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Texto aprovado pelo Conselho Pedagógico

do Agrupamento de Escolas de S. Julião da Barra


reunido a 13 de Fevereiro de 2008

O Conselho Pedagógico (CP) analisou a situação criada pelo Ministério da Educação


(ME) ao decidir a implementação da Avaliação do Desempenho Docente (AAD), a partir
de Janeiro de 2008.
Entendemos que esta matéria deve ser analisada de um duplo ponto de vista:
A) Considerando a filosofia política subjacente a esta estratégia ministerial, e
avaliando-a através da nossa experiência de ensino e da nossa formação científica e
deontológica;
B) Considerando os dados objectivos impostos por um fluxo legislativo ininterrupto,
donde se destacam o ECD (Estatuto da Carreira Docente) e o Decreto Regulamentar
2/2008 de 10 de Fevereiro, com todos os despachos, recomendações e observações
anexas que diariamente nos chegam.

A) Considerando a filosofia política subjacente à estratégia ministerial, e


avaliando-a através da nossa experiência de ensino e da nossa formação científica e
deontológica,
1) - É nosso parecer que este modelo de ADD está em absoluto desacordo
com a dinâmica organizacional da escola. É um modelo desmedidamente
burocrático, orientado para a competição entre pares, em vez de favorecer o trabalho
de equipa (mau grado os itens que aparecem nesse sentido), previsto para a avaliação
empresarial. Conduzirá, inevitavelmente, ao prejuízo do ensino (na óptica dos
professores) e da aprendizagem (na óptica dos alunos). Acrescenta ao trabalho docente
uma sobrecarga de burocracia que nos impedirá de estudar, de preparar correctamente
as aulas, de acordo com as turmas e os perfis dos alunos, de colaborar com outros
colegas, a não ser nas hipóteses teoricamente previstas para a avaliação, que nos
coagirá a modelos de planificação e preparação de aulas intermináveis e não exequíveis
na prática.
2) - A própria avaliação dos alunos estará submetida a metas prévias que
correspondam aos perfis de desempenho indicados pelo ME. Sem que tal signifique
uma voluntária «tolerância» para atitudes e aproveitamentos menos exigentes, a
própria sobrecarga de trabalho que sobre os professores recairá, terá como
consequência inexorável uma menor capacidade de execução no que toca ao
desenvolvimento dos programas (que, curiosamente, se mantêm, no meio de tanta
reforma pedagógica…) e das actividades que promovam uma avaliação contínua e
personalizada.
3) - Devemos ainda salientar que tudo indica que os nossos horários não venham a
ser aliviados para corresponder a estas solicitações burocráticas. O efeito óbvio será a
criação e divulgação de «modelos únicos» de trabalho, ou seja, uma espécie de
aplicação didáctica por sebentas/receitas, conduzindo previsivelmente à desigualdade
da sua aplicação, dada a heterogeneidade dos alunos e das turmas.

B) Os dados que presidem actualmente à implementação do processo de


ADD apontam todos para falhas importantes que obstam a uma execução correcta.
1) Falta de suporte legal:
 Inexistência do despacho de delegação de competências do Coordenador de
Departamento noutro professor titular (n.º 2 do art.º 12.º);
 Inexistência do despacho de indicação das ponderações dos parâmetros de
classificação (n.º 2 do art.º 20.º);
 Inexistência do despacho conjunto de estabelecimento de quotas (n.º 3 do art.º
21.º);
 Inexistência da portaria que estabelece os parâmetros classificativos da avaliação
a realizar pela Inspecção (n.º 4 do art.º 29.º);
 Inexistência de informações sobre o posicionamento dos professores na carreira
docente em virtude da aplicação do Novo Estatuto da Carreira Docente e do Decreto-lei
nº 200/2007, mormente quanto à situação dos docentes situados nos últimos escalões
da carreira de professor titular;
 Inexistência de um Conselho Científico a quem competirá a formulação das
recomendações para a avaliação dos professores (nº 2 do Artigo 6º). Este Conselho
não foi constituído, havendo apenas quanto a essa matéria:
— O Decreto regulamentar nº 4 de 2008 de 5 de Fevereiro que o institui, e
segundo o qual o Conselho deverá estar constituído no prazo de 60 dias a contar da
data de publicação (ou seja, no início do 3º período);
— Uma presidente nomeada que emitiu recomendações no sentido de as escolas
montarem um processo muito cuidadoso, negociado, assistido pela devida Formação e,
sobretudo, fixarem as metas quantitativas, depois das próprias
recomendações do conselho, dada a complexidade de todo o processo.

