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VIEIRA, Alberto (1996),

Pirataria e Corso,

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VIEIRA, Alberto (1996), Pirataria e Corso, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em:
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PIRATARIA E CORSO

As acçöes de pirataria e corso no atlântico, articulam-se


de modo directo na dinâmica europeia de extensäo colonial de
que o Atlântico surge como a via de ligaçäo imprescindível
para o evoluir do processo histórico europeu colonial. A
guerra de corso alia-se a esses vectores e vai surgir uma área
de passagem, abrangendo os Açores, a Madeiras e as Canárias.
Aí teremos a guerra de corso, outra forma de guerra das
potências beligerantes europeias e americanas, cujos conflitos
circunscritos ao domínio terrestre alargam-se ao mar,
produzindo efeitos catastróficos para as áreas atingidas que
apresentam uma economia demercado fortemente dependente como é
o caso da Madeira.
Por esta forma os conflitos europeus, como a guerra de
sucessäo da Casa de Austria (1740/8), as guerras napoleónicas
(1784/1815) e o consequente bloqueio continental (1806/9) que
se apresentavam com expressäo do confronto sempre aberto entre
os dois maiores potentados europeus - França e Inglaterra -,
levaram ao embate das duas esquadras mais poderosas do
continente europeu1.
Se o período de 1713/40 pode ser considerado como de paz
longa entre a França e a Inglaterra ao nível naval, o mesmo
näo se poderá dizer dos anos consequentes, num período que se
arrasta até 1831. Assim entre 1740/1748, num momento de
confronto de guerra ao nível do continente europeu temos uma
forte incidência do corso, especificadamente na Madeira, onde
os ingleses investem contra os espanhóis e franceses. O qual
conflito se atenta entre 1849/57, para regressar entre 1758/62
com acçöes reduzidas, tal como em 1778/80. Na área dos Açores
até 1785 näo se destaca qualquer acçäo de relevo, apenas
investidas esporádicas entre 1767/8, 1777, 1781/2. O que vem
confirmar que afinal as acçöes de corso em meados e finais do
século XVIII incidem na área da Madeira.
Com o dealbar dos conflitos no posto Revoluçäo Francesa
vemos surgir novas acçöes de corso, de que destacam na Madeira
entre 1793/1801 e 1804/11, enquanto os Açores, embora mantendo
uma certa constância entre 1793/1800, apresentam referências
esporádicas entre 1802/3, 1805/7, 1811/2.
O momento de finais do século XVIII é particularmente
importante, uma vez que foi o período de maior dimensäo da
guerra naval britânico-francesa. Através da Gazeta de Lisboa,
podemos ver como se articulava essa guerra de represálias2.

1Vide A. H. Baptista, O Ressurgimento da Marinha Portuguesa no


último quartel do século XVIII, fol. 106/121.

2Idem,ibidem, fols. 90/1, vide o que refere Jorge Macedo,


Bloqueio Continental, Lisboa, 1962, p. 25.
Assim o número de presas de navios mercantis entre 1 de
Fevereiro de 1793 e 1 de Fevereiro de 1794 era de 316 navios
franceses apresados pelos aliados e de 410 pelos franceses3.
Entretanto em 1794 a diferença das presas era de 276 a favor
dos franceses4, de modo que em 1795 só o porto de Brest tinha
700 presas inglesas5.
A 26 de Agosto de 1714 "A Gazeta" aludia às presas pelo
seguinte modo: - "Os navios britânicos de comércio, tomados ou
destruidos por desastres andam por 310, isto é 210 dos
primeiros e 100 dos segundos, incluso a ardente.
Quanto às embarcaçöes mercantes mencionadas nesta lista,
como o nosso país é depósito geral de comércio para todo o
mundo, é de admirar que sendo tantos os que sempre andam no
mar näo haja o inimigo feito maior númro de presas..."6.
Até 1798 os franceses tomaram aos ingleses e aliados 3199
navios comerciais, enquanto estes apenas aprisionaram 934,
sendo 513 retomados7.
Portanto ao nível dos navios de comércio temos que a
situaçäo é favorável à França, o mesmo näo sucedendo com os
navios de guerra, onde era vincada a superioridade naval
inglesa, demonstrada nas batalhas de Aboukir e Trafalgar, isto
de tal modo que em 1798 o panorama apresentava-se do seguinte
modo:
- "Segundo um mapa que aqui se acaba de publicar dos
navios de guerra britânicos apresados no decurso desta guerra
pelos franceses, espanhóis e holandeses, näo se acham em poder
deles mais que a navio de 74 peças, 1 de 16,3 de 14,1, 1 de
10.
A Grä-Bretanha conta agora em seu poder 14 naus de linha
tomadas aos franceses, 5 aos espanhóis, 16 aos holandeses,
além de 80 fragatas de 20 a 48 peças e 68 chalupas de 10 a 20.
Aqui se vê que enquanto os inimigos possuem todos nossos
navios de guerra, temos nós em nosso poder 184 dos deles"8.
Esta superioridade inglesa deve-se acima de tudo à
táctica adoptada pelo almirante Nelson9.

3Gazeta de Lisboa, 20 de Maio de 1794.

4Idem, 2 de Janeiro de 1796.

5Idem, 14 de Outubro de 1794.

6Cit. A. H. Baptista, ibidem, fol. 121.

7Gazeta de Lisboa, 24 de Fevereiro de 1798.

8Idem, 12 de Junho 1798, cit. A. H. Baptista, ibidem, fol. 122.

9Gazeta de Lisboa, 2 de Novembro de 1798.


No entanto os períodos de maior incidência do corso na
área atlântica se situavam na Madeira entre 1804/11 abrangendo
o período do bloqueio continental e o momento da ocupaçäo
inglesa da ilha, e nos Açores entre 1814 e 1821.
No entanto o caso dos Açores entre 1814 a 1818
apresentava-se com outras tonalidades, uma vez que o confronto
desta feita é entre os novos e os velhos beligerantes. O corso
surge com uma acçäo de represália enquadrado na guerra de
independência dos Estados Unidos da América e da Argentina,
Bolívia, Colúmbia e Perú. A área dos Açores foi escolhida com
espaço predilecto para essas acçöes.
O momento de 1818/21, 1823/6, 1828/31 é marcado por um
ressurgir dessas actividades de modo activo na Madeira em
detrimento dos Açores, mas desta feita säo acçöes esporádicas
e de pouca importância em relaçäo aos momentos de início do
século e poucas ou nenhumas foram as presas entäo feitas.
Quanto ao período de incidência (vide mapa) da guerra de
corso, denota-se dois períodos de actuaçäo marcados mas pouco
definidos, assim enquanto na Madeira se torna evidente a sua
incidência entre Março a Maio e Julho a Agosto, nos Açores se
contam os meses de Setembro a Dezembro e Abril. FActo
comprovativo de que os corsários actuavam na Madeira à ida das
naus e nos Açores ao seu regresso.

2.1. - MADEIRA
A Madeira, situada a meio caminho entre o colonialista e
a colónia americana, africana, asiática, encontra-se num eixo
importante de apoio logístico das rotas coloniais. Primeiro
com a dinâmica colonial principiante, depois com o período de
apogeu, abrangendo assim um vasto período de 1450 a 1850. Em
razäo desse polo de atracçäo das rotas, aí se praticaram ao
longo dos século XV/XVII constant4es acçöes de pirataria e
corso contra as embarcaçöes das rotas ou contra as terras
insulanas, como realmente sucedeu na Madeira em 1566 com os
franceses e por diversas vezes no Porto Santo e Santa Maria
com os piratas argelinos. Para aí convergiam os piratas e
corsários à procura das naus das rotas das Indias, que aí
faziam escala na ida e por vezes no regresso, servindo-se na
conhecida rota dos alíseos no NE10.
Esta dinâmica manteve-se e mais se acentuou nos séculos
XVIII/XIX em face do forte impulso dado ao comércio do vinho
da Madeira, o vinho do colonialista europeu nas Indias
Ocidentais e Orientais, isto de tal forma que em 1778 o consul
francês acentuava a importância desta área de passagem
atlântica: "Les environs de cette isle (Madeira) jusqu'aux
Canaries étant un passage continuel pour tous les navires qui

10A. Silbert, Un Carrefour de l'Atlantique - Madère, pp. 394/6.


partent de L'Europe pour l?Asie, l'Afrique et même
l'Amérique"11.
As Canárias situadas dentro desta mesma área de passagem
rivalizam com a Madeira no apoio logístico às esquadras
coloniais, de forma que Jean Godechot12 opöes a rota espanhola
à portuguesa; a portuguesa dominando näo só a Madeira, mas
igualmente os Açores, tornou-se desde muito cedo naval "pour
le revitaillement des escadres qui croisaient aux environs,
protégeant les lgines de communications vitales de
l'Angleterre"13.
Nos inícios do século XIX esse controle das rotas que
passavam pela ilha tornava-se mais visível, vendo-se os
ingleses de tal modo, forçados a ocupar por duas vezes a ilha
em pleno momento das guerras europeias (1801/2m 1807/14). E
pela ilha passavam contantemente os comboios de embarcaçöes de
guerra inglesas, que evitavam o assalto dos corsários
franceses o ingleses às suas embarcaçöes do comércio colonial.
Várias säo as referências à passagem desses comboios de que
podemos destacar o de 1740, com 42 navios às Indias
Ocidentais14, de 176915, de 179916 com 108 embarcaçöes, de 1815
que conduzia Napoleäo para a ilha de Santa Helena17. Mais
referências se juntam nos anos imediatos de 180418., 180519, 180720, onde se
dá conta que os navios comerciais seguiam em comboio patrulhados por
fragatas de guerra bem armadas, como a nau de guerra Malabar com 50 peças e
a fragata Tiveed com 24 peças.
Entretanto os ingleses precisavam de deter o controle do
mar das ilhas, única forma de manterem protegidos os comboios
das Indias Ocidentais e Orientais das constantes investidas
dos corsários franceses, espanhóis e argelinos... cujas

11Idem, ibidem, p. 396.

12"Histoire de l'Atlantique", citado, idem, ibidem,p. 396.

13Idem, ibidem, p. 432.

14Idem, ibidem, p. 396.

15AHU, Madeira e Porto Santo, nº 3701.

16Idem, nº 1125.

17Idem, nº 3699.

18Idem, nº 1484.

19Idem, nº 1620.

20Idem, nº 1752.
investidas se intensificaram nestas paragens nos momentos mais
críticos das guerras europeias de 1740/8, 1799/1814. O que o
conseguiram por meio da manutençäo de esquadras permanentes de
corsários e navios de guerra, com base na Madeira. Destes
temos em 178021 a acçäo da esquadra britânica sob o comando de Johnston
que andava cruzando a costa da Madeira, enquanto em 181422 se dá conta da
saída de um navio inglês - Garland - a proteger o comboio de navios
ingleses e portugueses.
Por esta forma era especialmente na área da Madeira que
os ingleses faziam incidir as suas acçöes de corso contra os
espanhóis, franceses e até mesmo contra os portugueses. A
primeira referência a essa é-nos fornecida em 170023, em que se
alude que a 17 de Novembro chegara à ilha 5 navios comboiados por 2 navios
de guerra, rumo à costa da Guiné, os quais conduziam um navio francês
carregado de "assucares pretos" que venderam aí a bordo.
Entre 1740/8 em face da guerra da Sucessäo da Austria,
aumenta a acçäo dos corsários nas águas da Madeira,
destacando-se os ingleses "que se servem da ilha com mais
proveito"24: - "Aproveitando o Funchal como sustentáculo
cómodo, corsários ingleses passam a alterar com grandes danos
contra a navegaçäo das potências inimigas, sendo especialmente
vítimas os navios espanhóis que circulavam no tráfego das
ilhas Canárias, Costa de Africa (de modo particular o norte),
Espanha e Mediterrâneo ou América"25.
Estes destacam-se neste momento com um total de 27 presas
feitas, sendo 16 a espanhóis e 5 a franceses. Dos espanhóis,
10 foram apresados nas águas das Canárias, conjuntamente com
os únicos 2 portugueses. Este facto salienta o apertado
bloqueio posto pelos ingleses "às Canárias e ao tráfego
francês vindo da América central que demandava uma rota afim
dos mares da regiäo a partir de 1744..."26.
Para a manutençäo deste bloqueio os ingleses precisavam
da ilha da Madeira e do apoio das autoridades locais, uma vez
que aí estacionavam constantemente corsários ou navios de
guerra. Destes podemos destacar a balandra corsário do capitäo
Filipe Maré que estacionou aí durante dois meses, tendo
trazido ao porto três presas, e o corsário "Rei Jorge" entre

21Idem, nº 545.

22Idem, doc. 7, Março de 1814, maço 9.

23ANTT, PJRFF, nº 976, fol. 312vº/3.

24J. J. de Sousa,
O MOvimento do Porto do Funchal e a Conjuntura
da Madeira de 1727 a 1810, fol. 87.

25Idem, ibidem, fols. 87/8.

26Idem, ibidem, fol. 91.


Novembro de 1746 e Fevereiro de 1747 que conseguiu fazer 5
presas.
Da parte dos espanhóis temos neste momento uma reacçäo em
força com o bergantim Cantelmo Nossa Senhora da Candelária,
sob o comando do capitäo Pascoal de Sousa Verino, armado em
corso a 24 de Novembro de 173927:
- "asin de que por el tiempo que duraren las hostilidades
de una e otra parte pueda salir a corsear con la zitada
embarcación levando em ella la vendera de las armas de España
sea directamente, segundo la costa osidental de Africa, o bien
cruzando a la Madeira, y Terseras sin pasar ni tocar por
motivo alguno a los mares de America y perseguir, atacar,
tomar y apresar los navios y efectos que encontrare proprios
de El-Rey y subditos de la Gran Bretaña, y de otros enemigos
de la corona..."28.
Este teve uma acçäo constante ao largo da Madeira e Porto
Santo em 1748, apanhando presas locais inocentes para depois
as apresentar em troca aos ingleses e portugueses29, tendo a 14
de Abril apresado junto ao Cabo Giräo uma balandra inglesa,
acabando depois a ser atacado pela artilharia dos redutos de
Câmara de Lobos e do Ilhéu ao tentar vender essa presa na
ilha, a qual acabou depois embargada nas mäos do bispo
governador, que acolheu a pretençäo inglesa30
Depois disso o corsário espanhol ainda tomou uma escuna
inglesa junto da Ponta do Sol, mas em Maio acaba aprisionado
pela nau inglesa Chesterfield, sendo depois arrematada na
Alfândega.
Este facto do corsário Santelmo atesta mais uma vez o
colaboracionismo das autoridades locais com os ingleses,
quando repetiam constantemente a sua pretençäo de se manterem
neutrais.
Na segunda metade deste século mantém-se a posiçäo
privilegiada da força naval inglesa e o apertado bloqueio às
Canárias, sem que da parte da França ou Espanha haja uma
reacçäo em força, apenas manifestaçöes esporádicas de
represália em 1768 e 179931 com o apresamento pelo corsário
Santa Bárbara de um navio inglês.
Em 1762 em face dos acontecimentos europeus ordena-se ao
governador José Correia de Sá que se mantenha neutral em face

27ANTT,
PRFFF, nº 972, fols. 233/5, vide J. A. Bustamante, El
Corso Maritimo, pp. 91/110.

