção de homens com idade entre 31 e 35 anos também é superior ao de
mulheres nesta mesma faixa etária (eles representam 18,1% da amostra e elas 14%).
Fenômeno que se repete sucessivamente até o fim do intervalo entre aqueles que casam
com idades entre 36 e 40 anos (10% versus 6,8%(, 41 e 45 anos (4,5% versus 2,9%), 46
e 50 anos (3,1% versus 2,4%), 51 e 55 anos (1,4% versus 1,3%), 56 e 73 anos (2,5% e
2,1%) e acima de 74 anos período no qual foi possível observar 11 homens casando e
apenas 2 mulheres.
Superpondo estes percentuais chaga-se ao seguinte gráfico:
Com este gráfico é possível verificar que o pico de casamentos entre os nubentes
ocorre entre os 21 e os 30 anos, o que é indicativo de período preferencial para o enlace.
Contudo comparando esta informação chega-se a conclusão que o pico inicial
corresponde a um período relativo às mulheres, enquanto o segundo aos homens. Isto
significa dizer que embora este período da vida seja entendido por ambos como
preferencial para o casamento o mesmo está condicionado pela relação que ambos os
gêneros estabelecem com o tempo, através das condições em que estão estabelecidos ou
das interpretações que possuem acerca dele. Para os homens é interessante casar
próximo aos 30 anos, já as mulheres antecipam este fenômeno para uma idade próxima
aos 21 anos.
57
Embora haja uma grande oscilação o gráfico acima demonstra que entre as
mulheres a faixa etária com proporção significativa de nubentes inicia-se aos 21 anos e
se estende até os 32 anos. A parti daí a tendência é reduzir a freqüência de mulheres
casando na mesma proporção em que estas avançam na idade. Entre os homens a
oscilação também é significativa, mas a região de maior freqüência encontra-se
localizada no intervalo entre os 24 e os 26 anos. Embora o gráfico permita considerar
uma ascendência na linha que representa a freqüência de homens casando a partir dos
18 anos observa-se que a mesma decresce entre aqueles que casam aos 25 anos. A partir
dos 26 anos a tendência é haver uma queda na proporção de homens casando da mesma
forma que a existente entre as mulheres, com a diferença de que em cada idade na
58
maioria dos casos há sempre mais homens casando do que mulheres na mesma idade.
Dois picos podem ser observados entre eles neste processo, aos 37 anos e aos 42 anos,
já entre elas chama atenção o picos referente aos 41 anos.
No que diz respeito aos homens a freqüência se eleva a partir dos 19 anos até os
31 anos. Nesse intervalo dois picos são expressivos:aos 26 e aos 28 anos,
respectivamente. A partir dos 31 anos a tendência é de que haja entre os homens um
decréscimo no número de casamentos, embora com 35 anos hajam homens casando em
proporções maiores que as existentes no decorrer deste processo.
***
NSCA e SFA a diferença entre estas oscilações foi de dois anos, aos 23 e 25 anos para a
primeira e aos 21 e 23 anos para a segunda. Esta constatação pode indicar que ao longo
de uma faixa etária a idade preferencial para o casamento pode variar entre uma
população e outra.
cultural que faz com que os primeiros adiem o período do seu casamento, enquanto
entre as mulheres isto é antecipado.
Tendo em conta o mapa a seguir onde estão distribuídos percentualmente os
índices de casamentos verifica-se que a maior parte dos casamentos homogâmicos se
concentra na faixa etária de 21 a 25 anos com 13%, seguido dos que ocorrem entre
nubentes que estão na faixa etária entre 26 e 30 anos, com 11,1%. Dentre os casamentos
que não são homogâmicos quanto a faixa etária chama atenção aqueles que envolvem
homens entre 21 e 25 anos com mulheres com idade entre 14 e 20 anos (eles
representam 7% do total analisado), homens entre 26 e 30 anos com mulheres entre 21 e
25 anos (12%) e homens entre 31 e 35 anos com mulheres entre 26 e 30 anos (6%).
CAPÍTULO IV
MIGRAÇÃO E ORIGEM
63
64
NADALIN (1994), op. cit.
65
MARTINE, G. Os dados censitários sobre migrações internas: evolução e utilização, in:
Censo, Consenso e contrasensos, III Seminário Metodológico dos Censos Demográficos
(ABEP), Ouro Preto, 1984, pp. 183-211.
64
[a] rigidez da estratificação social no Brasil é tão grande que para “melhorar de vida” ou
“ascender socialmente”, para uma grande maioria da população, sempre esteve
associado à migração ou, melhor ainda, só era possível com a migração. Uma trajetória
migratória se fundamenta nesta cultura’ (Durhan, 1984). A cultura migratória faz a
intermediação entre as trajetórias estruturadas social e economicamente e o nível da
decisão individual de migrar. Mesmo que no processo de decisão esteja envolvida uma
forma de alienação, em função da ilusão migratória, deve ficar claro que as migrações
não são um processo exclusivamente determinado pelas necessidades estruturais da
sociedade e da economia e pelas imposições políticas do Estado. Os migrantes não
passeiam ‘inconscientes’ pelas trajetórias migratórias, podem até fazê-lo, de um certo
modo, em função da ilusão migratória ou da enorme adversidade social no lugar de
origem, mas não são, somente, marionetes nas mãos dos desígnios estruturais 66.
66
LIMA, L. C.; VALE, A. L. F. Migração e mudança social: a influência do migrante so dertão
nordestino no Norte do Brasil. In: Scripta Nova. Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales,
Barcelona, n. 94 (82), 2001. (pp.3-4).
4
“Grande parte dos estudos sobre a migração interna se utilizam dos fatores de expulsão e atração da
população como explicação teórica dos fluxos migratórios” (MATOS, R.; BRAGA, F.; Redes Sociais,
Redes Territoriais e Migrações. XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais [ABEP], Caxambú
/Minas Gerais, Setembro de 2004, p. 4). De acordo com OSÓRIO “[a] abordagem concebida para
compreender as migrações [...] admite que essas são associadas às oportunidades entre as existentes na
origem e as existentes no destino, devendo-se interpretar conjuntamente os fatores expulsivos na origem
dos fluxos e os fatores atrativos no destino, haja vista que ambos desempenham uma função específica e
recíproca na determinação dos fluxos e nas suas características. A abordagem é condizente dom a
orientação de um importante documento oficial que recomenda ‘não considerar os momentos específicos
do processo migratório (expulsão ou atração) em separado’” (OSÓRIO, C.. Migrações recentes e
desigualdades. Anais do I Encontro Nacional da ABEP, Campos do Jordão, 1978, p. 606).
68
OLIVEIRA, K. F.; JANNUZZI, P. M. Motivos para migração no Brasil e retorno ao nordeste:
padrões etários, por sexo e origem/destino. São Paulo Perspec., São Paulo, v. 19, n. 4, 2005.
69
Op. cit.
65
70
“Nesse entendimento da Amazônia como um espaço de natureza opulenta e terra fértil, espaço que, por
essas qualidades, poderia garantir o sucesso do migrante que resolvesse instalar-se na região, temos a
construção de uma imagem da Amazônia que correu pelo Ceará e que, sem dúvida, influenciou na
decisão de muitos cearenses no sentido de deixar ou não o seu lugar de origem” (LACERDA, F. G. Entre
o sertão e a floresta: natureza, cultura e experiências sociais de migrantes cearenses na Amazônia [1889-
1916]. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 26, nº 51. p. 216).
71
Se “lá” a seca ocultava uma realidade de exclusão social devido à concentração das terras pelos
latifundiários, “aqui” as enchentes e os alagamentos da região de várzea ocultavam a realidade de uma
migração que levou a população nordestina a ocupar as áreas menos urbanizadas e distantes do centro de
Belém. (LACERDA, Op. Cit.).
72
Padrão migratório é considerado o “modo como se dá a articulação entre as trajetórias migratórias e o
contexto histórico dentro do qual elas estão estruturadas para atender as necessidades da dinâmica
demográfica, econômica, social e política” (BRITO, F.; GARCIA, R. A.; VIEIRA DE SOUZA, R. G. As
tendências recentes das migrações interestaduais e o padrão migratório. In: Anais do XIV Encontro
Nacional de Estudos Populacionais [ABEP], Caxambu, Setembro de 2004, p.3.)
73
FAISSOL, S. Aspectos formais do Estudo de migrações internas. In: Anais do I Encontro Nacional de
estudos populacionais (ABEP), Campos do Jordão / São Paulo, 1978, p. 11.
