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DIRETRIZES SBD 2008

2008
Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes

DE
DIRETRIZES SBD 2008

2008
Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes

DE
Apresentação

Atualização periódica é uma expressão perante o avanço extremamente rápido do


que vem ganhando cada vez mais espaço na conhecimento médico e das opções farma-
Medicina, pois todos têm consciência de que cológicas disponíveis como instrumento de
nada é imutável. Hoje, sabe-se que nenhu- terapia. Assim, especialistas de reconhecido
ma área do conhecimento é hermeticamen- saber foram convidados a elaborar e atuali-
te fechada, estando em constante mutação. zar os temas apresentados desde a primei-
Porém, o conhecimento, apesar de estar ao ra edição das Diretrizes da SBD.
alcance de muitas pessoas através das novas Para otimizar a publicação periódica
mídias, precisa ser bem organizado. Foi pen- das diretrizes, a diretoria 2008/2009 da SBD
sando assim que nasceram as Diretrizes da instituiu um novo regime de elaboração do
Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), que material. A cada dois anos, serão publicadas
chegam agora a sua edição 2008. as diretrizes completas, agregando os tex-
Nesta nova publicação, continuamos tos de anos anteriores juntamente com as
a defender aquilo em que acreditamos atualizações referentes a cada assunto. Nos
desde o lançamento da primeira edição, anos subseqüentes, de modo intercalado,
há dois anos. No processo de tomada de será editado apenas o material atualizado,
decisão médica, devem ser consideradas trazendo aos médicos as novidades relacio-
as preferências do paciente, que sempre nadas a cada tema. Desta forma, a diretoria
deve ser esclarecido, as circunstâncias do da SBD manterá os profissionais atualizados
atendimento, o estadiamento da doença a cada ano com o que há de mais moderno
e os recursos disponíveis. A experiência na sua área de atuação.
profissional é fundamental e faz muita di- Finalizando, gostaria de agradecer aos
Dra Marília de Brito Gomes ferença, moldando a decisão final e garan- colegas que, generosamente, empresta-
Presidente da SBD – Gestão 2008/2009 tindo maior benefício para o paciente. ram seu tempo e dedicaram-se à produ-
É essencial, portanto, entender que ção deste importante e útil trabalho. Com
as evidências são apenas um dos compo- isso, estamos contribuindo para a missão
nentes na tomada de decisão. Os médicos da SBD, que é servir de instrumento de
envolvidos na atenção a seus pacientes atualização e reciclagem. Nosso objetivo
necessitam de diretrizes e, mais do que final - vale a pena destacar - é a qualidade
isso, necessitam de constante atualização da atenção ao paciente com diabetes.
Diretrizes SBD 2008

SBD
Sociedade Brasileira de Diabetes

DIRETORIA

GESTÃO 2008 / 2009


Presidente
Dra Marília de Brito Gomes

Vice-Presidentes
Dr. Balduíno Tschiedel
Dr. Mario José A. Saad
Dr. Saulo Cavalcanti da Silva
Dr. Nelson Rassi
Dra. Reine Marie Chaves Fonseca

Secretário Geral
Dr. Sergio Atala Dib

Segunda Secretária
Dra. Rosane Kupfer

Tesoureiro
Dr. Antônio Carlos Lerário

Segundo Tesoureiro
Dr. Domingos Malerbi

Diretor para Assuntos Internacionais e Sociais


Dr. Antonio Roberto Chacra

Conselho Fiscal
Dr. Milton César Foss
Dr. Walter Minicucci
Dr. Marco Antônio Vívolo

Suplente
Dr. Adriana Costa e Forti
ERRATA 2008 Diretrizes SBD

EDITORES AUTORES
Marília B. Gomes Adriana Perez Angelucci

Antônio Carlos Lerário Alexandre J. F. Carrilho

Augusto Pimazoni Netto

Camila Barcia

Carlos Antonio Negrato

Carlos Eduardo Virgini-Magalhães

Gerson Canedo de Magalhães

João Roberto Sá

Lenita Zajdenverg

Lívia Ferreira da Costa

Márcia Nery

Marcio C. Mancini

Marco Andre Mezzasalma

Marcos Tadashi Kakitani Toyoshima

Maria Edna de Melo

Mauricio Levy Neto

Nanci Silva

Nelson Rassi

Rafael Pergher

Reginaldo Albuquerque

Renan Montenegro Junior

Roberta Azevedo Coelho

Rosiane Mattar

Saulo Cavalcanti da Silva

Sérgio Vencio

Walter J. Minicucci
Diretrizes SBD 2008

SUMÁRIO
Avaliação do controle glicêmico 10

Gerenciamento eletrônico do diabetes 18

Diabetes e drogas antipsicóticas 29

Doença arterial obstrutiva periférica no paciente diabético 35

Diabetes mellitus pós-transplante 42

Manifestações reumatológicas do diabetes 49

Diabetes e doença periodontal 55

Disglicemias na gestação 62

Cirurgia para diabetes 72

Indicação de vacinas no paciente diabético 78

Síndrome metabólica em crianças e adolescentes 81

HIV, diabetes e síndrome metabólica 86

Depressão no paciente diabético 92

Degeneração vascular cerebral 98

Definição de indicadores de desempenho dos programas de atendimento aos diabéticos 102

Reservados todos os direitos à Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). É proibida a reprodução ou duplicação deste volume, no todo
ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia ou outros), sem permissão
expressa da SBD.

AC Farmacêutica Diretor comercial: Silvio Araujo Diretor administrativo: André Araujo Comercial: Selma Brandespim, Wilson Neglia,
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a posição da editora. Distribuição exclusiva à classe médica.
2008 Diretrizes SBD

GRAUS DE RECOMENDAÇÃO E FORÇA DE EVIDÊNCIA


A Estudos experimentais ou observacionais de melhor consistência

B Estudos experimentais ou observacionais de menor consistência

C Relatos de casos (estudos não-controlados)

D Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos,


estudos fisiológicos ou modelos animais

NÍVEL DE EVIDÊNCIA CIENTÍFICA POR TIPO DE ESTUDO


Oxford Centre for Evidence-Based Medicine (maio 2001)
Projeto Diretrizes AMB-CFM
Grau de Nível de Tratamento/ Diagnóstico preferencial/
Prognóstico Diagnóstico
recomendação evidência prevenção-etiologia prevalência de sintomas

1A Revisão sistemática Revisão científica (com homogeneidade) Revisão científica (com homogeneidade) Revisão científica (com homogeneidade)
(com homogeneidade) de coortes desde o início da doença. de estudos diagnósticos nível 1. Critério de estudo de coorte (contemporânea ou
de ensaios clínicos Critério prognóstico validado em diversas diagnóstico de estudo nível 1B em prospectiva).
controlados e randomizados populações. diferentes centros clínicos.
A 1B Ensaio clínico controlado e Coorte, desde o início da doença, com Coorte validada, com bom padrão de Estudo de coorte (contemporânea ou
randomizado com intervalo perda <20%. Critério prognóstico referência. Critério diagnóstico testado prospectiva) com poucas perdas.
de confiança estreito. validado em uma única população. em um único centro clínico.

1C Resultados terapêuticos do Série de casos do tipo “tudo ou nada”. Sensibilidade e especificidade próximas Série de casos do tipo “tudo ou nada”.
tipo “tudo ou nada”. de 100%.

2A Revisão sistemática (com Revisão sistemática (com Revisão sistemática (com Revisão sistemática (com
homogeneidade) com homogeneidade) de coortes históricas homogeneidade) de estudos de homogeneidade) de estudos sobre
estudos coorte. (retrospectivas) ou de segmentos de diagnósticos de nível > 2. diagnóstico diferencial de nível maior
casos não-tratados de grupo de controle ou igual 2B
de ensaio clínico randomizado.

Estudo de coorte (incluindo Estudo de coorte histórica. Seguimento Coorte exploratório com bom padrão de Estudo de coorte histórica (coorte
2B
ensaio clínico randomizado de pacientes não tratados de grupo de referência. Critério diagnóstico derivado retrospectiva) ou com seguimento
de menor qualidade). controle de ensaio clínico randomizado. ou validado em amostras fragmentadas casos comprometidos (número grande
Critério prognóstico derivado ou validado ou banco de dados. de perdas)
B somente em amostras fragmentadas.

2C Observação de resultados Observação de evoluções clínicas Estudo ecológico


terapêuticos (outcomes (outcomes research)
research). Estudo ecológico

3A Revisão sistemática (com Revisão sistemática (com Revisão sistemática (com


homogeneidade) de estudos homogeneidade) de estudos diagnósticos homogeneidade) de estudos de nível
casos-controle. de nível maior ou igual 3B maior ou igual 3B.

Estudo caso-controle Seleção não-consecutiva de casos, padrão Coorte com seleção não-consecutiva de
3B de referência aplicado de forma pouco casos, ou população de estudo muito
consistente. limitada.

Relato de casos (incluindo Série de casos (e coorte prognóstica de Estudo caso-controle; ou padrão de Série de casos, ou padrão de referência
4
C coorte ou caso-controle de
menor qualidade)
menor qualidade) referência pobre ou não independente. superado.

D 5 Opinião de especialista sem avaliação crítica ou baseada em matérias básicas (estudo fisiológico ou estudo com animais)

Em razão da dificuldade em conseguir referências bibliográficas, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) considera nos trabalhos a
seguir o grau de recomendação e não há, necessariamente, em todas as diretrizes o nível de evidência.
Diretrizes SBD 2008

Avaliação do controle
glicêmico

1. INTRODUÇÃO

Na prática clínica, a avaliação do controle glicêmico é feita através da utilização


de dois recursos laboratoriais: os testes de glicemia e os testes de hemoglobina gli-
cada (A1C), cada um com seu significado clínico específico e ambos considerados
como recursos complementares para a correta avaliação do estado de controle
glicêmico em pacientes diabéticos1(A), como mostra a figura 1.

FIGURA 1 - Testes tradicionais para avaliação do controle glicêmico

Testes tradicionalmente utilizados para avaliar o


controle glicêmico

Testes de glicemia Testes de A1C

Mostram o nível Mostram a glicemia média


glicêmico instantâneo pregressa dos últimos dois
no momento do teste a quatro meses

“Saldo atual” “Saldo médio”

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2008 Diretrizes SBD

Os testes de glicemia refletem o TABELA 1 - Correspondência entre os níveis de A1C (%) e os níveis médios de
nível glicêmico atual e instantâneo no glicemia dos últimos dois a quatro meses (mg/dL)
momento exato do teste, enquanto os
testes de A1C refletem a glicemia mé- Nível de A1C (%) Estudos originais Novos estudos
dia pregressa dos últimos dois a quatro
4 65 70
meses. Uma forma didática bastante
5 100 98
simples para explicar aos pacientes os
significados e as implicações dos tes- 6 135 126
tes de glicemia e dos testes de A1C é 6,5 (meta: SBD) 152 140
a comparação com os termos já bas- 7 (meta: ADA) 170 154
tante familiares a eles, que utilizam os
8 205 182
serviços bancários: os testes de glice-
mia revelariam o “saldo atual” da conta 9 240 211

bancária, ou seja, a quantidade exata 10 275 239


de glicose sangüínea no momento do 11 310 267
teste. Por outro lado, os testes de A1C
12 345 295
revelariam o “saldo médio” da conta
bancária durante os últimos dois a
quatro meses. médicos que cuidam do diabetes, pelo média4,5(A). Assim, considerando os
Os valores de correspondência en- fato de não estarem totalmente fami- métodos tradicionais e os novos mé-
tre os níveis de A1C e os respectivos liarizados com as vantagens desses todos para avaliação do controle gli-
níveis médios de glicemia durante os novos parâmetros. São eles: a glicemia cêmico, agora são quatro parâmetros
últimos dois a quatro meses foram média estimada (GME)3(A) e a variabi- que podem ser utilizados para tal fim,
inicialmente determinados com base lidade glicêmica, um importante fator como mostra a tabela 2.
nos resultados do estudo DCCT2(A). que vem sendo considerado como um As metas estabelecidas para carac-
Estudo conduzido mais recentemente fator de risco isolado para as complica- terização do bom controle glicêmico
ções do diabetes, independentemen- pelos métodos tradicionais estão resu-
reavaliou as correlações entre os níveis
te dos valores elevados de glicemia midas na tabela 3.
de A1C e os correspondentes níveis
de glicemia média estimada3(A), con-
forme mostra a tabela 1. Note-se, por TABELA 2 - Métodos novos e tradicionais para a avaliação do controle glicêmico
exemplo, que um resultado de A1C = Métodos tradicionais Métodos novos
7% corresponderia, pelos padrões dos Testes de glicemia Monitorização contínua da glicose (CGMS - Continuous Glucose
estudos originais, a uma glicemia mé- Testes de A1C Monitoring System)
dia de 170 mg/dL. Agora, de acordo Glicemia média estimada (avaliada através de perfis glicêmicos)
com os novos parâmetros, esse mesmo Variabilidade glicêmica (avaliada através de desvio padrão)
nível de A1C = 7% corresponde, na re-
alidade, a um nível de glicemia média
estimada de 154 mg/dL. TABELA 3 - Metas terapêuticas para o controle glicêmico, conforme recomendações
Tanto os testes de glicemia como da Sociedade Brasileira de Diabetes e da American Diabetes Association
os de A1C são considerados testes tra- Metas terapêuticas
Parâmetro laboratorial
dicionais para a avaliação do controle SBD ADA
glicêmico. Mais recentemente, desde Hemoglobina glicada (A1C) <6,5% <7%
o início de 2008, dois outros parâme- Glicemia de jejum <110 90-130
tros de avaliação do controle glicêmi-
Glicemia pré-prandial <110 90-130
co foram desenvolvidos e ainda têm
Glicemia pós-prandial (duas horas) <140 <180
uma penetração muito baixa entre os

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Diretrizes SBD Avaliação do controle glicêmico

Um resumo executivo de cada um dos mediante a promoção da glicação de sendo mais freqüente a avaliação da
métodos mencionados encontra-se a proteínas, através da hiperosmolarida- hemoglobina A1C (HbA1c)2(D).
seguir. de e por meio do aumento dos níveis Tradicionalmente, a A1C tem sido
de sorbitol dentro da célula. É através considerada como representativa da
desse processo de glicação das prote- média ponderada global das glicemias
2. CONCEITO E IMPLICAÇÕES ínas que a glicose sangüínea se liga à médias diárias (incluindo glicemias de
CLÍNICAS DA HEMOGLOBINA molécula de hemoglobina2(D), confor- jejum e pós-prandial) durante os últi-
GLICADA me mostra a figura 2. mos dois a quatro meses. Na verdade,
A quantidade de glicose ligada à a glicação da hemoglobina ocorre ao
No decorrer dos anos ou das déca- hemoglobina é diretamente proporcio- longo de todo o período de vida do
das, a hiperglicemia prolongada pro- nal à concentração média de glicose no glóbulo vermelho, que é de aproxi-
move o desenvolvimento de lesões sangue. Uma vez que os eritrócitos têm madamente 120 dias. Porém, dentro
orgânicas extensas e irreversíveis, afe- um tempo de vida de aproximadamen- destes 120 dias, a glicemia recente é a
tando os olhos, os rins, os nervos, os te 120 dias, a medida da quantidade que mais influencia o valor da A1C. De
vasos grandes e pequenos, assim como de glicose ligada à hemoglobina pode fato, os modelos teóricos e os estudos
a coagulação sangüínea. Os níveis de fornecer uma avaliação do controle gli- clínicos sugerem que um paciente em
glicose sangüínea persistentemente cêmico médio no período de 60 a 120 controle estável apresentará 50% de
elevados são tóxicos ao organismo, dias antes do exame. Este é o propósito sua A1C formada no mês precedente
através de três mecanismos diferentes: dos exames de hemoglobina glicada, ao exame, 25% no mês anterior a este
e os 25% remanescentes no terceiro ou
quarto mês antes do exame2(D), como
FIGURA 2 - Molécula da hemoglobina, mostrando a glicação das moléculas de
glicose mostra a figura 3.
O impacto de qualquer variação
G significativa (em sentido ascendente
G
G
ou descendente) na glicemia média
G será “diluído” dentro de três ou quatro
meses, em termos de níveis de A1C. A
G G glicemia mais recente causará o maior
impacto nos níveis de A1C. Os exames
de A1C deverão ser realizados regu-
larmente em todos os pacientes com
diabetes. De início, para documentar
o grau de controle glicêmico em sua
avaliação inicial, e subseqüentemente,
FIGURA 3 - Impacto das glicemias mais recentes versus as “mais antigas” sobre como parte do atendimento contínuo
os níveis de A1C
do paciente2(D).
Para uma avaliação correta do re-
Um mês antes Dois meses antes Três meses antes Quatro meses antes
sultado do teste de A1C, é necessário
50% 25% 25%
conhecer a técnica laboratorial utilizada
na realização do teste. Métodos labo-
Data da coleta de sangue para o teste de A1C
ratoriais distintos apresentam faixas de
valores normais igualmente distintas.
IMPORTANTE: Em princípio, os laboratórios clínicos de-
Freqüência recomendada para os testes de A1C
Os testes de A1C devem ser realizados pelo menos duas vezes ao ano por todos os pacientes diabéticos veriam utilizar apenas os métodos labo-
e quatro vezes por ano (a cada três meses) por pacientes que se submeterem a alterações do esquema ratoriais certificados pelo National Glyco-
terapêutico ou que não estejam atingindo os objetivos recomendados com o tratamento vigente. hemoglobin Standardization Program

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2008 Diretrizes SBD

(NGSP), o qual analisa o desempenho do TABELA 4 - Fase de avaliação aguda: freqüências sugeridas de testes de glicemia
método analítico utilizado e verifica se capilar, conforme a situação clínica
uma determinada técnica laboratorial Situação clínica Freqüência de testes
é ou não rastreável ao método utiliza- Perfil glicêmico: seis testes por
Necessidade menor de testes
do durante o estudo DCCT. Esses méto- dia por três dias na semana
dos certificados pelo NGSP medem, de - Início do tratamento - Testes pré-prandiais: antes do café da ma-
maneira específica, a fração de hemo- - Ajuste da dose do medicamento nhã, do almoço e do jantar.
globina glicada definida como HbA1c, - Mudança de medicação - Testes pós-prandiais: duas horas após o
café da manhã, o almoço e o jantar.
que é a fração que efetivamente está - Estresse clínico e cirúrgico (infecções,
relacionada ao risco cardiovascular. cirurgias etc.) - Testes adicionais para paciente do tipo 1
ou do tipo 2, usuário de insulina: hora de
Para esse grupo de testes certificados, - Terapia com drogas diabetogênicas dormir e de madrugada (3 horas da manhã)
a faixa de normalidade varia de 4% a (corticosteróides)
6% e a meta clínica definida é de um - Episódios de hipoglicemias graves
nível de A1C <6,5% ou <7%, conforme - A1C elevada com glicemia de jejum
recomendações de diferentes socieda- normal

des médicas2(D). Adaptado6

componente essencial de uma efetiva consenso, a AMG é uma parte integral,


estratégia terapêutica para o controle porém subutilizada da estratégia inte-
3. CONCEITO E IMPLICAÇÕES adequado do diabetes. Este procedi- grada de gerenciamento da doença,
CLÍNICAS DOS TESTES DE mento permite ao paciente avaliar sua tanto em portadores de DM1 como de
GLICEMIA resposta individual à terapia, possibi- DM2. As diretrizes sobre as freqüências
litando também avaliar se as metas recomendadas e os horários para a re-
Os testes de glicemia podem ser glicêmicas recomendadas estão sendo alização dos testes de glicemia variam
realizados por técnicas laboratoriais efetivamente atingidas. Os resultados entre as associações internacionais de
tradicionais em laboratórios clínicos da AMG podem ser úteis na prevenção diabetes. Além disso, por falta de infor-
ou, então, através da prática da auto- da hipoglicemia, na detecção de hipo mações, os pacientes freqüentemente
monitorização domiciliar, que, quando e hiperglicemias não-sintomáticas e no desconhecem as ações mais adequadas
realizada de forma racional, pode pro- ajuste da conduta terapêutica medica- que deveriam tomar em resposta aos re-
porcionar uma visão bastante realista mentosa e não-medicamentosa, tanto sultados da glicemia, obtidos através da
do nível do controle glicêmico durante para portadores de diabetes mellitus AMG. O objetivo dessa Conferência Glo-
todo o dia. Isso pode ser conseguido tipo 1 (DM1) como para os portadores bal de Consenso foi definir a AMG como
através da realização de perfis glicê- de diabetes mellitus tipo 2 (DM2), va- uma ferramenta de auxílio para otimizar
micos de seis pontos (três testes pré- riando apenas a freqüência recomen- o controle glicêmico, complementando
prandiais e três testes pós-prandiais, dada, a qual deve ser definida pelas informações proporcionadas pela A1C,
realizados duas horas após as princi- necessidades individuais e pelas metas além de detectar excursões pós-pran-
pais refeições). Para pacientes insuli- de cada paciente1(D). diais e padrões inaceitáveis de perfil gli-
nizados, recomenda-se a realização de O papel da AMG nos cuidados com os cêmico, ajudando os pacientes a avaliar
mais um teste glicêmico durante a ma- portadores de diabetes foi extensamente a eficácia de suas ações de estilo de vida
drugada para a detecção de eventual avaliado por uma Conferência Global de e de seu esquema terapêutico. A AMG
hipoglicemia6(D). Consenso, publicada como um suplemen- também contribui para a redução do ris-
Em seu posicionamento oficial to do The American Journal of Medicine de co de hipoglicemia e para a manutenção
(Standards of medical care in diabetes setembro de 2005. De acordo com esse de uma boa qualidade de vida7(D).
– 2008), a American Diabetes Associa-
IMPORTANTE:
tion considera a automonitorização gli-
Não existe esquema padrão de freqüência de testes glicêmicos que seja aplicável a qualquer paciente,
cêmica (AMG) como parte integrante indistintamente. É importante ter em mente que a freqüência de testes para portadores de DM2 deve
do conjunto de intervenções e como ser determinada apenas com base no perfil de resposta clínica do paciente ao tratamento instituído.

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Diretrizes SBD Avaliação do controle glicêmico

TABELA 5 - Fase de estabilidade: freqüências sugeridas de testes de glicemia Uma vez obtido o controle glicêmi-
capilar, conforme a situação clínica co e após certificar-se de que o pacien-
Situação clínica Freqüência de testes te já tem conhecimentos operacionais
Necessidade menor Freqüência variável, conforme tipo, tratamento suficientes para gerenciar seu controle
de testes e grau de estabilidade glicêmica glicêmico, a freqüência de testes de gli-
- Condição clínica está- - Tipo 1: três testes ou mais por dia em diferentes horários, cemia deve ser ajustada de acordo com
vel. Baixa variabilidade sempre. três critérios principais: tipo de diabe-
nos resultados dos tes- - Tipo 2 insulinizado: três testes por dia em diferentes tes, esquema terapêutico utilizado e
tes, com A1C normal ou horários, dependendo do grau de estabilização glicêmica.
quase normal. grau de estabilidade ou instabilidade
- Tipo 2 não-insulinizado: pelo menos um ou dois testes do controle glicêmico, como mostra a
por semana, em diferentes horários.
tabela 5.
Adaptado6

A importância da automonito- e a mais racional para cada paciente 4. CONCEITO E IMPLICAÇÕES


rização no DM1 é universalmente em particular. CLÍNICAS DA MONITORIZAÇÃO
aceita. Por outro lado, tem sido con- Ao definir o esquema de auto- CONTÍNUA DA GLICOSE
testada sua utilidade para a avalia- monitorização da glicemia, deve-se
ção do controle no DM2. Na verda- ter em conta o grau de estabilidade A monitorização contínua da gli-
de, a automonitorização também ou de instabilidade da glicemia, bem cose (MCG) proporciona informações
é fundamental para os portadores como a condição clínica específica sobre a direção, a magnitude, a dura-
de DM2, em especial naqueles com em que o paciente se encontra num ção, a freqüência e as causas das flutu-
tratamento insulínico. Não se deve determinado momento. As principais ações nos níveis de glicemia. Em com-
discutir mais se essa prática é ou não condições nas quais a freqüência de paração com a automonitorização
útil no DM2 mas, sim, qual a freqüên- testes deve ser ampliada estão des- glicêmica (AMG) convencional, que
cia de testes seria a mais recomendada critas na tabela 46(D). engloba algumas determinações diá-
rias e pontuais da glicemia, o sistema
TABELA 6 - PRINCIPAIS INDICAÇÕES RECONHECIDAS PELA SBD PARA A de MCG proporciona uma visão muito
MONITORIZAÇÃO CONTÍNUA DA GLICOSE mais ampla dos níveis de glicose du-
rante todo o dia, além de proporcio-
- A indicação mais importante da MCG é a de facilitar os ajustes na conduta terapêutica, nar informações sobre tendências de
com o objetivo de melhorar o controle glicêmico.
níveis glicêmicos que podem identi-
- Os referidos ajustes incluem: ficar e prevenir períodos de hipo ou
* Substituição da insulina rápida pelo análogo de insulina ultra-rápida ou adição de hiperglicemia. Por outro lado, a AMG
aplicações adicionais de insulina de ação rápida ou de análogo de insulina de ação
ultra-rápida.
tem uma ampla indicação para uso
freqüente e rotineiro pelo portador
* Substituição da insulina NPH por um análogo de insulina de longa duração ou adi-
ção de aplicações adicionais de insulina NPH. de diabetes, enquanto que a MCG tem
• Ajustes de doses de insulina basal e prandial. suas indicações restritas a um grupo
• Alterações na composição de carboidratos da dieta.
de condições clínicas especiais. As in-
dicações clínicas para a realização do
• Alterações nas metas desejáveis para glicemia pré ou pós-prandial.
exame de MCG incluem situações que
- Quantificação da resposta a um agente antidiabético.
exigem uma informação detalhada
- Avaliação do impacto de modificações do estilo de vida sobre o controle glicêmico.
sobre as flutuações da glicemia, que
- Monitoramento das condições nas quais um controle glicêmico intensivo é desejado
somente podem ser detectadas atra-
(diabetes gestacional, diabetes em crianças e pacientes em UTI).
vés da monitorização contínua8(A).
- Diagnóstico e prevenção da hipoglicemia assintomática e noturna.
O procedimento da MCG está indi-
- Diagnóstico e prevenção da hipoglicemia pós-prandial.
cado tanto para pacientes portadores

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2008 Diretrizes SBD

de DM1 ou DM2, desde que seja devi- A utilização esporádica e não estru- correlações entre os níveis de A1C e os
damente caracterizada a necessidade turada de testes de glicemia capilar não níveis médios de glicemia através de
médica de um perfil glicêmico comple- fornece os elementos necessários para a sistemas de monitorização contínua da
to, com a finalidade de identificar alte- avaliação completa do estado glicêmico. glicose (CGMS)10-12(A).
rações significativas das flutuações gli- Por outro lado, a realização de pelo me- Estudos mais recentes confirmam a
cêmicas ocorridas durante as 24 horas nos três perfis glicêmicos diários de seis importância da variabilidade glicêmica
do dia. A tabela 6 mostra as principais ou sete pontos (três glicemias pré-pran- como um fator isolado de risco, uma
indicações reconhecidas pela SBD para diais, mais três glicemias pós-prandiais e vez que oscilações muito amplas da
a realização da MCG, com base nas re- mais uma glicemia durante a madruga- glicemia ao redor de um valor médio
comendações de Klonoff8(A). da para pacientes insulinizados) em cada ativam o estresse oxidativo e promo-
semana permite estimar a glicemia mé- vem dano tissular. Aliás, a importância
dia semanal (GMS). Isso viabiliza a avalia- da variabilidade glicêmica pode ser
5. CONCEITO E IMPLICAÇÕES ção do nível de controle glicêmico e da maior que a importância dos níveis
CLÍNICAS DA GLICEMIA MÉDIA adequação da conduta terapêutica em elevados de A1C na determinação do
SEMANAL E DA VARIABILIDADE curtíssimo prazo, quando esse método é risco de complicações cardiovasculares
GLICÊMICA utilizado em avaliações semanais duran- no paciente diabético tipo 24,5(A).
te o período de diagnóstico glicêmico e
Novos conceitos e métodos de de ajustes terapêuticos.
avaliação do controle glicêmico estão Além disso, a glicemia média mos- 6. CONSIDERAÇÕES ESPECIAIS
sendo mais intensamente divulgados trou ser o melhor preditor de com- SOBRE A UTILIZAÇÃO DA
durante este ano de 2008. Estudo clíni- plicações macrovasculares no dia- GLICEMIA MÉDIA SEMANAL
co recentemente publicado ressalta a betes tipo 1 (DM1), em comparação PARA A AVALIAÇÃO DO
importância da utilização do conceito com a A1C, sendo provavelmente a CONTROLE GLICÊMICO
de glicemia média, definindo as cor- melhor maneira de se avaliar o risco
relações matemáticas entre os níveis cardiovascular9(A). Outros estudos em A glicemia média semanal (GMS) é
de hemoglobina glicada (A1C) e os ní- pacientes com DM1 confirmaram as um método experimental que está sendo
veis médios de glicemia, de tal forma
a priorizar a utilização das médias gli- FIGURA 4 - Gráfico de desempenho glicêmico, mostrando normalização da glice-
cêmicas em substituição aos valores de mia e do desvio padrão três semanas após o início da terapia insulínica. Redução
A1C3(A). da GMS de 342 mg/dL para 112 mg/dL e redução do desvio padrão (expressão da
Na prática clínica, há uma necessi- variabilidade glicêmica) de 60 mg/dL para 25 mg/dL.
dade urgente do desenvolvimento de
Semana 1 = GMS 342 mg/dL e DP = 60 mg/dL
métodos confiáveis de fácil implemen- 3 semanas após início de insullina: GMS 112 mg/dL e DP = 25 mg/dL
tação e utilização e de baixo custo para
71 anos, sexo feminino, com diabetes n’ao controlado há 10 anos
a avaliação em curto prazo do controle
glicêmico e da adequação da conduta Semanas
1 2 3 4 5 6 7 8
terapêutica. Tais informações permi- 400
tirão reorientar a definição de novas 350
abordagens de tratamento com o ob- 300
jetivo maior de otimizar a terapêutica e 250

combater a inércia clínica e seu impac- 200

to nocivo sobre a progressão das com- 150

plicações crônicas do diabetes. Tanto a 100

A1C como a frutosamina são métodos 50


0
de avaliação de longo e médio prazos, 03 10 17 24 31 07 14 21 28
respectivamente. Mar Abr
2008

15
Diretrizes SBD Avaliação do controle glicêmico

desenvolvido pelo Grupo de Educação do Hospital do Rim da Universidade monitorização domiciliar que avalia
e Controle do Diabetes do Centro de Hi- Federal de São Paulo (Unifesp). Esse o controle glicêmico do paciente
pertensão e Metabologia Cardiovascular método é uma derivação da auto- através da realização de três perfis

TABELA 7 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Níveis de evidência

A redução dos níveis de A1C para valores abaixo de 7% demonstrou reduzir as complicações micro-
vasculares e neuropáticas e, possivelmente, as complicações macrovasculares do diabetes, principal- A
mente no diabetes tipo 1.

A meta de A1C para indivíduos selecionados deve ser estabelecida em nível o mais próximo possível
do limite superior da normalidade (< 6%), sem aumentar o risco de hipoglicemias significativas. B
Metas menos rígidas de A1C devem ser adotadas para pacientes com história de hipoglicemia severa,
crianças, indivíduos com comorbidades importantes, indivíduos com expectativas limitadas de vida e D
naqueles portadores de diabetes de longa duração e sem complicações microvasculares.

Testes de A1C deverão ser realizados pelo menos duas vezes ao ano para os pacientes com controle
razoável e a cada três meses para os pacientes mais instáveis. D
A glicemia média estimada é um novo conceito na avaliação do controle glicêmico e sua utilização,
em conjunto com os resultados da A1C, está sendo recomendada por entidades médicas internacio- A
nais relacionadas ao diabetes.

A variabilidade glicêmica pode ser considerada um fator de risco independente para as complicações
do diabetes. A
A utilização de perfis glicêmicos de seis ou sete pontos constitui-se em método mais preciso de ava-
liação da glicemia do que a realização de testes glicêmicos isolados. D
A freqüência recomendada para a automonitorização da glicemia deve ser definida em função do
tipo de diabetes, do grau de estabilidade ou instabilidade glicêmica e das condições clínicas de cada D
paciente.

A automonitorização glicêmica também contribui para a redução do risco de hipoglicemia e para a


manutenção de uma boa qualidade de vida. D
A monitorização contínua da glicose (MCG) está indicada em situações que exigem informações de-
talhadas sobre as flutuações da glicemia, que somente poderão ser detectadas através de monitori- A
zação eletrônica da glicose intersticial.

A utilização da glicemia média semanal (GMS) e do cálculo do desvio padrão como forma de expres-
são da variabilidade glicêmica permite a avaliação em curto prazo do nível de controle glicêmico e da C
adequação da conduta terapêutica.

Legenda:
(A) - Estudos experimentais e observacionais de melhor consistência.
(B) - Estudos experimentais e observacionais de menor consistência.
(C) - Relatos de casos – estudos não-controlados.
(D) - Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consenso, estudos fisiológicos ou modelos animais.

DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES:


A Roche Diagnóstica proporciona financiamento parcial do estudo clínico que está sendo conduzido sob a coordenação médica do autor,
Augusto Pimazoni Netto, junto ao Grupo de Educação e Controle do Diabetes do Centro Integrado de Hipertensão e Metabologia Cardiovascular
do Hospital do Rim e Hipertensão da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

16
2008 Diretrizes SBD

glicêmicos de seis ou sete pontos por semana. Os pacientes são atendidos semanalmente por uma equipe interdisci-
plinar e recebem monitor de glicemia e tiras reagentes necessárias para a realização dos perfis glicêmicos. Os resulta-
dos das glicemias são baixados para um computador e, com o auxílio de um software específico, calcula-se a média e
o desvio padrão dos resultados semanais(C).
De posse dessas informações, a equipe de atendimento pode verificar várias informações de importância, que per-
mitem um ajuste semanal da conduta terapêutica com base na GMS, nos padrões de glicemia apresentados pelos perfis
glicêmicos e no desvio padrão obtido a partir dos resultados dos perfis glicêmicos.
A figura 4 mostra o gráfico de desempenho glicêmico de uma paciente que se recusava a receber tratamento insu-
línico e que, depois de devidamente convencida pela equipe de atendimento, concordou em ser insulinizada. O grá-
fico mostra que três semanas após o início do tratamento insulínico a paciente entrou em pleno controle glicêmico,
assim definido quando são atingidos níveis de GMS abaixo de 150 mg/dL e desvio padrão abaixo de 50 mg/dL. Neste
caso, o acompanhamento semanal com base nos parâmetros mencionados permitiu que atingíssemos uma perfeita
adequação da conduta terapêutica às necessidades terapêuticas da paciente, em curtíssimo prazo (três semanas),
sem ter que aguardar a avaliação dos resultados dos testes de A1C, os quais demoram de três a quatro meses para
manifestar a totalidade do efeito terapêutico da conduta adequada.

REFERÊNCIAS 5. Ceriello A., Esposito K., Piconi L., et al. 9. Kilpatrick ES, Rigby AS and Atkin
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SBPC e FENAD. Abril de 2004. 7. Bergenstal, RM et al. The Role of
Self-Monitoring of Blood Glucose in the Continuous Glucose Monitoring. Diabetes
3. Nathan DM, et al. Translating Care of People with Diabetes: Report Care 2008;31(Suppl. 2):S146-S149.
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Variability – Should We And Can We Prevent It? 8. Klonoff DC. Continuos Glucose Glucose Levels Over Time. Diabetologia
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17
Diretrizes SBD 2008

Gerenciamento eletrônico do diabetes:


usando a tecnologia para melhor controle
metabólico do diabetes
1. INTRODUÇÃO

A partir do final do século XX, aconteceram grandes avanços em tecnologia


no tratamento do diabetes. Esses avanços permitiram que milhares de pacientes
pudessem ter melhora dos resultados do tratamento da doença, facilitaram seu
manejo e possibilitaram um entendimento mais profundo das variações glicêmi-
cas e de como manejá-las.
Neste artigo, citaremos os mais importantes desses avanços que possibilitaram
o gerenciamento eletrônico do diabetes, permitindo melhora dos controles glicê-
micos, diminuição dos episódios de hipo e hiperglicemia e facilidade de cálculos e
manejo do diabetes, pela equipe de saúde e pelo paciente e sua família. Os avan-
ços são:
• A bomba de infusão de insulina, que embora tenha sido desenvolvida e seu
uso difundindo nos Estados Unidos a partir de 1970, no Brasil chegou há aproxi-
madamente dez anos e só agora começa a ser mais conhecida e prescrita no nosso
meio.
• Os sensores de glicose: desde os de uso médico até os novos sensores de
tempo real de uso individual
• Os softwares e programas de computador, que através do acesso, seja pela in-
ternet seja pelo celular, permitem um gerenciamento mais eficaz do diabetes e das
excursões glicêmicas pelo paciente, por seus familiares e pela equipe de saúde.

2. BOMBA DE INFUSÃO DE INSULINA

O objetivo da terapêutica com bomba de infusão de insulina é simular o que


ocorre no organismo da pessoa sem diabetes, mantendo a liberação de insulina
durante 24 horas para tentar obter níveis normais de glicose entre as refeições e
liberar insulina nos horários de alimentação.
A bomba de infusão de insulina é um dispositivo mecânico com comando
eletrônico, do tamanho de um pager, pesando cerca de 80 a 100 g. Colocada
externamente ao corpo, presa na cintura, pendurada por dentro da roupa ou
no pescoço, a bomba de infusão deve ser usada ao longo das 24 horas do dia.

