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TEMPO COMUM. TRIGÉSIMA QUARTA SEMANA.

QUARTA-FEIRA

94. PACIENTES NAS DIFICULDADES


– A paciência, parte da virtude da fortaleza.

– Paciência connosco, com os outros e nas contrariedades da vida corrente.

– Pacientes e constantes no apostolado.

I. OS TEXTOS DA MISSA de hoje, agora que faltam poucos dias para


encerrar-se o ano litúrgico, relatam-nos uma parte do discurso do Senhor em
que Ele se refere aos acontecimentos finais da história. Nesse longo discurso
misturam-se diversas questões relacionadas entre si: a destruição de
Jerusalém – ocorrida quarenta anos depois –, o fim do mundo e a vinda de
Cristo em glória e majestade. Jesus anuncia também as perseguições que a
Igreja padecerá e as tribulações dos seus discípulos. Esta é a passagem que o
Evangelho da Missa nos propõe1, e que termina com uma exortação do Senhor
à paciência, à perseverança, apesar dos obstáculos que possam apresentar-
se: In patientia vestra possidebitis animas vestras, pela vossa paciência
salvareis as vossas almas.

Os Apóstolos lembrar-se-iam mais tarde da advertência do Senhor: Não é o


servo maior do que o seu senhor. Se eles me perseguiram a mim, também vos
hão-de perseguir a vós2. Mas as tribulações não escapam à Providência divina.
Deus permite-as porque são ocasião de bens maiores. A Igreja enriqueceu-se
no amor a Deus e sempre saiu vencedora e fortalecida de todas as
adversidades, conforme as palavras do Senhor: Haveis de ter aflições no
mundo; mas tende confiança, eu venci o mundo3.

Neste caminhar em que consiste a vida, teremos de sofrer diversas provas:


umas que hão de parecer-nos grandes, outras de pouco relevo, mas de todas
elas a alma deve sair fortalecida, com a ajuda da graça. Umas virão de fora,
com ataques directos ou velados por parte dos que não compreendem a
vocação cristã, de um ambiente paganizado adverso ou dos que se opõem a
tudo o que se refere a Deus; outras surgirão das próprias limitações da
natureza humana, que não permitem – tantas vezes! – alcançar um objectivo a
não ser à custa de um empenho contínuo, de sacrifício, de tempo... Podem
sobrevir dificuldades económicas, familiares, doenças, cansaço, desalento... A
paciência é necessária para que perseveremos, para que estejamos alegres
por cima de qualquer circunstância. E isto só será possível se tivermos o olhar
posto em Cristo, que nos anima a seguir adiante, sem obcecar-nos com o que
pode tirar-nos a paz. Sabemos que, em todas as situações, a vitória é
garantida.

A paciência, diz Santo Agostinho, é “a virtude pela qual suportamos os


males com ânimo sereno”. E acrescenta: “Não venha a acontecer que, por
perdermos a serenidade da alma, abandonemos os bens que nos devem levar
a conseguir outros maiores”4. É uma virtude que nos permite enfrentar com
bom ânimo, por amor a Deus, sem queixas, os sofrimentos físicos e morais da
nossa vida.

O normal será que tenhamos de exercê-la sobretudo nas coisas ordinárias,


talvez em coisas que parecem triviais: um defeito que não acabamos de
vencer, isto ou aquilo que não sai como quereríamos, um imprevisto, o carácter
de uma pessoa com quem temos de conviver no trabalho, aglomerações no
trânsito, atrasos dos meios de transporte públicos, esquecimentos... São
ocasiões para crescermos na virtude da serenidade, pondo-a a serviço da
caridade e fortalecendo a humildade.

II. A PACIÊNCIA é uma virtude bem diferente da mera passividade perante o


sofrimento; não é um não reagir nem um simples aguentar: é parte da virtude
da fortaleza, e leva a aceitar serenamente a dor e as provas da vida, grandes
ou pequenas, como vindas do amor de Deus. Identificamos então a nossa
vontade com a do Senhor, e isso permite-nos manter a fidelidade em qualquer
circunstância e é o fundamento da grandeza de ânimo e da alegria de quem
está certo de vir a receber uns bens futuros maiores5.

Os campos em que devemos praticar esta virtude são inúmeros. Em


primeiro lugar, connosco próprios, já que é fácil desanimarmos com os nossos
próprios defeitos, sempre repetidos, sem conseguir superá-los totalmente. É
necessário sabermos esperar e lutar com perseverança, convencidos de que,
enquanto mantivermos o combate, estaremos amando a Deus. Normalmente, a
superação de um defeito ou a aquisição de uma virtude não se consegue à
custa de esforços violentos, mas de humildade, de confiança em Deus, de
petição de mais graças, de uma maior docilidade. São Francisco de Sales
afirmava que é necessário termos paciência com todos, mas, em primeiro
lugar, connosco próprios6.