28ANTT, PJRFF, nº 972, fols. 233/5vº.

29ANTT, AF, nº 109, fols. 79, 82, 83vº (segundo J. J. Sousa).

30ANTT, PJRFF, nº 970, fols. 16vº/17.

31AHU, Madeira e Porto Santo, doc. 22 de Julho, Maço 5.


dos acontecimentos, ao mesmo tempo que se ordena que exerça
represálias sobre os navios espanhóis e franceses32. Este facto
contribuiu para a manutençäo da situaçäo privilegiada dos
ingleses na área atlântica.
Neste período conturbado foram apreendidos 5 navios
espanhóis no bloqueio das Canárias, sendo um em 175633, dois em
176234, um em 178035, 179936 e 180037.
Em 178038 o governador da ilha, em carta a Martinho de
Mello e Castro dá conta das proezas dos corsários ingleses,
que atacavam os barcos que faziam os contactos entre os portos
da ilha ou andavam nas pescarias, de que se salientava entäo o
capitäo Joäo Marshal, com o seu navio Júpiter. O mesmo havia
tentado apresar um navio veneziano que viera ao Funchal fazer
aguada, sendo impedido pelos portugueses, acabando depois por
seguir rumo ao Porto Santo onde, com o apoio de uma lancha de
pescadores, atacou uma embarcaçäo que aí estava.
O momento de 1799 a 1815 é marcado pelos conflitos
europeus advindos das guerras napoleónicas, é pautado por um
forte impulso da acçäo dos corsários nestas paragens,
destacando-se a acçäo de represália entre franceses e
ingleses.
Em 1796 uma galera da linha do Brasil é apresada por um
corsário francês, sendo retomada pelo corsário Alcovora que a
lançou no Funchal, passados dois anos passou-se o mesmo com um
bergantim da praça do Funchal em viagem da Madeira para os
Açores39.
A Madeira manteve-se entäo como base das incursöes
inglesas nas Canárias, que conduziram ao apresamento em 1799
do navio Fama40 e entre 1800/141 de 6 presas pelo corsário John Smith.

32ANTT,
PFRFF, nº 985, fols. 16vº/9; BNL-S/R-PBA-MS458, fols.
250/1vº, 231/4.

33ANTT, PJRFF, nº 974, fols. 14/4vº.

34J. J. de sousa, ibidem, fol. 100.

35AHU, Madeira e Porto Santo, nº 548/50.

36ANTT, AF, nº 238, fol. 26.

37AHU, Madeira e Porto Santo, nº 1163/9.

38Idem, nº 561.

39ANTT, PJRFF, nº 128, fol. 54vº (citado J. J. de Sousa).

40Idem, nº 128, fols. 101vº (idem).


Em 180542 os corsários ingleses apresaram na Madeira 5 navios
espanhóis, sendo 1 no alto mar e 2 junto das Canárias, a que se juntou
depois outro no porto do Funchal43. Tendo conduzido as presas ao
Funchal para a vender viu-se impedido de tal pelo governador
que alegava estar tal acto proibido por lei de 30 de Agosto de
1780 e 3 de Junho de 1803, onde se estipulavam as regras da
neutralidade44.
Em 17 de Março a nau inglesa Immortalité tinha apresado o
corsário espanhol El Entrepid Corunes, do mestre D. Patricio
Farto, que trazia a bordo os tripulantes de uma escuna
portuguesa que havia apresado45. E em Julho a fragata inglesa Venus
havia tentado apresar o bergantim espanhol Nª Srª da Conceiçäo
no Porto do Funchal, näo sendo coroado de êxito. Tal facto
mereceu viva repulsa do consul espanhol, que invocava as
regras da neutralidade46.
Em 1806 os ingleses apresaram mais 4 navios espanhóis47,
enquanto em Junho o brigue escuna inglês Saracen, sob o comando de
Prevot, lançou na ilha a tripulaçäo de uma fragata espanhola,
levando consigo a presa48. Em Dezembro a fragata inglesa Nereyde lançou
na ilha 13 prisioneiros das tripulaçöes de um corsário e uma corveta
espanhola, procedentes respectivamente, de Bilbau e Ponte Verda, que
apresou próximo da Madeira49. Entretanto em FEvereiro do ano
imediato um brigue de guerra inglês havia tentado apresar um
navio francês no Porto do Funchal, o que conduziu a um
protesto do consul francês argumentando o decreto da
neutralidade de 3 de Julho de 180350. Neste ano vários navios

41Idem, nº 130, fols. 16, 19, nº 206, fols. 80, 84 (cit. J. J. de Sousa, p.
123.).

42AHU,
Madeira e Porto Santo, nº 1156/60, 1589, 1584, 1594; doc.
11 Fevereiro, Maço 7.

43Idem, nº 1156/60.

44Idem, nº 1558.

45Idem, nº 1589, 1584.

46Idem, nº 1594.

47Idem, doc. 19 Julho, maço 7.

48ANTT,
PJRFF, nº 762, p. 191; AHU, Madeira e Porto Santo, nº
1672, 1698.

49AHU,
Madeira e Porto Santo, nº 1677, 1757, 1766, vide A.
Silbert, ibidem, p. 391.

50Idem, nº 1898.
de guerra aportaram à ilha e estiveram implicados no
apresamento de três navios espanhóis - as fragatas Nereyde e
Cambian e a escuna de Guerra Quail51. Em 181052 a galera inglesa The
Valiant apresou a fragata francesa Cannonier, vinda da ilha de França para
o Oriente com fazendas da India avaliadas em 3 milhoes de libras
esterlinas, no que se tornou dos saques mais vantajosos até entäo feito
nesta área.
Da rivalidade britânico-americana, acesa com a guerra da
independência dos Estados Unidos se transferiu para a área
atlântica insulana o embate das frotas dos beligerantes, com
acçöes violentas muito destacadas, principalmente nos Açores.
Na Madeira apenas temos de uma acçäo de represália de um
corsário inglês em 181353 contra um bergantim americano, que conduziu à
ilha para vender, no que foi impedido, pois neste momento e no período
consequente à dita guerra em 1778/80 as autoridades locais preocupavam-se
muto em manter a maior neutralidade54.
Entretanto em 1815 um facto inédito se constata no
Funchal em face desta constante acçäo de corso, uma vez que a
galera francesa Mercúrio com destino à Martinica ao entrar no
Funchal conjuntamente com um comboio inglês de sete navios, se
passou para os ingleses à saída, arvorando a sua bandeira.
Este facto deixou estupefactas e ao mesmo tempo alarmadas as
autoridades locais que näo deram pelo apresamento que a ter-
se-feito consistia numa violaçäo do direito de asilo e
soberania55.
Depois só em 1822 temos referência de que o bergantim
inglês Betsey fora abordado por 2 corsários ingleses que lhe
roubaram vinho e presunto56.
Quanro à acçäo dos franceses podemos afirmar que ela
incidia, de modo especial sobre as embarcaçöes portuguesas,
menos seguras e protegidas que as inglesas, tornando-se, por
este meio presa fácil aos corsários franceses, que as
justificavam pela política colaboracionista de Portugal,
aliado inglês. O porto do Funchal esteve por várias vezes
ameaçado pela acçäo destes, ou sob a expectativa da vinda da
esquadra de Brest. Muitas dessas presas eram retomadas pelos
corsários ingleses, como sucedeu em 1776 e 1798.
Desde Maio de 1793 o "panfletário" corsário de Nantes

51Idem, nº 1636/41.

52Idem, nº 1719/20, 1718, 1721, 1793.

53Idem, nº 2215.

54Idem, nº 3150/9.

55Idem, nº 465, 545, 561.

56Idem, nº 3647.
Sans Cullotte estava em actividade permanente nas águas da
Madeira.
Em face da Revoluçäo francesas e guerra consequente
muitos navios franceses que se encontravam, ou vieram ter ao
porto do Funchal, acabaram naturalizando-se aí como forma de
fugirem ao corso inglês.
Da acçäo de represália dos corsários franceses contra os
navios madeirenses ou nacionais temos 1 presa em 1797, 1798,
1801, 1813 e 4 em 181457. Neste último ano temos, primeiro duas
fragatas francesas que apresaram um navio que trazia o Conde das Galveas,
os quais entregaram os tripulantes ao navio Comerçante que fazia a patrulha
das ilhas, mais outras duas fragatas - Arethuza, l'Yrienne - haviam
apresado a escuna espanhola Stª Bárbara e os navios portugueses Hércules,
Carlote e o brigue Sociedade que haviam saído do reino para o Brasil58.
As preocupaçöes das autoridades locais em face destas
acçöes é constante nas duas últimas décadas do século XVIII,
coincidindo com o período de forte incidência das acçöes
francesas.
Em 1785 uma esqudra francesa andava corsando nas águas do
Porto Santo sob o comandante do Porto de Toulon, que segundo
lista fornecida pelo ajudante da esquadra, que entrara no
Funchal59 com alguns navios, se compunha de uma nau e 10
fragatas60. Foi com grande apreensäo que as autoridades locais tomaram
conta do facto e procuraram em tudo manter a maior neutralidade, pois que
faltava à ilha forças suficientes para lutarem com os franceses e os
ingleses haviam desaparecido.
Entre 1798/9 se intensificaram as acçöes dos corsários
franceses junto da Madeira, de modo que se haviam tornado num
forte transtorno para o comércio da ilha61, temendo-se a todo o
momento o assalto de uma esquadra francesa ou a repetiçäo dos
acontecimentos como o de 180462.
Por esta forma os franceses fizeram incidir a sua acçäo
sob os navios portugueses mais desprotegidos e menos
defendidos em relaçäo a qualquer ameaça corsária, constituindo
assim uma grande preocupaçäo para as autoridades locais e um
grave transtorno para as actividades comerciais da ilha em
finais do século XVIII. Além das presas referidas de navios
portugueses temos a salientar por parte dos franceses apenas

57Idem, doc. 17 Agosto, maço 12.

58Idem, nº 3301/2, doc. 18 Julho, maço 9; ANTT, PJRFF, nº 759, p. 351,


nº 772, pp. 54/5.

59Idem, doc. 18 Julho, maço 9.

60Idem, nº 760.

61Idem, nº 761.

62Idem, nº 1019, 1126.


uma presa a uma embarcaçäo näo portuguesa, facto que se deu em
1797, altura em que apresaram uma galera americana - Virginia,
conjuntamente com outra portuguesa - Annibal63.
Se os ingleses fizeram da Madeira a sua base de apoio
para as suas incursöes na área atlântica de passagem, os
franceses, por seu lado serviam-se das ilhas Canárias, onde
faziam aguada e vendiam as presas ou lançavam a tripulaçäo
dessas presas64.
Os corsários argelinos que ao longo dos séculos XV/XVII
se haviam tornado uma forte ameaça para estas paragens,
nomeadamente nas ilhas do Porto Santo e Santa Maria, surgem em
pleno século XVIII e XIX com pouca importância e acçöes
esporádicas. Assim em 170865 temos notícia de um saque do Porto Santo
e algumas presas no alto mar em 1771, 1737, 1750, neste último ano levando
cativo o cônsul francês, que se deslocava de Lisboa para a Madeira66.
Entre 1806/767 andavam corsando nas águas da Madeira 2
corsários argelinos à caça de navios portugueses e espanhois68,
surgindo depois em 1827 uma forte ameaça, a qual é cerceada
por uma acçäo em bloco dos países europeus lesados com o
bloqueio do porto de argel, por esta forma todos os navios
argelinos encontrados a navegar no Atlântico eram considerados
ao momento corsários, segundo a Gazeta de Londres69.
Em 30 de Julho de 1827 a questäo dos corsários argelinos
estava resolvida e a nova regência mantinha boas relaçöes com
Portugal, o que justifica uma recomendaçäo os navios de
comboio e patrulha das ilhas que näo molestavam os navios
desse porto70.
No entanto embora nos faltem os dados para acçäo dos
corsários argelinos na primeira metade do século XIX, o certo
é que eles existiram, uma vez que em Argel em 1811 estavam 610
portugueses de que foram entäo libertados 247 com 1021 pesos

63Idem, nº 1476.

64Idem, nº 968.

65Idem, nº 968.

66Vide E. Pereira, Piratas e Corsários nas ilhas.

67A. Silbert, ibidem, p. 391.

68AHU,
Madeira e Porto Santo, nº 1677, 1757, 1766; vide A.
Silbert, ibidem, p. 391.

69Idem, nº 1677.

70Idem, nº 10348/50.
em dinheiro71. Tendo-se feita uma coleta entre 1810/1 para esse fim72.
Em Fevereiro de 1811 temos referência que Manuel
Sardinha, da tripulaçäo do brigue Lebre Pequena estivera
cativo em Argel e havia ficado inválido no combate que travara
com um corsário há 11 anos e 3 meses73. E em 1823 se dá conta que
Diogo António CAbral estivera no cativeiro de Argel mais de 10 anos pela
tomada da fragata Cisne74.
A finalizar temos a destacar, ainda, a acçäo dos
corsários näo identificados, ou antes piratas (?), que entre
1804/1820 apresaram na área da Madeira 8 embarcaçöes
portuguesas, sendo uma em 1804, 1820 e 6 em 1818.
Em 1804 o mestre do bergantim português - Conceiçäo -
dizia ter sido apresado a 26 de Maio por um corsário "que se
dizia inglês, sem o parecer, por falar espanhol e italiano a
gente da sua tripulaçäo", tendo roubado a carga que
transportava75.
Em 1818 foram apresadas as galeras Luzia, Ninfa de
Lisboa, a escuna Maria76, as galeras Rainha dos Mares e o bergantim
Restaurador77, o bergantim da cidade do Porto78.
Por fim em 1820 é apresado o brigue português -
Providência - por um brigue pirata de 7 canhöes a banda, sendo
esta a única referência que temos à acçäo dos piratas79.
A acçäo destes corsários näo identificados ou piratas,
também se fez sentir com os navios espanhóis, sendo
aprisionados em 1816 o bergantim Nª Srª do Carmo por um
corsário de piratas80 e em 1823 o navio Armonia81.

71Idem, nº 10351.

72Idem, doc. 26 Janeiro, maço8.

73Idem, nº 2437/9, 2546/9, 2841/2.

74Idem, maço 8.

75Idem, doc. 3 Junho, maço 12..

76Idem, nº 1482/3.

77Idem, nº 4452/3.

