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TEMPO PASCAL. TERCEIRA SEMANA.

SEGUNDA-FEIRA

62. NATURALIDADE CRISTÃ


– Ser cristãos coerentes em todas as situações da vida.

– Apostolado nos ambientes difíceis.

– Rectidão de intenção.

I. O PROCESSO contra Estêvão desencadeou uma grave perseguição


contra a Igreja. Na leitura da Missa de hoje, narram-se a sua atividade
apostólica e o seu martírio1. Estêvão, cheio de graça e fortaleza, fazia
grandes milagres e prodígios entre o povo. Utilizarão contra ele os mesmos
meios e quase as mesmas palavras que se tinham empregado contra Jesus:
Nós o ouvimos dizer – afirmam as testemunhas – que Jesus de Nazaré
destruirá este lugar e mudará as tradições que Moisés nos legou.

Estêvão confessou com valentia a sua fé em Jesus ressuscitado. E é para


nós exemplo – ainda que o Senhor não nos peça o martírio – de uma vida
cristã coerente: uma vida cheia de firmeza, que não se deteve ante os falsos
escândalos nem ante o que poderiam dizer dele.

Devemos ter consciência de que há ambientes em que, vez por outra, nos
olharão com reservas por não entenderem um comportamento cristão nem
muitas das amáveis exigências da doutrina de Cristo. Teremos então de imitar
o Senhor e aqueles que lhe foram fiéis, e estar dispostos a dar a própria vida
por Ele, se for necessário, vivendo serenamente o ideal cristão até as suas
últimas consequências. Seria, sem dúvida, mais cómodo adaptar-nos a essas
situações e estilos de vida paganizados, mas nesse caso já não poderíamos
dizer que queremos ser discípulos fiéis de Cristo. Essas situações, em que
deveremos lançar mão de toda a nossa firmeza de carácter e de toda a
fortaleza na fé, podem ocorrer na Universidade, no trabalho, no lugar em que
passamos uns dias de descanso com a família, etc.

“Nas suas actuações públicas, os cristãos devem inspirar-se nos critérios e


objectivos evangélicos vividos e interpretados pela Igreja. A legítima
diversidade de opiniões nos assuntos temporais não deve impedir a
necessária coincidência dos cristãos na defesa e promoção dos valores e
projectos de vida derivados da moral evangélica”2. O cristão deve repelir
energicamente o receio de parecer chocante se, ao viver como discípulo fiel
do Senhor, a sua conduta for mal interpretada ou claramente rejeitada. Quem
ocultasse a sua personalidade cristã no meio de um ambiente de costumes
pagãos, curvar-se-ia aos respeitos humanos e seria merecedor daquelas
palavras de Jesus: Aquele que me negar diante dos homens, também eu o
negarei diante de meu Pai que está nos céus3.

“Sabem qual é a primeira tentação que o demónio apresenta a uma pessoa


que começou a servir melhor a Deus?, pergunta o santo Cura d’Ars. É o
respeito humano”4. Como é o nosso comportamento com os amigos, no
trabalho, numa reunião social? Mostramos com valentia e simplicidade a
nossa condição de filhos de Deus?

II. ÀS VEZES, parece de “bom tom” falar com frieza das grandes verdades
da vida, ou então silenciá-las por completo. E chega-se a chamar fanático
àquele que fala com entusiasmo de uma causa nobre – defesa da vida
humana desde o momento da concepção, liberdade de ensino... – ou
desqualificam-se com diversos adjectivos aqueles que têm convicções
profundas sobre a vida e o seu destino final.

Sem destemperos, que são alheios ao exemplo amável que Jesus Cristo
nos deixou, procuraremos ter, com a ajuda da graça, uma vida cheia de
convicções cristãs profundas e firmes. Sabemos bem, por exemplo, que a
indiferença perante as maravilhas de Deus é um grande mal, consequência
da tibieza ou de uma fé morta ou adormecida, por muito que a queiramos
disfarçar de “objectividade”.

Por outro lado, o cristão recebeu pelo Baptismo a graça que salva e dá
sentido ao seu caminhar terreno. Em face de um bem tão excelente, é lógico
que esteja alegre e que procure comunicar a sua felicidade às pessoas que
tem a seu lado, através de um apostolado incessante.

Jesus sempre fez o bem. Eu vos pergunto, dizia certa vez a uns escribas e
fariseus que o observavam: É lícito fazer o bem ou fazer o mal? E a seguir
curou o doente da mão seca. Devemos fazer o bem em todos os ambientes,
difundir neles a alegria de termos conhecido o Senhor. Sentimos a
necessidade de atrair almas para a Verdade, para o amor, para Cristo. “E isto
se chama, em correcto vernáculo, proselitismo. Aqui se observa também a
manipulação das palavras. O termo “proselitismo” foi tingido por alguns com
as cores do interesse egoísta, da utilização de meios pouco honestos para
fascinar, coagir ou arregimentar enganosamente os incautos. Tal atitude
merece séria condenação; mas o que é condenável é o proselitismo sectário,
enganador, mercenário, esse que se aproveita da ignorância alheia, da sua
miséria material e da sua solidão afectiva. Mas hão de os cristãos renunciar
por esse motivo à fecundidade apostólica e à fraternidade comunicativa do
proselitismo genuíno?”5

A certeza acerca das verdades da nossa fé – só convence os outros quem


está convencido – e o amor por Cristo hão de estimular-nos a uma
transmissão fecunda daquilo que nós descobrimos, quer dizer, a um leal
proselitismo. E isto em todos os ambientes.

