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ORGANIZACAO Sigrid Nora EDITORA CONVIDADA Maira Spanghero Pritts 18 Edigéo Caxias do Sul — RS 2007 © 2007 by Nora, Sigrid PLANEJAMENTO & REALIZACAO: Sigrid Nora ORGANIZAGAO: Sigrid Nora EDITORA CONVIDADA: Maira Spanghero REVISAO DE TEXTOS: Ivone Polidoro Franco DIAGRAMAGAO: vanessa Scola IMPRESSAO: Lotigraf - Grafica e Editora Ltda. Dados Intemacionais de Catalogagao na Fonte (CIP) Biblioteca Publica Municipal Dr. Demetrio Niederauer Caxias do Sul, RS 929 Humus, 3 / org. Sigrid Nora. - Caxias do Sul: Lorigraf, 2007. 220 p, Artigos de varios autores sob organizacéo de Sigrid Nora. ISBN 978-85-99089-14-9 1, Linguagem corporal. 2. Comunicagao - Corpo. 3. Expressao corporal. 4. Danga. |. Nora, Sigrid (org.) t CDU 159.925 Catalogagao elaborada por Maria Nair Sodré Monteiro da Cruz - CRB 10/904 s SUMARIO Apresentacdo rc 9 O corpo humano: objeto e sujeito Jayme Paviani ... : cron 1B Presenca e limite: esbogo de uma reflexao Luciana Paludo in «8 ‘Arepresentagéo do corpo na Historia da Arte Silvana Boone ..... 2 35 ‘As manifestagées do corpo do idoso a partir da terapia corporal no meio aquatic Adelina Lobo sone 45 As muitas danas do Brasil: uma reflexéo histérica Amaldo Leite de Alvarenga . oss 59 Dramaturgia em danga: estratégias de colabarageo Fétima Saadi a ; His 7 Alguns dialogos foram posstveis Cecilia Almeida Salles... oad 87 © corpo cémico do palhaco e uma teoria do riso Mario Femando Bolognesi : : sone 103 Anjo Novo: memdrias de um projeto Sofia Cavalcante : - 113 Agravidade de um corpo Adriana Banana . : i 123 ‘As metéforas de demarcacao do corpo cénico Sandra Meyer ie : vo 135 Cine-danca ¢ video-danca: quando o pretexto se faz texto Cristiane Wosniak . re 151 Danca e iconicidade: para enfrentar uma navegacao sem cartografia Airton Tomazzoni : : 167 Possiveis didlogos histéricos para a construgao de uma linguagem contemporanea na danca em Belo Horizonte Gabriele Generoso .... = goss LIT Relagdes entre a cidade e a danca: 0 viver biopolitico fala Clay de Oliveira Freitas... . en anes 191 Cada danga tem seu jeito ou cada inventor descobre um jeito Helena Bast0s «0. a 201 Airton Tomazzoni* RESUMO: Como entender a trama de sentidos que se configura na danga? A partir dessa delicada e complexa questo, o texto arrisca o transito pela idgia de iconicidade, presente na obra de C. S. Peirce para comecar a enfrentar esse desafio, O intuito é o de ressaltar a especificidade do movimento de danga e sua particularidade no processo de significagéo. Essa mirada reflexiva parte da producao mididtica para evidenciar a operacionalidade do conceito de fcone no entendimento dos signos da danga, navegando pelos mares da cultura pés-moderna Toda vez que se tenta dar conta do processo de significacéo que envolve a danca, parece que é preciso enfrentar um vocabulario e uma sintaxe que nenhum dicionério ou gramdatica permite traduzir com seguranca. Como jé alertara Ray Birdwhistel,' “ndo existe a significagdo de um gesto; 0 gesto integra-se num sistema interacional em miltiplos canais, que se contfirmam ou se infirmam mutuamente”. (Apud WINKIN, 1998, p.78). Esse alerta parece valido ao se pensar 0 movimento de danga € suas relagées intensionais. Qual € a légica da trama de significacdo que 0 movimento suscita? * professor no curso de Graduagéio em Danca da UERGSIRS/Fundarte. Doutorando em Educagao pela UFRGS/RS. Mestre em Processos Midiaticos palo PPG de Ciencias da Comunicagao, da Unisinos/RS. Jomalista, coredgrato, colunista do site Idanga e diretor do Centro Municipal de Danga de Porto Alegre. ) Pesquisador norte-americano da Escola de Palo Alto, que dedicou inumeros estudos 20 entendimento da gestualidade no proceso de comunicagao a partir das interag6es sociais, tendo publicade Introduction to kinesis (1962). Proponho comegar esta reflexdo por um viés pouco usual, mas talvez eficaz para evidenciar essa telacdio. Proponho comecar a partir do refrdo de uma cangao que foi “febre” no ano de 2003, nas programacées televisiva e radiofénica e que veio acompanhada de uma coreografia que