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Coordenação motora

Andebol
Método para potenciar a finta

A melhoria da capacidade de
Paulo Jorge Moura Pereira diferenciação cinestésica, permitirá ao
atleta o ordenamento adequado dos seus
movimentos parciais, permitindo
sequenciar e sincronizar as tarefas de
A importância da coordenação forma mais precisa através da melhoria da
motora em jogos desportivos colectivos percepção do seu corpo, aumentando assim
(JDC) e em andebol em particular é a percepção constante das condições
indiscutível, pela variedade de movimentos espaciais, temporais e da força a aplicar
e constantes alterações que se manifestam durante a execução de um determinado
na competição (instável e imprevista), gesto. A capacidade de ritmo relaciona-se
nomeadamente ao nível dos diferentes com a habilidade para organizar acções
tipos de fintas (com ou sem bola) que se musculares em relação ao espaço e ao
produzem para resolver problemas tempo. A orientação espacial permite
característicos de desportos cujo determinar e variar a posição e os
funcionamento implicam cooperação e movimentos do corpo no espaço e no
oposição. tempo relativamente ao campo de acção
“No contexto dos JDC, as acções (terreno de jogo, material fixo, …) e/ou a
técnico-tácticas individuais representam um objecto ou interveniente em
estratégias motoras singulares, produto da movimento (móbil, companheiros ou
interpretação pessoal que cada desportista adversários,...) Por outro lado a capacidade
faz das diferentes acções do jogo, e onde se de equilíbrio, consiste em manter o corpo
encontram intimamente interrelacionados em estado de equilíbrio ou recupera-lo
elementos do tipo condicional (força após o movimento.
rápida, resistência), coordenativo e
cognitivo” (Peñas e Graña, 2001).
No entanto, no dia a dia do treino Combinação de movimentos
verifica-se a optimização das componentes
referidas anteriormente de forma separada, Diferenciação cinestésica
demonstrando dissonância quanto a Capacidade
modelos cognitivistas que perseguem a de Equilíbrio
integração dessas componentes na procura controlo
da especificidade e das necessidades reais
da competição. Orientação espacial
O quadro 1 mostra como podem ser
estruturadas as capacidades coordenativas. Ritmo
A proposta apresentada neste trabalho,
assenta fundamentalmente na melhoria das Capacidade Reacção
capacidades associadas à diferenciação de
cinestésica, ritmo, equilíbrio e orientação adaptação
espacial embora outros elementos possam Transformação
estar interligados de acordo com o grau de
dificuldade de cada exercício (reacção,
combinação e transformação de Quadro 1 – Estrutura das capacidades coordenativas
(Meinel e Schnabel, 1987)
movimentos).
Também segundo Antón et. al. aprendizagem como no aperfeiçoamento
(2000), a coordenação manifesta-se de três da finta.
formas fundamentais: Capacidade de Boyle (2003), refere a escada de
controlo e reacção motora, Capacidade de agilidade como sendo um dos melhores
combinação motora e Capacidade de instrumentos associados ao treino
transformação motora (corrigir durante a funcional, podendo ser utilizada para
execução). trabalhos musculares do tipo excêntrico,
Alguns autores referem também a equilíbrio, coordenação e velocidade dos
melhoria da eficiência dos movimentos apoios promovendo benefícios de carácter
definindo a coordenação como sendo a neuro-muscular.
habilidade para controlar múltiplos
movimentos musculares ordenados de
forma a produzir tarefas com eficiência
motora, sendo composta por factores
associados à força, potência, capacidade
para acelerar e desacelerar e equilíbrio
dinâmico (Brown and Ferrigno, 2005)
Tarefas motoras que exijam rápidas
mudanças de direcção ou sentido, frontais
e à retaguarda, laterais ou verticais,
conduzem ao incremento da agilidade e Fig.1 – Escada de agilidade
coordenação promovendo a velocidade e
eficiência motora (Plisk, 2000). O material usado na construção do
Frequentemente, assistimos em andebol a aparelho, deve possuir alguma rigidez para
acções combinadas de fixação do par que ao ser tocado, seja facilmente
seguida de finta e drible enquanto o recolocado, evitando assim sucessivas
jogador fintador observa possibilidades de interrupções. Em idades mais baixas, ou
continuidade (pivot que desmarca). Por numa fase inicial com escalões mais
outro lado, existem estudos que avançados, deve substituir-se por um
demonstram que neste tipo de acções, a desenho no solo. Por outro lado, deve ter
agilidade é o factor mais determinante para tamanhos adaptados à idade a que se
predizer o sucesso em desporto (Halberg, destina, considerando por exemplo atletas
2001). seniores, poderá ter dimensões que rondam
Ávila (1998) referindo-se aos os cinquenta por sessenta cm cada
deslocamentos específicos sem bola em rectângulo, num total de seis a oito. No
andebol, define como capacidades entanto ela deve ser construída de forma
necessárias as seguintes: Controlo de que a sua dimensão possa ser modificada
mudanças de ritmo (acelerações, travagens de acordo com os exercícios aplicados. A
e arranques); controlo de mudanças de possibilidade de alterar o tamanho dos
direcção em ângulos diversos; domínio de rectângulos, permite que o sistema nervoso
diversas formas de deslocamento (frontais, central (SNC) não se adapte às dimensões
laterais e atrás); Acções simultâneas e do aparelho. É de grande importância,
dissociação segmentar; Combinação de mesmo mantendo os exercícios, alterar a
habilidades (giros, saltos, lançamentos); dimensão dos rectângulos que constituem a
domínio em situações de contacto físico; escada (ainda que com pequenas variações)
combinação de todas as anteriores. para que o atleta não se limite a reproduzir
mecanicamente uma determinada
Após esta breve análise conceptual, sequência depois de aprendida. As
a presente proposta surge baseada na ideia dimensões devem ser alteradas de forma
de que o controlo motor associado à aleatória dentro da mesma sessão ou entre
capacidade de execução dos exercícios na sessões sempre e quando os atletas já
escada de agilidade (“agility ladder”) pode dominam a execução do exercício. O
produzir um transfer positivo não só na número de exercícios a trabalhar na mesma
sessão é variável (5 a 8). O número de
repetições por exercício será de três a cinco
e o tempo de repouso não deve ser inferior
a um minuto. Os exercícios integrados com 10