78Idem, nº 4485: doc. 27 Outubro, maço 10.

79Idem, nº 4486/7.

80Idem, nº 4997/8.

81Idem, nº 3781/2.
2.2 - AÇORES

A área dos Açores, situada na confluência das rotas de


retorno do mundo colonial será um lugar privilegiado da acçäo
dos corsários e piratas. Aí se fez sentir a forte acçäo dos
corsários ingleses, americanos, insurgentes, os quais
escolhiam os eixos de aproximaçäo, provavél, entre Angra e as
Flores numa área que abrangia todas as ilhas do grupo central
e ocidental.
Um saque feito nos Açores, tornava-se mais rendoso, uma
vez que apanhava desprevenidos (?) os navios das rotas das
Indias Ocidentais e Orientais, do Brasil, que regressavam à
Europa com o ouro, a prata, o açúcar e os produtos exóticos. O
contrabando, a pirataria e o corso absorviam uma parte desses
produtos juntos dos Açores. Foi tendo em conta essa dinâmica
que desde muito cedo se criou em Angra a Provedoria das
Armadas, que coordenava o apoio das naus das rotas coloniais
nacionais, bem como a sua defesa desde o extremo ocidental -
Flores e Corvo - até Angra ou Lisboa.
Os ingleses surgem nestas paragens, näo com täo grande
importância como na Madeira, onde tinha a base das suas
operaçöes. Aqui mais se destaca a acçäo dos insurgentes.
Em 7 de Maio de 178182 temos notícia da passagem por Angra de
vinte corsários ingleses armados que fizeram aguada e a 17 de Maio83 se
refere que um corsário inglês armado em Liverpol - Herlekin -, certamente
um dos anteriores, deu caça ao bergantim português Monte do Carmo e S.
Francisco nas ilhas das Flores. Ainda durante este período temos em 179884
o apresamento de outra embarcaçäo portuguesa - o bergantim
Santo António por um corsário inglês que deitou a carga ao
mar.
Em finais do século XVIII temos poucas presas, pois para
além destas que atingem os portugueses, apenas podemos
salientar mais uma acçäo em 21 de Maio de 179385 contra um navio
sueco e em 179786 contra um navio francês junto de Guadaloupe, nas Indias
Ocidentais, que transportou até às flores, onde naufragou. Este facto
isolado denota que a acçäo de represálias entre franceses e ingleses quase
näo se fez sentir nos Açores e o único caso conhecido deu-se fora dos
Açores, facto que vem mais uma vez comprovar que os ingleses haviam
concretizado um apertado bloqueio à navegaçäo francesa no alto mar

82Idem, nº 6896.

83AHU, Açores, doc. 17 Maio, maço 11.

84Idem, doc. maço 11.

85Idem, doc. 2 Abril, maço 20; 26 Janeiro, maço 19.

86Idem, doc. 10 Junho, Maço 16.


Atlântico.
Entre 1800/10 a acçäo inglesa faz-se incidir
particularmente sobre os navios espanhóis que regressavam da
América do Sul e faziam a rota dos Açores. Em 180087 a escuna
inglesa Providência apresou no Porto de Ponta Delgada o bergantim espanhol
- Três Amigos -. que se apresentou com uma manifesta violaçäo da soberania
territorial portuguesa e do direito de asilo, facto que conduziu a uma
acesa polémica, sendo o caso apreciado no Conselho de Justiça do
Almirante88. Entretanto o navio espanhol ficara detido a guardar a soluçäo
do caso, mas antes que ela viesse o seu comandante levantou ferros a 15 de
Julho de 180289, acabando depois apresado pela fragata Phenix junto de S.
Miguel90.
Facto idêntico se repetiu em 1803, quando a 17 de Agosto91
ocorsário inglês General Gordon cortou as amarras à galera espanhola Nª Srª
das Mercês que se achava fundeada a 400 braças do Castelo de S. Brás.
Em 15 de Setembro do mesmo ano, outro corsário inglês da
galera Amadora Angolla, apresou a escuna espanhola Ecce Homo
Ajuda Esperança que se encontrava ancorada em Ponta Delgada a
descarregar e depois se havia levantado com o temporal92.
Estes factos comprovam a expressäo do governador de S.
Miguel, quando em 1803 dizia - "que näo säo poucos os que aqui
tem vindo"93; ou seja a constante permanência dos corsários ingleses
nestas paragens, prontos a tomar qualquer embarcaçäo desprevenida, até
mesmo junto à costa ou nos portos das ilhas, com manifesta violaçäo do
direito de soberania e asilo; aliás toda a sua acçäo nesta área será
pautada por essa característica, atingindo o seu auge em 1813 com o célebre
combate da baía do Faial e que já se verificara por esta forma em 1805 com
a apreensäo da galera espanhola Castilha pela fragata inglesa Eliania94.
Ao mesmo nível se situa a presa feita em 1803 pelo
corsário inglês armador Victori no Porto de Ponta Delgada da
galera holandesa Vraw Anna Catarina da Batavia95 e do bergantim

87Idem, doc. 22 Junho, maço 17.

88Idem, doc. 3 Novembro, maço 29; 27 Fevereiro, 2/8 Maio, 26 Abril, maço
103.

89Idem, doc. 3 Maio, maço 103.

90Idem, doc. 6 Novembro, maço 29.

91Idem, doc. 26 Abril, maço 103.

92Idem, doc. 17, 25 Agosto, 17 Setembro, maço 29.

93Idem, doc. 16, 20 Setembro, maço 29.

94Idem, doc. 17 Setembro, maço 29.

95Idem doc. 3/4, Março, 24 Dezembro, 16 Agosto, Maço 35; 28 Março, 7 Abril,
maço 28, 15 Novembro, maço 32; 9, 30 Janeiro 1806, maço 36.
hamburguês Hercules, "nas barbas dos oficiais de saúde96. Caso idêntico
veio a suceder em 1805 em face dos vexames provocados pela chalupa de
guerra inglesa Kent ao bergantim português S. Joäo Bom Nome e Bons Amigos,
o qual corsário dentro do porto de Ponta Delgada revistou e levou
pricioneiro o seu comandante97.
Depois só temos novas referências a acçäo corsária
inglesa em 181198 e 187199 contra um navio americano, uma escuna
portuguesa vinda de Lisboa com pedra e cal e a outro barco vindo do Pico
com Madeira.
Os franceses pouco se aventuraram por estas paragens
açorianas, uma vez que lhes estava vedado o caminho pelos
ingleses, que a partir da Madeira controlava as saídas do
Mediterrâneo. No entanto a sua acçäo de represália ainda se
fez sentir, mas de modo esporádico e por esquadras
organizadas, daí o temor manifesto destes navios em 1793100,
1797101 e 1814102.
Em 1782103 temos notícia do apresamento de um navio inglês, que
conduziram a Ponta Delgada onde o pretendiam vender, sendo impedidos pelas
autoridades locais.
Em 1797 a inquietaçäo das autoridades insulanas em face
das acçöes dos corsários franceses extrema-se em razäo da
notícia aí chegada de que os franceses preparavam uma esquadra
em Brest para "atacar e roubar estas pobres ilhas de que
apenas poderam tirar de todas elas pouco mais de nada em
efeitos"104.
Teriam sido estes navios e o bergantim Baläo, em viagem
de cruzeiro nestas ilhas encontrou em Fevereiro de 1798, os
quais conduziam um bergantim inglês que haviam apresado105. Os

96Idem, doc. 1/2, 8 Agosto, maço 29.

97Idem, doc. 17 Setembro, maço 29.

98Idem, doc. 28 Junho, maço 34.

99Idem, doc. 31 Agosto, maço 29.

100Idem, doc. 22 Julho, maço 69.

101Idem, doc. 11 Junho, maço 16.

102Idem, doc. 30 Julho, maço 17.

103Idem, doc. 5 Janeiro, maço 62; S/D, maço 61.

104Idem, doc. 17 Dezembro, maço 11.

105Idem, doc. 30 Julho, maço 17.


mesmos teriam roubado o hiate S. Lourenço106 e em Julho apresaram defronte
de S. Miguel tomaram um navio da praça de Angra, outro que vinha de Cabo
verde e outro, ainda, em Santa Maria. Em face deste último facto se
comentava: - "e todas estas presas fizera no espaço de pouco mais de trinta
dias, remetendo as primeiras duas a Canárias, e tratando os prisioneiros
com humanidade no ataque..."107.
Por último temos em 1806 três fragatas francesas sob o
comando de Monseour de La Duc que apresaram o bergantim inglês
Ruth que havia sido de Ponta Delgada em 25 de Maio, com sal e
carväo108.
Os corsários, ou antes piratas argelinos, que em 1616109
haviam feito uma acçäo em força na ilha de Santa Maria, foram sempre
temidos nas ilhas açoreanas, embora nunca mais actuassem da mesma forma nos
séculos XVIII e XIX. Aqui as notícias säo esporádicas e os documentos
consultados deixam transparecer o nervosismo das autoridades, quando se
pressente por alguma forma a sua presença, como veio a suceder em 1767110 e
1817111, sem que se tivesse feito sentir qualquer acçäo. Apenas temos
conhecimento do insulto de um corsário de Garnizé a um barco de Vila Franca
do Campo, que na mesma altura tomara um bergantim inglês112.
Para além destas operaçöes em que se dá conta da autoria
da nacionalidade dos apresadores, temos referência a algumas
onde ela näo é expressa e se alude ao nome genérico de
corsários. Facto atestado em 1816113 com o roubo do brig-escuna de
José Severino na Baía do Faial, do assalto, na mesma data, de Espírito
Santo (Santa Maria)114. No ano imediato temos o saque de uma fragata que
seguia para a Madeira com milho, no qual acto os corsários "só deixaram o
que tinham no corpo"115 e a presa do hiate Nª Srª do Alívio116 e da Nau Nª

106Idem, doc. 29 Março, maço 18.

107Idem, doc. 2 Abril 1799, maço 20; 26 Janeiro 1799, maço 19.

108Idem, doc. 7 Agosto, maço 19.

109Idem, doc. 4 Junho 1806, maço 12; 1 Julho 1806, maço 37, 14 Abril 1807,
maço 41.

110Idem, doc. 27 Julho 1616, 12 Outubro 1617, maço 1.

111Idem, doc. 10 Setembro, maço 4.

112Idem, doc. 3 Dezembro, maço 68.

113Idem, doc. 11 Dezembro, maço 69.

114Idem, doc. 17 Dezembro, maço 68.

115Idem, doc. 12 Dezembro, maço 69.

116Idem, doc. 28 Janeiro, maço 69.


Srª da Piedade e Almas117. Em 1821, mais cedo que a época habitual do corso
temos nova acçäo contra o hiate português Conceiçäo, que navegava da
Corunha para a Terceira e da contra-escuna Feliz Ventura em viagem de
Maranhäo para Lisboa. Acerca deste facto comentava-se entäo: - "Tornam
estes mares a ser infestados de corsários e bem mais cedo do que era de
esperar, atento o rigor da estaçäo invernosa"118.
No ano de 1826 surge-nos uma última informaçäo sobre o
roubo feito por um corsário a uma escuna americana ao largo do
Faial119.
O movimento vintista português para além dos graves
reflexos na estrutura sócio-económica portuguesa, veio alterar
a dinâmica colonial lusíada em face da declaraçäo da
independência do Brasil. Facto que só tardiamente veio a ser
reconhecido pela mäe-pátria que näo pretendia de modo algum
desligar-se desta importante colónia. Este litígio aberto em
1820 perdurou até 1823, altura em que se reconheceu
oficialmente a independência do Brasil. No entanto no mar ele
continuou a manteve-se por algum tempo por meio de acçöes de
corso de navios brasileiros na área dos Açores, alguns deles
eram embarcaçöes inglesas que se havia colocado ao serviço da
nova monarquia, assim em 1823 temos a presa ou roubo de 4
embarcaçöes portuguesas por estes corsärios ao serviço do
reino do Brasil120.
Da parte portuguesa em face da celebraçäo do tratado de
paz apenas foi solicitado aos Açores que näo hostilizassem as
embarcaçöes com a bandeira de Buenos Aires121.

2.2. - OS BELIGERANTES AMERICANOS

Os beligerantes americanos surgem com particular


incidência nas ilhas dos Açores, em épocas determinadas da
conjuntura histórica setecentista ou oitocentista. No entanto
a Madeira foi igualmente um polo de atracçäo, nomeadamente dos
piratas ou corsários americanos que aí vinham à procura dos
seus rivais ingleses.
Estas incursöes dos corsários americanos inserem-se numa
dinâmica própria saída da evoluçäo da conjuntura e estrutura
colonial a partir da segunda metade, que veio alterar o
posicionamento dos europeus em face do controle e disputa das
rotas comerciais. Enquanto as acçöes dos ingleses,

117Idem.

118Idem, doc. 2 Dezembro, maço 69; 12 Fevereiro, maço 68.

119Idem, doc. 12 Fevereiro, maço 68.

120Idem, doc. 3 Outubro, maço 78.

121Idem, doc. 7 Setembro, maço 85, 24 Setembro, maço 83.


franceses... se insere no velho quadro da gueraa de corso e
característica dos momentos de guerra, da rivalidade e disputa
das rotas e mercados comerciais, as acçöes dos corsários
americanos e insurgentes insere-se numa dinâmica de luta pela
independência das regiöes de forte dominaçäo e exploraçäo
colonial no continente americano, como é o caso dos Estados
Unidos, Argentina, Bolívia. No primeiro caso o alastramento
dessa acçäo à área atlântica insulana, justifica-se pela forte
influência britânica nestas paragens, aliado ao
colaboracionismo portugues, daí as suas acçöes incidirem sobre
os portugueses e ingleses. No segundo a acçäo é justificada
pelos pr+oprios como resposta à intervençäo militar
portuguesa, por intermédio do Brasil na guerra da Argentina e
Bolívia.

2.1. - OS CORSARIOS AMERICANOS

A guerra da independência dos Estados Unidos da América


(1770/90)122 e o litígio permanente que daí adveio mesmo depois das pazes
celebradas em 1873, uma vez que este se alargou ao espírito de guerra
latente com as constantes incursöes de corsários armados nas cidades
americanas, isolados e em estreita colaboraçäo a partir de 1816 com os
insurgentes, fazendo incidir particularmente esse confronto na área de
forte atracçäo do movimento naval e corsário - Madeira/Açores, causando por
esta forma graves transtornos ao viver das populaçöes e ao movimento
atlântico, sendo igualmente uma constante preocupaçäo das autoridades
insulanas que se avolumou em 1814 com o célebre combate da Baía da Horta.
Na ilha da Madeira temos notícia da sua permanência desde
1778 a 1780, tendo entäo bloqueado esporádicamente o Porto do
Funchal, por diversas vezes, isto de modo que em 1780 o
governador se queixava que os corsários americanos
"infestam... continuadamente esta costa depois que à guerra da
América Setentrional se juntou a de França, e de Espanha;
causando os sobreditos corsários particulares e maior incómodo
que é possível ao comércio deste porto, ou nas revistas dos
navios"123. No entanto neste período näo temos notícia de
qualquer presa, essas apenas surgem referenciadas em 1810124
com o apresamento de um navio inglês e em 1816 de três
embarcaçöes espanholas125 e três portuguesas126.

