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CAPITULO I – INTRODUÇÃO

Este trabalho de monografia tem por finalidade realizar uma abordagem


acerca das alternativas de usos do território, sobretudo, tendo como ponto de
partida a análise das atividades realizadas no projeto Centro de Produção,
Pesquisa e Capacitação do Cerrado - CEPPEC, localizado no assentamento
Andalúcia em Nioaque-MS (figura 01). A leitura da relação desses sujeitos com
essa porção do território1 conquistado nos guiou para uma discussão mais ampla,
a qual apontou para o debate a respeito da constante busca da ciência geográfica
pelo projeto unitário, no sentido da polêmica abordagem “sociedade & natureza”.
Portanto, o estudo do CEPPEC buscou uma teia de possibilidades para o
encontro da dita “geografia humana” com a “geografia física” na interpretação dos
territórios em tensão na região de Nioaque.
Nesse viés de investigação, foi possível uma abordagem que apreendeu o
saber local / camponês2, concebendo uma leitura diferenciada e não pré-
direcionada que procurou outras matrizes de racionalidades, as quais se diferem
do modelo ideológico da natureza do “eurocentrismo3”, conforme aclaram Lander
(2005) e Porto-Gonçalves (2006). Cabe salientar que, assumimos uma
abordagem crítica em relação à simbiose homem & natureza, pois partimos do
entendimento de que a natureza deve ser abordada em uma perspectiva histórica,
uma vez que, em primeira instância, a forma como os homens se relacionam
entre si deve ser enxergada na análise da realidade social, entendendo o espaço
como passível de uma territorialização capitalista e, do outro lado, uma
territorialização camponesa. Por sua vez, o território assume as tensões e formas

1
Oliveira afirma que MST conquista frações, ou seja, parcelas do território, e não o território como
totalidade histórica, pois esse último se caracteriza como uma categoria mais ampla, “produto
concreto da luta de classes travada pela sociedade no processo de produção de sua existência”
(OLIVEIRA apud ALMEIDA, 2006).
2
Camponês é aquele que é dono da terra e nela trabalha com a família, embora produtor de um
modo de vida, possuí uma diversidade de lutas que o caracteriza no território nacional, podendo
ser identificado como ribeirinho, assentado, quilombola, seringueiro, colono, pequeno proprietário,
etc. (ALMEIDA, 2003).
3
Estamos entendendo o eurocentrismo, como um conjunto de idéias e/ou ideologias, que buscam
colocar o pensamento europeu, branco e ocidental, na condição superior a quaisquer outras
formas de pensar o mundo. Logo, é preciso romper com essa natureza “mercadoria” do mundo
ocidental, para se entender uma outra natureza que está inscrita no pensamento das populações
camponesas.
15

próprias deste embate entre a paisagem da reprodução da vida (camponesa) e a


paisagem do agro(hidro)negócio.
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17

No campo dos saberes, se fez necessária a problematização do debate


acerca da constante tentativa das formas “ditas avançadas e modernas” de
produção, subordinar e deslegitimar os saberes/conhecimentos locais,
principalmente na questão ambiental. Subordinação inerente ao próprio discurso
hegemônico do projeto civilizatório, que promove a ciência moderna, em detrimento
dos saberes “marginalizados”. Estabelecendo, por intermédio da técnica, uma
relação de poder para com essas populações que vivem da sua criatividade no
transformar cotidiano dos recursos naturais.

É nesse viés que Foucault apud Leff (2007) elucida que o “ambiente” do
pensamento moderno-colonial emerge impulsionado pelas diferentes ordens do real
que foram externalizadas e dos “saberes” subjugados pelo desenvolvimento das
ciências modernas e das formas produtivas, sendo regido pelo capital (valor de
troca), prontamente tomado pela racionalidade econômica e acumulativa. Em um
empenho metodológico, Leff (2007) reforça que o saber ambiental tem que partir de
um esforço, no sentido de reconhecer as identidades dos povos, suas cosmologias e
seus saberes tradicionais como parte de suas formas culturais de apropriação de
seu patrimônio de recursos naturais. Estes saberes se inscrevem dentro dos
interesses diversos que constituem o campo conflitivo do ambiental, logo é nesse
processo que nascem as subjetividades na produção de saberes, sobretudo no
cotidiano do “viver”, “do saber - fazer” e de se apropriar do ambiente em uma
simbiose diferenciada. O que dentro da ciência geográfica possibilita a leitura das
diversas formas de uso do território, nesse estudo em particular o território
camponês (re-existência da vida) antagônico à territorialização do agro
(hidro)negócio.
É nesse rumo que Escobar (2006) adverte que o campo de análise da relação
homem e meio, deve ser enxergado para além de uma leitura cartesiana, e que essa
opção implica no entendimento de outras formas de experimentar o natural e o
biológico. Compartilhando de idéia parecida, Porto-Gonçalves (2008) elucida que
esses recortes territoriais estão plasmados em um viés intrínseco à própria
reprodução do modo de vida, onde não se contrapõe ambiente e homem, pois a
“natureza está no homem e o homem está na natureza”.
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Essas populações camponesas, ao contrário dos monocultivos,


vivem da sua criatividade cultural e da produtividade biológica
primária que a natureza oferece – biomassa – fazendo uma
agricultura diversificada, ainda que, muitas vezes, sobrevivendo em
condições piores do que poderiam caso houvesse um conjunto de
políticas que pusesse em diálogo a ciência convencional com essa
ciência da tradição, como chamam alguns pesquisadores. As áreas
onde hoje estão as maiores disponibilidade de bens genéticos
(germoplasma), ou seja, as áreas de maior diversidade biológica são
áreas ocupadas por populações camponesas e/ou por populações
cultural e etnicamente diferenciadas, como os quilombolas e povos
originários. Insistimos que a ideologia e o imaginário conformados
em torno de uma presumida superioridade epistêmica, cultural e
religiosa européia tende a deslegitimar essas populações tratando-
as como inferiores e como estorvo ao seu progresso e ao seu
desenvolvimento, assim como tratam a natureza como algo a ser
dominado. (PORTO-GONÇALVES, 2007, p. 02).

Portanto, essas formas de pensar do mundo-moderno-colonial não se dão


sem questionamentos e conflitos, pois com a conquista dos assentamentos, o modo
de vida camponês4 vai sendo resignificado na luta para na terra permanecer. Nesta
luta, para defender sua renda, o campesinato forja condições diante das armadilhas
do mercado, nesse caso de resistência, podemos citar a ação do CEPPEC quando
busca agregar valor ecológico em seus produtos. Logo no campo das tensões das
territorialidades antagônicas, (re)surgem formas de (re)existência5, portanto de usos
diferenciados do território, os quais vão na contra- mão do modelo agrário-agrícola
vigente.
Nesse contexto, o CEPPEC se apresenta como um projeto estratégico na
medida em que possibilita a manutenção da economia doméstica camponesa com a
conciliação de atividades de lavoura de auto-consumo, junto com atividades como o
extrativismo, turismo rural e o artesanato.

4
Teodor Shanin entende o campesinato como um modo de vida, pois o teórico parte da idéia de que
a classificação desse sujeito não parte de uma premissa marxista, e sim de um fundo antropológico.
O autor salienta que se o camponês é uma classe ou um modo de vida, vai depender das condições
históricas. (apud PAULINO, FABRINI, 2008).
5
Trocadilho feito por Porto-Gonçalves para definir o ato da existência da vida camponesa no
processo de territorialização e monopolização do capital, que nesse caso se caracteriza como uma
luta cotidiana para permanecer na terra conquistada.
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1.1- Objetivo
A pesquisa objetivou a discussão e investigação de como se dá, no interior da
reprodução da vida camponesa, a conciliação das atividades tradicionalmente
camponesas, como o cultivo de milho, feijão e outros elementos do roçado
camponês, com práticas alternativas como o extrativismo e as atividades de
agregação de valor ecológico conduzidas pelo CEPPEC. E que se expressam na
compra do barú em lotes do assentamento Andalucia, gerando renda para as
famílias produtoras do barú, ao passo que impede a derrubada do cerrado, uma
pratica anteriormente comum para produção de carvão. Portanto, procuramos
entender o funcionamento da economia camponesa, juntamente com as formas de
uso alternativo dessa porção do território (ambiente).
Nessa perspectiva, cabe elucidar que a reprodução da agricultura
camponesa, por intermédio da implantação de assentamentos em Mato Grosso do
Sul, tem se destacado como uma política tanto de cunho social como de
desenvolvimento econômico. Neste sentido, se torna interessante sublinhar que, até
o momento, o Estado possui 191 assentamentos, com 28.669 famílias beneficiadas,
numa área de 656.905,0075 ha. (INCRA, 2009)6.
Portanto, com esse número significativo de assentamentos em Mato Grosso
do Sul, torna-se necessário nesse momento, pós-processo de divisão dos lotes,
averiguar a relação assentado e ambiente, pois é dessa simbiose que se dá o
desenvolvimento sócio-econômico dos assentados e até mesmo a sua permanência
no lote. Nesse sentido, conforme supracitado, as análises foram pautadas a partir da
perspectiva do CEPPEC, em que se procurou entender as significações que a terra
e, consequentemente, o ambiente têm para o sujeito camponês assentado (sujeito
da pesquisa).

1.2- Metodologia

A monografia em questão focou-se na percepção dos assentados acerca do


ambiente em que vivem, na qual se partiu de uma análise que considera o “saber
camponês” como fator essencial para a compressão da realidade sócio-ambiental

6
Obs. Atualizado em 28/04/2009. Divisão de Desenvolvimento de Projetos/SIPRA.
20

presente no assentamento Andalucia. É, portanto, neste arcabouço teórico-


metodológico que focamos a pesquisa. E como caminho para atingir nossos
objetivos, utilizamos questionários estruturados e entrevistas gravadas. Os
questionários estruturados tiveram como foco principal, as atividades camponesas e
suas interfaces com o ambiente, a fim de apreender a racionalidade ambiental dos
sujeitos entrevistados.
Foram entrevistadas 19 famílias, as quais se dividem em 2 categorias a
saber: Membros permanentes7 e colaboradores8 no assentamento Andalúcia. O
critério divisão proposta, partiu da perspectiva de apreender a percepção não
somente dos membros permanentes que vivem cotidianamente a busca de uma
mudança da relação com a natureza, mas entender também a percepção das
pessoas que estão fora da associação e que não estão inseridas diretamente nesse
processo de construção do CEPPEC.
Por sua vez, o questionário teve como modelo a pesquisa desenvolvida nos
assentamentos da microrregião de Três Lagoas por Almeida (2006). Sendo que, as
entrevistas foram produzidas/conduzidas na busca da apreensão da percepção
ambiental dos assentados tendo como alicerce as contribuições teóricas de Guerra
(1998); Mendonça (2004); Porto-Gonçalves (2006). Autores que, de forma geral,
apontam a especificidade da ciência geográfica na leitura da relação homem e meio
e para a necessidade de se pensar a problemática ambiental como algo concreto
inserido nas relações cotidianas do sujeito, uma vez que é desta consciência
espacial/ambiental que nasce a mudança.
Cabe relatar, que essa construção se deu na busca e no entrelace de outras
perspectivas de abordagem do ambiente além da geográfica, as quais estão
materializadas nas contribuições teóricas de Leff (2007), Altieri (2005), Guzmán
(2006) e Lander et al. (2005).

7
Esses sujeitos se situam como participantes permanentes, ou seja, trabalham diretamente nas
frentes do CEPPEC, como: tingimento de tecidos, beneficiamento do cumbarú, tecelagem entre
outras atividades de geração de renda para o grupo pesquisado.
8
São sujeitos que de alguma forma estão relacionados às práticas do CEPPEC, seja por meio da
venda de matéria prima para o projeto (leite, barú, pequi), ou ainda com ações de recuperação de
nascentes e de conscientização ambiental, sendo esse último um trabalho educacional desenvolvido
na escola do assentamento ( casa do conde espanhol).
21

CAPÍTULO II - QUESTÃO AGRÁRIA/AGRÍCOLA EM MATO GROSSO DO SUL - O


REINAR DO LATIFÚNDIO.

2.1- A Essência do latifúndio até a emancipação em (Mato Grosso) do Sul.

Para uma discussão consistente do projeto em questão, torna-se essencial o


desvendamento das raízes do latifúndio no Brasil e em Mato Grosso do Sul. Nesse
sentido, é preciso entender o processo que permite aos latifundiários deter em suas
mãos cerca de 5 milhões de hectares de terras devolutas9 em Mato Grosso do Sul
(as quais representam 38% sobre as terras devolutas da região centro-oeste) e os
alarmantes 8,5 milhões de hectares de terras improdutivas conforme aponta Oliveira
(2008).
A apropriação e o monopólio da terra sul-mato-grossense foram legitimados
antes mesmo da criação do estado, como aponta Fabrini (2008). Para este autor o
Mato Grosso do Sul foi criado para as oligarquias locais. Logo, se destaca nessa
monopolização do território a Cia. Mate Laranjeira como um dos principais agentes
dessa raiz concentradora.

Neste processo, destaca-se o monopólio da exploração de erva-


mate pela Cia. Mate Laranjeira no sul do Estado. A atuação da Cia.
Mate Laranjeira não permitiu o desenvolvimento de pequenas
propriedades, nem mesmo para que os pequenos proprietários
servissem como mão-de-obra na coleta de erva-mate. (FABRINI,
p.55, 2008).

No tocante da questão agrária, cabe relatar que a essência do latifúndio no


estado, assim como no país, está presente desde a colonização, pois já vem deste
período as disputas pelo território, neste caso entre portugueses e espanhóis
entorno da linha divisória de Tordesilhas.
Para uma pequena abordagem histórica dos elementos que contribuíram para
moldar a fisionomia do latifúndio em Mato Grosso do Sul, optamos por privilegiar os
momentos mais cruciais da história do estado, entretanto sem perder de vista a
dimensão de que a realidade é processual.

