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transando com jesus


um conto da série “evangelho segundo sipriano”

Moa Sipriano
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O pastor chegava pontualmente às sete da noite. Estacionava o carro em sua vaga exclusi-
va, onde dois cones estratégicos na via pública impediam a parada de outros carros. Deixava o
interior do veículo coreano ao som dos cânticos de louvor entoados por uma bela voz de
barítono de um dos novos talentos da sua prestigiada gravadora evangélica.

O culto de quarta-feira começava às sete e meia. Alguns irmãos já oravam ajoelhados


perante o púlpito de madeira maciça, encerado à exaustão pelo jovem caseiro que cuidava do
salão, onde o brilho da madeira inspirava as orações que seriam entregues para Deus ao final
da pregação.

O sorriso radiante de dentes brancos e perfeitos do pastor abrandava o sacrifício daquela


gente pobre e humilde que depositava toda a sua fé no Servo do Senhor, o homem rico, culto
e poderoso que havia sido “escolhido” por Deus, e que prometia a cada culto realizado a chance
única daquelas almas cansadas terem os seus apelos atendidos pelo Santíssimo.

Um pouco antes do início do culto de adoração, como por encanto, centenas de pessoas
surgiam sabe-se lá de onde. Todas ansiosas para presenciar o espetáculo de gestos, palavras
e emoções proporcionados pelo grandiloqüente pastor diante das suas ovelhas histéricas.

Agora concentrado, sentado em sua cadeira no fundo do “templo”, o pastor acariciava sua
bíblia velha de guerra, retirando um pequeno marca-textos feito de papel e seda do meio de
uma página amarelada qualquer.

O pastor já havia decorado a bíblia de cabo a rabo. Ele sabia o que proferir no sermão
daquela noite. Nada que fugisse do trivial. Pequenos dramas encenando os mistérios da salva-
ção. Um pouco de suspense evocando o sofrimento e o perdão. O grande final era reservado
para as orações lacrimosas, ditas em alto e bom som, onde lágrimas pré-fabricadas inundariam
as faces coradas no instante exato. E o pastor invocaria o nome do seu xará quase que movido
pelo histerismo crônico, para o delírio da platéia ensandecida.

Uma hora e quinze minutos de espetáculo. Agora era o momento de colher as glórias de
uma atuação impecável. A volta do sorriso perfeito e o aperto seguro de mãos, mancomunados
com um leve tapinha nas costas e um olhar azul profundo exalando compaixão era o suficiente
para transmitir serenidade quase que divina aos irmãos tão necessitados de atenção.

As notas mirradas de real eram depositadas em uma cesta de vime que repousava sobre
uma mesa de plástico. Todos deveriam estar empenhados na reforma do salão, segundo as
palavras de incentivo do pastor.

Mas o que a maioria dos irmãos não sabia era que boa parte daquele dinheiro suado seria
investida naquela mesma noite, a poucos metros dali, numa casinha simples e discreta, onde o

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santo que não era santo costumava freqüentar antes de voltar para sua casa luxuosa em
condomínio fechado, cair nos braços dos seus dois filhos pequenos, tomar um segundo banho,
e dormir ao lado da esposa frígida.

***

Quinze minutos de sexo naquela noite valiam duzentos reais. O pastor chegaria a qualquer
momento. As palavras não eram mais necessárias. Mas Pietro queria comemorar aquela noite
fria de um agosto comum e corrente. Há dez anos o pastor mantinha um caso com Pietro, hoje
um rapaz de 24 anos, dono de um belo corpo esculpido ao som do axé baiano, mas sem
conteúdo algum na cabeça “solineuzada”.

Poucos minutos eram suficientes para o descarrego do velho homem. Jesus sempre abria
as portas com a própria chave. Jesus sempre retirava metodicamente peça por peça de suas
roupas de caimento perfeito, colocando-as delicadamente em um único cabide posicionado
atrás da porta do único quarto.

Jesus, trajando apenas uma cueca branca, olhava para aquele corpo moreno e liso posicionado
“de quatro”, com as pernas bem abertas sobre o colchão de molas, pronto para ser penetrado
com selvageria nada divina.

Jesus “entrava com tudo” naquele corpo que rebolava e gemia e gritava falsamente de
prazer, tudo para satisfazer o homem santo que não era santo. Atos repetidos à exaustão por
tanto tempo, onde os sentimentos estavam sepultados e somente o velho corpo viciado ainda
precisava desesperadamente consumir aquela carne fresca, quente, sensual, submissa.

Pietro rebolava. Jesus gritava. Ambos oravam o “pai-nosso”, entre gemidos e sussurros.
Assim era o prazer do casal enrustido, suando o corpo e ferindo a alma entre quatro paredes
fétidas que imploravam por uma demão de tinta fresca.

“O senhor Jesus é o meu Pastor e nunca me abandonará!”, gritava Pietro, manipulando seu
sexo até jorrar seus pecados sobre o lençol de tecido barato.

O pastor Jesus mordia as costas do seu amante, e entre uma oração e uma súplica de
perdão ao Pai, também acabava depositando sua essência hipócrita dentro do corpo sarado do
jovem amante bailarino.

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Banho tomado, cabelos alinhados, perfume reposto, o pastor Jesus tirava algumas notas
amarrotadas da carteira - fruto do esforço dos irmãos -, e deixava o montante sobre a cama
bagunçada do casal.

“Parabéns para nós, parabéns para nós...”, cantava, desafinado, o amante vindo da cozinha
minúscula, segurando uma travessa onde repousava um pequeno bolo caseiro de chocolate.

