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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE ECONOMIA

GREMIMT
Grupo de Estudo sobre Economia
Mundial, Integração
Regional &
Mercado de Trabalho

“Crises Econômicas e
Ondas Longas na
Economia Mundial”

THEOTÔNIO DOS SANTOS

Textos para discussão


Série 1 – Nº 5, 2002

Este texto é encontrado também no site da Cátedra e Rede UNESCO – UNU sobre Economia Global e
Desenvolvimento Sustentável – www.reggen.org.br

AS CRISES ECO NÔ MICAS

RUA TIRADENTES, 17 - INGÁ, NITERÓI / RJ


TEL.: (021) 717-1235
FAX: (021) 719-3286
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Entre os temas que preocupam o mundo contemporâneo desde o século XIX, dos
formuladores de política aos analistas econômicos, está a questão do ciclo econômico, das
flutuações econômicas e das crises econômicas que se manifestam em períodos mais ou menos
sucessivos e identificáveis nas economias nacionais e na economia mundial, seja nos países mais
desenvolvidos ou seja no conjunto da economia mundial. Na medida em que a economia
neoclássica se orientou para a preocupação com o equilíbrio geral, a flutuação econômica
passava a ser uma anormalidade, conseqüência de alguma forma de rompimento desse equilíbrio
que só pode encontrar sua explicação em fatores externos aos fenômenos econômicos analisados
pela teoria. Não se pode afirmar, então, que exista uma teoria do ciclo econômico produzida pela
economia neoclássica, na medida em que as flutuações econômicas seriam explicadas por
fenômenos externos ao modelo econômico e, portanto, relativamente aleatórios. Alguns
economistas se dedicaram, contudo, a análise dos ciclos ou flutuações dos negócios, na medida
em que era impossível negar sua existência que, como dissemos, é uma parte muito central da
vida econômica contemporânea.

A teoria keynesiana surgiu após um período longo de estagnação, voltando-se


para a difícil tarefa de formular políticas capazes de impedir essa estagnação e retomar o
crescimento da economia, ou, mais especificamente, o pleno emprego, grande inquietação da
Humanidade naquele momento. Daí que grande parte das preocupações keynesianas, e sobretudo
pós-keynesianas, estivessem ligadas ao conceito do crescimento econômico, à busca de
explicações dos mecanismos do crescimento, cuja expressão mais bem-sucedida talvez esteja no
fenômeno do multiplicador. Não há propriamente, do ponto de vista keynesiano, uma visão de
ciclo econômico, mas predominantemente uma percepção aguda do fenômeno da estagnação e da
necessidade de combatê-la através da intervenção do Estado, que assume um caráter anti-cíclico.
Em seguida vêm as preocupações com o crescimento econômico e os possíveis desequilíbrios que
ele possa manifestar, enfatizando-se outra vez o papel da intervenção estatal para regulá-lo e
viabilizá-lo.

Devemos, contudo, constatar que a teoria da crise econômica e do ciclo


econômico tem sua origem basicamente no pensamento marxista, passando por influências muito
decisivas de historiadores econômicos que foram focalizando o fenômeno e buscando explicações
para eles. Na verdade, a questão da crise e do ciclo econômico passou a ser fundamental para o
pensamento marxista. Também o foi para alguns teóricos que seguiram um caminho mais
próximo da história e dos fatos econômicos, como este conjunto de economistas que ficariam
conhecidos como a Escola do Pensamento Institucional, e que tem em Schumpeter sua principal
figura.

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TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Nosso objetivo neste capítulo será o de analisar a questão dos ciclos e das crises
econômicas, com uma ênfase particular nos ciclos longos. Estes devem ser analisados a nível
internacional, na medida em que eles se manifestam em conjuntos de países, permitindo inclusive
propor um mapeamento da sua trajetória a nível planetário. Neste sentido, a análise dos ciclos ou
ondas longas ultrapassa o marco nacional no qual os próprios teóricos marxistas tinham situado
as oscilações do ciclo econômico e a problemática da crise econômica.

Caminhamos, assim, de maneira decidida para incorporar esta dimensão nova


que vem se consolidando na análise dos fenômenos sociais, particularmente desde a década de 70
quando foi retomada a teoria das ondas longas, seja sob o ponto de vista da análise empírica, da
história econômica, ou seja sob o ponto de vista da análise teórica.

A questão das ondas longas se articula com uma visão mais global do
funcionamento da economia mundial. Na sucessão dessas ondas longas identifica-se cada vez
mais os períodos de retomada e crescimento econômico como períodos de incorporação maciça de
inovações tecnológicas, em geral, introduzidas no período de depressão e de recuperação, e que se
encontram em fase de difusão e expansão no período do crescimento. As teorias dos ciclos
econômicos longos ou ondas longas nos mostra que há mudanças estruturais no final de cada
ciclo longo, dando às crises dessa fase final um caráter estrutural, que as vinculam também com
a introdução de novos paradigmas tecnológicos que se identificam não somente pela
predominância de novos setores e ramos de produção dentro da economia, como também por
mudanças no próprio processo de trabalho, no próprio sistema de produção.

Vejamos, portanto, como se colocam essas questões tanto do ponto de vista


teórico como histórico que se faz necessário para testar o aparelho conceitual desenvolvido em
torno das flutuações econômicas seculares na análise concreta da história econômica
contemporânea e moderna.

T EORIA DAS CRISE S ECON Ô MICAS

Um primeiro tema a tratar é a diferença entre os ciclos e as crises econômicas.


As crises econômicas se referem a períodos de baixa da produção, aumento de desemprego e
queda dos negócios em geral. Elas foram detectadas desde a antiguidade e foram objeto de muitas
interpretações. Os ciclos econômicos supõem uma observação sucessiva de situações de crises
alternadas com situações de crescimento e auge das atividades econômicas. O conceito de ciclo
econômico está associado a uma certa regularidade e freqüência das oscilações entre os períodos
alternados de crescimento e descenso.

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TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Apesar do tema ter sido objeto de muitas referência históricas poderíamos dizer
que a primeira tentativa de uma análise sistemática do mesmo do ponto de vista econômico tenha
sido realizada por Jean de Sismondi, um economista suíço que identificou, em 1919, o fenômeno
das crises econômicas, chegando a concebê-las como "uma sucessão de círculos". Na sua obra
Novos Princípio da Economia Política ele identifica a idéia de crise econômica com o rompimento
das proporções necessárias para a circulação da produção, da renda e do consumo. Como este
depende dos salários dos trabalhadores, que tendem a ser reduzidos pelos capitalistas ou
simplesmente podem desaparecer devido ao desemprego, encontramos aí uma razão permanente
para a criação de desproporções entre os elementos chaves da circulação econômica, o que
conduz à crise sob a forma da superprodução. Daí sua conclusão de que "somente o crescimento
do consumo pode prescindir o crescimento da reprodução" e que, por sua vez, "o consumo não
pode ser regulado senão pela renda dos consumidores". Mas, apesar de encontrar a causa das
crises ele não tenta explicar a regularidade das mesmas. Fica em aberto a identificação do
princípio regulador dos movimentos cíclicos.

Um novo passo para a compreensão destes fenômenos pode ser encontrado no


Manifesto Comunista de 1848, de autoria de Marx e Engels. Eles identificam a existência de
ciclos regulares de crescimento e crises alternadas a cada 4 anos. Porém, foi o economista francês
Clément Juglar (1819-1905) quem primeiro identificou as crises sucessivas ocorridas a cada 10
anos, variando, contudo, entre 6 e 11 anos. Seu trabalho foi tão importante que no futuro passou-
se a identificar os ciclos de 10 anos com o seu nome: "ciclos Juglar".

Essas constatações empíricas a partir desses autores economistas e historiadores


não levavam necessariamente às causas das crises. Sismondi tentou uma primeira explicação
através de um esquema que partia das limitações da demanda por conseqüência da participação
inferior dos salários dentro da produção, que criaria um limite para a ela. Sismondi não via com
clareza o papel da acumulação dos gastos em investimentos, que supõem uma produção de
maquinárias e outros produtos que são consumidos pelo lucro quando ele é transformado em
investimento. Tampouco via que a outra parte do lucro, que não se transforma em investimento e
sim em consumo de luxo, pode gerar uma igualdade entre oferta e demanda. Mesmo que os
salários representem uma parte inferior no conjunto da renda nacional.

Contudo, quem vai incorporar a problemática da crise no interior do seu sistema


de pensamento será Marx. Isto justifica realizar uma revisão, ainda que geral, sobre o enfoque
marxista das crises econômicas, que conduzem inclusive à idéia dos ciclos e flutuações
econômicas mais ou menos permanentes, com a temporalidade que Marx constatou também em
torno dos 10 anos.

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Marx foi o primeiro estudioso de economia que introduziu na visão econômica o


fenômeno da reprodução. Apesar da importância deste conceito, ele nunca foi assimilado por
autores estranhos ao marxismo, talvez porque supõe um pensamento dialético. Seu
funcionamento é o resultado da ação de setores econômicos diferenciados. Os agentes sociais, por
exemplo, diferenciam-se entre os proprietários dos meios de produção e os trabalhadores, e se
estabelece uma relação entre eles. No caso da economia capitalista, há uma relação definida pelo
salário, pela venda da força de trabalho. Nas economias pré-capitalistas, o proprietário da terra
estabelecerá também relações de produção com os camponeses - os produtores diretos. O mesmo
podendo ocorrer numa relação intersetorial, pois Marx fundamenta a possibilidade da troca na
existência de uma divisão de trabalho. Daí inclusive ele constatar que as primeiras formas de
intercâmbio se dão entre tribos que trocam seus excedentes entre elas.

Portanto, a própria noção do intercâmbio, a própria noção de uma produção que


se destina a setores distintos da população, supõe também que esses setores estão exercendo
atividades econômicas distintas e que há uma divisão de trabalho entre eles. A noção de
reprodução, então, é essencial para o funcionamento da economia, onde os seus agentes
acumulam quando há um excedente que pode ser investido. Esse processo produtivo é cíclico,
dependendo do sistema de produção e do produto mesmo. O produto agrícola é o caso típico de
ciclo que se reproduz da plantação e da colheita. A produção industrial também se faz
diariamente ou, conforme o tipo de produto, pode até supor um ciclo de mais de um ano para
produzir determinados produtos, sobretudo maquinárias.

Enquanto os ciclos naturais afetam tão decisivamente a economia agrícola, as


atividades manufatureiras estão submetidas a outros ciclos. A sua dependência das máquinas e
dos instrumentos de trabalho, por exemplo, submete-as aos ciclos de desgaste e desuso e à
necessidade de repô-las imediatamente para não deter o processo de produção. Marx o vê como
um processo em si mesmo, formado de ciclos de produção onde a noção de acumulação já se
coloca pois estes ciclos podem ser ampliados. Trata-se de uma noção absolutamente dinâmica do
processo produtivo que nada tem a ver com a visão de equilíbrio geral na qual esses ciclos não
são tomados em consideração.

Ao pensar o problema da reprodução e da circulação do capital, que se apresenta


sob várias formas dentro do processo de produção global, Marx já colocava o problema dos
ciclos e a questão mais específica da crise econômica. Para ele, a possibilidade da crise surge
com o aparecimento do dinheiro e do processo de circulação onde o produtor se separa do
consumidor. Em um certo momento pode haver uma interrupção no circuito econômico, quando o
consumidor deixa de comprar o produto do produtor. Cria-se então uma situação de crise: um
produto já produzido que não pode se realizar e que não trará a renda ao produtor. Quanto mais
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esse produtor viver do mercado (ou seja, viver de produzir para que outros comprem) mais ele
será sensível à crise e à possibilidade da crise.

O esquema teórico de Marx, portanto, parte dessa noção de que o próprio


processo de circulação carrega dentro de si a possibilidade da crise, possibilidade que se fêz real
na história em várias circunstâncias. Mas o que nos interessa não é a possibilidade da crise em
geral (que existe em todo sistema mercantil), mas de um tipo de crise que se repete
sistematicamente e que está associada aos processos de produção, reprodução e de circulação.
Para que tal ocorra é necessário, contudo, que o capital seja já um elemento dominante e ocupe o
papel de organizador do processo produtivo. Já não se trata mais somente de um sistema do
capital mercantil ou financeiro. Trata-se do sistema de produção capitalista. A produção
capitalista significa que toda atividade econômica está submetida ao capital em suas diversas
formas (agrícola ou industrial, mercantil ou financeira, etc.). Caso qualquer uma delas sofra uma
paralisação, provocará a inviabilidade de circular a produção anteriormente realizada e uma
queda no processo de produção. O capital dinheiro tende a se converter em entesouramento; e
onde ele se converte em entesouramento, não se converte em capital produtivo. Daí inclusive a
importância do crédito no sistema capitalista: para permitir que o entesouramento não se converta
numa paralisia do processo produtivo no seu conjunto. O crédito permite que o seu possuidor
queira entesourá-lo. O capital produtivo pagará juros, ou seja, uma renda do capital dinheiro.

Essa visão nos permite pensar o próprio movimento do capital como aquele que
traz no seu interior as possibilidades da crise. Ao nos aproximarmos para ver o movimento do
capital concluiremos que o problema da rotação do capital está associado à produção. Quando o
capital se liga ao sistema produtivo ele tem de seguir as regras e as leis da organização, do
trabalho, da tecnologia e do processo produtivo real. O tempo e o número de rotações do capital
vão depender do tipo de produto e da sua circulação como bem útil. Se ele vai diretamente ao
mercado e não consome capital fixo suas rotações serão imediatas. Enquanto o capital fixo tem
um processo de rotação de longo prazo, o capital circulante tem uma rotação de curto prazo.
Quanto mais a produção se aproxima do consumo final maior será a rotatividade do capital
circulante e, portanto, os ciclos de rotação serão muito mais rápidos e dependentes dos estoques e
de seu financiamento.

É evidente que nesses ciclos de rotação está permanentemente colocada a


possibilidade de uma deficiência de mercado que impeça a rotação do capital. Para que essa
rotação se dê, é preciso que se cumpra a passagem do capital produtivo ao capital mercantil, e
que se retome o dinheiro para iniciar uma nova produção e circulação. Estamos aqui diante do
problema dos estoques que, como vamos ver posteriormente, foi visto como uma das origens dos
ciclos de 3 a 5 anos, que foi descoberto posteriormente por autores que compreenderam a
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importância da rotação e dos estoques dentro do processo de reprodução do sistema. Foi Kitchin
quem descobriu esse ciclo ligado à renovação dos estoques, com um ritmo de 3 a 5 anos que se
apresenta quase sempre durante um longo período do funcionamento do sistema capitalista.

Ao analisar a reprodução, Marx estabeleceu a relação entre ela e a circulação do


capital social global. Não se tratava simplesmente da reprodução de cada capital particular, mas
do conjunto do capital de uma nação, de uma unidade econômica determinada. O processo de
reprodução e a circulação do capital social global compõe-se de duas formas de reprodução: a
reprodução simples e a ampliada. A reprodução simples supõe que as partes que compõe o
sistema trocam seus produtos entre si. Inclui-se aí tanto o produtor direto como o produtor
indireto, que vende para o primeiro os meios de produção. A separação entre o setor I de bens de
produção e setor 2 de bens de consumo permite compreender o papel da reposição das máquinas
e matérias-primas na formação do equilíbrio econômico global. A noção da reprodução ampliada,
por sua vez, supõe que uma parte desse capital deverá ser aplicada não só para repor o ciclo de
desgaste das maquinárias, mas para adquirir uma quantidade maior de maquinárias e mão-de-
obra para criar novas unidades de produção. A reprodução ampliada é capitalista por excelência
posto que este sistema opera buscando sempre ampliar a base da sua acumulação com o objetivo
de aumentar o volume de mais-valia, que pode ficar na mão do condutor desse sistema, o
capitalista.

A teoria da crise econômica tem um papel fundamental dentro do sistema


marxiano. O ciclo econômico e as suas fases fazem parte essencial do funcionamento do modo de
produção capitalista. Daí Marx ter podido distinguir, na sua obra, três tipos de crise, todas
ligadas ao funcionamento da taxa de lucro. As crises de acumulação resultam da relação entre a
taxa de lucro e o conjunto dos componentes do capital. Durante o auge econômico, a taxa de
lucro começa a ter dificuldades de se manter. O pleno emprego da força de trabalho conduz a
uma diminuição do exército industrial de reserva. Um auge econômico importante e duradouro
aumentará a demanda de força de trabalho em relação à oferta e, portanto, tende a elevar o
salário médio. O mesmo ocorre com a demanda de matérias-primas que tende também a aumentar
fazendo elevar-se o preço das matérias-primas. A demanda de maquinárias também tende a
aumentar com o auge econômico. Com os novos investimentos há uma tendência ao aumento do
preço do dinheiro e uma elevação da taxa de juros. Assim também a construção, a energia e
outros componentes do capital tendem a aumentar o seu preço devido à pressão da demanda
produtiva. Tudo isso faz com que a taxa de lucro tenda a cair. O auge econômico não permite a
criação de uma renda extra pela via do aumento de preços pois a competição torna-se muito
intensa, com uma forte pressão sobre os preços. Há uma oferta muito grande de produtos e
também o mercado, no seu conjunto, passa a ter um poder de barganha maior, tendendo a haver
uma queda de preços dos produtos finais.
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Desta forma, o auge econômico produz uma tendência descrescente da taxa de


lucro. Nesse processo cíclico, é o pleno emprego que vai criar as condições para a interrupção do
auge econômico, na medida em que esses aumentos fazem cair a taxa de lucro e diminuem o
interesse de novos investimentos do capitalista, e isso começa a dar origem a um movimento
inverso. O investimento diminui e começam a aparecer os seus efeitos secundários: redução da
demanda, tendência ao desemprego e a uma queda em geral da produção. Primeiramente, há uma
tendência à recessão; depois à depressão.