alcangou 0 sucesso de sua “prima” Macarena. Estou falando de Ragatanga, que era marcada pelo seguinte refrao: “Aserehe ra de re { De hebe tu de hebere | seibiunouba mahabi / An de bugui an de buididipi.” O refrao acima foi um dos sucessos mais tocados no verao de 2003, trecho da mtisica do grupo Rouge,? que invadiu a programacao televisiva em programas de auditério e de videoclipes. Um desafio semantico que nao impediu que a miisica virasse mania no Brasil, cantada e dancada de norte a sul por um piiblico das mais variadas idades. A letra nao remete a qualquer sentido estabelecido. A sonoridade das silabas é que fala mais alto. Ao se ouvir 0 refrao, ‘© que chama aatenciio é essa propriedade de sentido estabelecida pela qualidade sonora das silabas. Trago esse fato para, a partir da letra da referida miisica, entender 0 especifico universo de sentidos. Ao tentar compreender esse “refrao sem sentido”, inicio uma reflexdo pautada nos sentidos pelos quais se trafega no universo da danca. Para chegar na danca, parto da palavra por identificar que, no caso, ‘© processo de producdo de sentido segue légica semelhante. O que se verifica no refrao da mtisica Ragatanga é que, como destaquei, uma combinagao de silabas no remete a idioma algum, sujeito a tradugao, a partir do conhecimento de um vocabulério ou gramética especifica. A sonoridade é que se oferece como possibilidade de sentido. Estamos diante daquilo que Charles Peirce define como feone, um “signo cuya virtud significante se debe simplemente a sua Cualidade”. (ANDACHT, 1999, p. 1) Uma qualidade que se presentifica e que remete a si mesmo, a sua "materialidade”. E 0 signo da aparéncia dos sentidos. O icone firma-se nas suas qualidades e “qualidades néo podem representar nem indicar nada, apenas se presentificam”. (SANTAELLA, 1992, p. 194) Ao se ouvir: “Aserefe ra de re/ De hebe tu de hebere/ seibiunouba mahabi/ An de 6bugui an de buididipi", nao temos a referéncia de qualquer objeto preciso ou a segura jornada de quem trafega por verbos, substantivos, preposigées, adjetivos ou qualquer outra categoria lingiifstica definida e reconhecida, que guie o seu sentido. As sonoridades néo apontam para nada. Estamos diante de “a sign with maximum independence with respect to it object; it does not require the object, it is no provoked by it, nor is it determined by convention”. (PONZIO, 1986, p. 22). As palavras do refrao nao remetem a outra palavra a nao ser a elas mesmas. As palavras do refrao suscitam sensagdes € nao definigdes. Tem-se qualidades: as palavras sao curtas, compridas, agudas, graves, suaves, Asperas, tuidosas, harmoniosas. Como observa Lucia Santaella, as “qualidades so tenras, vulnerdveis". H& um grau de liberdade nos signos icénicos que the conferem essa vulnerabilidade, num jogo de sentido diferente do indicial ou do simbdlico. O indice aponta = Grupo musical composto por cinco integrantes selecionadas entre as 30 mil inscritas no programa Pop Star, veiculado pelo SBT. 0 CD de ‘estréia do grupo vendeu mais de um milhdo de cépias. "Um signo com maxima independéncia em relagao ao objeto; ele nao requer o abjeto, nem 4 provocado por ele, nao ¢ determinada por conven¢ao.” para..., revela uma relacao. O simbolo explicita um sentido convencionado, é argumentativo. Os icones estabelecem seus sentidos a partir da abducao, a inferéncia. E 0 que destaca Castanares ao citar a obra de Peirce: “La deducién es el argumento que prueba que algo debe ser, la inducidn prueba que algo es realmente operativo, mientras que la abduccion se limita a sugerir que algo poede ser." (1996, p. 1324). Apesar da sua aparéncia que afronta, como evidéncia fisica, no fcone, enfrenta-se uma navegacéio sem cartografia. Tao tenro e vulneravel, 0 icone, como o refrao de Ragatanga desafia os sentidos. Exemplo que deixa isso evidente é que, tao logo a mtisica fez sucesso, comegou a circular 0 seguinte e-mail pela internet, intitulado Perigo Grupo Rouge Ragatanga Atencio Brasileiros! E preciso que saibam a verdade sobre o grupo Rouge! Em toda a Europa jé se sabe que o hit Ragatanga é uma espécie