18
2008 Diretrizes SBD

Na maioria dos sistemas de infusão de • de 17 mm para uso geral, aplica- 2.1 - INFUSÃO BASAL DE INSULINA
insulina, a bomba é ligada a um tubo do em 45 graus (Silouette®, Tender®,
plástico fino que tem uma cânula fle- Comfort® e Tenderlink®) ou menos, 2.1.1 - Cálculo da dose basal de insulina
xível de teflon, com uma agulha-guia, dependendo da quantidade de tecido
que é inserida sob a pele, geralmente celular subcutâneo. A infusão basal geralmente repre-
no abdômen, e por ele envia insulina Todos os conjuntos de infusão senta de 40% a 60% da dose total de
ao tecido subcutâneo do paciente utilizam adesivos na pele para a fixa- insulina/dia e seu objetivo é suprimir
continuamente em microdoses, de ção da cânula e a escolha do tipo dos a produção de glicose entre as re-
acordo com a dosagem previamente conjuntos de infusão, após o período feições, bem como durante a noite.
definida pelo médico. Outros locais inicial de adaptação, é feita pelo pa- Pode-se programar as bombas de
de aplicação da cânula podem ser a ciente, com base em critérios de preço infusão para liberar doses constantes
região lombar, as coxas e até mesmo e conforto. A cânula é o cateter, fina e
ou variáveis a cada hora, durante as
os membros superiores1. As bombas flexível de teflon. Todas as cânulas têm
24 horas, assim adaptando-se às ne-
de insulina são muito precisas. A libe- agulhas-guia, que são retiradas após a
cessidades variáveis dos diferentes
ração de insulina durante as 24 horas sua aplicação. Elas podem ser coloca-
períodos do dia3, como, por exemplo,
é automática é feita por meio de uma das manualmente ou por intermédio
o de maior resistência à ação da insu-
programação prévia, podendo ser de um aplicador.
lina, que ocorre no período do alvo-
constante ou variável. Pode-se pro- O kit de infusão (cânula e extensão)
recer e do entardecer. Além disso, a
gramar doses tão pequenas quanto deve ser trocado freqüentemente: a câ-
dose da infusão basal pode ser mu-
0,1 U/hora, ou nenhuma insulina por nula a cada três dias e todo o conjunto
dada a qualquer momento durante
algumas horas, adaptando-se às dife- de infusão (cânula e cateter) a cada seis
dias. Os análogos ultra-rápidos (lispro, as 24 horas do dia.
rentes necessidades de cada período Dependendo do modelo, as bom-
asparte ou glulisina) ou a insulina regu-
do dia.
lar são as insulinas preferencialmente bas de infusão de insulina podem
Por não ser à prova de água, ela deve
usadas na bomba, uma vez que cau- liberar taxas basais de 0,05 a 35 uni-
ser desconectada da cânula (por perío-
sam menos hipoglicemas do que a in- dades/hora (em gradações de 0,05
do máximo de até duas horas) quando o
sulina R, além de produzirem melhores a 0,10 unidades) e podem ser pro-
paciente quiser nadar ou tomar banho.
valores de glicemia pós-prandiais2. gramadas para até 48 diferentes ta-
Os implementos da bomba de infu-
O paciente deve ser alertado para xas basais em 24 horas4. Em alguns
são de insulina são:
carregar nas suas viagens frascos ex- casos, principalmente em crianças,
• Reservatório da insulina;
tras de insulina, acessórios para as pode-se usar doses tão pequenas
• Conjunto de infusão (cateter e câ-
bombas e seringas e/ou canetas, con- quanto 0,1 unidade por hora, e até
nula);
tendo análogos sem pico e ultra-rápi- sustar a infusão de insulina por algu-
• Baterias.
do, para o caso de acontecer algum mas horas. A dose basal total é calcu-
O reservatório de insulina contém
problema com o equipamento, bom- lada segundo a fórmula apresentada
de 300 a 315 unidades de insulina, de-
ba ou kit de infusão. a seguir na tabela 1.
pendendo do tipo de bomba utilizado.
Existem diversos tipos de conjuntos de
infusão, com diferentes tipos de catete-
res. São utilizados os seguintes tipos: TABELA 1 - Cálculo da dose basal de insulina
• de 6 mm para pessoas com te- a) Soma da insulina total/dia (N, L, glargina ou detemir) + (R, lispro ou asparte)*;
cido subcutâneo normal ou pouco b) Redução de 20% a 25%;
espesso; c) Divisão do total obtido por 2.
• de 9 mm para pessoas com teci-
do subcutâneo mais espesso, aplicado * Dose previamente utilizada.

em 90 graus (Quick-set®, Ultraflex® e


FlexLink®);

19
Diretrizes SBD Gerenciamento eletrônico do diabetes

2.2 – BOLUS DE REFEIÇÃO 2.2.2 - Sensibilidade à insulina e ajustes


de doses
O bolus alimentar ou de refeição é liberado no momento das refeições, pelo pa-
ciente, de acordo com a quantidade de carboidratos que será ingerida. Em média, Ela pode variar em diferentes perí-
usamos uma unidade de insulina para cada 15 gramas de carboidrato ingerida em odos, podendo ser menor no período
adultos e uma unidade de insulina para 20 a 30 gramas de carboidrato em crianças pré-menstrual, em situações de doen-
e adultos magros mais sensíveis à insulina. Podemos calcular esta relação usando ças infecciosas, estresse, depressão,
a formula descrita na tabela 2. quando o paciente ganha peso, ou até
mesmo em diferentes horários do dia,
quando é preciso lidar com níveis gli-
TABELA 2 - Relação insulina/carboidrato
cêmicos muito elevados, quando exis-
500 / DTID = gramas CH/unidade insulina te o efeito glicotóxico com diminuição
DTID = dose total de insulina/dia no início da terapia com bomba de infusão da sensibilidade à insulina. A sensibili-
dade também pode ser estimada em
50 mg/dl para adultos e em 75 a 100
Bolus adicionais de insulina podem é usado após refeição rica em gorduras mg/dl para crianças e adultos magros,
ser liberados durante as refeições ou e carboidrato, como pizza ou lasanha, com boa sensibilidade à insulina.
após seu término, o que é muito vanta- quando existe a necessidade de efeito Sempre que o paciente medir a gli-
joso quando se tratam de crianças, de mais prolongado da insulina. cemia, ele deve usar esse fator para cal-
pacientes com gastroparesia ou após cular quanta insulina é necessária para
o consumo de alimentos com grande 2.2.1 - Fator de sensibilidade e bolus reduzi-la ao valor desejado. Em todos
corretivo
quantidade de gordura, como pizza ou os pacientes, deve-se fixar uma meta
massas com queijo4(D). glicêmica a ser alcançada. No caso de
O fator de sensibilidade determina,
As bombas mais modernas, em uso crianças, por exemplo, é melhor fixar o
aproximadamente, qual é o efeito de
no Brasil, permitem alterar a forma e valor da meta glicêmica de 100 a 120
uma unidade de insulina nos níveis de
a duração do bolus que é usado para mg/% durante o dia e de 150 mg/%
glicemia do paciente. Ela é calculada
as refeições, utilizando esquemas de antes de deitar e, a partir daí, calcular
por meio da regra de 1.800: quando se
“onda quadrada” ou “onda dupla” para a correção. Ajustes na terapêutica po-
divide esse valor pela quantidade total
se adequar à quantidade e aos tipos de dem ser feitos em situações especiais,
de insulina utilizada por dia.
alimentos ingeridos. No esquema de tanto nas taxas basais quanto na rela-
bolus estendido (ou quadrado), uma ção dos bolus em diferentes situações,
Fator de sensibilidade
dose constante de insulina é liberada 1800/DTID = diminuição glicemia mg % como exercício, doença, menstruação
durante algumas horas, segundo uma / unidade insulina e estresse.
programação prévia, enquanto no es- DTID = dose total de insulina/dia no iní- Algumas das bombas de insulina
quema de bolus bifásico (ou de onda cio da terapia com bomba de infusão mais modernas têm softwares que a
dupla) primeiro se libera uma dose de capacitam a calcular a dose da insulina
insulina imediatamente após a refeição O bolus corretivo (BC) é usado para a ser injetada na forma de bolus, con-
e a seguir o restante da dose. O bolus corrigir a hiperglicemia e leva em conta siderando não só o consumo de car-
estendido pode ser usado durante uma a sensibilidade à insulina, que é indivi- boidratos calculado pelo paciente e
festa ou um churrasco. O bolus bifásico dual, como apresentado na tabela 3. introduzido na bomba, mas, também,
os resultados da glicemia medidos no
momento da aplicação. A possibilida-
TABELA 3 - Bolus corretivo
de de inclusão de diferentes coeficien-
Bolus de correção = valor de glicemia – meta glicêmica / fator de sensibilidade tes de relação insulina/carboidrato, de
520 – 120 mg / % = 400 / fator de sensibilidade = 400 / 50 = 8 unidades de Novo-Rapid® fatores de correção variáveis de acor-
do com diferentes horários do dia,

20
2008 Diretrizes SBD

bem como o cálculo da insulina resi- dose de insulina a ser injetada e liberar peso, desencadear cetoacidose diabé-
dual e a correção automática da dose doses necessárias com mais exatidão tica (CAD) por obstrução de cateter e
de insulina do bolus a ser liberado são do que com as injeções; tem custo mais elevado dentre todas
outras características positivas destas • Na maioria dos casos, podemos as opções disponíveis de insulinotera-
novas bombas. obter menores variações dos níveis de pia, além de ser desconfortável para
glicemia, melhorando a qualidade de alguns pacientes.
vida e os níveis de A1C;
2.3 - INDICAÇÕES PARA A PRESCRIÇÃO • Reduzir significativamente os
DA BOMBA DE INSULINA 2.5 - USO DE BOMBA DE INFUSÃO DE
episódios de hipoglicemias graves e
INSULINA NA GRAVIDEZ
assintomáticas9(C).
• Pacientes que estiverem com di-
• Eliminar os efeitos imprevisíveis
ficuldades para manter esquemas de O rígido controle glicêmico traz be-
das insulinas de ação intermediária ou
múltiplas aplicações ao dia, ou que nefícios indiscutíveis, tanto para a ges-
prolongada;
mesmo usando estes esquemas ainda tante diabética como para o feto e o
• Permitir a prática de exercícios
não consigam controle adequado4(D); recém-nascido. Este controle pode ser
sem exigir a ingestão de grandes quan-
• Quando houver controle inade- atingido com estratégias terapêuticas
tidades de carboidratos.
quado da glicemia ou ocorrer grandes que utilizam múltiplas injeções diárias
A vantagem da CSII sobre a terapia
oscilações glicêmicas; de insulina ou bomba de insulina. Nas
MDI é, primariamente, o resultado de
• Ocorrência do fenômeno do alvo- grávidas com diabetes, a terapêutica
uma melhor cinética da insulina. So-
recer (dawn phenomenon) com níveis com a bomba de infusão de insulina
mente a insulina ultra-rápida é usada
de glicemia de jejum acima de 140 a permite diminuir as excursões glicêmi-
hoje no tratamento com CSII e seu per-
160 mg/dl; cas, principalmente as glicemias pré-
centual de variabilidade na absorção
• Ocorrência do fenômeno do en- prandiais, melhorar o manejo do enjôo
é menor do que a das insulinas NPH e
tardecer; matinal e um reequilíbrio pós-parto
glargina, resultando maior reprodutibi-
• Ocorrência de hipoglicemias fre- mais facilitado.
lidade dos níveis glicêmicos.
qüentes e graves5(B), hipoglicemia Embora exista uma tendência a jul-
Outro fator que contribui para uma
noturna freqüente ou hipoglicemia gar superior o tratamento com bomba
absorção mais constante da insulina é
assintomática6,7(B); de insulina em mulheres com diabetes
a utilização de um só local de aplicação
• Em pessoas com grandes varia- durante a gravidez em relação aos es-
por cada dois a três dias, por meio do
ções das rotinas diárias ou com neces- quemas de múltiplas injeções diárias,
uso de um cateter, trocado após este
sidade de maior flexibilidade no estilo a superioridade deste tipo de trata-
período de tempo, o que não ocorre
de vida8; mento não foi confirmada por outros
quando é feito o rodízio dos locais de
• Portadoras de diabetes grávidas estudos11.
aplicação no esquema de MDI. Além
ou com intenção de engravidar;
disso, este sistema elimina a maioria
• Todas as pessoas motivadas, que
dos depósitos de insulina subcutâ- 2.6 - USO DE BOMBA DE INSULINA
desejem ter autocontrole9(A).
nea que existe quando se usam doses EM CRIANÇAS
maiores de insulina NPH ou as de ação
2.4 - VANTAGENS DA TERAPIA COM mais prolongada. O controle glicêmico Nas crianças com diabetes, uma das
BOMBA DE INFUSÃO DE INSULINA noturno é melhorado com as bombas grandes dificuldades do tratamento é
de insulina, minimizando o aumento seguir uma dieta fixada em horários,
As principais vantagens da terapia da glicemia anterior ao café da manhã quantidades e qualidade das refeições,
com bomba de insulina são: (o fenômeno do alvorecer), observado além das variações da atividade física
• Eliminar a necessidade de múlti- em pacientes com DM1, tratados com que ocorrem diariamente. Esses fatores
plas aplicações de insulina; injeções de insulina10. podem resultar em grandes oscilações
• Tornar mais fácil o controle do dia- Por outro lado, o uso da bomba glicêmicas ao longo do dia. O uso do
betes, permitindo ajuste mais fino da de insulina pode levar ao aumento de sistema de infusão de insulina permite

21
Diretrizes SBD Gerenciamento eletrônico do diabetes

diminuir as restrições dietéticas e me- de infusão de insulina seja bom, que se da glicemia e corrigir as alterações gli-
lhorar o controle glicêmico nessa po- meçam as glicemias capilares, no míni- cêmicas sempre que as mesmas ocor-
pulação, diminuindo o risco de hipogli- mo, três vezes ao dia antes dos horá- rerem. A cetoacidose ocorre com mes-
cemia e melhorando a sua qualidade rios das refeições. O ideal é que sejam ma freqüência em pessoas com MDI e
de vida, tornando-se uma opção tera- mediadas seis a oito vezes ao dia nas em pacientes com diabetes instável.
pêutica importante para esse grupo de pré-refeições e duas horas após, além Ademais, a freqüência de cetoacidose
pacientes. da hora de se deitar e duas vezes por é igual a dos pacientes em outras te-
Assim, todas as crianças portadoras semana, entre as 3 a 4 horas da manhã. rapias, embora pareça haver uma leve
de diabetes, independente da idade, Só assim é possível alcançar melhor vantagem a favor do uso da bomba de
podem ser potencialmente elegíveis controle glicêmico com menos hipo- infusão de insulina10.
para a terapia com bomba de insulina, glicemia, menos hipoglicemia assin- Como não é rara essa ocorrência,
desde que tenham pais motivados e tomática e conseqüente melhora da principalmente no início da terapia,
a criança aceite realizar de seis a nove qualidade de vida3. o paciente deve saber que hiperglice-
testes diários de glicemia12,13, além de mias inexplicáveis e mantidas a des-
concordar em usar o aparelho. peito de correções são uma indicação
2.8 - COMPLICAÇÕES RESULTANTES de que está havendo uma interrupção
DO USO DA BOMBA DE INFUSÃO DE da liberação de insulina, mesmo que
2.7 - FATORES QUE PREVÊEM INSULINA não tenha havido a mensagem de
SUCESSO NA TERAPIA COM BOMBA obstrução (no delivery) na bomba, e
DE INFUSÃO DE INSULINA Vários trabalhos mostram aumento que, por isso, o conjunto de infusão
das complicações em pacientes em uso deve ser trocado e a insulina ultra-
Entre os fatores preditivos de su- de terapia com bomba de infusão de rápida deve ser aplicada com caneta
cesso no uso de bomba de infusão de insulina, quando comparados com te- ou seringa no mesmo momento da
insulina podemos citar: a seleção ade- rapia com MDI e terapia convencional, troca do conjunto.
quada de pacientes, a freqüência das como infecção dos locais de aplicação,
medidas diárias de glicose no dia e a cetoacidose e coma hipoglicêmico15,16. 2.8.2 - Infecções de pele
presença de uma equipe entrosada. No entanto, é importante salientar que
Os resultados de hemoglobina gli- muitos destes trabalhos são anteriores Infecções de pele, embora raras,
cosilada são tanto melhores quanto à década de 1990, quando as bombas podem ocorrer no local da coloca-
maior é o número de medidas de glice- de infusão eram menos sofisticadas, ção do cateter em virtude da falta
mias no dia, além de quanto mais ve- com mecanismos de controle inferio- de cuidados na assepsia do local de
zes forem feitas correções de glicemias res e menor tecnologia agregada do aplicação ou de limpeza das mãos.
ao longo do dia, já que a maioria dos que os aparelhos atuais. Mesmo assim, Podem aparecer desde uma peque-
pacientes que mede a glicemia capilar ainda nos dias de hoje, existem compli- na ferida infeccionada a grandes
cinco ou mais vezes ao dia tem A1C cações no uso desta terapêutica, que abscessos, dependendo da exten-
médias menores que 7%14. Além disso, são descritas abaixo. são da contaminação e do estado
embora essa terapêutica permita uma de saúde do paciente 1. Geralmente,
vida sem qualquer tipo de restrições 2.8.1 - Hiperglicemia/cetoacidose antibióticos sistêmicos resolvem e
alimentares, aqueles pacientes que pre- raramente é necessário associar dre-
ferem seguir uma dieta mais regrada, Aumentos importantes das taxas de nagens nestes casos.
com horários e estilo de alimentação glicemia podem ocorrer sempre que
mais normal, contando corretamente houver interrupção do fluxo de insu- 2.8.3 - Falhas das bombas
os carboidratos e ingerindo dietas com lina, por causa do uso das bombas de
menor teor de gorduras, costumam ter infusão de insulina ultra-rápida, resul- São muito raras, uma vez que elas
melhores resultados. tando em cetoacidose diabética, que têm inúmeros mecanismos de auto-
É fundamental, também, para que pode ser prevenida se a pessoa que controle e alarmes, que detectam as
o resultado do tratamento com bomba usa a bomba fizer medições freqüentes falhas assim que venham a ocorrer.

22
2008 Diretrizes SBD

2.8.4 - Hipoglicemia • Pessoas que tenham problemas desconectado ou obstruído por


psiquiátricos ou distúrbios alimenta- tempo prolongado;
Embora ocorra, é muito menos res, como anorexia nervosa e bulimia. • Custo mais elevado dentre as opções
freqüente do que durante a terapia in- disponíveis de insulinoterapia;
tensiva (MDI)9. Seus riscos podem ser • Para alguns pacientes, carregar uma
diminuídos com medidas freqüentes 2.10 - ABANDONO DE USO DE bomba de insulina permanentemente
da glicemia, principalmente antes das BOMBA DE INFUSÃO DE INSULINA
pode ser desconfortável;
refeições e de madrugada, e antes de • Requer treinamento especializado.
dirigir. Erros de dose de bolus de refei- Os motivos mais comuns para
ção e de correção são causas freqüen- abandonar a bomba de infusão de in-
tes de hipoglicemias. Pacientes com sulina são: inabilidade para usá-la, falta 2.12 - CONCLUSÕES
hipoglicemia assintomática parecem de suporte familiar em adolescentes15,
se beneficiar da terapêutica com bom- custo do tratamento ou distorção de A terapia com bomba de infusão
ba de infusão, tendo menos episódios imagem corporal.
de insulina é tão segura quanto a MDI
desta complicação após o início de seu (múltiplas doses de insulina) e tem
uso. Além disso, pode-se interromper vantagens sobre ela, sobretudo em
ou reduzir a infusão de insulina duran- 2.11 – VANTAGENS E pacientes com hipoglicemias freqüen-
te episódios de hipoglicemia. DESVANTAGENS DA UTILIZAÇÃO tes, com um fenômeno do alvorecer
DE BOMBA DE INSULINA importante, com gastroparesia, na
2.8.5 - Outras complicações gravidez, em crianças e em pacientes
Principais vantagens da utilização
com DM1 e com um estilo de vida errá-
• Vazamento do cateter, que pode de bomba de insulina:
tico. A terapia com bomba de infusão
ser percebido pelo aumento das taxas • Elimina a necessidade de várias apli-
de insulina possibilita maior probabi-
de glicemia, ou porque a pessoa notou cações de insulina/dia;
lidade de se alcançar melhor controle
que sua roupa ficou molhada ou, ain- • Libera as doses necessárias com mais
glicêmico com menos hipoglicemia,
da, por sentir o cheiro de insulina. exatidão do que as injeções;
• Freqüentemente promove melhora hipoglicemias assintomáticas e melhor
• Falha da bateria, acusada pelos sen- qualidade de vida10,16.
sores da bomba, não é muito freqüente os níveis de A1C;
• Em geral, resulta em variações meno- A segurança e a eficácia do uso da
e pode ser facilmente resolvida.
res na oscilação habitual dos níveis de bomba de insulina são altamente de-
glicemia; pendentes da seleção adequada do
• Torna mais fácil o controle do diabetes paciente, de seu nível de educação em
2.9 - CONTRA-INDICAÇÕES PARA
O USO DA BOMBA DE INFUSÃO DE e permite um ajuste mais fino da dose diabetes, de sua adesão às recomenda-
INSULINA de insulina a ser injetada; ções terapêuticas e do nível técnico e da
• Com freqüência, melhora a qualidade competência da equipe multidisciplinar
As únicas contra-indicações para de vida; responsável por seu atendimento7(D).
o uso da bomba de infusão de insu- • Reduz significativamente os episódios As bombas de infusão de insuli-
lina são: de hipoglicemia severa; na existentes no mercado nacional
• Pessoas com baixa capacidade de • Permite a prática de exercícios sem até 2007 eram: Disetronic HPlus® e
entendimento ou que não tenham su- exigir a ingestão de grandes quantida- Medtronic 508®, produzidas respec-
porte familiar ou de apoio de Enferma- des de carboidratos. tivamente pelos maiores produtores
gem para as determinações do basal, mundiais de bombas de infusão de
bolus e troca dos conjuntos de infusão, Principais desvantagens da utilização insulina, Lab Roche e Lab Meditronic,
reservatórios de insulina e baterias; de bomba de insulina: as quais são de boa qualidade e aten-
• Pessoas que não estejam dispos- • Pode promover aumento de peso; dem as necessidades fundamentais
tas a medir a glicemia capilar no míni- • Pode desencadear cetoacidose da terapêutica intensiva com o uso
mo três vezes ao dia; diabética (CAD) se o cateter for de bomba de infusão de insulina. As

23
Diretrizes SBD Gerenciamento eletrônico do diabetes

bombas de insulina mais modernas, embora ainda tenham limitações de um cabo para o monitor. O monitor
como a ACCU-CHEK®Spirit (Lab Roche) importantes, tais como: capta os sinais a cada dez segundos e
e a Paradigm®715 e Paradigm®722 (Lab • Adesão do paciente; registra a média dos sinais a cada cin-
Medtronic), já existentes no mercado • Dados incompletos com poucos co minutos, totalizando 288 medidas
nacional e que vêm substituindo os valores medidos durante o dia. ao dia, durante três dias. A amplitude
modelos anteriores, permitem obter Devido a estes fatores, começou-se a de variação das medidas é de 40 a 400
melhores resultados desta terapêutica, desenvolver sistemas mais confortáveis mg/dl.
desde que seus recursos sejam ade- e precisos para a avaliação contínua de As leituras não são mostradas pelo
quadamente utilizados. glicemia. Assim, hoje, um grande núme- visor durante os três dias de uso do
ro de equipamentos foram desenvolvi- equipamento. Para o seu funciona-
FIGURA 1 - Paradigm®715 dos e testados: desde relógios de pulso mento adequado, é fundamental que
que medem a glicose intersticial a lentes os usuários insiram, no mínimo, três
de contato que mudam de cor de acor- medidas de glicemia capilar por dia na
do com os níveis de glicose da lágrima, memória do monitor, para permitir a
até sensores implantados e testados no calibração, além de registrarem todas
tecido celular subcutâneo. Nesse cami- as vezes que se alimentam, exercitam,
nho, muitos equipamentos foram aban- injetam insulina e quando têm hipo-
donados depois dos primeiros testes, glicemias. Além disso, os pacientes de-
outros foram lançados comercialmente vem manter um registro de todas estas
e abandonados após algum tempo e variáveis, e mais os horários, quantida-
outros ainda se firmaram como instru- de e qualidade das refeições. Estes da-
mentos importantes no controle das dos são usados para melhor avaliação
pessoas com diabetes17. dos fatores interferentes com o contro-
No momento, no Brasil e nas Amé- le glicêmico.
ricas, o Continuous Glicose Monitoring Após as medidas, as informações do
FIGURA 2 - ACCU-CHEK®Spirit
System (CGMS) é o único sensor de uso paciente armazenadas no monitor são
médico em uso. O CGMS18 é um tipo de transferidas para um computador pes-
holter de glicose, para uso pelo médico soal (é feito um download), através de
ou pelo laboratório. Ele mede e registra um software, utilizando uma base fixa
os níveis de glicose no tecido celular de transmissão de dados (Com-station).
subcutâneo e tem o tamanho de uma Após o download dos registros, as infor-
bomba de infusão de insulina. O sen- mações ficam disponíveis para análise
sor mede a glicose no fluido intersticial e interpretação através de gráficos, re-
através de uma pequena cânula inse- latórios estatísticos, tabelas e relatório
rida sob a pele, semelhante ao set de geral e são analisadas pelo médico.
infusão da bomba de insulina. Ele é co- As medidas apresentadas como
nectado com um pequeno cabo elétri- gráficos ou como tabelas permitem a
co a um aparelho eletrônico (monitor) identificação de padrões e tendências
3. MONITORIZAÇÃO que pode se colocar preso no cinto ou de glicose que ocorrem durante as 24
CONTÍNUA DE GLICOSE (MCG) dentro do bolso. horas do dia. O efeito das refeições nos
E SENSORES DE GLICOSE A leitura dos valores de glicose níveis de glicemias das aplicações de
através do sensor é feita por meio de insulina ultra-rápidas ou rápidas, das
As medidas de glicemia capilar uma reação eletroquímica da enzima reações à hipoglicemia e ao exercício
vêm cada vez mais ganhando espa- glicose oxidase, que converte a glicose físico também pode ser percebido,
ço como ferramentas importantes no intersticial em sinais eletrônicos, que além da hipoglicemia da madrugada,
controle das pessoas com diabetes, são enviados continuamente através quando presente, facilitando, assim,

24
2008 Diretrizes SBD

mudanças e ajustes no tratamento, 4. SENSORES DE USO PESSOAL alguns dias em alguns deles. Eles são
tanto dos pacientes com diabetes de E DE MEDIDA EM TEMPO REAL portáteis, do tamanho de uma bom-
tipo 1, como aqueles com DM2 e con- ba de insulina ou pouco menores. Eles
trole insatisfatório do diabetes. São mais uma promessa de melhora constam de três partes: um sensor, um
Todos os pacientes com DM1, em no manejo do diabetes, particularmen- transmissor e um receptor.
insulinização intensiva ou não, grávidas te nos pacientes com DM1 e também O sensor é introduzido no TCSC.
com DM, pacientes com hipoglicemias naqueles com DM2 e que estão em Trata-se de um tubo pequeno, com
freqüentes, pacientes com DM2 e con- esquemas de insulinização intensiva. uma agulha-guia, revestido interna-
trole insatisfatório, ou mesmo aqueles Vários destes equipamentos já estão mente de glicose oxidase. A glicose
com hemoglobina glicosilada normal em uso. Outros estão em fase final de medida tem seu valor transformado
mas, com muitos episódios de hipogli- registro e de experimento clínico. A em impulsos elétricos, que são envia-
cemias, têm indicação ao menos, uma maioria é implantada no TSCS (tecido dos pelo transmissor, através de co-
vez ao ano, de usar este instrumento celular subcutâneo), apresentando a municação sem fio (radiofreqüência)
de propedêutica (D). possibilidade de leituras de glicose em para o monitor. O monitor mostra em
O uso da CGMS permite o ajuste tempo real, e de disparar alarmes de hi- seu visor as medidas, em tempo real.
das glicemias das pessoas com DM, poglicemia e hiperglicemias. As medidas de glicose, efetuadas
ajudando a melhorar o controle glicê- Dentre as vantagens apresentadas pelo sensor a cada um a cinco minu-
mico, detectando e reduzindo o risco por esses sistemas, podemos citar: tos, são mostradas na tela do receptor,
de eventos hipoglicêmicos e, assim, melhora nas excursões glicêmicas19, assim como gráficos dos resultados da
permitindo melhorar os esquemas redução na duração e severidade dos monitorização, dependendo do mode-
de insulinização intensiva, com maior episódios de hipoglicemias20 e melho- lo, podendo armazenar os resultados
ajuste do basal e dos bolus de refeição ra do controle glicêmico em pacientes para serem transferidos para um sis-
e correção. A tabela 4 mostra as princi- com diabetes de tipo 121(B). tema de gerenciamento de dados via
pais indicações reconhecidas pela SBD Esses equipamentos já estão sendo internet. Por enquanto, um dos dois
para a realização da MCG, com base usados no Brasil, de forma contínua equipamentos em uso no Brasil é o
nas recomendações de Klonoff17(A). pela maior parte dos pacientes ou por Guardian Real-Time® (figura 3), um mo-
nitor contínuo de glicose, que mostra
TABELA 4 - Principais indicações reconhecidas pela SBD para a monitoriza-
a cada cinco minutos as medições da
ção contínua da glicose
glicose lidas do subcutâneo em tempo
- A indicação mais importante da MCG é a de facilitar os ajustes na conduta terapêutica, real, através de um sensor. Ele disponi-
com o objetivo de melhorar o controle glicêmico. biliza no display do monitor: gráficos
- Os referidos ajustes incluem: de três, seis, 12 e 24 horas de monitori-
• Substituição da insulina rápida pelo análogo de insulina ultra-rápida ou adição de zação, setas de velocidade de oscilação
aplicações adicionais de insulina de ação rápida ou de análogo de insulina de ação das glicoses, alerta e dispara um alarme
ultra-rápida.
em condições limítrofes, previamente
• Substituição da insulina NPH por um análogo de insulina de longa duração ou adi-
ção de aplicações adicionais de insulina NPH. programadas para cada paciente, além
do status do monitor e do sensor.
• Ajustes de doses de insulina basal e prandial.
O outro sistema é o Paradigm
• Alterações na composição de carboidratos da dieta.
REAL-Time 722 com Minilink (Me-
• Alterações nas metas desejáveis para glicemia pré ou pós-prandial.
dtronic Comercial Ltda.) (figura 4),
- Quantificação da resposta a um agente antidiabético.
que integra num só equipamento a
- Avaliação do impacto de modificações do estilo de vida sobre o controle glicêmico.
bomba de insulina e o monitor de gli-
- Monitoramento das condições nas quais um controle glicêmico intensivo é desejado
cose descrito acima. Em breve, pelo
(diabetes gestacional, diabetes em crianças e pacientes em UTI).
menos mais um equipamento Navi-
- Diagnóstico e prevenção da hipoglicemia assintomática e noturna.
gator® (Lab Abbott) (figura 5), deve
- Diagnóstico e prevenção da hipoglicemia pós-prandial.
estar disponível no Brasil21.

25
Diretrizes SBD Gerenciamento eletrônico do diabetes

FIGURA 3 - Guardian Real-Time® FIGURA 5 - Navigator® FIGURA 6 - Conjunto DexCom® com


aplicador

FIGURA 4 - Paradigm REAL-Time 722


com Minilink®

Alguns equipamentos, inclusive os atualmente em uso no Brasil, mostram no


visor um gráfico com as oscilações registradas a cada cinco minutos, além de suge-
rir com setas apontadas para cima ou para baixo a tendência de queda ou subida.
Estas setas, que permitem saber e calcular a velocidade de mudança da variação
da glicose (de 1 mg/dl/min a 2 mg/dl/min), podem ser programadas para emitir
alarmes sonoros, de hipo e hiperglicemia.

TABELA 5 - Características dos sensores de tempo real


Guardian®
Navigator® DexCom®
Paradigm 722 com Minilink®

Área alcance (wireless) 1,8 m 3m 1,8 m


Alarmes Sim Sim Não
Setas de tendências Sim Sim Não
Resistente à água Sim (90 cm por 30 min)* Sim (90 cm por 30 min) Não
Número mínimo calibração/dia Duas vezes por dia Uma vez por dia Duas vezes por dia
Freqüência de medida de glicose A cada cinco minutos A cada um minuto A cada cinco minutos
* Bomba não resistente à água

As medidas glicêmicas podem ser dos dados armazenados no receptor 4.1 - OUTROS SISTEMAS E
vistas nos receptores ou descarregadas através de um cabo especial que se FERRAMENTAS: SOFTWARES,
diretamente num computador, desde conecta ao computador (Guardian® e ACESSOS POR TELEMETRIA E
que se tenha o software e o cabo de Paradigm 722® com ComLink). O des- TELEFONES CELULARES
conexão (Dexcom®) ou vistas nos apa- carregamento destes dados é feito na
relhos receptores e armanezadas na home page do fabricante, que depois Além dos equipamentos citados
internet para, posteriormente, serem pode ser acessada pelo paciente, seu acima, alguns sistemas utilizando te-
vistas pela equipe de saúde. Isto é pos- médico ou pela equipe de saúde, des- lefones celulares ou glicosímetros
sível quando o paciente ou um mem- de que seja usada a senha autorizada acoplados a transmissores também
bro da equipe de saúde faz um upload pelo paciente. estão entrando no mercado brasileiro

26
2008 Diretrizes SBD

e prometem auxiliar o controle do pelo seu médico, que deverá inserir no gerenciamento do diabetes através
diabetes e facilitar o seu controle, en- sistema, via internet, os parâmetros a de página na internet é um programa
viando os dados obtidos de glicemia serem utilizados para o cálculo da dose desenvolvido nos Estados Unidos,
e de outros registros feitos pelo pa- de insulina a ser administrada para co- chamado de Nutrihand®23, que já está
ciente por celular, por internet ou por brir a refeição e corrigir a glicemia. O traduzido para o português e dispo-
telemetria. uso do sistema também faz com que os nível na internet.
GlicOnLine® é um destes programas22 pacientes não tenham a necessidade de Por último, sistemas de gerencia-
que brevemente deve estar disponível e registrar diariamente as suas glicemias mento do controle glicêmico de gran-
que pode auxiliar o paciente, seus fami- capilares, a quantidade de carboidratos de número de pacientes, que através
liares e cuidadores e os profissionais de ingeridos e as doses de insulina aplica- do envio das medidas de glicemia
saúde a manejarem melhor o diabetes, das, visto que os dados ficam armazena- capilar obtidas por glicosímetros por
já que permite, através de um software dos no servidor e podem ser acessados telemetria para centros regionais com
especialmente desenvolvido e utilizado a qualquer momento. Desenvolvido por softwares aplicados, permitem geren-
por telefone celular, orientar o paciente um grupo com larga experiência em tra- ciar o controle glicêmico de grande
em relação à dose de insulina tipo bolus tamento intensivo de pessoas com dia- número de pacientes. Vários destes
adequada para a quantidade de carboi- betes e já testado no HC de São Paulo, sistemas estão em desenvolvimento
drato que está sendo ingerida e a glice- deve entrar brevemente em uso mais e, pelo menos um deles, o Yara Tele-
mia do momento. amplo. medicine System (YTS)24-26, concebido
A utilização deste sistema só é possível Outro sistema (este já comercial) no Brasil, deve começar a ser usado
após a prescrição eletrônica do paciente que também promete facilitar o em breve.

TABELA 6 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Níveis de evidência

A bomba de insulina está indicada em todos os pacientes motivados, que desejem ter autocontrole. A
A segurança e a eficácia do uso da bomba de insulina são altamente dependentes da seleção
adequada do paciente, de seu nível de educação em diabetes, de sua adesão às recomendações
terapêuticas e do nível técnico e da competência da equipe multidisciplinar responsável por seu D
atendimento.

A bomba de insulina está indicada em pacientes que estiverem com dificuldades para manter es-
quemas de múltiplas aplicações ao dia ou que mesmo usando estes esquemas ainda não consigam D
controle adequado.

A bomba de insulina está indicada em pacientes que apresentam hipoglicemias freqüentes e gra-
ves, hipoglicemia noturna freqüente ou hipoglicemia assintomática. B
A monitorização contínua da glicose (MCG) está indicada em situações que exigem informações
detalhadas sobre as flutuações da glicemia, que somente poderão ser detectadas através de moni- A
torização eletrônica da glicose intersticial.

Os sistemas de sensores de mensuração da glicemia melhoram as excursões glicêmicas, reduzem


a duração e severidade dos episódios de hipoglicemias, com melhora do controle glicêmico em B
pacientes com diabetes de tipo 1.

DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES:


De acordo com a norma 1595/2000 do Conselho Federal de Medicina e a Resolução RDC 102/2000 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, o
autor, Walter J. Minicucci, declara que participa de estudos clínicos subvencionados pelo Laboratório Sanofi-Aventis Pharma. Ele declara ainda que é
conferencista dos Laboratórios Medtronic, Abbott e Lilly; desenvolve trabalho de Comunicação em Diabetes para os Laboratórios Abbott, NovoNordisk
e Laboratório Sanofi-Aventis Pharma; e integra o Grupo Assessor do site Medical Services do Laboratório Sanofi-Aventis Pharma.

27
Diretrizes SBD Gerenciamento eletrônico do diabetes

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28
2008 Diretrizes SBD

Diabetes e drogas antipsicóticas

1. INTRODUÇÃO

1.1 - DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS

Os distúrbios emocionais e orgânicos nos pacientes com doenças psiquiátri-


cas, tanto individualmente quanto no seu núcleo social, são enormes, podendo
ser incapacitantes, além de estarem ligados a custos psicológicos, sociais e eco-
nômicos.
As doenças psiquiátricas apresentam uma freqüência importante e devem
ser tratadas usualmente por toda a vida. Na população dos Estados Unidos, en-
contra-se incidência pronunciada de várias doenças psiquiátricas, tais como es-
quizofrenia (1%), transtornos bipolares (2%) e depressão maior (8%)1(B). Quando
analisadas as causas de morte destes pacientes, nota-se que, embora suicídio e
acidentes representem 28% e 12% respectivamente. Cerca de 60% delas decor-
rem de causas orgânicas, onde os distúrbios cardiovasculares são os fatores mais
importantes2(B).
Há mais de uma década, trabalhos já chamavam atenção para uma associação
entre esquizofrenia e DM2, independentemente de fármacos, com relato inclusive
da pouca probabilidade da interferência do tratamento medicamentoso3(B,2B). Os
trabalhos mais consistentes relatam que os pacientes com esquizofrenia e distúr-
bios afetivos apresentam 1,5 a duas vezes maior prevalência de diabetes e obesi-
dade do que na população geral1(B). Estudos menores associam essas condições
também a outros distúrbios psiquiátricos.
Enger et al. 4(B) recentemente publicaram dados, mostrando uma incidên-
cia de 34% de síndrome metabólica em pacientes esquizofrênicos, portanto,
superior ao encontrado na população geral. Ainda chamou a atenção para
o alto índice de tabagismo nestes pacientes, fator este que, mesmo isola-
damente, é muito importante na gênese dos problemas cardiovasculares.
Encontrou também um aumento na freqüência de arritmias (cerca de 60%),
de infarto agudo do miocárdio (IAM) (100%) e de morte (50%), demonstran-
do uma alta morbimortalidade quando ocorre a associação destes eventos
patológicos.