tarefas técnico-tácticas devem ter um


tempo de recuperação superior (± 2 9 8
9
minutos) e menor número de repetições (2
a 3) por exercício. A execução destes
exercícios envolve maioritariamente 7 6 7

contracções do tipo excêntrico, pelo que


devem ser respeitados os tempos de 5 4 5

repouso, para evitar um grau de fadiga


indutor de descontrolo motor. 3 2 3

Embora não possua dados


científicos que justifiquem a utilização 1 1

destes exercícios para beneficiar a eficácia


da finta, julgo poder afirmar que a
Fig.3 – Exercício 2
melhoria do controlo dos apoios após um Exercício 2 - Inicio com os apoios paralelos, saltar para o
trabalho prolongado e sistemático é um primeiro rectângulo com um dos apoios (esquerdo por exemplo).
Seguidamente, colocá-los ao lado do mesmo rectângulo para
facto observável em atletas que repetir a mesma sequência agora com o apoio contrário dentro
demonstram dificuldades em coordenar a do segundo rectângulo (direito).
utilização dos apoios para fintar ou para
encadear com outras tarefas. Seria
Os exercícios 1 e 2 podem ser
interessante levar a efeito um estudo que
introdutórios tendo como propósito uma
ajudasse a perceber a influência de
activação específica para os exercícios
métodos deste género não só na melhoria
seguintes.
das tarefas que o compõem como também
O exercício 3 mostra uma forma
da possível transferência para o jogo.
mais complexa, dado que o executante
deve fazer meia pirueta em progressão
lateral até ao final da escada e sempre que
está voltado para o colaborador, faz duplo
passe. O passe do colaborador deve ocorrer
imediatamente antes do contacto dos
apoios (momentos 3, 5 e 7) para que este já
seja efectuado com posse de bola. Para
8 8
além da componente cognitiva aumentada,
uma vez que a introdução do passe
7 6 6
7
aumenta a quantidade de estímulos a
“controlar”, este exercício pode melhorar
os níveis de propriocepção (sensações
5 4 4 5
recebidas pelo SNC provenientes dos
músculos articulações e tendões) da
3 2 2 3
articulação tíbiotársica favorecendo
nomeadamente a prevenção de lesão
1 1
(entorse). Embora todos os exercícios
propostos possam cumprir os objectivos
referidos anteriormente, o facto do atleta
ter que fazer meias piruetas sucessivas,
Fig.2 – Exercício 1 provoca maior instabilidade aos
Exercício 1 - Inicio com os apoios paralelos, saltar para o
primeiro rectângulo com os apoios unidos, seguidamente afastar movimentos, aumentando assim a
os apoios e colocá-los ao lado do mesmo rectângulo. Repetir a dificuldade para que o equilíbrio seja
sequência anterior no rectângulo seguinte.
readquirido. Como alternativa ao passe,
encadear o drible com os deslocamentos
pode ser uma variante possível deste
exercício.