9
Lembrando que terras devolutas devem obedecer o que reza o Art.188 da Constituição Brasileira
que diz o seguinte: “A destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com política
agrícola e com o plano nacional de reforma agrária”.
22

O histórico de ocupação do estado tem como marco preponderante as


primeiras penetrações do gado em fins do século XVIII. Segundo Sodré, apud Bittar
(1997), Minas Gerais sempre teve relações com história sul-mato-grossense, nesse
sentido houve predominância de marchas do rebanho mineiro para o oeste10, a fim
de se estabelecer nas fartas pastagens do centro-oeste, sobretudo em solo
matogrossense. Com a entrada pastoril, começa se projetar uma nova fisiologia
econômica e social no espaço agrário do estado.
Os chamados “chapadões de vacarias” na primeira metade do século XIX se
transformaram em um núcleo polarizador e concentrador de rebanhos. Nesse
processo de estabelecimento da boiada é que surgiram as primeiras fazendas e os
focos iniciais para a expansão do uso da terra nos campos que outrora foram
percorridos pelos bandeirantes no ciclo das penetrações paulistas, conforme aclara
Bittar (1997). Este processo já esboça a representação da terra monopolizada tão
cara às populações11 já existentes no cerrado e aos pobres da terra atualmente.
Para Almeida (2006), o processo de povoamento do Mato Grosso do Sul
(antigo Mato Grosso) possui uma dimensão paradoxal representada pela Guerra do
Paraguai, uma vez que no inicio ela foi a principal motivadora da estagnação do
povoamento, passando a ser fonte de expansão a partir de 1856 com o sistema
comercial da província de Mato Grosso articulado a partir da navegação do Rio
Paraguai até Corumbá, única via de comunicação entre as cidades platinas e a
capital da província. Redesenhando novos contornos sócio-econômicos para a
região.
Cabe salientar que após o decreto da lei de terras de 1850, a terra no Brasil e
em Mato Grosso do Sul perde o seu caráter de posse, para se tornar uma
mercadoria, portanto o que despontava como um monopólio territorial se intensifica
com a possibilidade de compra das grandes terras.
Remontando a idéia, a qual se iniciou o capitulo vigente, a companhia Mate-
Laranjeira contava com forte monopólio de terras no sul de Mato Grosso, nesse

10
Sodré elucida que essas áreas de expansão da fronteira da pecuária reuniam características
geográficas ideais para a criação bovina. Tal fato pode ser evidenciado quando analisa os fatores
ecológicos do cerrado, pois sua vegetação arbustiva e seu pouco gradiente de declividades são
fatores positivos para a pecuária extensiva. (Ab’ Saber, 2007)
11
Lembrando, conforme elucida Brand et al., as concessões feitas à Cia. Matte Laranjeira atingiram
em cheio o território dos Kaiowá e Guarani conforme palavras do autor.
23

sentido após a lei de terras, sua territorialização se deu por meio de arrendamentos,
os quais dependiam diretamente de alianças, logo a participação da família Murtinho
nos negócios do mate, veio consolidar a relação “terra e poder”, pois se caracteriza
como o encontro das oligarquias locais com o poder político, a fim de impor seus
interesses pessoais. Esse processo de monopolização territorial impedia qualquer
brecha para a consolidação da pequena propriedade na região, a qual naquele
momento sofrera investida dos migrantes do sul do país.
Cabe ressaltar que a construção da ferrovia Noroeste Paulista trouxe novas
perspectivas para a então “parte sul” de Mato Grosso, pois com essa obra foi
possível às oligarquias, a valorização de suas terras por meio da absorção de renda
diferencial12, capitalizando- se conforme afirma Fabrini (2008).

A construção da Ferrovia Noroeste do Brasil contribuía para


consolidar a “vocação” pecuária de Mato Grosso do Sul,
principalmente nas áreas próximas aos trilhos da ferrovia. A ferrovia
também provocou mudanças nos preços da terra; as cidades por
onde passavam os trilhos ganharam novo impulso, como foi o caso
de Campo Grande, Miranda e Aquidauana.(FABRINI, 2008 p.64).

Segundo Bittar (1997), não havia um consenso em relação às idéias


autonomistas, ou seja, a separação e criação do Estado de Mato Grosso do Sul.
Havia apenas alianças fixadas entre Cuiabá e as Oligarquias do Sul, as quais eram
alicerçadas na defesa de interesses políticos e na manutenção do latifúndio. Nesse
viés, torna-se interessante destacar que os membros da oligarquia matogrossense
estavam em conflito, ora para defender seus interesses regionais ou, até mesmo,
para defender os interesses dos membros do governo em Cuiabá. Um exemplo
citado por Bittar (1997), o qual pode trazer a dimensão paradoxal desses interesses,
reside na análise do conflito armado entre Mascarelhas e Muzzi13, pois objetivando
defender os interesses de Ponce, Mascarelhas vence Muzzi e destrói suas
propriedades.
Posteriormente, em 1932, nasce a liga Sul-Mato-Grossense, a qual era
caracterizada pela não ruptura com as conhecidas famílias Oligárquicas, logo a

12
Nesse caso como elucida Oliveira (2007), a renda pode ser classificada por “ renda diferencial I”,
tendo a localização das terras como elemento principal.
13
Segundo BITTAR, João Caetano Teixeira Muzzi possuía grande quantidade de terras em Nioaque,
o local da referida pesquisa.
24

combinação terra/poder se perpetuaria como uma constante política econômica no


sul de Mato Grosso. Torna-se interessante notar que o movimento emancipatório
não reúne elementos para uma insurreição que possa promover ao menos
equidade. Dessa forma, segundo Bittar, a luta estava pautada na defesa do poder
local.

Nunca houve esse “ódio” entre os habitantes do sul, do centro e do


norte. Tanto é verdade que durante quase um século em que a
causa separatista fecundou, a história não registrou qualquer tipo de
confronto físico entre grupos, a não ser entre chefes políticos.
Porém, mesmo neste caso, a razão principal dos choques não era a
divisão do estado. Nenhuma forma de extermínio físico,
discriminação ou constrangimento, como as que se verificam
historicamente em episódios separatistas ou naqueles que envolvem
ódio racial, ocorreu entre “cuiabanos” e sulistas. “O alegado “ódio”
era um recurso de retórica e para usar os termos do próprio
manifesto, mais ficção” do que realidade. (BITTAR 1997, p.182)

Como se observa nas palavras de Bittar (1997), a preocupação em criar o


Estado de Mato Grosso do Sul reside mais nos conflitos entre oligarquias (famílias),
do que necessariamente na idéia de “liberdade” e autonomia disseminada no
período. Portanto, como já posto em questão, apenas a sustentação da hegemonia
regional por meio da combinação “terra e poder” vai norteiar as intenções
emancipatórias.

2.2- Autonomia da federação, preservação do latifúndio e “mais do mesmo”.

Para as oligarquias do sul (de Mato Grosso), não adiantava somente exercer
o poder político em Cuiabá, haja vista que as divisas econômicas oriundas do sul
continuariam a suprir o governo central do norte. Portanto, a fim de impedir essa
transferência de riqueza, a ruptura se apresenta como imprescindível e inevitável
para aquele momento político, social e econômico do estado. O que acabara
acontecendo posteriormente em 1977, por meio da Lei complementar Nº.31 de 11
de outubro de 1977. Cabe aludir, que o processo de emancipação foi realizado nos
bastidores e no silêncio do poder, portanto sem a participação da população.
Essa divisão veio consolidar o “útil ao agradável”, pois além de satisfazer
anseios das oligarquias sulistas, fundamentou o projeto geopolítico do governo
25

militar de ocupar os “espaços vazios” e consequentemente submeter o território a


um controle mais ostensivo.
Nesse novo momento de divisão do estado, a essência do latifúndio continua
muito viva, pois os elementos fundantes como “os laços parentais” e a
monopolização do solo, permitem afirmar que estado foi construído para as
oligarquias existentes, havendo no poder político um tipo de revezamento entre
essas oligarquias estaduais conforme elucida Almeida (2006).

A classe dos proprietários de terra tratou de açambarcar o poder


político no Estado recém-criado e estabeleceu um tipo de
revezamento no poder que durou até 1998; inicialmente, em 1979,
com a nomeação de Marcelo Miranda e, depois, Pedro Pedrossian
(1980-1983). A partir das primeiras eleições, em 1983, assume
Wilson Barbosa Martins. Novamente, em 1987, temos Marcelo
Miranda; em 1991, volta Pedro Pedrossian. O ciclo fecha, em 1995,
com o retorno de Wilson Barbosa Martins. (ALMEIDA, 2006b,
p.117).
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CAPÍTULO III - ESPACIALIZAÇÃO E TERRITORIALIZAÇÃO CAMPONESA EM


MATO GROSSO DO SUL: POR UMA GEOGRAFICIDADE CAMPONESA

3.1- A difícil abertura da brecha camponesa em Mato Grosso do Sul (antigo


Mato Grosso)

Ao campesinato sul-mato-grossense pouca coisa restou em termos de


políticas públicas que permitissem sua recriação (Almeida, 2006). Ou seja, desde o
primeiro momento não houve uma brecha que possibilitasse sua entrada na terra. A
monopolização das terras pela da Cia. Matte Laranjeira desponta como exemplo
dessa política de priorização da grande propriedade em detrimento da
democratização do acesso à terra. Isso se deve também, de maneira indissociável,
às manobras do Estado no sentido de permitir a venda e arrendamento de terras
públicas. Nesse quadro, apresentam-se as empresas de colonização, as quais
gozam no período de grande privilégio na compra de terras públicas, que mais tarde
eram revendidas. O grupo SOMECO (Sociedade Melhoramentos de Colonização) e
a Colonizadora Vera-Cruz-Mato Grosso, dentre outros, se destacaram na
comercialização de terras em Mato Grosso do Sul. Para a pequena propriedade, foi
efetivada a colonização estatal por intermédio da CAND (Colônia Agrícola Nacional
de Dourados) em 1943, política territorial que depois não obteve sucesso por falta de
recursos financeiros aliado ao isolamento.
No quadro 01, Alves apud Fabrini (2008), apresenta números interessantes
para a análise da questão da apropriação privada da terra em Mato Grosso do Sul.

Quadro 01- Número de Títulos e Concessão de Terra Expedida pelo Estado


Discriminação 1908 1914 1921 1926 1929
Tit. Provisórios 49 126 183 89 107
Área.Abrangida(ha) 101.973 318.398 402.362 200.002 223.395
Área Média 2.081 2.527 2.199 2.247 2.088
Tit. Definitivos 25 17 50 76 61
Área.Abrangida (ha) 121.002 386.732 340.200 427.179
Área Média 8.840 7.735 4.476 7.003
Conc. Gratuitas 4 51
Área.Abrangida(ha) 700 2.950
Área Média 50 58
Fonte ALVES apud FABRINI: 2008, p. 61.

O quadro 01 explicita com muita propriedade a situação do campesinato no


começo do Séc. XX em Mato Grosso do Sul, pois se pode observar que foram
concedidos, por meio da compra em 1914, um total de 140 títulos entre provisórios e
27

definitivos, por outro lado neste mesmo período tivemos apenas 4 títulos concedidos
gratuitamente para áreas consideradas pequenas em relação as demais. Já em
1921, foram concedidos 233 títulos provisórios e permanentes, abrangendo uma
área total de 789.094 ha. Tais números mostram a dimensão trágica referente ao
não-lugar do campesinato sul-mato-grossense e é nesse sentido que se acirram as
contradições e o latifúndio permanece, porém, não sem questionamento.

3.2- A luta pelo chão camponês


A figura do camponês sul-mato-grossense é personificada principalmente pelo
trabalhador despossuído da terra. Tal situação, segundo Fabrini (2008), decorre de
vários fatores, entretanto, o principal elemento que configura essa situação de
fechamento das terras para essa classe, reside no processo de ocupação do
Estado, e sucessivamente na grande concentração fundiária. Posteriormente, o que
se denomina de modernização conservadora, será outro elemento complementar de
expropriação contra aqueles poucos camponeses que, lutando contra as condições
objetivas, conseguiram o seu pequeno sítio.
O camponês sul-mato-grossense é caracterizado como aquele, ou aquela
pessoa desprovida de terras, vagantes, cuja relação de pertença com a terra foi
construída precariamente, seja na condição de empregado temporário, posseiro ou
até mesmo arrendatário. Em boa parte têm suas origens em outros estados14 da
federação, conforme mostra o gráfico-01 sobre naturalidade das pessoas
entrevistadas no assentamento Andalúcia, em Nioaque. Pode-se verificar que 47%
dos entrevistados são originários de Mato Grosso do Sul, em seguida temos 32%
cuja origem é o Estado do Paraná. Sobre este Estado cabe relatar que esse
processo migratório pode ter uma relação direta com modernização conservadora, a
qual teve grande papel na expropriação dos pobres da terra no Paraná, os quais
viram a possibilidade de possuir sua terra em Mato Grosso do Sul e no Paraguai,
para retornar posteriormente por meio do movimento conhecido como “Brasiguaios”
na década de 1980. O mesmo processo de expulsão-migração se aplica para São
Paulo com 11%, Minas Gerais 5% e Rio Grande do Sul 5%. Como já aclarado, no

14
Mesmo tendo o Estado de Mato Grosso do Sul como origem, grande parte dos entrevistados são
mineiros e/ou gaúchos, ou ainda filhos de mineiros.
28

Estado houve grande migração de mineiros no período da expansão das pastagens


e na implementação de maciços florestais.
Gráfico 01- Naturalidade do Entrevistados no Assentamento Andalucia.

47%

32%

11%
5% 5%

MS PR SP MG RS
Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

O acirramento em Mato Grosso do Sul dessa condição de desprovido da


terra, se dá a partir do momento em que os trabalhadores não são donos da terra,
mas trabalham na condição de arrendatários na abertura e derrubada das matas e
formação das pastagens para os fazendeiros de São Paulo e Minas Gerais. Nesse
sentido, as palavras de Fabrini elucidam o começo do acirramento em relação ao
uso e posse da terra em Mato Grosso do Sul. Com destaque, nesse processo de
luta, para a imagem dos arrendatários que expulsos das fazendas, ocupam áreas
próximas às propriedades Bulle e Baunilha em Itaquiraí.

O anúncio desse projeto15 foi feito com grande propaganda por parte
do governo. Nesta mesma época, os camponeses despossuídos da
terra de vários municípios da região ocuparam a área intermediária
entre as fazendas Bule e Baunilha, em Itaquiraí. Uma das
estratégias dos camponeses foi utilizar o nome e o símbolo do
projeto (enxada encabada) do Projeto, construindo uma grande
placa, instalada próximo ao acampamento. (FABRINI, 2008, p.72).

Após três dias de espacialização da luta, foi realizada a retirada das famílias
com ostensivo aparato policial.