122Vide F. Mauro,
Histoire Economique Mondiale - 1790/1970, Paris,
1971, pp. 127/148.

123AHU, Madeira e Porto Santo, nº 561, vide nº 465, 545.

124Idem nº 2415.

125Idem, nº 3787/8, 3816/9.

126Idem, nº 3816/7.
No que concerne aos Açores, temos em 1777127 o assalto a uma
nau portuguesa vinha do Maranhäo, depois, sómente iremos ter notícia da
acçäo destes em força em 1814/16. No ano de 1814 os corsários americanos
pairavam constantemente nas águas açorianas, de modo que entre Julho/Agosto
apresaram três embarcaçöes inglesas entre as Flores e Corvo128. Este
conflito latente entre ingleses e americanos mais se agudizam
entra 26/7 de Setembro em face do combate naval travado na
baía do Faial entre o corsário americano General Amstrong e
uma divisäo naval inglesa sob o comando de Robert Loyd, que
estava de passagem para a Jamaica, onde ia em auxílio do
general Cckrane para o ataque a Loisiana129. A 26 de Setembro
ancorou ao porto da Horta o corsário americano para fazer aguada, já
perseguido subrepticiamente pela divisäo naval inglesa, que chegando ao
porto se colocou em posiçäo de agressäo, a que respondeu o capitäo Reid, do
corsário americano, travando-se entäo segundo expressäo do governador da
Horta, "um horroroso e sangrento combate a que deu lugar o desvario,
orgulho e soberba de um insolente chefe britânico, que näo quis respeitar a
neutralidade em que Portugal se acha na actual contenda entre Sua Magestade
Britânica e os Estados Unidos da América"130. Segundo informa o mesmo
em relatório de 14 de Outubro "decidiu-se a vitória a favor
dos americanos, em destruiçäo quase total dos ingleses"131.
Em face destes acontecimentos e de outros que se
seguiram, em queas potências beligerantes näo respeitavam o
direito das gentes e as leis marítimas "das naçöes civilizadas
da Europa"132 era natural a apreensäo e nervosismo das
autoridades insulanas, como se pode deduzir da seguinte
passagem:
- "Logo que vi serenada a tempestade que por tantos anos
assustou a Europa e fez estremecer a nossa existência
política, achando-se contudo ainda acesa a guerra entre a Grä-
Bretanha e os Estados Unidos, considerei que o principal
teatro desta guerra marítima seia nas vizinhanças do governo

127AHU, Açores, doc. Outubro, maço 8.

128Idem, docs. 1, 14 de Julho e 13 Agosto, maço 63.

129Sobre este caso existe no AHU um grupo valioso de documentos - maços


60/2, de que a maior parte foi já publicada no Arquivo dos Açores, vol.
XII, pp. 58/75, e dele já se ocupou Marcelino Lima - "Por causa de um
ramalhete" e nos Anais do Município da Horte, pp. 665/682.
Segundo informaçäo de Joäo Afonso, Açores, em novos papéis
velhos, pp. 235/49, os "Anais da Família Dabney" trazem
referência aos episódios mais importantes deste conflito (p.
242).

130AHU, Açores, doc. de 7 Outubro, maço 61.

131Maço 62, A. Açores, vol. XII, pp. 58/9.

132Idem, maço 62.


que Sua Alteza houve por bem confiar as minhas poucas forças e
pequeno préstimo e que sem dúvida repetidas seriam as ocasiöes
da inquietaçäo para estes povos. Näo tardei muito a
desenganar-me de que as minhas conjecturas ca a realizar-se e
o caso do Faial acontecido no dia 20 de Setembro, de que já
dei conta a V. Exa., verificando-se, me fez esperar
diariamente novos acontecimentos. Após este se seguiram as
irregularidade praticadas na ilha Graciosa com a galera
Emulaçäo de que igualmente dei conta a V. Exa. Näo podendo
remediar, nem prevenir desastres da ordem dos sucedidos na
ilha do Faial, porque para isso näo tennho forças à minha
disposiçäo. Tratei, contudo, de precaver novas desordens na
Graciosa que pudessem comprometer o ssossego daquele povo e a
neutralidade por Sua Real Alteza adoptada"133.
Conjuntamente com este facto "estrondoso" da baía do
Faial, temos o apresamento da escuna inglesa Matilde junto da
vila da Lagoa em S. Miguel134.
Em 1816 os corsários americanos investem contra as
embarcaçöes, certamente como forma de represália ao sucedido
em 1814 e à posiçäo entäo tomada pelos portugueses, tendo
entäo tomado 3 navios portugueses135, entrando um deles no porto de
Ponta Delgada a reconhecer os navios, disparando dois tiros contra uma
galera irlandesa que aí estava136. A este se junta em 1817137 e apresamento
de outra embarcaçäo nacional.
Certamente que o litígio entre os corsários ingleses e
americanos foi aquele que causou maiores preocupaçöes às
autoridades insulanas e que assumiu maiores proporçöes,
conforme o atestam os acontecimentos de 1814 no Faial, no
entanto seräo os insurgentes, por vezes aliados dos
americanos, se afirmaräo, acima de tudo, como a praga destas
paragens entre 1816/7.

2.2. - OS CORSARIOS INSURGENTES

Os acontecimentos do continente americano eram vistos


desde meados do século XVIII, com grande preocupaçäo por parte
das autoridades insulanas, que atendiam aos possíveis reflexos
desse conflito nestas paragens atlânticas ambivalentes. Essa
se fez sentir nomeadamente em 1777 em face do ataque feito

133Idem, doc. de 2 Dezembro 1814, maço 61.

134Idem, doc. 23 Novembro 1814 e 19 Janeiro 1815, maço 62.

135Idem, doc. 27 Dezembro, maço 8, s/d, maço 69.

136Idem, doc. s/d, maço 69.

137Idem, doc. 28 Junho, maço 68.


pelos espanhóis ao Rio da Prata, Rio Grande de S. Pedro e
Santa Catarina138 e em 1812 com a intervençäo das tropas portuguesas na
guerra da independência da Argentina, que vinha ameaçando as fronteiras do
sul do Brasil. Em face destes acontecimentos Francisco Borges em carta ao
Conde das Calveas, dava conta da sua apreensäo em face da evoluçäo provavél
dos acontecimentos e das suas repercussöes futuras, que de facto seriam
funestas, como veremos:
- "... eu näo posso sufocar os acontecimentos de desgosto
que me possuem vendo suplantar as sábias reflexöes de V. Exa.
sobre a expediçäo de Buenos Aires e ver marchar o nosso
exército sobre as margens do Panamá a envolver a naçäo em
contendas cujos resultados poderäo ser um dia assaz
desastrosos à naçäo e ao Brasil, exaspero, quando recordo as
sábias e poderosas razöes com que Vª Exª apoiou esse voto
sobre o comportamento a delicadeza que a nossa corte devia
conservar com Buenos Aires pensar diametralmente oposto à
cogitaçäo do génio que depois de ter semeado a confusäo e a
anarquia nas finanças e na Marinha foi de um golpe perder no
Brasil o exército e ingerir-nos nas delicadas questöes da
América espanhola, no momento em que este anunciou, uma
revoluçäo espantosa. Inculcar ao ministro da guerra querer dar
ao Brasil aquisiçöes sobre as margens do Rio da Prata, reviver
a nossa antiga animosidade com os espanhóis, abandonar as
vantagens comerciais que nos patenteia a amizade das colónias
espanholas, seja qual for a sua futura sorte, ingerir a um
império, sem populaçäo, sem exércitos, sem homens habéis em
número proporcional à sua necessidade; com uma absoluta
carência de tudo o que de necessário para a sua defesa, quanto
mais para as operaçöes ofensivas, com um grande déficit nas
finanças, conduzir o nosso exército ao Rio da Prata para ser
expectador de um armistício entre o vice-rei e os insurgentes
agora olhados por eles e reconhecidos como uma naçäo livre,
falando-se em regresso geral, tudo à vista de uma tropa
desgostosa e mal paga: por em contacto a naçäo com povos em
revoluçäo, näo se recordando que o entusiasmo só pode ser
destruído por si mesmo sem se recordar da Revoluçäo Francesa,
dos Estados Unidos. Eis os felizes resultados da marcha das
nossas gloriosas tropasm quais säo as desastrosas épocas e que
nos podem conduzir os planos atrevidos, remanescer e ambicioso
do Exmº Sr. Conde de Linhares"139.
CErtamente nesta carta näo se pretendia aludir aos
reflexos que o acontecimento veio a ter na dinâmica atlântica
de inícios do século XIX mas antes o perigo da luta
independentista alastrar à rica regiäo brasileira. Este näo
previa certamente a questäo da acçäo corsária insurgente.
O conflito opôs os portugueses aos rebeldes argentinos,
sob o comando de José Artigas e manteve-se para além da
batalha de 7 de Janeiro de 1817, onde estes sairam derrotados

138Idem, doc. 24 Outubro, maço 8.

139Idem, doc. 18 Março 1812, maço 57.


e mais ainda para além da intervençäo europeia na sua
resoluçäo, uma vez que o corso, como resposta permaneceu até
1827140.
Segundos declaraçöes dos insurgentes a sua acçäo de corso
inseria-se numa ampla campanha de represálias contra a acçäo
portuguesa nos destinos da Argentina. Assim em 5 de Dezembro
de 1816 uma galera americana informava que o capitäo
insurgente que apresara o bergantim espanhol Nª Srª Venerador
Obrigadíssimo: - "... em consequência da parte de Portugal
tinha tomada na guerra actualmente existente trazia ordens de
cativar todos os navios que encontrasse pertencentes aquela
naçäo e igualmente espanhóis"141.
Em 24 de Dezembro de 1816142 o dono do hiate D. José Diligente,
que havia sido apresado junto do Funchal por um insurgente, dava conta das
suas intençöes: - "Increpando-os eu de me roubarem com uma bandeira nossa
aliada, me responderam que tinham poder de usar e firmar quaisquer
bandeiras, porém que o seu navio era espanhol patriora e que o motivo de me
roubarem era o ter o rei de Portugal mandado tropas para Buenos Aires".
O facto destes corsários arvorarem habitualmente a
bandeira americana143 e de terem a bordo uma tripulaçäo cuja
nacionalidade era muito heterogénea, com ingleses, portugueses, americanos,
espanhóis144, onde prdominavam os americanos atestava, näo só o forte apoio
que estes tinham por parte dos americanos, mas igualmente à consideraçäo
destes como piratas.
Em 7 de Janeiro de 1817145 se ventilava essa hipótese, com base
na amálgama da nacionalidade da tripulaçäo: - "... me persuado que
semelhantes embarcaçöes antes devem ser consideradas como piratas, do que
navios de corso de governo regular".
Argumentando-se a 14 de Fevereiro146, por igual forma:
- "... a meu ver näo passam de piratas, tanto pela falta
de legitimidade para semelhante corso, como por sua tripulaçäo
de várias naçöes, sendo quasi todos americanos, ingleses,
declarando que por comissäo que têm dos insurgentes de Buenos
Aires, estäo autorizados para fazerem presas a vassalos da

140Sobre este caso vide CArlos Selvagem,


Portugal Militar, pp. 530/3;
Pinheiro Chagas, História de Portugal Popular e Ilustrada,
Lisboa, 1903, vol. VII, pp. 125/131.

141Idem, doc. 5 Dezembro, maço 69.

142Idem, maço 69.

143Idem, doc. 24 Dezembro, maço 69.

144Idem, doc. 24 Dezembro, 1816, 14 Fevereiro, 27 Março, 29 de Abril, 27


Maio, 20 de Junho, 12 de Dezembro 1816, maço 69.

145Idem, maço 65.

146Idem, maço 69.


naçäo espanhola e seus aliados".
Em 29 de Abril147 acrescentava-se:
- "Se espalharem vezes de que os corsários, ou antes
piratas, que causavam nos mares desta cpitania e ora se diziam
pertencentes aos insurgentes de Buenos Aires, ora ao chamado
governo republicano do México, haviam efectivamente saído de
Baltimor nos Estados Unidos d'América e näo tripulados pela
maior parte por cidadäos dos mesmos estados...".
Um facto saliente é contado em 30 de Abril de 1817148 no
protesto do capitäo da galera Marquês de Pombal, que havia sido apresada
por um corsário patriota de Buenos Aires. Segundo ele o corsário, quando o
apresou arvorara a bandeira americana "e toda a tripulaçäo do corsário,
tanto comandante e oficiais e marinheiros eram da naçäo americana, somente
um português servido de língua e vários pretos da naçäo americana, pois nem
um só espanhol". Ao ver um bergantim americano retirou a bandeira americana
e içou em seu lugar a do México, que descreve pela seguinte forma: - "Esta
bandeira era toda em xadrez de dados azuis e brancos com uma águia no
centro e em cada pé um ramo d'oliveira, a águia no peito tinha três riscas
encarnadas e três brancas e por cima da cabeça da águia tinha um letreiro,
que dizia bandeira patriótica do México e em volta em quadro uma risca
encarnada".
A acçäo dos insurgentes nas águas da Madeira näo se
apresenta täo constante e importante como nos Açores, surgindo
apenas com assaltos e presas esporádicas a navios portugueses
e espanhóis em 1816, 1818, 1819/21.
Em 31 de Outubro de 1816 é apresada a polaca Divina
Pastora, por um insurgente, que segundo o governador Florencio
Correia de Mello, se vinha tornando numa praga: -"... os quais
vem causando graves presas às naus portuguesas. Este malefício
vai sendo de um peso enorme para o comércio desta ilha e
pondo-a em um fatal bloqueio, sem que eu o possa obstar por
forma alguma, por falta de recursos"149.
Em 1818 säo apresados dois bergantins portugueses, que
conduziram às Canárias150. E no ano imediato se dá conta que a
escuna de guerra Leopoldina entrou no porto do Funchal
perseguida por um insurgente151.
A 23 de Março de 1820, o consul de Portugal nas Canárias
em ofício ao governador da ilha da Madeira participava que
essas ilhas estavam completamente cercadas por navios de
corsários insurgentes que atacavam e apresavam a marinha
mercante que demandava estas paragens:
- "Os portos destas ilhas Canárias tem presentemente

147Idem, idem.

148Idem, AHU, Madeira e Porto Santo, nº 3816.

149AHU, Madeira e Porto Santo, nº 3816.

150Idem, doc. 15 Novembro, maço 10.