74
BASSANEZI (2000), op. cit., p.1
66
aquele que se estabelece permanentemente no local de destino 75. O IBGE, que no Brasil
é a instituição por excelência que melhor aborda o conceito, tem atribuído ao termo
diferentes significados ao longo dos respectivos e periódicos censos que aplica.
No tocante a esta investigação o migrante, seja ele homem ou mulher, foi
identificado através do item origem contido nos livros de casamento das paróquias. A
validade dos mesmos, como primeira condição para derivar uma interpretação, permitiu
identificar que as informações obtidas são procedentes para a discussão que segue na
medida em que são válidas em 95% do total investigado.
Analisando a partir dessa origem a proporção de homens e mulheres que
casaram nas três paróquias, chega-se a conclusão que cerca de 66,7% dos homens e
70% das mulheres, isto é, mais de 2/3 dos nubentes, nasceram Belém, 23,3% dos
homens e 23,5% das mulheres tem origem em alguma cidade do interior do estado do
Pará, 9,3% de homens e 6,5% de mulheres são provenientes de outros estados da
federação e apenas 0,7% dos homens são oriundos de outros países. Em relação a este
último item descobriu-se que não houveram mulheres de outros países casando nestas
paróquias.
75
Nos Censos Demográficos do Brasil de 1960 e 1970, por exemplo, as questões foram direcionadas aos
que não haviam nascido no município de residência na data do Censo, ou seja, apenas aos não-naturais
dos municípios. Já no Censo de 1980 a investigação não se limitou aos não naturais, e além das
migrações intermuncipais perguntou-se também sobre as intramunicipais, porém sem inquirir sobre o
tempo e quem se deu o evento. No caso das estimativas da migração através de técnica indireta feita pelo
IBGE o conceito de migrante depende dos locais de residência nas duas datas limites do período
analisado (RIGOTTI, J. I. R; CARVALHO, J. A. M. Análise das metodologias de mensuração das
migrações. In: Anais do I Encontro Nacional sobre Migrações [ABEP], Curitiba, 1997, pp. 211-2).
67
PARÓQUIA (Bairro)
SPSP NSCA SFA
ORIGEM
(Guamá) (Pedreira) (São Brás)
HOMEM MULHER HOMEM MULHER HOMEM MULHER
Belém 60,4 60,4 69,2 75,1 67,6 70,7
Interior 32,4 35,6 22,4 19,4 20,4 21,2
Nacional 7,2 4,0 7,8 5,5 11,0 8,1
Estrangeiro 0,0 0,0 0,6 0,0 1,0 0,0
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: Livros de casamento das paróquias NSCA, SPSP e SFA (Belém, 1995-2006).
De acordo com a tabela acima, ao propor-se uma análise sobre a proporção dos
nubentes a partir de um recorte sobre a migração constata-se que em relação a cada uma
das regiões de origem existem resultados por bairro e paróquia que precisam ser
salientados. Por exemplo:
• A naturalidade dos nubentes é proporcionalmente igual entre as paróquias,
apenas alterando-se quando avaliada segundo o gênero;
• A tendência para o casamento nas paróquias envolver sempre um percentual
superior de mulheres ao de homens com origem em Belém;
• No entanto as proporções de nubentes que nasceram e se casaram em Belém
são superiores nas paróquias de SFA e NSCA em relação aos que casaram na
paróquia de SPSP;
• O percentual de 75,1% de mulheres (¾ do total) nascidas em Belém e que se
casaram na paróquia de NSCA é o maior dentre todos os analisados.
68
76
No caso do bairro do Guamá, que pelo explicitado até aqui tende a ser o menos urbanizado dentre os
bairros investigados, podemos perceber que a maior proporção de migrantes de município do interior do
Pará indica a existência de uma opção por parte desta população em ocupá-lo. O que o distingue dos
outros bairros é que este processo se dá produzindo uma “periferização da população residente”, à
maneira como afirma PASTERNAK & BÓGUS (2005), op. cit. Para Faria os espaços urbanos
periferizados, sobretudo após o levante migratório de décadas anteriores, explicaria a inchação do
terciário e a marginalidade ocupacional existente nas metrópoles brasileiras (FARIA, V. O processo de
urbanização no Brasil: algumas notas para seu estudo e interpretação. In: Anais do I Encontro Nacional
de Estudos Populacionais (ABEP), Campos do Jordão / São Paulo, 1978).
77
Posteriormente será analisada a estrutura das alianças com a finalidade de entender se há ou não uma
preferência por parte dos nubentes pelo casamento com um ou outro migrante (homogamia geográfica).
69
a maioria, esses nubentes naturais de Belém não seriam filhos de migrantes? Ou, qual o
tempo de residência dos migrantes nesta cidade?
Responder estas questões ajudaria a entender quando e como estes sujeitos se
estabeleceram na cidade e também de que forma se inseriram no fenômeno matrimonial
que aí existe. Esta inserção daria condições para que fosse possível compreender os
respectivos espaços em que foram socializados esses indivíduos e como os mesmos
estabeleceram a seleção dos seus pares. Ma para que isto ocorra Faria adverte que o
estudo destes tipos de fenômenos exigem
esforços [na] construção de objetos de conhecimento que articulem conjuntos de
determinações pertinentes para a apreensão do urbano e análise de situações urbanas
particulares e concretas, onde a capacidade da prática científica de produzir ‘o concreto
como síntese de múltiplas determinações’ realiza-se e testa-se. [É necessário] uma
análise de situações urbanas concretas a partir de objetos teóricos bem definidos 78.
O casamento, neste sentido, por ser um fenômeno social concreto que permite a
observação das formas de articulação existentes na sociedade – através das alianças –
possibilita entender que o movimento demográfico existente hoje e estabelecido a partir
do contato entre os indivíduos é indicativo das formas como a sociedade se organiza no
espaço ao longo do tempo.
A proposta em recuar no tempo é importante por que ajuda a compreender
Belém como uma cidade que se urbanizou e condicionou aos seus espaços distintos
níveis de ocupação. É uma cidade, portanto que se re-elaborou com a população que a
ocupou ao longo de sua história, passando a ser considerada pela demografia brasileira
como uma dentre as metrópoles brasileiras que mais absorveu migrantes ao longo dos
últimos 30 anos 79.
A migração para Amazônia, vista à luz da transformação ocorrida no período
entre 1970 e a metade da década de 1980, passa a ser neste sentido um importante
recorte para entender como todo esse período influenciou a organização social desta
capital na atualidade. Foi naquele contexto que emergiu no Estado uma preocupação
pela ocupação das áreas consideradas “de fronteira”. Surgiram os Projetos de
78
Idem.
79
BRITO (2006), op. cit.
70
80
CUNHA, J.M.; BAENINGER, R. A migração nos Estados Brasileiros no período recente: principais
tendências e mudanças. A migração nos estados brasileiros, no período recente: principais tendências e
mudança. In: Encontro nacional sobre Migração, 2., Anais... Belo Horizonte: Abep, 2000. p. 117-165;
TOBIAS, A. J. Dinâmica migratória paraense no período 1981-1991. In: Anais do XIII Encontro da
Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP), Ouro Preto/Minas Gerais, 2002; MATOS, R.;
BRAGA, F., op. cit.; BRITO, F. et all., op. cit.; OSÓRIO, C., op. cit. e BRITO, F. O deslocamento da
população brasileira para as metrópoles. Estud. av. , São Paulo, v. 20, n. 57, 2006.
81
Hébette e Marin ao historiar o processo de ocupação na região da Belém-Brasília
durante a década de 60, mostravam que tanto a ocupação espontânea como a
colonização dirigida desembocavam no latifúndio; para os colonos, uma das alternativas
de sobrevivência mais comum era dirigir-se para as periferias das cidades amazônicas
(HÉBETTE, J.; ACEVEDO MARIN, R. E.. Mobilidade do Trabalho e Fronteira
Amazônica: A Belém-Brasília. In: Anais do II Encontro Nacional de Estudos
Populacionais (ABEP), São Paulo, 1981).
82
RODRIGUES, C. I. Vem do bairro do Jurunas: sociabilidade e construção de identidades entre
ribeirinhos em Belém – PA. (Tese) Doutorado em Antropologia, Centro de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Federal de Pernambuco, 2006.