de mantra que cultua as forgas saténicas, e se por acaso vocé nao acredita, tente decifrar o que diz no refrao: Aserehe ra de re/ De hebe tu de berebere seibiunouba mahabi/ An de bugui an de buididipi. No dialeto da tribo Assab da Eritréa, no noroeste da Africa, essa cangGo ao som de tambores é dangada enquanto forgas malignas sao invocadas. Segundo a diretora do Instituto de Ciéncias Paranormais, de Souht Hampton, Kathrine Marshal, as palavras ditas no refrao sao as mesmas que tribo africana usa para compro- meter suas “miereliens”, o que significa alma. Cuidado! O refrao passa a ser associado a versos satanicos que ecoam de alguma tribo africana. Soltos de qualquer ancoragem segura nas linguas latinas € saxdnicas, 0 sentido se estabelece pela similitude sonora com a de rituais da Eritréa. E a misica que * Isto gente, 9.12.2002. A formula do biscoito. virou hit na midia passa a ter também um significado demoniaco. Os sentidos de Ragatanga ancoram em outro continente, mas a sua vulnerabilidade permite muitas rotas. E a propriedade ic6nica que se impée, uma vez que o icone se coloca como co signo qute tent com seu objeto uma relacao de semethanca. Mas esse objeto é sempre hipotético, facilmente substituido por outro, pois no mundo dos sniles o demnio das analogias faz a festa. (SANTAELLA, 1992, p, 194). A semelhanca abre-se as analogias possiveis. No Brasil, a Ragatanga, importada do grupo espanhol Las Ketchup, foi apresentada via televisao ao Pafs, interpretada pelo grupo Rouge, formado por cinco jovens que venderam mais de um milhao de cépias do seu primeiro CD. O sucesso foi milimetricamente planejado pela produtora RGB, que comprou os direitos autorais do programa Pop Star e, em parceria com a gravadora Sony ¢ 0 SBT, investiram nada menos que RS 7 milhdes.* A verso completa da cang&o ficou assim: Ola ld quem vem virando a esquina! Vem Diego com toda a alegria, festejando Com a lua em seus olfis, roupa de dgua marinhia E seu jeito de malandro E com magia e pura alma Ele chega com a danca Possuido pelo ritmo "ragatanga” Eo DJ que jd conhece ‘Toca o som da meia-noite pra Diego, a angio mais desejada Ele danca, ele curte, ele canta (repete 3 vezes) Aserehe ra dere De hebe tu de hebere seibiunouba mahiabi Ande bugui an de buididipi 169 De acordo com o site’ dedicado a Ragatanga, Aserejé é uma canc&o que fala sobre uma outra cangdo. Ela conta a hist6ria de Diego, um rastafariano negro-cigano que passa as noites dancando hip-hop Ele gosta de uma certa misica de 1979, chamada Rapper's Delight, do conjunto de rap Sugar Hill Gang, formado em 1977. Como Diego nao conhece direito a letra da cangao, por nao saber inglés, entéo pronuncia as palavras mais ou menos do jeito que as escuta. Assim, ‘Aserejé” é a prontincia espanhola deturpada de "I said a hip’, trecho tomado da cang&o original que conta com os seguintes versos: “I said a hip hop the hippie / The hippie to the hip hip hop, / Af you don't stop / The rock it to the bang bang boogie | Say up jumped the boogie | To the rhythm of the boogie, the beat.” Aqui 0 sentido do refréo é atribuido a uma espécie de degeneracao lingiifstica. Do inglés para 0 espanhol e, daf, para o portugués. Mais uma vez, verifica-se que os sentidos est4o diretamente ligados & sonoridade das palavras, que, nesse caso, vao buscar ancoragem na sonoridade da letra de um rap norte-americano,. Novamente busca-se, por similitude, um objeto referencial para o que é pura fisicalidade. O fcone, aut6nomo, nao precisa de nada para significar a ndo ser ele mesmo, é aquilo que Peirce chama um Qualisigno. "Qualisigns manisfest musically as timbre, intensity, quality of pitch and duration, before any intellectual appehension of the sign, and before any analysis."