151Idem, nº 4566.
estdo infestados de corsários insurgentes que mesmo as
pequenas embarcaçöes do tráfico delas tem sido maior valor. E
que tendo ele feito uma presa espanhola cuja tinha alguma
defesa lhe adicionaram mais alguma e hoje se acha outro
corsário de força os quais bloqueiam estes portos de dias em
dias"152.
A 23 de Abril estes corsários foram avistados na Ponta do
Garajau, mas em face das precauçöes tomadas em face deste
aviso näo exerceram qualquer acçäo153.
No ano imediato, sim, apresaram a 6 de Agosto a escuna
Nympha que vinha de Lisboa para a ilha154 e antes na ilha de S.
Bartolomeu haviam apresado outra embarcaçäo portuguesa155.
Nos Açores a acçäo dos insurgentes mantem-se até 1827 e
apresenta-se particularmente forte entre 1816/7. Isto de tal
modo que em Dezembro de 1816 mantinham "uma espécie de
cruzeiro entre os canais que dividem as ilhas e obrado
hostilmente näo só contra um navio português, mas até contra o
território de El-Rei Nosso Senhor"156. Desses dois passaram por S.
Jorge157, estando certamente implicados no roubo da escuna
portuguesa Nª Srª da Piedade e Almas158, o bergantim de José
Severino Avelar a 3 de Dezembro, que seguia para a Madeira159 e insultos e
maus tratos a uma lancha de S. Miguel160 e ainda o hiate D. José beligente,
junto da Madeira161.
Das embarcaçöes estrangeiras, apenas temos referência do
apresamento do bergantim espanhol Nª Srª Venerador e
Obrigadíssimo162 e da escuna inglesa Sarah163.

152Idem, nº 5008.

153Idem, nº 5011, no
Patriota Funchalense, nº 26, pp. 3/4 se
refere os efeitos nocivos da acçäo destes.

154Idem, doc. 27 Agosto, maço 2.

155Idem, doc. 23 Julho, maço 1.

156AHU, Açores, doc. 13 Dezembro, maço 66, 12 Dezembro, maço 65.

157Idem, doc. 7 Dezembro, maço 66.

158Idem, doc. 18 Dezembro, maço 68; 18 Dezembro, 13 Janeiro 1817, maço 65.

159Idem, doc. 6 Dezembro, maço 69.

160Idem, doc. 12 Dezembro, maço 69.

161Idem doc. 24 Dezembro, maço 69.

162Idem, doc. 5 Dezembro, maço 69.


Em princípios de Janeiro do ano imediato, a escuna
Terceira em viagem da Graciosa dá conta do encontro de um
insurgente164, o que vem confirmar a incidência desta acçäo entre
Novembro e princípios de Janeiro, o que obrigava as autoridades militares a
tomarem medidas excepcionais de defesa da costa e de vigilância do mar165
Em face desta apreensäo manifesta, é con certa surpresa
que vimos em 23 Janeiro de 1817 (dizer-se que näo era do
conhecimento local que os insurgentes "tivessem ainda apresada
alguma das nossas embarcaçöes, julgamos mais acertado esperar
a resoluçäo de V. M. sobre o procedimento que deviamos ter a
respeito dos ditos corsários..." 166. E essa surpresa aumenta se
tivermos em conta que dois dias depois em ofício se dava conta que os
corsários insurgentes "à vista daquelas ilhas tem aparecido e cometido
alguns insultos"167.
Em face desta ameaça constante dos insurgentes168 é enviada
a fragata pérola "a fim de limpar aquelas paragens dos ditos corsários"169.
Esses insultos entre Novembro a Janeiro haviam incidido,
particularmente as ilhas de Santa Maria e Abril, acentuando-se
de modo especial em Abril com a tomada das seguintes
embarcaçöes portuguesas - os bergantins S. Joäo Protector e o
Santo Cirsto Beligerante, o hiate Nª Srª da Conceiçäo, a
fragata Marquês de Pombal170. Daí a necessidade da permanência da
fragata Pérola. Em Maio temos o roubo ao barco Senhor dos Paços e
Livramento, saído de S. Miguel171, a que se seguiu o de uma embarcaçäo de
Rabo de Peixe. Em Junho, junto de Satna Maria172, e finalmente em 26 de
Julho roubaram a escuna portuguesa Boa Nova de Santa Maria, junto de Agua
de Pau, depois de terem feito o reconhecimento do porto de Ponta Delgada no

163Idem, doc. 12 Dezembro, maço 69.

164Idem, doc. 7 Janeiro, maço 65.

165Idem, doc. 12 Janeiro, maço 68; 22/3 Janeiro, maço 65.

166Idem, doc. 23 Janeiro, maço 65.

167Idem, maço 67.

168Idem, doc. 17 Abril, maço 68, 14 Fevereiro, maço 69.

169Idem, doc. 22 Abril, maço 69.

170Idem, doc. 3, 17, 22, 29 Abril, 31 Março, 27 Maio, maço 69.

171Idem, doc. s/d, maço 103.

172Idem. doc. 20 Junho, maço 69.


dia anterior173.
A estas presas portuguesas podemos juntar nesta época
estival, de 1817 temos o apresamento, junto de Santa Maria de
2 embarcaçöes espanholas - bombarda Nª Srª das Dores e o misto
Flor de Cario174.
Entre Maio/Junho se atesta a sua acçäo em força junto de
Santa Maria, onde tomaram três embarcaçöes e procuraram por
várias vezes fazer aguada, näo podendo fazer por forte
resistência das ordenanças marienses175.
A mesma tentativa foi feita em Julho na ilha das Flores,
por outro corsário, o qual sendo impeido tomou dois barcos
para tal que entäo fez "em uma ribeira retirada e debaixo de
uma rocha", tendo depois largado os barcos. Segundo o
governador militar da ilha a extrema facilidade com que os
insurgentes tomavam água nas Flores e no Corvo devia-se, acima
de tudo à falta de fortificaçöes na ilha176.
No entanto só em 1820 o governador e capitäo general dos
Açores, Francisco Borja Garçäo Stockler tomou providências
para evitar essa situaçäo, tendo enviado em deligência o
tenente coronel do Real Corpo dos Engenheiros, José Carlos de
Figueiredo "para dirigir as reparaçöes necessárias nos fortins
e baterias próprias para defender a paz dos riachos aonde os
insurgentes costumam ir fazer aguada... para que na chegada da
próxima primavera, tempo em que os corsários começam naquelas
paragens os seus cruzeiros, achem ali tudo disposto para
repeli-los"177.
Ao mesmo tempo se haviam tomado medidas de defesa e
vigilância com a acçäo de patrulha da fragata Amazone e da
escuna Constancie, as quais também sofreram danos nas lutas
travadas com estes178.
Parece-nos que essa acçäo foi proveitosa, uma vez que se
manteve um curto período de acalmia, em que näo temos notícia
dos insurgentes, nem das suas presas. Apenas em Setembro de
1824179 temos notícia de um insurgente nos Açores, mas sem qualquer presa,
o que sucede apenas em 1827, altura em que estes tornaram a actuar com

173Idem, doc. 28 Julho, maço 69.

174Idem doc. 30 Abril, 20 Junho, maço 69.

175Idem, doc. 14 Junho, maço 69.

176Idem, doc. 24 Julho, maço 69.

177Idem, doc. 7 Dezembro 1818, maço 77.

178Idem, doc. 20 Dezembro, maço 69.

179Idem, doc. 4 Agosto 1825, maço 102.


forte incidência entre o Faial e a Graciosa nos meses de
180
Outubro/Novembro , tendo tomado o brigue Flor de Pará, junto do Faial181 e
dois navios do Brasil182.
A partir de 1825 aparecem no mar dos Açores os corsários
da Columbia, de que temos referência de uma acesa discussäo de
como acolher estes nos portos das ilhas, quando o solicitavam
para fazer aguada183. Tendo-se decidido dar entrada, mas com a bandeira
arreada, por "näo haverem ainda reconhecido o seu governo"184.
Em 15 de Setembro de 1827185 temos notícia da acçäo de um
corsário da República do México, ao largo do Faial, que vinha em
perseguiçäo de uma embarcaçäo brasileira que aí se refugiara.

3. - DINAMICA DO CORSO

Com base em dados colhidos nos documentos consultados,


vamos assentar algumas ideias que deles se podem deduzir
acerca do modo como se articulava a guerra de corso, tendo em
conta principalmente as leis que o regiam (ordenanças de
corso), a sua legitimaçäo jurídica e os aspectos mais
salientes da organizaçäo e armaçäo de um corsário, como seja a
tripulaçäo, o armamento e o seu reabastecimento com bases
certas.

3.1. - AS ORDENANÇAS DE CORSO

Por meio das ordenanças de corso os monarcas que


mantinham corsários em litígio no Atlântico organizavam o modo
de actuaçäo das diversas delegaçöes do Almirantado e o seu
apoio a conceder ao nível naval e militar os corsários, bem
como as bases de acçäo de corso.
O corsário para ser dado como tal pelas potencias
beligerantes ou amigas necessitava de possuir uma determinada
ordem ou documento comprovativo e na sua acçäo respeitar as
normas estabelecidas na ordenança. Acima de tudo a sua acçäo
só podia ser reconhecida como guerra de corso mediante a

180Idem, doc. 31 Outubro, maço 116, 15 Setembro, maço 75, 2 Novembro, maço
114.

181Idem, doc. 6 Fevereiro, maço 118.

182Idem, doc. 12 Novembro, maço 116; 15 Setembro, maço 75.

183Idem, doc. 27 Julho, 24 Agosto 1821, maço 102; 28 Setembro 1825, maço
100.

184Idem, doc. 31 Outubro de 1827, maço 75; 12 Novembro, maço 116.

185Idem, doc. 15 Setembro, maço 75.


satisfaçäo das três cláusulas seguintes:
- "1. el corsario debe estar previsto de la autorización
expressa de su gobierno (patente), 2- antes de obtener-la debe
abonar una fianza (variable) que sirva luego de indemnizacion
a las victimas de los posibles abusos que se cometan, 3- las
presasse someterán al juicio y sentencia de un tribunal
especial"186.
Caso näo fossem respeitados estes requesitos eram
considerados e acima de tudo quando faltava a patente ou esta
havia caducado, quando violava a lei do direito das gentes,
ou, ainda, quando actuava nas águas fluviais do inimigo...187.
A comprovaçäo desta realidade, encontramo-la em alguns
documentos consultados. Assim em 1803188 em face da tomada da
galera espanhola por um comissário inglês no porto de Ponta
Delgada conduziu a uma viva polémica em razäo de o acto se ter
praticado em águas territoriais portuguesas. Uma das
justificaçöes apresentadas no nomento e que legitimava o acto
era a apresentaçäo das ordens que possuia para tomar navios
franceses e holandese189.
O caso repetiu-se, no mesmo ano190, com o corsário Cordon que
tomou a galera espanhola Nª Srª das Mercês dentro do porto, a que o
governador da ilha em carta ao corsário solicita a apresentaçäo de como
estava declarada guerra e a ordem de corso, pois caso contrário seria
considerado pirata191. Mas segundo informe do consul, ele possuia ordem de
corso192.
Em 1814193 em face do apresamento da galera inglesa Emulaçäo pelo
corsário americano Syren, na vila da Praia (Graciosa), deu azo a nova
questäo em torno da patente de corso, tendo-se verificado que o dicto
possuia uma cópia da patenta näo autenticada, com apostilha anexa em que o
Congresso dos Estados Unidos que autoriza o escrito na carta, mas sem selo,
o que deu azo a que as autoridades locais desconfiassem da capacidade dos
escritos.
No que concerne à violaçäo das águas territoriais temos
que os ingleses eram afamados nesses actos e quase todas as

186A. Azcarraga y Bustamante, El Corso Maritimo, p. 91.

187Idem, ibidem, pp. 131/2.

188AHU, Açores, doc. 8 Agosto, maço 29.

189Idem, doc. 2 Agosto, maço 29.

190Idem, doc. 25 Agosto, maço 29.

191Idem, doc. 20 Agosto, maço 29.

192Idem, doc. 23 Agosto, maço 29.

193Idem, doc. 28 Novembro, maço 61.


presas feitas nos Açores foram com a violaçäo dos direitos da
soberania portuguesa, pois, ou se faziam dentro do porto de
Ponta Delgada, como em 1803, ou à vista da costa sob o alcance
da artilharia. Destes casos o mais célebre sucedeu em 1814 com
a batalha naval na Baía da Horta entre os ingleses e
americanos. No entanto um dos casos mais importantes da
violaçäo do espaço territorial, surgiu em 1814194 com o
apresamento pelo corsário americano de uma escuna inglesa junto da costa
que segundo o consul inglês se havia feito ao alcance da artilharia. O
governador de S. Miguel em ofício ao cônsul inglês de 24 de Novembro195
referia:
- "... e tenho a esse fim requerido os ofícios de Vossa
Majestade para com os corsários de sua naçäo, a fim de que
eles se contenham nos limites marcados pelo direito das gentes
e pelas leis marítimas das naçöes civilizadas da Europa...
Consta que o dito corsário, até com a perfídia reprovada pelas
leis marítimas, chamou a seu bordo o sobredito navio há pouco
queimado e fazendo-lhe o dito chamamento antes de levantar o
verdadeiro pavilhäo, assim que se dá o tiro de chamamento,
como pede a boa-fé entre as naçöes civilizadas e grandes e
remeto-me nesta parte ao que acha nas ordenanças da Marinha
por M. Vallin do Lº 3, título 9, artigo 5º, nas instruçöes de
Direito Marítimo por Boucher lª 2166 e ao código das presas do
Mar e da Terra lª 129, 154, 170 e outros muitos".
Se a patente de corso justificava e legitimava a acçäo do
corsário deveria nova, no entanto, uma causa que conduzisse ao
apresamento de um determinado navio inimigo ou näo, pois que
estas acçöes näo se faziam, "por dá cá aquela palha". Assim
podemos constatar que no século XVIII e XIX a causa
condicionante em última instância, que conduzia a esse forte
impulso do corso esteve ligado de modo directo às guerras
europeias, por um lado e às guerras da independência das
colónias americanas, por outro. Em momento de guerra o corso
era legítimo e uma forma de guerra alargada aos mares. Deste
modo constatamos que os momentos palpitantes da guerra de
sucessäo da Casa de Aútria - 1740/8, as guerras napoleónicas -
1799/1815 conduziram a um confronto aberto entre ingleses,
franceses e espanhóis, com particular incidência na Madeira.
Enquanto a guerra da independência dos Estados Unidos da
América, da Argentina, conduziram ao confronto no mar entre os
americanos e insurgentes, por um lado e os ingleses,
portugueses e espanhóis, por outro, desta vez com particular
incidência nos Açores.
É dentro destes tramites que o consul espanhol protesta
em 1803, em face do apresamento da galera espanhola Nª Srª das
Mercês, por näo estar declarada guerra entre Espanha e

194Idem, 19, 30 Janeiro 1815, maço 62.