15
Segundo FABRINI (2008), o Projeto Guatambu, foi lançado logo depois da nomeação de Pedro
Pedrossian pelo o governo no inicio da década de 1980. O projeto tinha objetivo de melhorar a
rentabilidade e a organização da produção agrícola, com assistência técnica, mecanização,
fornecimento de insumos.
29

Espacializar é registrar no espaço social um processo de luta. É o


multimensionamento do espaço de socialização política. É
“escrever” no espaço por intermédio de ações concretas como
manifestações, ocupações e reocupações de terras, etc. É na
espacialização da luta pela terra que os trabalhadores organizados
no MST conquistam a fração do território e, dessa forma,
desenvolvem o processo de territorialização do MST.
(FERNANDES, 1996, p.136).

Outro processo de espacialização camponesa importante foi aquele realizado


por arrendatários do município de Naviraí, em 1980. Seguindo o que já comentamos
anteriormente, esse processo também ocorreu em vista da expulsão destes sujeitos
pelo fazendeiro, após a derrubada da mata. No seio dessa injustiça, nasce a luta
contra os donos das fazendas Água Doce, Jequitibá e Entre Rios devido às
irregularidades no contrato de arrendamento. No mesmo ano, a justiça deu ganho de
causa aos arrendatários da fazenda Jequitibá16, deixando os camponeses
permanecerem durante mais um ano.
Vale sublinhar, que uma passagem de grande importância para a história de
lutas em Mato Grosso do Sul, foi a ocupação da gleba Santa Idalina de propriedade
da SOMECO em 1984, já que esse processo traz a tona a necessidade de
democratização de acesso à terra, que estava abafada no período militar. Portanto,
essa espacialização desponta como fato fundante da contínua luta pela terra em
Mato Grosso do Sul conforme aponta o gráfico 02.
A partir da ocupação da fazenda Santa Idalina, a luta ganha outros
horizontes, pois até aquele momento os movimentos dos arrendatários em suas
estratégias priorizavam os limites institucionais, com negociação e batalha jurídica
pela desapropriação e permanência na terra. Com a ocupação do latifúndio, um
novo horizonte de luta pela reprodução da vida ganha espaço, pois nesse novo
momento os sem-terras organizados pela CPT e MST, com a sua essência
“rebelde”, ultrapassam as barreiras legais da institucionalidade. Nesse sentido,
destaca-se junto com a ocupação o acampamento, juntos ganham grande
importância para edificação da consciência dos camponeses.

16
Após as reivindicações de desapropriação da Fazenda Jequitibá, a situação se acirra com
destruição da roça camponesa e com a morte do advogado dos arrendatários, nesse momento fica
nítido o recrudescimento da violência.
30

Consequentemente, com o passar do tempo a luta ganha força e se espalha


pelo Estado, pois as chamadas “barreiras legais”, defesa da propriedade privada já
não representavam empecilho para o questionamento do latifúndio no Brasil e em
Mato Grosso do Sul.

Gráfico 02 - Mato Grosso do Sul - Número de Ocupações 1988-2007.

As ocupações, conforme mostra o gráfico 02, aumentam ao longo dos anos,


porém num movimento não linear. Vamos ter inicialmente 4 ocupações em 1988,
em seguida, em 1989, um aumento para 6 ocupações. Já em 1990 houve
diminuição. No último período mencionado, década de 1990, o Brasil e os
movimentos passam por uma grande expectativa política, pois além de simbolizar a
“redemocratização” do país, temos a possibilidade da tomada de poder pelo então
candidato operário Lula, o que não aconteceu de fato.
A tímida evolução no quadro da questão agrária sul-mato-grossense fica
nítida quando se analisa o gráfico 03, pois no período de 1985 a 1990 foram
implantados 19 projetos de assentamentos que representam apenas 11% do total de
assentamentos, estes projetos beneficiaram 4280 famílias, ou seja, uma média de
225 famílias assentadas por ano no governo Sarney. Cabe relatar que o governo
estadual não implantou nenhum projeto de assentamento nesse período.
31

Gráfico 03- Mato Grosso do Sul- Número de Assentamentos Rurais.

O período de 1990 ao final de 1994 é marcado pela diminuição brusca da


territorialização camponesa. Nesse sentido, vale aclarar que foi implementado um
total de 3 assentamentos, ou seja, apenas 2% do total apresentado pelo gráfico,
beneficiando apenas 410 famílias. Tal número negativo reflete o período conturbado
vivido na época (Governos Collor e Itamar Franco), caracterizado como um período
muito difícil para os movimentos de luta pela terra.
O período compreendido de 1995 ao final de 2002, apresenta uma evolução
no quadro agrário sul-mato-grossense, pois nesse período foram implementados 94
projetos de assentamentos, os quais favoreceram 12.677 famílias, portanto com
uma média de 1568 famílias assentadas por ano.
Torna-se mister aclarar que o processo de implementação dos projetos de
reforma agrária, não pode ser interpretado como um mérito da instituição Estado
brasileiro, mas sim, como uma série de processos, os quais são resultados da luta
cotidiana dos pobres da terra para a (re)criação camponesa, por intermédio da
espacialização da luta e posterior territorialização na terra de trabalho17, como nos

17
Aqui estamos trabalhando com os conceitos de Martins (1991), o qual aponta que a terra de
trabalho aparece como basilar para a reprodução e manutenção da família camponesa, pois quando
o trabalhador se apossa da terra, esta se transforma em terra de trabalho. No outro extremo, é
compreendida como terra de negócio a fração espacial apropriada pelo capital, a qual se caracteriza
32

alerta Fernandes (1996). Tanto faz sentido essa afirmativa, que a partir de 2001, os
números de ocupações (Gráfico 02) e de implementação de assentamentos rurais
em Mato Grosso do Sul (Gráfico 03) mantem uma relação próxima e explicam que
para existir reforma agrária tem que existir luta pela terra. É interessante destacar
que este decréscimo nas espacializações neste período e, consequentemente, nas
territorializações se deve principalmente à medida provisória nº. 2027, a qual em seu
Art.4º, parágrafo sexto e sétimo informam que:

O imóvel rural objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por


conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado nos dois
anos seguintes à desocupação do imóvel.

E ainda no parágrafo 7º:

Na hipótese de reincidência da invasão, computar-se-á em dobro o prazo a


que se refere o parágrafo anterior.

A medida provisória nº. 2027, como observado nos gráfico - 02 e 03, foi de
grande impacto para os movimentos sociais de luta pela terra, pois essa manobra do
governo FHC veio com a função de “criminalizar” os movimentos sociais, sobretudo
aqueles com o histórico de ações mais efetivas contra o latifúndio, por exemplo o
MST. Cabe relatar, que essa MP exibe sua face contraditória, a partir do momento
que livra o latifúndio de fiscalização, legitimando a contra-reforma agrária.
No período citado de 1995 a 2007, o governo estadual instalou somente 8
assentamentos, os quais favoreceram apenas 694 famílias. Cabe ressaltar que
mesmo tendo quebrado o ciclo de governo das famílias ligadas às oligarquias com a
eleição do Zeca do PT em 1999, na câmara dos deputados persiste um forte lobbie
político relacionado à aliança terra e poder. Nesse sentido, continuou predominando
a essência da ideologia burguesa local, dando continuidade as raízes e essência do
latifúndio, ou o “poder do atraso” como elucida José de Souza Martins.
No período de 2003 a 2007, no governo Lula, a territorialização camponesa
teve uma leve queda de 2002 para 2003, entretanto retoma um crescimento até

pela exploração do trabalho alheio ,portanto assentadas nos pilares da mais-valia. Nesse sentido,
distinguindo como regimes distintos de propriedade.
33

2005, tendo uma queda em 2006 e retomando novamente o crescimento em 2007


(gráfico 03).
Conforme ilustrado no gráfico 04, 95% das pessoas entrevistadas faziam
parte (ou fazem) do movimento dos trabalhadores rurais sem-terra, e apenas 5%
faziam parte da FETAGRI. Cabe ressaltar que o MST teve grande presença na
territorialização camponesa18, principalmente em áreas do Sul do estado e no oeste.

Gráfico 04- Organização de origem da luta pela terra dos Entrevistados no


Assentamento Andalúcia.

95%

5%
0

Fetagri MST CUT


Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Os dados do mapa-01 são bastante elucidativos em relação à espacialização


da luta pela terra em Mato Grosso do Sul, pois se pode verificar que essa luta está
pautada em ocupar áreas onde realmente há possibilidades reais de conquista da
terra. Dessa forma, as áreas ligadas ao agronegócio, como o grande corredor do
bolsão sul-mato-grossense até o norte do estado (entre o eucalipto e a soja), são
áreas onde a luta pela terra (ocupações) se dá com menor freqüência, portanto há
uma estratégia por parte dos movimentos sociais em pautar suas lutas em
determinadas áreas. Logo, essas lutas se espacializam em locais onde há melhores

18
Logicamente, que não cabe aqui um julgamento em relação as formas de luta pela terra, pois há
uma distinção dessas formas, porém o mais importante é a distinção feita a partir do sujeito da luta
conforme elucida Almeida (2006). O número aludido, não visa apresentar uma presumida
superioridade do MST, mas sim exprime um número do universo de entrevistados, os quais foram
ouvidos de forma aleatória independente da origem de organização de luta pela terra conforme já
aclarado na metodologia.
34

condições de fomento à reforma agrária, vide exemplo assentamentos dos territórios


do MDA19.

No sentido da diversidade da luta pela terra, o Assentamento Andalúcia tem a


sua origem alicerçada na luta camponesa por meio da espacialização de 3
acampamentos (MST, FETAGRI e CUT). Segundo depoimentos dos entrevistados,

19
Oliveira (2007) lembra que a política de reforma agrária do governo LULA está marcada por dois
princípios: Não fazê-la nas áreas de domínio do agronegócio e, fazê-la nas áreas onde ela possa
“ajudar” o agronegócio.
35

todas as lutas são fortes constituintes para a conquista da terra e sucessivamente


para a permanência no sítio camponês.
36

CAPÍTULO IV - QUESTÃO AMBIENTAL PARA ALÉM DE UMA LEITURA


CARTESIANA.

A construção teórico-metodológica proposta, busca uma abordagem da


questão ambiental em sua essência no mundo capitalista, ou seja, procura entender
os elementos chaves que permitem conceber as questões locais na sua interface
com as relações do sistema-mundo-moderno-colonial (Porto-Gonçalves, 2006).
Nesse sentido, a Geografia como ciência pode oferecer muitos subsídios para o
entendimento da questão ambiental contemporânea, sobretudo tendo o território
como o epicentro da discussão, uma vez que o mesmo pode representar a
materialidade reproduzida pelos conflitos antagônicos advindos dos sujeitos que
conformam a sociedade. Logo, o pensamento de Porto-Gonçalves é bastante
elucidativo, pois visa esclarecer o importante papel do território como categoria
analítica para o viés sócio-ambiental.

O território é uma categoria analítica que nos remete à inscrição da


sociedade na natureza e, assim, nos obriga a considerar as relações
sociais e de poder que estão imbricadas na relação das sociedades
com a natureza. A problemática ambiental ganha maior consistência
quando analisada a partir do território, das territorialidades e dos
processos de territorialização. (PORTO-GONÇALVES, 2006, p.38)

Outro fator observado para a leitura da problemática estudada reside no


questionamento da ideologia construída em torno da natureza (a-natural) do
eurocentrismo, uma vez que esse caminho pode contribuir para nos desviarmos do
caminho simplista que nos é oferecido pelas ideologias20. Portanto, esse desvio nos
permite lograr uma leitura crítica, a qual se sustenta em um entendimento da
problemática ambiental como um conflito de ordem moral, ética e política na qual a
sociedade está imbricada e, consequentemente, o território nas suas várias escalas
de análise.
Como já esboçado outrora, o olhar acerca das várias escalas geográficas de
análise permite a dialética do “ir e vir” na leitura do território e suas ramificações no
sistema “globalitalista”, ou seja, composto de uma geopolítica empreendida,

20
Essas ideologias podem ser materializadas pelos grandes veículos de comunicação, os quais têm
seus discursos pautados em um ecologismo simplista, portanto procurando mascarar a luta de
classes inscrita na sociedade.
37

sobretudo pelas grandes corporações. Nesse sentido, a problemática exige uma


correlação das questões local-nacionais (territorialização do agro-hidro-negócio) e o
seu papel no mercado internacional.
Uma leitura sobre o histórico da questão ambiental se faz necessária. No
entanto cabe ressaltar que partimos do entendimento que a questão ambiental
dentro do modo de produção capitalista21, deve ser entendida a partir dos processos
de expansão marítimas empreendidas a partir do século XV, pois nesse período o
capitalismo, por meio dos processos de pilhagem dos recursos naturais, enxerga a
possibilidade de reprodução do capital à custa do etnocídio, genocídio das
populações originárias e da extração em larga escala de cobre, ouro, madeira e,
posteriormente, com a implantação das plantations tão caras para a biodiversidade
dos trópicos. Nessa direção, uma geografia marcada pela assimetria já se
desenhara por meio do sistema mundo-moderno-colonial, o qual impunha o seu
caráter dominador dos recursos e do modo de pensar, o qual imputa sua episteme
como uma verdade absoluta em detrimento da construção histórica dessas
populações pré - existentes no novo mundo (Porto-Gonçalves, 2001).
A problemática ambiental, já no período contemporâneo, pode ser entendida
como resultado (rejeito) da grande capacidade de transformação de matéria-prima
em mercadoria, portanto a técnica desponta como elemento importante para a
conformação do capitalismo vigente22. Nesse sentido, no período conhecido como
capitalismo industrial, os países do centro do sistema gozam do desenvolvimento
em detrimento dos recursos naturais (matéria-prima), escasseados nos países ditos
de terceiro mundo.
Nos países do centro, inicia-se a preocupação da sociedade civil em relação à
questão ambiental. Temas como qualidade de vida começam vir à tona, entretanto,
esse pensamento em nada vai contribuir para a problemática nos países da periferia
do sistema, uma vez que os problemas dessa parte do globo são compostos por
várias questões de fundo social. É nesse sentido, que o movimento ecológico tem

21
Aqui procuramos entender a problemática ambiental mesmo antes do processo de revolução
industrial, uma vez que a pilhagem desses recursos já fizera em outro momento do capitalismo como
discutido.
22
Porto-Gonçalves elucida que um período não substitui o outro, há apenas algumas mudanças do
capitalismo, mas não uma ruptura com elementos de cada momento do capitalismo.
38

um grande papel para a descentralização das empresas potencialmente poluidoras23


para os países subdesenvolvidos, assim se desloca a problemática ambiental para
esses lugares da terra. Com essa relação, começa se esboçar uma geografia
assimétrica, onde uma geopolítica se conserva para a reprodução do capitalismo,
em detrimento do local. Vide exemplo, as grandes corporações de papel e
celulose24, as quais por intermédio do projeto neoliberal tiveram grande
deslocamento das suas atividades para os países de terceiro mundo.
Nesse sentido, o entendimento do caráter conflitivo das relações assimétricas
permite estabelecer a análise a partir de uma perspectiva local, uma vez que as
tensões territoriais se apresentam com maior nitidez onde o monocultivo se
materializa como aversão à vida e a diversidade dos povos. Destarte, a problemática
ambiental e questão agrária-agrícola não se apresentam divorciadas, pelo contrário,
sua análise apresenta possíveis caminhos para o entendimento das ligações entre
as escalas geográficas.