Essa visão do processo de acumulação, em Marx, não está ligada


especificamente a períodos determinados, mas sim dentro da sua visão geral do processo de
acumulação. Não está, também, diretamente ligada à tendência secular a queda da taxa de lucro,
que é uma outra forma em que se apresenta a crise como fenômeno de dimensão histórica. Nesse
caso, a questão da mudança tecnológica está no centro da teoria econômica. Com a evolução do
sistema capitalista, a composição orgânica do capital tende a ser cada vez mais intensiva em
capital constante em relação a capital variável, o que os economistas neoclássicos chamarão mais
tarde de "intensiva em capital". A composição orgânica do capital tende a ser crescente como
resultado da própria evolução da tecnologia, que permite que a mão-de-obra produza uma
quantidade cada vez maior de produtos num mesmo período de tempo. Isto ocorre, seja pela
evolução da maquinária, seja pela evolução da divisão do trabalho, ou seja por aplicação de
outros elementos científicos na produção. O fato é que, com um número menor de horas, é
possível produzir uma maior quantidade de produtos.

Não devemos confundir a composição orgânica do capital com o investimento


intensivo em capital. Essas noções não são exatamente as mesmas porque quando se fala em
investimento intensivo em capital está se falando, sobretudo, em capital fixo: maquinárias e
gastos de instalação. Não se está incluindo o capital circulante, isto é, as matérias-primas, o
pagamento de energia, etc. Às vezes, com a própria evolução da tecnologia, as máquinas podem
passar a custar bem mais barato e um volume de máquinas menor pode operar um sistema
produtivo maior com um pequeno número de trabalhadores. Portanto, essa relação é mais
complexa do que a noção de intensidade em capital ou em trabalho, ou melhor, do que os gastos
em máquinas ou em remuneração da mão-de-obra. Deve-se considerar também a relação do
trabalhador com as matérias-primas. Quanto maior a produtividade como fruto do avanço
tecnológico, ele vai mover, num mesmo período de tempo, uma quantidade de matérias-primas
crescente, pelo menos se consideramos os seguintes fatos: ao valor dessa matéria-prima, que pode
cair como conseqüência do desenvolvimento do setor produtor de matérias-primas, que através do
desenvolvimento tecnológico também poderá, com um menor tempo de trabalho socialmente
necessário, produzir matérias-primas mais baratas.
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Vemos assim a tendência da composição orgânica do capital a ser cada vez mais
intensiva em capital constante, em relação ao capital variável. Ou seja, em relação ao salário
(composição orgânica crescente do capital) está associada à tendência da acumulação capitalista
a buscar produtos de custo inferior, que ocupem um tempo de trabalho socialmente necessário
cada vez menor. Esta tendência tem no desenvolvimento tecnológico os meios para lograr essa
maior produtividade do trabalho e, portanto, baixar o custo dos produtos. Essa lógica intrínseca
na acumulação capitalista é que leva ao desenvolvimento científico e tecnológico como alguns
dos recursos de que dispõe o capital para conseguir o aumento da mais-valia. Trata-se de ampliar
a taxa de mais-valia pela diminuição do valor do capital constante, ou mais-valia relativa,
solução que tende a ser progressista e leva ao avanço das forças produtivas da humanidade.

Contudo, essa tendência a uma composição orgânica crescente do capital


funciona a longo prazo na direção de diminuir a taxa média de lucro. Vemos assim uma
separação entre a ação do capitalista individual (microeconômica) e os seus resultados globais
(macroeconômicos). Uma realidade é a operação das empresas que dependa da ação do agente
econômico, o capitalista. Ele tem interesse em incorporar novas tecnologias que vão produzir um
custo mais baixo no seu produto, como uma forma de competir com os outros produtores. Ao
dispor de um produto com custo mais baixo, enquanto os outros produtores têm os produtos a
custo mais elevado com a velha tecnologia, ele venderá seus produtos a um preço mais baixo e
não pelo seu preço de custo. Dessa forma ele obterá uma taxa de lucro mais alta. Através do
monopólio da tecnologia ele recebe uma renda extra decorrente desse monopólio da tecnologia.

Essa renda tecnológica desaparece, contudo, com a difusão dessa tecnologia.


Quando ela se difunde aos demais produtores, e todos passam a adotá-la rebaixa-se, então, o
custo de todos os produtores e os preços tenderão a cair. Nesse momento a composição orgânica
crescente do capital vai provocar uma baixa na taxa de lucro, na medida em que o capitalista terá
de investir mais capital constante para, com o mesmo número de horas de trabalho, alcançar um
menor valor final do produto. Como a taxa de lucro é a relação entre o lucro e o gasto de capital
variável e capital constante (isto é, o conjunto do capital que o capitalista adianta no processo de
produção) e, havendo uma necessidade de um adiantamento maior em capital constante para
obter o mesmo lucro sobre o mesmo capital variável, o resultado será uma taxa de lucro mais
baixa. Historicamente, a composição orgânica crescente do capital leva a uma tendência secular à
baixa da taxa de lucro.

Mas, como nós mostramos, essa tendência se manifesta quando as inovações se


difundem e fazem com que o produto baixe de preço em geral, como resultado da quebra da
situação monopólica. Neste momento o produto tende a aproximar-se do seu preço de custo e o
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conjunto dos capitalistas vai ter uma taxa de lucro mais baixa. Em resumo: a taxa média de lucro
baixará.

Esse comportamento complexo da mudança tecnológica e sua relação com o


monopólio e o mercado mais ou menos livre é extremamente importante para compreender os
ciclos longos porque as situações monopólicas estão ligadas ao tempo de difusão de uma
inovação, que hoje sabemos que é um tempo mais ou menos mensurável em torno de dez, quinze,
ou no máximo vinte anos, período em que vai completar a sua maturidade, terminar sua difusão
e, portanto, vai produzir uma tendência à baixa de custo, levando o preço do produto a se
aproximar do seu preço de custo. Ao criar uma situação de rompimento de monopólio vai obrigar
a algum tipo de reestruturação produtiva, na busca de custos mais baixos, mão-de-obra e/ou
matérias-primas mais baratas, buscando uma baixa de custo por uma via que permita manter, de
alguma forma, uma taxa de lucro mais alta. Como veremos posteriormente, é nesta fase que vai-
se produzir a passagem desse setor de produção em obsolescência para as frações decadentes do
capital, ou, em última instância, para o Estado, que vai assumir esses setores com alta
composição orgânica de capital e baixa taxa de lucro, que passam a ser de desinteresse dos
capitalistas em geral. O Estado toma esses setores para si para fazer aumentar a taxa média de
lucro porque a taxa de lucro do Estado não entra na formação da taxa média de lucro. Dessa
forma, quando o Estado entra para tomar essas empresas de baixa lucratividade ele provoca uma
elevação da taxa de lucro global e estimula os investimentos em novas tecnologias.

Este, como veremos, é um dos aspectos mais importantes do moderno


capitalismo de Estado, que se qualifica como um capitalismo monopolista de Estado. Trata-se da
intervenção crescente do Estado dentro do próprio processo de acumulação, aspecto muito
essencial da evolução da economia internacional contemporânea, na qual ele tem muitas outras
facetas.

Enquanto a crise de acumulação se liga a mudanças dos componentes do capital


que leva a uma tendência à queda da taxa de lucro nos auges econômicos quando se alcançam
situações de pleno emprego, existe uma tendência histórica à queda da taxa de lucro, como
conseqüência da incorporação de tecnologias cada vez mais produtivas que diminuem a
quantidade de trabalho necessária para reproduzir o conjunto do capital, levando portanto a uma
composição orgânica do capital crescente, que vai conduzir, como vimos, a uma tendência secular
à queda da taxa de lucro. No primeiro caso o ciclo é mais curto porque cria-se uma situação de
auge econômico e plena utilização da capacidade já instalada a curto prazo. No segundo caso,
supõe-se a incorporação de novas tecnologias e, portanto, um ciclo mais longo, que está ligado
inclusive a questões institucionais extremamente complexas, como é, por exemplo, a intervenção
do Estado para assegurar a mudança de comportamento da taxa média de lucro.
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TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Essa tendência secular à queda da taxa de lucro leva a uma busca por prolongar
a lucratividade do capital através da especulação financeira. O capital se retira dos setores onde
as taxas de lucro tendem a cair, para concentrar-se em atividades especulativas, particularmente
no setor financeiro. O Estado intervém novamente como criador desse setor financeiro pela via
clássica da dívida pública. A dívida pública é uma das fontes principais de criação do setor
financeiro. O pagamento de juros pelo Estado sobre a sua própria dívida é uma transferência de
recursos da população, no seu conjunto, daqueles que pagam os impostos ao Estado, para um
setor econômico específico, em geral o setor financeiro. Este está ligado às outras formas do
capital, através da tendência da evolução do sistema capitalista na direção de uma situação em
que o capital dinheiro (que se faz também capital crédito, financeiro, bancário, etc.) vá
hegemonizando o conjunto do capital. Ele submete o capital produtivo e o capital mercantil, na
medida em que o sistema capitalista vai se convertendo num sistema dominante a nível nacional e
internacional.

O outro tipo de crise que Marx analisou foram as de reprodução, que estão
ligadas à relação entre as partes que a compõem e a proporção em que estes setores se
intercambiem entre si. Cada setor vende aos demais setores, numa antecipação do que seria a
matriz de insumo produto de Leontief. Nesta situação, as proporções passam a ser essenciais. É
preciso que os setores que compõem o conjunto do sistema produtivo intercambiem seus produtos
entre si em proporções corretas. Para analisar tais relações, Marx distinguiu entre o setor I,
produtor de bens de produção, e o setor 2, produtor de bens de consumo, e dentro do setor I, o
capital constante (C), o capital variável (V), e a mais-valia (M). Todo seu esforço teórico,
constante do segundo volume de O Capital, será no sentido de provar que é possível haver um
equilíbrio entre esses setores. Na sua análise do esquema de reprodução, ele demonstra que este
equilíbrio é possível porque o setor de bens de produção produz, em parte, para sua própria
reprodução. (Uma parte se destina ao consumo de C1, e outra parte produz para o setor C2 - o
componente C, capital constante, dos meios de consumo). Dessa forma, toda a produção do setor
I, de meios de produção, será consumida por C1 e C2.

Quanto à produção do setor de bens de consumo, será consumida pelos


trabalhadores, (V-capital variável) e pelos capitalistas (M-mais-valia), tanto do setor I como do
setor 2. Portanto, se as proporções forem corretas, será possível reproduzir o conjunto, porque as
várias partes consumirão produtos diferentes que se complementam entre si formando um
conjunto que se fecha, onde as partes produzem umas para as outras, reproduzindo-se assim o
sistema no seu conjunto. Claro que, para isso são necessárias garantir estas proporções. Se
houver acumulação, tudo se resume em garantir as mesmas proporções na parte nova acumulada.

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Marx mostra, no segundo volume de O Capital, a viabilidade teórica desta


reprodução. O fato, contudo, de que essa reprodução seja viável não quer dizer que ela seja
provável e que aconteça sempre. Pelo contrário, há vários fatores rígidos que dificultam esse
processo de reprodução e a manutenção dessas proporções. Engels, por exemplo, chama a
atenção para alguns deles. Marx também, eventualmente. Quando surge um setor muito
lucrativo, por exemplo, há uma tendência do capital para migrar para esse setor e ao fazê-lo
produzir mais do que pode ser consumido deste produto. Cria-se então uma crise de proporção,
um excedente que não poderá ser consumido, gerando uma possibilidade de crise, de recessão e
depressão, sobretudo caso se trate de um movimento muito grande de investimento.

De certa forma, o sistema capitalista procura neutralizar essas situações através


da criação de uma taxa média de lucro que evite o aparecimento de setores com lucratividade
muito acima da média do sistema. Mas quando aparece, por exemplo, uma inovação importante,
quando há transformações importantes, ou quando há acontecimentos especiais de origem natural
ou social ou histórica ou geográfica, criam-se situações em que a taxa de lucro média não vai
funcionar para esses setores que apresentarão lucratividade mais alta e tenderão a produzir uma
emigração do capital para eles muito superior às possibilidades do mercado.

O ciclo do capital sofre, assim, constantemente, as perturbações dessas


tendências à desproporção, dentro do sistema capitalista. Para refazer essa regulação do sistema
entra outra vez o Estado e o setor financeiro. Tanto um quanto o outro atuam no sentido de
estabelecer um certo grau de planejamento dos investimentos. Isto permite que o movimento de
capital neutralize, em parte, essas tendências à desproporção, produzindo movimentos de capitais
que tendem a criar taxas médias de lucro.

Em seu livro Acumulação de Capital, Rosa Luxemburgo demonstra a


inviabilidade da manutenção dessas proporções. Ela mostra que a tendência da evolução
tecnológica era criar uma desproporção entre os distintos setores econômicos a favor da demanda
de bens de produção e em detrimento da demanda de bens de consumo. O debate em torno dos
esquemas de reprodução teve a interessante participação de Tugan-Baranovisky e de outros
estudiosos do capital. Eles vão indicar que as tendências do desenvolvimento tecnológico têm
conseqüências sobre as proporções entre os setores; que essas tendências são mais ou menos
rígidas; e que não se pode pensar na sua supressão para chegar às proporções adequadas à
reprodução do sistema capitalista. Rosa Luxemburgo mostrou que o sistema capitalista pode
resolver, em parte, as dificuldades dessas desproporções através da sua interação com setores
externos a ele. Entre estes estão as economias pré-capitalistas e o Estado, que além de entrar
como um fator regulador dessas desproporções, produz demandas específicas que fortalecem os
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 12
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

investimentos no setor I. Neste caso, o crescimento dos gastos militares tendiam a ser uma forma
de restabelecer as proporções necessárias dos esquemas de reprodução. Isto porque a maior
dificuldade que o sistema encontra é lograr que a demanda de consumo final acompanhe a
tendência ao crescimento do setor I, determinado pelo avanço da tecnologia.

Esta visão também levará Tugan-Baranovisky a pensar num sistema capitalista


que produza máquinas para produtores de máquinas. Rosa Luxemburgo, ao imaginar a ação do
Estado, lembrou a sua importância como grande demandante de produtos de alta tecnologia. Ela
antecipou, assim, uma tendência que se manifestou com a Primeira e Segunda Guerra Mundial, e
depois no período de pós-guerra, ao se criar um setor militar permanente dentro do sistema
capitalista, que foi uma das maneiras que permitiu o ciclo econômico do pós-guerra.

A questão da proporcionalidade é, pois, um dos aspectos chave da interpretação


marxista da acumulação que deveria comprovar-se através de vários desdobramentos históricos e
que antecipou uma das formas possíveis de crise econômica e de ação anti-cíclica. Contudo, elas
tendem a afetar o sistema de regulação e o sistema institucional mais do que a produzir
propriamente uma forma cíclica bem definida. São tendências de ciclos médios ou longos, na
medida em que esses sistemas institucionais se montam e começam a entrar em crise dentro do
sistema global, internacional ou nacional.

A S C R I S E S D E R E AL I Z A Ç Ã O

A terceira modalidade de crise que aparece na obra de Marx é a de realização.


Muitos autores evocam os textos de Marx e Engels, que questionam a idéia do subconsumo como
uma réplica a qualquer explicação das crises pelo aspecto do consumo. Isto particularmente
depois de ter sido rejeitada drasticamente por Lenin a idéia do um subconsumismo como origem
das crises dentro do sistema capitalista. Segundo ele, crise de subconsumo seria muito mais
própria de colocações de economistas como Sismondi que, como já assinalamos, não destacava a
importância do setor I de bens de produção, nem do processo de acumulação, nem a composição
orgânica do capital e a taxa de lucro. Na realidade ele criou grande parte dessas categorias de
análise que permitem uma análise muito mais sofisticada das crises. Portanto, o subconsumo é
rejeitado pela teoria marxista, apesar de se manifestar, por exemplo, na obra de Rosa
Luxemburgo sob a forma de uma dificuldade do setor de consumo final de manter o dinamismo
da economia. Mas é preciso ver que quando Rosa afirma a existência deste subconsumo não
deixa de tomar em consideração os elementos que compõem o processo de acumulação. Ela está
afirmando somente que esses elementos do processo de acumulação estão determinados por uma
composição orgânica crescente do capital. Esta impedirá a proporcionalidade entre os setores e
levará a uma distribuição dos elementos que compõem a produção (entre o capital variável e o
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 13
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

capital constante, entre o capital constante e a mais-valia) que tornará inviável o consumo final
crescer de acordo com as necessidades da reprodução global do sistema. Isto impedirá que ele
seja a mola dinâmica do sistema capitalista. O consumo final está associado a V e M, mas
acontece que a mais-valia se desdobra entre consumo de produtos de luxo e poupança para novos
investimentos. Na medida em que o sistema tende a criar uma poupança crescente para novos
investimentos e entra num processo de acumulação forte, a demanda de bens de consumo tende a
decair, aumentando a demanda de bens de produção. Mas, como a criação desses bens de
produção segue certa leis técnicas, haverá dificuldade de estabelecer as proporções entre os
vários elementos. Não podemos, portanto, assimilar Rosa Luxemburgo a um subconsumismo
primitivo, mas sim a uma visão das dificuldades da reprodução capitalista ser movida
basicamente pelo setor de consumo final. Quando se chama Rosa Luxemburgo de a rainha do
subconsumismo estamos fazendo-lhe uma injustiça.

