Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2009
1
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
Claramente conhecido, este cliente, que é a sociedade como um todo, segmentos da mesma, ou
cidadãos específicos, assume um caráter difuso e vago para aqueles que não estão no elo final da cadeia
de processos, isto é, na linha de frente. Para muitos participantes dos processos da retaguarda
administrativa, “cliente” é simplesmente o órgão a quem deverão entregar o produto de sua atividade e
em função do qual todo o esforço deve ser despendido. Ora, sem uma identificação concreta do
verdadeiro usuário final do serviço, cada processo ou etapa do trabalho vai perdendo a orientação
necessária. Por exemplo, agradar à chefia imediata, ou dedicar-se a construir uma imagem própria junto
aos meios de comunicação pode tornar-se mais importante do que entregar o “produto” ao usuário final
com a presteza e a qualidade necessária. No caso de empreendimentos, por exemplo, a implantação de
novos “equipamentos de interesse social”, muitas vezes esta deficiência quanto à usabilidade final do
equipamento dá espaço a projetos mal especificados, super-estimados, etc.
Casos práticos
A gravidade dos prejuízos causados pela falta de uma gestão integrada dos serviços e
empreendimentos públicos é diretamente proporcional à complexidade das questões enfrentadas. Nesta
seção são apresentadas algumas evidências disto. Mas o intuito de trazê-las aqui vai além do efeito
demonstrativo. Pretende-se que elas facilitem a interpretação da proposta de solução apresentada na
seção seguinte:
1
Os termos “produto” e “estrutura produtiva” são abusos de linguagem para denotar que, no fim das contas, todo
serviço público deve mirar o fornecimento de bens ou serviços para a sociedade ou seus indivíduos.
2
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
Um amplo estudo desenvolvido por equipe da Fundação Getulio Vargas em 2004 e apresentado
ao Gabinete Civil da Presidência da República (FGV: 2004) deixou claro que a causa primária dos
inúmeros problemas enfrentados pela região está na falta de uma ação integrada dos diversos atores
responsáveis.
De fato, conforme constata um dos participantes do estudo (Silva Pinto: 2004):
“A Amazônia hoje reúne um elenco não trivial de ações muitas vezes (freqüentemente) não
convergentes e não integradas, no imenso espaço verde-cortado por rios e cursos d’águas vigorosos,
sob o “guarda-chuva” de uma legislação ampla que é exercida sem os recursos necessários para sua
fiscalização – em termos financeiros, humanos e de equipamentos de apoio. Essa circunstância gera
resultados perversos que se traduzem muitas vezes em agressão ao meio ambiente, corrupção e o
fenômeno da não-integração.
De um modo geral, ocorrem na Amazônia as seguintes mega-presenças ou prioridades:
Presença das Forças Armadas sob o Comando Central do Ministério da Defesa.
As comunidades indígenas nos seus espaços demarcados e protegidos pela FUNAI.
A dos conservacionistas radicais que face tanta agressão verificada na Amazônia ao longo
de várias décadas, julgam que o melhor é interagir o mínimo com a grande floresta.
Os grupos de desenvolvimento sustentado (como por exemplo, o governo do Acre atual),
onde buscam interagir com a floresta e seus povos de forma inteligente, inovadora e criativa -
objetivando-se preservar o meio ambiente ao máximo sem se paralisar o processo de desenvolvimento
econômico.
Os incentivados, como empresários e empreendedores da Zona Franca de Manaus que se
julgam incapazes de concorrer com os similares do sul e sudeste do país caso não ocorram incentivos
fiscais e/ou assemelháveis.
Os exploradores de madeira que, motivados economicamente pelas grandes serrarias e
importadores, utilizam-se de toda uma gama de procedimentos que os orienta no avanço sobre a
floresta verde, violentando em inúmeras situações a legislação estabelecida.
Os agricultores (principalmente os centrados na soja) e, os pecuaristas que derrubam dia-
a-dia a floresta – e em alguns casos justapõem-se à posição de produtores de carvão de lenha,
conjunto esse que “motoserra” a floresta com intensidades cada vez mais preocupantes. Queimadas,
invasões e outras desconfigurações perversas são a “colheita imediata” de uma série de distorções
antes citadas.
E, ainda, a presença preocupante de minerações ilegais que em determinadas situações
interagem com outras ações desestabilizadoras para a região e o país (contrabando, etc.).
Nesse cenário – onde não se procurou ser exaustivo, inexiste uma política maior que una
esforços integrados para construção de uma Nova Amazônia inteligente – e supercapaz – onde o
desenvolvimento econômico e social possa ser efetivado com uma conseqüente valorização ambiental
e social. A falta desse Projeto Maior produz necessariamente conflitos de interesse e uma luta surda
de grupos interessados junto ao Executivo e ao Legislativo, onde as várias correntes estão
representadas com forças quase eqüipotentes.”