4.1- Relação Homem e (com) Natureza, ou Homem x Natureza?

Pensando na perspectiva do debate crítico em relação à sempre polêmica


simbiose homem e meio, torna-se necessário o aprofundamento, no sentido de
fornecer subsídios para “escapar das armadilhas”, sobretudo aquelas criadas pelos
movimentos ecológicos europeus e alimentada hoje pelos grandes veículos de
comunicação em massa. Nesse sentido, a questão ambiental é desqualificada por
meio de uma dimensão a-histórica e a-política, passando a ter uma conotação de
um ecologismo simplista25. Logo jargões oriundos do senso comum, como: “plante
uma árvore”, “O homem está depredando a natureza” entre outros, são a dimensão
mais visível dessa construção descompromissada com uma leitura social, portanto
escamoteando a realidade e escondendo os principais protagonistas dessa
problemática.

23
Não é a toa que países, como os da península Escandinávia despontam como os mais
preservados.
24
Quando não o fazem diretamente, entram como acionistas majoritárias em alguns casos como o
que ocorre com a Aracruz celulose em Espírito Santo ou a fusão VCP-IP em Três Lagoas-MS.
25
Pensamento esse inclusive herdado, até a história presente, por muitas Ongs ligadas a questão
ambiental.
39

A questão é de quais homens estamos tratando? Do homem camponês que


detêm uma relação diferenciada com a terra? Ou do homem personificado pela
territorialização capitalista do agro(hidro)negócio? Para avançar no debate, torna-se
basilar aclarar primeiro como se dá a relação entre os homens, pois isso nos torna
libertos do pensamento único que permeia a discussão.
Enveredando num sentido fundamental e se baseando em preceitos
marxistas, Gomez (2004) lembra que, prioritariamente, o homem é um “ser natural”,
o qual assim como outros animais, vai ter na fome o fator decisivo de similaridade
com outros seres da natureza. Entretanto, sua diferenciação vai se dar a partir de
como se dá sua relação com outro homem (burguês), nesse viés, mediado pelo
trabalho.
Por meio do trabalho, o homem se diferencia da natureza, mas não
rompe com ela. Sobre a sua universalidade natural, o homem
produz a sua particularidade através do trabalho. O homem
apresenta-se então como um ser que é determinado por sua
historicidade: “a história é o ato de nascimento do homem”. Assim
ao invés de se opor à natureza numa antinomia insuperável em
Marx, a história apresenta-se como a verdadeira história natural do
homem. (GOMEZ, 2004, p.25)

Portanto, os problemas ambientais são frutos dessa relação mediada pelo


trabalho alienado. Nesse sentido, a compreensão do modo como os homens se
apropriam e transformam a natureza está indissociavelmente ligada às formas como
os homens se relacionam entre si e ao desenvolvimento das forças produtivas da
sociedade vigente, conforme elucida Gomez (2004).
A questão socio-ambiental carrega consigo maiores complexidades que
comumente aparenta, pois envolve em sua interioridade as lutas de classes, as
quais sofrem constantes tentativas de falseamento como a do “desenvolvimento
(in)sustentável” formulada a partir do documento Bruntland de 1987, como se a
técnica fosse salvar a terra dos seus “inquilinos”. Situação que nos levou para um
“ecologismo simplista” no que rege a interpretação da realidade ambiental
contemporânea. Partindo desse pressuposto, Porto-Gonçalves apud Waldeman
(1994), nos oferece alguns subsídios para a apreensão da questão ambiental e suas
relações com a sociedade dividida em classes.

É preciso ir além daquela formulação tão em voga nos movimentos


ecológicos de que os homens estão destruindo a natureza- “, já que”
40

se um trabalhador opera uma serra elétrica que derruba milhares de


árvores em algumas horas, não se pode responsabiliza-lo por esse
ato sem que enfoquemos as relações sociais sob as quais vive.
(PORTO-GONÇALVES Apud WALDMAN, 1994, p.12).

Ainda pensando acerca dessas interpretações da questão ambiental que


cumprem papel simplista, pois analisam o problema na perspectiva de expor um
“causador”, o homem, é preciso ressaltar que nelas, este homem aparece como um
agente genérico e opaco porque não está inserido no conflito social, ou seja, de qual
homem estamos falando. Portanto, nos conduz a um devaneio de pensar a
abordagem ambiental sem ter em mente a relação Homem x Homem, logo prioriza a
relação Sociedade x Natureza como uma relação de dominação da segunda pela
primeira. Nesta leitura prevalecem as forças antropocêntricas por intermédio da
técnica, a qual tem grande papel dentro da lógica capitalista, pois nesse viés a
destruição da natureza se apresenta imprescindível para a sua posterior
transformação em mercadoria. A questão aqui seria então apenas “controlar” o
avanço do capital por meio do “desenvolvimento sustentável”.
Logo, o subtítulo deste texto aponta para uma perspectiva estimulante no
sentido de diferenciar os sujeitos sociais e suas relações diante da apropriação da
natureza (uso do território). É nesse sentido que não se pode entender a
territorialização do capital como hegemônica, pois em contrapartida diferentes
formas de organização social como os camponeses, quilombolas e populações
originárias são construídas tendo em vista uma outra territorialidade26 alternativa,
construída pela sua relação com a terra e por fatores de âmbito antropológico.
Destarte, a “natureza está no homem” e o “homem está na natureza”. Nessa
direção, Escobar (2005) destaca a importância de considerar outras concepções de
“natureza”, sobretudo em uma perspectiva divergente da concepção apregoada pelo
modelo de pensamento do “mundo-moderno-colonial”.

Antropólogos,geógrafos e economistas políticos demonstraram com


crescente eloqüência que muitas comunidades rurais do terceiro
Mundo “constroem” a natureza de formas impressionantemente
diferentes das formas modernas dominantes: eles designam, e
portanto utilizam, os ambientes naturais de maneiras muito

26
Segundo Raffestin, a territorialidade vai ser construída pela multimensionalidade do vivido
territorial, portanto regida pelas relações existenciais (culturais, idêntitárias), e/ou produtivistas.
41

particulares. Estudos etnográficos dos cenários do Terceiro Mundo


descobrem uma quantidade de práticas - significamente diferentes –
de pensar, relacionar-se, construir e experimentar o biológico e o
natural. (ESCOBAR, 2005, p.139).

Por conseguinte, a geografia como ciência tem um papel basilar para a


análise do “homem” e do seu papel frente às tensões empreendidas no território a
fim de procurar entender as várias formas de uso de uma dada porção do planeta e
as subjetividades imbricadas nas territorialidades antagônicas.

4.2- A atual territorialização do agro(hidro)negócio: uma leitura a partir da


perspectiva sócio-ambiental

Para a correlação sugerida neste sub-item, torna-se importante destacar o


papel do estado no ordenamento territorial brasileiro, pois esse caminho oferece
muitos elementos para se entender as entropias fomentadas pelos projetos
desenvolvimentistas (geopolíticos) empreendidos, mormente, na região centro-
oeste, no grande cerrado brasileiro. Esse processo de intervenção estatal se deu,
especialmente, a partir da década de 1950, pois os incentivos dados pelo governo
para a ocupação do “sertão oeste” permitiram que se desenhasse uma nova
geografia para o território nacional.
Outro fator, o qual Diniz (2006) define como essencial para as mudanças
ocorridas no centro-oeste reside na construção de Brasília no final da década de
1950 com inauguração em 1960, pois esse processo viria significar a edificação de
uma política de cunho integrador do território nacional. A isso, se junta a busca cada
vez mais intensiva pela participação do país no cenário internacional. Neste
contexto, a implantação do Programa de Desenvolvimento do Cerrado -
POLOCENTRO teve grande importância para o caráter conservador da terra no
centro-oeste e em Mato Grosso do Sul. Nesse sentido, em consonância com o
pacote tecnológico da Revolução verde (empréstimo bancário, insumos), o
POLOCENTRO é decisivo para o ordenamento do cerrado brasileiro, conforme
pontua Diniz (2006).

Baseado na concepção de pólos de crescimento, o programa


selecionou 12 áreas de cerrado com alguma infra-estrutura e bom
potencial agrícola. Essas áreas receberam recursos para
investimentos em melhoria da infra – estrutura, enquanto
42

fazendeiros dispostos a cultivar ali puderam participar de um


programa extremamente generoso de crédito subsidiado. Tratava-se
de linhas de crédito fundiário, de investimento e de custeio a taxas
de juros fixadas em níveis muito reduzidos e sem correção
monetária. Com a alta da taxa inflacionária, e com os longos
períodos de carência e prazos de pagamento, o crédito do
POLOCENTRO tornou-se uma virtual doação aos seus mutuários.
(DINIZ, 2006, p.115-116)

Essa via, por intermédio da infra-estrutura estabelecida pelo Estado, vai


constituir como um dos grandes pilares para as mudanças sócio-ambientais do
cerrado brasileiro27. Nesse sentido, sob o signo da revolução verde, os cerrados, por
muitos, denominados como “vazios geográficos”, começam tomar nova fisionomia.
Logo, a ideológica revolução verde começa indicar pistas para o atual quadro
agrário/agrícola desencadeado pela modernização conservadora.
A revolução verde, com o seu cunho técnico – científico, significou uma
grande transformação das relações de poder por intermédio da tecnologia. Segundo
Porto-Gonçalves (2006), a Revolução Verde se desenvolveu procurando
deslocar/escamotear o sentido social e político das lutas contra a fome e a miséria,
sobretudo após a Revolução Chinesa, camponesa e comunista, de 1949.
Cabe narrar, que a Revolução Verde teve como suporte a idéia de que só o
desenvolvimento técnico e científico seriam capazes de resolver o problema da fome
e da miséria.
Santos (2001) aponta uma relação interessante sobre o estabelecimento das
relações de poder por meio da tecnologia, sobretudo no espaço do centro-oeste,
para o autor, a região passou (e ainda passa) por uma grande mudança de âmbito
tecnológico, porque em 1985 a região tinha uma relação de 1 trator a cada 17
habitantes, entretanto 11 anos depois, em 1996, esse número passa para uma
relação de 1 para cada 8 habitantes.
Logo, uma agricultura sob a égide dos agro-químicos vai ter grandes
impactos, principalmente no estabelecimento de uma outra lógica territorial, ligada

27
Comumente, a ideologia utilizada para desqualificar o cerrado, foi destacá-lo para grande
população como um ecossistema com solo ácido ( improdutivo), arvores tortuosas. De fato essas são
características desse ecossistema, entretanto durante um bom essa imagem ficou atrelada a uma
condição inferior, portanto passiva da expansão da nova lógica de mercado. Assim ganha lugar no
cerrado o debate ideológico do agronegócio como bandeira do “ Brasil que dá certo”.
43

às grandes empresas internacionais e, consequentemente, a expropriação das


populações camponesas cerradeiras a partir da década de 1970 e, com maior efeito,
no período de 1990.

Na década de 1990 aumentaram, a um só tempo, a produção


nacional e a importação de fertilizantes, que passaram de 1,862
milhões de toneladas em 1990 para 2,417 milhões em 1997 e de
1,43 milhões para 3,510 milhões respectivamente. Somadas as
quantidades produzidas e importadas, o aumento foi de cerca de
80% em sete anos. As vendas de defensivos agrícolas no mercado
interno sobem de 1.084.400 em 1990 para 2.180.800 em 1997,
crescimento determinado, sobretudo pelo aumento das vendas de
herbicidas, que nesse período cresceram mais de duas vezes.
Esses produtos são talvez os melhores indicadores da
cientificização da agricultura, uma vez que realizam quimicamente a
seleção entre culturas e pragas. As áreas de cultura de soja e
algodão da região Centro-Oeste são, em grande parte, responsáveis
por esses aumentos. (SANTOS, 2001, p.89).

