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8 de outubro de 2007
Em 1997, quando o assassinato do
famoso guerrilheiro argentino e
cubano completava 30 anos, um
grupo de pesquisadores desses
países confirmou a descoberta da
ossada do líder guerrilheiro Ernesto
“Che” Guevara, enterrada em uma
vala comum na cidade boliviana de
Vallegrande junto aos restos mortais
de outros seis combatentes da
guerrilha, próximo ao local onde
foram capturados e mortos pela CIA
e pelas forças de repressão da
ditadura de Renê Barrientos[1] na
Bolívia.
Ernesto “Che” Guevara foi, em vida, a principal bête noire dos órgãos de repressão
do imperialismo mundial, o homem que queria, com o seu exemplo moral e político,
incendiar toda a América Latina e o mundo, impulsionando a juventude a romper
com a paz de cemitérios dos partidos comunistas stalinistas e passar à ação, que
segundo ele entendia era a ação militar direta contra o imperialismo e seus
governos títeres nos países atrasados. Hoje, a figura do guerrilheiro assassinado
vem sendo canonizada, inclusive pela imprensa e meios publicitários capitalistas.
O papel de Guevara na história merece ser analisado, apesar dos inúmeros poréns.
O líder guerrilheiro é apresentado como marxista, como gênio da tática de luta,
como grande pensador e, inclusive, como o “ser humano mais completo” em função
de ser um intelectual, homem prático e grande caráter moral. Nada disso, porém,
se sustenta. O dirigente da Revolução Cubana não era efetivamente marxista,
embora tomasse muitas das suas idéias do marxismo. Não conseguiu superar em
seus escritos a idéia do socialismo nacional ou assimilar a idéia do partido como
instrumento indispensável da revolução proletária, particularmente do partido
mundial da classe operária.
Perto dos grandes nomes do socialismo mundial, como Marx, Engels, Lênin ou
Trótski o Che evidentemente não é capaz de sustentar uma comparação. Além de
gigantescos teóricos do socialismo, Marx e Engels são os fundadores do movimento
operário político moderno, de cujo trabalho teórico e prático surgiu a tradição que
via da I à IV Internacional. Lênin e Trotski são os dirigentes da Revolução Russa de
1917, criadores da III Internacional, a maior organização política da classe operária
que jamais existiu. Todos foram teóricos, escritores e homens de ação geniais.
Comparar a Revolução Cubana e obra de Che Guevara com tais mestres é não só
exagerado como injusto para os últimos.
O Che tem um enorme valor revolucionário e este valor para ser corretamente
apreciado, deve ser visto em uma perspectiva histórica e na devida escala.
O Che foi sem dúvida um grande revolucionário e merece ser estudado por toda a
juventude e pela classe operária pela denúncia que representa o seu sacrifício na
luta contra o imperialismo, o seu combate até certo ponto pela expansão
internacional da revolução e o seu idealismo e desprendimento dos privilégios e das
benesses materiais tão característicos das burocracias cubana, soviética e dos
demais estados do leste europeu, posições estas tão contrastantes com as de uma
expressiva parcela da esquerda latino-americana e dos países atrasados, que cada
vez mais transforma-se em pilar de sustentação do imperialismo em seus países
(PT no Brasil, FSLN na Nicarágua etc.).
Assim como Blanqui, que pela sua história própria, nunca pôde compreender o
verdadeiro programa revolucionário e isto não o impediu de ser um grande
revolucionário, o mesmo podemos dizer do Che Guevara.
O papel político do líder guerrilheiro não pode ser corretamente avaliado sem um
olhar crítico frente aos seus grandes erros políticos, que contribuíram para
desencaminhar toda uma geração de militantes latino-americanos que ingressaram
no caminho desastroso da guerrilha nas décadas de 60 e 70. No entanto, os erros
teóricos e práticos realizados por uma pessoa que deu a sua vida pelo que
acreditava não podem ser visto menos que como uma contribuição para a luta da
classe operária mundial, assim como a Comuna de Paris, repleta de erros políticos,
nunca deixou de ser um aspecto decisivo da história revolucionária moderna com
enorme influência sobre a revolução e a evolução do marxismo. A luta verdadeira e
honesta não pode deixar de dar resultados revolucionários porque a classe operária
tem como característica fundamental a sua enorme capacidade de aprender dos
erros.
