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Neurociências • Volume 1 • Nº 1 • julho-agosto de 2004 21

Revisão

Uma abordagem evolucionária


e neurocientífica da música
Evolutionary and neuroscientific approach to music

Paulo Estêvão Andrade

PAULO ESTÊVÃO ANDRADE Resumo


é professor de musicalização Neste artigo discutiremos as prováveis origens biológicas da música e alguns de seus
infantil no Colégio Criativo, em principais aspectos cognitivos, incluindo evidências neuropsicológicas neuroimagens sobre seus
Marília (SP), e autor de uma correlatos neuronais, desde o processamento perceptivo básico e o papel primordial dos córtices
auditivos do hemisfério direito até os correlatos neuronais do processamento de mais alto nível
pedagogia musical baseada no
cognitivo das regras abstratas subjacentes à sintaxe musical, representada pelas regras da
conhecimento produzido pelas
harmonia tonal da música ocidental. Enquanto a literatura neuropsicológica tem provido
neurociências e pela psicologia inestimáveis contribuições sobre as redes neurais relativamente especializadas para o
cognitiva. Atualmente pesquisa processamento musical, os estudos com imagens funcionais ampliam as redes neurais que
a percepção musical, seu efetivamente participam no processamento musical. Estudos recentes apontam um importante
desenvolvimento em crianças envolvimento de estratégias cognitivas visuo-espaciais e das redes neurais correspondentes,
bem como o compartilhamento de mecanismos cognitivos e redes neuronais entre a música e a
entre 7 e 10 anos, e a
linguagem, principalmente no processamento de alto nível de regras abstratas como a sintaxe.
influência positiva da música Os aspectos emocionais da música também serão abordados com base em estudos recentes.
no aprendizado de vocabulário
e pronúncia de uma língua Palavras-chave: música, redes neurais, emoção.
estrangeira. É violonista/
guitarrista, compositor e
arranjador, e um dos Abstract
Here we discuss the likely biological origins of music and some of its main cognitive aspects,
fundadores do grupo musical
including evidence for its neural correlates reported by neuropsychological and neuroimaging
paulistano Língua de Trapo.
studies regarding basic perceptual processing, the special contribution of right auditory cortex,
tonal processing and the neural correlates of high-level abstract rules underlying musical syntax
given by the theory of harmony in the western music. While the neuropsychological literature
has provided priceless contributions about the relatively specialized neural networks for musical
processing, imaging studies enlarge the neural networks that indeed participate in music
Correspondência:
processing. Recent research points to the involvement of visuo-spatial strategies and
Departamento de Estudos corresponding neural correlates, as well as to the sharing of cognitive mechanisms and neural
Pedagógicos do Ensino networks between music and language, mainly in the high level cognitive processing of abstract
Fundamental, Colégio Criativo, rules like syntax. The emotional aspects of music will also be approached based on recent
Rua das Safiras, 45-Jd Maria findings on emotional processing in the brain.
Isabel Marília, São Paulo, Brasil,
E-mail: sustain@flash.tv.br Key-words: music, neural network, emotion.
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Introdução baseada na modulação de suas propriedades


espectrais (tons) e temporais (ritmo) para a produção
A música, com seu alto poder de evocar emoções de um significado, além de serem universais. Por isso,
e sua forte capacidade de comunicar sentimentos a questão de uma origem comum ou separada de
abstratos, em conjunto com sua presença ubíqua ambas tem estado no centro de aquecidas discussões
em todos as sociedades e épocas da história entre filósofos e cientistas desde o século XVII [3].
humana, tem intrigado sábios e estudiosos da Rousseau acreditava que a música e a linguagem
humanidade desde a antiguidade. Música pode ser compartilhavam uma origem comum [4]. Darwin
entendida sob linhas de pensamento tão distintas acreditava que a linguagem se desenvolvera a partir
quanto a filosofia, a matemática, a antropologia, a dos sistemas de comunicação sonora, os chamados
psicologia, e a neurociência. Todas essas linhas dos animais, e que o comportamento musical foi
distintas não são necessariamente conflitantes, e determinante na seleção reprodutiva, ou seja, na
hoje todas podem convergir harmonicamente na escolha de parceiros sexuais entre os indivíduos de
neurociência cognitiva, que procura estudar nossos uma espécie [5]. Em contrapartida, Spencer acreditava
comportamentos cognitivos e emocionais a partir de que a música se desenvolveu a partir da linguagem
uma visão neurobiológica e evolucionária. como uma forma estilizada desta [6].
Pitágoras foi o primeiro a relacionar matemática Na primeira metade do século XX, membros da
e física aos fenômenos perceptuais, ao estudar a escola de musicologia comparativa de Berlin lidaram
vibração sonora de cordas de tamanhos diferentes com a relação entre música e linguagem. Entretanto,
e proporcionais (1, 1/2, 2/3, etc.) e relacioná-las após os anos 40 a abordagem evolucionária da
aos intervalos harmoniosos (consonantes) e não música caiu na obscuridade e até mesmo descrédito,
harmoniosos (dissonantes) [1]. Pitágoras também talvez devido à repulsa, por parte de muitos
chegou a usar a organização sonora existente na intelectuais europeus das ciências sociais, pelas
música como explicação para a ordem que rege o noções racistas embasadas na biologia que estavam
universo, quando introduziu, no século V a.C., o se difundindo naquela época. À esta repulsa se aliou
conceito de “Harmonia das Esferas”, que prega uma o surgimento da abordagem antropológico-cultural na
relação da harmonia existente entre algumas notas América durante o período pós-guerra. Ambas as
musicais com a harmonia e equilíbrio existente nas influências levaram a uma quase que completa
órbitas entre os corpos celestes. Até a época de rejeição da abordagem biológica e universalista, tanto
Kepler (1571-1630), a música foi inseparável da na antropologia quanto na musicologia, devido ao
matemática e serviu como uma forma de seu espírito anti-revolucionário [7,8]. Desde então,
compreensão da misteriosa relação entre os homens, a música passou a ser estudada como um mero
a natureza e o sobrenatural. produto cultural. De um lado, os musicólogos fazem
Por outro lado, a música tem como produto final análises do sistema musical restritas ao contexto
o “invisível”. Os sons musicais, diferentemente das específico de cada cultura. Do outro, muitos
palavras, não se referem a nenhum outro objeto neurocientistas e psicólogos consideram a música
concreto ou abstrato. Por isso, a música, com certeza, como um produto de uma organização cerebral
é a mais subjetiva das formas de arte e a que mais destinada a propósitos cognitivos mais gerais [9].