29
Diretrizes SBD Diabetes e doenças antipsicóticas

1.2 - INTERAÇÃO ETIOLÓGICA demonstrando que o estresse causa devida utilização desses fármacos15(B).
influência direta no eixo hipotálamo- Os sintomas das psicoses são divididos
Desde 1960 já dava atenção à in- hipófise-adrenal, levando a uma pro- em dois grandes grupos:
teração gene-ambiente e sua relação dução aumentada de cortisol e ACTH, • Positivos: alucinações, delírios etc.
com diabetes5B, quanto à hipótese além de ativação do sistema simpatoa- • Negativos: isolamento, apatia, afe-
do thrifty genotype, ou seja, genes drenal com aumento de catecolaminas tividade, diminuição de fatores cogniti-
responsáveis por criar uma economia e ativação do sistema renina-angioten- vos, dentre outros.
energética, em situações de privação sina11-13(B). Thakore et al.14(C) encontra-
alimentar crônica, muito freqüente na ram que, numa população de pacientes
pré-história, com a finalidade da sobre- portadores de esquizofrenia, os níveis 2.1 - ANTIPSICÓTICOS DE PRIMEIRA
GERAÇÃO
vivência. Certas populações possuido- de cortisol plasmático estavam aumen-
ras desses genes poderiam ativar este tados em aproximadamente 90% e de
Nos anos 50, surgiu o primeiro an-
mecanismo, diminuindo com isso o gordura visceral em 250%. A hipótese
tipsicótico (clorpromazina). A partir de
metabolismo basal, com conseqüente do desenvolvimento da esquizofrenia
então, surgiram vários outros, sem im-
aumento das gorduras visceral e total. pelo binômio estresse-vulnerabilidade
portantes variações no mecanismo de
Devido ao aumento atual da oferta ali- (indivíduo geneticamente propenso,
ação ou eficiência terapêutica16(B). São
mentar, cria-se, portanto, um ambiente ao ultrapassar o seu limiar de tolerân-
chamados de antipsicóticos de primei-
propício para o desenvolvimento da cia ao estresse, poderá desenvolver
ra geração, convencionais ou típicos.
síndrome metabólica6,8(B). esquizofrenia), além do conhecimento
Hoje, ainda são encontrados vários
De maneira concomitante, existe que o estresse, com freqüência, prece-
componentes deste grupo, tais como:
descrição de dezenas de genes criando de a doença e exacerba os sintomas da
perfenazina, flufenazina, trifluoperidol,
alterações em diversos níveis do meta- esquizofrenia, mostra, mais uma vez,
trifluoperazina, haloperidol, pimozida,
bolismo, com ações específicas ou atra- a inter-relação da síndrome metabó-
tiotixeno, loxapina e penfluridol, entre
vés de interação entre eles, ocupando, lica com a esquizofrenia. Além disso,
outros.
deste modo, papel fundamental na dados de literatura direcionam para o O mecanismo de ação desses fár-
etiologia e progressão da síndrome fato de que a paciente com distúrbios macos é através do antagonismo dos
metabólica7(B). psiquiátricos, em especial a esquizofre- receptores (D2) dopaminérgicos, apre-
Recentemente, foi sugerido que a nia, apresente já ao diagnóstico uma sentando alta afinidade, levando com
manifestação de sintomas psicóticos maior incidência de DM2 e sobrepeso/ esta ação a importante melhora nos
seria devido a uma interação de fato- obesidade23(B). sintomas positivos18(B). Esse fato cor-
res genéticos e ambientais, havendo robora com a hipótese dopaminérgica
um grande número de genes de sus- (mudanças na transmissão dopaminér-
cetibilidade, que de forma individual, 2. ANTIPSICÓTICOS gica no cérebro seriam responsáveis
causaria apenas efeitos menores, mas, pela esquizofrenia)17(B).
quando combinados, as suas ações Embora, a esquizofrenia não seja Infelizmente, os antipsicóticos tí-
levariam à interação com fatores am- uma doença curável, em muitos casos picos não têm ação em cerca de 30%
bientais, induzindo à psicose. Entre- os sintomas e a evolução da doença dos pacientes, a sua ação nos sinto-
tanto, estes genes ainda não foram podem ser bem controlados. Entre- mas negativos é mínima e podem
identificados9,10(B). Não se pode ainda tanto, o sucesso do tratamento com causar efeitos colaterais extrapirami-
afastar a hipótese de que os genes dos medicamentos antipsicóticos está dais importantes, tais como: discine-
componentes da síndrome metabólica intimamente relacionado com o per- sia, acatisia, distonia e parkinsonis-
e das doenças psiquiátricas tenham centual da resposta ao medicamento mo, bem como hiperprolactinemia,
uma identidade comum ou mesmo in- e à aderência. Os efeitos colaterais, quando utilizados em dose efetiva.
terferência nas suas ações8(B). bem como a falta de entendimento Estes efeitos colaterais levam ao de-
Quanto à participação de fatores da doença e da necessidade do uso da senvolvimento de estigmas, angús-
ambientais, inúmeras publicações vêm medicação, poderão comprometer a tia e intolerância, ocorrendo, como

30
2008 Diretrizes SBD

conseqüência, uma diminuição de bipolar, demência, depressão psicóti- de 2003. Ele apresenta mecanismos de
aderência ao tratamento19(B). É im- ca, autismo e distúrbios relacionados ação diferentes dos antipsicóticos de
portante, porém, salientar que são ao desenvolvimento1(B). segunda geração anteriores, devido a:
drogas de baixo custo econômico. Embora tenham causado avanço
considerável na qualidade de vida dos a) Diferente ação nos receptores
pacientes, surgiram várias publicações D2 dopaminérgicos: enquanto os ou-
2.2 - ANTIPSICÓTICOS DE SEGUNDA mostrando a associação dos antipsicó- tros antipsicóticos (primeira e segunda
GERAÇÃO ticos atípicos com uma série de eventos geração) apresentam antagonismo, o
indesejados, tais como aumento de in- aripiprazol é um agonista parcial dos
O novo avanço importante no arse- cidência de DM2 e de DCV, sonolência, receptores D2 dopaminérgicos27(B).
nal terapêutico das doenças psicóticas ganho de peso e dislipidemia22-23(B). Um agonista parcial age como um
ocorreu com o aparecimento dos an- Esses fatores causam, por conseguin- estabilizador de sistema neurotrans-
tipsicóticos de segunda geração ou atí- te, uma diminuição da aderência ao missor, deslocando a dopamina dos
picos. A primeira substância foi a cloza- tratamento24(B). Estes efeitos colaterais seus receptores quando os níveis de
pina, nos anos 80 na Europa e nos anos são bem mais freqüentes nos pacientes dopamina estão altos (hiperativida-
90 nos Estados Unidos. A partir dos em uso da clozapina e da olanzapina, de), passando a estimular com menor
anos 90, surgiram outras, tais como: menores naqueles utilizando a rispe- intensidade. Além disso, quando os ní-
olanzapina, amisulpirida, risperidona, ridona e a quetiapina, e praticamente veis de dopamina estão baixos (hipoa-
quetiapina, ziprasidona e zotepina. ausentes quando do uso da ziprasido- tividade), eles estimulam os receptores
Diferentes dos antipsicóticos conven- na e aripiprazol25. que estão pouco estimulados ou mes-
cionais, estes variam quanto à eficácia, Quanto ao diabetes e sua correlação mo sem estimulação.
formulação, bioquímica e perfil de efei- com o uso de antipsicóticos, a literatu- Existe a hipótese de que nos pacien-
tos colaterais. A clozapina, mesmo sen- ra apresenta várias evidências1,23(B). O tes com esquizofrenia, os níveis de do-
do a mais efetiva, é indicada somente uso desse grupo de drogas, além da
quando outras medicações falham ou pamina estejam elevados em determi-
possibilidade de causar o aparecimen-
em pacientes com alto risco para sui- nados sistemas (mesolímbico), normais
to do diabetes, pode mesmo agravar
cídio, uma vez que apresenta risco im- em alguns (nigro-estriatal) e mesmo
o controle glicêmico naqueles já pre-
portante para o desenvolvimento de baixos em outros (mesocortical). Quan-
viamente diagnosticados. Estas ações
agranulocitose. do administrada uma droga que é an-
podem surgir com poucas semanas
Estas drogas apresentam em co- tagonista, ela terá, devido à diminuição
de uso da medicação, entretanto, po-
mum, como novidade, uma forte ação do estímulo em todos os sistemas, uma
dem ceder com a retirada da droga.
de antagonismo nos receptores sero- ação desejada apenas nos sistemas com
Quanto ao mecanismo fisiopatológico
toninérgicos 5-HT2a, sendo esta ação alto nível dopaminérgico. Entretanto,
para essa complicação, que não é total-
responsável pelo aparecimento de nos outros sistemas, poderá causar efei-
mente conhecido, existem suposições
efeitos benéficos nos sintomas negati- tos indesejáveis, tais como distúrbios de
sobre o aumento da resistência à in-
vos, como importante diminuição nos movimento, hiperprolactinemia e até
sulina causada pelo aumento de peso
efeitos colaterais extrapiramidais20(B), piora dos sintomas negativos.
e alteração na distribuição da gordura
mantendo, embora com menor inten- Portanto, espera-se que um agonis-
corporal ou mesmo por ação direta nos
sidade, o antagonismo aos receptores ta parcial dos receptores (D2) estabilize
tecidos sensíveis à insulina1,21(B).
D2 dopaminérgicos17(B). Por serem o sistema dopaminérgico. Em modelos
mais bem tolerados e mais efetivos, animais de esquizofrenia, simulando
passaram a ser, portanto, drogas de 2.3 - ANTIPSICÓTICOS MAIS hiperatividade dopaminérgica, o aripi-
primeira linha para os que necessitam RECENTES26,27(B) prazol atuou como antagonista e, nos
deste tipo de medicação. Em geral, os mesmos modelos, quando simulando
candidatos ao uso de antipsicóticos Existem antipsicóticos mais novos, hipoatividade, atuou como agonista28(B).
são pacientes com transtorno do es- como o aripiprazol, liberado pela Food Demonstrou-se que o sistema dopami-
pectro de esquizofrenia, transtorno and Drug Administration em novembro nérgico tem ação de agonista parcial.

31
Diretrizes SBD Diabetes e doenças antipsicóticas

b) Ações nos receptores serotoninérgicos: aumento da glicemia de jejum em


• Receptores 5-HT2a: o aripiprazol apresenta a mesma ação dos antipsicóticos ambos os grupos, sendo esse incre-
de segunda geração, ou seja, antagonismo levando à diminuição dos sintomas ne- mento menor naqueles fazendo uso
gativos e dos efeitos colaterais extrapiramidais29(B). do aripiprazol.Neste mesmo estudo,
• Receptores 5-HT1a: o aripiprazol apresenta atividade agonista parcial e pode, com quando o alvo foi a hemoglobina gli-
esta ação, diminuir atividade ansiolítica e promover melhora na depressão, cognição, cosilada, houve redução em ambos
sintomas negativos e sintomas extrapiramidais nos esquizofrênicos30(B). os grupos31(B).
Quando se observam os eventos adversos relacionados a cada grupo de Devido à importante associação dos
drogas, os resultados são diferentes. Por exemplo: quando se correlaciona antipsicótipos atípicos com os com-
o uso de antipsicóticos atípicos com o aparecimento dos componentes da ponentes da síndrome metabólica,
síndrome metabólica, a freqüência é significativamente diferente do que é foi desenvolvido um consenso acerca
visto com o uso do aripiprazol. Isso pode ser observado quanto ao compor- da relação das drogas antipsicóticas e
tamento do peso e surgimento da dislipidemia, bem como aparecimento e diabetes1(B). Da discussão, saíram reco-
comprometimento do DM2, conforme tabela11,26(B). mendações e comentários, tais como:
- Avaliação do risco-benefício: ape-
sar dos efeitos adversos citados, vários
TABELA 1 - Antipsicóticos atípicos e anormalidades metabólicas1(B) fatores devem ser valorizados, como
natureza da condição psiquiátrica do
Droga Ano Peso Risco DM Dislipidemia
paciente, metas, histórico da droga,
Clozapina 1989 +++ + + aderência, efetividade da medicação,
comorbidades, custo etc. Porém, os ris-
Olanzapina 1996 +++ + +
cos das implicações clínicas dos compo-
Risperidona 1993 ++ 0 0
nentes da síndrome metabólica devem
Quetiapina 1997 ++ 0 0 também influenciar a escolha da droga.
Ziprasidona 2001 + - Monitorização, se possível antes
Aripiprazol 2002 +
da prescrição dos antipsicóticos atípi-
cos, determinando altura e peso, calcu-
(+) Efeito de aumento (--) Sem efeito (0) Resultados discrepantes
lando o índice de massa corporal (IMC),
medindo a circunferência da cintura e
a pressão arterial, além de dosar a gli-
3. INTER-RELAÇÃO DO cemia de jejum e o perfil lipídico. Em
DIABETES COM OS seguida, deve-se monitorar estes da-
ANTIPSICÓTICOS dos periodicamente (tabela 2).

Vários estudos têm identifica-


do uma associação entre o uso de TABELA 2 - Monitorização
alguns antipsicóticos, sobretudo a
Quatro Oito Doze Três A cada 5
olanzapina e a clozapina, com o apa- Basal
semanas semanas semanas meses
Anual
anos
recimento de eventos metabólicos
Histórico pessoal familiar X X
adversos, tais como hiperglicemia,
dislipidemia, resistência à insulina e Peso (IMC) X X X X X
DM2. Entretanto, estes eventos ad- Circunferência da cintura X X
versos não foram encontrados quan- Pressão arterial X X X
do do uso do aripiprazol, ziprasidone
Glicemia de jejum X X X
e amilsulpride21(B). Estudo compa-
rando o uso do aripiprazol versus Perfil lipídico X X X
placebo encontrou um discreto Observação: Avaliações mais freqüentes podem ser justificadas, baseadas no estudo clínico.

32
2008 Diretrizes SBD

Os profissionais de saúde, os pa- relatam que a associação de diabetes


cientes, os membros da família e os e transtornos mentais já é conhecida
cuidadores devem ter conhecimen- desde o século 19, ocorrendo duas a
to da sintomatologia do diabetes. Se três vezes mais na população com es-
quaisquer destes itens vierem a ter quizofrenia do que na normal, assim
alterações, deve-se iniciar um trata- como a associação de antipsicóticos
mento adequado com um especialis- de segunda geração com ganho de
ta. Com pacientes que desenvolvam peso e alteração no metabolismo da
agravamento na glicemia ou dislipi- glicose e dos lipídios.
demia, durante a terapia, recomenda-
se trocar o antipsicótico por outro que
não esteja associado com ganho de 4. CONCLUSÃO
peso ou diabetes. O consenso salien-
ta também que muitos dos trabalhos Estudos atuais chamam a aten-
relacionados aos antipsicóticos ainda ção para os grandes benefícios que
apresentam as mais variadas limita- os antipsicóticos atípicos oferecem
ções, devendo no futuro surgirem para determinados grupos de pa-
mais estudos enfocando tópicos mais cientes com distúrbios psiquiátricos.
específicos. Entretanto, os eventos adversos, tais
Em 2007, foi criado o Consenso como ganho ponderal, aparecimen-
Brasileiro sobre Antipsicóticos de Se- to de dislipidemia e DM2, podem
gunda Geração e Distúrbios Metabó- estar presentes quando do uso de
licos32, tendo participado deste traba- determinados fármacos desse grupo
lho representantes de várias entidades de drogas. Nesse contexto, a prescri-
(PROESC, PRODESQ, PROJESQ, ABESO, ção de um antipsicótico deve valori-
SBD e SBEM) e aceitado como forma de zar, tanto no início, quanto durante
monitorização a tabela anterior, com o acompanhamento do paciente,
a modificação de que o perfil lipídico esta importante relação.
seja anual. Neste consenso, os autores

TABELA 3 - Tópicos fundamentais e seus graus de recomendação

Freqüência importante das doenças psiquiátricas B


Associação de diabetes e excesso de peso com distúrbio bipolar
B
e esquizofrenia é quase o dobro da população geral

Interação etiológica com fatores genéticos e eixo hipotálamo-


B
hipófise-adrenal

Os antipsicóticos apresentam grupos diferentes com ações


B
diversas entre eles e no metabolismo

Consensos recentes sugerem monitorização no tratamento


destas doenças psiquiátricas A

33
Diretrizes SBD Diabetes e doenças antipsicóticas

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34
2008 Diretrizes SBD

Doença arterial obstrutiva periférica no


paciente diabético: avaliação e conduta

1. IMPACTO DA DOENÇA ARTERIAL OBSTRUTIVA PERIFÉRICA


(DAOP) NO PACIENTE DIABÉTICO

A doença arterial obstrutiva periférica (DAOP) caracteriza-se pela obstrução


aterosclerótica progressiva das artérias dos membros inferiores, afetando gradu-
almente de forma adversa a qualidade de vida destes pacientes. Muitos indivídu-
os são assintomáticos e cerca de 1/3 desenvolve claudicação intermitente (CI). Ao
longo de cinco anos apenas 5% a 10% dos casos evoluem com isquemia crítica do
membro e risco de amputação1(A). O mais importante é que a DAOP constitui-se
um importante marcador da aterosclerose sistêmica e do risco de complicações
cardiovasculares e cerebrovasculares, como o infarto agudo do miocárdio (IAM) e o
acidente vascular cerebral (AVC), em especial nos pacientes diabéticos. A aterosclerose
é a maior causa de morte e invalidez em diabéticos, especialmente do tipo 22(B).
Em estudo ainda em andamento, com pacientes claudicantes, verificou-se que
cerca de 43% dos indivíduos são diabéticos3. A prevalência de DAOP é maior em
pacientes diabéticos do que na população não-diabética. Estima-se que 20% a 30%
dos indivíduos diabéticos sejam portadores de DAOP, ainda que a prevalência real
desta associação seja difícil de ser avaliada. Esta dificuldade se deve à ausência de
sintomas, mascarados pela neuropatia periférica em boa parte dos pacientes, e aos
diferentes indicadores utilizados nas pesquisas epidemiológicas4(A).
A despeito do reconhecimento da DAOP como preditor de eventos isquêmicos,
esta expressão da aterosclerose acessível à história e ao exame físico é pouco pesqui-
sada pelos clínicos. O diagnóstico precoce da DAOP oferece uma oportunidade única
de atuação sobre os principais fatores de risco e modificação do perfil cardiovascular,
melhorando, assim, a mortalidade e a qualidade de vida destes pacientes5(C).

2. DIFERENÇAS DA DAOP ENTRE PACIENTES DIABÉTICOS E NÃO-


DIABÉTICOS

O processo aterosclerótico que atinge o paciente diabético é semelhante ao do


indivíduo não-diabético. Várias alterações no metabolismo do diabético aumentam
o risco de aterogênese. A elevação da atividade pró-aterogênica nas células musculares

35
Diretrizes SBD Doença arterial obstrutiva periférica no paciente diabético

lisas da parede vascular e da agregação para fazer o diagnóstico de DAOP8(C). pronto-atendimento, devendo ser enca-
plaquetária, além do aumento de fa- Em fases mais precoces da DAOP, o pa- minhadas para centros de referência de
tores pró-coagulantes, da viscosidade ciente costuma ser assintomático ou cirurgia vascular para revascularização
sanguínea e da produção de fibrino- apresentar CI. Em estágios mais avan- do membro. Apenas um esforço mantido
gênio, são alguns destes mecanismos. çados, o quadro clínico mais evidente e coordenado é capaz de reduzir as am-
Estas anormalidades vasculares podem pode ser o de dor em repouso ou uma putações de diabéticos nas emergências,
ser evidentes antes mesmo do diagnós- ferida que não cicatriza. que além de serem limitantes para os pa-
tico de diabetes e ainda aumentar com Ainda assim, muitos diabéticos cientes, têm sido associadas a maior risco
a duração da doença e com a piora do que se apresentam com isquemia crí- de evolução para óbito10.
controle glicêmico. Todas estas altera- tica dos membros não relatam história
ções possuem uma ação deletéria sobre vascular prévia de DAOP9(C). O quadro
a parede do vaso e sua reologia, ativan- é aberto com ulcerações, feridas infec- 3.2 - AVALIAÇÃO FUNCIONAL
do o processo aterosclerótico, desesta- tadas e gangrenas nos pés, desenca-
bilizando a placa de ateroma e precipi- deadas por trauma local ou infecções A avaliação funcional do paciente
tando eventos clínicos. fúngicas interdigitais. A macroangio- com DAOP é baseada em classificações
As artérias de diabéticos apresen- patia da DAOP é apenas um dos fa- clínicas utilizadas na prática diária para
tam mais calcificação de parede e maior tores envolvidos na síndrome do pé definir o grau de comprometimento
número de células inflamatórias6(B). diabético e, curiosamente, a isquemia do membro afetado e também a con-
As obstruções arteriais apresentam é o fator determinante da lesão trófi- duta a ser seguida. A mais conhecida é
com mais freqüência uma distribui- ca podálica em menos de 10% destas a Classificação de Fontaine, que define
ção infrapatelar, acometendo vasos urgências9(C). quatro níveis de comprometimento: I -
da perna7(B). Estes fatos, associados Infelizmente, a avaliação criteriosa assintomático; II – claudicação; III - dor
a outras diferenças na fisiopatologia do pé diabético infectado é negligen- de repouso; e IV - lesão trófica.
das lesões do pé diabético, implicam ciada com freqüência nos hospitais de A Classificação de Fontaine traduz
em pior prognóstico destes pacientes, emergência, retardando o tratamento a história natural da DAOP desde suas
com maiores taxas de morbidade e adequado e reduzindo as chances de fases iniciais até a isquemia crítica.
mortalidade associadas à DAOP. salvamento do membro destes pa- Através desta classificação, é possível
cientes. A intervenção precoce sobre definir a conduta (cirúrgica ou clínica)
pequenas lesões infectadas de origem no tratamento da DAOP. Os estágios I
3. AVALIAÇÃO DO DIABÉTICO neuropática através de medidas relati- e II são considerados para tratamento
COM DAOP vamente simples, como debridamento clínico e os estágios III e IV representam
cirúrgico, antibioticoterapia e suporte isquemia crítica e devem ser tratados,
clínico adequado, são suficientes para de preferência, através de intervenção
3.1 - APRESENTAÇÃO a resolução destas lesões e evitar am- cirúrgica (tabela 1).
putações maiores. Em pacientes diabéticos com DAOP,
Anamnese e exame físico, em geral, Um paciente capaz de caminhar sem esta avaliação pode estar prejudicada
são suficientes para o diagnóstico de queixas e que tenha pelo menos um dos pela ausência de sintomas devido à
DAOP. Dor habitual em panturrilhas, pulsos podais facilmente palpáveis torna neuropatia periférica, mascarando es-
desencadeada pela deambulação, que improvável a doença isquêmica clinica- tágios avançados da DAOP. Da mesma
alivia após poucos minutos de repouso mente significativa e permite, portanto, forma, a presença de infecção pode
e que recorre ao se percorrer novamen- uma intervenção mais simples e imedia- agravar lesões tróficas, de início pe-
te a mesma distância, é característica ta, em geral no próprio local do atendi- quenas, em pacientes com isquemia
de CI. A ausência ou redução dos pul- mento inicial. Ao contrário, lesões predo- moderada do membro e que não se-
sos arteriais periféricos, no contexto de minantemente isquêmicas necessitam riam candidatos à revascularização do
fatores de risco para doença ateroscle- abordagens mais complexas, nem sem- membro se não houvesse o compro-
rótica e na presença de CI, é suficiente pre disponíveis em hospitais gerais de metimento infeccioso associado11(C).

36
2008 Diretrizes SBD

TABELA 1 - Classificação de Fontaine: recomendações de tratamento Uma alternativa à calcificação arte-


rial é a medida da pressão sistólica do
Classificação de Fontaine Conduta hálux (PSH). As artérias digitais costu-
mam ser poupadas pela calcificação de
I - Assintomático Tratamento clínico: controle dos fatores de risco.
Monckeberg, que acomete a camada
Tratamento clínico: exercícios sob supervisão e farma- média das artérias de maior calibre15.
coterapia. A cirurgia pode ser considerada em caso Pressões menores que 40 mmHg estão
II - Claudicação de falha do tratamento clínico e/ou lesões arteriais
focais. Indicada, eventualmente, também em casos de associadas à progressão da DAOP para
claudicação incapacitante. gangrena, ulceração e necessidade de
III - Dor em repouso Isquemia crítica (risco de perda iminente do membro), amputação16(A).
IV - Lesão trófica intervenção mandatória e imediata. A pressão parcial transcutênea de
oxigênio (TcPO2) é outro método não-
invasivo de avaliação da perfusão pe-
3.3 - MEDIDAS DE PRESSÃO todos os indivíduos diabéticos com riférica em DAOP, que pode substituir
SEGMENTAR mais de 50 anos (tabela 2). o ITB no caso de artérias calcificadas,
Quanto menor o ITB, mais signifi- embora não seja utilizado com freqü-
O índice tornozelo-braço (ITB) é cativa é a obstrução arterial. Um índice ência na prática clínica. Valores meno-
um teste não-invasivo, reprodutível e menor que 0,5 é fortemente sugestivo res que 30 mmHg estão associados a
razoavelmente acurado para a identi- de sintomas. O exercício aumenta a dificuldade de cicatrização de lesões e
ficação e determinação da gravidade sensibilidade do teste e a medida do amputações4(D).
da DAOP12. ITB é a razão entre a pressão ITB pós-exercício ajuda no diagnóstico
sistólica do tornozelo (numerador) e a diferencial entre outros tipos de dores
pressão sistólica braquial (denomina- nas pernas13. 3.4 - ESTUDOS DE IMAGEM
dor). Através de um doppler portátil e O ITB tem valor limitado em artérias
um manguito de pressão, é possível calcificadas, que se tornam incompres- Os estudos de imagem não devem
realizar o teste ambulatorialmente ou síveis e determinam índices falsamen- ser utilizados como exames diagnósti-
à beira do leito. São considerados nor- te elevados (> 1,4). Ainda assim, um ITB cos, mas devem ser indicados quando
mais valores entre 0,9 e 1,3. O ITB deve aumentado também é preditivo para a revascularização é considerada uma
ser realizado em qualquer paciente o risco de eventos cardiovasculares e, provável opção terapêutica11(D). Eco-
com sintomas de DAOP. O consenso neste caso, outros testes não-invasivos doppler (ou duplex-scan) é um método
da American Diabetes Association re- devem ser considerados para definir o não-invasivo que fornece informações
comenda que o ITB seja realizado em diagnóstico de DAOP14(B). anatômicas e hemodinâmicas do vaso
estudado. Através da ecografia vascu-
lar, é possível avaliar velocidades de
fluxo, identificar e graduar estenoses,
TABELA 2 - Índice tornozelo-braço (ITB): recomendações para
realização do teste além de medir a espessura da parede
arterial e analisar a morfologia da placa
Recomendação para a realização do ITB Nível de evidência de ateroma. É um exame relativamente
barato e pode ser repetido inúmeras
Qualquer paciente diabético com sintomas sugestivos B vezes. É muito utilizado no acompa-
Qualquer paciente entre 50 e 69 anos com diabetes ou nhamento pós-operatório de diversos
outro fator de risco cardiovascular
B tipos de revascularização. Sua principal
desvantagem é o fato de ser operador
Qualquer paciente > 70 anos B dependente. A presença de grandes
placas calcificadas também pode pre-
Qualquer paciente diabético > 50 anos C
judicar a acurácia do exame.

37
Diretrizes SBD Doença arterial obstrutiva periférica no paciente diabético

A arteriografia convencional ou do miocárdio. Estudos epidemiológicos 4.1 - CONTROLE DOS FATORES DE


por subtração digital é considerada o prévios demonstraram pior sobrevida RISCO
padrão-ouro dos estudos de imagem de pacientes com DAOP quando com-
vascular. Como mencionado acima, parados com a população geral. Pacien- DAOP e diabetes estão associados
não deve ser utilizada como método tes diabéticos com DAOP apresentam a um aumento significativo no risco de
diagnóstico, mas pode ser indicada mortalidade ainda mais alta e mais pre- eventos cardiovasculares. A modifica-
pelo cirurgião quando se vislumbra a coce do que os não-diabéticos. ção agressiva destes fatores está asso-
necessidade de revascularização do Além da modificação do perfil ciada a maior sobrevida destes indiví-
membro, mesmo sem a realização de cardiovascular destes pacientes, é duos. Menos da metade dos indivíduos
nenhum outro teste não-invasivo pre- necessário intervir nos sintomas is- diabéticos portadores de DAOP ofere-
viamente. È um método que acarreta quêmicos nos membros. Apenas uma ce atenção adequada a este aspecto da
riscos inerentes à punção arterial e ao avaliação individualizada de cada pa- doença aterosclerótica, embora prova-
uso de cateteres angiográficos, além ciente é capaz de identificar o grau velmente esta seja a opção mais fácil e
da possibilidade de nefrotoxicidade de comprometimento vascular e de- mais efetiva para melhorar a qualidade
pelo contraste iodado. finir a melhor abordagem terapêuti- de vida e o prognóstico da doença.
ca. A intervenção cirúrgica está restri- Além dos fatores de risco cardiovas-
Com a evolução da angiorressonân-
ta a situações de perda iminente do culares, o próprio pé diabético deve
cia magnética e da angiotomografia
membro por isquemia crítica ou, ex- ser considerado um fator de risco. Este
(angio-TC), a arteriografia convencio-
cepcionalmente, em pacientes com “pé de risco” neuropático e isquêmico
nal vem sendo amplamente substituí-
claudicação incapacitante. Portanto, é mais suscetível ao aparecimento de
da como método de imagem vascular
a conduta na DAOP é baseada em lesões e infecções fúngicas através de
pré-operatório, em razão do caráter
dois pilares: o controle dos fatores de portas de entrada, que podem colo-
ambulatorial e menos invasivo destes
risco e o tratamento dos sintomas is- car em perigo a viabilidade de todo o
dois métodos. Outra razão é que, com
quêmicos periféricos. membro (tabela 3).
o advento da cirurgia endovascular, a
angiografia tornou-se um exame pe-
roperatório associado ao procedimen- TABELA 3 - Fatores de risco e alvo de tratamento em DAOP
to terapêutico, procurando-se, assim,
Fator de risco Alvo do tratamento Nível de evidência
evitar punções arteriais repetidas e o
incremento do risco do contraste io- DAOP sintomática LDL < 100mg/dl A
dado. Neste quesito, a RM ainda leva Dislipidemia
DAOP + história de AEO em outros territórios
vantagem sobre a angio-TC. LDL < 70mg/dl
B

Níveis pressóricos < 130/80 mmHg A


Hipertensão
4. CONDUTA NA DAOP EM Betabloqueadores não são contra-indicados A
PACIENTES DIABÉTICOS Hemoglobina A1c < 7,0 % ou o mais próximo
Diabetes
possível de 6% C
A DAOP, tanto em pacientes diabé-
ticos quanto em não-diabéticos, é um
• Tabagismo: o fumo é o fator de • Controle glicêmico: vários estu-
poderoso marcador do processo ate-
risco mais importante para o desen- dos têm demonstrado que o controle
rosclerótico sistêmico. Menos de 5%
volvimento e progressão da DAOP. A agressivo da glicemia é capaz de redu-
dos portadores de claudicação serão
quantidade e a duração do tabagismo zir a incidência de complicações mi-
submetidos à amputação do membro
se correlaciona diretamente com a pro- crovaculares, mas não aquelas relacio-
ou à cirurgia de revascularização ao fi-
nadas à DAOP. As diretrizes atuais da
nal de cinco anos. No entanto, 1/3 desta gressão da DAOP17(A). A interrupção do
ADA recomendam uma hemoglogina
mesma população apresentará aciden- fumo aumenta a sobrevida de pacien-
glicada menor que 7% como meta de
te vascular cerebral ou infarto agudo tes com DAOP18(A).

38
2008 Diretrizes SBD

tratamento do diabetes, mas sugere a redução de eventos vasculares em para isquemia crítica do membro. Ape-
níveis individualizados o mais próximos todos os pacientes com DAOP. sar da evolução benigna, a CI impõe
dos valores normais (< 6%), porém, é in- • Cuidados com o pé diabético: o cui- uma restrição real ao estilo de vida,
certo que esse controle tenha influência dado adequado do pé é fundamental na com a limitação da velocidade e da dis-
sobre a evolução da DAOP19(D). redução do risco de complicações e perda tância de marcha, atrofia e disfunção
• Hipertensão: o tratamento da hi- do membro. A neuropatia influencia for- progressiva dos membros inferiores.
pertensão reduz o risco cardiovascular, temente a apresentação clínica e a evo- O tratamento da CI se apóia na prática
embora o efeito do controle pressórico lução das lesões no pé diabético, já que a de exercícios e na farmacoterapia espe-
intensivo em pacientes com diabetes dor causada pela isquemia crônica pode cífica. Em estágios mais avançados da
e DAOP ainda não esteja definido. O ser mascarada pelas alterações neuropá- DAOP, a isquemia crítica coloca em risco
UKPDS mostrou que não há efeito so- ticas nos pés4(C). O pé neuroisquêmico é a viabilidade do membro afetado. Nes-
bre o risco de amputação. Neste grupo mais suscetível a ulcerações traumáticas, tes casos, o tratamento visa a restabele-
de alto risco cardiovascular, recomen- infecção e gangrena. Por conta destes fa- cer de imediato a perfusão distal, com
da-se o controle pressórico agressivo tores, diabéticos com DAOP e neuropatia o objetivo de controlar a dor isquêmica
(< 130/80 mmHg) em pacientes diabé- são mais propensos a lesões avançadas, de repouso, cicatrizar as lesões tróficas e
ticos e DAOP como forma de reduzir o quando comparados aos não-diabéticos. manter o membro funcional.
risco cardiovascular20(A). Além da neuropatia, a distribuição mais • Exercícios de reabilitação: a práti-
• Dislipidemia: vários estudos têm de- distal da DAOP (preferencialmente arté- ca de exercícios regulares é a principal
monstrado que a terapia antilipídica re- rias infrapatelares) favorece a evolução medida terapêutica para a CI. Já está
duz de forma significativa o número de silenciosa do quadro isquêmico crônico, bem estabelecido que estes progra-
eventos cardiovasculares em pacientes que costuma ser subestimado até que le- mas de reabilitação devem incluir ca-
sabidamente portadores de doença co- sões avançadas aconteçam6(B). A utiliza- minhadas diárias, com intervalos de
ronariana. Embora não haja estatísticas ção criteriosa e multidisciplinar de práticas repouso e distâncias progressivamen-
específicas de pacientes diabéticos com como a utilização de palmilhas e órteses te crescentes28(A). Mais importante:
DAOP, recomenda-se um alvo para LDL < especiais, calçados confortáveis e perso- devem ser realizados sob supervisão e
70 mg/dl neste grupo de alto risco21(B). nalizados, curativos apropriados, repouso, ter uma duração mínima de três meses
O consenso de ADA estabelece um LDL antibioticoterapia e debridamentos, asso- antes se obter resultados significativos.
alvo menor que 100 mg/dl22(A). ciados ou não à revascularização, tem im- A aderência ao tratamento físico tem
• Antiagregação plaquetária: uma pacto significativo na evolução das feridas como vantagem adicional estimular
meta-análise com 145 séries controla- e não deve ser negligenciada como tera- outras mudanças no estilo de vida e
das de terapia antiagregante (a maioria pêutica destas lesões multifatoriais25(B). melhorar o perfil do risco cardiovascu-
com uso de aspirina) mostrou uma re- A educação continuada de todos profis- lar do paciente29(A).
dução de 27% no número de IAM, AVE sionais de saúde envolvidos, pacientes e • Terapia medicamentosa da CI:
e mortes vasculares23(A). Outro estudo, familiares26(B) e a implementação de pro- duas drogas foram aprovadas pelo
com quase 20 mil pacientes, o CAPRIE gramas governamentais de prevenção FDA para o tratamento da CI: pento-
(Clopidogrel Versus Aspirin in Patients At do pé diabético27(B) são fundamentais na xifilina e cilostazol. Apesar de alguns
Risk os Isschemic Events), mostrou uma redução dos riscos de amputação do dia- trabalhos iniciais terem demonstrado
redução de 8,7% para a ocorrência de bético. incremento da distância de marcha
IAM, AVE ou morte vascular. Em um de claudicantes, outros mais recen-
subgrupo de 6 mil pacientes com DAOP, tes afirmam que a pentoxifilina não
sendo 1/3 de indivíduos diabéticos, a 4.2 - TRATAMENTO DOS SINTOMAS DA é mais efetiva que o placebo30(A).
redução do risco foi ainda maior com o DAOP Uma revisão recente concluiu que o
clopidogrel: 24%, quando comparados cilostazol é a melhor opção, baseada
com a aspirina24(A). Com base nestes O sintoma mais freqüente da DAOP em evidências para o tratamento da
resultados, o clopidogrel foi aprovado é a claudicação intermitente. Dificil- CI. Em pacientes diabéticos com CI,
pelo Food and Drug Administration para mente, pacientes claudicantes evoluem o cilostazol não mostrou diferenças

39
Diretrizes SBD Doença arterial obstrutiva periférica no paciente diabético

significativas nos efeitos, quando comparado a indivíduos não-diabéticos31(A). taxas de salvamento de membro em
Ciclostazol é contra-indicado em pacientes portadores de insuficiência cardíaca torno de 80% em cinco anos32(A).
congestiva, disfunção hepática ou renal graves (tabela 4). No entanto, os procedimentos en-
dovasculares são realizados com freqü-
ência cada vez maior33,34(A) e atualmen-
TABELA 4 - Principais drogas utilizadas para trata-
mento da claudicação intermitente te já representam a primeira escolha no
tratamento de obstruções em algumas
Drogas utilizadas no tratamento da claudicação regiões anatômicas. É o caso do territó-
intermitente: evidência
rio aorto-ilíaco, onde as taxas de funcio-
Evidência suficiente
Evidência insuficiente namento em médio e longo prazo são
ou provável
comparáveis às da cirurgia aberta, mas
Cilostazol Pentoxifilina
com morbimortalidade menor11(B).
Naftidrofuril Antiagregantes plaquetários O sucesso da técnica endovascular
Carnitina Vasodilatadores está mudando rapidamente o conceito
Propionil-L-carnitina L-Arginina de revascularização, cujo alvo principal
tornou-se a cicatrização das lesões trófi-
Estatinas Prostaglandinas
cas. Embora o sucesso técnico imediato
Buflomedil seja alto, o funcionamento em longo pra-
Ginkgo biloba zo com a angioplastia ainda é baixo, em
Vitamina E especial no território infra-inguinal e nas
artérias infrapatelares de pacientes diabé-
Quelação
ticos. O curioso é que, embora as reeste-
noses sejam freqüentes, o impacto sobre
• Revascularização do membro: a pre- considerada sem a necessidade do trata-
a viabilidade do membro parece peque-
sença de lesão trófica ou dor de repouso mento clínico inicial. Portanto, a presen-
no. O provável é que isso ocorra porque
caracteriza a isquemia crítica e o risco de ça de claudicação incapacitante é uma
as artérias tratadas permanecem abertas
perda iminente do membro. Nesta situa- indicação relativa de revascularização do
tempo suficiente para permitir a cicatri-
ção, a revascularização está indicada para membro com DAOP, requer bom senso e
zação das lesões tróficas do pé isquêmico
salvamento do membro isquêmico e a esclarecimento ao paciente e seus fami-
temporariamente revascularizado9(C).
intervenção, seja ela por cirurgia aberta liares quanto aos riscos inerentes ao pro-
Os dois tipos de procedimentos
(convencional) ou por via endovascular, cedimento indicado e seus resultados ao
não são excludentes entre si e podem
não deve ser postergada. longo do tempo.
de fato ser associados para atingir me-
A claudicação incapacitante é carac- A revascularização através da ci- lhores resultados na revascularização
terizada pela forte interferência no estilo rurgia de bypass oferece excelentes do membro afetado. A escolha entre as
de vida de alguns pacientes, limitando resultados no tratamento da DAOP duas técnicas é uma decisão complexa,
atividades laborativas ou, em especial, as com isquemia crítica e não há dife- que deve ser baseada caso a caso, levan-
relacionadas ao lazer. Nestes casos, a re- renças nas taxas de funcionamento do-se em conta o benefício esperado e
vascularização do membro deve ser con- do enxerto entre diabéticos e não- o risco associado a cada procedimento.
siderada quando ocorre falha no manejo diabéticos7(A). O bypass com veia Vários fatores podem impossibilitar
clínico, geralmente após um período mí- safena tem sido o procedimento de a revascularização do membro: falta de
nimo de três a seis meses de tratamento. escolha para pacientes com diabetes condições clínicas do paciente por sépsis
Por outro lado, em pacientes que apre- e doença arterial infrapatelar, pois é o e/ou outras comorbidades, membro dis-
sentem obstruções focais localizadas método mais previsível e durável de funcional por anquiloses ou destruição
em segmentos arteriais proximais, onde revascularização do membro11(B). A avançada do pé pela gangrena, ausência
se antecipa baixo risco e bons resulta- revascularização por cirurgia aberta de veia adequada para o procedimento e
dos em longo prazo, a cirurgia pode ser apresenta excelentes resultados, com doença arterial difusa sem possibilidade

40
2008 Diretrizes SBD

de revascularização. Estas são algumas situações em que a revascularização não é possível. Nestes casos, a amputação do membro
pode ser a única opção de intervenção, em especial quando se antevê uma evolução arrastada de curativos e antibioticoterapia
prolongada com poucas chances de cicatrização e de melhora efetiva da qualidade de vida destes pacientes5(C).

