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TORNAR-SE

Da negociação entre o que digo e o que faço

Junior Maia1

INTRODUÇÃO

Acordar, esticar o corpo, relaxar, cumprir o exercício matinal diário de higiene, tomar café,
pegar as pastas de atividades, verificar a agenda, reprogramar o dia, ir à escola... Deparar-se
com uma sala de aula lotada, repleta de crianças, adolescentes, jovens ou adultos que
dinamizam o espaço. Que tornam aquele ambiente físico cheio de cadeiras, cartazes e livros
numa área humana completa de sentidos e significados únicos.

Para muitos, uma rotina;


Pra outros, um presente;
Para alguns, uma luta cansativa com a existência.

Mas o espaço existe. Os sujeitos existem. Estão todos ali reunidos esperando que entremos na
sala e iniciemos o ritual.

Qual ritual?

Para muitos, o simples ato de apresentar mapas, exercícios e conjugações verbais;


Para outros, o contato humano para a recriação e significação da existência;
Para alguns, o conflito de todo dia estabelecido entre indisciplinas e erros.

Tentemos nos afastar um pouco. Olhar a sala de aula como um espaço não nosso. Usar a lupa da
imparcialidade. Imagine uma sala de aula igualzinha a que você costuma experienciar todos os
dias, com todos os seus problemas, com os mesmos sujeitos, com as mesmas vozes, materiais.
Agora imagine você parada (o) no centro desta sala. Aproveite esse momento para questionar-
se:

Como me vejo neste espaço?


Qual o meu sentido aqui?
Como me sinto? (que é diferente de como me vejo)
O que penso de mim quando parada (o) olhando tantos rostos, tanta diversidade?
E o como eles me vêm? Que leituras fazem a meu respeito?

Questões como estas mobilizam o inconsciente de muitos de nós educadores diariamente.

1
É professor na Fundação Visconde de Cairu e nos cursos de formação de professores em serviço
oferecidos pela Universidade do Estado da Bahia. Na pós-graduação medeia informações sobre formação
de professores, currículo e intersubjetividades na FVC, ABEC, FSBA, UNIFACS e UNESI. Estuda
Narrativas do Professorado.
O ato de ajudar a PESSOA TORNAR-SE, que é função do oficio docente, precisa ser
compreendido também como ato de TORNAR-ME. Penso que seja esse um elemento decisivo
para o sucesso na docência. Quando me altero como conhecedor de mim, das minhas fraquezas
e potencialidades, dos meus limites e metas, emano ao outro, companheiro de jornada,
alterações também decisivas sobre suas fraquezas e possibilidades, limites e metas.

Os processos de ensinagem só se tornam fato quando os dois pólos (aquele que ensina-aprende e
aquele que aprende-ensina) reconhecem-se como companheiros de jornada, faltosos e faltantes,
portanto, desejosos e desejantes.

Mas lições como estas estão vivas nos escritos de Paulo Freire, por exemplo. Penso que ele,
como nenhum outro pesquisador da docência, conseguiu expressar poeticamente a “comunhão”
necessária ao ato educativo de construção-reconstrução de conhecimentos.

Os próximos textos não têm a pretensão de abordar essa didática. O nosso foco aqui não está no
ato em si, mas nos elementos pessoais que “permitem” a cada um de nós a mobilização saudável
deste ato.

O que nos torna educador e educadora não é a capacidade de transpor informações, mas a
capacidade de tocar no terreno emocional e racional dos outros sujeitos humanos,
oportunizando-os a agregarem significados positivos em suas existências a partir destas
informações. Mas o que é preciso para que isso ocorra? A resposta é simples: TORNAR-ME.

Os pressupostos didáticos nos ensinam a conhecer o processo construtivo de transformar


informações culturais em conhecimentos, mas só você pode ajudar o companheiro de jornada a
TORNAR-SE.

Tornar-me implica conhecer-me na profissionalidade.


Tornar-me implica uma reprogramação mental para a entrega diária.

A Nova Pedagogia tem revelado que o educador é muito mais que um guia. É instrumento de
edificação social. Nós educadores, não apresentamos conteúdos. Não mostramos fórmulas. O
que fazemos é superior a isso.

Quando trabalhamos com um conteúdo estamos apresentando aos companheiros de jornada


muito mais que assuntos criteriosamente selecionados. Estamos apresentando a eles as noites
que os cientistas ganharam na tentativa de descobrirem a cura para uma doença, mostramos o
sorriso do enfermo que durante anos esperava imóvel num leito de hospital por tamanha
descoberta. Nós educadores temos um contrato de afetividade e respeito com os conteúdos
enquanto os outros, apenas, os apresentam.

O ato de TORNAR-ME não está presente em manuais didáticos, não se encontra nos livros
científicos sobre educação, não é receituário de palestras, congressos ou simpósios. O ato de
TORNAR-ME é escolha. É decisão exclusiva de quem deseja que a sala de aula seja um espaço
de “educação” e não apenas de “reprodução de assuntos”. É opção sua!

Esses textos têm o objetivo único de mobilizá-los a um encontro formativo maravilhoso de


Você-professor com Você-educador que deseja ser. Só isso. No mais, todo esforço e trabalho
são exclusivamente seus!

Sucessos!
PARTE I
Me vejo no que vejo

Este é o principal momento deste processo de permitir-se TORNAR-ME. É o momento de


descobrir por você mesma(o) o que lhe motiva na docência. O que define, a partir dos seus
conceitos, da cadeia de crenças que você programou mentalmente sobre o exercício do
professorado, quem é você na profissão.

Nos encontros que tenho tido com professores, da educação infantil ao ensino superior, venho
percebendo que o distanciamento existente entre o sujeito humano-profissional e a qualidade na
docência deve-se muito à ausência da consciência de que está na relação estabelecida a peça
chave do processo.

Muitos apontam o estudante como elemento principal, outros os professores, outros a


transposição didática, mas poucos conseguem visualizar o contato físico-emocional como
coordenador real das mudanças, das afinidades, do respeito, da construção contextualizada.

Este estranhamento deriva, em muitos casos, dos falsos conceitos estabelecidos nos centros de
formação para a docência de que o educador deve ser assim ou assado. Isso mesmo! Assim ou
assado! Que ele deve ter a competência técnica para fazer isso e aquilo, o compromisso político
frente a isso ou aquilo, a qualidade teórica que determinam isso ou aquilo para que sejam de
verdade profissionais do magistério.