As crises de realização têm sua origem nessas dificuldades de ampliação de


consumo dos bens de consumo dentro da sociedade capitalista. Quando introduzimos, por
exemplo, o monopólio como um fator crescente de organização da produção capitalista; quando
introduzimos a especulação financeira como um fator crescente do seu funcionamento, vamos
encontrar um efeito destes fenômenos sobre a distribuição de renda no sentido de ampliar a
margem de recursos possíveis para novos investimentos. Mas estes tendem a expressar-se em
composições orgânicas de capital extremamente elevadas gerando, portanto, pouco salário e
pouca mais-valia em forma de consumo final. A tendência a uma diminuição do dinamismo do
setor de bens de consumo leva, paradoxalmente, a um excedente muito grande no setor I de bens
de produção e à necessidade de procurar meios para saída desses bens de produção, que
finalmente existem para aumentar a produção de bens de consumo. Apesar de apoiar-se na
desproporção, esta forma de crise não deixa de ser uma manifestação das difuculdades de
realização porque num certo momento deste processo é a dificuldade de encontrar um mercado
para o que foi ou poderia ser produzido, que está na base da crise capitalista.

A tradição marxista vai se desenvolver posteriormente através de vários autores e


produzirá uma literatura muito consistente de análise das crises econômicas. Ela é de grande
atualidade, sobretudo ao demonstrar que é possível se fazer uma teoria econômica que seja ao
mesmo tempo uma teoria da mudança tecnológica e uma teoria do ciclo econômico. Enfim, uma
teoria que nos vincule com o processo real histórico e não com um modelo abstrato, a-histórico,
sem condições de explicar nenhuma realidade.

A evolução posterior da economia vai agregar aos ciclos econômicos elementos


novos de grande importância que Marx não conheceu. O mais significativo deles são os ciclos
longos ou as ondas longas que Kondratiev encontrará nos anos 20. O debate sobre as ondas
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 14
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

longas agregará uma realidade nova dentro da teoria marxista, mas extrapolará do campo do
marxismo para a economia ortodoxa, quando a combinação da crise do pós-guerra e a crise de
1929 colocaram na ordem do dia não só o problema das crises econômicas mas também o seu
caráter de longo prazo. Schumpeter (1939) integrou essa problemática de maneira muito rica na
sua análise definitiva dos ciclos econômicos.

Na literatura marxista, a questão da crise, como vimos, tinha sido debatida no


final do século XIX, sobretudo pelos teóricos russos. Entre eles se destacaram Tugan-
Baranovisky , Lenin e Parvus, que foi um dos primeiros a visualizar as ondas longas em 1905, e
economistas holandeses que também trabalharam sobre os ciclos longos no começo do século.
Como veremos, contudo, estes ciclos apenas serão realmente sistematizados por Kondratiev nos
anos 20. Entre 1917 e 1930 há um debate muito intenso dentro do pensamento marxista. Alguns
autores sob a influência de Rosa Luxemburgo e outros sob a influência de Lenin vão tentar
explicar a crise de 1914-1918 pelos efeitos da Primeira Guerra Mundial, mas sobretudo a crise
que se manifestou depois da Primeira Guerra Mundial na Europa, levou a obras que buscaram
analisar a acumulação como uma tendência à estagnação. A visão de Rosa Luxemburgo levava a
enfatizar as dificuldades do sistema de se auto-reproduzir e a necessidade de encontrar soluções
institucionais externas, seja por mercados não capitalistas, ou seja pela via do Estado e o setor
militar como saída. Moscowska, Paul Mattick, Henrik Grossman têm uma temática muita rica
nas décadas de 30, 40, 50, retomada por Paul Sweezy no seu estudo sobre o desenvolvimento
capitalista, e posteriormente, na década de 60, quando junto com Paul Baran escreve o seu
Capital Monopolista.

Ao lado dessa tendência, encontramos também a tendência bolchevista que vai


desembocar no Instituto de Economia Mundial, com a tese da crise geral do capitalismo. Este
enfoque tende a assimilar o declínio da produção e uma certa estagnação da produção entre o fim
da Primeira Guerra Mundial e o fim da Segunda Guerra Mundial. Este longo período de relativa
estagnação, com fases de crescimento certas e crises muito longas, indicavam uma tendência a
estagnação e pareciam fundamentar essa visão na qual Eugenio Varga (1934) vai ter um papel
muito importante ao definir a crise do capitalismo em função do aparecimento da revolução
socialista na Rússia. Era o começo de um período histórico de retrocesso do sistema capitalista,
crise que levará inclusive ao surgimento do fascismo e do nazismo. A identificação dessa crise
final, com o aparecimento da contra-revolução fascista como uma forma de sobrevivência do
sistema capitalista, é parte da crise geral do capitalismo. Esta tese se reforçará, de certa forma,
quando retomada por Paul Sweezy e Paul Baran ao mostrarem o consumo militar como a grande
saída para a situação de subconsumo criada no pós-guerra e como tendência natural da evolução
do sistema capitalista.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 15
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Não é o lugar aqui para fazermos uma história desses enfoques e dessas
contribuições teóricas, mas simplesmente quero apontar as grandes direções de interpretação que
vão marcar o pensamento marxista. Havia que assinalar, contudo, uma outra linha teórica que vai
desembocar em Ernest Mandel (1964), que produziu o seu Traité de Économie Marxiste, e que
vai escrever, na década de 70, Capitalismo Tardio, onde tentará articular a visão marxista da
acumulação e da tendência decrescente da taxa de lucro como elemento-chave para a
compreensão das crises econômicas com as contribuições de Kondratiev e das ondas longas. No
meu estudo A Crise do Capitalismo Norte-Americano e América Latina (1970) vou também
retomar o ciclo longo de Kondratiev, articulando-o com outras modalidade de análise do ciclo
econômico para tentar compreender a evolução do capitalismo de pós-guerra e particularmente
daquele período histórico. André Gunder Frank também busca nos ciclos longos um caminho
para a análise da economia mundial. Na sua visão da acumulação mundial, Samir Amin
aproxima-se dessa visão. Immanuel Wallerstein, no seu Centro de Estudos Fernand Braudel, dará
uma das mais rigorosas contribuições ao estudo das ondas longas.

Faz-se necessário, portanto, que analisemos com cuidado essa outra maneira de
enfocar a crise econômica. A análise das ondas longas ou dos possíveis ciclos longos, como
veremos, permitirá articular grande parte dos estudos sobre o ciclo econômico realizados durante
a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século XX, tendo em Schumpeter um
dos seus primeiros grandes sistematizadores. Na década de 70 e 80 encontram-se novos
elementos para a compreensão das ondas longas que procuraremos transmitir aqui.

A QUESTÃO DAS ONDAS LONGAS

A existência de longos períodos de crescimento econômico, sucedidos por longos


períodos de recessão, depressão ou baixo crescimento faz parte da literatura dos povos e da
percepção que a sociedade tem de sua experiência histórica. Porém, a sistematização empírica
sobre a existência dos ciclos longos foi produto de um trabalho de pesquisa bastante difícil, que
veio a se realizar com maior clareza somente na década de 20 deste século, através da obra do
economista russo Nikolai Kondratiev, que publicou em 1926, o seu ensaio "As Ondas Longas na
Vida Econômica." Neste ensaio, ele distinguiu vários ciclos ou ondas longas (o termo onda
pretende ser menos determinístico e menos mecânico do que o conceito de ciclo, que supõe
necessariamente períodos mais ou menos iguais de descenso e de ascenso). Kondratiev distinguiu,
na história econômica européia, um período que vai de 1780-1790 a 1810-1817, que registraria
um ascenso nos dados sobre preço e sobre alguns produtos agrícolas, escolhidos pela sua
importância e pela facilidade para estabelecer uma série contínua. Em seguida, ele distinguiu um
período de que vai de 1810-17 a 1844-51, caracterizado por um declínio da economia européia.
Logo em seguida, determinou a existência de um outro período que vai de 1844-51 a 1870-75,
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 16
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

que seria um período de ascenso econômico. Sucessivamente, localizou um período de declínio


econômico que foi de 1870-75 a 1890-96. Novamente encontrou uma fase de crescimento
econômico sustentado no final do século e início do século XX, que pode ser enquadrado entre os
anos de 1890-96 a 1914-20. Apesar de realizar seus estudos na década de 20, antes do grande
crack de 1929, ele constatava a existência de uma nova fase de declínio que se iniciara em 1914-
20.

Se completarmos os dados de Kondratiev, vamos encontrar que esse período de


declínio vai prolongar-se até 1940-45, quando a economia norte-americana começa a recuperar-
se durante a guerra. Em seguida, teríamos um período que se extende de 1940-45 até 1966-73,
caracterizado por um longo ascenso econômico. Desde 1966-73 até nossos dias, em 1993,
registra-se um período de declínio, que deveria extender-se, a se manterem as mesmas tendências
das ondas longas anteriores, até 1994-97, ou talvez até 98, para dar início então a um novo
período de ascenso.

Os dados de Kondratiev são até hoje objeto de ampla discussão, seja porque haja
propostas de diferentes datas para estabelecer os limites dos ciclos, seja porque haja discussões
metodológicas sobre o conceito mesmo dessas ondas longas. Mas a verdade é que os dados
parecem confirmar a existência destes períodos de ascenso e declínio de cerca de 25 anos cada
um, sobretudo quando se utiliza uma metodologia adequada, abarcando vários setores e não
somente aqueles que Kondratiev estudou originalmente. Há evidências suficientes para
comprovar não somente a existência dos ciclos longos por ele detectados, como, além disto
produziu-se uma confirmação desses ciclos no período posterior a seus estudos.

Dentro desta linha de aceitação dos dados como ponto de partida para a reflexão
teórica, foram vários os autores que confirmaram as constatações de Kondratiev. Entre eles será
exatamente Joseph Schumpeter, no seu livro Business Cycles, dois volumes, editado pela Mc
Graw Hill em Nova Iorque, em 1939, o economista que vai produzir a reflexão mais sistemática
sobre as ondas longas de Kondratiev. Ele vai inclusive demonstrar a existência de uma
combinação dos ciclos longos de 40 a 60 anos com dois outros ciclos menores. São eles, os
ciclos de investimentos, que se sucedem de 4 (quatro) em 4 (quatro) anos, determinados pelos
movimentos de estoques, que Kitchin havia encontrado em 1900, e os ciclos de nove a onze anos,
estudados por Juglar, no século passado, em torno de 1860.

O economista holandês, Van Duijn ( 1983), procurou confirmar e desenvolver


esta linha de análise iniciada por Schumpeter, incorporando, contudo, um outro ciclo, que é o
ciclo de Kuznet, que identificou ciclos de 15 a 25 anos, ligados aos investimentos em transporte e
construção de casas, ocorridos sobretudo nos Estados Unidos. Segundo Van Duijn este ciclo se
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 17
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

combinaria com os ciclos anteriormente destacados, não em todas ocasiões nem em todos os
paises (pois haveria alterações dos mesmos, que foram encontrados sobretudo nos Estados
Unidos, particularmente quando descobertos em outros paises), pois eles estão muito ligados à
construção de casas e à instalação de transportes, devido à imigração nos períodos de ascenso
econômico, e formam um ciclo um pouco atípico.

O enfoque de Schumpeter, reafirmado por vários economistas atuais, permitiu


uma retomada da idéia do fenômeno econômico como um processo de mudança e transformação.
Schumpeter inicia sua análise definindo uma situação de equilíbrio, para depois introduzir as
mudanças de caráter cíclico, as quais estariam influenciadas por elementos externos ao universo
estritamente econômico. Ele buscará a explicação para os movimentos cíclicos longos ou ondas
longas na existência de uma capacidade empresarial criadora de inovações significativas. Assim,
para cada novo ciclo de 40 a 60 anos devemos supor o aparecimento de uma geração de
empresários inovadores, cuja ação decisiva e criativa seria a base para a criação de um novo
ciclo de inovações significativas.

Na década de 70, a temática dos ciclos longos foi retomada depois de um longo
abandono, devido ao crescimento econômico sutentado que ocorreu após a segunda Guerra
Mundial, e que parecia haver eliminado os ciclos econômicos. Este longo período de crescimento
deu origem inclusive a várias interpretações de que as economias nacionais já teriam chegado a
um estágio pós-cíclico, depois da segunda Guerra Mundial. Em outros estudos analisamos com
detalhes as características do período pós-Segunda Guerra. A verdade, porém, é que o
pensamento econômico só veio a redescobrir Kondratiev e os ciclos longos quando a crise de 66-
67 começou a gerar grandes questionamentos do sistema capitalista, que se expressaram
fundamentalmente nos grande movimentos de massa de 1968, que ocorreram no mundo inteiro.
Logo depois, em 1973, a ofensiva da OPEP para reajustar drasticamente os preços do petróleo,
não somente confirmou a tendência para o declínio das taxas de crescimento já verificadas desde
1967, como apresentou uma grave depressão entre 1973-75. O aumento do preço do petróleo
colocava em cheque todo um modelo econômico baseado numa fonte energética barata apesar de
seu caráter não renovável. Tudo indicava que não seria possível manter esta situação que passava
pela subjugação dos povos coloniais. No mesmo período apresentavam-se fenômenos políticos e
militares que pareciam confirmar esta tendência do Terceiro Mundo sacudir em definitivo esta
tutela , como a derrota militar dos Estados Unidos no Vietnam e a queda do fascismo em
Portugual, sucedida pelas revoluções em todo o seu império.

É fácil entender portanto por que foi na década de 70 que o modelo das ondas
longas de Kondratiev voltou a ser estudado. Eu destacaria em primeiro lugar o meu próprio
trabalho no livro de 1970 sobre A Crise Norte-americana e a América Latina e em artigos
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 18
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

publicados numa coletânea dos textos apresentados na Conferência de Tilburg, na Holanda, em


1970, sob o título de O Capitalismo na Década de 70, assim como o texto que apresentei no
Congresso Internacional de Sociologia de Varna, em 1969, e que foi publicado em francês e
espanhol no livro de Anouar Abdel Malek sobre A Sociologia do Imperialismo,

Em 1972, Ernest Mandel vai publicar seu excelente livro sobre O Capitalismo
Tardio, no qual retomou a temática dos ciclos longos, logo seguido por André Frank nos seus
estudos sobre as ondas longas, a acumulação e a crise, nos quais tentou prolongar o fenômeno
dos ciclos longos até o período que vai da conquista da América até a Revolução Francesa, numa
análise de acumulação de longo prazo. Ele aplicou também o conceito aos estudos da crise
capitalista dos anos 70 . Como já assinalamos, foi nesta mesma época que Immanuel Wallerstein
iniciou seu estudo da formação do sistema-mundo formado pelo capitalismo contemporâneo,
utilizando o conceito das ondas longas de Kondratiev. Fernand Braudel recupera em grande
estilo as ondas longas propondo sua extensão não somente a períodos anteriores como
encontrando ondas de 200 anos. W.W.Rostow vai reencontrar Kondratiev no seu The World
Economy: History and Prospect, editado pela Universidade do Texas, em 1978., Daí em diante,
foram milhares de artigos na imprensa especializada do mundo, chegando inclusive ao grande
público as exotéricas ondas longas de Kondratiev.

Fernand Braudel, como afirmamos, vai detectar ondas similares na Itália, no


período que vai de 1460 a 1621-1650. Ele vai detectar, de 1460 a 83, um período de ascenso na
Itália; entre 1483 e 1509 um período de descenso; entre 1509 e 29 outro ascenso; entre 1529 e
39, outro descenso; entre 1539 e 59 um ascenso; entre 1559 e 75, novo descenso; entre 1575 e 95
outro ascenso; entre 1595 e 1621, descenso; 1621 a 1650, novo ascenso. Este estudo, publicado
no livro de Romano e Vivanti (1974), Storia di Itália, volume 2, procura desenvolver uma
temática que será retomada por outros autores, que pretendem detectar a existência de tendências
seculares ou "logísticas" que podem ser assimiladas a ondas longas bastante mais amplas do que
aquelas detectadas por Kondratiev ou pelo próprio Braudel.