se presta à abstração de nossos sentimentos, da
relação do homem com o sobrenatural, e de nossa A música e a neurociência
religiosidade. Talvez essa seja a razão pela qual em
todas as culturas pré-capitalistas a música sempre Entretanto, há um crescente renascimento da
se revestiu de um caráter sagrado, de um significado abordagem psicobiológica dos comportamentos das
cosmogônico, existencialista, ponto de articulação espécies através de uma perspectiva evolucionária, e
entre o físico e o metafísico. Esse papel da música muitos investigam, através de estudos comparativos
é facilmente observável nas tribos primitivas desde com animais, as origens biológicas da música em seus
os aborígenes da Austrália, das tribos indígenas das aspectos filogenéticos, funções adaptativas,
Américas, e dos povos selvagens da África, até as inclinações inatas e mecanismos perceptivos [10],
mais sofisticadas tradições culturais da Ásia e da enquanto outros estudam as possíveis especializações
Europa [2]. neurológicas da percepção musical [11-14].
No entanto, linguagem verbal e a música Cada vez mais, os princípios de seleção sexual e
consistem na organização intencional de sons natural têm levado em consideração o comportamento
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social e outros mecanismos cognitivos que, ao que culturas e estilos musicais nos princípios subjacentes
tudo indica, são adaptações universais a: 1) produção das melodias (combinação sucessiva
evolutivamente determinadas, uma vez que tais de notas através da qual reconhecemos uma música)
comportamentos e processos cognitivos estão [20]; 2) percepção dos intervalos (diferença de altura
universalmente distribuídos entre as culturas entre duas notas) consonantes e dissonantes que
humanas como, por exemplo, a linguagem e os provocam uma sensação psicoacústica agradável ou
números [15]. Nesta perspectiva, então, devemos desagradável, respectivamente; e, finalmente, 3)
nos dar conta de que o processo de seleção natural organização das notas musicais em escalas e sua
molda as espécies à sua ecologia não somente nos organização temporal (metro e ritmo) [21,22]. Um
seus tratos físicos e fisiológicos, mas também nos estudo com macacos do gênero Rhesus mostrou que,
seus tratos comportamentais. Essas características assim como os humanos, eles são sensíveis às
comportamentais, por sua vez, refletem importantes melodias consonantes, ou tonais, sendo capazes de
sistemas neuronais desenvolvidos para fazer generalização de pequenas melodias de 6 a 7
desempenhar determinadas funções cognitivas ou notas quando estas são transpostas, porém somente
formas de raciocínio e comportamento para atender quando a transposição é feita em 1 ou 2 oitavas [23].
e processar os aspectos físicos, biológicos e sociais Tem-se observado que os bebês processam a
do meio relevantes para a sobrevivência. De acordo música de forma muito similar à dos adultos. Por
com a psicologia evolucionária defendida por Geary exemplo, assim como os adultos, os bebês
[16], a linguagem e a música foram domínios respondem melhor às escalas com distribuição
cognitivos evolutivamente determinados para atender, desigual de tons tais como as pentatônicas e
principalmente, aos aspectos sociais. Neste sentido diatônicas, às melodias e aos acordes que são mais
é interessante notar que quanto mais evoluída no consonantes, bem como aos rítmicos métricos
comportamento social é uma espécie, mais importante (baseados em pulsações regulares), mesmo os
se tornam os tratos neuropsicológicos relacionados complexos [24,25]. Além disso, estudos sugerem
ao comportamento social. Por exemplo, estudos fortemente que já nascemos com o tão mistificado
neuroanatômicos comparativos aliados a estudos dom do ouvido absoluto (a capacidade de identificar
psicológicos demonstram que significativas porções a altura exata das notas musicais, que permite a
do cérebro e mente humana estão dedicados às alguns músicos nomear uma nota musical tocada
relações sociais [14,17,18]. sem nenhuma referência), uma habilidade que antes
era considerada um privilégio de poucos músicos
Universalidade da música bem dotados. O que ocorre é que com o tempo, e
se não formos devidamente estimulados, retemos
A busca por circuitos neuronais relevantes para somente a capacidade do ouvido relativo por ser este
a música se inicia a partir de fortes indícios de que mais útil tanto na linguagem quanto na música [26].