195Idem, maço 62.


Inglaterra196. Noutro protesto de 1817, o comandante da galera Marquês de
Pombal, insurge-se contra um corsário insurgente por o ter roubado com
bandeira americana, uma vez que näo estava declarada guerra com os Estados
Unidos197. No mesmo ano o sargento-mor das ordenaçöes de Santa Maria, em
face da constante afluência à ilha de corsários insurgentes para fazer
aguada, estava na dúvida:
- "Se com efeito eles aparecerem nos ditos lugares os
devo reforçar e impedir que eles façam água e outro qualquer
refresco que queiram comprar, visto que näo consta termos a
declaraçäo de guerra, com naçäo alguma"198.
Por vezes näo era preciso a declaraçäo aberta sobre as
potências para se lançar acçöes de corso, pois que esta muitas
vezes se articulava a partir da rivalidade latente pela posse
das rotas e dos mercados coloniais. A luta entre os adeptos do
mare liberum e do mare clausum.
Muitas vezes bastava só o navio pertencer a uma
nacionalidade neutral em face dos conflitos, mas com certo
colaboracionismo activo com o inimigo para se justificar uma
acçäo de corso, tal como sucedeu com Portugal em relaçäo à
Inglaterra. Por vezes bastava só o transporte de mercadorias
de naçäo inimiga. A prova desta último facto, temo-la em
1811199, quando passou por Angra o navio americano Mason's Daugther de
Bouringen para Filadélfia, o qual foi apresado por um bergantim de guerra
inglês "com o fundamento de levar ele mercadorias pertencentes a vassalos
de potências que actualmente estäo em guerra com a Grä-Bretanha".
Em face desta facto, o governador D. Miguel António de
Melo, assinala a sua actuaçäo pela seguinte forma:
- "Eu guiei-me pelas batidas e mais seguidas regras do
direito público universal das gentes e pelas depuradas
doutrinas dos publicistas, que de maior autoridade gozam a
respeito das matérias sobre as quais escreveram como Grocio
(De Jere, Belli et Pacis, livro 3º), Ruffendorf (Jus Materiae
e Gentium, lib, 8, cap. 6; veja-se carta que o dito Ruffendorf
escreve a J. Groning a qual transcreve Barbapace na nota qo
dito lugar de Ruffendorf), os comentadores de ambos e outros
de igual conceito".
A actuaçäo em face destas situaçöes, bem como a
organizaçäo e apoio ao corso estavam regulamentados pelas
respectivas ordenanças, das quais temos notícia em França da
de 1584, 1881, 1778, na Holanda da de 1597, 1622, 1705, na
Inglaterra da de 1707, Dinamarca da de 1720200 e em Espanha das de

196Idem, doc. 17 Agosto, maço 29.

197Idem, doc. 30 Abril, maço 69.

198Idem, doc. 14 Junho, maço 69.

199Idem, doc. 31 Agosto, maço 52.

200J. B. de Bustamente, ibidem, p. 92.


1718, 1762, 1779, 1802201.
A ordenança de 17 de Novembro de 1718202, de que
encontramos a adiçäo de 1739203, estipulava näo só as regras do
corso a seguir pelos espanhóis mas o modo e o tipo de presas a
serem feitas, assim no artigo 6º dizia-se:
- "Han de ser buena presa todos los navios pertenientes a
enemigos y los mandados por piratas, corsaros y otra gente que
corriere la mar sin despacho de ningun principe ni estado
soverano"204.
Entretanto a ordenança de 1762205 e da de 1802206. proibem
o apresamento de embarcaçöes inimigas quando se encontrem em
águas ou portos aliados ou neutros. Referindo-se a propósito:
- "Prohibe assi mismo a los corsarios, que apresen,
ataquen, o hostilicen en maneira alguna las embarcaciones
enemigas que se hallaren en los puertos de principes o estados
aliados mios y neutrales, como tampoco a las que estuvieren
baxo el tiro de canon de sus fortificaciones, declarando para
obviar toda duda, que la jurisdicion del otro canon se ha de
entender, aun quando no haya baterias en el parage donde se
hiciere la presa, con tal que la distancia sea la misma"207.

3.2. - ASPECTOS LOGISTICOS

As mesmas ordenanças estipulavam os aspectos logísticos


das embarcaçöes armadas em corso, näo só por meio das casas de
apoio, onde estas podiam fazer aguada e prover-se de muniçöes
dos armazéns reais, mas igualmente o serviço da tripulaçäo a
bordo. Se dermos um pouco de atençäo à adiçäo da ordenança de
1718208 veremos que lugar de destaque é dados às questäo do
armamento, muniçöes e apoio diversificado pelas diversas
dependências do Almirantado. Ao mesmo tempo que se constata,
por exemplo que existia um controle rigoroso da tripulaçäo ao

201Idem, ibidem, pp. 92/110.

202Vide texto, idem, ibidem, pp. 258/65.

203ANTT, PJRFF, nº 972, fols. 233/vº.

204J. A. Bustamante, ibidem, p. 259.

205Idem, ibidem, p.

206Idem, ibidem, pp. 104, 370/1.

207Idem, ibidem,pp. 296/7.

208ANTT, PJRFF, nº 972, fols. 233/vº.


serviço.
O armamento de cada embarcaçäo variava conforme o calado
dos navios (para a arma pesada) e número de tripulantes (arma
ligeira). Assim temos que uma nau podia dispor de 74 peças, a
fragata de 36 e o bergantim de 22.
A esquadra francesa que em 1785209 passou pela Madeira,
apresentava uma nau com 74 peças e várias fragatas com um
número variável de peças entre 14 e 34. No entanto as
embarcaçöes dos corsários näo dispunham de täo elevado número
de peças, ou o seu número era mínimo e variava entre as três
peças de calibre 18 à banda e uma de meio piäo ao meio de
calibre 24210 a as 6 peças de calibre 9/12211, ou por vezes
ficavam-se só por uma peça de calibre 6 e outra de piäo de
calibre 18 ao meio, com algumas armas, espingardas212.
Em 1817 temos referência de dois corsários insurgentes
com 5213 e 3214 peças à banda, com uma de piäo ao meio com calibres
variados. Depois em 1820215 se dá conta de um brigue pirata com sete
canhöes à banda, e em 1822216 dois corsários: um bergantim e uma
corveta com 18 peças cada.
Quanto à tripulaçäo o seu número variava de acordo com as
capacidades da embarcaçäo, número de peças e finalidade da
mesma (vide mapa em anexo). Assim em 1816 temos um corsário
com apenas 18 homens217 e outros dois com maior número218 e 160219. Em
1822220 uma corveta disponha de 150 e um bergantim de 110 e em 1823221 uma

209AHU, Madeira e Porto Santo, nº 761.

210AHU, Açores, doc. s/d, maço 69.

211Idem, doc. 5 Dezembro, maço 69.

212Idem, doc. 24 Dezembro, maço 69.

213Idem, doc. 20 Junho, maço 69.

214Idem, doc. 28 Julho, maço 69.

215AHU, Madeira e Porto Santo, nº 4997.

216Idem, doc. 17 Agosto, maço 12.

217AHU, Açores, doc. 5 Dezembro, maço 69.

218Idem, doc. 24 Dezembro, maço 69.

219Idem, doc. 27 Dezembro, maço 68.

220AHU, Madeira e Porto Santo, doc. 17 Agosto, maço 12.


fragata inglesa apresentava 300.
Um facto importante a considerar é a nacionalidade da
tripulaçäo dos navios armados em corso, pois conforme podemos
constatar a sua nacionalidade era variada. Neste caso se
destacam os insurgentes que apresentavam uma tripulaçäo de um
modo geral composta por portugueses, espanhóis, americanos e
ingleses.
É considerável em todos estes corsários insurgentes,
franceses, americanos e ingleses, o número de portugueses ao
seu seriço, os quais eram aliciados ou raptados das
embarcaçöes costeiras, para servirem nas embarcaçöes de corso.
Disso demos notícia em 30 de Novembro de 1779, quando o
capitäo Thomaz Dowers, comandante do corsário inglês engajou
clandestinamente no Funchal 12 portugueses para o seu
serviço222. E em 1814 se refere que na ilha do Corvo e Flores
essa situaçäo era prática corrente223.
No entanto o serviço de marinheiros portugueses em barcos
estgangeiros estava interdito por lei de 27 de Setembro de
1756224, que estipulava pesadas penas para os seus infractores,
tais como, a condenaçäo a 10 anos para as galés pela primeira
vez e a pena de morte pela segunda. O mesmo foi regulamentado
por alvará de 7 de Dezembro de 1796, sendo por essa forma
preso em 1799, o madeirense José Gomes Fortuna que se
encontrava a bordo de um corsário francês, que foi apresado
por outro inglês que o largou no Algarve225.
Segundo o governador das ilhas dos Açores, de pouco
serviam estas medidas proibitivas do alistamento dos ilhéus ao
serviço dos estrangeiros ou a sua saída para o Brasil,
conforme a lei de 18 de Janeiro de 1798:
- "apesar, porém destas proibiçöes passa por certo que os
navios de guerra ingleses trazem muitos marinheiros das nossas
ilhas, o que é inevitável porque a pobreza os obriga a
procurar o seu sustento onde mais facilmente o podem achar"226.

4. - PORTUGAL EM FACE DO CORSO

221AHU, Açores, doc. 15 Setembro, maço 85.

222AHU, Madeira e Porto Santo, nº 548/50.

223AHU, Açores, doc. 2 Agosto, maço 62.

224ANTT, PJRFF, nº 976, fols. 59/61, nº 974, fols. 22/vº.

225AHU, Madeira e Porto Santo, doc. 22 Julho, Maço 5.

226AHU, Açores, doc. 29 Outubro 1806, maço 35.


Perante estas constantes incursöes corsárias nesta
importante área de passagem dominada pela Madeira e os Açores,
a parte portuguesa era muito afectada, näo só pelas presas que
sofreu, mas igualmente dos constantes bloqueios das rotas viu
o comércio das ilhas e do Brasil bastante afectado e onerado.
A Madeira, por exemplo, com uma economia dependente do mercado
externo, viveu algumas vezes momentos aflitivos em face desses
bloqueios, pois impedia de sai com o vinho näo tinha qualquer
possibilidade de se reabastecer de comestíveis e manufacturas.
De imediato seria de esperar, como forma de evitar esses
transtornos; era a acçäo de represália aos constantes
prejuízos causados pelos piratas ou corsários ingleses,
americanos, franceses, espanhóis, insurgentes.
Primeiro temos a armaçäo de corsários portugueses, depois
a organizaçäo de um acertado sistema de defesa costeira e de
vigilância dos mares.

4.1. - ACÇÄO DE REPRESALIA

A acçäo de represália tem sido mal entendida e estudada


até ao momento, uma vez que é tónica dominante em todas as
monografias, que nós, os portugueses é que fomos as vítimas
dessa acçäo, quando está mais que comprovado que nós também
tivemos corsários, cuja acçäo näo teria sido menos violenta
que a dos franceses, argelinos...
Já em inícios do século XV temos notícia que Joäo
Gonçalves Zarco, andava em corso aos espanhóis e numa dessas
acçöes teria encontrado a ilha do Porto Santo.
Já em 1557227 se ordenava a Francisco Gonçalves da Camara,
que fizesse aprestar um navio para ir em corso a um corsário
que andava investindo ao longo da costa da ilha, e em 1571228 a
Madeira dispunha de uma armada para a defesa da ilha contra os
corsários, paga pela Real Fazenda. Já em 1575229 se ordenava a
Simäo Gonçalves da Camara que auxiliasse a guerra de corso,
autorizando-se aos particulares o armar navios em o corso,
para "que todos os corsários e navios que achar de suspeita e
mau título meta ao fundo sem dos tais navios ficar viva pessoa
alguma por nenhum caso e que faça fazer outros em segredo per
uma pessoa de confiança e com testemunho de como säo corsairos
e por tais havidos, os quais autos vos entregará para mo vós
entregardes".

227ARM, RGCMF, t. 1 fols. 408.

228ANTT, PJRFF, nº 963, fols. 11/vº.

229ANTT,
Miscelâncias Manuscritas, 1104, pp. 43/5, cit. F.
Salles Loureiro, D. Sebastiäo Antes e Depois de Alcácer
Quibir, Lisboa, 1978, pp. 110/2.
E em 1730230 temos referência à armaçäo de um corsário na
ilha para ir a corso de um corsário de mouros que vagueava ao
longo da costa. Desse acto temos o requerimento e o termo de
fiança do seu promotor - Pantaliäo de Faria e Abreu.
Segundo o alvará de 1758231 o corso näo podia ser feito
por portugueses sem a devida autorizaçäo régia, facto que vem
comprovar que nesta época se passavam patentes de corso.
Outra forma de resposta à guerra ou ao corso era dada
pelas represálias dos navios da naçäo inimiga, intertadando-os
de entrar nos portos e apresando os que aí permaneciam ao
momento da declaraçäo da guerra. Assim sucedeu em 1762 em face
da declaraçäo da guerra feita pela França, em que se ordenou
ao governador da Madeira, Francisco Correia de Sá que
exercesse represálias sobre os navios franceses232, o que
realmente se fez, tendo-se o bergantim francês Ruby, que no
momento estava no Funchal233.
Desde Janeiro de 1793234 que a convençäo havia autorizado
aos oficiais da marinha mercante armarem navios de corso,
tendo-se iniciado uma acçäo de represália de que temos apenas
notícia do apresamento da galera francesa - Le Comerçant - em
Julho de 1793 junto do Porto Santo e de um corsário francês em
Julho de 1798235, junto de Mogador, pelo bergantim português
Lebre.
Em 1815 em face dos acontecimentos de França, se refere à
possibilidade de se armarem novamente corsários para corsear
os navios de bandeira tricolor236.
No entanto em face deste movimento de corso português
entre 1792/3 e 1815m näo temos qualquer referência a uma carta
de corso, somente em 1820, já em fase tardia fomos encontrar
uma carta de marca dada ao comerciante da praça de Lisboa,
Manuel de Sousa Lobo, para armar em guerra o seu navio
Harmonia com 18 Peças e 2 obuses para "correr sobre os
piratas, inimigos da minha real coroa, os quais infestando os
mares e perturbando o comércio de meus fiéis vassalos, tem

230ARM, RGCMF, t. 8, fols. 89, 92vº.

231AHU, Madeira e Porto Santo, nº 561.

232BNL,-S/R-PBA-nº 458, fols. 231/4.

233Idem, maço 458, fols. 236/vº; ANTT, PJRFF, nº 985, fols. 20vº/1.

234AHU, Madeira e Porto Santo, nº 921/2, 909/10.

235Idem, nº 1014.