Estes autores pretendem detectar a existência de uma tendência secular que se


prolonga do século IX e X, até meados do século XV, cujo auge se econtraria no século XII. Em
seguida se apresentaria uma nova onda secular da metade do século XV até meados do século
XVIII, cujo auge se localizaria no fim do século XVI. Da metade do século XVIII até a metade
do século XX teria havido outra onda secular cujo auge deve haver se localizado no final do
século XIX e início do século XX. Por fim, na metade do século XX, teria se iniciado uma nova
tendência secular ou "logística"que deverá se prolongar possivelmente até a metade do século
XXII, no caso de persistirem estes padrões cíclicos.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 19
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Teríamos assim ciclos compostos de 2 séculos e meio marcados pelo ascenso e 2


séculos e meio predominantemente de descenso. No seu estudo sobre o período de 1500 a 1789,
André G. Frank dedica várias páginas à discussão sobre o período de descenso, e até mesmo de
depressão, que teria ocorrido na Europa no século XVII, e que foi objeto de amplas discussões
naquela época. A serem corretas estas análises, poder-se-ia aceitar a existência de ciclos
interconectados entre si de 3-4 anos, 9-11 anos, de 17-18 anos, de 15-25 anos, os ciclos de 40 a
60 anos, e possivelmente os ciclos de 2 séculos a 2 séculos e meio que chegariam a conformar
ciclos de até 500 anos. No interior de cada um desses ciclos haveria períodos de crescimento e
descenso, mas eles seriam marcados por crescimentos maiores e descensos menores nos períodos
chamados de ascenso, e por crescimentos menores e descensos maiores nos períodos chamados de
descenso. Em conseqüência, não se mede os ciclos através de dados absolutos de crescimento ou
declínio do produto mas através das taxas de crescimento, procurando detectar as oscilações que
se dariam em torno de uma taxa média, o que permitiria configurar um ciclo de ascenso e declínio
mesmo quando, no seu conjunto, a economia apresenta um movimento em geral ascendente.

Até o século XX nós podemos encontrar longos períodos de queda na produção,


períodos em que a depressão era um fato e não poderíamos pensar numa situação de crescimento
permanente. A tendência ao crescimento permanente em taxas cada vez maiores só vai poder
ocorrer depois do século XIX, com a Revolução Industrial. A partir da Revolução Industrial, na
verdade, vamos encontrar uma situação em que o crescimento tende a ser a norma, e períodos de
descenso de produção são períodos localizados no tempo e mesmo em alguns países raramente se
apresentam, o que revela que as forças produtivas dominadas pela humanidade hoje permitiriam
pensar tecnicamente numa situação de produção em ascenso contínuo e portanto uma tendência a
eliminar a situação de carências técnicas profundas, apesar de que socialmente existam vários
fatores que agem como forças contra-tendenciais.

Muitos historiadores e particularmente os economistas recusam-se a aceitar a


existência dos fenômenos cíclicos descritos em nome da liberdade dos agentes sociais.
Particularmente a economia recusa este enfoque porque tem pretensões de intervenção e comando
sobre as variáveis macro e micro econômicas, pretensões que, por sinal, tem muito pouco que ver
com a prática das políticas econômicas, marcadas por erros crassos e fracassos permanentes.
Sem falar das dificuldades de integrar estes fenômenos na linguagem matemática dominante nos
modelos econômicos. Contudo, vários autores têm se ocupado dos fenômenos cíclicos com grande
rigor e precisão matemática. Trata-se mais de uma espécie de fenômeno religioso: quem crê e
quem não crê no rigor destes dados.

A partir do período da formação da economia européia moderna até nossos dias,


podemos identificar cada onda longa com:
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 20
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

a) a dominância de um determinado regime de produção (livre câmbio,


oligopólico, monopólico, globalizante).

b) a prevalência de determinadas relações sociais de produção e princípio de


organização social ( manufatura, grande indústria, fordismo, o chamado "toyotismo" no período
atual)

c) a hegemonia de certos centros econômicos ( como Espanha e Portugal,


Holanda, Inglaterra, Estados Unidos) que dominam zonas periféricas e semi-periféricas.

A partir da Revolução Industrial vai se estabelecer uma hegemonia do sistema-


mundo, que integra várias economias-mundo em um único sistema de caráter planetário. O
capitalismo industrial foi o primeiro sistema econômico capaz de implantar um sistema mundial,
mas ele supôs, até o presente momento um centro aglutinador do conjunto deste sistema. Este não
poderia ser mais as cidades-estado que exerceram este papel centralizados até o renascimento.
Fez-se necessário uma base nacional, um verdadeiro Estado Nação, como o foi a Inglaterra para
cumprir esta nova missão histórica. Essa visão nos leva a distinguir cuidadosamente o centro, a
semiperiferia e a periferia, para que a análise das ondas longas ganhe outra dimensão.

Nos meus estudos da década de 70, sustentei a tese de que o ciclo econômico
adota diferentes formas no centro e na periferia, e apresentei alguns elementos chaves para a
análise dessas diferenças. Entre elas deve-se ressaltar o papel das economias de subsistência
como amortecedoras dos efeitos mais dramáticos das depressões econômicas, a importância da
queda das iportações para a realização do mecanismo da substituição de importações durante os
períodos de crise do comércio internacional. Ao mesmo tempo, procurei distinguir as tipologias
dentro da periferia, separando aqueles países que haviam alcançado um desenvolvimento
industrial, a partir de uma nova divisão internacional do trabalho, e cujos elementos centrais se
esboçaram na crise de 67-68. A partir deste momento foi necessário distinguir os países
dependentes que se articulavam com a economia mundial como exportadores industriais, numa
posição subordinada à política das empresas transnacionais dos países da semiperiferia
propriamente dita do sistema mundo, apesar da aparente similitude de situações econômicas que
apresentavam e ainda apresentam em parte. Na semiperiferia deve-se incluir aqueles países
desenvolvidos que decaíram e/ou perderam sua posição relativa no sistema capitalista mundial,
como é o caso das economias do Sul da Europa.

O tema da semiperiferia foi estudado por Giovani Arrighi (1980), dentro do


Instituto Fernand Braudel, num livro extremamente interessante. A combinação das lutas
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 21
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

democráticas do Sul da Europa com as lutas democráticas latino-americanas e de vários países


em vias de desenvolvimento, os chamados Novos Países Industriais (New Industrial Countries)
na década de 70 mostrou que havia realmente um conjunto de elementos comuns entre estes
países. Nas minhas análises deste período chamava a atenção sobre os elos mais débeis do
sistema econômico mundial, utilizando a imagem de Lenin no seu Imperialismo, Fase Superior do
Capitalismo,,

Estes pontos débeis se situariam nos países em decadência, entre os países


desenvolvidos, e de outro lado, nos países em maior crescimento, entre os países
subdesenvolvidos e dependentes. Dentro desta faixa, onde se situavam paises chaves como a
Inglaterra e o sul da Europa, de um lado, e Brasil, Índia, China, Iran e Iraque, de outro lado,
estaria - vamos dizer assim - a faixa da crise institucional, a faixa crítica do sistema capitalista
mundial, onde a crise geral do sistema ou a fase b do ciclo de Kondratiev teria os seus efeitos
mais devastadores em termos de transformação social, econômica e política. Elas se fariam
necessárias para permitir a reintegração desses países na economia mundial.

Prevíamos também graves transformações nos países socialistas em vista da


necessidade de se integrarem na economia mundial, pois seu isolamento havia sido um resultado
da guerra fria e de uma política artificial de cerco aos paises que estavam sob a influência da
União Soviética. Sempre acreditei que durante o atual ciclo de Kondratiev esta situação
intolerável encontraria um caminho de saída, como de fato vem ocorrendo, apesar dos
trambulhões que vêm enfrentando por razões ideológicas, que deverão ser corrigidas nos
próximos anos, quando passe definitivamente este contexto neo-liberal em que se inscreveram
seus processos de liberalização política e sua luta por alcançar uma espécie de cidadania numa
economia internacional que lhes recusava qualquer papel no sistema-mundo.

Aceita a comprovação da existência dos ciclos longos através de vários estudos


empíricos, fica a questão bastante complexa da explicação da sua existência. Os ciclos curtos e
médios estão vinculados, como vimos, a fenômenos bastante concretos, como a existência de
estoques que se concentram mais ou menos em certos períodos, de 3 a 4 anos; a existência de
ciclos de investimentos ligados à incorporação de novas maquinárias e seu período de maturação,
de 7 a 11 anos; ou os ciclos devidos aos investimentos em construção, de 15 a 25 anos. Mas os
ciclos de Kondratiev são mais difíceis de explicar, porque não parecem apoiar-se num fenômeno
cíclico muito evidente.

Kondratiev já apontava contudo para uma explicação dos ciclos longos ao


vinculá-los à introdução de inovações tecnológicas, à expansão do mercado internacional e aos
aumentos na oferta de dinheiro. São estes três elementos que explicariam, segundo ele, a
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 22
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

existência dos ciclos longos. A base para estes ciclos seriam exatamente as mudanças no estoque
total de capital social, ou o capital social total disponíve. Este aumentaria ou diminuiria sob a
ação dos três elementos que analisaremos em seguida.

As fases de ascenso mais ou menos contínuo são movimentos de arranque que


requerem grandes somas de capital líquido para empréstimo e que necessitam, portanto, da prévia
criação de taxas de lucro atrativas ou baixas. Estas condições ocorrem, em geral, quando se
alcança o ponto mais baixo das crises econômicas.

No seno do ciclo, os preços agrícolas são relativamente insensíveis à queda


generalizada da demanda que ocorre durante as depressões , mas os preços industriais são mais
sensíveis a esta situação e pode-se constatar uma forte baixa de preço. Esta queda é ainda mais
provável devido à tendência de incorporação de novas tecnologias nos pontos mais baixos da
crise estrutural. Criam-se, em consequência, termos de intercâmbio favoráveis às mercadorias do
tipo comercial, e isto conduz a uma poupança mais acelerada no setor urbano.

Devido à redução genralizada de preços ou deflação produz-se uma tendência ao


entesouramento. Tomando-se em conta a tendência à queda da taxa de juros, nestes momentos, os
poupadores tendem a defender-se através da compra de ouro Este aumenta o seu preço, ao lado
de outros investimentos de refúgio, como os ativos em moeda (reforçados pela tendência à
deflação apesar da queda da taxa de juros), os ativos imobiliários e outros ativos fixos. Esta
tendência ao entesouramento é um dos elementos mais importantes para produzir um ímpeto
favorável ao crescimento de longo prazo quando se apresentam as tendências ascendentes do
ciclo. Kondratiev tentou não somente explicar as ondas longas por estas variáveis, mas procurou
inclusive detectar sua presença nos seus estudos empíricos.

A publicação do artigo de Kondratiev produziu reações em geral bastante


desfavoráveis, particularmente de parte da direção política da União Soviética. Quem mais se
destacou na confrontação com Kondratiev foi Leon Trotsky. No seu artigo sobre a curva do
desenvolvimento capitalista, republicado na revista Críticas da Economia Política, Trotsky, que
naquele momento estava ocupando seu posto de comandante em chefe do Exército Vermelho - vai
atacar muito fortemente o artigo de Kondratiev. Assistimos assim um curioso debate entre um
dirigente revolucionário, ministro da guerra, e um acadêmico, economista, pesquisador sobre
questões bastante teóricas, como a teoria do ciclo econômico. Esta situação era contudo uma
realidade muito típica da vida intelectual da União Soviética, no seu período revolucionário, que
vai até a consolidação de Stalin, no fim da década de 20, quando estes debates de idéias foram
substituidos pela intervenção de burocratas na vida intelectual do país para impor seus pontos de
vista.
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 23
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Richard Daves fêz um estudo comparativo sobre a teoria do ciclo prolongado de


Kondratiev, Trotsky e Mandel, no número seguinte desta mesma revista, chamando a atenção
para o interessante fenômeno de que seria exatamente Ernest Mandel, um dirigente trotskista que
recuperaria a obra de Kondratiev, na década de 70, revelando uma independência intelectual
frente a seu chefe político realmente excepcional. Deixando de lado estas ironias da história, qual
era a essência da argumentação de Trotsky contra Kondratiev?

Em primeiro lugar, Trotsky diferencia ciclos econômicos de épocas, no sentido


de que os ciclos se repetem necessariamente, enquanto que as épocas se sucedem em vez de
repetir-se. Por outro lado, Trotsky também vai afirmar que a relação entre crescimento baixo,
decadência, crescimento acima da média (ascenso) e crescimento igual (estacamento) se mede em
relação a um crescimento médio. E, diz Trotsky,

"A principal diferença entre eles está determinada pelas relações


qualitativas entre a crise e o período de auge de cada ciclo dado. Se o auge
restaura com esse excedente a destruição ou a construção que existiram
durante a crise precedente, então o desenvolvimento capitalista tem uma
tendência ascendente. Se a crise que significa destruição ou, quando menos,
constricção ou restrição das forças produtivas, sobrepassa em intensidade
seu auge correspondente, então teremos como resultado uma tendência
descendente da economia. Por último, se a crise e o auge são equivalentes em
intensidade, teremos um equilíbrio temporal e uma economia estancada".

A concepção de auge, ascenso e descenso de Trotsky tem um caráter absoluto,


contrariando a visão mais relativa do ciclo que tanto Kondratiev como seus seguidores
apresentaram. Como vimos, pode-se constatar um período de descenso, sem que haja, por
exemplo, um crescimento negativo ou decréscimo da produção. Claro que esta visão de Trotsky
restringe muito a possibilidade de utilizar-se os conceitos de ascenso, descenso, ao identificar o
conceito de descenso com decadência, ascenso com progresso histórico, e uma certa estabilidade
com estancamento. Daí que ele vai chegar a uma conclusão bastante radical de que o caráter e
duração das crises ou dos auges estão determinados por fatores externos e não pela interrelação
interna das forças que compõem a dinâmica capitalista. Ele chegava assim a uma conclusão
muito distante de Marx que havia se esforçado por compreender osciclos econômicos como parte
das leis de funcionamento do modo de produção capitalista. Na busca destes elementos externos
Trotsky ressaltará primeiramente a aquisição de novos países e continentes, em segundo lugar, a
descoberta de novos recursos naturais ou, como conseqüência de ambos, mas com sua
independência, as guerras e as revoluções.
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 24
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Assim, segundo Trotsky, não existe um ritmo ou lei rígida ligando as épocas
entre si. Ademais, ele chama muito a atenção para o impacto dessas mudanças do ponto de vista
ideológico e superestrutural, reconhecendo que esses movimentos econômicos desencadeiam
mudanças na super-estrutura. Esta identificação das fases do ciclo com épocas históricas
sucessivas, nos conduz à idéia de uma transformação histórica global, à idéia de um processo
evolutivo em contraposição a um enfoque de tipo cíclico. Não devemos desprezar estas críticas de
Trotsky, porque realmente o enfoque dos ciclos longos não deve ignorar que estes movimentos
estão associados a estruturas econômicas e sociais que passam por mudanças exatamente nos
vários momentos dos ciclos. Eles estão associados a guerras, a revoluções e a profundas
mudanças institucionais, que ocorrem, em geral nas fases de depressão ou de auge dos ciclos
longos. Trotsky vai propor um quadro sintético desses elementos estruturais e superestruturais
que, como ele mesmo reconhece, ainda se mostrava bastante informal, e que necessitaria de muita
pesquisa empírica e histórica para ganhar contornos de uma hipótese científica..

Como vimos anteriormente, será com Schumpeter que as propostas teóricas de


Kondratiev alcançarão um desenvolvimento bastante sofisticado. Schumpeter, coerente com sua
visão de que "o fato principal na história econômica da sociedade capitalista é a inovação", vai
exatamente procurar explicar as ondas longas através da sua teoria da inovação. A possibilidade
da existência de novos investimentos está ligada à existência do empresário inovador. Também a
um segundo elemento, que é a existência de um estoque de tecnologias novas a serem
incorporados. Em terceiro lugar, mercados para que esta incorporação de novas tecnologias tenha
para onde fluir, com o resultado da sua produção. E em quarto, empresas em setores particulares
que buscarão aplicar estas inovações e difundi-las pela economia. Se há mais empresas nestes
setores, há uma tendência à competição e, portanto, a preços mais baixos. O preço de venda
tenderá então a igualar o custo com tendência, inclusive, à eliminação do lucro.

De qualquer forma, a possibilidade de vender a menor preço e competir, num


primeiro momento, é um impulso à inovação. Há uma pressão sobre os empréstimos que exige,
portanto, um prévio declínio das taxas de juros durante as fases de deflação e entezouramento.
Esta fases são acompanhadas por uma queda na demanda por novos investimentos e, portanto,
por novos empréstimos, gerando assim um certo excedente financeiro que vai levar, por sua vez,
a uma queda na taxa de juros. Schumpeter tem uma visão clara dessa relação entre o decréscimo
de investimento produtivo, baixa da taxa de lucro e surgimento de um excedente financeiro que,
através da especulação, tende inclusive a aumentar sugando recursos das atividades produtivas,
gerando assim grandes excedentes sem colocação o que produz as graves crises financeiras
típicas dos períodos finais dos ciclos longos, que concuzem a colossais depressões, como a de

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 25
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

1929, cuja tarefa é a de desvalorizar os ativos existentes e pressionar por um declínio radical das
taxas de juros.

Os períodos de crescimento, segundo o próprio Schumpeter, apresentam uma


situação em que a renda total é superior ao produto total, e, portanto, que os ordenados e salários
são também inferiores à renda global, os gastos em bens e salários também são inferiores ao total
de salários e ordenados, e o resultado de tudo isso é que a demanda potencial para a produção é
crescente, e conseqüentemente os lucros estão em ascenso gerando então os fatores da retomada
do ciclo de inovações.