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41
Diretrizes SBD 2008

Diabetes mellitus pós-transplante

1. INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, o diabetes mellitus tem se tornado um sério e crescente


problema de saúde pública nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, de-
vido ao aumento de sua prevalência, morbidade e mortalidade. Estimativas recen-
tes da Organização Mundial da Saúde (OMS) projetam um aumento significativo
do número de indivíduos com diabetes até o ano de 2030. Nessa data, espera-se
um universo de cerca de 366 milhões de indivíduos diabéticos1. Aproximadamente
90% desses indivíduos apresentarão diabetes mellitus do tipo 2 (DM2), estarão na
faixa etária de 45 a 64 anos e viverão em países em desenvolvimento, onde se sabe
que as condições de acesso a centros de assistência especializados nem sempre
são satisfatórias1.
O diabetes pós-transplante (DMPT) é uma complicação que ocorre após o
transplante de um órgão sólido, sendo considerado também como um tipo secun-
dário de diabetes mellitus2.Os primeiros casos foram descritos em 1964, após um
transplante de fígado, por Thomas Starzl2. As últimas estimativas sobre sua inci-
dência reportam uma grande variabilidade, de 2% a 53%, sendo de 4% a 25% após
transplante renal e de 2,5% a 25% após transplante de fígado2.
A variabilidade na incidência do diabetes pós-transplante estaria relacionada a
dificuldade em definir, diagnosticar e identificar os possíveis fatores de risco asso-
ciados a esta entidade3. Em relação ao diabetes pós-transplante renal, estimando-
se que o número de pacientes com doença renal crônica em tratamento dialítico
no mundo já atinge 1,5 milhão de indivíduos, podemos inferir que o número de
casos de diabetes pós-transplante renal terá um aumento significativo nas próxi-
mas décadas4. Esta mesma hipótese também pode ser estendida aos demais trans-
plantes de órgãos sólidos.
Considerando-se que o desenvolvimento de diabetes pós-transplante é as-
sociado com maior risco de complicações, como infecção e doença cardiovas-
cular, e, portanto, apresenta maior risco de morte e maior custo para o Sistema
de Saúde, a identificação de seus fatores de risco e o seu diagnóstico precoce,
com intervenções terapêuticas adequadas, será de relevante importância no
seguimento do paciente, com repercussão no sucesso do procedimento no
que se refere à sobrevida do paciente e do enxerto3,5-10. Esta revisão propõe-se

42
2008 Diretrizes SBD

a discutir e estabelecer algumas condutas que facilitem a abordagem destes dos pacientes em uso de tacrolimus e
pacientes na prática clínica diária. ciclosporina, observou-se que o pico
de incidência de IGT e/ou diabetes era
aos 60 dias após o transplante, mas
2. IDENTIFICAÇÃO DOS FATORES DE RISCO que com seis e 12 meses a incidência
de DMPT renal ainda estava aumen-
Já foram identificados alguns fatores que aumentam o risco do desenvolvi- tada no grupo que usava tacrolimus
mento de diabetes pós-transplante. De maneira didática, estes fatores poderiam em comparação ao grupo que usava
ser classificados em não-modificáveis, potencialmente modificáveis e modificá- ciclosporina14. Persiste em discussão
veis (tabela 1). na literatura a dose ideal de corticóide
que não resulte em aumento significa-
TABELA 1 - Fatores de risco para o desenvolvimento de diabetes tivo de DMPT. Em estudo conduzido
pós-transplante em nosso meio, a dose de prednisona
Potencialmente > 1,3 mg/kg/dia foi associada a um ris-
Não-modificáveis Modificáveis
modificáveis co maior de DMPT renal. O uso de do-
• Raça: não-brancos • Infecções: • Terapia imunossupressora: ses baixas de 5 mg/dia de prednisona
• Idade: > 40 anos - HCV, CMV - Tacrolimos parece ser o mais indicado3.
• Gênero do receptor (M) - IGT (pré-TX) - Ciclosporina Em relação à presença de obesidade
• Gênero do doador (M) - Corticosteróides e outros componentes da SM, o mais
• História familiar de DM - Sirolimus apropriado seria a instituição precoce,
• HLA • Obesidade no pré-transplante, da mudança do esti-
• HLA (mismatches) • Componentes da SM lo de vida (dieta e exercício) adequado às
• Doador falecido
condições clínicas do paciente e do con-
• História de rejeição aguda
trole dos outros fatores de risco, como
IGT: intolerância à glicose; pré-TX: pré-transplante; SM: síndrome metabólica; HCV: hepatite por vírus C; hipertensão arterial e dislipidemia5.
CMV: citomegalovírus

Em relação aos fatores de risco, Os fatores de risco modificáveis in- 3. DIAGNÓSTICO DE


consideramos apenas os potencial- cluem o uso de corticosteróides, o que INTOLERÂNCIA À GLICOSE E
mente modificáveis e os modificáveis. resulta em aumento da resistência à in- DIABETES
No grupo dos potencialmente modi- sulina periférica e hepática e dos inibido-
ficáveis, têm-se enfatizado as viroses, res de calcineurina (ciclosporina e tacroli- De acordo com o último Consenso
como citomegalovírus (assintomáti- mus), que levam à diminuição da síntese Internacional em DMPT, todo o pacien-
cos e sintomáticos), que podem alte- e da secreção insulínica por efeito tóxico te que esteja em fase de pré-transplan-
rar a secreção de insulina6, e o vírus direto sobre a célula-beta13-18. Apesar das te deve ser avaliado quanto à presença
da hepatite C (HCV), que é mais as- diferenças em doses utilizadas e critérios de intolerância à glicose e diabetes.
sociado à resistência insulínica, mas de definição de DMPT, o uso de tacroli- Uma anamnese e uma história clínica
com possíveis efeitos citopáticos nas mus é, em geral, associado a um maior do paciente também serão de relevan-
células-beta11,12. O tratamento no pré- risco (30%) para o desenvolvimento de te importância para a identificação dos
transplante de pacientes com HCV DMPT, comparado ao uso de ciclospori- fatores de risco e das comorbidades.
com interferon diminuiu de maneira na (com risco de 18%)19-21, principalmen- Os critérios utilizados para o diagnós-
significativa a incidência de diabetes te em pacientes com HCV20. tico de intolerância à glicose e diabetes
pós-transpalante2. A presença de IGT Alguns estudos recomendam que a pós-transplante seguem os critérios esta-
no pré-transplante já é uma condição concentração plasmática de tacrolimus belecidos pela American Diabetes Associa-
em que é imposto o tratamento com no pós-transplante imediato não ultra- tion (ADA)23 e pela Sociedade Brasileira de
mudança do estilo de vida5,6. passe 15 ng/mL2. No acompanhamento Diabetes (SBD)24 e estão abaixo descritos.

43
Diretrizes SBD Diabetes mellitus pós-transplante

3.1 - DIABETES escolha da terapia medicamentosa,


podemos utilizar os medicamentos
• Sintomas de diabetes com glicemia plasmática randômica ≥ 200 mg/dl; ou orais, mas, em geral, no paciente in-
ternado ou logo após o transplante,
• Glicemia de jejum (FPG) no mínimo de oito horas ≥ 126 mg/dl. a insulinoterapia, pela sua pratici-
dade e rapidez de ação, é a droga
de escolha. Entretanto, no pacien-
3.2 - INTOLERÂNCIA DE JEJUM (GJA) te ambulatorial, sem clínica de DM
descompensado, há espaço para o
• FPG ≥ 110 mg/dl (6,1 mM) e < 126 mg/dl. uso de medicamentos orais, desde
que sua A1c seja < 9%. Em relação
à terapia com agentes orais, alguns
3.3 - TOLERÂNCIA À GLICOSE DIMINUÍDA (TGD)
cuidados devem ser observados
(tabela 3):
• Glicemia plasmática duas horas após sobrecarga ≥ 140 mg/dl e < 200 mg/dl. O
• Uso de metformina: avaliar a
diagnóstico de qualquer intolerância à glicose deverá ser confirmado em teste
função renal pelo risco de acidose
realizado em dia subseqüente.
lática;
• Sulfoniluréias: as drogas me-
TABELA 2 - Critérios de diagnóstico de intolerância à glicose e tabolizadas e excretadas pelo rim
diabetes pós-transplante podem causar hipoglicemias, em es-
Glicemia duas horas após 75 gramas de pecial nos idosos. As glinidas apre-
Glicemia jejum (mg/dl)
glicose (mg/dl) sentam mais segurança, mas são
DMPT ≥ 126 ≥ 200 menos eficazes;
• Glitazonas: por atuarem na re-
GJA ≥ 100 e < 126
sistência insulínica, teriam indica-
TGD ≥ 140 e < 200 ção nestes pacientes. Entretanto,
GJA: glicemia de jejum alterada; TGD: tolerância à glicose diminuída. seus efeitos colaterais devem ser
avaliados (ganho de peso, edema,
anemia, edema pulmonar e insufici-
4. CONDUTA CLÍNICA COM O cardiovascular);
ência cardíaca), bem como a demo-
PACIENTE COM DMPT • HDL-colesterol: > 50 mg/dl (sexo
feminino) e > 40 mg/dl (sexo mas- ra para o início de ação. O risco au-
culino); mentado de fratura, principalmente
A conduta clínica do paciente com
• Triglicerídeos: < 200 mg/dl; nestes pacientes que fazem uso
DMPT segue em geral a preconizada
• Pressão arterial sistólica: < 130 mmHg crônico de corticosteróide, deve ser
para o paciente com diabetes tipo 2,
e diastólica < 80 mmHg; considerado;
conforme estabelecido pela ADA, SBD
• Controle do peso corporal. • Análogos do GLP-1 e inibidores
e por consensos23-27.
do DPP-IV: ainda não há experiência
com o uso destas drogas no DMPT.
4.1 - CONTROLE GLICÊMICO E DOS 4.2 - ABORDAGEM TERAPÊUTICA Ambas as incretinas GLP-1 e GIP têm
FATORES DE RISCO eliminação renal;
Se a dieta e exercício não foram • Individualização da imunossu-
• Alvo glicêmico: HbA1c < 6,5%; suficientes para atingir o alvo glicê- pressão: avaliar a substituição do ta-
• LDL-colesterol: < 100 mg/dl (< 70 em mico e dos lípides, deve-se iniciar crolimus por ciclosporina e o uso de
pacientes com alto risco para doença o tratamento medicamentoso. Na doses baixas de corticosteróide.

44
2008 Diretrizes SBD

TABELA 3 - Antidiabéticos orais em DMPT

Droga IRC Em diálise Complicações

Sulfoniluréias Clorpropamida Evitar Evitar Hipoglicemia

Glibenclamida Evitar Evitar Hipoglicemia

Glimepirida Dose baixa: 1 mg/dia Evitar Hipoglicemia

Glicazida Sem ajuste

Glipizida Sem ajuste Sem ajuste

Glinidas Repaglinida Sem ajuste Cautela ou evitar Raramente hipoglicemia

Nateglinida Evitar Evitar Raramente hipoglicemia

Inibidores alfa glicosidase Acarbose Creat > 2 mg/dl: evitar Evitar Hepatotoxicidade

Biguanidas Metformina ClCreat < 30 ml/minuto: evitar Evitar Acidose láctica

Glitazonas Rosi/Pio Sem ajuste Sem ajuste Retenção hídrica e ICC

Análogos Incretinas Exenatide Sem ajuste Evitar Náuseas e vômitos

iDPP4 ClearCreat:

Sitagliptina < 50: diminuir 25% Diminuir 50% Hipoglicemia

< 30: diminuir 50%

Vildagliptina Poucos dados Poucos dados

Em relação à dislipidemia, considera-se que o tratamento com estatina deve ser instituído caso o alvo do LDL colesterol
não seja alcançado. As estatinas mais utilizadas são a pravastatina e a atorvastatina. Em casos selecionados, a associação de
estatina com fibratos poderá ser utilizada, mas deve-se levar em conta o risco aumentado de rabdomiólise (figura 1).

FIGURA 1 - Agentes hipolipêmicos em DMPT

LDL

<100 mg/dl 100-129 mg/dl >130 mg/dl

Não iniciar droga Mudança de hábito de vida

Aguardar 03 meses

LDL>100

Mudança de hábito de vida e droga oral

TG < 200 mg/dl TG 200-500 mg/dl TG 500 mg/dl

Pravastina ou Atorvastina Atorvastina Fenofibrato

45
Diretrizes SBD Diabetes mellitus pós-transplante

O tratamento da pressão arterial deve ser agressivo, monitorando a função


renal As interações medicamentosas devem ser cuidadosamente avaliadas. As
drogas metabolizadas pelo citocromo P-450 isoenzima CYP 3 A4 devem ser mo-
nitoradas. Os indutores (rifampicina, carbamazepina e fenitoína) e os inibidores
(ciclosporina e gemfibrozil) deste sistema podem modificar a cinética de alguns
agentes orais, como a repaglinida, aumentando sua meia-vida e resultando em
hipoglicemia.

5. ACOMPANHAMENTO DO PACIENTE COM DMPT

Recomenda-se a determinação de HbA1c a cada três meses, perfil lipí-


dico duas a três vezes por ano, triagem para microalbuminúria, avaliação
oftalmológica anual

TABELA 4 - Critérios de diagnóstico de intolerância à glicose e


diabetes pós-transplante

Orientações dietéticas: encaminhar para nutricionista, com ênfase em dieta com


pouca gordura saturada e colesterol, rica em fibras.

Mudanças no estilo de vida: reduzir o peso ou evitar ganho excessivo de peso. Parar
hábito do fumo, se presente.

Ajuste dos imunossupressores: redução da dose do corticóide para o mínimo necessário. A


troca de tacrolimus (FK 506) por ciclosporina nos casos de hiperglicemia pode ser tentada,
apesar das dúvidas sobre o procedimento na literatura.

• Hiperglicemia aguda: insulinoterapia;

• Hiperglicemia crônica: alvo de A1c < 6,5%. Tratar de acordo com as características e
contra-indicações do paciente com os medicamentos orais e/ou insulinoterapia.

• A1c a cada três meses;

• Triagem para microalbuminúria anual;

• Fundo de olho anual;

• Exame regular dos pés;

• Perfil lipídico anual;

• Tratamento agressivo da dislipidemia e hipertensão.

6. CONCLUSÕES

Os pacientes com DMPT l apresentam maior risco de doença cardiovascular


e de infecções que a população em geral, o que pode comprometer a sobrevida
e a duração do enxerto6,7. O DMPT é considerado hoje como uma importante
causa de morbidade e mortalidade em pacientes transplantados. A identificação
precoce desta condição, com tratamento agressivo do diabetes e de suas comor-
bidades, será um fator determinante na sua evolução.

46
2008 Diretrizes SBD

TABELA 5 - Resumo e graus de evidência

Recomendação para a realização do ITB Nível de evidência

O TOTG deve ser considerado em pacientes transplantados e com glicemia de jejum alterada (GJA) para refinar
o diagnóstico de DMPT. B
O alvo de HbA1c < 7%, por reduzir complicações microvasculares e neuropáticas em diabéticos, deverá ser
obtido. A
Portadores de diabetes devem ser instruídos a realizar ao menos 150 minutos de exercícios por semana se
não houver contra-indicação. A
Pacientes com diabetes devem ter como alvo pressão sistólica < 130 mmHg (C) e diastólica < 80 mmHg (B). C/B
Em pacientes com DCV e diabetes, o alvo de LDL deverá ser < 70 mg/dl. E
A combinação de estatina e fibratos ou outras drogas hipolipemiantes pode ser considerada, mas não tem
sido avaliada em estudos de segurança e desfecho cardiovascular. -

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48
2008 Diretrizes SBD

Manifestações
reumatológicas do diabetes
1. INTRODUÇÃO

Inúmeras associações entre diabetes mellitus (DM) e patologias musculo-


esqueléticas foram descritas. Algumas são associações indiretas, com fatores
associados tanto ao DM como à patologia reumática, como a obesidade e a dislipide-
mia, que também estão associados à gota e à osteoartrose. Outras patologias reumáti-
cas são secundárias a complicações neurológicas e vasculares do DM, como a artropa-
tia de Charcot e a osteólise. Muitas ocorrem por motivos ainda pouco claros, às vezes
precedendo o aparecimento do DM, como a contratura de Dupuytren, ou ocorrendo
também em maior freqüência em familiares não-diabéticos, como a espondilo-
hiperostose difusa. Na tabela 1, estão listadas as associações mais importantes entre
DM e patologias reumatológicas, que serão comentadas no texto a seguir.

TABELA 1 - Associações mais importantes entre


DM e patologias reumatológicas

Manifestação (sinonímia)

• Queiroartropatia diabética (síndrome das mãos rígidas ou da mobilidade articular limitada)


• Contratura de Dupuytren
• Dedo em gatilho
• Síndrome do túnel do carpo
• Síndrome da dor complexa regional tipo I (algoneurodistrofia, algodistrofria, distrofia neu-
rológica simpática reflexa, atrofia de Sudeck)
• Ombro congelado (capsulite adesiva do ombro)
• Espondilo-hiperostose difusa idiopática (DISH), doença de Forrestier, hiperostose anquilosante
• Piomiosite
• Artrite séptica
• Amiotrofia
• Infarto muscular
• Artropatia de Charcot (neuroartropatia)
• Osteólise (osteodistrofia reabsortiva, osteodistrofia diabética)

49
Diretrizes SBD Manifestações reumatológicas do diabetes

2. QUEIROARTROPATIA a sua gravidade, deixando eviden- do tendão dentro de uma polia, prejudi-
DIABÉTICA te o grau de limitação de extensão cando a sua extensão ativa. A extensão
das mãos: o sinal da prece, em que o do dedo ocorre de maneira abrupta (ga-
A queiroartropatia diabética carac- paciente tenta juntar as palmas das tilho) ao se fazer o movimento passiva-
teriza-se por deformidade em flexão mãos com os dedos estendidos, e o mente com o auxílio do polegar con-
dos dedos das mãos, com espessa- teste da tampa da mesa, em que o tralateral.
mento da pele, do tecido conjuntivo paciente tenta estender a mão espal- Os pacientes referem desconforto
periarticular e da fáscia palmar, resul- mada contra o tampo de uma mesa. palmar durante os movimentos dos
tando em limitação da extensão das Juntamente com a queiroartropatia, dedos envolvidos, com estalo doloro-
articulações metacarpofalangeanas as outras alterações das mãos que so de instalação gradual ou aguda ao
e interfalangeanas. Em casos mais discutiremos a seguir permitem intro- flexionar ou estender os dedos, que
graves, acomete também outras ar- duzir um conceito global genérico de podem estar em posição fixa, geral-
ticulações. Quando a pele mostra-se “mão diabética”8. mente em flexão10(D).
brilhante, espessada e enrijecida, ca- A infiltração com corticosterói-
racteriza-se a esclerodactilia diabética de junto à bainha do tendão sinto-
ou lesão escleroderma-símile, que às 3. CONTRATURA DE mático, com freqüência, é curativa9.
vezes antecede a limitação da mobili- DUPUYTREN Administração de antiinflamatórios
dade articular (LMA)1. não-hormonais e uso de órteses são
Embora possa ocorrer precoce- Caracteriza-se por proliferação da indicados em pacientes que recusam
mente no curso da doença2(D), é mais fáscia palmar, com sua aderência à pele a infiltração10(D). Cirurgia para libera-
comum em portadores de DM1 com e aos tendões flexores, principalmen- ção do tendão pode ser necessária em
controle inadequado e longa evolu- te do quarto e quinto quirodáctilos. casos refratários.
ção. Segundo alguns autores, seu apa- Sua prevalência aumenta com a idade
recimento deve ser visto como um si- e, em diabéticos, é 50% maior que na
nal de alarme, apontando para maior população geral. O diagnóstico é clíni- 5. SÍNDROME DO TÚNEL DO
risco de desenvolver microangiopatia co, baseado no espessamento das pal- CARPO
e microalbuminúria3. mas, rigidez não dolorosa dos dedos e
Tem como causa a glicação de co- enrugamento palmar. Formam-se nó- A compressão do nervo mediano
lágeno, que altera suas características dulos, que acompanham o trajeto dos junto à face volar do punho provoca
funcionais e estruturais. Recentemen- tendões flexores e a doença evolui distúrbios sensitivos na face flexora
te, Cray et al. encontraram relação com deformidade na flexão do dedo do primeiro, segundo e terceiro qui-
entre a espessura da fáscia plantar, in- cujo tendão flexor foi acometido. O rodáctilos (território de inervação
terpretada como uma medida de glica- tratamento consiste em aperfeiçoar do mediano). É a neuropatia com-
ção tecidual com o desenvolvimento o controle glicêmico, fisioterapia e pressiva mais comum, ocorrendo
de complicações microvasculares em exercícios de extensão. O tratamento em até 30% dos portadores de DM e
adolescentes com DM14. A prevalên- cirúrgico está indicado quando a in- neuropatia11.
cia da queiroartropatia diminuiu, em capacidade funcional é importante e Parestesia no território do nervo
DM1, nos últimos 20 a 30 anos, pro- tem bons resultados iniciais, mas ele- mediano costuma ocorrer ao se apli-
vavelmente como conseqüência da vada taxa de recorrência9(D). car as duas principais manobras pro-
intensificação do controle glicêmico pedêuticas que sugerem esta síndro-
que ocorreu nestas décadas5,7(B,D)6. me: o teste de Phalen (flexão palmar
A queiroartropatia, em geral, é in- 4. TENOSSINOVITE DE FLEXOR dos punhos em 90 graus durante um
dolor, mas as contraturas dificultam OU DEDO EM GATILHO minuto) e o teste de Tinel (percussão
a execução de movimentos finos das do túnel do carpo). A sensibilidade
mãos. Duas manobras propedêuticas A tenossinovite estenosante do flexor destes testes é bastante baixa e a
de fácil execução permitem avaliar de um dedo resulta do aprisionamento avaliação por testes quantitativos de

50
2008 Diretrizes SBD

sensibilidade acrescenta muito pou- autonômicas no membro acometido, Além disso, 20% a 30% dos pacientes
co para o diagnóstico. A avaliação da com alteração de temperatura e de co- não-diabéticos com CA apresentam
velocidade de condução nervosa não loração, além de edema, hiper-hidrose intolerância à glicose17-19. A presen-
deve ser feita de rotina, mas está in- e aumento da pilificação, podendo ha- ça de CA está associada com idade e
dicada para pessoas com quadro clíni- ver também diminuição da função do duração da doença, principalmente
co mais grave e que não respondem membro. É também conhecida como em DM1, o que explica a maior parte
ao tratamento conservador ou que distrofia simpático-reflexa ou algo- das associações com outras compli-
têm disfunção motora, sendo usada neurodistrofia. cações crônicas do diabetes. Não há,
para o diagnóstico e localização da Acredita-se que DM, hipertireoi- no entanto, uma clara relação com o
compressão12(D). dismo, hiperparatireoidismo e disli- grau do controle glicêmico. Pacientes
Seu quadro clínico é variável, mas pidemia tipo IV possam predispor a diabéticos com CA têm níveis de co-
em geral o sintoma principal é dor ou seu aparecimento. É com freqüência lesterol e triglicérides mais elevados
parestesias do polegar até a metade subdiagnosticada. Seu diagnóstico e alguns estudos mostram associação
do quarto dedo, intensas à noite. Em precoce é importante, pois o início com infarto agudo do miocárdio17,19,20.
casos mais avançados, pode haver precoce do tratamento fisioterápico A alteração patológica básica é um
comprometimento motor, com hipo- permite uma evolução melhor9(D). O espessamento da cápsula articular,
trofia muscular da região tenar, di- objetivo do tratamento é restaurar a que adere à cabeça do úmero, resul-
minuição da força e dificuldade para função da extremidade acometida e tando em redução acentuada do vo-
execução de movimentos finos de a prevenção ou minimização das al- lume da articulação glenoumeral21.
preensão13. terações tróficas do sistema músculo- A principal queixa é de dor crônica e
O tratamento compreende anal- esquelético. O alívio da dor pode ser rigidez progressiva. Ocorre perda da
gesia, órteses para imobilização e obtido com o uso de antidepressivos amplitude de movimento da articula-
aplicações locais de corticosteróides tricíclicos e anticonvulsivantes, como ção, levando à disfunção, dificuldade
em casos mais leves. O uso de cor- a carbamazepina, a gabapentina e de rotação externa e abdução do om-
ticóides orais por curto período de a lamotrigina. Em casos refratários, bro acometido. Pessoas com diabetes
tempo é eficaz, mas seu uso em por- pode-se tentar o uso de corticosterói- têm quadros em geral menos doloro-
tadores de diabetes não foi apropria- des e neurolépticos ou a realização de sos, porém, com maior duração e pior
damente estudado. A cirurgia para a bloqueio neuronal16(D). resposta ao tratamento22.
descompressão, em casos refratários, Ao exame físico, deve-se testar a
é mais eficaz para a diminuição dos mobilidade do ombro, através do teste
sintomas14,15(A,A)9. 7. CAPSULITE ADESIVA DO de Apley, que consiste em três mano-
OMBRO bras: para testar a adução, pede-se ao
paciente cruzar a face anterior do tórax
6. SÍNDROME DA DOR A capsulite adesiva (CA), também com o braço, até tocar o ombro oposto;
COMPLEXA REGIONAL TIPO 1 conhecida como “ombro congelado” para testar a rotação externa e abdução,
ou “bursite obliterativa”, caracteriza- pede-se ao paciente para levar o braço
Caracteriza-se por dor intensa, limi- se por dor e limitação importante dos por trás da cabeça e tocar a ponta me-
tação e alterações autonômicas, com movimentos ativos e passivos do om- dial superior da escápula contralateral
edema, hiperemia e sudorese em geral bro para todos os planos. Pode ocor- (o paciente com função normal alcan-
acometendo uma das mãos. Ocorre rer simultaneamente à síndrome da ça em média o nível de T4); para testar
habitualmente após lesão nervosa, dor complexa regional tipo 1, caracte- a rotação interna e adução, pede-se ao
trauma, cirurgia ou imobilização. A dor rizando a síndrome ombro-mão. paciente para levar o braço pelas costas
tem padrão neuropático, com sensa- Sua prevalência é três a cinco vezes até tocar a ponta inferior da escápula
ção de queimação, hiperalgesia, alodí- maior em DM que na população geral, contra-lateral (o paciente com função
nea e disestesias. Além da dor, costu- sendo, nos primeiros, freqüentemente normal alcança em média o nível de
mam ocorrer alterações vasomotoras e bilateral e em idades mais precoces. T8). Deve-se testar também a abdução

51
Diretrizes SBD Manifestações reumatológicas do diabetes

e a rotação externa passivamente. O (sindesmófitos), que diferentemente predispõe tanto à artrite séptica quanto
normal é rodar e abduzir no mínimo 90 da osteoartrose primária, não provo- à piomiosite29,30(A,A)
graus23(D). O diagnóstico é eminente- ca degeneração significativa do disco
mente clínico, sendo os exames de ima- intervertebral. Pode ocorrer também
gem reservados para casos com dúvida ossificação de ligamentos e tendões 10. OUTRAS MANIFESTAÇÕES
diagnóstica. A radiografia simples é o em outros locais, como crânio, pelve,
exame inicial indicado para exclusão de calcanhares e cotovelos27. O acome- A artropatia de Charcot e a oste-
outras causas em casos de dor crônica timento é sistêmico, não explicado odistrofia não serão discutidas neste
nos ombros23(D). apenas por reação a fatores mecâni- capítulo por serem associadas à neu-
Na maioria dos casos, a CA evolui cos locais. ropatia periférica e ao pé diabético.
de maneira espontânea, com recupe- Sua prevalência é três vezes Porém, deve ser lembrado que Char-
ração completa de seis a 18 meses. maior em DM e, entre os pacientes cot pode acometer também outras
O tratamento pode ser necessário na com hiperostose difusa, 12% a 80% articulações. Da mesma maneira, a
fase aguda dolorosa, constituindo-se têm DM ou intolerância à glicose. amiotrofia, que em geral acomete ho-
essencialmente de analgesia e exercí- Postula-se que níveis de insulina e mens idosos com DM2 com perda de
cios específicos de alongamento24(D). IGF mantidos prolongadamente al- força muscular e atrofia de musculatu-
Podem ser usados antiinflamatórios tos nos pacientes diabéticos estimu- ra proximal, principalmente dos mem-
hormonais ou não hormonais, em- lam a formação óssea28. bros inferiores, deve ser lembrada
bora se deve levar em conta o risco Na maioria dos casos, ocorre re- como uma forma de neuropatia. Por
do uso de tais drogas em pacientes dução progressiva assintomática da fim, infarto muscular pode ocorrer por
diabéticos25(A). mobilidade da coluna e o diagnósti- arteriopatia diabética.
Em casos de sintomas persistentes co muitas vezes é incidental ao reali-
por mais de seis a oito semanas, po- zar raios-X de coluna ou de tórax por
dem ser feitas injeções intra-articulares outro motivo. Queixas associadas po-
de corticosteróides ou ainda dilatação dem incluir dor e rigidez matinal leve.
da articulação por injeção de solução Não existe tratamento específico. Re-
salina e corticosteróide intra-articular. comenda-se controle glicêmico e fi-
Esta última abordagem parece ofere- sioterapia.
cer os melhores resultados26(A). Após
a fase dolorosa, o tratamento consis-
te em exercícios e fisioterapia. Casos 9. PIOMIOSITE E ARTRITE
refratários podem ser encaminhados SÉPTICA
para tratamento cirúrgico.
Consistem, respectivamente, em in-
fecção bacteriana muscular ou articular,
8. ESPONDILO-HIPEROSTOSE em geral causada por Staphylococcus
IDIOPÁTICA DIFUSA aureus. A artrite séptica é, na maioria
dos casos, monoarticular e ocorre prin-
A espondilo-hiperostose difusa cipalmente em grandes articulações pe-
idiopática (DISH), também conhecida riféricas. O diagnóstico é confirmado por
como hiperostose anquilosante ou coloração de Gram ou cultura do liquido
doença de Forrestier, caracteriza-se sinovial. O tratamento específico é anti-
por limitação progressiva da coluna bioticoterapia. É importante o diagnósti-
vertebral, com calcificação dos liga- co precoce para que não ocorra destrui-
mentos intervertebrais, formando ção articular grave. O diabetes mellitus
pontes ósseas entre as vértebras é considerado um fator de risco, que

52
2008 Diretrizes SBD

TABELA 2 - Recomendações

Conclusão Nível de recomendação

A pesquisa de limitação da mobilidade articular deve ser feita nos pacientes diabéticos, especialmente nos
do tipo 1, com longa evolução e controle glicêmico insatisfatório. B
A limitação da mobilidade das mãos é pesquisada pelo sinal da prece e pela alteração ao encostar a palma
da mão em uma mesa. No tornozelo, a limitação da mobilidade é pesquisada com o goniômetro. D
Não existe tratamento específico para a limitação da mobilidade articular. Há algumas evidências de que
a melhora do controle glicêmico melhore a evolução. Fisioterapia e exercícios de alongamento podem D
melhorar o quadro.

Contratura de Dupuytren é mais comum em diabéticos. O tratamento consiste em melhorar o controle


glicêmico, fisioterapia e, eventualmente, tratamento cirúrgico. D
O diagnóstico de síndrome de túnel do carpo deve ser feito pela combinação de sintomas e sinais clínicos
sugestivos. O diagnóstico é mais provável se houver positividade no teste de Phalen ou também na pesquisa
do sinal de Tinel. Tais testes não são confiáveis em casos mais graves. Estudo de condução nervosa deve ser
D
reservado a casos duvidosos, especialmente se estiver sendo considerada descompressão cirúrgica

O tratamento da síndrome do túnel do carpo é essencialmente conservador, incluindo splinting do pulso,


fisioterapia, terapia ocupacional e injeção local de corticosteróides. Não se recomenda o uso de antiinflama- A
tórios não-hormonais para tratamento da síndrome do túnel do carpo.

O tratamento cirúrgico traz resultados melhores do que o clínico em pacientes com quadros mais graves
de síndrome do túnel do carpo. A
Considerar como hipótese diagnóstica a tenossinovite de flexor ou dedo em gatilho no caso de um paciente
com diabetes mellitus que tenha um ou mais nódulos palpáveis e espessamentos próximos ao tendão ou
bainha dos flexores, que possam levar a limitação de movimento e desconforto ou dor palmar durante D
movimentos.

O tratamento da tenossinovite de flexor ou dedo em gatilho consiste, de início, na injeção de corticos-


teróide no tendão flexor sintomático, freqüentemente curativo. No caso de pacientes que não querem D
tratamento invasivo, tentar antiinflamatórios não-hormonais ou bandagens.

Pensar em síndrome da dor complexa regional tipo I (antiga distrofia simpático-reflexa) em casos de dor
neuropática associada a alterações vasomotoras e/ou autonômicas em paciente com diabetes mellitus. D
Considerar para o tratamento da síndrome da dor complexa regional: fisioterapia e terapia medica-
mentosa para controle de dor crônica (antidepressivos tricíclicos, anticonvulsivantes, corticosteróides D
orais, neurolépticos ou bloqueio neuronal).