ela possui uma origem evolucionária: a música é Finalmente, há evidências de que componentes
distribuída universalmente, e apresenta universa- estruturais da música como contornos melódicos e
lidades cognitivas; ela é encontrada em membros os intervalos são codificados automaticamente pelo
imaturos da espécie; e apresenta algum grau de cérebro, mesmo em indivíduos não músicos [27]. Toda
automação [19]. estas evidências são consistentes com estudos com
Diferentemente da escrita, a música e a linguagem lesões cerebrais [28] e estudos neurofisiológicos [29]
não foram inventadas numa determinada época por que mostram que os princípios básicos que regem a
um ou alguns grupos humanos para depois, então, se teoria da harmonia e a consonância e dissonância
espalhar para outras culturas. Até onde se sabe, todas são, na verdade, o reflexo das propriedades
as sociedades humanas sempre tiveram a música e a anatômicas e fisiológicas de nossos circuitos
linguagem no centro de suas manifestações. Sabe-se, auditivos. Estudos interculturais comparativos
também, que o comportamento musical não é recente sugerem que a prevalência dos intervalos de oitava
na evolução humana. Achados arqueológicos mostram (que equivalem à distância, no piano, entre duas notas
que nossos ancestrais, o homem de Cro-Magnon e o Dó separadas por 12 teclas brancas e pretas) e quinta
homem de Neandertal eram tão aficionados por música justa (a distância entre Dó e Sol separadas por 7
quanto nós. teclas) em culturas muito diferentes pode ser o
Neste mesmo sentido, há evidências de caracte- resultado de como nossos ouvidos foram
rísticas comuns, ou universais, entre diferentes desenvolvidos. Até mesmo animais como macacos,
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ratos e pequenos pássaros distinguem entre sons disciplina bastante antiga que surgiu há quase 2
culturalmente classificados como consonantes e séculos atrás quando os cientistas franceses
dissonantes [30]. Bouillaud (1796-1881), Marc Dax (1770-1837), e
Em suma, resultados experimentais têm sugerido Broca (1824-1880) fizeram estudos sobre déficits
certas universalidades no processamento mentais específicos associados a lesões cerebrais
neurocognitivo da música. Todos os estudos localizadas, cujo marco foram os casos de afasia
experimentais sobre consonância e dissonância dos expostos por Broca em 1861 em função de lesões
intervalos musicais, por exemplo, com ouvintes de específicas numa pequena região do lobo frontal
diferentes países, gerações, e de experiências musicais inferior esquerdo, hoje conhecida como a área de
distintas, bebês e pássaros, mostram que mecanismos Broca [52]. Boillaud realizou os primeiros estudos
comuns do processamento auditivo básico suportam da neuropsicologia musical descrevendo casos com
a categorização perceptual dos intervalos na música vários tipos de déficits musicais decorrentes de
[29]. Por exemplo, ouvintes de culturas tão diferentes lesões cerebrais, inclusive um caso espetacular de
quanto os balineses [32] ou os indianos [33] preservação das habilidades musicais em um
freqüentemente usam mecanismos ou esquemas paciente que, apesar de não poder mais falar, e nem
cognitivos similares aos ocidentais para processar escrever, ainda era capaz de compor e transcrever
seqüências de tons. Assim, mecanismos perceptuais suas músicas [53]. Portanto, estudar déficits
similares estão associados com emoções e contextos seletivos devidos a danos cerebrais localizados é o
sociais similares através das diferentes culturas. método mais antigo e bem conhecido da
Baseando-se nestes critérios acima expostos, neuropsicologia, inclusive para estudar o proces-
muitos têm estudado a existência de redes neuronais samento musical [54].
especialmente relevantes não somente para a Além dos estudos com lesões há, também, as
linguagem [34-37], o domínio espacial [38-40], e o desordens congênitas, assim chamadas por serem
numérico [41,42], mas também para a existência de detectadas desde muito cedo no desenvolvimento,
redes neuronais especialmente relevantes para a nas quais ocorre um déficit inesperado em um dado
música [11,43,13,44,19]. Mas, independentemente domínio a despeito do funcionamento normal das
do interesse específico sobre as origens evolucionárias outras habilidades cognitvas e sócio-emocionais. A
da música e sobre suas especializações neuronais, disfasia (distúrbios da fala), a dislexia (distúrbios da
a compreensão de seu processamento no cérebro leitura e escrita) e a discalculia (distúrbios numéricos)
produz importantes esclarecimentos sobre o são exemplos de déficits congênitos em que cada
funcionamento básico do córtex auditivo, além de abrir qual pode afetar de 5 a 17% da população normal.
as portas para a compreensão das funções cerebrais Alguns consideram estas desordens congênitas
superiores [19]. Hoje há evidências suficientes mos- evidências adicionais aos estudos com lesões para
trando, por exemplo, que a audição musical atenta, a existência de especializações neurais para estas
além de envolver mecanismos perceptuais básicos funções cognitivas [13], entretanto a história pode
no processamento das variações spectrais (tonais) e ser um pouco mais complicada [56]. Similarmente
temporais dos eventos auditivos, também envolve a ao que ocorre com as funções lingüísticas e
memória, incluindo as várias formas de memória de matemáticas, há evidências de que aproximadamente
trabalho, além da atenção e até mesmo imaginação 5% da população demonstra ser musicalmente inepta
motora [45], bem como o processamento semântico enquanto as outras habilidades parecem normais,
[46] e o processamento multisensorial de regras como é o caso do famoso revolucionário argentino
abstratas de alta complexidade que pode ser Che Guevara, que era incapaz de distinguir entre um
compartilhado com o processamento numérico e sintá- tango e um samba. Esses déficits musicais
tico da linguagem [47]. Finalmente, emoções são específicos de origem hereditária são denominados
consistentemente provocadas pela ativação de áreas de amusia congênita.
cerebrais tradicionalmente envolvidas no processamen- Outra área de investigação sobre a relativa
to auditivo, inclusive por estímulos musicais [49-51]. autonomia de alguns domínios cognitivos são os
casos de anomalia cerebral congênita que levam a
As bases neurais da música uma deficiência mental. Apesar de alguns casos
tornarem as pessoas completamente dependentes
A neuropsicologia busca relacionar os de muitas tarefas mesmo na fase adulta, os
mecanismos neurais com as funções mentais. É uma pacientes ainda conseguem apresentar grande
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fluência lingüística e musical como é o caso da sofrem de epilepsia musicogênica, uma forma mais
syndrome de Williams, ou até mesmo atingir níveis rara de desordem neuropsicológica na qual os
de expressão altamente proficientes em alguns casos ataques ocorrem especificamente sob a forma de
de autismo [13,12]. Em suma, se estas evidências audição de determinadas peças musicais. Estas
de distúrbios seletivos congênitos, juntamente com evidências sugerem que estas regiões contêm
os casos de lesões cerebrais, são usados como circuitos de memória específicos à experiência
argumentos para a noção de uma “modularidade” musical [14].
