O documento discute a alegoria presente no livro "O Vendedor de Passados" do escritor angolano José Eduardo Agualusa. A narrativa alegórica representa a crise de identidade de Angola após a independência e a busca do povo angolano por compreender seu passado colonial e construir sua identidade pós-colonial. Personagens como um vendedor de identidades falsas e um fotógrafo à procura de um novo passado simbolizam as questões da nação em definir quem é em meio aos legados portugueses e a
O documento discute a alegoria presente no livro "O Vendedor de Passados" do escritor angolano José Eduardo Agualusa. A narrativa alegórica representa a crise de identidade de Angola após a independência e a busca do povo angolano por compreender seu passado colonial e construir sua identidade pós-colonial. Personagens como um vendedor de identidades falsas e um fotógrafo à procura de um novo passado simbolizam as questões da nação em definir quem é em meio aos legados portugueses e a
O documento discute a alegoria presente no livro "O Vendedor de Passados" do escritor angolano José Eduardo Agualusa. A narrativa alegórica representa a crise de identidade de Angola após a independência e a busca do povo angolano por compreender seu passado colonial e construir sua identidade pós-colonial. Personagens como um vendedor de identidades falsas e um fotógrafo à procura de um novo passado simbolizam as questões da nação em definir quem é em meio aos legados portugueses e a
Um fotgrafo de guerra em busca de um passado completamente
novo, um ser humano com amnsia reencarnado em uma lagartixa, um mendigo que esconde seu passado como ex-agente do governo, esses so alguns dos personagens do livro O vendedor de Passados do escritor angolano !os "duardo #gualusa$ #ngola foi uma das %ltimas col&nias a conquistar sua independ'ncia, fato que ocorreu mais precisamente no ano de ()*+$ # partir da, o povo angolano mergulhou em uma crise de identidade, pois se viram perante o impasse que assola a grande maioria dos pa,ses que um dia estiveram na posi-o de col&nia, o impasse de se encontrar entre a busca pelos idiomas e culturas pr-coloniais ou de abra-ar o idioma e cultura dos povos ps- coloniais como parte importante de sua identidade$ . esse dilema que serve de matria-prima para a narrativa de O vendedor de passados$ /o livro o personagem 0lix 1entura , literalmente, um vendedor de passados$ "le fabrica histrias de vida para seus clientes, ou se2a, cria uma genealogia de luxo para quem o contrata$ 3o prsperos empres4rios, pol,ticos e generais da emergente burguesia angolana que t'm um presente e um futuro prspero, mas falta-lhes um passado que no se2a comprometedor$ " arquitetar esse passado uma empreitada no qual o personagem 0elix se encarrega$ 0elix est4 indo muito bem nesse servi-o e leva uma vida ra5oavelmente confort4vel at que uma noite essa rotina interrompida pela chegada de um estrangeiro, fotgrafo de guerra, que quer um passado completamente novo$ O misterioso fotgrafo quer que sua nova identidade se2a angolana$ 6om o novo nome de !os 7uchmann e uma fantasiosa e respeit4vel 4rvore genealgica o personagem passa ento a vasculhar seu passado falso a fim de confirmar sua exist'ncia fict,cia$ # narrativa no contada pelo personagem 0lix 1entura e sim por uma lagartixa que vive pelos cantos da casa onde 0lix mora, um rptil que outrora fora um ser humano embora no lembre quem era em sua vida passada$ # lagartixa tem um nome, o seu nome "ul4lio$ # partir desta pequena sinopse do livro podemos discutir o ponto chave da obra de #gualusa8 a alegoria$ Uma alegoria 9do grego :;;<=, allos, >outro>, e :?<@ABACD,agoreuein, >falar em p%blico>E uma representa-o figurativa que transmite um significado outro que e em adi-o ao literal$ Falter 7en2amin, em Ursprung des deutschen Trauerspiels 9Origens do Drama Trgico AlemoE, enxergava a alegoria como a revela-o de uma verdade oculta$ Uma alegoria no representa a realidade tal como ela , mas pretende antes dar-nos uma verso da mesma, se2a esta uma verso atual, de como um dia foi ou como poderia vir a ser$ Gartin Heidegger estudou a nature5a da obra de arte como sendo constitutiva de uma realidade alegrico-simblica indivis,vel8 # obra de arte , com efeito, uma coisa, uma coisa fabricada, mas ela di5 ainda algo de diferente do que a simples coisa , Iallo agoreueiJ$ # obra d4 publicamente a conhecer outra coisa, revela-nos outra coisa8 ela alegoria$ K coisa fabricada re%ne-se ainda, na obra de arte, algo de outro$ Leunir-se di5-se em grego sMmballein$ # obra s,mbolo$ 6omo regra geral a alegoria reporta-se a uma histria ou a uma situa-o que 2oga com sentidos duplos e figurados, sem limites textuais 9a alegoria pode ser encontrada tanto em um simples poema como em um romance inteiroE, pelo que tambm tem afinidades com a par4bola e a f4bula$ Nomemos como exemplo a f4bula O leo e a r8 Certa vez, um leo, ao passar perto de um pntano, ouviu uma r coxear muito alto e com muita or!a" Dirigiu#se ento na direc!o do som, supondo $ue ia encontrar um animal grande e possante, correspondente ao %arulho $ue azia" &or isso, ao avan!ar, nem reparou na pe$uena r e p's# lhe a pata em cima" () l onde p*es os p+s,-, gritou a r" O leo olhou, admirado, e disse. /e +s assim to pe$uena, por$ue + $ue azes tanto %arulho0- 3e substituirmos a r por o orgulho e o leo por o poder, transformamos a f4bula numa alegoria$ . de notar que usual na alegoria o recurso a personifica-Oes ou prosopopeias em especial de no-Oes abstractas$ 6omo demonstrado acima, a interpreta-o de uma alegoria depende sempre de uma leitura intertextual, ou se2a, uma leitura contextuali5ada com a situa-o histrico-social em que a alegoria foi escrita, permitindo assim identificar tanto um sentido mais abstrato como um sentido mais profundo, geralmente de car4ter moral$ "m outras palavras, uma alegoria uma representa-o de um elemento para dar a idia de outro atravs de uma ila-o moral$ /o por acaso que a alegoria foi, durante a Pdade Gdia, o instrumento de defesa preferido dos telogos, que recorreram Qs interpreta-Oes alegricas da 7,blia para superarem todas as d%vidas herticas$ Re certa forma a alegoria uma espcie de irm dos sonhos$ # psican4lise explica os sonhos da seguinte forma8 todos os traumas, dese2os reprimidos e eventos com a qual no conseguimosSqueremos lidar so suprimidos pela mente consciente para o inconsciente onde permanecem esquecidos quando estamos acordados$ Gas quando estamos dormindo o inconsciente toma conta do indiv,duo e ento todos os traumas e dese2os reprimidos se manifestam na forma de sonhos, que nada mais so do que representa-Oes simblicas de dese2os e fantasias reprimidas$ #s passagens do livro onde a lagartixa sonha que se encontra com 0lix 1entura simboli5am perfeitamente essas questOes$ Portanto nada mais correto que di5er que a alegoria e o sonho so parentes prximos$ Poder-se-ia di5er que a alegoria um sonho acordado, uma forma consciente de lidarmos com nossas frustra-Oes e dese2os atravs de representa-Oes simblicas$ 3e o sonho a forma que o individuo encontra para lidar com suas questOes pessoais a alegoria a forma como a sociedade encontra para trabalhar com seus problemas$ !os "duardo #gualusa em O 1endedor de passados fa5, atravs do recurso da alegoria, um esfor-o de lidar com traumas da #ngola ps- independ'ncia$ Podemos di5er que #gualusa coloca a na-o angolana no div em O 1endedor de passados, pois os personagens do livro no so o que a primeira vista aparentam$ O personagem de !os 7uchmann, por exemplo, come-a a acreditar na fantasia for2ada por 0elix 1entura iniciando uma pesquisa sobre seu passado posti-o a ponto de encontrar pistas sobre sua me fict,cia e encomendar uma l4pide ao seu pai for2ado, ou se2a, o personagem cria sua prpria realidade em um comportamento digno de um esqui5ofr'nico$ O prprio vendedor de passados, 0lix 1entura, tambm simboli5a um dist%rbio psicolgico, o dist%rbio da m%ltipla personalidade, pois se trata de um personagem que na verdade um negro albino$ "stes dois so apenas alguns dos exemplos de personagens sem identidade ou em busca de uma$ Personagens como 0lix 1entura e !os 7uchmann simboli5am perfeitamente o atual estado de angustia da alma angolana, uma alma que se encontra em uma encru5ilhada entre um passado nebuloso e um futuro incerto$ 3o personagens que representam Q histria de #ngola e sua heran-a da ex-metrpole portuguesa$ "ssa identidade multifacetada de #ngola est4 representada tanto em !os 7uchmann, na verdade um portugu's que dese2a um passado angolano, como em 0lix 1entura, o negro branco, ou na lagartixa que desconhece o seu prprio passado$ Portanto nada mais natural para a literatura angolana do que tratar de todas essas questOes em forma de alegorias$ Lesumindo, #ngola por um lado uma na-o livre, mas por outro ainda dependente de Portugal, pois como resultado de anos e anos de dom,nio o idioma e a cultura portuguesa 9e consequentemente a de diversos pa,ses de l,ngua portuguesa como o 7rasil, por exemploE se entranharam nas v,sceras do pa,s chegando ao ponto de se confundir com a cultura do prprio pa,s, causando o mal-estar e desconforto que perturba a alma do angolano$ O escritor !os "duardo #gualusa ele prprio o exemplo por excel'ncia da confuso da alma angolana8 descendente de angolanos e portugueses #gualusa escreve no apenas sobre #ngola, mas tambm sobre si mesmo$ " porque no sobre todos nsT #final, quem nunca um dia se sentiu confuso em rela-o a sua identidade e ao seu lugar no mundoT 3ob uma outra perspectiva, o prprio escritor representa tambm uma afirma-o de ra,5es que contm em si todo um pro2eto de futuro, de possibilidade de afirma-o de valores culturais angolanos e das culturas africanas e coloni5adas em geral$ Um valor no da afirma-o da negritude, mas da miscigena-o, no apenas racial, mas, sobretudo cultural$ Portanto a alegoria de O 1endedor de passados a alegoria sobre a constru-o da identidade, se2a esta individual ou de uma na-o$ . uma alegoria sobre um povo que busca desesperadamente compreender a si mesmo, descobrir a sua identidade e fa5er as pa5es com o passado a fim de poder finalmente tra-ar seu caminho em dire-o ao futuro$