Pacientes diabéticos com queixa de dor ou limitação do movimento dos ombros devem ser pesquisados
pelo teste de Apley e da mobilidade passiva para diagnóstico de capsulite adesiva do ombro. D
Embora o diagnóstico de capsulite seja clínico, a radiografia deve ser considerada no diagnóstico diferencial
de dor no ombro para a exclusão de outras causas. D
O uso de antiinflamatórios não-hormonais e corticosteróides orais oferecem melhora sintomática na fase
aguda dolorosa. Deve ser avaliada a relação risco-benefício do uso de tais drogas no paciente diabético. A
Pacientes com sintomas persistentes podem ser tratados com dilatação articular por injeção intra-articular
de corticosteróides e solução salina. A
Após a fase dolorosa, o tratamento da capsulite adesiva do ombro consiste em exercícios e fisioterapia. D
Considerar sempre a artrite séptica e a piomiosite como diagnóstico diferencial de artrites (especialmente
monoartrites) e de miosites, respectivamente, no paciente diabético. A

53
Diretrizes SBD Manifestações reumatológicas do diabetes

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54
2008 Diretrizes SBD

Diabetes e doença periodontal

1. INTRODUÇÃO

Uma possível associação entre o diabetes mellitus (DM) e doenças periodontais


tem sido considerada em todo o mundo. Estas últimas compreendem um grupo
de condições crônicas inflamatórias induzidas por microorganismos que levam a
inflamação gengival, destruição tecidual periodontal e perda óssea alveolar1. Gru-
pos específicos de anaeróbios gram-negativos no biofilme dental são tidos como
seus principais agentes etiológicos. Entretanto, estima-se que a maior parte do
dano observado seja causado de maneira indireta pela resposta do hospedeiro
frente à infecção e não pela agressão direta do agente infeccioso2.
De forma semelhante ao diabetes, gengivites e periodontites também afetam
grande parte da população mundial, com estimativas de que aproximadamente
80% sofram de periodontite moderada ou gengivite, enquanto 8% a 10% apresen-
tem sua forma severa. Estudos realizados em diversos países indicaram distribuições
semelhantes3,4(A,B). No Brasil, a ausência de levantamentos compreensivos bem
conduzidos dificulta a determinação da prevalência e a severidade destas lesões.
A significativa diminuição na freqüência de gengivite de 40% para 20%, obser-
vada nos últimos 20 anos na população sueca, não resultou na correspondente
queda de prevalência da periodontite severa. Este fato demonstra que higiene oral
adequada pode não ser suficiente para prevenir esta doença5(A,B).

2. DIABETES E MANIFESTAÇÕES ORAIS

Evidências indicam que complicações clássicas relacionadas ao diabetes, como ne-


fropatias, retinopatias, doença cardiovascular e neuropatias, podem iniciar-se antes de
estabelecido o seu diagnóstico6. Na boca, o sinal clínico do diabetes não diagnosticado
ou mal controlado pode incluir queilose, fissuras, ressecamento de mucosas, diminui-
ção do fluxo salivar, dificuldades de cicatrização e alterações na microbiota.
Enquanto alguns autores demonstram índices aumentados de cáries em
diabéticos7(B,C), outros verificaram incidências similares ou ainda menores nestes pa-
cientes quando comparados a controles não-diabéticos8(C)9(B,C). Em indivíduos com

55
Diretrizes SBD Diabetes e doença periodontal

níveis de glicose sangüínea mal contro- similar às clássicas complicações micro nestes tecidos. Um aumento de 50%
lados ou não controlados, tanto a saliva e macrovasculares observadas com na produção de RNAm para RAGEs foi
como o fluido gengival podem conter freqüência nestes pacientes. Estados identificado em tecidos gengivais de
quantidades aumentadas de açúcares10, de hiperglicemia mantida resultam em diabéticos tipo 2, comparados a con-
o que em parte poderia alterar a micro- alterações no metabolismo lipídico, as- trole não-diabético29(D).
biota do biofilme dental, influenciando sim como na glicosilação não-enzimá- Deficiências na adesão, quimiota-
o desenvolvimento de cáries e, possi- tica de proteínas colágenas, glicídios e xia e fagocitose neutrofílica têm sido
velmente, doenças periodontais11,12. Por ácidos nucléicos. Esta condição altera observadas em diabéticos, o que faci-
outro lado, a ingestão limitada de car- as propriedades da membrana celular, litaria a persistência e o crescimento de
boidratos, comum neste grupo de pa- modificando as relações célula-célula periodontos patógenos, contribuindo
cientes, proporciona uma dieta menos e célula-matriz. O agravamento deste significativamente para a destruição
cariogênica, o que diminuiria o risco de quadro pode levar a formação de ate- tecidual local30,31(D). Por outro lado,
surgimento destas lesões13(D). romas e microtrombos, espessamento embora neutrófilos estejam, com fre-
A xerostomia observada com fre- da parede vascular com conseqüente qüência, hipofuncionais em diabéticos,
qüência, responsável em parte pela estreitamente da sua luz e alterações acredita-se que monócitos/macrófa-
síndrome da ardência bucal e o au- na permeabilidade endotelial21. gos hiper-responsivos sejam respon-
mento parotídeo, mostra-se também Os produtos finais da glicosilação sáveis por grande parte da degradação
relacionada ao grau de controle gli- (AGEs) em diabéticos acumulam-se periodontal observada32,33(D). Traços
cêmico14-16(D,D,C). Neuropatias, assim em órgãos como retinas, gloméru- desta hiper-resposta têm sido observa-
como medicamentos utilizados no los, regiões endoneurais e paredes dos com freqüência no fluido gengival
controle do diabetes, podem colaborar vasculares22,23(C,D). Embora ocorra tan- (FG), um transudato seroso que reflete
nas alterações de secreção salivar17(C), to em diabéticos como em não-diabé- a atividade inflamatória local. Nestes
embora alguns estudos não tenham ticos, a presença de AGEs está signifi- casos, o FG caracteriza-se por uma
encontrado diferenças no fluxo nem cativamente aumentada em estados alta concentração de mediadores pró-
nos constituintes salivares entre os hiperglicêmicos prolongados24,25(D). inflamatórios, citocinas, quimiocinas
grupos avaliados17(C). Nestas condições, receptores de mem- e metaloproteinases da matriz (PgE2,
Dados sobre a incidência de can- brana (RAGE) têm sido identificados na IL-1, IL-6, TNF-a, IL-8, MMP-1, MMP-2 e
didíase oral entre diabéticos ainda superfície de células endoteliais, neu- MMP-8), tendo sido relacionado por al-
são inconclusivos18,19(C).Uma avalia- rônios, células de músculo liso e monó- guns autores à qualidade do controle
ção envolvendo 405 pacientes com citos/macrófagos26-28(D). glicêmico de diabéticos34,35(C).
DM1 encontrou 15,1% de candidíase Para alguns autores, a hiperglicemia O LPS bacteriano é tido como um
no grupo-teste, comparados a 3% no eleva a expressão de RAGEs, aumentado dos fatores de virulência mais impor-
grupo-controle não-diabético20(C). A assim a formação de complexos AGE- tante na destruição periodontal me-
análise multivariada demonstrou estar RAGE. Em monócitos/macrófagos, esta diada pelo hospedeiro36,37(C,D). Tem
a presença de candidíase oral também ligação induz um aumento no estresse sido demonstrado que sua ligação a re-
relacionada ao grau de controle glicê- oxidativo, sinalizando uma mudança ceptores celulares específicos (toll-like
mico nestes indivíduos. no fenótipo destas células, que passam receptors) estimula a secreção de uma
a aumentar a produção e a liberação de ampla variedade de citocinas da imu-
citocinas pró-inflamatórias. A síntese e nidade inata, além de fatores de cresci-
3. FISIOPATOLOGIA DA INTER- a secreção aumentada destas citocinas mento, contribuindo para a destruição
RELAÇÃO DIABETES MELLITUS e mediadores contribuem para exacer- tecidual local38(B,C)39(D). A prostaglan-
E DOENÇA PERIODONTAL bação de outros processos crônico-in- dina E2, por exemplo, considerada um
flamatórios observados em diabéticos. potente estimulador da reabsorção
Muitos dos mecanismos pelos quais Por também ocorrer no periodonto, a óssea alveolar, está significativamen-
o diabetes mellitus influencia o perio- formação de AGEs e sua ação deletéria te aumentada no fluido gengival de
donto possuem uma fisiopatologia sobre outros órgãos pode estar refletida pacientes diabéticos com infecções

56
2008 Diretrizes SBD

periodontais, quando comparados a levantamentos epidemiológicos de ausência de bactérias, reconhecidas


controles saudáveis. Estes níveis corre- larga escala encontraram um risco au- como patógenos periodontais em po-
lacionam-se também de modo positi- mentado de três vezes para perda de tencial. Estes resultados sugerem que
vo com a severidade e a agressividade inserção periodontal e destruição óssea menos de 20% da variabilidade na ex-
da doença40. alveolar entre diabéticos, quando com- pressão desta doença pode ser explica-
parados a não-diabéticos51,52(A,B). da pelos níveis de patógenos específi-
Estes dados foram posteriormente cos. Evidências da influência genética
4. DIABETES COMO FATOR confirmados através de meta-análises nas periodontites vêm de estudos re-
DE RISCO PARA A DOENÇA envolvendo diferentes populações de alizados em gêmeos56 e, mais recente-
PERIODONTAL diabéticos41. Estas evidências acabam mente, na identificação de certos poli-
por suportar o conceito da periodonti- morfismos que se correlacionam com
Uma ampla gama de evidências te como sendo mais uma complicação fenótipos de resposta imune.
tem demonstrado ser o diabetes um crônica do diabetes mellitus. Um exten- É freqüente observar em pacien-
fator de risco para periodontites e gen- so levantamento longitudinal (Third Na- tes diabéticos uma tendência maior
givites41-43,45,51,55(D,A,C,A,B).Um levanta- tional Health and Nutrition Examination a hiperplasias gengivais, pólipos, for-
mento realizado em 1990, abrangendo Survey, NHANES III) evidenciou o grau mação de abscessos, perda dentária e
2.273 índios Pima, encontrou 2,6 vezes de controle glicêmico como a variável periodontite. Dessa forma, o conjunto
mais doença periodontal entre porta- mais importante na determinação do de informações a respeito das con-
dores de diabetes do que entre os não- risco para doenças periodontais em seqüências do diabetes mellitus mal
diabéticos, sugerindo que esta doença diabéticos. Adultos com mau controle controlado nos sugere que os tecidos
deveria ser considerada uma complica- glicêmico tiveram 2,9 vezes mais perio- orais podem ser afetados de forma si-
ção não-específica do DM243(A). dontites que não-diabéticos. Por outro milar ao que acontece em outros siste-
O grau de controle glicêmico pa- lado, diabéticos com bom controle não mas do corpo. Estudos demonstraram
rece ser uma variável bastante im- apresentaram aumento significativo que pacientes diabéticos com infecção
portante, estando o seu mal controle no risco, quando comparados a não- periodontal possuem pior controle gli-
relacionado a uma prevalência maior diabéticos53(A). cêmico do que diabéticos sem doença
e severidade da inflamação gengival Parte das características clínicas periodontal57(A).
e destruição tecidual. Um estudo lon- observadas nas periodontites pode ser Em função da alta prevalência de
gitudinal de curta duração, realizado explicada por fatores genéticos54(A). doenças cardiovasculares em indivídu-
em 1993, envolvendo diabéticos tipo 2 Estudos moleculares e epidemiológi- os diabéticos e por estas responderem
com idade entre 35 e 56 anos, encon- cos da microbiota oral sugerem que, por mais da metade das mortes ob-
trou mais inflamação e sangramento embora fatores microbianos sejam ne- servadas entre eles, além de estudos
gengival nos indivíduos com pobre cessários para a doença, estes, por si só, recentes correlacionarem de forma
controle glicêmico44(C). Em 1998, no- não são suficientes para predizer a pre- significativa doença periodontal e ris-
vamente utilizando uma população sença ou a severidade da periodontite. co aumentado para infarto agudo do
de índios Pima, um acompanhamento Elementos relativos à suscetibilidade miocárdio, um estudo longitudinal en-
prospectivo demonstrou associação do hospedeiro, como resposta imune volvendo mais de 600 pacientes com
entre o controle glicêmico inadequado e doenças sistêmicas pré-existentes, DM2 foi realizado para avaliar o efeito
do diabetes mellitus tipo 2 e o risco au- além de fatores ambientais não micro- da doença periodontal sobre a mortali-
mentado significativo de perda óssea bianos, como, por exemplo, o fumo, dade por causas múltiplas nestes indi-
alveolar progressiva, quando compa- têm se mostrado importantes para a víduos. Entre aqueles com periodontite
rado a um grupo com bom controle manifestação da doença55(A). severa, as taxas de morte por doenças
glicêmico45(A). Outros trabalhos trans- Modelos multivariados de perio- isquêmicas do coração foram 2,3 vezes
versais e de casos-controle alcança- dontite que incorporam fatores micro- maiores do que as taxas em indivíduos
ram resultados semelhantes46-50 (B,C,). bianos apresentam coeficiente de corre- sem periodontites, após ajustes para
Ainda em acordo com estes achados, lação entre 0,3 e 0,4 para presença ou outros fatores de risco conhecidos. As

57
Diretrizes SBD Diabetes e doença periodontal

taxas de morte por nefropatias diabéti- de forma clara ao desenvolvimento de podendo estar limitados por fatores de
cas foram 8,5 vezes maiores em indiví- complicações. confundimento residuais, estudos lon-
duos com periodontite severa e as ta- gitudinais, com medidas mais precisas
xas gerais de mortalidade por doenças de adiposidade, proverão melhores in-
cardiorrenais foram 3,5 vezes maiores 5. OBESIDADE E DOENÇA formações a respeito da relação entre
em indivíduos com periodontite seve- PERIODONTAL doença periodontal e obesidade.
ra do que naqueles sem periodontites,
sugerindo que a presença da doença Devido a sua natureza inflamatória,
periodontal pressupõe um risco para pode-se esperar que a doença perio- 6. TRATAMENTO PERIODONTAL
mortalidade cardiovascular e renal em dontal altere o controle glicêmico de E CONTROLE DO DIABETES
pessoas com diabetes58(A). forma análoga à obesidade, também MELLITUS
Segundo dados da American Dental de igual natureza. Décadas atrás, um
Association (ADA, 1982)59, a prevalência estudo em ratos observou que a obe- Pesquisas intervencionistas sugerem
de periodontite em indivíduos diabéti- sidade contribuía para a severidade um potencial benefício metabólico ob-
cos chega a atingir 39% entre os maio- da doença periodontal63(D). Recente- tido a partir do tratamento periodontal
res de 19 anos. Em outro estudo, um ris- mente, uma relação entre doença pe- aditivo, envolvendo consultas de raspa-
co relativo de dois a três foi encontrado riodontal e obesidade tem sido sugeri- gem e alisamento radicular associadas à
para esta relação. Segundo estes auto- da. Em um estudo envolvendo adultos administração sistêmica de doxiciclina67-
res, existe ainda uma severidade maior japoneses64(B), os autores verificaram 69
(D,A,). Um estudo recente envolvendo
da periodontite entre diabéticos de que o aumento do índice de massa pacientes com DM2 bem controlados,
longa duração e mau controle glicêmi- corporal (IMC) estava associado ao au- com sinais de gengivite e periodontite
co60. Entretanto, trabalhos conduzidos mento do risco para periodontite. insipiente, avaliou a raspagem radicular
por Ervast et al.61(B) não encontraram Outro grupo de pesquisa, analisan- sem o uso adjunto de antibióticos. Um
diferenças significativas na inflamação do dados do terceiro levantamento na- grupo-controle diabético, com níveis
gengival entre diabéticos e não-diabé- cional de saúde e nutrição dos Estados similares de doença periodontal, não
ticos. Porém, quando os grupos anali- Unidos, encontrou uma associação sig- recebeu tratamento. Após a terapia, o
sados foram estratificados de acordo nificativa entre medidas de gordura cor- grupo-teste apresentou 50% de redu-
com o nível de controle glicêmico, um poral e doença periodontal em adultos ção na prevalência de sangramento
significante aumento na inflamação jovens65(A). Utilizando a mesma base gengival e uma redução na HbA1c de
gengival foi observado nos pacientes de dados66(A), avaliou a relação entre 7,3% para 6,5%. No grupo-controle,
com glicemia mal controlada. diferentes mediadas de adiposidade e onde não houve tratamento periodon-
Em geral, o número de sítios infla- doença periodontal, encontrando cor- tal, não foram encontradas mudanças
mados decrescia na medida em que o relação entre IMC, taxa cintura-quadril no sangramento gengival e nenhuma
controle glicêmico melhorava, sugerin- e diversos parâmetros periodontais, melhora nos níveis de HbA1c pode ser
do haver uma relação direta entre estas incluindo perda de inserção média, pro- observada70(A). Estes resultados suge-
variáveis. Outros trabalhos também en- fundidade média de bolsa, índice gen- rem que modificações nos níveis de in-
contraram uma relação positiva entre gival e índice de cálculo66. flamações gengivais após o tratamento
níveis inflamatórios gengivais e o grau Evidências recentes a respeito de periodontal podem impactar de positi-
de controle glicêmico62, evidenciando tecidos adiposos servirem como re- va sobre o controle glicêmico.
que os níveis glicêmicos podem ter um servatórios de citoquinas pró-inflama- Muitos mecanismos podem expli-
importante papel na resposta gengival tórias justificam a hipótese de que o car o impacto da infecção periodontal
à placa bacteriana nestes indivíduos. aumento na gordura corporal ativaria sobre o controle glicêmico, como já
Por este prisma, as doenças periodon- a resposta inflamatória do hospedeiro, discutido anteriormente. A inflamação
tais aparecem de forma similar às com- favorecendo, dentre outras, a doença sistêmica possui um importante papel
plicações clássicas do diabetes, onde o periodontal33. Entretanto, por serem sobre a sensibilidade insulínica e a dinâ-
mau controle glicêmico está associado todos estes estudos transversais, mica da glicose. Evidências sugerem que

58
2008 Diretrizes SBD

doenças periodontais podem induzir ou Para alguns autores, o sucesso da severidade, extensão e progressão
perpetuar um estado inflamatório crôni- terapia periodontal pode estar limita- nesta população.
co sistêmico, como evidente através das do pela presença do diabetes mal con-
dosagens séricas elevadas de proteína trolado ou não diagnosticado. Assim,
C-reativa, IL-6 e fibrinogênio em muitos a existência de abscessos recorrentes, 7. CONCLUSÕES
indivíduos com periodontites71,72(B,C). gengivites hiperplásicas idiopáticas, rá-
Inflamação, de maneira geral, induz pida destruição do osso alveolar e cicatri- O diabetes mellitus aumenta a sus-
resistência insulínica e tal resistência zação alterada após cirurgias orais deve cetibilidade e a severidade da doença
freqüentemente é acompanhada por servir de alerta. Estudos conduzidos por periodontal, por prejudicar a função
infecções sistêmicas. De forma similar, a Stewart avaliaram o efeito do tratamento imune celular, diminuir a síntese e reno-
infecção periodontal poderia aumentar periodontal em 36 pacientes portadores vação de colágeno e induzir à reabsor-
o estado inflamatório sistêmico, exacer- de DM2. Os resultados sugeriram que a ção óssea alveolar. A relação entre estas
bando a resistência insulínica. O TNF-a, terapia periodontal está associada a uma duas doenças parece ser ainda mais ínti-
produzido em abundância tanto em melhora no controle glicêmico do DM2. ma, uma vez que a infecção periodontal
adipócitos como em sítios de periodon- A mesma relação foi observada é capaz de ativar uma resposta inflama-
tites, aumenta a resistência insulínica, por Taylor após revisão compreensiva tória sistêmica, como evidenciado pelos
prevenindo a autofosforilação do re- da literatura mundial. Entretanto, as altos níveis séricos de proteína C-reativa
ceptor tirosina quinase (TK)63. A inter- evidências que suportam a associação e fibrinogênio nestes pacientes.
leucina-6 (IL-6) é um importante esti- entre a periodontite severa e um au- Este estado pode dificultar o controle
mulador da produção de TNF-a. Não por mento do risco para um mau controle da glicemia em diabéticos. Apesar da vas-
acaso, níveis elevados de IL-6 têm sido glicêmico vêm de apenas dois estudos ta gama de evidências oriunda de estudos
também observados tanto no soro de prospectivos, sendo ainda necessárias de caso e coortes transversais, ensaios clí-
indivíduos obesos como em pacientes pesquisas futuras bem conduzidas e nicos controlados e randomizados, assim
periodontais. Por esta razão, a existên- rigorosas. Com relação à distribuição como acompanhamentos longitudinais
cia de uma relação entre infecções orais das doenças periodontais entre dia- bem desenhados, ainda são necessários
severas, incluindo periodontite crônica béticos, 37 de 41 estudos transversais estudos para esclarecer o papel do tra-
generalizada (PCG), e o aumento da re- e sete longitudinais indicaram evidên- tamento periodontal frente ao controle
sistência à insulina tem sido estudada. cias significativas de maior prevalência, glicêmico do diabetes mellitus.

TABELA 1 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Nível de evidência

A periodontite severa afeta 8% a 10% da população mundial. A


O paciente com diabetes tem um maior risco de apresentar doença periodontal. A
O mal controle glicêmico é um fator de risco para o aumento da prevalência e severidade da inflamação
gengival e destruição tecidual. A
A doença periodontal confere maior risco para mortalidade cardiovascular e renal em pacientes pessoas
com diabetes.
A
Os produtos finais da glicosilação e a resposta inflamatória crônica são importantes fatores na patogê-
nese da doença periodontal do paciente com diabetes. D
A terapia com raspagem radicular resulta em 50% de redução na prevalência de sangramento gengival
e uma redução na HbA1c. A

59
Diretrizes SBD Diabetes e doença periodontal

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61
Diretrizes SBD 2008

Disglicemias na gestação:
do diagnóstico ao tratamento

A observação de que muitos casos de disglicemias nas mulheres grávidas,


ainda hoje, não são diagnosticados, acarretando complicações maternas e fetais,
mostra que existe a necessidade de uniformização do rastreamento, diagnóstico
e tratamento de todas as formas de disglicemia que ocorrem durante a gestação
no Brasil. Esta medida tem como objetivo permitir a padronização do diagnóstico
entre os clínicos, os endocrinologistas e os obstetras, permitindo assim penetração
maior da informação nos serviços de atendimento dos centros de saúde, ambu-
latórios públicos e privados do país. Por esta razão, a Sociedade Brasileira de Dia-
betes (SBD) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia
(Febrasgo) se uniram na apresentação desta proposta.

1. INTRODUÇÃO

A disglicemia é, hoje, o problema metabólico mais comum na gestação1. A pre-


valência de disglicemia durante a gravidez pode ser de até 13%. A ocorrência de
diabetes tipo 1 na população de gestantes é de 0,1% ao ano; a de diabetes tipo 2
é de 2% a 3% ao ano; e a de diabetes gestacional é de até 12%, dependendo do
critério utilizado no diagnóstico e da população estudada2.
É importante a diferenciação entre os tipos de diabetes, uma vez que causam
impactos diversos sobre o curso da gravidez e o desenvolvimento fetal. O diabetes
mellitus pré-gestacional, seja do tipo 1 ou 2, é mais grave, pois seu efeito começa
na fertilização e implantação, afetando de modo particular a organogênese, le-
vando a risco aumentado de aborto precoce, defeitos congênitos graves e retardo
no crescimento fetal, principalmente nos casos tratados de maneira inadequada3.
Além das complicações no concepto, as manifestações maternas também são rele-
vantes, em especial na presença de complicações, tais como retino e nefropatia4.
O diabetes gestacional (DG) aparece em geral na segunda metade da gra-
videz e afeta principalmente o ritmo de crescimento fetal5. Os filhos de mães
com DG têm maior risco de evoluírem com macrossomia e hipoglicemia ne-
onatal. Como conseqüência, obesidade e desenvolvimento psicomotor mais
lento são complicações que podem se desenvolver em longo prazo6. Caso o

62
2008 Diretrizes SBD

diabetes seja diagnosticado antes deste período da gravidez, é provável que É importante orientar cuidados pré-
se trate de um diabetes de qualquer tipo, já existente na fase pré-gestacional, concepcionais e dar informações às pa-
mas não diagnosticado previamente. cientes que estejam planejando engra-
vidar, antes que elas descontinuem o
método contraceptivo. Orientar também
2. RECOMENDAÇÕES PARA PACIENTES COM DIABETES PRÉ- que um bom controle glicêmico antes da
GESTACIONAL concepção reduz, mas não elimina os ris-
cos de aborto, má-formação congênita,
natimortalidade e morte neonatal (B).
2.1 - ORIENTAÇÕES PRÉ-CONCEPCIONAIS PARA PACIENTES COM DIABETES PRÉ- Oferecer ainda um programa de edu-
GESTACIONAL cação continuada, que oriente quanto à
dieta, contagem de carboidratos, auto-
Da adolescência em diante, deve-se aconselhar as pacientes a evitarem a gra- aplicação de insulina e automonitori-
videz não-planejada3(A). É preciso informar às pacientes e a suas famílias de que zação de glicemia capilar o mais pre-
forma o diabetes pode complicar a gravidez e como a gravidez pode agravar o cocemente possível para mulheres que
diabetes7, conforme tabela 1.
estejam planejando engravidar. Avaliar
as pacientes quanto à presença de ne-
TABELA 1 - Orientações do período pré-gestacional fropatia, neuropatia, retinopatia, doença
cardiovascular, hipertensão, dislipide-
Temas a serem enfocados com pacientes diabéticas e seus familiares no período mia, depressão e disfunção tireoideana.
pré-gestacional:
Quando diagnosticadas, tratá-las8.
• O impacto do mau controle do diabetes sobre o curso da gravidez e sobre o risco
materno e fetal;

• A importância da dieta, do controle do peso corporal e da prática regular de exercício 2.2 - CONTROLE GLICÊMICO ANTES E
físico (incluindo aconselhamento para perda de peso em pacientes com IMC > 25); DURANTE A GRAVIDEZ
• O aumento do risco do nascimento de um bebê macrossômico, o que aumentaria
as chances de tocotraumatismos, tanto para a mãe quanto para o feto; Deve-se aconselhar as pacientes
com diabetes pré-existente, que este-
• A importância do controle glicêmico materno antes, durante e após o parto, e tam-
bém a importância da amamentação precoce do recém-nascido com o intuito de se jam planejando engravidar, a mante-
reduzir o risco de hipoglicemia neonatal; rem os níveis de glico-hemoglobina
A1C (HbA1c) o mais próximo possível
• A possibilidade da ocorrência de internação do recém-nascido em unidade de tera-
pia intensiva, por hipoglicemia ou imaturidade pulmonar, entre outras situações; dos valores normais, sem a ocorrência
de hipoglicemias9. O nível recomenda-
• O risco aumentado que o recém-nascido tem de desenvolver obesidade e/ou dia-
betes no futuro. do de HbA1c é < 6%, pelo método pa-
drão (HPLC), ou até 1% acima do valor
Em pacientes diabéticas pré-gestacionais, deve-se também orientar sobre: máximo informado pelo laboratório9(B).
Isso contribui para a prevenção de
• O impacto do mau controle do diabetes sobre o curso da gravidez e sobre o risco más-formações fetais, para as quais há
materno e fetal;
maior risco nas primeiras semanas de
• A necessidade de suplementação com ácido fólico até a 12a semana de gestação gestação, quando o diabetes não esti-
para reduzir os riscos de ocorrência de má-formação do tubo neural; ver bem compensado.
• Os riscos de hipoglicemia clínica ou mesmo assintomática durante a gravidez e os É preciso esclarecer, ainda, que qual-
efeitos da náusea e do vômito no controle glicêmico durante a gravidez; quer redução dos níveis de HbA1c dimi-
• A necessidade de se avaliar a presença de retinopatia e nefropatia antes, durante e nui os riscos de más-formações. Mulhe-
após o término da gravidez. res com HbA1c acima de 10% devem
ser desencorajadas a engravidar até

63
Diretrizes SBD Disglicemias na gestação

alcançarem melhor controle glicêmico, A dieta também deve ser planejada da adiposidade fetal, melhora do con-
devido ao elevado risco de ocorrência e distribuída ao longo do dia, objetivan- trole glicêmico e diminuição de pro-
de más-formações fetais e abortamen- do-se evitar episódios de hiperglicemia, blemas durante o trabalho de parto15.
tos10. A gravidez deve ser programada hipoglicemia ou cetose. Deve-se ter A atividade física melhora a sensibili-
para quando o diabetes estiver bem atenção especial na adequação das do- dade periférica à insulina, facilitando
compensado, com HbA1c dentro das ses de insulina e dos horários de sua ad- a utilização periférica da glicose. Este
metas pré-estabelecidas. ministração ao conteúdo dos nutrientes efeito pode evitar ou retardar a neces-
A HbA1c deverá ser medida na pri- fornecidos em cada refeição nas mulhe- sidade de uso de insulina nas mulhe-
meira consulta pré-natal; depois, men- res que fazem uso de insulina. Em geral, é res com diabetes gestacional (DG).
salmente, até que valores < 6% sejam necessário fracionar a ingestão alimentar Mulheres previamente sedentárias
alcançados, quando poderá ser avaliada em três refeições grandes e três peque- não devem ser encorajadas a iniciarem
a cada dois ou três meses. Deve-se mo- nas (C). A ceia tem grande importância, exercícios físicos intensos durante a
tivar as pacientes a realizarem glicemias em especial nas mulheres que fazem uso gestação. Entretanto, a prescrição de
capilares antes e após as refeições, ao de insulina à noite, e deve conter 25 gra- atividade física leve, sob supervisão,
deitarem-se e esporadicamente ente 2 e mas de carboidratos complexos, além de pode estar indicada. Os exercícios de-
4 horas da manhã (C). Tais testes devem proteínas ou lipídios, para evitar hipogli- vem ser realizados em ambientes apro-
ser feitos, de preferência, nos dedos das cemia durante a madrugada. priados, para evitar calor excessivo e
mãos, não utilizando locais alternativos. Mulheres que fazem uso de in- risco de desidratação. Mulheres que
O controle glicêmico durante a sulina podem ser orientadas a faze- já praticavam previamente alguma
gestação é considerado ótimo quan- rem o ajuste da dose pré-prandial de atividade podem continuar com seus
do os valores de glicemia pré-prandial, insulina de ação rápida através do exercícios durante a gestação, caso não
ao deitar-se e durante a madrugada se cálculo do conteúdo de carboidrato existam contra-indicações. Está contra-
encontram entre 60 a 99 mg/dl, com o de cada refeição. Os adoçantes artifi- indicada a prática de exercício físico
ciais (aspartame, sacarina e acessul- durante a gestação em caso de:
pico pós-prandial entre 100 a 129 mg/
fame-K) podem ser utilizados com • Doença hipertensiva induzida
dl. Os valores de glicemia pós-pran-
moderação14(C). pela gestação;
dial de uma hora após o início das re-
feições são os que melhor refletem os • Ruptura prematura de membra-
valores dos picos pós-prandiais11(C). nas;
2.4 - SUPLEMENTAÇÃO DE VITAMINAS
• Trabalho de parto prematuro;
E MINERAIS
• Sangramento uterino persistente
2.3 - TERAPIA NUTRICIONAL após o segundo trimestre;
O uso de ácido fólico desde o pe-
ríodo pré-concepcional até o fecha- • Crescimento intra-uterino retar-
As gestantes com diagnóstico de mento do tubo neural é recomendado dado;
diabetes devem receber orientações para todas as mulheres, inclusive para • Síndrome nefrótica;
dietéticas individualizadas, neces- aquelas que têm diabetes13(A). A su- • Retinopatia pré e proliferativa;
sárias para atingir as metas do trata- plementação com outras vitaminas e • Hipoglicemia sem aviso;
mento. A quantidade de calorias deve sais minerais pode ser realizada quan- • Neuropatia periférica avançada e
ser baseada no IMC, freqüência e in- do detectada a presença de deficiên- disautonomia.
tensidade de exercícios físicos, padrão cias nutricionais12(C). Pacientes que não tenham contra-
de crescimento fetal e ganho de peso indicações de realizar exercícios devem
adequado12. A distribuição recomen- fazê-lo diariamente por pelo menos 30
dada do conteúdo calórico é: 2.5 - EXERCÍCIOS FÍSICOS minutos, que podem ser divididos em
• 40% a 55% de carboidratos; três sessões de dez minutos cada, reali-
• 15% a 20% de proteínas (no míni- A prática regular de exercícios físi- zadas de preferência após as refeições.
mo 1,1 mg/kg/dia); cos causa sensação de bem-estar, di- Deve-se monitorizar a glicemia capilar
• 30% a 40% de gorduras. minuição do ganho de peso, redução antes e após os exercícios e manter-se

64
2008 Diretrizes SBD

boa hidratação. É preciso orientar a necessidade ainda maior de aumento gravidez ou tão logo a mesma seja
prática de exercícios que não tenham da dose de insulina, chegando a atin- confirmada, devido a seus potenciais
alto risco de quedas ou traumas abdo- gir o dobro da dose pré-gravídica, em efeitos teratogênicos24,25(A).
minais e que não levem ao aumento da torno da 36a semana. Após o parto, a Como não está claro se o uso dos
pressão arterial, contrações uterinas ou necessidade de insulina cai abrupta- fibratos na gestação é seguro, sua
sofrimento fetal16(B). mente. Muitas vezes, não sendo ne- indicação deve ocorrer apenas nos
cessário o uso da mesma nas primei- casos mais severos de hipertrigliceri-
ras 24 horas e, nos dias subseqüentes, demia, quando há risco de evolução
2.6 - TRATAMENTO MEDICAMENTOSO a dose deve ser ajustada para 1/3 da para pancreatite aguda e que não res-
(INSULINOTERAPIA E SEGURANÇA dose pré-gravídica. pondam à dietoterapia (D).
DOS MEDICAMENTOS USADOS NO
Os análogos de insulina de ação ul-
CONTROLE DO DIABETES E SUAS
COMPLICAÇÕES, ANTES E DURANTE tra-rápida, tais como a insulina aspart e
lispro, são seguros durante a gestação 2.7 - EMERGÊNCIAS E COMPLICA-
A GRAVIDEZ)
ÇÕES DO DIABETES DURANTE A
e levam a uma melhora dos níveis de
GESTAÇÃO
Mundialmente, prevalece a reco- glicemia pós-prandial e à diminuição
mendação da descontinuação do uso da ocorrência de hipoglicemias21(B).
Deve-se alertar as pacientes em in-
de antidiabéticos orais e sua substitui- A insulina humana NPH é a primei-
sulinoterapia sobre os riscos de hipo-
ção por insulina, de preferência antes ra escolha entre as insulinas de ação
glicemia, em especial durante a noite e
da gravidez ou logo após seu diagnós- intermediária21(A). Não existem ainda madrugada, e estabelecer medidas de
tico, devido à segurança comprovada estudos consistentes com o uso dos prevenção. É preciso também orien-
e melhor eficácia para o controle da análogos de insulina detemir e glargi- tar seus parceiros e familiares sobre
glicemia. Estudos recentes mostra- na. A bomba de infusão contínua de tais riscos e como prestar os primeiros
ram segurança do uso de metformina insulina pode ser utilizada, quando socorros21(B). Deve-se descartar a pre-
durante a gestação17-19(B) e de gliben- disponível. Os locais ideais para in- sença de cetoacidose diabética caso a
clamida em pacientes portadoras de jeções de insulina são o abdômen e paciente com diabetes tipo 1 apresen-
DG a partir do segundo trimestre20(B). coxa21(C). te intercorrências infecciosas, desidra-
A metformina atravessa a placenta e, Suspender o uso de inibidores da tação e aumento da glicemia10(D).
apesar de até o momento não existi- enzima de conversão da angiotensi- O controle da função renal e tera-
rem relatos de efeitos adversos, é ne- na (IECA) e bloqueadores do receptor pêutica das complicações retinianas
cessária cautela na indicação rotineira da angiotensina (BRA), devido a sua deve ser feito antes, durante e após a
desta medicação. associação com embriopatias e feto- gravidez nas pacientes com diabetes
Para obter-se um controle glicêmi- patias, antes da gravidez ou tão logo pré-existente, porque algumas com-
co adequado, em geral deve-se utilizar a mesma seja confirmada, e substi- plicações, como retinopatia, nefropa-
esquemas intensivos de insulinização, tuí-los por agentes anti-hipertensi- tia clínica e insuficiência renal, podem
com múltiplas doses subcutâneas de vos seguros durante a gestação22(A). se agravar com a gestação. O risco de
insulina de ação intermediária, rápi- Os anti-hipertensivos que podem ser piora da retinopatia proliferativa é ex-
da ou ultra-rápida. Em mulheres que utilizados são a metildopa, os bloque- tremamente elevado naquelas mulhe-
usavam insulina antes da gestação, adores de canais de cálcio não diidro- res que não fizeram tratamento prévio
com freqüência é necessário reduzir piridínicos de duração prolongada e com laser. A cardiopatia isquêmica,
a sua dose em 10% a 20% durante o os betabloqueadores com atividade quando não tratada, está associada a
primeiro trimestre. Entre a 18a e a 24a beta agonista parcial, como carvedi- altos índices de mortalidade. A pre-
semana de gestação, em média, esta lol, labetalol e pindolol. O uso de ate- sença de nefropatia diabética aumen-
dose deve ser aumentada. No terceiro nolol tem sido associado à restrição ta de maneira significativa os riscos
trimestre, o aumento da produção de de crescimento fetal e, portanto, deve de complicações perinatais, tais como
hormônios placentários com ação an- ser evitado23(C). Deve-se suspender pré-eclampsia, restrição do crescimen-
tagônica à da insulina resulta em uma também o uso de estatinas antes da to intra-uterino e prematuridade4(B).