Essa “invenção da fertilidade” terá um alto custo, pois aumentará a


dependência em relação às monoculturas de exportação, e ainda terá grande papel
para deterioração dos solos, águas, matas e das vidas das populações pré-
existentes.
Nesse sentido, mudam-se as formas de uso das “chapadas” e “veredas”
conforme elucida Porto-Gonçalves (2001). Esses locais eram ocupados por
populações camponesas que desenvolviam sua agricultura tradicional em lugares
com grande oferta hídrica (brejos, pântanos e varjões). Essa agricultura era
combinada com a criação de gado e coleta de frutos do cerrado como pequi, fava
d’anta, baru e outros frutos.
As regiões mais pobres em recursos hídricos, as chapadas, onde a água se
encontrara em uma camada mais profunda do solo, com o advento de novas
tecnologias para a captação desse recurso, esses locais começam a ter uma nova
importância para a territorialização do agronegócio, com forte subsídio técnico da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA.
Para uma produção, a qual justificasse os altos empréstimos empreendidos
pelos agros-negociantes junto ao Banco do Brasil, principalmente (pacote
tecnológico e financeiro), a expansão das terras foi vista como essencial para esse
processo. Destarte, essa territorialização iria “bater de frente” com outros modos de
44

vida existentes28 no grande cerrado brasileiro, pois sua essência é concentradora de


terras, o que resulta na já conhecida modernização conservadora.
O poder concentrador será a grande marca dessa territorialização, entretanto
no momento atual, as conseqüências deste modelo não estão apenas nos
alarmantes 8,5 milhões de hectares de latifúndio improdutivo29 em Mato Grosso do
Sul, conforme aponta Oliveira (2008), mas nas opções produtivas. As quais
poderíamos chamar de uma grande contra-reforma agrária promovida pelo
agrohidronegócio da indústria de papel e celulose, que traz consigo grandes
imbricações com a questão socio-ambiental local em uma relação assimétrica. Na
qual o local fica com os rejeitos (ônus ambientais) e o global com os proveitos
(benefícios). Tal situação pode ser confirmada quando a Secretaria de Estado de
Desenvolvimento Agrário da Produção da indústria e do turismo-SEPROTUR (2009),
de Três Lagoas, divulga que 80% da produção de papel e pasta de celulose serão
destinados para o mercado externo.
Cabe destacar que atualmente estamos vivenciando uma transição produtiva
nos campos de Mato Grosso do Sul, onde cresce a opção pelo plantio do eucalipto
nas grandes propriedades, logo o gado que antes serviu para esconder a terra como
elucida Almeida (2008), vem perdendo lugar para a entrada cada vez mais voraz do
capital com suas “intermináveis fileiras de eucalipto”, em detrimento de um projeto
de democratização do acesso à terra.
Ainda, nessa perspectiva, vale o registro de que segundo dados da
Internacional Paper, localizada no município de Três Lagoas (recentemente
associada à Votorantim), a empresa possui um maciço “florestal” de 225 mil
hectares, com uma estimativa produtiva de 1,3 milhões t/ano de celulose. Segundo
dados da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário da Produção da
indústria e do turismo - SEPROTUR, a empresa deve aumentar sua área de plantio

28
Tal situação em Mato Grosso do Sul pode ser exemplificada pela expropriação indígena em
Dourados com expansão do plantio da soja.
29
No artigo Latifúndio e Agronegócio: Semelhanças e diferenças no processo de acumulação de
capital, FABRINI aponta que o agronegócio e o latifúndio, exibem algumas semelhanças. A questão
crucial que aponta para a contradição do agronegócio. Ou seja, embora o agronegócio tenha uma
aparência de moderno e produtivo, ele na essência não faz desaparecer o latifúndio. Na verdade
convive com ele como reserva de valor, portanto ambos carregam nas suas essências, o caráter
rentista.
45

para 440 mil hectares até 2015. Ainda, a Associação Brasileira de Produtores de
Florestas Plantadas - ABRAF , aponta outros dados preocupantes sobre o
monocultivo de eucalipto e pinus no estado, pois segundo essa associação a
expansão do monocultivo obteve um crescimento de 124%, no período de 2004 a
2008 (gráficos-04).

Gráfico 05- área (ha) de plantio de eucalipto e pinus em MS (2004-2008)


284.051

228.384

152.341 147.819
126.741

Ano 2004 Ano 2005 Ano 2006 Ano 2007 Ano 2008

Fonte: ABRAF, 2009. SOARES, I.S (Org.).

Tal avanço do capital, por intermédio do monocultivo, traz consigo outras


contradições, quais sejam: os impactos sobre a biota local nas trocas de energia,
supressão de espécies do cerrado como Cumbaru (Dipteryx alata), Pequi (Caryocar
brasiliense), Jatobá-do-cerrado (Hymenaea stigonocarpa), Ipê amarelo (Tabebuia
aurea) e nas áreas de recarga do lençol freático (Veredas) com os buritis (Mauritia
flexuosa). Promovendo o desencontro do homem cerradeiro com os elementos do
seu ambiente. Outro fator a ser verificado é o ônus hídrico que esse tipo de
monocultura do eucalipto (geneticamente modificado) pode trazer.
Outra ameaça para o cerrado sul-mato-grossense e seus povos, reside na
territorialização do setor sucro-alcooleiro, pois segundo dados da União da Indústria
da cana- UNICA, hoje o estado possui 14 usinas e uma área de 290.990 mil ha de
cana plantada, em franca expansão. Situação amplamente apoiada nas benesses
oferecidas pelo Estado evocando o chamado “progresso”. Já o INPE - Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais, aponta para o Estado um número maior, isto é,
uma área de 310.711ha.
46

O importante é salientar que no período de 2005 a 2009 (Gráfico 06), o


Estado teve um crescimento de 194% no cultivo (territorialização) da cana-de-
açucar. Tais “estatísticas”, indicam para uma situação crítica na medida em que
havendo essa expansão nasce a necessidade de uma (não nova) adaptação
geoambiental do cerrado para suprir as exigências desse cultivo temporário,
fomentando crescentemente o desequilíbrio sócio-ambiental.
Gráfico 06- área (ha) de plantio de cana-de-açúcar em
MS (2005-2009)

310711

226958
182061
159806

2005-2006 2006-2007 2007-2008 2008-2009

Fonte: CANASAT/INPE-2009. SOARES, I.S (Org.).

Olhar para essa problemática exige sua correlação com o território no sentido
de se indagar: quais são os impactos dessas atividades para o cerrado e seus
povos?
Um caminho para o entendimento desta “racionalidade territorial” do
agronegócio30 parece residir na análise dos recursos hídricos do estado. É preciso
lembrar que Mato Grosso do Sul31 detêm a maior área do Aqüífero Guaraní com 200
mil Km², o que representa um número de 27% da porção brasileira desse aqüífero.
Nesse sentido, a análise do quadro 01 é bem sugestiva para se pensar na água
como um importante insumo basilar para o sucesso do agronegócio.

30
Cabe lembrar, que a agricultura é responsável pelo consumo de 70% da água da superfície do
planeta.
31
Vale salientar que além do guarani, outros 2 grupos de sistemas aqüíferos estão presentes em boa
parte do estado, a saber: Bauru-caioá e Serra Geral. Dessa forma, há no MS uma grande oferta em
recursos hídricos.
47

Quadro 02- Lâmina de água necessária durante o ciclo das culturas.


Culturas Consumo
Cana-de-açucar 1000 a 2000 mm
Banana 900 a 1800mm
Arroz 600 a 1200mm
Café 800 a 1200mm
Uva 500 a 1000mm
Algodão 550 a 950mm
Milho 400 a 800mm
Tomate 300 a 600mm
Feijão 300 a 600mm
Verduras em Geral 250 a 500mm
Fonte: Thame, 2008, p.198.
Nesse viés, a territorialização da agroindústria32 passa a simbolizar mais uma
via a qual dificulta a já cambaleante reforma agrária fomentada pelo estado
brasileiro, devido à elevada valorização da terra. Lembrando que a territorialização
do setor sucro-alcooleiro no MS promete um avanço sem precedentes, pois o
monocultivo pode chegar a 900.000 ha em 2010, se constituindo como um grande
empecilho para a construção da terra de trabalho.
A região da pesquisa, município de Nioaque (Território da Reforma do MDA),
nas proximidades da Serra de Maracajú, também não está livre de conflitos, porque
lá se começa a esboçar uma aliança terra-capital, pois segundo dados da empresa
MMX, pretende-se cultivar nos municípios de Nioaque, Anastácio, Guia Lopes da
Laguna e Jardim, um total de 38.000 ha de eucalipto até 2016, visando suprir sua
produção de ferro guza na siderúrgica em Corumbá.
O questionamento sobre uma possível racionalidade territorial do agronegócio
na apropriação, sobretudo, dos recursos hídricos em Mato Grosso do Sul, reforça a
discussão entorno do conceito do Agro(hidro)negócio33. Conceito que os
movimentos sociais já vêm trabalhando no seu questionamento, por meio da
agroecologia e dos SAFs (sistemas agroflorestais), construtos de uma nova

32
Cabe elucidar que, segundo dados do CANASAT/INPE, hoje o município de Maracajú possui uma
área plantada de cana de 25092 ha, o que se materializa como um grande risco para as condições
ecológicas e para as populações ali presentes, em vista das questões imbricadas na territorialização
do capital.
33
O debate já é bastante amplo na pauta dos movimentos sociais de luta pela terra, pois avança a
compreensão de que a conquista da terra abre outras frentes de luta, que vão além da crítica à
concentração fundiária, apontando, sobretudo para a insustentabilidade do modelo agrícola atual,
amplamente utilizado a partir da revolução verde e da modernização conservadora. Nesse sentido,
cabe pontuar, que hoje talvez uma dos maiores exemplos dessa perspectiva, seja o debate sobre a
transposição do Rio Francisco.
48

territorialidade como resposta frente ao avanço desse modelo insustentável de


agricultura.
Assim, fortalecem os questionamentos no sentido de indagar a problemática
da terra no cerrado, não só no sentido da estrutura fundiária, mas também
ambiental, por se tratar, o cerrado brasileiro, um dos mais importantes nascedouros
das principais drenagens do país. Thomaz Jr.(2008), traz à luz da reflexão, o papel
da territorialização capitalista e dos agro(hidro)negociantes.

As frações do território em disputa (intra e inter-capital)- com a


participação crescente de grupos estrangeiros- expressam não
somente uma nova geografia do espaço agrário, no Brasil, mas
consolidam o poder de classe do capital sobre as melhores terras
agricultáveis do país e da maior incidência de disponibilização de
água de subsolo da América Latina. O capital nada mais tem à
disposição do que o Aqüífero Guarani, o que lhe assegura o controle
territorial das melhores terras e de mananciais de águas de subsolos
para a irrigação, nada comparável em nenhuma outra parte do
planeta, para destinação e uso comercial. ( THOMAZ JR, 2008.
p.08)

Segundo Thomaz Jr., parte de Mato do Grosso do Sul, Oeste do estado de


São Paulo, Triângulo Mineiro, Norte do Paraná e Sudoeste Goiano, são áreas que
estão compreendidas no que o autor chama de “polígono do agrohidronegócio”.
Nesse sentido, a construção de usinas hidrelétricas, monocultivo da soja, eucalipto,
pinus e da cana, vão simbolizar a sua territorialização devido, sobretudo, a
abundância na oferta dos recursos hídricos disponíveis nessa porção do território
brasileiro.
Portanto, a idéia de se trabalhar com uma crítica ao modelo agrário/agrícola
se torna essencial para o debate da questão agrário-ambiental contemporânea
(Porto-Gonçalves, 2006), de modo que se procure entender as entropias sócio-
ambientais suscitadas para a sociedade e para esses povos camponeses
cerradeiros.
49

CAPÍTULO V- RESULTADO E DISCUSSÃO

A iniciativa de criar um projeto centrado na biodiversidade do cerrado como


meio de geração de renda centrado no extrativismo, surge de forma embrionária em
1997, fruto da relação entre a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS
e assentados do projeto Andalúcia. Atualmente são 40 famílias que fazem parte da
associação conhecida como CEPPEC, cujo carro chefe da geração de renda tem
sido a tecelagem de algodão, lã com tingimento natural e fibras vegetais na
produção de bolsas, pastas, mantas, cachecol e aproveitamento de sobras da
agricultura (fibra de bananeira, capim de arroz, palha de milho) para ornamentação
de peças. Praticam ainda o turismo rural e comercializam a castanha do cumbaru
(Dipteryx alata), conhecido no cerrado como Barú, a farinha de jatobá, o pequi
(Caryocar brasiliense) e a bocaiúva (Acrocomia aculeata).
No campo da troca de conhecimento e saberes, o CEPPEC tem valorizado
essa parceria com universidade (UFMS), pois, conforme informação coletada em
campo em entrevista com a diretoria do CEPPEC, essa relação tem possibilitado um
aprendizado mútuo, principalmente pela possibilidade que o meio acadêmico
oferece de pesquisa e divulgação dos projetos.

5.1- Nioaque e assentamentos rurais: uma via para o desenvolvimento local

O Município de Nioaque, assim como a microrregião da Bodoquena, têm sido


palco para as lutas camponesas pela conquista da terra. Nesse sentido, a
espacialização dessas lutas demonstram o empoderamento camponês frente à
expansão cada vez mais massiva do agro(hidro)negócio no MS e das velhas raízes
políticas que teimam em calar o grito pela reprodução da vida.
50

Reiterando o dito anteriormente, a implementação de assentamentos rurais


não pode ser interpretado como resultado de uma política de reforma agrária
empreendida pelo Estado, mas sim, produto efetivo das lutas de homens e mulheres
para ter acesso à terra e para nela permanecer. Esse pressuposto faz sentido
quando se compara os dados numéricos de ocupações (Mapa-02) com os dados do
número de assentamentos34, nesta comparação Nioaque se destaca como o
município com maior número de projetos de assentamentos rurais, em relação a
outros municípios da microrregião da Bodoquena. Portanto o processo de
espacialização da luta pela terra (leia-se ocupações), ganha um sentido de
conquista na vida desses homens e mulheres.
Podemos afirmar ainda que Nioaque apresentar números interessantes para
se pensar na viabilidade da reforma agrária como caminho para a sociedade frente
ao “fantasma” da crise dos alimentos. A região estudada apresenta, por exemplo, o
seguinte indicador: a soma dos assentamentos do chamado “território da reforma35”

34
É interessante mencionar que, atualmente, Nioaque possui 8 assentamentos.
35
Essa classificação dos territórios da cidadania faz parte de uma política de ordenamento agrário do
Ministério do Desenvolvimento Agrário-MDA. Segundo o ministério, essa divisão permite o
51

do Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA, onde se localiza o CEPPEC,


representa 31% do total de assentamentos implantados até o final de 2007 no
Estado, conforme demonstra os dados do INCRA (2007).
Outra informação que mostra a relevância da política de Reforma Agrária
nesta região de Mato Grosso do Sul, é o fato de que o total de famílias assentadas
no município de Nioaque (que é 1.558), multiplicado36 por 5 (calculo usado para se
pensar o número de pessoas na família), representa 51% da população deste
município, que é de 15.203 habitantes (IBGE, 2007). Lembrando que os números
apresentados referem-se apenas as pequenas propriedades oriundas de reforma
agrária.
Pensando na importância do sítio camponês para a questão alimentar,
ressaltamos que os dados do IBGE (1996) são bastante elucidativos, conforme
aponta o quadro 02.
Quadro 03- Plantel do Município de Nioaque segundo IBGE (1996)
Animal Pequeno % Médio % Grande % Total
Estabelecimento Estabelecimento Estabelecimento

Bovinos 26.469 8 74.505 24 212.341 68 313.315


Eqüinos 1.633 29 1.259 23 2.694 48 5.586
Asininos 14 30 19 41 13 29 46
Muares 153 30 40 8 317 62 510
Caprinos 289 30 203 22 462 48 954
Ovinos 1.957 17 4.689 40 5.171 43 11.818
Suínos 5.261 68 1.019 13 1.485 19 7.765
Aves 84.929 82 10.744 10 8.504 8 104.177
Fonte: Censo agropecuário-IBGE/1996. SOARES,I.S(Org.).
O gado bovino aparece com maior freqüência nos grandes
estabelecimentos37, representa 68% do total do plantel de Nioaque. Lembrando que