Esta cadeia de crenças, alicerçada no imaginário social e ideário coletivo, pinta o quadro do
bom educador como sendo aquele que conhece a teoria tal, que conhece variados tipos de
dinâmicas, que tem experiências de trabalho em tais turmas, que tem “controle da sala”... e
assim por diante.

Não discordo que estas informações também formam o elenco de atribuições do sujeito da
docência, mas acrescento que como seres humanos, os educadores jamais conseguirão Ser se
não tiverem a oportunidade de TORNAREM-SE. Continuaremos sendo guias, instrutores,
orientadores se não tivermos passado pelo crivo da percepção sensorial pessoal sobre nossa
profissionalidade.

Como qualquer outra profissão, o magistério também tem suas diretrizes, normas, regras.
Também tem seu conteúdo próprio e que deve ser respeitado. Contudo, para conseguir vivenciar
estes objetivos é fundamental que o educador esteja preparado, que ele se veja neste processo,
para que possa compreendê-lo e praticá-lo. É o que estaremos construindo aqui.

Tal afirmação leva-me a questionar se é real a existência de um perfil profissional pra o


exercício do magistério, se é possível identificar as representações sociais dos professores. Não
consigo perceber um perfil de professor (sujeito humano) como grupo. Em mim existe a
diferenciação como base. A unidade como base.

Você é único e em sua profissão, também! Creia nisso!

Talvez o seu discurso não seja. Talvez suas crenças não sejam. Mas a sua performance no
exercício do professorado é. E isso ninguém pode duvidar.

Mas porque o seu desempenho é único?

Porque o que lhe forma enquanto sujeito da docência não foi estruturado na faculdade, nas
aulas do curso de graduação. Elas só ajudaram a alimentar o que você já estava sendo. O que lhe
forma na docência está impreguinado nas experiências vividas por você desde a infância. São os
seus motivadores, são as recordações, são as coisas que deram ou não certo com você.

Todos nós temos um potencial enorme para a docência justamente porque todos nós somos
capazes de aprender!

Contudo, ser educador demanda a necessidade de conhecimentos técnicos específicos e,


principalmente, um conhecimento de quem se é e como se é. Os conhecimentos técnicos
encontram-se nos centros de formação, nos livros e trocas estabelecidas. Quem se é e como se é
só você pode descobrir viajando por você mesmo nos caminhos traçados em sua
profissionalidade.

Esta busca da essência pessoal, tarefa difícil e diária, é importante porque o educador vive o
exercício de entrega, experiencia cotidianamente a oportunidade de fazer com que o outro
deseje o que ele apresenta, vive o ato de sedução constante.

Não é fácil fazer o companheiro de jornada desejar aprender o que não quer. Não é fácil seduzir
quando não conhecemos o nosso potencial, os elementos motivacionais que já existem em nós e
que só precisamos despertá-los. Não é fácil encostar-se ao outro quando não nos sentimos
pisando no mesmo chão ou vivendo a mesma vibração. Por isso o exercício da docência não se
alimenta apenas da dimensão técnica do professorado.

Convido você para uma viagem agora. É necessário arrumar as malas. Provavelmente jamais
retornaremos ao lugar que estávamos após este exercício, mas tenha a certeza de que ele será
maravilhoso. Para isso é necessário apenas um lápis, um caderno e um ambiente silencioso,
próprio para oportunizar a você à sensibilidade necessária para despedir-se da antiga(o)
professora(or) que foi e tornar-se a grande educadora(or) que já é, porque existe inconsciente
em você e só precisa ser despertada(o).

Pronto?

Então, relaxe, respire fundo, inspire e expire com leveza, sentindo o ar tomar conta do
seu corpo e expulsar as velhas preocupações, os velhos medos, as antigas inseguranças
que guiavam você em sua profissão.

Feito isso dei um tempo para se despedir do velho professor que existia em você, das
velhas coisas que faziam o magistério ser visto como uma profissão-martírio-diário.
Para que isso seja possível é necessário esquecer as frustrações vivenciadas, mesmo
sabendo que elas estão armazenadas em algum canto pertencente a você.

É fundamental se perdoar pelos erros cometidos, pelos castigos simbólicos instaurados


no seu exercício profissional. Perdoe-se por ter amedrontado. Perdoe-se por ter
elaborado as avaliações tentando cobrar dos estudantes questões que você sabia que não
seriam capazes de responder. Perdoe-se por não ter tido coragem de colocar em prática
os ensinamentos daquele curso bom que tivera feito. Perdoe-se pelas discussões.
Perdoe-se por não ter ajudado quando deveria e tinha oportunidade de fazê-lo. Essas
coisas quem fez não foi você, foi o outro do qual você se despede. Você agora é uma
nova professora(or).

Agradeça agora todos os momentos bons e peça-a(o) que os deixem com você.
Agradeça-a as aprendizagens, os momentos de vitória, as conquistas pequenas, mas
constantes.

Então comece a arrumar sua mala de viagem. (Anote tudo em seu caderno)
O que você gostaria que continuasse com esse novo professor? (A tarefa é demorada,
difícil, mas necessária).

O que você acha importante?


O que enriquecerá esse educador que está despertando?
O que dignificará o magistério?

Lembre-se de arrumar com cuidado sua mala. A viagem é longa, não pode lhe faltar
nada.

Mala arrumada é hora de viajar. De pegar a condução. Mas lembre-se de não pegar o
primeiro carro (imagem pessoal) que vier pela frente. Selecione, olhe se é confortável,
se é bonito, confiável, se vale à pena, a viagem é longa. Escolhido o carro, abasteça-o.

Pense qual o combustível (saberes pessoais e sociais) necessário para te conduzir até o
lugar desejado. Faça uma lista e abasteça seu automóvel. Ele é único, ninguém tem
igual ao seu. É belo e feito na medida certa pra você!

Aqui pra nós, fiquei sabendo de um posto que tem o melhor combustível para sua
viagem. Ele fica num lugar bem pertinho de você. Basta pegar um espelho e olhar com
calma, sem culpas, sem se permitir chorar, para a imagem que ele reflete. Esse posto
tem de tudo e olhe que pra você não é caro, ele sempre lhe dá um desconto.