83
BRITO, F.; SOUZA, J. Expansão urbana nas grandes metrópoles: o significado das migrações
intrametropolitanas e da mobilidade pendular na reprodução da pobreza. São Paulo Perspec., São
Paulo, v. 19, n. 4, 2005. Para Brito (2006 [op. cit.]) essa concentração da população nas cidades tem
haver com a grande expansão urbana no Brasil. Segundo ele este processo ocorreu na segunda metade do
século XX, quando a população das cidades superou a população rural; portanto “o rápido processo de
urbanização é um fenômeno estrutural relativamente recente, tendo o seu auge medido pela velocidade do
crescimento da população urbana, entre os anos 1950 e 1970” (BRITO [2006], op. cit. p. 222).
71
84
TOBIAS, op. cit., p. 9.
72
De acordo com esta tabela, onde são analisadas as origens dos nubentes quanto
às meso-regiões do Pará, pode-se perceber que predominam as migrações envolvendo
pessoas nascidas na região Nordeste do Estado. Dela migraram cerca de 65% dos
nubentes. Em segundo lugar estão os nascidos na região da ilha do Marajó que
correspondem a 12,5% dos migrantes. Em seguida os migrantes da região Metropolitana
de Belém representando cerca de 11,5% dos indivíduos. Os nascidos na região do
Baixo-Amazonas, com 7,6%, os da região Sudeste, com 2,1% constituem
respectivamente o quarto e o quinto grupo de migrantes do interior que mais estão
presentes nesta capital. E, por último, os que nasceram na região Sudoeste do Estado
que representam 1,3% dos nubentes que contraíram matrimônio nas três paróquias.
Ao serem verificadas as diferenças na proporção de nubentes que casaram em
uma outra paróquia e que são migrantes do interior do estado do Pará o que se percebe é
uma tendência de que migrantes da região Nordeste do Estado casem em maior
proporção na paróquia de SFA (69,6%), seguido dos que casaram na paróquia de SPSP
(62,2%) e NSCA (60,6%). Os que provêm da região do Marajó estabelecem suas
alianças em maiores proporções na paróquia de NSCA, em 17,2% dos casos, seguido
daqueles que o fazem nas paróquias de SPSP (13,3%) e SFA (9%). Os nubentes que
73
85
“À medida em que a urbanização vai se expandindo no território paraense, maior é a concentração de
fluxos migratórios com destino urbano e, via de regra, com destino à Metropolitana de Belém, mais
especificamente para o município de Belém” (TOBIAS, idem, p. 16).
86
Para Cunha & Baeninger “os dados sobre o volume e importância relativa da migração intra-estadual
sobre o conjunto dos movimentos intermunicipais não deixam lugar à dúvida quanto à sua crescente
importância na dinâmica demográfica dos estados, sobretudo nos anos 80. Assim, se na década de 70,
mas de 15,4 milhões de pessoas fizeram um movimento intra-estadual, representando 60,7% do total de
migrantes intermunicipais, na década seguinte esse número aumentou sua importância em todos os
sentidos: 16,7 milhões e 66,7% dos movimentos intermunicipais. Nos anos noventa, os dados da PNAD
95 apontam para um volume de mais de 6,7 milhões em cinco anos—ou quase 14 milhões na década,
supondo certa uniformidade no período—o que demonstra o fôlego desse tipo de movimento migratório”
(CUNHA, J.M.; BAENINGER, R. op. cit., p. 130).
74
e 2006 podem estar assentados nestes fluxos, e portanto podem ser relacionados com o a
migração ocorrida em Belém desde a década de 1980.
87
É bem provável que grande parte destas perdas populacionais se devam a uma absorção do fluxo
migratório por Belém. Isto por que segundo os dados de Tobias, quase a metade da população que circula
pelo interior do Pará, migra para esta capital.
75
TOTAL
REGIÃO Estado ou País HOMENS MULHERES TOTAL %
GERAL
AMAPÁ 14 16 30
AMAZONAS 12 8 20
RONDÔNIA 0 2 2
NORTE 55 21%
RORAIMA 1 0 1
TOCANTINS 0 1 1
ACRE 0 1 1
MARANHÃO 40 19 59
CEARÁ 12 11 23
PIAUI 12 9 18
PENAMBUCO 4 4 8
NORDESTE 119 47%
BAHIA 1 2 3
RIO GRANDE DO NORTE 1 1 2
PARAÍBA 2 0 2
ALAGOAS 1 0 1
DISTRITO FEDERAL 4 2 6
CENTRO-
GOIÁS 2 0 2 11 4%
OESTE
MATO GROSSO 3 0 3
RIO DE JANEIRO 21 14 35
SÃO PAULO 6 3 9
SUDESTE 50 19%
MINAS GERAIS 3 2 5
ESPÍRITO SANTO 0 1 1
PARANÁ 3 1 4
SUL RIO GRANDE DO SUL 2 2 4 10 4%
SANTA CATARINA 1 1 2
ESTADOS UNIDOS 2 0 2
FRANÇA 2 0 2
ARGENTINA 2 0 2
LIBANO 1 0 1
EXTERIOR IRAN 1 0 1 12 5%
CABO VERDE 1 0 1
ALEMANHA 1 0 1
ITÁLIA 1 0 1
PORTUGAL 1 0 1
TOTAL 157 96 253 100%
% 62% 38%
Fonte: Livros de Casamento das Paróquias SPSP, NSCA e SFA (Belém, 1995-2006).
88
Estes além de representar metade da população migrante da região Nordeste, estabeleceram suas uniões
nos bairros de São Brás e do Guamá em 76% dos casos.
89
50% eram maranhenses, 19% cearenses e 17% piauienses
78
Paróquia-Bairro
H M H M H M
CENTRO-OESTE 9% 0% 8% 0% 5% 3%
SUL 0% 0% 3% 4% 6% 5%
ESTRANGEIRO 0% 0% 1% 0% 1% 0%
Com ela é possível afirmar que a proporção de nubentes casando numa ou noutra
paróquia está diretamente relacionada a presença ou ausência destes nos respctivos
bairros onde as mesmas encontram-se localizadas. E isso ocorre devido as seguintes
considerações:
• A existência de um grande percentual de casamentos envolvendo migrantes
do nordeste (sobretudo maranhenses) no bairro do Guamá (68% entre os
homens e 67% entre as mulheres) e de São Brás (50% entre homens e 44%
entre as mulheres);
• A elevada porcentagem de mulheres da região Norte casam nos bairros do
Guamá (33%) e São Brás (31%);
• A significativa proporção de nubentes oriundos da região sudeste (sobretudo
fluminenses) casam no bairro da Pedreira (28% entre os homens e 37% entre
as mulheres);
• A diferença na proporção de homens e mulheres que migraram das regiões
Nordeste, Norte e Sudeste no bairro da Pedreira não chega a ser tão
acentuada quanto em relação aos outros dois bairros;
• Predominam os homens entre os migrantes da região Centro-Oeste nos três
bairros (9% no Guamá, 8% na Pedreira e 5% em São Brás);
79
90
LIMA, L. C.; VALE, A. L. F., op. cit., p. 5.
91
Ver também SOARES, W.; RODRIGUES, R. N. Redes sociais e conexões prováveis entre migrações:
internas e emigração internacional de brasileiros. São Paulo Perspec., São Paulo, v. 19, n. 3, 2005. Para
exemplificar esta situação PASTERNAK & BÓGUS (2005 [op. cit.]) afirmam que nos cinco primeiros
anos da década de 90 cerca de 5 milhões de brasileiros deslocaram-se de um estado a outro do país, já nos
últimos anos essa mobilidade se reduziu para cerca de 3,7 milhões de brasileiros. Em Belém o impacto
dessa redução na intensidade do fluxo migratório iniciada com o fim da década de 80 provocou uma
desconcentração metropolitana fazendo com que a cidade deixa-se de possuir 29,4% da população
paraense para 26,9%. Neste mesmo período Belém cresceu demograficamente cerca de 2,6% a.a.,
portanto abaixo dos 3,5% a.a. observado na região Norte uma década antes (crescimento que fora
sobretudo influenciado, segundo CUNHA e BAENINGER [2000, op. cit.] pela expansão da fronteira
80
agrícola) e menos do que o observado nos municípios do interior do Estado, que foi de 3,8%. De acordo
com CUNHA E BAENINGER (idem) é possível verificar que “as modificações ocorridas na migração
nos últimos trinta anos estiveram ligadas muito mais aos volumes e intensidades do que propriamente aos
fluxos estabelecidos. Na verdade não seria exagero pensar que se pudesse falar na existência de um
“padrão” migratório nacional no sentido da ocorrência de certas regularidades em termos das
características do fenômeno, em particular, quanto às correntes identificadas, poder-se-ia até mesmo
arriscar dizer que este não sofreu grandes alterações. Ou seja, os dados mostram que, apesar dos volumes,
poucas foram as modificações ocorridas nas direções dos principais fluxos registrados no país; esta
tendêncai se reforça quando a análise dos fluxos migratórios não contempla a desagregação dos
movimentos no contexto intra-regional (entre os estados de uma mesma região) e aqueles de caráter inter-
regional (entre estados de diferentes regiões)” (p.143).
