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A APAE E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Apresentação

A educação inclusiva é, no momento, um enorme desafio para o nosso


sistema educacional. Ela representa um novo caminho que está sendo construído
por tantas e tantas pessoas que sonham com uma sociedade justa, solidária e
pronta para garantir os direitos de todas as pessoas que nela vivem.
Quando falamos em viver, estamos preocupadas com o sentido pleno da
palavra que significa conviver, compartilhar, desfrutar, participar, relacionar,
interagir, trocar.
Sabemos que essas vivências continuam sendo, senão negadas, ainda
dificultadas para um número significativo de crianças, jovens e adultos com
deficiência.
A educação inclusiva é, sem dúvida, uma conquista que vai facilitar que
essas vivências passem a fazer parte da vida de todas essas pessoas, cidadãos de
direitos e deveres, como todos.
As APAES, cuja missão maior está na defesa dos direitos das pessoas com
deficiência, querem ser parceiras na construção desse caminho - longo e muitas
vezes ainda árido - da educação inclusiva em nosso Estado.
Para isso, pensamos em colocar nas mãos de todos os nossos professores, e
quem sabe, também na de tantos outros educadores envolvidos com essa nova
caminhada da educação, uma cartilha sobre o tema.
Esta cartilha, elaborada sob a forma de questões problematizadoras,
pretende provocar e estimular a discussão com os nossos alunos e suas famílias,
para que também eles possam compreender de que escola estamos falando
quando falamos da escola inclusiva. E, ao compreender, possam também opinar
sobre a escola que desejam ter.
Pensamos ainda que, ao discutirmos as questões propostas, estaremos
enfrentando os nossos próprios medos e conflitos pessoais e por que não, nossas
próprias barreiras e resistências interiores.
Esperamos que cada professor, sentindo-se motivado por essas questões,
possa acrescentar muitas e muitas outras, surgidas no cotidiano de sua
convivência com seus alunos, fazendo com que essa cartilha seja mais um
instrumento facilitador de um debate sério e comprometido, dentro do nosso
programa de organização dos auto-defensores.

1- COMO SURGIU A IDÉIA DA INCLUSÃO ESCOLAR?

A inclusão escolar faz parte de um movimento muito maior, que é a inclusão


social de todas as pessoas que, ao longo da história, foram discriminadas,
segregadas e afastadas da convivência com outras pessoas consideradas
“normais”: as pessoas muito pobres, muito feias, os negros, as mulheres, as
pessoas abandonadas, as pessoas com deficiência.
Esses grupos foram então excluídos dos ambientes sociais públicos, porque
acreditava-se que eles eram muito diferentes dos outros, considerados então
como pessoas inferiores e incapazes de conviverem na sociedade.
E a escola também os discriminou. Não os recebeu, porque não sabia como lidar
com suas diferenças.
Com a mudança das sociedades, que foram se transformando em
sociedades mais democráticas, essas pessoas e suas famílias passaram a se
organizar e a exigir os seus direitos.
Foi então que também as pessoas com deficiência e suas famílias iniciaram
a sua luta pelo direito à escola.
Como a escola regular não se abria para a maioria das pessoas então
consideradas “doentes”, surgiu a escola especial, como espaço exclusivo para as
crianças e jovens cuja deficiência motivou a sua exclusão da escola regular, sob a
justificativa da necessidade de um atendimento especializado. Durante muitos
anos a escola especial foi a única alternativa disponível para esses alunos,
embora ainda hoje sejam poucos os que mesmo a ela conseguem ter acesso.
Com o avanço da sociedade, a luta pela inclusão social e pelo respeito à
diversidade se fortalece e faz crescer , em todo o mundo, a luta por uma escola
que possa atender a todos os alunos, sem rótulos e sem classificações
discriminatórias.
Esta é a escola inclusiva, que a declaração de Salamanca defendeu em
1994, na Espanha e que o Brasil adotou como diretriz para sua política
educacional
A educação inclusiva está ainda em construção. O caminho não está pronto.
Está sendo traçado, pouco a pouco, em cada município, em cada escola, por
todos aqueles que querem contribuir com um sistema educacional de qualidade
para todos os alunos.
A inclusão escolar é, portanto, um caminho a ser buscado por todos, com
compromisso, responsabilidade e sobretudo com a crença de que essa construção
é possível.

2- O QUE SIGNIFICA A INCLUSÃO ESCOLAR ?

