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Filosofia

vontade
Definition:
atividade refletida e consciente. — Segundo o esquema clássico, a vontade implica:
1.° numa evocação dos motivos; 2.° numa deliberação; 3.° numa decisão; 4.° numa
execução. O ato voluntário não é a manifestação espontânea de um desejo; supõe uma
reflexão e a tomada de suas responsabilidades: devido a isso, a vontade não
corresponde apenas ao desejo mais forte (Herbert) e sim resulta da reflexão, da ação
racional (Sócrates, Leibniz). W. James demonstrou que a vontade está ligada em
geral à consciência de uma exigência social (é o dever social que nos dá, de manhã, a
vontade para sairmos do leito; é mais fácil partir para o combate que deixar de fumar,
pois no primeiro caso existe exigência social, enquanto que, no segundo, há apenas um
simples dever que se quer impor a si mesmo etc.) Ribot distingue duas espécies de
perturbações da vontade: por excesso de impulso (arrebatamento passageiro) e por
falta de inibição (incapacidade de resistir aos desejos: ex. alcoólatras e toxicômanos).
Aquele a que falta vontade denomina-se abúlico. A vontade se define essencialmente
pela flexibilidade e pela continuidade de ação: em seu pleno sentido, a vontade implica
no engajamento total do indivíduo e na arte de seguir os desvios para chegar aos fins.
(V. abúlico.) [Larousse]

Conhecer e querer são dois modos fundamentais da atividade espiritual. Assim como a
ação não é necessariamente mutação, nem o conhecimento intelectual é
necessariamente pensamento discursivo, assim a vontade não denota necessariamente
tendência a um bem que se deva adquirir ou realizar. Seu ato fundamental é a
afirmação de um valor, ou seja, o amor. Por isso, é também vontade a efetuação
espiritual, não tendencial, do valor infinito (vontade de Deus). A vontade em geral
tem como objeto característico o valor em geral ou o bem como tal. A vontade
aparece como apetite só onde o bem não se identifica com a vontade ou onde não está
originariamente ligado a ela. Por isso, a vontade humana pode ser designada como a
faculdade espiritual, que o homem possui de afirmar os valores intelectualmente
conhecidos ou de tender para eles. Seu objeto característico é o da vontade em geral: o
ser como valor, mas apresentado segundo o modo peculiar do conhecimento e do
entendimento humanos. Enquanto o apetite sensitivo (tendência) se restringe ao
estreito domínio de bens sensivelmente aceitáveis, a vontade tem um domínio objetivo
ilimitado. Com efeito, pode dirigir-se somente àquilo que de algum modo aparece como
bom, mas também a tudo quanto possua esta qualidade; ora isto é o que constitui o
domínio ilimitado do ente em geral, porque todo ser é, de algum modo, valioso.