92
MATOS, R. & Braga, F., op. cit., p. 4.
93
“De fato”, segundo afirmam CUNHA & BENINGER, “os dados sobre o volume e importância relativa
da migração intra-estadual sobre o conjunto dos movimentos intermunicipais não deixam lugar à dúvida
quanto à sua crescente importância na dinâmica demográfica dos estados, sobretudo nos anos 80. Assim,
se na década de 70, mas de 15,4 milhões de pessoas fizeram um movimento intra-estadual, representando
60,7% do total de migrantes intermunicipais, na década seguinte esse número aumentou sua importância
em todos os sentidos: 16,7 milhões e 66,7% dos movimentos intermunicipais. Nos anos noventa, os
dados da PNAD 95 apontam para um volume de mais de 6,7 milhões em cinco anos—ou quase 14
milhões na década, supondo certa uniformidade no período—o que demonstra o fôlego desse tipo de
movimento migratório” (op. cit., p.130).
81
94
Se escaparmos a comparação entre os dois período envolvidos por essa transição demográfica (já que
não existem fontes para analisar os casamentos ocorridos em Belém entre as décadas de 70 e 80) e
observamos a influência da migração que existiu na cidade no período da transição entre os séculos XIX e
XX verificar-se-á que os migrantes interestaduais e até mesmo os estrangeiros exerciam um importante
papel no contexto social da sociedade paraense, sendo responsáveis não só pelo incremento da economia
extrativista, mas também pela traçado urbano, pelas formas de ocupação da cidade e pela estrutura dos
arranjos matrimoniais existentes. CANCELA (2006 [op. cit.]) observou que 19% dos casamentos
ocorridos entre 1870 e 1920 envolviam nordestinos e 10% estrangeiros, assim como o surgimento de
inúmeras hospedarias, hotéis, varias e estâncias para atender a população migrante e as inspeções médico-
sanitárias que provocaram um re-ordenamento urbano na cidade.
95
TOBIAS, op. cit., p.15.
82
Tabela 23: População residente, segundo estado de nascimento e
Região, na cidade de Belém (PNAD – 2004).
ORIGEM TOTAL %
Amapá 8.896 5,2
Amazonas 8.896 5,2
Rondônia 2.442 1,4
Acre 2.092 1,2
Roraima 1.570 0,9
Tocantins 350 0,2
NORTE 24.246 14,1
Maranhão 80.186 46,6
Ceará 20.229 11,8
Piauí 9.588 5,6
Bahia 4.533 2,6
Pernambuco 2.615 1,5
Rio Grande do Norte 1.746 1,0
Paraíba 1.398 0,8
Sergipe 348 0,2
Alagoas 174 0,1
NORDESTE 120.817 70,2
Goiás 3.661 2,1
Distrito Federal 2.793 1,6
Mato Grosso do Sul 522 0,3
Mato Grosso -- --
CENTRO-OESTE 6.976 4,05
Rio de Janeiro 5.926 3,4
São Paulo 3.661 2,1
Minas Gerais 1.909 1,1
Espírito Santo 1 570 0,9
SUDESTE 13.066 7,5
Rio Grande do Sul 1.740 1,0
Paraná 873 0,5
Santa Catarina 523 0,3
SUL 3.136 1,8
País Estrangeiro 3.841 2,2
TOTAL 172.082 100,0
FONTE: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE / Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios – PNAD.
NOTA:- Exclui-se a população rural.
- Pesquisa por amostragem.
- Formatação da tabela alterada pelo autor.
Diante deste cenário Belém precisa ser vista como parte de uma realidade
heterogênea, composta por múltiplos sujeitos. Para Pacheco e Patarra a heterogeneidade
espacial da economia brasileira é bem conhecida:
83
Das regiões brasileiras que mais contribuíram para essa expansão demográfica
verificada em Belém ao longo das últimas três décadas o Nordeste é a que mais se
destaca. Os estudos produzidos pela Associação Brasileira de Estudos Populacionais
(ABEP) por sinal o entendem como a região que mais expulsa a sua população 97 e o
estado do Pará como uma das áreas que mais a absorve98. Dos migrantes nordestinos
destacam-se os 66% nascidos no Maranhão, 16% nascidos no Ceará e cerca de 8% do
Piauí. Estas informações acabam se confundindo com os dados obtidos junto aos
registros de casamento no que tange a origem. Nas paróquias estes três estados
lideraram a proporção de migrantes da região Nordeste (50% eram de maranhenses,
enquanto 19% eram cearenses e 17% eram piauienses). Fenômeno análogo ocorre com
os migrantes que nasceram no Rio de Janeiro e casaram em Belém. Se no período entre
1995 e 2000 cerca de 54% de migrantes da região Sudeste estabelecidos em Belém eram
deste estado e na atual conjuntura os mesmos lideram o fluxo dessa região
representando cerca de 45% que reside nesta capital, nas paróquias encontrou-se
proporção semelhante, haja vista que 70% dos nubentes eram fluminenses. Isto os torna
a população predominante da região Sudeste presente em Belém, sobretudo no caso
daqueles que casam no bairro da Pedreira.
Tanto um fluxo como o outro, embora estejam inseridos num processo de
desaceleração do fluxo migratório, podem estar indicando duas possibilidades de
interpretação do atual contexto demográfico vivido por Belém:
1. A continuidade no processo de expulsão/absorção da população nordestina
para o interior desta cidade; e
96
PACHECO, C. A.; PATARRA, N. Movimentos migratórios nos anos 80: novos padrões? In: Anais do
Encontro Nacional sobre Migração (ABEP/IPARDES). Curitiba, 1998.
97
Cf. PINHEIRO, S. M. G. Tendências recentes da dinâmica demográfica nordestina: migração. Anais do
VI Encontro de Estudos Populacionais Olinda, 1988, v.4, p.163-176. Segundo PACHECO & PATARRA
(op. cit.) para entender o Nordeste como provedor de população para as outras regiões do país é preciso
perceber que em seu interior há uma elevada concentração fundiária.
98
Ver TOBIAS, op. cit. Mais recentemente o estado de Roraima também tem se destacado neste processo
de absorção dos migrantes nordestinos. LIMA & VALE (op. cit.) destacam a ocorrência de um “bom”
envolvendo os migrantes do estado do Ceará, que vem a se estabelecem nas cidades de Roraima através
do que os autores chama de “redes de interação social”. Segundo estes autores as informações e os
“sistemas de apoio inicial” são utilizados pelos migrantes com o apoio daqueles que galgaram posições de
relevância na vida econômica e ou política da capital ou do estado (p. 9).
84
99
“[T]rata-se de uma terminologia usada nos estudos migratórios. Para os movimentos populacionais, em
ambas as direções, envolvendo duas áreas distintas, considera-se como “corrente” aquela direção que
abriga o maior fluxo migratório e contra-corrente a direção inversa” (CUNHA & BAENINGER, op. cit.,
p. 126).
100
Sobre os fluxos migratórios brasileiros envolvendo a população de Belém cf. BRITO, F. (2006), op.
cit.
101
PACHECO, C. A.; PATARRA, N., op. cit.
Tabela 24: Distribuição dos nubentes segundo a origem e a faixa etária.