Penso que o melhor combustível para essa viagem rumo ao educador seja a construção
interna de que já temos tudo que precisamos, de que somos capazes, de que estaremos
sempre em contato com outros tantos capazes, portanto não somos melhores nem
piores, tampouco iguais, apenas diferentes.

Quando colocarmos este combustível em nosso veículo humano, fica fácil entender o
erro do outro, as “colas” nas provas, as ansiedades nos seminários, os medos de
exposição, as inseguranças. Fica fácil apresentar os conteúdos e torná-los desejantes,
desejados.

Boa viagem. Você já sabe aonde quer chegar. Penso até que depois desse exercício você
já chegou sem nem ter saído. É assim também na sala de aula. Um dia me ensinaram
que somos o que pensamos. Então, se veja positivamente e todas as células do teu corpo
ajudarão o universo a garimparem conquistas junto com você! Seja muito bem-vindo,
EDUCADOR!

Quando o docente começa a perceber-se na diferença, como sujeito diferente e da diferença,


todo seu ato pedagógico de auxilio à compreensão da cultura lingüística, histórica, geográfica,
matemática etc., muda. Ao perceber-me diferente, dou ao outro o direito de ser diferente.

Ser diferente implica ter dúvidas diferentes, maneiras de aprender diferentes, formas discursivas
diferentes, emoções diferentes.

Essa compreensão nos permite um encontro olho no olho sem medo, com calma, sem a
necessidade de impor regras ou definir quem é o líder do espaço. Autorizamos-nos sem
necessidade de dizer-nos autoridade ou sermos autoritário. Ai já some a dificuldade que alguns
professores têm com a indisciplina e que os educadores tanto agradecem por não ter.

A compreensão da diferença nos torna humilde e a humildade permitem encostar-se ao outro


simplesmente para compreendê-lo, com a cobrança devida e o compromisso profissional.
Se eu vejo no Outro insegurança, esta insegurança passa morar em mim, como educador. Eu
me vejo no que vejo. Porque eu, como sujeito dialógico e afetivo, sinto as mesmas dores e
alegrias, na base da percepção, que o companheiro de jornada sente. O quem vem pra mim, é o
que me forma.

TORNE-SE UM LAGO

O velho Mestre pediu a um jovem triste que colocasse uma mão cheia de sal em um copo
Como me vejo neste espaço? d'água e bebesse.
Qual o meu sentido "Qual
aqui? é o gosto?" perguntou o Mestre.
"Ruim" de
Como me sinto? (que é diferente disse o aprendiz.
como me vejo)
O Mestre sorriu e pediu ao jovem que pegasse outra mão cheia de sal e levasse a um
O que penso de mim quando parada (o) olhando tantos rostos, tanta diversidade?
lago.
E o como eles me vêm? Que leitura fazem a meu respeito?
Os dois caminharam em silêncio e o jovem jogou o sal no lago, então o
velho disse:
"Beba um pouco dessa água".
Enquanto a água escorria do queixo do jovem, o Mestre perguntou:
"Qual é o gosto?"
"Bom!" disse o rapaz.
"Você sente o gosto do sal?" Perguntou o Mestre.
"Não" disse o jovem.
O Mestre então sentou ao lado do jovem, pegou sua mão e disse:
"A dor na vida de uma pessoa é inevitável. Mas o sabor da dor depende de onde a
colocamos. Então, quando você sofrer, a única coisa que você deve fazer é aumentar a
percepção das coisas boas que você tem na vida.
Como me? Deixe de ser um copo.
Torne-se um lago

PARTE II
Me entendo no entendimento do outro

Se me vejo como sujeito diferente por natureza e ações não me é autorizado perceber, analisar
nem compreender o Outro na igualdade. Entender o Outro sujeito humano, companheiro de
jornada, na igualdade é, em primeira mão, negar em mim a diferença. É existencializar-me na
incoerência.

A sala de aula, enquanto espaço de diferenciação que medeia e media informações sociais, é o
ambiente próprio para a “solidificação” do exercício constante para percepção do inacabamento
humano. Portanto, espaço ímpar para observação.

Assim sendo, como avaliar as aprendizagens do Outro neste lócus que exige critérios únicos?
Critérios “totalizantes e totalitários” que, em primeira análise, reafirmam a homogeneização de
idéias, a garantia de saberes e a mercantilização numérica das conquistas destes.
Aquele que se permitiu TORNAR-SE sabe caminhar pelo comercio de aprovação/reprovação
instituído pelas organizações escolares rumo ao encontro intersubjetivo construído entre ele,
sujeito da docência, os estudantes e as informações.

O educador que se permitiu TORNAR-SE compreende que a aproximação do sujeito com o


saber é tarefa pessoal, é fruto de suas motivações e interesses, é fruto da dinâmica de
significação única inscrita na história de vida de cada um. Por mais que nós educadores
tentemos ver no outro os reflexos dos nossos desejos para o aprender, só ele, o estudante, o fará.

Nesta perspectiva se torna cada vez mais difícil avaliar a aprendizagem do outro, a não ser que
se tenha a diferenciação como base. O que fazemos com nossas investidas, a partir dos critérios
estabelecidos, é uma aproximação às definições garantidas, aos conceitos por eles apresentados,
aos dados a nós mostrados.

Muitos companheiros da docência têm lançado olhos de pesquisadores no campo da avaliação


da aprendizagem. Em sua maioria, a partir dos estudos cuidadosamente elaborados, têm
revelado conceitos e definições que nos aprisionam a critérios nem sempre possíveis frente às
realidades experienciadas. Poucos deles vivem as salas com estudantes repetentes, com
necessidades educativas especiais, com multisseries, com quarenta, cinqüenta, sessenta
educandos que, como nós, comungam de uma diferenciação. Poucos conseguiram, em seus
estudos, dizer-nos como avaliar estas subjetividades na escassez de recursos, na escassez do
tempo, na escassez dos ânimos.

O que importa é que se é preciso avaliar. Se é preciso entender o processo formativo dos
sujeitos a nós autorizados, dos companheiros da labuta diária com as informações sociais na
tentativa de significá-las.

Penso que para isto seja necessário um novo passeio. Este menos demorado porque já nos
sentimos fortes. Já nos percebemos no processo. Já nos entendemos como sujeitos na diferença.
Para isto, responder algumas questões se faz importante. Mas não uma resposta simples. Não
me é permitido mentir pra mim neste momento.

Podemos começar?