Outros participantes do estudo (Lustosa: 2004) apontam, no texto a seguir, os seguintes fatores
para a “Síndrome da Amazônia”:
“Um diagnóstico inicial do atual arranjo organizacional orientado para a promoção do do
desenvolvimento regional no Brasil aponta alguns problemas e pontos de estrangulamento que podem
dificultar o esforço de concepção e implementação de um modelo de gestão pública mais integrado e
compartilhado. Entre os problemas, é possível destacar:
3
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
4
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
Caso C: Municípios brasileiros de acentuada pobreza apesar de abrigarem importantes e bem sucedidos
empreendimentos industriais
Esta impressionante situação paradoxal, lamentavelmente, repete-se em diversas localidades do
Brasil.
Ela adquire maior complexidade quando se constata que os parques produtivos instalados nestas
localidades efetivamente transferem, sob a forma de impostos ou royalties, renda significativa aos
municípios onde atuam. Entretanto, esta renda não é devidamente aproveitada nem para a melhoria das
condições sociais atuais nem para a alavancagem de um possível futuro auto-sustentável, preocupação
importante face ao inexorável esgotamento futuro dos recursos naturais hoje explorados pelos
empreendimentos locais.
Um município emblemático das contradições citadas foi alvo de projeto para constituição do
seu Plano Diretor, que conduzimos. Trata-se do município de São Francisco do Conde, situado no
Recôncavo Baiano, e que apresenta o maior PIB per capita do país, embora ocupando a 2.735ª posição
no ranking do IDH dos municípios brasileiros (IBGE: 2004). As análises do amplo material recolhido
no projeto realizado permitem extrapolações para outros municípios do Recôncavo e para outros
municípios como os do Norte Fluminense recebedores de royalties do Petróleo, os municípios do Pará
que abrigam importantes projetos de mineração, etc. De fato, somadas as produções de todas essas
regiões, obtém-se parcela bastante significativa do PIB nacional. Se socialmente recuperadas, estas
localidades teriam forte efeito irradiador nas regiões sob sua influência (Almeida: 1985), evitando-se
uma migração futura dos seus habitantes ao fim da exploração de seus recursos naturais (que
normalmente ocorre rumo aos saturados grandes centros urbanos). Portanto, sofrem as populações
destas regiões e sofre o país como um todo por não aproveitar as suas riquezas adequadamente.
Novamente, constata-se que, também neste caso, as políticas públicas, não têm oferecido
soluções adequadas para o tratamento destas regiões “desbalanceadas”. Nota-se a falta de um modelo
capaz de lidar com a situação, o qual não pode ser encontrado dentro da economia do modernismo
industrial perseguida pelo país nas últimas décadas. Parece que nossos gestores públicos ainda não
estão convencidos do previsível declínio deste modelo e, assim, ainda não conceberam mecanismos
para lidar com oportunidades relacionadas com a nova condição pós-industrial que o mundo vem
descortinando (Drucker:1999). Isto talvez explique porque ficamos como que presos no dilema de
como agir em situações em que a indústria não pode oferecer saídas para as crises sociais como
desemprego, desigualdade social, etc.
É preciso desenvolver-se um novo modelo que possibilite o desenvolvimento de estratégias para
arrancar da cilada em que se encontram essas populações das “cidades-gueto”, que é como podemos
chamar as regiões que vivem o fenômeno citado. Pelo modelo convencional, pouco ou nada se pode
fazer, já que os empreendimentos implantados esgotaram a capacidade de absorção de mais
trabalhadores após terem atingido seu limite físico de, digamos, 2 ou 5 mil trabalhadores, deixando de
fora os 15 ou 20 mil outros que participaram da fase de construção do empreendimento ou foram,
posteriormente, atraídos pelas notícias de riqueza que ele traria para a região. Pelo “estado da arte” da
nova era pós-industrial, tudo pode ser feito, sobretudo pela abundância de recursos provenientes dos
impostos e royalties pagos pelos empreendimentos.
De fato, a verdadeira causa da má aplicação atual dos recursos arrecadados está no despreparo
político-educacional da população, facilmente manipulada por políticos desonestos. A adoção de um
modelo de desenvolvimento que priorize o Setor Terciário ou de Serviços pode estabelecer um novo
paradigma em que o cidadão local passe a ser o protagonista principal da geração de bens e riquezas, e,
principalmente, adquira maior capacidade melhor exercer a sua cidadania.
5
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
Ao contrário do modelo rigidamente industrial, fortemente centrado no capital, o modelo misto, que
reserva espaço suficiente para as empresas prestadoras de serviços e as produtoras de bens e produtos
da sociedade pós-industrial, favorece a formação de sociedades mais equilibradas. Para isso, novas
formas laborais deverão ser cogitadas, tais como: cadeias estendidas, arranjos produtivos, cooperativas,
serviços turísticos, centros culturais e artísticos, parques temáticos e tantos outros esquemas de
produção onde o empreendedorismo, a arte, a cultura e a capacidade de comunicação tenham papel
proeminente.