85
Origem dos Nubentes segundo o sexo
Faixa %
Capital Interior Nacional Estrangeiro Total Geral
Etária
H M Total % H M Total % H M Total % H M Total % H M Total
10,4* 5,0 7,2 0,0
14-20 40 182 222 12 24 36 5 13 18 0 0 0 57 219 276 8,8
80,4** 13,0 7,0 0,0
30,0 23,1 25,0 0,0
21-25 288 355 643 77 92 169 31 31 62 0 0 0 396 478 874 27,9
73,6 19,3 7,1 0,0
29,1 24,8 27,9 27,3
26-30 353 270 623 95 86 181 43 26 69 3 0 3 494 382 876 28,0
71,1 20,7 7,9 0,3
15,1 18,7 19,8 18,2
31-35 181 142 323 75 62 137 33 16 49 2 0 2 291 220 511 16,3
63,2 26,8 9,6 0,4
7,8 10,5 10,1 9,1
36-40 103 64 167 38 39 77 17 8 25 1 0 1 159 111 270 8,6
61,8 28,6 9,25 0,4
3,0 5,2 4,4 36,3
41-45 39 29 68 20 18 38 10 1 11 4 0 4 73 48 121 3,9
56,2 31,4 9,1 3,3
2,0 4,6 2,8 9,1
46-50 23 19 42 21 13 34 4 3 7 1 0 1 49 35 84 2,7
50,0 40,5 8,3 1,2
0,7 3,3 0,8 0,0
51-55 9 6 15 11 13 24 1 1 2 0 0 0 21 20 41 1,3
36,6 58,5 4,9 0,0
1,4 4,0 1,6 0,0
56-73 17 14 31 16 13 29 2 2 4 0 0 0 35 29 64 2,1
48,4 45,3 5,3 0,0
0,2 0,8 0,4 0,0
74-... 5 0 5 5 1 6 1 0 1 0 0 0 11 1 12 0,4
41,7 50,0 8,3 0,0
TOTAL 1058 1081 2139 100,0 370 361 731 100,0 147 101 248 100,0 11 0 11 100,0 1586 1543 3129
102
Fonte: Livros de casamento das paróquias (Belém, 1995-2006). (*) Percentual na coluna, (**) percentual na linha .
102
Este tipo de procedimento estatístico pode ser encontrado no trabalho de BASSANEZI, Ana Maria Cristina. O casamento na colônia no tempo do café. Anais do VI
Encontro de Estudos Populacionais (ABEP), Olinda,1988, v.1, p. 128.
86
De acordo com a tabela acima, onde é analisada a distribuição dos nubentes tendo em
conta a origem dos mesmos e nas respectivas faixas etárias, em relação a população que
nasceu em Belém prevalecem aqueles com idade entre 21 e 25 anos (30%), seguidos dos que
possuem entre 26 e 30 anos (29,1%), sendo que o primeiro grupo formado sobretudo de
mulheres e o segundo de homens. Nas faixas etárias seguintes predominam os homens. Este
arranjo envolvendo homens e mulheres é semelhante ao que ocorre quando as faixas etárias
são analisadas isoladamente.
Embora seja possível considerar que os naturais estão em proporções bem elevadas
junto a amostra analisada percebeu-se que isso é muito relativo quando comparadas as idades
e as origens dos nubentes. Neste sentido pode-se perceber que os naturais superam em
proporção os migrantes nas faixas etárias entre 14 e 20 anos (80,4%), 21 a 25 anos (73,6%), 26
a 30 anos (71,1%), 31 a 35 anos (63,2%), 36 a 40 anos (61,8%) e 41 a 45 anos (56,2%), é
proporcional na faixa etária entre 46 e 45 anos e são superados por estes nas faixas etárias
posteriores, sobretudo pelos migrantes com idades acima dos 51 anos.
Entre os migrantes do interior predominam os nubentes com idade entre 26 e 30 anos
(24,8%), seguidos pelos que possuem entre 21 e 25 anos (23,1%) e 31 e 35 anos (18,7%). A
proporção de homens e mulheres casando numa ou noutra faixa etária entre estes migrantes é
semelhante ao observado entre os nascidos em Belém, isto é, as mulheres predominam nas
faixas etárias entre 14 e 20 anos e 21 a 25 anos, enquanto os homens nas duas faixas etárias
seguintes. A partir das faixas etárias acima de 36 anos é que surge a grande diferença nos
casamentos estabelecidos pelos migrantes em Belém, pois os mesmos variam de acordo com o
gênero do nubente. Este fenômeno, que ainda não havia sido observado anteriormente, indica
que os homens predominam nas faixas etárias entre 41 e 46 anos, 46 e 50 anos e acima de 56
anos, porém são superados nas faixas etárias entre 36 a 40 anos e 51 a 55 anos. Isto permite
considerar que os migrantes vindos do interior que casaram nas três paróquias analisadas nesta
pesquisa apresentam uma composição na estrutura das suas alianças que se diferencia do que
fora analisado até aqui.
Entre os migrantes interestaduais é possível perceber que os mesmos casaram
predominantemente entre os 26 e os 30 anos. ¼ dos mesmos casaram entre 21 e 25 anos, 19%
casaram entre 31 e 35 anos e 7,2% dos nubentes casaram com menos de 20 anos. Os que
casaram com mais de 36 anos representam menos de 20% do total analisado.
A distribuição por gênero nas faixas etárias entre este grupo de migrantes também
permitiu considerar que os mesmos assemelham-se mais com os naturais de Belém do que
87
com os migrantes do interior. Excluído-se a faixa etária entre 21 e 25 anos, onde a relação
entre homens e mulheres é proporcional em todas as outras assiste-se uma proporção superior
de mulheres em relação aos homens com menos de 20 anos e uma proporção superior de
homens em relação as mulheres nas idades acima de 25 anos. É possível considerar que este
fenômeno possui relação com a maior circulação da população masculina oriunda de outros
estados no interior de Belém.
Em relação aos estrangeiros é possível afirmar que estes, além de serem homens,
casam com idades entre 26 e 50 anos, portanto numa fase da vida que para a população
masculina investigada até aqui pode ser entendida como a preferencial para a realização do
casamento.
Os gráficos a seguir ajudarão a entender melhor o que se vem discutindo ao longo do
texto, porém dando ênfase ao contexto dos bairros em que estão localizadas as paróquias.
O gráfico acima indica que a distribuição segundo a origem e a faixa etária dos
nubentes que casaram na paróquia de SPSP, no bairro do Guamá, varia conforme os nubentes
avançam em suas idades. Por exemplo, apesar da pequena proporção de migrantes
interestaduais presentes nas paróquias os mesmos se distribuem uniformemente até a faixa
etária entre 56 e 73 anos; os nascidos em Belém predominam até a faixa etária de 46 a 50 anos
e depois são superados em proporção pelos migrantes do interior do estado; estes últimos além
de representarem a maior proporção de nubentes da paróquia de SPSP são aqueles que casam
com a idade mais elevada.
88
CAPÍTULO V
ESTRUTURA DAS ALIANÇAS E HOMOGAMIA NA CIDADE
91
Tabela 25: Estrutura das alianças segundo a origem e o sexo dos nubentes.
103
NADALIN (1994), op. cit.
104
São excluídos os dados inválidos, isto é, os que não foram declarados e os que não permitiram identificar a
origem dos nubentes.
92
105
Foram identificados 11 estrangeiros (2 americanos, 2 franceses, 2 argentinos, 1 libanês, 1 iraniano, 1 cabo-
verdiano, 1 alemão, 1 italiano e 1 português).
93
PARÓQUIA
TIPO DE ALIANÇA SPSP NSCA SFA TOTAL %
Tot. % Tot. % Tot. %
BELÉM X BELÉM 123 41,0 267 55,6 376 51,5 766 50,6
Sendo assim, nesta tabela, em que são observados os diferentes resultados obtidos com
o cruzamento das origens dos nubentes segundo as paróquias onde os mesmos contraíram
matrimônio, constatou-se que cerca de 61% dos casamentos são de natureza homogâmica,
enquanto 39% são de natureza heterogâmica. Nela também está evidente que mais da metade
das alianças estabelecidas nas três paróquias, isto é, 50,6% dos matrimônios, envolviam
homens e mulheres belenenses.
A homogamia em se tratando de belenenses variou entre uma paróquia e outra em
cerca de 10%, com destaque para a diferença entre as paróquias de NSCA, que apresentou o
maior índice de homogamia entre belenenses (55,6%), e SPSP, que neste sentido apresentou
índice de 41%, e isto se deve a presença de uma proporção mais elevada destes sujeitos nos
bairros em que estão localizadas as paróquias (ver capítulo anterior).
Porém, cerca de ¼ dos casamentos ocorridos nas três paróquias foram heterogâmicos
envolvendo alianças entre belenenses e migrantes do interior. 32,7% deste tipo de casamento
ocorreram na paróquia de SPSP enquanto 24% e 24,8% ocorreram, respectivamente, nas
paróquias de SFA e NSCA. O mesmo ocorre quando são analisados os casamentos
94
homogâmicos entre migrantes do interior. 16% dos casamentos ocorridos na paróquia de SPSP
são deste tipo, enquanto apenas 7,1% e 7,5% do mesmo ocorrem respectivamente nas
paróquias de SFA e NSCA.