A inclusão escolar significa que todas as crianças e jovens em idade escolar


devem freqüentar a mesma escola, e que esta escola deve estar organizada para
atender as necessidades educativas especiais de todos os seus alunos.
No entanto, a inclusão escolar não significa apenas colocar todos os alunos
na escola comum , fazendo assim uma inclusão apenas física. A inclusão escolar
significa garantir o acesso, a permanência e o sucesso escolar também dos alunos
com deficiência.
Para isso, a escola tem de oferecer os suportes que o aluno vai precisar
para que ele possa, de fato, estar incluído. Esses suportes são os apoios
pedagógicos, os apoios clínicos, a remoção das barreiras , os recursos materiais e
tudo o que for necessário para que o aluno possa aprender como e com os outros.
Para garantir esses suportes, é preciso que os órgãos públicos de educação,
as secretarias de educação estadual e municipal estejam também comprometidas
com a inclusão escolar, garantindo algumas condições que possam facilitar a
entrada de alunos com deficiência na escola comum: escolas acessíveis, sem
barreiras; professores melhores preparados; número menor de alunos nas salas
inclusivas; apoios pedagógicos, como e quando necessário; o professor de apoio;
materiais específicos (braille, sorobã, dentre outros), professor intérprete. Essas
são as chamadas adaptações de grande porte.
Na escola, as adaptações necessárias, são as chamadas de pequeno porte,
ou seja, aquelas que o professor mesmo deve providenciar: novas formas de
ensinar, de avaliar, de acompanhar o desenvolvimento de seus alunos, de se
relacionar com as suas diferenças, de trabalhar de forma cooperativa, de buscar
apoios através de parcerias com outras instituições e outros profissionais. Estas
dependem das necessidades que cada aluno apresenta.

3- QUAIS AS LEIS QUE GARANTEM A EDUCAÇÃO INCLUSIVA?

Hoje nós podemos afirmar que o Brasil tem um arcabouço legal muito
avançado, no que se refere à garantia dos direitos das pessoas com deficiência.
Nossa luta, no entanto, é para que elas sejam respeitadas e implementadas.
Para isso, torna-se necessário conhecer e multiplicar o conhecimento das
legislações em cada espaço de convivência.
Na área da educação podemos destacar:
- a Constituição Federal (1988) art.208
- a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) - lei nº 9394 de 1996.
- a lei dos direitos da pessoa portadora de deficiência - lei nº 7853 / 1989
- o Decreto nº 3298 / 1999, que regulamenta a lei 7853
- a lei nº 10098 / 2000 sobre a acessibilidade
- as diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica (MEC/2000)

Todas essas leis e decretos determinam que a educação das pessoas com
necessidades educativas especiais deve ser oferecida preferencialmente na rede
regular de ensino e só extraordinariamente em escolas especiais, para aqueles
alunos que requeiram apoios intensos e permanentes, que a escola comum não
consegue prover.
VAMOS PROCURAR CONHECÊ-LAS E DIVULGÁ-LAS.

4- O QUE É UMA ESCOLA INCLUSIVA ?

É aquela escola que não rejeita a matrícula de nenhum aluno, independente


das condições que ele apresenta.
É aquela que se preocupa com a permanência de seus alunos, de forma a
não excluí-los no percurso escolar.
É aquela escola que se preocupa com o desenvolvimento de todos os seus
alunos, buscando sempre criar situações de aprendizagem significativa para
todos.
É aquela que está preocupada com formação de cidadãos conscientes,
preparados para a vida fora dos muros da escola.
É aquela que está comprometida com a formação continuada de seus
professores, que incentiva o trabalho cooperativo, que respeita a diversidade
humana, que se organiza de acordo com as necessidades de seus alunos.
É aquela que oferece os apoios e suportes necessários ao sucesso escolar
de seus alunos.
É aquela que busca a parceria disponível para poder oferecer uma educação
de qualidade para todos.
É a escola acolhedora, cujo projeto político-pedagógico está fundamentado
numa pedagogia humanista e inclusivista.
Enfim, é a escola que buscamos e que estamos começando a colocar as
bases para sustentar a sua construção.
VAMOS AJUDAR A CONSTRUÍR ESTA ESCOLA INCLUSIVA.

5- POR QUE AS ESCOLAS REGULARES E AS ESCOLAS ESPECIAIS SÃO


DIFERENTES?