2) Falta de Formação:
 O nosso Agrupamento já em Setembro inventariou esta necessidade como
prioritária, tendo-a então comunicado ao Centro de Formação da sua área.
 É notória a falta de oferta de formação sobre este tema, em todos os centros de
formação próximos. A título informativo, referimos que a única formação sobre esta
matéria conseguida por docentes da Escola Sede foi paga pelas professoras e implica o
seu deslocamento a Sacavém…
3) Falta de dados básicos essenciais:
 Uma avaliação do anterior sistema de avaliação de desempenho docente que
aponte deficiências e forneça indicadores a ter em consideração na implementação
deste.
 A definição exacta do conceito de abandono escolar (muito diferente conforme
se considerem os ciclos de escolaridade obrigatória ou o ensino secundário).
 A definição exacta do que se pretende com melhoria dos resultados
escolares e dos respectivos cálculos. Saliente-se que os últimos dados tratados e
publicados datam de 2004/05 (IGE).
 O próprio preenchimento das fichas não é claro, porque não estão definidos os
respectivos critérios e ponderações; as quotas a atribuir não estão definidas.

4) Falta de condições mínimas relativas à organização interna da escola:


 Não se vê como será possível agendar para o terceiro período, em simultâneo
com toda a vida normal da escola, a assistência a aulas de professores contratados por
professores avaliadores, que desde o início do ano lectivo têm que cumprir um horário
completo normal.

Perante esta situação, que fazemos? Deixamos de funcionar na escola e


abandonamos os alunos?
Para já, devemos sublinha que todo o tempo, energia e disponibilidade até hoje
gastos para tentar montar este “aborto” organizativo se tem reflectido negativamente
no trabalho normal da escola — foi feito à custa da qualidade das aulas e da atenção
prestada aos alunos, sem falar do tempo roubado à vida pessoal dos professores.

5) Falta de condições de planeamento:


Não se entende como se faz cair, a meio do ano, numa organização como é
este Agrupamento de 5 escolas, cujo planeamento se iniciou em Setembro
(Projecto Curricular de Escola e PAA) e há dois anos (Projecto Educativo do
Agrupamento), um conjunto de directivas e normas que alteram
completamente as suas regras de funcionamento.

6) No que toca à Educação Especial:


• A situação é particularmente grave, já que se levantam questões, relacionadas
com as práticas específicas destes professores, que não estão previstas nas fichas de
avaliação, tornando impossível a sua aplicação.
• Acresce a esta situação uma legislação desarticulada e frequentemente
contraditória, como se pode verificar pela perturbação trazida pelo decreto-lei nº
3/2008 de 7 de Janeiro, que dificulta gravemente qualquer orientação minimamente
consistente em todo processo.

Resumindo: Estamos a arriscar as aprendizagens dos alunos, empenhando


as nossas energias num projecto que nos prejudica como professores e
prejudica a própria escola como organização.

C) Outros Dados:
Acrescentamos que o facto de recentemente ter sido anunciado pela Ministra e pelo
SE Jorge Pedreira que os prazos intermédios de cumprimento impostos pelo Decreto
Regulamentar 2/2008 de 10 de Fevereiro ficariam a cargo das escolas, em nada altera
a decisão ministerial de a avaliação começar no 3º período (a valer pelo ano lectivo
2007/08…). Se a Senhora Ministra considera que esta questão da execução dos prazos
é meramente «técnica», os professores agradeceriam informações técnicas para a sua
resolução.

Assim sendo, o Conselho Pedagógico continuará o trabalho já iniciado de


reformulação dos documentos de projecto do Agrupamento e de produção de
instrumentos de recolha de dados para a Avaliação do Desempenho Docente, fazendo
depender esse trabalho da resolução das situações irregulares atrás
mencionadas e procurando nunca sacrificar a um tal processo o
funcionamento da própria Escola e do trabalho com os alunos, dado que é
essa, verdadeiramente, a nossa missão.

Considerando ainda que a maioria dos Departamentos subscreveu o texto abaixo


transcrito, o Conselho Pedagógico entende comunicar a sua posição ao Conselho
Executivo, à Assembleia de Escolas do Agrupamento, às Associações de Pais e
Encarregados de Educação do Agrupamento/Escolas, à Câmara Municipal de Oeiras e
ao Ministério da Educação.
Reservamo-nos ainda a liberdade de divulgar a nossa posição publicamente.
O Conselho Pedagógico do Agrupamento de Escolas de S. Julião da Barra - Oeiras,
reunido a 13 de Fevereiro de 2008.
Guião para a análise da legislação sobre a
AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE
31. Janeiro. 2008

