Mito de Prometeu à Cultura Digital (2004), de Ken Goffman e Dan Joy , Uma
outra forma de excelência humana, tópicos Definindo contracultura, O que é hip?,
“Contracultura” questionável, Princípios definidores da contracultura,
Características quase universais da contracultura, A contracultura ainda é contra?
( respectivamente as paginas 45 à 58 e 62 à 64 ). (Rio de Janeiro: Ediouro 2007)
Capítulo Dois
1
conceito ocidental de história como uma narrativa continuada, definida basicamente por
grandes líderes, estruturas sociais variáveis e as mutáveis fronteiras entre nações-estado
antagônicas parece que quase explicitamente projetado para nos amarrar a uma visão
hegemônica do potencial (muito limitado) da humanidade. Nesse contexto , o registro
histórico conspira para nos convencer de que o predomínio de comportamento não-
contraculturais, como conformismo e autoritarismo, é o que define a humanidade.
Alguma vezes somos tentados a dizer que na verdade, aqueles que recordam a história
são condenados a repeti-la.
Mas como a cultura ocidental, e particularmente suas gerações mais jovens, se
encaminha rapidamente para épocas crescentemente não-históricas, o quadro não parece
agradável. Para começar , a amnésia histórica descontextualiza situações passageiras no
mundo contemporâneo, produzindo resultados negativos. Assim, podemos, por
exemplo, reagindo ao rancor dos colonizadores (ou ex-colonizadores) com
incompreensível irritação, como se sua falta de passividade fosse um defeito de caráter,
uma grosseria inexplicável que algumas vezes atinge o grau da violência. Ou nós (nos
Estados Unidos) podemos simplesmente aceitar o senso comum de que nossa nação-
estado é “a terra da liberdade”, sem realmente compreender os direitos em nossa
Constituição e nossa Declaração de Direitos e as formas pelas quais eles foram
ampliados e reduzidos.
No nível da contracultura, encontramos muitos jovens influenciados pelo hedonismo
hippie, mas sem nenhuma verdadeira consciência dos princípios filosóficos mais
profundos daquele movimento. . E, o que é ainda mais perigoso, eles talvez consumam
as plantas sagradas e as substâncias químicas do movimento sem terem as informações
práticas adequadas acerca da segurança , ou sobre integrarem harmoniosamente essas
experiências em suas vidas cotidianas.
Essa busca da não-historicidade chega mesmo a privar alguns dos movimentos
contraculturais jovens de profundidade e humanidade. Ao longo de 1990, a Geração
X,/tecnocultura abraçou o culto ao novo. A revista Wired, soando exatamente como o
Camarada Mao durante a violenta Revolução Cultural na China dos anos 1960,
celebrava a rápida mudança tecnológica como um “furacão” apagando todas as
lembranças. Essa rejeição de todas as coisas passadas teve a sua apoteose naquele
glorioso surto de exuberância contracultural conhecido como o movimento rave. Em
meados dos anos de 1990, a arma mais devastadora do arsenal dessa cultura era a frase
“Era assim a cinco minutos”.
Ao ignorarem a história, mesmo a história recente, os contraculturalista do “culto ao
novo” se privam de coisas esplêndidas – como as maravilhosas músicas expansoras da
mente de John Cage e Iannis Xenakis ou as afirmações intensamente contraculturais de
Beggars Banquet, dos Rolling Stones, ou Never Mind the bollocks here’s the Sex
Pistols, dos Sex Pistols, ou mesmo o impressionante Premium Millennium Tension, de
Tricky que hoje parece ter acontecido há looongos cinco anos. Claro que toda geração
gosta de achar que inventou a sua própria cultura rebelde e , como esse livro irá
demonstrar, na maioria das vezes ela está certa. O espírito contracultural fundamental se
reinventa perpetuamente de formas imprevisíveis, estilos chocantes e novos modelos.