Deparamo-nos então com outro exemplo das conseqüências da falta de integração do Setor
Público, caracterizado:
primeiro, pela má formulação do projeto desses grandes empreendimentos, que poderiam ter
reservado uma pequena parcela dos investimentos realizados para educar os trabalhadores contratados,
o que teria dificultado a implantação dos “currais eleitorais” que se implantaram na região a posteriori
e que vivem a dilapidar as receitas geradas;
segundo, criado o problema, pela incapacidade de produzir novos modelos de desenvolvimento
social, capazes de superá-lo. A razão aqui é simples. Como a constituição desses modelos requer a
participação de todo um leque de competências espalhados por diversos setores da administração
pública, a deficiência de interação entre os mesmos virtualmente impossibilita o desenvolvimento
pretendido.
Proposta de solução
Longe de pretender ter encontrado uma solução mágica para questão tão complexa, a proposta
apresentada a seguir visa tão somente contribuir para o fortalecimento do arsenal de medidas que urge
serem adotadas para lograr-se um rápido aumento da integração do Setor Público.
Primeiramente, vale observar que a integração de processos com vistas a resultados tangíveis e
de alto valor para o cliente final não foi obtida nas grandes organizações privadas com facilidade. Aí
também imperavam (e em algumas ainda imperam) os feudos funcionais, os setores que resistiam a
trabalhar de forma entrosada com os demais. Tanto é que, após o lançamento de suas idéias, que
inicialmente ganharam a alcunha de “reengenharia de processos”, Hammer sofreu um forte revés,
sendo muito criticado porque suas teorias mostravam-se impraticáveis. Foi somente com o advento dos
avanços da tecnologia, que permitiram a criação do chamado “ERPS”2, software integrado apoiado em
bases de dados relacionais poderosas e em arquiteturas distribuídas de processadores, que se tornou
viável – e de certa forma irreversível – o funcionamento das cadeias de processos empresariais.
Com este firme apoio estrutural, fortaleceu-se o papel do outro elemento indispensável para a
integração desejada: o chamado “arquiteto” e “orientador” da cadeia de processos. Este profissional é
da mais alta importância por vários motivos:
Primeiro, porque estamos lidando com funcionalidades amplamente estendidas, que
compreendem uma longa série de transações até a constituição do resultado final a ser fornecido ao
cliente. É preciso desenhar de forma otimizada toda esta longa cadeia de interações e zelar para que ela
funcione corretamente.
Segundo, porque as evoluções não cessam de ocorrer, em diversas dimensões. É preciso,
portanto, que o “arquiteto” esteja constantemente estudando novos aperfeiçoamentos ou modificações e
promovendo os redesenhos que se façam necessários. Ele é um especialista, que conhece
profundamente o funcionamento de sua cadeia de processos, e tem capacidade e autoridade para
implementar mudanças quando as julgar oportunas.
2
ERPS – “Enterprise Resource Planning System”
6
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
7
XIV Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Salvador de Bahia, Brasil, 27 - 30 oct. 2009
Ou seja, ele prepara o caminho, o estuda e o aperfeiçoa, mas não executa nem chefia qualquer
transação operacional. Assim sendo, não existirão conflitos de autoridade, pois o arquiteto atua off-line,
as atividades operacionais continuando, como antes, sob a responsabilidade das chefias dos diversos
organismos envolvidos. Claro que, na ocorrência de dúvidas ou disputas entre organismos, a palavra do
arquiteto de processos deverá ser sempre fortemente considerada.
Quanto à segunda questão, claramente não existe hoje nenhum organismo de governo com este
perfil, embora existam ministérios como o da Casa Civil e o do Planejamento que exercem funções
semelhantes em relação a determinados setores do país. Numa eventual discussão aprofundada desta
proposta, isto teria que ser equacionado, a dúvida residindo mais do ponto de vista político do que do
ponto de vista técnico. O importante é que, uma vez estabelecido, este novo organismo e seus
funcionários sejam implantados “para durar”, de modo que possam adquirir, progressivamente, a
maturidade necessária para que suas ações frutifiquem.
Bibliografia
Hammer, Michael e Champy, James (1993), “Reengineering The Corporation - A Manifesto for
Business Revolution”, USA, Collins Business Essentials
Kaplan, Robert e NORTON, David (1997), “A estratégia em ação: balanced scorecard”, Rio de
Janeiro, Ed. Campus.
FGV (2004), Diversos autores, Coordenação de Antonio Bogado, “Gestão Integrada da
Amazônia”, Rio de Janeiro, Fundação Getulio Vargas
Silva Pinto, Luiz Fernando, opus cit.
Lustosa, Frederico e Peci, Alketa, opus cit.
IBGE (2004)
ALMEIDA, Rômulo (1985), “Nordeste: desenvolvimento social e industrialização”, Rio de
Janeiro, Ed. Paz e Terra e Brasília, CNPq.
DRUCKER, Peter (1999), “Management challenges for the 21st century”, New York, HarperCollins
Publishers
Resenha biográfica