65
Diretrizes SBD Disglicemias na gestação

3. RECOMENDAÇÕES PARA substituir as condutas atuais, tem-se recomendado que o rastreamento do DG


PACIENTES COM DIABETES seja universal, ou seja, todas as gestantes devem ser investigadas. A época que
GESTACIONAL (DG) deverá ser realizado o rastreamento variará conforme o risco desta mulher evo-
luir com DG.
O DG é definido como a intolerân- A SBD, juntamente com a Febrasgo, sugere o emprego da glicemia de jejum
cia à glicose de qualquer grau, diag- a partir da 20a semana de gestação para rastreamento do DG. O ponto de cor-
nosticada pela primeira vez durante a te para classificação de rastreamento positivo, independente do momento da
gestação, e que pode ou não persistir gravidez, é o da glicemia de 85 mg/dl. Um resultado inferior a 85 mg/dl é consi-
após o parto26. A importância do diag- derado rastreamento negativo. Na presença dos fatores de risco listados acima,
nóstico do diabetes durante a gesta- sugere-se repetir o teste de rastreamento no terceiro trimestre29 (figura 1).
ção foi sugerida por relatos de maior
freqüência de abortamentos, macros-
somia e mortalidade perinatal em fi-
lhos de mulheres que desenvolveram FIGURA 1 - Procedimento para o rastreamento do diabetes gestacional
diabetes mellitus, em comparação às
do grupo-controle. Na maior parte
Glicemia de jejum
das vezes, representa o aparecimento (primeira consulta)
do diabetes mellitus tipo 2 (DM2) du-
rante a gravidez e apresenta fatores
de risco, tais como: < 85 mg/dl ≥ 85 mg/dl e/ou FR
• Idade superior a 25 anos;
• Obesidade ou ganho excessivo
Glicemia de jejum
de peso na gravidez atual; Rastreamento positivo
após a 20a semana
• Deposição central excessiva de
gordura corporal;
• História familiar de diabetes em < 85 mg/dl ≥ 85 mg/dl e/ou FR
parentes de primeiro grau;
• Baixa estatura (< 1,5 m)27;
• Pernas curtas28; Rastreamento Rastreamento
• Gestantes que nasceram com baixo negativo positivo
peso28;
• Crescimento fetal excessivo (ma-
crossomia ou fetos GIG), polidrâmnio, A Associação Americana de Diabetes indica que o rastreamento deve ser feito
hipertensão ou pré-eclampsia na gra- através da medida da glicose plasmática uma hora após sobrecarga com 50 gra-
videz atual; mas de glicose. Pode-se empregar o ponto de corte de 140 mg/dl (80% de sensi-
• Antecedentes obstétricos de abor- bilidade) ou 130 mg/dl (90% de sensibilidade) para se considerar o rastreamento
tos de repetição, de más-formações positivo, dependendo do objetivo quanto à sensibilidade e à especificidade que
congênitas fetais, de morte fetal ou ne- se deseja alcançar.
onatal, de macrossomia ou de diabetes Gestantes com glicemia de jejum alterada na primeira consulta pré-natal
gestacional. e/ou fatores de risco para DG (rastreamento positivo) realizam o procedimento
Existe grande controvérsia sobre diagnóstico preconizado, ou seja, teste oral de tolerância à glicose, com sobre-
a indicação do rastreamento do DG carga de 75 gramas de glicose anidra, com duração de duas horas. Com elas, de-
na literatura. A maior parte das reco- vem ser usados os critérios diagnósticos de diabetes gestacional da Organização
mendações advém de consensos de Mundial da Saúde (OMS), ou seja, uma glicemia duas horas após a sobrecarga ≥
especialistas7(D). Até que recomenda- 140 mg/dl30. Caso o resultado do teste seja normal, deve-se repeti-lo entre a 24a
ções baseadas em evidências possam e a 28a semana de gestação26(A) (figura 2).

66
2008 Diretrizes SBD

FIGURA 2 - Procedimento para o diagnóstico do diabetes gestacional Deve-se esclarecer às pacientes


com DG sobre os riscos de sua patolo-
gia e que um bom controle glicêmico
Rastreamento positivo
durante toda a gestação reduzirá os ris-
cos de macrossomia fetal, tocotrauma-
tismos (para as mães e para os recém-
85-109 mg/dl nascidos), parto induzido ou cesariana,
≥ 110 mg/dl
hipoglicemia neonatal e mortalidade
perinatal. Também deve-se instruí-las
Jejum < 110 mg/dl Jejum ≥ 110 mg/dl Repetir glicemia de sobre a freqüência e as técnicas cor-
2 horas < 140 mg/dl 2 horas ≥ 140 mg/dl jejum prontamente
retas da automonitorização de sua
glicemia capilar. Os alvos glicêmicos a
≥ 110 mg/dl serem atingidos são os mesmos para
Teste negativo Diabetes gestacional
as diabéticas pré-gestacionais e as
gestacionais.
Diabetes gestacional
Evidência recente sugere que a inter-
venção em gestantes com DG pode di-
O procedimento diagnóstico preconizado pela OMS é o teste oral com sobre- minuir a ocorrência de eventos adversos
carga de 75 gramas de glicose anidra. Nestes casos, somente os valores relativos da gravidez31(B), inclusive em pacientes
aos tempos zero e duas horas são considerados para avaliação. O teste com 75 portadoras de disglicemias menos se-
gramas é considerado positivo para diagnóstico de diabetes gestacional se a gli- veras que as diagnósticas de DG32(A). O
cemia de jejum for ≥ 126 mg/dl e/ou a glicemia de duas horas for ≥ 140mg/dl. tratamento inicial do DG consiste em
Entretanto, o último consenso da Sociedade Brasileira de Diabetes defende a orientação alimentar que permita ga-
adoção, para o diagnóstico do diabetes gestacional, dos pontos de corte de 110 nho de peso adequado e normalização
mg/dl para a glicemia de jejum e de 140 mg/dl para o valor de duas horas após da glicemia. O cálculo do valor calórico
sobrecarga. Atualmente, a ADA também aceita o teste com 75 gramas como cri- total da dieta pode ser feito de acordo
tério diagnóstico, utilizando-se, entretanto, os mesmos valores de corte suge- com as tabelas idealizadas para tal fim e
ridos por Carpenter e Coustan nos tempos zero, uma e duas horas (tabela 2). É visa a permitir ganho de peso em torno
importante que os testes sejam realizados após três dias de dieta sem restrições de 300 a 400 gramas por semana a par-
(≥ 150 gramas de carboidratos), que a paciente não fume e permaneça sentada tir do segundo trimestre da gravidez12.
ou deitada durante os testes. A prática de atividade física deve fazer
parte do tratamento do diabetes ges-
TABELA 2 - Diagnóstico de diabetes gestacional através de teste oral de tacional, respeitando-se as possíveis
tolerância à glicose com 75 g de glicose anidra VO contra-indicações obstétricas15(B).
Após duas semanas de dieta, se
SBD OMS ADA
os níveis glicêmicos permanecerem
Jejum 110 mg/dl 126 mg/dl 95 mg/dl elevados (jejum ≥ 95 mg/dl e uma
hora pós-prandial ≥ 130 mg/dl), re-
Uma hora - - 180 mg/dl
comenda-se iniciar o tratamento com
Duas horas 140 mg/dl 140mg/dl 155 mg/dl
insulina33(B). O controle glicêmico
deve ser feito com uma glicemia de
jejum e duas pós-prandiais semanais,
A glicemia de jejum de 100 mg/dl, valor considerado superior em adultos feitas em laboratório quando não
normais, não está validada para aplicação na gestação. Não se deve fazer o existe a possibilidade de automonito-
diagnóstico com exame de glicemia feito ao acaso, com teste de sobrecarga com rização domiciliar. Quando esta se en-
50 gramas de glicose e glicosúria7(B). contra disponível, deve ser realizada

67
Diretrizes SBD Disglicemias na gestação

antes e uma hora após as principais refeições, em especial nas gestantes que usam glicemia e ajustes da dose da insulina8(D).
insulina. O critério de crescimento fetal, através da medida da circunferência O uso de tocolíticos para a inibição do
abdominal fetal maior ou igual ao percentil 75 na ecografia entre a 29a e a 33a trabalho de parto prematuro também
semana, também pode ser utilizado para indicar terapia com insulina34(B). não é contra-indicado8(D).

4. CUIDADOS NA ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL 6. MOMENTO E TIPO DE PARTO

Deve-se oferecer às pacientes diabéticas grávidas (pré-gestacionais e gesta- O diabetes não é uma indicação
cionais) um programa de educação em diabetes fornecido por equipe multipro- absoluta de cesariana. Nas gestan-
fissional. As consultas devem ser direcionadas para o cuidado do diabetes, além tes bem controladas, a indicação da
de toda a rotina pré-natal básica. via de parto é obstétrica. Permite-se
A avaliação do controle glicêmico deve ser feita a cada uma ou duas semanas o uso de anestesia de bloqueio para
pelo médico assistente ou por um membro da equipe multiprofissional. Realizar alívio das dores do trabalho de par-
entre a 18a a 20a semana de gravidez uma ecocardiografia fetal para a avaliação to, principalmente na presença de
das quatro câmaras cardíacas, objetivando a visualização de disfunção anatômica comorbidades, tais como obesidade
ou funcional do coração fetal22(A). Os objetivos da avaliação fetal são verificar a e neuropatia autonômica. Deve-se
vitalidade no primeiro trimestre, a integridade estrutural no segundo trimestre e controlar os níveis de glicemia capilar
monitorar o crescimento e o bem-estar fetal no terceiro trimestre (tabela 3). a cada hora durante todo o trabalho
de parto e em todo o período pós-
TABELA 3 - Avaliação fetal na gestação complicada pelo diabetes anestésico. O parto eletivo pode ser
realizado após 38 semanas comple-
Primeiro trimestre US para avaliar IG / TN e rastrear más-formações fetais. tas de gestação, através de indução
Segundo trimestre • US morfológico para rastreamento de más-formações: 20a do trabalho de parto ou cesariana, se
a 24a semana houver indicação8( D).
• Doppler das artérias uterinas: 20a semana
• Ecocardiograma fetal: 26a semana (nas diabéticas prévias)
7. CONTROLE GLICÊMICO
• US a cada duas semanas a partir da 24a semana para avaliar
DURANTE O PARTO
crescimento fetal e polidramnia
Terceiro trimestre • US a cada duas semanas até a 34a semana; a seguir, sema- Deve-se controlar a glicemia capi-
nal, com cálculo de peso lar de hora em hora durante o parto
• CTG basal semanal a partir da 30a semana para manter os níveis entre 70 e 120
• Doppler, se houver HAS, toxemia ou vasculopatia mg/dl. Caso a concentração não seja
mantida nestes níveis, é preciso fazer
• Contagem de MF diários três vezes dia em decúbito lateral
esquerdo a partir da 28a semana uso intravenoso de glicose e/ou in-
sulina em forma de infusão contínua
IG: idade gestacional; TN: transluscência nucal; HAS: hipertensão arterial sistêmica; MF: movimentos fetais
endovenosa7(D). Em pacientes com
Nas gestantes com controle glicêmico ruim e nas hipertensas, os testes que avaliam o diabetes tipo 1, considerar a possi-
bem-estar fetal podem ser antecipados e realizados com intervalo menor, já que o risco bilidade do uso de glicose ou insu-
de morte fetal é proporcional ao grau de hiperglicemia materna. lina desde o início do trabalho de
parto7(D). Usuárias de bomba de in-
5. TRABALHO DE PARTO PRÉ-TERMO EM MULHERES COM DIABETES fusão contínua de insulina devem ter
ajustada a programação da infusão do
O uso de corticoesteróides para maturação pulmonar fetal não é contra-indicado, medicamento, dependendo do tipo
mas dever ser administrado de forma concomitante com monitorização intensiva da de parto realizado.

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2008 Diretrizes SBD

8. CUIDADOS INICIAIS A SEREM hipomagnesemia. É importante ter hipoglicemia nos bebês, embora
TOMADOS COM O RECÉM- critérios bem definidos para admis- seja muito reduzido o número de ca-
NASCIDO são em uma unidade de terapia in- sos estudados36.
tensiva neonatal, como hipoglicemia, Deve-se continuar evitando quais-
Deve-se aconselhar as pacientes presença de sinais clínicos anormais quer drogas para o tratamento das
a dar à luz em hospitais onde existam que sugiram imaturidade pulmonar, complicações do diabetes que foram
unidades de cuidados intensivos com descompensação cardíaca ou encefa- descontinuadas por razões de seguran-
atendimento por 24 horas. É preciso lopatia neonatal. ça no período pré-concepcional, como
manter o recém-nascido com a mãe, a os inibidores da enzima de conversão
não ser que surja uma complicação clí- da angiotensina, bloqueadores do re-
nica que necessite internação em uni- 9. CUIDADOS PÓS-NATAIS COM ceptor da angiotensina e estatinas. É
dade de terapia intensiva7(A). O DIABETES preciso encaminhar as pacientes por-
O recém-nascido deve ser amamen- tadoras de diabetes pré-gestacional
tado o mais rápido possível após o parto para seus locais originais de tratamen-
(dentro de 30 minutos) e depois a cada 9.1 - DIABETES PRÉ-GESTACIONAL to e lembrá-las da importância da con-
duas ou três horas até que a amamen- tracepção e dos cuidados pré-concep-
tação mantenha as concentrações de Deve-se reduzir a dose de insulina cionais que devem ter, caso estejam
glicose sangüíneas entre as mamadas imediatamente após o parto em mu- planejando engravidar no futuro.
em pelo menos 40 mg/dl. Deve-se me- lheres que faziam seu uso no período
dir a concentração de glicose sangüínea pré-gestacional. Também é preciso
a cada duas a quatro horas após o nas- monitorar os níveis de glicemia de ma- 9.2 - DIABETES GESTACIONAL
cimento. Somente em caso de concen- neira rigorosa, para estabelecer a dose
trações de glicose sangüínea menores apropriada, e informar às pacientes do Deve-se descontinuar a terapia
de 40 mg/dl em duas medidas conse- risco aumentado de hipoglicemia no com insulina imediatamente após
cutivas ou na presença de sinais clínicos período pós-natal, especialmente se o parto, testar os níveis de glicemia
sugestivos de hipoglicemia ou, ainda, elas estiverem amamentando (sendo, para excluir a presença de hiperglice-
se o recém-nascido não conseguir se então, aconselhável fazer uma refei- mia persistente antes da alta hospita-
alimentar de forma eficaz por via oral, ção ou lanche antes ou durante as lar e aconselhar a paciente a procurar
medidas adicionais, tais como alimen- mamadas)12(D). tratamento médico caso sintomas de
tação por sonda ou injeção de glicose O retorno ou continuação do hiperglicemia apareçam. É preciso
intravenosa, devem ser adotadas. uso de agentes antidiabéticos orais, também orientar a fazer mudanças
Deve-se também testar os níveis como metformina e glibenclamida, no estilo de vida, como redução do
de glicose sangüínea em recém-nas- imediatamente após o parto em pa- peso, dieta balanceada e prática re-
cido que apresente sinais clínicos de cientes com diabetes tipo 2 pré-exis- gular de exercícios físicos. Realizar
hipoglicemia (como hipotonia mus- tente, que estiverem amamentando, pelo menos uma dosagem de glice-
cular, nível de consciência rebaixado embora controverso, pode ser consi- mia de jejum seis semanas pós-par-
e apnéia) e iniciar tratamento com gli- derado. Apenas 0,4% da dose de me- to e, depois, anualmente (B). Por fim,
cose intravenosa o mais precocemen- tformina ingerida pela mãe é detec- informar sobre o risco de diabetes
te possível7(A). É preciso fazer eco- tada no leite materno e a presença gestacional em gravidezes futuras,
cardiograma no recém-nascido com da medicação no leite independe do realizar o rastreamento para diabetes
sinais sugestivos de doença cardíaca horário da tomada. Estudos com pe- ainda no período pré-concepcional
congênita ou cardiomiopatia. quena casuística (no máximo, nove quando planejar outras gestações e
Exames confirmatórios devem ser crianças) não detectaram a droga solicitar a realização de automonito-
realizados nos casos de presença de si- nos lactentes35. A glibenclamida e a rização da glicemia capilar e um teste
nais clínicos sugestivos de policitemia, glipizida não foram detectadas no oral de tolerância à glicose precoce-
hiperbilirrubinemia, hipocalcemia ou leite materno e não foi verificada mente em gestações futuras.

69
Diretrizes SBD Disglicemias na gestação

TABELA 4 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Nível de evidência

Pacientes diabéticas devem engravidar em condições metabólicas ideais (HbA1c < 6% ou até 1% acima
do valor máximo informado pelo laboratório). B
Motivar as pacientes a realizarem glicemias capilares antes e após as refeições, ao deitarem-se e espora-
dicamente ente 2 e 4 horas da manhã. C
A quantidade de calorias deve ser baseada no IMC. A distribuição recomendada do conteúdo calórico
é de 40% a 55% de carboidratos, 15% a 20% de proteínas (no mínimo, 1,1 mg/kg/dia) e 30% a 40% de B
gorduras.

O uso de ácido fólico desde o período pré-concepcional até o fechamento do tubo neural é recomenda-
do para todas as mulheres, inclusive para aquelas que têm diabetes. A
A prática regular de exercícios físicos causa sensação de bem-estar, diminuição do ganho de peso, re-
dução da adiposidade fetal, melhora do controle glicêmico e diminuição de problemas durante o traba-
lho de parto. Tal prática está contra-indicada em caso de doença hipertensiva induzida pela gestação,
ruptura prematura de membranas, trabalho de parto prematuro, sangramento uterino persistente após
A
o segundo trimestre, crescimento intra-uterino retardado, síndrome nefrótica, retinopatia pré e prolife-
rativa, hipoglicemia sem aviso, neuropatia periférica avançada e disautonomia.

Mundialmente, prevalece a recomendação da descontinuação do uso de antidiabéticos orais e sua subs-


tituição por insulina, de preferência antes da gravidez ou logo após seu diagnóstico. Estudos recentes
mostraram segurança do uso de metformina durante a gestação e do uso de glibenclamida em pacien- B
tes portadoras de DG a partir do segundo trimestre.

Os análogos de insulina de ação ultra-rápida, como a insulina aspart e lispro, são seguros durante a
gestação e levam a uma melhora dos níveis de glicemia pós-prandial e diminuição da ocorrência de
hipoglicemias. A insulina humana NPH é a primeira escolha entre as insulinas de ação intermediária. Não A
existem ainda estudos consistentes com o uso dos análogos de insulina detemir e glargina.

Suspender o uso de inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA), de bloqueadores do


receptor da angiotensina (BRA) e de estatinas, devido a sua associação com embriopatias e fetopatias, A
antes da gravidez ou tão logo a mesma seja confirmada.

A título de simplificação do diagnóstico de diabetes gestacional, deve-se realizar uma glicemia de jejum
na primeira consulta pré-natal. Caso esta seja ≥ 85 mg/dl e a paciente apresentar fatores de risco para
o DG, deve-se realizar o GTT oral com 75 gramas de glicose anidra. Caso o teste seja normal, deverá ser A
repetido entre a 24a a 28a semana de gestação.

Não se deve fazer o diagnóstico com exame de glicemia feita ao acaso, com teste de sobrecarga com
50 gramas de glicose e glicosúria. Deve-se realizar entre a 18a e a 20a semana de gravidez uma ecocar-
diografia fetal para a avaliação das quatro câmaras cardíacas, objetivando a visualização de disfunção B
anatômica ou funcional do coração fetal.

Realizar pelo menos uma dosagem de glicemia de jejum seis semanas pós-parto e, depois, anualmente. B

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71
Diretrizes SBD 2008

Cirurgia para diabetes

1. INTRODUÇÃO

Diabetes tipo 2 tem assumido proporções epidêmicas em vários países do


mundo, incluindo o Brasil, sendo o aumento da prevalência do sobrepeso e da
obesidade uma das principais explicações para este fenômeno. A redução do peso
através de mudanças comportamentais (hábitos alimentares, atividade física, su-
porte psicológico etc.) associadas, às vezes, ao uso de anorexígeno tem sido preco-
nizada pela maioria dos autores como ponto central para o controle glicêmico.
Apesar dos avanços obtidos na compreensão dos mecanismos envolvidos na
fisiopatogenia da obesidade e sua relação com o diabetes, acrescido ao surgimen-
to de novos agentes terapêuticos para redução de peso, os resultados em médio
e longo prazo continuam desapontadores. Segundo diversos consensos de trata-
mento, incluindo a posição oficial da Associação Brasileira para o Estudo da Obesi-
dade e da Síndrome Metabólica (Abeso), nos pacientes com obesidade grau III ou
mórbida (IMC ≥ 40 kg/m2) ou grau II (IMC entre 35 e 39,9 kg/m2) com comorbida-
des graves, nos quais tenha havido falha dos tratamentos clínicos, a cirurgia antio-
besidade ou bariátrica é uma opção terapêutica, com sua eficácia documentada
em inúmeros estudos controlados. Apesar da importância da redução do peso re-
sultante do tratamento cirúrgico, este não parece ser o único e talvez nem o mais
importante fator no controle e, algumas vezes, no desaparecimento do diabetes.
Com a incidência do diabetes tipo 2 aumentando em todo o mundo1(A) e devi-
do a sua elevada morbidade, novas formas de tratamento vêm sendo pesquisadas.
O estudo Steno 22(A) mostrou a interessante redução de mortalidade com trata-
mento intensivo, diminuindo para uma morte para cada cinco pacientes tratados.
Porém, dados do NHANES3(A) mostram que o controle glicêmico adequado acon-
tece em somente 35,8% dos pacientes diabéticos, representando o que se vê na
prática clínica diária. Essa percepção de que o diabetes é uma doença crônica, pro-
gressiva e de difícil controle nos leva a tentativas freqüentes de novas abordagens,
que evidentemente necessitam passar por um crivo científico adequado.
Nos últimos anos, temos visto o aumento crescente de trabalhos que avaliam
o efeito das cirurgias bariátricas no controle do diabetes, assim como de novos
procedimentos cirúrgicos que objetivam uma abordagem mais fisiopatológica
da doença. Sendo uma doença tratada há milênios de forma clínica, uma série

72
2008 Diretrizes SBD

de controvérsias éticas surge na análise e aceitação dos procedimentos cirúrgicos


para tratamento e eventual remissão do diabetes.
Procedimentos cirúrgicos em diabéticos obesos têm conseguido levar a re-
missão da doença em longo prazo4(A). A cirurgia bariátrica, em especial a gastro-
plastia com derivação gástrica em Y de Roux5(A) e as cirurgias disabsortivas6(A),
é efetiva em controlar o DM2 em cerca de 80% a 100% dos pacientes diabéticos
obesos. Um estudo de meta-análise7(A) mostrou remissão de 80% dos casos de
DM2, em 22.094 pacientes avaliados (tabela 1).

TABELA 1 - Estudo de meta-análise mostra remissão de 80% dos casos de DM2

Excesso de Resolução do
peso perdido diabetes

Banda gástrica 47,5% 47,9%


Bypass com roux em Y 61,6% 83,7%
Derivação bilio-pancreática 70% 98,9%

FIGURA 1 - Tipos de cirurgia – gastro- FIGURA 3 - Tipos de cirugia – bypass FIGURA 5 - Tipos de cirurgia – derivação
plastia tubular sleeve gástrico com Y em Roux bilio-pancreática com duodenal switch

FIGURA 2 - Tipos de cirurgia – bypass FIGURA 4 - Tipos de cirurgia – derivação FIGURA 6 - Tipos de cirurgia – interposição
duodeno-jejunal bilio-pancreática Scopinaro ileal – freio neuroendócrino

73
Diretrizes SBD Cirurgia para diabetes

2. FISIOPATOGENIA experimentais em camundongos sub- hormonal. Naslund et al.14(C) reporta-


metidos a esta técnica mostraram que ram altos níveis de GLP-1 em pacien-
Os mecanismos fisiopatológicos os animais apresentaram aumento de tes submetidos ao bypass jejuno-ileal
pelos quais a cirurgia bariátrica atinge GLP-1 e peptídeo YY16,24,25(C). De Paula após 20 anos, sugerindo que o DM2
estes resultados ainda não estão bem et al. demonstraram resultados em hu- possa ser controlado de maneira ade-
entendidos. Acredita-se que as possí- manos que substanciam essa última quada pelo GLP-1 em longo prazo.
veis explicações sejam a restrição caló- hipótese18-21(C). Mason15(C), por fim, sugeriu que a in-
rica, a perda de peso e alterações hor- Rubino et al.26,27(C) advogam uma terposição ileal poderia ser a cirurgia
monais no eixo entero-insulínico8-10(A). segunda hipótese (distal ou foregut), ideal para o tratamento do DM2.
Como há normalização das glice- na qual haveria um fator aberrante hi- Patriti et al.16(C) realizaram interpo-
mias em obesos diabéticos antes que perglicemiante produzido no intestino sição ileal em ratos diabéticos magros
ocorra perda de peso6,22(A), em poucos proximal (fator antiincretina ou fator de da raça Goto-Kakizaki e concluíram que
dias ou semanas após a cirurgia bariátri- Rubino), cuja produção e secreção au- o procedimento foi efetivo na indução
ca, advoga-se que outros mecanismos, mentada estaria presente no paciente da melhora na tolerância à glicose, sem
independentes do fator peso, estejam com diabetes. Estudos experimentais afetar o peso e a dieta. Strader et al.17(C),
envolvidos no controle metabólico. O em camundongos GK demonstraram trabalhando com ratos, também realiza-
conhecimento da participação de hor- desaparecimento do diabetes pela ram uma interposição ileal e demonstra-
mônios gastrointestinais na secreção exclusão cirúrgica (exclusão duodenal ram um aumento da secreção de GLP-1
de insulina e glucagon pelas células ou switch duodenal) da passagem do e PYY, além de melhora na tolerância à
das ilhotas pancreáticas fez com que alimento pelo intestino proximal pela glicose e sensibilidade insulínica, inde-
inúmeros cientistas passassem a es- redução deste fator antiinsulinêmico pendente de perda de peso.
tudar as alterações destes hormônios hiperglicemiante. De Paula et al.18-20(C) realizaram a in-
(incretinas) em pacientes diabéticos Gumbs et al.11(C) sugeriram que a terposição ileal em pacientes com dia-
e não-diabéticos submetidos a estes melhora do metabolismo glicêmico e betes tipo 2 e IMC menor que 30 kg/m2,
procedimentos cirúrgicos. da resistência insulínica, que se seguem obtendo um controle glicêmico com
Dois mecanismos têm sido pro- após cirurgias bariátricas, sejam devido à A1c < 7 em 84% a 90% dos pacientes,
postos para explicar estas alterações: diminuição do estímulo entero-insulíni- a depender da técnica utilizada. Hou-
a exposição precoce dos alimentos co, através da restrição calórica no segui- ve aumento importante da área sobre
ao intestino proximal e a exclusão mento em curto prazo, perda de peso e a curva do GLP-1 e aumento da secre-
duodenal11,23(B). O primeiro mecanismo alteração na secreção de cininas através ção de insulina. Em dados já enviados
também é conhecido como hipótese do tecido adiposo em longo prazo. para publicação, DePaula21(C) mostrou
distal (hindgut), onde a incretina GLP-1 Pories8(B) propôs que a estimula- o efeito positivo e redundante da cirur-
(glucagon-like-peptide-1), secretada pe- ção excessiva de incretinas intestinais gia no perfil hormonal, avaliando GLP-
las células L localizadas principalmente em indivíduos vulneráveis possa cau- 1, GIP, insulina, glucagon, peptídeo-C,
no intestino e cólon, em contato preco- sar o DM2 e que a cura através da ci- amilina, colecistocinina (CCK), PPP, so-
ce com os alimentos, teria sua secreção rurgia esteve relacionada à perda deste matostatina, PYY, grelina, adiponecti-
aumentada e, por conseqüência, esti- estímulo. Rubino et al.12(C) advogaram na, resistina, leptina e interleucina-6.
mularia a produção de insulina pelas a presença de um fator intestinal deri- Pitombo et al.28(C) estudaram o efei-
células beta pancreáticas. vado do excesso de estímulo no tubo to da remoção da gordura visceral na
Um dos procedimentos cirúrgicos digestivo superior como causa da defi- homeostase glicêmica, transdução da
propostos para produzir este fenôme- ciência do efeito incretínico. sinalização insulínica e adipocinas sé-
no é a interposição ileal, que envolve a Wickremesekera et al.13(C) demons- ricas em ratos suíços com obesidade e
transposição de um segmento do íleo traram que a melhora ou a resolução diabetes induzida por dieta. Estes ani-
distal para o jejuno, promovendo uma do DM2 por cirurgias do tipo derivação mais, quando comparados com os do
exposição precoce dos alimentos às cé- gástrico, em curto prazo, como seis grupo-controle (magro não-diabético),
lulas L produtoras de GLP-1 e aumen- dias, bem antes de efetiva perda de apresentavam aumento significativo
tando a sua produção e secreção. Estudos peso, seja consistente com um efeito das glicemias e insulinemias basais,

74
2008 Diretrizes SBD

assim como da resistência insulínica após um ano, se manteve em torno de O melhor procedimento cirúrgico
avaliada pelo teste de tolerância a in- 155 mg/dl. Não houve diferença esta- dependerá da experiência do grupo ci-
sulina. Ocorreram também nestes ani- tística na massa gorda, IMC e sensibili- rúrgico, da preferência do paciente, da
mais alterações na transdução do sinal dade insulínica medida pelo KITT. estratificação de riscos e de outros fa-
da insulina através dos receptores de tores. Entretanto, o cirurgião deve exer-
insulina, substrato do receptor insulina cer cautela ao recomendar a derivação
1 e 2 (IRS-1 e IRS-2) e AKT no músculo. 3. DIRETRIZ bilio-pancreática com ou sem exclusão
Os níveis séricos das citoquinas pró-in- duodenal, devido a maiores riscos as-
flamatórias - fator necrose tumoral alfa, Se o efeito antidiabético da cirurgia sociados a estes procedimentos. A via
interleucina 1 (IL-1) beta e interleucina 6 gastrointestinal não ocorre apenas na laparoscópica tem preferência sobre
(IL-6) - estavam aumentados de manei- população obesa e o mecanismo pare- os procedimentos abertos, desde que
ra significativa, enquanto os valores da ce ser independente da perda de peso o time cirúrgico tenha experiência com
adiponectina apresentavam-se reduzi- e da ingestão calórica, torna-se, então, o procedimento.
dos nos animais com obesidade e dia- possível uma nova modalidade tera- Uma abordagem cirúrgica ideal
betes induzida por dieta. Após a remo- pêutica: a da cirurgia metabólica ou não pode se concentrar somente em
ção cirúrgica da gordura visceral, houve cirurgia do diabetes, na qual o proce- perda de peso, mas ir além, atuando e
normalização dos valores das glicemias dimento cirúrgico é usado de maneira corrigindo as diversas alterações que
e insulinemias basais, dos parâmetros intencional para tratar o diabetes. provocam a doença, como:
de avaliação da resistência insulínica, na O entendimento fisiopatológico do • Defeito da primeira fase de secre-
transdução da sinalização insulínica e diabetes é complexo e toda abordagem ção de insulina;
nos níveis de adipocinas. nova de tratamento acaba levando a um • Defeito da secreção de insulina na
Geloneze et al.29(C) mostraram se- melhor entendimento da doença. O uso fase tardia;
guimento de um ano de tratamento ci- da cirurgia para tratar o diabetes deve • Resistência insulínica;
rúrgico de 15 pacientes diabéticos tipo ser olhado com muita responsabilidade. • Secreção inadequada de glucagon;
2 não-obesos, submetidos a exclusão • Secreção deficiente de incretinas;
É necessária a formação de equipes mul-
• Melhorar outros fatores de risco
duodenal. Houve redução na necessi- tidisciplinares que entendam essa fisio-
cardiovasculares, como hipertensão
dade de insulinização, sendo que, dos patologia a fundo, pois indicar a cirurgia
arterial, dislipidemia, obesidade abdo-
15 pacientes operados, somente dois baseado-se somente no IMC nos parece
minal e outros.
precisavam de insulina após um ano. um empobrecimento do conhecimento
A comunidade médica vê com
A A1c inicial de 8,9% permaneceu alta, já conquistado pelos endocrinologistas.
grande expectativa e esperança as
com média de 7,9% após um ano. A gli- Os critérios de exclusão devem ser rigi-
novas formas de tratamento que ve-
cose inicial era de 182 mg/dl no basal e, damente obedecidos (tabela 2).
nham ajudar no controle do diabe-
tes e eventualmente levar à remissão
da doença. No entanto, a validação
TABELA 2 - Critérios de exclusão
científica destes procedimentos faz-
• Presença de doenças endócrinas ou outras enfermidades reversíveis, que podem se necessária. A cirurgia no diabético
ser a causa da obesidade obeso, com IMC > 35 kg/m2, apesar
• Dependência de álcool ou outras drogas do alto índice de remissão, só deve
ser realizada em centros capacitados,
• Doenças psiquiátricas graves e não-controladas
com profissionais experientes e com o
• Presença de doenças hepáticas, renais, pulmonares, neurológicas ou quaisquer ou- acompanhamento de um endocrino-
tras enfermidades cuja gravidade inviabiliza o ato cirúrgico ou que limite de modo logista. Embora ainda não aprovada
substancial a qualidade e/ou quantidade de vida do paciente
pelos consensos nacionais e interna-
• Neoplasias ou outras enfermidades terminais cionais, a cirurgia em pacientes com
• Incapacidade de compreender ou aceitar possíveis riscos e mudanças no estilo de IMC entre 30 e 35 kg/m2 tem sido acei-
vida necessário ou proveniente da cirurgia bariátrica ta por alguns autores, em especial nos

75
Diretrizes SBD Cirurgia para diabetes

pacientes com controle glicêmico de difícil obtenção pelas modalidades terapêuticas disponíveis e que estejam desenvol-
vendo complicações crônicas inerentes ao controle glicêmico inadequado.
Em relação aos procedimentos em pacientes com DM2 e IMC < 30 kg/m2, apesar de promissores, esses procedimentos ci-
rúrgicos ainda precisam de dados de longo prazo, assim como de estudos envolvendo diversos serviços, avaliação com clamp
euglicêmico e hiperglicêmico e estudos de sobrecarga de glicose, além de avaliação do impacto da cirurgia sobre doenças
cardiovasculares e mortalidade. Portanto, estes procedimentos devem ser considerados como metodologias de caráter expe-
rimental, que exigirão validades para que, somente então, possam ser utilizadas como terapêuticas de rotina.

DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES:


Os autores desta diretriz, Nelson Rassi e Sérgio Vencio, participam do grupo que pesquisa em Goiânia (GO) o freio neuroendócrino como opção
terapêutica para o tratamento cirúrgico do diabetes.

TABELA 3 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Nível de evidência

O diabetes tipo 2 tem assumido proporções epidêmicas no mundo devido ao aumento da prevalên-
cia do sobrepeso e da obesidade. A redução do peso, através de mudanças comportamentais (hábitos
alimentares, atividade física, suporte psicológico etc.) associadas, às vezes, ao uso de anorexígeno, tem
A
sido preconizada pela maioria dos autores como ponto central para o controle glicêmico.

A cirurgia bariátrica, em especial a gastroplastia com derivação gástrica em Y de Roux e as cirurgias disa-
bsortivas, é efetiva em controlar o DM2 em cerca de 80% a 100% dos pacientes.
A
Os mecanismos fisiopatológicos pelos quais a cirurgia bariátrica atinge estes resultados ainda não estão
bem entendidos, sendo as possíveis explicações relacionadas à restrição calórica, à perda de peso e às A
alterações hormonais no eixo entero-insulínico.

A interposição ileal que envolve a transposição de um segmento do íleo distal para o jejuno promove
uma exposição precoce dos alimentos às células L, produtoras de GLP-1, aumentando a sua produção C
e secreção.

No pacientes com DM 2 e obesidade grau III (IMC ≥ 40 kg/m2) ou grau II (IMC entre 35 e 39,9 kg/m2), nos
quais tem havido falha no tratamento clínico, a cirurgia bariátrica ou antiobesidade pode ser uma opção A
terapêutica.

A melhora do metabolismo glicêmico e da resistência insulínica que se seguem logo após a cirurgia
bariátrica seriam devidas à restrição calórica e a mudanças na secreção de incretinas, enquanto que a
perda de peso e as alterações na produção de cininas pelo tecido adiposo interfeririam nos efeitos em
B
longo prazo.

A seleção dos pacientes com obesidade e diabetes para tratamento cirúrgico deve ser baseada pela re-
serva de insulina nas células beta através dos valores de peptídeo-C basal e pós-estímulo e não apenas C
pelo IMC.

Constituem contra-indicação ao tratamento cirúrgico as seguintes situações: presença de doença endó-


crinas ou outras enfermidades reversíveis que podem ser causa da obesidade; dependência de álcool ou
outras drogas; doenças psiquiátricas graves e não-controladas; presença de doenças renais, hepáticas, A
cardiológicas, neurológicas ou quaisquer outras enfermidades cuja gravidade impede ou inviabiliza o
ato cirúrgico ou que limite de maneira substancial a qualidade e/ou quantidade de vida do paciente;
neoplasias ou outras enfermidades terminais; incapacidade de compreender ou aceitar possíveis riscos
ou mudanças no estilo de vida necessários ou provenientes da cirurgia bariátrica.

A via laparoscópica tem preferência sobre as cirurgias abertas, desde que o time cirúrgico tenha experi-
ência com este procedimento. A

76
2008 Diretrizes SBD

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77
Diretrizes SBD 2008

Indicação de vacinas no
paciente diabético

1. INTRODUÇÃO

As duas medidas mais efetivas na prevenção das doenças infecciosas são as


higiênicas e a imunização. A decisão para recomendar uma vacina envolve a ava-
liação dos riscos da doença, os benefícios da vacinação e os riscos associados a
sua realização.
Os pacientes com diabetes mellitus têm um maior risco presumido de in-
fecção pneumocócica grave e complicações de influenza (dados insuficientes
para calcular a taxa), sendo recomendado atenção especial a estas vacinas no
paciente diabético (tabela1).

TABELA 1 - Esquema recomendado de vacinação no adulto


Faixa etária

Vacina 19 a 49 anos 50 a 64 anos ≥ 65 anos

Tétano, difteria e pertussis (dT, dTpa) Uma dose de dT a cada dez anos
Substituir uma dose de dT por dTpa
HPV Três doses (0, 2 e 6 meses)
MMR Uma dose Uma dose
Varicela Duas doses (0 e 4 a 8 semanas)
Influenza Recomendada para diabéticos: uma dose anual Uma dose anual
Pneumocócica (polissacáride) Recomendada para diabético: uma ou duas doses Uma dose
Hepatite A Duas doses (0 e 6 a 12 meses)
Hepatite B Três doses (0,1 a 2 e 4 a 6 meses)
Meningocócica Uma dose
Zoster > 60 anos: uma dose
Febre amarela Primeira dose a partir dos 9 meses e reforço a cada dez anos (indicada para populações específicas)*
* Vacina contra febre amarela: composta de vírus vivo atenuado, indicada a partir dos 9 meses, em pessoas que vivem em regiões onde a doença é endêmica e para aquelas
que se dirigem para locais pertencentes a zonas endêmicas. É recomendada uma dose de reforço a cada dez anos (desde que o indivíduo permaneça ou viaje para locais que
pertençam a zonas de risco para febre amarela).