Não tenha medo em responder para você. Só você se ouvirá neste momento. Um lugar
arejado, sem barulho, agradável ajuda neste encontro dialógico estabelecido entre você
e a (o) educadora (or) que já existe.

Porque avalio? (Não aceite de você resposta simples, exija de você um sentido para esta
ação. Observe se a maioria das respostas evidencia um sentido meramente burocrático.
Caso sim, questione-se sobre o porquê de não ser formativo.);

O que de fato entendo por avaliação da aprendizagem? (Muitos sujeitos nos disseram
sobre ela, mas só nós efetivamos a prática em sala de aula. Só nós, do nosso jeito,
fazemos dela algo concreto. Agora, não importa o que os outros disseram, importa o
que penso.);

Quando avalio? (Você irá perceber que às vezes o que dizemos não se justifica no que
fazemos. Às vezes entendemos avaliação como processo, mas operacionalizamos como
produto. A idéia de tempo materializada é importante para definir, de forma prática, a
nossa compreensão. Neste momento vale relembrar Paulo Freire ao afirmar que o que
falo tem que se materializar senão vira falatório. Reflita bastante sobre sua resposta);

O que avalio? (Esta questão é uma bomba, não é? A concepção epistemológica, a


crença no modelo de aprendizagem que experienciamos é a base desta resposta. Nem
sempre entendemos e respeitamos o outro em suas diferenças e desejos de aprender. Na
maioria das vezes queremos que o Outro (que ousamos chamar de criatura humana)
aprenda o que achamos importante ( o que os tornam máquinas de aceitação dos
modelos mercantilistas instituídos por nós).

Imagino como tenha sido valoroso este momento para você. Pra mim sempre é. Costumo
estabelecer entre mim e a minha profissionalidade este diálogo constante porque acredito
que só quando avalio as ferramentas por mim utilizadas para o exercício docente vou ser
capaz de usá-las com qualidade técnica. Se não sou capaz de avaliar-me, nunca serei capaz
de avaliar o Outro.

Só agora vale entender o que os colegas de profissão têm nos dito sobre avaliação. Primeiro
porque só nos será válido buscar significado daquilo que sentimos e penso que o passeio
pelas questões nos ajudou a entender melhor como vivenciamos este processo. Segundo
porque o que os autores, professores, colegas dizem são apenas coisas que eles dizem. O
que implica dizer que, quando chega a mim, estas coisas tomam outro rumo, outros
significados a partir das minhas experiências, a partir da consciência que tenho da minha
diferenciação. E terceiro porque uma opção teórica é fundamental para a validação das
nossas práticas ao possibilitarem melhor entendimento da nossa profissionalidade.

O que os companheiros da docência têm nos dito. Vejamos:

Todo o estudo sobre avaliação aplicada à educação começa com Tyler (1949). Ele é
considerado o pai da avaliação educacional. Para Tyler avaliar é comparar constantemente o
desempenho do estudante com os objetivos definidos. Ou seja, avalia-se para verificar se os
objetivos previamente definidos estão ou foram garantidos.

Parando para analisar constataremos que muitos de nós ainda comungamos, de forma
inequívoca, com o pensamento de Tyler – pontua-se, mede-se, aprovamos com base em
objetivos definidos por cada um de nós no inicio das unidades ou períodos letivos.
Homogeneizamos o processo e, com venda em nossos olhos, alegamos não ver nem viver
produto. Ao sermos questionados a serviço de que e de quem avaliamos muitos de nós
ficamos assustados com as possibilidades de respostas que povoam o nosso imaginário.

Professora Maria das Graças Mizukami, ao apresentar a concepção tradicionalista de


avaliação, nos salienta que esta:

É realizada predominantemente visando a exatidão


da reprodução do conteúdo comunicado em sala de
aula. Mede-se, portanto, pela quantidade e exatidão
de informações que se consegue reproduzir. Dada
consideração de provas, exames, chamadas orais,
exercícios etc, que evidenciam a exatidão da
reprodução da informação”. (1996, p.8)

Toda essa fundamentação mobiliza as representações de muitos dos professores na tentativa


de culpabilizar o “sistema” pela obrigatoriedade de mensurar as aprendizagens, de
transformar em números, em notas, as informações “garantidas”. Diante de posturas como
essas, se faz importante salientar que, independente das amarras quantitativas é função do
professor investir nas análises qualitativas e agregar à sua prática de avaliação outros tantos
instrumentos que não apresentem apenas as informações desejadas, mas as informações
pelos estudantes significadas. As distintas leituras que eles fazem a partir das suas
representações, a partir do contato estabelecido entre ele e o comunicado em aula.

O ato de apontar como culpados os programas educacionais e/ou a política tradicional de


ensino, apenas nos afasta da culpa. Não tira de nós. Parte da culpa permanece. A maior
parte dela. Mesmo com o sistema educacional autorizando a obrigatoriedade da nota, não
significa afirmar que o professor deve, em sua prática de acompanhamento das
aprendizagens, avaliar unicamente a quantidade de informações retidas pelo estudante.

Contudo, entendo que se afastar desta perspectiva para construir um diálogo formativo entre
o educador que me torno e outro modelo de avaliação, muitas das vezes nunca
experienciado por mim enquanto estudante, torne-se algo complicado. É muito difícil
praticar algo que nunca viveu; pisar firme em solo nunca antes sentido. É difícil romper a
barreira firmada pela abordagem tradicional de avaliação e vivenciar uma postura
construcionista.

Penso que o tempo seja o primeiro facilitador para a solidificação de posturas tradicionais
em avaliação. O tempo em todas suas formas. O tempo didático, o tempo cronológico, o
tempo humano. Nem sempre temos, nos modelos de currículo construídos, o tempo
necessário para conhecer o nosso universo de atuação, para conhecer os estudantes e os
desejos neles imbricados. A temporalidade desejada é negada pela cronologia definida. Esta
necessidade de dar conta do tempo imposto faz-nos pensar em instrumentos que valorizem a
objetividade das respostas negando a diferenciação. Marcar X, associar, colocar (V) ou (F),
facilita o processo não porque os professores se neguem a compreender as justificativas, as
dúvidas, as polissêmicas respostas; mas porque entender o processo demanda o tempo que
muitos professores não têm por conta de todas as justificativas antes apresentadas (salas
lotadas, estudantes em diferentes níveis e linguagens, etc.).