Entre as paróquias de SPSP e NSCA estes dados influenciaram diferenças observadas
na tabela. As mesmas ocorreram, sobretudo, devido à proporção de casamentos heterogâmicos
envolvendo belenenses com migrantes do interior (7,9%), e homogâmicos entre migrantes do
interior (8,5%). Com isto é possível considerar que a expressiva proporção de migrantes do
interior no bairro do Guamá obtidas com os livros de casamento influenciou não só o
casamento homogâmico entre eles, mais do que em relação aos outros bairros, mas também os
outros tipos de casamento heterogâmicos estabelecida com estes sujeitos na paróquia de SPSP.
Isto permite considerar que a presença de migrantes do interior no bairro do Guamá
além de expressiva é indicativa da sua forma de ocupar a cidade. Como já salientado em
capítulo anterior, este bairro é o menos urbanizado entre os destacados, portanto apresenta
características do bairros de periferia que ocupam grandes metrópoles.
Já em relação aos casamentos heterogâmicos entre belenenses e migrantes de outros
estados percebeu-se que os mesmos corresponderam a 10,4% do total analisado, com a
particularidade de os mesmos serem mais expressivos nos bairros SFA e NSCA. Entre estas
paróquias e SPSP a diferença chega a ser 7,1%, o que indica uma correspondência entre
proporção de migrantes e o tipo de aliança estabelecida, ou seja, se nos bairros de São Brás e
da Pedreira, existe um grande número de população migrante de outros estados da federação,
os casamentos envolvem estes na mesma proporção que os que ocorrem envolvendo os
migrantes do interior presentes no bairro do Guamá.
Por último, os casamentos homogâmicos entre migrantes nacionais e heterogâmicos
entre estes com migrantes do interior foram pouco expressivos. Os do primeiro tipo chegaram
a representar somente 2,7% do total enquanto os do segundo representaram apenas 1,3%.
CAPITAL
MESO-REGIÃO do INTERIOR Total %
H M
NORDESTE 121 137 258 65,6
MARAJÓ 29 25 54 13,7
BAIXO-AMAZONAS 20 16 36 9,2
METROPOLITANA DE BELÉM 18 15 33 8,4
SUDESTE 5 2 7 1,8
SUDOESTE 3 2 5 1,3
Total 196 197 393 100,0
Fonte: Livros de casamento (Belém, 1995-2006).
pelo estado, tanto expulsando como também absorvendo a população que migra pelo seu
interior, quer tenha nascido nele ou não. Neste sentido Tobias 106 indica que há uma elevada
troca populacional entre as cidades da região Sudeste paraense com outras regiões do Brasil e
não só com Belém, como seria de se esperar. Isto indica que a população que migrante do Pará
embora procure as áreas urbanizadas não vêem como destino principal a sua capital, mas o
interior ou a capital de outros estados, que aliás encontram-se mais próximos das regiões
economicamente desenvolvidas do País como Palmas ou Brasília.
Observando o gênero dos migrantes da meso-regiões paraenses que contraíra
matrimônio em Belém é possível considerar que os mesmos apresentam-se em proporções
semelhantes com uma leve tendência para que as mulheres sejam a maioria quando os
imigrantes provém da região Nordeste.
Outro tipo de aliança heterogâmica estabelecida entre os nubentes foi destacada nesta
análise refere-se às uniões envolvendo belenenses e migrantes de outros estados da federação.
Na tabela a seguir isto ficará esclarecido tendo em conta os seguintes dados:
CAPITAL
REGIÃO Total %
H M
NORDESTE 22 46 68 44,2
NORTE 18 19 37 24,0
SUDESTE 13 19 32 20,8
CENTRO-OESTE 1 9 10 6,5
SUL 3 4 7 4,5
Total 57 97 154 100,0
Fonte: Livros de casamento (Belém, 1995-2006).
De acordo com esta tabela 44,2%, ou pouco menos da metade, dos casamentos entre
belenenses e migrantes de outros estados envolvem indivíduos de origem nordestina,
sobretudo da região Setentrional, ou seja, Maranhão e Piauí. Destes, cerca de 67% são homens
que casaram com mulheres de Belém e a grande maioria ocupa os bairros do Guamá e São
Brás.
Excluindo o estado do Pará, a região Norte é a que possui o segundo maior índice de
indivíduos que contraem matrimônio com belenenses (24% dos casos). Entre eles destacam-se
os oriundos dos estados do Amazonas e do Amapá.
106
TOBIAS, op. cit.
97
Os migrantes da região Sudeste estabeleceram este tipo de aliança em 20,8% dos casos,
sendo que boa parte deste contingente é de origem fluminense nascida na cidade do Rio de
Janeiro.
Entre os cerca de 6,5% de migrantes da região Centro-Oeste destacam-se os homens
nascidos na cidade de Brasília que estabeleceram este tipo de união em cerca de metade dos
casos.
Os casamentos heterogâmicos entre belenenses e migrantes da região Sul embora
tenham sido pouco significativos (apenas 4,5% do total analisado) apresentaram o predomínio
de uniões envolvendo belenenses e paranaenses.
Nesta tabela também foi possível perceber que, ao contrário do que fora observado
anteriormente, 2/3 dos casamentos entre belenenses e migrantes de outros estados envolvem
indivíduos do sexo masculino. Esta razão possibilita interpretar e repetir a afirmação de que há
uma diferença na circulação espacial de homens e mulheres em inter-regionais, com uma
possível tendência para o maior fluxo de homens, inclusive no que diz respeito aos migrantes
estrangeiros que eram, sobretudo, homens estabelecendo alianças heterogâmicas com
belenenses 107.
107
Nas alianças de migrantes do exterior destacam-se a união com belenenses em 8 casos e com migrantes do
interior em 1 caso, com migrante nacional em 1 caso, além de um tipo de aliança não identificada.
108
Entre os trabalhos que permitem abordar esta temática está o de BOTELHO, T. Estratégias matrimoniais entre
a população livre de Minas Gerais: Catas Altas do Mato Dentro, 1815-1850. In.: Anais do XIV Encontro Nacional
de Estudos Populacionais (ABEP), Caxambu, 2004. LÓPEZ, D. et. all. "La dimensión geográfica en la
nupcialidad: homogamia espacial en la España del siglo XX". In. VII Congreso de la Asociación de Demografía
Histórica (ADEH), Granada/ España, Abril de 2004.
109
COLEMAN, D. A. "Marital Choice and geographical mobility”. In. BOYCE, A. J. (ed.). Symposia of the
Society for the Study of Human Biology, 23, University of Chicago Press, 1984: pp. 19-55.
98
Porquanto esta sessão propõe a análise dos respectivos locais de residência dos
nubentes a partir do item “moradia” contido nos livros de casamento. Isto ajuda a entender
situação dos mesmos no ambiente da cidade e a importância que os bairros têm no cenário dos
arranjos estabelecidos.
Para que o conjunto das informações obtidas pudesse dar condições de realizar esta
avaliação foram selecionados os dados válidos que continham tanto o nome da rua, o número
da casa e quando possível o nome do bairro. Através do programa Google Earth, do site dos
Correios e do catálogo da Listel foi possível identificar este o local de residência e mapear as
áreas onde os nubentes, tanto homens quanto mulheres, estavam mais concentrados.
A localização destas moradias permite não só identificar que áreas da cidade os
nubentes ocupam, mas também ajudam a entender como se configuram as alianças e a
disposição destas nos regiões de residência dos nubentes. A maior parte das informações
obtidas indicam que os mesmos, principalmente as mulheres, residem nas proximidades das
paróquias onde casaram.
Porém, é preciso salientar que nem sempre estas informações estão completas. Às
vezes não são incluídos os nomes das ruas, mas somente o bairro, ou pelo contrário, o bairro é
identificado, mas a rua não. Pela rua é possível se chegar ao bairro no qual reside um ou outro
nubente, mas o inverso torna-se inviável. Em outras ocasiões os nomes de rua, passagens e
vilas se repetem, e quando o nome do bairro não é indicado a informação pode se tornar
ambígua, já que o nome de uma via pode ser encontrada em Diferentes locais da cidade. Isso
pode confundir a investigação, mas também indicar a maneira como são avaliadas as
informações que os nubentes prestam por quem as escreve nos livros de casamento.