Como vimos, Schumpeter integrou os três tipos de ciclos. Duijn (1983) integrará
num modelo mais complexo os quatro tipos de ciclo. Mais do que Schumpeter, Duijn insistiu
muito sobre a base dos ciclos em movimentos de estoques, de reposição de maquinárias, de
investimentos em construção e em inovações significativas. Como vários economistas e
estudiosos contemporâneos da mudança tecnológica, ele segue a linha de Schumpeter, segundo a
qual a inovação é apresentada como elemento-chave para os ciclos longos. A literatura sobre o
tema insiste cada vez mais no conceito de cachos de inovações, segundo o qual as inovações mais
importantes arrastam consigo não só a introdução de novos produtos ou novos processos no seu
próprio setor, mas elas provocam também outras inovações em outros setores com os quais têm
relações de complementariedade.

Podemos distinguir pois, como Sweezy e Baran, as inovações que "marcam


época " e que produzem efeitos secundários em todo o sistema produtivo, nos serviços, na super-
estrutura ideológica e cultural. Outros pesquisadores distinguem as inovações básicas das
secundárias, entendendo por inovações básicas aquelas que abrem caminho para inovações
complementares ou secundárias que se utilizam dos conhecimentos básicos trazidos pelas
primeiras. Pode-se constatar inclusiva uma onda de inovações terciárias que aplicariam os
conhecimentos desenvolvidos pelas anteriores. Seria esta sucessão de ondas de inovações que
formaria o ciclo entre 20 e 25 anos (30, no máximo), que explicariam as longas fases de
ascensão.

Por outro lado, as fases de decadência, ou fase b, devem se explicar pela


dificuldade de incorporar inovações quando o ciclo longo começa a perder a sua força inovadora
e alcança a sua maturidade. Neste momento, os novos investimentos necessários para incorporar
novas tecnologias supõem, de um lado, grandes investimentos de incorporação das novas
maquinárias e novas instalações que supõe a nova safra de inovações. Estas novas instalações
supõem também a obsolescência da capacidade já instalada. Portanto, os períodos de descenso se
explicam não só pelo grande volume de investimentos que representa a incorporação de inovações
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 26
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

realmente revolucionárias e que marcam época, mas talvez principalmente pelo longo período de
destruição do capital instalado, de desvalorização de enormes massas de investimento, de
derrubada das resistências às novas tecnologias, que depende sobretudo da capacidade de
negociação, sobretudo da força de trabalho, que tende a aumentar durante a fase A do ciclo,
quando ocorre um grande crescimento do produto baseado num mesmo patamar tecnológico e
portanto acompanhado de um crescimento do emprego, gerando uma situação de pleno emprego,
que favorece a organização sindical, favorece a capacidade de pressão do movimento trabalhista
e a obtenção de salários mais elevados, que vão também pesar de alguma forma sobre a taxa
média de lucro

Vemos assim que é possível explicar o movimento ascendente do ciclo longo por
um conjunto de cachos de inovações que vão se sucedendo, dentro de uma visão do processo de
acumulação capitalista que nos permita associar esses cachos de inovações à taxa de lucro média
dentro do sistema, considerando inclusive com muito mais clareza a tendência decrescente da
taxa de lucro. Na medida em que essas inovações vão se instalando, sobretudo na medida em que
elas vão se difundindo - e aqui o conceito de difusão é central, porque é exatamente a difusão que
cria a situação em que o monopólio tecnológico vai desaparecer. A única forma de evitar isso
seria então uma situação monopólica que prolongasse o ciclo do produto no interior do capital da
própria empresa inovadora. Isto garantiria o monopólio tecnológico e a renda que dele deriva
durante o processo de difusão do produto da sua região de origem para o resto do país e do
mundo. Esta situação nem sempre é possível, já que, quando o produto está alcançando uma certa
maturidade, com grandes investimentos já feitos, a introdução de novas empresas começam a ser
mais fácil, desde que as barreiras de entrada começam a cair, na medida em que as tecnologias
necessárias para a criação de uma nova empresa já tenderão a estar relativamente mais
disponíveis a preços mais baixos. Ademais, como os custos de inovação já foram quase que
totalmente cobertos pela empresa líder, aumentam as possibilidades de surgimento de empresas
rivais incorporando novas tecnologias e rompendo com o monopólio da empresa inovadora.

É pois lógico esperar que no ponto mais baixo do seno, haja uma tendência do
sistema capitalista a um forte aumento de competitividade. E não é difícil explicar por que nesses
momentos inclusive há uma tendência ao liberalismo econômico como forma de reconhecimento
dessa situação de competitividade aguda, onde as formas de protecionismo tradicionais do
Estado, as formas de subsídios estatais, etc., tornam-se obsoletas e tornam-se débeis diante das
grande forças de competitividade que se estão confrontando a nível tecnológico. Na realidade,
depois de um longo período de estagnação existem um estoque de novas tecnologias muito
significativo a ser incorporado na economia. Sua incorporação depende em primeiro lugar da
desvalorização da capacidade instalada, que se realiza através da deflação e dos mecanismos já
assinalados. Em seguida, ela depende da existência de excedentes de capital que se interessem em
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 27
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

utilizar esta nova vantagem. Somente em terceiro lugar, faz-se necessário a existência do agente
deste processo. Isto é uma nova geração com vontade de inovar e conhecedora das novas
tecnologias que pode ser um grupo de empresários inovadores ou de tecnocratas audazes ou de
líderes revolucionários.

Estas inovações supõem que o Estado intervém para favorecer o avanço


tecnológico das suas firmas, supõe também que ele está aumentando o poder de competitividade e
derrubando as barreiras de entrada. Nos países onde dominam as firmas apoiadas nas antigas
tecnologias, o Estado tende a intervir para subsidiá-las permitindo que mantenham o controle
de seus mercados sem desenvolvimento tecnológico. Este tipo de intervenção estatal adquire,
portanto, um conteúdo muito reacionário. Ele é diferente daquela outra intervenção em que o
Estado atua para fortalecer a capacidade inovadora das empresas que estão introduzindo as
inovações. Deve-se distinguir contudo uma faixa média entre as tecmologias de ponta e as
obsoletas, que são empresas que estão difundindo as inovações tecnológicas anteriores e que
necessitam ainda de uma certa proteção estatal, sobretudo diante do mercado externo que se
coloca cada vez mais competitivo pelas mesmas razões defensivas. O Estado nacional pode
ajudá-las a fazer essa difusão, entregaando-lhes a cobertura legal para que possam copiar os
produtos e as inovações produzidas em outros países, por outras empresas e em outras situações
econômicas.

Vemos assim que a visão de Kondratiev nos leva a uma riqueza muito grande na
análise dos ciclos econômicos. Os ciclos longos são tanto uma possibilidade de enfoque, nos dão
portanto uma possibilidade de enfoque da dinâmica econômica extremamente rica. Isso se dá em
grande parte na obra de Ernest Mandel (1972), no seu estudo sobre o capitalismo tardio, onde ele
vai retomar o conceito das ondas longas e vai fundamentar seu movimento apelando para o
conceito das revoluções tecnológicas. Aqui há evidentemente um defeito no seu enfoque, por não
compreender que nos últimos anos a parte científica vai entrar também dentro das revoluções
tecnológicas, para fazer uma revolução própria, uma revolução científico-técnica.

Assumindo um conceito chave da perspectiva marxista, Mandel afirma que as


flutuações nas taxas de lucro são exatamente os fenômenos reguladores dos processos de
acumulação a curto e a longo prazo. Em consequência ele vincula as ondas sucessivas de
expansão e contração, descobertas por Kondratiev aos seguintes elementos: primeiro, às
mudanças na composição orgânica do capital, aspecto que nós já assinalamos anteriormente; b) à
taxa de exploração da força de trabalho, que também já estudamos; c) aos custos das matérias-
primas, que entram na composição do custo industrial e na formação da taxa de lucro e d) pela
disponibilidade do capital ou seja o funcionamento do capital financeiro.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 28
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Dessa forma, Mandel distingue na fase a, ascendente, a ação dos seguintes


elementos: o crescimento da taxa de lucro leva à maior acumulação de capital, que leva ao maior
crescimento global e uma valorização contínua do capital que, por sua vez, leva a novos
investimentos e a um auge econômico. A fase b, descendente, será resultado então da queda da
taxa de lucro que pode ser exatamente uma conseqüência do próprio auge econômico. Como já
assinalamos anteriormente, o aumento da composição orgânica do capital faz cair a taxa média
de lucro, na medida em que, como já destacou-se, se generalizam as inovações através da sua
difusão pelo conjunto das empresas, de forma a fazer com que as empresas que iniciaram a
inovação percam suas vantagens iniciais obtidas através de uma renda tecnológica, assegurada
pelo monopólio de um processo ou produto.

Isso faz com que caiam os preços em geral, permitindo a entrada no mercado de
empresas de fora do monopólio, ou pelo menos a ameaça dessa entrada já é suficiente para fazer
cair os preços e fazer com que então a composição orgânica do capital se oriente no sentido de
uma baixa da taxa média de mais-valia. Também os custos das matérias-primas tendem a elevar-
se em conseqüência do aumento da demanda de matérias-primas durante o auge, e a
disponibilidade do capital investido também fica comprometida gerrando uma escassês de capital.
É bom destacar que Mandel chama a atenção muito particularmente para o aspecto político-
institucional e para o efeito da luta de classes, como um fator muito decisivo no comportamento
da taxa de mais-valia. Nos períodos de auge da fase A trava-se uma luta muito forte entre as
classes pela hegemonia do sistema político e pelo domínio da distribuição da renda e, enfim, do
processo de acumulação em seu conjunto. A posiçao e força dos trabalhadores nas fases de
ascenso permitem que obtenham importantes conquistas salariais, nas concições de trabalho e
outros aspectos, as quais levam a uma queda da taxa de lucro. A queda da taxa de lucro leva à
queda da acumulação e da taxa de crescimento que, por sua vez leva a uma desvalorização do
capital e portanto a uma situação de depressão.

Como vimos, esta situação de depressão criará condições favoráveis à


recuperação da economia através de um aumento da taxa do lucro em alguns setores, e depois
sucessivamente no resto da economia. Neste momento há uma tendência a racionalizar os
investimentos e portanto a buscar substituições tecnológicas. Com a desvalorização do capital
instalado fica mais favorável para alguns setores fazer novos investimentos com novas
tecnologias que significam custos mais baratos. A implantação desta tecnologia pode criar um
novo monopólio ou uma situação de monopólio tecnológico por um certo período. Os custos
das matérias-primas, com a queda da demanda, tendem a cair e isto estimula mudanças
tecnológicas para poder sustentar esses preços mais baixos. A disponibilidade de capitais sofre,
neste momento, as conseqüências da baixa dos investimentos. Do ponto de vista da luta de
classes, há um aumento muito importante do desemprego que provoca uma perda significativa da
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 29
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

capacidade de negociação dos trabalhadores. Como resultado tem-se uma tendência à queda dos
salários, o que também favorece uma recuperação da taxa de lucro. Todo essa situação é
extremamente dura socialmente mas cria condições para que o capitalismo volte a florescer e se
inicie, com a introdução das revoluções tecnológicas, uma nova fase de crescimento.

W. W. Rostow (1978) interveio também nesta discussão, aceitando a tese das


ondas longas. Mas Rostow entende as ondas longas como um desvio do equilíbrio dinâmico de
crescimento. Este equilíbrio seria igual aos investimentos apropriados aos requerimentos do
produto por setor num determinado nível de renda real e de pleno emprego. Como vimos,
portanto, dentro dessa visão neoclássica, torna-se muito difícil incluir a dinâmica da mudança
tecnológica dentro dos modelos de funcionamento da economia. Na visão marxista, ao contrário,
é o próprio crescimento que gera o descenso, e é este que gera o crescimento.

Portanto, não há nenhuma questão metodológica a resolver, senão a análise do


próprio funcionamento da economia. Numa visão neoclássica, como a de Rostow, parte-se de
uma noção de equilíbrio e portanto o desequilíbrio, isto é, o ciclo, tem de ser explicado por algum
fator externo. Daí então a conduta do investidor aparecer como um elemento muito importante,
onde os indicadores do lucro esperado dão o fluxo de potencialidade de invenção, e portanto nós
teríamos uma situação de desequilíbrio toda vez que se produz uma brecha entre a decisão de
investir e a realização da inversão. Então, formam-se mais estoques de capital, que é igual a
mais investimento, que é igual a subprodução do setor, que é igual a custos mais elevados. Tudo
isso conduzindo portanto a uma situação de recessão. O novo boom sairia então da continuação
do fluxo de oportunidades de inovação, através também dos resultados dos investimentos no
início do boom. O fluxo de oportunidade de inovação levaria a uma renda real mais alta, e aí se
alcançaria uma lucratividade maior, e se teria uma lucratividade maior esperada por setor, que é
reforçada por custos mais baixos, como resultado dessas novas inovações.

Produz-se, em conseqüência, uma taxa de estabilidade, uma tendência à


estabilidade no nível do consumo ou até mesmo um aumento no nível do consumo, há um
crescimento da força do trabalho por fatores não afetados pela depressão, e esse crescimento da
força do trabalho pode permitir exatamente também um crescimento da demanda do nível de
consumo, mantendo assim as condições para um novo boom econômico. Rostow teve um papel
importante na discussão da teoria do desenvolvimento, exatamente por estabelecer uma noção
do desenvolvimento como como estágios sucessivos. Ele estabelece cinco fases sucessivas que
todo país tem de seguir para alcançar o desenvolvimento, às quais agrega posteriormente uma
sexta. Trata-se de uma mistura de uma visão evolucionista em que se apresenta a evolução da
sociedade capitalista moderna como um modelo ideal e ao mesmo tempo histórico. Este modelo
muito duvidoso de evolução deve servir de modelo para todos os outros paises. Desenvolver-se
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 30
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

seria assim repetir a bem sucedida experiência das economias capitalistas (claro que estas
experiências foram devidamente depuradas para retirar-se delas os Cromwel, as revoluções como
a francesa, as guerras, as revoluções anti-coloniais, o fascismo e o nazismo).

Nem Rostow, nem nenhum economista que parta das premissas neoclássicas
poderá jamais produzir um legítimo conceito de um sistema econômico mundial, um sistema que
se faz e se organiza a nível mundial. Também é impossível produzir uma história econômica dos
ciclos longos que encontre uma explicação científica adequada.

Outros autores trabalharam sobre o a temática das mudanças a longo prazo,


identificando inclusive uma sucessão de ondas de ascenso e descenso na economia mundial, mas
não necessariamente aceitaram o conceito das ondas longas de Kondratiev. Um caso
extremamente interessante é exatamente o dos autores franceses da teoria da regulação, entre os
quais se destaca Gérard Destanne de Bernis (1987) , que foi na verdade o grande inspirador da
escola da regulação e será também um dos que tentarão um enfoque da economia internacional do
ponto de vista da teoria da regulação. Ele distingue as variáveis de acumulação, as variáveis de
concentração e as variáveis de competição no conjunto da evolução capitalista contemporânea,
mostrando que os processos de regulação ocorrem na busca de um certo equilíbrio entre essas
variáveis, toda vez que o processo de produção capitalista está permanentemente corroendo as
possibilidades de equilíbrio no processo de acumulação, no processo de concentração e portanto
também no processo de competição.

Apesar de sua contribuição muito interessante para a análise da história recente


da economia internacional, este tipo de enfoque não aceita a idéia de que haja um movimento
regulado de ascenso e descenso dentro da economia mundial. Ele também não aceita a tese de que
nesse movimento haja um certo ritmo, ritmo este que seria explicável exatamente por elementos
da própria acumulação de capital, identificáveis através da análise do processo de inovação. Nem
incorpora o papel deste processo dentro da competição capitalista como desestabilizador
permanente dos equilíbrios parciais alcançados em cada um desses momentos históricos do
processo de acumulação.

A obra de De Bernis é, contudo, muito importante, não somente por sua


ambiciosa análise global das teorias e processos da economia mundial, sobretudo na edição de
1987 de seu tratado sobre As Relações Econômicas Internacionais, onde ele procura analisar a
estruturação de dois sistemas de produção a nível mundial: os sistemas produtivos estruturados
em torno de uma industrialização voltada para o comércio mundial, a exportação de capitais, a
especulação financeira, a existência de uma moeda dominante, e onde se pode se ver as
contradições do processo de acumulação que levam a uma crise dos modos de regulação. Ele
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 31
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

parte do século XIX, mostrando a tendência a uma longa baixa dos preços no último quarto
deste século, a existência de uma nova modalidade de concorrência, uma transformação das
estruturas produtivas na direção de uma economia monopólica, e a desestruturação conseqüente
dos espaços dos sistemas produtivos e aparecimento do investimento direto no exterior, cojunto
de transformações que vão mudar o processo de regulação, afetando o comércio, a relação
metrópole-colônia e a estabilidade estrutural do processo de acumulação e do sistema monetário
internacional, que leva então a uma nova crise do processo de regulação entre as duas guerras
mundiais.