Em 1944, a família muda-se de Córdoba para Buenos Aires, quando Ernesto, então
com 16 anos, já havia se decidido a estudar medicina. Já com 21 anos, Guevara
não tinha ainda nenhum tipo de compromisso político, preferindo a vida de viagens
e aventuras de um jovem despreocupado com a vida. É com esse espírito que, em
1949, resolve fazer uma longa viagem de moto em companhia de um amigo para
conhecer vários países da América Latina. Passa pelo Chile, Peru, Colômbia e
Venezuela, onde conhece a miséria dos camponeses e da população pobre desses
países, todos com a mesma característica de Cuba, o país que mais tarde viria a
revolucionar: o controle despótico de países imperialistas que lhes impunham um
bárbaro atraso econômico e cultural.
Voltando a Buenos Aires, depois de uma rápida passagem por Miami, Guevara
retoma o curso universitário e em 1953 forma-se em medicina. Então com 25 anos,
“Che” prefere não exercer imediatamente a profissão, decidindo viajar novamente
com outro amigo, desta vez para a Bolívia. Em julho do mesmo ano, momento em
que seu futuro companheiro, Fidel Castro, atacava sem sucesso, mas com decisiva
repercussão política o Quartel de Moncada em Cuba, seu batismo de fogo na luta
armada contra Batista.
No caminho, “Che” passa pela Costa Rica, onde encontra-se com exilados cubanos,
vários do quais remanescentes do ataque a Moncada, que lhe garantem voltar a
Cuba para derrubar Fulgêncio Batista[4]. Segundo Rojos, que escreveria uma
pequena biografia do “Che”, nenhum dos dois os levaram à sério.
Certo dia, no hospital, encontra com Ñico Lopez, que havia conhecido na Guatemala
e que o apresenta Raúl Castro, irmão de Fidel. Guevara e Raúl tornam-se amigos e
este último, em julho de 1955, o leva a conhecer o irmão, Fidel Castro.
O ambiente universitário na Cuba da segunda metade dos anos 40 era marcado por
uma grande radicalização política, onde dominavam grupos como o Movimento
Revolucionário Socialista e a União Insurrecional Revolucionária. Fidel ingressou na
Universidade de Havana em 1945 e à partir daí ingressou na política alinhando-se
posteriormente com os setores da burguesia democrática cubana.
Não obstante ter sofrido uma batida policial que resulta na prisão de vários
combatentes e no confisco de várias armas, o Movimento 26 de Julho continua o
treinamento no México e Fidel segue com os planos iniciais.
A idéia era fazer coincidir, no dia 30 de novembro, a invasão de Cuba pela Província
do Oriente dirigida por Fidel com um levante popular conduzido pelo líder estudantil
Frank País na cidade de Santiago de Cuba.
Após sete dias no mar passando enjôo, fome, frio e sede -, Fidel e seus
combatentes enfrentavam agora a passagem pelo extenso mangue, no qual foram
obrigados a deixar, pouco a pouco, o que restava de armas e suprimentos, para
somente três dias depois pisar em terra firme, onde uma nova surpresa, bem mais
desagradável, os aguardava.
Mal sabiam eles que o Exército de Batista já sabia de sua presença, através de duas
fontes: uma patrulha da guarda-costeira que os havia visto desembarcar e o
próprio guia que contrataram para levá-los à Sierra.
Greve Geral
A Junta de Miami
O acordo fora realizado com a visível intenção de estabelecer uma frente comum
com Washington e envolver o movimento revolucionário em uma operação de
frente popular. Não havia uma única declaração se opondo à intervenção
estrangeira no país e nem mesmo à idéia de que uma junta militar sucedesse
Batista. Propunha ainda a incorporação “pós-vitória” das tropas de Fidel às forças
armadas, assegurando assim a futura dissolução do exército rebelde e o
restabelecimento do Estado burguês demolido pela revolução. Não continha, por
outro lado, nenhuma proposta concreta em relação à situação econômica da
população cubana, apenas promessas de criação de mais empregos e elevação do
padrão de vida. O acordo era, sobretudo, uma tentativa de suplantar a iniciativa de
Fidel, para então negociar uma saída política de conciliação com o ditador e o
governo dos EUA.
“Che” Guevara passa a exercer uma forte pressão sobre Fidel para que ele emitisse
uma declaração condenando o pacto. Em 9 de dezembro, lhe envia uma carta
acusando o Diretório nacional do 26 de Julho de sabotá-lo intencionalmente,
opinando que este deveria exigir permissão para adotar severas providências a fim
de corrigir a situação, caso contrário deveria renunciar.