78
2008 Diretrizes SBD

Os níveis glicêmicos são importantes para o manejo e o acompanhamento do 4. VACINA DUPLA (DT) E
paciente diabético, porém não existem relatos na literatura de contra-indicação de TRÍPLICE BACTERIANA (DTPA)
vacinação por alteração dos níveis glicêmicos, bem como pontos de corte glicêmi-
cos que contra-indiquem as vacinas. Diabetes mellitus não é considerado contra- Todos os adultos com uma história
indicação para nenhuma vacina, respeitando suas indicações de acordo com cada de vacinação incerta ou incompleta de-
faixa etária. Estudos com vacinação pneumocócica em pacientes de alto risco (in- verão iniciar ou completar seu esquema
cluindo diabéticos, pacientes com doença coronariana, insuficiência cardíaca con- vacinal. O esquema básico de vacinação
gestiva e doença pulmonar crônica) têm evidência de eficácia em torno de 57%. para adultos consiste de três doses do
Não existem dados do risco de doença grave ou complicações de influenza no toxóide tetânico e diftérico, respeitando-
paciente diabético, contudo influenza é um fator de risco para infecção bacteria- se o intervalo vacinal mínimo de quatro
na grave. A vacinação deve ser uma estratégia essencial do cuidado primário em semanas entre a primeira e a segunda
todas as faixas etárias e, desta forma, o médico deve atualizar sempre o cartão dose e de seis meses entre a primeira e
vacinal de seu paciente. a terceira dose, devendo-se realizar uma
dose de reforço a cada dez anos. A vaci-
na dTpa (composta de toxóide tetânico,
2. VACINA PNEUMOCÓCICA toxóide diftérico e componente pertussis
acelular) pode substituir uma única dose
A vacina conjugada pneumocócica heptavalente é recomendada para todas da série básica do adulto ou uma única
as crianças na idade de 2 a 23 meses e para crianças de alto risco na idade de 24 dose do reforço. Esta formulação da vaci-
a 59 meses (tabela 2). A vacina polissacáride pneumocócica é recomendada para na tripla bacteriana contém quantidades
pacientes maiores de 2 anos. A eficácia desta vacina em pacientes diabéticos tem reduzidas de toxóide diftérico e alguns
variado em torno de 65% a 84%. Pacientes com insuficiência renal ou síndrome antígenos pertussis, sendo recomendada
nefrótica poderão receber a segunda dose após um intervalo de cinco anos da como uma única dose de reforço.
primeira dose.

TABELA 2 - Indicações da vacina conjugada pneumocócica heptavalente 5. VACINA CONTRA O


PAPILOMAVÍRUS (HPV)
História de
Idade Regime recomendado
imunização
É recomendada para todas as mu-
Crianças com diabetes Qualquer esquema incom- Uma dose a cada dois me-
mellitus, entre 24 a 59 pleto menor que três doses ses ou mais. O intervalo lheres com idade igual ou inferior a 26
meses da última dose e a outra anos. História prévia de verruga genital,
dose deve ser maior ou Papanicolau anormal ou teste de HPV
igual a dois meses após a positivo não são contra-indicações da
primeira. vacina. Uma série completa consiste de
Qualquer esquema incom- Uma dose, com o interva- três doses, devendo haver um intervalo
pleto de três doses lo da última dose igual ou mínimo de dois meses entre a primeira
maior que dois meses. e segunda dose e de quatro meses en-
tre a segunda e a terceira dose.

3. VACINA CONTRA A INFLUENZA 6. VACINA MMR (SARAMPO,


CAXUMBA E RUBÉOLA)
É recomendada atualmente para crianças com 6 meses ou mais, com diabe-
tes mellitus. Entre pacientes diabéticos, a vacinação reduziu em 54% o núme- O principal objetivo é evitar a síndro-
ro de hospitalizações e em 58% a taxa de mortalidade. Deve ser administrada me da rubéola congênita, sendo assim,
anualmente. sempre obter evidência laboratorial de

79
Diretrizes SBD Indicação de vacinas no paciente diabético

imunidade, não devendo valer-se de 9. VACINA CONTRA A HEPATITE B (a vacina conjugada meningocócica foi
história clínica de rubéola. licenciada em 2005 para uso em pesso-
A possibilidade de desenvolvimen- as de 11 a 55 anos de idade). A vacina
to da forma crônica da doença e de sua meningocócica é recomendada para
7. VACINA CONTRA A VARICELA evolução para cirrose e hepatocarcinoma pacientes de alto risco: pacientes HIV
justifica a indicação universal da vacina. positivo, pacientes com asplenia ana-
Todos os adultos sem evidência de Todos os pacientes com doença renal crô- tômica ou funcional, crianças com de-
imunidade para varicela deverão receber
nica e hepatopatias têm indicação para se- ficiência do complemento terminal ou
duas doses da vacina, com um intervalo
rem vacinados. Também é recomendada
de quatro a oito semanas entre as doses. properdina (tabela 3).
para contatantes domiciliares de pessoas
A vacina conjugada meningocó-
com infecção crônica pelo vírus da hepa-
cica 4 (VCM4) é administrada via in-
tite B. O esquema consiste de três doses e
8. VACINA CONTRA A HEPATITE A tramuscular em uma única dose de
o intervalo mínimo é de um mês entre a
0,5 ml e pode ser realizada de forma
primeira e a segunda dose e de seis meses
Quando ocorre na infância, a hepa- concomitante com outras vacinas re-
tite A desenvolve-se em geral de modo entre a primeira e a terceira dose.
comendadas. A VCM4 atua contra os
benigno e autolimitado. Porém, quan-
sorotipos A, C, Y e W135. A vacina con-
to mais tardiamente ocorre a infecção,
10. VACINA MENINGOCÓCICA jugada não é licenciada para crianças
maior o risco de desenvolvimento de
formas graves e fulminantes. O esque- de 2 a 10 anos de idade. Nestes casos,
ma vacinal é composto de duas doses, A vacina conjugada meningocóci- a recomendação é utilizar a vacina
devendo haver um intervalo mínimo ca deverá ser recomendada para todo meningocócica polissacáride (admi-
de seis meses entre elas. adolescente saudável aos 11 ou 12 anos nistrada via subcutânea).

TABELA 3 - Indicações da vacina meningocócica


Faixa etária

Indicação < 2 anos 2 a 10 anos 11 a 19 anos 20 a 55 anos

População geral saudável Não recomendado Não recomendado Recomendada a


vacina conjugada

População de risco: HIV Não recomendado Vacina polissacáride Vacina conjugada Vacina conjugada
positivo, asplenia, deficiência de
complemento

11. VACINA CONTRA O HERPES ZOSTER

Uma única dose da vacina contra zoster é recomendada para adultos com idade ≥ 60 anos, independente de história
prévia de herpes zoster. Não é recomendada para o tratamento de neuralgia pós-herpética ou para o episódio agudo de
herpes zoster.

REFERÊNCIAS

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2. CDC. Recommended adult immunization schedule- United States, October 2007- September 2008. MMWR 2007; 56: Q1-Q4.

80
2008 Diretrizes SBD

Síndrome metabólica em
crianças e adolescentes

1. INTRODUÇÃO

A prevalência da obesidade tem aumentado entre adultos e crianças. Nos


Estados Unidos, a prevalência de crianças obesas dobrou entre 1976 e 20021(A).
A disponibilidade abundante de alimentos com alto teor calórico e o sedenta-
rismo ligado a atividades como televisão, jogos eletrônicos e computadores
são algumas das causas do aumento do número de crianças obesas. Com o
crescimento da obesidade infantil, as complicações associadas tornam-se mais
comuns. Assim como no adulto, a obesidade infantil leva ao aparecimento de
doenças, como diabetes mellitus tipo 2 (DM2), hipertensão arterial sistêmica e
dislipidemia, que conferem aumento do risco de eventos cardiovasculares. O
DM2, por exemplo, tem crescido de maneira dramática entre os adolescentes
nos últimos 20 anos2(A).
No adulto, a associação entre obesidade e doença coronariana está bem
estabelecida. Essa associação levou nos anos mais recentes à criação do termo
SM para definir aqueles indivíduos que teriam mais chances de desenvolver
eventos cardiovasculares devido a uma base fisiopatológica comum entre os
componentes da síndrome, possivelmente orquestrada pela obesidade cen-
tral. Entre os fatores incluídos na SM, estão a obesidade visceral, a dislipidemia
aterogênica, a hipertensão e a resistência à insulina.

2. CRITÉRIOS PARA DEFINIÇÃO DE SÍNDROME METABÓLICA EM


CRIANÇAS E ADOLESCENTES

No estabelecimento de critérios para definir a SM em crianças e adolescentes,


um primeiro desafio que se coloca é a medida da circunferência abdominal. Crité-
rio importante que faz parte de várias definições de SM, apontado como impor-
tante indicativo de obesidade visceral, leva ao questionamento de como medir a
circunferência abdominal na criança.
Há diferenças entre os estudos no que concerne à medida da circunferên-
cia abdominal. Alguns autores definem a mensuração da circunferência abdo-
minal no ponto médio entre o rebordo costal e o topo da crista ilíaca 3(D)

81
Diretrizes SBD Síndrome metabólica em crianças e adolescentes

(mesmo procedimento utilizado em em 19987(D), e a NCEP/ATP-III8(D), segundo gráfico de IMC ajustado para
adultos), enquanto outros não des- definida em 2001. A primeira exige sexo e idade (disponível em www.cdc.
crevem o modo de medição4(D), infe- como obrigatória a resistência à insu- gov).
rindo-se que seja semelhante ao usa- lina, enquanto na segunda esta pode Entre os 1.513 indivíduos arro-
do pelos primeiros autores, já que os estar ausente. Apesar desta diferen- lados no estudo, o autor encontrou
critérios foram baseados no National ça, os estudos mostram prevalência prevalência de 4,2%, usando-se a
Cholesterol Education Program Adult semelhante em adultos, comparando primeira definição (OMS) e 8,4%
Treatment Panel III (NCEP/ATP-III) para as duas classificações9(D). Uma nova aplicando a segunda (NCEP/ATP-III).
adultos. Outros compararam a preva- proposta de classificação foi apre- Além da enorme diferença encon-
lência de SM em crianças utilizando sentada em 2005 pela International trada entre os dois grupos, o que
os critérios definidos pelo NCEP/ATP- Diabetes Federation (IDF)10(D). Esta chama atenção é uma prevalência
III e pela Organização Mundial da considera como o mais importante bem menor do que a encontrada
Saúde (OMS), preferindo usar o pon- marcador a obesidade visceral deter- em adultos, estimada em 24%9(D). A
to entre a cicatriz umbilical e a crista minada pela medida da cintura, pela provável justificativa seria devido a
ilíaca superior5(D). Um estudo com primeira vez com propostas de limi- uma prevalência menor de obesida-
meninas de 6 a 9 anos usou a medida tes específicos por etnia. de em adolescentes comparando-se
no ponto médio entre a décima cos- Quando se tenta usar estas classi- com adultos. É possível conjeturar
tela e a crista ilíaca6(D). Vemos que é ficações em crianças e adolescentes, que pode não ter havido tempo su-
de suma importância a normatização observam-se resultados conflitantes. ficiente para a obesidade central de-
de uma medida no intuito de não ha- Goodman et al.5(D) tentaram deter- flagrar os mecanismos responsáveis
ver discordância de resultados, tanto minar a prevalência de SM entre ado- para o aparecimento dos fatores de
para uso clínico como para estudos lescentes usando a definição da OMS risco associados. Sendo assim, nas
epidemiológicos. e do NCEP/ATP-III. Foram utilizados últimas décadas, vêm sido propos-
A classificação de SM em adultos, os mesmos pontos de corte para os tas classificações baseadas em mo-
apesar de ainda amplamente discuti- fatores de risco destas duas classifica- dificações dos critérios para adultos
da, é bem estabelecida. As duas prin- ções, com exceção da obesidade, que no intuito de se identificar crianças e
cipais definições são a da OMS, criada foi definida como IMC ≥ percentil 95%, adolescentes com SM (tabela 1).

TABELA 1 - Propostas de classificação de síndrome metabólica em crianças e adolescentes

Três ou mais dos cinco


Cook et al. De Ferranti et al. Weiss et al.
critérios abaixo:

Adiposidade: circunferência CA ≥ percentil 90% CA > percentil 75% IMC escore Z ≥ 2


abdominal (CA) ou IMC

Glicemia de jejum ou no Glicemia de jejum ≥ 110 Glicemia de jejum ≥ 110 Glicemia no TTGO de 140 a 200
TTGO (mg/dl)

Pressão arterial ≥ percentil 90% > percentil 90% > percentil 95%

Colesterol HDL (mg/dl) ≤ 40 < 50 (meninas) e < 45 (meninos) < percentil 5%

Triglicerídeos (mg/dl) ≥ 110 ≥ 100 > percentil 95%

82
2008 Diretrizes SBD

Um dos primeiros estudos anali- estratificado para crianças com IMC entre estes a obesidade, que foi avalia-
sando a SM em crianças foi realizado ≥ percentil 85% para idade e sexo. O da através do IMC em vez da circunfe-
por Cook et al. em 20033(D). Utilizan- que explica esta prevalência conside- rência abdominal utilizada em outros
do dados do NHANES III (Third Natio- ravelmente maior do que a encontra- estudos. Os autores defendem o uso
nal Health and Nutrition Examination da por Cook foram os pontos de corte do IMC, dizendo ser este menos sujeito
Survey, 1988-1994), o autor avaliou os em relação à circunferência abdo- a variações decorrentes da puberdade
adolescentes de 12 a 19 anos aplican- minal e o perfil lipídico. Em relação à ou raça. Além disso, afirmam ter o IMC
do os critérios definidos para SM de circunferência abdominal, o ponto de uma forte correlação com adiposidade
acordo com o NCEP/ATP-III com algu- corte utilizado foi o percentil > 75% visceral e que o mesmo se correlaciona
mas modificações. A primeira delas é ao invés de 90% usado por Cook et al. melhor com a pressão arterial e com o
que obesidade foi definida como cir- Diferentes pontos de corte também fo- perfil lipídico do que a medida de cir-
cunferência abdominal maior ou igual ram utilizados para o perfil lipídico. Isto cunferência abdominal14(A).
ao percentil 90%, para idade e sexo. levou a uma definição menos restrita, Recentemente, a International Dia-
O ponto de corte da pressão arterial ampliando o número de adolescentes betes Federation (IDF) desenvolveu uma
foi extraído de valores publicados que se encaixavam nos critérios. nova definição de SM para crianças
pelo NBPEP (National Blood Pressure Os autores defendem seus critérios (tabela 2)15(D). Nesta nova definição, a
Education Program)11(D). Além disso, utilizados afirmando que estes estão população pediátrica foi dividida em
os valores de referência para o perfil relativamente mais próximos daqueles grupos de acordo com a idade, pelo
lipídico foram retirados do National usados nos adultos. Exemplificando: o fato de haver diferenças de desenvol-
Cholesterol Education Report on Lipid colesterol HDL de 40 mg/dl apontado vimento entre crianças e adolescentes:
Levels in Children12(D). por Cook representa o percentil 10% de 6 a 10 anos, de 10 a 16 anos e acima
Os resultados mostraram uma pre- a 25% em meninos e 10% a 15% em 16 anos. Crianças menores de 6 anos
valência de 4,2% de SM na amostra meninas, menor que o percentil cor- foram excluídas devido à falta de da-
analisada. Quando estratificados pelo respondente a 40 mg/dl de adultos. O dos em relação a esta faixa etária.
IMC, 28,7% dos adolescentes obesos nível de triglicérides de 110 mg/dl re- A entidade sugere que a SM não
(IMC ≥ 95% por percentil para idade presenta o percentil pediátrico de 85% deve ser diagnosticada em crianças
e sexo) preencheram critério para SM. a 95%, também maior do que o per- com menos de 10 anos, porém, redu-
Esta prevalência não é surpreendente centil adulto de 75% a 85%. Por fim, o ção de peso deve ser fortemente reco-
se considerarmos que cerca de 7% dos ponto de corte no percentil 90% usado mendada para aqueles com obesidade
adultos entre 20 e 29 anos são afetados para circunferência abdominal é bem abdominal. Acima de 10 anos, a SM é
pela SM9(D). Os autores, no trabalho, maior do que o percentil 75% usado diagnosticada através da presença de
defendem o uso da medida de circun- no critério de adultos do NCEP/ATP-III. obesidade abdominal associado a dois
ferência abdominal em vez de outras Portanto, no estudo de Ferranti, foi uti- ou mais critérios clínicos. Com exceção
medidas de obesidade, como o IMC, lizada uma definição pediátrica baseada da medida de circunferência abdomi-
afirmando ser a distribuição corporal intimamente nos critérios adultos defi- nal, os pontos de corte para os outros
de gordura um forte indicativo de corre- nidos pelo NCEP/ATP-III. critérios, como pressão arterial, perfil li-
lação com risco cardiovascular. Em um estudo que envolveu 429 pídico e glicemia, foram estabelecidos
A mesma população foi analisada crianças classificadas como obesas, através de valores fixos, sem conside-
por Ferranti et al. em 20044, porém Weiss et al.13(D) analisaram indivíduos rar os índices de percentil para idade e
foram usados critérios diferentes de 4 a 20 anos, encontrando o valor de sexo. Isso vai contra a tendência obser-
para definição de SM. Neste estudo, 38,7% de SM no grupo definido como vada nas outras classificações, em que
também foram usados os critérios obesos moderados (IMC com escore Z os valores em termos de percentis vêm
definidos pelo NCEP/ATP-III com mo- de 2 a 2,5) e 49,7% no grupo definido sendo cada vez mais usados, haja vista
dificações. O resultado mostrou uma como obesos graves (IMC com escore as alterações corporais e metabólicas
prevalência de 9,2% indivíduos com Z > 2,5). Neste estudo, foram utilizados que existem entre as diferentes faixas
SM na amostra e 31,2% quando critérios diferentes para definir a SM, etárias da adolescência.

83
Diretrizes SBD Síndrome metabólica em crianças e adolescentes

TABELA 2 - Definição de síndrome metabólica para crianças e adolescentes segundo a IDF

6 a 9 anos 10 a 16 anos >16 anos

Diagnóstico de SM Não estabelecido Sim (presença de obesidade abdo- Sim (presença de obesidade abdo-
minal em mais de dois critérios) minal em mais de dois critérios)

Obesidade abdominal (CA) ≥ p. 90% ≥ p. 90% Mesmos critérios usados em adultos


Glicemia de jejum (mg/dl) - ≥ 100 Mesmos critérios usados em adultos
Pressão arterial (mmHg) - sistólica/diastólica ≥130 ou ≥ 85 Mesmos critérios usados em adultos
Colesterol HDL (mg/dl) - < 40 Mesmos critérios usados em adultos
Triglicerídeos (mg/dl) - ≥ 150 Mesmos critérios usados em adultos

Apesar de mostrar-se mais ade- obesidade central na definição de adul- em adultos, pode ser aplicado às faixas
quado, um dos problemas do uso de tos e como não tendo, se fosse usada etárias menores. Alguns modelos de
percentis para idade e sexo na avalia- a classificação para crianças. classificação de SM em crianças já foram
ção dos critérios para SM é o ajuste apresentados e observa-se considerável
do valor de corte na transição para a divergência entre eles. Sendo assim, em-
fase adulta16. No adulto, os critérios 3. CONCLUSÃO bora uma padronização de critérios para a
não são baseados em distribuição de classificação da SM em crianças e adoles-
percentis, mas sim em valores fixos. Como conclusão, as crianças e adoles- centes seja necessária e ainda careça de
Assim, enquanto na criança é utiliza- centes estão sendo vítimas da epidemia estudos e discussões, os autores sugerem
do o ponto de corte de 90% para a de obesidade observada nos tempos a aplicação dos critérios da IDF.
circunferência abdominal, no adulto atuais. As complicações futuras desta si-
o valor fixo (102 cm para homens e tuação podem ser catastróficas se não
88 cm para mulheres pelos critérios forem instituídas medidas de intervenção 4. DIRETRIZ
do NCEP/ATP-III) corresponderia a preventiva. Para isso, torna-se necessário
um percentil entre 75% a 90% para identificar aqueles indivíduos com maior Aplicação dos critérios da IDF (ta-
homens e 75% para mulheres. Des- risco de desenvolver complicações decor- bela 2) para o diagnóstico de SM na
ta maneira, um indivíduo de 18 anos rentes do excesso de peso. Nesse con- infância e adolescência, para indivídu-
poderia ser classificado como tendo texto, o termo SM, usado habitualmente os de 10 a 16 anos de idade (D).

TABELA 3 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Nível de evidência

O aumento global da prevalência da obesidade em crianças e adolescentes está resultando em maior


risco de desenvolvimento de diabetes tipo 2, hipertensão arterial e dislipidemia. A
Os critérios para definir a SM em crianças e adolescentes não são específicos para esta faixa etária. D
Na definição de síndrome metabólica para crianças e adolescentes pela IDF, nos indivíduos com idade
maior que 16 anos, utilizam-se os mesmos critérios adotados para adultos. D
Não há normatização da medida da circunferência abdominal nesta faixa etária. D
O IMC teria correlação com a adiposidade visceral e, se correlacionaria melhor com a pressão arterial e
com o perfil lipídico do que a medida de circunferência abdominal.
A
Não há normatização dos pontos de corte para pressão arterial, HDL-colesterol e triglicérides nesta faixa etária. D

84
2008 Diretrizes SBD

REFERÊNCIAS 6. Golley RK, Magarey AM, Steinbeck KS, 11. National High Blood Pressure
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85
Diretrizes SBD 2008

HIV, diabetes e síndrome


metabólica

O desenvolvimento das drogas anti-retrovirais (DAR) alterou de maneira drásti-


ca a história natural da infecção pelo HIV, reduzindo a morbimortalidade e aumen-
tando a sobrevida dos pacientes. Entretanto, esse fator permitiu o aparecimento
de desordens metabólicas como resistência insulínica (RI), intolerância à glicose
ou diabetes mellitus (DM), lipodistrofia e dislipidemias responsáveis pelo aumento
significativo do risco cardiovascular em pacientes com AIDS1. Evidências consis-
tentes sugerem que essas alterações têm inicio com a infecção pelo HIV2 e se agra-
vam sobremaneira com o uso das drogas anti-retrovirais3.

1. HIV E DISLIPIDEMIA

A dislipidemia associada à infecção pelo HIV foi descrita mesmo antes do uso
das DAR e caracteriza-se pela diminuição do colesterol total, do LDL colesterol
(LDL) e do HDL colesterol (HDL) e pelo aumento dos triglicerídeos2. Essas altera-
ções são igualmente encontradas em outros estados de inflamação crônica e são,
em parte, atribuídas às elevações de mediadores inflamatórios sistêmicos, como
interferon alfa e fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa)4,5, que promovem o au-
mento da lipólise nos tecidos periféricos, maior aporte de ácidos graxos livres ao
fígado e, como conseqüência, maior síntese hepática de triglicerídeos e VLDL. A
diminuição da HDL e da LDL é explicada pela perda de peso e piora do estado
nutricional desses pacientes, além do aumento do catabolismo dessas partículas,
sobretudo da HDL, encontrado nos estados pró-inflamatórios4.
Nesses estados, ocorre não apenas diminuição, mas principalmente al-
terações importantes na composição e funções das HDL, como aumento da
proporção de pré-beta HDL (pequenas e pobres em colesterol) sobre as alfa
1 HDL (grandes e ricas em colesterol) 6, diminuição da apolipoproteína A1
(apoA1)7 e da apolipoproteína M (apoM) 8, presença da proteína sérica amilói-
de A (SSA) e aumento da fosfolipase A2. A presença da SSA em substituição
à apoA1 como principal componente protéico das HDL encontradas nos es-
tados inflamatórios contribui, não apenas para a perda da função antiinfla-
matória desta partícula, como também diminui de modo substancial a sua
capacidade de remoção de colesterol das células periféricas (efluxo de colesterol)

86
2008 Diretrizes SBD

pelo sistema ABCA1 (ATP-binding cassete protein A1), considerado uma etapa importante no transporte reverso de coles-
terol e no papel antiaterogênico das HDL7.
Estas alterações, no seu conjunto, configuram como um estado pró-aterogênico, em vários aspectos semelhantes
ao encontrado em pacientes com síndrome metabólica ou doença cardiovascular estabelecida6 (tabela 1). A adição das
drogas anti-retrovirais apenas agrava essas alterações (1A).

TABELA 1 - Alterações dos lípides e lipoproteínas encontradas com mais freqüência em indivíduos HIV positivos

Alterações Fisiopatogenia Nível de evidência

 Colesterol total Resultante da queda da LDL e HDL. B


Piora do estado nutricional e aumento do catabolismo em estados pró-in-
 LDL
flamatórios. B
Piora do estado nutricional e aumento do catabolismo por substituição da
 HDL HDL normal por HDL de fase aguda, com substituição da apoA1 por SSA A
(substância amilóide A). Aumento da proporção pré-beta/alfa1 HDL.

Aumento da síntese hepática de VLDL resultante da maior lipólise periférica


 Triglicerídeos e aporte de ácidos graxos ao fígado, além da diminuição do catabolismo pela A
lipoproteína lipase.

2. DROGAS ANTI-RETROVIRAIS mitocondrial, levando à depleção do os estudos epidemiológicos que ava-


E DISLIPIDEMIAS DNA mitocondrial e à disfunção na ca- liaram o risco de desenvolvimento de
deia respiratória. DM nesta população apresentaram
A patogênese da dislipidemia asso- Essas alterações parecem estar in- conclusões conflitantes. De Wit et al.12
ciada ao uso de anti-retrovirais envol- timamente envolvidas no desenvolvi- encontraram incidência de DM de 5,7
ve uma complexa interação entre a mento da lipodistrofia e da resistência em mil indivíduos por ano em uma
ação das drogas e fatores genéticos, insulínica no tecido muscular4. Entre- população, em sua maioria masculina
hormonais e ambientais. De maneira tanto, nem todos os pacientes expos- (73%), composta de adultos jovens (38
clássica, essas alterações se caracteri- tos aos anti-retrovirais desenvolvem anos) e com IMC normal (23 kg/m2).
zam pela elevação dos triglicerídeos, graus semelhantes de dislipidemias, Concluíram que a exposição aos anti-
pelo aumento das LDL e pela diminui- sugerindo a participação de fatores retrovirais foi fator de risco importan-
ção das HDL, com aumento na propor- genéticos e ambientais. Polimorfismos te para o desenvolvimento do DM, em
ção de LDL pequenas e densas, Lp(a) dos genes da ApoCIII e da ApoA5 estão especial o stavudine e o zidovudine.
e apo CIII4. Os inibidores de protease envolvidos no desenvolvimento de Entretanto, não há população-controle
(PI) diminuem o catabolismo das VLDL hipertrigliceridemia, bem como dieta no estudo e não podemos determinar
pela lipase periférica9 e aumentam hipercalórica e sedentarismo11(1A). se a infecção pelo HIV sem o uso das
sua síntese, no qual estão envolvidos drogas é suficiente para aumentar o
o aumento da resistência insulínica e risco de desenvolvimento de DM.
do aporte de ácidos graxos livres ao 3. HIV E DIABETES MELLITUS Em outro estudo prospectivo,
fígado10, a inibição da degradação da envolvendo mulheres-controle ver-
apolipoproteína B (apoB) no hepatóci- Apesar de inúmeras evidências re- sus HIV positiva, com e sem terapia
to e, ainda, a disfunção mitocondrial. lacionando a infecção pelo HIV e, prin- anti-retroviral, Tien et al.13 não en-
Os PI, juntamente com os nucleosíde- cipalmente, as drogas anti-retrovirais contraram aumento na incidência
os inibidores da transcriptase rever- ao desenvolvimento de resistência de diabetes pela infecção pelo HIV,
sa (NRTI), inibem a DNA polimerase insulínica, dislipidemia e lipodistrofia, apenas nos indivíduos HIV positivos

87
Diretrizes SBD HIV, diabetes e síndrome metabólica

com exposição cumulativa aos NRTI, de 20,8% versus 15,8% entre os indi- menor do que a verificada entre a po-
mas não aos PI ou aos inibidores da víduos HIV positivos e a população- pulação geral, o grau de dislipidemia,
transcriptase reversa não nucleosíde- controle, respectivamente. Nos Es- resistência insulínica e marcadores de
os (NNRTI). tados Unidos, Jacobson et al.16 e, na risco cardiovasculares foram conside-
Brown et al.14, em um estudo de Austrália, Samaras et al.17, analisando ravelmente maiores. Quando compa-
coorte realizado nos Estados Unidos, uma população majoritariamente rados aos dados de Framinghan, os
encontraram aumento da incidência masculina, encontraram diminuição pacientes HIV positivos em terapia
de DM entre os homens HIV positi- da prevalência de SM entre os indi- anti-retroviral apresentaram altera-
vos em uso de terapia anti-retroviral, víduos HIV positivos. Mondy et al.18 ções no perfil lipídico mais acentuadas
quando comparados aos controles encontraram prevalência semelhante do que os indivíduos com história fa-
HIV negativos, ajustado para idade (25,5% versus 26,5%) entre HIV po- miliar de doença cardiovascular, além
e índice de massa corpórea de 4,7 sitivos e controles e Sobieszczyk et do risco 26% maior de apresentarem
versus 1,4 casos por cem indivíduos al.19, em estudo com mulheres nor- IAM por ano de exposição aos anti-
ao ano. Neste mesmo estudo, a inci- te-americanas, encontraram aumen- retrovirais nos quatro a seis anos de
dência de DM não foi estatisticamen- to da prevalência entre as mulheres seguimento1. No Brasil, em um estudo
te diferente entre os controles e os HIV positivas quando comparadas às realizado com 180 pacientes HIV po-
indivíduos HIV positivos sem terapia controles (33% versus 22%). sitivos, Diehl et al.21 encontraram 36%
anti-retroviral. Porém, devemos con- Devemos levar em consideração, com critérios para SM. Entretanto, até
siderar o pequeno número de casos entretanto, que a prevalência de SM o presente, não dispomos de estudos
desse subgrupo. Analisados em con- é maior entre os norte-americanos comparativos com a população-con-
junto, poderíamos considerar que a (26,5%, segundo Mondy et al.18) do trole (1B).
intolerância à glicose ou o diabetes que entre os italianos (13,7%, segun-
mellitus parece ser uma desordem de do Mannucci20). Além disso, diferen-
aparecimento relativamente tardio ças na seleção da população-con- 5. HIV E LIPODISTROFIA
quando comparada à dislipidemia ou trole nos diversos estudos podem
a lipodistrofia, razão pela qual não ter contribuído para essas divergên- A lipodistrofia associada ao HIV
se conseguiu demonstrar diferenças cias. Quando comparados diferentes (LAHIV), encontrada em homens e mu-
entre os indivíduos HIV positivos sem critérios para o diagnóstico de SM, lheres HIV positivos sob terapia anti-re-
terapia anti-retroviral e os controles Samaras et al.17 encontraram preva- troviral, caracteriza-se principalmente
HIV negativos (1B). Ao que parece, lência de 18% e 14% pelo NCEP-AT- pela perda do tecido adiposo subcutâ-
a exposição às drogas contribui de PIII e pela Federação Internacional neo em extremidades (membros supe-
modo significativo para o apareci- de Diabetes (IDF), respectivamente, riores e inferiores) e na face, associada
mento do diabetes (1B). com a concordância entre os dois de a graus variáveis de alterações no te-
85%. Considerando que a lipodistro- cido adiposo troncular (visceral e sub-
fia, presente em 57% dos pacientes, cutâneo)22. O diagnóstico é baseado
4. HIV E SÍNDROME contribui para a redução do tecido na percepção pelo próprio paciente e
METABÓLICA adiposo subcutâneo, o aumento da confirmado pelo exame médico. Entre-
circunferência abdominal - critério tanto, a concordância entre o relato do
A prevalência de síndrome meta- necessário pela IDF - nem sempre é paciente e a confirmação pelo médico
bólica nos indivíduos HIV positivos encontrado, uma vez que esses indi- pode variar de 98%23 a 50%24, confor-
apresenta resultados conflitantes, víduos costumam ter IMC menor que me diferentes estudos.
mesmo quando utilizados os mes- a população-controle. Além desse aspecto, outros fato-
mos critérios diagnósticos. Em estu- De maneira curiosa, apesar da pre- res, como tempo de seguimento e
do realizado na Itália, Bonfanti et al.15 valência da SM por ambos os critérios de exposição às drogas e critérios de
encontraram aumento da prevalência entre a população HIV positiva ter sido seleção dos pacientes, explicam as

88
2008 Diretrizes SBD

consideráveis diferenças nos estudos 6.2 - DROGAS ANTI-RETROVIRAIS e relativamente segura. Porém, a
de prevalência de LAHIV, variando de monitorização das transaminases e
8% a 84%. Em média, essa prevalên- A suspensão do uso dos inibidores CPK é recomendada.
cia é da ordem de 42% e, embora sua de protease melhorou parcialmente a
fisiopatogenia não seja conhecida lipodistrofia em alguns estudos26, po- • Ezetemibe: reduz a absorção in-
por completo, vários fatores de risco rém, não em outros27,28. Entretanto, a testinal de colesterol, sem ser meta-
foram identificados: exposição aos PI, melhora da dislipidemia, resistência bolizado pelo CYP3A4. Constitui uma
tempo de infecção pelo HIV, idade, insulínica ou hiperglicemia parece alternativa aos casos de intolerância
sexo e, ainda, uso de outras classes evidente26,28. às estatinas ou, em associação a essas,
de anti-retrovirais22. Em relação à potência em induzir nos casos de hipercolesterolemia seve-
Os pacientes com diagnóstico dislipidemia, podemos considerar: ri- ra. Quando usado de forma isolada, re-
de LAHIV apresentam exacerbação tonavir > amprenavir/nelfinavir > in- duz o LDL em aproximadamente 20%.
da dislipidemia25 e aumento da dinavir/saquinavir/lopanavir > ataza-
resistência insulínica5, quando navir. As classes dos NRTI e dos NNRTI • Acido nicotínico: eficaz na hiper-
comparados aos HIV positivos sem induzem menos dislipidemia do que trigliceridemia e contribui para o au-
LAHIV. O mecanismo pelo qual os anti- os inibidores de protease. Na mudan- mento do HDL. Entretanto, tem baixa
retrovirais, sobretudo os PI e os NRTI, ça do esquema terapêutico, deve-se tolerabilidade e aumenta a resistência
induzem lipodistrofia permanece considerar a possibilidade de intera- à insulina, contribuindo para o apare-
obscuro. Contudo, algumas hipóteses ção medicamentosa e, ainda, a eficá- cimento de DM4(1B).
têm sido consideradas: 1) alterações cia em inibir a replicação viral4(1B).
na expressão de sterol regulatory
element-binding protein (SREBP-1) e 6.4 - SENSIBILIZADORES DE
inibição do transportador de glicose 4 6.3 - HIPOLIPEMIZANTES INSULINA
(GLUT4) no tecido adiposo; 2) redução
da atividade da lipoproteína lipase; • Estatinas: são as drogas mais efi- • Metformina: diminuiu a resis-
e 3) diminuição da degradação da cazes em reduzir a colesterolemia, tência insulínica e a gordura visce-
apolipoproteína B no hepatócito e com queda do LDL em 50% a 60%. ral em alguns estudos 29,30, mas não
redução da replicação mitocondrial Relativamente bem toleradas, entre- em outros 31,32. Contribuiu para me-
pela inibição da DNA polimerase22. tanto, têm interação potencial com lhora no perfil lipídico, com redu-
as drogas anti-retrovirais, pois ambas ção da trigliceridemia 29,30 e aumen-
são metabolizadas pelo citocromo to da fração HDL3 32. É indicada nos
6. TRATAMENTO P450 3A4 (CYP3A4). A fluvastatina, a casos de intolerância à glicose ou
pravastatina e a rosuvastatina devem DM, porém não é capaz de reverter
ser preferidas, por dependerem me- a lipodistrofia.
6.1 - DIETA E EXERCÍCIO nos da metabolização pelo CYP3A4.
• Tiazolidinedionas: reduzem a
A atividade física aeróbica diminui • Fibratos: promovem redução resistência insulínica de forma seme-
de maneira significativa a resistência da trigliceridemia em até 50% e po- lhante à metformina e aumentam a
insulínica, a dislipidemia e a intolerân- dem reduzir o LDL em até 25%. Sua adiponectina30. Entretanto, seus efei-
cia à glicose, além de contribuir para a associação com estatina aumenta tos sobre a lipodistrofia são contro-
redução da gordura troncular. Indiví- o risco de hepatotoxicidade e rab- versos: alguns autores encontraram
duos com hipertrigliceridemia devem domiólise, em especial a associação um aumento discreto na gordura
ser orientados a consumir dieta pobre estatina-genfibrozil. Quando ne- subcutânea periférica33,34, não con-
em gordura e carboidratos livres, além cessária, a associação pravastatina- firmado por outros35(1B), conforme
de evitar o uso de álcool4,22(1A). fenofibrato demonstrou ser eficaz tabela 2.