Os Coordenadores de Departamento querem levar ao Conselho Pedagógico (CP)


a opinião da Escola sobre todo este processo. Não querem perder a confiança que neles
foi depositada pelos Colegas que os elegeram para os representar. Continuamos a
reger-nos pelo DL 115-A/98. Não fomos ainda nomeados por um Director, como está
previsto no diploma que ainda não saiu. Lamentamos vir sobrecarregar-vos com mais
uma reunião /Ponto de Ordem de Trabalhos, mas é indispensável que obtenhamos a
vossa opinião sobre esta matéria, que será discutida num CP extraordinário
expressamente convocado para o efeito, a realizar depois do Carnaval.
O grupo de trabalho que apoia a Secção de Avaliação do CP tem vindo a estudar
atentamente todas as directivas emanadas do Ministério da Educação, sob formas
diversas:
Decretos-lei / regulamentares contraditórios entre si, e abusivamente
utilizados por meras medidas economicistas (vide as orientações da DGRHE sobre os
Coordenadores de Departamento, que deveriam passar a ser os constantes na lei
200/2007 – Concurso para Titulares – quando a mesma diz expressamente que essa
distribuição é unicamente para efeitos desse concurso);
Recomendações de um conselho científico formado por um único membro
(a Presidente);
Fichas supostamente elaboradas por esse conselho científico que retomam
as divulgadas no sítio da DGRHE em Outubro último e depois retiradas, para serem
depois reeditadas às 23.30h de 6ª feira, dia 25, … a lista é longa.
Sobre as grelhas, em especial, salienta-se que as tais «recomendações
genéricas» assinadas pela dita presidente, foram conhecidas na manhã do dia 25 e as
grelhas apareceram menos de 24h depois. Se acrescentarmos a este perturbador
elemento a declaração da mesma senhora, até agora o único membro do Conselho
Científico para a Avaliação de Professores, feita em Guimarães, perante dezenas de
docentes, na sua 1ª intervenção pública depois de ter sido conhecida a sua nomeação,
e segundo a qual «não pode responder às dúvidas dos professores sobre como serão
avaliados e quem irá avaliar os avaliadores» e que quem implementa o processo de
avaliação é a Direcção Geral dos Recursos Educativos, talvez seja útil interrogarmo-nos
sobre a responsabilidade da autoria das ditas grelhas e sobre a sua efectiva
responsabilidade neste processo …
Há, portanto, motivos de sobra para nos inquietarmos não só sobre a legalidade
de todo este processo, como também sobre as condições da sua execução, por muito
legal que fosse. O Fórum da DGRHE está cheio de perguntas por responder ou mal
respondidas, feitas pelo Conselho Executivo (CE) de várias escolas de todo o país, de
que se citam alguns exemplos, cuja perplexidade partilhamos:
Os Coordenadores de Departamento são avaliados pelo Presidente. do
Conselho Executivo e por um Inspector; os objectivos individuais são fixados, por
acordo entre o avaliado e os avaliadores; até ao dia 25 de Fevereiro devem ser fixados
os objectivos individuais. Perguntas:
-A) Quem convoca o Inspector para a reunião de fixação dos objectivos?
-B) Terá a IGE capacidade de resposta para, no prazo de 10 dias, procederem ao
legislado?
Dado que toda a componente não lectiva dos professores está ocupada
com actividades várias (AA, APAs, Clubes, etc.) e que a componente de trabalho
individual deve servir para a preparação da componente lectiva, QUANDO poderão os
professores titulares avaliadores (Coordenadores ou Delegados) desenvolver as
actividades de preparação, observação e reflexão relativas a todos os parâmetros
classificativos dos professores avaliados e da sua própria avaliação? Que fazer aos
alunos que estão a ser seguidos por esses professores, em especial os dos APAs de LPO
e MAT?
Como é possível cumprir prazos, tendo em conta o trabalho diário dos
professores?
A avaliação de desempenho realiza-se no final de cada período de cada 2
anos. A ser possível cumprir os prazos dados, o processo de avaliação dos Professores
ficará comprimido no 3º período:
- A) Como é possível operacionalizar a observação/avaliação de todos os
professores em apenas um período lectivo?
- B) A realizar-se a avaliação em apenas um período lectivo, como se cumpre o
período de dois anos escolares referidos no art.º 5º do Decreto Regulamentar 2/2008?
Os professores do 2º ciclo, que estão impedidos de leccionar o 3º ciclo
vão poder ser avaliadores dos colegas desse ciclo?
Quando só existe um titular e não há possibilidade de delegar a avaliação,
como é possível avaliar 20 professores ou mesmo mais?
Como pode um Conselho Executivo elaborar um calendário de observação
de aulas deste ano lectivo, se ainda não existe publicação de diploma legal que
estabeleça as regras de delegação de competências de avaliador?
As aulas a observar são de 45 ou de 90 minutos?
Já foi feito um estudo ao funcionamento de uma escola no exercício deste
modelo, tendo em conta as actividades decorrentes da sua implementação,
funcionamento, actividade lectiva, reuniões de rotina, reuniões de avaliação,
intercalares, as novas intervenções da escola (Plano de Acção para a Matemática),
Projecto “Promoção para a Saúde”, Plano de Leitura, Iniciativa "Escolas, Professores e
Computadores Portáteis", Melhoramento dos resultados escolares, Redução do
abandono escolares, Actividades constantes do Plano de Actividades de Complemento
Curriculares e outras...)?
O último ponto da nossa preocupação deveria ser o primeiro, mas decorre dos
dois anteriores: SERÁ TODA ESTA PRESSA (para os prazos, a definição de
indicadores objectivos e parâmetros) BENÉFICA PARA OS ALUNOS? A resposta
óbvia para nós é que os alunos têm sido a última das preocupações do ME e do
Governo. Toda esta parafernália legal tem como único objectivo exibir estatísticas,
quer seja de controlo do défice orçamental ou do sucesso escolar. Se o ME estivesse
preocupado com a qualidade do ensino e as condições de aprendizagem nas escolas
portuguesas,
não se daria ao trabalho de inventar fraudes como as Novas
Oportunidades, em que se adquirem em 6 ou 5 meses as competências do ensino
secundário,
não alteraria grosseiramente o Estatuto do Aluno para assoberbar os
professores com mais papéis e exames para compensar as faltas, desautorizando o
seu trabalho e, sobretudo,
não perturbaria constantemente o trabalho das escolas com uma catadupa
legislativa, alterações constantes de regras a meio do ano lectivo, tanto no que ao
nosso estatuto respeita como à organização e gestão da Escola,
não criaria “ghettos” para os Alunos com Necessidades Educativas
Especiais, deixando de fora os casos verdadeiramente perturbadores de indisciplina e
violência para os quais nenhuma solução é proposta,
não e reduziria o corpo docente do Ensino Especial e o do pessoal auxiliar,
não poria os professores sob a tutela das autarquias e dos Encarregados
de Educação.