cerebral de domínios como a linguagem e a Um caso conhecido de amusia foi o do
matemática, esses domínios existem igualmente para compositor francês Maurice Ravel, que sofreu de uma
a música. doença cerebral progressiva que inicialmente afetou
Hoje sabemos que a crença de que a música é seu hemisfério esquerdo e lhe causou prejuízos na
uma capacidade específica do hemisfério direito é linguagem (afasia) acompanhada de um déficit na
inadequada (como é, de uma maneira geral, o antigo escrita (alexia) e de uma incapacidade de desenvolver
conceito de uma dicotomia hemisfério esquerdo movimentos coordenados (apraxia ideomotora). Ravel
verbal/hemisfério direito não-verbal). Uma análise tornou-se incapaz de compor, embora declarasse que
criteriosa dos estudos de pacientes com danos os pensamentos musicais permaneciam intactos.
cerebrais sugere que a percepção musical envolve Curiosamente, um estudo recente sugere que os
ambos os hemisférios [56], e revelam que a maioria efeitos de sua doença podem estar refletidos em
dos casos de amusia ocorre associado a afasia [58]. uma de suas mais famosas composições, se não a
Alguns aspectos da melodia, como os intervalos, são mais famosa, feita nos últimos anos de vida: o
seletivamente prejudicados por lesões no hemisfério “Bolero” (La Valse). De acordo com os autores, esta
esquerdo, enquanto a percepção dos contornos obra deveria sua extrema riqueza em timbres de
melódicos continua intacta. A percepção do ritmo diversos instrumentos à preservação e à prevalência
também é seletivamente prejudicada por lesões no das regiões do hemisfério direito, conhecidamente
hemisfério esquerdo, e normalmente aparece intacta importantes no reconhecimento e processamento de
em lesões do hemisfério direito [19]. Por outro lado, timbres, e portanto na seleção dos elementos dessa
há suficientes evidências neuropsicológicas de composição [69].
dissociação entre a música e a linguagem que Normalmente, os casos de dissociação nos
sugerem que, assim como a linguagem, a música quais o processamento musical é danificado e a
corresponde a um sistema neuronal relativamente linguagem é preservada, ao contrário do caso de
autônomo [59-61,66-68]. Ravel, ocorrem devido a lesões no hemisfério direito.
Um problema para o estudo de lesões que Nesses casos o paciente fica impossibilitado de
afetam o processamento musical é que os relatos reconhecer sons como musicais, de perceber a
são na maioria anedóticos. Somente os trabalhos métrica e a duração dos sons com precisão, de
mais recentes oferecem avaliações criteriosas dos perceber quando as notas estão desafinadas ou
déficits seletivos no processamento musical e as “dissonantes”, e de perceber as diferentes
lesões cerebrais especificamente envolvidas [59]. entonações tanto na música quanto na linguagem,
e ambas soam monotônicas (ou monótonas) ao
Amusias paciente [57].
Déficits mais severos no processamento das
A perturbação específica do processamento melodias decorrem, em sua maioria, de lesões que
musical é um tipo específico de agnosia auditiva atingem as áreas auditivas dos lobos temporais,
denominada “amusia”. O termo de uma forma geral principalmente o giro temporal superior direito
se refere à incapacidade para se reconhecer melodias [60,66,11]. Lesões nessa área normalmente
antes muito familiares. Estas podem ser “amusias ocasionam déficits irreversíveis na percepção tonal,
adquiridas” em função de danos cerebrais devido a impedindo que o paciente perceba diferenças de
doenças ou acidentes, ou “amusias congênitas” altura entre duas notas e, conseqüentemente,
devido a fatores hereditários. Ao contrário, a perceba as diferenças entre duas melodias distintas
estimulação elétrica direta de áreas específicas do e/ou não consiga reconhecer melodias que antes
córtex auditivo de pacientes epilépticos também pode lhe eram muito familiares, ao passo que suas
induzir alucinações musicais altamente realísticas, capacidades verbais parecem ficar intactas. Lesões
similares àquelas que ocorrem em pacientes que do lobo frontal direito, apesar de não afetarem a
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percepção tonal básica na discriminação de altura, frontais no processamento melódico em tarefas


induzem déficits semelhantes aos déficits na cogntivamente mais complexas e que demandam
discriminação de melodias que decorrem de lesões a memória tonal de trabalho para a retenção de
no giro temporal superior direito, e, portanto, não curto prazo dos padrões melódicos para efeitos
refletem danos perceptuais básicos mas sim déficits de comparação nas tarefas de discriminação
na memória tonal de trabalho, sugerindo um papel melódica [73].
determinante dos córtices frontais direitos no O metro e o ritmo também aparecem duplamente
processo mnemônico de retenção “online” da dissociados nos estudos com lesões, de tal forma
informação auditiva [11]. que pode ocorrer déficits no ritmo enquanto a
Assim, os estudos com lesões nos mostram que percepção do metro permanece intacta [70-72],
podem ocorrer déficits seletivos dentro do próprio enquanto que prejuízos na percepção métrica, tais
domínio musical, como dissociação entre déficits como a inabilidade de marcar o ritmo ou perceber
perceptuais e déficits na memória musical. Há casos durações exatas dos eventos auditivos, ou mesmo
em que o paciente possui suas capacidades de distinguir uma valsa ou uma marcha são
perceptuais relativamente intactas, mas é incapaz freqüentemente observados na presença da
de reconhecer melodias antes familiares. percepção e produção rítmicas relativamente intactas
Os casos de amusia adquirida têm lançados [71,74].