° (MARTINEZ, 1997, p. 84). Estamos diante de uma pura qualidade actistica Se nas can¢des nem sempre essa propriedade é to evidente, na danga ela se coloca de maneira imperativa no jogo dos sentidos. E a iconicidade o nivel inicial da semiose. Os movimentos do corpo impdem sua fisicalidade, sua materialidade. Tem-se uma experiéncia cinética que se conforma num vocabulério coreografico que néo permite uma direta e precisa tradugao. Na danca os signos nao sao deter- minados apenas por convengdes preestabelecidas, mas pelas qualidades do corpo que se move, pela aparéncia desse corpo, pela sua forma. Antes de qualquer operacao, é o nivel sensorial que “fala” No videoclipe Ragatanga, 0 refrao € acompa- nhando por uma coreografia. Um movimento forte e direto do braco direito a frente, repetido pelo brago esquerdo; 0 braco direito realiza um giro répido de mais de 180° para tras, pousando sobre o quadril direito; 0 brago esquerdo repete o movimento; os dois bragos cruzam a frente quatro vezes rapidamente, na altura do abdémen; o brago direito é flexionado, e a mao direita, com os dedos fechados, com excegao do polegar, faz um movimento em direcéio ao ombro direito; o mesmo é realizado com © braco esquerdo; os bracos, & frente, vao girando em movimentos répidos e ascendentes, em tomo de um mesmo eixo, subindo verticalmente até a altura da cabega, enquanto os joelhos oscilam para dentro e para fora repetidas vezes; simultaneamente, a mao esquerda é pousada na testa, com a palma para fora, ea direita, na nuca, coma palma voltada para dentro, ambas mantendo os cotovelos no nivel alto. = Disponivel em: . Acesso em: 29 abr. 2003, © “Qualisignos manifestam-se musicalmente como timbre, intensidade, altura e duracao, antes de alguma apreensao intelectual do signo, antes A coreografia foi amplamente divulgada na Programacao televisiva e virou mania nacional em discotecas, academias de danca e até em festas de aniversério e casamento. Como interpretar o movimento de bragos que giram e sobem ou que sao langados com forca para frente? Os sentidos dos movimentos referidos nao se expressam por definigSes, mas pelas suas qualidades: movimentos fortes, rdpidos, circulares, diretos, simultaneos. Movimentos de bracos Ageis, quadris sinuosos, pernas vibrantes. Os movimentos tém sua carga de independéncia semantica, Os seus sentidos remetem as suas préprias qualidades, Como sugere Laban (1978, p. 52), "a danga pode ser considerada como a poesia das agaes corporais no espaco", agdes que “modulam-se ricamente conforme modelos peculiares de esforco que nao tém qualquer serventia funcional”. (p. 111). O movimento da danga nao esté preso ao desempenho, como no esporte ou ao utilitario e funcional, como no trabalho © Nas ag6es rotineiras. O movimento da danca se estrutura enquanto expressividade corporal construida pelo uso do esforgo de maneira distinta, nas coreografias. Esse esforgo é a tradugdo das suas qualidades quando se faz movimento. E essa Operagéio pode ser considerada perigosa e até subversiva, por nao apresentar uma leitura univoca e determinada. Tal condigao fez com que a 0 balé da corte, nos séculos XVI, se valesse da poesia para explicar 0 que era dangado, No balé roméntico do século XIX, os libretos davam conta de orientar o ptiblico ao entendimento do espetaculo coreografico. O movimento precisava de palavras para ser traduzido. Contudo, coreégrafos como 0 norte-americano Merce Cunningham estiveram atentos a especificidade dos movimentos da danga nas suas qualidades Cunningham criou um trabalho no qual o movimento nao procura ancoradouros, mas que est4 atento, acima de tudo, a si mesmo. O movimento nao depende do enredo ou da histéria, mas das qualidades dos corpos em movimento. Seu trabalho chama a atengado o tempo todo para essas qualidades, elemento essencial para dar sentido as suas obras. Ao analisar um artigo Publicado em 1952 pelo coredgrafo sobre a sua atividade “ouvimos um quase eco do Guardador de Rebanhos de Alberto Caeirof Fernando Pessoa, para quem ‘0 vento sé fala do vento..." (AMORIM; QUEIROZ, 2000, p. 82). Arrisco afirmar que, nessa perspectiva, os signos da danga, como os da mtisica, promovem um efeito estético, que se conforma de maneira que © que € significado por ele ndo se funda em nada sendio nele mesmo. Esse efeito, em um primeiro momento, pode ser definido como recusa a categorizagao ou ainda como uma situacao em que © receptor se afasta de suas