Não estamos aqui fazendo defesa dos companheiros professores que utilizam de práticas
tecnicistas para avaliar, que sustentam sua ação didática nas ferramentas positivistas de
análise. O que queremos é chegar na aproximação às propostas avaliativas que têm a
diferenciação de posturas, saberes e aprendizagem como elemento formador das avaliações
em sala de aula.

Como pensar uma diferenciação se o foco a ser avaliado não é o saber, não são as atividades
sociais ou a conexão destas informações com as atitudes dinamizadas?

Responder tal inquietação implica entendermos o que então deve ser avaliado.

Se sua resposta foi a aprendizagem, então responda: Porque informamos que a prova será
do capítulo tal ao capítulo tal? Porque não apresentamos a web discussion multirreferencial
a ser elaborada?

Acho (assim mesmo, tendo o achismo como base) que uma das respostas seria: “Porque não
corporeificamos, na prática, o que poeticamente sinalizamos na fala – somos conteudistas e
negamos, na ação didática, a diferenciação”.

Uma certeza é o trabalho dinamizado mediante o conflito acerto e erro. As propostas


tecnicistas evidenciam o erro, supervalorizam o contrário ou negado. Marilda Behrens em
suas considerações teóricas sobre o assunto, apresenta que:
A metodologia tecnicista reprodutivista enfatiza a
resposta e, especialmente, a resposta certa. O erro é
sancionado com rigorosidade. A pergunta só pode
ser formulada dentro do conteúdo exposto pelo
professor. Neste contexto, o aluno torna-se passivo,
acrítico, obediente e ingênuo. (2003, p. 54)

Evidenciar o erro significa entrar no solo de significações que o outro sujeito humano fez
sobre algum conteúdo, significa mexer com a auto-estima do estudante, negar referencias
por ele construída. Infelizmente, ainda não fomos preparados para apontar as incoerências
das respostas, para apresentar outra possibilidade de verdade. Na escola, o que muitos de
nós fazemos é informar o que o livro didático apresenta como certo ou errado.

É nesta perspectiva que corrigimos prova. Corrigir implica ter a certeza do erro. Significa
antecipar que o outro errará. De não apresentar o que se considera correto. Implica elaborar
uma avaliação já crendo que o conceito existe.

O professor que se permitiu TORNAR-SE elabora o instrumento de avaliação na


perspectiva da análise. Ele não corrige, ele analisa. Analisar é dar crédito ao pólo que
responde. É entender a verdade como algo não absoluto, é receber o quem do outro com
todos os seus conflitos, é ver a verdade a partir dos distintos conceitos justificáveis
possíveis.

Quem alimenta o discurso da correção também nutre simbolicamente o castigo, como


punição. Assim salienta o professor Cipriano Luckesi:

A partir do erro, a prática escolar, desenvolve-se e


reforça-se no educando uma compreensão culposa
da vida, pois, alem de ser castigado por outros,
muitas vezes ele sofre ainda a autopunição. Ao ser
reiteradamente lembrado da culpa, o educando não
apenas sofre os castigos impostos de fora, mas
também aprende mecanismos de autopunição, por
supostos erros que atribui a si mesmo. Nem sempre
a escola é responsável por todo o processo culposo
que cada um de nós carrega, mas reforça (e muito)
esse processo. Quando um jovem não vai bem
numa aprendizagem e diz: “Poxa, isso só acontece
comigo!”, que é que está expressando senão um
juízo culposo e autopunitivo? (1999, p.51)

Na perspectiva da diferenciação o erro precisa ser analisado como negação à possibilidade


de aprender e como parte do processo de conhecer. Por sermos diferentes entendemos e nos
expressamos de forma diferente. Muitas das vezes o que se evidencia pode ser fruto da
incapacidade que alguns de nós, professores e professoras, temos de analisar os conceitos
pelos estudantes elaborados. Muitas vezes a lógica das respostas destes não coincide com o
já territorializado no processo de privilegiação instituído. O que dizem, não coincide com o
que queremos ouvir ou ler.
Sempre tive muito cuidado ao analisar as produções escritas dos sujeitos que compartilham
reflexões sobre conteúdos comigo. Lembro da força que um E2 tinha nas avaliações que
recebia dos professores. A marca deixada pela forma de analisar (neste caso, corrigir) não se
traduzia apenas como materialização didática, se constituía como marca psicológica
imbricada não apenas na idéia que tinha sobre certo e errado, mas também na compreensão
dos meus limites e impossibilidades. O E era a única forma de dizer que estava errado. Era a
representação do erro. Era o meu erro.

Ao assumir a docência uma das minhas preocupações primeira estava em achar uma forma
dialógica e, também simbólica (pelo número de estudantes nas turmas), que mediasse no
instrumento escrito, a compreensão do que a ciência apresentava como aceito e o que o
estudante apresentava como possível.

A forma mais simples foi usar ícones com carinhas. Ao lado do que a ciência definia como
não aceito eu usava o símbolo . Este símbolo não pontuava ao estudante que ele tinha
errado. Acentuava que a resposta ainda era uma possibilidade a ser discutida e que tendo as
discussões em sala como base, o escrito parecia contrário se uma justificativa coerente, em
tempo, não fosse apresentada. Assim como usava ☺ para uma resposta muito interessante,
☻para algo interessante, etc.

A idéia não estava em torno do que é certo ou errado. Posto ser uma construção ainda
inexistente. Mas a tentativa de desde a escola entender as possibilidades de avaliação como
algo aceito ou não, possível ou não.

O que se diz é que o erro não deve ser visto como um resultado negativo, mas sim, evitado.
Tanto ele quanto o acerto são elaborados no processo constante de negociação de conceitos
rumo à aprendizagem, rumo à diferenciação.

Sugerir novas perspectivas avaliativas implica também desenhar na escola outros modelos
de autonomia, de currículo (flexível, dinâmico e contextualizado), desenhar uma escola
onde a formação de professores seja uma constante e o trabalho coletivo seja valorizado,
onde a proposta pedagógica se torne prática e o tempo escolar seja respeitado enquanto
tempo separado do tempo das políticas administrativas.

O fato é que viver a diferenciação enquanto processo didático, político e pedagógico requer
o rompimento das barreiras conscientemente edificadas por nós professores. Necessita de
ousadia, de conhecimento de quem se é enquanto pessoa, enquanto profissional do
magistério e, principalmente, de quem e como se é naquela turma ou equipe de trabalho.