luzes sobre dois aspectos importantes da percepção O modelo de amusia de Peretz (ver mais adiante)
e do processamento musical. Primeiro, a percepção sugere que a organização métrica se dá no HD e os
de ambas as dimensões melódica e temporal requer grupamentos temporais do ritmo são codificados nos
tanto as informações globais que são, HE, ou no hemisfério contralateral ao da linguagem
respectivamente, o contorno melódico e o metro, [66], e, de fato, há evidências para uma organização
quanto informações locais que são, respectivamente, hierárquica no processamento tonal e temporal da
os intervalos e o ritmo, do processamento auditivo música em que um reconhecimento inicial do
[19]. Estudos com lesões mostram claramente que contorno e do metro no hemisfério possibilita a
a dimensão temporal pode ser preservada enquanto identificação local do intervalo e do ritmo no
que a melodia é severamente prejudicada e vice- hemisfério esquerdo [60,72]. No tocante ao
versa, consituindo um quadro de dupla dissociação processamento temporal, embora esta noção seja
no processamento das dimensões temporal e de consistente com os estudos com lesões [76] e em
altura, sugerindo mecanismos neurais distintos indivíduos sadios [88,85,93], alguns estudos
[70,63,71,66,60,72]. Além disso, dentro da própria mostram déficits no ritmo em pacientes com lesões
dimensão melódica os dados indicam a existência exclusivamente no hemisfério direito [68,60]. Uma
de dois mecanismos distintos, porém, serialmente análise mais acurada que temos feito dos estudos
integrados para a percepção global do contorno com lesões e com imagens [19] sugerem que déficits
melódico e para a percepção local dos intervalos. seletivos no ritmo, ou grupamento temporal dos
Lesões no hemisfério esquerdo prejudicam a eventos auditivos, decorrem, na sua maioria, de
percepção dos intervalos deixando intacta a lesões mais extensas do hemisfério esquerdo que
percepção do contorno melódico, ao passo que alcançam áreas parietais e/ou frontais [72,60],
lesões no hemisfério direito prejudicam tanto a enquanto que lesões confinadas aos lobos
percepção do contorno quanto do intervalo temporais, em qualquer um dos hemisférios,
[70,71,60,72]. Dessa forma parece haver uma normalmente não geram déficits no ritmo [66,71,75]
hierarquia no processamento melódico na qual a mas sim na extração do metro ou pulso musical e,
análise dos intervalos no hemisfério esquerdo por isso, das durações exatas e dos ritmos métricos
depende do processamento inicial, no hemisfério [71,75], principalmente lesões nas porções
direito, da direção global de altura das notas (o anteriores do lobo temporal direito [75].
contorno melódico), de modo que uma lesão no
hemisfério direito interromperia o processamento da Especializações neurais do hemisfério direito
informação local dos intervalos no hemisfério para o processamento da música ou para o
esquerdo intacto [70-72]. Embora hoje se reconhece processamento tonal em geral?
o papel dos lobos temporais no processamento tonal
e o papel primordial do lobo temporal direito Os casos de amusia relatados por Peretz foram
[71,66,11], reconhece-se também o papel das áreas decorrentes de excisão cirúrgica de aneurismas
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[63,60] que, assim como acidentes vasculares um papel crucial e primordial no processamento
cerebrais [70,67], causam lesões esparsas . Estudos melódico [78,79,73]. Outro importante achado de
neuropsicológicos anteriores aos de Peretz, Zatorre é a existência de uma memória de trabalho
realizados pela equipe canadense de Robert Zatorre específica para tons executada por uma rede neuronal
em pacientes com lesões unilaterais e mais fronto-temporal formada por córtices auditivos
focalizadas, resultantes de lobectomias unilaterais secundários que realiza a percepção, e córtices
temporais, frontais ou fronto-temporais para frontais que realizam o prolongamento da experiência
eliminação de foco epiléptico, mostraram que o auditiva. Assim, essa memória de trabalho para tons
hemisfério direito parece ser mais especializado no pode ser prejudicada tanto por lesões focais nas áreas
processamento tonal, apesar dessas lesões auditivas quanto nas áreas frontais [73].
produzirem déficits musicais menos severos e que Resultados mais recentes, incluindo o registro
não caracterizam amusia. Os resultados mostraram de novos casos típicos de amusia, reforçam a noção
o papel crucial na percepção melódica dos córtices de uma especialização tonal do hemisfério direito
auditivos do giro de Heschl, localizado na parte central proposta por Zatorre [80]. Os dados de Zatorre e sua
do giro temporal superior, onde se localizam o córtex equipe explicam por que os déficits na percepção
auditivo primário (PAC) e áreas circundantes do córtex global do contorno melódico normalmente ocorrem
auditivo secundário [77,78]. Além disso, também associados a déficits na percepção dos intervalos e
mostram que, embora o hemisfério esquerdo seja decorrem de lesões que atingem o giro temporal
importante no processamento de padrões tonais, superior direito em pacientes destros [61,71,60], ou
tanto de melodias quanto de acordes, são as áreas na mesma área contralateral ao hemisfério lingüístico
auditivas do hemisfério direito que desempenham nos indivíduos sinistros [66], mesmo em caso de
lesões focais restritas ao giro temporal
Figura 1 - Comparação direta entre os hemisférios (subtraindo-se a ativação superior [71,66]. Por outro lado, o déficit
durante variações espectrais da ativação durante variações temporais e seletivo na percepção local dos
vice-versa) dos volumes de ativação combinados de TEP (Tomografia de
intervalos, preservando a percepção do
emissão de pósitrons) e IMR (imagem de ressonância magnética). A
imagem à esquerda mostra a secção horizontal na região do giro de Heschl contorno melódico, geralmente ocorre
(z=0), mais ativado nas variações temporais do que nas espectrais e com somente em lesões no hemisfério
predominância no hemisfério esquerdo. A imagem à direita é uma secção esquerdo [70,71,60,72], mesmo
horizontal na altura da região temporal superior que mostra maior ativação quando as lesões são focais e restritas
nas variações espectrais do que nas temporais, com predominância do
ao giro temporal superior esquerdo [71].