236Idem, doc. 20 Abril, maço 9.


causado a detracçäo, danos, prejuízos e hostilidades
manifestas a todas as naçöes da Europa, apreendendo e
represendo as suas embarcaçöes... possa o referido navio...
atacar, render, e fazer prisioneiros todos os corsários de
piratas e inimigos que encontrar em todas aquelas embarcaçöes
sobre que houver suspeita, ou falta de legalidade, com todos
os efeitos que elas contiverem..."237.
Por outro lado estavam regulamentadas medidas proibitivas
da acçäo dos corsários, tais como a proibiçäo de venda das
presas das naçöes aliadas ou amigas em portos nacionais. E ao
mesmo tempo se legislara as normas a ter em conta na
hospitalidade a conceder aos corsários. Dessas leis, podemos
destacar a de 30 de Agosto de 1780238, 17 de Setembro de 1796239 e 3
de Junho de 1803240.
Em 1805 em face da entrada da fragata inglesa L'Egyptian
com 3 embarcaçöes espanholas apresadas, o governador da
Madeira com base dos decretos de 30 de Agosto de 1780 e de 3
de Junho de 1803 dizia:
- "Fixou um inviolável sistema de neutralidade e as
regras que se devem praticar, proibindo que os corsários das
potências beligerantes, näo sejäo admitidos nos portos dos
seus estados e domínios, nem as presas, que por eles ou naus,
fragatas, ou quaisquer outras embarcaçöes de guerra se fizerem
sem outra excepçäo, que a dos casos em que os direitos das
gentes fazem indispensável a hospitalidade, com a condiçäo,
porém que nos mesmos portos se lhes näo consista vender, ou
descarregar as ditas presas, nem demorarem-se por mais tempo,
que o necessário para evitarem o perigo, ou conseguirem os
inocentes socorros, que lhes forem necessários"241.
Quanto ao decreto de 30 de Agosto de 1786, dizia-se:
- "Havendo recebido pelo expediente do Conselho da Guerra
um decreto de Sua Magestade de 30 de Agosto de 1780, que
proibe o serem admitidos nos portos deste reino os corsários
das naçöes actualmente beligerantes, nem as presas que estes,
ou as naus e fragatas de guerra fizerem e sem outra excepçäo
que a do caso da hospitalidade, nem venderem, ou descarregarem
as ditas presas, ainda nos referidos casos, o qual fiz logo
expedir cópias aos comandantes das fortalezas que guardem os

237Idem, doc. 12 Junho, maço 13.

238Idem, nº 1558.

239Idem, nº 1031; AHU, Açores, doc. 8 Agosto 1803, maço 29.

240Idem, nº 1558, 1638; AHU, Açores, doc. 2 Agosto 1803, maço 29, 25
Outubro 1803, maço 103, 4 Julho de 1806, maço 42.

241AHU, Madeira e Porto Santo, nº 1558.


portos destas ilhas..."242.

4.2. - ORGANICA DEFENSIVA

Neste campo várias foram as medidas tomadas, de que os


restos de fortificaçäo ainda existentes o testemunham e
atestam a valoraçäo dada a essas medidas ao longo dos séculos
de maior investida corsária, como foram os séculos XVII/XIX.
Se a orgânica defensiva costeira procurava atender à
segurança de pessoas e haveres e manter os portos ao abrigo
das investidas corsárias, a defesa e vigilância dos mares
procurava manter as rotas "limpas" dos corsários de modo a que
a navegaçäo mercantil se fizesse com segurança. Nesta época
esta última dimensäo assumia grande importância, uma vez que a
acçäo corsária cada vez caminhava para o alto mar fora do
alcance das fortificaçöes costeiras.

4.2.1. - DEFESA COSTEIRA

A defesa costeira e dos portos de abrigo é encarada entäo


como um meio de preservaçäo e resguardo do espaço territorial
das investidas dos corsários, mas a sua utilidade neste
momento foi quase nula, uma vez que entäo os corsários,
cientes da forte barreira que oferecia a rede de fortificaçöes
costeiras näo se aventuravam a entrar em terra e quando o
faziam era de modo subreptício para fazer aguada. A sua acçäo
localizava-se no mar alto, nomeadamente nas áreas vizinhas dos
portos de forte aproximaçäo no Porto Santo, Flores e Corvo,
Santa Maria...
No entanto nesta época manteve-se uma forte dinamizaçäo
da construçäo e reparodas fortificaçöes com a acçäo da
Engenharia Militar, para muito contribuindo a criaçäo das
Academias Militares de Angra (1797) e do Funchal. A acçäo da
Engenharia Militar faz-se incidir nos períodos de maior
incidência da pirataria e corso entre 1793/1801, 1804/10,
1814/1820. Sendo de destacar os levantamentos feitos entäo nos
Açores, por Francisco Xavier Machado, José Carlos Figueiredo,
José Rodrigo de Almeida e na Madeira os de Pedro de Azevedo e
Paulo Dias de almeida243.
Em face das ameaças dos corsários se organizaram nas
ilhas formas diversificadas de defesa adequadas para o embate
de qualquer esquadra naval ou de corsário. Essas medidas
surgem em face da notícia da guerra ou da organizaçäo de
esquadras estrangeiras para sair aos mares, tal como sucedeu

242AHU, Açores, doc. 18 Outubro 1782, maço 11.

243Este tema é motivo de um estudo que estamos presentemente a preparar


laguns excertos para publicar na "Memória da Agua Viva".
em 1762244 e em 1797245 e 1805246 na Madeira e em 1818 na Madeira
e Açores247.
4.2.1. - DEFESA DOS MARES

A defesa dos mares desta importante área de passagem


atraíu a atençäo das autoridades locais durante este momento e
foi o único meio capaz de controle e apaziguamento dos efeitos
do corso. Assim o entendia, por exemplo o governador geral dos
Açores, Francisco de Borja Garçäo Stockler em 1821, ao
afirmar:
- "... sem nenhuma embarcaçäo de guerra nestas ilhas é
impossível segurar o seu comércio recíproco, nel limpar estas
paragens de corsários que nelas venham inquietar o comércio
geral da Naçäo"248.
Em 1831 em face do bloqueio da ilha Terceira, no momento
das lutas liberais, aludia-se:
- "... por muitas vezes tenho dito e sempre direi que a
defesa de ilhas faz-se com embarcaçöes de guerra e as nossas
näo aparecem nestas ilhas"249.
Para essa defesa dos mares, desde 1768 que temos notícia
do estacionamento nesta área de uma embarcaçäo de guerra para
fazer o "corso" das ilhas até à época invernal e ajudando as
embarcaçöes que faziam esta rota. Neste ano temos em acçäo nos
Açores a fragata de guerra Nª Srª da Penha de França250.
Em 1797251 temos notícia da permanência em Angra da 1 fragata e 1
bergantim "para conter os corsários franceses", e no ano imediato fez o
cruzeiro das ilhas o bergantim Baläo252.
Entre 1805253 esteve em acçäo na Madeira a charrua Active, enquanto

244ANTT, PJRFF, nº 985, fols. 16vº/7vº.

245AHU, Madeira e Porto Santo, nº 969.

246Idem, nº 1580.

247Idem, nº 4074.

248AHU, Açores, doc. 12 Fevereiro, maço 79.

249Idem, doc. 24 Abril, maço 75.

250Idem, doc. 1 Outubro, maço 1.

251Idem, doc. 7 Junho, maço 17.

252Idem, doc. 29 Março, maço 18.

253AHU, Madeira e Porto Santo, doc. 13 Fevereiro, maço 7, 22


em 1812254 se requisitava o brigue Lebre para cruzar entre a
Madeira e os Açores a fim de proteger os navios dos ataques
corsários.
Em 1817, momento de forte incidência da acçäo dos
cors+arios insurgentes nos Açores estiveram aí destacadas a
fragata Pérola, de Janeiro a Abril255 e as fragatas Amazonas e
Constancie de Junho a Dezembro256 "afim de limpar aquelas paragens
dos ditos corsários"257. No entanto a acçäo destas duas últimas foi
muito polémica258 e teve pouca "exacçäo"259, daí o ter-se solicitado em
Agosto de 1818 o envio urgente de novas embarcaçöes de guerra260.
No ano de 1819 estiveram nos Açores as Fragatas Venus261,
Amazonia262 e as corvetas de 18 peças263 e a Príncipe Real264.
Para a Madeira em 1820265 é enviado o bergantim infante D. Miguel
para actuar contra os corsários entre a Madeira e as Canárias, e em 1821 a
fragata Pérola266, 1824 o bergantim Tejo267.

Agosto 1807, maço 8.

254Idem, nº 3046.

255AHU, Açores, doc. 22/3 Janeiro, maço 65; 14, 22 Abril, maço
69.

256Idem, doc. 17 Junho, maço 68; 1 Setembro, 13 e 30 Novembro, 1 e 20


Dezembro, 14, 26, 28 Junho, maço 66.

257Idem, doc. 22 Abril, Maço 69.

258Idem, doc. 1 Setembro, maço 69.

259Idem, doc. 3 Março 1818, maço 70.

260Idem, doc. 1 Agosto, maço 72.

261Idem, doc. 18 Janeiro, 2 Fevereiro, maço 73.

262Idem, doc. 19 Abril, maço 68.

263Idem, doc. 30 Abril, maço 75.

264Idem, doc. 14 Outubro, maço 73.

265AHU, Madeira e Porto Santo, nº 5005/6, 50092.

266Idem, doc. 12 Novembro, maço 1.

267Idem, doc. 23 Novembro, maço 1.


Em 1823268 se referia que a área de actuaçäo dos corsários na
Madeira incidia até 10 léguas ao norte do Porto Santo e entre o Cabo de S.
Vicente e o cabo de Santa Maria. Mais se especifica e alarga essa área em
representaçäo dos comerciantes da praça de Lisboa, onde se dá conta das
incessantes perdas dos navios de comércio em razäo de näo haver forças
navais que defendam do Pará a Maranhäo a altura do Porto e das ilhas contra
os ataques dos corsários franceses. E por isso apresentam uma pá de
distribuiçäo das embarcaçöes para a defesa dessas paragens: 2 fragatas e 3
cuters para o cruzeiro entre Vigo e o Porto, 2 fragatas para Santa Maria e
S. Miguel, 2 fragatas do Corvo a S. Miguel, 3 sumacas armadas em guerra
para o Pará e Maranhäo269.
Essas embarcaçöes destacadas para as ilhas, tanto
patrulhavam a área como comboiavam as embarcaçöes comerciais a
porto seguro. Os próprios comerciantes e consignatários dos
navios de comércio solicitavam esse apoio. Assim sucedeu em
1814270 com a galera Belle Barbara vinda da Baía para Angra que
estacionou na Horta a aguardar o comvoio, e em 1818271, com o
comerciante Francisco Rut Ferreira que requereu o comboio de seu navio, o
Marquês de Pombal, em viagem do Faial Para Lisboa, o que se fez com a
galera-escuna Constancie.
E para evitar qualquer acçäo contra um navio de comércio
desprotegido, o governador geral dos Açores havia proibido em
1799 a saída de qualquer embarcaçäo sem comboio, o que mereceu
vivo repudio dos comerciantes272.
Por vezes os próprios consignatários armavam os seus
navios com peças, como forma de evitar ou defender-se dos
ataques dos corsários, tal como temos documentado em 1816273,
com o comerciante Caetano Maria Magiolo que havia comprado em Londres 10
peças de calibre 12 para o seu navio; e em 1818274 com o consignatário do
Navio Nova Amazónia que solicitou 4 peças e bala para seu navio.

V - CONCLUSÄO

Foi nossa intençäo com este trabalho divulgar ou


descobrir um aspecto de pouco conhecimento da dinâmica

268Idem, nº 6896.

269AHU, Açores, doc. maço 137.

270Idem, doc. s/d, maço 61.

271Idem, doc. 3 Março, maço 70.

272Idem, doc. 7 Agosto, maço 19.

273Idem, doc. 15 Junho, maço 65.

274Idem, maço 73.


conjuntural e estrutural europeia e colonial dos séculos
XVIII/XIX, que tem merecido certo desprezo por parte da
historiografia, por isso tentamos divulgar o máximo de
elementos elucidativos e alinhavar as linhas mestras da guerra
de corso, neste momento, tentando aproximar a sua visäo dos
momentos cruciais dos Século XVI/XVII."O confronto das duas
épocas, que aqui näo o fazemos, seria por certo muito
elucidativo e traria ao público novas pistas sobre a
compreensäo da dinâmica do corso nos séculos nossos vizinhos e
por certo näo teria conduzido ao desprezo que até ao momento
tem sido cotado.
Parece-nos que a guerra de corso nesta área de passagem
Atlântica se apresenta como a extensäo ou alastramento para
fora dos conflitos europeus, por um lado, com particular
incidência na Madeira, e do mundo colonial, com forte
acentuaçäo nos Açores. Assim de um modo geral podemos
considerar a área da Madeira, como o local de extensäo das
guerras e conflitos das naçöes europeias e a área dos Açores
como a zona de alastramento dos conflitos da guerra da
independência das colónias da América, com a acçäo dos
americanos e insurgentes de Buenos Aires.
Se na área da Madeira, onde os princiapais actuantes era
os ingleses, as vítimas foram os espanhóis e em parte os
portugueses, nos Açores essa acçäo fez-se incidir sobre as
embarcaçöes portuguesas, seguidas das inglesas e espanholas,
mas em relativo número. Em ambos os lados os franceses,
ingleses, americanos e insurgentes, principais beligerantes,
foram os mais beneficiados. Portanto uma guerra em que os
beligerantes principais saem vencedores e os neutrais
derrotados ou prejudicados na sua actividade comercial.
Esta acentuada perda de embarcaçöes portuguesas,
justifica por si só a acçäo de represálias, de defesa costeira
e dos mares, entäo encaradas como acçäo primordial.

VI - ANEXO DOCUMENTAL

- Normas de transcriçäo dos documentos

Tendo em conta as normas de transcriçäo do Pe. Avelino de


Jesus da Costa275 e de Serafim da silva Neto276, convencionámos a
transcriçäo dos documentos em anexo pela seguinte forma: - os
textos anteriores ao século XVI, respeitar a graiia das
palavras, apenas desenvolvendo as abreviaturas, os documentos

275Normasde Transcriçäo e Publicaçäo de Documentos e Textos


Medievais e Modernos, Braga, 1977.

276Textos Medievais Portugueses e Seus Problemas, Lisboa, 1956,


p. 21/4.
a partir desta data modernizam a grafia de modo a que o texto
se torne mais perceptível, pois a sua transcriçäo "ipsis
verbis" näo tem qualquer valor linguístico ou histórico277.

1820/Junho/12 (Lisboa) - Carta de marca, represália e


mercancia concedida ao comerciante português Manuel de Sousa
Lobo para armar em guerra o seu navio "Harmonia".