Ainda assim , muitos jovens contraculturalistas do século XXI poderiam lucrar se
aprendessem a história de seus antecedentes do final do século XX, e todos nós nos
beneficiaríamos se aprendêssemos sobre os movimentos contraculturais das
profundezas do tempo.
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O que é hip?
I walk forty-seven miles of barbed wire/ Use the snake for as necktie
Bo Diddley
Pouquíssimas pessoas têm uma definição pratica e adequada para o que seja
contracultura, mas têm certeza de que sabem reconhecer uma quando a vêem. Na
verdade, quando Theodore Roszak popularizou a expressão em seu livro The Making of
a Counter Culture, de 1969, ele literalmente podia ver quais eram as pessoas que se
encaixavam em sua concepção. Qualquer pessoa do sexo masculino com cabelos
compridos e, provavelmente, uma barba, vestindo jeans esfarrapados, uma bandana e
talvez uma camiseta estampada quase certamente era um contraculturalista. Qualquer
mulher com os cabelos ainda mais longos, vestindo a mesma coisa que o rapaz, ou,
opcionalmente, um vestido de camponesa, também provavelmente era uma
contraculturalista... Em outras palavras, praticamente todo mundo que naquela época
estava na faculdade. Essas pessoas representavam uma síntese do movimento hippie –
dedicado a fazer experiências com drogas que expandiam a consciência e a seguir a
onda, e ligado ao movimento da Nova Esquerda/pacifista - , que se dedicava a desafiar a
autoridade, acabar com o imperialismo e a guerra e a um mal definido comunalismo.
Do ponto de vista de Roszak, aquela era uma revolta contra a civilização alienante,
mecanizada e excessivamente materialista, em prol de uma forma de vida mais natural,
intuitiva, harmoniosa e generosa. Mas para outros , como Tim Leary e (em menos grau)
os yippies e os diggers, eles estavam se rendendo antecipadamente a um mundo no qual
a tecnologia nos libertava da miséria humana e do trabalho alienante, garantindo-nos
uma vida de espontâneo e divertido autoconhecimento e, até mesmo, auto-indulgência.
Qualquer que seja a visão ( e havia milhares de outras) da contracultura dos filhos do
baby boom que escolhamos, podemos estar certos de uma coisa: Newt Gingrich acredita
que ela destruiu a América.
Claro que características culturais que são inicialmente vistas como desafiadoras,
novas ou mesmo revolucionarias podem acabar se revelando rançosas – uma caricatura.
Hoje , um cara de cabelos compridos pode muito bem ser um caipira reacionário, e o
Zeitgeist contracultural hippie foi superado por uma cultura alternativa mais ampla e
eclética formada por subculturas contraculturalmente afetadas. Punks, artistas de
vanguarda, o movimento hip-hop, ativistas antiglobalização e anarquistas Black Bloc,
tecnoculturalistas leitores de Wired e hackers, ligados na cultura clubber, rappers
conscientes , psicodelistas educados, Burning Man, modernos primitivos com implantes
e piercings de aço pendurados em cada órgão, habitantes do submundo sexual, pagãos,
acadêmicos pós-modernos, funkeiros, adeptos da New Age, riot grrrls*, desertores,
freqüentadores de raves, dreadsters, zen-budistas, gnósticos, iconoclastas solitários,
vagabundos, poetas performáticos, góticos, abraçadores de árvores, libertinos e
libertários – todos algumas vezes definidos (e autodefinidos) como contraculturais.
Como se essa lista de supermercado de “doidões” não fosse longa o bastante, alguns
grupos tradicionalistas – cristãos fundamentalistas e grupos judaicos ortodoxos –
começaram a se referir a si mesmos como contraculturas. O Webster’s New World
Dictionary define contracultura como “uma cultura com um estilo de vida que é oposto
à cultura dominante”, portanto, não surpreende que grupos que se opõem
profundamente ao pluralismo, ao aborto, ao racionalismo, à liberdade sexual, à ciência,
a auto-indulgência materialista, à liberdade de opinião e a muitos outros aspectos de
nossa cultura que são mais ou menos dominantes possam ver s si mesmos como
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contraculturais. De acordo com essa definição, até mesmo muçulmanos praticantes da
jihad que vivem em países ocidentais constituem uma contracultura.