hemisfério direito. Os gráficos mostram a diferença percentual entre as
duas condições nas regiões em questão. Imagem cedida gentilmente pelo Entretanto, é importante salientar
Dr. Robert Zatorre, Montreal Neurological Institute. que esta especialização do hemisfério
direito não ocorre em todos os estágios
do processamento dos tons. A simples
discriminação de freqüência não parece
envolver preferencialmente o hemis-
fério direito mesmo em pacientes
epilépticos que se submetem à excisão
unilateral dos córtices primários e
secundários [78,73]. Até mesmo
lesões bilaterais mais extensas do
córtex auditivo não parecem ocasionar
danos permanentes na simples
discriminação [63]. Juntos estes dados
sugerem que a especialização tonal
dos córtices auditivos do hemisfério
direito surge em tarefas perceptivas
específicas e, provavelmente, em
estágios mais complexos e posteriores
à simples extração da freqüência
(altura) dos tons por estruturas
auditivas de ambos os hemisférios.
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Neuroimagem em indivíduos sadios direito na manutenção da informação acústica e,


portanto, da memória tonal de trabalho proposto por
Os estudos com lesões nos indicam quais Zatorre [19].
áreas são cruciais para o desempenho de Há muitas evidências de que durante as funções
determinadas funções cognitivas, mas não indicam cognitivas superiores diferentes áreas do cérebro se
quais áreas estão normalmente ativas durante o tornam não somente coativadas mas também
seu processamento. Os estudos com imagens funcionalmente interdependentes. Análises com EEG
funcionais não só ajudam a confirmar a ativação, durante a audição de vários tipos de música
em indivíduos normais, das áreas cruciais mostraram uma atividade simultânea e homogênea
lesionadas como também permite-nos observar a em diferentes regiões corticais, principalmente nas
ativação e cooperação de outras áreas importantes ondas gama de alta freqüência consideradas como
que formam, juntamente com as áreas cruciais, as reflexo de codificação e concatenação temporal entre
redes neurais tipicamente ativadas em uma áreas cerebrais disitntas. Recentemente, mostrou-
determinada função cognitiva. se que o grau de sincronização nas ondas gama entre
Os métodos mais usados recentemente são as regiões corticais próximas ou distantes foi muito
neuroimagens que permitem a observação da maior em músicos em comparação aos não-músicos,
atividade cerebral tanto de forma direta ou indireta. enquanto não houve diferenças quando da leitura
As observações diretas são feitas através das de um texto neutro. Ponderou-se que algumas das
medições da atividade elétrica de neurônios possíveis razões para esta diferença são a maior
individuais através de registros intracelulares ou da memória musical de longo prazo dos músicos e sua
atividade de uma população neuronal com o maior habilidade de antecipação dos padrões
eletroencefalograma (EEG), ou através da atividade musicais [81]. Uma vez que a sincronização das
magnética gerada pela atividade elétrica dos ondas gama reflete tarefas cognitivas complexas, os
neurônios e medida pelo magnetoencefalógrafo resultados apóiam a idéia de que a percepção
(MEG). As observações indiretas são as medições musical é muito útil como um modelo para o estudo
da atividade metabólica cerebral através da das funções cerebrais superiores [19].
tomografia de emissão de pósitrons (PET) ou da As imagens nos permitem observar com mais
imagem de ressonância magnética funcional, ambos detalhes o processamento dos tons e a hierarquia
medindo o fluxo sangüínieo nas áreas cerebrais como anatômica e funcional envolvendo diferentes regiões
indicadores da atividade neuronal. De uma forma distribuídas bilateralmente, desde o tronco cerebral,
geral, os métodos diretos possuem uma alta o tálamo até os córtices auditivos. O córtex auditivo
resolução temporal permitindo a medição da atividade em si mesmo apresenta uma hierarquia anatômica
neuronal em milésimos de segundo, mas possuem com uma área central situada na porção anteromedial
uma baixa resolução espacial não delimitando com do giro de Heschl que recebe as fibras talâmicas e,
muita precisão as áreas ativadas, enquanto que o portanto, chamada de córtex auditivo primário ou A1,
oposto ocorre com as medidas indiretas. a qual é circundada por um cinturão (belt) que fica
Os estudos com EEG confirmam a dominância na região mais anterolateral do giro de Heschl e
do hemisfério direito para a percepção melódica, mas depois por um outro cinturão lateral (parabelt). Tanto
também o envolvimento de ambos hemisférios estudos com lesões [82] quanto com imagens [83]
quando do processamento mais local e analítico dos mostram que a extração básica dos tons ativa
componentes musicais. Tais estudos mostram simetricamente, sem nenhuma lateralização, todas
também que indivíduos músicos praticamente não estas áreas desde o tronco cerebral até o córtex
mostram nenhum sinal de lateralização independente auditivo primário (A1) no giro de Heschl. A latera-
de tarefa, indicando diferentes estratégias cognitivas lização somente ocorreu quando houve variação de
utilizadas pelos músicos [19]. Mesmo em indivíduos altura nos tons, gerando-se uma melodia, gerando
não-músicos observou-se uma ativação temporal ativações adicionais anterolaterais ao córtex auditivo
esquerda para a percepção de aspectos locais como primário, no giro temporal superior (STG) e no plano
escala e uma ativação temporal direita para a audição polar (PP) [83].