Como causa final que atua por mediação do conhecimento intelectual, a bondade
atrativa do objeto é, ao mesmo tempo, motivo de vontade. O querer está, assim,
arreigado imediatamente no motivo conhecido, mas mediatamente em tudo o que, por
parte das diversas disposições e "camadas" da alma, coopera para a constituição dos
juízos do valor. Quer dizer que para o complexo da vivência valorativa contribuem
igualmente todos os estados afetivos psíquicos, como a disposição de ânimo, o
temperamento, as bases sensoriais do pensamento, o caráter, o tipo de personalidade
e a profusão de complexos inconscientes. Pela vivência valorativa são provocados os
primeiros movimentos da vontade, os quais, por sua parte, podem repercutir-se sobre a
ulterior configuração da vivência motivai. Todavia, dentro de certos limites, a
orientação última da vontade continua sendo, nas lutas suscitadas pelos motivos, dentro
de certos limites, um ato voluntário livre (liberdade da vontade).
O objeto do querer, que por sua bondade deve ser pretendido, tem de estar sintonizado
até certo ponto com a perfeição ontológica do sujeito ape-tente. Quando se trata de
uma efetivação séria de fins da vontade, o objeto não pode aparecer ao sujeito como
irrealizável em tal momento e lugar, porque a vontade não pode querer seriamente o
impossível nem, em geral, o mal pelo mal. — À base de inumeráveis experiências,
distinguimos um querer enérgico e outro fraco. Não obstante, discute-se se a "vontade"
(como faculdade particular) é intrinsecamente, ontologicamente, forte ou fraca e se, pelo
"exercício", se pode consolidar. Boas razões militam em favor de que o sentido dos
chamados exercícios da vontade não consiste num acréscimo intrínseco-ontológico da
força de vontade, mas sim na criação de uma constelação psíquica total de complexos,
na qual determinados valores objetivos são vividos com maior facilidade subjetivamente
como valores superiores, ao querer correspondente se contrapõem menos obstáculos
interiores psíquicos, e hábitos favoráveis facilitam mais que o querer se imponha no
conjunto da alma (cf. a teoria da vontade de Lindworsky). — A vontade, como
potência apetitiva espiritual, brota do conhecimento intelectual e abarca fins
intelectualmente apreendidos. Pelo que, não se pode falar, em rigor de expressão, de
querer inconsciente como de mero impulso surdo (como se fala de tendências naturais
sensitivas), a não ser que se equipare a vontade ao apetite. Ver o fundamento último
de toda a realidade do universo num querer inconsciente (filosofia do inconsciente,
Schopenhauer, Ed. v. Hartmann) contradiz o princípio de razão suficiente, porque o
superior (a vontade espiritual) não pode ter seu fundamento no inferior (o apetite
inconsciente). — Willwoll. [Brugger]

É compreendida principalmente em três sentidos:


