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Direito Penal – 1ª aula – Dia 13/05/2010

Bibliografia:
Parte Geral, Rogério Greco, Vol. I
Parte especial: Código Comentado

Aplicação da norma penal no tempo e no espaço: de acordo com a data da ocorrência


do crime, qual lei penal aplicar?
Em regra, as leis penais são irretroativas, salvo quando benéficas para o réu
(art. 5º, XL/CF). Significa que essas leis não se aplicam fora do seu tempo, isto é, não
se aplicam a fatos anteriores e nem posteriores a ela. Aplica-se a lei penal vigente à
época do crime, em regra.

A data do início da lei penal é aquela que é dada pela vacatio legis, isto é,
após a publicação começa a correr o prazo da vacatio (em regra esse tempo é de 45
dias após a sua publicação, mas pode ser maior ou menor).
Pode ocorrer também que a lei entre em vigor na data da sua publicação,
sem a vacatio legis, conforme texto da própria lei.
A eficácia temporal da norma penal vai variar conforme o tipo de lei. Se for uma
lei comum, seu prazo será indeterminado e regularam situações ordinárias (como o
homicídio, por exemplo). Tais leis só perderão a validade com a revogação desta por
outra lei, ou se forem consideradas inconstitucionais. A revogação pode ser total (ab-
rogação) ou parcial (derrogação). Pode ser também expressa ou tácita (quando a lei
posterior for incompatível com a anterior – ex. art. 244 – A do ECA foi revogado
tacitamente pelo art. 218 - B do Código penal, conforme princípio da novidade, em que
a lei mais nova revoga a mais antiga quando tratarem de mesmo assunto).
No caso das leis temporárias, elas já possuem em seu próprio texto uma
data para a sua auto-revogação (mas se houver uma lei nova antes desse prazo final
ocorrerá a revogação da lei temporária, sem problemas).
Há também as leis excepcionais, que estão vinculadas a um fato para terem
início e fim (ex.: em casos de guerra é permitida a pena de morte) e, finalizando-se
esse fato excepcional, finda-se a vigência da lei.
Para se aplicar a lei penal adequada, deve-se saber a data de ocorrência do fato
criminoso. Assim, o tempo do crime é estabelecido pelo art. 4º do CP. São três
teorias:

1) Teoria da atividade: o tempo do crime é o tempo da conduta;


2) Teoria do resultado: o tempo do crime seria o momento do resultado;
3) Teoria da ubiguidade ou mista: o tempo do crime será tanto o momento da
conduta ou no momento do resultado.

Obs.: Prevalece no Brasil a Teoria da Atividade, isto é, mesmo que a consumação do


crime ocorra futuramente, o fato criminoso considera-se praticado no momento da ação
ou omissão, ainda que seja outro o momento do resultado.

Exceções à teoria da atividade, isto é, a data do crime vai deixar de ser um dia fixo
e passa a ser um período temporal. São 3 casos:

1) Crime permanente: a conduta e a consumação se prolongam no tempo


(extorsão mediante seqüestro – art. 159 do CP). Enquanto o agente
permanecer praticando a conduta o crime não termina. Nesse intervalo

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(entre o início da conduta criminosa e seu fim) surgindo lei penal nova,
mesmo que mais gravosa, esta irá retroagir, conforme súmula 711 do STF.

2) Crime habitual (é um único crime – cada conduta isoladamente não constitui


crime): é aquele em que a conduta é reiterada, repetida (ex.: art. 229/CP –
Casa de prostituição; curandeirismo – art. 284/CP). Nesse caso, também a lei
nova irá retroagir, segundo súmula 711 do STF.

3) Crimes continuados (são vários crimes/concurso de crimes): são aqueles


previstos no art. 71 do CP (quando o agente, mais de uma ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes da mesma espécie (embora haja divergência
doutrinária, o STF entende que crime de mesma espécie são aqueles
previstos no mesmo tipo penal), aproveitando-se das condições de tempo,
lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os crimes seguintes
ser havidos como continuação do primeiro...). Aqui também se aplica a
súmula 711 do STF, isto é, a lei nova, mesmo que mais gravosa, irá retroagir
até o primeiro delito cometido.