O investimento nesta metodologia exigiu minúcia, contudo permitiu que os dados se
qualificassem. Isto possibilitou que a investigação avançasse e avaliasse até mesmo a distância
entre as residências dos nubentes. Assim o que se obteve foi à dimensão da mobilidade dos
indivíduos no interior do bairro. Essas informações levaram em consideração tanto a
proporção de nubentes que residiam na mesma casa antes de casarem, em bairros ou cidades
da zona metropolitana distantes entre si ou a possibilidade dos mesmos serem vizinhos que
residem próximos, na mesma rua, esquina ou quarteirão.
distantes entre si, mas ainda pertencentes à área urbana de Belém. Os que moravam na região
limítrofe, isto é, nos bairros adjacentes (Condor, Cremação, Universitário, Terra-Firme,
Canudos e São Brás) representaram 2,3%. Os que residiam nas outras cidades que compões a
zona metropolitana (Ananindeua, Marituba, Santa Bárbara, Benevides) representaram 1,3% e
os que residiam em outras cidades do interior do estado ou de outros estados representaram
1%. Nesta amostra os dados inválidos (não declarados e não identificados) somaram menos de
0,8% do total.
No que concerne à observação sobre o gênero dos residentes que casaram nesta
paróquia foi possível constatar que a única área em que a proporção de mulheres é superior a
de homens é a do Guamá, bairro onde está localizada a paróquia. Há uma equivalência entre
os que habitam os bairros adjacentes, porém todas as outras regiões analisadas demonstram
que há um maior número de homens residindo em regiões distintas do Guamá do que de
mulheres. Isto indica que os casamentos ocorridos no bairro do Guamá envolvem uma grande
quantidade homens provenientes de outras áreas de Belém com mulheres que residem em seu
interior.
Tabela 29: Local de residência dos nubentes em relação à paróquia de SPSP,
segundo o sexo
em muitos dos casos como referencia para os nubentes indicarem a passagem ou vila onde
moram. É o caso por exemplo dos moradores das passagens São Lázaro e Rui Barbosa que
indicam a Avenida Bernardo Sayão como referência pra indicar a sua residência.
Um dado que pode contribuir para entender o padrão de homogamia em relação à
residência diz respeito à existência de 69 casamentos em que homem e mulher ocupavam a
mesma via dentre as indicadas. Isto representa 40% do total da amostra analisada. Também,
foi possível analisar que destes 69 casamentos 58 envolviam casais que já moravam juntos, ou
seja, 84%.
Portanto é possível afirmar que além do bairro a rua onde os nubentes moram é
também um importante elemento no processo de seleção do parceiro entre os habitantes do
Guamá.
Considerando apenas os dados válidos pode-se observar que 57,3% dos nubentes
residiam no bairro da Pedreira no momento do seu casamento. 27,3% moravam nos bairros
adjacentes, 11% em outros bairros da cidade e 4,3% nas cidades que compõe a zona
metropolitana de Belém. O endereço francês localizado na cidade de Miradoux representou
0,1% do total da amostra.
observado junto à paróquia de SPSP pode estar indicando a existência entre os habitantes do
bairro da Pedreira de uma preferência por moradores de outros bairros da cidade.
No que diz respeito aos moradores dos bairros que fazem parte da região limítrofe foi
possível encontrar 30% de homens e 27,9% de mulheres residindo em algum destes bairros. O
casamento entre estes moradores foi da monta de 15,7%, sobretudo entre os que moravam nos
bairros do Marco, Sacramenta e Telégrafo. Dentre os homens que residiam nestes bairros
observou-se que 13,4% casaram mulheres do bairro da Pedreira. O contrário indicou que as
mulheres da região limítrofe casavam com homens deste bairro em cerca da metade dos casos,
ou seja, 6,8%.
Os homens que residiam em outros bairros da cidade representaram 14,3% dos
nubentes enquanto as mulheres apenas 5,9% . E somente 6,6% dos homens e 2,2% das
mulheres residiam em outras cidades da região metropolitana de Belém.
Essa relativa diferença em relação à paróquia de SPSP ampliou a distância média entre
os nubentes para cerca de 2,35 Km. O que contribuiu significativamente para isso foi a
redução na proporção de nubentes que já residiam na mesma casa antes do casamento (28,8%
). Cerca de 8,4% dos nubentes distavam um do outro menos de 100m, o que permite-lhes
serem considerados vizinhos, 22,4% moravam em regiões circunvizinhas (entre 100m e
1Km), 36,8% localizavam-se a uma distância acima de 1Km e inferior a 10Km e apenas 3,6%
superavam estas distâncias.
105
Em relação à estrutura das alianças no que tange o local de residência dos nubentes foi
possível constata que a maioria dos casamentos envolviam homens e mulheres que residiam
em bairros localizados na região limítrofe. Eles representaram 58,4% da amostra e elas 55,7%.
Os homens que habitavam o bairro onde está localizada a paróquia representaram 17,6%, já as
mulheres 12,6%. 23,8% eram homens e 19,1% eram mulheres residentes de algum outro
bairro da cidade de Belém e 7,9% dos homens e 4,9% das mulheres moravam em outras
cidades da zona metropolitana.
Entre os que moravam na região limítrofe ao bairro de São Brás também está o maior
percentual (45,5%) de nubentes que resolveram casar com alguém do próprio bairro. Isco
ocorreu, sobretudo entre os habitantes do bairro do Guamá que representaram cerca 30% do
total da amostra analisada. Em seguida estão os nubentes de outros bairros da cidade que
casaram entre si na paróquia de SFA em 10,6% dos casos. 7,3% dos casamentos envolviam
homens de outros bairros com mulheres da região limítrofe à paróquia, 5,6% envolviam
homens desta região com mulheres de outros bairros da cidade. Este índice é apenas um pouco
inferior em relação aos 6% encontrado entre os nubentes que habitavam o mesmo bairro na
época do enlace e semelhante ao observado entre os homens que habitavam outros bairros da
cidade e as mulheres que moravam no bairro onde está localizada a paróquia. Apenas 3,3% e
2,3% dos homens casaram respectivamente com mulheres que residiam nos bairros adjacentes
à paróquia e em outros bairros da cidade. Neste sentido o que se pode concluir
provisoriamente é que a taxa de homogamia existem no bairro de São Brás entre os nubentes
108
da paróquia de SFA é não só muito reduzido, como também designativo da elevada circulação
desta população em seu interior.
Essa grande proporção de nubentes morando distante da região onde está localizada a
paróquia levou a maior distância média observada entre as paróquias desta pesquisa: 3,86Km.
Os nubentes que residiam na mesma casa antes do matrimônio representaram 34,5% da
amostra e apenas 3,4% poderiam ser considerados vizinhos. 13,6% moravam em regiões
circunvizinhas à casa do nubente e 8,5% em residências que distam uma da outra em mais de
10Km. Mas a grande proporção está localizada a uma distância que varia entre 1 e 10 Km, ou
seja, 40%
Neste sentido o número de nubentes que residiam nas vias que compõem ou
entrecortam o bairro de São Brás são bastante reduzidos em relação aos observados
anteriormente, isto por que cerca de 21,8% da amostra reside em vias como as Avenidas
Conselheiro Furtado e Mundurucus, Travessas Caldeira Castelo Branco e Quatorze de Abril e
Passagens Napoleão Laureano e Guerra Passos, estas últimas localizadas no bairro do Guamá.
109
Isto permite considerar que além desta população ser a mais espalhada no interior da malha
urbana de Belém é que mais aglutina moradores de outro bairro, e conseqüentemente de outra
paróquia (neste caso a de SPSP) 110.
Tabela 33: Distribuição dos nubentes da paróquia de SFA entre os principais logradouros
do bairro de São Brás segundo a proporção de ocupação dos mesmos
***
Ao analisar os tipos de alianças estabelecidas em Belém no que diz respeito à origem e ao local
de residência dos nubentes foi possível constatar que existe um padrão de homogamia tanto entre
aqueles que são naturais desta capital e quanto entre os moradores do bairro em que está localizada a
paróquia onde ocorreram os casamentos.
Porém embora esse seja o perfil predominante é necessário considerar que cada contexto sócio-
espacial, tido como referência, possui a sua particularidade. As mesmas se fazem notar, por exemplo,
através da diferença na proporção de imigrantes presentes em cada bairro ou nos locais em que os
mesmos residem em seu interior. É possível que estas diferenças sejam o efeito de uma tendência, que
cada bairro possui, para concentrar ou fragmentar as relações existentes entre os naturais de Belém e os
imigrantes de outros lugares e entre os seus moradores e os moradores de outros bairros.