AHU, Madeira e Porto Santo, maço 13, cópia autenticada.

Dom Joäo, por graça de Deus, rei do reino unido de


Portugal e do Brasil e Algarves, d'aquem e d'além mar, em
Africa senhor de Guiné e da conquista, navegaçäo, comercio, de
Etiópia, Arabia, Persia e da India, etc. Faço saber a todos
que esta carta de marca, represalia e mercansia virem, que eu
sou servido autorizar e permitir que o negociante português,
Manuel de Sousa Lobo, residente nesta cidade de Lisboa, possa
equipar e armar em guerra o seu navio denominado - Harmonia -
de porte de vinte peças de calibre dezoito e nove e dois
obuses de calibre dezoito e nove e dois obuses de calibre
dezoito, assim como para embarcar pólvora, bala e todas as
muniçöes de guerra, que julgar e necessárias a fim de poder
correr sobre os piratas, inimigos da linha Real Coroa, os
quais infestando os mares e perturbando o comércio de meus
fieis vassalos, tem causado a detracçäo, danos, prejuízos e
hostilidades manifestas a todas as naçöes da Europa,
apreendendo e represando as suas embarcaçöes. Permitindo-lhes,
igualmente, que usando da Minha Real Bandeira Portuguêsa e do
direito de represálias, possa o referido navio, comandado por
Joäo Borges Pamplona, atacar e fazer prisioneiros todos os
corsários de piratas e inimigos que encontrar e todas aquelas
embarcaçöes sobre que houver suspeita, ou falta de
legabilidade, com todos os efeitos que elas contiverem,
podendo as conduzir a qualquer dos portos nacionais, para ái
serem julgadas como for de justiça, respeitando porém sempre
os territórios, fortalezas e pavilhöes das naçöes antigas,
aliadas nesta coroa. E prestando cauçäo da quantia de quatro
mil cruzados, perante o auditor geral da Marinha, antes de se
fazer à vela, fará registar esta carta na secretaria do Meu
Conselho de Almirantado, aonde igualmente será obrigado a
deixar uma relaçäo, sobrenomes, idades e naturalidades da
gente da sua equipagem, assinada por ele, armador, e pelo
comandante do referido navio, ficando obrigado no torna-viagem
a dar conta da mesma equipagem do Meu Conselho do Almirantado.
E por o já mencionado Joäo Borges Pamplona, comandando o
referido navioHarmonia, pode ser encontrado em quaisquer mares
ou portos, pelos cabos e oficiais comandantes da Minha Real

277Idem, ibidem, p. 24.


Armada, ordeno lhe näo ponham impedimento algum, nem às presas
que tiver feito, mas pelo contrário lhe asistam com tudo que
precisa. E recomendo aos comandantes das armadas, esquadras e
mais embarcaçöes dos reis, príncipes, républicas, potentados,
amigos e aliados desta coroa lhe näo embarassem o seu destino,
mas antes para o seguir lhe dêm e favor de que necessitar, na
certeza de que os recomendados pelos seus príncipes, se fará o
mesmo e igual tratamento. El-Rei Nosso Senhor o mandou pelo
Almirante Conselheiro do Almirantado e pelo chefe de esquadra
assinados, Henrique José Dionísio Franco a fez. Dada nesta
cidade de Lisboa aos doze de Junho de mil oitocentos e vinte.
José Joaquim de Sampaio a fez escrever, Pedro Mendonça de
Moura. José Maria Dantas Pereira.
Carta de marca, represália e mercancia, pela qual Sua
Magestade autoriza a Manuel de Sousa Lobo, negociante da
cidade de Lisboa, para armar em guerra o seu navio, denomiado
-Harmonia - comandante por Joäo Borges Pamplona, permitindo-
lhe a ter a Real Bandeira, tudo pela forma acima declarada
(lugar do selo das armas reais)
Por este despacho do Conselho do Almirantado de dez de
Junho de mil oitocentos e vinte.
Fica registada no livro de semelhantes folhas dezoito,
Secretaria do Conselho do Almirantado em doze de Junho de mil
oitocentos e vinte Henrique José Dionísio Franco.
Lugar do selo da lavra pública - Pagou mil e seiscentos
reis de selo, Lisboa doze de Junho de mil oitocentos e vinte.
Amorim.
Apostilha.

Dom Joäo por graça de Deus, Rei do reino-unido de


Portugal e do Brasil e Algarves d'aquem e d'além mar, em
Africa Senhor da Guiné e da conquista, navegaçäo, comércio, da
Etiópia, Persia e da India, etc. Faço saber aos que a presente
carta de marca, represália, corso, e mercancia virem, que sou
servido em virtude desta apostilha, permitir que tenha todo o
seu vigor na presente viagem, a que se destina o mesmo navio,
da mesma forma que na anterior. El-Rei Nosso Senhor o mandou
pelos conselheiros do Almirantado abaixo assinados. Ambos do
seu Conselho, Antonio Vicente Lobato de Araújo Sampaio a fez
em Lisboa aos três de Março de oitocentos vinte e hum. José
Joaquim de Sampaio a fez escrever. Pedro de Mendonça de Moura,
José Maria Dantas Pereira.
Fica registada no livro competente a apostilha posta
nesta carta, em consequência do despacho do Conselho do
Almirantado de três de Março de mil oitocentos e vinte e um.
Secretaria do mesmo Conselho em sete do dito mês ano. Antonio
Vicente Lobato de Araújo Sampaio.
Traslado da própria a que me reporto, a entreguei, Lisboa
três de Novembro de mil oitocentos vinte e três. Rodrigues
Teixeira Machado, tabeliäo subscrevi e assinei em primeiro,
Luís Rodrigues Teixeira Machado (ass). Pedro Mendonça de
Moura.
1739/Novembro/24 - Santa Cruz de Thenerife - Carta de corso
passada Don Pasqual de Sousa Verino, mestre do bergantim
Santelmo Nossa Srª de Candelaria y el Dragon.

B) ANTT, PJRFF, nº 972, fols. 234/5vº, registo de uma cópia.

Don Phelipe de Bourbon, por la gracia de Dios, Ynfante de


España, cavallero de las ordens de el Toision, Sante
Espiritus, y Santiago, Gran Prior de Castilla y Leon en la de
San Juan, comendador maior de Calatrava de Castilla y Aragon,
Almirante General de todas las fuerças maritimas de España y
de las Indias y protetor del Comercio. Porquanto El Rey mi
senor e padre ha resuelto que para imdemnisar a sus vasallos
de las vejasiones, que experimentan em su navegacion y
comercio por parte de yngleses, en violacion manifesta de los
empenos que subsisten entre una, y otra nacion se permita a
los naturales de estos reynos y a los demas que lo solicitaren
y en las yslas de Canarias, armar en corso contralos subditos
de la Gran Bretanha las embarcaciones que tengan o pudieren
tener, al proposito para este destino; y pertennesiendome por
las facultades anexas a mi dignidad y Almirante General de
todas las fuerzas maritimas de Espanha y de las Yndias, la
expidision de las bizencias y comiciones nesesarias a el
expresado, e fecto, he venido en conseder, como en virtud de
las presentes letras, consedo la correspondiente a Don Pasqual
de Sossa Verino de la ysla de Thenerife en las yslas de
Canarias para armar en corso contra yngleses, el bergantim,
nombrado Senhor Santhelmo Nossa Senhora de Candelaria y el
Dragon, de porte de ciento y treynta thoneladas, poco mas o
menos, com diez canones, y ocho pedrerosy las demas, armas y
muneciones comvenientes, y hasta ell numero de ciento y doz
homos de tripulacion. Asin de que por el tiempo que duraren
las hostilidades de una e otra parte/ pueda salir a corsear
comn la zitada embarcacion llevando en elle la vendera de las
armas de España, correr los mares desde el sur de las
expresadas yslas de Canarias, hasta España; sea directamente
egyndo la costa Ocidental de Africa, o bien cruzando a la
Madera, y Terseras (sin pasar ni tocar por motivo alguno a los
mares de America) y perseguir, atacar, tomar, y apresar los
navios y efeitos que encontrare, proprios de El Rey, y
subditos de la Gran Bretaña y de otros enemigos de la corona
con la condizion expressa de que en el corso que assi hisiere
se arreglara a lo tocante a el que vienen las ordenansas y
estabelesimento reales de que con las presas que executare se
encaminara directamento si fuere posible a uno de los puertos
de los dominios de Su Magestad, en las misemas yslas de
Canarias en España de que a togara la fianza la fianza
nesesaria a satisfasion del ministro, por cuja mano recebiere
esta comision y de que se tomara la razon de este despacho emn
las oficinas a que corresponde el puerto o para se, en donde
se haja o convenga, el armamiento, en las quales habrä de
desear una lista firmada de su mano, que contenga llos
nombres, appelidos, naturalesa y residencia de los individuos
de la tripulación. Portanto requiero y pido a todos los reyes
y aliados de esta corona consedan a el referido Don Pasqual de
Sossa, o alervo que substitucire en el mando, too favor,
asistencia, y acoxida en sus puertos con la nominada
embarcacion, y equipage, y todo lo que hubiere adquerido
durante su navegación sin ponerla, ni permitir se reponga
embaraso alguno, ni disturbio, Y mando, y ordeno a los
comandantes, y menistros dellos oficiales senores, y
particulares de la Real Armada Nabal y dela escuadra de
galeras, juezes e justicias y demas personas sujetas a mi
jurisdicion, y a las que no lo son, en cargo de dejen pasar
livremente, sencausarle impedimiento alguno y le faciliten
todo el favor, auxilio y ayuda que nesesitare. Anvio fin le e
mandado despachar estas letra firmadas de mis manos, selladas
con el sello de mis armas y referendadas de el ynfra scripto
Intendente de Marina del Consejo de Su Magestad, y Secretario
del Almirantazgo General de España y de las Indias. Dado en
hun retiro a veynte y quatro de Novembre de mil settecientos
treinta e nuebe. Phelipe P. Zenon desomo de villa, lugar de un
sello entrego se la parte para su pouso en Santa Cruz de
Thenerife a siete de Noviembre de mil settecientos quarenta y
siete, haviendo otorgadola obligacion y fiansa
correspondiente, Casabuena, en la dependencia de Marina de mi
cargo tome la razon de la comicion y patente de lo corso
antesedente expedida por el Serenisimo Senhor Ynfante
Almirante General a Don Pasqual de Sossa, contenido en ella, y
queda regsitada en el correspondiente livro a el folio diez y
nuebe de el Santa Cruz de Thenerife a siete de Noviembre de
mil sete cientos quarenta y siete, Pedro Cazabuena.
Registada de propria que recebeu o consul da naçäo
espanhola, Don Luiz Agostinho de Castilho, no Funchal 20 de
Abril de 1748. Luís Agostin de Castilho (ass.), Oliveira
(ass.).

1739/Agosto/30 (San Ildefonso) - Adiçäo à ordenança de corso


de 17 de Novembro de 1718.

B) ANTT, PJRFF, nº 972, fols. 233/vº, registo de uma cópia


autenticada

Adiccion a la ordenanza de diez y siete de Noviembre de


mil setecientos diez y ocho que prescribe las relgas con que
se hade hazer el corso.
Teniendo Su Magestad presente que sus reales
determinaciones sobre la erecion de la dignidad de Almirante
General, y establecimiento de almirantazgo precissan à alterar
en parte lo prevenido en esta ordenanza, ha resolveto con
reflexion a esta y aquela constitucion presente de la armada
naval distribuida en los tres departamientos de Cadiz, Ferro y
CArtagena facilita que los intendentes y menistros principales
puedan por si, y por medio de sus subalternos subdelegados,
estabelecidos en las provincias, exercer en todos los puertos
y plazas de estos dominios, sin atrasso del serviço, la
jurisdiccion absoluta de qualquier tribunal de tierra, todo lo
concerniente a corso, contra enemigos de esta corona.
Conseguientemente manda Su Magestad, que los
particulares, que quiseran emplear se en el, acudan
immediatamente con sus proposiciones a los menistros de Marina
y que estos den quenta de ellas al Almirantazgo, para que por
el se les prevenga, si deberan o no admitirse y tambien se los
remitan las patentes correspondientes.
Estas se expediran por el señor Infante Almirante
General, para lo que la tiene concedida el rey la facultad de
que necessita, pero para entregar se a los interessados
procedera haver atorgado estos la fianza prevenida à
satisfaccion del ministro, con quien ayan tratado el
armamento, aunque por el armados deba costearse integramente
el armamento si sucediere que le falten algunas armas,
municiones, o petrechos, y no se hallaren de venta en el lugar
del armamento, o otros immediatos, se el franqueran los
generos, que fueren, delos existentes, en los reales
almacenes, pagandolos promptamente se quer tassacion; y para
que en esto no ocurra embarazo que detenga el corso, se ha
prevenido lo conveniente, por la via a que corresponde, a los
capitanes generales y governadores de plazas, afin que baxo la
regla prescripta provean a los armadores de lo que
necessitaren, y existiera en los almazenes de ellas.
Declara tambien Su Magestad que no obtante lo prevenido
en esta ordenanza, debe ser toda la gente de la tripulacion de
la comprehendida en la matricula de mar y esta se presente con
las justificaciones necessarias al ministro, quien deberá que
dar con una lista de ella assi para que conste su paradero,
como para al retorno pueda haver-se cargo al armador de la que
faltare.
Si del levare la pressa a puerto, que no sea cabeza de
departamento, el Ministro de Marinha rezidente en el,
concluido el processo, le remitirá con todos los documentos y
papelles que le compongan a manos del intendente o ministro
principal de aquel departamento, para la ordenanza. Es el
animo de Su Magestad, que los recursos se hagan en derechura
al senhor infante Almirante General, para que disponga se
administre justiçia a las partes, breve y sumariamente.
Todo lo qual manda su Magestad se observe puntualmente
por ser assi Su Real voluntad. San Ildefonso, treinta de
Agosto de mil settecientos treinta y nueve, el Marques de
Villarias.
Concuerda con sus originales. Cópia de la instrusion
remetida para entregar con cada patente a los capitanes
corzistas, que arman en estas islas, en cuja comformidade la
entriego con la patente correspondente a el capitan Don
Pasquam de Souza, que lo ey armados del bergantim nomeado
Senhor Santelmo Nossa Senhora de Candelaria y el Dragon, con
que sale a corzo para su govierno, en Santa Cruz a Thenerife a
sette de noviembre de mil sette cientos quarienta y siete,
Pedro Cazabuena.
Registado tudo da propria por mandado do provedor actual
e Contador da Real Fazenda, Domingos Affonso Barroza, que de
como aqui mandou registar assignou, no Funchal, 18 de Abril de
1748.
(seguem-se as assinaturas do provedor e escriturário Oliveira)
"nossacincia".ACincian

oumaaventuraindividualoudepoucos,massimumaop

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