Súmula 711 do STF: A lei mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da
permanência.
Apesar de a súmula referir-se à continuidade e à permanência, aplica-se
também ao crime habitual, só não existe alusão ao crime habitual na referida súmula
porque tal delito não chegou a ser discutido no STF. Na verdade, se a conduta
continua durante a vigência de uma nova lei, é claro que é a lei vigente que vai ser
aplicada ao caso, sendo mais grave ou não.

Situações de extratividade da lei penal – art. 2º do CP (significa aplicar a lei penal


fora de seu tempo: retroatividade e ultratividade – avançar/efeitos futuros):

A garantia da irretroatividade da lei penal mais gravosa é encontrada no


art. 5º, XL/CF (a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu). Todavia,
tratando-se de lei penal nova mais benéfica a regra a ser aplicada é a da
retroatividade, e isso pode ocorrer em duas hipóteses:

1) O fato não é mais considerado crime (abolitio criminis – art. 2º, caput/ CP);

2) A lei nova, de alguma forma, beneficia o réu (Lex mitior).

Obs.: Se a lei nova for posterior ao fato criminoso haverá retroatividade; caso a lei nova
seja anterior ao fato criminoso haverá ultratividade da lei.

Obs2: No caso de abolitio criminis ocorrerá extinção da punibilidade, conforme art.


107, III/CP. Não significa dizer que o agente não cometeu o crime no passado, pois no
momento de sua conduta o fato era criminoso. O agente não será absolvido, terá
apenas extinta a punibilidade. Todavia, se ele já foi condenado com trânsito em
julgado da sentença condenatória, conforme art. 2º, parte final do CP, cessam os
efeitos penais da sentença, devendo o condenado ser imediatamente livre.

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Obs3: A nova lei que deixa de considerar criminoso um fato faz cessar os efeitos da
sentença penal condenatória, mas não cessa os seus efeitos civis (arts. 91 e 92 do CP
– efeitos da condenação. São efeitos extrapenais e, portanto, a abolitio criminis não
cessa tais efeitos, devendo esses danos ser indenizados).

Efeitos da condenação: arts. 91(não precisam ser motivados/expressos na sentença) e 92


(o juiz precisa motivar na sentença), ambos do CP:

Obs.: O legislador pode criar novos efeitos extrapenais ou alterar os já existentes.

Ex.: Lavagem de dinheiro – O art. 7º da lei 9613/98 prevê como efeito da condenação,
além daqueles previstos no CP, a perda em favor da União dos bens, direitos e valores
objeto de crime...

Efeitos da condenação criminal – arts. 91 e 92 do CP

Art. 91. São efeitos da condenação: (denominados efeitos extrapenais genéricos).

I) Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

II) A perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro


de boa-fé:

a) Dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico,


alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;

b) Do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito


auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

Comentários: O tipo ora apresentado apresenta os chamados efeitos extrapenais da


condenação criminal. Esses efeitos podem ser genéricos (caso do artigo 91 do CP) ou
específicos (caso do artigo 92 do CP).

Os efeitos genéricos da condenação (art.91/CP) são AUTOMÁTICOS,


DISPENSANDO-SE SUA EXPRESSA DECLARAÇÃO NA SENTENÇA
CONDENATÓRIA (o juiz não precisa declarar o motivo).

1º efeito extrapenal genérico: tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado


pelo crime (art. 91, I/CP). A condenação penal irrecorrível faz COISA JULGADA
NO CÍVEL, PARA FINS DE REPARAÇÃO DE DANO. A sentença penal com
trânsito em julgado é título executório no juízo cível, permitindo ao ofendido
reclamar indenização sem que o condenado pelo delito possa discutir a existência do
crime ou a sua responsabilidade por ele.

2º efeito extrapenal genérico: perda em favor da União de instrumentos e do


produto do crime, ressalvado o direito do lesado ou terceiro de boa-fé (art. 91,
II/CP).
São considerados instrumentos os objetos usados para o cometimento do delito.
A lei não se refere a instrumentos utilizados em CONTRAVENÇÃO.

