Porm se fosse a Amrica acharia, no um mas milhes, e milhes de ndios to
despidos de toda afeio, e ambio das preciosidades mundanas, que ainda das
que Deus lhes repartiu nas suas terras no se utilizam, no fazem apreo, nem caso
algum, antes as desprezam. [...].
[...] Da mesma sorte julgam por cousa suprflua os instrumentos de garfos,
e colheres, quando nos dedos, e nas mos Deus lhe ministrou o suficiente preparo
de garfos, e colheres, que alimpam com a finssima toalha da sua lngua. [...] Os
seus pratos so umas vezes folhas de rvores, outras nos mais polidos so umas
cuias, que, como j disse, so um gnero de bons cabaos, ou cousa semelhante; e
de nada mais constam as suas baixelas, e servios de mesa.
[...] Onde melhor se v, que os ndios da Amrica no tem ambio em
desprezarem os mesmos metais de ouro, prata, e muitos outros: porque tendo a
Amrica tantas, e to grandiosas, e to abundantes minas destes metais, que o
mundo tanto cobia, no consta que eles se aproveitem de alguma, tirando algumas
poucas naes, como a nao dos incas, e poucas outras: [...] Mas na verdade bem
ponderada a sua vida, desnudez, e mantimentos, e que a caa dos matos
inumervel e com~ua, e a pesca nos rios abundantssima, de que lhes servem as
riquezas de ouro, prata, e diamantes?
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Isso, no que se refere aos ndios do mato, no aldeados, com pouco ou nenhum
contato com os brancos. Mas as consideraes do padre so algo diferentes quando se trata de
ndios j reunidos em aldeamentos ou em vilas, servindo aos colonos ou aos missionrios. H,
ainda, elogio e admirao. Joo Daniel louva, por exemplo, entre os caratersticas dos povos
indgenas, a fraternidade e a igualdade. Entre si, chamam-se uns aos outros por irmos, atitude
que devia ser imitada no s de todos os homens, pois todos descendemos de um s pai; mas
principalmente de todos, os que nos prezamos de cristos, como na primitiva igreja se fazia, e
ainda muito antes se usava em muitas outras naes, especialmente no povo de Deus, ou