* Movimento iniciado na década de 1990 , por zines e bandas femininas, que repudiava o sexismo. (N. do
E.)
“Contracultura” é questionável
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surrealistas. Alguns movimentos são vistos como sendo fundamentalmente espirituais,
enquanto outros são conhecidos por suas contribuições artísticas, políticas o u filosófica.
Algumas contradizem as outras em certos aspectos. Os socráticos introduziram o
raciocínio dedutivo, enquanto os dadaístas o detonaram. Os libertinos do século XVII
debochavam da espiritualidade, enquanto os sufis a buscavam de uma forma algumas
vezes libertina.
Essa diversidade por vezes contraditória pode levar alguns leitores a concluir que nós
basicamente reunimos todos os movimentos culturais e políticos que achamos legais ou
interessantes, e chamamos isso de uma história da contracultura. Não é verdade. Os
movimentos contraculturais , não importa quão diferentes uns dos outros possam
parecer, surgem de diferentes combinações dos mesmos princípios e valores.
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“verdadeira motivação” por intermédio de uma auto-exploração profunda e disciplinada.
Aquele que procura precisa descobrir qual ´q a sua vontade, antes de fazê-lo.
Apesar dessas definições , nossa interpretação da contracultura inegavelmente
permanece um pouco libertária (com “l” minúsculo) . Não iremos discutir aqui se o
direito de indefinidamente acumular bens pessoais e riqueza é uma garantia
fundamental da liberdade individual ou se, na verdade, é um obstáculo e ela. Mas
afirmamos que , da mesma forma que rejeitamos o simples egoísmo, também excluímos
de nossa definição o puro comunalismo. As culturas que impedem ou desencorajam o
individuo de explorar plenamente e expressar seu autêntico ser – seja por coerção direta,
seja por pressão populista de seus colegas – não podem ser consideradas contraculturais.
Portanto, a participação nas contraculturas mais refinadas normalmente não exigem que
os indivíduos façam, digam, pensem ou acreditem em algo especifico. Tudo o que é
exigido é um compromisso com o processo de eliminar a submissão à autoridade
externamente aplicada e internamente inculcada, de modo que a verdadeira
individualidade possa florescer.
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populações. Muitos antiautoritaristas acreditam que tentativas idealistas de colocar em
prática o puro anarquismo em larga escala se mostrariam desastrosas simplesmente
levariam as massas a clamar por um renovado e forte governo autoritário. A maioria
preferiria limitar severamente a hierarquia e a coerção utilizando mecanismos
democráticos e de liberdade civil grandemente ampliados.
Outra característica básica de todos os episódios contraculturais é um entusiasmo por
mudanças pessoais e sociais. Esse principio pode ser formulado de uma forma quase
abstrata, como na descoberta do filósofo taoísta Lao-tsé de que a mudança é a única
constante ou na afirmação semelhante do grego Heráclito de que “tudo muda, nada
permanece”. Na contracultura taoísta, essa sabedoria era associada a uma política
anarquista, mas basicamente passiva. Outros contraculturalistas preferiram incorporar o
principio da mudança a ações concretas em larga escala.
No nível individual, os contraculturalistas demonstram mutabilidade : um processo
fluido, camaleônico de perpétua transformação na identidade pessoal, nos interesses e
nos objetivos almejados. Os contraculturalistas realizam apaixonadamente aquilo que
Nietzsche chamou de “transposição de valores” – uma filosofia e um estilo de vida que
implica uma continua transformação , com sistemas de valores, percepções e crenças
mutáveis, como um objetivo em si.