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Produto do crime ou qualquer outro bem o valor são as coisas obtidas
diretamente ou indiretamente com a prática do delito.

Obs.: O artigo 91, II/CP trata do CONFISCO de bens, isto é, perda em favor da
União de instrumentos e produtos provenientes de crime. Todavia, a apreensão de
bens que não estejam arrolados nesse dispositivo legal só se justifica se forem
imprescindíveis à produção de alguma prova.

Obs2: O veículo utilizado em descaminho ou contrabando só deve permanecer


apreendido na esfera criminal se houver possibilidade de, ao final da ação penal, ser
decretado o confisco do bem por ser instrumento do crime ou produto deste.

Obs3: O fato de ter sido encontrado entorpecente no veículo não é suficiente para
autorizar a sua perda em favor da União.

Obs4: A decisão que decreta a perda de dinheiro apreendido com traficante preso em
flagrante deve ser fundamentada.

Art. 92. São também efeitos da condenação (denominados efeitos extrapenais


específicos):

I) A perda de cargo, função ou mandato eletivo, nas seguintes hipóteses:

a) Quando aplicada PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR TEMPO


IGUAL OU SUPERIOR A 1 ANO, NOS CRIMES PRATICADOS COM
ABUSO DE PODER OU VIOLAÇÃO DE DEVER COM A
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA;

b) Quando aplicada a PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR TEMPO


SUPERIOR A 4 ANOS, NOS DEMAIS CASOS.

II) A incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos


CRIMES DOLOSOS, SUJEITOS À PENA DE RECLUSÃO,
COMETIDO CONTRA FILHO, TUTELADO OU CURATELADO;

III) A inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a
prática de crime doloso.

Parágrafo único: OS EFEITOS DE QUE TRATA ESTE ARTIGO NÃO SÃO


AUTOMÁTICOS, DEVENDO SER MOTIVADAMENTE DECLARADOS NA
SENTENÇA.

Comentários: os efeitos deste artigo são ESPECÍFICOS E NÃO


AUTOMÁTICOS, e só se aplicam a determinados crimes cuja sentença
condenatória deverá ser expressa, isto é, deverá motivar tais medidas.

1º efeito específico: perda de cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 92,
I/CP). Tal efeito encontra respaldo No artigo 15, III/CF. Tratando-se de
SENADORES E DEPUTADOS FEDERAIS, APESAR DE NÃO MAIS SER
NECESSÁRIA A PRÉVIA AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA PARA QUE

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ELES SEJAM PROCESSADOS PERANTE O STF (vide art. 53da CF), A
PERDA DE SEU MANDATO EXIGE DELIBERAÇÃO, MEDIANTE VOTO
SECRETO, DA MAIORIA ABSOLUTA DA RESPECTIVA CASA (art. 55,
VI, §3º/CF). No âmbito estadual, APLICAM-SE AS MESMAS REGRAS DOS
PARLAMENTARES FEDERAIS (arts. 27 e 32, § 3º/CF).

2º efeito específico: incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela


(art. 92, II/CP). São exigidas duas condições concomitantes:

1) Os crimes devem ser DOLOSOS, sujeitos à pena de RECLUSÃO;


2) Devem ser cometidos contra filhos, tutelado ou curatelado.

3º efeito específico: inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para
a prática de doloso. Não depende que o agente tenha habilitação, pois o que se prevê é a
própria inabilitação para que o sujeito possa vir a dirigir. Todavia, como a CF veda
qualquer pena de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, b/CF), a interdição só pode durar
enquanto não tiver havido a reabilitação penal.

Retornando à aplicação da lei penal no tempo – art. 2º do CP: Sabe-se que a lei
penal, em regra, não retroage. Todavia, conforme parágrafo único do artigo 2º/CP, se a
lei posterior DE QUALQUER MODO FAVORACER O AGENTE, AINDA QUE A
SENTENÇA TENHA TRANSITADO EM JULGADO, APLICA-SE A FATOS
ANTERIORES (RETROAGE – NOVATIO LEGIS IN MELLIUS). Vide artigo 5º,
XL/CF.