Em relação à paróquia de SPSP, que viu reunida a maior parte de seus nubentes no bairro do
Guamá, foi possível observar a existência de um elevado índice de casamentos envolvendo imigrantes,
sobretudo do interior do estado do Pará e de maranhenses. Assim, esta paróquia permite concluir que
110
Há de se considerar que dada à localização das paróquias no interior dos bairros, no sentido de estarem mais
próximas de um ou de outro, é possível que haja uma tendência para a que a ocorrência dos casamentos seja
inversamente proporcional à distância entre as residências dos nubentes e as igrejas onde são realizadas as
cerimônias. No caso da paróquia de SFA, ao observarmos sua posição no mapa de Belém, verificamos que a
mesma está mais próxima em relação ao bairro do Guamá do que em relação à região central do bairro de São
Brás.
110
neste bairro onde está localizada se concentra a maior proporção de imigrantes e que os mesmos, na
maioria das vezes, ou casam-se entre si, ou com naturais da capital.
Este bairro, de igual maneira, também tende a concentrar os indivíduos que foram analisados
segundo o item “moradia”. A maioria desses indivíduos, no entanto, além de residirem no mesmo
bairro habitavam também o mesmo lar antes do casamento. Talvez isto reflita a presença de um levado
número de alianças informais, que podem ser mensuradas tendo em conta a expressiva quantidade de
casamentos comunitários ocorridos no período analisado. Este fenômeno influenciou sobremaneira a
tendência para que a distância entre os locais de moradia dos nubentes se reduzisse e fosse a menor
dentre os bairros analisados, ampliando assim o índice de homogamia geográfica observado na
paróquia.
No caso da paróquia de NSCA constatou-se que os casamentos ocorridos envolviam
indivíduos, sobretudo mulheres, nascidos na capital e residentes do bairro onde está localizada a
paróquia (Pedreira) ou de bairros próximos que compõem a região limítrofe. Entre estes nubentes a
homogamia existente é relativa, o que explica a menor proporção dentre todas as paróquias de
casamentos entre pessoas que moravam na mesma casa ou próximas umas da outras.
Por fim, os nubentes que contraíram matrimônio na paróquia de SFA estabelecem alianças
homogâmicas, sobretudo no que se refere à origem comum em Belém. Estes nubentes também
manifestaram homogamia na condição de moradores do mesmo bairro Dentre estes bairros o que mais
se destaca é o Guamá.
Essa tendência para a ocorrência de casamentos entre pessoas com residência em bairros
distantes da paróquia onde foi realizado o casamento contribui para o aumento significativo da
distância entre as residências dos nubentes, que neste bairro foi a maior dentre as observadas.
Sendo assim, é possível considerar que os nubentes da paróquia de SFA, embora também
sejam moradores do bairro do Guamá, possuem características muito distintas daqueles que moravam
neste bairro, mas se casaram na paróquia de SPSP, como por exemplo a tendência para já habitarem a
mesma casa antes do casamento 111. Isso indica que estes habitantes possuem entre si diferenças que são
marcadas pela forma como ocupam o espaço do bairro, na maneira como selecionam seus pares e na
fórmula que encontraram para estabelecer seus arranjos conjugais.
111
Pesa também nesta avaliação a proximidade entre as residências dos nubentes e as respectivas
paróquias, visto que SPSP encontra-se localizada na interior do bairro do Guamá, e a paróquia de SFA,
embora represente o bairro de São Brás está mais próximo do Guamá do que em relação a sua região
central.
111
CONSIDERAÇÕES FINAIS
nubentes socialmente distintos, cuja divisão se dá entre os que são oriundos de bairros
próximos, que possivelmente são menos urbanizados (como Sacramenta e Telégrafo), e os que
moram no próprio bairro, onde há um relativo grau de urbanização.
O bairro de São Brás por estar localizado em uma área mais próxima da região central
da cidade possibilitou constatar um alto grau de urbanização e com isso a presença de uma
população com elevado padrão de vida e alto nível de instrução em comparação com os
demais bairros.
No que se refere à freqüência dos casamentos ocorridos nas paróquias, a mesma pouco
variou entre um ano e outro, porém muito entre os meses e os dias da semana. Dos meses que
compõe o ano dezembro é o mais escolhido para o estabelecimento do enlace, seguido de
maio, outubro e junho. Já os meses que menos interessam aos noivos são agosto, abril e
setembro, respectivamente. Preferencialmente os casamentos também ocorrem nos dias de
sábado.
Em relação à análise sobre a faixa etária nas as quais os nubentes casaram percebeu-se
que as mulheres são, no ato do matrimônio, mais novas que seus noivos em pelo menos 2,7
anos. A faixa etária preferencial entre elas localiza-se entre os 21 e 25 anos, já entre os homens
a mesma encontra-se entre os 26 e 30 anos. Contudo estas diferenças podem variar tanto entre
paróquias quando em comparação com as origens dos nubentes, no sentido de que quanto mais
próximos de contexto sócio-espaciais menos urbanizados maior é a tendência para os nubentes
se casarem em idades acima da média e da mesma forma se estes forem imigrantes vindos do
interior do estado. Os nubentes da paróquia de SPSP estão entre os que mais se adequaram a
este perfil, pois apresentam as características de serem os mais velhos no ato do matrimônio e
os que possuem maior população de migrantes provenientes de municípios paraenses. Em
contrapartida, os nubentes da Pedreira e São Brás são os que possuem, consecutivamente,
indivíduos que casam mais jovens e menor proporção de migrantes oriundos de municípios
paraenses em seu interior.
Esta naturalidade foi assunto de discussão posterior, uma vez que foram analisadas
segundo um recorte teórico instituído pela demografia brasileira. Esta procura tratar a
mobilidade da população que habita o Brasil a partir de um viés historicista e a entende a partir
da dinâmica econômica, mas também social, pela qual o país passa em cada momento de sua
evolução histórica e demográfica. Sendo assim foi identificada uma relação entre a
naturalidade dos nubentes e o padrão migratório existente no interior de Belém. Juntamente a
este foi constado também que a migração para esta capital segue uma tendência que é histórica
e se reserva à concentração em áreas metropolitanas.
113
Pelo que se viu a maioria dos imigrantes vem dos estados que compõem a região
Nordeste, seguidos pelos nascidos nas regiões Norte, Sudeste, Centro-Oeste, Sul e países
europeus, consecutivamente. A disposição das informações incide sobre existência de uma
redução no fluxo de migrações interestaduais e o aumento no fluxo de migrações
intraestaduais, à semelhança do que ocorre com o padrão existente hoje e observado desde a
década de 1980 para o Brasil e Belém. Entre os nubentes que migraram dos municípios
paraenses para a capital destacam-se os nascidos na meso-região Nordeste, seguidos pelos
naturais das meso-regiões do Marajó, Baixo Amazonas e Metropolitana de Belém.
Entre os imigrantes ficou constatado que a maioria era masculina, o que leva a
considerar que esta tende a ser a população que mais circula no interior do mercado
matrimonial de Belém. A população feminina neste sentido tende a ser aquela que menos
circula, porém não só geograficamente entre municípios, estados da federação ou países, mas
também no interior do núcleo urbano. A confirmação desse fenômeno se dá através da análise
sobre a estrutura das alianças que compõe a discussão final do trabalho.
Nela observou-se que as alianças ao serem estabelecidas envolviam uma grande
parcela de homens provenientes não só de áreas externas ao núcleo geográfico de Belém, mas
também de outros bairros que não aquele onde estava localizada a paróquia de ocorrência dos
casamentos. Por esta via fica constatado que o movimento dos indivíduos no espaço durante o
enlace matrimonial varia segundo o gênero e no sentido de que os homens se deslocam mais
do exterior do que as mulheres. Por conseqüência as mulheres são aquela população que mais
está localizada ás proximidades no núcleo onde ocorre o rito matrimonial.
Estas observações também incidem sobre a região da cidade e dos bairros ocupadas
pelos nubentes. Discutiu-se então a concentração dos mesmos dentro e fora do bairro onde está
localizada a paróquia. Como cada uma delas possuía dados relativamente díspares quanto a
sua qualidade propôs-se que os mesmo fosses discutidos separadamente. Sendo assim
verificou-se que no bairro do Guamá a tendência para o casamento ocorrer entre pessoas que
moram próximas umas das outras é bem maior do que entre os nubentes do bairro da Pedreira
e de São Brás, que neste caso ou moram em bairros próximos à região limítrofe ou em outros
da própria cidade.
Por esta via o que é possível concluir é que os casamentos que ocorrem em Belém
tendem a ser homogâmicos, sobretudo em relação à origem e entre pessoas que moram em
áreas relativamente próximas umas das outras.
114
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