Os teóricos não nos deixam fórmulas para avaliar justamente porque, enquanto ato de
diferenciação é impossível. Cada um de nós se expressa de uma forma, aprende de uma
forma, porque somos irmanamente (de)formados de maneiras também diferentes.

Exigir o real modelo de avaliação, o melhor, o mais coerente é negar a diferenciação das
idéias e possibilidades. É medir e não avaliar.

Alguns instrumentos facilitam na percepção dos conteúdos, mas a percepção da


aprendizagem é informação prática, dialógica, dialética. A informação da aprendizagem se
tem no conflito instituído nos momentos não escolares, nas trocas, na mobilização das
informações para a resolução de problemas.

2
Letra utilizada por alguns professores para identificar ao estudante, nas avaliações escritas, que a
resposta não está correta.
O importante é o sujeito da docência saber fazer uso destes instrumentos para, num processo
reflexivo, aproximar-se das possibilidades de aprendizagens apresentadas pelos sujeitos
entendendo as suas motivações. Entendendo que cada um aprende para um fim, que cada
um construiu o edifício da sua vida com blocos e cimentos distintos, portanto, a análise
deve, também, ser distinta.

O que se diz aprender não é a garantia da informação, são as maneiras que utilizo para
mobilizar estas informações. Garantir informação não é modelar aprendizagem. Se ao
analisar as respostas valorizo apenas o que é certo em detrimento de como se chega a este
resultado, apenas mensuro o número de informações e avalio para a informação e não para a
aprendizagem. Eis aqui um cuidado que todo sujeito que se permitiu TORNAR-SE precisa
ter.

Alguns instrumentos podem ajudar na busca de informações, mas só você professor, no


exercício da observação, poderá perceber a aprendizagem. Vejamos alguns:

AUTÓDROMO

O autódromo é um instrumento para coleta das informações adquiridas durante o processo


formativo. Podemos usar este instrumento enquanto possibilidade quantitativa de avaliação,
mas devem-se observar os critérios acordados com/pelo grupo.

Dividimos a sala em grupos de quatro participantes. Cada grupo recebe quatro fichas.

V V V F F F F V

As fichas constam dos códigos:

VV (as duas informações são verdadeiras);


VF (a primeira informação é verdadeira e a segunda informação é falsa);
FF (as duas informações são falsas)
FV (a primeira informação é falsa e a segunda é verdadeira).

Organizados os grupos com as fichas, montamos um mural ou desenhamos no quadro uma


tabela contendo o nome de cada equipe e os valores ou prêmio de cada questão.

Valor 0,5 0,2 0,4 0,3 0,6 TOTAL


Grupo
A
B
C
D
E
F

Feito isto, é hora de começar a atividade. Solicite aos estudante bastante atenção e
informe aos grupos que terão alguns minutos para pensarem a resposta e que estas
respostas serão apresentadas com as fichas. Os grupos deverão suspender as fichas
quando o mediador der o sinal. Não será permitido suspender antes dos outros grupos
ou após, sobe pena de não obterem pontuação naquela questão. Ao sinal do mediador
(apito ou chamada) todos os grupos, no mesmo momento, devem elevar a ficha que
acreditam representar corretamente as informações.

Exemplo:

O mediador afirma:

Sobre o achamento do Brasil:

(01) O Tratado de Tordesilhas foi assinado depois do


“descobrimento” das terras que hoje chamamos de
Brasil.

(02) O território brasileiro foi “descoberto” em 1500.

Dado o tempo para que os membros dos grupos discutissem as afirmações o mediador
dá o sinal para apresentarem, através da ficha, as respostas.

Neste caso o grupo deveria apresentar a ficha FV, posto a primeira afirmação ser falsa e
a segunda, oficialmente, verdadeira.

O mediador vai marcando na tabela as equipes que acertaram. No final soma-se a


pontuação de cada equipe. É interessante discutir sobre as questões apresentadas ao
concluir cada jogada.

Veja o quadro final:

Valor 0,5 0,2 0,4 0,3 0,6 TOTAL


Grupo
A α α α 1.3
B α α α α 1.7
C α α α α 1.8
D α α α 0,9
E α α α 1.1
F α α 1.1

ARANHA ASSASSINA

A aranha assassina é outro instrumento que oferece ao professor e à turma uma


percepção das aprendizagens conceituais e factuais. Mostra-se também, como excelente
estratégia de aprendizagem utilizada pelos estudantes pelo caráter lúdico implicado em
sua prática.
Tanto quanto o instrumento anterior, esta atividade necessita de equipes para que seja
realizada. Dividimos equipes com quatro jogadores e um mediador. Aqui o mediador
pode ser o professor ou um colega da turma. Poderá aumentar o número de jogadores,
caso acrescente círculos ao esquema abaixo. O interesse para que o professor seja o
mediador da jogada está no acompanhamento, caso a turma seja grande, dos discursos
justificadores das questões, as respostas.

Faz-se um sorteio para definir a ordem que os participantes responderão as questões.


Feito isto o mediador monta no quadro-negro, num cartaz ou no chão da sala o esquema
para a jogada. Veja o exemplo:

_____________ ______________ ____________ ______________


1 2 3 4

A partir daí o mediador faz a pergunta ao primeiro jogador e dá um tempo para que ele
responda. Se ele acertar, permanece no ponto de partida e todos os outros participantes
sobem um círculo. Caso ele não acerte, ele sobe um circulo e todos os outros
participantes permanecem onde estão. A bacana do jogo está em não se aproximar da
aranha, não chegar ao espaço da aranha. Vence quem estiver mais longe da aranha.

Podem ser elaboradas questões de todos os tipos, atendendo ao tempo necessário para a
resolução e apresentação destas.
SEMINÁRIO

Penso que o valor do seminário está, além da apresentação sistemática do conteúdo em


estudo, na diferenciação apresentada e construída por aqueles que o faz. O seminário é
um instrumento de avaliação que favorece a construção coletiva do conhecimento e
sugere variadas formas de analise do tema proposto.

É importante que o professor estabeleça a diferença entre um seminário e uma aula


apresentada pelo estudante, tal separação ajuda na definição dos critérios de avaliação e
fortalece os vínculos formativos.