A partir da Primeira Guerra se estabelece uma nova estabilidade do processo de


acumulação no quadro das relações econômicas internacionais, em que novas regras do jogo
internacional são impostas, criam-se as premissas de uma Europa européia e se criam enfim as
relações internas a cada um dos sistemas produtivos, estabilizando os espaços dos dois sistemas
produtivos. Ao lado, geram-se novas forças de transformação muito importantes, como a
descolonização, a internacionalização do intercâmbio e a consciência da unidade do Terceiro
Mundo, o fenômeno de regionalização e a transnacionalização da produção. E, ao mesmo tempo,
desenvolvem-se também as relações entre os sistemas produtivos, emtre as quais a questão da
convertibilidade externa das moedas européias é um dos pontos importantes, a crise do dólar
reflete as conseqüências das dificuldades da balança de pagamento americana, e dá nascimento a
um amplo e crescente mercado de ouro e divisas, à extensão das firmas internacionais, ao
abandono da convertibilidade do dólar e por fim, levando ao desenvolvimento do comércio
internacional com a extensão do seu volume e à mudança das suas características gerais com o
nascimento da Europa e a explosão do Japão que leva ao aumento do comércio entre os países
industrializados.

Tudo isso nos leva à idéia de uma economia mundial, que se aproxima do
conceito de sistema do mundo. E à tentativa de analisar a crise dessa economia mundial dentro
da teoria da regulação, como transição de um equilíbrio internacional a outro. Desta maneira, a
crise se inscreve no movimento geral do capital, no qual as empresas multinacionais ocupam um
papel fundamental. Contudo, De Bernis será muito contundente em afirmar que a crise mundial
ainda está apoiada nos níveis nacionais. Para ele, as contradições da tecnologia
transnacionalizada mostram os limites desse processo de transnacionalização. A
multinacionalização e a transnacionalização bancárias, por outro lado, procuram impulsar mais
ainda esse processo, mas a integração das economias nacionais e da economia internacional
continua a ser um processo complexo e contraditório. A internacionalização do capital é o
instrumento mais importante dessa economia mundial, mas é também uma das razões
fundamentais da sua crise, que se vê como sobretudo uma transição de um modo de extração da
mais-valia a outro.
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 32
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Minha posição sobre essas questões deve ficar bastante clara ao finalizar este
balanço teórico. Parto da constatação empírica das ondas longas e proponho como explicação
dessas ondas longas o mecanismo das inovações, distinguidas entre as inovações primárias,
secundárias e terciárias, e coloco o processo de difusão ao lado do processo de inovação para
explicar o mercanismo das ondas longas e seus vínculo com os fatores micro-econômicos. Nesta
altura devo chamar a atenção para um excelente texto Nathan Rosenberg em que crítica a
Schumpeter por não considerar o processo de difusão como parte da formação do ciclo de
expansão capitalista a longo prazo.

Ao analisar o processo de inovações proponho uma distinção bastante clara do


papel dos instrumentos de produção como elemento mais dinâmico da mudança tecnológica. Seus
avanços afetam profundamente o conjunto do processo do trabalho e atuam sobre a oferta de
energia, os transportes e outros aspectos da produção e do consumo, e sobre os serviços em
geral que representam um papel cada vez mais crucial no processo da produção no seu conjunto
como reflexo da revolução científico-técnica.

Por isto dediquei em outros trabalhos um bom conjunto de estudos à automação


e seu papel na dinâmica sócio-econômica contemporânea. Ela tem uma posição fundamental na
conformação do processo de produção atual e seu impacto é fundamental sobre o conjunto do
sistema produtivo, a circulação de mercadorias, as mudanças institucionais e as mudanças nas
relações de classe. Daí ver com muito interesse, por exemplo, os estudos do grupo de regulação
sobre as mudanças do regime de produção fordista para o que eles chamam toyotismo. Este
elementos forma muito bem articulados com outros conceitos inovadores em estudos menos
ortodoxamente regulacionistas, sobretudo no informe sobre tecnologia da OCDE ao qual já
fizemos referências anteriormente.

Isso tudo nos conduz à necessidade de integrar essas variáveis econômicas


básicas do processo de acumulação, com o papel da ciência e da tecnologia e das estruturas
científico-tecnológicas. Pois evoluimos das estruturas tecnológicas para as estruturas científico-
tecnológicas que organiam a nova fase do processo de produção no seu conjunto e em suas
implicações sobre as relações de trabalho, sobre a luta de classes, sobre a organização da classe
empresarial, sobre a organização do movimento dos trabalhadores, que deverá representar um
papel muito importante na reestruturação institucional do mundo contemporâneo, sobre as
unidades nacionais e as forças geopolíticas, que também estão em ação.

Desta forma, a construção de um modelo explicativo do funcionamento da


economia mundial passa necessariamente por essa combinação entre as ondas longas nas suas
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 33
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

fases A e B, os ciclos mais curtos, cuja evidência é indiscutível, as estruturas científico-


tecnológicas, os paradigmas tecnológicos, que é um conceito que se introduziu na década de 70,
80, com um valor heurístico muito forte, e as mudanças no processo de produção, com seus
impactos institucionais, com seus impactos sobre a luta de classes e seus impactos sobre as
estruturas de poder nacionais e mundiais, e seus impactos sobre a geopolítica mundial.

A S C R I S E S E C O N Ô M I C A S E S T R U T U R A I S . A FA S E b D A S O N D A S L O N G A S D E K O N D R AT I E V

E AS MU DANÇAS TEC NOL ÓGICAS

Passamos agora à analise da relação entre as crises econômicas e as mudanças


tecnológicas. Para tal fim, é necessário destacar que a crise é um fenômeno estrutural ao
funcionamento do sistema capitalista.

Já desenvolvemos a nossa interpretação sobre o movimento cíclico e as crises


cíclicas, estudadas por Marx, que se repetem a cada 10 anos. Só nos interessa destacar que Marx
ressaltava a importância da relação entre estas crises e as mudanças tecnológicas. Segundo ele,
as crises desvalorizam fortemente o capital constante (sobretudo sob a forma de maquinária
utilizada), e o capital variável gerando as condições para novos investimentos que substituem
trabalho por maquinárias. Produz-se, em conseqüência, um incremento na produtividade do
trabalho e se recompõe a taxa de lucro dando origem à saída da crise, que gera uma nova
situação de auge e cria as condições para uma nova recessão.

Como vimos, Marx e outros autores do século XIX trabalharam sobretudo sobre
os ciclos de 10 anos, que foram estudados mais em detalhe por Juglar.

Somente no século XX Kondratiev descobrirá as ondas longas, que são ciclos de


aproximadamente 50 anos, nos quais se sucedem 25 anos de crescimento e 25 anos de crise. Na
explicação destes ciclos longos Kondratiev incorpora os efeitos dos fatores tecnológicos. Ele
associa estes movimentos cíclicos à entrada de novas tecnologias e às ondas de investimento que
permitem os períodos de auge. Nas ondas longas, ele define uma fase a, de auge, e uma fase b, de
desaceleração ou de crises, na qual ocorre o esgotamento da base tecnológica existente, tornando
obsoleto o complexo de maquinárias e equipamentos diante das novas possibilidades
tecnológicas, e exigindo a sua substituição.

A saída das crises e o início dos auges estão associados a profundas mudanças
nesta base tecnológica. Trata-se, em primeiro lugar, da incorporação de novas tecnologias para a
produção que mudam as maquinárias e obrigam a substituir as anteriores, criando uma onda de
investimentos.
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 34
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

A tese de Kondratiev foi retomada por Schumpeter após a crise de 1929. Ele
desenvolveu uma associação mais clara entre a crise e os novos investimentos. Para ele, a
destruição das antigas tecnologias, ocorrida nos períodos de crise, abre caminho às novas
tecnologias, que se introduzem nos vários ramos produtivos, impactando o resto da economia e
dando origem a um novo auge.

Estudos mais recentes identificam a existência de inovações tecnológicas


primárias, secundárias e terciárias. Inovações primárias seriam aquelas que inauguram todo um
setor econômico novo e que dão origem a novas instalações, a novas demandas de matérias-
primas e a novos investimentos e adaptações, inclusive fora do seu próprio setor. Secundárias e
terciárias são aquelas inovações que dão origem a uma nova onda de investimentos, que se inicia
pelos setores que geram insumos para o núcleo inovador, e que se estende, posteriormente, a
novos usos e demandas geradas pelo novo produto ou processo. As inovações terciárias seriam o
resultado do impacto provocado pelas novas tecnologias primárias e secundárias em novos
setores, sem maiores vínculos com o núcleo das inovações primárias.

Nesses estudos, podemos identificar a existência de ondas de inovações que


afetam vários setores e se traduzem em milhares de novos produtos e processos que poderiam, de
alguma forma, explicar os movimentos de ondas longas de crescimento econômico, com seus
investimentos e seus impactos sobre a renda nacional.

É necessário notar que as conjunturas de alto investimento são precedidas por


longas fases de crise em que as recessões e as depressões predominam sobre os auges. Nestes
períodos, ocorre uma forte desvalorização do capital instalado, em decorrência das quebras e
falências. Ao mesmo tempo, o aumento do desemprego desvaloriza o preço e até mesmo o valor
da força de trabalho. A recessão diminui também a demanda de matérias-primas e tende a
rebaixar seus preços. As maquinárias e instalações, as matérias-primas e a mão-de-obra são os
elementos básicos que compõem os custos de produção e influenciam a taxa de lucro. Uma
desvalorização maciça do capital instalado, das matérias-primas e da força de trabalho cria
condições favoráveis para a recomposição da taxa de lucro. Desta forma, a crise funciona como
um fator recuperador da economia. Esta é a "destruição criadora" de que nos fala Schumpeter.
Nestes períodos, as guerras, as crises sociais e as revoluções costumam apressar e radicalizar
estes processos de destruição, inaugurando novas formações sociais.

A dinâmica dos investimentos está associada, secundariamente, ao problema do


mercado e suas oscilações. A depressão do mercado por quebras de empresas e desemprego
aumenta a disponibilidade destas para aceitar e incorporar inovações importantes. Com isto, elas
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 35
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

passam a se diferenciar das demais e a diversificar seus produtos, deslocando as empresas


antigas, cujo capital imobilizado as impermeabiliza às inovações revolucionárias.

Na fase atual do capitalismo, onde a destruição de um setor econômico afeta


milhões de trabalhadores e gerando profundos problemas sociais, estas mudanças são
impensáveis sem a forte intervenção do Estado para desmobilizar as empresas, ressarcir os
trabalhadores e promover sua recapacitação para integrá-los em novos setores. Exemplos desta
nova fase do capitalismo monopolista do Estado estão na desativação dos setores siderúrgicos
nos EUA, França e Espanha, ou nas minas de carvão da Inglaterra, nas décadas de 70 e 80.
Somente através destes mecanismos globais é possível imaginar a possibilidade de novas ondas
longas de investimento. O Estado terá que assegurar os gastos de pesquisa e desenvolvimento
(P&D) e o estabelecimento de estratégias globais de investimento. Na verdade, estas
transformações do caráter do Estado estão em plena execução, como veremos adiante, apesar da
cortina de fumaça do "neoliberalismo".

As novas ondas longas de crescimento estão associadas à introdução destas


novas tecnologias. Esta introdução se realiza através de ondas sucessivas, que definem um novo
padrão ou paradigma tecnológico, que só assumirá sua configuração completa ao fim do período
de inovações. A partir de então, as economias de escalas não recomendam novos investimentos.
Cada novo investimento tenderá a ter uma taxa de lucro decrescente e dará origem a uma
tendência ao desinvestimento e a uma nova crise, com todos os seus efeitos já analisados.

Do ponto de vista internacional, o movimento de inovações é acompanhado pela


difusão das novas tecnologias para outros países, através do crescimento dos investimentos no
exterior. No primeiro momento de evolução do capitalismo, tendeu-se a produzir uma divisão de
trabalho a nível internacional, de tal forma que as inversões externas atendam as demandas de
matérias-primas e insumos intermediários, que têm sua origem nos países centrais. Os países
receptores dos investimentos introduzem inovações determinadas pelo avanço tecnológico dos
centros econômicos internacionais, dos quais conhece somente seus efeitos em campos produtivos
específicos ligados aos seus setores exportadores. Dessa forma, a difusão das inovações para o
exterior abre novas fases de investimento e estende os auges capitalistas, mas não cria novos
centros tecnológicos competitivos, que surgem paralelamente aos países centrais e não em suas
áreas de investimento.

Os portugueses e espanhóis, por exemplo, não difundiram sua tecnologia naval


para a América, África ou Ásia. Foram seus competidores holandeses e ingleses que dominaram
essa tecnologia, deslocando-os progressivamente dos mares nos séculos XVII e XVIII. Com a
Revolução Industrial no fim do século XVIII e na primeira metade do século XIX, a Inglaterra
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 36
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

assume a liderança. A acumulação capitalista na França fez-se paralelamente à inglesa e


holandesa, mas teve um impulso menos radical. A expansão do capitalismo alemão, que se deu na
segunda metade do século XIX, não necessitou do capital inglês ou holandês para incorporar a
onda de inovações produzidas pela segunda fase da Revolução Industrial com a produção de
máquinas em bases industriais. Houve inclusive, no caso da Alemanha e também do Japão, um
fechamento para o capital externo, só aceito como complementar ao nacional. Na Russia, no final
do século XIX, a expansão industrial se fez em grande parte com a participação do capital
francês e inglês, o que debilitou sua burguesia e sua revolução democrática, que terminou sendo
hegemonizada pelos partidos operários. Nos Estados Unidos, houve uma importação de capital
inglês, mas este foi posteriormente nacionalizado sem que se fossem dadas maiores satisfações.

Com o avanço posterior da integração da economia mundial, particularmente


depois da Segunda Guerra Mundial, fez-se mais direta a expansão das inovações para o exterior
pela via do investimento externo. Este fenômeno foi analisado por Raymond Vernon que utilizou
o conceito do "ciclo do produto". Segundo seus estudos, há uma maturação da curva de difusão
dentro de cada mercado, que dá origem ao surgimento de novas curvas de investimento e difusão
do mesmo produto no exterior, de tal forma que há um ciclo de expansão dos produtos para o
exterior, ao qual o próprio processo de internacionalização do capital está associado. Desta
forma, o movimento do capital tende a acompanhar a difusão dos novos produtos ou processos
que estão sob seu controle, na medida em que aumenta a integração entre a capacidade de
monopólio do mercado e o monopólio de novas tecnologias. Quanto maior este movimento de
capitais, maior a difusão internacional das tecnologias e mais rápida a internacionalização dos
auges e das crises econômicas, que se difundiram primeiro na Europa para o conjunto da
economia mundial e depois nos Estados Unidos para uma economia mundial cada vez mais
integrada.

Nesta nova fase do capitalismo é o movimento de capital, apoiado no monopólio


tecnológico, que comanda a desestruturação e a reestruturação do comércio mundial e que
determina a divisão internacional do trabalho. Grande parte deste comércio se realiza no interior
das empresas, que localizam suas unidades produtivas em várias regiões do mundo, importando
partes e exportando produtos semi-acabados ou finais. Ou seja, existe um centro de expansão na
qual a inovação surge e de onde ela começa a se expandir para novos centros de produção na
semi-periferia e na periferia.

Este mecanismo de concentração das fontes de inovação está associado ao


imperialismo e à existência de uma potência hegemônica estruturando o comércio mundial e a
divisão internacional do trabalho. Ele é, em parte, resultado da ação do mercado mundial em
formação e, em parte, das instituições que comandam este mercado, essencialmente oligopólico:
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 37
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

as instituições econômicas dos Estados nacionais, os monopólios, os trustees, os cartéis e os


investimentos em carteira ou diretos.

Na fase inicial do sistema capitalista mundial, a questão da hegemonia teve que


ser resolvida pela força das armas. As guerras napoleônicas, a guerra franco-prussiana de 1870,
a guerra russo-japonesa, etc., foram antecipações das duas grandes guerras deste século. Estas
tentaram resolver definitivamente a crise da hegemonia inglesa provocada pelo surgimento de
novas potências com a ascensão dos EUA, da Alemanha e do Japão. Essa conjuntura só foi
superada com o estabelecimento de uma nova hegemonia mundial norte-americana após a
Segunda Guerra Mundial. Somente através desta hegemonia foi possível restabelecer uma moeda
de curso mundial e um sistema de liquidez capaz de estimular o comércio mundial.

Os períodos de crise se manifestam por uma desintegração da economia mundial.


Esta se realiza, contudo, de forma assimétrica. A crise tende a originar-se nos centros onde as
inovações já se esgotaram, enquanto países mais atrasados estão recebendo as ondas inovativas e
ainda estão em etapas de crescimento, enquanto a economia internacional já está decaindo. Nestes
períodos há uma forte luta entre protecionismo e liberalismo. Os países hegemônicos da fase
anterior tendem a fechar-se, enquanto as potências emergentes buscam impor princípios liberais.
Na medida em que as novas potências se impõem, há uma tendência para uma economia mundial
liberal na qual o mercado estabelece os novos equilíbrios, provocando uma dinamização das
economias exportadoras. As novas ondas de inovação vão rompendo com os padrões tecnológicos
anteriores e surgem novas capacidades produtivas. Aprofunda-se, em parte, o período de crise no
qual as economias centrais da fase anterior já não conseguem proteger seus mercados e sua
tecnologia superada. Acirra-se dramaticamente a concorrência e aumenta-se a incorporação de
inovações importantes.