Ex.: Reclusão de 1 a 4 anos e multa – Lei A.


Reclusão de 1 a 4 anos ou multa – Lei B.

Nesse caso a lei mais benéfica é a B e, assim, retroagirá.

Obs.: A combinação de leis pode ocorrer para beneficiar o réu, isto é, aplicar parte
da lei da data do crime e parte da lei nova, desde que, assim, torne uma situação
benéfica para o agente. Havia divergência doutrinária, mas hoje tal questão está
pacificada. Alguns autores diziam que ao combinar duas leis criar-se-ia uma terceira lei.
Mas a tarefa de criar lei cabe ao Legislativo, e não ao Judiciário. Por isso, essa posição
não vigorou. Assim, pode-se retroagir somente a parte da lei nova mais benéfica,
combinando-se com dispositivos da lei antiga. (O STF e o STJ aceitam).

Lei intermediária: caso uma lei seja sucedida por outra, e esta sucedida por outra,
para fins de retroatividade, ainda que a lei seja intermediária, aplicar-se-á a lei
mais benéfica. Essa lei temporária terá dupla extratividade, isto é, retroagirá em relação
ao fato pretérito e será ultrativa em relação à sentença, digo, julgamentos posteriores.

Ex.: Fato ocorre sob a vigência da lei A. Surge uma lei nova (B), temporária, mais
benéfica e em seguida volta a vigorar a lei prejudicial ao réu, mesmo após a sentença.
Nesse caso, a lei B retroagirá em relação ao fato criminoso e será ultrativa, isto
é, terá efeitos futuros em relação à sentença.

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Art. 3º do CP – Lei temporária ou excepcional: Aplica-se a lei temporária ou
excepcional, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as
circunstâncias que a determinaram, ao fato praticado durante a sua vigência. Essas
leis terão sempre ultratividade para fatos que serão julgados no futuro, mas que
ocorreram durante a vigências delas.
Ocorrido um fato durante a vigência de uma lei temporária ou excepcional,
não ocorrerá o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica. Como são
leis especiais, não faria sentido admitir que mesmo após cessados o tempo de vigência
da lei temporária ou as circunstâncias que autorizavam a lei excepcional uma lei mais
benéfica retroagisse para anular os efeitos de tais leis, sob pena de se frustrar toda a
força intimidativa delas (afasta-se a abolitio criminis).

Obs.: Durante a vacatio legis (ela é vigente, mas não tem eficácia) de uma lei mais
benéfica ela não retroage, uma vez que nenhuma lei durante esse período não tem
eficácia. A lei nova só irá retroagir depois de esgotada a vacatio legis.

Obs2: Leis declaradas inconstitucionais (elas entram em vigor, mas uma das partes
legítimas na CF vai reclamar a sua inconstitucionalidade perante o STF. É o STF quem
declara se a lei é inconstitucional e, assim, tal declaração terá efeito EX TUNC) ou
ilegais podem ter aplicação se forem mais benéficas? Sim, tais leis terão efeitos
retroativos (efeito ex tunc) depois de declarada a inconstitucionalidade, desde que mais
benéficas.

Normas penais em branco: são aquelas que não possuem definição integral,
necessitando de complementação por outras leis, decretos ou portarias. Podem ser
homogêneas (quando o complemento tem a mesma origem legislativa que a norma
penal), ou heterogênea (quando o complemento tiver origem diversa da norma
penal).

Ex.: A lei de drogas (11.343/06) precisa de complementação do Ministério da Saúde


(através de portaria) para definir o que vem a ser “drogas” (norma penal em branco
heterogênea).

Dentro de tais normas como ficará o princípio da retroatividade da norma penal


mais benéfica? Se a complementação da norma for alterada e esse complemento
tiver uma característica de lei comum, irá retroagir. Ex.: O rol de drogas deixa de
considerar alguma substancia como tal, irá retroagir. Como esse rol é de aspecto
definitivo, se assemelha à lei comum, e por isso retroage. Todavia, se o complemento
da norma penal em branco tiver um caráter temporário ou excepcional, ainda que
ocorra uma alteração mais benéfica, mesmo assim não irá retroagir.

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