passiva de melodias [80], confirmando com EEG o Os estudos com neuroimagem (PET e IRMf)
modelo hierárquico de processamento dos aspectos provêem alta resolução espacial e muito esclarecem
globais e locais, proposto por Peretz [70]. Estudos os aspectos neurofuncionais da percepção musical.
com EEG confirmam o papel do sistema fronto-parietal Em geral, apóiam os estudos com lesões, apontando
Neurociências • Volume 1 • Nº 1 • julho-agosto de 2004 29
Figura 2 - Imagens de ressonância magnética funcional mostrando áreas corticais envolvidas no processamento da linguagem
e da música. As áreas de Broca (Ba 44/45) e de Wernicke (BA 22/40), o sulco temporal superior, o giro de Heschl, o plano
temporal bilateralmente, bem como os córtices insulares são estruturas cerebrais conhecidas por desempenharem importantes
funções na compreensão da linguagem, e são consideradas “domínio-específicas”. Hoje sabe-se que estas áreas também
são ativadas pela música, como indicam as imagens à direita. A área de Broca, conhecida pelo seu papel na sintaxe
lingüística, é especialmente ativada (com predominância do hemisfério direito) na detecção de acordes musicais “desafinados”
ou fora do tom, que violam a sintaxe musical. Adaptado de Heinke et al., Anaesthesiology, in press; e Koelsch, et al.,
NeuroImage, 2002. Imagens gentilmente cedidas pelo Dr. Stefan Koelsch, Instituto Max-Planck de Neurociência Cognitiva,
Leipzig, Alemanha.

para uma especialização do hemisfério direito tanto frontal esquerdo na área 47 de Brodmann [88,93].
na percepção melódica, através dos córtices auditivos Na maioria dos trabalhos, tarefas de discriminação
secundários do lobo temporal, e na memória tonal melódica mais complexas levam a ativação
de trabalho através de uma rede fronto-temporal inesperada de áreas normalmente envolvidas com o
[84,11]. O papel fundamental dos córtices auditivos processamento visuo-espacial como o cuneus e
secundários no giro de Heschl vai além da audição precuneus, o lobo parietal superior direito, e o giro
real de melodias e se estende para as tarefas de supramarginal, bilateralmente [84,11,88,87,94,
imaginação melódica na qual pede-se aos sujeitos 43,95,93]. A audição analítica da música, tanto em
que imaginem uma melodia bem conhecida [43]. O indivíduos músicos e não músicos, parece recrutar
papel primordial do hemisfério direito é reforçado nas áreas adicionais do hemisfério esquerdo, o que em
observações com vários tipos de estímulos tonais músicos pode gerar uma lateralização esquerda
tais como a apresentação binaural de música mesmo na audição passiva [86], e induzir a
instrumental [86], pares de tons tocados estratégias cognitivas de natureza visuo-espacial
sucessivamente [87], seqüências melódicas [84,88], mesmo em indivíduos não-músicos [88,94]. De fato,
percepção dos tons nas sílabas [89] e da prosódia muitos trabalhos têm mostrado que o treinamento
lingüística [90], manutenção da altura/tom durante musical parece incrementar as habilidades espaciais
o canto [11], na simples imaginação de uma melodia e matemáticas [96], e trabalhos mais recentes têm
[43], e percepção de acordes fora do tom, provido cada vez mais suporte a esta idéia,
“desafinados” [91]. Portanto, observa-se que apesar mostrando alterações plásticas no cérebro dos
do hemisfério direito ser especializado para tons ele músicos como o aumento das conexões no corpo
processa tanto os tons provenientes de padrões caloso da parte mais frontal que pode refletir efeitos
musicais quanto de eventos auditivos de outros motores e cognitivos do treinamento musical [97],
domínios como, por exemplo, a linguagem [92]. ou da área de Broca (BA44/45) que além da
Por outro lado, consistentemente com os linguagem tem estado associada a processos viso-
estudos com lesões, o processamento local do ritmo espaciais. De fato, indivíduos músicos testados
e dos intervalos, bem como as representações apresentaram um incremento na matéria cinzenta da
musicais semânticas (memórias musicais de longo área de Broca bem como uma performance
prazo), ativam estruturas do hemisfério esquerdo significativamente superior à dos não músicos nos
[88,93]. Em concordância com os estudos com processos visuo-espaciais [98]. Mais interessante
lesões, os lobos temporais normalmente não são ainda são os efeitos, recentemente estudados, do
ativados nas tarefas de ritmo as quais, na realidade, treinamento musical na memória de trabalho, na
ativam áreas frontais inferiores, principalmente a área abstração e nas habilidades numéricas [99].
de Broca (BA44/45). Representações semânticas Por outro lado, as relações entre a música e a
ativam especialmente regiões inferiores do lobo linguagem se tornam mais claras à medida que os
30 Neurociências • Volume 1 • Nº 1 • julho-agosto de 2004

estudos sobre a percepção musical vão progredindo. notavelmente consistentes e confiáveis entre os
Muitas evidências têm sido produzidas sobre o sujeitos experimentais não músicos. Ouvintes comuns
compartilhamento de mecanismos cognitivos e são capazes de detectar o caráter triste ou alegre de
recursos neurais entre a sintaxe lingüística e a sintaxe excertos musicais com grande rapidez e facilidade,
musical representada nas regras da teoria da em menos de um quarto de segundo [102].