1. Psicologicamente, como um conjunto de fenômenos psíquicos ou também como uma
faculdade cujo caráter essencial se encontra na tendência. 2. eticamente, como uma
atitude ou disposição moral para querer algo. 3. Metafisicamente, como uma entidade
à qual se atribui absoluta subsistência e se converte por isso em substrato de todos os
fenômenos. Estas três significações da vontade caraterizam as diferentes acepções do
voluntarismo, mas junto com a distinção, necessária em toda a investigação filosófica,
deve reconhecer-se que em quase todas as doutrinas voluntaristas se proclama o
domínio da vontade nas três esferas e se passa insensivelmente da psicológica à
metafísica ou, pelo menos, à ética. Muito corrente foi no passado confundir a vontade
com certos tipos de sentimento, qualificados de ativos em oposição aos sentimentos
passivos. No entanto, o resultado de todas as investigações parece conduzir ao
reconhecimento do caráter originário da vontade, sem que isso signifique a vontade
tenha de ser considerada como algo inefável, pois é susceptível, pelo menos, de uma
descrição. Esta descrição permite não só averiguar a natureza da vontade, mas
também os seus graus e formas, bem como os atos psíquicos que se encontram
intimamente vinculados com ela. No fenômeno volitivo concorrem, portanto,
numerosos fenômenos psíquicos de vários tipos. Entre estes destacou-se sempre o
elemento intelectual. Por isso se tem tentado com frequência compreender as
diferentes teoria psicológicas acerca da vontade de acordo com o maior ou menor
predomínio citado elemento, desde os que o fazem depender da consciência plena do
representado e do juízo da conveniência ou inconveniência de entender ao fim a que a
representação propõe, até aos que reduzem a um mínimo estes elementos. Geralmente
considera-se que em todo o fenômeno da vontade há uma prévia representação, ou
melhor dizendo, um conhecimento, uma finalidade, uma decisão, uma resolução e uma
ação. Entrelaçados com estes elementos encontram-se os chamados motivos da
vontade, que são concebido às vezes como o que faz com que a vontade se ponha em
marcha e q noutras vezes são concebidos como um mero incentivo do momento da
resolução ou da ação.
A história do conceito de vontade desenvolve-se na linha da discussão em torno do
predomínio da vontade sobre o conjunto dos fenômenos psíquicos e em torno da sua
relação com o intelecto. A relação entre vontade e desejo foi já tratada a fundo dentro
da filosofia antiga, especialmente em Platão e Aristóteles. O primeiro advertia que
enquanto o desejo pertence à ordem do sensível, a vontade pertence, em contrapartida,
à ordem do intelecto. Quanto a Aristóteles, assinalava explicitamente que embora desejo
e vontade sejam, por igual, motores, a vontade é de índole racional. Desde então a
racionalidade da vontade quase nunca foi desmentida... Isto não significa que deixasse
de acentuar-se o caráter motor dos atos volitivos e ainda o fato de, como precisou Santo
Agostinho, a vontade ser capaz de intervir em todas as funções anímica.. Com o que a
vontade pôde converter-se numa espécie de motor ou movimento de potências, e
portanto, num princípio que podia inclusivamente aplicar-se a todas as espécies de
apetites, tanto os naturais como os racionais... S. Tomás precisa, em primeiro lugar, que
a vontade não está submetida em nenhum dos seus atos à necessidade (e isto até ao
ponto de vontade e livre arbítrio não serem potências diferentes, mas uma só
potência). Em segundo lugar, a vontade não quer necessariamente tudo o que quer. Em
terceiro lugar, embora pareça que, sendo o Bem o objeto formal da vontade, esta terá
de ser a mais elevada das potências, o objeto do intelecto é mais nobre que o da
vontade, pelo que o intelecto será a potência mais elevada. Em quarto lugar, o intelecto
move a vontade, mas como fim. O que não significa, certamente, que a vontade esteja
no seu próprio atuar eternamente subordinada ao intelecto; na verdade, se o intelecto
move a vontade quanto à especificação, a vontade move o intelecto quanto ao ato do
seu exercício.. Para Duns Escoto, em contrapartida, a vontade é um verdadeiro motor,
quer dizer impulsiona e dirige o movimento em todo o reino das faculdades. E quando
esta vontade é divina, pode ser considerada como a primeira causa do ser,
diferentemente da causa parcial que define o intelecto. O conceito de Deus, tal como foi
desenvolvido por Duns Escoto, por Ocam e por Descartes, sublinha, por outro lado., até
ao máximo este carácter directo e não o apenas motor da vontade. A determinação do
intelecto pela vontade, o primado desta, parecem, portanto, cumprir-se, segundo Duns
Escoto, em todas as esferas do ente. É usual chamar a esta posição voluntarismo e à de
S. Tomás intelectualismo... O problema da relação entre vontade e inteligência não
tem sido apenas uma questão teológica ou psicológica; tem sido também, e às vezes de
um modo muito eminente, uma questão ética. Esta questão apresentou-se com toda a
clareza desde tempos muito remotos, mas acentuou-se a partir do momento em que se
perguntou de que modo se fundamenta o Bem em Deus. Também aqui se contrapuseram
as opiniões de S. Tomás e Duns Escoto. Enquanto para S. Tomás Deus quer o bom, para
Duns escoto, o bom é bom porque Deus o quer. A omnipotência de Deus faz, de acordo
com Duns Escoto, que não haja para o ser supremo nenhum obstáculo à sua vontade
infinita, nem sequer o obstáculo da ideia, que não é mais que causa ocasional para a
vontade humana e que não pode representar nenhuma limitação para a divina, pois
esta é, por assim dizer, o absoluto ser que se move e decide absolutamente por si
mesmo. O próprio problema de Deus é o que faz destacar até ao máximo todas as
implicações do problema da vontade e do voluntarismo. Este foi um dos temas capitais
da época moderna, pelo menos na medida em que alguns dos representantes capitais da
sua filosofia - como Descartes, Kant ou Fichte - sustentaram, explícita ou
implicitamente, um voluntarismo. [Ferrater]

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