“planejamento de áreas com a mesma afinidade produtiva e econômica”. Se, por um lado, essa
política visa fomentar o desenvolvimento local, por outro peca porque ao definir uma área de atuação
acaba excluindo outras que ficam abertas para a expansão do agronegócio. Cabe salientar, que o
território da reforma agrega 11 municípios, a saber: Anastácio, Dois Irmãos do Buriti, Guia Lopes da
Laguna, Maracajú, Nioaque, Sidrolândia, Terenos, Bodoquena, Bela Vista, Bonito e Jardim. Hoje o
estado possui 4 territórios rurais: Cone Sul, da reforma, Vale do Ivinhema e Grande Dourados.
36
Calcula-se 5 pessoas conforme metodologia do IBGE para a média da família brasileira e também
utilizada pelo NERA/ Presidente Prudente.
37
Módulo Fiscal serve de parâmetro para classificação do imóvel rural quanto ao tamanho, na forma
da Lei nº. 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. · Pequena Propriedade - o imóvel rural de área
compreendida entre 1(um) e 4(quatro) módulos fiscais; · Média Propriedade - o imóvel rural de área
de área superior a 4 (quatro) e até 15 (quinze) módulos fiscais. · Serve também de parâmetro para
definir os beneficiários do PRONAF (pequenos agricultores de economia familiar, proprietários,
meeiros, posseiros, parceiros ou arrendatários de até 4 (quatro) módulos fiscais). Cabe Ressaltar,
que em Nioaque o Módulo fiscal é de 50 ha. Outro fator que se deve esclarecer, é que os conceitos
52

essa opção dos grandes estabelecimentos está ligada às políticas de incentivos para
a criação extensiva de gado no Estado personificadas pela EMBRAPA, a qual teve
papel de destaque no melhoramento genético do gado de corte. Não é demais
esclarecer, que essa criação de gado em nada tem de semelhança com a criação
animal camponesa mais voltada a produção de leite. Embora a produção de carne
seja importante do ponto de vista alimentar, o problema reside na opção pelas
pastagens como via única de desenvolvimento que, de certo modo, também se
configura como monocultivo no Estado.
Em relação à quantidade de suínos, o pequeno estabelecimento se apresenta
como imprescindível, pois segundo o IBGE ele apresenta uma participação de 68%
sobre o total do plantel. Depois vem o grande estabelecimento com 19% e o médio
com 13%.
Quando se analisa em relação às aves, o sitio camponês também se
apresenta superior, pois o mesmo representa 82% do total, contra 10% do médio e
apenas 8% do grande. Cabe ressaltar, que as duas últimas criações têm grande
destaque no mundo camponês, no espaço casa-quintal. No caso do porco, além da
sua utilidade como alimento, permite a retirada da banha para uso na cozinha, ou
até mesmo para a fabricação caseira de sabão.
Quadro 04- Cultivares do Município de Nioaque segundo IBGE-(1996).
Tipo de Pequeno % Médio % Grande % Total
cultivo Estabelecimento Estabelecimento Estabelecimento
(ha) (ha) (ha)

abacaxi 0,018 69 0,005 19 0,003 12 0,026


abóbora 14,753 100 - - - 14,753
amendoim 2,000 100 - - - 2,000
batata 0,120 100 - - - 0,120
doce
Feijão 89,8 98 1,2 1,3 0,5 0,7 91,5
Mandioca 153,89 79 24,34 13 15,44 8 193,67
Fonte: Censo agropecuário-IBGE/1996. SOARES,I.S(Org.).

Vejamos os dados da área plantada em Nioaque. A área plantada de abacaxi


pelo pequeno estabelecimento representa um percentual de 69%, contra 19% do
médio e apenas 12% do grande. Quando focamos a análise para os cultivares

de propriedade e de estabelecimento são diferentes, logo essa agregação de dados dos


estabelecimentos do IBGE foi realizada com vistas a uma aproximação metodológica com o modulo
fiscal.
53

essenciais na mesa do brasileiro, como a abóbora, o número é bem mais


expressivo, pois segundo o censo agropecuário, 100% das áreas cultivadas se
deram no pequeno estabelecimento.
O mesmo ocorre em relação ao cultivo de amendoim, pois o pequeno
estabelecimento rural representa 100% de áreas cultivadas no município
pesquisado. No feijão, item essencial da cesta básica, o pequeno estabelecimento
outra vez demonstra o caráter social que a terra de trabalho tem, pois o cultivo
dessa leguminosa representa 98% do total cultivado no município, contra 13% do
médio e 8% das grandes.
Em relação à mandioca, o mesmo acontece, pois a área plantada do pequeno
estabelecimento representa 79% total, contra 13% do médio estabelecimento e 8%
do grande.
Quadro 05- Pessoal ocupado em estabelecimentos rurais-1996.
Pessoas Pequeno % Médio % Grande % Total

Homens 2803 72 345 9 743 19 3891


Mulheres 1155 85 110 8 97 7 1362
Ambos 3958 75 455 9 840 16 5253
Fonte: Censo agropecuário-IBGE/1996. SOARES,I.S(Org.).
Em consonância com os dados anteriores, o quadro 04 com as informações
do censo agropecuário de 1996 é eloqüente acerca do caráter da terra de trabalho,
onde 72% dos homens ocupados são oriundos do pequeno estabelecimento rural,
contra 9% do médio e 19% do grande. No caso das mulheres ocupadas, o pequeno
estabelecimento participa com 85%, contra 9% do médio e 16% do grande. Dessa
forma, os dados do censo agropecuário são cruciais para o entendimento do
significado da terra camponesa, portanto da sua função social.
As informações tanto de plantel, pessoal ocupado e cultivares, nos alertam
para o sentido e significação que a terra tem para os diversos sujeitos. Logo, a
apreciação dessas informações nos aponta algumas questões sobre o caráter da
terra em Mato Grosso do Sul já salientado em outro momento. Destarte, fica
evidente que o latifúndio no Estado, e nesse caso em Nioaque, tem no boi a forma
encontrada para apresentar a terra como produtiva, mantendo concentração-
ociosidade como elementos atuais do campo sul-mato-grossense.

5.2- Pesquisa e famílias entrevistadas


54

Como já antecipado na descrição metodológica, foram entrevistadas 19


famílias que se encontram divididas em 2 categorias, a saber: Membros
permanentes e colaboradores. Nesse sentido, procurou-se apreender as diferentes
vozes, no sentido de procurar entender como se dá a simbiose entre os assentados
e os recursos naturais ali existentes, sobretudo, tendo vista a construção da visão de
mundo que permeia o CEPPEC, focada na sustentabilidade do cerrado, e dos seus
povos em uma relação de pertencimento desse/nesse ecossistema.
Para se compreender o sujeito assentado torna-se necessária a compressão
sobre o histórico de luta, logo o gráfico-07 apresenta algumas informações de suma
importância para a apreensão da realidade vivida por esses homens e mulheres até
chegar a terra.

Gráfico 07- O que o Sr. Fazia Antes da entrada no assentamento

43%
Outros

Trabalhador 14%
autônomo

Assalariado 29%
rural

Assalariado 14%
urbano

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

O gráfico-07 exemplifica a situação do campesinato migrante sul-mato-


grossense, pois 43% dos entrevistados declararam que estavam trabalhando, seja
por meio de “bicos” na cidade, na pequena propriedade da família ou até mesmo de
bóia fria. Por outro lado, temos um percentual de 14% dos entrevistados que
declaram ter exercido a função de trabalhador autônomo, que nesse caso, se deu
por meio de arrendamento em terras de outrem. Outros 29% declararam ter
trabalhado como assalariados rurais. E um percentual de 14% declarou ter
trabalhado na cidade. Tais números demonstram a importância da reforma agrária
como política econômica e social, pois permite que se possa constituir um caminho
para a resolução de alguns problemas do meio urbano, uma vez que propicia ao
55

sujeito a condição do trabalho livre e familiar, não mais em terra (meio de


produção/ferramenta de trabalho) de outrem.
Gráfico 08- Total de Filhos.

63%

32%

5%

1 à 2 filhos 3 à 4 filhos 5 à 6 filhos


Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Em relação à família camponesa, o gráfico-08 aponta para uma tendência


brasileira em relação a diminuição do número de filhos, pois 63% dos entrevistados
declararam ter 1 a 2 filhos. Os números de forma geral se apresentam como
preocupantes para vida camponesa na medida em que, como lembra as idéias de
Chayanov (1974), a unidade camponesa é composta pelo balanço do “trabalho e
consumo”, uma vez que há desequilíbrio nessa relação, haverá uma tendência a
desestruturação da família camponesa.
Gráfico 09- filhos divididos entre os que moram no lote e fora

53%

47%

Moram no lote Moram fora

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Pensando na perspectiva do equilíbrio da unidade camponesa, o gráfico-09


traz algumas informações interessantes para se pensar na base da família
camponesa. O gráfico em questão mostra certo equilíbrio em relação à morada dos
56

filhos, pois um porcentual de 53% declararam ter filhos residindo fora do


assentamento, enquanto um número um pouco menor, no caso 47% afirmaram ter
filhos no assentamento.
Gráfico 10- Local de estabelecimento dos filhos que
moram fora

14%
campo e cidade

0
acampamento

no campo 7%

79%
cidade

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Os dados expostos em relação aos filhos, principalmente quando se observa


os dados do gráfico-10 não podem ser interpretados apenas como uma perda
potencial de trabalho no sitio, pois o intercâmbio entre a Universidade38 e o CEPPEC
tem constituído uma via pela qual os jovens têm a possibilidade de conhecer e
usufruir de um espaço que, historicamente, sempre foi (é) restrito para poucos, que
é a universidade. Nesse sentido, os filhos de camponeses, por meio de uma
conquista que se deu no processo de luta pela terra, podem lutar por outras
questões, que nesse caso é a educação gratuita de qualidade.
Pensando na permanência dos jovens no assentamento, cabe relatar que as
propostas do CEPPEC têm importância para além de um debate ambiental, pois a
essência da sua frase “Sustentabilidade dos povos, Cerrado vivo e em pé”, trata
acima de tudo de um projeto social e político, uma vez que o mesmo desponta como
o “epicentro” dessa estratégia de desenvolvimento focado na potencialidade do

38
Só para exemplificar, um filho de assentado do Andalúcia estuda no curso de administração no
Campus da UFMS em Três Lagoas, entre vários outros jovens camponeses que estudam em Campo
Grande, seja em universidades ou colégios técnicos.
57

cerrado “em pé39”. Na contramão do avanço do monocultivo de eucalipto, cada vez


mais voraz, na região e dos fornos de carvão para a siderurgia. Essa contramão
descrita tem como ponto de partida o enfrentamento contra o modelo vigente,
imprimindo uma territorialidade camponesa.

O CEPPEC também foi implementado no assentamento Andalucia


como proposta para solucionar um dos problemas que é a evasão
da juventude do campo, porque na maioria dos assentamentos na
região estão ficando só os velhos nos assentamentos. A juventude
normalmente se sente envergonhada por dizer que são jovens
rurais, jovens assentados. A falta de política de desenvolvimento, de
intercâmbio de cultura pros assentamentos leva os jovens a sonha
com o mundo lá fora, com o que a mídia apresenta. E isto é
preocupante, porque nós estamos pretendendo trabalhar na terra,
nós conquistamos esta terra pra que ela amparasse nossos filhos e
nossos netos. Não no sentido deles terem que ficar a vida inteira
como nós, trabalhando no cabo da enxada, assim como a Clarice
disse que é a lógica passada pra os agricultores. Mas que eles
estudem, que eles valorizem o espaço onde vivem, que reconheçam
que esse espaço tem valor e que eles desenvolvam ali atividades
que possam acomodá-los e que possa trazer um sentimento de bem
estar no lugar onde eles vivem. São cursos de capacitação pelo
CEPPEC que o assentamento trouxe para os condutores de
visitantes no assentamento [turismo rural] visando despertar, então,
a atenção da juventude para as belezas que existe na fauna, na
fauna, e isso teve um resultado positivo, fez com que vários jovens
hoje tenham prazer, tenham satisfação, tenham orgulho de dizer que
eles são assentados. (SAMPAIO apud ALMEIDA, 2008a, p.306-
307).

A fala da presidente do CEPPEC não parte de um “ecologismo simplista”,


mas sim, de uma relação de pertencimento do/ao bioma cerrado, o qual é inerente à
própria (re)criação cotidiana e agregadora que a luta na terra camponesa exige.

39
“Deixar o cerrado em pé” tem representado uma bandeira de luta do CEPPEC contra a derrubada
do Barú, prática anteriormente comum nos assentamentos para queima da madeira nas carvoarias.
58

Gráfico 11- Pessoas da família extensa que moram no lote

63%

37%

Sim Não

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Apesar da presença em numero menor, a existência de outras pessoas


morando no lote revela a condição agregadora do campesinato brasileiro, bem como
as possíveis estratégias para suprir a falta de braços que neste caso pode ser
representada pela família extensa. (Gráfico 11).

5.3- Uso do solo no assentamento: por uma territorialidade camponesa

Pensando numa discussão a qual dê conta de compreender o sentido da terra


para esses sujeitos camponeses, a abordagem tendo o território como categoria
analítica se torna essencial para o entendimento das relações que esses
estabelecem com o ambiente. Nesse sentido, conforme Porto-Gonçalves (2006) é
preciso romper com a relação espaço-tempo estabelecida pelo capital, pois essa
ruptura nos permite apreender outras matrizes de racionalidades, as quais são
alicerçadas na própria reprodução camponesa no experimentar o natural e o
biológico cotidiano, portanto no viés da inseparabilidade do homem com a natureza
e do valor de uso.
Nesse direcionamento, um olhar acerca das territorialidades do CEPPEC e
suas práticas são basilares para entender como se dá o processo de construção
cotidiana como um importante contraponto ao agro(hidro)negócio, composto de
territorialidades e temporalidades antagônicas. Acerca do conceito de
territorialidade, Claude Raffestin (1993) oferece alguns subsídios.