Nesse ponto , contraculturas ativistas como o radicalismo de 1960 e contraculturas
passivas como o taoísmo têm um ponto em comum. Assim como muitos conhecidos
contraculturalistas dos anos 1960 evoluíram por intermédio de uma impressionante série
de permutações no estilo, na estética, na política e na filosofia ao longo de alguns
poucos anos , os mais conhecidos representantes do taoísmo e da filosofia zen foram
tradicionalmente inescrutáveis pelos outros em função de seu comportamento
imprevisível e contraditório momento a momento, dia a dia, ano a ano.
O apego contracultural à mudança constante é algumas vezes confundido com
modismo ou com a aceitação de qualquer mudança. Especialmente hoje , qualquer
atividade au courant na mídia e na cultura jovem ( que se estende quase que até a
velhice) pode ser descrita como “avançada” – desde se alistar no corpo de Fuzileiros a
participar de pegas nas ruas , participar de disputas íntimas em rede nacional de TV ou
acompanhar a banda de rock Phish. Mesmo correndo o risco de parecer óbvio, algumas
mudanças , côo uma mudança da democracia para ditadura, ou de uma cultura libertina
para uma cultura matrimonial claramente não são contraculturais por natureza.
Naturalmente todos os princípios contraculturais básicos são expressos de acordo com
parâmetros estabelecidos pelo momento histórico. Contraculturas históricas especificas
representam os princípios básicos de contracultura em aspiração e rumo, mas a
concretização desses princípios no mundo é limitada pela imperfeição humana. De fato,
as próprias contradições e imperfeições humanas encontradas nesses episódios
históricos oferecem a esta narrativa várias oportunidades de critica irreverente, dando a
ela, espera-se, um cunho mais verdadeiramente contracultural do que um mero exercício
de animação de torcida – ou uma árida enumeração de acontecimentos.
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Características quase universais da contracultura
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verdadeiro Jardim do Éden.” E Ralph Waldo Emerson disse que caminharia cem milhas
sob uma tempestade de neve por uma boa conversa.
A comunicação emocional intima – a pratica de abrir a alma plenamente – é tão
importante quanto a comunicação intelectual na maioria dessas comunidades. Basta
recordar como a terna coragem de revelar os mais profundos segredos de alguém estava
no cerne do movimento beat, e não apenas nas confissões públicas publicadas de
Ginsberg, Kerouac, Diane di Prima e outros. Antes que suas obras circulassem
amplamente, os beats passaram centenas de noites falando intimamente uns com os
outros até o amanhecer.
O movimento beat, claro, saiu dessa intimidade privada, atraindo a atenção dos meios
de comunicação de massa. De fato , a maioria das erupções contraculturais foi
estimulada pela utilização criativa de qualquer meio de comunicação ou espaço publico
disponível. Sócrates conseguiu alunos discursando nos ginásios públicos e mercados de
Atenas. Os trovadores difundiram por toda a Europa um novo conceito de amor
viajando e cantando suas canções. Não teria havido Revolução Americana sem uma
incansável panfletagem. Picasso mudou para sempre a percepção visual do mundo
utilizando como meio a tela. E os anos 1960 poderiam ter sido um estalinho em vez de
uma bomba de fusão se não fosse pela sublime subversão sônica gravada nos sulcos dos
discos de vinil de consumo de massa.
A maioria dos contraculturalistas acredita em absoluta liberdade para divulgar o
conteúdo de suas mentes e de sua imaginação. Não surpreende, portanto, que as
contraculturas normalmente sejam submetidas a algum grau de perseguição. Quando
uma contracultura nasce, a sociedade encontra estrangeiros em seu meio. Quebra de
tabus, violação de normas, desafio a idéias sacrossantas: o espírito antiautoritario
inerente à contracultura é uma ameaça potencial a qualquer ordem estabelecida.
Normalmente se segue a eliminação.
Os tipos de perseguição variam de campanhas oficiais de convencimento do publico,
promovidas por autoridades governamentais, ao ostracismo social e à rejeição do
indivíduo contracultural por seus pares e sua família. O grau em que uma determinada
cultura foi ou é perseguida depende em grande medida do nível em que aquele
movimento pratica o ativismo social explicito e do grau de difusão de sua mensagem.
