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RESUMO
O trabalho que se apresenta assenta sobre a realização de ensaios com piezocone (CPTU) e sua
interpretação com vista à obtenção dos parâmetros de consolidação, de compressibilidade e de
resistência ao corte não drenada de solos moles. Os resultados dos ensaios CPTU e de ensaios de
dissipação são comparados com resultados de ensaios edométricos realizados em laboratório e ensaios
vane test, explorando os diversos modelos de interpretação na definição de alguns parâmetros de
correlação. Utilizam-se os diagramas de classificação de solos para discernimento do estado de
subconsolidação de alguns solos ensaiados e confirma-se a sua validade para a classificação litológica
dos solos, com preferência sobre os que não usam as pressões intersticiais.
ABSTRAT
This paper deals with the characterisation of soft soils by comparing some results of CPTU and
dissipation tests in the area of undrained shear strength, compressibility and consolidation, with
oedometer tests and vane shear tests, to achieve more reliable relationship between field and
laboratory tests. The charts for soil classification are used in order to explain some level of the
subconsolidation stage of the soils investigated, confirming also the reliable use as a tool to define
stratygrafhie, mainly when using pore water pressure data.
1. INTRODUÇÃO
A utilização ainda pouco frequente no país, do ensaio de penetração estática com medição de pressões
intersticiais, CPTU, torna interessante a compilação de algumas relações existentes na bibliografia
(Robertson, 1990; Robertson et al., 1992; Senneset et al., 1992) que permitem converter as grandezas
medidas em parâmetros mecânicos de utilização directa (valores derivados) no dimensionamento das
obras (Gomes Correia et al., 1997). Este trabalho aborda o estudo dos parâmetros de
compressibilidade, de consolidação e de resistência ao corte não drenada do solo, relativamente aos
quais as relações mais divulgadas carecem pontualmente de alguns ajustamentos para solos regionais
(Correia, 1999). Consequentemente torna-se necessário validar essas relações através do recurso, quer
a ensaios de campo, quer de laboratório, que forneçam directamente esses parâmetros mecânicos.
Os resultados da resistência não drenada, obtidos através da realização in-situ de ensaios de corte
rotativo, permitem a sua comparação com os derivados com recurso a modelos de interpretação do
ensaio de penetração, conduzindo ao estabelecimento dos factores do cone mais adequados para os
solos estudados.
205
VII Congresso Nacional de Geotecnia
Além disso, tecem-se algumas considerações no âmbito do problema do estado de consolidação dos
solos, tendo por base algumas propostas mais recentes de classificação de solos, fazendo-se alusão a
algumas discrepâncias em relação a propostas mais antigas, que não tinham em conta o efeito das
pressões intersticiais.
2. O ENSAIO CPTU
Embora a utilização de sistemas eléctricos possa ter antecedido o início da realização de ensaios com
medição das pressões intersticiais, convirá aqui referir um importante salto qualitativo da
disponibilização deste tipo de equipamentos no nosso país. De facto a experiência anterior com
sistemas mecânicos, com as inerentes imprecisões, nomeadamente no que se refere a toda a sequência
intermitente de operações de penetração, paragem e leitura, mas também por questões relacionadas
com a sensibilidade e precisão e, não menos importante, o atrito que se desenvolve nas varas interiores
do sistema mecânico, terão estado na origem de alguns insucessos. Tal facto terá certamente
contribuído para a menor utilização do ensaio de penetração estática, com sistemas mecânicos, na
caracterização geotécnica dos terrenos, em Portugal.
O CPTU utilizado neste estudo é o equipamento HYSON 200 do fabricante A.P.van den Berg com
capacidade de penetração até 200 kN, tendo sido utilizadas ponteiras com secções de 10 cm2
(d=35.7mm) e 15cm2 (d=43.6mm), com sensores para medições da resistência de ponta, da resistência
por atrito lateral local e da pressão intersticial. O faseamento de execução do ensaio segue o
procedimento especificado pela ISSMGE (1999).
3. ESTUDO EXPERIMENTAL
4. CONSOLIDAÇÃO
O sensor para medição das pressões intersticiais acoplado à ponteira permite, de modo relativamente
simples, medir as pressões intersticiais ao longo do tempo num ensaio de dissipação, cuja
interpretação dos resultados permite a determinação do coeficiente de consolidação.