Todos sabemos que o nosso trabalho, as relações com os alunos e os


Encarregados de Educação vem piorando de ano para ano. Os alunos não aprendem
melhor, nós não ensinamos melhor, antes pelo contrário. E no entanto, parece que
apesar de tudo os portugueses em geral entenderam que são os professores a última
barreira contra a barbárie e a desonestidade, ao declararem, acima de todos os outros
europeus, que confiam em primeiro lugar nos professores e em último, nos políticos.
Porque somos nós que estamos no terreno. Porque somos nós que damos a cara.
Porque somos nós que enfrentamos esta «cultura» do facilitismo, da falta de regras, da
ignorância, de que os nossos governantes dão o primeiro exemplo.
Os professores do Grupo de Trabalho sobre a Avaliação do Desempenho
Docente não recusam a sua tarefa. Mas querem fazê-la correcta e legalmente:
É impossível cumprir os prazos dados pelo Ministério da
Educação.
É impossível trabalharmos na construção dos indicadores que
devem orientar os objectivos individuais sem o tempo e o suporte legal
correctos e a devida formação.
Não queremos prejudicar a Escola nem os nossos Alunos. Não nos
estamos a furtar ao trabalho. Há mais de dois anos que antecipámos
esta situação e estamos a trabalhar para uma avaliação interna da
Escola, mas não nos são dados o tempo nem as condições de trabalho
para retirar dos dados recolhidos as conclusões necessárias.
Não vamos deixar que a inépcia da Ministra e dos seus
Secretários de Estado ponham em causa o nosso trabalho e o dos nossos
Alunos. E não estamos sós: várias são as escolas que se têm revoltado
contra este estado de coisas. Temos a obrigação, pela nossa honra
profissional e pessoal, de declarar que não pactuamos com ilegalidades
nem com atabalhoamentos políticos. A nossa Escola, os nossos Colegas e
os nossos Alunos não podem ser reféns das ameaças que nos acenam.
Não é assim que se trabalha.

Esta é, de uma forma geral, o nosso sentimento colectivo e é sobre esta


situação que pedimos a vossa opinião, para vos podermos, realmente, representar no
próximo Conselho Pedagógico.

Texto subscrito pela maioria dos professores em reuniões de Departamentos


Curriculares da Escola E. B. 2,3 de S. Julião da Barra, Oeiras.

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