Quando a perseguição fracassa na tentativa de esmagar uma contracultura ativa, a
cultura dominante tende a assimilá-la , sutilmente enfraquecendo, distorcendo ou
mesmo algumas vezes invertendo seus memes, tirando deles seu poder subversivo. O
establishment força a incorporação do discurso contracultural em sua própria
propaganda , ao mesmo tempo em que o poder econômico reduz a arte e a estética
contracultural a mercadoria de consumo de massa. Theodore Roszak escreve em The
Making of Counter Culture que “é o experimento cultural dos jovens que
freqüentemente corre maior risco de exploração comercial – e, assim, de ter a força de
sua dissensão dissipada”. O filosofo da Nova Esquerda Herbert Marcuse chamou esse
processo de cooptação.
Por outro lado, mesmo os aspectos mais comercializados do meme contracultural
foram profundamente subversivos para os estados totalitários stalinistas que caíram no
final dos anos 1980. E mesmo nas relativamente abertas democracias empresariais a
cooptação pode sair pela culatra. Terá a comercialização da irreverência antiautoritária
por intermédio da música, da comédia, da animação infantil e de muitos outros meios
produzido uma contracultura ainda mais disseminada e sólida entre muitos dos jovens
de hoje, como pode ser visto no ceticismo, na cultura de software livre, no movimento
rave e no movimento antiglobalização da Geração X? e pode o espírito contracultural
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sobreviver à febre bélica em uma nação atacada por um inimigo invisível? Estas
perguntas continuam sem resposta.
A fuga freqüentemente é uma reação contracultural a essas dificuldades . Mesmo
quando não são forçados ao exílio, as contraculturas freqüentemente buscam maior
liberdade para explorar e viver segundo seus valores, afastando-se da cultura
hegemônica. Essa separação pode implicar isolamento geográfico ou pode ocorrer
segundo mecanismos mais sutis.
Como ocorreu com os transcendentalistas americanos antes deles, muitos membros da
contracultura jovem dos anos 1960 pegaram o caminho geográfico, estabelecendo
comunidades experimentais em regiões rurais remotas. Os escritores e artistas
americanos da Geração Perdida escolheram o exílio pleno, se transformando em
expatriados nos territórios mais sofisticados de Paris e outras regiões européias.
Outros contraculturalistas escaparam da cultura hegemônica, continuando a viver no
meio dela. Os beats se destacaram da sociedade hiperconformista americana dos anos
1950 por intermédio de um dialeto distintivo, de estilos de vestir atípicos e de uma
recusa a participar do joguinho econômico mesmo com o risco da pobreza. (Alguns
podem debochar , dizendo que os principais nomes beat acabaram conseguindo uma
situação econômica confortável como fruto de seus escritos e conferencias. Contudo ,
Allen Ginsberg foi o único que chegou a correr o risco de ter uma renda
verdadeiramente alta, e ele torrou a maior parte do seu dinheiro.) Mas a maioria dos
beats permaneceu nas cidades em vez de pegar o caminho das montanhas. Da mesma
forma, as invasões dos punks, as comunas “hippes” urbanas e a ocupação ilegal de
armazéns por participantes de raves abriram “zonas autônomas temporárias” – lugares e
momentos de autoconcedida libertação do reino das leis – no coração do poder
hegemônico.
A generosidade é outra característica importante e quase universal da contracultura.
Abraão abriu sua tenda para alimentar os pobres. O bodisatva zen leva uma vida de
trabalho , sem sucumbir à hipocrisia caritativa. Gertrude Stein e Ezra Pound deram
apoio a artistas que na Paris do inicio do século XX buscavam superar limites. As
contraculturas tendem a dar mais valor à humanidade que à propriedade, e muitas amam
acima de tudo abrir mão do que têm. Outras contraculturas exprimem sua generosidade
por intermédio do impulso prometéico de partilhar democraticamente descobertas e
intenções tecnológicas , idéias, visões e obras de arte. O famoso slogam hacker “ A
informação quer ser livre” é basicamente um conceito contracultural fundamental.