Todo seminário é feito por sujeitos que já sabem sobre o conteúdo a ser apresentado.
Jamais convidaria uma fisioterapeuta para falar sobre processos didáticos de ensinagem,
assim como uma fisioterapeuta não convidaria um pedagogo para falar sobre as
dinâmicas do movimento corporal em pacientes hipertensos. Um provável fracasso
existiria. Fala em um seminário quem sabe sobe o tópico em discussão.

Assim, o seminário não é um espaço para dar aulas. É um espaço para refletir sobre
aprendizagens, para apresentar análises sobre determinado assunto.

Infelizmente o que observamos, até nos centros de formação superior, é a fragmentação


de textos por parte dos estudantes na tentativa de apresentarem o que memorizaram, a
partir de um esforço pessoal, sobre um assunto nunca antes estudado. Os professores,
infelizmente, apresentam o texto e esperam, do estudante, a apresentação deste.

O seminário não é um processo solitário. Costumo dizer que antes mesmo que os
estudantes apresentem já sabemos, a partir da organização deles, a apartheid definida.
O primeiro a apresentar é sempre o que sabe mais, o que é capaz de introduzir o
conteúdo inteiro, de recitar, de apresentar uma canção sobre o assunto e não se perder
na apresentação. Daí vai passando a bola aos que menos conhecem sobre o tópico e
dividirem-se entre os que gaguejam, os que esquecem, e os que lêem. No momento da
conclusão, àquele que introduziu o conteúdo retoma o poder e majestosamente assume
o posto do grande sábio apresentando as idéias centrais. Infelizmente é assim que
acontece em muitos centros de formação, e nós legitimamos estas práticas ao exigir uma
aula sobre o assunto imaginando ter um seminário.

O que visualizamos como seminário formativo está na apresentação de um tema de


discussão. A este tema os estudantes apresentam relações com histórias pessoais,
sociais, profissionais, faz interações dialógicas com outros sujeitos, alinha teorias e, de
maneira muito pessoal apresenta suas construções em torno do tema.

Isso implica dizer que, antes de exigir o seminário o professor deve discutir sobre o
assunto, deve apresentar a sua “aula sobre o assunto”, para que depois, garantida a
exposição, possa autorizar-se avaliar.

Não nos é permitido avaliar o que não oferecemos. O ato de cobrar o que não é dado a
sociedade já o faz, de forma cruel, neste modelo capitalista e hiper-liberal vivenciado.

Uma sugestão para organização de seminários:


O planejamento do seminário formativo –NEPA/FSBA- Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alfabetização

Utilize uma técnica para dividir os grupos. Observe que quanto mais
heterogêneo for o grupo, mais interessante e rico será o seminário. O seminário
enquanto instrumento de avaliação e estratégia de ensino e aprendizagem tem
no diálogo sua força, tem na troca de experiência e na negociação de conflitos
um ambiente impar para o estabelecimento da zona de desenvolvimento
proximal.
Sugira temas e não textos. Oportunize a pesquisa, deixe o estudante buscar
fundamentações para o que irá apresentar. Isso não nega o cumprimento do
quatro de conteúdos já programados. É você educador quem define o tema a
partir do conteúdo trabalhado e dos objetivos já definidos.
Apresentado os temas, definam juntos os critérios de avaliação para o
seminário. (organização das ações, coerência das idéias apresentadas,
criticidade, qualidade dos recursos apresentados, otimização do tempo,
fundamentação teórica, etc.)
Definido os critérios, começa um momento de avaliação importantíssimo que é
o planejamento das ações. É neste momento que nós professores, por grupo,
percebemos quais idéias os estudantes têm sobre o conteúdo, antes da pesquisa
propriamente dita. Ouvir estas informações serve para comparar as
aprendizagens antes e depois da apresentação.
É importante solicitar uma produção escrita sobre o que os estudantes irão
apresentar. Mais interessante se esta produção apresentar as idéias a que serão
defendidas alinhadas à fundamentação teórica por eles identificada como
pertinente.
Definam uma data para que esta produção escrita seja apresentada ao professor.
É pertinente que este documento não seja apresentado no dia do seminário
porque o professor nem sempre terá tempo para relacionar o escrito ao
apresentado no momento. É interessante um retorno sobre a produção, por parte
do professor aos estudantes, antes da data de apresentação do seminário.
A partir de agora estabelecemos uma parceria entre professor e equipes. Cada
equipe define, sobre o olhar atento do professor, a dinâmica de apresentação, a
definição dos recursos a serem utilizados e, principalmente, a ordem de
apresentação. É neste momento que percebemos a compreensão do conteúdo, a
sistematização das idéias.
Marcam-se os momentos de orientação e acompanhamento.
Depois disso, é aguardar os resultados, com a consciência do dever quase
cumprido!
AUTO-AVALIAÇÃO

Auto-avaliar é dizer como se percebe no processo. É apresentar, a partir de critérios


previamente definidos, a análise qualitativa das aprendizagens garantidas. É dizer, pela
escrita ou pelo diálogo, onde estava em relação às informações oferecidas, como
caminhou e onde está em relação ás aprendizagens.

Não existe comparação entre os que garantiram mais informações e os que garantiram
menos. Na auto-avaliação, o valor está no caminho, no percurso, nas atitudes realizadas
para superar obstáculos, na qualidade definida no processo.

Enquanto sujeitos diferentes, caminhamos rumo a aprendizagem de forma diferente.


Aquilo que foi fácil para um grupo de estudante nem sempre é fácil para outro grupo,
portanto, o momento de auto-avaliação dos estudantes é principalmente, para o
professor, um momento de reflexão sobre as individualidades, não de comparação.

Existem algumas propostas e fichas para o processo de auto-avaliação. Costumo


desenvolver este modelo:

Primeira Etapa: (preenchimento da ficha)

Informe ao grupo qual a proposta, o que é, para que se destina a auto-avaliação.


Apresente uma ficha contendo os critérios de análise e as questões que deverão
responder. Esta ficha os estudantes deverão responder em casa e devolver ao
mediador. Quanto mais tempo tiverem para pensar sobre as questões, melhor.

Na ficha, podem conter questões que levem a refletir sobre:

PARTICIPAÇÃO NAS AULAS

1- Presto atenção às aulas, acompanho, me envolvo nas aulas?


2- Tenho dificuldade ou receio de expor minhas idéias?
3- Falo pouco: só quando julgo necessário ou que posso acrescentar algo?
4- Na medida do possível, sempre participo?