Quatro dias depois, Fidel responde. O conteúdo da carta de resposta nunca foi
divulgado, mas a reação de “Che” dá a medida do seu conteúdo: “Neste exato
momento, chegou um mensageiro com sua nota de treze. Confesso que (...) ela me
encheu de paz e felicidade. Não por qualquer razão pessoal, mas sim pelo que esse
passo representa para a revolução. Você bem sabe que eu não confiava de forma
alguma no pessoal do Diretório Nacional - nem como líderes nem como
revolucionários. Mas não pensava que chegariam ao extremo de traí-lo de forma
tão aberta (...).”
Confrontado com o desafio da oposição burguesa e da sua própria ala direita, Fidel
conservou-se em um terreno de independência do regime político. No mesmo dia,
emitiu uma declaração contra o Pacto de Miami: “A liderança da luta contra a
tirania está e continuará a estar em Cuba e nas mãos dos combatentes
revolucionários (...) O Movimento 26 de Julho reivindica para si o papel de manter
a ordem pública e reorganizar as forças armadas da república”. Contra a tentativa
de Felipe Pazos de tentar assegurar para si próprio a presidência de um futuro
governo de transição, Fidel designava o seu próprio candidato, o idoso jurista de
Santiago, Manuel Urrutia, declarando ainda: “Estas são as nossas condições (...) Se
forem rejeitadas, então continuaremos a luta por nossa própria conta (...) Para
morrer com dignidade, não se precisa de companhia”[7].
Após a tomada da cidade de Santa Clara pelas tropas de “Che”, Batista finalmente
desistiria. Às 3 horas da madrugada do dia 1º de janeiro de 1959, ele e um
punhado de íntimos colaboradores embarcaram num avião para a República
Dominicana, abandonando Cuba para sempre.
Fidel demorou uma semana para chegar em Havana. A longa marcha, durante à
qual parava inúmeras vezes para fazer inflamados discursos, permitia um
intervenção generalizada das massas, que iam desmantelando todo o Estado
ditatorial. Ocupavam-se os edifícios públicos, delegacias de polícia, tribunais. Os
funcionários de Batista eram destituídos, os torturadores presos, enquanto juízes,
governadores e militares fugiam para Miami.
A expedição fatal de Che Guevara na Bolívia deve ser vista de um ponto de vista
acima de tudo da análise das suas teorias políticas, tal como amadureceram após a
Revolução Cubana.
A Revolução Cubana foi vitoriosa quando as condições estavam dadas para a vitória
da revolução, caso contrário teria sido derrotada. O ataque ao quartel de La
Moncada mostrou que a revolução não estava madura para uma insurreição. Ela foi
longamente preparada e o próprio ataque de Moncada foi uma parte importante
desta preparação. A situação em Cuba foi revolucionária, com altos e baixos, em
caráter geral desde a década de 30 e a sua tradição revolucionária era grande. A
iniciativa de Fidel Castro agregou à decomposição do regime e ao fermento
revolucionário a forma organizada, ou seja, a direção política através do Movimento
26 de Julho, o qual estava longe ser apenas um foco guerrilheiro, bem como estava
longe de ser apenas rural, mas era um movimento político geral.
A conclusão do Che é uma percepção distorcida que toma uma iniciativa política
específica pela iniciativa em geral: “Destas três contribuições, as duas primeiras
luta contra a atitude quietista de revolucionários ou pseudo-revolucionários que se
refugiam, e refugiam sua inatividade, no pretexto de que contra o exército
profissional nada pode se fazer e alguns outros que sentam-se a esperar que, em
uma forma mecânica, dêem-se todas as condições objetivas e subjetivas
necessárias, sem preocupar-se em acelerá-las”[8].
A guerra de guerrilhas é um dos métodos de luta que podem ser utilizados pelo
movimento operário na sua luta pelo poder contra burguesia. No entanto, o
marxismo não faz um fetiche de nenhum método de luta e nem procura criá-los de
forma artificial, mas, como disse Marx, “procura na própria sociedade capitalista os
meios para combatê-la”. Os métodos de luta da classe operária e das massas
podem ser os mais variados e devem ser adaptados concretamente, do ponto de
vista histórico e da conveniência de cada situação.