De acordo com a nossa perspectiva, a territorialidade adquire um


valor bem particular, pois reflete a multimensionalidade do “vivido”
59

territorial pelos membros de uma coletividade, pelas sociedades em


geral. Os homens “vivem”, ao mesmo tempo, o processo territorial e
o produto territorial por intermédio de um sistema de relações
existenciais e/ou produtivistas. (RAFFESTIN, 1993 p.158).

A territorialidade do CEPPEC vai se estabelecer por intermédio, acima de


tudo, das relações existentes com o lugar40, que nesse caso é o cerrado, uma
relação de pertencimento do/no ecossistema. O resultado dessa territorialidade do
CEPPEC fica evidente na sua externalidade dentro do território da reforma do
MDA41.
Para a apreensão da construção cotidiana do CEPPEC, torna-se essencial
buscar no histórico dos assentados, informações referentes às práticas de
assistência e orientações recebidas, pois essa investigação permite entender
também o papel dos movimentos sociais de luta pela terra no período de
espacialização, pois como lembra Fernandes (1996), esse momento é simbolizado
pela formação do sujeito da luta. Inclusive essa passagem não está divorciada de
práticas e orientações acerca da agricultura sustentável, logo se configurando como
um importante contraponto ao modelo tradicional.

40
Essa identidade com lugar, fica evidenciada nos relatos, seja pelo significado que a terra tem para
a reprodução cotidiana camponesa, ou então com os recursos ali existentes, como as plantas
medicinais (cancorosa, bedaleira, ipês) , os frutos ( baru, guavira, pequi, cajuzinho do cerrado) ou
com fauna característica da região. Inclusive, em uma das casas foi possível encontrar um
assentado que criava uma Seriema. Portanto, não se separa homem e natureza.
41
Essa territorialidade pode ser materializada com a contra do barú em assentamentos vizinhos como
o Nioaque e monjolinho em Anastácio, ou até mesmo por intermédio da promoção de oficinas de
tecelagem, extrativismo e artesanato em assentamentos e aldeias indígenas.
60
61

Gráfico 12- Recebimento de assistência e orientação sobre


formas de conservação do solo, antes de entrar no assentamento

84%

16%

Sim Não
Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

O gráfico 12 traz algumas informações interessantes para se pensar na


importância dos movimentos sociais para a formação dos sujeitos. Nessa direção,
84% dos entrevistados declaram ter recebido orientação sobre uso de esterco,
adubação verde e o uso de restos da agricultura na compostagem orgânica. Do
outro lado, apenas 16% declararam não ter recebido esse respaldo no momento
anterior ao assentamento. Vale lembrar que segundo indicado inicialmente no
gráfico - 04, 95% dos entrevistados têm suas origens de luta pela terra no MST.
Sendo que o debate de cunho ecológico nos movimentos sociais de luta pela terra,
como o MST e a própria Comissão Pastoral da Terra- CPT/MS já é bem amplo, uma
vez que historicamente procuram fazer crítica às grandes empresas de insumos
agrícolas e sementes como a Monsanto, Cargill entre outras.
Gráfico 13- Recebimento de assistência e orientação sobre
formas de conservação do solo, depois de entrar no assentamento
100%

Sim Não

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.


62

As informações contidas no gráfico-13 reforçam compreensão da busca de


práticas sustentáveis, uma vez que permitem entender como se dá os sustentáculos
da continuidade da luta camponesa na busca de alternativas para conservação do
solo. Segundo dados colhidos em campo, 100% dos entrevistados declararam
receber cotidianamente orientação sobre essas formas de manejo da terra. Outro
fato importante relatado reside na informação de que, na maioria das vezes, essas
orientações não vêm dos órgãos42 responsáveis para tal função, mas do CEPPEC.
Gráfico 14- Usa defensivos agrícolas químicos (veneno)?

89%

11%

Sim Não

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Os dados do gráfico-14 mostram o papel do CEPPEC no assentamento, pois


89% dos entrevistados declararam não ter utilizado defensivos agrícolas na última
safra 2007-2008, contra apenas 11% que declaram ter usado. O mesmo ocorre
para outros insumos químicos na agricultura como adubos e corretivos, as
informações de campo indicam que 89% declararam não terem utilizado, enquanto
apenas 11% utilizaram na safra 2007-2008.
Os dados apresentados repercutem de maneira interessante, pois evidenciam
que não houve uma ruptura com a formação da época de acampamento, e sim uma
continuidade, entretanto agora com as propostas e orientações do CEPPEC.

42
Lembrando que as bases estruturais desses órgãos estão fortemente ligadas a revolução verde,
logo seus projetos muitas vezes se apresentam como uma “replica” do agronegócio, e não dentro de
uma lógica camponesa. Portanto as práticas do CEPPEC são importantes no sentido de viabilizar
ações inerentes ao campesinato, seja por meio de recuperação de nascentes, orientações, ou até
mesmo na coleta do barú.
63

Ainda em relação aos dados apresentados, cabe relatar que a utilização


massiva desses insumos pode comprometer a qualidade da água, pois os corretivos
têm grande potencial de contaminação tornando a água com característica alcalina,
modificando o ambiente aquoso. Outras associações negativas podem acontecer,
como por exemplo, em relação à sedimentação, pois em áreas com grande
comprimento de rampa e com culturas perenes, a incidência de sedimentos
agregados com produtos químicos (defensivos agrícolas, corretivos e outros) que se
movimentam em direção as menores cotas (corpo d’ água), será maior devido à
supressão de barreiras naturais como as matas ciliares. Nesse sentido, as
informações contidas nos gráficos apresentados apontam para uma perspectiva, não
só ambiental, mas econômico-social do uso da terra, pois um fator que deve ser
levado em consideração é a defesa da renda camponesa frente ao gasto com os
agroquímicos.
Gráfico 15- Conhece alguma forma alternativa de uso na agricultura

95%

Sim
Não

5%

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

O saber popular/tradicional aparece como um grande fator para a


sustentabilidade da agricultura, pois 95% dos entrevistados declararam utilizar
formas alternativas no plantio, seja por meio de uso de calda de fumo, resto da
agricultura (chamada palhada) ou até mesmo com a adubação verde. Um menor
número, 5%, declararam não conhecer nenhum mecanismo alternativo para
utilização na agricultura. Nesse sentido, conforme elucida Guerra (1998), o uso
alternativo de matéria orgânica no solo pode propiciar uma agricultura sustentável.

Uma das maneiras de manter a fertilidade natural é por meio da


colocação de matéria orgânica no solo. Além de melhorar sua
64

coesão e aumentar sua capacidade de retenção de água, promove a


formação de uma estrutura com agregados estáveis. A matéria
orgânica pode ser adicionada ao solo várias formas: adubos verdes,
restos de colheitas ou, ainda, um tipo de adubo bastante
decomposto por alto grau de fermentação. Tudo isso tem dois
aspectos favoráveis aos solos: aumenta sua fertilidade e reduz os
riscos de erosão. Além disso, os vegetais produzidos nessas
condições estão livres da contaminação que os defensivos agrícolas
podem causar. (GUERRA, 1998, p. 192-193).

Outra informação de grande importância deriva da análise do gráfico-16, nele


89% dos entrevistados declararam não utilizar a queimada na agricultura. Ao não
realizar esse tipo de prática o assentado evita a destruição dos microorganismos
responsáveis pela aeração solo tão vital para a infiltração da água. Mantendo assim
o solo menos vulnerável ao movimento de massas proporcionado pela combinação
de chuvas, estrutura física do solo, vegetação (ou sua falta) e declividade.

Gráfico 16- Costuma fazer queimada para limpeza da área agricultável?

89%

11%

Sim Não

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Por outro lado, apenas 25% declararam43 utilizar medidas de conservação do


solo como curva de nível e terraceamento, contra 75% que não utilizam, realidade
inclusive bem comum no Estado como mostram as pesquisas de Almeida (2008).
Sobre isso, acrescenta-se que grande parte dos entrevistados atribuem a falta de
utilização dessas medidas aos órgãos de assistência. Essa realidade é preocupante,
pois o solo se torna mais vulnerável aos processos erosivos propiciados pela

43
Cabe ressaltar que os que declararam realizar as medidas de conservação, como por exemplo, a
curva de nível, a fazem por conta própria, nesse caso com a utilização de enxada no espaço casa-
quintal.
65

competência do escoamento superficial, tendo como resultado, no estágio de perda


de velocidade das águas, a formação de depósitos de sedimentos nos riachos,
portanto os assoreamentos. Vale salientar que esses procedimentos de preservação
devem ser realizados na perspectiva de abrangência da microbacia hidrográfica,
pois a mesma comporta outros assentamentos.

A erosão dos solos não causa problemas apenas nas áreas onde
ocorre, podendo reduzir a fertilidade dos solos e criar ravinas e
voçorocas, o que torna, às vezes, impossível sua utilização agrícola.
A erosão causa, quase sempre, uma série de problemas ambientais,
em nível local ou até mesmo em grandes áreas. Por exemplo, o
material que é erodido de uma bacia hidrográfica pode causar o
assoreamento de rios e reservatórios. (GUERRA, 1998, p.187, Grifo
nosso).

Naquilo que foi sublinhado a perda do solo no sítio camponês, já tão limitado
no seu tamanho, pode significar o comprometimento do desenvolvimento sócio-
econômico, ou até mesmo sua permanência no lote.
Gráfico 17- Já obteve informações sobre sistema agroecológico.

11%
Não

89%
Sim

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Segundo Guzmán (2006), a agroecologia nasce nos últimos anos do século


XX, como um redescobrimento por parte das ciências agronômicas, de saberes e
técnicas utilizadas por muitas culturas tradicionais. A agroecologia na sua essência
se apresenta com um conteúdo multidimensional, pois não se trata apenas de uma
agricultura alternativa e/ou orgânica, mas também simboliza uma resposta frente à
modernização do manejo dos recursos naturais, portanto sua essência camponesa
66

vai além de uma abordagem ambiental. É nesse sentido que Altieri (2006) enfatiza o
caráter da abordagem agroecológica.

A agroecologia fornece uma estrutura metodológica de trabalho


para a compreensão mais profunda tanto da natureza dos
agroecossistemas como dos princípios agronômicos, ecológicos e
socioeconômicos à compreensão e avaliação do efeito das
tecnologias sobre os sistemas agrícolas e a sociedade como um
todo. Ela utiliza os agroecossistemas como unidade de estudo,
ultrapassando a visão unidimensional -genética, agronomia,
edafologia- incluindo dimensões ecológicas, sociais e culturais.
(ALTIERI, 2006, p.23)

Portanto, como pontuam esses autores, a agroecologia nasce da crise


agrícola-ecológica (modelo agrário/agrícola), sobretudo do fracasso do paradigma
dominante de desenvolvimento.
O caráter especial da agroecologia reside na discussão sobre a fome, a qual
tem chamado atenção Porto-Gonçalves (2006), pois para o autor essa limitação
energética se configura como um dos principais problemas ecológicos. Nesse
sentido, Guzmán (2007) salienta sobre o papel da agroecologia frente à
territorialização do capital.

La agroecologia pretende proporcionar el cúmulo de conocimiento


que hagan posible uma apropiación correcta de los recursos
naturales para obtener alimentos. (p.221)

Portanto, a abordagem agroecológica do CEPPEC pode constituir como um


elemento fundamental para o enfretamento do modelo agrário-agrícola atual. Neste
sentido, 89% dos entrevistados declararam ter recebido informações referentes ao
sistema agroecológico.
Destaca-se ainda, junto às famílias associadas ao CEPPEC, o sistema de
agrofloresta (SAF), sistema este que busca a realização de uma agricultura que
acompanha os processos naturais presentes nos ecossistemas locais. Nesse
sentido, procura-se manter a complementaridade entre agricultura e a vegetação
nativa, criando um sistema complexo, onde se pensa em todos os elementos que
compõe essa porção da área plantada. Diferentemente da monocultura, a qual torna
o espaço cultivado simplificado, impactando as diversidades biológicas e culturais. O
SAF se pode configurar como uma boa estratégia para a conservação do solo, pois
a não supressão da mata nativa permite manter o solo agregado, deste modo
67

evitando os processos erosivos tão comuns nas terras destinadas para a reforma
agrária.
Figura 03- Sistema Agroflorestal no Assentamento Andalúcia

O sistema agroflorestal permite consorciar culturas temporárias como milho,


feijão e mandioca, com espécies nativas do cerrado como o barú (Dipteryx alata),
cajuzinho do cerrado (Anacardium humile) e o pequi (Caryocar brasiliense). A dita
complementaridade se dará na relação planta-solo, pois cada planta é responsável
por liberar determinado elemento químico, assim ajudando manter a fertilidade
natural do solo. Ao contrário do modelo largamente disseminado a partir da
revolução verde, o qual necessita de um uso excessivo de fertilizantes e outros
agroquímicos para adequar o cerrado às condições desses monocultivos, como vêm
ocorrendo nos últimos 30 anos.
Segundo dados de campo, 74% dos entrevistados já receberam informações
sobre o sistema agroflorestal. Na perspectiva do saber camponês, cabe relatar que
68

95% dos entrevistados declararam possuir alguma planta para uso medicinal no lote.
O conhecimento esboçado pelos camponeses sobre essas plantas traz para a
discussão o saber tradicional/popular como um elemento de estratégia frente à
mercantilização44 cada vez mais massiva da natureza. Portanto, indo na contramão
das ideologias que ao longo dos tempos teimam em deslegitimar e calar esses
saberes não formais, conforme esclarece Porto-Gonçalves (2004).
A grande maioria dos entrevistados declarou ter e conhecer mais de 5 plantas
medicinais do cerrado, as quais servem para curar desde problemas estomacais,
inflamações e cólicas. E até mesmo o cumbarú é citado como medicinal, uma vez
que os camponeses o chamam curiosamente de “viagra do cerrado”.