206
Prospecção, Amostragem e Caracterização de Maciços
Anote-se que o coeficiente de consolidação de um solo assume normalmente valores diferentes para as
direcções vertical (cv) e horizontal (ch), ou radial (cr). Ora, o recurso a um modelo de cavidade
cilíndrica conduz à dedução de um coeficiente para a direcção horizontal, normal ao eixo do cone,
enquanto que um modelo de interpretação esférica conduz a um coeficiente de consolidação
“envolvente”. Na realidade a escolha do modelo mais apropriado é dependente da posição do elemento
filtrante, sendo o modelo esférico mais adequado para o filtro localizado no cone, e o modelo
cilíndrico para o filtro localizado no fuste com algum afastamento do cone, o que não será bem o caso
da posição normalizada.
Houlsby e Teh (1988) desenvolveram uma interpretação baseada numa análise em grandes
deformações, conjugando uma avaliação das pressões intersticiais geradas com a penetração, com
recurso ao método dos elementos finitos, e da dissipação das pressões intersticiais com uma análise de
diferenças finitas. Desta análise os autores propuseram a utilização de um factor tempo modificado,
T*, dado pela eq. (1), que utiliza o conceito de índice de rigidez do solo. Este traduz a importância da
rigidez do solo na extensão da zona plastificada.
Ch.t
T* = (1)
2
r Ir
em que:
No Quadro 2 apresentam-se valores do factor tempo modificado, T*, para alguns valores do grau de
dissipação, no caso da posição normalizada do elemento filtrante (u2).
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VII Congresso Nacional de Geotecnia
Senneset et al. (1992) propõem uma abordagem baseada na teoria da expansão da cavidade que
conduz ao coeficiente de consolidação radial (cr), expresso em termos do factor tempo (T), dada por:
T
c = ro2 . (2)
t
em que t é o tempo para ser atingido determinado nível de dissipação e ro o raio do penetrómetro.Na
Fig. 2 representa-se a proposta de Senneset et al. (1992) para a obtenção dos valores do factor tempo,
T. Este depende da rigidez do meio e do grau de dissipação, UT, obtido por:
1.00
C h = r 20 T ∆u t u − uo
t
UT = = t .100(%) (3)
0.75 ∆uT uT − u o
0
Relação ∆u/∆u
RIJO em que:
0.50
MÉDIO
UT – grau de dissipação;
0.25 MOLE
ut – pressão intersticial no tempo t;
uo – pressão intersticial em equilíbrio;
uT – pressão intersticial no início do ensaio de
0.00
0 1 4 10 15 dissipação(t=0).
Factor tempo T
Estes dois modelos de interpretação foram aplicadas a alguns resultados de ensaios de dissipação (grau
de dissipação de 50%) disponíveis (Quadro 3). No modelo de Houlsby e Teh, consideraram-se valores
do índice de rigidez de Ir=50 e Ir=500. Os valores deduzidos para os coeficientes de consolidação
radial, obtidos por aplicação de cada um dos modelos, foram comparados com os valores do
coeficiente de consolidação vertical resultante dos ensaios edométricos efectuados em laboratório,
tendo-se obtido as relações apresentadas no Quadro 3.
Numa tentativa de explorar um pouco melhor os valores elevados obtidos para estas relações,
procedeu-se também à realização de ensaios edométricos sobre provetes orientados
perpendicularmente, de modo a obter parâmetros representativos das duas direcções, cujos resultados
se apresentam no Quadro 4. Apresentam-se igualmente as relações obtidas para os coeficientes de
permeabilidade radial e vertical. Os resultados obtidos com estes ensaios orientados apresentam
208
Prospecção, Amostragem e Caracterização de Maciços
igualmente apreciável dispersão, embora com maior persistência dentro da gama de valores
habitualmente considerada, Ch=2 a 5Cv.
35.6mm
-5
(10cm2 )
10
QUADRO 4 – RELAÇÕES DOS u2
COEFICIENTES Cv - Ch e Kh - Kv -6
10
k h (cm / sec)
Amostra Prof. (m) LL Ch/Cv Kh/Kv
-7
26624 3.70-4.50 60 3.00 2.40 10
t 50 (min)
Fig. 3 – Avaliação de kh a partir do tempo t50, para a
ponteira de 10cm2 ( adaptada de Robertson et al, 1992)
5. DEFORMAÇÃO
M = α .q c (4)
em que α, varia com tipo de solo e para o qual existem propostas detalhadas, já muito divulgadas.
Senneset et al. (1992), investigando o comportamento de argilas, propõem uma relação de acordo com
a gama de tensões em análise, sugerindo que na zona sobreconsolidada, em que as tensões se
posicionam aquém da tensão de pré-consolidação, a avaliação do módulo se faça por:
M i = α i .q n = α i ( qt − σ vo ) (5)
em que αi varia de 5 a 15, que no caso das argilas de Glava, analisadas pelo autor da proposta, mostra
uma boa concordância para um valor médio de αi =10.