89
Diretrizes SBD HIV, diabetes e síndrome metabólica

TABELA 2 - Considerações sobre o tratamento

Medidas não-farmacológicas Medidas farmacológicas

Dislipidemia • Hipertrigliceridemia: dieta pobre em gorduras e • Quando necessário, utilizar fibrato.


carboidratos livres. Evitar uso de álcool. • Se necessário, utilizar, de preferência, estatinas que
• Hipercolesterolemia: dieta pobre em colesterol e não sejam metabolizadas pelo CYP3A4 (fluvastatina,
gordura saturada. pravastatina ou rosuvastatina)

Diabetes mellitus • Dieta, atividade física e perda de peso (para aqueles • Sensibilizadores (metformina e tiazolidinedionas)
com sobrepeso ou obesidade). • Se necessário, associar secretagogo
Lipodistrofia • Atividade física • Considerar a troca da droga anti-retroviral

TABELA 3 - Considerações sobre diabetes mellitus e síndrome metabólica em indivíduos HIV positivos

Considerações Nível de evidência

O aumento da incidência e/ou prevalência de DM em indivíduos HIV positivos foi demonstrado naqueles
expostos à terapia com drogas anti-retrovirais. A
Apesar de plausível, não está demonstrado que a simples infecção pelo vírus HIV (sem o uso das drogas)
aumente o risco de desenvolvimento de DM nesses indivíduos. B
Não há consenso sobre a prevalência de SM em HIV positivos. Alguns trabalhos encontraram aumento15,19;
outros, diminuição16,17; e outros18, ainda, prevalência semelhante entre HIV positivos e controles. B
Os indivíduos HIV positivos em terapia anti-retroviral apresentam risco cardiovascular aumentado, quando
comparados aos controles. A

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91
Diretrizes SBD 2008

Depressão no paciente diabético:


diagnóstico e conduta

1. INTRODUÇÃO

A depressão é um transtorno psiquiátrico com critérios diagnósticos bem


definidos, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais,
texto revisado (DSM-IV-TR)1, que estão resumidos na tabela 1.

TABELA 1 - Critérios de exclusão

A. No mínimo, cinco dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo


período de duas semanas e representam uma alteração a partir do padrão de funciona-
mento anterior, sendo, pelo menos, um dos sintomas (1) humor deprimido ou (2) perda
do interesse ou prazer. Não incluir sintomas nitidamente devidos a uma condição mé-
dica geral ou alucinações ou delírios incongruentes com o humor.

(1) Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, indicado por relato
subjetivo (por exemplo: sente-se triste ou vazio) ou observação feita por terceiros (por
exemplo: chora muito). Em crianças e adolescentes, pode ser humor irritável.

(2) Acentuada diminuição do interesse ou prazer em todas ou quase todas as ativida-


des na maior parte do dia, quase todos os dias (indicado por relato subjetivo ou obser-
vação feita por terceiros).

(3) Perda ou ganho significativo de peso sem estar em dieta (por exemplo: mais de 5% do
peso corporal em um mês) ou diminuição ou aumento do apetite quase todos os dias.
Em crianças, considerar incapacidade de apresentar os ganhos de peso esperados.

(4) Insônia ou hipersonia quase todos os dias.

(5) Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias (observáveis por outros, não
meramente sensações subjetivas de inquietação ou de estar mais lento).

(6) Fadiga ou perda de energia quase todos os dias.

(7) Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada, quase todos os dias


(não meramente auto-recriminação ou culpa por estar doente).

(8) Capacidade diminuída de pensar ou de concentrar-se ou indecisão, quase todos os


dias (por relato subjetivo ou observação feita por outros).

(9) Pensamentos de morte recorrentes (não apenas medo de morrer), ideação suicida
recorrente sem um plano específico, tentativa de suicídio ou plano específico para
cometer suicídio.
Continua

92
2008 Diretrizes SBD

B. Os sintomas não satisfazem os critérios para um episódio misto.

C. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funciona-


mento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.

D. Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos diretos de um substância (por


exemplo: droga de abuso ou medicamento) ou de uma condição médica geral (por
exemplo: hipotireoidismo).

E. Os sintomas não são melhor explicados por luto. Ou seja, após a perda de um ente
querido, os sintomas persistem por mais de dois meses ou são caracterizados por acen-
tuado prejuízo funcional, preocupação mórbida com desvalia, ideação suicida, sinto-
mas psicóticos ou retardo psicomotor.

Diversos estudos comprovam a Na última década, a depressão diabetes. Estima-se que apenas um terço
associação entre depressão e diabe- passou a ser estudada como um dos dos pacientes diabéticos com depres-
tes2. A depressão já foi associada com fatores etiológicos do diabetes11 e al- são recebe diagnóstico adequado18.
hipoglicemia3, complicações relacio- guns estudos evidenciaram que a de- É importante ressaltar que, apesar
nadas ao diabetes4, bem como com a pressão prediz a ocorrência posterior disso, o diagnóstico e o tratamento
percepção das limitações funcionais de diabetes12,13. Na população geral, a adequados podem levar à remissão
decorrentes do diabetes5. Um estudo depressão é responsável por piora na do quadro depressivo e, por sua vez, à
nacional recente, que avaliou pacien- morbidade e na mortalidade, mesmo diminuição dos riscos de morbidade e
tes diabéticos tipo 2, encontrou não na ausência de diabetes14. Um estudo mortalidade.
apenas elevada prevalência de depres- demonstrou que a depressão seria um A seguir, discutiremos os principais
são, como correlação positiva entre a importante fator de risco para doença grupos de medicamentos utilizados no
gravidade do quadro depressivo e a microvascular, doença macrovascu- tratamento da depressão e seus efeitos
gravidade da polineuropatia diabética lar, perda da autonomia e até mesmo colaterais e interações com medica-
distal simétrica apresentada pelos pa- mortalidade pelo diabetes15. A partir mentos utilizados no tratamento do
cientes6. deste estudo, também foi postulada a diabetes. Um resumo das principais
Já foi demonstrado que os níveis existência de um efeito sinérgico en- medicações utilizadas e suas doses ha-
de depressão em diabéticos são pelo tre a depressão e o diabetes, ou seja, o bituais pode ser visto na tabela 219.
menos duas vezes maiores do que em efeito das duas condições juntas seria
pessoas sem doenças crônicas2. A pre- maior do que apenas o somatório dos
valência de depressão em diabéticos efeitos das mesmas16.
pode ser ≥ 40%7 e a comorbidade de Dadas as implicações da comorbi-
depressão e diabetes pode prolongar dade entre depressão e diabetes, é im-
o episódio depressivo ou favorecer a prescindível a avaliação cuidadosa da
ocorrência de recorrências8. sua ocorrência nos pacientes diabéti-
A prevalência ao longo da vida de cos. As implicações clínicas de quadros
depressão na população geral em um depressivos são evidentes. A ausência
dos maiores estudos epidemiológicos de tratamento ou o tratamento inade-
de saúde mental nos Estados Unidos quado elevam o risco a uma ordem de
foi de 17,1% e a prevalência corrente magnitude semelhante ao risco apre-
(nos últimos 30 dias) foi estimada em sentado pela elevação da pressão ar-
4,9%9. Em pacientes com doenças clí- terial não-tratada ou tratada de forma
nicas, a incidência é ainda maior, uma inadequada17.
vez que a depressão é encontrada em Infelizmente, estudos demons-
5% a 10% dos pacientes ambulatoriais tram que a depressão é subdiagnos-
e em 9% a 16% de internados10. ticada, em especial nos pacientes com

93
Diretrizes SBD Depressão no paciente diabético

TABELA 2 - Principais antidepressivos disponíveis no Brasil

Classe do medicamento Dose média habitual Ação Hipotensão


Sedação
e princípio ativo para adultos (mg/dia) anticolinérgica ortostática

Antidepressivos tricíclicos (ADTs)A

Imipramina 150-200 Moderada Moderada Alta

Amitriptilina 150-200 Alta Muito alta Moderada

Nortriptilina 75-100 Moderada Moderada Menor dos ADTs

Clomipramina 150-200 Alta Alta Baixa

Antidepressivos tetracíclicosA

Maprotilina 150-200 Moderada Moderada Baixa

Inibidores da monoaminoxidase (IMAOs)

Tranilcipromina 30 - Muito baixa Alta

Inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS)

Fluoxetina 20-60 Muito baixa Nenhuma Muito baixa

Paroxetina 20-40 Baixa Baixa Nenhuma

Sertralina 100-150 Baixa Nenhuma Nenhuma

Citalopram 20-40 Baixa Nenhuma Nenhuma

Fluvoxamina 50-150 Baixa Nenhuma Nenhuma

Escitalopram 10-20 Baixa Nenhuma Nenhuma

Inibidores de recaptação de serotonina e noradrenalina (SNRI)

Venlafaxina 75-225 Baixa Nenhuma Muito baixaB

Duloxetina 60 Baixa Muito baixa Muito baixa

Inibidores de recaptação de dopamina e noradrenalina

BupropionaC 300 Baixa Muito baixa Muito baixa

Inibidores seletivos de recaptação de noradrenalina (NARI)

Reboxetina 8-10 Muito baixa Muito baixa Muito baixa

Antidepressivos noradrenérgicos e serotoninérgicos específicos (NASSA)

Mirtazapina 30-45 Alta Moderada Baixa

Inibidores da recaptação de serotonina e antagonistas de serotonina (SARI)

TrazodonaD 150-400 Alta Muito baixa Moderada

A: todos os antidepressivos cíclicos possuem elevado potencial arritmogênico;


B: venlafaxina causa aumento da pressão arterial dose-dependente em alguns indivíduos;
C: bupropiona reduz significativamente o limiar convulsivo, devendo ser evitada em pacientes com histórico de síncopes e convulsões;
D: trazodona está associada com arritmias cardíacas e priapismo

94
2008 Diretrizes SBD

2. CONDUTA TERAPÊUTICA (IMAO); inibidores seletivos da recapta- psicofármacos de primeira linha no


ção de serotonina (ISRS); inibidores de tratamento de episódios depressi-
A depressão, nos casos leves e mo- recaptação de serotonina e noradrena- vos, dada a sua eficácia comprovada,
derados, pode e deve ser tratada pelo lina (SNRI); inibidores de recaptação de tolerabilidade e facilidade de empre-
médico não-psiquiatra, a exemplo de dopamina e noradrenalina; inibidores go, por conta de efeitos colaterais
outras patologias não-complicadas (por seletivos de recaptação de noradrena- pouco pronunciados e melhor tole-
exemplo: hipertensão arterial leve). No lina (NARI); antidepressivos noradre- rados, além de custo razoavelmente
entanto, casos de episódios depressi- nérgicos e serotoninérgicos específicos acessível.
vos graves, depressão com sintomas (NASSA); e inibidores da recaptação de É fundamental ressaltar ao pacien-
psicóticos, risco de suicídio e história de serotonina e antagonistas de serotoni- te que a resposta à medicação anti-
transtorno bipolar do humor devem ser na (SARI). depressiva ocorre entre a segunda e
encaminhadas ao psiquiatra para ava- De acordo com as diretrizes da Asso- a quarta semana de uso contínuo da
liação e conduta20. Além disso, sempre ciação Americana de Psiquiatria1,21 e medicação22. Dados da literatura de-
que o profissional não se sentir capaz com as Diretrizes da Associação Médica monstram que a melhora nas primeiras
de conduzir o tratamento do paciente Brasileira para o tratamento da depres- semanas de tratamento está associada
ou após duas tentativas sem sucesso de são20, três fatores são fundamentais com maior chance de resposta23. Do
tratamento da depressão é indicada a na escolha de um antidepressivo: efi- mesmo modo, a ausência de resposta
consultoria de um psiquiatra ou o enca- cácia comprovada no tratamento dos após quatro semanas de tratamento
minhamento do paciente20. sintomas depressivos; preferência do com uma dada medicação diminui as
Atualmente, existem mais de 30 paciente; e perfil de efeitos colaterais, chances de uma posterior redução de
psicofármacos com eficácia comprova- interações medicamentosas e tolerabi- sintomas, embora alguns pacientes ve-
da no tratamento de episódios depres- lidade da medicação. Cabe a ressalva nham a apresentar respostas após seis
sivos. Os antidepressivos são divididos que, com relação à eficácia antidepres- a oito semanas de uso da medicação24.
por mecanismo de ação em diferentes siva, a maioria dos antidepressivos é A duração do tratamento deve com-
classes, sendo as principais classes: an- considerada equivalente. preender três fases: a fase aguda, a de
tidepressivos tricíclicos (ADT) e tetrací- Seguindo as diretrizes supraci- continuação e a de manutenção, con-
clicos; inibidores da monoaminoxidase tadas, os ISRS são considerados os forme podemos ver na figura 125.

FIGURA 1 - Fases do tratamento antidepressivo

Recaída Recorrência
Remissão Recuperação
Resposta

“Normalidade”
Gravidade

Sintomas

Síndrome
Cronicidade

Fases do tratamento Aguda Continuação Manutenção

Tempo

95
Diretrizes SBD Depressão no paciente diabético

A fase aguda compreende os pri- de manutenção tem como objetivo efetividade no tratamento de episó-
meiros dois a três meses e visa à di- evitar a ocorrência de novos episódios dios depressivos são a psicoterapia
minuição dos sintomas depressivos depressivos (recorrência) e é recomen- cognitiva28, a psicoterapia interpesso-
(resposta) ou idealmente o retorno dada nos pacientes que apresentem al29 e a psicoterapia de solução de pro-
completo ao nível de funcionamento probabilidades de recorrência25. blemas30, sendo que essas evidências
pré-mórbido com completa ausência A dose de antidepressivo utilizada se referem a casos de depressão leve a
de sintomas (remissão). A fase de con- nas fases de continuação e de manu- moderada31. Cabe ao psiquiatra a avalia-
tinuação vai até o sexto mês após o tenção devem ser as mesmas utiliza- ção da indicação da psicoterapia, bem
início do tratamento e tem como ob- das na fase aguda, já que estudos com como o encaminhamento à mesma.
jetivo manter a melhora obtida, evi- doses de manutenção equivalentes à Dada à morbidade e à mortalidade
tando novas recaídas de um mesmo metade das doses utilizadas na fase associadas à depressão e à possibilida-
episódio depressivo. Os índices de re- aguda demonstraram taxas mais altas de de recaída e recorrência dos episó-
caída são estimados entre 27% e 50% de recorrência27. dios depressivos, fica a ressalva que não
após seis meses de tratamento26. Se o O tratamento psicoterápico tam- basta apenas diagnosticar a depressão
paciente mantiver a remissão de sinto- bém tem importância fundamental. nos pacientes diabéticos, mas sim, pro-
mas ao final da fase de continuação, o Dentre as diferentes formas de psico- ver o tratamento adequado para evitar
mesmo é considerado recuperado do terapias, aquelas que possuem estu- as conseqüências, tanto da depressão
episódio depressivo original25. A fase dos controlados e que demonstram quanto do diabetes.

TABELA 3 - Grau de recomendação e força de evidência

Recomendação Nível de evidência

Impacto da depressão no paciente diabético A


Importância do diagnóstico de depressão no diabético A
Evidência de sinergia entre depressão e diabetes na morbimortalidade B
Evidência de eficácia e tolerabilidade de antidepressivos ISRS na depressão A
Necessidade de tratamento com dose e tempo adequado com antidepressivos A

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97
Diretrizes SBD 2008

Degeneração vascular cerebral,


Alzheimer e diabetes: avaliação
e conduta
Diabetes mellitus 2 é condição comum em pessoas idosas, afetando 20% da-
queles com mais de 65 anos. Vários estudos têm mostrado diversos efeitos adver-
sos do diabetes, inclusive comprometimento cognitivo que poderia sugerir que
o diabetes pudesse contribuir para o desenvolvimento da doença de Alzheimer
ou de demência vascular, fato observado em muitos, mas não em todos estudos
epidemiológicos.
A doença de Alzheimer (DA), descrita por Alois Alzheimer1 em 1906, é a causa
mais comum de demência e sua incidência aumenta à medida que a idade avança.
Apenas menos de 10% dos casos surgem antes dos 65 anos e, às vezes, nos 40
ou 50, como ocorreu com Auguste D., a primeira doente descrita por Alzheimer.
Porém, a partir dos 65, a prevalência dobra a cada cinco anos, entre 65 e 85 anos. À
medida que recursos médicos têm permitido ampliar a duração da vida humana,
é de se esperar que nos próximos anos um número cada vez maior de pacientes
existirão, representando enorme custo financeiro. Em 2007, os gastos mundiais
foram estimados em 315 bilhões de dólares contra 210 bilhões de 2005, com ten-
dência a aumentos significativos nos próximos anos.
Duas alterações patológicas marcam a DA: as placas neuríticas ou senis, for-
madas pela agregação de polipeptídeos abeta 40 e abeta 42, e a degeneração
neurofibrilar, resultante da fosforilação aumentada da proteína tau. Bloquear tal
hiperfosforilação seria fator significativo para controlar a enfermidade. Os peptí-
deos abeta 40 e abeta 42 são formados pela ação da beta e da gama-secretase
sobre a proteína precursora do amilóide (APP), que tem parte intracelular, parte
na membrana citoplasmática e outra extracelular. Já a alfa-secretase agiria sobre o
APP, quebrando a molécula, sem a formação de abetas.
Intensas pesquisas têm sido realizadas com objetivo de esclarecer os mecanis-
mos fisiopatológicos da enfermidade e medidas terapêuticas efetivas. Sem dúvida,
as descobertas genéticas foram muito importantes e, nas palavras de Rosemberg2,
marcam o fim do princípio (the end of the beginning) no caminho do completo
conhecimento dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos.
Dentro desse contexto, foram importantes os trabalhos sobre as formas fami-
liares relacionadas a mutações da presenilina 1-PS1 (cromossoma 14q24.3), da pre-
senilina 2- PS2 (cromossoma 1q31-q42) e da proteína precursora do amilóide (APP
– cromossoma 21q21.2), todas estas ocorrendo precocemente em determinadas

98
2008 Diretrizes SBD

famílias PS1 e PS2, com atividade de no cromossoma 10), que é uma me- Beeri et al.7 mostraram que a insuli-
gama-secretase. A inibição da beta e taloprotease que cataboliza a insulina na, em combinação com outras medi-
gama-secretases poderia prevenir a e que também pode ter papel funda- cações antidiabéticas, está associada a
síntese de abetas e diminuir a forma- mental no clearance da abeta, sendo menos achados neuropatológicos de
ção de placas. a IDE altamente expressa no cérebro, DA. Eles analisaram cérebros de 124
A apolipoproteína (APOE - cromos- fígado, rins e músculos. A IDE tem sido, indivíduos diabéticos e 124 não-diabé-
somo 19q13.2) está relacionada a for- ademais, ligada à regulação da degra- ticos na faixa etária (81,2 + 9,3), sendo
mas familiares tardias e a casos esporá- dação do APP em seu fragmento intra- 57,3% de mulheres, coletados no Ban-
dicos. A APOE existe nas formas e4, e3 celular, após a clivagem pela gama- co de Cérebros do Mount Sinai Scho-
e e2, sendo que os indivíduos heterozi- secretase. Em culturas de células, a IDE ol of Medicine, todos com demência
gotos de e4 têm três vezes mais risco de foi capaz de agir sobre o beta amilóide. severa. Os pacientes diabéticos foram
desenvolverem DA e os homozigotos, É preciso assinalar que menos ativida- classificados de acordo com o perfil
oito vezes mais risco de ter a doença de e níveis de IDE e seu mRNA foram medicamentoso utilizado em vida: ne-
aos 75 anos, quando comparados aos observados em tecido cerebral de DA. nhuma medicação (n = 29), somente
e3. Já os portadores de e2 gozariam de É preciso lembrar que estudos genéti- insulina (n = 49), outras medicações
efeito protetor em relação a DA. cos têm apontado locus no cromosso- antidiabéticas que não a insulina (n = 28)
A causa molecular pela qual os in- ma 10, próximo à IDE, em certos casos ou insulina e outras medicações orais
divíduos e4 seriam mais propensos de DA tardia. antidiabéticas (n = 18). Estudaram ain-
estaria relacionada à maior afinidade Arvanitakis et al.3 estudaram, du- da a densidade de placas neuríticas e
pela proteína abeta e sua agregação, rante nove anos, 824 religiosos cató- emaranhados neurofibrilares em várias
com subseqüente formação de fibrilas licos, padres e freiras, todos com mais regiões neocorticais, no hipocampo,
que se incorporariam à placa neurítica. de 55 anos, submetendo-os a cuidadosa córtex entorrinal e amídala. Mostraram
Além destes genes, outros têm sido observação clínica realizada anualmen- que nos diabéticos tratados havia de
também relacionados, como o gene da te. Diabetes mellitus foi diagnosticado modo significativo menos placas neu-
beta-secretase (envolvido na geração em 127 participantes (15,4%). Durante ríticas (20%) que em todos dos outros
da abeta); neprilysin, da enzima con- 5,5 anos de observação, 151 pessoas grupos, não havendo diferença no que
versora da angiotensina (ACE 1, poten- desenvolveram DA, sendo que os dia- dizia respeito à degeneração neuro-
cialmente envolvida na degradação da béticos tiveram 65% mais risco da DA fibrilar.
abeta); receptor relacionado com sorti- que os não-diabéticos. Diabetes mellitus A segunda causa mais importante
lin (SORT 1, envolvido nos mecanismos também foi associado com níveis in- de demência é de etiologia vascular
de geração e reciclagem da proteína feriores de cognição global, memória (DV). O diabetes mellitus aumenta de
abeta); genes responsáveis pelos re- episódica, memória semântica, habi- cinco a dez vezes a incidência de ar-
ceptores de lipoproteínas de densida- lidade visoespacial, bem como 44% teriosclerose e de fatores de risco para
de muito baixa (VLDLR) e receptores mais decréscimo na velocidade de per- demência vascular, além de afetar a
de APOE (APOE R2). Ratos, sem estes cepção. microcirculação. É próprio dos diabéti-
dois genes, têm aumento da proteína Craft et al.4 estudaram 23 pacientes cos a calcificação das camadas medias
tau hiperfosforilada. com DA e 14 idosos, mostrando efeito e íntimas das artérias (esclerose de
Outros relatos apontam polimorfis- favorável da insulina e de análogo da Mönckeberg), principalmente se existir
mo da interleuquina 1 (IL-1) nos genes somatostatina. Já Boyt et al.5 evidencia- insuficiência renal. É sabido que lesões
IL-1A e IL-1B como fortemente associa- ram que a insulina reduz os níveis séri- de DA e de DV podem coexistir num
dos com DA de início precoce. A IL-1 é cos da proteína precursora do amilói- mesmo paciente.
citoquina pró-inflamatória com muita de. Além disso, segundo Hong et al.6, Todos estes trabalhos apontam
expressão na micróglia. a insulina poderia regular a fosforilação para a importância do tratamento do
Finalmente, de importância no pre- da proteína tau, base da formação dos diabetes com o objetivo de diminuir
sente trabalho, seria o gene da enzima emaranhados da degeneração neurofi- a incidência de DA. Também devem
degradante da insulina (IDE, localizado brilar. ser incluídas medidas preventivas em

99
Diretrizes SBD Degeneração vascular cerebral, Alzheimer e diabetes

relação a enfermidades cerebrovascu- lipidograma, da eletroforese de proteí- depósitos de hemosiderina causados


lares, tais como controle do peso, do nas, dos níveis de vitamina B12 e ácido por hemorragias anteriormente ocor-
perfil lipídico, de processos infecciosos fólico, dos hormônios tireoidianos T3 e ridas, tortuosidades vasculares, atrofia
e inflamatórios, devendo não serem T4 e os da supra-renal, bem como do cerebral e aumento dos ventrículos
esquecidos os dentários, evitando-se TSH e o ACTH e da sorologia para lues cerebrais. A SPECT demonstra menos
o consumo exagerado de bebidas al- e, em determinados casos, para HIV. fluxo circulatório cerebral.
coólicas. Além disso, aconselha-se a Neste contexto, os exames de imagem Quando os pacientes com diabetes
prática moderada de exercícios físicos, contribuem de modo eficaz, tanto para apresentarem quadro clínico com alte-
a ingestão de vinhos tintos (revasterol), o diagnóstico da DA como da DV, sen- rações cognitivas sugestivas de DA, de-
hidratação apropriada e a chamada do também de valia para diversas ou- verão ser utilizados os medicamentos
dieta mediterrânea, sendo fundamen- tras enfermidades, onde comprometi- prescritos para esta enfermidade. Para
tal a abolição do tabagismo. mento mental pode estar presente. os distúrbios da memória, inibidores
Li et al.8, estudando cérebros de 110 Doppler carotídeo e vértebro-basilar, da acetilcolinesterase, com objetivo
indivíduos com idades entre 65 e 79 tomografia computadorizada, ressonân- de elevar os níveis de acetilcolina em
anos ainda cognitivamente normais, cia magnética, espectroscopia, PET, áreas cerebrais como o núcleo basal de
compararam os usuários de estatinas SPECT, angiotomografia e angiorres- Meynert, sendo prescritos: donapezil
(sinvastatina, pravastatina, lovastati- sonância e o PIB (meio de contraste (dose inicial de 5 mg pela manhã com
na ou atorvastaina) com não-usuários chamado complexo de Pittsburgh, que ou sem alimento, elevando-se depois
destas substâncias, notando que acha- mostra as placas neuríticas, ainda não de quatro a seis semanas para 10 mg);
dos neuropatológicos de DA ocorriam disponível em nosso meio) ampliaram rivastigmine (de início com 1,5 mg
menos no grupo medicado com esta- muito nossos conhecimentos e permi- tomado com alimento duas vezes ao
tinas. tiram melhor análise destes casos. dia, com incrementos progressivos até
A avaliação cuidadosa da cognição Na DV, a tomografia e a ressonân- o máximo de 12 mg ao dia, em doses
dos pacientes diabéticos se impõe, em cia mostram sulcos cerebrais mais evi- divididas em comprimidos, existindo
especial quando familiares relatarem dentes, que traduzem atrofia cerebral, ainda a forma de adesivos de 4,6 e 9,5
problemas nesta área. Tal avaliação dilatação ex-vácuo dos ventrículos mg); galantamina (dose inicial de 8 mg
passa pelo exame neurológico, pela cerebrais, com menor volume dos hi- pela manhã e com alimento, chegan-
aplicação do teste do relógio e do mi- pocampos, resultado de suas atrofias, do-se até 24 mg, caso haja tolerância).
nimental, solicitando-se consulta es- sendo estas os primeiros sinais ob- Outra droga, no que diz respeito a
pecializada para realização de testes serváveis na doença. O PET evidencia deficiências da memória, é a meman-
mais completos e específicos, quando diminuição da atividade metabólica tina, que antagoniza o glutamato nos
se fizer necessário. Isso deve ser feito, cerebral e a espectroscopia de prefe- receptores NMDA, melhorando a trans-
em especial, na eventualidade de pro- rência, em nível do giro cíngulo, mos- missão nervosa e impedindo o excesso
blemas na esfera do direito cível, como tra de início aumento da relação Mi/Cr de cálcio para dentro dos neurônios,
nos casos de testamentos ou doações, (mioinositol/creatina) e, posteriormen- resultantes da estimulação pelo glu-
ou verificação da capacidade para o te, diminuição dos picos de NAA tamato, exercendo deste modo efeito
gerenciamento de empresas, em cir- (n-acetil-aspartato), com redução da protetor, em especial nas mitocôndrias.
cunstâncias em que a família manifes- relação Naa/Co (n-acetil-aspartato/co- A dose utilizada é de 5 mg, com ou sem
tar dúvidas a este respeito. lina) e aumento da relação Co/Cr. alimento, que gradualmente pode che-
É importante, por outro lado, que Na DV, o doppler pode evidenciar gar ao máximo de 20 mg diários.
seja feito diagnóstico diferencial com obstruções vasculares que também Recentemente duas novas drogas
outras condições que possam trazer aparecerão na angiotomografia e an- têm sido analisadas em estudos expe-
manifestações cognitivas. Para isso, é giorressonância. Na tomografia e res- rimentais. A primeira é o R-flurbiprofen,
de praxe a solicitação do hemograma e sonância magnética, evidenciam-se agente seletivo para modular a quanti-
da velocidade de hemossedimentação, infartos lacunares múltiplos, áreas de dade da gama-secretase e, como conse-
das taxas de uréia e de creatinina, do gliose que traduzem microangiopatia, qüência, reduzir a produção de abeta42.

100
2008 Diretrizes SBD

Foi utilizado por Wilcock et al.9 em dose de 800 mg, duas vezes ao dia, sendo bem tolerado e com bons resultados depois de 24
meses de tratamento. A outra droga é o hidrocloreto dimebolin, há muito empregado na Rússia como anti-histamínico. Tem-se
mostrado, segundo Doody et al.10, eficaz na dose inicial de 10 mg, três vezes ao dia, e, uma semana depois 20 mg, em cada
três tomadas.
Todas estas medicações devem ser prescritas nas fases iniciais da DA, deixando de ter qualquer sentido quando se
aprofunda o estado demencial.
No presente trabalho é impossível estabelecer-se o nível de evidências porque há necessidade de um volume maior de
estudos”.

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101
Diretrizes SBD 2008

Definição de indicadores de
desempenho dos programas de
atendimento aos diabéticos
1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste capítulo das diretrizes 2008 é definir os indicadores básicos na


avaliação da qualidade do atendimento aos portadores de diabetes mellitus tipo 2
e hipertensão arterial.

2. METODOLOGIA

Para esta avaliação, será utilizado o protocolo a seguir e que pode ser preen-
chido on line pelas pessoas autorizadas. O endereço eletrônico deste formulário
é: www.diabetes.org.br/sistqual2.0. Os dados obrigatórios a serem colhidos são
indicadores internacionalmente reconhecidos como capazes de avaliar os compo-
nentes do atendimento com relação às medidas de processos e indicadores de
desfechos (outcomes)1,4(A). Os seguintes indicadores de processos são obrigatórios
nos prontuários. Deve ser considerada pelo menos a realização de uma medida
nos últimos seis meses.

3. MEDIDAS DE PROCESSOS

• Medida da PA sistólica e diastólica;


• Medida da circunferência abdominal;
• Determinação da hemoglobina glicada (A1C);
• Determinação do LDL colesterol;
• Realização de pelo menos um exame de FO no último ano;
• Realização de pelo menos um exame de função renal no último ano;
• Realização de pelo menos uma avaliação de função renal no último ano;
• Realização de atividades educacionais relacionadas com o fumo;
• Prescrição de uso de AAS;
• Prescrição de uso de inibidores de ECA

102
2008 Diretrizes SBD

4. MEDIDAS DE DESFECHO • As dosagens bioquímicas de- A SBD, de comum acordo com os


vem estar padronizadas e devem ser participantes, poderá realizar estu-
• O valor da última A1C encontrada conhecidos os valores normais dos dos multicêntricos e compromete-se
no prontuário5; métodos utilizados, principalmente a não usar os dados com nenhuma
• O valor mais recente da PA; os de A1C; outra finalidade. O uso do sistema de-
• O valor mais recente do LDL; • O pessoal de apoio ou os médi- verá seguir todos os cânones éticos
• HDL. cos devem executar as medidas da atualmente existente no país, ou seja,
Dependendo do interesse, poderão PA e da circunferência abdominal aprovação nos comitês de ética da
ser incluídos outros indicadores, tais segundo as técnicas recomendadas instituição e, quando necessário, no
como: internacionalmente; Ministério da Saúde.
• Realização de educação nutricional; • Termo de consentimento dado pe-
• Realização de práticas de Educa- los indivíduos para a coleta dos dados
ção Física; nos prontuários. 8. BENCHMARKS DO PROJETO
• Realização de automonitoramen-
to glicêmico pelos usuários; As metas e a pontuação seguem
• Indicadores de satisfação do clien- 6. CRITÉRIOS DE AUDITORIA DE basicamente as estabelecidas pela
te com o serviço. COLETA DE RESULTADOS Agência Americana de Controle de
Cada um dos indicadores tem uma Qualidade (NCQA)1. Do ponto de vis-
meta a ser alcançada e um sistema de • Dos prontuários, 25% deverão ser ta brasileiro, temos um trabalho, cuja
pontos. Os serviços ou os profissionais auditados. principal autora é Marilia Brito Gomes2,
médicos de saúde poderão ser classifi- que avaliou num estudo multicêntrico
cados em três níveis, dependendo do cerca de 2.230 pacientes da rede pú-
número de pontos alcançados. Este 7. ETAPAS NO blica de saúde. Temos ainda uma pu-
sistema permitirá que sejam estabe- DESENVOLVIMENTO DE UM blicação de Alberto Santos3, que apre-
lecidas metas individuais ou coletivas SISTEMA DE AVALIAÇÃO DE sentou no último Congresso Brasileiro
para o ano seguinte. Um programa QUALIDADE NUM SERVIÇO de Endocrinologia (2006, em Recife)
educacional de reciclagem poderá ser MÉDICO dados de 50 pacientes de um Hospital
realizado para todos aqueles cujas ava- Universitário na Paraíba, utilizando os
liações mostrem indicadores abaixo da O serviço deverá, de início, reali- indicadores e o formulário on line su-
média. A SBD poderá participar com zar contato com a SBD, comunicando geridos pela SBD2(C).
os seus profissionais destes programas que passará a utilizar o programa de O resultado do estudo multicêntri-
educacionais. avaliação de qualidade da SBD, onde co citado acima apresentou os seguin-
fiquem mencionados os objetivos, pra- tes dados:
zos e o papel de cada entidade. A SBD • Apenas 28,5 % dos pacientes ti-
5. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO se compromete a treinar o pessoal no nham uma PA sistólica menor que 130
preenchimento do formulário on line e, mm/Hg;
• Pessoas com o diagnóstico do CID eventualmente, caso haja interesse da • Apenas 19,3 % tinham PA diastóli-
E10; instituição, participar da coleta de da- ca menor ou igual a 80 mm/Hg;
• Pessoas (25 a 50) de cada serviço dos dos prontuários médicos. • Apenas 24,6% da população tinha
com idade superior a 30 anos e escolhi- O Sistema de Avaliação dos Serviços o IMC menor que 25 kg/m2 da superfí-
dos seqüencialmente a partir da data poderá ser modificado com a inclusão cie corporal;
de início do projeto; de novos indicadores de interesse dos • Apenas 20,6 % tinham um LDL
• Um ano, pelo menos, de acompa- seus usuários, mas os sugeridos pela menor que 2,6 mmol/l;
nhamento no serviço; SBD deverão estar sempre presentes. • Apenas 46 % apresentavam A1c
• A amostra deverá ser distribuída Os dados da avaliação são de proprie- dentro dos padrões estabelecidos pela
entre ambos os sexos; dade exclusiva do serviço. autora (SBD), ou seja, não mais do que

103
Diretrizes SBD Definição de indicadores de desempenho dos programas de atendimento aos diabéticos

1 % acima dos valores superiores do método utilizado;


• Apenas 0,2 % dos pacientes atingiram todas as metas.
Diante destes resultados e seguindo as normas das agências reguladoras de
controle de qualidade de outros países, a SBD sugere os critérios e as metas abaixo
na avaliação da qualidade dos serviços ou de profissionais que lidam com diabetes
no país1(C).

9. METAS DE AVALIAÇÃO E PONTUAÇÃO QUE DEVERÃO SER


ALCANÇADAS PELOS SERVIÇOS OU MÉDICOS QUE TRABALHAM
NOS CUIDADOS COM DIABETES NO BRASIL

TABELA 1 - Dados mínimos obrigatórios

Indicador Exigência Número de pontos

A1c > 9% Inferior a 20% 10


A1c < 7% Pelo menos 40% 5
PA < 140/90 Pelo menos 65% 10
PA < 130/80 Pelo menos 35% 5
Exame de olho Pelo menos 60% 10
Educação contra o fumo Pelo menos 80% 5
Lipídios completos Pelo menos 85% 5
LDL < 130 mg/dl Pelo menos 63% 7,5
LDL < 100 mg/dl Pelo menos 36% 2,5
Homens < 94 cm Pelo menos 50%
Homens < 84 cm Pelo menos 50%
Avaliação renal Pelo menos 80% 10
Avaliação do pé Pelo menos 80% 10
Total de pontos 80
Pontos necessários para o selo SBD 60

Poderão ser estabelecidos níveis intermediários de pontuação, como, por exemplo: nível 1 – 60 pontos ou mais;
nível 2 – entre 50 e 59 pontos; e nível 3 – abaixo de 50 pontos.

10. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a utilização deste protocolo e da ferramenta proposta, teríamos a possibilidade de comparar o padrão dos serviços ou
os indivíduos com os dados internacionais e os existentes no Brasil. Além disso, poderiam ser propostos cursos de reciclagem
direcionados para a melhoria dos indicadores cujas metas não foram alcançadas. A SBD poderá prestar assessoria técnica,
treinamentos e palestras para o pessoal na análise de resultados, com a participação dos seus especialistas.

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2008 Diretrizes SBD

TABELA 2 - Níveis de evidência das principais recomendações e conclusões

Recomendação ou conclusão Nível de evidência

A exigência de indicadores da qualidade pode resultar numa melhoria da qualidade de atendi-


mento, numa diminuição de custos e num melhor desfecho dos casos clínicos de diabetes e hiper- A
tensão arterial.

A utilização de perfis glicêmicos de seis ou sete pontos constitui-se em método para a diminuição das
complicações.
A

A utilização de níveis de PA de 130/80 diminui as complicações cardiovasculares. A


A utilização de níveis de LDL colesterol abaixo de 130 mg/dl diminui as complicações cardiovasculares. A
Os indicadores de atendimento dos pacientes diabéticos de hipertensos no Brasil estão abaixo dos
exigidos. C
A disponibilização de um formulário via web no site da SBD pode constituir-se em uma importante ferra-
menta de coleta de dados. D

REFERÊNCIAS

1. NCQA. The state of health care quality 2006 National Committee for Quality Assurance. WASHINGTON, D.C. in www.ncqa.org/dprp
visitado em 04/09/2008.
2. Gomes MB, Gianella D, Faria M et al Prevalence of type 2 diabetic patients within the targets of care guideline in daily clinical practice:
a multi-center study in Brazil. Rev Diab Stud (2006) 3:73-78.
3. Ramos AJJS, Cavalcante AJ,Ribeiro DJB et al. A avaliação dos níveis de HbA1c em pessoas com Diabetes tipo 1 em uso de insulina
Glargina. Poster apresentado no Congresso Brasileiro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia. Salvador 2006.
4. American Diabetes Association. Standards of Medical Care in Diabetes – 2008. Diabetes Care 2008;31(Suppl 1):S12-S54.
5. Nathan DM, Turgeon H and Regan S. Relationship Between Glycated Haemoglobin Levels and Mean Glucose Levels Over Time. Diabetologia
2007;50(11):2239-2244.

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