Paciência também com as pessoas com quem nos relacionamos


frequentemente, sobretudo se, por qualquer motivo, temos obrigação de ajudá-
las na sua formação ou em determinadas circunstâncias... Devemos contar
com os defeitos das pessoas com quem convivemos – sem esquecer que
muitas vezes estão sinceramente empenhadas em superá-los –, talvez com o
seu mau génio, com as suas faltas de educação, com os seus melindres... que,
sobretudo se se repetem com frequência, poderiam fazer-nos faltar à caridade,
envenenar a convivência ou tornar ineficaz o nosso interesse em socorrê-las. A
caridade ajudar-nos-á a saber esperar, sem deixar de corrigir quando for o
momento mais indicado e oportuno. Esperar um tempo, sorrir, dar uma
resposta amável a uma impertinência, são pormenores que podem fazer com
que as nossas palavras cheguem ao coração das pessoas, e, de qualquer
modo, sempre chegam ao Coração do Senhor, que olhará para nós com
especial afecto.

Paciência com os acontecimentos que nos contrariam: a doença, a pobreza,


o excessivo calor ou frio..., os diversos contratempos que se apresentam num
dia normal: o telefone que não funciona ou a ligação que não se completa, a
morosidade no trânsito que nos faz chegar atrasados a um encontro
importante, esquecer em casa o material de trabalho, uma visita que se
apresenta no momento menos oportuno... São as adversidades, talvez não
muito grandes, mas que possivelmente nos levariam a reagir com falta de paz.
O Senhor espera-nos nessas ocasiões: devemos enfrentá-las de ânimo
tranquilo, sem “explodir”, sem um gesto sequer de contrariedade ou um trejeito
de desagrado. E tudo isto é manifestação do ânimo forte de um cristão que
aprendeu a santificar os pequenos incidentes de um dia qualquer.

III. CARITAS PATIENS EST7, a caridade está cheia de paciência. E por sua
vez a paciência é o grande suporte da caridade: sem ela, a caridade não
subsistiria8. E no apostolado, que é manifestação da caridade por excelência, a
paciência torna-se uma virtude absolutamente imprescindível. O Senhor quer
que tenhamos a calma do semeador que lança a sua semente no terreno por
ele previamente preparado e segue o ritmo das estações, esperando o
momento oportuno: sem desânimos nem impaciências, com a confiança posta
naquele minúsculo rebento que acaba de brotar e que um dia será espiga
madura.

Jesus dá-nos exemplo de uma paciência indizível. Das multidões que o


procuram, comenta por vezes que vendo não vêem, e ouvindo não ouvem nem
entendem9; apesar de tudo, vemo-lo incansável na sua pregação e dedicação
às pessoas, calcorreando sem parar os caminhos da Palestina. Nem sequer os
Doze que o acompanham demonstram um grande aproveitamento: Tenho
ainda muitas coisas a ensinar-vos – diz na véspera da sua partida –, mas por
agora não as podeis compreender10. O Senhor conhecia bem os defeitos dos
Apóstolos, a sua maneira de ser, e não desanimou. Mais tarde, cada um à sua
maneira, será uma testemunha fiel de Cristo e do seu Evangelho.

A paciência e a constância são imprescindíveis nesse trabalho que, em


colaboração com o Espírito Santo, temos que realizar na nossa alma e na dos
nossos amigos e familiares que queremos aproximar do Senhor. A paciência
anda de mãos dadas com a humildade, acomoda-se ao ser das coisas e
respeita o tempo e o momento de cada uma delas, sem precipitá-los; conta
com as suas próprias limitações e com as dos outros. “Um cristão que viva a
rija virtude da paciência, não se surpreenderá ao perceber que os que o
rodeiam dão mostras de indiferença pelas coisas de Deus. Sabemos que há
pessoas que guardam nas camadas subterrâneas – como acontece com os
bons vinhos nas adegas – umas ânsias irreprimíveis de Deus que temos o
dever de desenterrar. Acontece, no entanto, que as almas – a nossa também –
têm os seus ritmos de tempo, a sua hora, aos quais devemos acomodar-nos
como o lavrador se acomoda às estações e ao terreno. Não nos disse o Mestre
que o Reino de Deus é semelhante a um amo que saiu a diferentes horas do
dia para contratar operários para a sua vinha? (Mt 20, 1-7)”11. E como não
havemos de ser pacientes com os outros, se o Senhor teve tanta paciência
connosco e continua a tê-la?

Caritas omnia suffert, omnia credit, omnia sperat, omnia sustinet12, a


caridade tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo sofre, ensina São Paulo.
Se tivermos paciência, seremos fiéis, salvaremos a nossa alma e também a de
muitos outros que Nossa Senhora coloca constantemente ao nosso lado.

(1) Lc 21, 12-19; (2) Jo 15, 20; (3) Jo 16, 33; (4) Santo Agostinho, Sobre a paciência, 2; (5) cfr.
São Tomás de Aquino, Comentário à Epístola aos Hebreus, 10, 35; (6) cfr. São Francisco de
Sales, Epistolário, frag. 139; (7) 1 Cor 13, 4; (8) cfr. São Cipriano, Sobre o bem da paciência,
15; (9) Mt 13, 13; (10) Jo 16, 12; (11) J. L. R. Sánchez de Alva, El Evangelio de San Juan, 3ª
ed., Palabra, Madrid, 1987, nota a 4, 1-44; (12) 1 Cor 13, 7.

(Fonte: Website de Francisco Fernández Carvajal AQUI)

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