Apesar da pressa, Jesus aceitou um pedaço da sua sobremesa favorita, para não fazer
desfeita ao seu objeto de prazer. O pastor olhava assustado as horas no caro relógio de pulso.
Tudo era controlado. Para tudo havia um rígido horário a ser cumprido.

“O dinheiro dos irmãos sustenta o nosso prazer.”, disse Pietro, enquanto limpava a boca do
seu homem, que feito criança se deliciava com os restos de uma fatia fina de bolo.

“Amém, Senhor, Aleluia!”, gritou Jesus, olhando para um céu imaginário, pondo-se de pé
logo em seguida, pronto para voltar ao seu lar perfeito, inventar uma desculpa qualquer à
esposa queixosa e dormir o sono tranqüilo daqueles sustentam o báculo da Hipocrisia.

“Pietro - Transando com Jesus” é um conto da série “Evangelho Segundo Sipriano”

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O AUTOR :: MOA SIPRIANO Em 2007, após editar e ampliar o conto, transfor-
mando-o em um e-book e carro-chefe na divulgação do
meu trabalho, resolvi disponibilizá-lo gratuitamente em
meu site.
Percebendo a boa receptividade de "30 dias", aca-
bei transformando praticamente toda minha produção
literária nesse formato, tonando-me assim um pioneiro
na divulgação e distribuição no Brasil de livros digitais
gratuitos contendo literatura gay de qualidade.
Em 2008, após mais de 20 mil downloads no Brasil
de todos os meus títulos publicados e também por cau-
sa da grande quantidade de comentários incentivadores
dos meus leitores é que continuo me esforçando na
produção constante e divulgação permanente de uma
literatura "gay" de excelente entretenimento.
Nasci em Jundiaí, uma próspera cidade do interior A homossexualidade, o amor verdadeiro, os confli-
de São Paulo. Minha mãe é uma guerreira. Tenho duas tos internos, a amizade e a espiritualidade são temas
irmãs fantásticas, dois cunhados bacanas, duas sobri- recorrentes no meu trabalho literário. Espero que mi-
nhas fofas, algumas primas idolatradas e uma tia que é nhas histórias e verdades proporcionem a você mo-
fora-de-série. Ah, também tenho um pai... ausente. mentos de agradável leitura e reflexão.
Comecei a escrever roteiros, poesias, letras de mú-
sicas e outras bobiças aos 12 anos. Eu vivia anotando
meus sonhos e minhas verdades em papéis soltos que Você gostaria de investir no melhor
foram se perdendo pelo caminho. Sempre escrevi his-
tórias que de alguma maneira retratavam a homosse-
site de literatura gay do brasil?
xualidade masculina.
Em 1988, após uma experiência pessoal "abalante",
resolvi desabafar através de uma autoterapia forçada, Se você curtiu muito o texto que acabou de ler e quiser
escrevendo em uma noite Uma carta para Hans. Foi o colaborar financeiramente, apoiando o meu trabalho, faça e
confirme um depósito na minha poupança (ui!) e seu nome
primeiro conto. ficará registrado em meu site – menu “colabore” – na famosa
Em 2004, ao criar a primeira versão do meu site lista permanente dos leitores e fãs que apoiam o fofo do
oficial, fiquei totalmente surpreso com a polêmica, os Moa! (eu me acho, né! :)
comentários inflamados e a repercussão positiva junto
aos leitores ao publicar meus primeiros artigos na
Internet: Deus x Gays, Afeminado? Tô fora e Você é MAS, ANTES DE COLABORAR, POR FAVOR LEIA ISSO:
Ativo ou Passivo; além da série Poltrona 47 (cinco con-
Todo os artigos, contos e livros digitais (e-books) contidos em
tos que retratam as experiências sexuais de um rapaz meu site são de minha autoria e estão disponíveis de maneira
dentro de um ônibus) e o conto Filipe ou Treze homens ESTRITAMENTE GRATUITA. No entanto, se você quiser
e um destino (história que retrata de uma maneira po- CONTRIBUIR ESPONTANEAMENTE para a continuidade da
produção literária exposta em moasipriano.com, poderá
lêmica as atitudes de um rapaz que ao saber que pode depositar o valor que você achar justo na seguinte conta-
estar contaminado com o vírus da AIDS, num momento poupança:
de revolta e irresponsabilidade total resolve se vingar
e transar com treze homens em um único dia).
Caixa Econômica Federal (CEF)
Foi este incentivo que me levou a apostar no meu Agência: 2209 | Conta Poupança: 013.00034097-2
tipo de literatura. Desde então, nunca mais parei de Nome: Moa Sipriano
escrever, procurando aprender e evoluir a cada dia como
um bom contador de histórias gays. OBS: Qualquer tipo de ajuda será bem-vinda e, antes de tudo,
Em 2005, por causa do sucesso do conto Filipe, vista como um SINAL DE GRATIDÃO E RECONHECIMENTO
busquei inspiração para desenvolver o projeto 30 dias. À PROPOSTA DESSE PROJETO. Os depósitos serão
revertidos em amortização dos custos de hospedagem e
A história de Jägger foi realmente escrita em tempo manutenção do site, e também servirão na ajuda de custos de
real, conforme as datas descritas no diário do persona- gráfica para que eu possa em breve - por conta própria -
gem. Foi um desafio enorme escrever trinta capítulos lançar meu primeiro livro impresso. Por favor, jamais se sinta
forçado a nada. E muito obrigado, de coração, por ser meu fã!
em exatos trinta dias e postar um capítulo diário, em
formato de blog, em meu site. E mesmo não tendo di- MOA SIPRIANO.com - literatura gay de qualidade
vulgado devidamente este projeto, a repercussão foi
muito promissora.

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