Houve um tempo em que as escolas públicas só recebiam as crianças e


jovens pertencentes a famílias que tinham boas condições financeiras e sociais,
eram inteligentes, enfim, a crianças e jovens “sem problemas”.
Quando outras crianças e jovens, vindas de outras classes sociais
começaram a chegar nas escolas públicas, elas começaram a afastar e a recusar
as crianças chamadas “problemáticas”.
Dentre essas, estavam as crianças que apresentavam fracasso na
aprendizagem, as que apresentavam características muito diferentes da maioria,
as que apresentavam deficiências.
Foi assim que então surgiu a educação especial, que se expandiu em
classes e escolas especiais, para atender aquelas crianças e jovens que não
tinham acesso ás escolas regulares.
Estas escolas se organizaram de forma diferenciada e com o tempo, foram
constituindo um outro sistema de educação: o sistema de educação especial, que
foi ficando distante e diferenciado do sistema educacional regular.
Este não foi um desdobramento positivo, pois fortaleceu o rótulo, a
segregação e a separação entre “deficientes e não deficientes”, entre “normais e
anormais”.
As escolas especiais ofereciam vantagens e desvantagens aos alunos: eram
escolas menores, com turmas reduzidas, com atendimento especializado, com
cuidados e proteção individuais. Porém não privilegiavam a educação escolar e
não garantiam a vida escolar que todo aluno tem direito. A prioridade sempre foi
o cuidado pessoal, a clínica, a socialização, pecando no que se refere à
informalidade na educação escolar.
A escola “regular”, cumpre normas escolares definidas pelo sistema e,
embora não sendo ainda suficientemente capaz de enfrentar o fracasso escolar
de muitos, assegura uma vida escolar reconhecida no país como e educação
escolar formal.
A escola especial, na maioria das vezes, não estimulava a convivência de
seus alunos com os seus pares “não deficientes”. Além disso, ela passou a
receber os alunos que a escola comum encaminha, fortalecendo, dessa forma, a
não reorganização de todas as escolas.

6- COMO A APAE PODE CONTRIBUIR COM A EDUCAÇÃO INCLUSIVA? È


POSSÍVEL A INTERLOCUÇÃO ENTRE AS ESCOLAS ?
A APAE, como instituição de defesa dos direitos da pessoa com deficiência
tem o dever de se comprometer e de contribuir com a construção da educação
inclusiva em nosso país.
A educação inclusiva é necessária e fundamental para a inclusão social.
Sem o acesso à escola, dificilmente as pessoas com deficiência conseguirão
exercer a sua cidadania com plenitude.
As APAES têm uma vasta experiência no campo da educação especial para
alunos com deficiência, têm um quadro de profissionais competentes e
experientes tanto no atendimento escolar quanto no atendimento clínico, contam
com muitos ambientes equipados para dar suporte às muitas das necessidades
específicas que os alunos apresentam ao chegarem nas escolas, têm hoje, as
suas escolas especiais regularizadas, de forma a permitir a transferência de
muitos de seus alunos para as escolas comuns, e de forma a garantir, para os que
nela permanecerem, um percurso escolar reconhecido como válido. Mais
importante do que tudo isso, as APAES podem disponibilizar os seus esforços, a
sua experiência e os seus recursos para a construção de uma educação que não
segregue, que não rotule, que não discrimine.
As escolas das APAES podem e querem ser parceiras das escolas públicas,
fortalecendo a criação e a organização de serviços de apoio à inclusão escolar.
VAMOS CONHECER MELHOR O PROGRAMA APAE EDUCADORA.
VAMOS FORTALECER A PARCERIA COM AS ESCOLAS PÚBLICAS.

7- O QUE VOCÊ - PROFESSORA, DIRETORA, PRESIDENTE, PROFISSIONAL


DA APAE - PODE FAZER PARA QUE AS ESCOLAS DO SEU MUNICÍPIO
POSSAM TRANSFORMAR-SE EM ESCOLAS INCLUSIVAS? E A ESCOLA DA
APAE, COMO PODE SE ENVOLVER NESSA CONSTRUÇÃO?

A educação inclusiva só vai acontecer a partir de uma decisão do município.


É no município que a mudança se fará de fato.
Esta mudança implica numa reorganização das escolas, tanto da escola
especial quanto da escola comum e isso exige que seja firmado um pacto, que
seja explicitado o acolhimento da escola e dos educadores a esse paradigma da
inclusão escolar sem a adesão das escolas e dos educadores, a inclusão escolar
não estará presente no cotidiano das escolas. E será mais um discurso
“polìticamente correto”.
A APAE , pode e deve, a exemplo do que já vem acontecendo em inúmeros
municípios do Estado, se colocar como a instituição facilitadora dessa mudança.
Ela pode provocar a elaboração de um projeto de inclusão escolar no município,
tendo como referência a sugestão anexada a essa cartilha. Ela pode também ser
parceira das escolas comuns da rede pública, organizando os seus serviços de
apoio à inclusão escolar, participando dos eventos de capacitação de professores,
bem como organizando eventos coletivos de capacitação - escola da APAE e
escolas comuns - onde a inclusão seja o foco das discussões.
Os municípios que se envolveram com essa proposta já registram uma
movimentação inversa dos alunos entre a escola comum e a APAE: apresentam
redução dos encaminhamentos das escolas comuns para a APAE e ampliação da
transferência de alunos da APAE para a escola comum!
Com isso, a APAE está se organizando para ampliar as suas vagas para
muitos alunos com comprometimentos graves, que se encontram fora de
qualquer atendimento escolar.
Essa é uma responsabilidade coletiva: depende muito da contribuição de
cada um de nós.
VAMOS ORGANIZAR A NOSSA CONTRIBUIÇÃO. VAMOS REGISTRAR E
SOCIALIZAR A NOSSA EXPERIÊNCIA.