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VII Congresso Nacional de Geotecnia
M n = α n .q n = α n ( qt − σ vo ) (6)
em que o coeficiente αn , designado de número de módulo in-situ (αn=m/Nm), varia entre 4 e 8, sendo
frequente adoptar-se um valor de αn =5.
10 6
9
8
5
7 4
M (MPa)
6
M (MPa)
5 3
4
2
3
2 1
1
0
0
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 0 2 4 6 8 10 12 14 16
Tensãoefectiva(kPa) Coeficientealfa
Usando agora as linhas de tendência definidas por cada família de curvas, igualando os valores do
módulo de compressão unidimensional lidos em cada gráfico, facilmente se relaciona o valor de α e se
estabelece uma relação única com o estado de tensão. No Quadro 4 apresentam-se os resultados
obtidos, que permitem a selecção do valor de α mais adequado ao nível de tensão em apreço.
210
Prospecção, Amostragem e Caracterização de Maciços
A partir dos valores de α associados aos diferentes estados de tensão, facilmente se relaciona a
variação do módulo de compressão udimensional em profundidade, com as resistências medidas no
ensaio CPTU. Acresce a vantagem deste ter uma natureza contínua, permitindo um grande
refinamento do cálculo ao proceder-se a uma discretização fina das camadas.
A resistência ao corte não drenada não é uma característica intrínseca do solo, dependendo do modo
de rotura, da anisotropia do solo, da velocidade de deformação (que se acentua em argilas plásticas) e
da história de tensões, sendo a análise e o método de avaliação fortemente condicionados pelo tipo de
problema em apreciação.
Tem havido intenso trabalho de investigação para relacionar os resultados da resistência à penetração
do cone com a resistência não drenada, podendo estabelecer-se uma dicotomia entre duas vias distintas
de investigação; uma que recorre a soluções teóricas e outra a correlações empíricas. Estas vias,
distintas quanto ao modo de avaliação do factor teórico do cone, convergem para uma relação entre a
resistência de ponta e a resistência não drenada com o mesmo andamento.
A determinação da resistência ao corte não drenada a partir da resistência do cone, tendo por base a
resistência total, pode fazer-se pela expressão que faz intervir um factor empírico do cone, Nk, e a
tensão total vertical ao nível do ensaio, σvo.
( q c − σ vo )
Su = (7)
Nk
A utilização do CPTU em vez do CPT, permite considerar o efeito da pressão intersticial, privilegiando
a utilização da resistência de ponta corrigida, qt em vez de qc, vindo:
( q t − σ vo )
Su = (8)
N kt
Do mesmo modo, Nkt corresponde ao factor empírico do cone, sendo frequente posicionar-se no
intervalo de 10 a 15 para argilas normalmente consolidadas e entre 15 a 20 para argilas
sobreconsolidadas.
Senneset et al. (1992) propuseram a determinação da resistência ao corte não drenada a partir do
conceito de resistência de ponta efectiva, qe, definida pela diferença entre a resistência no cone e a
pressão intersticial medida na posição normalizada, vindo:
qe ( q − u2 )
Su = = c (9)
N ke N ke
∆u
Su = (10)
N ∆u
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VII Congresso Nacional de Geotecnia
Na Fig. 6 apresentam-se diversas propostas, compiladas por Lunne et al. (1997) e alguns resultados
obtidos no presente trabalho, para os factores empíricos do cone, que poderão ser aplicados nas
equações apresentadas.
Nk
Nkt
Nke
- PROPOSTAS DE VÁRIOS AUTORES
NESTE TRABALHO
N∆u
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Factores do Cone : Nk; Nkt; Nke; N∆u
A prática tem sido essencialmente baseada na adopção de Nk=15, e de Nkt=15 a 20, para uma
aproximação mais conservativa. Para argilas normalmente consolidadas, ou levemente consolidadas,
Nkt pode ser próximo de 10, vindo valores próximos de 30 para argilas sobreconsolidadas fissuradas.
Para argilas moles é sugerido o uso de acréscimo de pressão intersticial, com valores de N∆u de 7 a 10,
com adopção dos valores mais elevados para uma estimativa conservativa.