classificagoes, (ISER, 1996, p. 53) Nao ha regra nem convengao que permita interpreté-los. H4 uma sugestibilidade, possibi- lidades de sentido trazidas pelas qualidades que os movimentos mobilizam. Isso faz ecoar a idéia de Peirce na qual os fatos exigem uma explicacdo, ainda que nao se tenha uma teoria ou regra geral para explicé-los. (CP 7.218).” E uma propriedade estética, expressa pelas formas dos movimentos, a qual aciona TCP 6 a abreviatura para designar os Collected Papers, que ratinem 08 trabalhos de Perce 172 um possivel sentido. E quando remeto ao conceito de estética, cabe ressaltar que la palabra estética no tiene que ver aqui, por tanto, ni con un museo ni con un institute cosmético. Lo estético se relaciona, en cambio, con la pura aficién por algo, con la consideracién de alguna cualidad absoluta, ni mala ni buena en si misma, que, independientemente de cualquier raz6n 0 realidad fisica, nos hace desear esto y repudiar aquello. (ANDACHT, 1996, p. 20} Desejo e reptidio se apresentam como duas faces da mesma matriz estética promovida pela sensorialidade. Essa espécie de afetividade é que rege as operagées de sentido dos movimentos de danga, 0 seu apelo sensorial, antes de mais nada. “© primeiro efeito significado de um signo é 0 sentimenta por ele provocado.” (CP 5.475). Um arabesque ou um plié, por mais codificado que possa estar na normatividade do balé cldssico, néo confere um sentido determinado, colocam-se como possibilidade. O efeito estético articula as conexdes possiveis, provocando emocionalidade, afeigées acionadas pelas qualidades dos signos da mtisica e da danca “But quality of feeling, as the interpretant generated by musical qualisigns, is already an instance of emotional interpretant."* (MARTINEZ, 1997, p. 84-85). Nao quero dizer com isso que 0 universo de significacéo da danca envolve apenas iconicidade. Os movimentos de danga, como 0 refrio da miisica aqui citada, podem servir de simbolo de sucesso ou indicar a ascenséo da cultura Pop. O intuito aqui nao énegligenciar essas tramas dos sentidos, mas sugerir que ha de se atentar que tal propriedade, da iconicidade, est a servigo da danca, que faz parte da sua matéria-prima e sem a qual fica diffcil entender, por exemplo, a idéia de uma dramaturgia de danga. Claro que para isso hé de se aceitar uma navegacéo sem cartografia esquemética, mas suscetfvel aos ventos que sopram. Esse tipo de navegacao, entretanto, ndo é um vale-tudo ou um se deixar ir ao sabor do vento. Esse tipo de navegacdo exige antes de tudo rigor e conhecimento do navio e de seus procedimentos, dos saberes do mar com seus caprichos e sereias e, também, das percepcdes agucadas do navegador para a embarcacéo nao naufragar em Aguas rasas. * "Mas qualidade de sentimento, come o interpretante gorado pelos qualisignos musiceis, ja € uma instancia de interpretante emocional.” REFERENCIAS sel. AMORIM, Gisia; QUEIROZ, Bérgson. Merce Cunningham: pensamento e técnica: ligées de danga 2. Rio de Janeiro. UniverCidade, 2000. ANDACHT, Fernando. Paisajes de pasiones: pequefio tratado sobre las pasiones en Mesocracia. Montevidéu: Fin de Siglo, 1996 __ Laitresistile via iconica del carisma. Relaciones, 1999. CASTANARES, Wenceslao. El efecto Peirce: |S. |: sugestiones par atna teorfa de la comunicacién. Navarra: Anuétio Filos6fico, 1996. ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. Sao Paulo: Ed. 34, 1996. LABAN, Rudolf. O dominio do movimento, S40 Paulo: Summus, 1978. MARTINEZ, José Luis. Semtiosis in findustani music. Helsink: The International Semiotics Institute, 1997 PEIRCE, C. S. The collected papers. Cambridge: Harvard University Press, 1956. 8. PONZIO, Augusto. Semiotics between Peirce & Bakhtin. In: Jkonicity: essays on the nature of culture. Tlbingen: Stauffenburgverlag, 1986. SANTAELLA, Lucia. A assinatura das coisas: Peirce e literatura. Rio de Janeiro: Imago, 1992. Imagem: cognigao, semistica e midia, So Paulo: lluminuras, 2001 WINKIN, Yves. A nova comunicagao: da teoria ao trabalho de campo. Campinas: Papirus, 1998.

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