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Cultura de Paz, Não Violência

Eu estava em Nova Delhi, na Índia, no dia 30 de janeiro passado. Era o dia Memorial de
Mahatma Gandhi.
Corria sozinha pelas ruas próximas do hotel e numa rotatória vi o pôster grande, com a foto
de Gandhi, anunciando um Seminário sobre Cultura de Paz, Não violência e
empoderamento.
Parei para cumprimentar o sol que despontava. Dourado.
Empoderamento – talvez essa seja a maior dificuldade atual da Índia, pensei eu. Pessoas
acomodadas na pobreza, na desigualdade, na injustiça.
Onde estariam os ricos? Em que bairro moram os de classe média alta? Como são suas
casas, seus seguranças, seus jardins, sua água?
Coberta de terra e cinza a Índia liberta continua aprisionada. Não há violência e há
violência. Há paz e não há paz.
Empoderamento.
Dar poder. O poder de exigir seus direitos de forma não violenta. Restituir a dignidade da
vida em cada ser vivo.
Quem tirou o poder das pessoas?
O poder de escolher, de decidir, de sentir, de pensar?
O poder de estudar, trabalhar, compartilhar, cooperar?
O poder de viver e de morrer com dignidade.

No Rio de Janeiro meninos apressados num assalto mal planejado arrastam outro menino
morto-vivo em meio aos gritos de quem ainda grita. Tantos silêncios silenciados pelo medo.

Vítimas todos da violência, que já não a percebemos violenta.

Nas margens do Rio Ganges, na cidade de Varanasi – sagrada cidade – cachorros de rua,
inúmeros cachorros nas ruas da Índia, cachorros de todas as idades – comiam o corpo de um
menino morto que o rio regorgitou em uma de suas margens. Crianças não são cremadas,
são jogadas no rio sagrado, com uma pedra a elas amarrada.

Era apenas o que era. Ao lado uma vaca entrava na água, dois jovens lavavam suas roupas
batendo na pedra vermelha.

Nosso corpo é comida para cães famintos. Somos alimento na cadeia alimentar.

Quando nos lembramos disso?

Saneamento básico. Não jogar cadáveres nos rios.


Não evacuar, não urinar nas águas que usamos para beber, lavar, banhar, comer.
Parece tão simples.
Não jogar ácido nos rios. Não envenenar a terra. Não poluir o solo. Não matar as matas,
que sem elas não vivemos.

Sobreviventes em um planeta que dilaceramos, violentamos, mal tratamos. Assim como


fazemos com as crianças, com as mulheres, com os idosos, com os diferentes, com os
excluídos.

No portão um morador de rua agradece um pequeno alimento. Cheira a álcool. Irmão


menor. Sua mão inchada está cheia de cachaça. Como a lua cheia de graça.
E o meio ambiente é este, que começa neste corpo recoberto de pele por dentro e por fora.
Nossa pele que reveste esqueletos queimados ou enterrados. Nossa pele cheia de grama e
ervas daninhas. Espinhas. Nossa pele que fede e se perfuma. Nossa pele de cores diversas
e texturas. A pele da Terra – mãe que dá vida e se desgasta na sua superfície mais fina.
Afirma a aliança da eternidade em cada instante perene. Transformando.
Somos a vida da Terra. Somos o Caminho. Somos a Verdade.
Acorda. Compartilha. Cuida. Coopera.
Constrói comigo, conosco, uma nova maneira antiga de Interser.
Paz. Cultura de Paz e de Não violência. Empoderamento.
Somos o Caminho. Que senda construímos com nossos pensamentos, gestos, palavras?
Ilusão. Desilusão.
Acorda.
Ainda é tempo.
Redescobre seu papel neste cenário que não é cenário é realidade.
Cuida.
Coopera.
Compartilha.
Riquezas e pobrezas. Rio corre sagrada vida.
Percebe criança que você tem o direito de viver, de sorrir, de comer, de beber, de estudar, de
trabalhar, de cuidar e de respirar. Direito e dever de brincar, amar, compartilhar.
Terra me permite um gesto de humildade, abaixando e a beijando com ternura- minha
própria face.
Mãos em prece

Monja Coen

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