harmonia da música ocidental. A equipe do Dr. As forças emotivas da música são tão claras e
Koelsch do Instituto Max Planck têm mostrado que tão evidentes, independentemente de suas origens,
as áreas frontais inferiores, incluindo a área de Broca, que o psicólogo John Sloboda da Universidade de
não são tão domínio-específicas como antes se Keele, Inglaterra, desenvolveu um trabalho de
acreditava. A área de Broca é especialmente ativada pesquisa, em uma amostra de 83 ouvintes de
nas tarefas que envolvem a percepção de acordes música, no qual tinha-se que denominar peças
impróprios, “fora” da tonalidade, propositadamente musicais que provocavam sensações físicas como
colocados numa seqüência harmônica e com vários leves tremedeiras, lágrimas, ou “nós na garganta”,
graus de impropriedade. Até mesmo crianças de bem como identificar tão precisamente quanto
apenas 5 anos de idade sem nenhuma formação possível em que momento da peça musical ouvida
musical são capazes de identificar os acordes essas sensações ocorriam. Sloboda verificou que
impróprios e mostrar ativações frontais compatíveis noventa por cento dos voluntários reportaram que
com aquelas produzidas por construções sintáticas sentiam “frios na espinha”, e praticamente todos
impróprias usadas nos experimentos em linguagem eles sentiram “nó na garganta” ou chegaram às
[100,44,101]. lágrimas ou sorrisos. O mais importante é que, para
cada ouvinte, os trechos musicais que inspiravam
A música e a emoção essas reações eram consistentemente os mesmos.
O biopsicólogo Jaak Panksepp, da Universidade
Embora a música seja caracterizada como a de Ohio, propôs uma intrigante hipótese para explicar
linguagem das emoções, ironicamente a grande os calafrios provocados pela música. Segundo
maioria dos estudos experimentais tem se dedicado Panksepp, eles podem derivar da habilidade de uma
ao processamento da estrutura musical como uma estrutura acústica particular - por exemplo, um
linguagem não-verbal, e raramente como uma crescendo de altura (quando as notas vão ficando
linguagem emocional. Parte dessa situação pode ser mais agudas) das notas, ou um solo instrumental
atribuída a uma crença largamente difundida de que que vai emergindo pouco a pouco de dentro de um
a interpretação da música é altamente pessoal, uma bloco de sons simultâneos como um acorde denso
experiência que varia muito de indivíduo para indivíduo e longo ou uma cadência de acordes - que é capaz
e de cultura para cultura, e que por isso escapa a de excitar regiões cerebrais primitivas dos mamíferos
uma analise mais objetiva e científica. Entretanto, as quais respondem, por exemplo, ao sinal de aflição
esta postura é conflitante com a idéia de que a quando um filhote perde repentinamente seus pais,
música é um forte mecanismo emocional que age ou se perde do grupo. O efeito dos uivos pungentes
como uma força social altamente coesiva. Muitos é fazer os pais sentirem uma perturbação física, como
autores sustentam que a maior razão para a um calafrio ou tremor, que dessa forma os alerta
existência e a persistente presença da música na para prontamente procurar pelo calor implícito no
sociedade humana são as respostas altamente conforto do reencontro.
emocionais que elas induzem e que agem como Estudos recentes com imagens cerebrais parecem
um forte fator de coesão social. Achados recentes sugerir que as hipóteses de Panksepp não são
mostram que, ao contrário da crença de que as especulações improváveis. Um estudo com PET mostrou
respostas são altamente variáveis de indivíduo que a dissonância e a consonância na música recrutam
para indivíduo e de cultura para cultura, as mecanismos neurais das regiões paralímbicas
respostas emocionais à música são relativamente normalmente associados aos estados emocionais de
homogêneas entre os indivíduos e compartilhadas desprazer e prazer, respectivamente. Além disso,
por todos os membros de uma dada cultura. Os pacientes com lesões nestas áreas ficam incapacitados
resultados obtidos por Peretz em estudos especifi- de identificar expressões emocionais [50].
camente dedicados aos aspectos emocionais da As intensas respostas emocionais que experi-
música mostram que os julgamentos emocionais mentamos, de tristeza ou euforia dependendo da
dos materiais musicais empregados nos testes são música, se devem às respostas autonômicas e
Neurociências • Volume 1 • Nº 1 • julho-agosto de 2004 31

psicofisiológicas associadas que denominamos processing. Ann NY Acad Sci 2001;930:193-210.


“arrepios” ou “frios na espinha”, mesmo àquelas 12. Peretz I. Brain specialization for music. New evidence
from congenital amusia Ann NY Acad Sci
músicas às quais não associamos nenhum evento ou 2001;930:153-65.
memória. Em um novo experimento, Blood e Zatorre 13. Peretz I. Brain specialization for music.
[51] examinaram a atividade cerebral quando da Neuroscientist 2002;8(4):372-80.
audição de peças escolhidas pelos sujeitos como as 14. Peretz I. Brain specialization for music: New evidence
fromcongenital amusia. In: Peretz I, Zatorre RJ (Eds).
que mais os induzem a estados eufóricos de arrepios The cognitive neuroscience of music. Oxford: Oxford
unicamente gerados pela própria música, sem nenhum University Press; 2003. p.192-203
vínculo ou associação com outras experiências. De fato, 15. Geary DC. Principles of evolutionary educational
os sujeitos experimentaram arrepios cujas diversas psychology. Learning and Individual Differences
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intensidades se correlacionaram com medidas 16. Geary DC. A Darwinian perspective on mathematics
psicofisiológicas tais como ritmo cardíaco, and instruction. In T. Loveless, ed. The great
eletromiograma, e respiração, que por sua vez se curriculum debate: How should we teach reading and
correlacionaram com as atividades neurais. A math? Washington, DC: Brookings Institute; 2001.
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intensidade dos arrepios se correlacionou com
17. Miller EK, Freedman DJ, Wallis JD. The prefrontal
respostas típicas do circuito da recompensa tais como cortex: categories, concepts and cognition. Philos Trans
o aumento da atividade no estriado ventral esquerdo e R Soc Lond B Biol Sci 2002;357(1424):1123-36.
o mesencéfalo dorsomedial, e a diminuição da ativação 18. Bar-On R, Tranel D, Denburg NL, Bechara A. Exploring
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