ATUAÇÃO NOS TRABALHOS EM GRUPO

1- Sempre me envolvo; colaboro; faço a minha parte; ajudo o grupo a atingir os


objetivos?
2- Tenho vergonha de dar minha opinião no grupo?
3- Poderia colaborar mais; prefiro trabalhos individuais?

APRENDIZAGEM

1- As aulas são produtivas; os textos de fácil compreensão; os trabalhos e as


sistematizações ajudam muito?
2- A disciplina tem sido válida, esclarecedora, útil e relacionada à nossa prática?
3- Estou bastante satisfeito com o que tenho aprendido; estou aprendendo muito?
4- Consigo compreender o objetivo da disciplina?
5- Apresento algumas dificuldades para aprender alguns conteúdos?
6- A estratégia de aprendizagem que utilizo tem ajudado?
O QUE PRECISO FAZER PARA MELHORAR?

1- Me expressar mais sem medo de errar?


2- Me aprofundar mais nas leituras e trabalhos?
3- Me dedicar mais; dedicar mais tempo?
4- Organizar-me para não faltar às aulas?
5- Manter contato para não perder prazos?
6- Revisar material escrito e escrever melhor?

QUEM PODE ME AJUDAR E COMO?

QUEM COMO?
Eu mesmo
Pessoas de casa
A professora
Colegas
*UFPR – Curso de Pedagogia

O mediador recebe a ficha e analisa comparando com as informações contidas em seus


registros de acompanhamento. Este é o momento que o professor terá para anotar as
questões que serão pontuadas na próxima etapa.

Segunda Etapa: (Minuet de reflexão)

Minueto ou minuet é uma dança de origem francesa em compasso de ¾. O nome


significa “dança em compassos miúdos”. Podemos utilizar outras canções ou dança, o
que importa é o circulo de discussão e reflexão estabelecido.

Nesta etapa, o mediador propõe uma atividade que todo o grupo possa fazer junto.
Gosto do minuet porque alguns erram o passo, parecido “escravos de Jó”, e fica muito
divertido. À medida que algum participante erra, uma pergunta é lançada pelo
mediador. Esta pergunta tem relação com o analisado anteriormente pelo professor a
partir das fichas.

O professor não informa a quem se destina a pergunta, deixa a reflexão aberta,


mediando a proposta até que o estudante avaliado se manifeste.

Este momento é interessante porque nem sempre o que está escrito aparece de forma
clara para quem faz a leitura e algumas pessoas não conseguem se expressar
positivamente pelo instrumento escrito.

Canção Minuet:

Minuet, Minuet
Me gusta la dancê
Me gusta la dancê
La dança Minuet

Minuet, Minuet
Me gusta la dancê
Me gusta la dancê
La dança Minuet

A dança é desenvolvida em circulo. Os estudantes dançam como se fizessem um


trenzinho e a medida que vão errando o professor começa a propor dificuldades, tais
como, danças agachado, segurar na cintura de quem está atrás sem mudar a posição,
dançar sentado no joelho do coleta, etc.

NEPA/FSBA no Minuet

Estes são alguns dos instrumentos utilizados, inúmeros outros se fazem necessários para
a avaliação da aprendizagem na perspectiva da diferenciação. A transversalidade
obriga-nos a ampliação das técnicas e estratégias avaliativas no processo didático de
transformação das informações culturais em conhecimento.

Entender o homem e suas formas de aprender nunca foi tarefa fácil. Observar como
estamos nos fazendo educadores, como estamos no processo de TORNAR-SE, é o
primeiro sinal para a autorização ou negação do julgamento das aprendizagens alheias.
Só serei capaz de entender o outro quando for capaz de me entender neste processo.

A Observação, estudo de caso, portfólio, co-avaliação, auto-avaliação, dinâmicas de


grupo, tudo isso só fortalece a prática avaliativa se a compreensão que tenho da
docência, do exercício do professorado, for inteira, for consciente. Do contrário, se
tornam instrumentos de mera coleta de dados.

É imperioso quebrar a visão parcelarista de que apenas alguns pólos são avaliados. Na
perspectiva da diferenciação não existem pólos, existem caminhos, condutas,
momentos. Estes caminhos podem indicar o enfraquecimento de alguma estratégia, de
algum elemento, mas não de pessoas. Ninguém deseja não saber, ninguém se reconhece
no erro. O foco da criatura humana é o progresso. A compreensão de pólos favorece a
avaliação apenas do estudante, do conhecimento, dos resultados pretendidos em
detrimento da meta-avaliação, da percepção dos momentos de aprendizagem.

Assim, a avaliação não é um fato pontual isolada nela mesma. É um conjunto de ações
que se condicionam mutuamente na tentativa de entender se as diferentes intenções
foram respondidas.
Na perspectiva da diferenciação não basta avaliar a aprendizagem, é necessário,
sobretudo, compreender os desejos pessoais para a garantia desta. É a partir dos desejos
que me indivíduo do companheiro de jornada, é a partir do desejo que me formo, me
torno, e proponho ao Outro variadas formas de TORNAR-SE.

LIÇÂO DO VENTO

Um dia, numa aula, a nossa professora


Ensinou-nos que o vento é simples massa de ar.
E eu acreditei. Se a professora o diz ...mas não compreendi.
E pus-me a cogitar ...

E disse o Zé Moleiro – O vento é pó de trigo, são velas a rodar.


O vento é um amigo.

O Luís Pescador gritou, sem se conter:


- O vento faz as ondas e fez meu pai morrer!
O vento é assassino, o vento faz doer.

- Nem sempre, lembrei eu.


Levanta os papagaios e fá-los ser estrelas num céu azul de sol.

E gemeu a velhinha, num canto do portal:


- O vento é dor nos ossos...

- É roupa no varal sequinha num instante!


Afirmou minha mãe
Correndo atarefada, entre casa e quintal.

Mas explicou um velho jardineiro:


- O vento, meus amigos, destruiu-me as roseiras.
E fez cair as flores das minhas trepadeiras.
O vento é muito mau.

Um poeta sorriu...
- O vento é a beleza, as searas são mar
Se o vento as faz mover,
No campo a ondular.

Já sei o que é o vento:


É dor, é medo, é pão.
É beleza e canção.
É a morte no mar.
E por trás disso tudo é uma massa de ar ...

E eu disse cá para mim


Que a minha professora
Com tudo que estudou
Não soube ensinar / avaliar
Porque nunca escutou.

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