7
5
4
7
6 6
5
4
3 5 4 4
3
3
2 2 3
2

2
1
1
1

1 Fig.5 – Exercício 4
Duplo passe com o colaborador enquanto executa quartos de
Fig.4 – Exercício 3 pirueta. O executante faz duplo passe com o colaborador sempre
Duplo passe com o apoio enquanto executa meias piruetas até ao que está de frente para ele.
final da escada de equilíbrio.

Podemos observar nas figuras seguintes (5,


6, 7, 8a, 8b e 9) um formato de exercício
aproximado a fintas mais comuns ainda
que o exercício da figura 9 apresente um
exercício específico para o trabalho de uma 10
finta só observável nos jogadores mais
evoluídos. As figuras 5 e 6 mostram um 9 8
exercício de finta simples destinada por 7
exemplo a ultrapassar um defensor em
5 6
proximidade. Dado que a amplitude destas
fintas não é grande, deve ter uma execução 4
3 2
rápida para que quando aplicada em jogo
possa resultar num acto táctico eficaz que
permita a continuidade ou finalização num 1 1
curto espaço de tempo. As tarefas devem
ser executadas de forma a privilegiar Fig.6 – Exercício 5
Inicio com os apoios paralelos à esquerda da escada. Colocar
movimentos coordenados e controlados em sequencialmente o apoio direito seguido do esquerdo no
que a velocidade de execução deve ser primeiro rectângulo seguindo-se o direito à direita da escada
(DED). Repetir a sequência mas agora em sentido contrário
“óptima” de forma a evitar gestos (EDE).
desnecessários que possam aumentar o
gasto energético ou contribuir para
movimentos que não cumprem o O exercício da figura 8a, tem como
protocolo. O equilíbrio entre a velocidade objectivo trabalhar uma finta tendente a
de execução e o cumprimento da tarefa ampliar o espaço a explorar em jogo. Uma
deve ser encontrado pelo executante. variante que pode tornar o exercício mais
específico para explorar um espaço amplo,
pode ser, utilizar o drible (neste caso
unitário) sempre que ocorre o cruzamento
do apoio (figura 8b).

9 9
8

7 7
6

5 5
9 8 4
9

Drible 3 3
6 7 7 2

5 4 1 1
5

2 3 3
Fig.8 (b) – Exercício 8
Variante do exercício 8 (a), agora com uso de um drible
simultâneo ao cruzamento do apoio para ampliar a finta.
1 1

Fig.7 – Exercício 6
Inicio com os apoios paralelos, seguidamente colocar o apoio
esquerdo ao lado do 1º rectângulo (2) seguido dos dois apoios
(em simultâneo) dentro do mesmo. Repetir a mesma sequência
mas agora iniciando com o apoio direito (4).