A Fig. 6 refere o conjunto de propostas de vários autores para os diferentes factores do cone, exibindo
uma gama muito alargada. Repare-se por exemplo nos factores Nk e Nkt; a relação que se estabelece
entre as resistências de ponta corrigidas e não corrigidas resulta numa manifesta inconcordância entre
as propostas existentes. O posicionamento de alguns resultados obtidos pela comparação das
grandezas medidas no ensaio CPTU com resultados corrigidos de ensaios vane test, sugere um
estreitamento mais provável.
Atente-se também na banda mais estreita de resultados para o critério dos acréscimos de pressão
intersticial reflectindo aparentemente a confirmação da tendência para uma resposta mais fiável deste
critério.
7. CLASSIFICAÇÃO DE SOLOS
A observação dos resultados dos ensaios edométricos, representados na Fig. 4, sugeria a hipótese de
alguma subconsolidação dos solos ensaiados (estes resultados referem-se apenas à baixa do Sado),
sendo evidente a ausência de patamar inicial correspondente à região sobreconsolidada, referindo-se
essencialmente à zona virgem, não obstante os reduzidos níveis de tensão investigados. Este aspecto
decorria também de alguma forma das tensões de pré-consolidação avaliadas pelo ensaio edométrico,
embora com as reservas inerentes ao carácter pouco preciso desta determinação. Numa tentativa de
melhor esclarecer este aspecto, procedeu-se ao posicionamento de alguns resultados mais expressivos
nos diagramas de classificação de solos propostos por Robertson (1990), que se apresentam na Fig. 7.
A observação desta figura, é consentânea com um estado de subconsolidação dos solos da baixa do
Sado, em particular no diagrama da esquerda em que a mancha de pontos se posiciona francamente
afastada da região normalmente consolidada. Embora com resistências mecânicas similares, apenas os
solos da Baixa do Sado exibem esta condição, posicionando-se os solos ensaiados noutros ambientes
(solos CL) tipicamente na zona normalmente consolidada.
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Prospecção, Amostragem e Caracterização de Maciços
1000 1000
7
σV0
8 7 U qt
0
ϕ
OCR crescente com
idade e cimentação
9 U2
No
100 100 6
rm
6
alm
5
en
te
Qt Qt
co
4
ns
5
oli
da
a idade crescente
10 4 10
3
Sensibilidade
Sensibilidade crescente crescente
3
1 2
2
1
1 1
0.1 1 10 -0.4 0 0.4 0.8 1.2
Fr (%) Bq
Os números referidos na figura delimitam zonas de solos com comportamento diferenciado de acordo
com a descrição que se apresenta no Quadro 5.
Dispõe-se ainda de outros indicadores empíricos que parecem convergir para a tendência de
subconsolidação expressa pelo diagrama, nomeadamente os que decorrem de necessidades relativas à
conservação da plataforma, com trabalhos de compensação de deformações, nos períodos de secagem
e abaixamento dos níveis freáticos, o que aparentemente se poderia atribuir aos consequentes
aumentos de tensão efectiva, o que é particularmente importante para materiais subconsolidados, uma
vez que o efeito da consolidação, por tendência, não evanesce. Por outro lado, as taxas de acréscimo
da resistência não drenada com a tensão efectiva que se obtiveram em ensaios de corte directo
realizados, não se encontram espelhadas nas variações de resistência de ponta com o aumento da
profundidade, exibindo em regra valores substancialmente abaixo.
Embora não sendo oportuna a apresentação de situações emblemáticas, refere-se o facto de, pela
importância que assume, os diagramas da Fig. 7 traduzirem com excelente fiabilidade as condições
litológicas ensaiadas, ultrapassando adequadamente algumas condições de erro resultantes da
utilização de diagramas de classificação que não contemplam o efeito das pressões intersticiais nas
leituras.
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VII Congresso Nacional de Geotecnia
8. CONCLUSÕES
As situações analisadas ao longo deste trabalho permitiram clarificar alguns aspectos relacionados
com a utilização do equipamento CPTU e testar o enquadramento de algumas relações conhecidas em
relação à interpretação do ensaio nas diversas vertentes.
No âmbito da avaliação da resistência ao corte não drenada, sugerem-se factores do cone para os
diferentes modelos de interpretação estreitando, e mesmo racionalizando (atente-se à falta de
concordância das propostas para os coeficientes Nk e Nkt) as gamas propostas por vários autores,
concluindo-se pela melhor adequação da utilização dos factores N∆U para caracterização de solos
moles.
Tendo por base os diagramas de classificação de solos, retiram-se também algumas conclusões muito
interessantes em relação ao problema da subconsolidação dos solos lodosos no caso dos terrenos
aluvionares do Sado, para onde convergem as informações laboratoriais.
AGRADECIMENTO
REFERÊNCIAS
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