entre cegos e obras de arte O Simpósio de Educação Musical Es-
pecial ganha sexta edição em São Paulo, nos dias 19, 20 e 21 deste mês. Tem como objetivo reunir profissionais da área mé- Exposição tátil “Mundos Tangíveis” é a segunda mostra de projeto da Udesc que visa a dica e pedagógica para discutir assuntos relacionados à inclusão social a partir do formação estética e a integração de deficientes visuais aos museus de Florianópolis ensino de música. Pessoas com deficiência auditiva severa podem não ouvir o que está Fotos:Jessé Torres acontecendo, porém, através das vibrações, É comum chegar a uma exposição de são capazes de entender as intenções mu- artes e se deparar com o aviso: “Proibi- sicais. do tocar nas obras”. A mostra Mundos O campo é ainda pouco explorado no Tangíveis – exposição tátil, aberta de Brasil. Mas segundo Viviane Louro, autora 4 de novembro a 9 de dezembro na Ga- do livro “Educação Musical e Deficiência: leria Municipal Pedro Paulo Vecchietti, Propostas Pedagógicas”, tende a seguir em Florianópolis, poderia muito bem o exemplo de outros países e crescer em apresentar a recomendação: “Por favor, importância. “Música é importante para toque nas obras”. Apesar de não haver todos, sem exceção. Inclusive para os sur- nenhuma instrução, quem entra na dos.” sala onde estão as seis peças de Alfonso O professor Dean Shibata, do Departa- Ballestero e os “brinquedos” de madeira mento de Radiologia da Universidade de de Michel Groisman sente-se impelido a Washington, é um dos pioneiros no estu- tocar, mexer e sentir. do. Concluiu que apesar de os surdos não Os dois artistas foram convidados ouvirem a música são capazes de senti-la pela coordenadora do projeto “Forma- de forma tão real que o estimulo é equiva- ção Estética do Público Cego – Museu e lente, fazendo com que a mesma área do Inclusão Social”, Maria Cristina da Sil- cérebro seja trabalhada. va, professora da Universidade Estadual Na Inglaterra, já existe balada direcio- de Santa Catarina (Udesc). A iniciativa nada aos deficientes auditivos. Foi idealiza- surgiu em 2006, mas naquele ano o pro- da por James Hoggarth, que tapou os ouvi- jeto ainda era tímido, e se restringia à dos durante uma festa e reparou como os tentativa de produzir material em Brail- graves da música eram sentidos no corpo. le para as exposições. “Vimos que havia Voluntários e os dois artistas da mostra experimentam a “Máquina de Desenhar” de Groisman: o diálogo do corpo em movimentos interligados Além do som, para ajudar nas sensações, o material (etiquetas e catálogos), mas usam iluminação especial que acompa- não o público”. Em 2007 e 2008, com nha o ritmo da música. Parte do dinheiro apoio financeiro da Udesc, o grupo liga- arrecadado é destinada a organizações que do ao projeto passou a realizar maque- defendem os direitos dos surdos. tes táteis, a promover encontros men- Regina Finck é professora do Departa- sais com deficientes visuais, e a levá-los mento de Música da Universidade do Esta- a vários espaços culturais da cidade. Em do de Santa Catarina. Sua tese de douto- 2008, o projeto recebeu financiamento rado “Ensinando música ao aluno surdo: do edital ProExt, do Ministério da Cul- perspectivas para ação pedagógica inclu- tura, o que levou à concretização de siva”, ainda está em fase de revisão, mas exposições como a realizada em agosto é uma das primeiras pesquisas do gênero com obras das artistas Jussara Maria da no sul do Brasil. Diz que as crianças surdas Silva e Rosana Bortolin, e a que acon- são capazes de realizar todas as atividades tece agora. que as crianças ouvintes fazem. “Diferente é como você adapta os materiais e as estra- Readaptação do clássico tégias de ensino. Todas as atividades devem O paulista Alfonso Ballestero trabalha ser preparadas com apoio visual.”. há mais de dez anos com a transposição No caso da oficina que ministrou para de obras clássicas para versões acessí- escrever a tese, trabalhou pulso, silêncio, veis, ou seja, que utilizam de alto relevo som, duração, intensidade, altura e timbre: para a apreciação pelo público deficien- “Desenvolvemos jogos de percepção vibro- te visual. Essas versões estão na Pinaco- tátil com o apoio de um computador, am- teca de São Paulo. O artista conta que plificando as frequências graves dos sons. nem sempre criou suas obras pensando “Hola”, de Alfonso Ballestero, abusa das formas e convida ao toque Os andadedos de Michel Groisman são como brinquedos para os dedos Outro recurso foi o contato físico com as nesse público, mas acabou seguindo formações (nome, artista e ano em que man revela que ficou muito entusias- papel. Cada pessoa segura um lápis de caixas de ressonância dos instrumentos esse caminho. “Eu faço as peças quase foram produzidas) tanto em caracteres mado quando recebeu o convite para cera e os movimentos combinados dos acústicos, como violão, piano e tambor. inconscientemente para esse público. impressos como em Braille. criar para o projeto. Para ele, essa era participantes criam desenhos sobre a Também foi essencial a participação de É automático”, revela. A inspiração, ele As esculturas e telas foram feitas uma oportunidade de desenvolver obras folha. um intérprete de libras.” recorda, surgiu durante a 23ª Bienal de entre 2000 e 2003, mas Ballestero não que levassem ao diálogo de cada um Groisman também criou a série Segundo Regina, atividades práticas de São Paulo, em 1996, quando trabalhou parou de produzir materiais para o pú- com o seu corpo, mas que não se res- “Andadedos”: são pequenas peças de ensino musical aos deficientes acontecem como monitor e convidou um grupo de blico cego. Recentemente ele desenvol- tringissem ao público deficiente. “Todos madeira que se assemelham a carretéis esporadicamente em Santa Catarina, em pessoas com Síndrome de Down para a veu uma série de xilogravuras (técnica têm deficiências que nos impedem de de linha. Feitos a partir de diferentes forma de oficinas e minicursos. Nenhuma visitação. As quatro esculturas e as duas de gravura que utiliza madeira como estar em contato com os outros”, defen- madeiras - algumas com cheiros - os escola realiza ensino musical para surdos telas de Ballestero expostas na mostra matriz para a reprodução sobre papel de Groisman. andadedos “funcionam” com o movi- de maneira fixa. “O principal problema é a “Mundos Tangíveis” abusam das curvas ou outro material) táteis. O contato entre as pessoas é o que mento dos indicadores que, encaixados falta de preparação do professor. Não exis- e dos formatos que convidam ao toque. move a “Máquina de Desenhar”, uma nas peças, fazem-nas girar. tem cursos de formação inicial e continua- São grandes, com cerca de 50cm³ cada. Diálogo intracorporal de suas obras em exposição em Floria- Tudo pensado para incitar os senti- da para atuar no contexto inclusivo”, diz. Feitas de concreto celular, brancas so- Enquanto Alfonso Ballestero está nópolis. Composta por placas de madei- dos – além da visão. bre suportes pretos – não que as cores acostumado a trabalhar com deficientes ra unidas por lápis de cera, a estrutura tenham grande importância – têm in- visuais, o artista carioca Michel Grois- é colocada sobre uma grande folha de Camila Chiodi Bibiana Beck