Hoje, a cultura ocidental e mundial e mundial é uma confusão de valores. Mas quem
hoje pode negar que – em meio à caótica complexidade desta Nova Desordem Mundial
– cada vez mais indivíduos ampliaram a liberdade individual de não se adequar a
convenções e de transmitir suas próprias idéias excêntricas? Antes da popularização da
internet e da grande disponibilidade de outras formas de tecnologia de comunicação, a
maioria dos cidadãos ocidentais não tinha meios adequados de se expressão, o
questionamento da autoridade, a mudança constante, a liberdade sexual e a maioria dos
outros da contraculturalidade não sejam do gosto da maioria, essas liberdades são
permitidas e estão disponíveis a um enorme número de cidadãos globais, se não à
maioria deles. Talvez a contracultura já não seja contra.
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Por outro lado, continuamos a experimentar ataques à liberdade. Conservadores
culturais estão particularmente alertas contra o sucesso conseguido pela contracultura
em afrouxar os laços da população com estruturas de crença rígidas e absolutistas. Os
conservadores consideram que esse “relativismo moral” é responsável por um vácuo
ético. Eles afirmam que em uma sociedade de massa as pessoas precisam de regras e
códigos precisos segundo os quais viver – preferencialmente estabelecidos pela
autoridade religiosa e reforçados pelo temor de um Deus julgador e punitivo. Eles
consideram que a falta de uma ideologia social claramente definida e inflexível é
responsável pela anomia social e a decadência, uso de drogas, abusos sexuais,
gangsterismo e a grosseria geral que hoje reina na cultura ocidental. Eles culpam os
anos 1960. Embora possamos relacionar muitos outros fatores que são igualmente
responsáveis por todo esse comportamento perturbado e perturbador que preocupa
qualquer um que queira viver em paz e prosperidade, e não apenas os conservadores
culturais , não podemos negar que a liberdade desempenha um importante papel em
todo esse “caos”.
Apesar da aparente adoção da doutrina iluminista da liberdade individual no século
XVIII, desde então a maioria das pessoas viveu em sociedades e comunidades que
impuseram convenções sociais muito bem definidas e ofereceram a elas papéis
produtivos para toda a vida. À medida que as convenções, os papéis, as comunidades e
as famílias que sustentaram estáveis identidades conformistas ruíram sob o poderoso
tufão do desenvolvimento tecnológico,da interpenetração cultural global e da liberdade
individual, muitos – talvez a maioria – dos cidadão pós-modernos se descobriram
perdidos. A idéia taoísta de pegar a onda da constante mudança; o método cientifico de
buscar experimentalmente o conhecimento em vez de chegar à certeza; a herança
surrealista de transformar o caos em arte e “significado sem sentido” – essas formas de
ver e ser no mundo ainda não são compreendidas pela maioria das pessoas que vivem
nas terras (relativamente) livres. E mesmo quando elas compreendem intelectualmente,
não é fácil viver verdadeiramente livre.
O verdadeiro caminho contracultural é difícil. É incerto se uma maioria pode ser feliz
em algum tempo próximo vivendo sem algum tipo de sistema de crença externamente
determinado. A libertação da certeza e dos rígidos códigos de comportamento sem
dúvida continuará a produzir confusão, inquietação e um comportamento destrutivo em
muitos. E no nível da massa, nos Estados Unidos pós-11 de setembro, todo o projeto de
espalhar e expandir as fronteiras do não-conformismo e da autonomia se tronou muito
mais complexo. Talvez o melhor que a contracultura possa esperar seja perseverar,
embora outra visão identifique oportunidades para mudanças radicais em meio à
turbulência. Qualquer que seja o caso, pegue a onda!
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