Gráfico 18- Utilização de frutos do cerrado para venda ao CEPPEC

58%

42%

Sim Não

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

A compra de frutos do cerrado tem sido um fator importante para o


envolvimento das famílias do assentamento Andalúcia, ou até mesmo de outros
assentamentos no entorno, constituindo uma forma alternativa para a geração de
renda45 que vai além de outras atividades tradicionais, como a agropecuária.
Consequentemente, 42% dos entrevistados declararam utilizar o barú como
produto para venda ao CEPPEC e geração de renda. Cabe ressaltar que nem todos

44
Um grande exemplo dessa apropriação a partir do saber científico em detrimento de outros saberes
pode ser observado em noticia vinculada no dia 28/01/2009 no site da universidade de São Paulo,
onde pontuava que a faculdade de ciências farmacêuticas de Ribeirão Preto “demonstrou que o
extrato bruto etanólico e o principio ativo isolado da casca do caule da popular dedaleira, planta típica
do cerrado, tem ação anti-inflamatória na asma. Omiti-se, por exemplo, que as populações
tradicionais conhecem e já fazem uso dos benefícios dessas plantas a longa data.
45
Segundo os assentados, é pago o valor de 10 reais por cada saco de 60 kg de barú.
69

realizam a venda, pois conforme esclarecido na metodologia alguns colaboradores


participam em outras frentes, seja na educação ambiental na escola, ou até mesmo
na recuperação de riachos.
Outra situação que vale esclarecer, reside no fato desse processo de
fornecimento de Barú46 ser relativamente novo, pois a coleta era realizada apenas
pelos membros permanentes do CEPPEC. A mudança ocorreu a partir do processo
de conscientização acerca da importância de manter o Barú em pé e da
possibilidade de geração de renda com a venda da semente e da castanha.
Segundo Lorenzi apud Arakaki (2004), o barú frutifica de setembro a outubro,
período em que pode gerar renda.
Figura 04- Etapas do barú ( Dipteryx alata).

Pesando nas atividades tradicionais inerentes ao mundo camponês, ou seja,


a produção de alimentos para o autoconsumo, a pesquisa em questão procurou

46
Cabe ressaltar, que com o barú, pode-se fazer farinha ou até mesmo torrá-lo para o consumo,
dessa forma agregando valor para a venda. Essa amêndoa possui alto valor calórico.
70

verificar como se dá a conciliação das atividades agrícolas com o paradigma em


construção, materializado no extrativismo e nas atividades ecoprodutivas ligadas ao
CEPPEC.

Gráfico 19- Plantou mandioca na última safra (2007-2008)?

79%

21%

Sim Não

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Os números do gráfico 19 apresentam informações para se pensar sobre a


importância da pequena propriedade frente à expansão do agro(hidro)negócio, e
consequentemente na “crise” de alimentos tão discutida atualmente. Nesse sentido,
79% dos entrevistados declararam plantar mandioca. A mandioca, conforme lembra
Garcia Jr.(1975), se configura como um alimento que tem alternatividade, ou seja,
tanto serve para alimentação da família, quanto para a alimentação dos animais,
autoconsumo e venda. O mesmo acontece na transformação dos produtos, pois se
pode com ela fazer farinha e polvilho, portanto, agregar valor. Ou então, pode-se
deixar na terra por um considerável tempo, sem que isso prejudique a qualidade do
vegetal. Cabe ressaltar que em tempos de transgênia, e conseqüente monopólio de
sementes das grandes empresas, a mandioca guarda uma característica
interessante para a reprodução camponesa, pois para planta-lá só se necessita da
rama. A média da área cultivada de mandioca no assentamento é de 0,5 ha por lote.
Quando perguntados sobre o cultivo do milho, 63% dos entrevistados
responderam ter plantado na safra 2007/2008. A área média plantada desse tipo de
cultivo é de 1,89 ha. Portanto, novamente a estratégia camponesa de garantir o vital
se foca num produto que permita a alternatividade, nesse caso o milho.
71

O mesmo ocorre, quando se analisa o feijão, pois segundo dados da


pesquisa, o mesmo foi plantado por 58% dos entrevistados. A área média de plantio
é de 1,81ha. Nesse sentido, vale destacar que a comida no mundo camponês, não
se configura como um simples mecanismo de reposição de energia do corpo,
podendo se constituir como uma via para sociabilidade, conforme elucida Almeida
(2008).
Logo, comida é mais que comida como alimento, na verdade, sua
representação social está diretamente ligada ao papel do pai na
família e, portanto, à hierarquia. Por outro lado, comida é fartura
quando se tem para comer e para oferecer aos amigos, assim, é
pela comida que necessariamente passam os laços de solidariedade
(ALMEIDA, 2008b, p.286).

Gráfico 20- Na percepção do Sr.(a) da situação de conservação dos recursos


naturais no assentamento em relação ao período de entrada

74%
Piorou

21%
Melhor

5%
Igual

Fonte: Trabalho de Campo, 2008.

Apesar do bem-estar das famílias e das iniciativas agroecológicas do


CEPPEC o gráfico 20 mostra alguns dados preocupantes em relação às matas,
águas e o solo do assentamento. Segundo a percepção dos entrevistados, 74%
declararam que a qualidade das riquezas naturais no assentamento está pior em
relação ao período de entrada na terra, 21% declararam que está melhor e apenas
5% declararam que continua igual.
A situação é preocupante porque a maioria dos entrevistados atribuiu essa
piora ao corte de madeira para o carvão, alguns entrevistados declararam ter
testemunhado a entrada sistemática de caminhões para a retirada dessa madeira
(ou em alguns casos do próprio carvão). Logo é preciso perguntar o que está
72

levando esses sujeitos em direção a derrubada do cerrado, seu meio de vida. Como
aludido, vale ressaltar que a região presencia hoje uma ampla territorialização
capitalista por intermédio da MMX. Logicamente, para uma resposta consistente
sobre essa relação empresa-assentado é necessário um estudo mais aprofundado,
no sentido de entender as imbricações desse processo.
A despeito dessa problemática, é preciso reafirmar que a territorialidade do
CEPPEC se constitui como um fator importante para se pensar no desenvolvimento
(ou envolvimento) local sustentável, uma vez que o mesmo sinaliza para a geração
de renda sem destruição do meio.
47
A fala de Rosana Claudina da Costa Sampaio, presidente do CEPPEC é
ilustrativa para se pensar no CEPPEC como uma construção cotidiana.

Embora a gente sabe que como nós viemos de um histórico da


revolução verde, onde nós estamos aí muito inseridos dentro do
processo de produção da monocultura, então é uma proposta que
encontra muita resistência dentro da agricultura, essa mudança de
sistema que a gente busca, essa atenção mais voltadas para os
recursos naturais que nos temos e que é a base de tudo que a terra,
é a água né.. então você se reeducar nessa proposta é difícil, então
não estranhe muito o fato da gente não ter ainda tantas famílias
envolvidas dentro do assentamento, confesso a vocês que pra nós
mesmo se adequar, levou um tempinho grande né.. porque nos
estamos a 7, 8 anos nessa proposta trabalhando e se reeducando
nela. Então é um processo lento, mas por ser lento ele tem um ... as
raízes ficam mais fixadas né, então você consegue começar obter
resultado depois de 3 a 4 anos de persistência na mudança de
sistema de produção, então é isso, e também a necessidade de que
os agricultores tem de ...de ... ter a sustentabilidade, de gerar renda
.. de ter dinheiro pra comprar o que precisa .. e dar também o que a
família necessita.

47
Fala realizada na visita pelos acadêmicos do curso de geografia UFMS/CPTL ao assentamento
Andalúcia.
73

VI- CONSIDERAÇÕES FINAIS

As considerações finais começam com uma justificativa, pois inicialmente a


pesquisa tinha como um dos objetivos o levantamento da renda obtida pelos
membros permanentes do CEPPEC. Entretanto, isso não foi possível porque a
“racionalidade acadêmica” personificada nos questionários fechados foi contrariada
pelas formas diferenciadas de organização. Os entrevistados na sua grande maioria,
não souberam informar o quanto obtém de renda com os trabalhos no CEPPEC,
isso porque, principalmente as mulheres, trabalham em várias frentes de atuação do
CEPPEC, que vai desde a cozinha, tingimento e tecelagem, logo esse ganho só vai
se dar no final do processo. Esse ganho vai variar conforme o trabalho no CEPPEC,
a participação nas etapas e a posterior venda na feira ou por outros canais de
comercialização. Esse “desencontro metodológico” serviu para evidenciar que no
mundo camponês, mesmo naquele mediado pelo mercado, as categorias contábeis
comuns na relação patrão-empregado nem sempre são as melhores para “medir” a
renda e a viabilidade econômica.
Um fator de destaque é o papel das mulheres no CEPPEC, uma vez que é
explicito o empoderamento delas por meio das atividades produtivas, em que boa
parte tem papel importante na constituição de renda da sua família, portanto nesta
relação não está em questão somente a renda, todavia também a auto-estima da
mulher camponesa.
A problemática da expansão do agronegócio no momento atual demanda um
olhar que deve ir além do questionamento sobre o monopólio da terra, pois se deve
somar outras indagações no sentido da defesa da reprodução do modo de vida
camponês. A discussão sobre a problemática da expansão do agrohidronegócio já
se configura como pauta nos movimentos sociais e na CPT. A pauta ambiental
fomentada por essas entidades não se estrutura no “ecologismo simplista”, mas sim,
na defesa de um modo de vida em que a relação homem e natureza se mantêm em
condição indissociável. Assim, o cerrado se configura, não só como um ecossistema
do Brasil central, sobretudo, como parte da alma desses homens e mulheres
cerradeiros.
O CEPPEC vem apontar, não só uma via para o desenvolvimento local
sustentável, mas o resgate da identidade camponesa cerradeira frente à ideologia
74

do discurso desenvolvimentista, advindo da territorialização do agrohidronegócio e


fomentado pelo Estado brasileiro.
As ações do CEPPEC nos campos sul-mato-grossense não podem ser
enxergadas como um modelo para o desenvolvimento, pois se partimos desse termo
corremos o risco de ver o processo como algo fechado. Na verdade, deve-se
configurar como uma alternativa de uso do território, tendo em vista o
aproveitamento do cerrado para o desenvolvimento local sustentável, construindo
nesse sentido uma outra territorialidade, por meio da sua identidade e relação de
pertencimento do/ao cerrado.
75

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São Paulo: Labur edições, 2007.disponível<http://www.fflch.usp.br/dg/gesp> acesso
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PAULINO, E.T. Terra e vida: a geografia dos camponeses no norte do Paraná.


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Pegada, Presidente Prudente, V.9, N.1, 2008. p.8-34.
80

QUESTIONÁRIO CEPPEC

PARTE I - SOBRE O UNIVERSO FAMILIAR.

1) Identificação do assentado: ____________________________ Idade:_____


Naturalidade_______________________ LOTE: _______
Escolaridade_____________
Função no projeto______________ (linha de atividade)

2) Tipo de atividade exercida no lote (forma de uso)

a) Pecuária b) agropecuária c) atividade não agrícola e agropecuária.

3) Antes de conquistar o lote, o Sr. (a) fazia parte de qual organização de luta pela
terra?

a) Fetagri b) MST c) CUT

4) O Sr.(a) está no assentamento desde quando?


Ano:

5) Um ano antes de vir para o assentamento o Srº(a) estava trabalhando?

a) Sim b) Não

6)- O que o Sr.(a) fazia?

a) Assalariado urbano b) assalariado rural c) trabalhador autônomo d) outros


( explicitar a função)

7) Número total de filhos?


R: (criar categorias depois)

8) Filhos divididos entre os que moram no lote e fora

a) Moram no lote:________/ b)moram fora:_______

9) Faixa etária dos filhos que residem no lote (a)?


R: _________

10) Este filho que mora fora está estabelecido onde?


a) cidade b) no campo c) acampamento

11) Tem algum filho (a) morando em assentamento?


a) Sim b) Não

12) total de filhos, quanto são homens e quantos são mulheres?


81

Homens________/ Mulheres___________

13) Além da família nuclear ( pai, mãe e filhos) existem alguém da família extensa (
netos (a), sobrinho (a) ou agregados morando no lote?
a) sim b) não

se sim quais? _______

II-SOBRE O USO E MANEJO DO SOLO.

14) Antes da conquista da terra, o Sr.(a) já recebeu alguma orientação sobre as


formas de conservação do solo? ( palestra, cursos de formação etc.)

a) Sim b)Não

15) Depois da conquista da terra já recebeu alguma orientação ou assistência sobre


o manejo e uso sustentável do solo ( uso de esterco e outras maneiras alternativas
para o plantio)?

a) Sim b) Não se sim, quais?

___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________

16) O Sr(a) plantou milho na última safra (2007/2008)?

a) Sim b) Não se sim, qual foi a área


plantada?_________________

17) O Sr(a) plantou feijão na última safra (2007/2008)?

a) Sim b) Não se sim, qual foi a área plantada?_________________

18) O Sr(a) plantou mandioca na última safra (2007/2008)?

a) Sim b) Não se sim, qual foi a área plantada?_________________

19) Outros produtos agrícolas produzidos no lote:


82

20) Utilizou adubos e corretivos ( industriais) na última safra?

(a) Sim (b) Não

21) Usa defensivos agrícolas químicos (veneno)?

a) Sim b) Não

22) Conhece alguma forma alternativa de uso para a agricultura ( uso de calda de
fumo, chá de angico, Nim “amargosa” , etc)

a) Sim b) Não

23) O Sr.(a) se utiliza e medidas conservacionista para o uso do solo ( Curva de


nível, terraceamento, etc)?
a) Sim b) Não

24) Costuma fazer queimadas para a limpeza da área agricultável?

a) Sim b) Não

25) Já obteve informações sobre o sistema agroecológico?


a) Sim b) Não

26) Já obteve informações sobre o sistema agroflorestal?


a) Sim b) Não

27) o Sr(a) possui alguma planta medicinal no lote?

(a) Sim (b) Não

Se sim quais?

Nome Para que serve?

28) Das atividades realizadas junto ao CEPPEC, qual a renda obtida ( Mensal,diária
)?

________________
83

29) Utiliza algum fruto ( Barú, Jatobá, Pequi...) nativo do cerrado (no lote) para
geração de renda junto ao CEPPEC?

(a) Sim (b)Não


___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________

30) Se sim, qual a renda obtida com essa atividade? ( Dia, ano, Mês)

___________________________________________

31) Na opinião do Sr.(a) a situação de conservação do solo, das águas, da mata


hoje no assentamento em relação ao período de entrada,está:

a) ( ) igual b) melhor c) ( ) pior

III- PERGUNTAS ABERTAS PARA GRAVAÇÃO

32) o que o Sr. Entende por questão ambiental?

33) Na sua opinião, qual a importância da questão ambiental no seu dia a dia na
produção?

34) Para o senhor (a), qual a diferença no meio ambiente quando compara o
CEPPEC com as área de plantação de cana, eucalipto ( monocultivo no geral) ?

35) O significam a terra, as águas e as arvores nativas para o Sr.(a), qual a


importância desses elementos?

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