III. O LUGAR EM QUE PROCURAMOS a santidade é o trabalho, o


relacionamento com os colegas de fábrica ou de escritório, o convívio social,
a família.
Se nesses ambientes encontramos obstáculos, incompreensões ou críticas
injustas, temos de pedir a Deus a sua graça para nos mantermos serenos, e
depois ter paciência e, por via de regra, não interromper a acção apostólica.
Ao anunciar a Boa Nova, o Senhor nem sempre deparou com pessoas de boa
fé, e nem por isso deixou de mostrar as maravilhas do Reino de Deus. Nos
começos da Igreja, tanto os Apóstolos como os primeiros cristãos se viram a
braços com situações e ambientes em que, pelo menos a princípio, se
rejeitava frontalmente a doutrina salvadora que traziam em seus corações; e,
não obstante, converteram o mundo antigo. “Não compreendo a tua abulia.
Se tropeças com um grupo de colegas um pouco difícil – que talvez tenha
chegado a ser difícil pelo teu descaso –, logo te desinteressas deles, tiras o
corpo e pensas que são um peso morto, um lastro que se opõe às tuas
aspirações apostólicas, que não te vão entender... – Como queres que te
escutem se, além de querer-lhes bem e servi-los com a tua oração e
mortificação, não lhes falas?...”6

Deixar-se dominar pelos respeitos humanos é próprio de pessoas com uma


formação superficial – que não lhes proporciona critérios claros – e dotadas
de um carácter pouco firme. Com frequência esta atitude, tão pouco atraente
mesmo nos assuntos humanos, goza da protecção do comodismo, que leva a
não querer passar um mau bocado, a ter medo de pôr em risco um cargo, ao
desejo de não chamar a atenção, etc...

Ainda que os nobres se sentem para murmurar de mim, lê-se no salmo


responsorial7, o teu servo medita as tuas leis; os teus preceitos são as minhas
delícias, os teus decretos são os meus conselheiros. Se queremos vencer os
respeitos humanos, necessitamos de rectidão de intenção, para antepor o
parecer de Deus ao parecer dos outros; necessitamos de fortaleza, para
passar por alto com elegância as pequenas críticas, frequentemente
superficiais, que nos possam dirigir; necessitamos de alegria, para podermos
comunicar aos outros esse tesouro que cada discípulo do Senhor encontrou;
e do bom exemplo, que é coerência com a graça que o Senhor pôs em
nossos corações e do qual nunca nos arrependeremos.

Mesmo nos ambientes mais difíceis, é possível aproximar as almas de


Cristo, desde que de verdade desejemos tornar felizes esses amigos, colegas
ou conhecidos. É disso que se trata: “Antes de tentarmos fazer santos todos
aqueles a quem amamos, é preciso que os tornemos felizes e alegres: nada
prepara melhor a alma para a graça do que a alegria.

“Sabes perfeitamente que, quando tens entre as mãos os corações


daqueles que queres tornar melhores e os sabes atrair com a mansidão de
Cristo, já percorreste metade do teu caminho apostólico. Quando te têm
afecto e confiam em ti, quando se mostram contentes, o terreno está
preparado para a sementeira. Seus corações abrem-se, como terra boa, para
receberem o branco trigo da tua palavra de apóstolo, de educador.

“Se souberes falar sem ferir, sem ofender, mesmo que devas corrigir ou
repreender, os corações não se fecharão. De outro modo, as tuas palavras
esbarrarão contra um muro maciço, a tua semente não cairá em terra fértil,
mas à beira da estrada [...] da indiferença ou da falta de confiança, ou na
pedra [...] de um espírito mal disposto, ou entre os espinhos [...] de um
coração ferido, ressentido, cheio de rancor.

“Nunca percamos de vista que o Senhor prometeu a sua eficácia às caras


alegres, aos modos afáveis e cordiais, à palavra clara e persuasiva que dirige
e forma sem magoar [...]. Não devemos esquecer nunca que somos homens
que tratam com outros homens, mesmo quando queremos fazer bem às
almas. Não somos anjos. E por isso a nossa fisionomia, o nosso sorriso, as
nossas maneiras são elementos que condicionam a eficácia do nosso
apostolado”8.

À semelhança dos Apóstolos, encontraremos na Santíssima Virgem a


fortaleza necessária para falar de Deus sem respeitos humanos: “Depois de o
Mestre lhes ter dito, enquanto ascendia à direita de Deus Pai: «Ide e pregai a
todos os povos», os discípulos ficaram com paz. Mas ainda têm dúvidas: não
sabem o que fazer, e reúnem-se com Maria, Rainha dos Apóstolos, para se
converterem em zelosos pregoeiros da Verdade que salvará o mundo”9.

(1) Cfr. At 6, 8-15; (2) Conferência Episcopal Espanhola, Testigo de Dios vivo, 28-VI-1985, n.
64, d; (3) Mt 10, 32; (4) Cura d’Ars, Sermão sobre as tentações; (5) C. Lopez Pardo, em Rev.
Palabra, n. 245; (6) São Josemaría Escrivá, Sulco, n. 954; (7) Sl 118; (8) S. Canals,
Reflexões espirituais, pág. 56-57; (9) São Josemaría Escrivá, Sulco, n. 232.

(Fonte: Website de Francisco Fernández Carvajal AQUI)

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