8- E VOCÊ, ALUNO DA APAE, COMO PODE PARTICIPAR DESSE MOVIMENTO


PELA EDUCAÇÃO INCLUSIVA? E SUA FAMÍLIA, PODE AJUDAR? COMO?

Cada aluno deve estar atento ao programa de organização dos auto-


defensores em sua APAE. Caso ele ainda não tenha sido implantado, comece a
fazê-lo. Este programa vai ajudá-lo a ser uma pessoa mais atuante, mais
participativa e mais respeitada em todos os espaços que freqüentar. Vai ajudá-lo
a conhecer os seus direitos e os seus deveres.
Conhecendo os seus direitos, cada aluno vai lutar pelo cumprimento deles e
quanto mais alunos estiverem preparados para isso, mais conquistas serão
atingidas.
O direito a uma educação inclusiva está escrito na LDBEN (lei de diretrizes e
bases da educação nacional) e é importante conhecê-la.
O programa de organização dos auto-defensores também vai ajudá-lo a ser
mais participativo dentro da escola da APAE: você vai se sentir mais seguro para
dizer e mostrar o que deseja aprender na escola para viver melhor na sua
comunidade.
Procure também conhecer outras escolas de sua cidade.
Sua família também deve procurar informações sobre a educação inclusiva.
Ela também deve participar e opinar sobre a escola e sobre a sua aprendizagem.
A educação inclusiva está sendo construída e para não haver prejuízos, é preciso
que você e sua família estejam informados e discutam essa construção.
VAMOS FALAR SOBRE A ESCOLA QUE QUEREMOS E SOBRE O QUE
QUEREMOS DA ESCOLA.

9- A EDUCAÇÃO INCLUSIVA VAI ACABAR COM A ESCOLA DA APAE? QUE


PAPEL CABE Á ESCOLA ESPECIAL NESSE PROCESSO?

Alguns estudiosos da educação inclusiva no Brasil têm se preocupado com o


que estão chamando de “ressignificação da educação especial”. Para muitos
desses educadores, não construiremos as escolas inclusivas no Brasil através do
desmonte da educação especial, mas sim através da redefinição do papel que vai
caber a cada uma das agências educacionais.
Nesta ótica, a ressignificação da educação especial vai exigir uma
interlocução permanente entre a escola comum e a escola especial, de forma que
seja construída uma prática cooperativa entre elas e que seja possível organizar
os serviços de apoio mútuo.
Essa interlocução, que se torna tão necessária nesse momento de transição
de um modelo educacional para outro, deverá se concretizar mediante a sua
inclusão nos eventos de planejamento, avaliação e monitoramento da ação
pedagógica de ambas as escolas.
É preciso acreditar que as duas têm muito o que aprender e o que ensinar.
Quem sabe chegará o dia em que todas as escolas serão especiais na
qualidade do atendimento, na infra-estrutura física, prontas a atender, sem
restrições, a todas as necessidades especiais de todos os alunos?
Nesse dia então, a APAE não mais vai precisar oferecer serviços de
atendimento escolar, de saúde, de esporte, de lazer, de assistência social e de
preparação para o trabalho a esta parcela da população com deficiência, porque
eles estarão tendo as suas necessidades bem atendidas pelas políticas públicas
universais, em espaços públicos sem restrições.
Nesse dia, viveremos numa sociedade onde não haverá espaço para a
exclusão, porque a diversidade será respeitada por todos.
Nesse novo tempo, a APAE poderá deixar de ter uma escola para ser, acima
de tudo, um movimento vigilante dos direitos das pessoas com deficiência.

10-COMO E POR QUE DEVEMOS TODOS COLABORAR COM A EDUCAÇÃO


INCLUSIVA?

Porque temos de estar em consonância, contra todas as formas de


exclusão.
Porque a inclusão se fará pela inquietação coletiva de educadores e
educandos.
Porque a escola inclusiva será construída pelos desafios que estão
mobilizando profissionais, alunos e pais.
Porque a nossa força coletiva será capaz de comprometer os governos com
a reorganização do sistema educacional, para torná-lo acessível a todos.
Porque temos de abrir espaços para a convivência respeitosa com a
diversidade humana.
Portanto, nós convidamos a todos, educadores, dirigentes, familiares e
alunos a reafirmarem, dia após dia, o compromisso com a educação inclusiva em
nosso município, acreditando que “entre erros, acertos e consertos estamos
avançando nessa caminhada.”

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