Você está na página 1de 2

Aos estudantes de Filosofia,

Este é um convite à construção.

Não há dificuldades em reconhecer as diversas debilidades que os estudantes têm enquanto


movimento, na sua prática e organização – elas são um reflexo de uma cultura preponderante em
nosso cotidiano que ausenta valores da coletividade, do respeito às diversidades, da cooperação e
principalmente do envolvimento em uma construção unitária. O que nos é presente é a cultura do
individual acima do coletivo, que se expressa no esvaziamento dos espaços públicos e do debate.

No entanto, pouco ou quase nada temos feito para alterar este cenário. A opção mais cômoda e mais
freqüente se restringe ao descrédito e à ausência de participação dessa realidade, lidando com ela de
maneira apática e sem se reconhecer enquanto sujeito de uma possível inversão do quadro colocado.

O Movimento Estudantil tem se ensimesmado e consumido muitos esforços buscando sempre o


inimigo interno; infantiliza-se ao não conseguir bancar as disputas reais, externas ao movimento. Essa
lógica de atuação internalista alimenta a disputa fratricida entre seus próprios setores, fragmentando
e fragilizando ainda mais nossas movimentações. Devemos nos dispor a reverter esse tipo de prática,
tendo em vista um processo que aglomere e acumule para a disputa de um projeto coletivo para a
universidade pública, que apresente uma alternativa ao que nos está colocado.

A inovação de nossos métodos está pendente há muito, e ela provirá da ampliação dos atores que
compõem o palco da universidade. Da explosão de idéias e fermentação dos debates, sustentando
a pluralidade e sabendo dialogar com ela, traremos o novo; a coletividade dá base de apoio para
o desenvolvimento de uma construção legítima e representativa para que se viabilize a busca de
alternativas numa lógica de complementariedade, com a predisposição na busca pelo que nos toca
em comum.

O X Congresso dos Estudantes da USP vem nesse sentido: para além de seu caráter deliberativo
– pois ele representa nossa máxima instância – é um espaço de formação. Esse é sem dúvida um
dos elementos fundamentais para que possamos formular estrategicamente e ter uma atuação mais
propositiva e coesa, que não se resuma à mera reatividade. O Congresso estabelece nossas principais
diretrizes de atuação durante os próximos dois anos. Essa plataforma política nos garante uma
atuação mais perene e democrática, independente de quais serão as próximas gestões das entidades
estudantis. Ele propicia um contato entre os estudantes de diversas unidades, que trazem realidades
locais diversas, devido à própria fragmentação de nossa academia. Esperamos que desse contato
possa provir uma quebra de preconceitos e paradigmas que se baseiam em estereótipos de estudantes
dentro da universidade.

O Congresso vai balizar seus debates em torno de três eixos: Conjuntura e Educação, Universidade
e Movimento Estudantil. Esse espaço de reflexão, quase ausente no movimento, é um momento para
nos debruçarmos sobre a universidade e a nossa sociedade e repensarmos nossas práticas cotidianas.
Enquanto delegados do curso de Filosofia, nos comprometemos a estar a par das discussões colocadas
e a trazer um retorno para a movimentação de nosso curso.

O Congresso é um instrumento de mobilização e organização, indispensáveis para que tenhamos forças


para colocar em xeque o projeto de universidade vigente. O descaso e a desresponsabilização do Estado
com os direitos sociais os invertem em serviços e os restringem a privilégios àqueles que possuem
meios de detê-los. A universidade vem sendo gradualmente submetida à lógica empresarial, colocando a
produção de conhecimento a serviço de interesses determinados de uma parcela restrita, dentro e fora
da USP, que direcionam diretamente o tripé ensino–pesquisa-extensão.

Essa expressiva influência externa gera uma inversão ideológica do caráter acadêmico. O critério
pedagógico qualitativo de ensino reverte-se em um padrão quantitativo-mercadológico, comprometendo
diretamente a produção de conhecimento, uma vez que a submete a essa mesma lógica meritocrática
da excelência e do produtivismo empresarial. Essa relação mercadológica com o ensino se reverbera
inclusive nas relações que os próprios estudantes estabelencem com o próprio.

A universidade pública é um espaço privilegiado, justamente porque não devia sofrer esse tipo de
pressão, onde se deveria produzir livremente, um conhecimento crítico, universal e autônomo. Mas
não é isso que vemos ocorrendo na USP. Defendemos um projeto que reforce o caráter público da
Universidade como espaço de ensino com potencial emancipatório e enxergamos a educação como setor
estratégico e ferramenta essencial para uma transformação mais ampla da sociedade em que vivemos.

O eixo da nossa iniciativa é justamente reconhecê-la e valorizá-la enquanto tal. A partir da análise
do que está dado e da insatisfação com a constatação da atual conjuntura, reconhecemos a
necessidade de transformar a indignação em mobilização!

É importante, portanto, que os estudantes de Filosofia se expressem, também,


por meio do voto, dada a impossibilidade da participação ativa de todos e, sendo
assim serão representados pelos delegados eleitos; no entanto, enfatizamos
a necessidade do envolvimento de todos com o processo do Congresso de
maneira coletiva, não se limitando as suas deliberações pura e simplesmente.

Assinam: Paulo de Sousa Morais, Luís Eduardo Prado, Vinícius Gueraldo, Vivian Petri,
Guilherme Riscali, Isabella Oku, Abdeir Crispim, Marcelo Gomes, Mateus Novaes Dias,
Marcelo Soares, Inauê Taiguara, Amanda Saud, Mateus Castilha, Maria Rita Morita e
José Calixto, Douglas Anfra, Rafael Versolato.

“Em vão me tento explicar, os muros são surdos.


Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que triste são as coisas, consideradas em ênfase.”

Você também pode gostar