7 7
9 9
8
6 6
8
3 3
7 7
6 5 5
2 2 4
5 5
4
1 1

3 3
2

1 1 Fig.9 – Exercício 9
Inicio com os apoios paralelos, seguidamente produz-se um
avanço com duplo apoio para o 1º e 2º rectângulos, para
seguidamente sair da escada na diagonal e à retaguarda com um
só apoio (4). Seguidamente, a escada é recuperada com
Fig.8 (a) – Exercício 7 deslocamento lateral e duplo apoio para reiniciar o ciclo agora
Inicio com os apoios paralelos, seguidamente colocar o apoio para o lado contrário (8).
esquerdo dentro do 1º rectângulo (cruzar o apoio) seguido de
duplo apoio simultâneo à direita da escada. A sequência repete-
se agora cruzando o apoio direito para dentro do 2º rectângulo. Uma variante que também pode ser
observada na mesma figura consiste em
O exercício apresentado na figura 9 tem conjugar o drible sempre que se coloca o
como objectivo trabalhar a finta com salto. apoio fora da escada de equilíbrio.
Adapta-se por exemplo para fintar em
espaço amplo ou para evitar interrupção do Os exercícios apresentados são
jogo por parte de um defensor que procura apenas alguns exemplos de combinações
contacto físico. possíveis, no entanto podem ser criadas
outras de acordo com as necessidades
individuais (posto específico) ou colectivas
(escalão etário), nomeadamente trabalhos
que impliquem giros no solo (pivots); com
maior número de bolas/colaboradores
(variando também a sua colocação), etc.
Encadear fintas com ou sem oposição
(condicionada ou não) no final do
exercício, pode produzir uma transferência
imediata dado que a aplicação da finta
ocorre de forma específica.
Posteriormente, também pode ser usada
mais do que uma escada de equilíbrio
(duas paralelas, três em U, quatro em
quadrado ou outras) para que no mesmo
exercício se passe de uma a outra,
modificando o formato de execução do
mesmo (figura 10). Esse formato deve ser
estruturado tendo em conta sempre um
objectivo concreto. Todos os exercícios
podem ser integrados com conteúdos
tecnico-tácticos individuais ou de grupo Fig.10
Pode ser utilizada mais do que uma escada de agilidade no
como se pode observar na figura 11, em sentido de combinar diferentes sequências de com ou sem bola.
que após as tarefas executadas na escada
de agilidade, se produz por um lado uma
situação de 1X1 com apoio (1) e por outro
uma situação de 2X2 (2), ambas em espaço
amplo. Outras variáveis podem ser
integradas em função dos objectivos do
exercício, nomeadamente no respeita às
tarefas dos defensores (colete lastrado,
bola agarrada nas duas mãos, mãos nas
costas, etc.) no sentido de aumentar ou
diminuir a dificuldade do mesmo. Por 1
outro lado, os atacantes podem realizar os 2
exercícios transportando uma carga
adicional para provocar mais instabilidade
que poderá ser por exemplo uma bola
medicinal agarrada à frente do tronco e
adaptada às possibilidades do executante (2
a 4 kg). No final da sequência, procede-se
de imediato à substituição da bola
medicinal por uma regulamentar se o
Fig.11
exercício pretender a integração com o Pode ser utilizada mais do que uma escada de equilíbrio no
trabalho tecnico-táctico. Adicionar cintos sentido de combinar diferentes sequências de exercício com ou
sem bola. Por outro lado também é possível a integração dos
com carga (não superior a 5% do peso total exercícios com outros de carácter tecnico-tácticos (1X1, 2X2,..).
do executante) também representa uma
possibilidade de trabalhar a força
específica associada à finta.
Todos sabemos que a utilização
adequada dos apoios nas tarefas técnico-
tácticas é uma garantia de performance
desportiva. Quantificar essa necessidade já
não é tão exequível, no entanto estou certo
de que exercícios desta natureza podem
conduzir à melhoria de resultados
relacionados com a eficácia da finta, com e
sem bola. Acompanhar a evolução dos
atletas submetidos a este ou outro tipo de
trabalhos implica uma análise exaustivo
das possíveis alterações produzidas. Só
controlando o processo de treino com
meios adequados e credíveis, podemos Referencias bibliográficas
reformular um plano previamente
elaborado. A estatística ou meios
Antón et. al. (2000) Alternativas y factores
videográficos, podem ser uma ferramenta para la mejora del aprendizaje. Editorial Gymnos.
válida para aferir desempenhos motores e
as suas variações. A estatística, embora de Ávila, F. (1998) Los desplazamientos sin
forma generalista, já que existem variáveis balon de los jugadores de campo en balonmano:
difíceis de controlar (nível dos defensores), Factores perceptivos decisionales. RFEBM.
Comunicación técnica nº 170. Revista Asociacion
pode fornecer dados relativos a acções de Entrenadores de Balonmano, nº 4, Junio 1998.
positivas ou negativas relacionadas com a
finta, como ultrapassar um defensor em Boyle, M. (2003) Functional training for
situação de 1X1 (+) ou violar a regra dos sports. Human kinetics.
apoios (-). Por outro lado, a análise
Brown, L. and Ferrigno, V. (2005)
videográfica, permite localizar problemas Training for speed, agility and quickness. Human
em quantidade e qualidade dificilmente Kinetics.
observáveis em jogo.
A escada de agilidade, permite Costello and Kreis, 1993. Sport agility.
também estruturar trabalhos com Nashville, TN: Taylor Sports
orientação específica para a melhoria dos Halberg, G. 2001 Relationships among
deslocamentos dos defensores e do guarda- power, acceleration, maximum speed, programmed
redes. Resta-nos usar a imaginação como agility, and reactive agility: The neural fundaments
uma ferramenta mais, no sentido de of agility. Masters thesis. Central Michigan
encontrar formas, talvez mais evoluídas de University, Mount Pleasant, MI. In Training for
Speed, agility and quickness Brown, L. and
elevar o rendimento dos nossos atletas. Ferrigno, A. (2005). Human Kinetics.

Peñas e Graña, (2001) Las capacidades


coordinativas en los juegos deportivos colectivos.
El balonmano. Revista Asociacion de Entrenadores
de balonmano. nº 17, comunicacion técnica 207.

(Meinel e Schnabel, 1987)

Plisk, S. 2000 Speed, agility, and speed-


endurance development. In Essentials of strength
training and conditioning Association. Champaign,
IL: Human Kinetics.

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