Analisando 80 inovações importantes durante 1921 e 1957, o economista


holandês J. Van Duijn encontrou os seguintes resultados, ao relacioná-las com as fases dos ciclos
longos de Kondratiev: durante o período de recessão de 1921-29 ocorreram 5 inovações; na
depressão de 1930-37 ocorreram 11 inovações; na recuperação de 1938-48 introduziram-se 15
inovações; e no período de prosperidade entre 1949-57 foram incorporadas 9 inovações.

Esta constatação de Van Duijn é confirmada por outros estudos e pela lógica
econômica que descrevemos acima. São os períodos de depressão e recuperação que mais
estimulam a introdução de mudanças tecnológicas, enquanto os períodos de prosperidade se
caracterizam pela difusão destas inovações e a introdução de um menor número de inovações, em
geral secundárias e terciárias.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 38
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

É natural, pois, que os períodos de depressão e de recuperação se caracterizem


pela destruição das empresas que tentam preservar os padrões tecnológicos superados. Cada
retomada do processo expansivo é acompanhada por uma fase tecnológica nova e um novo
padrão ou paradigma tecnológico. A tendência de cada novo padrão tecnológico é apresentar, no
início, uma desconcentração industrial pela introdução de novas empresas competidoras. Mas, no
seu transcurso, estas empresas tendem a consolidar um novo monopólio e a criar uma
concentração tecnológica muitas vezes superior.

A concentração tecnológica assume, em alguns períodos, uma forma espacial de


grandes unidades de produção. Mas, em outros períodos, ela se diversifica em pequenas unidades
de produção integradas entre si e formando vastos complexos produtivos. A tendência do capital
tem sido procurar a diversificação das unidades produtivas e sua separação no espaço, porque a
concentração espacial é adversa ao capital. Toda concentração de produção é, ao mesmo tempo,
uma concentração dos trabalhadores. Isto aumenta sua organização e sua capacidade de ação
política. Então, o capital busca localizar de maneira desconcentrada suas unidades produtivas.
Mas é necessário manter a concentração tecnológica porque, mesmo separadas fisicamente, estas
unidades produtivas são interdependentes entre si e formam partes de uma mesma unidade final
de produção.

O sistema produtivo que predominou até os anos 70 foi desenvolvido a partir da


Segunda Guerra Mundial e baseava-se em sistemas de montagem final de partes e compostos de
várias unidades dispersas dentro do país ou mesmo internacionalmente. Estas unidades podiam
pertencer a uma mesma firma ou serem empresas subcontratadas pela montadora. Em geral estas
empresas subcontratadas eram, e ainda são, pequenas e médias e sem nenhuma independência
econômica. Trata-se, muitas vezes, de assalariados disfarçados que correm o risco dos
investimentos básicos. São transmitidas para elas funções de gestão e riscos que as grandes
companhias não querem bancar. E isso ocorre tanto na cidade como no campo. No setor agrícola,
quem assume o risco da produção são os pequenos produtores, convertendo-se em setores
subordinados aos compradores dos produtos agrícolas e aos fornecedores de insumos e de
financiamentos.

Desta forma, cada nova onda tecnológica leva, de início, a uma desconcentração
mas finalmente a uma concentração tecnológica. Esta se expressa, porém, numa complexidade
crescente de elementos (partes e peças) que compõem os produtos e na interdependência crescente
dos setores e ramos de produção. Ela leva também a uma concentração econômica e empresarial
que, como foi mencionado, nem sempre se manifesta numa concentração das unidades de
produção, mas numa hierarquia e subordinação entre pequenas, médias e grandes empresas.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 39
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

É inevitável, também, a centralização do capital, posto que a possibilidade de


formar estas unidades empresariais maiores depende de que os capitais pequenos se concentrem e
se centralizem. É o fenômeno da socialização do capital já analisado por Marx no século XIX
quando surgiram as sociedades anônimas. Ele mostrava que a concentração da tecnologia e da
produção obrigava o capital a centralizar-se pela via da associação dos capitalistas. E a forma
mais perfeita dessa associação era a sociedade anônima. Mas não foi e não é suficiente que os
capitalistas individuais formem sociedades de capital. Com o tempo, as próprias empresas
passaram a se associar umas com as outras, dando origem às holdings e aos trustees, que
representavam formas de associação de capitais e de empresas cada vez mais complexas.

Na atualidade, as corporações multinacionais geram unidades empresariais com


diversas formas de associação. Surgem, ao mesmo tempo, os conglomerados, que unificam
empresas dos setores mais diversificados em função das estratégias de inversão de capital, e as
redes empresariais, que são associações informais de empresas em torno de algum centro de
prestação de serviços, em geral associadas às novas tecnologias de comunicação e informática.

Também não devemos desprezar o aparecimento dos investidores institucionais,


entre eles os fundos de pensão dos trabalhadores, cujo imenso volume de recursos que
administram os converte em investidores privilegiados, sobretudo nos países desenvolvidos.
Apesar destes recursos serem geridos pelo sistema financeiro e se colocarem a serviço de suas
estratégias financeiras, em alguns países como a Suécia os trabalhadores vêm despertando para o
poder econômico que podem representar tais recursos se administrados pelos próprios
trabalhadores ou se convertidos em força de barganha com o capital.

Há ainda que se considerar o crescimento de formas empresariais e institucionais


coletivas como as cooperativas, as fundações e outras, que vêm introduzindo desde o século
passado elementos coletivizantes no universo econômico capitalista.

Mas entre todas estas formas de socialização da propriedade e da gestão no


interior do capitalismo, a mais importante é o crescimento do capitalismo de Estado. A
intervenção do Estado se explica devido a duas razões principais: primeiramente, porque o
processo de concentração da produção leva a uma composição orgânica do capital crescente, e
esta leva à baixa da taxa de lucros nos setores economicamente mais concentrados. Uma das
formas de que dispõe o capital privado para manter sua taxa média de lucros elevada é transferir
progressivamente para as mãos do Estado as atividades que apresentam taxas de lucros baixas.
Em segundo lugar, o desenvolvimento e a expansão das unidades de produção, provocando maior
concentração e centralização, exige a crescente intervenção do Estado para disciplinar o
intercâmbio, a circulação e o próprio processo de produção. Os monopólios, os preços
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 40
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

administrados das empresas estatais, os subsídios e os efeitos das taxas de juros artificiais
passam a violar constantemente a lei do valor como instrumento do intercâmbio capitalista. A
concentração da produção, o monopólio e a intervenção estatal rompem o funcionamento normal
do mercado. Dessa forma, o Estado tem que intervir cada vez mais para regular o intercâmbio na
economia.

Junto a tudo isso, aparece a internacionalização da produção, já que todo esse


processo é parte da expansão da economia capitalista internacional, como vimos anteriormente.

Cada nova onda de crescimento gera uma etapa superior de concentração


econômica, centralização de capitais, monopolização, internacionalização e intervenção do
Estado. Estes níveis mais altos de socialização da produção no interior de um regime de
propriedade privada acentua as contradições globais do sistema. Mas estas não se manifestam
negativamente nas fases de expansão pois ela acomoda os interesses em confronto. Mas, na
medida em que se esgota o período de expansão, abre-se o caminho para a expressão aberta
dessas contradições que se acumulam através de processos sucessivos, cada vez mais profundos,
de confrontações entre patrões e assalariados, entre os monopólios e os pequenos e médios
proprietários, entre os centros de acumulação de capital distribuídos setorial ou regionalmente
(confrontos que se expressam, às vezes, em violências étnicas, regionais e locais), e entre os
países centrais entre si e destes com as zonas semi-periféricas e os países dependentes.

Desta forma, os períodos de depressão são caracterizados por confrontações


crescentes e de natureza cada vez mais dura entre os vários componentes do sistema capitalista
mundial, das unidades econômicas regionais e nacionais e, dentro destas, entre classes, grupos
sociais e poderes locais.

As fases das depressões longas a nível internacional são caracterizadas por um


período inicial de inversões artificiais, de caráter especulativo, que sucedem a queda de inversões
produtivas. Logo em seguida, dá-se o crescimento da especulação financeira, com aumento da
inflação, até que, posteriormente, produzem-se as grandes quebras e a desinflação. Nestes
períodos, produz-se o aumento do protecionismo tentando impedir a redefinição da força relativa
dos países, que terminam cedendo a uma nova onda de "livre" comércio que visa consolidar as
novas lideranças criadas pelos novos investimentos. Eles são, assim, períodos de "limpeza" das
estruturas produtivas internas dos principais países, com a destruição dos ramos obsoletos
tecnologicamente e a afirmação dos novos ramos e setores viáveis nas condições do novo padrão
tecnológico.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 41
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Vemos, assim, que a análise dos períodos longos, com predominância das
depressões, consideradas a fase b dos ciclos longos de Kondratiev, exige um aparato analítico que
logre articular elementos micro e macroeconômicos. Ao mesmo tempo, na fase atual do
capitalismo monopolista de Estado, temos que considerar sempre a relação dos mecanismos
econômicos puros com a ação consciente dos homens através dos seus meios de ação sobre a
economia, que são cada vez mais sofisticados.

As chamadas "expectativas racionais" exercem uma influência crescente na


dinâmica econômica do capitalismo contemporâneo, mas mudam muito pouco as suas
determinações básicas. Elas determinam o comportamento dos agentes econômicos, mas não o
resultado de suas ações, que podem ser o oposto das expectativas que as motivaram. O marxismo
e a psicanálise desenvolveram um novo paradigma científico exatamente porque consideraram as
motivações explícitas dos fatores um dado secundário e independente do resultado de suas ações.
Fazer "ciência" acreditando que as expectativas produzem resultados esperados é um retrocesso
metodológico. Acreditar que estas expectativas sejam variáveis e independentes é também, no
mínimo, infértil.

Outra série de fenômenos que alteram definitivamente as realidades micro e


macroeconômicas se ligam à ação consciente dos monopólios que possuem instrumentos de
medição dos mercados, que lhes permitem aumentar sua influência sobre ele, realizada através da
publicidade e do marketing, envolvendo inclusive a formação dos preços e a sua administração.
Neste campo minado, devemos considerar ações e decisões de ordem estrutural tais como: a) as
barreiras de entrada; b) as ações de dumping; c) a cartelização; d) as comissões; e) as influências
sobre as decisões das empresas e instituições compradoras ou fornecedoras, que envolvem a
política de relações públicas, a política financeira da empresa e as especulações financeiras
cambiais com seus recursos excedentes, o endividamento como instrumento financeiro, e as
políticas de inversões e fusões. Enfim, o nível microeconômico não pode separar-se, hoje, da ação
consciente da administração da empresa e de suas estratégias de crescimento em relação aos
fatores macroeconômicos.

Mais decisiva é, contudo, a articulação das decisões microeconômicas com a


ação do Estado. Este não somente determina o quadro macroeconômico em que operam as
grandes empresas (política de investimento estatal, estratégia de desenvolvimento, política fiscal,
taxa de juros, taxas de câmbio, política de salários, subsídios, etc.), como afetam diretamente
suas variáveis microeconômicas (contratos de venda para o setor público, financiamentos da
pesquisa e desenvolvimento, estratégias de mercado e políticas setoriais, entre outras). Nos
nossos dias, as práticas comerciais são cada vez mais um subproduto do planejamento estatal
articulado com as decisões das grandes empresas. Estas se vêem obrigadas a definir políticas
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 42
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

globais para os setores em que atuam, antecipando-se às tomadas de decisão estatais. Estas se
baseiam, na maioria dos casos, em dossiês e propostas de política e legislação emanadas
diretamente das empresas ou dos órgãos de classe do empresariado.

Forma-se, assim, uma interdependência crescente entre Estado e empresa, que


passa a reger o funcionamento do sistema no seu conjunto. Esta simbiose deve reconhecer,
contudo, a lógica global deste funcionamento, tal como os ciclos longos, e ajustar a ação desses
agentes a estas circunstâncias estruturais.

É assim que as políticas estatais passam a dirigir os fenômenos típicos das etapas
recessivas. É através da ação do Estado que se organiza a desativação de setores inteiros. O
Estado assume os custos da desativação do setor, entende-se com os sindicatos para reorientar a
mão-de-obra afetada e promove a transferência destas indústrias para outros países através dos
ajustes econômicos, das políticas cambiais e tecnológicas e das ajudas econômicas.

Estes processos assumem, às vezes, dimensões determinantes para a economia de


países inteiros. Este foi o caso da transferência, no início da crise de longo prazo iniciada em
1967, dos centros produtores de petróleo para os Estados do Terceiro Mundo. Venezuela,
Equador e os países árabes assumiram o controle das empresas petroleiras num movimento
internacional mais ou menos sincronizado, ao fim da década de 60 e começo de 1970. Já nos anos
anteriores, havia se iniciado a transferência das empresas multinacionais de serviço público e
mineiras para a propriedade estatal dos países do Terceiro Mundo. Estas mudanças, que
aumentaram drasticamente o capitalismo de Estado nestes países, foram realizadas tanto por
governos progressistas, como por governos de direita militar sob hegemonia das multinacionais.

No início da década de 70, tivemos a transferência da produção de petróleo das


multinacionais para o setor estatal. Na segunda metade da década, houve a desativação do setor
siderúrgico europeu e norte-americano e o financiamento a uma siderurgia substitutiva, primeiro
no Japão e, em seguida, nos NICs (financiamentos assumidos em geral pela ação dos Estados
destes países, mas através do endividamento internacional). A década de 70 foi marcada também
por outros fortes movimentos estatizantes, tais como a nacionalização do cobre chileno (mantido
pelo regime fascista de Pinochet); a nacionalização do sistema bancário e financeiro português,
mexicano e francês (revestidos em parte substancial nas décadas de 80 e 90); as reformas
agrárias chilena e portuguesa; e as mudanças drásticas de propriedade em Angola, Moçambique,
Guiné-Bissau e Cabo Verde.

Neste processo de alargamento do capitalismo de Estado devemos inscrever


também o aumento dos gastos públicos nos Estados Unidos e na Europa (que ampliam ainda
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 43
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

mais nas décadas de 80 e 90, não havendo uma reversão radical à vista, apesar do consenso sobre
a necessidade de sua eliminação ou diminuição). Junto ao crescimento da dívida pública, deu-se a
entrada do Estado na definição das taxas de juros nos Estados Unidos e na Europa, ao lado dos
países devedores do Terceiro Mundo. Na verdade, apesar do clima neoliberal que terminou
triunfando nos anos 80, aumentou-se a intervenção estatal nos mecanismos econômicos em áreas
antes consideradas livres do controle público. Tudo isso vinha somar-se ao crescimento da
intervenção pública nos anos da pós-guerra até a década de 60, sob a égide da formação do
Estado do bem-estar e do planejamento indicativo.

Na verdade a década de 80 representou somente uma tentativa de correção deste


intervencionismo estatal através dos processos de desregulamentação de importantes setores,
como a aviação comercial; através da diminuição de barreiras alfandegárias e de alguns subsídios
estatais, sobretudo às populações pobres; representou também uma corrida ao patrimônio público
através da chamada "desestatização" ou privatização de empresas públicas. Os dados revelam,
contudo, a modesta dimensão dessas privatizações diante dos fenômenos estatizantes gigantescos
nas décadas anteriores e mesmo dos que ocorrem na época atual. O mais importante deles foi o
aumento do déficit público norte-americano, que comandou a recuperação da economia norte-
americana e mundial, através do aumento da demanda norte-americana pelos produtos alemães,
japoneses e dos NICs, como veremos adiante.

Ao lado desta gigantesca intervenção na economia mundial pela criação de uma


demanda artificial via aumento dos gastos públicos, foram necessários outros mecanismos para
corrigir os excessos de meios de pagamentos gerados nos Estados Unidos e na economia mundial.
Surgiram, assim, os títulos públicos capazes de absorver os excedentes gerados pelos déficits,
que se caracterizavam por uma enorme elevação da taxa de juros média a partir dos Estados
Unidos e, em seguida, em todo o mundo. Vimos, assim, surgir um endividamento público colossal
para cobrir os déficits e, em seguida, para pagar os juros gerados pelo próprio endividamento.

Assim, os excedentes dos petrodólares haviam criado um mercado financeiro


colossal nos anos 70, que terminou assumindo a forma do inchaço da dívida do Terceiro Mundo.
Já na década de 80 tivemos os enormes excedentes do comércio do resto do mundo com os
Estados Unidos e o brutal endividamento internacional deste país para sustentar sua demanda
pela via da dívida pública.

