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CONTO AFRICANO PARA REFLETIR SOBRE A DOR

Antigamente, quando as palmeiras ainda viajavam de um canto ao outro, dando muitos


frutos e refrescando a vida dos homens na terra, não faltavam nozes para os esquilos e a
relva verde cobria a terra, havia uma mulher que se chamava Inine.
Inine era a mais bela mulher de sua aldeia. Adorava dançar e, portanto, tinha presença
certa em quase todas as festas do povoado. Quase todas, porque em algumas ela não
comparecia por estar doente. Se não era dor de cabeça, era dor de barriga, outras vezes
doía a coluna e noutras o pé. Embora cometida por tantos males, ela continuava a
dançar sempre que podia.
Certa vez, Inine fez um delicioso prato, utara, ao meio-dia, para um sábio ancião, cujas
barbas refletiam a luz do dia e em sua cabeça o brilho da lua vinha repousar. O velho
homem gostou tanto da comida que, depois de se fartar, contou como poderia se livrar
das doenças.
O velho disse que todos os dias, ao meio-dia, as doenças saíam para passear e só
retornavam depois de algumas horas. Inine precisaria preparar o mesmo prato que lhe
servira, a utara, e ao meio-dia a mesa teria de estar posta, como se fosse receber
convidados. Depois disso, deveria fugir para bem longe, para nunca mais voltar. Desse
modo, estaria livre das doenças.
Ela fez exatamente como o sábio ancião lhe dissera: ao meio-dia, quando sentiu as
doenças saírem para passear, foi para bem longe, para além dos sete rios e das sete
cidades, onde moravam seus parentes.
Quando as doenças voltaram do passeio, não a encontraram, mas viram a mesa posta e
devoraram aquela saborosa comida. Terminada a refeição, ficaram à espera da moça.
A noite caiu, e vendo que Inine não retornava, as doenças resolveram fazer alguma
coisa para trazê-la de volta. Aproveitaram as panelas que ela havia usado e começaram
a tocar e cantar:
ININEooo ININEooo
Inineooo Inineooo
DO LIMAMA DO
Venha por favor!
ININEooo ININEooo
Inineooo Inineooo
DO LIMAMA DO
Venha por favor!
ININE SURU UTARA DEBERE ORIA
Inine que fez esta saborosa utara para as doenças.
DO LIMAMA DO
Venha por favor!
ININE A NA AGBANARU ORIA N'OSO?
Inine, alguém pode fugir das doenças?
DO LIMAMA DO
Venha por favor!
ORUBURU DALU N'ALA NA ODALU NA MKPU
Oruburu assusta porque parece forte, mas quando cai no chão se despedaça
ONYE OMA SURU UTARA N'OSIRI NU OFEH
A pessoa que fez a utara pode também ser a mesma que fez a sopa
DO LIMAMA DO
Venha por favor!
As doenças tocaram as panelas em ritmos afinados e cantaram tão alto que Inine
escutava a música de onde estava, porém não entendia a letra.
Então, saiu e começou a perguntar onde havia uma festa que nunca terminava, pois
escutava a música dia e noite, cuja melodia era irresistível assim como a vontade de
dançar. Ela partiu para descobrir o lugar onde estava acontecendo aquela festa e, cada
vez mais, dançando, se aproximava de sua antiga aldeia e pensava: “Mal deixei meu
povoado, e eles chamaram a melhor orquestra! Vou surpreendê-los. Mesmo não tendo
me convidado, eu, Inine, a melhor dançarina, chegarei bailando”.
Cada vez mais próxima, o ritmo da música enchia os ouvidos da moça, que a essa altura
não pensava em mais nada, a não ser em dançar, dançar, dançar. Assim que tomou o
caminho de sua antiga casa, as doenças a viram, dançando com toda sua elegância.
Tocaram e cantaram mais alto ainda. Inine escutou seu nome e sentiu-se lisonjeada,
pensando que haviam feito uma música para ela. Já na porta de sua casa, as doenças
largaram as panelas e entraram correndo no corpo dela.
Inine adoeceu novamente e jamais se livrou das doenças, pois elas nunca mais saíram
para passear. Assim acontece quando as doenças tomam conta de uma pessoa.
Texto extraído do livro: “Ulomma - A casa da beleza e outros contos”

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