Estes mecanismos de financiamento da dívida criaram um enorme movimento


financeiro, que gerou, por sua vez, imensos recursos financeiros sem nenhum respaldo econômico
real. Estes excessos especulativos não geraram uma onda inflacionária tão forte como na década
de 80 porque os estados europeus, o Japão e os NICs absorveram estes excedentes em dólares
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 44
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

sob a forma da compra de títulos da dívida pública norte-americana. A partir de 1987, contudo,
foram abandonando esta política suicida e passaram a comprar ativos reais nos Estados Unidos,
gerando uma onda anti-japonesa naquele país. No conjunto, Japão e Alemanha mantiveram, a
duras penas, uma austeridade econômica no contexto de uma explosão financeira exportada
desde os Estados Unidos, para onde dirigiram os excedentes financeiros obtidos no comércio, ao
lado de algumas outras praças financeiras artificiais, como Londres e vários paraísos fiscais.
Como os anos 80 se caracterizaram também pela consolidação do tráfico de drogas, os seus
gigantescos resultados financeiros também convergiram para o sistema financeiro internacional,
que criou mecanismos de "lavagem" de dinheiro da droga.

Este monumental aumento da liquidez mundial só poderia ter um destino: a


desinflação e o desaparecimento dos valores financeiros gerados artificialmente no período. Esta
etapa se iniciou, de fato, em 1987, com o deságio das dívidas externas, que deve chegar à perda
de cerca de 500 bilhões de dólares ou 50% do seu valor bancário; o crack das bolsas mundiais,
em setembro de 1987, que fez desaparecer 1 trilhão de dólares em um só dia; a desvalorização em
aproximadamente 40% do dólar em relação ao iene e outras moedas fortes, que desvalorizou na
mesma proporção as reservas em divisa de todos os países superavitários no comércio com os
Estados Unidos.

Caminhamos, assim, para uma desinflação e uma depressão extremamente séria,


que vem se configurando desde o início de 1990, devendo prolongar-se até 1994-95, que exigirá
um ajuste de contas definitivo do sistema capitalista mundial com a fase depressiva do ciclo
longo iniciado em 1967. As políticas econômicas terão que realizar estes reajustes para permitir
uma recuperação capitalista de longo prazo, que só poderá ser alcançada a partir da desinflação,
da quebra maciça da atual estrutura de especulação financeira, e da drástica reestruturação das
estruturas produtivas tradicionais, criando assim as condições de sua transferência para os países
periféricos e para a renovação tecnológica dos países centrais, que deverão voltar-se para as
novas tecnologias.

A partir deste ponto, faz-se necessária uma incursão nas novas direções da
revolução científico-técnica, nas suas repercussões sobre a economia internacional e sobre a nova
divisão internacional do trabalho. O avanço dos estudos sobre a relação das novas tecnologias
com o ciclo longo e os períodos de ascenso, ou fase a dos ciclos longos de Kondratiev, têm sido
objeto de um grande avanço nos últimos vinte anos, que se concentrou nos trabalhos que já
citamos, além dos quais, gostaria de mencionar aqui o grupo que trabalhou comigo no 'Seminário
de Ciência e Tecnologia', bem como nos vários estudos que produzimos. Ainda na América
Latina, uma especial atenção deve ser dada ao estudo sobre 'As Novas Tecnologias e o Futuro da
América Latina', dirigido por Amílcar Herrera, do qual participei, com outros cientistas sociais
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TEXTOS PARA DISCUSSÃO

latino-americanos, nas discussões da sua orientação geral, e também na pesquisa junto com
Leonel Corona.

De outra parte, há também os estudos europeus, particularmente do grupo do


SPRU e do FAST, extremamente interessantes na produção de conhecimento efetivo sobre o
funcionamento das economias diante das ondas longas. Da mesma forma, o estudo do Tecnology
Economical Programme (TEP) da OECD, assim como vários outros trabalhos de grande
interesse também produzidos pelo seu Centro de Estudos do Desenvolvimento. Ainda dentro desta
linha, há que se considerar os estudos do Fernand Braudel Center, na State University of New
York, em Binghampton, EUA. Isto sem olvidar o estudo de Marshall sobre os ciclos, que o leva,
posteriormente, a assimilar a idéia dos ciclos longos (apesar de não ter partido da hipótese dos
ciclos longos). A obra de Mandel continuou sobre este tema, porém não dispôs dos recursos para
formar um grupo de pesquisa.

De tal forma que temos aí um conjunto de estudos que levam a uma visão
bastante consolidada sobre o papel das inovações no funcionamento da economia mundial, e
particularmente a sua articulação com as ondas longas. O aparelho conceitual que vem sendo
desenvolvido neste sentido consta de alguns elementos-chave que vou desenvolver em seguida,
para aplicar parte desse aparelho à análise histórica, relacionando a evolução da economia
mundial ao fenômeno da dependência econômica, particularmente o caso das novas economias
industriais. Com isto tentarei demonstrar até que ponto há uma confluência entre os esforços que
estavam na origem da problemática da teoria da dependência, da qual participamos, e os esforços
posteriores por uma teoria do sistema mundial e das ondas longas, que vão nos conduzindo a
conclusões comuns que devem ser objeto de uma articulação nesta oportunidade.

Inegavelmente, o conceito que mais permitiu avançar na articulação entre o


comportamento das ondas longas e o papel da tecnologia foi o de paradigmas tecnológicos,
desenvolvido pelo grupo de Christopher Freeman no SPRU. Este conceito procura mostrar que
nos vários períodos históricos há uma mudança na maneira como se articulam os elementos
fundamentais da pesquisa e desenvolvimento, das inovações, que criam estruturas setoriais,
comportamentos do sistema produtivo e relações de trabalho específicas e, portanto, processos
gerenciais e de organização das firmas e do sistema institucional no seu conjunto. Isto relaciona
muito diretamente, então, o desenvolvimento tecnológico com o conjunto do sistema econômico,
social, político e ideológico. Esta capacidade crescente de estabelecer estas relações são aceitas
inclusive como elemento-chave para as políticas econômicas contemporâneas pelos ministros da
OSCD, orientando assim um programa de pesquisa sobre Technology Economical Program
(TEP), que faz uma tentativa de análise complexa desses fenômenos em 1991.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 46
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

O primeiro elemento é essa idéia de que a inovação é um processo interativo.


Com o desenvolvimento dos modelos interativos na teoria econômico nos últimos anos para poder
captar este processo, ligou-se as pressões na demanda com as pressões tecnológicas (ou
oportunidades da oferta) gerando conceitos que permitiram ligações entre a ciência e a tecnologia.
Com isto, muitas das tecnologias-chave contemporâneas, que avançam num campo genérico,
podem ser integradas dentro das decisões econômicas a nível de empresa. Podemos descrever
cada vez mais este processo interativo que está por trás da produção de novos produtos, de novos
processos, e que exige estruturas organizacionais e mecanismos que assegurem uma interação
mais apropriada e um feedback entre as várias instituições, através dos sistemas nacionais de
inovação. Estes sistemas são extremamente decisivos, apesar de que a colaboração entre Estados
e entre empresas de vários países avançou muito na década de 80, gerando fenômenos novos e
uma espécie de sistema internacional (não podemos falar ainda de um sistema mundial, mas de
um sistema internacional de pesquisa e desenvolvimento e de inovação, na medida em que as
redes de inovações se deslocam dos planos nacionais para o plano internacional).

Também no plano da relação entre ciência e tecnologia, vão-se desenvolvendo


estudos sobre as ciências de transferência, que permitem os mecanismos de interface entre o
conhecimento básico científico e a solução de problemas concretos e necessidades sociais
concretas que exigem soluções tecnológicas, que são específicas e práticas, ao contrário do
conhecimento científico, que tende a ser fundamental e abstrato.

A relação entre universidade e empresa tem sido um dos elementos mais


importantes para este processo, apesar de nos últimos anos o desenvolvimento de centros de
pesquisa básica dentro das próprias empresas começar também a gerar uma realidade totalmente
nova de ligação entre a evolução da empresa e a evolução da ciência contemporânea. E isto é o
resultado da revolução científico-técnica. A ciência tende a ser, cada vez mais, uma força
produtiva e um elemento-chave na solução dos problemas concretos da produção. Isso nos leva a
aceitar a idéia de uma acumulação como fundamento da história da Humanidade. A capacidade
de acumular conhecimento é, seguramente, o elemento-chave para dominar o conhecimento
científico e o desenvolvimento tecnológico e para o estabelecimento de hegemonias dentro da
economia mundial. Mas o que os estudos vêm demonstrando é que, ao lado destes conhecimentos
gerais, desta combatividade no plano mais global, existem instrumentos mais concretos que
favorecem o processo de inovação e de difusão, que estão ligados ao conhecimento, à
aprendizagem, através de processos que incluem aprender fazendo, aumentando a eficiência das
operações de produção; aprender usando, o que aumenta a eficiência do uso de sistemas
complexos; aprender interagindo, que envolve o uso e a produção interativa, que é o resultado das
inovações.

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 47
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

Nessa idéia de um paradigma tecnológico, vemos também que há certas


tecnologias que ocupam uma posição genérica, atuando sobre o conjunto de setores econômicos.
São elas que garantem o avanço tecnológico no seu conjunto, e as conseqüências em termos de
poder econômico, de funcionamento e de mudanças estruturais do sistema. São estas tecnologias
que alguns autores chamam de ponta. Portanto, há uma conotação de estar na frente, o que mais
corretamente deveríamos chamar como tecnologias-chave, interativas e genéricas, cujo
aprendizado leva ao domínio de vários setores econômicos, permitindo aplicá-la sobre outros
setores, havendo assim uma generalização do processo de inovação.

Aqui temos um aspecto extremamente significativo: quanto mais as inovações


são socialmente geradas como produto de pesquisa e desenvolvimento de várias instituições, mais
difícil fica a apropriação dos conhecimentos gerados por ela e a apropriação das inovações
criadas pela aplicação dos conhecimentos em função das demandas propostas pela sociedade.
Isso tem duas conseqüências que pesam sobre os paradigmas tecnológicos, no sentido de
conduzir, de um lado, a uma necessidade crescente de interação entre os centros de pesquisa e
desenvolvimento e as empresas interessadas nas inovações, e, de outro lado, uma dificuldade
crescente de privatizar o conteúdo social destas inovações, exigindo comportamentos restritivos
de difusão cada vez mais difíceis de serem gerenciados.

Os efeitos das mudanças de paradigmas também são muito fortes quando


tomamos em consideração a necessidade de mudanças organizacionais. Ao mesmo tempo,
podemos distinguir o conceito de trajetórias tecnológicas que ligam a idéia da mudança
tecnológica ao processo social que vinculam as tecnologias usadas com seus potenciais de
aplicação diferentes, e a seleção dos quais depende de um grande campo de fatores econômicos
como preços relativos, os custos sobre a renda, os valores sociais, o que nos leva inclusive a uma
conclusão bastante importante, citando-a do Background Concluding to Technology Economical
Program, onde se afirma que:

"A noção de taxas crescentes de adoção de novas tecnologias


expressa o fato de que as tecnologias podem, de fato, não tanto ser
selecionadas de acordo com a sua eficiência superior, mas, ao contrário,
tornarem-se eficientes porque foram selecionadas."

E selecionadas pelos atores sociais de acordo com interesses que são culturais e que estão
vinculados ao processo civilizatório no seu conjunto. Temos que concordar então com estes
autores quando afirmam que o progresso tecnológico não é uma questão de inovação e difusão,
mas sim de aceitação social. É claro que a ação das empresas e dos interesses econômicos pode
tentar deter a aceitação social de certos produtos e orientar a sociedade através dos instrumentos
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 48
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

da publicidade, mas a verdade é que, em última instância, serão os fatores sociais globais que
determinarão a tendência à adoção de tal ou tal tecnologia.

A questão do meio ambiente começa a influenciar seriamente a idéia das novas


tecnologias e a direção do processo de inovação. A crescente consciência da relação entre as
tecnologias e os ecossistemas leva a uma mudança na maneira de considerar o uso de certas
inovações e nas direções que a sociedade tende a orientar o fenômeno da produção de novas
tecnologias. Isto nos mostra também como esses fenômenos estão cada vez mais sob o impacto de
grandes processos de transformação social, que estão reorientando muitas decisões do sistema
gerencial das empresas. E aqui, muito particularmente, na formação da visão destes paradigmas.
Há de incorporar-se, então, o papel da pesquisa e desenvolvimento, da pesquisa de longo termo,
da educação e da infra-estrutura de telecomunicações, que asseguram o funcionamento das novas
tecnologias, com implicações também sobre o investimento tanto tangível quanto intangível
(incluindo este crescente papel dos investimentos intangíveis, que trazem realidade nova para a
relação entre a evolução e a organização da sociedade).

Não deixa de ser importante retomar o problema da relação entre tecnologia e o


crescimento posto que há um período histórico em que a questão da eficiência da tecnologia para
gerar crescimento econômico, assumiu um caráter muito determinante, particularmente no século
XIX até metade do século XX, associada ao desenvolvimento da produção em massa, onde o
aspecto quantitativo ganhou uma dimensão muito determinante sobre o conjunto do modelo de
funcionamento econômico, e, portanto, o paradigma tecnológico existente. O avanço da
globalização transforma esse sistema tecnológico num sistema cada vez mais planetário, onde a
relação entre os centros de produção da ciência e tecnologia, de produção de inovações e a sua
difusão para o resto do mundo, está relacionado com um sistema econômico mundial.

Este conjunto de instrumentais teóricos nos leva a repensar o papel das novas
tecnologias na sociedade contemporânea, onde as novas estratégias de desenvolvimento, baseadas
em estratégias sócio-econômicas e em uma visão cultural do espaço social. No período
contemporâneo o que assistimos é o aparecimento de novas tecnologias, que na fase final que
estamos vivendo, da fase b de Kondratiev, poderão ser absorvidas para um novo período de
crescimento econômico. Como já assinalamos, as características principais dessas novas
tecnologias são dadas pelo sistema produtivo, que se fundamenta cada vez mais na automação.
Esta automação é resultado da aplicação da informática e da eletrônica ao sistema produtivo
contemporâneo, que vai liberando este sistema da ação do trabalhador direto, que vai sendo
substituído pelos sistemas complexos de produção automatizados, onde a ajuda da robotização
tem representado também um papel cada vez mais decisivo. Como são os novos materiais que
vão sendo incorporados e permitindo uma organização da produção cada vez mais em termos de
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 49
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

uma produção mais voltada para os princípios da química do que propriamente mecânicos, o que
fortalece as possibilidades da automação ao criar modelos e produtos cada vez mais focados para
demandas específicas.

É assim também que, neste contexto das novas tecnologias, coloca-se o papel da
biotecnologia. Ela rompe os marcos de produção tradicionais, não só da agricultura, como da
indústria alimentícia e farmacêutica, produzindo mudanças significativas nas condições
biológicas da humanidade, podendo até ser aplicada no campo da criação de materiais novos. O
avanço da biotecnologia representa uma potencialidade que os países do Terceiro Mundo,
particularmente os países das zonas tropicais, poderiam seguramente explorar. O exemplo de
Cuba é muito significativo nesse sentido, onde uma política científica, uma orientação firme e
muito poucos recursos, além de um bloqueio internacional muito sério, vem permitindo
conquistas importantes e inovações significativas no plano dessas biotecnologias. Também o
Brasil apresenta na sua política do pró-álcool a demonstração das grandes potencialidades da
biomassa, que poderão se desenvolver muito com o avanço da biotecnologia, indicando assim que
nosso país pode dar saltos revolucionários para a configuração de um novo paradigma
tecnológico do mundo.

Por fim, não devemos deixar de considerar o complexo eletrônico e


microeletrônico. Ele é a base material para o avanço da informática e para o avanço da ação mais
complexa e mais sistêmica, baseada no alto nível de informação, que representa um dos aspectos
centrais do novo paradigma que está sendo desenvolvido nas décadas de 70 e 80. Ele servirá
também como base para o avanço científico-tecnológico e para um novo período de investimentos
e crescimento econômico, que deve trazer uma nova fase a do ciclo de Kondratiev.

Neste plano, nos cabe assinalar que, ao lado do hardware promovido pela
microeletrônica, está sobretudo o software ligado às matemáticas, à teoria do sistema, à teoria do
caos, à matemática louca e novos campos teóricos ligados à inteligência artificial. Isto mostra que
o campo propriamente científico e a evolução do conhecimento científico em si mesmo devem
constituir os elementos-chave do novo paradigma tecnológico. Também aí podemos encontrar um
campo muito interessante para a superação do povos do Terceiro Mundo, pois os investimentos
em educação e em transformação educacional podem ser feitos por nações novas na estrutura
econômica mundial, que saibam aproveitar ao máximo as suas capacidades através de programas
educacionais ambiciosos, como fizeram os coreanos e os japoneses, se bem que não estiveram
nessa condição de subdesenvolvimento. Aliás, por isso mesmo estão diante de um dos pontos
mais dramáticos da condição dependente ou subdesenvolvida, porque uma política deste tipo
supõe uma elite política extremamente consciente, voltada para a distribuição da renda, para a
criação de uma sociedade e uma cultura novas, com conteúdo extremamente cooperativo,
GRUPO DE ESTUDOS SOBRE ECONOMIA MUNDIAL, INTEGRAÇÃO REGIONAL & MERCADO DE TRABALHO 50
TEXTOS PARA DISCUSSÃO

coletivizante. E essa visão coletivizante deve, ao mesmo tempo, estar apoiada sobre o uso da
coletividade e a colocação da coletividade a serviço dos indivíduos. Desenvolvimento é, então,
cada vez mais, neste contexto, um fato cultural, social, político e só nessa proporção e nessa
medida um fato econômico.

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